variação ou mudança?

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Universidade da Amazônia Centro de Ciências Humanas e Educação Mestrado em Comunicação, Linguagens e Cultura LIA BARILE CARVALHO DA SILVA NÓS/A GENTE: VARIAÇÃO OU MUDANÇA? Belém 2011

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Universidade da Amazônia Centro de Ciências Humanas e Educação

Mestrado em Comunicação, Linguagens e Cultura

LIA BARILE CARVALHO DA SILVA

NÓS/A GENTE: VARIAÇÃO OU MUDANÇA?

Belém 2011

Universidade da Amazônia Centro de Ciências Humanas e Educação

Mestrado em Comunicação, Linguagens e Cultura

LIA BARILE CARVALHO DA SILVA

NÓS/A GENTE: VARIAÇÃO OU MUDANÇA?

Texto apresentado ao Curso de Pós-Graduação em Comunicação, Linguagens e Cultura – Mestrado, Linha de Pesquisa Linguagem e Análise Discursiva de Processos Culturais – área de concentração: linguística, da Universidade da Amazônia, como requisito parcial para aprovação no Exame de Qualificação, orientado pela Profª. Dr. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da Silva.

Belém

2011

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Sheila Monteiro CRB2 859

410

S586n Silva, Lia Barile Carvalho da.

Nós/a gente: variação ou mudança? / Lia Barile Carvalho

da Silva – 2011.

94 f.; Il.; 21 x 30 cm.

Dissertação (Mestrado) – Universidade da Amazônia,

Programa de Pós-graduação em Comunicação, Linguagem e

Cultura, 2011.

Orientadora: Profª Drª Maria do Perpétuo Socorro

Cardoso da Silva.

1. Variação linguística. 2. Fala – sociolinguística 3. Semântica. 4. Língua – estudo. I. Silva, Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da. II. Título.

NÓS/A GENTE: VARIAÇÃO OU MUDANÇA?

Por

LIA BARILE CARVALHO DA SILVA

Dissertação submetida à avaliação, como requisito p arcial para a

obtenção do título de Mestre em Comunicação, Lingua gens e

Cultura.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________

Orientadora: Maria do Perpétuo Socorro

Cardoso da Silva

Universidade da Amazônia – UNAMA

____________________________________

Examinadora : Rosa Maria Coelho de Assis.

Universidade da Amazônia - UNAMA

___________________________________

Examinador: José de Anchieta Bentes.

Universidade do Estado do Pará – UEPA.

Aprovada: ____________________

Belém, _____de_____________ de 2011

A Deus sobre todas as coisas.

Ao meu pai Wilson e ao meu marido George, meus grandes

incentivadores

Ao meu filho Tiago e ao meu enteado Tales, minhas grandes

inspirações.

Às minhas mães, Marile ne e Marília, sem as quais eu não teria

tempo para pesquisar e escrever.

À minha família, que me faz experienciar o amor incondicional

diariamente.

Aos meus queridos professores Hilton, Jurandy e Sèrgio Sapucay

(in memmorian), que tanto fizeram pela minha formação

acadêmica.

À minha mestra e amiga, doutora Socorro Cardoso, sem a qual

minha prática diária seria empobrecida e este trabalho jamais teria

acontecido.

Aos meus alunos, material vivo, renovável e motivador para que eu

continue sempre estudando e pesquisando para corresponder as suas

expectativas quanto às práticas de usos da língua portuguesa.

Aos meus colegas de mestrado, que tanto me ensinaram em nosso

tempo de convivência.

Em especial, às minhas queridas Magnólia Rego e Dani Benaion,

sem as quais eu jamais teria acreditado na minha capacidade de

chegar até aqui, de cuja ajuda eu jamais deixei de contar.

Aos meus sujeitos, pessoas queridas e de boa vontade.

A todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram para que

este trabalho fosse possível.

A verdadeira substância da linguagem não é constituída por um

sistema abstrato de formas linguísticas, nem pela enunciação

monológica isolada, nem pelo ato psicológico de sua produção, mas

pelo fenômeno social da interação verbal, realizada pela enunciação

ou pelas enunciações. A interação verbal constitui, assim, a

realidade fundamental da linguagem. (Mikhail Bakhtin)

RESUMO

SILVA, Lia Barile Carvalho da. Nós/A gente: variaçã o ou mudança?. Dissertação do Programa de Mestrado de Comunicação, Linguagens e Cultura da Universidade da Amazônia – Unama. Belém, 2011.

O presente trabalho apresenta um estudo dos usos que os falantes fazem dos

pronomes nós/a gente, na perspectiva da linguística variacionista. O percurso

metodológico está fundamentado em um estudo descritivo analítico de abordagem

quantiqualitativa. Com aporte teórico-metodológico no modelo sociolinguístico de

Labov (1972) e Tarallo (1999), selecionou-se como objeto de estudo os pronomes

nós e a gente, objetivando analisar o uso destes na fala de trinta e cinco (35)

sujeitos, moradores do bairro de Nazaré (Belém-Pa). A seleção deste lócus, bem

como da faixa etária, do grau de escolaridade e do sexo, está relacionada ao Projeto

de Pesquisa Variação Linguística Urbana na Região Norte – VALUNORTE,

desenvolvido por docentes da UNAMA, e vinculado a uma das linhas de pesquisa,

Linguagem e Análise discursiva de Processos Culturais, definidas para o referido

mestrado. As entrevistas com relatos orais, gravadas e transcritas

grafematicamente, compõem os instrumentos de produção dos dados. A questão

norteadora buscou responder se há uma variação ou uma mudança no uso desses

pronomes. Os resultados obtidos indicam que, considerando o fator referência, os

pronomes se equivalem, ou seja, há uma intercambialidade entre eles no campo

semântico. Entretanto, há uma diferença de cunho valorativo, já que a forma

pronominal “nós” é considerada de maior prestígio linguístico que a forma “a gente”.

Apesar de indícios demonstrados na pesquisa, ainda não é possível assinalar uma

mudança em progresso, já que os dados obtidos e o contexto da pesquisa não

constituíram elementos suficientes para uma conclusão definitiva. Por hora, é

possível dizer que as variáveis convivem na comunidade de fala selecionada,

embora haja uma preferência pelo pronome “a gente” por 45,71% dos entrevistados,

determinada pela situação em que os dados foram produzidos e pela idade dos

mesmos. O fator escolaridade foi determinante para o fato de que 99% dos sujeitos

utilizaram a concordância do pronome com os verbos de acordo com a norma

padrão, e dentre os sujeitos que utilizaram os dois pronomes em suas falas ou

optaram pela variável “nós”, 57,14% são mulheres, o que corrobora com a ideia de

que, nos fenômenos de variação, as mulheres são as que mais usam as formas

consideradas de maior prestígio.

Palavras-chave: língua; fala; sociolinguística; variação; mudança; semântica.

ABSTRACT

SILVA, Lia Barile Carvalho da. Nós/ A gente : change or variation?. Dissertation of master's program of Communication, languages and culture at the University of Amazonia – Unama. Belém, 2011.

This paper presents a study of the uses that speakers make the pronouns we / us,

from the perspective of linguistics variational. The course methodology is based on a

descriptive analytical approach quanti. With theoretical and methodological model of

sociolinguistic Labov (1977) and Tarallo (2004), was selected as a study object

pronouns we and us, aiming to analyze the use of speech of thirty-five (35) subjects,

residents of neighborhood of Nazareth (Belém-Pa). The selection of this locus, as

well as age, level of education and sex is related to the Research Project Linguistic

Variation in Urban North Region - VALUNORTE, developed by teachers of UNAMA,

and bound to a line of research, language and discursive analysis of cultural

processes, defined for the master said. Interviews with oral histories, recorded and

transcribed graphematic, make the instruments of production data. The guiding

question sought to answer whether there is a variation or a change in the use of

pronouns. The results indicate that, considering the factor reference, the pronouns

are the same, ie, there is an interchangeability between them in the semantic field.

However, there is a difference of stamp value, since the form pronoun "we" is

considered more prestigious than the language as "we." Despite demonstrated

evidence in the search, still can not signal a change in progress, since the data

obtained and the research context did not constitute sufficient evidence for a

definitive conclusion. For now, one can say that the variables live in the community

selected speech, although there is a preference for the pronoun "we" for 45.71% of

respondents, given the situation in which the data were produced and the same age.

The school was a determining factor for the fact that 99% of the subjects used the

pronoun with the agreement of verbs according to standard procedure, and among

the subjects using the two pronouns in their speech or have chosen the variable

"we", 57 , 14% are women, which corroborates the idea that the phenomena of

change, women are most likely to use the forms considered more prestigious.

Keywords: language; speech; Sociolinguistics; variation; change; semantics.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10

SEÇÃO I – LABOV: ENTRE A VARIAÇÃO E A MUDANÇA ..... .............................. 16

1.1 SOCIOLINGUÍSTICA: O ESTUDO DO CAOS ORGAZINADO. ..................... 17

1.1.1 O ponto de partida: a heterogeneidade. ........................................................ 17

1.1.2 As áreas de interesse da Sociolinguística ..................................................... 18

1.1.3 Variantes e variáveis ..................................................................................... 19

1.1.4 Heterogeneidade e unidade .......................................................................... 20

1.1.5 A variação: legítima, sistemática e estigmatizada. ........................................ 21

1.2 COMPORTAMENTOS E ATITUDES ............................................................. 21

1.2.1 Importância das variáveis linguísticas ........................................................... 23

1.2.2 Importância das variáveis extralinguísticas ................................................... 24

1.2.3 A variável gênero/sexo .................................................................................. 27

1.2.4 A variável escolaridade ................................................................................. 28

1.2.5 As variáveis semânticas ................................................................................ 30

1.3 LINGUAGEM E CONTEXTO ......................................................................... 31

1.3.1 A relevância da faixa etária para mudança linguística .................................. 32

1.3.2 Mudança em tempo aparente ........................................................................ 33

1.3.3 Variação estável ou mudança em progresso? .............................................. 33

SEÇÃO II – PERCURSOS METODOLÓGICOS ................ ....................................... 34

2.1 CONTEXTO DA PESQUISA: A CIDADE DAS MANGUEIRAS ...................... 35

2.1.1 O bairro de Nazaré ........................................................................................ 40

2.1.1.1 Dados geográficos, sociais, econômicos e históricos.................................... 41

2.2 OS SUJEITOS ............................................................................................... 44

2.3 A DOCUMENTAÇÃO DA FALA ..................................................................... 45

2.3.1 A composição e analise do corpus ................................................................ 40

SEÇÃO III – A FALA DOS DADOS ...................... .................................................... 47

3.1 NOVAS FORMAS... NOVOS FATOS ............................................................ 48

3.1.1 O fenômeno da Gramaticalização ................................................................. 40

3.1.1.1 A perda do traço de número .......................................................................... 50

3.1.1.2 A perda do traço formal de gênero ................................................................ 50

3.2 OS DADOS FALAM ....................................................................................... 51

3.3 OS FATOS EM CONTEXTO .......................................................................... 64

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ............................. ................................................... 67

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 71

APÊNDICES ............................................................................................................. 77

Nós/A gente: variação ou mudança? 10

Nós/A gente: variação ou mudança? 11

Um menino tímido, recém chegado à escola, ainda em fase de ambientação,

fora solicitado para que lesse um parágrafo do texto em uma de minhas aulas de

língua portuguesa. Foi o primeiro passo que dei rumo a esta Dissertação.

Tão logo o aluno iniciou a leitura em voz alta, a turma de adolescentes, fase

das indelicadezas e ridicularizações, começara a rir incessantemente, e logo percebi

que e o motivo da “piada” nada mais era que a variação fonética do aluno novato,

vindo de Paragominas, município do estado do Pará. Imediatamente, pensei que

brigar com eles não seria o suficiente e nem eficiente para combater o que já estava

evidenciado como um claro exemplo de preconceito linguístico.

Era hora de parar e ... conversar!

Pensando em como seguir com a orientação sobre as variações, bem como

sobre a importância delas para nossa constituição como povo, como sociedade, eis

que me surge o que chamaria de “prato cheio”: no meio do semestre, entra nesta

mesma turma um aluno vindo de São Bernardo do Campo, interior de São Paulo,

cuja variação fonética se diferenciava bastante das demais. E, para minha surpresa:

nada! Nem sequer um coxixo, um burburinho. Risada, então, nem pensar. Havia ali

uma marca de hierarquização de variações fonéticas, segundo critérios resultantes

da situação socioeconômico que goza o estado de São Paulo no contexto brasileiro.

O que era nosso, aqui da terra, não merecia o mesmo respeito que aquilo que

chegara de fora?

Agora sim, eu tinha material para meses de aula, caso eu quisesse. Desde

então, o estudo de gêneros orais nunca mais saiu da minha sala de aula; serve-me

de suporte, de aporte, de recorte, enfim, de material para auxiliar os meus alunos a

entederem a língua em seu funcionamento.

E foi falando sobre tais influências que surgiu a ideia de fazer uma pesquisa

em um dos colégios onde trabalho sobre o Internetês, ou melhor, sobre a opinião

dos alunos em relação à exposição deles a este tipo de linguagem, cujas

modificações se baseiam, também, na linguagem oral, e quais as implicações disso

na sala de aula.

Para minha surpresa, os alunos-sujeitos do estudo, na faixa etária de 13 e 16

anos, usuários de sites de relacionamento e cyber comunidades, afirmaram que a

linguagem que eles usam nesses espaços não chega à sala de aula, em provas ou

redações. Os resultados desta pesquisa possibilitaram a elaboração de um artigo

intitulado “Internetês: uma nova forma de produção linguística”, publicado na revista

Nós/A gente: variação ou mudança? 12

Lato & Sensu1 e, posteriormente, apresentado na mesa redonda intitulada “As

linguagens sobre múltiplos olhares”, no VIII Seminário de Pesquisa e IX Seminário

de Iniciação Científica2.

Desde a graduação em Letras (2000), tenho interesse pela linguística, razão

pela qual participei do Programa de Monitoria da Universidade da Amazônia, em

1999, como Monitora de Linguística, e tive a oportunidade de acompanhar, por um

ano, a Professora Doutora Socorro Cardoso. Os participantes deste programa

devem acompanhar os professores da disciplina em suas aulas, participar de

projetos coordenados pelos professores da área e auxiliar pedagogicamente os

alunos dos cursos em que haja a discplina escolhida pelo monitor. Entretando, foi

com a linguística textual que dei meu primeiro passo para o estudo científico sobre a

língua, quando escrevi o Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em

Letras3, cujo teor foi uma análise do ensino de VERBO nas aulas de língua

portuguesa no Ensino Fundamental II, em vinte e duas escolas públicas de Belém. A

partir dessa amostra, comecei a perceber que o caráter funcional da língua ainda era

pouco trabalhado, e que, na maior parte desses casos, a gramática pela gramática

predominava nas aulas de português destas escolas.

Foi quando, já na pós-graduação, pensei que um dos fatores que constribuia

para a perpetuação de alguns paradigmas para o ensino de português fosse a

seleção inadequada do livro didático, ou seja, sem um livro didático que atendesse

às mais recentes teorias sobre o ensino de língua , o professor acaba pouco ou não

norteado para os caminhos da pragmática. Assim, guiada pela perspectiva do

Letramento, à luz de Magda Soares, investi em um estudo sobre o livro didático4,

sua importância e os melhores critérios para a sua escolha. Esta experiência

também me despertou para a importância de livros didáticos que estimulem o

trabalho com textos orais.

1 CARVALHO, Lia Barile de. Internetês : uma nova forma de produção linguística Revista Lato & Sensu. UNAMA: Belém, v. 11. n 2, p. 35 a 40, 2010. 2 Realizado pela Superintendência de Pesquisa da Universidade da Amazõnia. Belém: UNAMA, 2009. 3 CARVALHO, Lia Barile de. Língua Portuguesa: usos e reflexões. 2002. 68 fs. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Letras – Graduação) - Universidade da Amazônia, Belém, 2002.

Nós/A gente: variação ou mudança? 13

Ensinar a língua inglesa por quase quinze anos mostrou-me algumas

estratégias para realizar o trabalho com a língua ‘materna’, já que a metodologia de

ensino de língua estrangeira já vem norteado pela linguística desde a década de 60,

ou seja, desde os livros didáticos até os processos teóricos-metodológicos já

seguem a visão funcionalista/pragmática sobre a língua. Assim, em língua inglesa, o

aluno estuda para se tornar proficiente, ou seja, para ser capaz de ouvir, falar, ler e

escrever com competência.

Só em 2002, após a graduação em Letras com habilitação em Português e

Inglês é que comecei a trabalhar com Língua Portuguesa.

Graduada e pós-graduada, a necessidade de agregar valores às minhas

práticas linguísticas levou-me a considerar a possibilidade de tentar o mestrado em

Comunicação, Linguagens e Cultura, o qual viria ao encontro de práticas de sala de

aula nas quais acredito e busco me aperfeiçoar, além de me fornecer aporte teórico

para outros “voos”.

Por essa caminhada, o trabalho com a oralidade era o que, de fato, mais me

estimulava a escrever e a pesquisar. No início, minha intenção era buscar os dados

para esta Dissertação em Paragominas ou Parauapebas, dois dos lugares de onde

mais recebo alunos. Contudo, a possibilidade de fazer parte de um projeto de

pesquisa sobre a variação linguística urbana da região Norte – VALUNORTE4, me

fez, imediatamente, redirecionar meu foco para a capital, Belém, mais

especificamente o bairro de Nazaré, onde moram todos os sujeitos que colaboraram

para esta pesquisa.

A questão norteadora deste trabalho buscou responder se há uma variação

ou uma mudança no uso dos pronomes nós/a gente. Ou seja, se há equivalência ou

uma intercambialidade entre eles, e se esta variação no uso configura uma mudança

em progresso.

4 Pesquisa financiada pela UNAMA/FIDESA, coordenada pelas Profªs. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da Silva, Graça Salim, Rosa Assis e Lucilinda Teixeira, que objetiva instalar um Banco de Dados lingüísticos, informatizado, a partir da documentação da fala de sujeitos residentes em cinco (05) áreas urbanas linguisticamente representativas e posicionadas, geograficamente, na cidade de Belém, capital do estado do Pará.

Nós/A gente: variação ou mudança? 14

O objeto desta investigação são os usos linguísticos dos pronomes nós/a

gente que os falantes fazem da língua em uso. Para dar conta desse estudo,

estabelecemos como objetivo geral analisar os usos linguísticos dos pronomes nós e

a gente na fala dos moradores do bairro de Nazaré, em Belém, estado do Pará,

considerando os fatores que favorecem o uso da variante a gente, contribuindo para

o processo de variação. E como específicos: produzir os dados de fala dos sujeitos,

previamente selecionados; constituir um corpus com os excertos contextuais

referentes aos usos dos pronomes nós/a gente; correlacionar os usos destes

pronomes com os fatores: sexo, grau de escolaridade e faixa etária.

Para a produção dos dados foi usada a técnica da entrevista, seguindo as

orientações da sociolinguística quantitativa, com trinta e cinco (35) sujeitos

residentes bairro de Nazaré, distribuídos em três (3) faixas etárias; três (3) níveis de

escolaridade, de ambos o sexos, como previsto no Projeto VALUNORTE.

Com base no exposto, esta Dissertação está organizada em quatro capítulos,

cuja estrutura segue.

Na seção I, esboço os Aspectos Teóricos, fundamentados em autores como

Labov (1972, 1981), Mollica (2010), Bortoni-Ricardo (1994), Bagno (1997). Este

capítulo, em geral, foi elaborado à luz das contribuições das mais recentes teorias

que norteiam os estudos linguísticos e sociolinguístico, elucidando questões sobre a

sociolinguística enquanto ciência, suas implicações e aplicações, enfatizando o

estudo da língua como produto das interações sociais, bem como a importância das

variações para a construção da identidade de uma comunidade.

Na seção II, explico o processo de Gramaticalização da forma pronominal a

gente, aspecto relevante para análise da Referencialidade deste pronome, (Lopes,

2003).

Na seção III descrevo o Percurso Metodológico traçado para a construção

deste trabalho, com o objetivo de orientar a pesquisa e validar seus processos. Este

capítulo foi fundamentado por dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística), informações cedidas pelo projeto VALUNORTE e pelo site da prefeitura

de Belém, e por Labov (1972).

Na seção IV descrevo, e analiso o corpus à luz dos estudos da

Sociolinguística, em consonância com as obras de William Labov.

Nós/A gente: variação ou mudança? 15

As Considerações Finais apontam para alguns resultados preliminares,

indicando possíveis contribuições deste estudo para os estudos sociolinguísticos,

bem como para o ensino de língua portuguesa.

Seguem ainda as Referências, com as quais informo as fontes de consulta

usadas na elaboração desta Dissertação, e, a elas, os Apêndices, constituídos das

transcrições grafemáticas dos dados de fala resultante das entrevistas realizadas

com os sujeitos.

Nós/A gente: variação ou mudança? 16

Nós/A gente: variação ou mudança? 17

1.1 SOCIOLINGUÍSTICA: O ESTUDO DO CAOS ORGAZINADO.

A Sociolinguística é uma subárea da Linguística que estuda a língua em uso

dentro das comunidades de fala, voltando-se para um tipo de investigação que

correlaciona aspectos linguísticos e sociais. Entende-se por comunidade de fala

não um grupo de pessoas que fala exatamente igual, mas que compartilham traços

linguísticos específicos que os diferenciam de outros grupos. Além disso,

comunicam-se mais entre si do que com outras comunidades e, sobretudo,

partilham normas e atitudes relacionadas ao uso da linguagem.

Esta ciência situa-se em um espaço interdisciplinar, entre língua e

sociedade, cuja preocupação está centrada nos empregos linguísticos concretos,

em especial os de caráter heterogêneo.

1.1.1 O ponto de partida: a heterogeneidade.

Todas as línguas são heterogêneas, ou seja, trazem em si um dinamismo

que lhe é próprio e característico. Desta forma, as línguas são constituídas de

formas distintas que se equivalem semanticamente no nível do vocábulo, da sintaxe

e da morfossintaxe, do subsistema fonético-fonológico e no domínio pragmático-

discursivo. O português brasileiro (doravante PB) está cheio de exemplos.

