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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ JULIANA GOLIN XAVIER VIANNA
A PRODUÇÃO DIDÁTICA DE ROCHA POMBO: ANÁLISE DE HISTÓRIA DA AMÉRICA E NOSSA PÁTRIA
CURITIBA 2009
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ JULIANA GOLIN XAVIER VIANNA
A PRODUÇÃO DIDÁTICA DE ROCHA POMBO: ANÁLISE DE HISTÓRIA DA AMÉRICA E NOSSA PÁTRIA
Monografia de conclusão de curso apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel e Licenciado em História. Curso de História, Setor de Ciências Humanas Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná. Orientadores: Marcus Aurelio Taborda de Oliveira e Roseli Boschilia
CURITIBA 2009
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Ao João e a toda a família Xavier Vianna.
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AGRADECIMENTOS
Este trabalho foi resultado de dois anos de pesquisa que realizei em meus dois
últimos anos de graduação. O trabalho de pesquisa histórica é, em geral, um trabalho
individual, e este foi o meu caso, porém, não teria sido feito sem algumas pessoas que
muito me ajudaram e ensinaram. A estas pessoas agradeço imensamente.
Quando eu estava no primeiro ano da graduação, ainda perdida e assustada, uma
menina baixinha e simpática veio me perguntar se eu era irmã do Julio. Eu ainda lembro
aquele dia, estávamos na primeira aula de uma optativa que eu nem sabia do que se
tratava. Foi quando nasceu uma grande amizade entre mim e a Lúcia. Muito tempo depois
fui indicada por ela para a bolsa de Iniciação Científica. O primeiro passo desta pesquisa
foi dado, na verdade, pela Lúcia, e a ela eu serei eternamente grata.
A bolsa de IC foi orientada pelo professor Marcus Taborda, e foi uma orientação
diferente. Começou com algumas festas, continuou por muito tempo por e-mails, e
terminou com um trabalho do qual eu muito me orgulho. Este ano o professor Marcus
aceitou meu convite de darmos continuidade ao trabalho, com esta monografia, mesmo
com os problemas burocráticos que não nos assustam em nada. O Marcus é o culpado de
tudo isso! Certamente este trabalho não seria metade do que é se não fosse por ele. O
Marcus é um cara íntegro e sincero, ele não tem medo de dizer as coisas, de elogiar e de
puxar a orelha quando eu mereço. Mas principalmente ele me dá metade do entusiasmo
que é preciso para a pesquisa. Ele me ensinou a pesquisar, a estudar, e me ensinou lições
que vão além da academia, que levarei comigo em minha “conquista do mundo”, como ele
diria.
Gostaria também de agradecer à professora Roseli Boschilia, por ter aceitado meu
convite, e contribuído tanto para este trabalho. Certamente a academia precisa de mais
pessoas com uma cabeça tão aberta e tão receptiva como a dela.
Também quero agradecer a todas as pessoas que me ajudaram no início, quando o
Marcus estava fora, e quando eu ainda não sabia bem pra que lado correr. Todas as
pessoas do projeto, dentre elas Sidmar, Diogo, Lausane e professor Marcus Levy.
Gostaria também de agradecer a todos os colegas de graduação e a todos os
professores. Certamente todos me acrescentaram muito, de alguma forma.
Gostaria também de agradecer meu grande amigo, namorado e companheiro de
aventuras, Leo. Foi uma das pessoas que mais contribuiu com este trabalho, ouvindo e
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discutindo ideias, lendo algumas versões, me ajudando quando eu precisava, e até
correndo atrás de fontes por aí! Ele me ensinou muito, e é certamente o cara que nasceu
pra fazer pesquisa, ler coisas complexas, pensar, criticar, “monografar”.
Por fim, gostaria de agradecer a Cíntia Carneiro, que muito me ajudou neste
trabalho, com a revisão do texto, mesmo eu tendo pedido um pouco de última hora.
