(a) corrente diadinamica e iontoforese

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11 Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.18, n.4, p. 11-19, out./dez., 2005 Correntes Diadinâmicas de Bernard e Iontoforese no tratamento da dor lombar CORRENTES DIADINÂMICAS DE BERNARD E IONTOFORESE NO TRATAMENTO DA DOR LOMBAR Bernard’s Diadynamic Currents and Iontophoresis in Low Back Pain Treatment Alberito Rodrigo de Carvalho 1 Elisiane Marise Fungueto 2 Iole Marciele Canzi 2 Cladson Barbieiro 2 Vanessa de Moraes 2 Gladson Ricardo Flor Bertolini 3 Fernando Amâncio Aragão 4 Resumo A dor lombar baixa tem alta prevalência. Apesar de multifatorial, as lombalgias estruturais mecânico- degenerativas constituem o grupo etiológico mais comum. Tanto as Correntes Diadinâmicas de Bernard (CDB) quanto à iontoforese têm sido apontadas como recursos terapêuticos apropriados para tratar a dor lombar, apesar da carência de estudos que as sustentem com tal. Este trabalho teve como objetivo principal verificar se a aplicação de CDB + iontoforese apresentam melhores resultados na promoção de analgesia na dor lombar em relação à aplicação isolada das CDB. Foram selecionados 18 pacientes com queixa e diagnóstico clínico de lombalgia crônica e divididos aleatoriamente em 2 grupos. Um grupo recebeu aplicação de CDB isoladamente e o outro aplicação de CDB + iontoforese com hidrocortisona 1%. As formas de corrente utilizadas para ambas as técnicas foram DF (por 5 minutos) e LP (por 5 minutos). As intensidades foram estabelecidas de acordo com a sensibilidade do paciente. Pelos resultados, pôde-se observar que as técnicas foram eficazes para reduzir a dor, porém, as CDB isoladas se mostraram superiores para este propósito. Concluiu-se que as CDB + iontoforese não apresentam superioridade na promoção de analgesia comparadas às CDB isoladamente. Palavras-chave: Dor Lombar; Correntes Diadinâmicas de Bernard; Iontoforese. 1 Fisioterapeuta, especialista em Fisioterapia Traumato-Ortopédica. Docente dos cursos de Fisioterapia da UNIPAR (Campus Toledo/PR) e UNIOESTE. ([email protected]) 2 Discente do curso de Fisioterapia da UNIPAR, Campus Toledo/PR 3 Fisioterapeuta, Mestre em Engenharia Biomédica. Docente do curso de Fisioterapia da UNIOESTE. 4 Fisioterapeuta, Mestre em Neurociências. Docente do curso de Fisioterapia da UNIOESTE ([email protected])

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11Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.18, n.4, p. 11-19, out./dez., 2005

Correntes Diadinâmicas de Bernard e Iontoforese no tratamento da dor lombar

CORRENTES DIADINÂMICAS DE BERNARD EIONTOFORESE NO TRATAMENTO DA DOR LOMBAR

Bernard’s Diadynamic Currents and Iontophoresis in LowBack Pain Treatment

Alberito Rodrigo de Carvalho1

Elisiane Marise Fungueto2

Iole Marciele Canzi2

Cladson Barbieiro2

Vanessa de Moraes2

Gladson Ricardo Flor Bertolini3

Fernando Amâncio Aragão4

ResumoA dor lombar baixa tem alta prevalência. Apesar de multifatorial, as lombalgias estruturais mecânico-degenerativas constituem o grupo etiológico mais comum. Tanto as Correntes Diadinâmicas de Bernard(CDB) quanto à iontoforese têm sido apontadas como recursos terapêuticos apropriados para tratar a dorlombar, apesar da carência de estudos que as sustentem com tal. Este trabalho teve como objetivo principalverificar se a aplicação de CDB + iontoforese apresentam melhores resultados na promoção de analgesia nador lombar em relação à aplicação isolada das CDB. Foram selecionados 18 pacientes com queixa ediagnóstico clínico de lombalgia crônica e divididos aleatoriamente em 2 grupos. Um grupo recebeu aplicaçãode CDB isoladamente e o outro aplicação de CDB + iontoforese com hidrocortisona 1%. As formas de correnteutilizadas para ambas as técnicas foram DF (por 5 minutos) e LP (por 5 minutos). As intensidades foramestabelecidas de acordo com a sensibilidade do paciente. Pelos resultados, pôde-se observar que as técnicasforam eficazes para reduzir a dor, porém, as CDB isoladas se mostraram superiores para este propósito.Concluiu-se que as CDB + iontoforese não apresentam superioridade na promoção de analgesia comparadasàs CDB isoladamente.Palavras-chave: Dor Lombar; Correntes Diadinâmicas de Bernard; Iontoforese.

