varsóvia: no caminho para paris - expectativas da rede de ação climática para a cop19

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Varsóvia: No caminho para Paris Como a Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas em Varsóvia (de 11 a 22 de Novembro de 2013) deve aumentar o nível de ambição no curto prazo e estabelecer um caminho de combate às alterações climáticas para 2015 A partir de um conjunto de decisões tomadas em 2011, na 17ª Conferência das Partes (COP17) da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC, na sigla em inglês), em Durban, na África do Sul, os países presentes reafirmaram a sua vontade em ultrapassar o problema das alterações climáticas. Estas decisões foram reafirmadas na COP18, em Doha, Qatar, o ano passado, mas ainda não saíram do papel, pois as emissões globais de gases de efeito de estufa (GEE) continuam a empurrar o mundo para um aumento de temperatura de 4 graus Celsius até ao final deste século, em relação aos níveis de temperatura préindustrial. Porém, os limites do planeta e o presente estado de equilíbrio dos ecossistemas estão prestes a ser ultrapassados. Já assistimos a impactes devastadores das alterações climáticas um pouco por todo o mundo, em forma de tempestades, cheias, secas e um número crescente de eventos climáticos extremos. Os impactes das alterações climáticas estão a custar aos países, recursos financeiros escassos, enquanto a economia global continua a enfrentar uma enorme crise. Os impactes são tratados de forma isolada e temporária, enquanto a raiz do problema continua a ser ignorada. A falta de vontade política continua a ser o maior entrave ao progresso das negociações no quadro da Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (UNFCCC, em inglês). A insuficiência de recursos financeiros tem dificultado ações de mitigação mais ambiciosas e a operacionalização efetiva dos mecanismos que podem ajudar ao lidar com os impactes das alterações climáticas, ao nível mundial. Equidade, perdas e danos, são outras questões chave que continuam a ser ignoradas. Chegou a hora dos países enfrentarem a realidade das alterações climáticas, de mostrarem liderança e coragem para tomarem as difíceis decisões necessárias neste momento. A falta de vontade política não deve continuar a impedir a definição de ações ambiciosas para enfrentar as alterações climáticas. O caminho para um futuro climático seguro ainda é possível. Para isso os países presentes na COP19, em Varsóvia, devem tomar as decisões necessárias para um aumento de temperatura global abaixo dos 2,0 1,5 graus Celsius. É necessário um acordo climático global em 2015 e, até lá, só temos mais duas reuniões entre as partes. O tempo é essencial para este objetivo e há muitos assuntos por resolver e a falta de confiança entre países é o principal.

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Como a Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas em Varsóvia (de 11 a 22 de Novembro de 2013) deve aumentar o nível de ambição no curto prazo e estabelecer um caminho de combate às alterações climáticas para 2015. Mais em http://varsovia.blogs.sapo.pt/

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Page 1: Varsóvia: No caminho para Paris - Expectativas da Rede de Ação Climática para a COP19

 

Varsóvia: No caminho para Paris   

Como a Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas em Varsóvia (de 11 a 22 de Novembro de 2013) deve aumentar o nível de ambição no curto prazo e 

