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YARA CÉLIA FAJARDO DE ANDRADE AVALIAÇÃO: UM DISCURSO DEMOCRÁTICO QUE OCULTA PRÁTICAS CONSERVADORAS LONDRINA 2008

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YARA CÉLIA FAJARDO DE ANDRADE

AVALIAÇÃO: UM DISCURSO DEMOCRÁTICO QUE OCULTA PRÁTICAS CONSERVADORAS

LONDRINA

2008

AVALIAÇÃO: UM DISCURSO DEMOCRÁTICO QUE OCULTA PRÁTICAS CONSERVADORAS

Yara Célia Fajardo de Andrade1

RESUMO

O presente artigo tem por finalidade apresentar o processo de reflexão, de estudo sobre concepções de avaliação, desenvolvido junto a um grupo de professores e pedagogos da rede estadual de educação do município de Londrina, durante o Programa de Desenvolvimento Educacional do Paraná. Num processo de intervenção pedagógica, destaca os interesses que fundamentaram as práticas autoritárias de avaliação que ainda permeiam o ambiente escolar. Apresenta pressupostos teóricos que fornecem elementos para as análises e a compreensão das práticas de avaliação: as relações de produção, as relações sociais e o ideário pedagógico construído historicamente com seus respectivos panos de fundo filosófico, ideológico e sociológico. Neste sentido, a prática da avaliação é apresentada sob duas perspectivas: como uma ação conservadora (regulatória, autoritária) e como uma ação emancipatória (democrática). Analisa a real função da avaliação no processo ensino-aprendizagem na perspectiva da democratização do saber. Os primeiros resultados no sentido de aliar conhecimento e mudança, apontam para a conscientização acerca da necessidade do exercício de uma avaliação que supere práticas autoritárias e excludentes.

Palavras-chave: Educação. Democratização do saber. Avaliação da Aprendizagem.

1 Especialista em Didática e Metodologia do Ensino. Professora Pedagoga da Rede Estadual de Educação do Paraná. Experiência profissional nos setores de ouvidoria e assessoria pedagógica do Núcleo Regional de Educação de Londrina.

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EVALUATION: A DEMOCRATIC SPEECH THAT OCCULTS CONSERVATIVE PRACTICALS

Yara Célia Fajardo de Andrade 2

ABSTRACT

This article aims to show the reflection process, study about conceptions of evaluation, developed with a group of teachers and educationalists of the municipal teaching in Londrina City during the Program for Educational Development of Parana state.(PDE). In a process of the pedagogical intervention, it emphasizes the interests that supported the authoritarian practices of evaluation that still permeate the school surroundings. It presents theoretical assumptions that provide elements for the analysis and understanding of the practices of evaluation: the relations of production, social relations and educational ideals historically constructed with panels of their respective fund philosophical, ideological and sociological. In this logic, the practice of the evaluation is presented in two perspectives: as a conservative action (regulatory, authoritarian) and as an emancipator action (democratic). It examines the real role of evaluation in teaching-learning process in preparation for the democratization knowledge. The first results in order to combine knowledge and change, are pointing to raise awareness about the necessity of conducting an assessment to overcome authoritarian and exclusionary practises.

Keywords: Education. Democratization of the Knowledge Assessment of the Learning.

2 Specialist Didactics and methodology of teaching. Teacher Pedagogue of State for Education Network. Professional experience in the areas of Ombudsman and educational advisory team in the NRE of Londrina.

3

INTRODUÇÃO

Este trabalho apresenta o processo de reflexão, de

estudo sobre concepções de avaliação e sua repercussão no conceber

e no fazer avaliativo, realizado junto a um grupo de professores e

pedagogos da rede estadual de educação do município de Londrina,

num processo de intervenção pedagógica, realizado durante o

Programa de Desenvolvimento Educacional da Rede Pública Estadual

do Paraná- PDE.

Estas reflexões passam pela necessidade de mudanças

na concepção e na prática da avaliação escolar, a fim de superar as

práticas autoritárias de avaliação. Segundo Wachowicz (2006), para

mudar esta prática é necessário criar outra cultura para a avaliação e

também para a aprendizagem e isto é impossível sem a História. Mas

nós também fazemos História através de nossas ações no cotidiano.

É necessário, portanto, desenvolvermos novas formas de

elaborar e efetivar o fazer docente, novas maneiras de se pensar a

prática avaliativa que possibilite aos professores o exercício de uma

ação pedagógica que responda de modo efetivo às necessidades e

exigências educacionais. A mediação do professor durante todo o

processo, garantindo as aprendizagens com qualidade, torna-se um

imperativo do trabalho pedagógico.

Luckesi, referindo-se à democratização do ensino, afirma

que “[...] será democrática a escola que possibilitar a todos os

educandos que nela tiverem acesso, uma apropriação ativa dos

conteúdos escolares.” (2002, p. 65). Assim, neste estudo, a questão

original que orienta este trabalho é a de verificar como, de que forma a

4

avaliação pode contribuir para a democratização do saber na escola.

Em resposta, assume-se a firmação de Luckesi (2006, p. 28) de que

temos de “[...] colocar a avaliação escolar a serviço de uma pedagogia

que entenda e esteja preocupada com a educação como mecanismo de

transformação social”. Temos que entender a avaliação como uma

prática pedagógica comprometida com a aprendizagem, como um fator

de combate à seletividade, discriminação, exclusão e desqualificação

do ensino evidenciado na escola.

A discussão em torno de uma nova forma de se avaliar

na escola abrange questões teóricas e históricas da prática educativa,

questões que refletem aspectos da sociedade em que se organiza a

escola e que têm influenciado as práticas pedagógicas, e em especial a

avaliação educacional. Entre estes aspectos, o artigo destaca as

relações de produção, as relações sociais e as simbolizações

subjetivas, relações que se apresentam particularmente alienadoras. A

contextualização histórica permite perceber os elementos estruturais

do fenômeno e compreendê-lo enquanto processo.

Para ser entendida enquanto prática social e atividade

humana histórica, construída no conjunto das relações sociais, a

avaliação é analisada no contexto das diversas concepções

pedagógicas a fim de que se compreenda que a sua prática exercida

consciente ou inconscientemente, tem a ver com pressupostos teóricos

implícitos. Isto se faz necessário, pois se percebe que em termos

gerais, a concepção dos professores em suas práticas de avaliação da

aprendizagem evidencia uma prática baseada no senso comum, e de

acordo com Luckesi (2006, p. 28) [...] “como se ela não estivesse a

serviço de um modelo teórico de sociedade e de educação, como se

ela fosse uma atividade neutra”.

O artigo dedica um espaço à análise da Recuperação,

enquanto princípio derivado da própria avaliação e do Conselho de

Classe, enquanto instrumento coletivo de reflexão e de avaliação,

voltado à democratização das tomadas de decisão, em prol da

5

aprendizagem do aluno e da qualidade do ensino, ampliando o conceito

da relação entre avaliação e ensino/aprendizagem.

Numa perspectiva de pesquisa qualitativa, na qual os

sujeitos que nela se envolvem compõem um grupo com objetivos e

metas comuns, interessados em um problema que emerge num dado

contexto no qual atuam, o papel do pesquisador consistiu em orientar

o grupo a problematizá-lo, ou seja, situá-lo em um contexto teórico

mais amplo e assim possibilitar a ampliação da consciência dos

envolvidos, com vistas a planejar as formas de transformação das

ações dos sujeitos e das práticas institucionais (Thiollent, 1994).

