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Sábado 10.2.2018 l Segundo Caderno l O GLOBO l 7 QUESTÃO DE GÊNERO R ecentemente, entrevistei uma bela mu- lher de 74 anos. Quando eu disse que ela parecia muito mais jovem e tinha um corpo mara- vilhoso, fiquei surpresa com a sua reação: — Minha neta diz que sou uma velha ridícula e que não tenho mais idade para usar leg- ging, camiseta e tênis o tempo todo. Ela tem vergonha de sair comigo, quer que eu me com- porte como uma senhorinha. Mas o que deve vestir uma mu- lher da minha idade para fazer ginástica? Ela me critica tanto que estou acreditando que sou uma velha ridícula. No livro “Por que os homens preferem as mulheres mais ve- lhas?”, mostrei muitos relatos dos preconceitos que as mu- lheres sofrem, como o de uma jornalista de 67 anos. “Minha filha me chama de ve- lha doida, coroa piriguete, ve- lhota sem noção e sem vergo- nha na cara, porque meu namo- rado tem 40 anos. Ela diz que ele tem idade para ser meu filho e tem nojo de imaginar que nós transamos. Diz que eu já tenho netos e devia ter me aposentado nesse departamento.” Uma professora aposentada de 72 anos não aguenta mais as ofensas das duas filhas. “Elas querem controlar tudo, desde minha forma de vestir até o meu dinheiro. Querem que eu pare de viajar, ir a restaurantes e shows, como se tudo o que eu ganhei na vida fosse delas. Elas me xingam de velha gagá, velha maluca, ameaçam pedir a mi- nha interdição por dilapidar o patrimônio da família. Acham que eu tenho que ficar trancada em casa cuidando dos netos.” Em inúmeras entrevistas, en- contrei o mesmo tom precon- ceituoso e desrespeitoso com o envelhecimento feminino. “Tenho 61 anos, mas meu cor- po não mudou quase nada. Fui comprar um jeans de uma grife famosa e a vendedora me tratou com total desprezo. Seu olhar de nojo gritava: ‘Você não se en- xerga, sua velha baranga? Não quero a etiqueta da minha loja desfilando na bunda de uma ve- lha decrépita’ . Fiquei chocada, já que as jovens falam tanto de so- roridade, de feminismo, de em- poderamento. Como ela não percebe que está sendo cúmpli- ce da violência que todas as mulheres sofrem, que está ali- mentando o preconceito contra si mesma no futuro?” Na minha pesquisa com 1.700 moradores do Rio, as mulheres mais jovens (espe- cialmente as que têm entre 25 e 45 anos) são as que de- monstram estar mais infeli- zes, insatisfeitas, frustradas, deprimidas e exaustas. Elas reclamam, principalmente, de falta de tempo, falta de re- conhecimento e falta de li- berdade. Algumas ainda di- zem que “falta tudo”! Perguntei o que elas mais invejam nos homens. Elas responderam, em primeirís- simo lugar: liberdade. Em se- guida disseram: fazer xixi em pé. Elas também invejam a li- berdade masculina com o próprio corpo e a liberdade sexual. Sessenta por cento das mulheres que eu pesqui- sei invejam a capacidade masculina de brincar e de rir de qualquer bobagem. Per- guntei: “Por que vocês não ri- em mais?” Elas responderam: “Porque eu não tenho tempo ou tenho muito medo do que os outros vão pensar.” Quando perguntei aos ho- mens o que eles mais invejam nas mulheres, eles responde- ram simplesmente: nada. Também perguntei o que as mulheres mais invejam em ou- tras mulheres. Elas responde- ram: corpo, beleza, juventude, magreza e sensualidade. O cor- po invejado por elas é jovem, magro e sensual. No Brasil, este modelo de corpo é considerado um verdadeiro capital. N ão é à toa que as brasileiras estão entre as maiores con- sumidoras de todo o mundo de ci- rurgia plásti- ca, Botox, preenchimentos, tintura para cabelo, remédios para emagrecer, moderadores de apetite, medicamentos para dormir e ansiolíticos. São as que estão mais insatisfeitas com o próprio corpo, e as que mais deixam de sair de casa, ir a festas e até mesmo de traba- lhar quando se sentem velhas, gordas e feias. Elas têm um verdadeiro pânico de envelhe- cer, como mostra uma profes- sora de 45 anos. “A minha maior crise foi quan- do fiz 40 anos. Todas as minhas amigas e colegas de trabalho já fizeram plástica, Botox e preen- chimento. Minha filha me proi- biu de usar minissaia, shorts e biquíni. Estou na fase do ‘será que eu posso?’ Tenho que pas- sar pelo julgamento dela antes de sair de casa. Eu me sinto invi- sível, transparente, ignorada, uma mulher ‘nem, nem’: nem jovem, nem velha.” Em um momento de impor- tantes lutas e conquistas femi- nistas, é fundamental denun- ciar as pressões sociais que le- vam tantas brasileiras a aceitar e fortalecer, com seus medos e inseguranças, os preconceitos e estigmas relacionados ao en- velhecimento feminino. Simone de Beauvoir escreveu que velho é sempre o outro, já que a maior parte das pessoas de mais idade só se sente velha por meio do olhar dos outros, sem terem experimentado grandes transformações interi- ores ou até mesmo exteriores. No entanto, ela alertava: velho não é o outro, pois a velhice está inscrita em cada um de nós. Vale a pena lembrar que a única categoria social que in- clui todo mundo é velho. So- mos classificados como ho- mem ou mulher, negro ou branco, homo ou heterossexu- al, mas