estabelecer um caminho de combate às alterações climáticas para 2015   A partir de um conjunto de decisões tomadas em 2011, na 17ª Conferência das Partes (COP17) da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC, na sigla em inglês), em Durban, na África do Sul, os países presentes reafirmaram a sua vontade em ultrapassar o problema das alterações climáticas. Estas decisões foram reafirmadas na COP18, em Doha, Qatar, o ano passado, mas ainda não saíram do papel, pois as emissões globais de gases de efeito de estufa (GEE) continuam a empurrar o mundo para um aumento de temperatura de 4 graus Celsius até ao final deste século, em relação aos níveis de temperatura pré‐industrial.   Porém, os limites do planeta e o presente estado de equilíbrio dos ecossistemas estão prestes a ser ultrapassados. Já assistimos a impactes devastadores das alterações climáticas um pouco por todo o mundo, em forma de tempestades, cheias, secas e um número crescente de eventos climáticos extremos. Os impactes das alterações climáticas estão a custar aos países, recursos financeiros escassos, enquanto a economia global continua a enfrentar uma enorme crise. Os impactes são tratados de forma isolada e temporária, enquanto a raiz do problema continua a ser ignorada.   A falta de vontade política continua a ser o maior entrave ao progresso das negociações no quadro da Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (UNFCCC, em inglês). A insuficiência de recursos financeiros tem dificultado ações de mitigação mais ambiciosas e a operacionalização efetiva dos mecanismos que podem ajudar ao lidar com os impactes das alterações climáticas, ao nível mundial. Equidade, perdas e danos, são outras questões chave que continuam a ser ignoradas.  Chegou a hora dos países enfrentarem a realidade das alterações climáticas, de mostrarem liderança e coragem para tomarem as difíceis decisões necessárias neste momento. A falta de vontade política não deve continuar a impedir a definição de ações ambiciosas para enfrentar as alterações climáticas.   O caminho para um futuro climático seguro ainda é possível. Para isso os países presentes na COP19, em Varsóvia, devem tomar as decisões necessárias para um aumento de temperatura global abaixo dos 2,0 ‐ 1,5 graus Celsius. É necessário um acordo climático global em 2015 e, até lá, só temos mais duas reuniões entre as partes. O tempo é essencial para este objetivo e há muitos assuntos por resolver e a falta de confiança entre países é o principal.       

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A COP19 deve ter como objetivo trabalhar para um plano climático justo, ambicioso e vinculativo aplicado a todo o mundo. A CAN considera que a prioridade da COP19 deve ser o aumento da ambição de redução de emissões a curto‐prazo e de financiamento das medidas. Estes resultados ajudarão a construir confiança entre os países e criar um momento positivo no caminho do regime climático pós‐2015.  O que pode ser feito a curto‐prazo na COP19 – Pré‐2020   Mitigação 

Os países precisam de se esforçar para que o pico global de emissões ocorra em 2015. As partes precisam de acordar um processo para adotar uma decisão sobre o pico de emissões, que dever ocorrer o mais cedo possível. 

Os países desenvolvidos devem acordar num imediato aumento da ambição da redução das emissões pré‐2020. 

Os países em desenvolvimento que ainda não lançaram o seu Plano Nacional de Ação de Mitigação (NAMA, na sigla em inglês) devem fazê‐lo de imediato. 

Devem ser exploradas formas dos países em desenvolvimento contribuírem para ações globais de mitigação, respeitando as diferentes capacidades e responsabilidades. Incentivos financeiros adequados, bem como outros meios de implementação, aumentarão o potencial de mitigação atual. 

Deve ser criada uma estrutura de apoio às Energias Renováveis e Eficiência Energética (ER & EE) que permita à UNFCCC desempenhar um papel de facilitador e coordenador na ampliação das ER & EE em todo o mundo. 

Deve ser mostrado forte apoio político a outas medidas complementares para a redução de emissões, especialmente em relação ao abandono progressivo dos gases HFC, redução as emissões da aviação e navegação marítima e ao fim dos subsídios aos combustíveis fósseis. 

 Financiamento 

Todos os países desenvolvidos devem assegurar o valor de financiamento climático com o qual já se comprometeram entre 2013 e 2015, e garantirem o objetivo de médio prazo de financiamento público no valor de 60 mil milhões de dólares. 

Deve ser conseguido um roteiro concreto para conseguir um financiamento anual de 100 mil milhões de dólares a partir de 2020, através de novas e adicionais formas de financiamento público. 

Deve ser assumido o compromisso de alocar metade do financiamento público em adaptação. 

Deve ser assumido um compromisso financeiro imediato e substancial para o Fundo Verde para o Clima, o Fundo de Adaptação e o Fundo para os Países Menos Desenvolvidos. 

 Tecnologia 

Providenciar um fundo de longo prazo para o mecanismo tecnológico, recorrendo a uma avaliação dos impactes tecnológicos, bem como a uma análise das tecnologias chave cujo desenvolvimento poderá trazer a maior e mais rápida redução sustentável de emissões. Acordar num processo para conseguir em 2015 um Plano de Ação Tecnológico. 