1 Fisioterapeuta, especialista em Fisioterapia Traumato-Ortopédica. Docente dos cursos de Fisioterapia da UNIPAR (CampusToledo/PR) e UNIOESTE. ([email protected])

2 Discente do curso de Fisioterapia da UNIPAR, Campus Toledo/PR3 Fisioterapeuta, Mestre em Engenharia Biomédica. Docente do curso de Fisioterapia da UNIOESTE.4 Fisioterapeuta, Mestre em Neurociências. Docente do curso de Fisioterapia da UNIOESTE ([email protected])

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12 Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.18, n.4, p. 11-19, out./dez., 2005

Alberito Rodrigo de Carvalho et al.

Introdução

Segundo Borenstein, Santos e Silva (1, 2),as disfunções da coluna vertebral têm altaprevalência na população em geral, sendo alombalgia um dos sintomas mais comuns. Boa partedos indivíduos vivenciou ou vivenciará dor lom-bar em algum momento de suas vidas.

As lombalgias estruturais mecânico-dege-nerativas constituem o grupo etiológico mais co-mum, sendo as hérnias discais as principais repre-sentantes deste grupo e que, freqüentemente, res-pondem positivamente aos tratamentos e ao tem-po. A atuação de fatores de risco (traumas mecâ-nicos, obesidade, tipo de ocupação e idade) sobrea unidade anátomo-funcional da região lombarpode levar a múltiplos processos degenerativos,contribuindo, assim, para o aparecimento dos si-nais e sintomas da doença (3, 2).

Há evidências, como sugerem Benoist,Grance et al. (4, 5), que apontam a associação entreo quadro inflamatório e agentes mecânicos comocausadores da degeneração discal. Isso pode levara uma inflamação das raízes nervosas, gerando ossintomas da lombociatalgia.

A reeducação do paciente quanto aos fa-tores de risco das afecções vertebrais, a fisiotera-pia e a terapia medicamentosa são os alicerces parao tratamento da dor na coluna. Nesse contexto,várias modalidades físicas utilizadas pelo fisiotera-peuta podem ser úteis para diminuir asintomatologia desses pacientes e, dentre elas,destaca-se a eletroterapia (1, 3).

Apesar da grande prevalência e dos vári-os recursos disponíveis para o tratamento da dor

lombar, Poiraudeau e Revel (6) relatam que pou-cos estudos avaliando as técnicas atualmente dis-poníveis têm sido realizados.

A iontoforese, uma forma de eletroterapiautilizada para introduzir medicamentos na pele peloefeito de correntes polarizadas, tem sidofreqüentemente mencionada por vários autorescomo um dos métodos disponíveis para o trata-mento da dor lombar (7).

De acordo com Guirro e Guirro (8), asCorrentes Diadinâmicas de Bernard (CDB) foramdesenvolvidas na França no início da década de50 por Pierre Bernard e estão associadas a umacorrente contínua de base. Elas podem até dupli-car o índice de reabsorção tecidual devido a suacapacidade de causar hiperemia.

Apesar das CDB apresentarem efeitosgalvânicos essenciais para a iontoforese, não háestudos demonstrando a eficiência dessas corren-tes para tal finalidade.