No norte do país, o pronome “tu” é o tratamento preferido quando o falante

interage com o ouvinte, o que já não é muito comum em outras regiões onde esta

ocorrência é menos frequente. Assim, fica evidenciado uma diferenciação

geográfica, em que os pronomes de tratamento distribuem-se em sistemas

variacionais diferentes. Marcas de concordância nominal e verbal, por exemplo,

como em “os estudos do português” e “eles estudam Português” convivem com a

possibilidade de ocorrência de enunciados em que tais marcas estão ausentes: “os

estudo� do português” e “eles estuda� Português”. A realização de “pobr ema”,

“comeno” é encontrada no PB coexistindo com “problema”, “comendo”.

Construções sintáticas como “eu vi ele”, “nós fomos na Igreja” estão presente no

PB alternando-se com os equivalentes semânticos “ eu o vi” e “nós fomos à Igreja”.

Esses são alguns casos que ilustram a variabilidade linguística presente em

todas as línguas naturais humanas. E é exatamente essa variação que vem a ser,

prioritariamente, o objeto de estudo da Sociolinguística, concebendo esta

Nós/A gente: variação ou mudança? 18

característica da língua como um princípio geral e universal, passível de ser

descrita e analisada cientificamente. Para esta ciência da linguagem, as

alternâncias de uso são influenciadas por fatores estruturais e sociais, os quais são

também chamados de variáveis independentes, no sentido que os usos de

estruturas linguísticas são motivados e as alternâncias configuram-se por isso

sistemáticas e estatisticamente previsíveis.

1.1.2 As áreas de interesse da Sociolinguística

A Sociolinguística interessa-se por diversos temas de investigação, tais

como: contato entre as línguas, questões relativas ao surgimento e extinção

linguística, multilinguismo e variação e mudança.

O fenômeno da diversidade linguística em cada sistema não é o mesmo que

chamamos de multilinguismo. Em um país podem conviver várias línguas, como é o

caso do Brasil: somos plurilingues, pois além do português, há em nosso território

aproximadamente 180 línguas indígenas, de comunidades étnico-culturalmente

diferenciadas, além das populações bilingues que dominam igualmente o português

e línguas do grupo românico, anlo-germânico e eslavo-oriental como em

comunidades multililingues português/italiano, português/espanhol,

português/alemão, português/japonês. Enquanto a Linguística olha para todas as

comunidades com o mesmo interesse científico, a Sociolinguística considera a

importância social da linguagem, dos pequenos grupos socioculturais e

comunidades maiores. Se cada grupo apresentasse comportamento linguístico

idêntico, homogêneo, não haveria razão para se ter um olhar sociolinguístico da

sociedade.

Desta feita, a mudança linguística é fundamental para os estudos

sociolingüísticos. Os problemas teóricos envolvidos estão relacionados aos

processos de encaixamento, avaliação e implementação. Antes de tudo, o linguista

deve compreender como se caracteriza uma determinada variação de acordo com

as propriedades da língua, verificar seu status social positivo ou negativo, entender

o grau de comprometimento do fenômeno variável no sistema e determinar se as

variantes em competição encontram-se em processo de mudança, seja no sentido

de avanço, seja no de recuo da inovação. Em última análise, deve definir se o caso

Nós/A gente: variação ou mudança? 19

de variação estável ou de mudança em progresso, conceitos explicitados mais

adiante neste trabalho.

1.1.3 Variantes e variáveis

A variação linguística é um fenômeno universal e pressupõe a existência de

variantes, ou seja, formas linguísticas alternativas. Logo, as variantes são diversas

formas alternativas que constituem um fenômeno variável, tecnicamente chamado

de variável dependente.

A concordância entre verbo e o sujeito, por exemplo, é uma variável linguística (ou um fenômeno variável), pois se realiza através de duas variantes, duas alternativas possíveis e semanticamente equivalentes:a marca de concordância do verbo ou a ausência da marca de concordância. (MOLLICA, 2010)

Entende-se que uma variável é dependente quando o emprego das variantes

não é aleatório, e sim influenciado por grupos de fatores (ou variáveis

independentes) de natureza social ou estrutural. Deste modo, as variáveis

independentes ou grupo de fatores podem ser internos ou externos à língua e

podem influenciar diretamente nos usos, aumentando ou diminuindo a frequência

de ocorrência.

O termo “variável”, por sua vez, pode significar fenômeno em variação ou

grupo de fatores, os quais são considerados os parâmetros que regulam os

fenômenos variáveis, condicionando positiva ou negativamente o emprego de

formas variantes. As variantes podem permanecer estáveis nos sistemas (as

mesmas formas permanecem se alternando) durante um período curto ou longo de

tempo, ou podem sofrer mudança, quando uma das formas deixa de ser usada.

Neste caso, as formas substituem outras que desaparecem, constituindo, assim,

uma mudança em progresso.

À Sociolinguística, cabe investigar o grau de estabilidade ou de mutabilidade

da variação, diagnosticar as variáveis que têm efeito positivo ou negativo sobre os

usos linguísticos alternativos e prever seu comportamento regular e sistemático.

Desta forma, entende-se que a variação e a mudança são contextualizadas e os

condicionamentos que contribuem para o emprego de formas variantes são muitos,

atuam simultaneamente e surgem de dentro ou de fora dos sistemas linguísticos.

Nós/A gente: variação ou mudança? 20

No conjunto de variáveis internas estão os fatores de natureza

fonomorfossintáticos, os semânticos, os discursivos e os lexicais, os quais estão

relacionados à língua em várias dimensões. Já no conjunto de variáveis externas à

língua, reúnem-se os fatores inerentes ao indivíduo (etnia e sexo), os sociais

(escolarização, nível de renda, profissão, classe social) e os contextuais (como

grau de formalidade e tensão discursiva).

1.1.4 Heterogeneidade e unidade

Todo sistema linguístico está, constantemente, sujeito à pressão de duas

forças que atuam no sentido da variedade e da unidade. Esse princípio atua por

meio da interação e da tensão de impulsos contrários, de forma que as línguas

exibem inovações mantendo-se, contudo, coesas: de um lado, o impulso à variação

e possivelmente à mudança; de outro, o impulso à convergência, base para a

noção de comunidade linguística, caracterizada por padrões estruturais e

estilísticos. Assim, as línguas apresentam as contrapartes fixa e heterogênea de

modo a exibir unidade em meio à heterogeneidade. É válido ressaltar que isso só é

possível porque a dinamicidade da língua é inerente e motivada.

A variação linguística pode ocorrer nos eixos diatópicos e diastrápico,

conforme no explica Mollica, 2010

No primeiro, as alternâncias se expressam regionalmente, considerando-se os limites físico-geográficos; no segundo, elas se manifestam de acordo com os diferentes estratos sociais, levando-se em conta fronteiras sociais. Assim, tradicionalmente, concebe-se uma ecologia linguística do ponto de vista horizontal, com a constituição de comunidades geográficas com base em marcadores regionais; e do ponto de vista vertical, com a geração de padrões por meio de indicadores sociais. A recorrência da atuação de parâmetros condicionantes resulta na sistematicidade da variação de tal modo que se originam padrões preditivos mensuráveis probabilisticamente.

Qualquer que seja o eixo, diatópico/geográfico, diastrático/social, ou de outra

ordem, a variação é contínua e é, sobremaneira, impossível demarcar com nitidez

as fronteiras em que ela ocorre. É mais viável falar em tendências de emprego de

formas alternantes motivadas simultaneamente por condicionamentos diversos.

Nós/A gente: variação ou mudança? 21

1.1.5 A variação: legítima, sistemática e estigmati zada.

Dentro de uma perspectiva científica, é válido ressaltar que todas as

manifestações linguísticas são legítimas e previsíveis. Muito embora os juízos de

valor não sejam bem-vindos, os padrões linguísticos estão sujeitos à avaliação

social positiva ou negativa e, nesse quadro, podem determinar o tipo de inserção

do falante na escala social.

Estigmatização linguística e mobilidade social são temas de interesse da

Sociolinguística. Em princípio, estruturas quem têm boa aceitação social servem de

parâmetro para avaliação de movimentações linguísticas. Maior sensibilidade,

percepção e planejamento linguístico são, via de regra, pré-condição à produção

das formas de prestígio e disposição adequada para eliminarem-se estigmas

sociolingüísticos na fala ou na escrita.

Dentro desta perspectiva é que chegamos outro ponto debatido (e

combatido) pelos sociolinguistas: o preconceito linguístico. O certo é que ainda

predominam as práticas pedagógicas norteadas pelas diretrizes maniqueístas do

tipo certo/errado, tomando-se como referência o padrão dito culto. Os falantes de

uma língua, de modo geral adquirem primeiramente as variantes informais e, num

processo sistemático e gradativo, pode vir a apropriar-se de estilos e gêneros mais

formais, aproximando-se da variedade padrão e da tradição literária.

Toda língua apresenta, portanto, variantes mais prestigiadas do que outras.

Os estudos sociolinguísticos contribuem com o combate ao preconceito linguísticos

quando relativizam a noção de erro e busca descrever o padrão real que muitas

escolas tentam desqualificar e desconsiderar como forma de uso legítimo e natural

da língua.

1.2 COMPORTAMENTOS E ATITUDES

É muito fácil perceber que há todo um conjunto de atitudes, de sentimentos

dos falantes para com suas línguas, para com as variedades de língua e para com

aqueles que a utilizam, daí ser imprudente e superficial tratar a língua apenas como

um instrumento, o qual é usado quando se precisa e descartado quando já não tem

mais utilidade. É válido dizer que as atitudes linguísticas exercem influência sobre o

comportamento linguístico.

Nós/A gente: variação ou mudança? 22

Há na história diversos provérbios ou fórmulas pré-fabricadas que

expressam os preconceitos de cada época contra as línguas. Conta-se que Carlos

V falava com os homens franceses em francês, com seus cavalos em alemão e

com Deus em espanhol. Um provérbio do século XVII diz que “o alemão urra, o

inglês chora, o francês canta, o italiano faz comédia e o espanhol fala”. Este é um

exemplo claro de que estereótipos linguísticos e nacionalistas confundem-se. Tais

estereótipos não se referem somente a línguas diferentes, mas também às

variantes geográficas das línguas, comumente submetida a uma escala valorativa

pelo senso comum.

Outros estereótipos referem-se ao “bem falar”. É comum ouvirmos dizer que

em todos os países há um lugar onde a língua nacional é pura (diz-se que no Brasil

seria em São Luis, Maranhão). Por trás disso, esconde-se a noção do “uso correto”

da língua, noção segundo a qual existem modos de bem falar a língua e modos que

devem ser condenáveis. Encontramos, então, em todos os falantes um espécie de

norma espontânea que os leva a decidir que forma deve ser proscrita e qual deve

ser admirada.

Se os usos variam geograficamente, socialmente e historicamente, a norma

espontânea varia da mesma forma: não se tem as mesmas atitudes linguísticas em

classes sociais diferentes, em países diferentes e em momentos diferentes da

história.

Sendo assim, cabe aqui reafirmar que o que interessa para a Sociolinguística

é o comportamento social que esta norma pode provocar. De fato, ela pode

provocar dois tipos de consequência sobre os comportamentos linguísticos: uns se

referem à maneira como os falantes vêem suas próprias falas, outros se referem ao

que os falantes acham de outros usuários da mesma língua. No primeiro caso,

valorizar-se-á sua prática linguística ou se tentará adequá-la ao modelo padrão; no

outro, as pessoas serão julgadas segundo seu modo de falar.

Nós/A gente: variação ou mudança? 23

1.2.1 Importância das variáveis linguísticas

Ao estudarmos a língua em uso numa comunidade, deparamo-nos com a

realidade da variação. Os membros que compõem esta comunidade são homens e

mulheres de idades, posição social, profissões, grau de escolaridades diferentes, o

que irá influenciar na forma de expressão de cada indivíduo.

Coletando seus dados em situações reais de comunicação, a Teoria da

Variação Linguística capta exemplares da língua em uso num determinado contexto

social e pode focalizar seu interesse imediato para esses condicionamentos

externos.

É fato que, inicialmente, os fenômenos escolhidos para análise pelos

variacionistas, envolviam, sobretudo, diferenças de pronúncia e eram bem

marcadas socialmente. É certo ainda que, juntamente com os aspectos sociais,

sempre se investigou a influência de variáveis internas, ou seja, de natureza

linguística (fonológicos, morfológicos, sintáticos, semânticos, etc.). Contudo, os

fatores sociais adicionavam um aspecto primordial: além de destacar uma postura

teórica oposta à idealização gerativista, ainda mostrava o comportamento de um

falante/ouvinte real, numa comunidade linguística bem longe se ser heterogênea.

Nasce, assim, uma Sociolinguística precisa, rigorosa, ou seja, científica, apoiada

nos métodos de análise quantitativa introduzidos por Willian Labov (1969) e

refinados por Cedergren e Sankoff (1974).

A ampliação do objeto de estudo para além do campo fonológico trouxe para

a teoria variacionista uma questão de interesse que virou exigência teórica: as

formas variantes em análise devem ocorrer num mesmo contexto. Afinal, além da

manutenção do significado, é necessária a identidade de contextos para que duas

ou mais variantes possam ser atribuídas à mesma variável.

É importante ressaltar que há alguns obstáculos para encontrar o contexto

ideal para que algumas análises sociolingüísticas, sobretudo quando se trabalha

com formas sintáticas ou discursivas. Por esta razão, os pesquisadores têm

ampliado o campo de investigação para domínios mais abrangentes. Por exemplo,

procura-se investigar como um mesmo processo manifesta-se através de

expressões distintas, muitas vezes pertinentes a diferentes questões níveis

linguísticos. É o caso do estudo da indeterminação, processo que usa diversos

Nós/A gente: variação ou mudança? 24

mecanismos linguísticos para manifestar-se, perpassando por diversos níveis

linguísticos. Dessa maneira, é como se estabelecêssemos não somente uma

escolha entre duas alternativas, mas uma escala de possibilidades para aquilo que

poderíamos chamar de um domínio funcional, e então estudar a variação. Esta

situação aplica-se a este estudo em questão.

1.2.2 Importância das variáveis extralinguísticas

Os usos da língua são controlados por variáveis estruturais e sociais, as

quais podem ser agentes internos e externos ao sistema linguísticos. Dentre as

variáveis externas ou não linguísticas, registram-se os marcadores regionais

predominantes em comunidades facilmente identificadas geograficamente, as quais

atuam simultaneamente com indicadores de estratificação estilístico-social, de

maneira que a projeção da variação permite descrever tendências de usos

linguísticos de comunidades de fala caracterizadas de acordo com seu perfil

sociolinguístico. É válido ressaltar que as variáveis, tanto linguísticas quanto

extralingüísticas operam em um conjunto complexo de correlações que inibem ou

favorecem o emprego de formas variantes semanticamente equivalentes. Por

exemplo, elementos como escolarização alta, contato com a escrita, nível

socioeconômico alto e origem social alta contribuem para o aumento do uso das

variedades de prestígio tanto na fala quanto na escrita, admitindo-se que existam

pelo menos o padrão popular e o culto.

Já são muitos os estudos que correlacionam as variáveis sexo/gênero,

idade, escolaridade e classe social, entre outras, a fenômenos de uso na fala e na

escrita. Mesmo assim, ainda não se pode afirmar que tais estudos são conclusivos

acerca de um efeito padronizado dessas variáveis sociais, a ponto de responder

algumas questões importantes, tais como: a) o grau de escolarização concorre para

um comportamento linguístico ajustado a um padrão culto? b) o gênero feminino é

mais conservador do ponto de vista da norma? c) há uma relação entre

estigmatização sociolinguística, status e mobilidade social? Esses e outros pontos

são problematizados quando se correlacionam variáveis extralinguísticas a

fenômeno de variação.

Já nos idos dos anos 1960 e 1970, Labov (1972) investigou o efeito de

diversos fatores sociais dessa natureza sobre traços do inglês padrão e não

Nós/A gente: variação ou mudança? 25

padrão, dedicando-se sobremaneira a demonstrar que o Black English vernacular,

variedade extremamente estigmatizada, sofre preconceito em razão de pressões

étnicas, escolarização e classe social. Sankoff, Kemp&Cedergren (1978)

demonstraram que escolarização, valor de mercado de formas discursivas e status

profissional dos falantes são relevantes para determinar o grau negativo ou positivo

de marcação social das alternativas linguísticas:falantes com maior cotação no

mercado linguístico tendem a lançar mão de estruturas de maior prestígio. As

contribuições de Laberge (1977), Clermont&Cedergren (1979) e os trabalhos de

Kemp (1979 e 1981) consolidaram resultados a favor da tese de que empregos

linguísticos prestigiados acham-se preferencialmente em indivíduos com prestígio

social alto. (MOLLICA, 2010 p. 28)

O fator escolarização tem sido muito testado para se verificar o seu grau de

influência sobre os falantes considerando o seu desempenho quanto à norma de

prestígio. Num painel bem amplo apresentado em Silva & Scherre (1996), três

tendências foram observadas quanto ao efeito da escolarização sobre as formas

padrão:

- Podem ocorrer casos em que falantes entram na escola oscilando entre um

grande e um pequeno uso da variante padrão; a escola “poda” a criança que não se

amolda ao sistema de ensino (...) Nesses casos, trata-se de variantes

estigmatizadas pela escola, que chegam a ser sistematicamente corrigidas.

- Em outros casos, em que a maioria dos falantes entra na escola sem usar a

variedade padrão, esta é adquirida durante sua escolarização sem que desapareça,

porém, a variante não padrão. Enquanto no primeiro ano escolar só há indivíduos

que tendem a usar a variante não padrão, nos últimos anos escolares há falantes

que tendem a usar ambas as variantes. (...) Algumas variantes não padrão não

chegam a ser estigmatizadas pela escola, não sendo objeto de correção.

- Finalmente, uma terceira modalidade ocorre quando os falantes entram na

escola apenas com a variante que se considera não padrão, mas, paulatinamente,

substituem essa variante pela considerada padrão. (SILVA & SCHERRE, 1996,p.

348-349)

Stella Bortoni também tem observado a ação determinante que atividades

de letramento podem ter sobre os alunos, ainda que sejam práticas de base

inteiramente intuitivas por parte dos professores.

Nós/A gente: variação ou mudança? 26

(...) padrões de mudança de código e de intervenções dos professores estão associados a estratégias intuitivas que estes desenvolveram com base em seu sistema de crenças sobre o letramento. Entendemos que as estratégias intuitivas usadas por eles podem contribuir para a implementação de uma pedagogia culturalmente sensível e para que isso se torne mais efetivo recomendamos que lhes proporcione acesso a informações sistemáticas de Sociolinguística. (BORTONI, 1994,p. 92)

De acordo com a teoria de Bourdieu (1977), as manifestações linguísticas

recebem um valor que denominou “mercado linguístico”, aliado à renda, sexo, faixa

etária e nível escolar do falante. Há evidências estatísticas que sugerem que renda,

valor de mercado, mídia e sensibilidade linguística, junto com outros elementos

podem ser bons indicadores sociais. Alguns resultados comprovam que a variável

de mercado é relevante, pois revelam que quanto maior a cotação na escala do

mercado ocupacional, maior a chance de haver ajuste à norma padrão.

Esta questão seria simples se todas as evidências considerassem uma

correlação constante e regular entre as estruturas linguísticas de prestígio, de alto

valor no mercado linguístico, diretamente proporcional a: grau alto de consciência

linguística, indivíduos mais velhos e escolarizados, de classe socioeconômico-

cultural alta. Considerando-se isso como verdade absoluta, poderíamos esperar

seguramente o emprego de estruturas padrão pelos grupos mais escolarizados e

mais sensíveis à diversidade linguística em relação à necessidade de adequação

dos usos alternativos em estilos e gêneros em diferentes níveis de formalidade,

tanto na fala quanto na escrita. Na prática, todavia, nada é tão simples e definitivo

assim.

Numa sociedade tão complexa como a constituída pelos falantes do PB,

pode-se pensar em inúmeros indicadores sociais, seja de exclusão, seja de

estabilidade e mobilidade social. Origem social, renda, acesso a bens materiais e

culturais são alguns deles, assim como tipo de acupação, grau de inserção em

redes sociais e outros.

É válido ressaltar que, como esta pesquisa está vinculada ao Projeto

VALUNORTE, o fator renda não é relevante para a análise proposta neste estudo.

Nós/A gente: variação ou mudança? 27

1.2.3 A variável gênero/sexo

A Sociolinguística interessa-se em saber em que limite e de que forma

fenômenos linguísticos variáveis estão correlacionados ao gênero/sexo do falante?

As diferenças mais aparentes entre a fala dos homens e das mulheres estão

no plano lexical. É muito comum admitirmos que determinadas palavras são mais

apropriadas para o uso feminino e outras para o uso masculino, daí frequentemente

ouvirmos “isso não é coisa que uma moça diga”, ou ainda “não fica bem uma garota

falar assim”. Nas sociedades ocidentais, a existência de um vocábulo feminino e de

um vocábulo masculino não é tão acentuada quanto em sociedades orientais e

tende, gradativamente, a desaparecer, o que não quer dizer que algumas

diferenças ainda resistam.

A análise da dimensão social da variação e da mudança linguística não pode ignorar, no entanto, que a maior ou menor ocorrência de certas variantes, principalmente daquelas que envolvem o binômio forma padrão/forma não padrão e o processo de implementação de mudanças estejam associados ao gênero/sexo do falante e à forma de construção dos papeis feminino e masculino. (PAIVA, 2010, p. 34)

Um estudo realizado por Fischer (1958), intitulado Influências sociais na

escolha de variantes linguísticas, analisou a variação na pronúncia do sufixo inglês

–ing, formador de gerúndio (playing, speaking) e constatou que a pronúncia velar

era mais freqüente nas mulheres. Verificou-se, também, que essa preferência não

era resultado de uma escolha aleatória entre duas pronúncias intercambiáveis do

sufixo. A diferença entre pronúncia velar ou dental do sufixo corresponde a uma

diferença de valorização social: forma prestigiada versus forma não prestigiada,

respectivamente. Fischer constata, então, que na fala das mulheres há uma

predominância da forma de prestígio.

Vários outros estudos de orientação sociovariacionista vieram reforçar a

constatação de Fischer: gênero/sexo pode ser um grupo de fatores significativo

para um quadro variacionista de diferentes níveis (fonológico, morfossintático,

semântico) e revela um padrão bastante regular em que as mulheres apresentam

maior preferência pelas variantes linguísticas mais prestigiadas socialmente.

