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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE UNIDADE ACADÊMICA ESPECIALIZADA ESCOLA DE MÚSICA LICENCIATURA PLENA EM MÚSICA A MÚSICA POPULAR NO TEMPO DA REPRESSÃO- um estudo sobre a música em Natal, nos tempos da Ditadura Militar. JOÃO MARIA RODRIGUES DE SOUZA FILHO NATAL-RN NOVEMBRO/2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

UNIDADE ACADÊMICA ESPECIALIZADA

ESCOLA DE MÚSICA

LICENCIATURA PLENA EM MÚSICA

A MÚSICA POPULAR NO TEMPO DA REPRESSÃO- um estudo sobre a

música em Natal, nos tempos da Ditadura Militar.

JOÃO MARIA RODRIGUES DE SOUZA FILHO

NATAL-RN

NOVEMBRO/2014

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JOÃO MARIA RODRIGUES DE SOUZA FILHO

A MÚSICA POPULAR NO TEMPO DA REPRESSÃO- um estudo sobre a

música em Natal, nos tempos da Ditadura Militar.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

à Unidade Acadêmica Especializada em

Música, da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte, como requisito para

obtenção do título de Graduado em Música –

Licenciatura.

Orientador: prof. Dr. Agostinho Lima

NATAL-RN

NOVEMBRO/2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

UNIDADE ACADÊMICA ESPECIALIZADA

ESCOLA DE MÚSICA

LICENCIATURA PLENA EM MÚSICA

A MÚSICA POPULAR NO TEMPO DA REPRESSÃO- um estudo sobre a

música em Natal, nos tempos da Ditadura Militar.

JOÃO MARIA RODRIGUES DE SOUZA FILHO

Monografia apresentada e aprovada em ___/___/___ pela Banca Examinadora composta pelos

seguintes membros:

______________________________________

Orientador

_______________________________________

Membro Examinador

________________________________________

Membro Examinador

NATAL-RN

NOVEMBRO/2014

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―O impreciso tem de ser muito preciso em relação aos fenômenos que

tornam a coisa imprecisa. Por exemplo, elementos temporais da música:

duração, silêncio e som. É a mistura de precisão e imprecisão, que é muito

interessante, talvez ainda mais para as gerações ou artistas do futuro do que

para nós no momento. Essas noções antidualistas são básicas na ciência

ocidental e na filosofia oriental. No fundo já há essa tendência na dodecafonia.

A altura do som não é muito exata, pode ser, mas se estiver exata fica morta.

Há certa margem de imprecisão que é necessária... Minhas ideias são baseadas

em conceitos que nunca são exatos, porque a alma não é coisa exata. O

impreciso tem que ser tratado com precisão.‖

Hans-Joaquim koellreuter (1999).

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeira e certamente ao meu Deus vivo Pai, que me acompanha desde

sempre; segurando em minha mão e me mostrando a luz do caminho judicioso. Agradeço pelo

teu amor, por todas as horas que estais comigo.

A minha noiva e amiga Julieany, que me acompanhou de perto e participou

juntamente em tudo o que aconteceu em minha vida, me dando força e coragem. Obrigado por

seu amor, compreensão e por estar presente em meu coração e em meus planos por toda a

minha vida.

Aos meus amigos, Alynne Davi, Diógenes, Evilazio Ruan, Renilsom, e a cada

familiar dessas pessoas, por todas as vezes que me direcionaram e auxiliaram certamente o

que fizeram por mim não tem preço. Amizade sincera e verdadeira para todas as horas, e que

se Deus permitir levarei para sempre.

Agradecer em especial A meu Grande Amigo Físico Josiano Freitas por torna o curso

divertido nas viagens de ônibus, e pelos Grandes debates políticos que seguiam nas viagens.

A dona Francisca por ter sido a principal incentivadora deste curso. As amizades sinceras das

minhas amigas de dança Ariane Mendes, Samara Salgueiro e Sabrina Mendes.

Aos meus amigos da Faculdade, pois durante este tempo, estive mais com eles que

com minha própria família. Agradeço pela união e companheirismo, que jamais serão

esquecidos.

Ao meu Orientador o professor Dr. Agostinho Lima, por me guiar e acreditar nesse

trabalho, e não poderia me esquecer de agradecer ao professor Dr. Ezequias Oliveira Lira e a

professora Dr. Betania Maria Franklin de Melo por suas grandes contribuições a este trabalho.

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RESUMO

A ditadura militar no Brasil instaurada entre os anos de 1964 a 1985 tomou o domínio

político, econômico e social artístico; originando os mais selvagens episódios da Música

Popular Brasileira sob a forma de abuso, censura, repressão, exílio, prisão e diversas outras

formas de coibição da Sociedade Artística. Os militares silenciaram de forma cruel e

desumana, aqueles que poderiam vir a exercer qualquer ação consicientizadora a respeito da

realidade a respeito da realidade brasileira e seus absurdos, isto ocorreu de forma intensa na

Era dos Festivais, pois este mecanismo de fusão de ideais tinha o poder de arrebatar uma

grande massa populacional.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 07

CAPÍTULO 1 – MÚSICA POPULAR ............................................................................... 08

CAPÍTULO 2 – COMO NASCE E SE ESTABELECE A MPB ................................... 14

CAPÍTULO 3 – MÚSICA, SOCIEDADE E POLÍTICA .................................................. 19

CAPÍTULO 4 – A MÚSICA POLÍTICAMNETE ENGAJADA, PÓS BOSSA-NOVA . 26

CAPÍTULO 5 – DITADURA MILITAR: O QUE FOI E COMO SE DEU O SISTEMA

GERAL DE CENSURA E REPRESSÃO AS ARTES .......................... 31

CAPITULO 6 – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A CENSURA E

REPRESSÃO AS ARTES NA CIDADE DO NATAL........................... 39

CONCLUSÃO........................................................................................................................ 46

REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 47

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INTRODUÇÃO

O presente texto almeja ilustrar de caráter utilitário o que ocorreu no cenário

sócio musical do Brasil durante o período da ditadura militar (1964/1985), alegando

fatos que incidiram neste país; através da determinação de ideais por meio da força e

ameaça para o desenvolvimento de uma sociedade menos participativa criticamente e ao

mesmo tempo mais submissa, tendo um papel decisivo para que a ideologia implantada

pelo regime militar pudesse transformar as analogias igualitárias.

Por ensejos e atitude de censura em relação ao governo, os artistas executavam

mensagens codificadas e impregnadas de metáforas para descrever toda a coibição que

toleravam.

A valorização dessa ciência está atrelada ao povo brasileiro, fazendo parte da

nossa biografia, acarretando o princípio de entendimentos de litígios sociais de um

modo instantâneo e direto propriamente dito.

Dentro desse contexto, a proposta central deste estudo foi responder ao seguinte

questionamento: O que aconteceu no cenário musical na cidade de Natal sob o regime

militar?

Diante dessas questões, o objetivo principal deste trabalho é apresentar as praticas

musicas em Natal, nos tempos da repressão.

Justifica-se a realização deste estudo pelo fato de que se torna necessário à

sociedade musical Norte Rio Grandense brasileira, de forma geral, deter conhecimentos

satisfatórios sobre a Música Popular Brasileira e seu registro em Natal.

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CAPITULO 1 – MÚSICA POPULAR

Neste capitulo abordaremos o conceito de musica popular buscando observá-la a

partir de um enfoque histórico e sociológico entre as relações música popular e história,

assim como a história da música popular no Ocidente.

De acordo com Napolitano (2002), as analogias entre música popular e história,

igualmente como a história da música popular no Ocidente precisam ser pensadas

dentro do campo musical como um todo, sem a confrontação entre ―erudito‖ versus

―popular‖. Nesta perspectiva Napolitano sintetiza os elementos que compõe a música

popular:

A música popular reuniu uma série de elementos musicais, poéticos e

performáticos da música erudita (o lied, a chançon, árias de ópera, bel

canto, corais etc.), da música ―folclórica‖ danças dramáticas

camponesas narrativas orais, cantos de trabalho, jogos de linguagem e

quadrinhas cognitivas e morais e do cancioneiro ―interessado‖ do século

XVIII e XIX (músicas religiosas ou revolucionárias) (NOPOLITANO

2002,p.09).

O mesmo autor continua sugerindo que a ―música a entre o sec. XIX e XX

assume uma nova estrutura sócia econômica além de sua função básica à dança,

incorporando-se a culturas e lazeres urbanos, atendendo interesse social ou individual‖.

A ―música popular‖ emerge na cultura ocidental, ocasionada pelas tensões e

lutas sociais entre as dicotomias, ―popular‖ e ―erudito‖, transcorrendo por vários

acontecimentos. O historiador Middleton abordando esta questão observa que:

O momento da ―revolução burguesa‖, que estimulou a criação de

editores musicais, promotores de concertos, proprietários de teatros e

casas de concerto público. O gosto burguês na música tem seu auge por

volta de 1850, com o predomínio de formas musicais sinfônicas e

valores culturais consagrados: banimento da ―música de rua‖, canções

políticas circunscritas a enclaves operários vanguarda marginalizada ou

assimilada (MIDDLETON, 1990 apud NAPOLITANO 2002, p.09).

Neste panorama Middleton (1990) relata que por volta de 1890, o panorama

começou a mudar, com o nascimento da ―cultura de massa‖ e as novas estruturas

monopolísticas tomando conta do mercado, resultando num impacto do ragtime, jazz,

Tin Pan Alley (quarteirões que concentravam os editores musicais em Nova York e que

se tomaram sinônimo de um tipo de canção romântica), novas formas de dança e

espetáculos (music-hall). Middleton ainda aponta outro momento sendo:

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De ―crise‖ e mudança na música popular, vem depois da II Guerra

mundial, com o advento do rock’n roll e da cultura pop, como um todo.

O jazz também sofre mudanças. (BeBop, Free Jazz etc.). A experiência

musical é o espaço de um exercício de ―liberdade‖ criativa e de

comportamento, ao mesmo tempo em que se busca a ―autenticidade‖

das formas culturais e musicais, categorias importantes para entender a

rebelião de setores jovens, sobretudo oriundos das classes trabalhadoras

inglesas ou da baixa classe média americana. (MIDDLETON, 1990

apud NAPOLITANO 2002, p.09).

Para Napolitano essa linha histórica ainda é muito panorâmica e linear e deve ser

repensada antes de ser aplicada em realidades diferenciadas, como a América Latina.

Segundo ele:

O que se chama de ―música popular‖ emergiu do sistema musical

ocidental tal como foi consagrado pela burguesia no início do século

XIX, e a dicotomia ―popular‖ e ―erudito‖ nasceu mais em função das

próprias tensões sociais e lutas culturais da sociedade burguesa do que

por um desenvolvimento ―natural‖ do gosto coletivo, em tomo de

formas musicais fixas (NAPOLITANO 2002,p.11)

Waldenyr Caldas ao se referir a "Iniciação à Música Popular Brasileira" cita que:

A nossa música, de acordo com seus estudiosos, aparece, juntamente

com os primeiros centros urbanos, no Brasil colonial do século XVIII...

Mas é só a partir do final do século XIX que se configura a síntese da

nossa expressão musical urbana através do hibridismo de sons

indígenas, negros e portugueses (CALDAS 1989, p.5).

