alívio das tensões residuais de soldagem por shot peening na
TRANSCRIPT
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Centro de Tecnologia
Escola Politécnica
Engenharia Naval e Oceânica
“ALÍVIO DAS TENSÕES RESIDUAIS DE SOLDAGEM POR SHOT PEENING NA
CONSTRUÇÃO NAVAL”
Aluno
Marcela Correia Esteves
DRE: 109046389
Professor Orientador
Segen Farid Estefen, Ph.D.
Professor Co-Orientador
Tetyana Gurova, D.Sc.
Rio de Janeiro, RJ – Brasil
Agosto de 2015
i
ESCOLA POLITÉCNICA
ENGENHARIA NAVAL E OCEÂNICA
“ALÍVIO DAS TENSÕES RESIDUAIS DE SOLDAGEM POR SHOT PEENING NA
CONSTRUÇÃO NAVAL”
Marcela Correia Esteves
– DRE 109046389
Projeto Final Submetido Ao Corpo Docente Do
Departamento De Engenharia Naval E Oceânica
Da Escola Politécnica Da Universidade Federal
Do Rio De Janeiro Como Parte Dos Requisitos
Necessários Para A Obtenção Do Grau De
Engenheiro Naval e Oceânico.
Aprovado por:
___________________________________________________
Segen Farid Estefen, Ph.D.
(ORIENTADOR)
___________________________________________________
Tetyana Gurova, D.Sc.
(CO-ORIENTADORA)
___________________________________________________
Marta Cecília Tapia Reyes, D.Sc.
___________________________________________________
Anatoli Leontiev, D.Sc.
Rio de Janeiro, RJ – Brasil
Agosto de 2015
ii
ESTEVES, Marcela C.
Alívio das Tensões Residuais de Soldagem por Shot
peening na Construção Naval-Rio de Janeiro: UFRJ/
Escola Politécnica, 2015.
48 p: X .;29,7 cm.
Orientador: Segen Farid Estefen
Projeto de Graduação – UFRJ/ Escola Politécnica/
Engenharia Naval e Oceânica, 2015
Monografia apresentada ao curso de Engenharia Naval e
Oceânica da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Referências Bibliográficas: p. 48
1.Tensão Residual. 2 Solda de Reparo. 3.Shot peening.
I. Farid Estefen, Segen. II. Universidade Federal do Rio
de Janeiro, Escola Politécnica, Curso de Engenharia Naval
e Oceânica. III. Titulo.
iii
À minha mãe e em memória de meu pai.
iv
Agradecimentos
Gostaria de agradecer primeiro aos meus pais, que sempre foram meu pilar
central e fonte de inspiração.
Ao meu pai André Abrahão da Silva Esteves por todos os ensinamentos com
os quais me preparou para uma vida inteira, e que mesmo nesses últimos 10 anos
“afastados” tenho certeza não ter me desamparado e ter me passado força quando
precisei.
À minha mãe Vânia Vargas Correia Esteves pelo exemplo de força e mulher
guerreira, que sempre foi minha maior incentivadora, me levantou nos momentos que
precisei e sempre esteve ao meu lado. E, principalmente, nunca mediu esforços para
fazer com qualquer dificuldade na minha trajetória pudesse ser revertida.
Ao amigo Carlos Alberto Guerra pelo apoio e desdobramento incansável em
sempre me ajudar no meu dia-dia a passar pelas dificuldades que surgissem no
caminho.
À minha família que sempre esteve desde pequena ao meu lado torcendo e me
apoiando na minha formação e em continuar na busca do meu diploma.
Às minhas amigas e às segundas mães, que em todos esses longos anos de
amizade sempre me ouviram, me apoiaram, buscaram me compreender e dar forças
nos momentos difíceis, ou simplesmente, conseguiam torná-los de alguma forma mais
fáceis e por fim também me incentivar a continuar.
Às minhas amigas da Subsea7 que acompanharam de perto o meu dia-dia no
último ano e conseguiam torná-lo muito mais fáceis e agradáveis. Aos meus colegas
de profissão que me incentivaram e passaram grandes ensinamentos que agora
lavarei para minha vida profissional.
Aos amigos da Naval pelo apoio mútuo nestes anos de faculdade e pelas
risadas e até mesmo momentos de desesperos porém unidos que fizeram-nos
avançar na nossa graduação.
Ao meu orientador, Segen Farid Estefen, e à minha Co-orientadora, Tetyana
Gurova, pela oportunidade fornecida de iniciação científica no Laboratório de
Tecnologia Submarina (LTS), e pelos auxílios e contribuições ao longo do
desenvolvimento deste trabalho.
Ao apoio financeiro da Petrobras e Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural
e Biocombustíveis – ANP, por meio do Programa de Recursos Humanos para o Setor
Petróleo e Gás – PRH-03 e ao apoio tecnológico e operacional do Estaleiro EISA.
v
Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/UFRJ como parte
dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Engenheiro Naval.
“ALÍVIO DAS TENSÕES RESIDUAIS DE SOLDAGEM POR SHOT PEENING NA
CONSTRUÇÃO NAVAL”
Marcela Correia Esteves
Agosto/2015
Orientador: Segen Farid Estefen
Co-Orientador: Tetyana Gurova
Departamento: Engenharia Naval e Oceânica
Soldagem é uma das principais operações tecnológicas na construção naval.
Os efeitos colaterais da soldagem, tais como surgimento de distorções e de tensões
residuais, são indesejáveis durante o processo de fabricação, pois implicam no
retrabalho que é responsável por cerca de 25% do custo de mão de obra. Destaca-se
entre as operações de soldagem as soldas de reparo, que introduzem novas tensões
residuais nos elementos estruturais do navio não previstas no projeto original. O
processo de shot peening, adotado neste projeto, é um dos pós-tratamentos utilizados
para alívio das tensões de soldagem. Neste trabalho foi estudado o efeito da
distribuição das tensões induzidas por shot peening sobre metal depositado, zona
termicamente afetada e metal base próximo ao cordão de solda, para chapas navais
com solda de reparo. Estas áreas das chapas soldadas possuem tensões pré-
existentes tanto de tração como de compressão de natureza térmica, que
comprovadamente influenciam no resultado final das distribuições. Na obtenção dos
resultados experimentais foram utilizadas técnicas experimentais de mapeamento das
tensões mecânicas através do método magnético e de medição dos valores absolutos
pelo método de difração de raios-X.
vi
Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment of
the requirements for the degree of Engineer.
“RELIEF OF WELDING RESIDUAL STRESSES BY SHOT PEENING ON
SHIPBUILDING”
Marcela Correia Esteves
August/2015
Advisor: Segen Farid Estefen
Co-Advisor: Tetyana Gurova
Department: Naval and Ocean Engineering
Welding is one of the main technological operations in shipbuilding. Side effects
of welding, such as appearance of distortion and residual stresses are undesirable
during the manufacturing process, as it implies that the rework is responsible for about
25% of the labor cost. It stands between the welding operations, the repair welds,
which introduce new residual stresses in the structural elements of the ship, not
provided for in the original design. The process of shot peening, adopted in this project,
is one of the post-treatments used for relief of welding stresses. This study investigated
the effect of the distribution of stresses induced by shot peening on deposited metal,
heat affected zone and base metal near the weld bead, for welded ship plate top.
These areas of welded plates have pre-existing tensions both traction as thermal
compression nature, which proved to influence the final result of distribuições. To
obtain the experimental results were used experimental techniques of mapping
mechanical stresses through the magnetic measuring method and the absolute values
by the method of X-ray diffraction.