Outros estudos sobre processos variáveis do português mostram que há

uma maior consciência feminina do status social das formas linguísticas, ou seja, a

Nós/A gente: variação ou mudança? 28

forma considerada padrão ocorre com mais frequência entre mulheres do que com

os homens.

Por fim, é válido ressaltar que a análise da correlação entre gênero/sexo e a

variação linguística deve obrigatoriamente fazer referência não só ao prestígio

atribuído pela comunidade às variantes linguísticas, como também à forma de

organização social de uma dada comunidade de fala. Os padrões apontados em

comunidades de fala ocidentais serão, certamente, bem diferentes dos padrões

relevantes nas comunidades orientais, já que os valores culturais e organizacionais

de tais sociedades são, sobremaneira, bem diferentes.

Neste presente estudo, pesquisamos uma comunidade de fala cuja

organização sociocultural é ocidentalista.

1.2.4 A variável escolaridade

Por meio de uma observação diária é possível constatar que a escola gera

mudanças na fala e na escrita das pessoas que a frequentam e das comunidades

discursivas. Percebe-se, por outro lado, que ela contribui para a preservação das

formas de prestígio, face a tendências de mudanças em curso nessas

comunidades. A escola, como meio de familiarização com a literatura nacional,

incute gostos, normas, padrões estéticos e morais. Compreende-se, nesse

contexto, a influência da variável nível de escolarização (ou escolaridade), como

correlata aos mecanismos de promoção ou resistência à mudança.

Todavia, é imprudente propor uma análise das correlações feitas entre

variação/continuidade/mudança versus variável escolaridade sem estabelecer

algumas distinções no interior de categorias presentes na dinâmica social em que

interage a escola.

A primeira distinção volta-se para o status econômico e o prestígio social dos

usuários das formas da língua. As formas de expressão socialmente prestigiadas

das pessoas consideradas superiores na escala socioeconômica opõem-se aos

falares das pessoas que sem prestigio social e econômico. As pessoas ditas

“superiores” dentro desses parâmetros, acabam por servir de modelo de referência

do bem falar e do bem escrever. As formas socialmente prestigiadas estão

diretamente relacionadas à literatura oficial, que as transforma em língua padrão,

reguladas e codificadas na gramática normativa em que assumem o estatuto de

Nós/A gente: variação ou mudança? 29

formas corretas, a serem ensinadas, aprendidas e internalizadas através de um

longo processo escolar.

A segunda distinção faz referência à estigma social. A maneira como as

pessoas desprovidas de prestígio econômico e social tende comunicam-se tende a

ser coletivamente avaliado como estigmatizado, considerada inferior em termos

estéticos e informativos, pelos membros da comunidade discursiva. Desta forma,

criam-se consensos quanto ao caráter estigmatizado dos usuários de pobrema,

rezistro e homi. A forma inferiorizada é alvo de preconceitos e registrada como vício

ou erro nas gramáticas escolares, estudo e ensino da língua, sobretudo nos níveis

fundamental e médio. Enfim, pode-se afirmar que a escola consome uma parcela

substancial de seu tempo esforçando-se para impedir a corrosão do padrão culto

da língua.

A terceira distinção focaliza os fenômenos controlados pela escola, contra

aqueles que não são objetos de atenção disciplinadora e de gramaticizadora da

mesma. De um lado e escola controla, evita e pune o uso de formas como

pobrema, rezistro e homi; por outro lado, é conivente com formas redundantes

como há anos atrás.

A quarta distinção opõe fenômenos controlados por fatores gramaticais

incluídos no nível da oração e do período, contra fenômenos associados a fatores

discursivos. A gramática do sintagma e da oração tem o privilégio de receber toda,

ou quase toda, atenção dos pesquisadores e dos profissionais do ensino de língua,

enquanto o nível transfrásico, do texto, ainda dá passos lentos rumo a uma

situação de mais destaque e importância. Eis o motivo pelo qual a maioria dos

fenômenos estudados apresenta alta concentração de fatores estruturais e poucos

escolhem variáveis discursivas ou funcionais.

Por fim, distinguem-se as modalidades falada e escrita. Os estudos do uso

da língua concentram-se nos fenômenos da fala, enquanto a escola privilegia o

canal da escrita. A maioria dos fenômenos é sensível a ambos os canais, mas há

pressões específicas da escrita, bem como outras específicas da fala; alguns itens

mais frequentes na modalidade falada sequer são mencionados na escola. É o

caso o objeto de análise desta presente pesquisa: as condições do uso dos

pronomes nós e a gente , que não recebe nenhum tratamento sistemático da

escola, em nenhum nível de ensino. Ao menos é o que se deduz do exame dos

manuais de ensino da língua, em que inexistem seções de análise, descrição,

Nós/A gente: variação ou mudança? 30

tampouco exercícios de fixação das formas ditas incultas ou não prestigiadas,

como, em determinadas ocasiões, o pronome a gente, por exemplo.

Tende a haver uma reação mais veementemente rígida contra o termo a

gente, nos casos em que ele é utilizado com o verbo na primeira pessoa do plural,

como em a gente vamos estudar. O que se passa em a gente vamos é processo de

extensão dos efeitos da regularização, uma vez que a gente é reanalisado como

equivalente do nós.

Como na escola não há tratamento sistemático para fenômenos como esse,

outras agências sociais como a igreja, o clube, a família, as redes sociais, etc,

exercem papel homogeneizador nada desprezível.

Enfim, em projetos de pesquisa que privilegiam a língua falada, em situação

de entrevista, aparecem nitidamente as interferências do grau de formalismo da

gravação, como um efeito secundário e indireto da escolaridade. Outros fatores

certamente interferem como o fato do entrevistador ser uma pessoa culta, a

presença do gravador e o próprio tópico da conversa. Entretanto, o nível de

escolaridade desempenha um papel crítico na configuração geral do domínio da

língua padrão pelos informantes.

Cabe destacar e atribuir à escola a responsabilidade (e o mérito) por uma

parcela importante da tarefa socializadora que o uso de uma língua nacional, de

prestígio, exige. A escola, sozinha, entretanto, não faz a mudança, mas mudança

alguma se faz sem o concurso da escola.

1.2.5 As variáveis semânticas

A partir do momento que a Teoria da Variação se propôs a considerar as

variantes morfossintáticas, pragmáticas e discursivas, além das tradicionais

variantes fonéticas e fonológicas, introduziu-se automaticamente uma nova

dimensão de análise: a significação.

Estudos relacionados às variantes portadoras de significado e das variáveis

a elas correlacionadas atestam que as questões semânticas já passam a ser foco

de estudo da teoria variacionista. Sabe-se que o significado linguístico não se

encerra no conteúdo lexical, mas deriva em grande parte dos contextos linguísticos

ou situacionais em que a forma ocorre. Deste modo, a confirmação estatística da

relevância de grupos de fatores semânticos e pragmático-discursivos (fatores que

Nós/A gente: variação ou mudança? 31

levam em conta não só a organização discursiva, mas o contexto de enunciação e

a interação locutor-interlocutor) fornece pistas cruciais para a identificação do

significado das variantes. Neste trabalho, pretende-se constatar a regularidade e

consistência das relações entre as variáveis dependentes nós e a gente com foco

nas questões semânticas. É mister dizer que este tópico do trabalho se restringe a

conteúdos que dependem do conhecimento de mundo e/ou contexto para sua

interpretação: no caso, a variável independente, referencialidade dos pronomes.

1.3 LINGUAGEM E CONTEXTO

Não há mais dúvidas de que o tipo de contexto pode influenciar a maneira

como a linguagem é utilizada, já que muitos aspectos, tanto internos ao discurso,

como relativos à situação social em que este ocorre, podem ser considerados como

contexto. Entende-se por situação social a forma como duas ou mais pessoas

relacionadas entre si de maneira particular se comunicam sobre um determinado

assunto, em um determinado lugar.

O objetivo do estudo da linguagem em relação aos contextos sociais é

descobrir quais são as normas linguísticas de uma comunidade, reveladas pelas

variações estilísticas que forem observadas desde o ambiente mais formal até o

mais informal. Tudo indica que os falantes possuem um repertório linguístico que

pode variar dependendo do contexto, ou seja, de com quem fala, onde fala e sobre

o que fala. Assim sendo, pode-se afirmar que os membros de uma determinada

comunidade são capazes de adaptar sua maneira de falar e usar com maior

frequência as variantes de prestígio, segundo as normas.

Tudo isso porque sabemos que as línguas mudam com o tempo. Basta

compararmos a português com o latim, ou até mesmo o próprio português de hoje

com o da década de 30 para notarmos diferenças em todos os níveis: sintático,

semântico, fonológico, lexical e morfológico.

Esta mudança não se processa, através dos séculos, de forma repentina e

instantânea, como se numa bela manhã a população inteira de uma comunidade

acordasse falando de maneira diferente do dia anterior. Na verdade, as mudanças

linguísticas normalmente ocorrem de maneira gradual em várias dimensões. Nos

eixos sociais, por exemplo, os falantes mais velhos costumam preferir mais as

formas antigas, o que pode acontecer também com as pessoas mais escolarizadas,

Nós/A gente: variação ou mudança? 32

ou com aquelas que detêm uma posição socioeconômica de mais prestígio, ou por

exigências profissionais, etc. E ainda, uma mesma pessoa pode escolher uma

forma mais conservadora numa situação formal, preferindo outra mais atual em

uma situação menos formal.

Os eixos da própria estrutura linguística não são diferentes: num

determinado momento do processo de mudança, alguns itens lexicais ou estruturas

podem ser mais propensos a mudar.

Assim sendo, podemos concluir que a mudança linguística não é, sob

nenhuma hipótese, mecânica e regular a curto prazo. Em qualquer estado real da

língua, costumam coexistir formas de diversos estágios de evolução, embora a

longo prazo (normalmente no espaço de várias gerações) a mudança quase

sempre acaba afetando todos os níveis lexicais e todas as estruturas de um

determinado tipo.

1.3.1 A relevância da faixa etária para mudança lin guística

Muitos estudos revelam que os falantes adultos tendem a preferir as formas

antigas, criando situações interessantes de interação, já que algumas pessoas,

apesar de conviverem há muito tempo e estarem em constante interação (pai e

filho, por exemplo) costumam falar de maneiras muito distintas. Contudo, este

fato não afeta a comunicação, já que ambos os lados são capazes de se entender.

Trata-se apenas de uma tendência em direção a outra forma. Com o correr do

tempo, é provável que a forma nova seja adotada por todos.

Até aqui consideramos a mudança linguística – a curto ou a longo prazo –

em função da comunidade ou grupos componentes da comunidade. Contudo, é

importante lembrar que é o indivíduo quem fala, quem muda ou não sua maneira de

falar. Os estudos mais atuais da ciência da linguagem não afirmam ao certo até que

ponto a língua falada pelo indivíduo pode de fato mudar sua maneira no decorre

dos anos. Há duas posições teóricas, ambas sem evidência empírica convincente.

A primeira posição – a qual podemos chamar de clássica, já que é aceita por uma

boa quantidade de linguistas – postula que o processo de aquisição da linguagem

se encerra mais ou menos no começo da puberdade e que a partir de então a

língua do indivíduo fica essencialmente estável. Segundo Naro (2010)

Nós/A gente: variação ou mudança? 33

A gramática do indivíduo não pode sofrer mudanças significativas porque o acesso aos dispositivos cognitivos que possibilitam a sua manipulação (a chamada faculdade da linguagem) fica bloqueado, uma hipótese que se apoia na psicologia desenvolvimentista. Quaisquer eventuais mudanças seriam apenas esporádicas: troca de uma palavra por outra, troca de pronúncia de uma palavra, etc.

1.3.2 Mudança em tempo aparente

De acordo com a hipótese clássica, o atual estado da língua de um falante

adulto reflete o estado da língua adquirida quando o falante tinha aproximadamente

15 anos de idade.

Desta forma, a fala de uma pessoa com 60 anos hoje representa a língua

falada há quarenta e cinco anos atrás, enquanto outra pessoa com quarenta anos

hoje nos revela a língua de há apenas vinte e cinco anos. A escala em tempo

aparente, obtida por meio do estudo de falantes de diferentes idades, é chamada

“gradação etária”. Ela corresponde, sempre sob a hipótese clássica, a uma

mudança em tempo real.

Por fim, entende-se que o tempo aparente constitui uma espécie de

projeção sobre as possíveis mudanças na resolução das variações.

1.3.3 Variação estável ou mudança em progresso?

Com base na análise das variáveis sociais, procura-se definir o quadro de

variação observado na comunidade de fala nos termos da dicotomia entre variação

estável e mudança em progresso. No primeiro caso, o quadro de variação tende a

se manter ainda por um longo período, já que não se verifica uma tendência de

predominância de uma variante linguística sobre a(s) outra(s). Já um quadro de

mudança em progresso indica que o processo de variação caminha para a sua

resolução em favor de uma das variantes identificadas. Nesse quadro, a(s) outra(s)

variante(s) tenderia(m) a cair em desuso.

Nesse sentido, a grande questão é avaliar se um determinado cenário de

variação tende a se resolver em função de uma determinada variante, efetivando-se

a mudança linguística, ou se as variantes identificadas tendem a se manter no uso

linguístico da comunidade, dentro de uma estratificação específica, o que

caracterizaria a variação estável.

Nós/A gente: variação ou mudança? 34

Nós/A gente: variação ou mudança? 35

2.1 CONTEXTO DA PESQUISA: A CIDADE DAS MANGUEIRAS

O Pará (Mapa 1) fica no centro-leste da região Norte. A origem do nome Pará

vem do termo pará, que significa rio-mar na língua indígena tupi-guarani. Era como

os índios denominavam o braço direito do rio Amazonas, engrossado com as águas

do rio Tocantins, que o torna tão vasto a ponto de não se poder ver a outra margem,

mais parecendo um mar que um rio. Ao ‘chegarem’ à região, os portugueses deram

primeiramente o nome de Feliz Luzitânia a terra, que foi depois substituído pelo de

Grão-Pará (grande rio), para, finalmente, se tornar Pará.

(www.brasilrepublica.com/para.htm)

MAPA 1 – Localização de Belém no Estado do Pará

Fonte: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 . Acessado em 10/12/2010.

Eis algumas informações sobre o estado no Quadro 1.

Quadro 1 – Dados sobre o Pará

Capital Belém

Área (km²) 1.247.950,003

Número de Municípios 143

População 2010 7.588.078

Fonte: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 .Acessado em 10/12/2010.

Nós/A gente: variação ou mudança? 36

É neste espaço geográfico que está localizada a maior cidade da Linha do

Equador: Belém (marcada com uma bolinha vermelha no Mapa 1), carinhosamente

apelidada de “Cidade das Mangueiras”. É com essa referência que a capital do

estado do Pará é ‘exportada’ para o mundo inteiro pelo segmento turístico.

O primeiro núcleo habitacional da cidade constituiu-se a partir de uma

fortificação, o Forte do Castelo, o que é uma tônica da colonização portuguesa.

Maior metrópole do Norte brasileiro, detalhe que credencia a Cidade Morena

a ser considerada a porta de entrada para a região Norte, tornando-a Metrópole da

Amazônia.

Não foi à toa que o atual prefeito, Dulciomar Costa, adotou o slogan

Metrópole da Amazônia como bandeira principal da sua administração para

‘resgatar’ a autoestima da população belenense. O trabalho, nesse sentido, pode ser

constatado a partir do símbolo da nova administração, em que se vê a imagem

estilizada de uma mangueira.

O ícone é de forte apelo para a população que identifica turisticamente (Mapa

2) a capital como a Cidade das Mangueiras, alusão à grande quantidade dessa

árvore, nos principais corredores de viários municípios, formando uma espécie de

túnel verde.

MAPA 2 – Belém – A maior cidade da linha do Equador

Fonte: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. Acessado em 10/12/2010.

Nós/A gente: variação ou mudança? 37

Nascida das ‘expedições’ da Coroa Portuguesa, em busca de novos

territórios, na foz do rio Amazonas, Belém foi fundada a 12 de janeiro de 1616. Foi o

Capitão-mor Francisco Caldeira Castelo Branco quem aportou às margens da baía

de Guajará para assegurar o domínio da nova terra e resguardá-la do ataque de

corsários vindos da Inglaterra e da Holanda.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou dia

29/04/2010 os primeiros resultados do Censo 2010. Pelos dados apresentados,

hoje, a população brasileira é formada por 190.755.799. No Pará, o número de

habitantes cresceu. São 7.581.051, quase um milhão e 400 mil habitantes a mais do

que as 6.189.550 pessoas registradas no último levantamento feito pelo órgão em

2000, a maior parte concentrada nas áreas urbanas.

Belém também é denominada de Cidade Morena, característica herdada da

miscigenação do povo português com os índios Tupinambás, nativos habitantes da

região à época da fundação. município. (http://servicos.belem.pa.gov.br)

Segundo o IBGE, na região metropolitana de Belém, quando somadas as

populações da capital e de Ananindeua – que já é a 40ª maior cidade do Brasil –

concentram-se 1.865.379 pessoas. Belém passou de 1.280.614, em 2000, para

1.393.399 em 2010, e é hoje a a 11ª maior cidade do país.

Em Belém, a densidade demográfica é de 1315,27 habitantes por quilômetro

quadrado. O município de Altamira tem uma das menores densidades demográficas

do país: 0,62 habitante por quilômetro quadrado.

Os fatos que circundam a história de Belém tornaram a área do quadrilátero

da fundação roteiro obrigatório para turistas que visitam a capital do Pará.

Atualmente, denominado de Complexo do Ver-O-Peso. O centro histórico leva o

nome de um dos logradouros mais exportados para o trade turístico nacional e

internacional: o Mercado do Ver-o-Peso, porto principal de barcos que chegam à

cidade, procedentes de vários lugares.

Essas embarcações emprestam ao Ver-O-Peso um burburinho culturalmente

muito peculiar, constituem um detalhe, à parte. Mas a vida urbana de Belém sofre

influências aquáticas em quase toda a sua totalidade, basta conhecer a rede

hidrográfica da cidade: as baías do Sol, do Marajó, do Guajará, de Santo Antônio; os

rios Guamá, Pratiquara, Murubira, Mari-Mari; igarapés do Tucunduba, Val-de-Cans,

do Uma e do Combu; e o Furo do Maguari, só para citar os mais importantes.

Nós/A gente: variação ou mudança? 38

O potencial hidrográfico de Belém é enorme pela posição privilegiada

entrecortada por baías, rios, igarapés e furos que se espalham na porção continental

e na região insular. A baía do Marajó a banha ao Norte; o leste é delimitado pelos

municípios de Ananindeua, Santo Antônio do Tauá, Santa Bárbara do Pará e

Marituba; o município de Acará e o rio Guamá são o limite ao sul; e, as baías do

Guajará e do Marajó, limitam a cidade a oeste. É comum ouvir, no meio turístico,

uma referência à chuva de Belém, a clássica expressão “antes ou depois da chuva”,

em vários meses do ano. No entanto, o período de chuvas mais fortes vai de maio

até dezembro.

No mês de julho, os termômetros registram temperaturas que variam de 20

graus mínimos à máxima de 38 graus, porém, até novembro, ainda se sente muito o

calor belenense.

Nesse espaço geográfico, foram selecionados cinco bairros para o Projeto

VALUNORTE, distribuídos segundo os pontos cardeais, conforme o Mapa Geral da

Listel (2006 -2007). Ao norte da cidade, o bairro do Benguí; ao sul, o do Guamá; a

leste, o do Souza; a oeste, o da Sacramenta e, ao centro, o de Nazaré, este, lócus

desta pesquisa. A seleção dos 5 (cinco) bairros da cidade de Belém, capital do

estado do Pará, para a documentação da fala dos sujeitos, tomou por base o (Mapa

3), que apresenta a divisão dos Distritos Administrativos de Belém – DAM.

Nós/A gente: variação ou mudança? 39

MAPA 3 – Distritos Administrativos da cidade de Bel ém

Fonte : http://www.belem.pa.gov.br/new/index. php.

Esses bairros correspondem a cinco áreas urbanas linguísticamente

representativas e posicionadas geograficamente: ao norte da cidade, o bairro do

Bengui, ao sul, o do Guamá, à leste, o do Souza, a oeste, o da Sacramenta, e, ao

centro, o de Nazaré (Mapa 4).

Nós/A gente: variação ou mudança? 40

MAPA 4 – Bairros da cidade de Belém

Fonte : http://www.belem.pa.gov.br/new/index.php.

2.1.1 O bairro de Nazaré

A seta verde, no Mapa 4, indica o bairro de Nazaré. Nome de origem

hebraica, siginifica “aquele que guarda”. Aqui em Belém, contudo, o nome do bairro

foi dado em homenagem à padroeira da cidade, Virgem de Nazaré. Denominação

que faz sentido considerando-se a origem do bairro, que se confunde com o

momento e com o lugar em que o caboclo Plácido encontrou a imagem de Nossa

Senhora de Nazaré às margens de um rio, onde posteriormente seria construída a

Basílica de Nazaré, hoje Basílica Santuário, no início do século XX.

O bairro de Nazaré é, sem dúvida, um dos mais nobres e bem estruturados

de nossa cidade, além de ser um dos metros quadrados mais caros da capital do

Pará. Geograficamente, encontra-se numa posição privilegiada (vide Mapa 4), se

comparado aos demais bairros. Em Nazaré encontram-se lojas, serviços, colégios,

restaurantes, etc, de boa qualidade e com variedade. Se o trânsito intenso agita as

Nós/A gente: variação ou mudança? 41

ruas durante o dia, à noite, a intensidade é menor, permitindo que os moradores

ainda desfrutem de alguma tranquilidade depois de um dia de trabalho.

Por volta de 1900 a 1912, uma das, se não a melhor fase de Belém, o centro

da cidade foi urbanizado, inspirado nas intervenções de Houssmen, na França.

Foram contratados arquitetos e engenheiros franceses para elaborar o estudo da

urbanização de Belém. Além dos franceses, os ingleses também exerceram forte

influência nesse processo, embora em menores proporções que os franceses.

Pela sua localização na cidade (Mapa 5), encontra-se numa região onde a

violência e o trânsito caótico já incomodam os moradores. No entanto, o bairro ainda

é muito bem quisto e valorizado por todos os que ali habitam.

MAPA 5 – Localização do bairro de Nazaré na cidade de Belém

Fonte: wikipedia. Acesso em 05.08.10.