De acordo com Abreu (2001), dando algumas pistas para se compreender as

razões que o levaram a considerar a "música popular" um fator de identidade nacional,

Guilherme de Mello parte de uma constatação de que a música é a "arte mais

sociológica", a "mais leal do sentimento humano". Sendo assim, o autor defende que o

"sentimento música" é muito diferente entre diferentes partes do mundo. Depende do

indivíduo e da raça a que pertence, reafirmando a existência de uma música (popular)

brasileira, da mesma forma que existiria uma espanhola ou russa. Assim, aproximando a

―música nacional‖ de outras marcas da nacionalidade, pergunta-se... ‖Como, pois não

termos uma música essencialmente nacional desde quando temos uma tradição, um

clima e uns tantos costumes precisamente brasileiros‖ (Guilherme de Mello 1908 apud

Abreu...).

No que diz respeito sobre essa ideia, Luciano Gallet, demonstrar que o índio não

contribuiu para a "formação de nossa música atual", em função da destruição de sua

"música primitiva" pelos jesuítas e da igualdade de "feitio e sentimento" dos índios de

hoje com os do passado, comprovando que se mantiveram separados da sociedade

brasileira. O folclore brasileiro, no que se referia à música, era de origem luso-africana.

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Ele argumenta que, da síntese do componente melódico expressivo português, latino,

com o artifício rítmico africano, nasceu à música brasileira.

Discutindo sobre as opiniões distintas de autores sobre as características gerais

da música brasileira Martha observa que:

Sem jamais terem chegado a um acordo, o melhor recurso que os

autores encontraram para definir as características gerais da ―musica

popular‖ nas sínteses históricas que procuraram construir, foi mesmo a

eleição de alguns gêneros musicais. Nesta operação, contraditoriamente,

ao mesmo tempo em que buscavam valorizar a mestiçagem musical dos

estilos, muitas vezes de uma forma muito próxima a uma depuração dos

traços africanos, não conseguiram deixar de transparecer a

impossibilidade da síntese e da identidade nacional, em função da

variedade dos estilos e da significativa influência negra e africana

apresentadas. Estas dificuldades encontradas revelam os limites das

intenções de homogeneização do que procuravam definir como música

popular brasileira. (ABREU 2001, p.08).

Discutindo as ideias, Guilherme de Mello, Renato Almeida e Luciano Gallet

Martha Abreu observam que é necessário indagar os motivos que, em meio a tantas

dificuldades de definição, em função da variedade das manifestações musicais dos

setores populares e dos evidentes preconceitos raciais, os levaram a ter tanto empenho

em eleger a ―música popular‖ como um dos maiores traços de definição da

nacionalidade, chegando mesmo a inverter o sentido depreciativo. Frequentemente

atribuído na época aos resultados culturais da mestiçagem.

Estas considerações históricas são fundamentais para entendermos os diversos

sentidos da expressão música populares.

A partir das formas básicas de experiência musical moderna — a

audiência/execução isolada, o espetáculo dramático- musical e as reuniões de dança

forma-se a ―musica popular‖. Segundo Sandroni (2004 p. 25). ―[...] música popular tem

uma conjectura comum de república: trata-se, é claro, da ideia de povo‖, estando

intimamente relacionada à cultural, crenças, interpretações, etc.

Marta Abreu reforça essa ideia ao afirmar que:

A modinha, em sua opinião, ocupa um papel de destaque, pois

foi a "mais expressiva forma de música popular: "cantava

lindamente a índole e os costumes do povo, dominando na casa

do pobre e imperando no solar dos morgados". Assim, definiu o

estilo: "A modinha é o Brasil de ontem, Brasil-colônia, quando

o povo começava a ser caracterizar‖. (ABREU 2001, p.19).

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A expressão ―música popular‖ adequa-se às manifestações da cultura nacional

ocorrida nos anos 1940, valorativa mente cogitada estando entre as principais

manifestações da cultura nacional.

Alberto Ikeda (2001) afirma que, a partir dos anos 60 a música popular passar a

ser objeto de reflexão acadêmica, expressando dupla decadência ―autêntica‖ e

―espontânea‖ que representava a perda de um estado de pureza sociológica, étnica e

estética, a canção popular emergia com status privilegiado na cultura nacional. O

mesmo autor que afirma que os estudos dirigidos para música popular são bem

limitados focalizados em elementos próprios.

A esse respeito Marcos Napolitano observa que:

O campo musical popular desenvolvido nas Américas apontou para uma

outra síntese cultural e, guardadas as especificidades nacionais e

regionais, consolidou formas musicais vigorosas e fundamentais para a

expressão cultural das nacionalidades em processo de afirmação e

redefinição de suas bases étnicas. (NAPOLITANO 2002, p.12).

Em concordância com Ikeda, Napolitano (2002) afirma que o mundo da música

popular assume uma forma complexa, de ampla penetração sociológica e cultural, que

resulta numa reflexão acadêmica mais sistematizada.

Numa abordagem da música popular a partir dos estudos culturais Pereira

observa que:

Se a definição do que constitui a cultura popular foi durante décadas – e

é-o ainda hoje – alvo de muitos e extensos debates, a definição da

música popular não o foi menos. As diferentes tradições e perspectivas

que ao longo das últimas décadas determinaram à análise da cultura

popular, incluindo a concepção elitista que distingue ―high‖ / ―low

culture‖, as teses da cultura de massas, a abordagem cultura lista, o

estruturalismo e, mais recentemente, a visão pós-moderna, todas elas

manifestaram a sua influência na elaboração de um enquadramento

teórico no interior do qual se tem vindo a processar o estudo da música

popular, assumindo desde logo que, tal como o conceito lato de cultura

popular, como hoje o entendemos, trata-se de um fenómeno que emerge

na sequência da industrialização e que apresenta uma relação próxima

com o advento dos dispositivos tecnológicos (PEREIRA 2011, p 119).

Contra a ideologia de Sandroni (2004), Sidney Molina afirma que a música

popular não possui raízes em cultura alguma. Necessitando essencialmente de estilo

para ser produzida.

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Música popular não é folclore, não é música dos índios brasileiros ou

das tribos africanas. Da mesma forma que a música erudita, a música

popular baseia-se em diversos ambientes sonoros para constituir uma

reflexão musical própria. Ao contrário da música étnica - que não se

configura em "obras" - a música popular é autoral e tem estilos

específicos, que se manifestam em gravações e apresentações ao vivo.

(Molina?).

Sousa (2005,) em seu estudo acerca do conceito de música popular, aponta que

esta poderia ser definida de três formas: ―música popular‖ como uma música não

erudita; ―música popular‖ como MPB, um repertório e estilo específico; e ainda

compreendíamos ―música popular‖ como sendo aquela que é disseminada pelos meios

de comunicação.

Para autores como napolitano (2002), o equilíbrio do campo musical popular

expressou novas sociabilidades lógicas da urbanização e da industrialização, novas

composições demográficas e étnicas, novos valores nacionalistas, novas formas de

progressos técnicos e novas agitações sociais, revelando um rico processo de luta e

conflito estético e ideológico, alvo de artifícios culturais, foco de opiniões e

apropriações distintas, sendo elemento de formatações tecnológicas e comerciais.

Para Frith (1998), entretanto, cultura e indústria não se misturam formando

assim um resultado, pois ―A cultura da música popular não é consequência da indústria

da música popular, e mais, a indústria da música é apenas um aspecto da cultura da

música popular‖ (Frith 1998 apud Janotti Junior 2011, p. 35).

Desta maneira podemos compreender a música popular como a música urbana,

instrumental ou cantada, mediatizada, massiva, e moderna. ainda segundo Vila (1995) a

música popular não se expressa somente através do som, mas também através do que se

diz a respeito dela.

No Dicionário Grove, o termo ―música popular‖ tem sido habitualmente

aplicado a partir de 1880. Num sentido mais amplo, é usado para designar a música que,

com o desenvolvimento urbano e o crescimento da industrialização no século XIX,

começou a desenvolver características distintas, de acordo com o gosto e os interesses

da então classe média urbana em expansão. Aprofundando mais essa definição no

dicionário Grove a musica popular é a:

Expressão que abrange todos os tipos de música tradicional ou

―folclórica que, originalmente criada por pessoas iletradas, não era

escrita. as formas de música popular destinadas ao entretenimento de

um grande numero de pessoas surgiram particularmente com o

crescimento das comunidades urbanas, resultado do processo de

industrialização[...], no brasil a música beneficiou –se de um

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cruzamento entre matrizes diversas : lirismo português (produzindo a

―modinha‖), um forte elemento rítmico de origem africana (de

manifestações é o samba urbano do Rio de Janeiro, com sua sincope

característica), o manancial folclórico que vinha sobre tudo do

nordeste e, finalmente sofisticações harmônicas que resultaram no

movimento da bossa-nova. Da fusão dessas corretes , a música popular

brasileira (MPB) partiu para a conquista de uma audiência mundial,

apoiada na obra de compositores como Antonio Carlos Jobim, Chico

Buarque de Holanda, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Milton

Nascimento(DICIONARIO GROVE DE MÚSICA 1997,p.636).

Tagg (1979, apud Pinto 2011) afirma que qualquer tipo de produto musical

marginal e gêneros deveriam ser incluídos no conceito de música popular. Para ele, o

termo ―popular‖ se aplicava somente à música circulando como mercadoria. Neste caso,

música popular para ele seria mercadoria.

No entanto para Gonzalez:

A Música Popular é uma música midiatizada, massiva e

moderna. Midiatizada em suas relações com o público pela

indústria e tecnologia. Massiva porque chega a milhões de

pessoas simultaneamente. Moderna em suas relações

simbióticas com a indústria e a tecnologia. É música da moda?

Sim! Como outras expressões populares também (vestimenta,

gírias, comida, passeios etc.). É midiatizada? Sim! A música

Folk também o é! É música massiva? Sim! Nos tempos da pós-

modernidade, Chopin é toque de telefone celular e é também

massificado. (González 2001)

A música popular, sobre a ótica de Mário de Andrade (apud NAVES 1998, p.2)

veiculada no rádio e nos meios de comunicação de massa, distinguia-se em dois tipos de

música: a popular e a popularesca. A primeira é a música de raiz, ―verdadeira‖,

reveladora da ―alma brasileira‖. A segunda é uma sub música, falsa, plagiaria e

comercial, nos próprios termos mário-andradianos.

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CAPITULO 2 – COMO NASCE E SE ESTABELECE A MPB

Para Napolitano a ―folclorização‖ da música popular se abala com a eclosão da

Bossa Nova, ocorrendo uma quebradura estética em direção ao que se julgava

―modernidade‖: sutileza interpretativa, novas harmonias, funcionalidade e adensamento

dos elementos estruturais da canção.

Segundo Sandroni (2004) até meados de 1940 a expressão ―música popular‖ no

Brasil continha o mesmo significado Europeu, ocorrendo por volta de 1960 à junção das

palavras ―musica popular brasileira” que representa as músicas urbanas ligadas ao

rádio e discos, que ainda segundo Napolitano (2002, p.44) hasteava como um ponto

médio entre a tradição ―folclorizada‖ do morro e do sertão e as conquistas cosmopolitas

da Bossa Nova. Para Ikeda:

O interesse sistemático pela música popular urbana se deu inicialmente

entre aqueles profissionais relacionados diretamente com a música

popular [...], a partir da década de 1980, passa a despertar interesse nos

meios universitários [...] (IKEDA 1999, p.02).