vii
Sumário
1. Introdução e Objetivos .......................................................................................... 1
2. Motivação ............................................................................................................. 1
2.1. Histórico de Falhas ......................................................................................... 3
3. Revisão Bibliogáfica .............................................................................................. 6
3.1. Soldagem ....................................................................................................... 6
3.1.1. Soldagem a Arco Elétrico com Arame Tubular ...................................... 11
3.2. Tensões Residuais de Soldagem ................................................................. 13
3.3. Tratamentos de Alívio de Tensões ............................................................... 17
3.3.1. Shot Peening ......................................................................................... 18
3.3.2. Outros Tratamentos de Alívio ................................................................ 22
3.4. Tensões Residuais Pré-Existentes ............................................................... 25
3.5. Métodos e Equipamentos de Medição .......................................................... 28
3.5.1. Raystress .............................................................................................. 28
3.5.2. Stressvision ........................................................................................... 31
4. Procedimento Experimental ................................................................................ 34
5. Resultados Experimentais das Medições ............................................................ 37
6. Conclusões ......................................................................................................... 47
7. Bibliografia .......................................................................................................... 48
viii
Lista de Figuras
Figura 1 - Método de fabricação por blocos na construção de um navio ....................... 2
Figura 2 - Distorções de fabricação na indústria naval .................................................. 3
Figura 3 - Navio da classe Liberty construído durante a II guerra mundial .................... 3
Figura 4 - Vista da ruptura do navio Charles S. Haight entre a secção central do navio
e popa. ......................................................................................................................... 4
Figura 5 - Fratura frágil do navio SS Schenectadyainda no porto. ................................ 4
Figura 6 - Repercussão dos acidentes nos jornais ........................................................ 5
Figura 7 - Principais tipos de procedimento de soldagem ............................................. 7
Figura 8 - Variáveis que influenciam no procedimento de soldagem ............................. 8
Figura 9 - Procedimento de soldagem e terminologia adotada ..................................... 9
Figura 10 – Terminologia de soldagem: poça de fusão, zona termicamente afetada e
metal base .................................................................................................................... 9
Figura 11 - Procedimento de soldagem e terminologia adotada ................................. 11
Figura 12 - Desenho esquemátido da soldagem a arco elétrico com arame tubular ... 12
Figura 13 - Terminologia e distribuição de tensões residuais de uma solda ................ 14
Figura 14 - Representação esquemática da variação de tensões residuais transversais
(𝛔𝐭) mostrando a superposição linear dos efeitos a) contração (C); b) resfriamento
superficial mais intenso (R); c) transformação de fase (T); d)C+R; e)C+R+T f)C+T; ... 15
Figura 15 - Tensões de solda em aço: a) espessura 2,5 mm resfriamento com ar,
b)espessura de 10 mm resfriamento com ar, c) espessura 2,5 mm resfriamento com
água. .......................................................................................................................... 16
Figura 16 - Máquina industrial de shot peening ........................................................... 18
Figura 17 - Zona de compressão formada pelo impacto do shot peening ................... 19
Figura 18 – Perfil ideal das distribuição das tensões induzidas por shot peening ....... 20
Figura 19 – Exemplo de uma aplicação do jateamento das granalhas em uma peça . 21
Figura 20 - Desenho esquemático do método de Almen ............................................. 22
Figura 21 – Equipamento Raystress ........................................................................... 29
Figura 22 - Esquema de medição de tensões com o equipamento portátil ................. 31
Figura 23 – Equipamento Stressvision ........................................................................ 32
Figura 24 – Esquema do funcionamento do sensor magneto-anisotrópico. ................ 33
Figura 25 - Preparação do corpo de prova no EISA .................................................... 35
Figura 26 - Corpo de prova com solda de reparo ........................................................ 35
Figura 27 - Equipamento de soldagem ....................................................................... 36
Figura 28 - Localização dos pontos de medição das tensões resíduas de soldagem
com relação a solda de reparo .................................................................................... 37
ix
Figura 29 - Polimento eletrolítico sendo aplicado no primeiro dia................................ 38
Figura 30 – Corpo de prova com a malha de pontos desenhada ................................ 39
Figura 31 - Medição realizada após duas semanas .................................................... 40
Figura 32 - Solda de reparo com shot peening. Mapa de distribuição do fator de
concentração da tensão cisalhante máxima. Resultado inicial. ................................... 41
Figura 33 - Solda de reparo com shot peening. Mapa de distribuição do fator de
concentração da tensão cisalhante máxima. Resultado final. ..................................... 42
x
Lista de Gráficos
Gráfico 1 - Gráfico de temperaturas para TTAT .......................................................... 23
Gráfico 2 - Variações das tensões durante TTAT ....................................................... 23
Gráfico 3 - Distribuição das tensões residuais numa camada sub-superficial dos corpos
de prova em relação à profundidade. (1) corpo de prova sem cementação; (2) e (3)
corpo de prova após a cementação, tensões na direção longitudinal e transversal,
respectivamente ......................................................................................................... 27
Gráfico 4 - Distribuição inicial e final dos valores da tensão cisalhante máxima na
posição A (acima) e B (abaixo) para corpo de prova submetido ao tratamento por shot
peening ....................................................................................................................... 43
Gráfico 5 - Distribuição da tensão cisalhante máxima na posição A, inicial (acima) e
final (abaixo), para solda de reparo sem e com shot peening ..................................... 44
Gráfico 6 - Distribuição da tensão cisalhante máxima na posição B, inicial (acima) e
final (abaixo), para solda de reparo sem e com shot peening ..................................... 45
Gráfico 7 - Valores iniciais e finais das tensões com profundidade nas direções
longitudinal e transversal com relação ao cordão de solda no ponto de medição A-2
para corpo de prova com solda de reparo submetido ao shot peening ....................... 46
1
1. Introdução e Objetivos
Soldagem é uma das principais operações tecnológicas na construção naval. No
entanto os efeitos colaterais da soldagem, tais como surgimento de distorções e de
tensões residuais, são indesejáveis durante o processo de fabricação, pois implicam
no retrabalho que é responsável por cerca de 25% do custo de mão de obra. Destaca-
se entre as operações de soldagem as soldas de reparo, que introduzem novas
tensões residuais nos elementos estruturais do navio não previstas no projeto original.
Enquanto o procedimento de solda de junção está amplamente estudado, desde
o inicio do século passado, através dos métodos experimentais, numéricos e teóricos,
a solda de reparo começou a ser assunto das amplas pesquisas recentemente.
O processo de shot peening, abordado neste projeto, é um dos pós-tratamentos
utilizados para alívio das tensões de soldagem que consequentemente tem como sua
principal vantagem atuar no aumento da vida útil da estrutura.
Este trabalho tem como objetivo, portanto, estudar o efeito da distribuição das
tensões induzidas por shot peening sobre metal depositado, zona termicamente
afetada e metal base próximo ao cordão de solda, para chapas navais soldadas de
topo, sem considerar os efeitos desta aplicação na microestrutura e propriedades
mecânicas do material. O processo de soldagem escolhido foi soldagem a arco
elétrico com arame tubular e as chapas soldadas possuindo tensões pré-existentes,
que comprovadamente influenciam no resultado final das distribuições.
2. Motivação
A soldagem está presente em todas as etapas de fabricação de embarcações
sendo uma das principais técnicas usadas nos estaleiros. Estima-se que
aproximadamente um por cento de todo o peso do navio é proveniente dos
consumíveis de solda.
Painéis enrijecidos constituem estruturas básicas na construção de navios,
sendo estes obtidos por meio da união entre placas de aço e enrijecidos com a
soldagem de reforços transversais e longitudinais, em alguns casos ainda são
enrijecido em ambos os lados, como na figura 1. Os processos básicos empregados
2
na confecção dos painéis são, portanto, o corte, a conformação mecânica e a
soldagem.
Figura 1 - Método de fabricação por blocos na construção de um navio
Porém os processos de soldagem empregados na fabricação naval inserem
diferentes níveis de tensões residuais, por diversas causas que serão abordadas neste
trabalho. Os principais efeitos da presença de tensões residuais em componentes
soldados:
Flambagem;
Falha por fadiga;
Fratura Frágil;
Formação de trincas.
Estas imperfeições constituem, portanto, sérias complicações, podendo causar
desde danos estruturais a atrasos nos prazos de conclusão do projeto, além de
aumentar o custo final do empreendimento, pois, parte considerável do tempo total
para construir uma embarcação é gasto com retrabalho para corrigir imperfeições. As
distorções inseridas em componentes oceânicos devido aos processos de fabricação
têm por fim um efeito negativo gerando estruturas com reduzido limite à resistência.
3
Figura 2 - Distorções de fabricação na indústria naval
Dita a importância da soldagem para a indústria naval, porém não apenas nesta,
e também as consequências que pode implicar nas estruturas, é clara a necessidade
de desenvolvimento de novas tecnologias e estudos para um melhor entendimento
das consequências e possíveis ações mitigadoras no uso deste processo.
2.1. Histórico de Falhas
Pode-se apresentar um histórico de casos de falha em navios provocados pelo
uso inadequado de processos de soldagem. O caso mais clássico é o da fratura frágil
dos navios da classe Liberty (1941-1945). A Classe Liberty foi uma série de navios
cargueiros/militar, construídos nos EUA durante a Segunda Guerra Mundial.
Figura 3 - Navio da classe Liberty construído durante a II guerra mundial
4
Na Segunda Guerra Mundial as estruturas dos navios eram soldadas para
economizar tempo na montagem devido a grande demanda de suprimentos que
atravessavam o Oceano Atlântico do EUA para Inglaterra principalmente, com a
finalidade para abastecer as tropas aliadas durante a época de guerra.
Os efeitos da temperatura, dos concentradores de tensão e de tensões residuais
não eram bem compreendidos para a época. Muitos deles acabavam afundando antes
de cumprir a travessia do Atlântico, alguns fraturavam em alto mar e outros atracados
no porto onde foi observado que o material perdia ductilidade necessária para resistir à
baixa temperatura.
Foram construídos 4694 navios deste tipo, dos quais 1289 sofreram fratura frágil.
Destas, 233 foram catastróficas, com perda completa e, em 19 casos, os navios
partiram-se ao meio, como os navios tanques SS Schenectady e o Charles S. Haight,
figuras 4 e 5.
Figura 4 - Vista da ruptura do navio Charles S. Haight entre a secção central do navio e popa.
O SS Schenectady, figura 5, fraturou em 16 de janeiro de 1943, atracado no píer
de acabamento do estaleiro, com mar calmo. A fratura frágil foi súbita, sem aviso e foi
ouvida pelo menos a 1500 metros de distância.
Figura 5 - Fratura frágil do navio SS Schenectady ainda no porto.
5
Estes acidentes tiveram grande repercussão na mídia e na época surgiram
muitas críticas ao processo de soldagem, ao ensaio Charpy e a metodologia de projeto
(resistência dos materiais), o que levou ao desenvolvimento de uma nova abordagem
técnica, conhecida hoje como Mecânica da Fratura e uma preocupação com a
qualidade dos processos de soldagem já naquela época.