Finalmente, a perspectiva de análise adotada exige, para

a compreensão da prática avaliativa, evidências que possam

comprová-la. Assim, buscou-se através da aplicação de questionários,

depoimentos dos professores e da observação da prática da avaliação

em duas escolas do professor pesquisador a apreensão concreta sobre

a prática pedagógica de fato existente nas escolas pesquisadas.

É sobre esse processo de reflexão e intervenção

pedagógica que este texto se debruça.

O PROCESSO PRODUTIVO INFLUENCIANDO A ESCOLA

Como a história da humanidade é marcada pela relação

estabelecida entre a forma como o homem produz sua existência

(trabalho) e os conhecimentos que são produzidos neste processo e

repassados às gerações (educação), as mudanças ocorridas nessa

organização resultam em mudanças na sociedade e conseqüentemente

marcam a questão educacional e o papel da escola.

Com o surgimento da sociedade capitalista, e depois

como efeito da Revolução Industrial (séc. XVIII) a escola é generalizada

de forma contraditória e dualista: para a elite uma escola de formação

geral e intelectual, enquanto que para os trabalhadores a escolaridade

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básica, ou habilitações profissionais, numa perspectiva funcional ao

sistema capitalista.

No capitalismo, a produtividade torna-se o elemento

central do processo surgindo novas maneiras de se administrar o

processo produtivo como o taylorismo, o fordismo e o toyotismo. No

Taylorismo, com o objetivo de diminuir o tempo gasto na produção o

trabalhador só domina aquela parcela que ele opera no processo de

produção coletiva, havendo uma desqualificação, e fragmentação entre

o planejamento e a execução.

No Fordismo, modelo de produção em massa e em série,

o aperfeiçoamento da linha de montagem e os princípios de

padronização e simplificação, torna o trabalho repetitivo, parcelado e

monótono, exigindo pouca qualificação do trabalhador.

“Acácia Kuenzer (2005), aponta várias modalidades de

fragmentação do trabalho pedagógico, escolar e não-escolar devido ao

sucesso do paradigma “taylorista/fordista que também influenciou a

escola: a dualidade estrutural, a fragmentação curricular, a teoria

separada da prática; as estratégias taylorizadas de formação de

professores, que promovem capacitação parcelarizada, por temas e

disciplinas, agrupando os profissionais por especialidade, de modo à

nunca discutir o trabalho pedagógico em sua totalidade, o plano de

cargos e salários, que prevê a contratação dos profissionais da

educação por tarefas, ou jornadas de trabalho, e até mesmo por aulas

ministradas, sem desenvolver sentido de pertinência à escola, a

fragmentação do trabalho dos pedagogos, nas distintas especialidades.

Os novos modos de produção e o surgimento da

indústria moderna foram responsáveis pela implantação dos cursos

profissionais, organizados no âmbito das empresas ou do sistema de

ensino, determinados diretamente pelas necessidades do processo

produtivo e destinadas às massas trabalhadoras.

No Toyotismo, a produção em série é substituída pela

flexibilização da produção, o que resulta em uma elevada

7

especialização. Prevalece o individualismo que tem a competição como

valor central em muitos aspectos da vida. Firma-se a cultura do

empreendedorismo, forjada num processo de mudanças de normas,

hábitos e atitudes culturais.

Segundo Alves (2007), o toyotismo tende a exigir novas

qualificações do trabalho que articulam habilidades cognitivas e

habilidades comportamentais. Para Kuenzer (2005) quanto mais

mediados por ciência e tecnologia sejam os processos sociais e

produtivos se exige do trabalhador a capacidade de articular

conhecimentos teóricos, de modo que o domínio da teoria oriente as

ações.

Com as exigências dessas qualificações, as políticas

educacionais introduzem na educação os conceitos de competências e

habilidades e as políticas de formação profissional os conceitos de

empregabilidade e competência.

Kuenzer (2005) afirma que apesar do discurso toyotista

da recomposição da unidade rompida pela divisão do trabalho no

capitalismo, percebe-se, no exercício das atividades laborais e de

formação dos trabalhadores flexíveis, que o trabalho da maioria está

cada vez mais desqualificado, intensificado e precarizado.

Para esta autora, acentua-se na acumulação flexível, a

cisão entre o trabalho intelectual, que compete a um número cada vez

menor de trabalhadores – estes sim com formação flexível resultante

de prolongada e contínua formação de qualidade – e o trabalho

instrumental, cada vez mais esvaziado de conteúdo.

Segundo Lima (1995), a avaliação da aprendizagem

quando imerso nesta indústria educacional se restringe à verificação

do desenvolvimento do aluno e tem a função de controle de qualidade

de toda a produção realizada pela linha de montagem escolar. Tem um

caráter mecânico, seletivo e definitivo ou de final de linha e a ênfase é

no produto. Recusa como sucata os produtos defeituosos (reprovação)

e promove os considerados satisfatórios (aprovação).

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Luckesi (2006) afirma que a prática educacional

brasileira opera na quase totalidade das vezes com verificação e não

com avaliação da aprendizagem. Segundo o autor, os professores na

aferição do aproveitamento escolar, realizam basicamente três

procedimentos sucessivos: medida do aproveitamento escolar,

transformação da medida em notas ou conceito e utilização dos

resultados identificados.

Para este autor, quando os professores utilizam os

resultados da avaliação fazendo apenas o seu registro no Diário de

Classe ou oferecendo uma oportunidade de melhorar a nota ou

conceito, caso o aluno tenha obtido uma nota inferior, permitindo que

faça uma nova aferição, está praticando verificação e não avaliação.

Neste caso, estão preocupados com a melhoria da nota. O foco da

ação, portanto não é no sentido da aprendizagem, mas sim da nota. A

aferição é utilizada apenas para classificar os alunos em aprovados e

reprovados. A dinâmica do ato de verificar encerra-se com a obtenção

do dado, não implicando ações novas ou intervenções para a melhoria

da qualidade e do nível de aprendizagem dos alunos.

Mas quando os professores constatam as dificuldades e

desvios de aprendizagem dos alunos, por meio dos resultados das

aferições e decidem trabalhar com eles para que de fato aprendam

aquilo que deveriam aprender e construam efetivamente os resultados

necessários de aprendizagem, estão praticando avaliação, pois polariza

sua ação tendo em vista a aprendizagem efetiva do aluno. Neste caso,

o professor é comprometido e se interessa pela aprendizagem de todos

os alunos. Para este, o momento da aferição do aproveitamento escolar

não é o ponto definitivo de chegada, mas um momento de observar se

a caminhada está com a qualidade desejada.

Também para Hoffmann (2000) a concepção de

avaliação que marca a trajetória de alunos e educadores é a que define

a avaliação como julgamento de valor de resultados alcançados. Nesta

concepção, para os educadores, há uma dicotomia entre educação e

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avaliação. A ação de educar e a ação de avaliar são momentos

distintos e não relacionados.

OS CONTEXTOS PEDAGÓGICOS LIBERAIS E A PRÁTICA DAOS CONTEXTOS PEDAGÓGICOS LIBERAIS E A PRÁTICA DA

AVALIAÇÃOAVALIAÇÃO

Segundo Luckesi (2006) este sistema avaliativo, de

caráter excludente, seletivo e classificatório, com a prática de provas e

exames escolares que conhecemos tem sua origem nas concepções

trazidas pelos jesuítas no século XVI e XVII. Esta prática foi se

consolidando ao longo do tempo, sendo herdeira também do momento

histórico de consolidação da sociedade burguesa marcada pela

exclusão e marginalização de grande parte de seus membros.