Sendo assim, este trabalho teve como ob-jetivo verificar se as Correntes Diadinâmicas deBernard são adequadas para o uso da iontoforese,além disso, buscou-se analisar se a aplicação dasCorrentes Diadinâmicas de Bernard associadas àiontoforese apresentou melhores resultados na pro-moção de analgesia em indivíduos com dor lom-bar em relação à aplicação das CorrentesDiadinâmicas de Bernard isoladamente.

Materiais e métodos

A presente pesquisa iniciou após aprova-ção no Comitê de Ética em Pesquisa em Humanos

AbstractThe lumbar back pain has a high prevalence, and instead of its multifatorial features, the structuralmechanical-degenerative lumbar pain is the most common etiologic group. Both Bernard’s DiadynamicCurrents (BDC) and the Iontophoresis have been declared as suitably therapeutic resources to treat the backpain, even with poor evidences supporting these ideas. The aim of the present study was to verify if thetreatment with BDC + Iontophoresis to provide better results than just the isolated BDC treatment to reducethe lumbar back pain. 18 subjects with clinical diagnosis of chronic lumbar back pain were selected andrandomized in two groups. One group received only the BDC treatment and the other received BDC +Iontophoresis with 1% hydrocortisone. The BDC currents employed in both groups were DF (5 minutes)and LP (5 minutes). The strength of the electrical stimulus was based on subject individual’s sensitivity andthe Visual Analog Scale was used for the assessment of pain. The results showed the effectiveness fromboth techniques to reduce the lumbar pain, however, the isolated BDC group showed better averageresults. In conclusion, the BDC + Iontophoresis did not show to be better than just the BDC isolatedtreatment to reduce the lumbar back pain.Keywords: Low Back Pain; Bernard’s Diadynamic Currents; Iontophoresis.

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da UNIOESTE. Foram selecionados pacientes comqueixa e diagnóstico clínico de lombalgia e/oulombociatalgia, com idade entre 20 e 55 anos, apartir da lista de espera do setor de Ortopedia,Traumatologia e Desportiva da Clínica de Fisiote-rapia da UNIPAR – campus Toledo/PR.

Os pacientes selecionados foram triadospor uma avaliação inicial, durante a qual foramcoletados os dados pessoais dos pacientes e seushistóricos. Também foi realizado um exame físicopara confirmação de que a sintomatologia advinhade causas mecânico-degenerativas. Uma vez elei-tos os pacientes, estes foram divididos de formaaleatória em 2 grupos.

O grupo CDB recebeu um protocolo detratamento que consistiu na aplicação isolada dasCorrentes Diadinâmicas de Bernard (CDB). O gru-po CDB + iontoforese recebeu um protocolo detratamento que consistiu na aplicação de CDB as-sociada à iontoforese. Para a iontoforese, o medi-camento utilizado foi um ungüento dehidrocortisona 1% manipulado nos laboratórios daUnipar - campus Toledo. Uma pequena quantida-de do ungüento foi ainda aplicada por toda áreadas emergências das raízes nervosas de L4, L5 eS1.

Os protocolos foram realizados de 2ª a 6ªfeira por 7 sessões consecutivas, com duração de10 minutos. As formas de corrente utilizadas fo-ram a Difásica Fixa (DF) inicialmente por 5 minu-tos, seguida de Longos Períodos (LP) também por5 minutos.

A técnica de colocação dos eletrodos uti-lizada em ambos os grupos foi a troncular sugeridapor Fuirini e Longo (9), técnica na qual o eletrodopositivo foi colocado sobre a emergência das raízesnervosas e o negativo no trajeto do ciático em queo ramo nervoso se encontra mais próximo da su-perfície da pele. Foram disponibilizados para estetrabalho 2 aparelhos ENDOPHASYS D ELF0204 damarca KLD Biosistemas, verificado quanto às vari-ações de calibração referentes à curva padrão eentre eles por meio de tratamento estatístico. Aintensidade da corrente liberada pelo equipamen-to era dependente da tolerância individual dospacientes, sempre acima do limiar sensitivo, po-rém, nunca chegando ao umbral motor ou de dor.