Figura 6 - Repercussão dos acidentes nos jornais
Outros acidentes ainda, no ramo offshore, podem ser relatados como, por
exemplo, a semi-submersível de perfuração Sedco 135 que sofreu uma falha por
fadiga em 1967 no Golfo do México e a jaqueta de perfuração Ranger I que sofreu um
colapso devido a um fissura por fadiga em 1979 também no Golfo do México. Assim
como estes estruturas de exploração offshore muitos casos similares e na mesma
época foram verificados no Mar do Norte, Mar do Sul da China, Canadá e Austrália.
6
3. Revisão Bibliográfica
3.1. Soldagem
A Soldagem é o processo de união de materiais, particularmente metais,
utilizado na fabricação e recuperação de peças, equipamentos e estruturas, todos dos
mais variados tamanhos e setores industriais. Ou ainda, é caracterizada como a
operação que visa à união de duas ou mais peças, assegurando na junta, a
continuidade das propriedades físicas e químicas do material. Solda é o nome dado
para o resultado do procedimento de soldagem.
Após muitos avanços tecnológicos, atualmente existe uma vasta gama de
diferentes processos de soldagem, sendo necessária a seleção do processo adequado
para uma dada aplicação. As principais características positivas e negativas deste
processo podem ser vistas abaixo:
Vantagens:
Juntas de integridade e eficiência elevadas;
Grande variedade de processos;
Aplicável a diversos materiais;
Operação manual ou automática;
Pode ser altamente portátil;
Juntas totalmente estanques (ao contrário da rebitagem);
Custo, em geral, razoável;
Junta não apresenta problemas de perda de aperto;
Montagens de um único lado de acesso (ao contrário do aparafusamento);
Suporta esforços no próprio plano (ao contrário da rebitagem).
Desvantagens:
Prazo de validade limitado e resultados permanentes;
Apresentam formulações numerosas e variadas;
7
Exigem controle, montagem e testes complexos;
Somente testes destrutivos;
Exigem mão-de-obra altamente capacitada;
Ás vezes são necessários processos de cura (forno);
Exigem limpeza minuciosa;
Exigem preparação das superfícies a serem unidas.
A soldagem pode ser dividida de modo geral em dois grandes grupos de
operações: soldagem por fusão ou soldagem por pressão (deformação), e cada tipo se
subdivide ainda em uma extensa lista de procedimentos de soldagem existentes, de
acordo com suas peculiaridades conforme mencionado. A quantidade total é um
número dinâmico, pois vários outros processos estão em constante desenvolvimento
em nível de pesquisa e projetos para breves inserções no mercado de soldagem. A
ilustração 7 apresenta um breve resumo dos tipos de procedimentos disponíveis.
Figura 7 - Principais tipos de procedimento de soldagem
8
Dentre estes, os processos de soldagem a arco, que será adotado no
procedimento experimental deste trabalho, são os de maior importância industrial na
atualidade. Devido à tendência de reação do material fundido com os gases da
atmosfera, a maioria dos processos de soldagem por fusão utiliza algum meio de
proteção para minimizar estas reações.
A figura 8 mostra as variáveis envolvidas no processo de soldagem, observa-se
que para ter um bom resultado no processo deve-se levar em conta principalmente o
tipo de processo utilizado, o material e a sequência de realização da solda.
Figura 8 - Variáveis que influenciam no procedimento de soldagem
Após a operação de soldagem é necessário inspecionar e verificar as
propriedades das juntas soldadas, de acordo com o critério de aceitação da norma
adotada. Os principais métodos de ensaio não destrutivos (END) aplicados com esta
finalidade podem ser de quatro tipos: líquido penetrante, partícula magnética,
ultrassom e raio-x, além do ensaio visual que é considerado como um teste básico
que precede a todos os outros END’s. Conforme o nome indica, estes testes não
alteram as características físicas, mecânicas ou dimensionais e não interferem na vida
útil da peça. Cada método apresenta grau de complexibilidade e custos relacionados
bem diferentes, assim como seu nível de abrangência da solda, e por isso, de acordo
com o processo, solda, equipamento e outras circunstâncias a serem verificadas um
método será mais aplicável. A escolha dos ensaios não destrutivos está diretamente
relacionada às características das descontinuidades.
9
Algumas definições de conceitos são importantes para compreensão do
procedimento da soldagem, muitas vezes envolvendo o entendimento da
nomenclatura e siglas apropriadas. Algumas destas importantes terminologias podem
ser vistas a seguir:
Material de Base (MB): É o material que sofre o processo de soldagem, e,
portanto, constitui as partes a unir.
Material de Adição (MA): É o material que será usado como enchimento no
processo de soldagem, capaz de preencher a região livre entre as superfícies a serem
unidas. Este material é da mesma natureza das partes e será usado para assegurar a
continuidade de propriedades no caso da soldagem por fusão, de chapas ou peças
relativamente espessas.
Figura 9 - Procedimento de soldagem e terminologia adotada
Poça de fusão (PF): Região em fusão, a cada instante, durante uma soldagem.
Zona termicamente afetada (ZTA): É a região da solda que não se fundiu
durante a soldagem, porém teve sua microestrutura e propriedades alteradas devido
ao calor induzido pela soldagem ou operações de corte.
Figura 10 – Terminologia de soldagem: poça de fusão, zona termicamente afetada e metal base
10
Junta: Região entre duas ou mais peças que serão unidas. Classificação em
alguns tipos de juntas, porém, mais a mais comumente juntas de topo, que pode ser
ainda de penetração total ou parcial.
Chanfro: Corte efetuado na junta para possibilitar/facilitar a soldagem em toda a
sua espessura.
Raiz: Região mais profunda do cordão de solda conforme ilustrado na figura 11.
Tende a ser a região mais propensa à formação de descontinuidades em uma solda.
Face: Superfície oposta à raiz da solda conforme ilustrado na figura 11.
Passe: Depósito de material obtido pela progressão sucessiva de uma só poça
de fusão. Uma solda pode ser feita em um único ou em vários passes conforme
ilustrado na figura 11.
Camada: Conjunto de passes localizados em uma mesma altura no chanfro
conforme ilustrado na figura 11.
Reforço: Altura máxima alcançada pelo excesso de material de adição, medida
a partir da superfície do material de base conforme ilustrado na figura 11.
Margem: Linha de encontro entre a face da solda e a superfície do metal de
base conforme ilustrado na figura 11.
11
Figura 11 - Procedimento de soldagem e terminologia adotada
3.1.1. Soldagem a Arco Elétrico com Arame Tubular
O processo de soldagem escolhido para ser adotado no procedimento deste
projeto foi a soldagem a arco elétrico com arame tubular. A utilização deste processo
tem apresentado um aumento em razão de ser mais produtivo que a soldagem com
eletrodos revestidos e também devido ao desenvolvimento de novos tipos de
consumíveis, que tornou possível soldar em qualquer posição e com qualquer tipo de
junta. Sua aplicação é notável nas indústrias nuclear e naval.
Este processo de soldagem, também conhecido pela sigla FCAW (Flux-cored
Arc Welding), é definido como sendo um processo de soldagem por fusão, onde o
calor necessário para ligação das partes é fornecido por um arco elétrico estabelecido
entre a peça e um arame alimentado continuamente. Em algumas situações pode
utilizar gás de proteção durante a soldagem e ainda, com ou sem proteção gasosa,
este processo pode ser do tipo semi-automático ou automático.
12
A soldagem com arame tubular apresenta uma camada de escória que deve ser
removida antes que um novo cordão seja executado. O tipo de arame utilizado
condiciona a consistência e a aderência da escória; assim, existem escórias que se
partem ao esfriar e se destacam facilmente do cordão, enquanto que outras aderem
de tal modo ao cordão que precisam ser quebradas por meios mecânicos.
A escolha do arame tubular para soldagem segue as normas AWS que
consideram fatores como soldagem monopasse ou multipasse, uso ou não de gás
protetor, tipo de corrente, posições de soldagem e propriedades mecânicas desejadas
para o cordão de solda. O fluxo contido dentro do arame é responsável pela proteção
do arco e do cordão de solda e pode ser complementado por um fluxo de gás
fornecido por fonte externa conforme mencionado. Esta proteção gasosa é realizada
na maioria das vezes utilizando CO2 e em alguns casos podem-se utilizar misturas
específicas.
No caso de soldagem com arame autoprotegido, a própria fusão, a queima, a
formação de escória e a vaporização dos elementos do fluxo são suficientes para
proteger a poça de fusão e o arco elétrico.
Figura 12 - Desenho esquemático da soldagem a arco elétrico com arame tubular
Resumidamente é um processo semelhante ao processo MIG/MAG, diferindo
deste pelo fato de possuir um arame no formato tubular, que possui no seu interior um
fluxo composto por materiais inorgânicos e metálicos que possuem várias
funções, entre as quais a melhoria das características do arco elétrico, a transferência
do metal de solda a proteção do banho de fusão e em alguns casos a adição
de elementos de liga, além de atuar, como mencionado, na formação de escória.