As pedagogias, que se definiram após a Revolução

Francesa são escolas que segundo este autor, refletiu a vida da

sociedade liberal capitalista, reproduzindo e reforçando os mecanismos

para adaptação de seus membros a esta sociedade e à ideologia liberal

dominante.

A avaliação educacional em geral, assim como a da

aprendizagem, em coerência com essas pedagogias, torna-se um

instrumento disciplinador, de controle e enquadramento dos indivíduos

nos parâmetros pré- estabelecidos pela sociedade, sendo mais um

mecanismo de manutenção do “status quo”.

Segundo Cunha (1980), o liberalismo privilegia aptidões

e talentos, vinculando-os a uma posição social. Logo, o único

responsável pelo sucesso ou fracasso social de cada um é o próprio

indivíduo. Todos têm liberdade para se educar, mas não têm igualdade,

as mesmas condições, porque a realidade sócio-econômica das

diversas classes dentro da sociedade burguesa não lhes permite uma

mesma instrução. Faz crer que o sucesso ou fracasso escolar são

produtos únicos das razões de ordem intelectiva, dissimulando os

mecanismos de discriminação da ordem econômica que também é

reproduzido na própria escola,

10

Nesse sentido, as análises avaliativas segundo Dalben

(1992), não levam em conta as diferenças sociais e culturais, tendo em

vista um ensino padronizado. Apegam-se à pessoa do indivíduo,

considerando a educação um bem particular ou uma conquista pessoal.

Dessa forma, o próprio aluno é o grande responsável pela sua

educação. Quando o aluno não consegue enquadrar-se no esquema

exigido pela escola, é rotulado como incapaz ou preguiçoso “que não

estuda” ou “sem base”.

As primeiras manifestações de prática pedagógica

escolar no Brasil, às quais foram denominadas de Tradicional ou

Conservadora, Escola Nova e Tecnicista, surgem vinculadas à ideologia

liberal e segundo Saviani (2003) “não se constituem em períodos fixos

e homogêneos, mas sim são períodos nos quais suas características

prevaleceram ou prevalecem”. Todas têm como característica

fundamental a reprodução do conhecimento e uma visão mecanicista

da prática educativa.

A Escola Tradicional teve um longo período de

predomínio da igreja católica. Caracteriza-se pela valorização do ensino

humanístico e da cultura universal, os quais são repassados como

verdades absolutas e separados da experiência do aluno e das

realidades sociais.

Neste modelo, o professor é autoritário, severo, rigoroso

e inibidor da participação do aluno, caracterizando-se como o

controlador do processo, aquele que deve ter domínio dos

conhecimentos. A aprendizagem é receptiva e mecânica, valorizando a

memorização que se dá freqüentemente pela coação. O método

indutivo permite que a matéria seja tratada seqüencialmente,

desvinculada das outras disciplinas e do corpo do curso. Oferta-se o

mesmo caminho para todos, o que vem privilegiar as camadas mais

favorecidas. O aluno caracteriza-se como um ser receptivo, passivo,

realizador de tarefas. É educado para atingir sua realização pessoal

pelo próprio esforço.

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A avaliação na escola Tradicional privilegia os aspectos

cognitivos e quantitativos, com ênfase na memorização, repetição e a

exatidão. O aluno deve reproduzir na íntegra, o que foi ensinado. Este

fator impede os alunos de serem criativos, reflexivos, questionadores.

A única pessoa a avaliar, indiscutivelmente, é o

professor. O que avaliar está claramente definido, os conhecimentos

consagrados, os valores perpetuados por determinado tipo de

sociedade. Como avaliar parece ser a questão mais clara para todo

professor, principalmente para o conservador, que supervaloriza o

instrumento formal único (prova bimestral). Quando avaliar é o

momento em que a “autoridade” do professor atinge o apogeu, ele é

quem decide sobre a vida escolar do aluno. Há uso de reforço negativo

(punições, notas baixas, apelo aos pais), para se alcançar resultados

positivos.

A avaliação classificatória (e como ato final para

aprovar/reprovar) é característica marcante da escola Tradicional, é o

porquê se avalia.

A Escola Nova embasada por pressupostos de

educadores como Dewey, Montessori, Piaget, foi proposta por Anísio

Teixeira no Brasil, por volta de 1930, num momento histórico de

efervescência de idéias, aspirações e antagonismos políticos,

econômicos e sociais. Como um movimento de reação à pedagogia

tradicional, busca alicerçar-se com fundamentos da biologia e da

psicologia dando ênfase ao indivíduo e a sua atividade criadora. Nesta

concepção, a escola deve ser pública, laica, obrigatória e gratuita.

Na Escola Nova ou Renovada o aluno é o centro do

processo de ensino-aprendizagem, participa das experiências de

aprendizagem de maneira ativa, aprendendo pela descoberta. O papel

do professor é o de criar condições para que os alunos aprendam, deve

ser um facilitador da aprendizagem que auxilia o desenvolvimento livre

e espontâneo do aluno.

Dá-se mais valor aos processos de aquisição do saber do

que ao saber propriamente dito. Desta forma privilegia-se o aprender

12

fazendo, no qual a motivação encontra-se na estimulação do problema

e nas disposições internas para aprender. Neste modelo, a escola passa

a valorizar a descoberta individual, bem como a construção subjetiva

do conhecimento.

Para Saviani trata-se de uma teoria pedagógica que

considera que o importante não é aprender, mas aprender a aprender.

(2003. p. 9). Para este autor houve como conseqüência o afrouxamento

da disciplina e a despreocupação com a transmissão dos

conhecimentos, acabando por rebaixar o nível do ensino destinado às

camadas populares e em contrapartida aprimorou a qualidade do

ensino destinado às elites.

A avaliação na Escola Nova valoriza a capacidade de

tirar conclusões de uma experiência. Apoiada na psicologia, sociologia

e antropologia, valoriza os aspectos afetivos (atitudes), os aspectos

bio-psico-sociais, preocupação com: participação, interesse,

socialização e conduta (assiduidade, responsabilidade, pontualidade,

higiene), ênfase às diferenças individuais e a auto-avaliação dos alunos

pressupondo a busca de metas pessoais. O processo avaliativo é

processual, ocorrendo num ambiente favorável à vivência democrática,

no entanto, permanece a palavra final do professor.

A tendência tecnicista surgiu, no Brasil, após 1964, tendo

como objetivo adequar a educação às exigências da sociedade

industrialmente e tecnologicamente desenvolvida, articulando-se com

o sistema produtivo para o aperfeiçoamento do sistema capitalista.

Aliada à concepção taylorista marcou profundamente a

educação brasileira, atrelando-a definitivamente ao mercado de

trabalho, implementando uma vocação dedicada à formação

profissional, visando à preparação de mão de obra técnica, provendo a

formação do aluno para “aprender a fazer”. Durante este período a

educação foi direcionada para a adaptação do indivíduo ao trabalho.

(Aranha, 1996).

Neste modelo a escola valoriza a aprendizagem

enquanto modificação de desempenho. O aluno é submetido a um

13

processo de controle de comportamento, a fim de ser levado a atingir

objetivos previamente estabelecidos. O ensino é um processo de

condicionamento/reforço da resposta que se quer obter. Acontece

através da operacionalização dos objetivos e mecanização do processo

e é organizado em função de pré-requisitos.

A ênfase está na organização racional dos meios, na

instrução programada, nos livros didáticos, nas técnicas de micro-

ensino, nos recursos audiovisuais, na tecnologia educacional, no

planejamento em moldes sistêmicos. O essencial não é o conteúdo da

realidade, mas as técnicas (formas) de descoberta e aplicação, com as

quais se pretende alcançar a eficiência, a eficácia, a qualidade, a

racionalidade, a produtividade. O professor emprega o sistema

instrucional previsto fazendo uma ligação entre a verdade científica e o

aluno.