velho todo mundo é: hoje ou amanhã. A jovem de hoje é a mulher de mais idade amanhã. Só assumindo cons- ciente e plenamente, em todas as fases da vida, que nós tam- bém somos ou seremos velhas, poderemos ajudar a derrubar os medos, estereótipos e pre- conceitos existentes sobre o envelhecimento feminino. Por isso defendo que, como nos movimentos libertários do século passado, todas as mu- lheres, de todas as idades, de- veriam vestir uma camiseta com os dizeres: “Eu também sou velha. E velha é linda! So- mos livres, enfim!” Cada uma de nós, principal- mente as mais jovens, deveria se reconhecer na velha que é hoje ou na velha que será amanhã. Velha não é a outra; velha sou eu! l AOS QUASE 60 ANOS, Madonna posta foto com seio de fora, desperta a fúria de ‘haters’ e chama a atenção para um tipo de conflito que parece não ter entrado na pauta feminista. Por que, num mundo em que as mulheres mais velhas estão produtivas e são até ícones fashion, é tão difícil derrubar estigmas e evitar o julgamento, muitas vezes vindo das jovens? Velha sou eu! MIRIAN GOLDENBERG* Especial para O GLOBO [email protected] O preconceito das jovens contra si mesmas * Antropóloga, professora titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e autora de “A bela velhice” (Record) M adonna, aquela que já bei- jou um santo católico e ateou fogo em cruzes, que simulou masturbação no meio dos shows e que cantou o sado- masoquismo e o sexo sem pudo- res, recentemente causou polê- mica de novo. Ao compartilhar uma foto em que estava nua, sem produção e sem retoques (havia apenas uma tarja cobrindo seus mamilos), a cantora de quase 60 anos recebeu uma chuva de críti- cas. Não que sua nudez fosse al- guma novidade. De seios ao ven- to, ela encerrou o desfile do ami- go Jean Paul Gaultier em 1992, por exemplo. O problema, se- gundo os haters, seria o fato de ela ser uma “senhora” que “deve- ria se dar ao respeito” , que aquilo era “patético” e “vergonhoso” . A reação gerou uma onda de deba- tes sobre etarismo (ou gerofobia). Em outras palavras, o preconcei- to contra pessoas mais velhas, es- pecialmente as mulheres. Para a cientista social e ativista do feminismo Mariana Varella, de 44 anos, a ideia de mulher no imaginário coletivo é sempre muito jovem. Ela lembra que, na ficção, personagens masculinos de 60 anos se envolvem com mulheres bem mais novas, de 20, 30, e isso não causa espanto. — O contrário não é bem vis- to. Às mulheres, não é permiti- do viver a velhice — analisa. — A mulher mais velha não cos- tuma ser representada como uma pessoa capaz de produzir intelectualmente, com vida se- xual ativa, que se diverte. As pessoas acham que a mu- lher envelhece e deixa de ser quem ela é, deixa de gostar do que ela gosta, observa Mariana: — Madonna sempre foi pro- vocadora e contestadora, achar que ela envelheceu e vai virar uma senhorinha é muita ingenuidade. Nas redes sociais, o surgimen- to de influencers da terceira ida- de (ou à beira dela) vem cha- mando a atenção. É o caso de Beth Djalali, de 59 anos, a @sty- leatacertainage, Sarah-Jane Adams, de 62, a @saramai- jewels, e Dorrie Jacobson, de 82, a @seniorstylebible. — Eu posso estar nos meus 80 anos, mas ainda consigo sustentar um par de calças justas de couro e salto agulha — diz Dorrie. Ex-coelhinha da “Playboy”, com 21,3 mil seguidores no Ins- tagram, ela percebe que algo es- tá mudando na sociedade, que as mulheres estão envelhecen- do de uma maneira muito dife- rente da geração anterior: — Não estamos sentadas nu- ma cadeira tricotando sapati- nhos para nossos netos. Esta- mos por aí gerenciando negó- cios, correndo maratonas, saindo com pessoas que co- nhecemos na internet, nos di- vertindo. Não vamos permitir que a sociedade faça com que nos sintamos invisíveis. Designer de joias inglesa radi- cada na Austrália, Sarah-Jane Adams acredita arrebanhar 163 mil seguidores em seu Insta- gram, no qual publica fotos diá- rias de seus looks extravagantes, justamente por sua “atitude”: — Em qualquer idade, é muito mais importante entender sobre si mesmo e ser feliz do que se preocupar com o que os outros pensam ser apropriado sobre o seu comportamento. Sugiro que as pessoas olhem para dentro e não para fora, buscando aprova- ção. Minha idade não tem nada a ver com a minha atitude. Escritora, casada há 34 anos, mãe de três filhos e dona de dois gatos e um cachorro, Beth não está nem aí para a turma que patrulha seu figurino. E faz sucesso no Instagram, com 45,4 mil seguidores que acom- panham dia a dia seus looks. — Mas alguns criticam quando minhas saias estão curtas, que “jeans justos, não” , que cabelo grisalho me envelhece — conta. — Há uma lista circulando que diz o que uma mulher da minha idade não deve fazer. Quem criou essas regras? Nunca recebi o me- morando com todos esses certos e errados. Se tivesse recebido, te- ria rasgado e jogado fora. l DE SALTO AOS 80. POR QUE NÃO? REPRODUÇÃO Poderosas. Em sentido horário, a partir do alto, Madonna, Beth Djalali, Dorrie Jacobson e Sarah-Jane Adams: ícones sem idade LIV BRANDÃO [email protected] ARI SETH COHEN/DIVULGAÇÃO FOTOS DE DIVULGAÇÃO