13
A soldagem com arame tubular apresenta as seguintes vantagens perante
outros processos de soldagem:
Alta produtividade;
Alta taxa de deposição do metal de solda;
Soldagem pode ser executada em todas as posições;
Requer menos limpeza antes da soldagem que o GMAW;
Distorção reduzida sobre o SMAW;
Uso de eletrodos autoprotegidos elimina a necessidade do uso de
aparelhos de gás além de ser mais tolerante para condições ao ar livre;
Alta tolerância com relação a contaminantes que podem originar trincas;
Resistente a trincas do cordão.
3.2. Tensões Residuais de Soldagem
Tensões residuais podem ser definidas como qualquer tensão que existe no
volume de um material sem aplicação de carga externa. Tais tensões influenciam
substancialmente nas características de resistência mecânica e no funcionamento dos
elementos da estrutura, podendo contribuir para o surgimento de trincas. Portanto,
para preservação da segurança e da capacidade de trabalho dos elementos da
estrutura é fundamental o entendimento do surgimento e atuação dessas tensões.
As tensões residuais provenientes da soldagem são tensões residuais internas
em equilíbrio, que permanecem na estrutura após a realização de uma operação desta
magnitude. São tensões geradas por escoamentos parciais localizados que ocorrem
durante o ciclo térmico de soldagem, e podem surgir tanto no metal depositado, zona
termicamente afetada e/ou metal base próximo ao cordão de solda, com variação
significante no seu valor absoluto (tanto tensões de compressão como de tração).
No geral, as tensões residuais de soldagem surgem como consequências dos
seguintes fatos:
Contração no resfriamento de regiões diferentemente aquecidas e
plastificadas durante a operação de soldagem;
14
Resfriamento superficial mais intenso;
Transformações de fase.
A contração no resfriamento de regiões diferentemente aquecidas e plastificadas
durante a operação de soldagem normalmente representa a principal fonte de tensões
residuais. O nível de tensões varia ainda com o grau de restrição da estrutura na
direção considerada. Na maioria dos casos, a restrição é total na direção longitudinal
do cordão de solda. Não dispondo de rigidez suficiente, as peças se deformam,
tendendo a aliviar as tensões residuais através de escoamentos parciais localizados.
Estas deformações são proporcionais à extensão da zona plastificada. A distribuição
das tensões, considerando apenas as tensões de contração, pode ser vista na figura
13.
Figura 13 - Terminologia e distribuição de tensões residuais de uma solda
Tensões residuais também surgem devido ao resfriamento mais rápido da
superfície, pois o processo de resfriamento não é homogêneo ao longo da espessura,
a superfície resfria-se mais rapidamente do que o interior. Desta forma, além do
gradiente de temperatura nas direções longitudinal e transversal ao cordão de solda,
será também estabelecido um gradiente de temperatura ao longo da espessura da
15
peça. Este gradiente de temperatura poderá ocasionar deformação plástica localizada
e, consequentemente, tensões residuais ao longo da espessura. Ocorrerá um nível
elevado de tensões residuais deste tipo quando a junta soldada apresentar elevado
gradiente de temperatura ao longo da espessura (no caso de chapas espessas), e
baixo limite de escoamento nesta faixa de temperatura. Se o resfriamento mais rápido
da superfície fosse a única fonte de tensões residuais, tensões compressivas seriam
obtidas na superfície e, em equilíbrio, tensões trativas seriam obtidas no interior.
A distribuição de tensões residuais transversais, devido somente ao efeito de
resfriamento mais rápido da superfície, ao longo do eixo, é observado na figura 14b.
Figura 14 - Representação esquemática da variação de tensões residuais transversais (𝛔𝐭)
mostrando a superposição linear dos efeitos a) contração (C); b) resfriamento superficial mais
intenso (R); c) transformação de fase (T); d)C+R; e)C+R+T f)C+T;
Tensões residuais devido às transformações de fases na solda ocorrem porque
a transformação de fase da austenita para ferrita, bainita, perlita ou martensita, ocorre
com variação de volume decorrente de mudanças no arranjo cristalino. Desta forma,
numa junta soldada, o material da zona fundida e da zona termicamente afetada (ZTA)
que sofre transformação de fase tenderá a se expandir, o que será impedido (pelo
16
menos na direção longitudinal da solda) pelo restante do material frio e não
transformado. Explica-se então a geração de tensões residuais de compressão na
região transformada. A distribuição de tensões residuais transversais na superfície,
devido somente à transformação de fase, é mostrada na figura anterior 14c. A
superposição das tensões residuais transversais devido à contração, resfriamento
mais rápido da superfície e transformação de fase, é mostrada figura anterior 14e).
O estado de tensões na área do cordão de solda não é o mesmo, como foi
mostrado na figura 14. Ele depende muito da espessura das chapas soldadas e das
condições de resfriamento, conforme mostrado para diferentes casos na figura 15.
Figura 15 - Tensões de solda em aço: a) espessura 2,5 mm resfriamento com ar, b)espessura de 10
mm resfriamento com ar, c) espessura 2,5 mm resfriamento com água.
17
Existem diversos métodos para medição destas tensões, e estes podem ser
divididos nos seguintes dois grupos:
Métodos destrutivos;
Métodos não-destrutivos.
Nos métodos do grupo destrutivo, como o nome já indica, a medição é
acompanhada de destruição parcial ou total da peça. Enquanto que os métodos do
grupo não-destrutivos permitem manter a forma e dimensões originais da estrutura,
permitindo também com isso medições repetidas durante o processo de medição a ser
executado.
Entre os métodos destrutivos mais comuns pode-se citar: método da
amostragem, método da trepanação, método da perfuração e método da remoção de
camadas. E os principais métodos não-destrutivos consiste em: métodos magnéticos,
métodos acústicos, métodos elétricos e métodos de raio-X, que será adotado na
atividade experimental deste trabalho. Cada técnica possui suas particularidades,
vantagens e restrições, cabe analisar perante cada situação qual o método adequado
para uma aplicação correta.
O uso dessas técnicas traz consequências positivas, pois o conhecimento da
distribuição e magnitude das tensões possibilita fazer estimativas sobre a resistência
estrutural, visto que as tensões e às distorções residuais constituem um sério
problema na construção naval.
3.3. Tratamentos de Alívio de Tensões
Já relatada a importância da soldagem na cadeia produtiva de um navio, e
também o fato deste processo ser um dos principais fatores gerador de tensões
residuais e distorções, que podem vir a trazer consequências indesejáveis à estrutura,
os tratamentos de alívio de tensões são vistos como de extrema importância e
desafiador às empresas fornecedoras deste serviço.
As tensões residuais podem ter sua origem em diversas causas, e não sendo
sempre possível controlar e suprimir o surgimento das tensões residuais durante o
processo de fabricação, o procedimento de alívio das tensões assim como o nome já
18
diz é aplicado posteriormente para diminuir o nível das tensões e/ou redistribuí-las de
maneira mais uniforme.
Diversos métodos para alívio de tensões são oferecidos hoje em dia no
mercado, todos com o objetivo em comum de reduzir uma das principais dificuldades
do setor que são as já mencionadas distorções. Estes podem variar desde tratamentos
térmicos a métodos com vibração ou mecânicos conhecidos como martelamento,
porém cada um com suas particularidades, tanto positivas quanto negativas, e
devendo, portanto ser estudada sua aplicabilidade perante cada caso desejado.
O tratamento em questão neste trabalho é o tratamento mecânico de Shot
Peening apresentado a seguir, e mais em seguida outros tipos de tratamentos também
disponíveis serão abordados em nível de comparação.
3.3.1. Shot Peening
Processo de shot peening é um dos pós-tratamentos, também conhecido como
martelamento, utilizado para alívio das tensões de soldagem. Este método consiste
em um processo mecânico de trabalho a frio, amplamente utilizado nas indústrias nos
dias atuais, de custos relativamente baixos.
Figura 16 - Máquina industrial de shot peening
Basicamente, o procedimento consiste no jateamento da superfície da peça por
granalhas aceleradas com velocidades controladas. Estas granalhas adotadas
usualmente são partículas esféricas metálicas, de cerâmica ou ainda de vidro.
19
Neste processo cada granalha golpeia o material na superfície, como um
“martelo”, provocando com este impacto a formação de um pequeno sulco/deformação
sobre a superfície tratada, e na região exatamente abaixo deste impacto o surgimento
de um volume de material deformado plasticamente a frio, figura 17. Considerando um
fluxo contínuo na aplicação destas granalhas ocorre então uma sobreposição destas
regiões encruadas, desenvolvendo-se uma camada regular de metal com tensão
residual compressiva. A metalurgia mecânica estabelece que a propagação das
trincas necessita de tensões de natureza contrária, ou seja, de tensões trativas, e
assim as falhas por fadiga mecânica ou por corrosão tem o seu avanço e/ou
surgimento prejudicado. O choque das partículas com a superfície do material tratado
pode gerar uma camada de tensões compressivas de até 80% do limite de
escoamento ou 60% da tensão de resistência máxima do material.
Deste modo as tensões de compressão, introduzidas na superfície pelo shot
peening, são de extrema importância agindo de modo a proporcionar uma espécie de
barreira para a propagação de trincas e, de uma maneira geral, aumentos
consideráveis na vida útil das peças tratadas.