A avaliação na Escola Tecnicista visa ao produto e está

diretamente ligada aos objetivos estabelecidos e ocorre no final do

processo com a finalidade de verificar se os alunos adquiriram os

comportamentos desejados. Pouca ou nenhuma preocupação com a

formação e o espírito crítico. Exige-se uma forte dose de memória e

retenção e, por conseqüência, ocasiona um alto índice de reprovação.

A prática avaliativa é diluída, eclética e pouco

fundamentada, com exagerado apego aos livros didáticos, uso de

testes objetivos, realização de exercícios programados. A ênfase está

na produtividade do aluno, em seus comportamentos observáveis e

mensuráveis. Privilegia-se a forma e a apresentação dos trabalhos

produzidos. O sistema de instrução leva a desencadear processos de

avaliação na entrada (pré-teste) e saída (pós-teste) do sistema, de

forma que a primeira tem a finalidade de estabelecer pré-requisitos e a

última verificar se o aluno alcançou ou não os objetivos propostos.

De acordo com Vasconcellos (2005) a função docente

historicamente tem sido associada ao controle, à fiscalização, ao

disciplinamento, à medida, à verificação. Assim, muitos professores

após transmitir os conteúdos, logo verificam o quanto os alunos

14

assimilaram, indicando claramente através de notas, conceitos ou

menções, aqueles que merecem ou não prosseguir nos estudos, seja

por “não terem condições” ou por “não saberem aproveitar as iguais

oportunidades dadas a todos”. A avaliação seleciona e exclui.

O autor afirma que há um pressuposto (normalmente

implícito) no modelo autoritário de educação e avaliação, de que a

escola pode não ensinar, ou seja, o professor “dar” aula e o aluno não

aprender, seria normal.

Faz parte das estratégias deste modelo, a culpabilização

da vítima (“os alunos não aprendem por problemas de família, sociais,

neurológicos”, etc.). O autor ainda destaca que a lógica classificatória

gira em torno de aprovar-reprovar, não tocando na questão

fundamental que é a aprendizagem efetiva. A intencionalidade seletiva

está enraizada nos sujeitos, mas também nas estruturas. É necessário,

portanto, uma reforma na intencionalidade.

A AVALIAÇÃO NUMA PERSPECTIVA DEMOCRÁTICA E

EMANCIPADORA

Em oposição à pedagogia liberal, nasce uma pedagogia

progressista. É progressista na medida em que se firma na

possibilidade de superação das condições reais de vida das camadas

oprimidas, a partir da transformação social. Para esta pedagogia, a

escola é condicionada pelos aspectos sociais, históricos, políticos,

econômicos e culturais, mas ao mesmo tempo, possibilita um espaço

que aponta à transformação social.

Segundo Saviani, (2005) a educação é determinada pela

sociedade, mas essa determinação é relativa e tem uma ação

recíproca, o que significa que a educação também interfere sobre a

sociedade, podendo contribuir para a sua própria transformação.

Para o autor, a educação “é uma atividade mediadora no

seio da prática social”. Entender a escola como mediação significa

compreender o conhecimento como ponte para efetivação de um

15

processo de transformação social. O papel político da escola está

vinculado ao seu papel pedagógico. “Do ponto de vista prático, trata-se

de retomar vigorosamente a luta contra a seletividade, a discriminação

e o rebaixamento do ensino das camadas populares”. (SAVIANI, 2003,

p. 31).

De acordo com Libâneo (1992), a pedagogia progressista

tem se manifestado em três tendências: a libertadora (mais conhecida

como pedagogia de Paulo Freire), a libertária (que se inspira em

propostas autogestionárias e/ou antiautoritárias) e a crítico-social dos

conteúdos (ou pedagogia Histórico-crítica, proposta por Dermeval

Saviani).

Pedagogicamente, a primeira e a segunda versão

valorizam mais o processo de ensino e de aprendizagem grupal, o

modo de apropriação do conhecimento mais do que a aquisição do

conteúdo propriamente dita, preferindo a modalidade de educação

não formal, enquanto que a terceira valoriza a aquisição dos

conteúdos culturais, assimilados criticamente e reelaborados, como

instrumento de elevação cultural do povo.

Segundo Libâneo,

Esta corrente da pedagogia progressista defende o ponto de vista de que a principal contribuição da escola para a democratização da sociedade está na difusão da escolarização para todos, colocando a formação cultural e científica nas mãos do povo como instrumento de luta para sua emancipação. Valoriza, assim, a instrução enquanto domínio do saber sistematizado e os meios de ensino, enquanto processo de desenvolvimento das capacidades cognitivas dos alunos e viabilização da atividade de transmissão/assimilação ativa de conhecimentos. (1992, p. 127)

Para Saviani (2003), não se deve ministrar às camadas

populares o conteúdo diluído, e aligeirado até o nada. Ao contrário,

deve-se priorizar o conteúdo, sem reducionismos qualitativos, com a

preocupação de instrumentalizar a classe dominada culturalmente, de

modo a poder dominar aquilo que os dominantes dominam: o saber

científico historicamente acumulado.

16

Pode-se perceber que a pedagogia histórico-crítica está

empenhada na recuperação da função essencial da escola e, portanto,

em métodos de ensino e avaliação eficazes. Neste aspecto, o trabalho

docente apresenta-se como um duplo processo: continuidade da

experiência trazida pelo aluno e ruptura dessa experiência, elevando o

aluno a uma visão elaborada do conhecimento.

Em conseqüência, a relação pedagógica tem na prática

social o seu ponto de partida e de chegada. Os métodos de ensino

pressupõem a vinculação entre sociedade e educação, e consideram

professor e aluno como agentes sociais diferenciados, no ponto de

partida da atividade de ensino, e identificados no ponto de chegada

desta mesma atividade.

Em coerência com esta perspectiva, entende-se que

para demonstrar o possível compromisso da avaliação da

aprendizagem com uma prática pedagógica transformadora, faz-se

necessário admiti-la enquanto processo determinado e determinante

de uma pedagogia progressista.

Avaliar dentro desta pedagogia implica em ter clareza

dos determinantes sociais da educação, da compreensão do grau em

que as contradições da sociedade marcam a educação e,

conseqüentemente, como é preciso se posicionar diante dessas

contradições. Requer perceber claramente qual é a direção que cabe

imprimir à questão educacional para que o aluno aproprie-se

criticamente de conhecimentos e habilidades necessárias à sua

realização como sujeito crítico dentro desta sociedade que se

caracteriza pelo modo capitalista de produção.

Para tanto o que se coloca como fundamental para

redirecionar a prática da avaliação é assumir um posicionamento

pedagógico claro e explícito. Mas não basta entender que é necessária

uma nova pedagogia e mudanças nas práticas da avaliação, é

fundamental que este entendimento resulte em novas formas de

conduta que expressem o resgate da avaliação em sua essência

constitutiva.

17

Nesta perspectiva, a avaliação somente tem função

apropriada quando está intimamente vinculada a um projeto social,

nunca centrada apenas em sua função absolutamente técnica. A

avaliação é um processo contínuo, diagnóstico, dialético e deve ser

tratada como parte integrante das relações de ensino-aprendizagem. A

avaliação tem, enquanto técnica, a função de prover informações úteis

e necessárias sobre o desenvolvimento da prática pedagógica para a

intervenção/reformulação desta prática e dos processos de

aprendizagem.