Em ambos os procedimentos, as áreas quereceberam os eletrodos, antes de qualquer inter-venção, foram higienizadas com lenços umedeci-dos para minimizar os efeitos da oleosidade ou do

ressecamento sobre a impedância da pele. Após ahigienização, foi utilizado, pelo terapeuta, um pa-pel absorvente para secar a área sem que fossemproduzidos movimentos de fricção, evitando as-sim escoriações dérmicas.

Os eletrodos utilizados foram de siliconeimpregnados com carbono que, durante a aplica-ção, foram envolvidos por espumas umedecidascom água, visando não haver contato entre os ele-trodos e a pele do paciente. Os indivíduos foramposicionados em decúbito dorsal, com um rolopara posicionamento sob a região lombar. Todosos pacientes foram questionados com relação àdor antes da terapia e imediatamente após, utili-zando-se, para isso, a escala visual analógica (EVA).A utilização desta escala tem sido recomendadapela literatura para aumentar a consistência dosresultados da avaliação (10).

Paralelamente à avaliação inicial, aplicou-se um questionário de avaliação funcional. O Tes-te de Triagem de 10 Minutos de Hendler para pa-cientes com lombalgia crônica, proposto porHendler et al. (11), trata-se de um questionárioobjetivo com 15 perguntas, sendo que cada umapossui entre 4 a 6 opções de resposta. Cada per-gunta foi feita pelo examinador e o paciente rece-beu pontos de acordo com sua resposta. Ao térmi-no do teste, o examinador calculou o número depontos. Os resultados foram interpretados de acor-do com os escores descritos pelo autor do questio-nário (Anexo I)

Foram adotados os seguintes critérios paraa inclusão ou exclusão dos pacientes:a) Inclusão:Aceitação ao convite em participar da pesquisa e adisponibilidade para tal; ter diagnóstico clínico delombalgia ou lombociatalgia decorrente de dege-neração mecânica; relato de lombalgia oulombociatalgia por mais de 3 semanas; sintomasnervosos, quando presentes, respeitando osdermátomos e miótomos das raízes nervosas deL4, L5 e/ou S1 ou distribuição cutânea do nervociático referente à sensibilidade e os músculosinervados pelo ciático referente à motricidade; sin-tomas de dor e/ou parestesia que pioravam aomovimento e eram aliviados com o repouso; b)Exclusão: Respeito à liberdade de recusa; realiza-ção de outro tipo de tratamento fisioterapêuticoconjuntamente ao proposto neste trabalho; pre-sença de déficits de sensibilidade detectados naavaliação; relato de lombocruralgia; presença deúlceras estomacais ativas ou gastrites; alterações

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dérmicas nos locais de aplicação dos eletrodos ouno trajeto da corrente; pacientes que, pela avalia-ção, apresentaram sinais e sintomas sugestivos deetiologia não mecânica para a dor lombar; falta a 2sessões consecutivas ou 3 alternadas; pacientes comqualquer disfunção cognitiva ou neurológica deorigem central.

Para a análise matemática dos dados,foram realizadas análises estatísticas inferencial edescritiva com auxílio do software “GraphPadPrism” v. 3.0, 1999. Para as análises das variáveisdor e intensidade de corrente, foi utilizado o testenão paramétrico “U” de Mann Whitney, adotan-do-se (a=0,05) e o tratamento estatístico para osescores foi o descritivo

Resultados

Compuseram a amostra final 18 pacien-tes, sendo que 9 pertenciam ao grupo CDB e 9 aogrupo CDB + iontoforese. O grupo CDB foi com-posto por 5 pacientes do sexo masculino e 4 dosexo feminino com média de idade de 42,11 anos.O grupo CDB + iontoforese compôs-se de 2 paci-entes do sexo masculino e 7 do sexo femininocom média de idade de 45,00 anos.

Nos gráficos 1, 2, e 3 são mostrados osresultados descritivos e inferenciais conflitados. Nográfico 4, observa-se a representação gráfica dadistribuição por escores.

Gráfico 1 – Gráfico comparativo da dor intragrupos no momento da coleta. As barrasrepresentam as médias encontradas em cada grupo. Os asteriscos representam as diferen-ças estatisticamente significantes encontradas (***p<0,001, Teste U de Mann Whitney).