Figura 17 - Zona de compressão formada pelo impacto do shot peening
Além da possibilidade em vista de induzir uma distribuição desejável das tensões
residuais de compressão numa camada sub-superficial, entre os principais fatores
benéficos do shot peening são considerados o endurecimento das camadas
superficiais do material tratado, refinamento de grãos, uniformização dos valores das
tensões residuais na superfície e aumento na resistência à corrosão.
20
O perfil “ideal” da distribuição das tensões residuais esperado de um tratamento
por shot peening numa cama sub-superficial é apresentado na figura 18. Esta
distribuição é caracterizada por um valor da tensão de compressão na superfície 𝜎𝑠
que é constante em qualquer direção, um valor máximo da tensão de compressão 𝜎𝑡
introduzido conforme esperado, e sua profundidade ℎ𝑐 no qual a compressão atinge
seu valor máximo e por fim a profundidade da camada sub-superficial atingida.
Figura 18 – Perfil ideal da distribuição das tensões induzidas por shot peening
A profundidade das tensões obtidas com o shot peening varia entre 0,03 e 2
milímetros do material. A eficácia do processo, assim como a profundidade da camada
resultante são fortemente dependentes de vários fatores do processo de aplicação de
shot peening que irão influenciar no resultado, entre eles, velocidade, tamanho e
material das granalhas lançadas contra superfície e seu ângulo de impacto, tempo de
aplicação e percentual de cobertura. A propriedade do material é mais um fator que
influencia no resultado de shot peening, por exemplo, o mesmo procedimento resulta
numa distribuição completamente deferente para dos materiais com dureza diferente.
21
Figura 19 – Exemplo de uma aplicação do jateamento das granalhas em uma peça
O Shot Peening ainda que vastamente divulgado pelas indústrias em processos
automatizados possui a vantagem da existência da sua aplicação manual, sendo esta
de fácil manuseio e podendo ser levado até as peças a serem tratadas, eliminando
possíveis custos com o transporte da peça. Exemplo desta aplicabilidade são os
grandes blocos de navio da construção naval.
A eficiência do tratamento é controlada de maneira indireta e relativa, utilizando
o método de Almen, que parte do princípio de que deformações iguais em chapas
padronizadas correspondem às aplicações com iguais intensidades. Neste método,
são utilizados três tipos de plaquetas padronizadas, uma tira é colocada em um
dispositivo paralelamente ao componente a ser tratado. Durante o processo, as
esferas induzem simultaneamente tensões residuais na tira, a qual se deforma no
formato de um pequeno arco. Após o processo, é medida a altura do arco da tira e
através de uma tabela de conversão obtém-se o valor de intensidade Almen.
22
Figura 20 - Desenho esquemático do método de Almen
Existem ainda diferentes modificações do processo de shot peening, entre elas
os processos de stress peening e peen forming, quando a peça submetida ao
tratamento por shot peening é pré-tencionada e, consecutivamente, pré-deformada.
Neste caso a superfície submetida ao shot peening encontra-se no estado de tração
elástica por tensões atuantes (não residuais) externas. E também o lazer peening em
que um único “tiro” de alta energia repetido várias vezes na superfície da peça causa o
mesma efeito de compressão causado pelo impacto das partículas no shot peening
tradicional.
3.3.2. Outros Tratamentos de Alívio
Uma outra forma de minimizar as tensões oriundas do processo de soldagem, ou
seja, aliviá-las, é pela utilização do tratamento térmico de alívio de tensões (TTAT)
que, como o próprio nome já sugere, consiste em uma operação de aquecimento da
peça de trabalho, utilizando, por exemplo, um forno, após a conclusão da operação de
soldagem.
A temperatura de aquecimento na peça deve ser inferior à temperatura crítica de
transformação do material, ou seja, antes que ocorra alguma mudança de fase. Depois
de atingida essa temperatura, a peça é mantida aquecida durante um determinado
tempo, denominado tempo de patamar ou de encharque. É importante que a peça
atinja a temperatura uniformemente em todo seu comprimento. Segue-se então para o
23
resfriamento uniforme e controlado da peça, geralmente a uma taxa relativamente
baixa. O gráfico 1demonstra as principais etapas operacionais do alívio de tensões.
Gráfico 1 - Gráfico de temperaturas para TTAT
Os principais parâmetros para se definir um Tratamento Térmico de Alívio de
Tensões como taxa de aquecimento (TA), o tempo e a temperatura de patamar e a
Taxa de Resfriamento (TR) são definidos com o auxílio de normas internacionais.
Basicamente que neste tipo de tratamento ocorre que ao se aquecer um material
a tensão de escoamento do material se torna muito baixa, de modo a não suportar as
tensões internas dos componentes e o material se deforma, aliviando a tensão. O fato
de o processo ser controlado faz com que não haja geração de tensão durante o
processo de resfriamento, garantindo assim restar um menor nível de tensão residual
ao final da aplicação do tratamento.
Gráfico 2 - Variações das tensões durante TTAT
24
Os principais objetivos do TTAT são:
Aumento da ductilidade;
Diminuição da dureza tanto da zona fundida quanto da zona
termicamente afetada;
Redução de empeno;
Aumento da resistência à fadiga;
Aumento da resistência à corrosão sob tensão.
Por outro lado, esse método requer alto investimento em equipamentos e custos
relacionados ao alto consumo de energia, além do inconveniente do uso de peças de
grandes dimensões devido às limitações de tamanho dos fornos disponíveis e as
distorções que podem ocorrer nas estruturas e componentes tratados. O seu uso
também é restrito a estruturas homogêneas.
Por fim, um segundo tratamento que vem se destacando é o de alívio de tensões
por vibração mecânica, caracterizado por ser um método com custo inferior em
relação aos tratamentos térmicos e também por ser aplicável em materiais com
estruturas heterogêneas.
O alívio de tensões por vibração mecânica é um método baseado na
ressonância vibratória, em que as peças são submetidas a vibrações de baixa
frequência por um período de tempo. Essa energia aplicada é capaz de gera um
estado de deformação plástica em determinadas partes da estrutura, que realinha a
estrutura cristalina para que as tensões residuais sejam reduzidas a um nível mais
baixo, ou seja, aliviando-as. Este método é bastante flexível, pois em alguns casos sua
aplicação não depende da paralisação do equipamento que contém a parte a ser
tratada, o que representa uma das suas principais vantagens, senão a principal.
Este novo método possui algumas outras relevantes vantagens quando
comparado com os tratamentos térmicos, pois além de não alterar as propriedades
mecânicas, as tensões não reaparecem. Os tratamentos por vibração mecânica
apresentam custos até 90% inferiores, com utilização de apenas 1% da energia
empregada nos tratamentos térmicos convencionais e duração aproximada de 30
minutos.
25
No entanto, a falta de compreensão completa do fenômeno é a principal
limitação para a aplicação deste tratamento em larga escala, estando ainda em
pesquisa a influência dos parâmetros de vibração nos resultados, tais como o tipo e a
frequência de excitação.
3.4. Tensões Residuais Pré-Existentes
Na maioria dos trabalhos experimentais dedicados ao estudo dos efeitos de shot
peening os autores não apresentavam nenhuma informação sobre estado inicial das
tensões residuais. Porém, o conhecimento deste estado inicial proporciona um quadro
mais completo do processo de distribuição das tensões de shot peening,
especialmente quanto se trata de comparação dos resultados do mesmo procedimento
para peças diferentes.
Em estudo prévio realizado buscou-se estudar as tensões residuais induzidas
por shot peening em peças com tensões residuais pré-existentes de compressão,
especificamente, as tensões pré-existente de origem térmica.
Para tal, foram utilizados corpos de prova de tamanho 300 x 35 x 6 milímetros
confeccionados de aço carbono SAE 1020. Primeiro os corpos de prova foram
submetidos ao tratamento térmico de alívio das tensões, que resultou numa
redistribuição uniforme das tensões residuais na faixa de 40 Mpa, observada na
superfície dos corpos de prova e numa camada sub-superficial com profundidade de
até 0.20 milímetros.
Após o alívio das tensões, um dos corpos de prova foi submetido ao processo de
cementação. Observou-se que os valores das tensões residuais e sua distribuição
com profundidade são diferentes na direção longitudinal e transversal para material
com mesma dureza. Podemos atribuir este resultado ao fato que os processos
térmicos durante cementação ocorreram de maneira diferente nestas direções por
causa da geométrica alongada do corpo de prova. Observou-se também que este
processo modificou as características do material aumentando o seu limite de
escoamento e as tensões resíduas de compressão atingiram o valor de -350MPa.
Os dois corpos de prova, com e sem cementação, foram submetidos ao mesmo
tratamento por shot peening utilizando equipamento GP-9075 em regime manual, com
granalha de aço esférica S-110, intensidade Almen 0.003”C, cobertura de 100%,
pressão do ar 100 PSIG e ângulo de jato 90 graus. As tensões residuais de
26
compressão induzidas por shot peening na superfície da amostra cementada ficaram
iguais em ambas às direções, longitudinal e transversal, com valor de -380MPa,
embora existisse uma diferença significativa na sua distribuição antes do shot peening.