2.1.1.1 Dados geográficos, sociais, econômicos e hi stóricos

Compreende a área envolvida pela poligonal que tem início na interseção da

Av Dr. Assis de Vasconcelos com a Rua Henrique Gurjão. Segue por esta até a

Trav. Benjamim Constant, dobra à direita e segue por esta até a Rua Boaventura da

Silva, dobra à esquerda e segue por esta até a Av. Alcindo Cacela, flete à direita e

segue por esta até a Av. Conselheiro Furtado, flete à direita e segue por esta até a

Nós/A gente: variação ou mudança? 42

Trav Quintino Bocaiuva, flete à direita e segue por esta até a Av Gentil Bittencourt,

flete à esquerda e segue por esta até Av. Serzedelo Corrêa, flete à direita e segue

por esta até a Av. Nazaré, flete à direita e segue por esta até a Av. Dr. Assis de

Vasconcelos. f1ete à esquerda e segue por esta até o início da poligonal. Na Figura

1, se tem uma vista geral deste bairro.

(http//www.guiadoleitor.com.br/bairros/naz.htm).

FIGURA 1 – Vista geral do bairro de Nazaré – o segu ndo metro quadrado mais caro da cidade

de Belém

Fonte: www.skyscrapercity.com.

O nomes dados aos moradores pelos próprios moradores de outros bairros é

Nazaré. O número de habitantes oficial é 18.760 hab (IBGE – Censo 2000) e

calculado pelos moradores e 20.000 hab.

Atividades econômicas predominantes Bancos, Supermercados, Farmácias,

Boutiques e Restaurantes. Há também indústrias caseiras, do tipo Vous Voules –

venda de chocolate caseiro.

Principais vias de acesso: Avenida Nazaré, Avenida Governador José

Malcher, Avenida Braz de Aguiar, Avenida Gentil Bittencourt, Avenida Conselheiro

Furtado, Avenida Generalíssimo Deodoro, Avenida 14 de Março, Travessa Quintino

Bocaiuva, Travessa Benjamim Constant e Travessa Doutor Moraes.

Nós/A gente: variação ou mudança? 43

As linhas de ônibus são inúmeras, a Avenida Nazaré é uma das principais de

Belém, entre elas: Águas Lindas, Almir Gabriel, Ananindeua, Castanheira, Ceasa,

Cidade Nova 1/4/5/6, Curió/ Utinga, Guamá /Montepio, Guamá /Presidente Vargas,

Guamá/Ver-o-Peso, Marambaia, Marex/Arsenal, Marex/Centro, Marituba/ Presidente

Vargas, Pedreira Condor, Pedreira Nazaré, Satélite/Presidente Vargas, Ufpa/

Presidente Vargas, Ufpa /Ver-o-Peso, Ufpa/Pe. Eutíquio, Unama BR/Presidente

Vargas 40 Horas

O bairro de Nazaré, como não poderia deixar de ser, conta com um bom

serviço de saneamento básico; bem como urbanização e lazer. O bairro oferece

boas opções de bares e restaurantes, bem como a Av. Braz de Aguiar, que é um

atrativo luxuoso para aqueles que gostam de passear e comprar o que há de mais

novo nas tendências da moda nacional e internacional. A praça SANTUÁRIO,

localizada bem em frente à BASÍLICA DE NAZARÉ, é um espaço procurado pelas

crianças do bairro, bem como por casais de namorados no final da tarde.

Em relação à educação pública, há 4 escolas da rede estadual: Escola de

Ensino Findamental e Médio Orlando Bitar, Escola Estadual Pinto Marques, Escola

Estadual Deodoro de Mendonça e Escola Estadual Ulisses Guimarães.

Quanto à saúde pública, há farmácias, posto de saúde, e maior segurança

pública, comparada a outros bairros da periferia. O valor de rendimento nominal

médio mensal das pessoas responsáveis por domicílios particulares permanentes,

no bairro de Nazaré, é compatível com o da classe média/alta do país.

O bairro de Nazaré teve como “primeira habitante” conhecida uma imagem de

Nossa Senhora de Nazaré. Segundo informações divulgadas no site da Basílica

Santuário de Nossa Senhora de Nazaré (www.basilicadenazare.com.br), baseadas

no manuscrito de Dom Frei João Evangelista Pereira - quinto bispo do Pará (de 1772

a 1782)

"No ano de 1700, o agricultor e caçador paraense Plácido José de Souza encontrou, entre pedras lodosas às margens do igarapé Murutucu (onde hoje encontra-se a Basílica), uma pequena imagem da Senhora de Nazaré. Plácido levou a imagem para sua casa, mas constatou na manhã seguinte que ela havia, milagrosamente, retornado ao seu local de origem. Devido a este fato, Plácido ergueu, no local do achado, para abrigar a imagem, o primeiro oratório(...)”

Nós/A gente: variação ou mudança? 44

Foi o começo da devoção por Nossa Senhora em Belém do Pará, assim

como, anos mais tarde, o surgimento de um novo bairro em nossa cidade: O bairro

de Nazaré.

Atraídas por esse fato, as pessoas passaram a olhar para o bairro “com

outros olhos”. Os devotos viam (e ainda vêem) o lugar como abençoado, escolhido

pela “santinha” e, logo, por eles, para fazer morada. Além disso, o movimento

religioso mais importante do Estado, quiçá de Brasil, o Círio de Nazaré, se

corporifica neste bairro.

Esta festa, também conhecida como o 2º Natal dos paraenses, inicia mais

exatamente no Colégio Gentil Bittencourt, de onde sai a imagem peregrina para sua

procissão anual e caminha com o povo (cerca de 1,5 milhão de pessoas) até a Igreja

da Sé (Cidade Velha), cumprindo um percurso de 1,2 quilômetro. Este movimento é

conhecido como Trasladação, e acontece sempre na noite anterior à procissão

principal. Na manhã do 2º domingo de outubro de cada ano, a imagem, então,

retorna à sua morada: a Basílica Santuário, refazendo o percurso inverso, mas

agora acompanhada de quase o dobro de devotos que esperam ser cobertos pelo

manto da “Santa Mãezinha”, enquanto cobrem as ruas com lágrimas de

agradecimentos, pedidos e comoção.

O advento do Círio é muito mais do que uma festa religiosa, já ganhou a

proporção de Patrimônio Cultural da Humanidade, símbolo da cultura paraense, que

faz fruir um sentimento de pertença entre os paraenses em todo mundo.

2.2 OS SUJEITOS

Os sujeitos foram selecionados obedecendo a critérios predeterminados pelo

Projeto VALUNORTE. O número de sujeitos corresponde a quantidade mínima

permitida estatísticamente, obedecendo a um critério de proporcionalidade em

relação ao total de habitamtes do bairro, considerando : sexo, idade e grau de

escolaridade, conforme discrimina tabela na Seção I. Ao todo, perfazem o total de 35

sujeitos (Quadro 3), os quais foram solicitados a falar, espontaneamente, sobre as

férias que mais marcaram suas vidas, justificando suas escolhas, a fim de que o

registro durasse tempo suficiente para a posterior análise do fenômeno escolhido.

Nós/A gente: variação ou mudança? 45

QUADRO 3 – Síntese da distribuição dos sujeitos, se gundo os fatores: bairro, sexo, faixa etária e grau de escolaridade

Fonte: Projeto Valunorte/UNAMA/2009.

Além do sexo, a idade e o nível de escolaridade também foram itens

relevantes para esta pesquisa. Os sujeitos foram identificados com base nesses

critérios, conforme tabela a seguir

QUADRO 4 – Código de identificação dos sujeitos

Fonte: Projeto Valunorte/UNAMA/2009.

2.3 A DOCUMENTAÇÃO DA FALA

Para a produção dos dados foi usada a técnica da entrevista, por meio de

dois Roteiros de entrevista, que objetivaram, inicialmente, conhecer os sujeitos e

posteriormente gravar a fala. São eles:

• Tipo A: entrevista – objetivou obter informação da identidade social dos

sujeitos (não foi gravada).

NAZARÉ

SEXO 18 a 25 ANOS 26 a 45 ANOS ACIMA DE 46 ANOS

Total ALF EM ES ALF EM ES ALF EM ES

FEMININO 1 1 3 1 1 4 1 2 6 20

MASCULINO 1 1 2 1 1 3 1 1 4 15

Total 2 2 5 2 2 7 2 3 10 35

identificação dos sujeitos

SUJEITO S

HOMEM H

MULHER M

IDADE I

ALFABETIZADO ALF

ENSINO MÉDIO EM

ENSINO SUPERIOR ES

Nós/A gente: variação ou mudança? 46

• Tipo B: entrevista com duração, em média, de 4 a 10m – conversa não

controlada e gravada, em que os sujeitos relataram sobre suas “férias

inesquecíveis”

A conversa gravada, segundo o roteiro tipo B, constitui os dados brutos. Deles

foram extraídas ocorrências dos pronomes “a gente” e “nós” , objetivando a

frequência delas no corpus. A frequência permitiu avaliar o grau de produtividade da

ocorrência, ou seja, as recorrências. Essas foram analisadas segundo o contexto do

texto em que foi produzido. Assim, espera-se estudos e pesquisas, usos linguísticos

reais, de falantes reais, em situações reais de comunicação. Não se almeja,

portanto, chegar a um ideal de uso linguístico e sim registrar o maior número

possível de ocorrências, neste caso, dos pronomes a gente e nós e quem são os

sujeitos que as usam.

Em meio a uma atual e acalorada discussão sobre desvio ou variação nos

livros didáticos, a fala é uma das maiores colaboradoras para transformar o que era

desvio, em variação. Aqui, o fenômeno observado foi o uso das formas pronominais

“a gente” e “nós”, na língua portuguesa, mais especificamente no dialeto paraense,

usado no bairro de Nazaré.

2.3.1 A composição e análise do corpus

Neste estudo, os dados de fala foram abordados à luz da Sociolinguística,

numa perspectiva variacionista, isto é, por meio de pesquisa quantiqualitativa dos

usos que os falantes fazem da língua em contextos extralinguísticos, o que permitir

perceber a sistematicidade da variação, considerando as chamadas variáveis

independentes.

As chaves para descobrir os padrões que governam a variação na estrutura

de um dado sistema linguístico foram encontradas nas variáveis extralinguísticas,

como: lugar de moradia; faixa etária; grau de escolaridade; e sexo dos falantes. O

mercado linguístico selecionado para esta pesquisa se configura conforme segue:

seleção do contexto; seleção dos sujeitos; documentação da fala por meio de

entrevistas gravadas; transcrição grafemática das entrevistas feitas pela própria

pesquisadora; composição e análise do corpus.

Nós/A gente: variação ou mudança? 47

Nós/A gente: variação ou mudança? 48

3.1 NOVAS FORMAS... NOVOS FATOS

A inserção das formas gramaticalizadas você e a gente no português do

Brasil (PB) trouxe uma série de repercussões gramaticais em diferentes níveis.

Novas possibilidades combinatórias tornaram-se comuns: você com te~lhe~o(a),

seus~teus, de vocês, etc. Em resumo, este processo acarretou mudanças nas

outras subcategorias pronominais (possessivos, oblíquos átonos e tônicos), como

em Você disse que eu te encontraria mais cedo, ou ainda Você conseguiu o teu

lugar na fila?

Outra reestruturação ocorreu no paradigma verbal que sofre perdas

significativas em termos flexionais, passando de seis para três formas básicas (eu

estudo / você/tu/ele/ela/a gente estuda / vocês/eles estudam ). Duarte (1993)

defende a ideia de que o português do Brasil estaria passando de uma língua de

sujeito nulo para uma língua de sujeito pleno, já que a perda da desinência verbal

faz com que os novos pronomes sejam os únicos indicadores da categoria

pessoa; daí sua presença ter se tornado cada vez mais obrigatória. Lopes (1993)

conclui que com o pronome a gente o falante não se sente compromissado com o

discurso, já que esta forma pode englobar as demais pessoas.

Originalmente gens, gentis significa “raça”, “família”, “tribo”, “o povo de um

país, comarca ou cidade” (LOPES, 1999). De acordo com este princípio, este termo

carrega uma grande carga semântica de referência genérica.

(1) S23MI48ESL25

...a gente acabou fazendo essa viagem juntos e por esses motivos essa

também foi uma viagem especial...

3.1.1 O fenômeno da Gramaticalização

Advinda de uma expressão nominal, o substantivo a gente, ao assumir, em

determinados contextos discursivos, determinadas propriedades, valores e funções,

passou a fazer parte de uma outra categoria. Configura-se, então um caso de

gramaticalização , que, de forma geral, ocorre quando um item lexical se torna, em

certas circunstâncias, um item gramatical, ou quando itens gramaticais se tornam

ainda mais gramaticais, ou seja, “passam a assumir posições mais fixas nas

Nós/A gente: variação ou mudança? 49

sentenças, tornando-se previsível em termos de uso”. (cf. Traugott&Heine, 1991 e

Hopper & Traugott, 1993, Heine, 2003, Castilho, 2007).

Nos estudos funcionalistas sobre gramaticalização, reavivados nas décadas

de 80 e 90, autores como Lichtenberk (1991) retomam discussão sobre o problema

da transição (Weinreich, Labov & Herzog 1968) defendem a ideia de que o

gradualismo é inerente aos fenômenos de gramaticalização estudados. Por ser um

fenômeno contínuo, postula-se que a gramaticalização não seja um processo que

possa vir a se extinguir. Em concordância com a Teoria Sociolinguística de Labov

(Weinreich, Labov & Herzog 1968), conclui-se que os fatores que produzem

mudanças, não só no eixo linguístico, mas também na vida de uma comunidade,

não são repentinos nem súbitos, mas ocorrem lenta e gradualmente, e é por isso

que a mudança linguística requer a observação de dois ou mais estágios de

uma língua . No percurso de uma língua, há estágios intermediários em que formas

coocorrem num processo que pode durar séculos.

A gramaticalização pode ser considerada como uniderecional, ou seja, uma

vez iniciada uma atapa do processo, não há retorno ao estágio anterior. Para a

identificação de um processo de gramaticalização é necessário que se observe três

critérios: sintáticos, semânticos e morfofonéticos.

Graças ao caráter contínuo da gramaticalização, este processo pressupões,

sobretudo em seu estágio inicial a coexistência de novos valores/usos ao lado de

características antigas. O princípio da persistência de Hooper (1991;124)

corrobora com esta perspectiva quando, quando se postula que “alguns traços do

significado lexical original de um item tendem a aderir à nova forma gramatical, e

detalhes de sua história lexical podem refletir-se na sua distribuição gramatical”,

Isso ocorre na gramaticalização de a gente (nome) > a gente (pronome).

Algumas propriedades do nome a gente foram salvaguardadas, da mesma maneira

que nem todas as propriedades intrínsecas aos pronomes pessoais foram

assumidas. Do nome a gente, a forma gramaticalizada mantém o traço formal de 3ª

pessoa, embora nos dê indicações semântico-discursivas de 1ª pessoa [+EU].

Ainda que o verbo em concordância com a gente mantenha-se na 3ª pessoa do

singular, interpreta-se a existência de uma falante+alguém. Este comportamento

está também associado ao princípio da decategorização (Hopper, 1991), o qual

indica a neutralização das marcas morfológicas e propriedades sintáticas da classe-

origem (nome) e adoção dos atributos da classe-destino (forma pronominal).

Nós/A gente: variação ou mudança? 50

(2) S16H139ESL7

... a gente ficou numa casa alugada, que a minha irmã alugou, ela tinha um bar...

3.1.1.1 A perda do traço de número

O traço formal de número plural foi se perdendo com o decorrer do tempo.

Estudos mostram que o substantivo gente apresentava nitidamente características

próprias do nome, uma vez que podia ser usado tanto no singular (esta gente)

quanto no plural (estas gentes). Já no século XVI, verificou-se um percentual

significativo de 74% de ausência do traço de número plural. Desde então, ocorre

uma perda crescente deste traço, atingindo 100% no século XX.

(3) S23M48ESL2

... eu vou falar de quando a gente foi pra Disney...

3.1.1.2 A perda do traço formal de gênero

Além da mudança com relação às propriedades de número, verifica-se que,

com a gramaticalização do termo a gente, tenha ocorrido também uma alteração

nos traços de gênero, sejam eles formais ou semânticos.

Pesquisas realizadas por Lopes (1999,2003) mostraram que entre o século

XIII e o XV, havia uma grande variedade de concordância no predicativo,

envolvendo sobretudo o plural, até porque a gente, conforme dito anteriormente,

sofria diversificação quanto ao número (todas as gentes da aldeia ficaram

arrasadas/ toda gente da aldeia ficou arrasada). A partir do século XVI, essas

possibilidades de concordância começam gradativamente a diminuir a frequência

de uso. Já nos séculos XIX e XX a concordância torna-se categórica para o

feminino singular. A forma gramaticalizada a gente apresenta a especificação

positiva de gênero formal [+fem] do substantivo desaparece, tornando-se neutra.

Em relação à interpretação semântica de gênero, com a pronominalização, o a

gente passa a poder combinar-se com adjetivos no masculino e/ou no feminino, de

acordo com o gênero semântico (a gente ficou cansada (referência exclusiva a

mulheres) ou a gente ficou cansado (referência mista ou exclusiva a homens).

Nós/A gente: variação ou mudança? 51

(4) S17HI39ESL11

...viajar pra Mosqueiro e a gente foi assaltado...

A partir dessa mudança de propriedade, a combinação formal no predicativo

com formas no masculino e no feminino teria relação direta com o sexo do

referente. Contudo, o fato de a gente pressupor “o falante mais alguém”, ou seja, a

noção de pluralidade intrínseca a essa forma, “variante de nós”, permite várias

possibilidades interpretativas ao estabelecer a concordância com adjetivo em

estruturas predicativas.

Diversos estudos com amostras diversificadas do português do Brasil

(Omena 1986; Lopes 1993, 1999, 2003; Alves Fernades, 1996; Machado 1997,

entre outros) procuraram demonstrar a movimentação proveniente da inserção da

forma inovadora a gente sobre a mais antiga nós. Ambas as formas coexistem no

português falado no Brasil; entretanto, aparentemente, a forma inovadora vem

ganhando espaço nos últimos 30 anos.

(5) S29MI60EM

L2 ... quando nós fomos coincidiu com a época do natal...

L8 ... a gente não precisava tá se abanando...

L19 ..a gente olhava pro teto do restaurante era todo de ouro...

Com base nesses novos fatos é que foi possível fazer a investigação que

norteia esta pequisa, verificando as ocorrências da forma nova e da forma velha no

contexto em questão.

3.2 OS DADOS FALAM

Os trinta e cinco (35) sujeitos que colaboraram com esta pesquisa, moradores

do bairro de Nazaré, em Belém do Pará, inicialmente foram convidados a contar

sobre “As férias que marcaram suas vidas”.

Nós/A gente: variação ou mudança? 52

QUADRO 3 – Síntese da distribuição dos sujeitos, se gundo os fatores: bairro,

sexo, faixa etária e grau de escolaridade NAZARÉ

SEXO 18 a 25 ANOS 26 a 45 ANOS ACIMA DE 46 ANOS

Total ALF EM ES ALF EM ES ALF EM ES

Feminino 1 1 3 1 1 4 1 2 6 20

Masculino 1 1 2 1 1 3 1 1 4 15

Total 2 2 5 2 2 7 2 3 10 35

Fonte: Projeto VALUNORTE, UNAMA//2009.

Pelo Quadro 3, verifica-se que 22 sujeitos eram graduados (62,86%). Além

disso, este é um bairro considerado ‘nobre’ na cidade, onde a maioria dos

moradores pertence à classe média alta. Todavia, para fins desta análise foram

considerados apenas os fatores: grau de escolaridade, faixa etária e o sexo para

que algumas constatações e inferências fossem possíveis.

Foram entrevistadas nove pessoas na faixa etária 18 a 25 anos, sendo cinco

mulheres e quatro homens. Dentre as mulheres, verifica-se que três mulheres

usaram somente o pronome “a gente” , uma usou somente o pronome “nós” e uma

usou os dois sem predominância. Já os homens, três usaram somente o pronome “a

gente” e um usou somente o “nós” , o que nos permite dizer que 66,67% dos

sujeitos nesta faixa etária usaram preferencialmente a variante inovadora (Gráfico

1). Com base neste dado especificamente, poderia se considerar a hipótese de que

esteja ocorrendo uma mudança em progresso , já que entre os mais jovens

aparece com maior frequência o uso das formas inovadoras (Cf. CHAMBERS e

TRUDGILL, 1980).

Nós/A gente: variação ou mudança? 53

GRÁFICO 1 – Ocorrência de nós e a gente entre os su jeitos de 18 a 25 anos - (a) sexo

Fonte: Pesquisa de campo/2010 e 2011.

Conforme explicitado na Seção 1 desta pesquisa (tópico 1.3.2), apostando-se

em uma estabilidade do sistema, criou-se a hipótese de que o padrão linguístico

fixado por um indivíduo jovem se conserva mais ou menos intacto pelo resto de sua

vida; só assim podemos imaginar que o padrão depreendido do comportamento

linguístico dos falantes de 60 anos de hoje corresponderia a padrão fixado na

comunidade há 40 anos (LABOV, 1981; e NARO, 2003, p. 43-50).

Ainda na mesma Seção 1 deste trabalho (1.3.3), explica-se sobre variação

estável e mudança em progresso. Analisando isoladamente o gráfico 1, verifica-se a

força da variante inovadora dentro desta comunidade, haja vista a predominância de

seu uso dentre os homens e mulheres mais jovens desta comunidade.

Com relação ao grau de escolaridade, o Gráfico 2 revela que só 2 sujeitos

graduados usaram somente o pronome nós ; os alfabetizados e aqueles com apenas

o ensino médio concluído preferiram o pronome a gente .

Nós/A gente: variação ou mudança? 54

GRÁFICO 2 – Ocorrência de nós e a gente entre os su jeitos de 18 a 25 anos - (b) escolaridade

Fonte: Pesquisa de campo/2010 e 2011.

Foram entrevistadas 11 pessoas, na faixa etária 26 a 45 anos, sendo cinco

homens e seis mulheres. Dentre os sujeitos, verifica-se 45.45 % (equivale a cinco

pessoas) usaram somente o pronome a gente , e o número de sujeitos que não

usaram nenhum dos dois termos (36,36%) entre homens e mulheres. É importante

ressaltar que os dois entrevistados pertencentes ao grupo de alfabetizados, um do

sexo masculino e outro do sexo feminino não utilizaram nenhum dos pronomes

estudados nesta pesquisa. (Gráficos 3 e 4).