GRÁFICO 1 - MÉDIAS DE DOR, NO MOMENTO DA COLETA(COMPARAÇÃO INTRAGRUPOS)

3,365

4,333

1,302

2,349

0

1,5

3

4,5

6

CDB CDB + ionto

GRUPOS

DIA

S

Dor inicial

Dor final

*** ***

Gráfico 2 - Gráfico comparativo da dor intergrupos no momento da coleta. As barrasrepresentam as médias encontradas em cada grupo. Os asteriscos representam asdiferenças estatisticamente significantes encontradas (*p<0,05; **p<0,01, Teste U deMann Whitney).

GRÁFICO 2 - MÉDIAS DE DOR, CONSIDERANDO-SE O MOMENTO DA COLETA(COMPARAÇÃO INTER GRUPOS)

3,365

4,333

1,302

2,349

0

1,3

2,6

3,9

5,2

CDB CDB + ionto

GRUPOS

DIA

S

inicial

final

***

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Alberito Rodrigo de Carvalho et al.

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Gráfico 3 – Gráfico comparativo das intensidades suportadas pelos pacientes nasformas de corrente DF e LP. As barras representam as médias encontradas em cadagrupo. Os asteriscos representam as diferenças estatisticamente significantes encontra-das (*p<0,05; **p<0,01, teste U de Mann Whitney).

GRÁFICO 3 - MÉDIAS DAS INTENSIDADES SUPORTADAS PELOSPACIENTES NAS FORMAS DE CORRENTE DF E LP

7,603

10,81

7,508

5,571

0

3

6

9

12

CDB CDB + ionto

GRUPOS

DIA

S DF

LP

***

GRÁFICO 4 - DISTRIBUIÇÃO DOS PACIENTES NOS ESCORES DEACORDO COM TESTE DE TRIAGEM DE 10 MINUTOS DE HENDLER

PARA PACIENTES COM LOMBALGIA CRÔNICA

6

0

3

0

2

5

2

0

0

2

4

6

8

escore 1 escore 1A escore 2 escore 3

ESCORES

PA

CIE

NT

ES

CDB

CDB + ionto

Discussão

Os resultados mostraram que ambas astécnicas foram eficazes para o tratamento da dorlombar (Gráfico 1).

Os efeitos analgésicos das CDB, apesarda escassa literatura sobre esta modalidadeeletroterapêutica, não foram divergentes na litera-tura pesquisada. Para Machado (17), além do efeitode vasodilatação produzido, ocorre grande

analgesia, o que favorece a rápida recuperação dopaciente; além de ser um tratamento que requerpouco tempo para execução.

Fuirini e Longo (9) e Rodrigues (12) su-gerem que o componente analgésico dessas cor-rentes baseia-se numa excitação infra-umbral per-manente das fibras nervosas sensitivas, induzindoa um bloqueio dos impulsos dolorosos com con-seqüente destonificação e analgesia persistente, pormeio de uma elevação do umbral de dor. Esse fe-

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nômeno é chamado de mascaramento e este im-pede a propagação de impulsos provenientes dereceptores de dor e, em conseqüência, não sãoregistrados ao nível central, eliminando assim asensação de dor.

Já Nelson, Hayes e Currier (13), desta-cam que as CDB causam respostas excitatórias di-retas, mas, devido a sua longa duração de pulso,são muito desconfortáveis, principalmente compa-radas a outras técnicas que também promovemefeitos analgésicos. Portanto, para esses autores, ouso desta técnica pode se tornar obsoleto, a nãoser que sejam apresentados trabalhos comprovan-do sua superioridade em relação às outras técni-cas.

Segundo Cecin (14), Benoist (4) e Grangeet al. (5), há uma estreita relação entre processoinflamatório e o quadro álgico em pacientes por-tadores de dor lombar de origem mecânica.