As tensões residuais de compressão de shot peening atingiram o valor maior de -
770MPa, na direção transversal, e o valor de -680MPa na direção longitudinal. O fato
que as tensões resíduas chegaram a estes valores de compressão bem elevados está
atribuído, além de endurecimento pela cementação, ao efeito de endurecimento da
camada superficial por deformação mecânica, que pode ser observado também na
amostra sem cementação, aonde a tensões máximas de compressão chegam até -
330MPa, valor acima do limite de escoamento do material do corpo de prova no seu
estado original.
A comparação das tensões de shot peening nos corpos de prova com e sem
cementação mostra o efeito esperado da dureza do material na distribuição das
tensões residuais. A localização do ponto de tensão máxima compressiva para corpo
de prova cementado encontra-se mais próximo da superfície do que no caso do corpo
de prova sem cementação. Observou-se que na profundidade 0.16 - 0.20 mm os
valores das tensões residuais do corpo de prova cementado chegam aos mesmos
níveis das tensões do corpo de prova sem cementação. Estes resultados podem ser
vistos no gráfico 3.
27
Gráfico 3 - Distribuição das tensões residuais numa camada sub-superficial dos corpos de prova em relação à profundidade. (1) corpo de prova sem cementação; (2) e (3) corpo de prova após a
cementação, tensões na direção longitudinal e transversal, respectivamente.
Portanto, efeito da presença das tensões de compressão pré-existentes deve ser
considerado com um dos fatores que influenciam na distribuição final das tensões
residuais de shot peening de mesma maneira como contribuem nesta distribuição as
características do material e parâmetros do próprio processo de shot peening aplicado,
e por isso foi levado em consideração no tema principal do trabalho a ser apresentado
neste relatório. Considerando a aplicação do shot peening em peças que possuem
tensões residuais de soldagem, como tensões pré-existentes, neste trabalho
estudamos o efeito do shot peening, levando em consideração o fato que o próprio
campo das tensões pré-existentes de soldagem varia com tempo.
28
3.5. Métodos e Equipamentos de Medição
3.5.1. Raystress
Os valores absolutos das tensões residuais foram medidos com o equipamento
portátil de raios-X, chamado Raystress. Este é um equipamento de tecnologia não
destrutiva caracterizado pelo seu tamanho portátil e peso reduzido, que lhe
proporciona a vantagem de realizar medições em praticamente qualquer condição de
campo, superfície de peças de geometria complexa e em locais de difícil acesso.
O método utilizado por este equipamento consiste em uma dupla exposição e
radiação K do Cr, técnica esta amplamente testada e utilizada com sucesso durante
vários anos em diferentes aplicações industriais.
O equipamento Raystress, figura21, apresenta as seguintes partes incluídas
como componentes deste equipamento:
Unidade de controle com fonte de alta tensão, que permite
monitoramento e o ajuste do nível de potência de alimentação do tubo de raios-X;
Fonte de alta tensão e tubo de raios-X. Uma das qualidades do
equipamento é que o tubo de raios-X é acoplado à fonte de alta tensão. A tensão e a
corrente de trabalho da fonte de raios-X são de 25 kV e 1,5 mA, respectivamente. O
tubo de raios-X possui dois anodos de cromo com resfriamento ao ar, e produz dois
feixes convergentes de raios-X para realizar a técnica de duas exposições de
medição de tensões por raios-X. O ângulo de convergência dos feixes de raios-X é
de 50 graus;
O suporte magnético permite instalar o equipamento diretamente na
peça analisada e ajustar o equipamento na posição de exposição;
O colimador com cassete para filme de raios-X. Duas janelas no
cassete permitem captar partes das linhas difratadas no intervalo angular de 2𝜃 de
148 a 164 graus.
29
Figura 21 – Equipamento Raystress
Os princípios da tensometria por raios-X se baseiam, por um lado, na teoria de
difração de raios-X para materiais cristalinos, e por outro – em mecânica dos materiais
e, em particular, na teoria da elasticidade do corpo sólido. Os valores das tensões são
definidos a partir da deformação da estrutura cristalina causada pela ação destas
tensões. As deformações são medidas por sua vez, conforme lei de Bragg: 2 𝑑 sin 𝜃 =
𝜆, através do deslocamento da linha de difração.
Os princípios de técnica de dupla exposição, usada para medição de tensões
utilizando o equipamento portátil descrito acima, baseiam-se na determinação de duas
componentes de deformação:ℰ𝜑, 𝜓1 e ℰ𝜑, 𝜓2. Sendo a deformação é determinada por
meio da fórmula:
ℰφ,ψ =1 + υ
Eσφ. seno2ψ −
ν
E(σ1 + σ2) (1)
Logo a diferença entre duas componentes da deformação fica:
ℰφ, ψ2 − ℰφ, ψ1 =1 + υ
Eσφ. (seno2ψ2 − seno2ψ1) (2)
Onde:
30
E = constantes elásticas do material;
ψ e φ = ângulos polar e azimutal respectivamente;
σφ = Componente medida de tensão;
σ1 e σ2 = São as tensões principais;
Da equação (2) a componente medida de tensão (σφ), se torna:
σφ =E
1 + ν .
ℰφ,ψ2− ℰφ,ψ1
seno2ψ2 − seno2ψ1 (3)
Derivando a lei de Bragg, tem-se:
ℰφ,ψ =dφ,ψ − d0
d0= ctg θ0(θφ,ψ − θ0) (4)
Onde:
dφ,ψ , d0 = distancias entre planos para materiais com e sem tensão
respectivamente;
θφ,ψ , θ0 = ângulos de difração para materiais com e sem tensão
respectivamente;
Usando as fórmulas (3) e (4), tem-se:
σφ =E
1 + ν .
ctg θ0(θφ,ψ2− θφ,ψ1
)
seno2ψ2 − seno2ψ1 (5)
Desta maneira, para determinar qualquer componente da tensão é necessário
medir os ângulos de difração correspondentes às reflexões dos planos cristalinos com
normais caracterizadas por ângulos 𝜓1 e 𝜓2.
31
Figura 22 - Esquema de medição de tensões com o equipamento portátil
Os ângulos usados no equipamento são ψ1 = 0 graus e ψ2 = 50 graus e para se
medir as tensões é usada geometria de “ψ - goniômetro”, figura 22. A precisão da
medição do valor absoluto da tensão por equipamento utilizado neste trabalho é de
±10MPa.
3.5.2. Stressvision
Para o mapeamento do estado das tensões foi utilizado um equipamento
magnético portátil, que emprega o efeito inverso de magnetostrição, com sensor do
tipo MAS (sensor magneto-anisotrópico). O efeito inverso de magnetostrição consiste
na variação de magnetização do material ferromagnético sujeito às tensões
mecânicas, devido às mudanças na estrutura dos domínios magnéticos.
O equipamento utilizado, figura 23, é composto por:
Sensor de tipo MAS (diâmetro 20 mm);
Unidade de controle;
Computador portátil para visualização dos resultados em tempo real.
32
Figura 23 – Equipamento Stressvision
O sensor MAS utilizado tem duas bobinas na forma de U, posicionadas entre si
nas posições ortogonais. Uma delas é a da indução (magnetização), a outra é a da
detecção. A bobina de indução produz uma onda eletromagnética que, passando pelo
material, gera uma onda refletida, captada pela bobina de detecção. Seja uma onda
senoidal com intensidade do campo magnético H0 e frequência ω transmitida na
diração do eixo z ortogonal à superfície do metal. Para semi-espaço ferromagnético
com permeabilidade magnética μ temos a intensidade do campo magnético Η na
profundidade z.
Η = Η0 . exp(𝑖𝑘𝑧)
Onde:
𝑘 = 𝑖 + 1
𝛿
𝛿 = 𝐶√2𝜋𝜇𝜔
Consideramos que o ângulo 𝛼 entre a direção do Η e uma das direções de
tensão mecânica principal é de 45 graus.
33
Figura 24 – Esquema do funcionamento do sensor magneto-anisotrópico.
O fluxo magnético registrado pela bobina de detecção é proporcional à projeção
do vetor da indução magnética Β na direção entre os polos da bobina. A força
eletromotriz induzida na bobina de detecção fica:
dU = Μ (Βx − Βy). exp(ikz) dz
Onde:
Μ = Coeficiente que caracteriza as propriedades do metal analisado;
Integrando com relação à espessurahda camada, encontramos o sinal captado
pela bobina de detecção:
U = ΜΗ
2∫ (μx
h
0
(z) − μy(z)). exp (2ikz) dz
Com a variação da tensão mecânica σ variam também as permeabilidades
magnéticas na direção longitudinal μx e transversal μy. Esta variação é proporcional a
σ, ou seja:
μx − μy = β. σ
Onde:
β = Constante do material;
34
Assim, para voltagem captada pelo sensor temos:
U = A ∫ σ(z)h
0
. exp (2ikz) dz
Onde:
A = Constante específica do sensor;
Desta maneira, o sensor registra o valor σreg da desmodulação em amplitude da
onda com frequência ω utilizada posteriormente para encontrar a diferença entre os
valores das tensões principais, cujo módulo é igual ao valor dobro da tensão
cisalhante máxima, utilizada diretamente no critério do escoamento de Tresca-Guest.