GRÁFICO 3 – Ocorrência de nós e a gente entre os su jeitos de 26 a 45 anos - (a) sexo

Fonte: Pesquisa de campo/2010 e 2011.

Nós/A gente: variação ou mudança? 55

GRÁFICO 4 – Ocorrência de nós e a gente entre os su jeitos de 26 a 45 anos - (b) escolaridade

Fonte: Pesquisa de campo/2010 e 2011.

Foram entrevistadas 15 pessoas com idade acima de 46 anos, sendo nove

mulheres e seis homens. Dentre eles, nove usaram somente ou predominantemente

o pronome nós , o que equivale a 60% deste grupo. Considerando o grau de

escolaridade, verifica-se que os dois alfabetizados usaram somente o pronome a

gente ; já os entrevistados com o ensino médio usaram ou o nós ou não usaram

nenhum dos dois termos, e entre os entrevistados graduados, a maioria usou ou

somente ou predominantemente o nós. (Gráficos 5 e 6).

GRÁFICO 5 – Ocorrência de nós e a gente entre os su jeitos acima de 46 anos - (a) sexo

Fonte: Pesquisa de campo/2010 e 2011.

Nós/A gente: variação ou mudança? 56

GRÁFICO 6 – Ocorrência de nós e a gente entre os su jeitos acima de 46 anos - (b) escolaridade

Fonte: Pesquisa de campo/2010 e 2011.

O gráfico 5 confirma a ideia defendida por Fischer (Seção 1 – 1.2.3) de que

“na fala das mulheres há uma predominância da forma de prestígio”. Conforme já

dito nesta seção anterior, vários estudos concordam com a afirmação de Fischer,

revelando uma regularidade considerável na preferência das mulheres pelas

variantes linguísticas mais prestigiadas socialmente. Já os gráficos 1 e 3, contestam

esta afirmação, acrescentando então um outro fator importante: a faixa etária dessas

mulheres.

Os gráficos 5 e 6 vão ao encontro da hipótese explicitada na Seção 1 (1.3.2)

deste trabalho de que “a fala de uma pessoa com 60 anos hoje representa a língua

falada há quarenta e cinco anos atrás...”

Todos os gráficos apresentados acima nos mostram que há uma

predominância na incorrência da variável nós entre os indivíduos com grau de

escolaridade superior aos demais, o que corrobora com a ideia explicitada na Seção

1 (1.2.4) de que a variável nível de escolarização é uma grande influência para a

manutenção das formas de prestígio, aqui representada pelo nós.

Para completar esta análise, segue uma síntese dos fatores verificados, e,

paralelamente, os resultados obtidos.

Nós/A gente: variação ou mudança? 57

• O primeiro fator estrutural testado foi a realização morfológica da

pessoa verbal

Este fator busca distinguir a realização do verbo na 1ª pessoa do plural ou na

3ª pessoa do singular. Para poder separar presença e ausência de desinência

número-pessoal e tempo verbal, apenas a desinência foi observada, com o propósito

de verificar se a desinência de 1PP (-mos; mo0) inibe o uso da variante a gente.

Os valores obtidos (em percentual) indicam que é preferencial o uso do a

gente com o verbo na 3PS (90,1%), havendo apenas 1% de ocorrência desse

pronome com o verbo na 1PP (2,8%). Quanto ao uso do pronome nós , o maior uso

é com o verbo em 1PP (99%) Os valores probabilísticos obtidos confirmam os

resultados percentuais. Fica claro aqui que a morfologia verbal de 1PP inibe a

variação.

Além disso, foi constatada uma significativa a ocorrência do pronome nós

como sujeito desinencial, o que mostra que a ausência de marcas morfológicas de

pessoa favorece o uso deste pronome, como nos exemplos:

(6) S1MI23ESL12

...eu ver, o que a gente fez .. ah, a gente, teve um dia que a gente fez a

noite do...

(7) S14HI38ESL5

...a gente tem um outro espírito e eu faço isso costumeiramente nas

férias...

(8) S21MI46ESL17

...então isso foi, na verdade, muito triste pra gente... a gente tentou ainda

fazer...

(9) S34MI65ESL3

... levamos inclusive mais duas sobrinhas...estávamos todos juntos...

Nós/A gente: variação ou mudança? 58

• O segundo fator testado foi referência

Lopes (2003) ao analisar o uso do substantivo homem como pronome

indefinido no português arcaico, constatou que tal emprego estaria diretamente

relacionado a perda da referência do nome substantivo que, ao ser utilizado como

pronome, assume um lugar de indeterminação. Em um dado momento

intermediário do processo gradual da perda da especificidade, a palavra homem

assumiu um caráter genérico antes de atingir o seu mais alto nível de

indeterminação.

Considerando-se a hipótese de que o termo a gente herdou o traço

indeterminado do substantivo gente, esse passa, então, a integrar o sistema

pronominal, concorrendo com o pronome nós, o qual também permite várias

leituras interpretativas que vão desde uma determinação precisa como eu+você ou

eu+ele, até um grau máximo de indeterminação e generalidade: eu+todo mundo ou

eu+ qualquer um. Em termos comparativos, os diversos estudos sincrônicos

(Omena, 2003, Monteiro, 2001, Lopes, 1993, entre outros) já demonstraram que há

uma diferenciação no emprego de nós e a gente em relação a um uso mais restrito

ou mais genérico. O falante usa preferencialmente o pronome nós para se referir a

ele mesmo e mais o interlocutor (não-eu): referente [+perceptível] e [+determinado].

Quando o falante amplia a referência, indeterminando-a, há mais preferência pela

forma a gente (Lopes, 1993:130).

A análise dos dados deste trabalho visa a verificar se o fator referência

influencia no uso das formas pronominais estudadas.

Tendo em vista a hipótese de que contextos de referência [+genérica]

favoreceriam a variante a gente , pois esta seria, conforme dito anteriormente,

resultante de um processo de gramaticalização do item lexical gente (lat. Gens,

gentis), conforme Omena; Braga (1996¨); Lopes (1999) e possuiria uma significação

mais ampla.

O traço genérico da variante a gente é definido por Lopes (1999:35) nos

seguintes termos: “O a gente pronominal designa, mais comumente, um todo

abstrato, indeterminado e genérico, representando o conjunto base “ser pessoa (...)

massa indeterminada de pessoas disseminada na coletividade”.

Nós/A gente: variação ou mudança? 59

Dessa forma, é possível substituir a gente por “se”, por “qualquer pessoa”, ou

por “ a pessoa”, que são expressões de indeterminação, sem que o enunciado deixe

de ser adequado ao contexto, portanto, nesse contexto, é forma Referencial [+ ou -

genérica].

As variantes nós e a gente foram classificadas quanto à referencialidade em

Referência [+ou – genérica].

Os valores obtidos nos mostram que tanto um quanto o outro são favorecidos

pelo traço [+Ref + Gen]: 100% dos casos, as pessoas usam os pronomes em

questão indicando pessoa que fala+outras pessoas e não mais indicando eu+tu

(pessoa que escuta).

(10) S3HI18EML1

... a gente fez vários passeios, fomos no museu do futebol...

(11) S6MI25ESL11

... só sei que nós ... tínhamos que parar pra fazer xixi...

É válido ressaltar que o contexto em que essas formas pronominais estão

inseridas favorecem este traço de referência mais genérica, já que os sujeitos estão

narrando sobre um episódio que ocorreu em suas vidas.

• O terceiro fator investigado foi a realização fonológica da desinência

de número pessoa

Procurei verificar se a forma padrão do Português do Brasil (PB) era realizada

ou não. Com a quantificação desse fator, pode-se confirmar a ocorrência do

processo descrito a seguir:

Nós V+mos > nós V+ mos0 > nós V+ 0> a gente V + 0

Nesse processo a desinência de 1PP sofre erosão lenta, confirmando o

enfraquecimento morfológico, inicialmente com a perda do s desinencial e, depois,

com a perda do –mo . Em ambas as ocorrências, existe a mesma pessoa verbal,

mas, do ponto de vista fonológico, há diferença. Veja neste exemplo:

Nós/A gente: variação ou mudança? 60

(12) S22I47ALFL4

... nóis ia de barco... – considerada não-padrão.

Essa forma parece ser uma variação fonética da forma padrão.

Provavelmente, teria havido supressão do – s e do morfema –mo, resultando em ia.

Dessa forma, em (7) a forma verbal ia seria mais um dos estágios de implementação

da mudança e não a forma verbal de 3PS como poderia parecer.

Esse fator pode ser uma evidência a favor da hipótese de que a mudança

afeta mais imediatamente o paradigma morfológico, via fonologia e, posteriormente,

afeta o paradigma pronominal, dando-se a variação aqui estudada.

Em termos quantitativos, a forma pronominal a gente ocorre em 100% dos

casos com a desinência número-pessoal padrão, ou seja, 3PS. Da mesma forma, o

pronome nós apresenta-se em 99% dos casos com a concordância padrão, ou seja,

1PP. Sendo assim, neste estudo não fica comprovada uma erosão fonética nas

realizações dos verbos com o pronome nós , assim como a desinência 1PP favorece

o uso deste pronome.

Por outro lado, parece haver aqui uma evidência de que o uso da forma

lexical a gente desencadeou o uso da 3PS. Além disso, pode-se dizer que as

formas de 3PS são ambíguas, pois um item como estava é, ao mesmo tempo,

resultado da erosão fonética de –mos , a partir de estávamos, como também é

resultado do verbo estar + 3PS, o que favorece o uso do a gente.

(13) S21MI46ESL22

...voltar, tanto que a gente até reduziu o tempo que a gente ia ficar lá a gente...

Ainda nesse sentido, entende-se que um outro fator que conrtibui para o uso

do a gente em detrimento do nós é a necessidade do pronome quando se conjuga

o verbo na 3PP para indicar plural, ao contrário do verbo em 1PP que admite a

ausência do nós sem interferir na compreensão do enunciado.

• O quarto fator selecionado foi a saliência fônica

Segundo Omena (2003;62) “a inserção de um elemento novo elemento num

ponto do sistema desencadeia uma reorganização desse sistema”. O princípio da

Nós/A gente: variação ou mudança? 61

saliência fônica é um dos itens a serem testados nesta pesquisa, para verificar se

nesta comunidade de fala, a forma pronominal a gente combina-se a formas

verbais menos marcadas, enquanto o pronome nós acompanha formas verbais

foneticamente mais salientes, tendendo a uma maior estabilidade.

Este princípio fora proposto inicialmente por Naro & Lemle (1977) que

postula que

(...) entre duas formas niveladas, que se opõem, é mais provável a manutenção dessa oposição quando existe, entre elas, uma diferenciação tônica acentuada, caso contrário, ou seja, quando for menor essa distinção, há uma tendência a se neutralizar a oposição e prevalecer o uso de apenas uma das formas.

Desta forma, testaremos neste trabalho a hipótese de que nos níveis de

menor diferenciação fônica, a forma a gente tende a ocorrer mais, e, por

conseguinte, quando há maior saliência fônica entre as formas verbais (é/somos) a

ocorrência de a gente é menos provável.

Há uma hipótese de que a concordância no português do Brasil ocorreria

mais frequentemente com as formas verbais nas quais o morfema no plural é

aplicado só no final, ou seja, aquelas em que a forma singular difere pouco da

forma fonética originada do verbo, sendo, então, raramente percebida.

Daí, então,foram observados os casos de ambiguidade entre a 3ª pessoa do

singular (3PS) e a realização zero de desinência –mos . Por exemplo, o par

vive/vivemos seria ambiguo, já o par foi/fomos não. Vive pode resultar do

desaparecimento de –mos , o que não acontece no segundo exemplo.

Com base nos resultados obtidos, o nível de saliência fônica que mais

favorece o uso da variante a gente (74,9%) é o que contém palavras nas quais o

acréscimo do morfema –mos ao radical não altera o vocábulo quanto à posição da

sílaba tônica ao ser usado com o pronome nós . Esta quanitificação levou em

consideração os 35 verbos utilizados pelos sujeitos junto ao pronome a gente.

O segundo nível a favorecer o uso de a gente (25,71%) é o nível em que há

alguma alteração fônica na mudança de 3PS para 1PP.

O terceiro nível em termos de favorecimento do uso da forma a gente é o que

contém palavras que sofrem completa alteração ao passarem de a gente para nós

(fez/fizemos) , com um percentual de 8,57%.

Nós/A gente: variação ou mudança? 62

Com isso, pode-se constatar que a variante a gente tem peso relativo maior

nas formas verbais ambíguas.

(14) S1MI23ESL3

...primo do papai e a gente ficou lá durante uns vinte dias, aí a gente foi visitar...

(15) S8MI21EML7

... depois, a gente pensa em voltar...

(16) S3MI18EML1

... a gente fez vários passeios, fomos ...

• Os últimos fatores analisados são os extralinguísticos: faixa etária,

sexo, região geográfica e escolaridade

Os resultados nos mostram que, independente do sexo e do grau de

escolaridade, os moradores deste bairro da cidade de Belém, considerado um bairro

nobre, privilegiado em vários aspectos, os entrevistados acima de 46 anos usaram

preferencialmente o pronome nós (60% das ocorrências), enquanto que dentre os

mais jovens de 46 anos, que perfazem o total de 20 pessoas, 11 optaram

predominantemente ou somente pela forma a gente (55% das ocorrências).

Segundo Labov (1972), quando é alto o índice na faixa etária dos jovens, é porque

está havendo uma mudança em progresso . Contudo, em termos probabilísticos,

ainda que confirmada a tendência ao uso da variante inovadora a gente ao invés da

forma pronominal conservadora nós , os dados obtidos nesta pesquisa revela um

equilíbrio muito grande no uso das formas pronominais em questão, demonstrando

ser prematura a ideia de uma substituição da forma tradicional pela inovadora.

(17) S21MI46ESL1

Nós/A gente: variação ou mudança? 63

As minhas férias melhores são sempre as últimas, viu, Lia, então, Tereza e

Daniel já falaram, então acho que eu vou falar das mesmas férias. A cada dois anos

a gente faz uma viagem, a gente programa uma viagem assim em família que eu

acho que é o mais legal é a gente poder viajar todo mundo junto...

(18) S12MI33ESL1

As melhores férias assim que a gente já teve, foi agora com as crianças

que a gente teve a oportunidade de viajar com o Marquinho e com o Bruno e a

oportunidade também que Deus deu pra gente da gente conseguir viajar pro exterior

e principalmente da gente levá-los pra Disney, né, isso foi uma benção...

(19) S1MI23ESL1

Nas minhas últimas férias a gente foi dia 6 de julho pro Rio de Janeiro, a

gente ficou, eu e minha família toda, a gente ficou na casa de um primo do papai e

a gente ficou lá durante uns vinte dias, aí a gente foi visitar todos os tios, as tias,

depois.... ah a gente saiu, foi no cinema, eu, meu irmão e...

Segundo Labov (1972 e 1982) , a predominância da variante inovadora pelos

usuários de uma estratificação específica é um indício de mudança em progresso.

Os dados analisados anteriormente nos permitem traçar um paralelo entre

inserção de você e a inserção de a gente no sistema pronominal do PB: ambos

decorrem do enfraquecimento da morfologia verbal iniciada na fonologia. Em relação

a a gente temos na amostra analisada a documentação do enfraquecimento fonético

da desinência –mos . Conforme visto na análise, a erosão da desinência da 1PP

inicia-se no nível fonético e atinge o morfológico, processo derivado pelos fatores

Pessoa Verbal e Realização fonética da Desinência de Número e Pessoa. O espaço

[+genérico), demonstrado no fator Referências, também favoreceu a inserção da

variante inovadora a gente no quadro pronominal.

Além disso, a intercambialidade entre os dois pronomes também favorece o

uso do pronome inovador, sobretudo em contextos informais como o apresentado

nesta análise.

No que tange ao paradigma verbal do português brasileiro, há duas posições

aparentemente contrárias que vale a pena discutir: a primeira posição é a de que o

Nós/A gente: variação ou mudança? 64

paradigma verbal sofre perdas, de início fonológicas, e, em seguida, morfológicas.

Essas perdas, ou reduções nas formas verbais, ao se tornarem mais frequentes,

abrem espaço para a inserção de uma nova forma pronominal, modificando, então, o

paradigma pronominal. Na mudança nós/a gente a realização zero da desinência

número-pessoa de 1PP é, então, revista pelo falante como desinência de 3PS,

deixando a forma a gente bem frequente dentre os pronomes da nossa língua

(Abraçado, 1991).

A segunda teoria, bastante considerada no meio dos linguístas, defende a

ideia de que é exatamente o contrário: surge uma forma pronominal, a qual entra em

concorrência com outra já existente; após um certo tempo, a forma existente acaba

por ceder espaço para a forma inovadora.

3.3 OS FATOS EM CONTEXTO

A escola e, em geral, a sociedade, ainda está presa a heranças deixadas por

uma perspectiva de ensino cujo objeto de exploração é a metalinguagem,

desvinculado de suas condições de uso e centrado na palavra e nas frases

isoladas. Assim, numa visão reducionista, é comum que o ensino de língua se

restrinja ao domínio da morfossintaxe, sobretudo às classificações, e às finalidades

comunicativas presumidas para os eventos quase nada importavam.

Consequentemente, os fatos da interação verbal se reduzia a simples

condição de material linguístico, de itens gramaticais, cujo sentido, por sua vez, se

exauria na simples análise dos componentes imanentes a cada um dos estratos que

compõem um dado sistema linguístico.

Porém, a integração da linguística com outras ciências, a abertura das

pesquisas sobre os fatos da linguagem em pespectivas mais abrangentes,

sobretudo aquelas propostas pela pragmática, provocaram o paulatino surgimento

de novas concepções.

Assim, a compreensão do fenômeno linguístico como atividade, como uma

das atividades do homem, resultou em estudos mais significativos sobre a língua,

voltados para as intenções sociocomunicativas que põem os interlocutores em

interação, além de fortalecer o interesse pelos efeitos de sentido que os

interlocutores pretendem conseguir com as palavras em suas atividades de

interlocução; trouxe à tona estudos mais relevantes sobre discurso e texto, bem

Nós/A gente: variação ou mudança? 65

como deu mais visibilidade às relações entre a língua e seus componentes de uso, o

que implica dizer entre as manifestações linguísticas e a produção e a expressão da

cultura de cada comunidade de falantes.

O trabalho com a gramática normativa, tal como conhecemos atualmente, é

um suporte para que os alunos conheçam a estrutura, mas é a partir de atividades

contextualizadas, gêneros variados, inclusive oral, e métodos que estimulam o uso

real da língua que os alunos constróem repertório linguístico para utilizar a língua.

O domínio da linguagem e o domínio da língua são condições de

possibilidade para a plena participação social do cidadão e que a escola tem a

responsabilidade de garantir aos alunos o pleno domínio das diversas variedades da

língua, sejam orais, sejam escritas, pois ela é o que lhes dá acesso a uma vida

social plena, e a linguagem oral precisa estar neste ambiente, para que os alunos

saibam adequar suas falas aos diferentes contextos diários, bem como para que

conheçam e respeitem as variações linguísticas marcadas pela fala, como forma de

expressão regional, cultural e social.

Pesquisar, neste caso, estudar o falar brasileiro, representa um dos

importantes desafios que o professor da disciplina, atualmente denominada língua

“portuguesa”, tem a sua frente no limiar do século XXI e do III milênio. Justifica-se,

em especial, por dar voz à língua falada, a partir de uma visão mais sintonizada com

o pensamento científico contemporâneo (BAGNO, 2005).

Pesquisar o falar brasileiro é não querer reproduzir, sem crítica, uma doutrina

intacta durante séculos a fio. É reconhecer a diferença entre o que é e o que alguns

poucos acham que deveria ser, ou seja, é a possibilidade do professor de

“português” transformar suas aulas em atividades de pesquisa, empreendidas junto

com seus alunos.

A pesquisa variacionista, na perspectiva de Labov, ‘abriu’ meus caminhos

para estudar mais a questão das variações versus desvios, tendo por base a

questão da heterogeneidade, cujos fatos até agora não se harmonizaram bem com a

abordagem estrutural da língua, já que está última defende a ideia de que só

podemos estudar um fenômeno de variação quando esta já está implementada.

A rigor, a ‘quebra’, dessa homogeneidade e o seu reconhecimento, mesmo

que ainda parcial, dão créditos ao princípio da variação, garantem espaço para um

estudo da língua em uso, produto da interação social e reflexo da comunidade

Nós/A gente: variação ou mudança? 66

falante. O ato de fala, ainda que individual e particularizado, não deixa de sofrer

pressões sociais e estruturais que devem ser consideradas no processo da análise.

Assim sendo, é mister dizer que os trabalhos com gêneros orais não podem

mais se calar, já que a fala materializa marcas de nossa cultura, de nossa identidade

e de nossa condição social, padrões, sem os quais, não se pode ensinar uma língua.

Produzir um novo conhecimento humano sobre o fenômeno linguagem possibilita contrastar os resultados da pesquisa com paradigmas ultrapassados, sobre um conjunto de prescrições fonético-fonológicas, morfossintáticas e semânticas, artificiais, que não correspondem mais a nenhuma variedade linguística real, posto que, advindas de definições contraditórias e incompletas, responsáveis pela perpetuação de mitos sobre uma série de fatos linguísticos, cuja consequência mais desastrosa é o preconceito (BAGNO, 2005)

Nós/A gente: variação ou mudança? 67

Nós/A gente: variação ou mudança? 68

Para terminar ou começar estas considerações, remonta-se a questão de

base: o que é uma língua?

Entede-se que a língua é muito complexa, já que incorpora elementos de

diferentes ordens, uma vez que se situa em vários domínios. Isto é, a língua é, por

um lado, provida de uma dimensão imanente, aquela do seu próprio sistema interno,

conjunto de recursos disponíveis, algo pronto para ser utilizado pelos sujeitos

quando necessário. Por outro lado, a língua é um sistema em uso, preso à realidade

histórico-social do povo, espaço garantido para a heterogeneidade das pessoas e

dos grupos sociais, com suas individualidades, concepções, histórias, interesses.