O processo inflamatório libera uma sériede substâncias que estimulam os nociceptores.Além disso, ele induz, por uma complexa seqüên-cia de eventos, à formação de edema, e este últi-mo pode comprimir os tecidos vizinhos (15). Se-gundo Lundborg et al. (16), a compressão de umnervo resulta em isquemia local, pois há um co-lapso dos vasos capilares da vasa nervorum. En-tão o nervo é privado de oxigenação e sua respos-ta fisiológica é o bloqueio de condução.

Neste trabalho, pode-se sugerir que amelhora nos níveis de dor tenha decorrido da açãodas Correntes Diadinâmicas de Bernard (CDB)sobre a resposta inflamatória. O fluxo unidirecionaldessas correntes, a longa duração de pulso e ointervalo interpulsos relativamente curto causammudanças em níveis celulares ou teciduais simila-res àquelas da corrente contínua, como propostopor Nelson, Hayes e Currier (13), sendo os efeitosdesta última bem conhecidos.

Outra vantagem desse efeito galvânico dasCDB que também pode ter contribuído para amelhora do quadro doloroso foi a redução doedema pelo mecanismo da eletrosmose, que con-siste em um efeito resultante da passagem da cor-rente contínua pelos tecidos, o que provoca a trans-ferência ou fuga de líquido do pólo positivo parao pólo negativo (17).

Reinert (18) demonstrou o efeito daeletrosmose que as CDB apresentam. Foi induzi-do edema traumático decorrente de lesões seria-das em patas de ratas. Essas foram divididas em 3

grupos: um grupo controle; um grupo que rece-beu terapia com CDB com o pólo positivo sobre alesão e o pólo negativo distalmente; e um outrogrupo que recebeu terapia com CDB com o pólonegativo sobre a lesão e o pólo positivo distalmente.Observou-se que o grupo controle e aqueles quereceberam o pólo negativo sobre a lesão tiveramaumento significante na magnitude do edema.Quando o pólo positivo foi colocado sobre a le-são houve uma tendência à redução do edema,embora não de forma significante.

Talvez, todos esses eventos juntos pos-sam justificar os resultados estatísticos apresenta-dos aqui para a variável dor no grupo CDB.

Verificou-se pelos dados, como mostra ográfico 1, que a associação entre CDB e iontoforesefoi significantemente eficaz para diminuir a dorquando comparados valores iniciais e finais destegrupo.

As CDB, apesar de possuírem um com-ponente farádico, preservam muitas característicasdas correntes galvânicas. Ancorado nestas caracte-rísticas, foi proposto para este trabalho verificar seeste tipo de corrente é adequado para a utilizaçãoda iontoforese.

Segundo Ciccone (19), a iontoforese uti-liza corrente contínua para conduzir a medicaçãopor meio da pele e dentro dos tecidos subjacentes.Esse procedimento pode fornecer uma maneira re-lativamente segura e indolor para enviar quantida-des clinicamente significativas de medicação paraos tecidos cutâneos e subcutâneos. Como muitasintervenções terapêuticas tradicionais, existempoucos estudos de pesquisa experimentais quedocumentam os efeitos clínicos da iontoforese.

Khan (20) coloca que a hidrocortisona naforma de ungüento a 1% tem sido usada naiontoforese como um íon útil de açãoantiinflamatória. Robinson e Synder-Mackler (21)colaboram afirmando que os glicocorticóides sãocomumente usados como recurso iontoforético.Essas drogas inibem a síntese das substâncias pró-inflamatórias tais como as prostaglandinas eleucotrienos, inibem a migração de células sanguí-neas brancas removedoras para o local da infla-mação e estabilizam a membrana lisossômica, im-pedindo a lesão enzimática secundária.

Sendo um dos problemas das disfunçõesmecânicas da coluna lombar a dor proveniente doprocesso inflamatório, era de se esperar que asomatória de dois agentes que atuassem direta-

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mente sobre este processo. As CDB e oantiinflamatório esteróide tivessem ação terapêuti-ca pontencializada. Entretanto, os resultados nãodemonstraram tal fato. Apesar da CDB + iontoforesepor meio das CDB ter reduzido significativamentea dor dos pacientes submetidos a esta técnica,quando comparada com a aplicação de CDB iso-ladamente, esta última se mostrou superior estatis-ticamente, como se pode observar no gráfico 2.