O processo avaliativo é parte integrante da práxis

pedagógica e deve estar voltado para atender as necessidades dos

alunos. O professor encara a avaliação como diagnóstico do

desempenho do aluno. Intervém para ajudá-lo a ultrapassar suas

necessidades, para ganhar autonomia, para ajudá-lo no seu esforço de

distinguir a verdade do erro. Assim, o erro serve para direcionar a

prática pedagógica, assumindo papel diagnóstico e permitindo aos

envolvidos no processo, a percepção do conhecimento construído. Por

outro lado, o acerto desencadeia no aluno ações que sinalizam

possibilidades de superação dos saberes apropriados para novos

conhecimentos. Segundo Luckesi (2005) quando a avaliação assume o

caráter de uma avaliação participativa, esta funciona para os alunos

como um meio de autocompreensão.

Por sua vez, Paro (2001) também afirma que se

educação é processo de apropriação da herança histórico-cultural pelo

indivíduo, com o fim de construir a própria personalidade deste, é de

extrema importância a autoconsciência dos seus progressos e

dificuldades, ou seja, a auto-avaliação. A auto-avaliação, na verdade, é

que sintetiza o estágio de desenvolvimento da autonomia pelo próprio

indivíduo.

O desempenho do aluno não pode ser resultado de

apenas um dia de prova, mas de outros dias (muitos) em que construiu

sua aprendizagem passo a passo, com retrocessos e avanços,

característicos do ato de aprender. Nesse sentido, Paro (2001) propõe

18

que a avaliação deve integrar-se o no próprio trabalho que se realiza,

de modo a acompanhá-lo em todo o seu desenvolvimento. Quanto

maiores forem os intervalos em que se dão as avaliações, maiores são

as chances de que algum processo incorreto, ineficiente ou viciado

tenha se prolongado no tempo sem que dele se tenha conhecimento

para que se possam tomar medidas para saná-lo.

Os instrumentos de avaliação devem ter significado para

o aluno, que não exijam somente memorização ou conteúdo específico

para uma prova, que sejam reflexivos, relacionais e compreensíveis.

Estudiosos contemporâneos como Hoffmann, 2000,

Luckesi, 2002, Vasconcellos, 2005, apontam a preocupação em superar

as práticas avaliativas classificatórias. Demo, 1999, concorda que é

necessário superar os abusos da avaliação de teor repressivo,

humilhante e punitivo. Estes e outros estudiosos argumentam em favor

de processos avaliativos conectados com o compromisso com a

aprendizagem para todos os alunos e a formação da cidadania.

Para Hoffmann (2001), os estudos contemporâneos em

relação à avaliação da aprendizagem apontam novos rumos teóricos,

tendo como diferencial básico o papel interativo do avaliador no

processo, influenciando e sofrendo influências do contexto avaliado. O

que passa a conferir ao educador um comprometimento com o objeto

da avaliação e com a sua própria aprendizagem do processo de avaliar.

RECUPERAÇÃO : NOVAS OPORTUNIDADES DE APRENDIZAGEM

A recuperação, segundo Paro (2001), deve ser pensada

como um princípio derivado da própria avaliação. Entendendo-se a

avaliação como um processo contínuo e permanente, embutido no

próprio exercício de ensinar e aprender, esta diagnosticaria os

problemas e dificuldades que a recuperação, também num processo

contínuo e permanente, cuidaria de solucionar pelo oferecimento de

19

novos recursos e alternativas de ação que desafiem o aluno a avançar

em termos do conhecimento.

Para Vasconcellos (2005, p. 81) “todo ser humano é

capaz de aprender”. No entanto, muitas vezes o conhecimento no

indivíduo não se dá de uma vez, só ouvindo e “de primeira”. Há

necessidade de novas iniciativas e de um tempo de espera. Com

aproximações sucessivas e num processo de interação com o objeto,

com outros sujeitos e com a realidade, o aluno pode captar aquilo que

eventualmente não captou numa abordagem inicial do conteúdo.

Desse modo, para o autor, recuperar a aprendizagem é

“conceber e organizar situações que favoreçam a efetiva construção do

conhecimento”.

A recuperação de estudos visa garantir a aprendizagem

por parte de todos os alunos, especialmente daqueles que têm maiores

dificuldades em determinados momentos e conteúdos.

Ainda para Vasconcellos (2005), a recuperação da

aprendizagem deve acontecer fundamentalmente no espaço que lhe é

própria, ou seja, na sala e durante a aula.

Ao se organizarem períodos de aulas especiais para os

alunos com dificuldade, corre-se o risco tanto por parte do aluno como

do professor de se acomodarem com essa atividade: o aluno não

prestando muita atenção às aulas por saber que terá outro momento

para aprender e outra oportunidade para “tirar nota”, e o professor

deixando de trabalhar as dificuldades de determinados alunos já

prevendo seu encaminhamento para a recuperação.

Com muita clareza a Lei nº. 9394/96 (Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional), estabelece que a avaliação deve ser um

instrumento de acompanhamento da construção da aprendizagem,

num processo contínuo e cumulativo, que venha a incorporar todos os

resultados obtidos durante o período letivo, não podendo ser aceita

como um simples instrumento classificatório.

No entanto, no entender de Hoffmann (2001), com as

exigências da LDB nº 9394/96, a maioria dos regimentos escolares é

20

introduzida por textos que enunciam objetivos ou propósitos de uma

avaliação contínua, mas estabelecem normas classificatórias e

somativas, revelando a manutenção das práticas tradicionais.

O CONSELHO DE CLASSE: ESPAÇO DEMOCRÁTICO DE AVALIAÇÃOO CONSELHO DE CLASSE: ESPAÇO DEMOCRÁTICO DE AVALIAÇÃO

O Conselho de Classe, segundo Dalben (1992), é uma

das instâncias formalmente instituídas na escola, responsável pelo

processo coletivo de avaliação da aprendizagem do aluno. Constituiu-

se na organização escolar brasileira, a partir da Lei 5692/71, ocorrendo

indiretamente através dos regimentos escolares elaborados pelas

escolas, na época.

Parte do pressuposto de que o processo coletivo de

avaliação é qualitativamente superior ao individual, pois as diferentes

óticas, análises e avaliações dos diversos profissionais podem permitir

a tomada de decisões mais acertadas.

No entanto, constatou-se, a partir de pesquisas sobre

essa instância (DALBEN, 1992), que o papel dos Conselhos de Classe

era o de reforçar e de legitimar os resultados dos alunos, como um

veredicto final, acabado, já fornecido pelos professores e registrados

em seus diários. Os professores apresentavam os seus resultados,

fechavam-se no seu ponto de vista, não discutiam entre si as

diferenças de posicionamento e tudo transcorria numa relação

individualizada e de isolamento profissional.

A avaliação escolar apresentava-se presa a medidas de

rendimento e a discussão centrava-se na figura do aluno, como

portador de problemas que recaiam sobre a “falta de estudo”, “falta de

disciplina”, “falta de interesse” diante das atividades escolares. Assim

sendo, o objetivo fundamental da instância, não era atingido, perdendo

assim a sua importância e riqueza no trato das questões pedagógicas.

De acordo com Dalben (2004), apesar de o aluno ser o

centro das avaliações no Conselho de Classe, apesar de ser, a todo

instante, colocado como elemento central das discussões propostas

21

pela instância, ele tem se apresentado como um elemento passivo,

sem voz e sem participação nas reuniões. O aluno quase nunca sabe

quais os critérios pelos quais está sendo submetido nesse processo

avaliativo, muitas vezes não sabe o significado dos parâmetros

utilizados, ficando numa situação de submissão e alienação total.