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 7
1.1 O USO DO LIVRO DIDÁTICO COMO FONTE HISTÓRICA ................................. 9
2. A TRAJETÓRIA E O PENSAMENTO DE ROCHA POMBO .................................... 16
2.1 O PENSAMENTO DE ROCHA POMBO ................................................................ 18
3. HISTÓRIA DA AMÉRICA ........................................................................................... 24
3.1 PERÍODO PRÉ-COLOMBIANO ............................................................................. 28 3.2 PERÍODO COLONIAL ............................................................................................ 32 3.3 EMANCIPAÇÃO DAS COLÔNIAS AMERICANAS E INTEGRALIZAÇÃO DAS
NACIONALIDADES AMERICANAS .......................................................................... 40
4. NOSSA PÁTRIA ............................................................................................................ 47
5. CONCLUSÕES .............................................................................................................. 61
6. FONTES ......................................................................................................................... 63
7. BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................ 64
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1. INTRODUÇÃO
A trajetória de José Francisco da Rocha Pombo ainda possui muitas lacunas e
questões sem respostas, apesar de ser bastante estudada. Os dados sobre sua trajetória
pessoal são poucos, suas obras são muitas vezes de difícil acesso e muitas de suas ideias
estão esquecidas em arquivos e bibliotecas. Algumas obras receberam maior atenção da
historiografia, mas muitas não são sequer citadas e conhecidas.
Em pesquisa iniciada no ano de 2008 pelo programa de Iniciação Científica da
UFPR/CNPq, comecei a fazer um levantamento das obras e escritos deste autor e já me
deparei com uma vasta coleção: livros sobre os mais diversos temas e artigos em vários
jornais. Algumas bibliotecas possuem grande número de suas obras, como a Biblioteca
Pública do Paraná e a Biblioteca Nacional. Pude encontrar também em sebos algumas
obras, mas em geral os livros deste autor se encontram espalhados, e muitos são de difícil
acesso.
Literatura, educação, imigração, política e história eram alguns dos diversos
assuntos de interesse para Rocha Pombo. O imenso número de publicações encontradas
faz crer que esta era uma personalidade importante do Paraná do fim do século XIX e
início do século XX. Sua atuação nas mais diversas esferas da sociedade da época faz com
que haja inúmeras formas de abordagem no estudo de Rocha Pombo.
Meu foco, porém, sempre foi acerca de seu pensamento sobre educação. Quando se
estuda sua trajetória, pode-se ver que esta foi uma de suas grandes preocupações. Neste
trabalho de conclusão de curso analiso não só suas ideias sobre educação, mas também
sobre história. O Rocha Pombo historiador foi muito ativo, escreveu diversas obras
reconhecidas, e esta monografia pretende trabalhar com sua obra didática, que foi muito
usada até pelo menos a década de 1950. Foi também utilizada em diversas partes do país,
por um longo período. São fontes ainda pouco estudadas e exploradas se comparadas com
outros tipos de fontes escritas, e, pelas limitações de tempo e objetivos, não serão ainda
esgotadas neste trabalho.
Pude localizar ao todo nove livros didáticos escritos por Rocha Pombo.
Apresentam diferenças de conteúdo, número de edições etc. Sua relevância se evidencia
por dois aspectos: 1 – o período em que foram usados, já que possuímos edições que vão
até os anos 1940 e 2 – a suposição de que foram usados em diversos estados do Brasil, já
que podemos encontrá-los em acervos de sebos e bibliotecas na internet por todo o país.
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No momento, trabalho apenas com a suposição deste segundo aspecto, já que para
comprová-lo seria necessário buscar outras fontes nos demais estados e, por se tratar de
uma monografia de conclusão de curso, foge das possibilidades presentes.
Os livros com o título de História do Brasil são quatro: “curso fundamental”,
“curso superior”, “para o ensino elementar”, e “para o ensino secundário”. Estas obras não
possuem as datas das primeiras edições, mas tudo indica que sejam da primeira década do
século XX. A maioria, porém, apresenta edições até pelo menos a década de 40. Destes
quatro, o que encontrei mais edições até o presente momento foi o História do Brasil
(curso fundamental), com mais de 23 edições.1
O livro Nossa Pátria merece destaque, pois foi editado mais de 80 vezes,
certamente a obra de maior sucesso de Rocha Pombo. A data da primeira edição também
não consta, mas acredito ser de 1917.2 Este livro é um dos dois escolhidos para a análise
neste trabalho, exatamente por se destacar por seu grande uso.