σreg = ∫ σ(z)
h
0. exp (2ikz) dz
∫ exp (2ikz) dzh
0
4. Procedimento Experimental
Para o procedimento experimental foi realizado uma parceria com o estaleiro
EISA, na Ilha do Governador/RJ. A primeira etapa, que antecedeu os testes, foi a
preparação de dois corpos de prova a serem utilizados. Para tal foi utilizado chapas de
aço AWS A5.20 com 10 milímetros de espessura utilizadas na construção naval,
cortadas no formato quadrado e com dimensões 400 x 400 milímetros. Em seguida
em cada uma das chapas foi realizado o corte de um furo vazado localizado em seu
centro e de formato retangular no tamanho 190 x 20 milímetros, de acordo com as
figuras 25 e 26.
35
Figura 25 - Preparação do corpo de prova no EISA
Figura 26 - Corpo de prova com solda de reparo
36
A segunda etapa consistiu na aplicação da solda de reparo fechando o furo
central da chapa, realizada por profissionais da soldagem do estaleiro. A solda de
reparo foi executada utilizando processo de soldagem a arco com arame tubular
(FCAW – Flux Cored Arc Welding), conforme processo descrito no item 3.1.1, com a
máquina MIG 408-T da marca ESAB, arame de solda E71T-1C de diâmetro 1.2 mm e
gás ativo de proteção CO2, figura 27.
Figura 27 - Equipamento de soldagem
A soldagem foi realizada com backing cerâmico, tendo um passe de raiz e dois
passes de face seguidos de passe de acabamento. Para os três primeiros passes a
voltagem e a velocidade de arame eram de 25,5V e 176 m/min, respectivamente, e
para o passe de acabamento a voltagem era de 25,5V e a velocidade 168 m/min.
Logo após o término da operação de soldagem apenas um dos corpos de prova
foi encaminhado para a aplicação do tratamento de shot peening. Os parâmetros do
shot peening aplicados no corpo de prova correspondem aos normalmente utilizados
nos estaleiros para trabalhos de acabamento superficial das chapas e sua preparação
para pintura, que são:
Grau de jateamento SA2 ½;
Grão angular;
Granometria G40 angular;
Ângulo de jateamento de 90 graus.
37
Com esta aplicação deu-se fim ao procedimento experimental que havia sido
proposto para este trabalho. As medições em ambos os corpos de prova foram
realizadas no mesmo dia da soldagem e da aplicação do shot peening para a
obtenção do resultado inicial, e novamente duas semanas depois para obtenção do
resultado final.
5. Resultados Experimentais das Medições
As medições das tensões residuais nos dois corpos de prova foram realizadas
segundo o método de raios-X descrito no item 3.5. Estas foram feitas na superfície
frontal em pontos localizados no meio do corpo de prova, numa linha perpendicular ao
cordão de solda na superfície frontal (direção A), e numa linha de continuação do
cordão de solda para lado externo do corpo de prova (direção B), conforme mostrado
na figura 28.
Figura 28 - Localização dos pontos de medição das tensões resíduas de soldagem com relação à solda de reparo
38
Para cada uma das direções, A e B, as medições foram realizadas em três
pontos do metal de base (pontos 1, 2 e 3) localizados conforme a figura 28 e também
no metal depositado (ponto MD), na zona termicamente afetada (ponto ZTA), e metal
base próximo ao cordão de solda (ponto MB), totalizando seis pontos de medição em
cada direção. Em cada um desses pontos as tensões foram medidas na direção
paralela ao cordão de solda (tensão longitudinal σL), na direção perpendicular ao
cordão de solda (tensão transversal σT) e na direção diagonal entre estas duas (σ45).
O processo de polimento eletrolítico foi aplicado em cada um dos pontos para
uma remoção controlável das camadas superficiais e realização das medições de
tensões residuais com profundidade. Com este polimento busca-se garantir a ausência
das tensões mecânicas induzidas na superfície da chapa durante o processo de
fabricação. A espessura da comada removida foi controlada com relógio comparador
eletrônico.
Figura 29 - Polimento eletrolítico sendo aplicado no primeiro dia
39
O mapeamento das tensões foi realizado através do método magnético, também
descrito no item 3.5., em uma área de 360 x 360 milímetros, em 361 pontos da malha
retangular com passo uniforme de 20 milímetros, conforme na figura 30. As medições
foram feitas sobre área composta dos materiais com diferentes propriedades
mecânicas e magnéticas (especificamente metal base, metal depositado e ZTA). Por
esta razão, os resultados deste mapeamento têm caráter relativo para cada uma das
partes da área mapeada. Além disso, mapeamento magnético envolve mais pontos de
análise do que as medições feitas por raios-X. E, finalmente, o método magnético
representa um valor médio na profundidade de até três milímetros sob a superfície,
enquanto os resultados das medições pelo método de raios-X representam os valores
superficiais absolutos das tensões. Por estas razões, os resultados do mapeamento
foram utilizados neste trabalho somente para comparar entre si a evolução com o
tempo das tensões residuais.
Figura 30 – Corpo de prova com a malha de pontos desenhada
40
Quando se trata de análise das tensões residuais induzidas pelo tratamento de
shot peening as seguintes condições devem ser avaliadas, de preferência, na
sequência apresentada:
Uniformidade dos valores das tensões no ponto (uniformidade local). Na
situação ideal, os valores das tensões em qualquer direção devem ser iguais;
Uniformidade dos valores das tensões em toda superfície tratada
(uniformidade global). Na situação ideal, os valores das tensões não devem variar de
um ponto para outro;
Os valores das tensões na superfície devem ser de compressão;
Perfil da distribuição das tensões com profundidade deve atingir a curva
desejada, com valor máximo de compressão numa camada sub-superficial;
O primeiro critério pode ser avaliado em termos da tensão cisalhante máxima,
uma vez que, menores valores da tensão cisalhante máxima correspondem a uma
maior uniformidade do campo das tensões no ponto. Por esta razão, os nossos
resultados de medição dos valores absolutos das tensões são apresentados na forma
de valores das tensões cisalhantes máximas.
Medições pelo método de raios-X e mapeamento magnético foram realizadas no
mesmo dia da soldagem e shot peening (resultados inicial), e duas semanas depois
(resultado final).
Figura 31 - Medição realizada após duas semanas
41
O mapeamento através do método magnético representa uma distribuição do
fator de concentração da tensão cisalhante máxima. Observou-se nos resultados
iniciais uma forma simétrica na distribuição das tensões residuais no corpo de prova e
a localização dos pontos críticos das tensões no metal base ao longo das duas linhas,
uma perpendicular ao cordão de solda e outra direcionada na sua continuação para o
lado externo ao corpo de prova. Observou-se também a variação na posição das
linhas de nível apresentadas no mapeamento, quando comparado o resultado inicial
com final, figuras 32 e 33.
Figura 32 - Solda de reparo com shot peening. Mapa de distribuição do fator de concentração da tensão cisalhante máxima. Resultado inicial.
42
Figura 33 - Solda de reparo com shot peening. Mapa de distribuição do fator de concentração da tensão cisalhante máxima. Resultado final.
A distribuição inicial e final dos valores da tensão cisalhante máxima, nas posições A e
B, para o corpo de prova submetido ao tratamento de shot peening está apresentada
nos gráficos 4. Tanto na posição de medição A como na posição B, existe uma
variação entre os valores iniciais e finais das tensões cisalhante máxima, sendo esta
mais explicita no caso das tensões medidas na posição B. Na posição A, a diferença
entre os valores inicias e finais é mínima, ou seja, o shot peening aplicado foi
suficiente para uniformizar as tensões residuais superficiais de soldagem nos pontos
localizados do lado esquerdo e direto do cordão de solda. Os resultados iniciais de
medição das tensões apontam numa variação bem significativa dos valores da tensão
cisalhante máxima na posição de medição B, porém os resultados finais mostram que
43
aconteceu uma redistribuição bastante visível destes valores e a variação deles ficou
numa faixa de até 40MPa, bem próxima da faixa de variação para resultados de
medição na posição A.
Gráfico 4 - Distribuição inicial e final dos valores da tensão cisalhante máxima na posição A (acima) e B (abaixo) para corpo de prova submetido ao tratamento por shot peening
44
Os gráficos 5 e 6 mostram a distribuição inicial e final da tensão cisalhante
máxima na posição A e B, para solda de reparo sem e com shot peening. O corpo de
prova submetido ao shot peening apresenta tanto valores iniciais como valores finais
das tensões cisalhantes máximas menores em comparação com corpo de prova sem
shot peening. Comparando somente os resultados finais, podemos concluir que o
corpo de prova com tratamento de shot peening apresenta distribuição mais uniforme
das tensões cisalhante máximas, especificamente no caso dos pontos de medição
localizados na posição B.
Gráfico 5 - Distribuição da tensão cisalhante máxima na posição A, inicial (acima) e final (abaixo), para solda de reparo sem e com shot peening.
45
Gráfico 6 - Distribuição da tensão cisalhante máxima na posição B, inicial (acima) e final (abaixo), para solda de reparo sem e com shot peening.