   Florestas (REDD/LULUCF) 

A Redução de Emissões da Desflorestação e Degradação Florestal (REDD, na sigla em inglês) é fundamental para reduzir as emissões. No entanto, é necessário financiamento 

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em quantidades significativas e para tal é necessário que o programa de financiamento REDD+ (o programa da UNFCCC sobre REDD nos países em desenvolvimento) seja alargado. As regras relacionadas com o Uso do Solo, Alterações do Uso do Solo e Floresta (LULUCF, na sigla em inglês) e alguns elementos do REDD+ devem ser clarificados.  

 Adaptação 

É necessário reforçar imediatamente as ações de adaptação incluindo financiamento para adaptação, acordo sobre a próxima fase do Programa de Trabalhos de Nairobi, compromisso para prosseguir com a implementação completa dos Programas Nacionais de Ação sobre Adaptação (NAPAs, na sigla em inglês) e prestar apoio aos Países Menos Avançados, bem como reforçar o apoio necessário aos países mais vulneráveis para desenvolverem os seus NAPAs nos próximos dois anos.  

  Desenho do Acordo de 2015 e os elementos essenciais para o seu alcance  Jurídico 

O âmbito, a estrutura e o formato do acordo de 2015 deve ser consistente com o objetivo de não aumentar mais de 1,5 graus Celsius no quadro de um balanço global de carbono, incluindo os objetivos e ações dentro de um quadro equitativo que permita o apoio financeiro, tecnológico e de capacitação aos países que necessitarem. 

O acordo de 2015 deve ser construído, desenvolvido e melhorado com base nas regras já definidas no Protocolo de Quioto e na Convenção, de forma transparente, com métodos apropriados de cálculo e de efetivo cumprimento, respeitando os princípios de equidade. 

O formato do acordo de 2015 deve ser justo, ambicioso e vinculativo.  

Equidade 

Não haverá um acordo ambicioso em 2015 sem equidade e não haverá equidade sem um acordo ambicioso em 2015. 

Os países devem estar de acordo sobre um Quadro de Referência de Equidade que assegure que os compromissos – de mitigação e apoio financeiro – podem ser avaliados de forma objetiva e rigorosa de acordo com balanços específicos das emissões globais e as estimativas do financiamento climático necessário. 

A CAN desenvolveu uma lista de cinco indicadores de equidade: Adequação, Responsabilidade, Capacidade, Necessidades de desenvolvimento e Necessidades de adaptação. Com estes indiciadores é possível atingir o âmago da Convenção.  

Os “países campeões” da equidade devem dar um passo em frente e conduzir o processo de equidade. Na COP 19 deve ser organizada uma discussão em torno de um Quadro de Referência de Equidade e de Indicadores de Equidade. 

A COP 19 deve trabalhar no sentido do desenvolvimento acelerado de um Quadro de Referência de Equidade que seja aplicado a todos, num processo técnico independente. 

 Mitigação 

Os países precisam de, em conjunto, acordar em objetivos de redução de emissões de médio e longo prazo (2030, 2040 e 2050). Estes objetivos devem estar referenciados no acordo vinculativo de 2015 e devem ter por base rigorosos estudos científicos.   

Todos os países devem apresentar compromissos e ações de mitigação justos e adequados, para pós‐2020. Estes compromissos e ações devem ser apresentados até à COP 20 (em 2014), segundo um método comum para todos os países para assegurar a transparência, e regras de medição, comunicação e verificação (MRV, na sigla em inglês) de forma que seja possível a comparação com os compromissos nacionais assumidos.  

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 Financiamento 

Fixar um espaço de negociação para financiamento climático ao alto‐nível, no âmbito da COP. 

Assegurar um processo rápido sobre os seguintes assuntos, relacionados com o financiamento: adequação e crescimento, adicionalidade, coerência, racionalização e transparência. 

Um mecanismo de revisão que avalie a adequação dos compromissos financeiros assumidos de forma regular. 