Os livros de história local do autor são História de São Paulo: resumo didático e
História do Paraná: resumo didático. Segundo a bibliografia pesquisada e as próprias
fontes, estimo que o primeiro seja de 19183 e o segundo de 1929.4 Ambos não possuem
um grande número de edições, mas foram utilizados pelo menos até os anos 1930. Neste
contexto, a história regional ainda não era o foco da educação. Ainda preocupava-se em
consolidar o nacionalismo com a história do Brasil, e a história regional era uma
preocupação secundária. Por este motivo, acredito, há uma grande diferença entre o
número de edições destes e dos livros de história do Brasil. Ainda assim, o fato de Rocha
Pombo já se preocupar com estes assuntos é um questionamento a ser levantado.
O compêndio de História da América, seu primeiro livro didático, foi publicado
por ter sido vencedor de um concurso promovido pelo Conselho Superior da Instrução
Pública do Distrito Federal, em 1897. É este livro que lhe abre portas no Rio de Janeiro e o
faz mais um historiador oficial da Primeira República. Também traz muitas questões
interessantes, pois, mesmo sendo a primeira obra didática de História da América, não foi
muito bem aceito, já que apresentava um ponto de vista diverso daquele comum e
desejado na época. Segundo Circe Bittencourt, Rocha Pombo apresenta uma visão da 1 BEGA, M. T. S. “No centro e na periferia: a obra histórica de Rocha Pombo.” In: LOPES, M. A. (Org.) Grandes Nomes da História Intelectual. São Paulo: Contexto, 2003. p. 488. 2 Consta no catálogo on-line do acervo da Biblioteca Nacional: http://www.bn.br 3 SILVA, A. A. Entre Deus e a Nação: trajetória de José Francisco Rocha Pombo. Monografia (Graduação em Ciências Sociais) – Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1997. 4 Os dois livros – História do Paraná e História de São Paulo – possuem prefácios com as datas mencionadas, por isso acredito ser da primeira edição.
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colonização como um saque, com europeus destruindo a cultura local, uma exploração que
culminou com o extermínio da população americana.5 É importante ressaltar que esta
visão da colonização não se repetiu nos demais compêndios do autor. Ao contrário dos
demais compêndios, este teve apenas duas edições, a primeira em 1900 e a segunda em
1925. História da América é, sem dúvida, o livro que mais se destaca dentro da produção
de Rocha Pombo, e nos permite formular algumas perguntas a serem respondidas neste
trabalho: Por que a diferença de discursos nos livros? Teria sido o fracasso do primeiro
livro que levou o autor a mudar seu ponto de vista? O número reduzido de edições de
História da América é de fato pelo ponto de vista que trazia, ou seria simplesmente pelo
fato de que a História da América não teve e não tem lugar privilegiado nos currículos
escolares?
Assim, meus objetivos com este trabalho são:
• Analisar os livros didáticos História da América e Nossa Pátria, de Rocha Pombo.
Entender sua narrativa presente nestas obras, comparando-as e observando-as em
suas diferentes edições.
• Compreender o pensamento do autor acerca da história, quais os assuntos
priorizados, quais são os fatos e atores mais relevantes, e qual o formato que utiliza
em sua narrativa.
• Compreender a importância da obra didática dentro da trajetória intelectual de
Rocha Pombo.
1.1 O USO DO LIVRO DIDÁTICO COMO FONTE HISTÓRICA
Desde que a educação no Brasil foi institucionalizada, o livro didático tem
acompanhado sua história. Inicialmente os livros eram estrangeiros ou de cunho religioso,
depois, aos poucos, foram substituídos por livros brasileiros. Há muitas formas de
trabalhar com este objeto, e é preciso muita atenção ao fazê-lo. Em primeiro lugar é
preciso ter em mente que o livro didático é um livro, por isso é preciso entender como, por
que, quando e onde é lido. Também é um elemento da indústria cultural, que é escrito,
editado, fabricado, vendido, comprado. Possui, além de suas finalidades pedagógicas,
5 BITTENCOURT, C. Livro didático e conhecimento histórico: uma história do saber escolar. 1993. Tese (Doutorado em História) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, São Paulo, 1993. p. 186, 187.