46
As medições das tensões residuais com profundidade foram realizadas no ponto
localizado na posição A-2, no mesmo dia da soldagem e shot peening (resultados
inicias) e duas semanas depois (resultados finais), gráfico 7. Observa-se que o efeito
de shot peening está presente e o valor máximo de compressão, encontra-se na
profundidade entre 0.06 e 0.08mm. Para os resultados iniciais existe uma diferença de
30 até 40MPa nos valores da tensão nas direções longitudinal e transversal. Esta
diferença diminui nos resultados finais numa camada de 0.06mm de profundidade e os
valores na superfície ficam iguais, porém menores do que nos resultados iniciais.
Desta maneira podemos concluir que a migração das tensões de soldagem observada
para solda de reparo no trabalho influi também na distribuição com profundidade das
tensões residuais induzidas por shot peening.
Gráfico 7 - Valores iniciais e finais das tensões com profundidade nas direções longitudinal e transversal com relação ao cordão de solda no ponto de medição A-2 para corpo de prova com
solda de reparo submetido ao shot peening
47
6. Conclusões
Após a análise dos resultados obtidos, pode-se concluir com este trabalho que:
O tratamento por shot peening do corpo de prova com solda de reparo
contribui na uniformização dos valores das tensões cisalhantes máximas na
superfície e introduz tensões de compressão na superfície e numa camada sub-
superficial;
O tratamento por shot peening não impede o efeito de redistribuição das
tensões de soldagem com tempo;
A redistribuição com o tempo dos valores das tensões no corpo de
prova com solda de reparo submetido ao tratamento por shot peening consiste na
diminuição dos valores da tensão cisalhante máxima, ou seja, na uniformização dos
valores das tensões principais. Desta maneira, o estado das tensões num corpo de
prova com solda de reparo submetido ao tratamento por shot peening “melhora com
tempo”;
A redistribuição com o tempo das tensões afeta os valores não somente
na superfície, mais também nas camadas sub-superficiais;
A variação das tensões observadas após o término do processo de
soldagem indica a necessidade de especificar nos resultados experimentais de
análise das tensões de soldagem, o período de tempo entre a execução da operação
de soldagem, shot peening e a realização das medições;
Para efeito de comparação dos resultados de simulação computacional
tanto do processo de soldagem como do processo de shot peening, com resultados
experimentais, o fenômeno de migração das tensões após execução do processo de
soldagem deve ser incluído nos modelos numéricos;
A observação do efeito de redistribuição das tensões de soldagem após
término do processo de soldagem pode contribuir significativamente para o
entendimento dos processos relacionados às tensões residuais de soldagem; ajudar
no ajuste dos modelos computacionais e na interpretação dos dados de simulação
numérica das tensões de soldagem;
Provavelmente, o período de estabilização do estado das tensões de
soldagem e sua distribuição final dependem do tipo de processo de soldagem e das
condições de soldagem, assim como da geometria, material, tamanho das peças e
48
locais a serem reparados. Estudos sobre a relação entre estes parâmetros e o tempo
mínimo necessário para a estabilização do estado das tensões, para cada técnica de
soldagem, constituem assuntos de grande interesse para serem abordados em
pesquisas futuras;
7. Bibliografia
"Fórmula 62" - Equipamento Vibratório para Alívio de Tensão. (s.d.). Acesso em Maio
de 2015, disponível em Dreyfus Global :
http://www.dreyfusglobal.com/downloads/sre/SRE-Tech-Guide-Portuguese.pdf
Caso 050: Fratura Frágil dos Navios Classe LIBERTY (1941/1945). (2013). Acesso em
Junho de 2015, disponível em Inspeção de Equipamentos: Estudo de Casos:
http://inspecaoequipto.blogspot.com.br/2013/11/caso-050-fratura-fragil-dos-
navios.html
Chuvas, T. d. (2012). Estudo da Influência dos Parâmetros de Tratamento de Alívio
das Tensões Residuais por Vibração Mecânica em Juntas Soldadas a Plasma.
Niterói - RJ.
Estefen, S. F., Gurova, T., & Esteves, M. C. (15 a 19 de outubro de 2012). Efeito de
Shot Peening em Juntas Soldadas. 24° Congresso Nacional de Transporte
Aquaviário, Construção Naval e Offshore - SOBENA. Rio de Janeiro - RJ:
SOBENA, 2012.
Estefen, S. F., Gurova, T., & Leontiev, A. (2013). Solda de Reparo na Construção
Naval: Avaliação do Estado das Tensões Residuais. 12° Conferência sobre
Tecnologias de Equipamentos - COTEQ. Porto de Galinhas - Ipojuca - PE:
ABENDI, 2013.
Estefen, S. F., Gurova, T., Barbosa, P. T., & Esteves, M. C. (21 de Junho de 2013).
Alívio das Tensões Residuais de Soldagem por Shot Peening. 12° Conferência
sobre Tecnologia de Equipamentos - COTEQ. Porto de Galinhas - Ipojuca - PE:
ABENDI, 2013.
Estefen, S. F., Gurova, T., Werneck, D. S., & Leontiev, A. (2011). Efeito de
Redistribuição das Tensões Residuais de Soldagem. Conferência sobre
Tecnologia de Equipamentos - COTEQ. Porto de Galinhas - Ipojuca - PE:
ABENDI, 2011.
Felizardo, I., & Bracarense, A. Q. (s.d.). SOLDAGEM MIG/MAG E COM ARAME
TUBULAR.
Gonzales, M. A. (2009). Análise Numérico-Experimental das Tensões Residuais
Induzidas por Jateamento com Granalha em molas Automotivas. São Paulo -
SP.
49
Gurova, T., Estefen, S. F., & Leontiev, A. (2012). Controle Dimensional e
Monitoramento das Tensões Residuais na Fase de Sub-Montagem Durante a
Fabricação de Navios. Congresso Nacional de Ensaios Não Destrutivos e
Inspeção - CONAEND. São Paulo - SP: ABENDI, 2012.
Gurova, T., Estefen, S. F., & Leontiev, A. (2012). Efeito de Shot Peening em Peças
com Tensões Pré-Existentes de Compressão. Congresso Nacional de Ensaios
Não Destrutivos de Inspeção - CONAEND. São Paulo - SP: ABENDI, 2012.
Gurova, T., Estefen, S. F., & Leontiev, A. (2012). Redistribuição da Tensões Residuais
de Soldagem. Conferência Internacional em Tecnologias Naval e Offshore -
NAVTEC . Rio Grande - RS.
Gurova, T., Quaranta, F., & Estefen, S. (2006). Monitoramento do Estado das Tensões
Residuais Durante a Fabricação de Navios. 21º Congresso Nacional de
Transporte Aquaviário, Construção Naval e Offshore - SOBENA. SOBENA,
2006.
Oliveira, F. A. (Março de 2014). Análise das Tensões Residuais Induzidas pelos
Tratamentos Mecânicos Superficiais na Construção de Navios. Rio de Janeiro -
RJ.
Processo com Arame Tubular - Características . (s.d.). Acesso em Junho de 2015,
disponível em Infosolda: http://www.infosolda.com.br/artigos/processos-de-
soldagem/29-biblioteca-digital/livros-senai/processos/159-processo-com-
arame-tubular-caracteristicas.html
Processo com Arame Tubular - Consumíveis . (s.d.). Acesso em Junho de 2015,
disponível em Infosolda: http://www.infosolda.com.br/artigos/processos-de-
soldagem/29-biblioteca-digital/livros-senai/processos/161-processo-com-
arame-tubular-consumiveis.html
Processos de Soldagem: Arames Tubulares. (2014). Acesso em Junho de 2015,
disponível em ESAB:
http://www.esab.com.br/br/pt/education/blog/processo_soldagem_arames_tubul
ares.cfm
Riva, I. d. (2004). Análise de Fadigas de Estruturas Metálicas com Ênfase em
Offshore. Rio de Janeiro - RJ.
Scuracchio, B. G. (2012). Tensões Residuais Induzidas por Shot-Peening e
Durabilidade de Molas em Lâmina. São Paulo - SP.
Serizawa, G. H., & Gallego, J. (2005). Análise Estrutural da Aplicação do Processo de
Jateamento com Granalhas de Aço (Shot Peening) em Rotores Hidrelétricos.
XII Congresso Nacional de Estudantes de Engenharia Mecânica. Ilha Solteira -
SP.
Souza, E. C., Garuzzi, J. M., & Durão, B. R. (2013). Influência da Soldagem na
Geração de Tensões Residuais e Distorções em Painéis Soldados na Indústria
Naval. Aracruz - ES.
50
Tratamento Térmico de Alívio de Tensões na soldagem. (02 de Junho de 2014).
Acesso em Maio de 2015, disponível em ESAB:
http://www.esab.com.br/br/pt/education/blog/tratamento_termico_alivio_tensoes
_soldagem.cfm
Vieira, D. L., Silva, B. M., Monin, V., Gurova, T., & Leontiev, A. (2008). Nova Técnica
de Avaliação do Estado das Tensões de Soldagem. Congresso Nacional de
Ensaios Não Destrutivos e Inspeção & Conferência Internacional sobre
Evaluación de Integridad y Extensión de Vida de Equipos Industriales -
CONAEND&IEV . São Paulo - SP.
Zeemann, A. (2003). Tensões Residuais de Soldagem. Acesso em Maio de 2015,
disponível em Infosolda: http://www.infosolda.com.br/artigos/metalurgia/394-
tensoes-residuais-de-soldagem.html