Ele ainda alega que, a expressão “música popular brasileira‖ contém em si uma

assimilação politico cultural caracterizada pelo folclore, construindo uma identidade

nacional. A distinção entre música popular e música folclórica no Brasil esteve ligada

também à ideia de que a primeira estava viva, e a segunda, morta. Segundo o próprio:

A concepção de uma ―música-popular-brasileira‖, marcada

ideologicamente e cristalizada na sigla ―MPB‖, liga-se, a meu ver, a um

momento da história da República em que a ideia de ―povo brasileiro‖

— e de um povo, acreditava-se, cada vez mais urbano. (SANDRONI

2004, p. 04).

Napolitano (2002) aponta que em 1965, surgiu a sigla MPB que sintetiza ―toda‖

a tradição musical popular brasileira e agregou novos artistas (Elis Regina, Chico

Buarque de Holanda, Gilberto Gil e Caetano Veloso, entre outros), constituindo um

bloco estético e ideológico monolítico, marcado pelo populismo e pelo nacionalismo,

sem matizes e nuances entre os diversos artístas a ela identificados.

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A MPB foi pensada a partir da estratégia de ―nacionalização‖ da Bossa Nova

que traduzia uma busca de ―comunicabilidade e popularidade‖, sem abandonar as

―conquistas‖ e o novo lugar social da canção compreendida de forma mistificadora, pois

prometia conscientização ―para o povo‖, mas oferecia apenas uma catarse escapista

(marcada pelo culto do ―dia que virá‖ nos libertar), sobretudo para os estratos

intelectuais da classe média, sem espaço político após o golpe de 1964.

Carlos Sandroni (2004) sugere que, Partindo de uma orientação estético-política,

cristalizada em valores e concepções republicanas, a MPB atravessa os anos 1970

marcados pela censura e pelas lutas democráticas, vinculada ao tropicalismo de Caetano

Veloso e Chico Buarque, estando dentro ou fora do assunto politico. O rock nacional

nos anos 1980 da um novo aguento a MPB, segundo a cantora Joyce a MPB-chato

designa músicos demasiado apegados a paradigmas estéticos nacionalistas, contudo

segundo Napolitano (2002, p.51)Mesmo mantendo-se como sinônimo de ―música

popular culta‖ a MPB perde espaço progressivamente para o rock, entretanto o sucesso

do rock que herda estilo poético-musical da MPB não tira de cena os compositores

consagrados da MPB como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria

Bethânia, Milton Nascimento, Gal Costa, Djavan, entre outros.

A MPB assume no fim dos anos de 1990 uma postura mercadológica segundo

Sandroni (2004):

Creio que a força da noção de MPB nos anos 1960/70/80 estava ligada à

confluência dos três fatores já discutidos: ela servia ao mesmo tempo

como categoria analítica (distinguindo-se da música ―erudita‖ e da

―folclórica‖), como opção ideológica e como perfil de consumo

(SANDRONI 2004, p.5).

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Desse modo podemos compreender uma ligação do perfil ideológico de

consumo de Sandroni (2004) com afirmação de Prysthon (2008, p.136) que sugere que

concorrer num Festival da canção já era necessariamente ter que assumir essa relação

com o mercado, embora nem todos os compositores naquela época reconhecessem isso.

Os festivais eram o veículo para tornar-se conhecido no Brasil, para vender discos,

enfim, para fazer parte do mercado cultural e ganhar dinheiro, sem se ter um ―objetivo‖

mercadológico claro.

Sobre a ideia de uma música mercadológica Prysthon afirma que:

A indústria cultural - tanto o seu passado como o seu presente e futuro -

é o nervo central do trabalho dos tropicalistas no final dos anos 60. Os

tropicalistas falam, principalmente, do que eles viveram e viram, vivem

e veem e esta atitude vai completamente de encontro ao caminho

tomado pela MPB da época, que buscava um Brasil ―puro‖ e

―autêntico‖, um país intocado pela influência dos meios de

comunicação e dos movimentos internacionais da contracultura (mesmo

que para falar desse) país tão ―puro‖ e ―autêntico‖, esses mesmos

artistas ocupassem o horário nobre das redes de televisão e rádio, e

obtivessem um enorme sucesso de vendas — embora nada que se

comparasse às vendagens dos rapazes e moças da Jovem Guarda, vale

lembrar. (PRYSTHON 2008, p.137).

Ainda sobre a MPB dos anos 60 e 70, Marcos Napolitano (2002, p. 50) sintetiza

de forma singular as diversas tradições estéticas, circuitos culturais e tempos históricos

que marcaram a vida cultural brasileira do século XX.

Segundo Prysthon (2008) na era dos festivais por volta de 1966 a MPB estava

dividida entre o nacionalismo exaltado e a imitação despreocupada das formas da

cultura de massas estrangeira, confrontando-se artista de uma Bossa Nova mais

sofisticada contra artistas (alguns também oriundos da Bossa Nova, mas tentando

atenuar o lado jazzístico) que escreviam letras engajadas e buscavam um som

estritamente ―brasileiro‖.

Chico Buarque de Holanda e MP4 no III FESTIVAL INTERNACIONAL DA CANÇÂO (1967)

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Para ele:

Os festivais da canção, especialmente o Festival da Música Popular

Brasileira promovido anualmente pela TV Record de São Paulo desde

1965, além de serem uma ilustração muito precisa de como se dava a

oposição entre identidade nacionale cosmopolitismo na cultura popular

brasileira naquele tempo, introduziram o rótulo MPB acrescentado de

um inusitado status: a MPB, ou MMPB (Moderna Música Popular

Brasileira, o rótulo mais corrente, aliás) seria um produto diferenciado

no contexto geral da cultura de massas, um produto direto da linguagem

musical elaborada a partir da Bossa Nova, acrescentado das letras de

protesto contra o regime militar e de ―mensagens‖ de cunho social, e

que conseguia ainda assim ter apelo popular (Prysthon 2008, p.133).

Ainda segundo Prysthon (2008), Caetano Veloso e Gilberto Gil modernizam o

universo poético da canção brasileira (MPB), propondo de maneira bem direta um

enfoque mais urbano, menos panfletário e seguramente menos maniqueísta.

Podemos compreender a importância de Caetano Veloso nesta época como

Marcos Augusto Gonçalves assim o diz:

Num momento em que a bossa nova aguava-se no sorriso e na

flor e que a MPB de raízes enveredava pela ―protestsong‖,

Caetano surge com uma letra ―nouvelle vague‖, feita de

estilhaços de imagens, adotando procedimentos da poesia e do

cinema de vanguarda para falar de um Brasil novo, mais

internacionalizado, fragmentado, moderno e mais jovem

(Gonçalves, 1997).

Pryston (2008) reflete que sob toda essa movimentação, especialmente sob o

efeito que essas canções tiveram no III festival da MPB, surgiu à necessidade da

organização de um grupo de compositores que se aglutinavam em torno de alguns

preceitos estéticos derivados da antropofagia de Oswald de Andrade, das experiências

artísticas de Hélio Oiticica nasce o movimento do Tropicalismo, que vem atualizar e

problematizar as questões mais fundamentais relativas à identidade nacional, numa

época onde estas estavam totalmente circunscritas pelo enfoque nacionalista da extrema

direita ou panfletário da esquerda, que segundo Napolitano (2002, p.45) O embate entre

tropicalistas e emepebistas provocou muitos mitos ―negativos‖ que defendiam a

abertura pop como sinônimo de ―linha evolutiva‖ da música brasileira.

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O tropicalismo segundo Favareto: ―Configurou-se como uma desarticulação das

ideologias que, nas diversas áreas artísticas, visava interpretar a realidade nacional‖.

(FAVARETO1996, p.22).

Napolitano (2002) considera o tropicalismo, após 1972, uma ―tendência‖ dentro

do sistema musical amplo da MPB, perdendo a aura de ―gênero‖ específico e

movimento anti-emepebista.

Tropicalistas: Maria Bethânia, Caitano Veloso, Elis Regina e Gilberto Gil.

Para Pryston (2008) A MPB concentrada, principalmente pela classe média

vinha expondo um confronto virtual entre o povo e a elite, vinha problematizando os

conflitos raciais que filtrava aspectos importantes da história brasileira. Reforçando a

ideia de Pryston, Marcos Napolitano afirma que:

A MPB tinha uma inspiração revolucionária e, se não fosse à repressão

política e a cooptação da indústria cultural, teria desempenhado sua

tarefa de ser a trilha sonora da revolução brasileira (NAPOLITANO

2002, p.46).

Segundo ele a ―definição‖ da MPB passava por critérios muito mais de tipo

sociocultural, implicando em tipos de audiência, reconhecimento valorativo e circuitos

sociais da cultura. Sob esta perspectiva Napolitano sugere que:

A MPB era suficientemente vigorosa e elástica para penetrar em

camadas sociais que estavam fora do seu público-padrão a MPB foi

mais popular do que supõe uma determinada memória social

(NAPOLITANO 2002, p. 50).

Para ele a MPB é marcada pela ideia de resgate da tradição musical considerada

autenticamente brasileira, marcada pela linha evolutiva dos gêneros tradicionais ―choro-

samba-bossa nova-MPB‖.

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CAPITULO 3 - MÚSICA, SOCIEDADE E POLITICA.

Alberto Ikeda (2001) mentalizando a sociedade sob óticas das incoerências

internas e externas, no campo de uma ―sociologia do conflito‖, podemos abranger o uso

da música no significado político-ideológico. Segundo ele nas afluências de

compassivos hierarquizados, tanto por partida dos hegemônicos quanto pelo curso

daqueles que resistem, a música abrange o uso politico. Quando item de elevação e

analogia classista, transportando aos métodos de dominação ideológica, como debates

motivam para atos que tendem a transformação da sociedade como da identidade e

oposição, ou tão-somente o desvelamento da realidade.

Para ele a música jazendo num campo que abrange imunidades, preferencias e

visões de uma aliança ou camadas, isto é estar no campo político, contudo sem eliminar

os demais papéis e significado da música, pautadas na estética, no repouso, à

identificação igualitária, á sociabilidade dentre outras.

Marx Gluckmann ressalta que em graus distintos permaneceremos no domínio

do poder, e da imanência das relações sociais. ―[...] Todo sistema social é um campo de

tensões, cheios de ambivalências, cooperações e lutas contrastantes. Isso é verdade tanto

para sistemas sociais relativamente estacionários - que me apraz chamar de repetitivos -

como para sistemas que mudam e se desenvolvem.‖ (Gluckmann apud Ikeda 2001,

p.06).

Para Ikeda por uma visão anti-hegemônica podemos considerar a afinidade

música e politica em dois aclives ingênuos são eles: 1º vinculadas as agitações política

constituída, muitas ocasiões na configuração de ideias partidárias; e 2º como implicação

perceptiva legitimista da sociedade, todavia resumido quanto ao nível de penetração,

deste modo, não normatizada, onde na maioria das ocasiões, a música de acepção

política brotará do acúmen intuitivo da realidade, como uma consciência política

exclusivamente potencial. Diversas vezes, observamos ainda completa consciência

política da realidade, entretanto as atuações desveladas se dão por meio de dicções

camufladas, comuns na cultura popular e em sociedades sobrepujadas por esquemas

repressivos.