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finalidades econômicas. Apesar de o discurso da escola para todos e o próprio livro
didático se fazerem presente desde os fins do século XIX no Brasil, foi por volta dos anos
1960 e 1970 que o ensino foi realmente massificado. Foi neste momento que o livro
didático passou a ser tão marcante e tão presente no cotidiano de grande parte dos
brasileiros, sendo definidor, muitas vezes, do currículo.
Antes de entrar na discussão do livro didático propriamente, faz-se necessário
pensar um pouco sobre as finalidades da escola. Em primeiro lugar é importante
deixarmos de naturalizar a escola como um todo, entendendo-a, junto com todas as suas
produções, práticas, tradições, enfim, tudo que a engloba, como uma criação de uma
determinada sociedade, dentro de um contexto histórico-cultural.
As finalidades da escola são muito discutidas e não há uma resposta única e
simples que a contemple. Como produto de determinadas sociedades, que estão sempre em
mudança, as finalidades da escola também mudam constantemente. Podemos encontrar
finalidades religiosas, sócio-políticas, psicológicas, culturais etc, conforme o contexto
histórico em que se insere. Portanto pode-se observar que estas finalidades não são apenas
a apreensão dos conteúdos das disciplinas, mas vão muito mais além.6 É necessário ainda
afirmar que a escola não é apenas lugar de reprodução de conhecimentos e ideologias,
impostos pelo Estado ou por uma determinada classe. A escola possui função não só de
transmissão, mas também de produção dos conhecimentos. Assim, segundo Chervel, a
ideia da disciplina escolar e a escolha de seus métodos e conteúdos não pode ser pensada
como unilateral, como uma imposição da sociedade, ou como a vulgarização do
conhecimento acadêmico7.
Por que e como estudar história, quais conteúdos serão ministrados e quais serão
omitidos, quais países e períodos serão priorizados? Todas estas questões são respondidas
de acordo com diversos fatores, num diálogo multilateral entre escola, sociedade e
academia. A influência da sociedade, o contexto histórico e a cultura que está inserida a
escola, a construção do conhecimento acadêmico, a construção do conhecimento escolar,
as influências dos modelos de outros países etc.
Com relação ao livro didático, temos presenciado atualmente muitos debates, não
somente sobre seu papel, mas de toda a cultura material na educação dentro da história das
disciplinas escolares. Uma disciplina escolar comporta não apenas as práticas docentes de
6 CHERVEL, A. “História das Disciplinas Escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa”. In: Teoria e Educação, Porto Alegre, n.2, 1990. p. 187 – 188. 7 Ibid., p.180 – 181.
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aula e os conteúdos, mas também suas finalidades, seus materiais, suas práticas, seus
exames.8 Na historiografia mais tradicional, os elementos materiais da escola, como o
livro, edifícios e mobília são naturalizados, considerados elementos sem relevância.9
Porém, hoje está surgindo uma nova discussão acerca da função destes elementos.
Circe Bittencourt afirma em sua tese de doutorado que o livro didático é o
instrumento pedagógico mais utilizado no cotidiano escolar, sendo a principal fonte de
estudo, e o produto cultural mais divulgado no Brasil entre as pessoas que possuem acesso
a escola.10 Chervel, quando fala da importância do conteúdo das disciplinas, coloca em
destaque a função do livro:
Dos diversos componentes de uma disciplina escolar, o primeiro na ordem cronológica, senão na ordem de importância, é a exposição pelo professor ou pelo manual de um conteúdo de conhecimentos. É esse componente que chama prioritariamente a atenção, pois é ele que a distingue de todas as modalidades não escolares de aprendizagem, as da família ou da sociedade.11
Note-se que Chervel posiciona a explicação do professor e o livro didático lado a
lado, com a mesma função, de exposição dos conhecimentos. Assim, temos o livro não só
como o instrumento mais utilizado na escola, mas também como identificador do ensino
escolar, em primeiro lugar, e, em segundo, como identificador da própria disciplina. Este
autor afirma ainda que as fronteiras entre as diversas disciplinas são traçadas por
programas, horários, didáticas, pela formação dos professores12 e também, é claro, pelo
material didático. Essas fronteiras são criações dos determinados contextos históricos e,
portanto, mutáveis.