Uma língua que, mesmo sendo um sistema, está em constante reformulação,

reconstrução.

Nesta pespectiva, a língua deixa de ser apenas um conjunto de signos, de

regras ou de frases gramaticais; passamos, então, a entender a língua como um

fenômeno social, melhor ainda, como uma prática de ação interativa, totalmente

dependente de seus usuários. Assim sendo, há por aqui um caráter político, histórico

e sociocultural, não cabendo mais um estudo da língua desvinculado da interação.

A troca dos bens simbólicos, que constituem o patrimônio cultural dos grupos

humanos, passa irremediavelmente pela mão dupla da interação verbal. Ou seja, é a

linguagem o suporte, a que media as coisas entre os indivíduos, entre os grupos,

entre gerações. E é também meio pelo qual surgem e solidificam valores que dão

sentidos a todas as coisas, inclusive ao próprio homem. Deste modo, não há como

reduzir a linguagem a questões como falar certo ou falar errado.

De fato, a língua não existe sob a forma de uma entidade concreta; o que

existem são grupos de falantes; é o que existe de observável, os quais usam

recursos linguísticos particulares para interagirem uns com os outros e fazerem

circular o punhado de valores culturais que marcam cada lugar, cada situação e

cada tempo.

Dentro dessa concepção, a língua só pode ser vista como um conjunto

sistemático, mas heterogêneo, aberto, móvel, variável. Em qualquer língua, de

qualquer época, desde que em uso, ocorreram e ocorrem mudanças, em todos os

estratos, em todos os níveis; pode-se dizer, portanto, que a língua aparece em

diversos falares, os quais estão submetidos às exigências dos diversos contextos de

uso dessa língua.

Nós/A gente: variação ou mudança? 69

Por isso, passa a ser tão importante o estudo da oralidade, da nossa fala, já

que é está fala que manifesta a heterogeneidade e a complexidade da língua.

Pensar em uma uniformidade, uma língua falada do mesmo jeito em todos os

lugares é um mito, o qual precisa ser trabalhado desde a sala de aula, pois tem,

como uma de suas consequências mais dramáticas, o preconceito linguístico. Já

não é de agora que pesquisadores de todo o mundo vêm estudando as línguas e

seu comportamento variável. Há uma atual preocupação em compreender as razões

que influenciam a variação existente na fala espontânea de comunidades que fale

diferente.

Aqui reside o limite entre a forma privilegiada pela ‘sociedade’ em que

vivemos, cristalizada pela escola e a forma convencionada como informal ou não-

padrão, que, para a sociolinguística, nada mais é que uma fomra, por ela

denominada, ‘inovadora’.

O conceito de variação nos assegura que as ocorrências reportam ao

fenômeno no qual uma língua, nas práticas interlocutivas, modifica-se numa dada

época, lugar ou grupo social, resultando em um objeto cuja singularidade é ser

variável, foco principal da Sociolinguística.

Retomando às hipóteses que orientaram esta pesquisa: a expressão a gente

é uma forma inovadora; mudando a morfologia verbal, muda-se o paradigma

pronominal. O percurso da mudança que resultou na inserção do a gente no

paradigma pronominal pode ter sido:

• Nós V+mos > nós + mo0 > nós V + 0 > a gente V + 0

• Neste caso, os tempos verbais mais afetados inicialmente foram:

V [- passado] > [+ passado]

V [ - saliente] > [+ saliente] fonicamente.

Assim, neste trabalho, analisando a fala dos sujeitos, pode-se constatar que,

em um contexto ‘informal’, o uso do pronome nós foi mais usado pelos falantes

acima de 46 anos, enquanto que os sujeitos entre 18 e 45 anos optaram

preferencialmente pela forma a gente . Embora haja uma diferença percentual no

uso das variantes, esta ainda não é suficiente para configurar uma mudança no

paradigma pronominal do PB . Além disso, por meio desta pesquisa pode-se

constatar que:

• há formas diferentes para expressar a 1ª pessoa do plural (caso reto), são

elas: “nós” e “a gente”.

Nós/A gente: variação ou mudança? 70

• a forma a gente é preferencialmente usada pelo grupo mais jovem desta

comunidade de fala graças também ao contexto informal, já que esta variante

tem um menor prestígio junto a norma padrão do que a forma nós.

• os verbos na 3PS favorecem o uso do a gente , já que precisam do pronome

para eliminar a ambiguidade do verbo; já o verbo na 1PP dispensa o uso do

pronome nós , já que o sujeito fica implícito.

• a forma a gente tem seu uso favorecido pela referência [+genérica], o que se

explica em sua origem e no gênero textual elaborado pelos sujeitos.

• as formas pronominais estudadas coocorrem nesta comunidade de fala, já

que há uma equivalência semântica entre elas, configurando, assim, uma

variação até então estável entre elas.

• dentre os sujeitos que utilizaram os dois pronomes em suas falas ou optaram

pela variável nós , 57,14% são mulheres, o que confirma a ideia de que, nos

fenômenos de variação, as mulheres são as que mais usam as formas

consideradas de maior prestígio.

Este estudo pretende suscitar reflexões e discussões sobre um fenômeno

presente no dialeto paraense, fornecendo argumentos para o debate referente ao

paradigma pronominal, além de mostrar a presença da morfologia nas modificações

da língua.

Não há pretensão, sob qualquer hipótese, de construir um juízo de valor,

julgando a fala das pessoas; mas, sim, tão somente, refletir sobre as mudanças

inerentes a qualquer sistema linguístico, em especial na fala, responsável pela

maioria das modificações. No mais, demonstrar que estudar a fala é, por assim

dizer, estudar a língua viva, que conta nossa história, que diz quem somos, que nos

revela ao mundo e nos permite continuar... existindo.

Nós/A gente: variação ou mudança? 71

Nós/A gente: variação ou mudança? 72

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Apêndices 1 – Transcrição das falas dos sujeitos

Sujeito 1: M23ES L1Nas minhas últimas férias a gente foi dia 6 de julho pro Rio de Janeiro, a gente ficou, eu e minha família toda, a gente ficou na casa de um primo do papai e a gente ficou lá durante uns vinte dias, aí a gente foi visitar todos os tios, as tias, depois.... ah a gente saiu, foi no cinema, eu, meu irmão e meus primos, fomos L5jogar boliche, esses programas de férias... depois a gente foi pra São Paulo, passou uma semana lá, aí a gente foi pro Guarujá, não aproveitamos nada porque tava chovendo, frio, e eu ainda fiquei doente... aí, depois que a gente voltou pra São Paulo a gente foi no museu do futebol, visitar esses programas de, esses passeios de turistas, depois a gente voltou pro Rio, ficou lá mais uma semana, aí depois a L10gente foi se despedir de todos os tios e de todas as tias, na maioria os velhos, depois a gente... deixa eu ver, o que a gente fez.. ah, a gente, teve um dia que a gente fez a noite do fondue na casa da minha tia, foi muito bom, e depois a gente voltou pra Belém... (a gente: foi/ ficou/ voltou/fez / ) Sujeito 2: M25ALF L1As férias que marcaram a minha vida é quando eu era solteira, viajava, ia pro interior, ia pra praia, pro igarapé, pescava, bebia na beira da praia, farriava e era muito legal, com minhas primas, meus primos, que era tudo solteiro na época, nera... e era uma turma, era... bacana... muito bacana, gente ia de barco pra baia, L5tomava banho na beira da praia lá na baia lá, no Marajó, e era muito legal... muito bom. (a gente: ia) Sujeito 3: H18EM L1As minhas férias foram no Rio de Janeiro com a minha família e... a gente fez vários passeios, fomos no museu do futebol, em São Paulo, eh.... eh.... eh... fomos... eh... ao Maracanã... visitamos o Pacaembu... depois, no Rio, a gente foi pra Niterói com família e... depois fomos à praia, no Rio, também... é isso... (a gente: fez/ foi ) Sujeito 4 – H21ALF L1Bom, as férias mais marcantes da minha vida... férias, assim, eu não tiro férias porque eu só estudo, mas uma que marcou minha vida assim, foi pra Salinas, quando eu fui pra Salinas, quando me convidaram pra ir pra Salinas, sabe como é que é... pobre, só vai pra Outeiro e Mosqueiro, quando vai pra Salinas vira uma L5festa, uma coisa assim incrível, né... aí eu falei “ tá, né”... mas aí falaram “mas tu vai ter que pagar tua passagem”... “pagar minha passagem? Tá, quanto é que tá?” ... “Trinta reais”... Falei “Meu Deus! Eu sou estudante, num trabalho, num tenho nada... como é que eu vou fazer isso?”... “Num sei, te vira... a gente vai domingo que

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vem”... isso era sexta-feira... falei “tá, eu vou me virar”... aí fiquei pensando como L10é que eu vou fazer isso... já sei o que eu vou fazer... fui lá no entroncamento, comprei um saco de bombom assim “Vô vender no ônibus.. trinta reais eu consigo”... saí sábado de manhã cedinho de casa disposto a conseguir meu dinheiro pra ir pra Salinas... eu num ia perder essa... aí tá, cheguei lá, comecei a vender no ônibus, minha cara de vergonha, nunca falei em público assim... tentei decorar aquela L15fala que aqueles cara falam, né...”eu poderia estar matando, roubando, me prostituindo”, mas...falei normalmente... essa hora a gente faz tudo...tanto é que no final da tarde eu consegui arrecadar o dinheiro, aí no dia seguinte a gente foi pra Salinas... chegando lá, na casa de um amigo meu, tinha casa, comida, tudo de graça, só era passagem que eu ia ter de pagar... aí o que a gente foi fazer... a L20gente foi pra praia Salinas...aí me disseram que tinha um tal do “morro da coca-cola”... eu falei “Morro da coca-cola... o que que é isso, eles dão coca-cola pra gente, é?” ... “Não, meu amigo, é que a água lá é tão preta que parece coca-cola...”.Falei “Ah, tá!” ... A gente foi pra lá, né? O caminho era muito extenso, era mato pra tudo que era lado, parece que tava numa selva... a gente subiu uma L25meia hora, assim da praia até lá... quando chegou lá a gente foi num tal de “snow board”, sendo que lá pra França, pra Inglaterra é na neve, né...aqui em Salinas sabe o que era? Era em areia..mas tudo bem... a pobreza foi, a gente foi também.. curti... chegamo lá, descemo aquele morro parece criança, parece que... água... uma coisa tão simples, assim... um morro com um monte de areia, assim, L30descer, a gente foi... aí, chegando lá...a gente foi pra praia, nunca tinha visto água salgada, nunca... água salgada eu nunca tinha visto... a não ser aquela que a mãe faz no soro, mas, fora isso, não... me encantei... uma coisa assim maravilhosa... a noite também, sem comentários, a gente foi prum lual... lual.. ah lual..muitas coisas aconteceram no lual, que não vem ao caso agora, mas fica pra uma próxima L35história...mas foi muito bom. (a gente: faz/ foi/ subiu ) Sujeito 5 – M25ES

L1Bem, ano passado, dia dez de julho, fui passar as férias em Fortaleza com a minha família... e fui eu, juntamente com meu noivo e a minha filha de seis anos...depois foi a minha mãe com duas irmãs... foi ótimo, maravilhoso, qual é as férias que num é...bom demais, né?... Então, foi muito bom desfrutar, conhecer... L5porém, o meu pai é cearense, né.. eu tenho sangue de cearense, então, não é a primeira vez que eu conheço a cidade, eu já conhecia Fortaleza, só que assim, eu levei a minha filha pra conhecer...e lá, chegamos, ficamos num hotel maravilhoso, na beira mar, passeamos horrores, passeamos horrores e... e eu tenho família lá.. só que eu não fiquei na casa da minha tia, ficamos neste hotel... e lá dentro do hotel L10eles disponibilizaram.. eh... passeios pro Beach Park.. passeios pra conhecer, né, a cidade...eu já conhecia, mas o meu noivo e a minha filha não...então foi ótimo porque eu fui com eles, né...e... e também, um dia que foi muito bom, foi no Beach park, o dia que nós aproveitamos o dia todo foi no Beach Park, que a minha filha de seis anos aproveitou e a gente acaba virando criança, né...a gente acaba virando L15criança no Beach Park.... e também a noite é muito legal, tem os bares pra casal, no meu caso, foi mais pizzaria, mais churrascaria, porque eu fui com a minha filha e não podia ficar até tarde na rua, mas foi muito bom.. isso nós ficamos até... ficamos quinze dias somente e depois voltamos pra Belém, porque no dia trinta de

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julho a minha filha nasceu e eu sempre comemoro em agosto porque em julho tá L20todo mundo viajando e eu sempre comemoro a festa dela em agosto. (a gente: acaba / NÓS) Sujeito 6: M 25ES L1Bom... eu tive várias férias maravilhosas, mas uma bem marcante foi a de 1997, onde eu fui pra Bragança pela primeira vez e eu fui com meu pai, com a minha irmã, com a minha madrasta, na época, gostava muito dela e com a irmã da minha madrasta..mas foi assim, meu pai, na época tinha um fusca e foi tudo muito L5engraçado, desde a ida, como lá... primeiro, o fusca tava mais pra lá e o que pra cá...mas aí como deu todo mundo foi muito legal, pra ti tê uma ideia, iam três pessoas atrás, apertado, e... parece que nunca chegava, Lia tu não tens ideia, a viagem era longa, longa, longa, parece que nunca chegava, e eu nunca tinha isso aí a ansiedade fazia com demorasse mais... exatamente.. eu só sei que nós L10parávamos toda hora... porque, imagina, o fusca num tem ar, é apertado, então... então nós ... tínhamos que parar pra fazer xixi, parar pra pegar um ventinho, já que o carro tava cheio... quando nós chegamos em Bragança, paramos e almoçamos... já assim, né...no final.. demoramos muito na viagem... se tu levas de um carro normal ou de ônibus, três horas, de fusca tu leva quarenta e cinco... L15enfim...quando nós chegamos lá, pra completar a viagem tava todo mundo cansado, não tinha hotel, não tinha pousada, era tipo, meio de férias, tinha muita gente em Bragança e Ajuruteua..

Sujeito 7 – H25ES L1Foi uma viagem que eu fiz pra Fortaleza, fui eu e um grupo de amigos, era quatro amigos... foi muito bacana porque... assim... desde que eu era mais novo eu sempre quis viajar com meus amigos e nunca tive eh... como ir... meu pai num... tinha dinheiro e num deixava eu ir...eu sempre quis, meus amigos sempre iam, desde L5novo pra esses Fortal da vida, esses carnaval fora de época... e eu sempre quis ir e eu nunca ia, sempre tava trabalhando na loteria desde novo, nunca pude ir... eh... dessa vez eu consegui ir porque eu já tava trabalhando e eu fui mesmo com meu próprio dinheiro... e... fazer essa viagem com os amigos... ir pra Fortaleza.. a gente foi prum bloco de carnaval fora de época lá em Fortaleza e foi muito bacana L10porque foi com próprio dinheiro, num precisei pedir nada pro meu pai e... desde aqui a gente já foi se divertindo, tomando cerveja dentro do avião... ai lá gente... brincando, na sacanagem... isso foi muito bacana, marcou muito pra mim porque era uma coisa que eu sempre quis, sabe... viajar assim... fora de Belém... e toda vez os meus amigos iam e eu ficava... pô... ficava triste em Belém, não podia ir, num L15tinha dinheiro, pedia pro meu pai “meu filho num dá, meu filho num dá, num dá pra você ir”, e, pô, eu ficava triste pra caramba, até que eu consegui, graças a Deus, com meu próprio dinheiro, fazer essa viagem que eu queria, que era... sei lá.. num era só uma viagem, mas pô, era um negócio bacana de sair daqui e prum lugar... pra fora de Belém, prum carnavalzinho, fora, e eu consegui, com meu dinheiro, L20com meu trabalho, fazer essa viagem com os amigos, chegando lá a gente ficou na casa dum irmão dum amigo que a gente nem conhecia, aí a gente dormia todo

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mundo na sala, a gente acordava já pegando cerveja, acordando bebendo já e foi uma diversão muito boa, muito bacana que eu nunca esqueci... (a gente: foi/ ficou/ dormia/ acordava ) Sujeito 8: M21EM L1Lia, a viagem que... assim... mais marcou na minha vida foi a viagem quando eu fui pra Fortaleza... foi a primeira vez que eu sai do estado, né...só ia pra Vigia e também eu fui com... que antes era meu namorado, que hoje é meu marido, né... e foi aí que a gente decidiu que a gente ia viver junto, foi a partir dessa L5viagem...então, pra mim, Fortaleza foi muito bom, além de ser um lugar lindo, né, praias tão bonitas... a gente conhecer várias praias, passeios, né....saimos à noite, né... foi uma lua de mel, pré-lua de mel... daz dois anos depois, a gente pensa em voltar, tenho muita vontade de voltar pro mesmo hotel, pro mesmo local... foi muito bom.

(a gente: decidiu/ ia viver/ conhecer/ pensa )

Sujeito 9: H25ES

L1Boa noite... eh... as minhas melhores férias foi no Rio de Janeiro porque eu sempre tive um sonho de ver os fogos na praia de Copacabana... então, eu consegui realizar esse sonho com a minha esposa Patrícia e eu me emocionei muito com ela, nós choramos, foi muito legal... então... eu faria tudo de novo, eu gastei uma L5grana... nós passeamos na orla, nós pegamos sol na praia, nós tomamos água de côco, nós fomos passear, eu tinha muita curiosidade em conhecer o Rio de Janeiro pelas novelas, pelas paisagens bonitas... nós fomos num morro lá, muito bonito, fizemos escalada na pedra bonita, então foi uma experiência assim inesquecível, que inclusive eu tinha até vontade de voltar lá pra conhecer a L10região dos lagos, então foi uma viagem, uma das melhores viagens que eu já fiz na minha vida.

Sujeito 10: M26ES L1Já tive muitas férias boas, já conheci vários lugares, já viajei pelo mundo todo, mas as férias que mais marcaram foram as férias de julho do ano passado, que eu fui com as minhas amigas, estavam todas solteiras e eu fui assim como a líder da equipe, porque eu era a que não bebia, eu era a mais responsável, apesar de ter L5tido muito muito... é... trabalho com elas... eu.... fiquei numa casa onde havia sete meninas e eu só conhecia duas e hoje as sete viraram minhas melhores amigas e hoje eu sei que Salinas foi um momento propício pra que eu conhecesse as outras que, na verdade, eu só conhecia de vista, e conhecesse a fundo e saber que hoje em dia cada uma faz parte da minha vida, e assim, foram 15 dias, mas quinze L10dias intensos em que a gente acordava dez horas da manhã e ia dormir seis horas da manhã... então assim, a gente ficava direto na praia, tinha barraca onde

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rolava pagode e... a gente tomava banho na praia, trocava de roupa na praia, a gente comia na praia, levava lanche pra poder não voltar pra casa, chovia a gente entrava no carro, todos os contratempos naquele Julho era festa pra gente. L15Cada uma que tava lá, tava com um motivo especial e, assim, todas nós, uma ajudamos a outra e que, no final, as férias foi muito marcante pra cada uma de nós... Sujeito 11 – H28ALF L1Oi, professora, tudo bem? Em 2004, professora, mais ou menos esse tempo, eu já vivia em São Paulo há seis anos e eu tive a oportunidade de conhecer a minha ex-namorada, na época atual, né...ela ia fazer um congresso de medicina em Gramado e Canela, e me convidou pra ir... nessa época foi a mesma época que L5tava acontecendo o Festival de Gramado e eu aproveitei pra ir pra onde, uma das minhas grandes paixões, talvez a minha principal paixão que é cinema, tudo, tabalhar com cinema, por ser um cinéfolo, assim, bastante, assíduo, gostar demais, aproveitei pra conhecer... conhecer a parte do cinema e parte da cidade. Sujeito 12: M33ES L1As melhores férias assim que a gente já teve, foi agora com as crianças que a gente teve a oportunidade de viajar com o Marquinho e com o Bruno e a oportunidade também que Deus deu pra gente da gente conseguir viajar pro exterior e principalmente da gente levá-los pra Disney, né, isso foi uma benção mesmo, foi L5uma luta diária minha e do Marcus, aí quando a gente chegou lá e viu os olhos mesmo, porque o sorriso já tava estampado mesmo nos rostinho deles, mas os olhos brilhando vendo o Pateta, vendo o Mickey, vendo tudo isso, eras, foram umas das melhores férias das nossas vidas. (a gente: teve/ conseguir/ chegou ) Sujeito 13: M37EM L1Esse ano eu estive no período de março viajando com a minha sogra, nós fomos pros quinze anos da sobrinha do meu marido, em Brasília... eu ainda não tinha tido a oportunidade de ir em Brasília e foi muito bom porque de lá eu imendei caminho, nós fomos em Goiânia, fomos no Rio, não conhecia nenhuma dessas cidades e L5foi muito emocionante pra mim porque eu nunca pensei que uma coisa que não foi planejada e eu conseguisse chegar até o Rio de Janeiro, que era o meu maior sonho conhecer o Rio. Chegando lá, conheci, dois dias e meio, Rio e Niteroi, minha sogra é uma pessoa assim, muito boa pra viajar, ela conhece tudo e te leva pra tudo o que é lugar, dos mais inusitados aos melhores que tu possa imaginar... muito L10divertida, assim, sabe..eu tava andando assim, no primeiro dia nós fomos conhecer o Cristo Redentor, o Pão de Açúcar e eu estava com uma sandália de salto enorme, subindo as ladeiras lá pro Cristo, ela disse assim “Luciana, não tem como você andar assim, dessa maneira... salto alto, subindo ladeira, minha filha...num tem como”... ai, que que eu fiz, parei, comprei uma sandalinha baixa L15e fomos conhecer o Rio de Janeiro, assim, foi uma emoção muito grande porque tu conheceres aquela cidade, cheia de expectativa, de gente bonita, lugares bonitos, gente que tem aquela vontade de viver, porque você vai caminhando pela orla, assim, pela praia de Capacabana, Leblon, Ipanema, tu vê aquele povo bonito lá,

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bem arrumado e fazendo ginástica, tendo uma vida saudável, coisa que aqui em L20Belém num existe, tu vê o povo muito em academia, mas assim, na rua, tu num vê o pessoal, são poucos, específicos locais que existem que é aqui a praça Batista Campos, algumas, na praça da República, na Doca, mas lá no Rio, parece assim que a filosofia é você caminhar, é você malhar, é você se cuidar, é você ser bonita, combina com o ambiente e o Rio de Janeiro é uma cidade belíssima, então, pra L25mim foi muito emocionante assim, eu conhecer... Brasília, gostei muito de Brasília, os shoppings, comprei horrores, gastei horrores de dinheiro, e vi e fui... Goiânia, nas feiras da Lua e do Sol, nos lagos, é coisa assim, muito linda, muita linda mesmo... Caldas Novas, aquele clube belíssimo de águas quentes, cê ficar ali horas e horas pensando... só senti muita falta porque eu não pude ir com meu L30marido nem com meus filhos, mas assim, foi muito bom porque eu conheci lugares novos, coisas novas, culturas diferentes, e agora a gente tá planejando de ir em julho do ano que vem, eu vou viajar pra Portugal em Maio, vou em Fátima, eu e minha tia, e em Julho do ano que vem eu vou levar as crianças, o Fabrício, nós vamos pro Nordeste, ai já vai ser outra experiência, porque já vai com as crianças, L35eles vão conhecer... são lugares que eles ainda não conhecem... juntos a gente conhece só Fortaleza, que foi umas férias também de julho, que nós fomos, na época eu só tinha o Fabrício Junior, a Kamilly e o Frederico, e foi muito interessante porque eles não estranharam nada, nós fomos de carro, levamos o carro, e eles curtiram bastante, foram pro Beach Park, Lagoa da Banana, Cumbuco, praias L40belíssimas, lindas mesmo, e foi assim umas férias muito emocionante porque foi em família, uma coisa que a gente não tinha planejado e as crianças se divertiram muito, porque a nossa meta era levar justamente eles pra se divertir, pra eles curtirem aquele momento em família, e foi muito bom mesmo pra mim, foi assim, dois momentos que marcaram de viagem, a minha vida. (a gente: tá/ conhece/ tinha planejado/ NÓS ) Sujeito 14: H38ES L1As férias que eu mais gosto, que eu sempre costumo repetir são as férias que eu passo na beira do Rio Araguaia.. a novidade qual é? Rio Araguaia extremamente limpo, maravilhoso, uma natureza esplêndida, então quando eu vou pra lá tá aquela L5água totalmente sem poluição, eu descanso, rejuvenesce, a gente tem um outro espírito e eu faço isso costumeiramente nas férias e acho sempre uma novidade. (a gente: tem) Sujeito 15: M41ES L1Bom... falando em férias... uma das férias que realmente eu mais apreciei foi quando eu passei Julho em Campos do Jordão... então, eu estava na companhia da minha irmã e do meu cunhado... e aquele clima realmente nos faz sentir muito bem... um lugar maravilhoso, muita gente bonita, o clima de na... o clima de, na L5realidade, lá, que propicia também, já que aqui em Belém é extremamente quente, então lá foi assim um conhecimento.... um... o tipo de... de culinária... o tipo de...vestuário que você observa, isso contribui pra deixar tudo mais maravilhoso, mais grandioso.