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Sábado 10 .2 .2018 l Segundo Caderno l O GLOBO l 7

QUESTÃO DE GÊNERO

Recentemente,entrevisteiuma bela mu-lher de 74anos. Quandoeu disse queela pareciamuito mais

jovem e tinha um corpo mara-vilhoso, fiquei surpresa com asua reação:

— Minha neta diz que souuma velha ridícula e que nãotenho mais idade para usar leg-ging, camiseta e tênis o tempotodo. Ela tem vergonha de saircomigo, quer que eu me com-porte como uma senhorinha.Mas o que deve vestir uma mu-lher da minha idade para fazerginástica? Ela me critica tantoque estou acreditando que souuma velha ridícula.

No livro “Por que os homenspreferem as mulheres mais ve-lhas?”, mostrei muitos relatosdos preconceitos que as mu-lheres sofrem, como o de umajornalista de 67 anos.

“Minha filha me chama de ve-lha doida, coroa piriguete, ve-lhota sem noção e sem vergo-

nha na cara, porque meu namo-rado tem 40 anos. Ela diz queele tem idade para ser meu filhoe tem nojo de imaginar que nóstransamos. Diz que eu já tenhonetos e devia ter me aposentadonesse departamento.”

Uma professora aposentadade 72 anos não aguenta maisas ofensas das duas filhas.

“Elas querem controlar tudo,desde minha forma de vestir atéo meu dinheiro. Querem que eupare de viajar, ir a restaurantes eshows, como se tudo o que euganhei na vida fosse delas. Elasme xingam de velha gagá, velhamaluca, ameaçam pedir a mi-nha interdição por dilapidar opatrimônio da família. Achamque eu tenho que ficar trancadaem casa cuidando dos netos.”

Em inúmeras entrevistas, en-contrei o mesmo tom precon-ceituoso e desrespeitoso com oenvelhecimento feminino.

“Tenho 61 anos, mas meu cor-po não mudou quase nada. Fuicomprar um jeans de uma grifefamosa e a vendedora me tratoucom total desprezo. Seu olharde nojo gritava: ‘Você não se en-xerga, sua velha baranga? Nãoquero a etiqueta da minha lojadesfilando na bunda de uma ve-lha decrépita’. Fiquei chocada, já

que as jovens falam tanto de so-roridade, de feminismo, de em-poderamento. Como ela nãopercebe que está sendo cúmpli-ce da violência que todas asmulheres sofrem, que está ali-mentando o preconceito contrasi mesma no futuro?”