Segundo ele a música ligada aos movimentos políticos será funcional ou

instrumentalmente política, transportando abertamente às ações políticas na direção,

mediadora de uma realidade exclusiva. Já como resultado perceptivo realista da

sociedade notou o aspecto constante de músicas legitimistas, denunciadoras ou

questionadoras, nas formas culturais diárias dos vários grupos humanos, como o

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exemplo do Coco de roda. Equivale a então referencialmente políticas já desligadas das

ações políticas programáticas.

Assim, estabelecer que a música que oferece ao gozo estético-intelectivo ou que

necessitará adotar determinadas propriedades cultiva para servir, por exemplo, a um

cerimonial místico, ou, ainda, desapreciar a música de determinado fragmento social

será evidentemente uma ação de posse, ou poder de enunciar, que apropriado, estará

secundado de acordo com a ideologia.

Neste caso, podemos concordar com Pierre Clastres, que afirma:

Se o poder político não é uma necessidade inerente à natureza humana,

isto é, ao homem como ser natural (e nisso Nietzsche se engana), em

troca ele é uma necessidade inerente à vida social. Podemos pensar o

político sem a violência, mas não podemos pensar o social sem o

político, em outros termos, não existe sociedade sem poder

(CLASTRES apud IKEDA 2001, p.07).

Ikeda (2001) relata que no caso da música, por seu caráter polissêmico, mutável

em cada situação e período, o seu modo na fabricação de sentidos emblemáticos se

comete de pose bastante decidida, tanto que em todas as sociedades, em ocasiões

formidáveis, ela se faz atual: nas solenidades, nas festividades, nos rituais religiosos ou

mágicos, nos processos revolucionários e outros. Em cada circunstância, calhada ao

evento perpetrado, de modo que estabeleça significados acrescentados, edificados na

história conveniente de cada sociedade.

No entanto, na esfera musical se compreende que muito nas falas arquitetadas e

ideológicas, incluída na música dominantemente ao prazer estético, à fruição

descompromissada, de tal maneira que a própria musicologia, em muitas ocasiões, não

vai longe de uma visão estilhaçada do prodígio musical, com base no aspecto estético.

Nesse aspecto, referindo-se aos compositores (propriamente os eruditos).

Arnaldo Daraya Contier expõe:

Em geral, os compositores procuram negar quaisquer discussões sobre

as possíveis conexões entre música e política, alegando que os sons

simbolizam somente alegria, tristeza, liberdade, prazer, em suma,

encara a música como um fator abstrato e isolado como uma arte que

dialoga consegue mesma. Mas, como vimos à música, ao longo da

História, prendeu-se aos mais diversos sistemas políticos [...].

(CONTIER APUD IKEDA 2001, p.08).

Segundo Ikeda (2001) a música não apresentará, apenas atitudes e fruições, mas

expressão, muitas vezes subjacentes, que esclarecerão melhor os métodos ativos da

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concretização harmônica na espécie humana. De tal modo, por exemplo, em uma parada

militar as marchas (o gênero musical) não estarão exclusivamente ao emprego do

desfile cadenciado dos soldados. Além disso, serão ligados no afixo e na música toda

uma simbologia de domínio, preparo, categoria e coragem que simulam não tão-

somente a composição interior da música, mas ainda a alternativa do movimento, da

instrumentação e outros fatores. Ainda segundo Ikeda em um desfile de escola de

samba esse elementos constituirão outros os significados, apesar de que a ideia seja a

mesma uma atitude de desfilar e se exibir.

Deste modo para ele, tanto na área da música estudada como forma de sanção e

conservação dos aparelhos dominantes, quão nos questionamentos destes estaremos,

dialeticamente, no campo do político e do ideológico.

Em concordância a essas ideologias em 1970 para Napolitano (2002), a MPB se

se consolidou como a formação de ideias musicais de nação idealizados por uma cultura

politica influenciado por uma ideologia nacional popular, onde ajudou a consolidá-la

como espaço de resistência cultural e politica, após a repressão se abater sobre seus

artistas.

Segundo Napolitano (2002),

A ideia de participação politica na MPB assumia diversas formas e

todas estavam sujeitas ao controle da censura: crônicas sociais,

mensagens de protesto político e construção de tipos populares que

expressem os valores do nacionalismo de esquerda. (NAPOLITANO

2002, p.4).

Que Logo acarretou na perspectiva da política da ―descompressão‖ do regime

militar que estabelecia certa tolerância perante o consumo da cultura de protesto.

Macha da Família com Deus pela liberdade (1964)

Mesmo após o retorno do exílio de grandes nomes da MPB entre 1971 e 1972

como, Chico Buarque e Caetano Veloso a censura e repressão política eram intensas,

todavia a sua dinamização politicas sob o aturado domínio do regime, designava uma

atmosfera favorável ao consumo de obras culturais avaliados como ―críticos‖, visto

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como modo de protesto, em si exercia um respeitável papel na articulação dos

procedimentos públicos e privados dos cidadãos contrários ao regime militar.

Segundo ele em 1976,

Consolidada como uma verdadeira instituição sociocultural, a

MPB delimitava espaços culturais, hierarquias de gosto,

expressava posições politicas, ao mesmo tempo em que

funcionava como uma peça central da indústria fonográfica.

(NAPOLITANO 2002, p.9).

Ainda segundo ele, através dos tempos a música vem sendo utilizada como

objeto para análise histórica, seja como recurso didático ou na produção cultural,

provocando de forma coletiva mudanças no meio social assim como no comportamento

mais íntimo dos seres. Deste modo faz se necessário apontar uma análise dos enigmas

teóricos metodológicos e sistematizar metodologias fundamentais que guiem o

pesquisador a realizar um estudo fértil e estimulante sobre documento-musical. Todo

pesquisador em música popular precisa esclarecer os diversos sentidos encravados na

linguagem musical, identificando as suas formas de inserção na sociedade e na história,

fugindo, das facilitações e mecanicismos indutivos que podem desvirtuar o caráter

polissêmico de qualquer documento de natureza estética.

Primeiramente devemos entender todo processo como parte da história cultural,

por isso será importante fundamentar nosso trabalho nos estudos desenvolvidos por

Roger Chatier sobre a nova história cultural, mas especificamente no que diz respeito às

―práticas‖ e ―representações‖, pois, em sua fidelidade crítica à historia cultural dos

anales, e no intuito de compreender as práticas que constroem o mundo como

representações, ele menciona o seguinte:

A história cultural, tal como entendemos, tem por principal

objeto identificar o modo como diferentes lugares e momentos

uma determinada realidade social é construída, pensada, dada a

ler. [...] As representações do mundo sociais assim construídas,

embora aspirem a universalidade de um diagnostico fundado na

razão são sempre determinadas pelos interesses do grupo que as

forjam. [...], [...] As lutas de representações têm tanta

importância como as lutas econômicas para compreender os

mecanismos pelos quais um grupo impõe, ou tenta impor a sua

concepção do mundo social, os valores que são o seu domínio

(CHARTIER1990, p. 16-17).

Napolitano ainda explica que devemos,

Tomamos como base para estes apontamentos o artigo de Arnaldo

Contier, ―O nacional e o popular na canção de protesto‖ (CONTIER,

1998), no qual o autor sugere alguns pontos de reflexão que podem ser

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vistos como a base para uma discussão teórico-metodológica mais

ampla. (NAPOLITANO 2002, p.54).

A partir desta compreensão, é possível levantar questões sobre a história da

musica que discorra com estudos culturais, que sirva como alicerce para abordagens e

modelos analíticos (de áreas como a semiótica, a linguística, a musicologia e a

sociologia). Napolitano (2002) afirma que o pesquisador precisa descrever a

composição total do elemento musical entre o texto e contexto, que abrange dados de

caráter distintos e que devem ser proferidos ao extenso da apreciação.

Neste sentido como ponto de partida, em uma abordagem dos estudos culturais

devemos levar em conta uma ―quadrupla natureza‖ do fazer musical: o Musical, verbal,

social e histórico.

Napolitano afirma que:

O grande compositor de canções é aquele que consegue passar para o

ouvinte uma perfeita articulação entre os parâmetros verbais e musicais

de sua obra, fazendo fluir a palavra cantada, como se tivessem nascido

juntos (NAPOLITANO 2002, p. 55).

Trazendo essa afirmação para uma perspectiva dos estudos culturais, saliento

que o grande compositor ou pesquisador, devera articular a sua pesquisa ou obra de

forma que retrate o contexto social histórico da época assim como os elementos

musicais e verbais deste determinado tempo, fazendo (res) nascer uma cultura (a)

temporal, chegando ao ouvinte através das implicações de ambientes socioculturais,

valores e expectativas político-ideológicas, e situações específicas de audição.

Entretanto Napolitano ressalta que a recepção cultural e a historia cultural da

música tem sido um dos grandes desafios dos estudos culturais, pela diacronia que

provoca a impossibilidade de ―reconstituir‖ ou mapear a experiência cultural dos

atuantes que tomaram parte no processo estudado.

Uma vez que a estas situações são apresentadas a melhor abordagem a ser

tomada é a pesquisa quantitativa, revendo a perspectiva clássica sobre a esfera da

musica popular.

Para melhor entendimento tomemos o exemplo à citação de Napolitano:

Quando a cantora Elis Regina apareceu para o grande público

com sua voz expressiva e potente, por volta de 1965, causou certo

horror nos círculos bossa novistas mais radicais, pois ela não só

revelava outro leque de escutas pessoais (por exemplo, a influência do

bolero dos anos 50), mas seu surgimento numa mídia específica

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(―televisão‖), e, ao mesmo tempo, reclamando para si a tradição da

―bossa‖, abalou toda a estrutura de audiência da música popular

―moderna‖ no Brasil. Seu sucesso significou uma verdadeira ampliação

do público de música brasileira ―moderna‖, na medida em que suas

canções e sua performance trouxeram novos segmentos socioculturais,

cujo gosto musical não havia sofrido, ao menos de maneira profunda, o

impacto da bossa nova. (NAPOLITANO 2002, p.56-57).

Este momento é considerado o ponto de transfiguração da musica moderna brasileira

que resulta no nascimento da MPB, que no final dos anos 60 configura-se numa apropriada

instituição cultural brasileira.

Para Napolitano (2002), um dos pontos mais polêmicos da discursão teórico-

metodológica no estudo musical, que englobam tanto a musica erudita quanto a popular

é o elemento de performance. Que segundo ele,

A música, enquanto escritura, notação de partitura, encerra uma

prescrição, rígida no caso das peças eruditas, para orientar a

performance. Mas a experiência musical só ocorre quando a música é

interpretada. Para a evolução da linguagem da música erudita, a

padronização da notação musical e a organização das regras de

composição foram fundamentais na constituição de novas formas e

experiências musicais, consagrando a importância da partitura como

veículo de divulgação das obras musicais. Mas a obra musical

apresentada na forma de uma partitura ainda assim não tem autonomia,

apesar de traduzir a sofisticada racionalização da linguagem musical

(WEBER, 1995). A partitura é apenas um mapa, um guia para a

experiência musical significativa, proporcionada pela interpretação e

pela audição da obra (NAPOLITANO 2002, p.57).

Porém,

No caso da música popular, o registro fonográfico se coloca

como o eixo central das abordagens críticas, principalmente porque a

liberdade do performer (cantor, arranjador ou instrumentista) em

relação à notação básica da partitura é muito grande. (NAPOLITANO

2002, p.58).

Dessa forma podemos entender melhor os trabalhos de Gilberto Vasconcelos,

que teve o mérito de sintetizar a importância política que a música popular teve nos anos 70,

sendo um foco de resistência cultural significativo e reconhecido.