Os professores não percebem que, sendo o aluno um ser

pensante, um elemento ativo do processo de ensino, um ser histórico,

capaz de incorporar e produzir conhecimentos, é também capaz de,

num processo comunicativo, contribuir para o maior conhecimento dele

mesmo, das questões referentes ao processo de ensino e, obviamente,

referentes ao avanço de propostas.

Conforme a prática usual das escolas, os Conselhos de

Classe reúnem-se, depois de obtidos os resultados de cada bimestre,

fornecidos pelos professores. Devem participam do Conselho de Classe

os diversos professores de uma determinada turma, o pedagogo

responsável pelo período, o diretor ou o diretor do período e ainda um

representante da secretaria da escola.

Atualmente, a maioria desses colegiados restringe-se a

discussões relacionadas às possibilidades de continuidade de estudos

dos alunos, baseada principalmente na análise quantitativa dos valores

atingidos em relação à média determinada na legislação vigente, e nos

aspectos comportamentais que “interferem” no processo de ensino e

aprendizagem, dificultando-o. Normalmente, os registros não

identificam as dificuldades de aprendizagem que os alunos possam

estar apresentando em relação a esta ou àquela disciplina.

Os encaminhamentos propostos, então, dizem respeito à

modificação de atitudes comportamentais dos alunos frente ao

processo de ensino e aprendizagem ou, ainda, solicitam providências

dos responsáveis como auxílio para a superação das dificuldades de

relacionamento destacadas. Raramente registram-se

encaminhamentos pedagógicos alternativos e diversificados por parte

dos docentes das diferentes disciplinas, ou pela equipe pedagógica, ou

22

mesmo pela direção do estabelecimento, que busquem a superação

das possíveis dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos alunos.

Hoffmann (2001) destaca que os momentos do Conselho

de Classe só têm significado se forem constituídos com o propósito de

aprofundar a análise epistemológica e didática do processo de

aprendizagem dos alunos, de deliberar ações conjuntas que

contribuam para o aprimoramento das ações futuras do corpo docente,

dos alunos e de toda a escola.

Para esta autora, as práticas tradicionais privilegiam o

caráter comprobatório de uma etapa escolar percorrida pelo aluno,

reunindo e apresentando resultados obtidos e tecendo considerações

atitudinais que, na maioria das vezes, servem para explicar ou justificar

o alcance desses resultados em determinado espaço de tempo.

Nesse sentido, a avaliação volta-se para o passado,

relatando e explicando o presente. Diferentemente, uma prática

avaliativa direcionada ao futuro, não tem por objetivo reunir

informações para justificar ou explicar uma etapa de aprendizagem,

mas acompanhar com atenção e seriedade todas as etapas vividas

pelo estudante para ajustar, no decorrer de todo o processo,

estratégias pedagógicas.

Do mesmo modo, em relação ao Conselho de Classe, a

autora dirige sua crítica ao significado desses momentos, no sentido

de se privilegiar uma ação voltada ao passado, ao caráter constatativo

e de proferição de sentenças parciais ou finais, em detrimento ao seu

caráter necessariamente interativo, reflexivo e deliberador quanto ao

futuro da aprendizagem dos alunos.

Dalben (1992) afirma que na tentativa de enxergar o

aluno como um ser total, visto em suas diversas dimensões, como um

ser que precisa ser conhecido e contextualizado, e também devido a

insatisfação com o processo avaliativo da escola e a preocupação com

a perspectiva de não prejudicar o aluno pelas injustiças que podem

ocorrer nesse processo, tornou-se uma prática dos Conselhos Finais

aprovar alunos que, mesmo não obtendo quantidade de pontos

23

suficientes para passar de ano, apresentem uma história que justifique

a sua aprovação.

Desta forma, professores encontram respaldo nas

decisões coletivas do Conselho de Classe e no processo de “Aprovação

pelo Conselho”.

Entretanto, conforme as análises de Enguita (apud

DALBEN, 1992, p. 129) a forma como a escola trabalha as questões de

avaliação onde traços da personalidade são selecionados, premiando-

se os alunos que se submetem com maior docilidade, resulta em um

processo onde a incorporação desses traços de personalidade

apresenta-se como preponderante em relação ao conteúdo veiculado

na escola, podendo estar, de outra maneira, atendendo aos interesses

hegemônicos do sistema,

Da mesma forma que o Conselho de Classe pode se

aproveitar de suas características constitutivas e ser capaz de

direcionar um projeto democrático de atuação pedagógica, pode

também ratificar relações autoritárias, discriminatórias e excludentes.

É no Conselho de Classe que questões postas em relação

à melhoria da qualidade de ensino e de aprendizagem, à elaboração e

execução do projeto político pedagógico e as concepções de ensino e

avaliação são confrontadas e integradas propiciando a reflexão e a

reorganização do trabalho pedagógico.

No entanto, para Dalben (1992), um novo Conselho de

Classe só será possível de ser efetivado quando os sujeitos que o

integram apoderarem-se, criticamente e conscientemente dele,

colocando-o a serviço de seus propósitos e da transformação social,

articulando-o com um projeto político-pedagógico comum e com o

compromisso de que de fato, o aluno aprenda.

AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: EVIDÊNCIAS SOBRE A PRÁTICAAVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: EVIDÊNCIAS SOBRE A PRÁTICA

24

Com o objetivo de refletir com educadores a respeito da

avaliação da aprendizagem enquanto recurso pedagógico e prática

intencionalizada capaz de contribuir para que a escola desempenhe

seu papel na efetivação de uma educação cujas finalidades dizem

respeito à instauração e a consolidação da condição de cidadania,

iniciamos o trabalho com 27 professores da rede pública, dentre eles

pedagogos e professores das diferentes áreas do conhecimento.

Assim procedendo, por meio de grupo de estudos foram

constituídos espaços para fundamentação teórica. Para subsidiar a

discussão/reflexão sobre o tema em questão, foi utilização o caderno

de apoio pedagógico produzido pelo pesquisador “Avaliação:

perspectiva emancipadora ou conservadora?” Foram realizados

estudos de textos teóricos, debates, análise de trechos de filmes,

reflexões acerca de experiências do cotidiano à luz de referenciais

teóricos, estudos orientados, produções coletivas, troca de

experiências, e outras atividades e dinâmicas que de forma dialética,

possibilitassem a reflexão das práticas encontradas.

A proposta de reflexão e análise sobre a prática avaliativa

existentes nas escolas partiu da necessidade de se compreender a

realidade, problematizando-a por meio de entrevistas semi-

estruturadas, aplicação de um questionário, depoimentos, análise de

instrumentos de avaliação, análise dos resultados dos alunos como os

índices de reprovação, evasão e aprovação por Conselho de Classe.

A intenção original foi chegar à prática social final, com a

implementação da práxis, e a tomada de consciência sobre a

necessidade de mudanças na concepção e na prática da avaliação

escolar, numa perspectiva emancipadora.

Dessa forma, foi aplicado um questionário. Como as

questões eram abertas, foram selecionados aqueles cujas respostas

tivessem maior clareza em relação ao objeto de estudo. Assim, do

total de 27 questionários, foram selecionados e efetivamente

analisados 66%.