Na minha pesquisa com1.700 moradores do Rio, asmulheres mais jovens (espe-cialmente as que têm entre25 e 45 anos) são as que de-monstram estar mais infeli-zes, insatisfeitas, frustradas,deprimidas e exaustas. Elasreclamam, principalmente,de falta de tempo, falta de re-conhecimento e falta de li-berdade. Algumas ainda di-zem que “falta tudo”!

Perguntei o que elas maisinvejam nos homens. Elasresponderam, em primeirís-simo lugar: liberdade. Em se-guida disseram: fazer xixi empé. Elas também invejam a li-berdade masculina com opróprio corpo e a liberdadesexual. Sessenta por centodas mulheres que eu pesqui-sei invejam a capacidademasculina de brincar e de rirde qualquer bobagem. Per-guntei: “Por que vocês não ri-em mais?” Elas responderam:

“Porque eu não tenho tempoou tenho muito medo do queos outros vão pensar.”

Quando perguntei aos ho-mens o que eles mais invejamnas mulheres, eles responde-ram simplesmente: nada.

Também perguntei o que asmulheres mais invejam em ou-tras mulheres. Elas responde-ram: corpo, beleza, juventude,magreza e sensualidade. O cor-po invejado por elas é jovem,magro e sensual. No Brasil, estemodelo de corpo é consideradoum verdadeiro capital.

Não é à toa queas brasileirasestão entre asmaiores con-sumidorasde todo omundo de ci-rurgia plásti-

ca, Botox, preenchimentos,tintura para cabelo, remédiospara emagrecer, moderadoresde apetite, medicamentos paradormir e ansiolíticos. São asque estão mais insatisfeitascom o próprio corpo, e as quemais deixam de sair de casa, ira festas e até mesmo de traba-lhar quando se sentem velhas,gordas e feias. Elas têm um

verdadeiro pânico de envelhe-cer, como mostra uma profes-sora de 45 anos.

“A minha maior crise foi quan-do fiz 40 anos. Todas as minhasamigas e colegas de trabalho jáfizeram plástica, Botox e preen-chimento. Minha filha me proi-biu de usar minissaia, shorts ebiquíni. Estou na fase do ‘seráque eu posso?’ Tenho que pas-sar pelo julgamento dela antesde sair de casa. Eu me sinto invi-sível, transparente, ignorada,uma mulher ‘nem, nem’: nemjovem, nem velha.”

Em um momento de impor-tantes lutas e conquistas femi-nistas, é fundamental denun-ciar as pressões sociais que le-vam tantas brasileiras a aceitare fortalecer, com seus medos einseguranças, os preconceitose estigmas relacionados ao en-velhecimento feminino.

Simone de Beauvoir escreveuque velho é sempre o outro, jáque a maior parte das pessoasde mais idade só se sente velhapor meio do olhar dos outros,sem terem experimentadograndes transformações interi-ores ou até mesmo exteriores.No entanto, ela alertava: velhonão é o outro, pois a velhice estáinscrita em cada um de nós.

Vale a pena lembrar que aúnica categoria social que in-clui todo mundo é velho. So-mos classificados como ho-mem ou mulher, negro oubranco, homo ou heterossexu-al, mas velho todo mundo é:hoje ou amanhã. A jovem dehoje é a mulher de mais idadeamanhã. Só assumindo cons-ciente e plenamente, em todasas fases da vida, que nós tam-bém somos ou seremos velhas,poderemos ajudar a derrubaros medos, estereótipos e pre-conceitos existentes sobre oenvelhecimento feminino.

Por isso defendo que, comonos movimentos libertários doséculo passado, todas as mu-lheres, de todas as idades, de-veriam vestir uma camisetacom os dizeres: “Eu tambémsou velha. E velha é linda! So-mos livres, enfim!”

Cada uma de nós, principal-mente as mais jovens, deveriase reconhecer na velha que éhoje ou na velha que seráamanhã. Velha não é a outra;velha sou eu! l

AOS QUASE 60 ANOS, Madonna posta foto com seio de fora, desperta a fúria de ‘haters’ e chama a atenção para um tipo de conflito que parece não ter entrado na pauta feminista. Por que, num mundo em que as mulheres mais velhas estão produtivas e são até íconesfashion, é tão difícil derrubar estigmas e evitar o julgamento, muitas vezes vindo das jovens?