Podemos dizer que durante toda a ditadura militar no Brasil ocorreu uma espécie

de luta de representações, na medida em que os militares a todo tempo impunham o seu

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domínio, os seus valores e a sua concepção do mundo social. Ou seja, de um Brasil

representado como democrático como ―democrático‖ politicamente e sem problemas

sociais, ao mesmo tempo em que silenciam através da censura oficial do estado, as

letras de canções de contestações política e social que representam justamente o

contrário do que eles propunham.

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CAPITULO 4 – MÚSICA POLITICAMENTE ENGAJADA, PÓS-BOSSA NOVA

Napolitano (2014) afirma que no começo dos anos 1960, tanto a Bossa Nova

politizada, feita por artista por artistas como Carlos Lyra, Sérgio Ricardo ou Nara Leão,

quanto o cinema novo de Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos e Ruy Guerra

promoveram o reencontro entre o engajamento, pesquisa estética, cultura popular e

nacionalismo. Segundo ele:

O ano de 1962, particularmente para vida rica cultural brasileira, com a

confirmação da Bossa Nova como modelo de nossa moderna canção

engajada, e a formalização do cinema novo como grupo e com a

formação do Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional dos

Estudantes (UNE) (NAPOLITANO 2014, p.20).

Manifesto no Centro Popular da Cultura

Para Marcos Napolitano (2014), os caminhos para um jovem artista engajado era

delineados pelo texto-base do manifesto do Centro Popular da Cultura (CPC), que

tentava disciplinar a criação, apontando preceitos estéticos e posturas ideológicas.

Que para a enciclopédia Itaú Cultural,

O CPC é criado em 1961, no Rio de Janeiro, ligado à União Nacional de

Estudantes - UNE, e reúne artistas de distintas procedências: teatro,

música, cinema, literatura, artes plásticas etc. O eixo do projeto do CPC

se define pela tentativa de construção de uma "cultura nacional, popular

e democrática", por meio da conscientização das classes populares. A

ideia norteadora do projeto diz respeito à noção de "arte popular

revolucionária", concebida como instrumento privilegiado da revolução

social. A defesa do caráter coletivo e didático da obra de arte, e do papel

engajado e militante do artista, impulsiona uma série de iniciativas: a

encenação de peças de teatro em portas de fábricas, favelas e sindicatos;

a publicação de cadernos de poesia vendidos a preços populares; a

realização pioneira de filmes autofinanciados. O engajamento cepecista

encontra-se sistematizado no Anteprojeto do Manifesto do Centro

Popular de Cultura, de autoria do sociólogo Carlos Estevam Martins

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(1962), primeiro diretor do CPC. O documento postula o engajamento

do artista frente ao quadro político e cultural do país no período e faz o

diagnóstico da impossibilidade de uma arte popular fora da política. De

acordo com o Anteprojeto, a arte do povo é "de ingênua consciência",

"desprovida de qualidade artística e de pretensões culturais", não

tem outra função, senão "a de satisfazer necessidades lúdicas e de

ornamento". Ao definir a arte como um dos instrumentos para a tomada

do poder e o artista como aquele que assume um compromisso, ao lado

do povo, o CPC defende um "laborioso esforço de adestramento à

sintaxe das massas", mas de modo a tirá-las de seu lugar de alienação e

submissão (Itaú Cultural, ?).

Sobre perspicácia do ―Nacional-Popular‖, sendo esta uma a expressão que

designava, ao mesmo tempo, uma cultura política e uma política cultural das esquerdas,

que não deveria ser confundida nem com o regional folclorizado (representação de parte

da nação), nem com padrões universais da cultura humanista (vivência da cultura

burguesa ilustrada), ajudaria a construir a autêntica cultura nacional, cuja tarefa

principal era estimular a conscientização em prol da emancipação da nação diante dos

usurpadores. Outra inciativa cultural do CPC foi:

A série de cadernos poéticos chamados Violão de Rua, nos quais eram

reproduzidos poemas engajados e, às vezes, didáticos tentando ensinar o

povo a fazer ―politica‖ e desenvolver uma consciência nacional

libertadora (NAOLITANO 2014, p.22).

Napolitano (2007) destaca que o jovem artista engajado, nacionalista e de

esquerda queria estar apto a produzir uma arte que fosse nacionalista e cosmopolita,

politizada e intimista, comunicativa e expressiva, rompendo inclusive, os limites

propostos pelo manifesto do CPC. Que segundo o Itaú cultural,

As classes médias - sobretudo intelectuais e estudantes - estão presentes

nos partidos políticos (o Partido Comunista Brasileiro - PCB ocupa

lugar de destaque no quadro cultural da época e atrai formadores de

opinião, como jornalistas, artistas e profissionais liberais em geral) e em

entidades como a própria UNE. A militância política e o engajamento

cultural andam de mãos dadas: os temas do debate político ecoam

diretamente nas produções artístico-culturais (Itaú Cultural, ?).

Já segundo Napolitano (2014) em 1962, os jovens intelectuais do movimento

estudantil tentavam incorporar a Bossa Nova como uma base legítima da música

engajada. Onde o manifesto insistia que ―ser povo‖ era uma questão de opção,

obrigatória ao artísta com a libertação nacional. Entretanto Carlos Lyra não concordava

com essa ideologia conforme suas próprias palavras: ―Eu, Carlos Lyra, sou de classe

média e não pretendo fazer arte do povo, pretendo fazer aquilo que eu faço [...] faço

Bossa nova, faço teatro [...] a minha música por mais que eu pretenda que ela seja

politizada, nunca será uma música do povo‖. Para ele o que sintetiza esta ideia é:

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Dois álbuns fonográficos se destacam como sínteses criativas que

procuram objetivar este projeto estético ideológico, na forma de

composição, intepretação e seleção de repertório. Depois do carnaval,

de Carlos Lyra (Philips, 1963), e um senhor de talento, de Sérgio

Ricardo (Elenco, 1963). A tentativa de estabelecer as bases estéticas e

ideológicas de bossa nova ―nacionalista‖ que correspondesse às

expectativas da juventudede esquerda que se engajava no processo de

reformas de base do governo Jango, encontrou nesses dois álbuns sua

expressão mais delineada (NAPOLITANO 2007, p.78).

Nas perspectivas de Carlos Lyra, Sérgio Ricardo, Nelson Lins e Barros, Vinicius

de Moraes entre outros:

A ideologia nacionalista era um projeto de um setor da elite que, em

médio prazo, poderia beneficiar a sociedade como um todo, e a ―subida

ao morro‖ visava muito mais ampliar as possibilidades de expressão e

comunicação da música popular renovada do que imitar a música das

classes populares (NAPOLITANO 2014, p.23).

Lyra (à esquerda), o produtor Aloysio de Oliveira, Nara Leão e Vinicius de Moraes.

Para Napolitano (2007) a canção engajada trazia em si as contradições da

modernização dependendo do capitalismo internacional monopolista, estando

intimamente ligado ao padrão sonoro imposto pela gravadora Elenco, de Aluísio de

Oliveira, transcrito em partes pela Philips. O mesmo autor revela que o circuito

universitário paulistas entranhar-se na busca da fusão entre a bossa nova nacionalista e a

tradição do samba. Segundo ele o circuito era:

Mais do que simples performances artísticas, os espetáculos

demarcavam um espaço de expressão e sociabilidade, no qual a música

era amálgama de uma identidade moderna, jovem e engajada. Por tanto,

tais expressões eram tão ―politicas‖ quanto às letras das canções de

protesto mais explícitas. (NAPOLITANO 2007, p.83).

As ―Artes de espetáculo‖ ou as ―artes performáticas‖ são apontadas por

Napolitano (2007) como responsável pela popularização da cultura engajada e

nacionalista, como contragolpe ao regime militar. Com a necessidade de atingir o

publico massivo a cultura engajada tinha expectativa que o sucesso fizessem os artistas

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reencontrarem a fórmula pura do povo, onde o teatro teve um papel importante na

cultura engajada mesmo após o surgimento da televisão no campo musical. Para ele:

A musica popular é tanto mais expressiva quanto tem uma opinião,

quando se aleia ao povo na captação de novos sentimentos e valores

necessários para a evolução social, além disso, outra proposta declara

―manter vivas as tradições de unidade e integração nacionais [...] O

sertão nordestino e o morro/ subúrbio carioca simbolizavam não só

territórios da ―autentica brasilidade‖, mas espaço imaginário de

resistência ―popular‖ ao novo contexto autoritário, meio aos quais a

juventude estudantil engajada deveria buscar suas referências.

.(NAPOLITANO 2007, p.84-85).

Dessa forma a canção engajada pré-golpe caracterizava-se pela tentativa de

adaptar-se entre sofisticação estética e pedagogia política em busca de uma obra cultural

de alto grau, para que o objeto popular oferecesse sentido ao pátrio.

Marcos Napolitano (2007) diz que os shows musicais de teatro apontaram a

procura ilusória da analogia popular mais simples possível, que nortearam a postura do

intelectual nacionalista e que o obras como Opinião e Arena conta zumbi:

Tiveram uma função catártica em relação à frustação politica, pela

manipulação da emoção e do riso. Acabaram por configurar um espaço

cultural que aglutinou uma da sociedade na resistência ao golpe: o

jovem intelectualizado de classe construir uma comunidade de valores

que reforçava sua vontade de resistir. Aliás, esse aspecto identitário

parece estar presente na música e nos espetáculos engajados de outros

países, como Estados Unidos, onde a música folk, sobretudo, teve um

papel importante na configuração de uma identidade politica nos grupos

que lutavam pelos direitos civis no começo dos anos

1960.(NAPOLITANO 2007, p.87).

A música além da música – Nara Leão » Zé Keti e Nara Leão no show Opinião (1964).

Para Napolitano (2007) com a transferência de audiência do radio para TV a

partir de meados 1960, o conjunto de experiências e demandas musicais, oriundas da

―antiga‖ música popular do radio que tinha suas bases em uma tradição de samba de

morro (samba canção, bolero e marchas de carnaval), passou a ter relação com uma

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música popular veiculada a um esforço global de modernização e engajamento. Ainda

segundo o mesmo autor.

O resultado, de caráter hibrido, marcou a linguagem de certos

programas musicais dos anos 1960: ora semelhantes a um baile de

formatura de colegiais, ora semelhante a um concerto sofisticados, ora

próximos de uma performance teatral engajada.(NAPOLITANO 2007,

p.88)

Segundo ele atravessando linguagens características da fase semi-artesanal da

televisão com estratégias de acesso e atuações altamente elaboradas, o fino da bossa

proferiu um novo sentido conceito para a MPB, no qual elementos da reminiscência do

samba e da pretensão de ruptura bossa-novista miscigenar a aliciação cultural e política.