As intensidades atingidas pelo grupo deCDB + iontoforese podem ter influenciado os re-sultados para esta associação. Neste trabalho, asdoses eram determinadas pela sensibilidade dopaciente. Verificou-se que o grupo de CDB +iontoforese apresentou médias significantementemais altas do que a de CDB isoladamente, tantopara a forma de corrente DF quanto para a formade corrente LP como demonstrado no gráfico 3.

No seu trabalho, Robinson e Synder-Mackler (21) sugerem, baseados em estudos clíni-cos usando iontoforese, que as amplitudes devemvariar entre 0,1 mA a 0,5 mA. Corroborando, Khan(20) descreve que baixos níveis de intensidade sãomais efetivos como força motriz do que as altasintensidades de correntes. Esta última pode afetarde forma adversa o fenômeno interiônico e difi-cultar a penetração. Talvez, se fosse estipulada umaintensidade menor para esta técnica, fosse possí-vel obter resultados mais satisfatórios.

A associação entre o efeito analgésico dacorrente e o mesmo efeito da droga pode ter con-sistido na razão para que o grupo de CDB +iontoforese tenha atingido intensidades de maiormagnitude.

Wallace et al. (22) avaliaram a anestesiada pele provocada por três técnicas: eletroporação,eletroincorporação e iontoforese utilizandolidocaína. Concluiu-se que a liberação de lidocaínatransdermal por eletroporação, eletroincorporaçãoe iontoforese resulta em uma anestesia da superfí-cie da pele semelhante, no entanto, a iontoforeseresulta em maior profundidade de anestesia. Infe-lizmente, não foram encontrados trabalhos avali-ando o grau de anestesia da superfície da pelecom hidrocortisona induzida iontoforeticamente.

O Gráfico 4 mostra o resultado para aavaliação da dor lombar segundo Hendler (11).Observa-se que a maioria dos pacientes do CDBse encontram no escore 1, que sugere respostanormal à dor crônica, e que a maioria dos pacien-tes do CDB + iontoforese se encontra no escore

1A, o que sugere uma anormalidade noprocessamento da dor.

Para Douglas (23), a dor é uma das sen-sações mais freqüentes observadas na clínica hu-mana a qual o homem dá grande importância, jáque não consegue ficar indiferente quando a sen-te. Entretanto, a reação a este quadro é variável edepende da intensidade da sensação, da experi-ência prévia do sujeito, das condições ambientaisexistentes em relação à dor, dentre outras. Por isso,a dor abrange certas características adicionais, talcomo a de acompanhar-se de um estado emotivo,chamado de aflição, que gera sofrimento. O paci-ente com dor torna-se mais sensível e confere im-portância às vezes exagerada, ou reduzida, a fato-res colaterais à dor.

Todo esse aspecto emotivo da dor podeter influenciado os resultados para a percepçãodela pelos pacientes, haja vista que 7 dos 9 paci-entes tratados com CDB + iontoforese exibiam umtraço de personalidade pré-mórbida enquanto queapenas 3 do grupo CDB o exibiam.

De acordo com Giesecke et al. (24), amaioria dos pacientes com dor lombar melhoraem até 12 semanas, entretanto, para aqueles quepermanecem com o quadro doloroso após esseperíodo, a melhora é lenta e incerta. Nesses casos,eles são caracterizados como portadores de umasíndrome idiopática similar a outras condiçõesinespecíficas como a fibromialgia e síndrome dointestino irritável. Para Giesecke et al. (24), essassíndromes crônicas parecem ter uma anormalida-de no processamento central da dor mais impor-tante do que a inflamação nas estruturas periféri-cas. Em seu trabalho, eles comparam grupos comsíndromes crônicas idiopáticas (dor lombaridiopática e fibromialgia) com indivíduos saudá-veis por meio de testes de dor experimentais e porressonância magnética funcional (FRM). Essas ava-liações mostraram que indivíduos com dor lombarcrônica idiopática têm sensibilidade aumentada àpressão dolorosa em locais distantes da região dedor clínica, são mais sensíveis a estímulos de pres-são que as pessoas saudáveis e, frente a estímulospressóricos dolorosos de 2 kg, várias áreas corticaisa mais que os indivíduos normais (área corticalsensorial secundária contralateral) foram evocadas(área cortical sensorial secundária contralateral eipsilateral, área cortical sensorial primária, lóbuloparietal inferior e cerebelo). Todas essas áreas ce-rebrais têm sido implicadas no processo de dor.