Velha sou eu!MIRIAN GOLDENBERG*Especial para O [email protected]

O preconceito das jovens contra si mesmas

* Antropóloga, professora titularda Universidade Federal do Riode Janeiro (UFRJ) e autora de “Abela velhice” (Record)

Madonna, aquela que já bei-jou um santo católico eateou fogo em cruzes, que

simulou masturbação no meiodos shows e que cantou o sado-masoquismo e o sexo sem pudo-res, recentemente causou polê-mica de novo. Ao compartilharuma foto em que estava nua, semprodução e sem retoques (haviaapenas uma tarja cobrindo seusmamilos), a cantora de quase 60anos recebeu uma chuva de críti-cas. Não que sua nudez fosse al-guma novidade. De seios ao ven-to, ela encerrou o desfile do ami-go Jean Paul Gaultier em 1992,por exemplo. O problema, se-gundo os haters, seria o fato deela ser uma “senhora” que “deve-ria se dar ao respeito”, que aquiloera “patético” e “vergonhoso”. Areação gerou uma onda de deba-tes sobre etarismo (ou gerofobia).Em outras palavras, o preconcei-to contra pessoas mais velhas, es-pecialmente as mulheres.

Para a cientista social e ativistado feminismo Mariana Varella,de 44 anos, a ideia de mulher noimaginário coletivo é sempremuito jovem. Ela lembra que, naficção, personagens masculinosde 60 anos se envolvem commulheres bem mais novas, de20, 30, e isso não causa espanto.

— O contrário não é bem vis-to. Às mulheres, não é permiti-do viver a velhice — analisa. —A mulher mais velha não cos-tuma ser representada comouma pessoa capaz de produzirintelectualmente, com vida se-xual ativa, que se diverte.

As pessoas acham que a mu-lher envelhece e deixa de serquem ela é, deixa de gostar doque ela gosta, observa Mariana:

— Madonna sempre foi pro-

vocadora e contestadora,achar que ela envelheceu e vaivirar uma senhorinha é muitaingenuidade.

Nas redes sociais, o surgimen-to de influencers da terceira ida-de (ou à beira dela) vem cha-mando a atenção. É o caso deBeth Djalali, de 59 anos, a @sty-

leatacertainage, Sarah-JaneAdams, de 62, a @saramai-jewels, e Dorrie Jacobson, de 82,a @seniorstylebible.

— Eu posso estar nos meus80 anos, mas ainda consigosustentar um par de calçasjustas de couro e salto agulha— diz Dorrie.

Ex-coelhinha da “Playboy”,com 21,3 mil seguidores no Ins-tagram, ela percebe que algo es-tá mudando na sociedade, queas mulheres estão envelhecen-do de uma maneira muito dife-rente da geração anterior:

— Não estamos sentadas nu-ma cadeira tricotando sapati-

nhos para nossos netos. Esta-mos por aí gerenciando negó-cios, correndo maratonas,saindo com pessoas que co-nhecemos na internet, nos di-vertindo. Não vamos permitirque a sociedade faça com quenos sintamos invisíveis.

Designer de joias inglesa radi-cada na Austrália, Sarah-JaneAdams acredita arrebanhar 163mil seguidores em seu Insta-gram, no qual publica fotos diá-rias de seus looks extravagantes,justamente por sua “atitude”:

— Em qualquer idade, é muitomais importante entender sobresi mesmo e ser feliz do que sepreocupar com o que os outrospensam ser apropriado sobre oseu comportamento. Sugiro queas pessoas olhem para dentro e

não para fora, buscando aprova-ção. Minha idade não tem nadaa ver com a minha atitude.

Escritora, casada há 34 anos,mãe de três filhos e dona dedois gatos e um cachorro, Bethnão está nem aí para a turmaque patrulha seu figurino. E fazsucesso no Instagram, com45,4 mil seguidores que acom-panham dia a dia seus looks.

— Mas alguns criticam quandominhas saias estão curtas, que“jeans justos, não”, que cabelogrisalho me envelhece — conta.— Há uma lista circulando quediz o que uma mulher da minhaidade não deve fazer. Quem criouessas regras? Nunca recebi o me-morando com todos esses certose errados. Se tivesse recebido, te-ria rasgado e jogado fora. l

DE SALTOAOS 80.POR QUENÃO?

REPRODUÇÃO

Poderosas. Emsentido horário,a partir do alto,Madonna, BethDjalali, DorrieJacobson eSarah-JaneAdams: íconessem idade

LIV BRANDÃO

[email protected]

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