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CAPITULO 5 – DITADURA MILITAR: O QUE FOI E COMO SE DEU O

SISTEMA GERAL DE CENSURA E REPRESSÃO ÀS ARTES

Em março de 1964 o clima é de muita agitação no país, suas grandes

manifestações populares refletem nas ruas a polarização ideológica, sendo uma de

esquerda e outra de direita, que apresentavam oscilações populares de ambos os lados,

que se acredita conterem financiamentos estrangeiros. Além da polarização, havia

igualmente um intenso sentimento antigetulista, motivador do movimento militar que

derrubou Jango. Que Segundo a enciclopédia virtual Wikipédia:

Para análise do Centro de Pesquisa e Documentação de História

Contemporânea do Brasil e a Escola de Ciências Sociais da Fundação

Getúlio Vargas CPDOC-FGV, havia fatores históricos que

posicionavam as Forças Armadas do Brasil contra o comunismo,

acentuando a polarização ideológica no Brasil. A percepção de um

"perigo comunista" no Brasil passou por um processo de crescente

"concretização", até atingir seu clímax com a Revolta de 1935. Assim,

após a Revolução Russa de 1917, tiveram lugar no país a criação do

Partido Comunista do Brasil (depois Partido Comunista Brasileiro –

PCB) em 1922; a conversão do líder tenentista Luís Carlos

Prestes ao comunismo, em maio de 1930, e sua ida para a União

Soviética, no ano seguinte; e o surgimento, em março de 1935,

da Aliança Nacional Libertadora, dominada pelos comunistas. Se em

1917 o comunismo no Brasil era visto ainda como um perigo remoto,

"alienígena" e "exótico", aos poucos ele foi se tornando mais próximo.

A frustrada revolta comunista de novembro de 1935 foi um evento-

chave que desencadeou um processo de institucionalização

da ideologia anticomunista no interior das Forças Armadas. Os

comunistas brasileiros foram acusados de serem elementos "a serviço de

Moscou" e, portanto, traidores da Pátria. Os militares que tomaram

parte na revolta foram, em particular, acusados de uma dupla traição:

não só do país como da própria instituição militar, ferida em seus dois

pilares — a hierarquia e a disciplina. Foram também rotulados de

covardes, devido principalmente à acusação, até hoje controversa, de

que no levante do Rio teriam assassinado colegas de farda ainda

dormindo. O ritual de rememoração dos mortos leais ao governo,

repetido a cada ano, tornava seu sacrifício presente, renovava os votos

dos militares contra o comunismo e socializava as novas gerações nesse

mesmo espírito. Foi no quadro dessa cultura institucional,

marcadamente anticomunista, que se viveu a ditadura do Estado Novo e

que se formaram os militares que, em 1964, assumiram o poder.

(WIKIPÉDIA,?).

Sob a forte pregação moralista e nacionalista do Diretório Nacional (DN) que

contaminava as forças armadas, a tomada do poder pelos militares em 1964 é

consumação de um processo golpista que vem desde 1954. O golpe de 1964 foi

arquitetado e comandado a distância pelo departamento de estado americano, que tinha

a preocupação que o governo brasileiro toma-se o mesmo caminho que Cuba. O Brasil

no século XX, particularmente dos anos 1930 até 1960 viveu uma experiência muito

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significativa de impulso econômico sob o governo JK que, desnacionalizou o principal

sistema produtivo do país, a indústria automobilística modificando o padrão de

investimento assim como o tipo de consumo. As disputas de poder entre 1963 e 1964

realizam-se após o Brasil atingir um patamar de industrialização substitutivo da

economia da produção das matérias primas.

Entretanto, para poder dar o próximo passo teria se que possuir uma poupança

admirável, que poderia ser obtida via estado, é assim constituindo uma economia

estatizada nacionalista, ou via capital estrangeiro, que resulta na ligação da economia

brasileira com a economia internacional.

Apontava-se na década de 1960 fatos de corrupção, inclusive na construção de

Brasília que não se comprovaram. Entretanto é oportuno observa que o Jânio Quadros

tirou muito proveito dessa situação na campanha, inclusive com o jingles ―varre, varre

vassourinha‖, que segundo ele varia os escândalos do governo JK, isso lhe determinou a

vitória em outubro contra o marechal Lott, tendo como seu vice João Goulart.

Vassoura e Jânio Quadros

Quando assume a presidência Jânio Quadros herda um país em crise financeira,

devido a política desenvolvimentista de JK, que trouxe o otimismo, mas deixou como

saldo a inflação em alta. Para solucionar o problema Jânio Quadros tinha uma receita

ortodoxa que era renegociar a dívida, desvalorizar a moeda e cortar subsidio. Entretanto

no congresso, a oposição que era a maioria, e não apoiar o presidente desencadeando a

sua renuncia.

Para o sociólogo Emir Sader,

A renuncia do governo de Jânio Quadros e um elo numa cadeia que

levou, da fundação da escola superior de guerra ao golpe de 1964. Na

volta dos militares brasileiros da segunda guerra mundial eles vieram

engolidos dos projetos norte americano de democracia, no marco da

guerra fria. Fundaram a escola superior de guerra, assumiram a doutrina

de segurança nacional e começaram a ter um projeto alternativo daquilo

que era democracia politica no Brasil da época. Passou pela tentativa de

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derruba Getúlio Vargas, de impedir a posse de Juscelino na eleição de

1955, tentativas de golpes menores no governo JK e por último a

tentativa de impedir que com a renuncia de Jânio, João Goulart tomasse

posse.(SADER?).

Jânio Quadros renuncia em 1961, deixando o cargo ao seu vice-presidente João

Goulart, que tinha novas ideias de reforma sociais e econômicas. Que, De acordo com

Da Costa e Sergl (2007),

[o] governo de Goulart é marcado pelo agravamento da crise econômica

e pela intensa vida política, bem como pelos conflitos sociais e políticos

no país. Diante disso, alegando combater a subversão e assegurar a

ordem democrática, os militares tomam o poder na noite de 1 de abril de

1964 (COSTA; SERGL, 2007, p.35-36).

O Brasil passa por um conflito onde os ministros militares exigem um manifesto

contra a posse de Jango, a solução para toda a crise sai do congresso nacional, onde os

parlamentares aprovam uma ementa constitucional que estabelece o parlamentarismo,

que duraria apenas um ano e quatro meses.

O parlamentarismo, entretanto é apenas um golpe de estado onde João Goulart

assume a presidência em 07 de setembro de 1961 duas semanas após a renuncia de

Jânio quadros.

Com a ideia política de que a democracia deveria ser restaurada, em janeiro de

1963 um plebiscito decide pela volta do presidencialismo, que segundo o deputado

Artur da Távola,

O presidencialismo é o regime de golpe, é a véspera do golpe, por que o

presidencialismo concentra o excesso de poder nas mãos de uma

pessoa, e dessa forma não se tem remédio para as crises, se o Brasil

tivesse mantido o parlamentarismo naquela época, não teria entrado o

movimento militar. (TÁVOLA?).

O golpe militar de 31 de março de 1964 ocorreu após um período de 21 anos de

democracia. Nesse período pré-1964, materializar-se no país um pensamento igualitário

de opinião esquerdista presente em boas partes das atividades culturais e artísticas

nacionais.

Para Napolitano (2014) a partir de outubro de 1963, o colapso político engrossou

a conspiração que já derivava de um extenso período, transformando a anormalidade em

impasse institucional. Ele aponta alguns fatores que desnortearam o governo de Jango

desembocando no golpe de 1964.

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As derrotas nas batalhas parlamentares de 1963 pelas reformas

pactuadas no congresso e pela retomada das rédeas da economia

nacional parecem ter deixado o governo Jango um tanto desnorteado.

Pressionado à esquerda e a direita, o presidente viu suas margens de

manobra diminuírem. Em setembro, antes mesmo de o ultimo projeto de

reforma agrária ser derrotado no congresso, começava a crise politico-

militar que desgastaria o governo e o próprio regime ao longo dos

meses seguintes. (NAPOLITANO 2014, p.44).

Napolitano (2014) observa que o golpe se deu início quando a policia paulista,

sob a autoridade do conjurado de Aldhemar de Barros, concretizou centenas de cárceres

em uma reunião sindical. Como resposta, a CGT ameaçou com uma paralisação geral.

Após a intervenção do exército no dia 5 de setembro contendo a ação grevista, podia-se

compreender o exercito como uma instituição que talvez ampara-se uma reforma,

todavia sem intervenção da classe operaria. Em 12 de setembro de 1963 os

insubordinados assumem de abalroamento a base aérea, o agrupamento de fuzileiros

navais, o ministério da marinha, o serviço de radiofonia do departamento federal de

segurança pública e a central telefônica, bloqueando as principais estradas de acesso a

Brasília e o aeroporto civil, mesmo após toda essa agitação ser contida, estes

acontecimentos podem ser entendidos como a constituição da ampla coalização

antigovernista, adensando a conspiração que desembocaria no golpe civil-militar.

Segundo Napolitano (2014) o discurso antigovernamentista e antirreformista

difundido metodicamente pelos jornalistas a partir do final de 1963, serviu para

disfarçar antigos interesses, a propósito dos grandes donos de terras que se sentiam

advertidos pelos discursos de reforma agrária, ou pelos interesses multinacionais os

quais pressentiam ameaçados pelo nacionalismo econômico das esquerdas trabalhista e

comunista. Entretanto para se explicar um provável golpe de direita lançar-se a ideia de

um golpe da esquerda em gestão, a direita conspirativa, isolada 1961, passa a ganhar

autoridade e terreno disseminando a questão do ―golpe preventivo‖. O fracasso das

transações parlamentares para implantar a regulada reforma agrária sugerida pelo

governo ao longo de 1963 reforçou o assunto de uma ―reforma via Poder Executivo‖.

Marcos napolitano ainda esclarece que:

A historiografia tem afirmado, com certa razão, que os reformistas e as

esquerdas em geral não foram meras vitimas da historia e de golpistas

maquiavélicos. Estes se alimentaram dos erros e indecisões daqueles.

Mas por erros políticos e o discurso radical das esquerdas, muitas vezes

sem base social real para realizar-se, não devem encobrir um fato

essencial: o golpe de estado foi um projeto de tomada do poder –

complexo errático e multifacetado, é verdade, mas ainda assim um

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projeto. Nos primeiros meses de 1964, o ato final começou a se

desenhar para ambas as partes. Reformistas e antirreformistas foram à

luta. A batalha da politica saia das instituições tradicionais e dos

pequenos círculos do poder para ocupar as ruas. À esquerda e à direita.

A primeira mais experiente neste tipo de batalha parecia levar a melhor.

Mas a segunda não ficaria em casa, como mera expectadora.

(NAPOLITANO 2014, p.53).

A peleja das ruas foi se acirrando onde os grupos ideológicos apostaram suas

fichas em campanhas de comícios e panfletagem enfatizando a necessidade de garantir

as reformas de base, sobretudo à reforma agrária e defender as liberdades democráticas,

adotando uma estratégia de ocupar as ruas.

João Belchior Marques Goulart Jango

Com o apoio da massa contra o governo Goulart e as ruas que protestavam

contra as reformas de bases, o general Castelo Branco em uma nota reservada deixava

claro a advertência ao governo sendo esta o ingresso para o golpe, mesmo que seu

promotor ainda titubeasse em assumi-lo de maneira proativa.

São evidentes duas ameaças: o advento de uma constituinte como

caminha para a consecução das reformas de base e o desencadeamento

em maior escala de agitações generalizadas do ilegal poder do CGT.

[...] A ambicionada constituinte é um objetivo revolucionário pela

violência com o fechamento do atual congresso e a instituição ditadura.

[...] È preciso ai perseverar, sempre ―dentro dos limites da lei‖. Estar

pronto ara a defesa da legalidade, a saber, pelo funcionamento integral

dos três poderes constitucionais e pela aplicação das leis, inclusive as

que asseguram o processo eleitoral, e contra a calamidade e pública a

ser promovida pelo CGT e contra o desvirtuamento do papel histórico

das forças armadas. (NAPOLITANO 2014, p.57).