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(sem ocorrências) Sujeito 16: H39ES L1Umas férias que ficaram marcadas, assim, tem uma que aconteceu em oitenta e cinco, eu tinha 13 anos, e foi interessante porque não foi aquela... aquela... aquele feriado tradicional, de ir pra uma casa de praia, ficar na praia, à noite dar uma volta... pronto... não foi só isso... na verdade eu tava junto com aminha irmã, tinha L5acabado de abrir um bar, lá no Maçarico, tu nem lembras porque... oitenta e cinco... tu tinhas quantos anos...(tinha dez)... dez anos, eu tinha treze, e com treze anos eu... foram dois primos comigo, né, juntos também, e a gente ficou numa casa alugada, que a minha irmã alugou, ela tinha uma bar que ela tinha... tinha aberto com meu irmão e com um amigo, um bar que ficava ali no Maçarico, né, gente L10dizia barraquinha, bar Paricá, num sei se já ouviste falar... ouviu falar?...já? eh... e assim, eu passava o dia no bar, entendeu... eles ficavam preparando o bar pra noite, que o lance todo era à noite, que os músicos da terra iam lá tocar violão, tocar aquelas músicas bem regionais, né... foi um bar muito badalado, na época, não é o Maçarico que é hoje, não, aquela coisa toda... assim, não era asfaltado, quer dizer, L15era asfaltado só uma parte assim, não era todo, não tinha as características que tem hoje, a barraca era de madeira, logo do lado da barraca era areia, é... não era feita a orla... e, assim, foi uma experiência interessante porque eu tive que amadurecer, tive que contribuir com a minha irmã, ajudar, não trabalhando toda hora, mas facilitando as coisas pra ela, as férias não podiam ser voltadas pro meu L20interesse, eu estava lá, mas na verdade a minha intenção era o bar, que o bar funcionasse bem, que desse muita gente, que conseguissem ganhar algum dinheiro.. e foi maior sucesso o bar, né... e eu... à noite, eu ficava lá, meus primos também, tinham a mesma idade que eu praticamente, e a gente dormia nas esteiras lá, enquanto a música tava tocando, o bar tava pegando fogo e a gente L25dormindo lá atrás, tinha um quartozinho lá atrás... aí eu acordava no meio da madrugada, ia pra lá, sentava, ficava ouvindo o cara tocar violão, e tal, vendo as pessoas se divertindo, e assim, a rotina foi muito voltada pro bar, uma coisa assim meio... de cinema até... que prum adolescente, pré-adolescente, na verdade,... assim, mas o dia era muito bacana, jogava bola, ai, uma vez ou outra a gente ia no L30Atalaia, e teve um dia muito bacana que a gente foi num caminhão alugado por esse amigo da minha irmã que era sócio no bar, era um... eu num lembro a marca, era um caminhão antigo, desses que a gente só vê em museu praticamente, eh... e ele ia comprar peixe lá em São João de Pirabas, Pirabas, né, pertinho de Salinas, aí foi uma aventura a viagem pra lá, né... eu e os dois primos atrás, na maior L35gaiatice e o Ney, que é o amigo na minha irmã, lá dirigindo, e o carro ia falhando, e... enchia o carro de peixe pra... vender, né... lá no bar...a gente vinha no meio dos peixe, era uma zona...aí, o bar deu certo, ganharam dinheiro e abriram um bar aqui, ali pertinho do tribunal de Justiça, em frente à praça Dom Pedro, perto ali do Feliz Lusitânia, uma casa antiga, eh... e muita gente famosa cantou lá, tocou lá.. o... L40Marco André, eh.... o Chico Sena, me lembro bem que foi exatamente naquele período que ele morreu, que ele se suicidou, se jogou, e a Julia até cantou uma música agora na apresentação, Flor do Grão Pará, Belém, Belém... da feira...é a flor que cheira... pois é... e outros tocaram lá que eu não me lembro... Carlinhos... Carlinhos é aquele compositor que fez aquela música... muito bonita sobre Salinas, L45não me lembro agora como é que é a música... tocava direto no Paricá... direto... não se tu já ouviste falar.. é Carlinhos, não sei o sobrenome dele...e... a alimentação

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era a mais divertida possível, né... primeiro que moleque só gosta de comer porcaria, aí tinha o cozinheiro do bar era o seu Pernambuco, velhinho já, de cabelo branco, gente boa, né... eh... já tinha lá pelos seus quase oitenta anos, bem L50velhinho, mas firme, ai ele fazia umas coisas que a gente pedia, fritava calabresa, fazia aquele molho tártaro, era o dia comendo besteira e tomando refrigerante, de graça, né... à noite, sanduiche, que já tinha um caminhão do Biga´s, já tinha o Biga´s lá.. primeira, começou esse negócio de vender sanduiche em caminhão, tanto é que tem um Biga´s ali na Doca... um trailer, um trailer... eh... e L55eram poucos os bares na época, não eram muitos não, assim, de balada, tinha um só que era assim, mais voltado pra isso, mas a maioria era de voz e violão, aquela, a valorização da MPB, uma época bem fértil artisticamente, saindo da ditadura, então, foi assim e eu aprendi muito com meus irmãos que são mais velhos é, tem um... eh, o meu irmão mais velho tem dez anos a mais que eu, minha irmã L60tem onze anos a mais que eu e meu irmão mais novo, oito anos a mais do que eu... então, eu, criança e adolescente acabei vivenciando a juventude deles também, né... convivendo com os amigos deles, e era uma turma assim, muito engajada politicamente, muitos já eram filiados ao PT, a maioria de esquerda, e... atuava em alguns movimentos, né...enfim... curtiam muito MPB ai eu aprendi a ouvir muito L65MPB... e acabei gostando muito de cantores como Chico, Milton, Caetanto, e hoje acho que gosto mais do que eles, enfim, foi umas férias muito legais mesmo, muito bacana, inesquecíveis... (a gente: ficou/ dizia/dormia/dormindo/ ia/foi/ vê/ pedia/vin ha) Sujeito 17: H39ES L1Bom... férias boas... eh... foi quando eu fui pra um viagem em Fortaleza e a gente foi de carro e... alugou uma casa lá... chegando lá a gente conheceu vários lugares , várias praias, eh, passeamos no calçadão, né, que é o ponto principal lá, que é a “beira mar”... fomos pras praias do Cumbuco, de Beach Park, e... também o L5relacionamento com os filhos, né... que a gente se entrosa melhor, leva eles pra conhecer outros lugares, outras, outras culturas, apesar de ter, nas férias, Fortaleza ter mais, mais, mais eh.... gente daqui também que vai pra lá, né, mas eh... a gente também conhece culturas de lá, as danças, né... a própria, o próprio local de compra, que também é bem mais viável do que Belém, e... e... o belo, né... são L10as praias litorâneas, e.... agora.... férias ruins foi a do ano passado que houve a gente passou aqui em Belém, e quando a gente ia viajar pra Mosqueiro e a gente foi assaltado na porta de casa, levaram o carro, levaram tudo o que a gente tinha e foi um drama grande, né que a gente passou ... bota.... botaram arma na cabeça do meu filho... na minha... ai... a sorte que eles num entraram em casa, né... só L15aconteceu na rua, na porta de casa, então... num pensaram em entrar em casa... o meu filho ficou do lado de dentro, o único que ficou, e a gente ficou tudo num paredão, do lado de fora, aí depois disso eu me mudei, né...tive que me mudar pra outro local, até mesmo porque não tinha mais condições de ficar, até mesmo porque meu filho mais velho até hoje ainda é traumatizado por causa disso, quase a L20gente não sai à noite...é mais ou menos isso... aí, férias boas também é Mosqueiro que a gente tem casa, né... a casa é enorme, o terreno lá é grandão... os meninos brincam de bola, se divertem mesmo, ficam lá à vontade porque não precisa sair pra lugar nenhum... essa é a minha opinião, né... as melhores coisas que têm é a gente curtir agradável, né... de uma forma que não tenho problema, que

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L25a gente se esqueça da vida um pouco fora.. né... da realidade que a gente vive que é o trabalho, que é... a tensão do dia a dia, esse é o principal, e o relacionamento dos filhos, apesar da gente ter todo dia, mas ser bem difícil... né... no dia a dia... nas férias não...é mais o prazer... até porque você se envolve mais com as crianças... esposa... isso é fundamental. Sujeito 18: H43EM L1Foi a realização do meu sonho, desde solteiro, desde a minha época, acho que de adolescente, ou, pouco depois, quando eu comecei a trabalhar eu tinha um sonho de levar meus filhos, quando eu tivesse, à Disney. Quando eu casei, a situação ficou muito difícil, e eu não conseguia ir nem na esquina... aí as coisas foram melhorando e eu finalmente eu consegui, no ano passado levá-los à Disney... L5pra mim foi a realização de um sonho, pra mim foi algo mágico que só a Disney tem, que só Orlando tem e eu ver a expressão dos meus filhos valeu qualquer coisa, valeu a entrada da Disney, aquele momento mágico, aquela coisa assim de eu dizer, pra eles, eles conhecendo o Mickey, mas pra mim dizendo “égua, eu consegui, eu estive aqui, eu realizei o meu sonho. (SEM OCORRÊNCIAS) Sujeito 19: M44ES L1O fato que mais me chamou atenção no decorrer de todas as férias que eu já tive, eh, foi de um grande desejo que eu tinha de conhecer Algodoal, e durante muitos anos eu me organizava, minha família se organizava, a gente sempre foi pra Marudá, no entanto, nunca atravessamos por um série de questões, e quando L5finalmente surgiu a oportunidade eu me deparei com um grande medo que eu tinha que atravessar em um popopô, os famosos barquinhos... e, assim, eu fui, né... cheguei lá no trapiche, no lugar onde a gente tinha que subir, adentrar nos barcos e gelei, né, a maré tava alta, mas fui (to usando inclusive gírias, né), mas fui e, no meio da travessia, quer dize, várias pessoas entraram, o barco fico lotado, mas L10houve uma situação em que dois homens entraram completamente bêbados e muitos comentaram que eles já estavam bêbados porque tinham o mesmo medo, isso devia ser por volta de oito horas da manhã, e como eu tava com a minha família, tava com a minha sobrinha, tava com meu marido, com alguns cunhados, e mesmo assim fomos pra apreciar o que tinha, o que há de belo na ilha. No L15decorrer da travessia, maré alta, os dois bêbados atravessam e resolvem pular no canal... o desespero foi tamanho, eu só, eu só me gritando no meio do barco quando eu já estava, o barco já estava dando a volta pra recebê-los, porque eu perdi o controle da situação... eu gritava, meu marido contava que eu gritava tanto lá pro rapaz que tava pilotando o barco, que ele se assustou mais com meu grito do L20que com os próprios rapazes que se jogaram na baia, no canal... e o barco deu a volta, pegou-os e eu briguei tanto com esses homens, eu falei tanta coisa pra esses rapazes que eu acho que eles ficaram bons, da minha, do meu acesso de raiva, porque eu já tinha medo da situação, eu já tinha pavor de atravessar, eles se jogam... a minha sobrinha ficou assustada, enfim, chegamos na ilha, aproveitamos, L25brinc...mas a volta foi mais dolorida ainda, porque quando nós saímos de lá era por volta de seis horas da.. é, às dezoito horas mais ou menos, a maré tava alta ainda e ela, né, aquelas ondulações, e o barco vinha e voltava e tal, e eu morrendo

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de medo que alguém se jogasse novamente. Então, assim, eu pretendo voltar pra Algodoal, não sei quando, mas eu vou fazer uma observação geral, pra ver se L30pelo menos bêbados não sobem no barco juntos e não atravessam pra me fazer passar por essa situação. ( a gente: foi/ tinha/ NÓS)

Sujeito 20: M44ALF L1Bom, as últimas, a última férias que eu lembro, que eu passei que foi muito, muito bacana, eu passei com a minha mãe, meus dois filhos, meu irmão e uma cunhada que hoje já é falecida... conheci todo nordeste, foi maravilhoso, aproveitamos muito, comemos bastante, só não podia beber porque minha mãe tava do meu lado... L5mas foi ótimo... conheci todas as cidades do nordeste, desde a Bahia, vindo até Fortaleza... minha mãe dormia do meu lado, com os meus filhos, cuidando também dos meus filhos, mas quando eu queria sair de noite, não podia, porque minha mãe não deixava eu sair, porque era uma pessoa casada.... hoje estou separada e não me lembro de outras férias boas que passei, até porque estava do.. ao lado da L10minha família, da minha mãe, dos meus filhos e do meu irmão mais velho, com a sua esposa que hoje é falecida.

(SEM OCORRÊNCIAS)

Sujeito 21: M46ES L1As minhas férias melhores são sempre as últimas, viu, Lia, então, Tereza e Daniel já falaram, então acho que eu vou falar das mesmas férias. A cada dois anos a gente faz uma viagem, a gente programa uma viagem assim em família que eu acho que é o mais legal é a gente poder viajar todo mundo junto. Nessas últimas L5férias, teve um diferencial, assim, a gente tava voltando pra São Paulo que pra gente era sempre assim um motivo de muito prazer ir pra São Paulo por causa da história toda da família do Pituca que mora lá, né, a mãe, o irmão, as tias, né, então pra gente é sempre muito gostoso ir pra São Paulo, todo mundo gosta e tal. Então a gente foi primeiro pra lá, mas foi totalemente diferente, porque como tinha L10morrido minha sogra, foi a primeira vez que a gente tava voltando sem ela, né....então foi assim muito triste, na verdade, o começo, a gente chegou lá, eu e a Tereza a gente adoeceu e eu acho que teve assim um fundo emocional, sabe, de chegar e ver uma coisa muito diferente do que a gente sempre via, né... então acabou sendo muito marcante, não pela alegria, mas assim pelo reencontro de ir L15num lugar que não tem mais o mesmo brilho, a mesma cor que tinha antes, né... então isso foi, na verdade, muito triste pra gente... a gente tentou ainda fazer algumas coisas que relembrassem, né, foi pro Guarujá passear, teve algumas coisas boas assim de estar com algumas tias, mas acho que a gente passou uns dias lá de muita memória só, tudo lembrava a Vera, tudo lembra, assim, outras coisas que a L20gente fez lá e, de novo assim a gente fez pouca coisa, na verdade acho que todo mundo tava doida pra sair logo de lá, pra voltar, tanto que a gente até reduziu o tempo que a gente ia ficar lá a gente reduziu... Bom aí nós fomos pro Rio, aí no Rio foi tudo de bom, tem também um monte de família lá do Pituca, primos, tem companhia pra todo mundo, da idade dos meninos, os primos do Pituca da idade L25deles, as cunhadas, as primas também, todas da minha idade, tem programa

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assim pra todo mundo, tem também um monte de tia, né...que adora rever a gente, e lá a gente fez muita coisa legal. O forte do nosso passeio é sempre família, sabe, ir pra casa de tia, ir pra casa de primo e viajar pra casa de praia de um, casa de praia de outro... a gente fez um passei muito gostoso, passamos quatro dias em L30Angra, que é a coisa mais linda assim de natureza, de... coisas gostosas, né, tomar banho de mar, comer muito, voltar gordinha (risos), e... acho que o mais gostoso foi isso, acho que o melhor mesmo é o encontro com família, assim, é o que marca mais as férias...

(a gente: faz/programa/pode viajar/tava voltando/ foi/ chegou / adoeceu/via/ tentou/fez/reduziu/ NÓS)

Sujeito 22 – M47ALF L1Eu fui pra Maracanã, prum passeio e eu gosto muito de ir pra lá, porque lá é muito legal, tem um igarapé bem grande, pra gente tomar banho, passear de canôa... é muito legal.... eu fui a última vez agora dia... dezessete de setembro... do ano passado... eu fui com a minha irmã... minha irmã, meu irmão... gente fomos de L5kombi pra lá... lá a gente faz farinha, a gente vai pegar peixe no rio, carangueijo, camarão, tudo a gente pega lá...pra comer assado (risos) tirar tucupí, tapioca, nós faz lá, quando a gente vai nós faz, mas isso é meu pessoal que faz mesmo, na roça, né... agora vai chegar o tempo de apanhar pimenta, pimenta do reino, muita pimenta... tô pensando de tirar umas férias e ir lá pegar pimenta.

( a gente: fomos/ faz/ vai)

Sujeito 23: M48ES L1Bom, seguinte, na verdade houveram duas férias inesquecíveis pra mim até hoje. Como o Gilson já relatou as férias de Gramado, eu vou falar de quando a gente foi pra Disney, não pelo fato de ter sido pra fora do Brasil ou qualquer coisa parecida, mas porque eu sempre sonhei durante a minha adolescência em conhecer a L5Disney e eu nuca pude ir, meus pais nunca puderam me proporcionar... e já com trinte e seis anos, já com dois filhos eu pude ir.. e, na verdade, pra mim foi uma coisa, nós éramos em três famílias, várias crianças, inclusive meus filhos, mas eu acho que de todas as crianças ali, a mais empolgada era eu, eu acho que eu era a mais criança de todas, porque eu tirei foto até com o homem que vendia balão, L10com o homem que vendia flor... porque aquilo tinha sido um sonho da minha adolescência e que pra mim uma coisa tão.. tão assim... tão longe do que eu pudesse alcançar que pra mim eu jamais iria conhecer... só pela televisão e pelas revistas e quando de repente eu me vi ali parecia que eu tava sonhando.. então eu queria fotografar tudo, eu fotografava os cavalos, eu fotografava nada, eu L15fotografava...e quando vinham os bichinhos eu não queria dar uma de idiota aí eu chamava a Aline pra botar do meu lado pra fotografar do lado dos bichos, porque só eu e o bichos era sacanagem, né... aí eu chamava a Aline e botava ela do meu lado pra fotografar... peguei autógrafo dos bichinhos... então eu fiquei assim... deslumbrada, porque pra mim era uma coisa assim fascinante, o que pra muitas L20crianças hoje é um coisa corriqueira, absolutamente normal, aquilo pra mim era um sonho de criança que se realizou e ainda por cima eu pude... eu pude... eh...

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realizar esse sonho junto com os meus filhos, né... e também, fomos com o meu sogro, a minha sogra e um tempo depois o meu sogro morreu e isso marcou também por isso, porque foi uma viagem que nós fizemos com ele, eles queriam L25muito viajar com a gente , a gente acabou fazendo essa viagem juntos, e por todos esses motivos essa também foi uma viagem especial.

(a gente: foi/ acabou ) Sujeito 24: M50ES L1O período de férias, de um modo geral, é sempre muito bom, porque é um momento em que eu me encontro com a minha família, a minha família toda reunida... agora, se eu tiver que falar de um período entre tantos que eu já vivi, eu me remonto, eu volto e penso nas férias da minha infância no quintal da minha L5casa... sem sair de Belém, e o meu pai construindo... eu diria assim, criando estratégias de entretenimento pra cada filho, e o nosso quintal virou um parque de diversão... o balanço, feito de pneu de carro e apoiado na árvore, que ainda hoje existe, o nosso piquenique, o nosso almoço todo era realizado no quintal de casa, nós escolhíamos o que queríamos para o almoço e esse almoço era feito no L10quintal de casa e sem cadeira, sentados todos numa lona porque o quintal ainda não era, não era lajotado como hoje é, era ainda chão... então meu pai colocava lona, todos os dias ele cuidava pra limpar, colocar a lona e retirar a lona no final do dia e transformou nosso quintal num parque de diversões pra suprir... uma dificuldade, não financeira, uma parte financeira, mas de uma dificuldade L15profissional que ele precisava ficar em Belém, que ele não poderia se ausentar do exército, que ele tinha um trabalho específico, então ele transformou nossas férias, nós não nos deslocamos, não fomos ao Rio, não fomos a Salinas como de costume, não fomos pra lugar nenhum, pra que a família permanecesse junta e unida, como era a grande característica nossa, e ele transformou nosso quintal L20num parque de diversões.