Um acordo sobre financiamento público entre 2020‐2025 e a inclusão de fontes alternativas de financiamento que contribuam para a obtenção de financiamento público na escala adequada. 

 Revisão 

Início do Grupo Conjunto de Trabalho (JCG, na sigla em inglês) sobre a Primeira Revisão Periódica. Os países devem promover uma sessão de trabalho durante a COP 19 sobre a ciência climática, para que sejam assinaladas as conclusões sobre os avanços científicos, especialmente do mais recente relatório do Grupo de Trabalho 1 do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC, na sigla em inglês).  

 Adaptação 

O acordo de 2015 deve reconhecer que a falta de ambição na mitigação agrava as necessidades de adaptação das populações mais pobres e vulneráveis. 

Explorar as opções, benefícios e limitações dos objetivos globais de adaptação. 

O desenvolvimento e implementação dos Programas Nacionais de Ação sobre Adaptação (NAPAs, na sigla em inglês) e dos Planos Nacionais de Adaptação (NAPs, na sigla em inglês) devem servir como base de trabalho para as necessidades de adaptação pós‐2020. Para tal, é fundamental a implementação completa dos NAPAs e dos NAPs. 

 Perdas e Danos 

As perdas e danos devem ser parte integrante do acordo de 2015. 

A COP 19 deve estabelecer um mecanismo que avalie as perdas e danos, que deve estar a funcionar em pleno na COP 21 (em 2015). 

 Florestas (REDD/LULUCF) 

O acordo de 2015 deve providenciar de forma clara a continuação do Programa para a Conservação da Floresta em todo o planeta (REDD+, na sigla em inglês). Esta continuação deve também incluir os meios financeiros necessários, com base nos resultados já alcançados pelo Programa REDD+, bem como assegurar que as salvaguardas decididas em Cancun estão asseguradas, respeitadas e implementadas. 

O acordo deve incluir regras comuns de contabilização, incluindo para Uso do Solo, Alterações do Uso do Solo e Floresta (LULUCF, na sigla em inglês), que sejam baseadas no terreno, consistentes com a Convenção, com base num período ou ano comum, assim como em todos os outros setores. 

 Tecnologia 

O Mecanismo de Tecnologia deverá aplicar os princípios de equidade para a definição de prioridades do Centro e Rede de Tecnologia Climática (CTCN, na sigla em inglês) e outros processos deste Mecanismo. 

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Preparar ferramentas para os países usarem, para poderem escolher que tecnologias implementar, desde que não representem impactes negativos nos humanos e na biodiversidade. 

Uma análise da tecnologias chave cujo desenvolvimento trará a maior e mais rápida redução de emissões e/ou redução das barreiras à resiliência. Ao mesmo tempo, dar prioridade às Eficiência Energética e Energias Renováveis, particularmente aos projetos de energias renováveis isolados de forma a apoiar as comunidades rurais no acesso à energia. 

Desenvolver um Plano de Ação de Tecnologia global em 2015.   Mercado Internacional de Carbono  

O acesso ao mercado internacional de carbono, dentro do novo acordo, deve ser limitado aos países com objetivos de redução de emissões ambiciosos, em linha com as metas apontadas pelos estudos científicos e do Quadro de Referência de Equidade. 

É necessária uma profunda restruturação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (CDM, na sigla em inglês) e Implementação Conjunta (JI, na sigla em inglês). 

 Agricultura 

Explorar todos os papéis possíveis e relevantes dentro dos mecanismos da UNFCCC e do Protocolo de Quioto que podem contribuir para a segurança alimentar e para uma agricultura equitativa, sustentável e resiliente às alterações climáticas.   

  A Rede de Ação Climática (CAN, da sigla em inglês) é a maior rede mundial da sociedade civil, com mais de 850 organizações em 90 países, que trabalham em conjunto na promoção da ação governativa para lidar com a crise climática (www.climatenetwork.org). A Quercus é membro da CAN Internacional fazendo parte do núcleo regional europeu, a CAN Europa.   Novembro de 2013