25

As questões giraram em torno dos seguintes temas: a

prática pedagógica existente na escola e sua coerência com a

concepção defendida nos seus documentos (Projeto Político Pedagógico

e Regimento Escolar – Sistema de Avaliação), teoria pedagógica

predominante no cotidiano escolar, encaminhamentos avaliativos

predominantes, como acontece a recuperação na escola, a realização

do Conselho de Classe, clareza para os alunos quanto aos instrumentos

de avaliação, entre outras.

Assim, quando indagados sobre qual teoria pedagógica

predomina no cotidiano escolar, a maioria dos professores considerou o

predomínio da tradicional. Entre outras respostas, pode-se destacar:

“Vivemos uma transição entre a tradicional à histórico-crítica, com o predomínio da primeira, ainda. Mas podemos nos deparar com todas em uma mesma instituição escolar”. (AN)

Sobre qual deve ser o objetivo do processo avaliativo

para que a escola cumpra sua função, destaca-se

“[...] observar os resultados obtidos no processo ensino-aprendizagem para reorganizar o trabalho pedagógico”;

“[...] perceber a deficiência de aprendizagem e revê-la”;

“[...] perceber se os objetivos têm sido alcançados por parte de quem ensina, se ocorre o aprendizado”;

“[...] verificar e sondar as suas falhas em relação ao ensino, para fazer as retomadas necessárias”;

Percebe-se através das respostas, que teoricamente a

maioria dos professores entende a avaliação como um processo. Os

resultados revelaram que principalmente os pedagogos, expressam

conceitos atualizados sobre a avaliação, fruto talvez da oportunidade

que tiveram de participar de cursos de capacitação e grupos de estudo

sobre o assunto.

No entanto, superar a dicotomia entre a teoria e a

prática requer do professor um salto de qualidade. É necessário, sólida

formação teórica para que seus objetivos não fiquem no plano ideal,

26

mas ganhem forma real. Que o seu saber fazer seja coerente com seu

discurso, pois o que muda é a prática.

O avanço teórico apontado pelas respostas dos

professores apresenta algumas contradições, quando no relato da

prática avaliativa é evidenciada a importância dada ao uso de

instrumentos e tarefas para a quantificação do saber.

Os professores responderam que predomina uma prática

classificatória e na sua grande maioria se reduzem na aplicação de

provas, testes, tarefas, pesquisas, como meios que podem revelar o

conhecimento através do resultado apresentado pela nota.

Esta prática, típica da avaliação classificatória, permite

perceber nitidamente a dicotomia entre a teoria que o professor

domina relativamente e a sua prática. Desta maneira, a avaliação

privilegia a memorização, avaliam-se muito mais a capacidade

minemônica dos alunos e não seu potencial crítico e criativo.

Isto se evidencia pelas seguintes respostas dos

professores quanto aos encaminhamentos avaliativos predominantes

na prática escolar:

“[...] avaliações classificatórias que exige muita memorização e não interpretação;

“[...] avaliações objetivas em detrimento às dissertativas (argumentativas)”;

“[...] Como Paulo Freire diz, socar o que foi ensinado. Educação bancária”;

Ao desvelar o nível do conhecimento dos alunos, se atém

apenas no limite da verificação. Neste caso, não há a preocupação com

o percurso da construção do resultado da aprendizagem do aluno. A

avaliação está comprometida apenas com o resultado, se resumindo na

apresentação quantitativa do saber configurado em uma nota.

Nesta perspectiva, o descompromisso em auxiliar o

aluno que apresenta dificuldades é a principal característica da função

classificatória da avaliação. Também colabora para que a escola

reforce aquilo que é frágil nos alunos.

27

Destaca-se ainda que, mesmo reduzindo-se a ênfase

dada à nota, é necessidade continuar existindo critérios de avaliação

para que o aluno possa ser atendido nas suas necessidades individuais,

quanto aos conteúdos essenciais do currículo. Pois ao não serem

atendidos, os professores estarão colaborando para que os alunos

fiquem à margem do processo de conhecimento, ou até mesmo

contribuam para expulsá-los da escola, seja pela evasão, seja pela

repetência.

Considerando que o objetivo dos instrumentos de

avaliação é levantar dados da realidade, em cima dos quais se dará o

julgamento e os encaminhamentos necessários, há toda uma solicitude

na confecção dos instrumentos.

A este respeito, a maioria dos professores respondeu que

às vezes há equívocos na elaboração dos instrumentos os quais

acabam não atingindo os objetivos esperados, pois não são claros e

compreensíveis para os alunos.

Diante dessas questões, foram analisados diversos

instrumentos de avaliação trazidos pelos professores nos quais foram

observados entre outros, os seguintes aspectos: a linguagem e os

enunciados com falta de clareza e objetividade, falta de cuidado

estético e correção gramatical, questões pouco diversificadas, pouco

privilégio quanto ao raciocínio e a argumentação, o instrumento não é

acompanhado por figuras, gráficos, tabelas, falta de clareza para os

alunos quanto aos objetivos que se quer alcançar, questões pouco

desafiadoras, os valores das questões que não são claros para os

alunos, a falta de contextualização das questões, a insuficiência da

relação com atividades práticas, a inexistência de graduação de

dificuldade, (questões fáceis, médias e complexas), etc.

As respectivas fragilidades foram analisadas na

perspectiva da necessidade do referencial teórico articulado com a

prática. Convém lembrar Libâneo quando afirma que

Essa compreensão do trabalho docente requer um professor capaz de encarar sua tarefa como parte da prática social global, para o que precisa adquirir um

28

conhecimento teórico que lhe permita pensar e agir sobre o real histórico e, também dominar os meios operacionais: o saber e o saber-fazer didáticos. (1992, p. 128)

Quanto ao questionamento sobre a recuperação de

estudos, esta se apresentou como uma questão polêmica e

contraditória. Houve uma maior divergência de pontos de vista.

Alguns professores responderam que esta é realizada de

forma paralela e contínua, com retomada de conteúdo e nova

avaliação, demonstrando que entendem a recuperação de estudo no

contexto da avaliação diagnóstica, pois os conteúdos do ensino são

retomados assim que se observa a sua não apreensão e compreensão

pelo aluno.

No entanto, quando da explicitação do tema no Grupo

de estudos com os professores, alguns deles, notadamente aqueles

que ministram aulas em turmas de 5ª a 8ª série e Ensino Médio

afirmaram que:

“[..] a recuperação deveria acabar, pois não leva a nada, que não há possibilidade de se efetivá-la, tendo em vista alguns fatores: o número de alunos nas salas de aula, o conteúdo que têm que vencer e o tempo gasto para preparar e aplicar as avaliações”. (LN)

Alguns ainda manifestaram a preocupação em recuperar

os conteúdos, mas a nota não, ou vice-versa. Neste sentido, o que

muitas vezes se observa no cotidiano escolar é que a recuperação só

acontece por força regimental ou muitas vezes não acontece.

A recuperação, o acompanhamento da aprendizagem é

um direito do aluno. No entanto, os professores não devem fazer a

recuperação apenas para cumprir uma formalidade legal, mas como

expressão do seu compromisso com a aprendizagem dos alunos.

Muitas vezes, há uma simples recuperação da “nota” e não do

fundamental que é a aprendizagem. Todavia, enquanto existir nota, a

recuperação da aprendizagem deverá repercutir na recuperação da

nota, pois só a reavaliação permitirá saber se houve a recuperação

pretendida. (Parecer do CNE/CEB nº. 12/1997).

29

Saber avaliar pressupõe o entendimento do porquê se

avalia. Assim, o professor que não trabalha a recuperação continuada

dos conteúdos, nega ao aluno o direito de acesso ao saber,

historicamente construído pela humanidade.