(NÓS)

Sujeito 25: H74ES L1 Minhas férias inesquecíveis se passaram no sul de Minas, no ano de 1990, quando por força de razões de saúde da minha mulher, nós fizemos uma estação de águas naquele circuito de águas Termais do sul de Minas, começando por Cambuquira, passando por Lambari, indo a São Lourenço e terminando em L5Caxambu. Foi uma viagem que reuniu não só prazer como também momentos muito grande de recuperação de saúde, porque o tratamento com as águas dos parques do sul de minas é um tratamento extremamente valioso para nossa saúde, de formas que nós não só conseguimos recuperar a saúde da minha mulher, como tivemos por muitos e muitos dias, é... momentos muito grande de lazer, para L10pessoas como nós que gostamos desta vida assim de descanso, de silêncio, de verde, de natureza, de formas que foram férias, pra mim, inesquecíveis, se me for possível ainda gostaria de repeti-las e sobretudo de recomendar a todas as pessoas que não deixem de conhecer esse recanto maravilhoso do Brasil que é o sul de minas, um verdadeiro paraíso, e a custo relativamente módico, acessível a qualquer

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L15pessoa assim da classe média como nós, que estivemos em hotéis razoavelmente baratos, com tratamento muito bom, eh... inclusive citando, por exemplo, o dia termina, terminava sempre com uma sessão de chás, pra quem gosta de chás, como eu, é, o hotel oferecia uma opção muito grande de chás para as pessoas antes de dormir, é... se servirem à vontade, além da refeição sempre L20farta e sadia, sobretudo de legumes e verduras, de formas que foi um passeio muito bom, que nós aproveitamos muito e, como já eu disse, gostaria extremamente de repeti-lo. (NÓS) Sujeito 26: M73AEM L1A melhor... as minhas férias das Quatro Bandeiras, que eu fiz, nós fomos até Buenos Aires, né... fomos no Paraguai, Ponta... Ponta De´leste, Uruguai e o sul do Brasil, né... mas a cidade de, de, de... que mais me impressionou foi Buenos Aires, em Buenos Aires nós fomos bem tratados, pessoal do Brasil, nossa excursão, L5fomos bem atendidos, bem... só não fomos... só a alimentação que não era boa, quando chega aqui no Brasil a gente... é uma alegria, porque a nossa alimentação é muito diferente de lá e... passeamos bastante, Ponta De´leste é muito lindo, quem poder ir lá tem que ir lá pra ver de perto, é... Uruguai também... foram passeios maravilhosos que nós fizemos, foi a melhor viagem que eu já fiz, melhor férias L10pra mim foi esta... nós já fizemos também de São Paulo, de São Paulo, Rio e viemos pelo Nordeste e... viemos todo o nordeste...e... e...a minha filha, Lia, tomou conta da excursão no ônibus, tomou conta, o guia já não podia mais nem falar porque ela que tomou conta e... cantou, e...e... atendia todas as pessoas dentro do ônibus, foi muito legal também essas férias... Sujeito 27: H65EM L1Na década de 80 nós, os nossos filhos ainda eram bem adolescentes, o Júlio, meu mais velho já estava na universidade, o meu segundo tinha passado no vestibular, estava fazendo medicina e a Helena Maria estava concluíndo o 2º grau, no colégio Marista, de onde todos estudaram.. e... através da amizade de uma L5colega do Júlio, é... nós conhecemos umas pessoas em Fortaleza... essas pessoas... essa moça, amiga do meu filho... é... que já fazia arquitetura... é... nos ofereceu a casa, inclusive de um amigo de um amigo dela da, da colega do Júlio e nós alugamos esta casa. Fomos... foi uma viagem formidável, foi muito gostoso, a nossa casa vivia constantemente com os jovens, com as crianças, né... a minha L10sogra foi, minha sogra que eu estimava muito, juntamente com que eu chamo meu irmão, mas na verdade é meu cunhado, ou melhor, ele é filho, cunhado, eu sou padrinho dos filhos dele, das filhas dele, enfim, é como se fosse um filhos que nós temos chamado Uasca, né, é como se fosse um filho pra nós... e foi uma beleza... lá, minha amiguinha, se eu lhe contar que nós.. é...nós.. é... na praia do Futuro, L15então a casa ficava próximo, próximo, era na praia, dentro da praia praticamente, inclusive a coisa ficou tão gostosa que eu até abri conta no João, era o, o barraqueiro que tinha uma barraca, né... pra não tá todo dia ah, que quero refrigerante, quero um pastel, vai lá, toma o dinheiro, vai lá, papai... eu cheguei lá, João, abre a conta... ah, pro senhor eu faço tudo... ficamos amigos dele, os

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L20meninos eia lá....e pega... e quanto é?... não, tá na nota, tá na nota...só que quase eu vendo um, quase eu deixo um pra pagar a conta...não... é brincadeira, brincadeira...de sorte que foi umas férias formidáveis, aonde o Zezinho, o segundo, tinha terminado, tava aprendendo a dirigir e um amigo meu nos emprestou um fusca, esse fusca dava, assim, mais ou menos, dez pessoas dentro, ai já viu a bagunça L25que era, né? ... e o Zezinho dirigindo, e eu ensinava ele dirigia e ele olhava pra trás, mas eu dizia, meu filho, o retrovisor do carro é na lateral e na frente, você olha pelo retrovisor e enxerga o carro lá atrás... e ele dizia, não pai, este aqui é o ponto morto, ponto cego, ... eu digo, que ponto cego, coisa nenhuma, você tem que olhar é pra frente... Ah, Lia, foi formidável, foi umas férias formidáveis, inesquecível... até L30hoje, a gente sempre lembra com muita saudade. Essa foi umas das boas férias que nós tivemos, fora outras, né, mas esta foi muito gostosa...

(a gente: lembra/ NÓS)

Sujeito 28: H55ES L1Bem, vou falar sobre uma viagem sob a perspectiva do momento de... casal, né... que foi comemoração dos vinte anos de casamento.. eh... como eu tenho uma... um certo gosto, ou uma saudade do frio, né...eh, nós escolhemos, eu e minha esposa escolhemos ir ao Chile, em Julho,e... pra ter a oportunidade de rever a neve... na L5minha infância tive dois momentos que vi a neve, o que me chamou mais atenção, foi quando eu morava no Rio Grande do Sul, eu tinha sete anos de idade, eu tive a oportunidade de ver, assim, a neve numa espessura de 30 centímetros..e como não é comum isso no Rio Grande do Sul... eh... foi uma coisa muito marcante, eh em primeiro lugar, meu pai tinha uma preocupação que a casa ia desabar, L10então ele providenciou logo instrumentos, ferramentas pra tirar neve do teto da casa e assim por diante, mas teve assim um lado dramático, digamos, comigo, né, o desespero do desabamento da casa, mas teve o lado, digamos assim... pitoresco, em termos de... de ver todos os campos cobertos e assim por diante... então, de certa maneira, pra comemorar os vinte anos de casamento foi essa ideia de L15rever, digamos, a neve... e como no Rio Grande do Sul se vai e não se vê mais neve, mesmo Gramado é por acaso, é...eventualmente, né... eu queria ter uma experiência de saber que ia prum lugar que tivesse a neve mesmo, né; então, eh... Julho, né, mês de Julho, fizemos uma viagem, né... até o Chile, e além de conhecer a capital ... eh... tivemos a oportunidade de ir, né... até o Vale da Nevada, né... então L20eh, em primeiro lugar, se diferenciou um pouco, né...daquele ambiente que eu vinha e que eu presenciei no Rio Grande do Sul de sessenta e quatro... sessenta e quatro, sessenta e cinco... eh... eh.... é diferente no sentido, o Rio Grande do Sul era aquela, assim, uma neblina, aquela coisa escura e tal, eh.. no Vale da Nevada, ao contrário, né... céu aberto, as pessoas vão esquiar, enfim, era toda uma outra L25dimensão em termo da beleza, da paisagem, enfim, tipo de pessoas que frequentam lá,uma certa elite econômica, né, enquanto eu vivi um momento de neve no Rio Grande do Sul que o medo, a circunstância era de sobrevivência e tal... o momento da viagem pra comemorar os vinte anos de casamento foi mais essa questão da beleza... assim... da neve em sim, mas todo, digamos, um comércio em L30torno disso...um turismo em torno disso, e assim por diante, né... bom, evidente que... que marcou, né...a viagem, né, particularmente, vê as pessoas esquiá, vê todo aquele clima, digamos, das pessoas que vão e assim por diante, mas também

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marcou o contexto de estar no Chile, eh, vê a questão dos vinhedos, né, a produção de uva, a minha família tem uma tradição desde a Itália de plantar parrerais, eh, L35plantar vinhedos e assim por diante, e, de repente, aquilo que eu conheci na terra do meu avô, do meu pai, era uma coisa mais rudimentar... rudimentar... de repente, no Chile, eu visitei cantinas já duma perspectiva mais comercial e assim por diante... então, dentro de todo esse contexto, digamos, da neve nas montanhas, nas baixadas, da produção de vinho, e assim por diante, retomou, digamos L40assim, minha infância, a minha história e assim por diante... foi uma coisa que foi muito salutar, digamos assim, do reencontro com as raízes, não como um reencontro aonde eu nasci, mas um reencontro com valores, eh, há toda uma cultura em torno do frio, toda uma cultura e um ritual atrás... em torno do vinho, né... então, isso que me chamou mais atenção e que pra mim, particularmente, foi uma L45viagem mais marcante, né...eh, embora eu tenha viajado, digamos, em outra circunstância de ver a neve, muito forte, aonde se neva mais, que foi no Canadá, mas, digamos, era uma questão muito mais urbana, né... uma cidade muito mais urbana, a neve tava ali, e tal, mas era uma questão muito mais de se esconder, de ir pros túneis e fugir.. então se via a neve muito mais como um desafio para se L50sobreviver, então não me marcou muito a neve no Canadá, marcou a cidade, mas a neve não me marcou, mas o Chile me marcou a neve em si, digamos, como o pessoal explora bem a questão do turismo, mas porque tá em torno, em torno da produção de uvas e de vinhos que me recordou minha infância... eu tenho impressão que quando você passa dos cinquenta anos, digamos, olhar pra frente é L55importante, mas alguma coisa, ver, ouvir, também é resgatar alguns valores que marcam fortemente a memória da gente e quando a gente tem a oportunidade de retomar parece que a gente tem mais capacidade de observar os detalhes, e assim por diante, quer dizer, aquilo que na infância, a neve era um pouco de medo, do terror, depois dos cinqüenta anos a neve passou a ser algo da beleza, do brilho, L60do lazer e assim por diante.

(a gente: tem)

Sujeito 29: M60EM L1Das férias que eu já tirei já viajei pra vários lugares, mas uma que eu gostei muito foi quando eu fui de excursão pras Serras Gaúchas, e lá quando nós fomos coincidiu com a época do natal. Então pra mim foi muito bom porque o Zezinho também foi conosco, a nossa nora foi, os pais da nossa nora foram também com a gente , foi L5uma viagem maravilhosa... nós pegamos a noite de natal com toda a serra, toda iluminada, papai Noel, nós compramos gorro de papai Noel pra butar na cabeça, e fomos naquelas igrejas lindas, e foi uma viagem diferente, primeiro porque lá não fazia nem calor, a gente não precisava tá se abanando, não tinha calor e nada... e tinha muito vinho, muito doce, nós entrávamos naquela lojas todas, vendiam L10aqueles casacos pesados, de couro, mas foi muito bom... a cidade de Gramado, por exemplo, parece, assim, que ela foi desenhada com a mão humana, que é linda, linda, linda... agora cada malharia... muita coisa linda... e na parte onde tem os doces, uma maravilha... sapato de couro, ficamos num hotel muito bonito que era todo iluminado também, tinha tipo um SPA dentro do hotel, nera... com piscina, e L15agora as refeições, o café da manhã, e o café colonial... que era uma fartura, bolo de todo jeito, pães, docinhos, refrescos, vinho... chegava na hora do almoço

Nós/A gente: variação ou mudança? 93

levavam a gente pra churrascaria, aquela infinidade de carne, muito boa mesmo... teve uma que nós fomos com uma variedade imensa... teve uma que nós fomos que a gente olhava pro teto do restaurante, era todo enfeitado com folhas de louro, L20aí nós fomos perguntar por que que era aquilo, aí eles disseram que era pra espantar as moscas que tinha lá, de vez em quando aparecia, mas essa foi uma viagem maravilhosa, essa eu guardo na minha memória, eu acho que não vou me esquecer nunca dela... eu quero voltar lá, não sei quando, se vai dar ainda, né... vamos ver.

(a gente: foi/ precisava/ olhava/ NÓS)

Sujeito 30: M52ES L1 As férias que eu tenho como lembrança é quando eu era pequena e nós íamos pra Salvaterra e nós íamos de navio... era um navio chamado Getúlio Vargas, chegávamos até Soure, de Soure pegávamos uma... um barco tipo uma canoa e depois íamos pra Salvaterra... praia limpa, muita... mui... muita... eh... muita fruta, L5muito sol e lá nós desfrutávamos de muito lazer. Sujeito 31: H51ES L1Uma das férias mais agradáveis que eu tive ultimamente foi exatamente a última que nós tivemos quando nós viajamos junto com nossos filhos, uma coisa que não é muito fácil de acontecer e nós fomos pra Gramado... por que foi gostoso? Porque nós estávamos com nossos filhos e nós fomos conhecer um local bem diferente L5do que nós vivemos, nós fomos prum local frio, montanha, cenário completamente diferente, os hábitos, as pessoas, completamente diferente... a impressão que eu tive realmente quando eu cheguei a Gramado é que nós estávamos em outro país que falava nossa língua... as pessoas com hábitos completamente diferente, costumes... até a maneira de falar, de se dirigir, a L10educação completamente diferente... e nós passeamos muito, curtimos muito com nosso filhos, que eles já tão numa fase já... chegando na fase adulta e cada vez é mais difícil eles andarem conosco e nessas férias que nós tiramos enorme de doze dias (risos) nós tivemos a oportunidade de curtir os nosso filhos dentro do mesmo hotel, passeando, jantando junto, e vendo coisas bonitas, coisas L15diferentes, bebendo junto também, junto com eles e... pra nós foi uma experiência muito gostosa, muito gostosa mesmo que eu gostaria de repetir, não sei se eu vou conseguir, mas que valeu a pena.

Sujeito 32 – M66ES L1Uma que me marcou muito foi quando eu fui a Miami com meu filho e a minha nora... foi muito bom porque nós passeamos muito, eu passei o que... uns quinze dias lá, e conheci muito.. agora... eu... deixa eu ver... deixa eu me lembrar...e... e o Paulo, eles já conheciam, eles já conheciam Miami, né... e o Paulo alugou um L5carro, né... que lá a gente usa muito isso, né... e passeamos bastante, só uma hora que eu fiquei apreensiva foi quando a minha nora resolveu pegar um iate pra dar uma volta.. ah, eu fiquei muito nervosa, fiquei preocupada porque nós não

Nós/A gente: variação ou mudança? 94

conhecíamos o trecho e ela conhecia, ela já conhecia.. “não, dona Nazaré, não vai acontecer nada...”, não sei o que, mas realmente não aconteceu nada, era mais L10... e foi uma viagem que marcou um pouco, por que..nós fomos aqui... naquela época, oh... deixa eu ver.... nós íamos primeiro, foi pela Transbrasil, nós fomos primeiro pra... naquela época os aviões ao invés de eles irem direta daqui pra Miami, nós íamos pra São Paulo pegar os passageiros de São Paulo pra ir pra Miami, entendeu? Hoje, não, naquela época, olha a mão de obra que era, eles vinham L15aqui em Belém, o avião vinha aqui em Belém, pegava os passageiros e ia pra São Paulo, de lá ia pra Miami... então, quando nós chegamos em Miami, minha bagagem, nossa bagagem não chegou lá, e a comissãria chegou pra nós e disse “olha, a bagagem de vocês não veio, aí saltamos lá, e como era uma praça que era mais de brasileiros, sabe, a praça tinha muitas casas do Brasil, tava até tocando L20Tico-Tico no fubá, nós nos sentimos em casa, aí nós ficamos passeando, aí a aeromoça disse “olha, a bagagem de vocês chega no dia seguinte, nós estávamos com a roupa do corpo, chegamos no hotel e não tinha, mas como tava tocando Tico-tico no fubá, aí o rapaz disse “olha, essa loja é brasileira, vocês podem conseguir roupas”... “como é que nós vamos ficar sem roupa, sem nada...”, aí entramos na L25loja e compramos, comprei uma porção de roupas, aí a comissária tinha saltado também conosco, ela ia ficar lá, e disse, “olha, essa roupa eles dizem que chega no dia seguinte, mas não chega”, aí pegamos, entramos na loja... eram mais ou menos, faltavam vinte pra meia-noite na hora deles... aí ela disse “não, mas vocês podem entrar e comprar roupa aqui, não tem problema nenhum... só que nós temos dez L30minutos pra fechar... aí, entramos na loja, começamos a comprar tudinho, aí.. tu sabes o que aconteceu? Aí, eu me lembro que eu tava com uma calça verde e tinha umas blusas tipo Hering, tinha assim bem umas vinte, tava em promoção, aí eu virei pra minha nora e disse “eu vou comprar umas duas blusas porque se não vier amanhã eu visto com essa roupa”... aí, não me preocupei e nem que eu quisesse L35me preocupar, o que tava escrito no inglês eu não prestei atenção, quando ela disse “faltam dez minutos pra fechar a loja” eu passei a mão... peguei... todo mundo cansado, saímos daqui cinco horas da manhã, fomos chegar quase meia noite... pra te encurtar a história... quando foi no dia seguinte, o ônibus veio pra viagem de turismo, aí nós pegamos o ônibus e saímos... depois de muito tempo, a minha L40nora chega e diz “Dona Nazaré, a sua blusa está esquisita, é melhor a senhora colocar assim pra dentro”... tu sabes o que é que tinha escrito na ... tava convidando pra fazer sexo (risos)... agora..eu olhava daqui de cima e via o verbo “I am não sei o que” e não via o verbo... e eles que estavam de frente tavam lendo... aí, depois de termos passeado muito, muito, muito, aí é que o meu filho... olha, ele riu, r iu, riu L45tanto, mas não queriam me dizer porque ia estragar o passeio, porque naquela hora eu queria voltar... aí não me disseram nada... “mas por que vocês riem tanto?”... “Não, nada!”... Pra te encurtar a história era isso que tinha escrito, por isso é que subi uma escada rolante lá e tinha um velho todo engraçado... aí eu brinquei com eles, né... que quando nós programamos a viagem, e eu disse pra eles “eu não L50quero ir”... eles fizeram o curso de inglês, mas eu nunca fiz, só tenho aquele inglês básico do ginásio, do curso técnico que eu tinha... mas valeu porque até hoje a gente se lembra da bruncadeira... mas foi umas férias maravilhosas!

(a gente: usa/ se lembra/ NÓS)

Nós/A gente: variação ou mudança? 95

Sujeito 33: H48ALF

L1Foi assim, eu nunca tinha vindo aqui em Belém, aí quando foi num tempo a minha tia foi lá em casa no interior, foi me buscar lá, aí foi que a gente veio de navio, aí viajou a noite toda... e... quando amanheceu o dia, né, eu... ansioso pra ver a cidade de lá do... da baía, nunca tinha vindo aqui, né... aí foi pra beira do barco assim, né... pro lado do barco, assim, do navio, aí quando chegou aqui em frente aí o navio L5bateu na pedra... aí, a minha tia tava com a minha filha, minha filha tinha o que... três meses de idade, de nascida, né.. aí ela... tava com a minha tia, minha tia tava sentada numa cadeira lá no navio... assim, eu tava mais na frente, e a minha esposa tava assim mais perto de mim também... aí quando o navio bateu na pedra aí ele virou, aí eu corri pra pegar a minha filha que eu ia pular, né, na água... aí foi quando L10o pessoal correu pro outro lado do navio... aí o navio voltou pra lá... saiu da pedra e virou... aí... o pessoal correu de novo pra cá e foi que o navio ficou normal, mas ele entrou água assim por cima da... não sei como que é o nome daquilo lá... eh... por cima assim do convés...e foi que mais rápido chegou uma lancha da capitania... foi rápido chegaram lá pra acudir a gente, foi que a gente encostou aqui L15no porto e eu vim pra cá e desde essa vez que eu vim pra cá eu fiquei com medo de andar de navio, eu tenho medo de andar de navio no rio, e.. até agora eu ainda não foi pra lá ainda, tô com vinte.... vinte e um ano morando aqui e até agora eu tenho medo de andar de navio.

Sujeito 34: M65ES

L1 Ah tenho várias que me marcaram, mas, fundamentalmente lembro de três delas... uma foi...duas, aliás... mais marcantes... uma foi...Fortaleza, período de férias, família toda reunida, levamos inclusive mais duas sobrinhas, Mara e Silvana, e foi agradabilíssima, estávamos todos juntos, com toda a infraestrutura, fomos L5de... eh... parte via aérea, parte terrestre, passamos um mês lá, e essas eu não as esquecerei nunca. E outra foi quando fizemos a primeira viagem para o exterior, que foi para os Estados Unidos, não contando com a presença da Louise que já era nascida, mais que de qualquer forma foi uma experiência extraordinária, momentos extremamente marcantes e que não dão pra esquecer nunca.

Sujeito 35: H70ES

L1 Olha... num posso dizer que foi bem umas férias, mas vamos dizer... num deixou de ser... foi quando nós tivemos a oportunidade de ir pra EXPO, em Portugal, depois prolongamos pela Espanha, pela Itália... então como foi uma coisa que eu fiz e não repeti, eu digo que foi uma coisa que eu poderia considerar como férias, e como L5uma coisa que marcou muito... tá no país que meu pai nasceu, jogar moeda na fonte de Trevi, na esperança de voltar lá... se é pelas moedas que eu joguei eu vou voltar muitas vezes...