Dessa maneira Marcos Napolitano (2014) compreende como sendo ―ilegal o

poder‖ do CGT e a ―ambicionada‖ constituinte como passos para uma ditadura

―sindico-comunista‖ ou autogolpe de Goulart.

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Em 31 de março 1964 tem início o movimento que põem fim ao regime

democrático, estalado no país desde final do estado novo de Getúlio Vargas, os militares

ficariam 21 anos no poder.

Walace Rodrigues (2012) relata que no Brasil, a ocasião mais autoritária da

ditadura brasileira adveio depois da criação do Ato Institucional número 5 (AI-5), em 13

de dezembro de 1968, que suspendia todos os direitos civis dos cidadãos. A aprovação

deste ato para a vida cultural brasileira naquele momento mudaria o rumo com uma

forte influência da censura pública sobre todos os campos das artes.

As manifestações artísticas contra a ditadura militar, principalmente na área da

criação musical, cinematográfica e plástica, tinham atitudes de contestação refletidas em

noções de vazio e impossibilidade suscitadas pela ditadura militar, que em controvérsia

foi a contestada e censurada pelo estado militar.

Para Walace Rodrigues (2012) a partir do AI-5 a classe artística começa a

intensificar os ―ataques culturais‖ contra a ditadura. As obras de teatro, cinema, música,

artes plásticas, entre outras, são divididas entre as que protestam contra o regime e as

que apoiam o regime. A Classe artística politizada protestava em suas obras, utilizando

um discurso de contestação, enquanto outros artistas instauravam um discurso de

alienação social. Para esse autor:

Os militares brasileiros que estavam no poder foram responsáveis por

mortes, exílios, prisões, torturas e desaparições que não seriam

permitidas se não estivessem dentro de um estado de exceção, que, de

alguma maneira, lhes dava poderes bastante para cometer essas

atrocidades. A Delegacia de Ordem Política e Social (Dops) foi o órgão

responsável pela repressão de vários artistas e intelectuais dentro deste

estado de exceção caracterizado aqui como ditadura militar, que afetou

profundamente a vida artística brasileira. (RODRIGUES 2012, p.104).

Na área cultural podemos compreender que a violência se deu por meio da

censura. A música se torna a melhor forma de manifestação contra o regime, centenas

de letras deixaram de ser conhecidas pelo público e muitas sofreram cortes ou foram

alteram pelos seus próprios compositores para driblar a ditadura.

A divisão de censura de diversões públicas conhecidas como DCDP, era o órgão

responsável pela censura prévia, a letras musicais de todos e qualquer artistas. A ex-

censora Odete Martins explica como era atuação do órgão: ―a gente fazia censura de

acordo com as instruções recebida pelas autoridades emanadas de Brasília‖. Dona Odete

lembra de mais dos temas que preocupavam a censura: ― época mandavam atentar mais

sobre a política, época mandavam mais sobre as drogas, outras época mandavam atentar

mais sobre os bons costumes‖.

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Em setembro de 1968 o compositor Geraldo Vandré participa do III FESTIVAL

INTERNACIONAL DA CANÇÃO (FIC), com a música Para Não Dizer Que Não

Falei das Flores que ser torna hino da contestação dos jovens Brasileiros. A música é

proibida de ser veiculada, e Vandré se se torna um dos primeiros artistas a ser

persseguido pela a ditadura militar, a música que também é conhecida como

―Caminhando‖, seria apenas o começo de uma serie de canções censuradas que iria

atingir outros artistas da MPB, entre eles Chico Buarque de Holanda que em suas letras

deixava claro o descontentamento com a ditadura militar. Entre a sua vasta lista de

canções podemos aqui dar destacar: Apesar de Você, que é considerada um marco do

período, logo após é vetada com a suposição de duplo sentido; outra famosa canção de

Chico Cálice, que a principio dribla a censura, mas logo após sua veiculação é vetada.

Geraldo Vandré ―Pra não dizer que não falei das flores" no III Festival Internacional da Canção, no Maracanãzinho (1968)

A caneta da censura não poupou ninguém os artistas populares tachados como

brega também foram vítimas dos censores. Odair José é um exemplo de cantor

censurado, polêmico em suas letras que tratavam de temas como prostituição e exclusão

social, o artista goiano teve que se explicar para que algumas de suas canções pudessem

ser veiculadas. O problema com ele não era pelas letras políticas, até por que não era

seu forte, mas por questões morais. Autor de grandes sucessos da música brasileira Luiz

Ayrão, foi outro que teve problemas com os militares. Em resposta descontraída a

canção Ao Meu Caro Amigo de Chico Buarque, o compositor incomodou a censura com

a sua canção Meu Caro amigo Chico.

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Um dos maiores sucessos de João Bosco e Aldir Blanc, Mestre Sala dos Mares

foi gravado inicialmente como o nome Almirante Negro, como se vê a censura além de

agir por razões políticas e morais, também era discriminatória e preconceituosa.

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CAPITULO 6 – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A CENSURA E

REPRESSÃO AS ARTES NA CIDADE DO NATAL

Utilizando-se de abordagens qualitativas e qualitativas descrevo as entrevistas

com RACINE SANTOS, Dramaturgo que teve seus primeiros contatos com teatro em

Recife, nos anos de 1960, quando conheceu Ariano Suassuna, Hermilo Borba Filho e

Luiz Marinho. Criou junto deste último, de Altimar Pimentel, Tácito Borralho e outros,

a Associação dos Dramaturgos do Nordeste, que preside até hoje, e o Cantor e

compositor Roberto Teixeira de Lima que é atualmente proprietário da Banda Maior

Expressão.

Em 1964 iniciou em todo Brasil um, regime militar repressor, ocasionando uma

revolução na cultura artística por todo país com grande poder de mudança, a qual o Rio

Grande do Norte especificamente na cidade do Natal, desempenhou um papel singelo e

pouco expressivo ao que se refere a engajamento e revolução contra a ditadura.

Segundo Racine Santos a música de contestação ou a música de insatisfação do

artista era a insatisfação pelo modo da sociedade de viver naquela época. Para ele no

Brasil especificamente após do golpe militar, as artes brasileiras tomaram uma postura

de inquietação com o regime militar, que para Roberto Lima tudo onde começou a dar

indícios no 1º grande show de teatro chamado de Opinião, na cidade do Rio de Janeiro

do qual participaram artistas como Zé keti, Nara Leão, João do Vale.

Para eles, após a consolidação da ideologia contraria ao golpe surgem grandes

artistas como: Caetano Veloso, Chico Buarque, Geraldo Vandré entre outros, que se

projetaram dentro do Festival da canção com uma temática ligada diretamente à

situação política do país, daí por diante a MPB tenciona nacionalmente apresentar-se

em grandes espaços públicos, com canções voltadas para a situação política e social da

época.

Que para Napolitano,

Foi neste momento que apesar do grito fundo de dor e revolta,

também com o olhar atualizado e quase profético das

possibilidades reais de ser sentir, com o aumento da produção

cultural que cantores através do seu jeito próprio decidiram dar

soluções aos problemas políticos, ideológicos e culturais

inovando desta forma a arte musical e inaugurando um novo

ciclo de estruturação modernista. (NAPOLITANO, 2004,

P.176)

Para Racine Santos, essa inquietação que a Música Popular Brasileira se

apoderou da insatisfação da juventude para cantar e colocar ideologia na música

chamada realmente de a música de protesto, não só de insatisfação social, mas de

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protesto contra o regime militar, seu reflexo na cidade do Natal foi muito pouco ou

quase não existiu. O grande ápice dessa canção se deu com o festival da TV Record em

1967, que culminou no ano seguinte com a implantação do Ato Institucional Número 5

(AI-5) que segundo ele censurava e perseguia os artistas.

Racine Santos – Dramaturgo

Segundo ele o Teatro Potiguar, teve uma posição mais frontal em relação à

música no Brasil naquela época, porém na cidade do Natal se interpretavam os grandes

sucessos da música de protesto dos grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro,

em bares e casas noturnas por toda cidade, entretanto cantores e compositores

comprometidos com essa linha musical na cidade do Natal ele não reconhece. Desta

maneira observamos certo tipo de apoio a música de protesto, uma vez que os artistas

Norte Rio Grandense, a reproduzia, apoiando as ideologias de seus compositores do

Brasil afora.

Segundo Roberto Lima, Natal reproduziu alguns festivais parecidos com o da TV

Record, e nesse momento surgiram os grandes artistas da época como, Mirabô Dantas,

Roberto Lima, Márcio Tarssino, Terezinha de Jesus, Ivanildo cortês, Nadja entre outros.

Roberto Teixeira de Lima Cantor e compositor

Entretanto nenhumas das composições musicais tinham indícios de função social

político ideológicas. Para ele,

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Nós passamos de branca as nuvens ao que diz respeito a este quesito.

Quem era engajado aqui em natal, quem tinha um pensamento social

politico ideológico, vivia nos barzinhos tocando as canções de Geraldo

Vandré, mas não existiu compositor ou obra musical Norte Rio-

Grandense que protestasse ao regime, eu acompanhei de perto eu vivi

com essas pessoas eles eram meus amigos, eu não conheço ninguém de

natal que tenha feito uma canção ou ação musical que posso se rotulada

de protesto. (ROBERTO TEIXEIRA DE LIMA, entrevista em 13de

Junho de 2014).

Já para Racine Santos relata que os festivais eram promovidos pela prefeitura da

cidade que era governada pelo prefeito Agnelo Alves na época, segundo ele os festivais

aconteciam no Teatro Alberto Maranhão, e como eram moda foram muito concorridos,

dentre os que mais participarão foi Mirabô Dantas, um dos mais produtivos e marcantes

desses festivais e Roberto Lima. Havia também um pessoal mais ligado ao rock, que

para ele ―esses eram que não tinham consciência social. (Racine Santos, entrevista

21/07/2014).‖ Isto parece ser controverso, pois o rock tem como característica uma

postura contestadora de discernimentos, como saber em quem acreditar ou não, e buscar

de conhecimento e principalmente de tirar suas próprias conclusões, sem auxílio de

falsos professores ou conceitos retrógrados.

Racine ainda afirma que:

Esse pessoal da primeira geração era mais ligado a MPB, porque vivia

mais ligado a pessoas da MPB do Rio de Janeiro e São Paulo, fatos

como a amizade Mirabô Dantas e Fagner fazendo uma ligação com esse

tipo de musica, mas repito a produção musical dos 60 e 70 de Natal não

contempla a musica de protesto, ela repetiu o que já tinha feito, se

cantava, se catava muito agente era muito empolgado, mas produzir

não, salvo de algo que não tenho conhecimento, peço até perdão se

alguém me contestar, mas eu que vivi a época eu que participei da arte

ativamente, não conheço.(RACINE SANTOS, entrevista em 21 de

Julho de 2014).

É lucido que os festivais de Natal não impulsionaram a canção de protesto, e

muito menos adquiriu um papel de divulgação da insatisfação social com o regime,

diferente do que aconteceu no da Rede Record a FIC, como afirma Napolitano:

Nesse festival, o povo expressa claramente sua paixão pela controvérsia

e o seu amor às decisões pelas quais todos sejam responsáveis, se não

podemos escolher o presidente da Republica, nos irmanamos numa

decisão feita de solidariedade. (NAPOLITANO 2004, p.213).