Com relação ao Conselho de Classe a pesquisa evidencia

que pouca coisa mudou desde sua implantação. Em vez de o Conselho

de Classe apresentar-se como um momento efetivo de análise, o que

se verifica é que durante os Conselhos de Classes “há um predomínio

de discussões relativas a questões disciplinares, relação família-escola,

nota, levantamento de problemas diversos, e em último caso,

intervenções pedagógicas”. “Levantam-se problemas e não se

apontam soluções”.

Afirmações como estas apontam a necessidade de

mudança na condução dos Conselhos de Classe, mas ao mesmo tempo

demonstram que os professores conseguem fazer a crítica de sua

própria prática, podendo ser o ponto de partida para fazer do Conselho

de Classe um real espaço de discussão, reflexão e orientação para uma

nova prática.

Contudo, esses mesmos professores expressam esta

necessidade e um caminhar nesta direção quando afirmam que

“grande parte dos professores já se conscientizaram da necessidade de

focalizarem no processo ensino-aprendizagem e não apenas no

comportamental”, ou “o objetivo maior é tentar modificar a prática

pedagógica, mas nem sempre os resultados de transformação são

atingidos” e ainda “realizamos o C.C. repensando a prática pedagógica.

Mas é um caminhar, ainda não é o ideal”.

Neste sentido, o Conselho de Classe deverá constituir-se

numa sessão onde cada um faz a sua intervenção com a devida

fundamentação teórico-científica exigida pela especificidade da

educação.

Outro aspecto observado pelos professores nas

discussões foi quanto à falta de tempo e espaço existente no

30

calendário escolar para a realização de um Conselho de Classe com

qualidade.

No entanto, na observação da prática encontrada, há

algumas situações em que há sobra de tempo e uma cobrança para

que o Conselho seja realizado rapidamente, demonstrando a

compreensão de que o mesmo é mais uma reunião burocrática, que

apenas deve ser cumprida atendendo a uma formalidade legal.

Percebe-se um caminhar ainda lento na direção da

participação do aluno no Conselho de Classe, seja por intermédio dos

representantes de turma, ou de um pré-conselho realizado pelo

professor conselheiro com os alunos, que depois encaminha os

resultados para o Conselho de Classe.

As escolas pesquisadas que relataram a experiência da

participação direta dos alunos no Conselho de Classe disseram que é

uma situação delicada, onde muitas vezes o professor é colocado

contra a parede. Disseram que a relação professor x aluno não se

altera durante a discussão do Conselho de Classe. Se o professor é

rígido na sala de aula, ele é rígido também no conselho. Há a quebra

do diálogo, e tanto os alunos como os colegas professores não têm

saída, aceitam os argumentos “inquestionáveis” do professor e tudo

fica do mesmo jeito.

Percebe-se então, que geralmente e corporativamente,

os professores têm retirado os alunos do processo de análise do

fenômeno pedagógico, do qual são sujeitos ativos.

É preciso destacar que os professores foram unânimes

em considerar a avaliação como o aspecto mais controvertido da

prática pedagógica e da relação professor-aluno.

Assinalaram a necessidade de se rever o processo de

avaliação, dado que “a avaliação não é compreendida na sua

verdadeira função, pois tem sido comprometida apenas com o

resultado e não com o processo ensino-aprendizagem.

A manifestação dos professores sobre o assunto

abordado neste processo de reflexão é que se puderam entender

31

muitas posturas dos professores frente aos problemas causados pela

sua formação fragmentada, o que os dificulta de ter uma visão da

totalidade do processo educacional, do qual a avaliação faz parte,

reproduzindo esta fragmentação com o aluno e reduzindo sua prática

avaliativa no meramente operatório.

A construção de uma nova prática avaliativa poderá ser

possível quando os professores perceberem que o acesso ao

conhecimento, o sucesso na escola, ou a aquisição de complexas

habilidades jamais podem ser conquistados pela mera repetição

generalizada, ou pela reprodução de verdades prontas e acabadas.

Os resultados destas análises demonstram que, na

concreticidade da luta pela democratização do saber na escola, a

avaliação apresenta-se como prática de natureza contraditória. Pois, se

por um lado, enquanto processo identificado com os princípios de

transformação social cria condições concretas para a existência de

uma escola comprometida com o projeto histórico da classe

trabalhadora, por outro lado, esta mesma prática encontra limites na

própria concretude histórica. Esses limites apontam para as

dificuldades e desvios que a prática da avaliação pode sofrer e

demonstram seu caráter polêmico. Considera-se que a superação deles

possa subsidiar a atuação do professor, sensibilizado com a

necessidade da escola pública vir atender, de modo satisfatório, aos

legítimos interesses das camadas populares.

CONCLUSÃO

O trabalho certamente não tem a pretensão de esgotar o

assunto, mas sim ampliar o debate em torno da avaliação da

aprendizagem, com a possibilidade de ser gerador de novas atitudes e

práticas capazes de contribuir para a aprendizagem dos alunos.

32

Procura, desta forma, trazer elementos interessantes

para as análises e a compreensão da realidade hoje vivida pela escola

diante das questões postas pelas práticas da avaliação escolar.

As referidas análises procuraram revelar os elementos

que têm permeado as práticas de avaliação, as condições objetivas e o

ideário pedagógico construído historicamente, que fundamentam as

referidas práticas, objetivando eliminar-se assim, uma prática acrítica,

supostamente neutra, sem as devidas análises de seus pressupostos

básicos e sem a clareza dos fins a que elas servem.

Sendo assim, é fundamental que se entenda que a

avaliação está intimamente relacionada ao modelo epistemológico

educativo adotado. Ela corresponde ao que se pensa e se espera dos

objetivos da educação e, por isso mesmo, tem variado no decorrer dos

tempos, sofrendo a influência de valorações diversas que se acentuam

em momentos distintos.

Dessa forma, é necessário se desenvolver um amplo

processo de reflexão das práticas avaliativas, um questionamento das

concepções de ensino e avaliação predominantes e ainda dos sentidos

e significados das avaliações, nesse contexto, pois os processos de

avaliação refletem o posicionamento dos professores, suas concepções.

A maneira de avaliar e o entendimento do que seja

avaliação precisa ser revisado para que se produzam novas práticas

avaliativas mais condizentes com uma educação democrática. É

necessário ter clareza do porque se avalia e da relação entre avaliação

e ensino/aprendizagem, de que se avalia para possibilitar uma

intervenção na realidade para transformá-la. Para Barcellos (apud,

PARANÁ, 1993, p. 45) “Avalia-se porque é preciso ensinar e não porque

se ensinou”.

Se as nossas metas são educação e transformação,

temos que mudar nossa concepção de avaliação e romper com padrões

estabelecidos pela própria história de uma sociedade elitista e

desigual.

33

Torna-se necessário ampliar o conceito de avaliação

escolar porque a construção desse processo não envolve apenas

pensar em novas formas de avaliação, em novos instrumentos de

verificação da aprendizagem do aluno ou em alteração dos conteúdos

escolares, das provas ou dos formatos dos exercícios. Envolve uma

compreensão diferenciada do seu significado.

A transformação da prática pedagógica liga-se

estreitamente à alteração da concepção de avaliação. De uma

concepção autoritária, seletiva, excludente, utilizada como um recurso

de autoridade, que decide sobre os destinos do aluno, para uma

concepção democrática e emancipadora, preocupada com a função

essencial da escola que é a socialização do saber sistematizado, e com

o estabelecimento da autonomia do aluno, assumindo o papel de

auxiliar o seu crescimento, comprometendo-se com a sua

aprendizagem.

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