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Correntes Diadinâmicas de Bernard e Iontoforese no tratamento da dor lombar

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Ainda pela ressonância magnética funcional, ob-servou-se, para os pacientes com dor lombar crô-nica idiopática, aumento na ativação da porçãoanterior da ínsula que está envolvida com compo-nentes emocionais negativos.

Giesecke et al. (24) concluem seu traba-lho fazendo uma reflexão sobre a implicação clí-nica dos seus achados, já que a manutenção dador em grande número de portadores de disfunçãolombar crônica pode ser justificada por um meca-nismo central maior que os danos ou inflamaçãodas estruturas periféricas.

Isso vem corroborar com os achados destetrabalho. Apesar de se somar os efeitosantiinflamatórios de 2 técnicas, os pacientes destegrupo não evoluíram melhor que aqueles que re-ceberam somente CDB. Entretanto, o perfil psico-lógico dos pacientes deste último grupo foi maisfavorável para o tratamento, já que apresentaramdor objetiva, do que os pacientes do outro grupoque apresentaram um perfil pré-mórbido.

Finalmente, este trabalho propôs-se acontribuir para que a fisioterapia possa cada vezmais ser embasada em preceitos cientificamentemais confiáveis. Verificou-se que as técnicas aquiestudadas podem ser utilizadas com sucesso, en-tretanto, estudos esclarecendo cada vez mais osefeitos das correntes elétricas e da iontoforese so-bre diferentes situações que envolvem a dor sãoimportantes.

Considerações finais

Conclui-se que:

a) A aplicação de Correntes Diadinâmicasde Bernard associada à iontoforese(CDB + iontoforese) não apresentasuperioridade à aplicação das CDB iso-ladamente na promoção de analgesiaem pacientes com dor lombar.

b) Os pacientes submetidos aos dois pro-cedimentos terapêuticos relataram di-minuição significativa dos níveis dedor.

c) As CDB mostraram-se adequadas parao uso da iontoforese, já que as duastécnicas promoveram analgesia.

Referências

1. Borenstein DG. A coluna – lombalgia: parte I.Reumatologia, 2. ed. São Paulo: Novartis;2000a.

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Anexo I

Escores do teste de triagem de Hendlerpara Lombalgia Crônica (HENDLER,1979)

Pacientes que somaram até 14 pontos fo-ram classificados no escore 1. Isto sugeriu que es-tes pacientes apresentavam dor objetiva e estavamrelatando uma resposta normal à dor crônica.

Pacientes que somaram entre 15 e 18pontos foram classificados em um subgrupo doescore 1, o escore 1A. Isso sugere que estes ti-nham aspectos de pacientes com dor objetiva, bemcomo de pacientes exagerando a dor. Isso remetea uma pessoa com mau ajuste pré-mórbido e le-são orgânica que produz a resposta normal à dor;entretanto, em virtude do mau ajuste pré-dor, ador crônica gerou uma resposta mais intensa doque de outro modo ocorreria.

Pacientes que somaram entre 19 a 31pontos foram classificados no escore 2. Este esco-re caracterizou pacientes que exageravam a dor eque, em geral, tinham uma personalidade pré-mórbida que poderia aumentar sua probabilidadede usar ou beneficiar-se da queixa de dor crônica.

Pacientes que somaram 32 pontos ou maisforam classificados no escore 3. Isto sugeriu queum parecer psiquiátrico seria necessário.

Recebido em: 17/03/2005

Aprovado em: 27/07/2005

Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.18, n.4, p. 11-19, out./dez., 2005

Correntes Diadinâmicas de Bernard e Iontoforese no tratamento da dor lombar