É pertinente aqui ressaltar que o Sr. Mirabô Dantas um dos grandes compositores

daquela época hoje residente em Pium, o qual tentamos várias vezes uma entrevista,

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apresentou dificuldades ou não quis, porque não se têm interesse em falar do assunto, o

que é uma lástima.

Mirambô Dantas cantor e compositor

Ao que se diz respeito as manifestação artística aqui em Natal contra os militares,

Racine santos relata que houve no teatro, dentro do que era possível:

O teatro novo universitário chamado tônus, montou uma peça Antígona

(uma peça clássica) que um cidadão contestando o poder do estado

contra ele. Então é era uma metáfora contra a ditadura, essa peça causou

polemica, o diretor do teatro queria colocar o povo para fora, foi uma

loucura! Então no teatro havia mais uma consciência, do pessoal do

teatro do que o pessoal de musica era um pessoal mais engajado mais

consciente. Ocorreu que dirigi uma peça chamada, jardim chamado

getsêmane, que foi proibida no dia de sua estreia, por conter conotações

ideológicas. Eu escrevi uma peça que foi para inauguração da catedral

nova e quando acabou a peça os atores foram presos eu fui recolhido, a

radio rural que transmitiu ficou três dias fora do ar. (RACINE

SANTOS, entrevista em 21 de Julho de 2014).

E que,

A repressão ao teatro era muito grande, a repressão era tanta que para

gente montar uma peça, pegava-se o texto mandava para Brasília para

censura federal, eles censuravam , carimbavam página por página,

cortavam o que queria e mandava pra cá, liberado ou não, ainda tinha

que se dar um ensaio geral para a censura que eram o delegado da

policia federal e os censores, eles com o texto em mãos observando se

tudo estava conforme escrito era tudo muito complicado de se fazer. Na

musica não, na produção musical dos anos 60 em natal confesso que

desconheço, essa tendência essa linha de engajamento, não que o

pessoal fosse alienado, não, mais que não tinha esse engajamento, esse

comprometimento pelo menos no que diz respeito a produção, tô

julgando pela produção, pois se Mirabô Dantas fez uma musica que

nem cheira a contestação, não quer dizer que ele seja alienado, ele pode

ter consciência politica, e tem mas mesmo assim ele não fez uma

musica de protesto, já Roberto lima não sempre foi uma cara engajado

com a direita, foi secretario cortês pereira, ele têm uma visão mais a

direita e fazia musicazinha de entretenimento, assim como os demais,

eram todos mais festivos do que ideológicos. (RACINE SANTOS,

entrevista em 21 de Julho de 2014).

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Segundo ele algumas de suas obras questionavam as ideias estéticas políticas

daqueles que estavam no poder, sua primeira peça, A Festa do Rei, recebeu vários

cortes da censura, que tratava de uma metáfora de Rei absurdo, que ele fez expirado na

peça Ubu Rei, que eu tinha visto no Rio, e transcreveu a situação para o nordeste. A

peça tratava de um rei absurdo, totalitário, ditador que era uma metáfora contra a

ditadura militar, a censura cortou algumas páginas, mas ele conseguir aprovar a peça em

semanas, depois escreveu a faça do poder e ouviram do Ipiranga que eram também

contestação ao regime e a política Brasileira, entretanto não mandou para analise da

censura naquela época, pois sabia que ia ser proibida, somente em 1976 escreveu e em

1980 foi que eu consegui encenar, com em estreia em 1981 em natal.

Racine explana que suas intensões eram,

A minha intensão era de contestar a politica Brasileira que se

apresentava e denunciar a arbitrariedade, mostrar ao povo que a coisa

era arbitraria. Isto foi demostrado nas minhas obras como na Festa do

Rei, que são historias absurdas como era absurdo o poder no Brasil. Era

o tempo todo o povo rindo, mas rindo do absurdo poder, da

arbitrariedade, já que não se podia ser claro e direto senão não passava

na censura. Infelizmente em natal a musica não teve nenhum momento

dedicado, voltado ou que se prestasse a uma consciência politica. Eu

não conheço. (RACINE SANTOS, entrevista em 21 de Julho de 2014).

Sobre o órgão censor Roberto Lima explica que a policia federal apenas

intermediava as decisões de Brasília, os artistas entregavam as obras para a polícia,

dava entrada aqui e eles mandavam para Brasília, dai eles censuravam mandavam de

volta para os censores daqui. Racine relata, que ―Eu ainda tenho até hoje, guardo

comigo todos os certificados da policia federal, os cortes proibidos e etc. era uma

clima tenso para gente que fazia teatro.‖ (RACINE SANTOS, entrevista em 21 de

Julho de 2014). Já Márcio Roberto Lima, diz que ―a música passou ao largo disso ai

né, em Natal não houve , é uma pena, mas também devemos respeita as decisões

individuas porque era perigoso‖. (ROBERTO TEIXEIRA DE LIMA, entrevista em

13 de Junho de 2014).

Racine Santos relata sobre o seu recolhimento Que se deu por ter escrito uma via

sacra, onde dizia que Jesus Cristo era um subversivo e de fato era, subverteu a

ordem humana onde se dizia dai a César o que é de César, prenderam o teatrólogo e

proibiram a sua peça. Racine relembra um dos fatos que sugerem a sua perseguição:

Eu fui levado para lá, passei o dia lá, sob tortura psicológica, três vezes

aconteceram isso, a 1º vez que deu margem a tudo isso as repercussões

posteriores. Eu como era ligado ao teatro, eu também escrevi na tribuna

do norte, falando sobre o suplemento literário. O pessoal de direito, pois

naquela época tinham-se as faculdades, diferente de hoje, pois a

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reforma universitária veio para acabar com as faculdades para acaba

com esses grupos de pessoas muito tempo junto. Então o pessoal de

direito quando terminou o ano iria fazer uma festa para comemorar, não

sei se ainda fazem isso, alugavam um clube pra os alunos do curso de

direito seus familiares e amigos. Para conseguir o dinheiro para fazer a

festa contrataram uns violeiros para se fazer um show no teatro Alberto

maranhão, ai o delegado proibiu o show de violeiro, e eu naquela época

era trepede como todo jovem era, achei o tema legal e corri para

delegacia para entrevistar o delegado: Dr. O senhor proibiu a cantoria

de viola? Ele puxou a constituição Brasileira de 30 do tempo de Getúlio

Vargas, tá aqui o, todo espetáculo de diversão publica tem que passar

pela aprovação da censura, ai eu disse: até violeiro! E ele retrucou , todo

espetáculo, mas Dr. Violeiro é improviso, e ele só fazia dizer: todo

espetáculo, tudo bem, voltei fiz a matéria mas não publiquei na tribuna

mandei para São Paulo, eles publicaram um editorial ―cavalgador de

prepotência‖ , o delegado de natal, proibi folclore, a partir deste

momento ele ficou a me perseguir pro resto da vida. Então eu

tripudiava com o poder através das minhas farsas com a máxima

latina de que rindo se corrige os costumes gozando do poder que

era a arma que eu tinha, fazendo com que o povo sorrisse do

absurdo, isto você vê refletido na cultura popular como no teatro

de boneco. Todo teatro de boneco tem uma cena em que o boneco

mais esperto pega um pedaço de pau e mete na cabeça da policia e

o povo rir, isto é uma cartasse que o consciente coletivo que

adora quando a policia vai pra porrada, isto é medieval. Então eu

trabalho com a cultura popular não para reproduzi-la, mas para

pegar esse espirito, pois minhas peças refletem isso, fui o 1º e

único a responder processo por causa de teatro em Natal, em

relação à área musical a coisa não teve nenhuma consequência,

não conheço. (RACINE SANTOS, entrevista em 21 de Julho de

2014).

Roberto Lima, explica que existiu um medo por parte dos compositores e grupos

musicais de Natal de produzir algo que fosse contra a ditadura.

Segundo Racine, em Natal só se veio sentir o um pequeno impacto de censura

após o AI-5 de 1968. Para ele,

A coisa começou quando o direto de teatro chamado Miram Pires, ele

pra puxar o saco da revolução, juntou os lideres de teatro para uma

reunião no teatro Alberto Maranhão, para fazer um documento de

apoio às forças armadas, eu me revoltei a isso e ficamos inimigos por

muito tempo, ele me denuncio fui recolhido no quartel do exercito

dizendo que eu estava fazendo peça subversiva. Então este clima de

terror se estalou no teatro mais do que na musica. (RACINE SANTOS

entrevista em 21 de Julho de 2014).

Para ambos os artistas não houve nenhum movimento popular espontâneo, além

de pequenos grupos e o movimento estudantil que talvez arquitetassem algo mais tudo

muito escondido, que represente a insatisfação cultural artística social da cidade do

Natal, frente a ditadura militar. E o que se refere especificamente as artes, não! Não se

manifestou fora o teatro superficialmente pouco com Racine Santos, o Tônus e Naval

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com suas peças escritas desde 1963. Não há até o presente momento na musica

produzida em Natal, evidências dos nossos compositores, uma única obra se quer que

tenha a conotação de engajamento e muito menos de censura.

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CONCLUSÃO

O presente trabalho buscou abordar o contexto da música popular brasileira no

tempo da Ditadura Militar, especialmente voltado para a cidade do Natal/ RN.

O regime militar, instaurado no Brasil no ano de 1964 - 1985 causaram

implicações políticas, sociais, econômicas e comportamentais complexas à população e

Artísticas.

Neste período a voz da comunidade Artística fica em um entrave, pois poucos

eram os que tinham coragem para ir contra o regime repressor que agia através da

manipulação de informações, torturas, repressões e censuras. Está clara a atrocidade que

a sociedade brasileira sofreu durante todo tempo que os militares estiveram no poder.

Aqui em Natal os reflexos enraizados no cotidiano da época do período militar, foram à

submissão; falta de participação política; crítica pessoal e ainda o atraso intelectual que

a maioria da população Artística possuía.

Acredito que ainda estamos convivendo um momento de intimidação nos dias

atuais pela falta, do comprometimento de algumas pessoas e artistas, que viveram e

participaram daquela época recusam se a falar, ou de algum modo não acreditam que os

acontecimentos artísticos e ideológicos políticos do regime foram importantes. Uma

pena, pois isto de forma lenta e gradativa está retirando direitos que foram adquiridos

com muita luta e determinação, oferecendo espaço a um descaso imparcial na maioria

da população brasileira assim como a própria história da Música Popular nas mais

diversas regiões do país como é o caso de Natal. Podemos observar isto nos dias atuais,

comparando o regime militar através da forma governamental que refletem em

interesses próprios e não os da massa populacional.

É imprescindível resgatar a História da Música Popular Brasileira e conhecê-la

de forma esclarecedora para que se possa efetivamente opinar, participar e escolher o

futuro da Música Popular do País.

Devemos resgatar o espírito na Música Popular de festival que é precisamente a

concepção social perante os acontecimentos de maneira ativa e opinativa, com

composições de conteúdo do que a do contexto atual massificada.

Necessitamos utilizar a Música Popular como manifestação Artística crítica

sobre a política, economia, educação ao desenvolvimento pleno do país; carregando o

anseio de haver a intranquilidade, o desempate, a decisão sobre importantes eventos; a

vontade de falar claramente o que raciocina, encorajando outras pessoas a fazer

também.

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