Este caráter mutável da disciplina escolar também é discutido por Dominique Julia,
que afirma que não se pode considerar que a disciplina escolar é exatamente a mesma com
o passar do tempo apenas por possuir o mesmo título. A “história” ensinada nas escolas do
fim do século XIX e início do XX não é exatamente a mesma que a “história” ensinada
hoje nas escolas. É preciso observar as mudanças de finalidades e conteúdos:
(...) toda a história das disciplinas escolares deve, em um mesmo movimento, considerar as finalidades óbvias ou implícitas buscadas, os conteúdos de ensino
8 Ibid. 9 SOUZA, R F. A cultura material na história da educação: possibilidades de pesquisa. In: Revista Brasileira de História da Educação, n. 14, SBHE, 2007. 10 FONSECA, S. G. “Livros didáticos e paradidáticos de História”. In: Didática e Prática de Ensino de História. 5.ed. São Paulo: Papirus, 2006. 11 CHERVEL, op. cit. p. 202. 12 Ibid, p.213.
12
e a apropriação realizada pelos alunos, tal como pode ser medida por meio de seus trabalhos e exercícios.13
Há aspectos na obra didática de Rocha Pombo que evidenciam isto. Todos os seus
compêndios trazem extensas descrições de clima, relevo, hidrografia, fauna e flora. Isto
causa um inicial estranhamento para nós hoje, que usamos, em nossa escolarização, livros
escritos cerca de 100 anos depois. A divisão didática que estamos acostumados a ver nos
livros mais atuais não trariam estas discussões na disciplina de história. Estariam
provavelmente contempladas na disciplina de geografia, ou ainda biologia, para as
questões de fauna e flora.
Isto nos faz lembrar que as disciplinas escolares e o currículo como um todo são
“construtos sócio culturais, historicamente contingentes”.14 Isso significa que as
disciplinas e seus conteúdos, práticas, avaliações e exercícios estão em constante
modificação, como fica claro o caso da história. A partir do momento em que um
conhecimento é trazido para escola, ele deve se “encaixar” dentro de uma determinada
disciplina, e esta escolha é feita a partir de diversos aspectos contextuais. A escolha do
detalhamento da fauna, flora, clima, relevo brasileiros no livro didático de história é
certamente um fato a ser observado, já que hoje, nas escolas, são elementos de outras
disciplinas, mas que em nenhum momento deixaram de ser relevantes para a história.
Outro papel importante do livro didático é o de ser um dos elementos fundamentais
no processo de ensino e na definição do currículo, além de, no caso da história, ser o
principal canal de difusão de seus saberes específicos.15 A escola está em diálogo com a
produção do saber histórico, formulando, construindo e selecionando o conhecimento
histórico que deve compor o livro didático. Assim, principalmente no início do século XX
(e até hoje), os conteúdos a serem ensinados na escola nas determinadas séries eram
aqueles encontrados nos compêndios.
Porém, não se pode pensar que todos leiam e compreendam o livro de forma igual.
O entendimento pessoal é um resultado de fatores culturais, e a forma como o texto é lido
influencia.16 Será que estes livros didáticos eram lidos em voz alta, em conjunto por todos
os alunos, apenas pelo professor, ou eram lidos individualmente e em silêncio? Será que o
13 JULIA, D. “Disciplinas escolares: objetivos, ensino e apropriação”. In: LOPES, A. C.; MACEDO, E. (Orgs.) Disciplinas e Integração Curricular: história e políticas. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. p. 51. 14 TABORDA DE OLIVEIRA, M. A. “Educando pelo corpo: saberes e práticas na instrução pública primária nos anos finais do século XIX”. In: BENCOSTTA, M. L. A. (org). Culturas escolares, saberes e práticas educativas: itinerários históricos. São Paulo: Cortez, 2007. p. 266. 15 FONSECA, op. cit. 16 CHARTIER, R. Práticas da Leitura. São Paulo: Estação Liberdade, 2001.
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objetivo era a memorização do conteúdo, havia discussões sobre os tópicos, ou reflexões?
Eram lidos em sala de aula ou em casa como tarefa? Todas estas questões, dentre outras,
são importantes para se entender como o conhecimento contido no livro era absorvido.
Apesar de o estudo sobre as práticas do uso do material escolar não ser o objetivo deste
trabalho, faz-se necessário trazer esta questão para compreendermos que há um
distanciamento entre a análise que está sendo feita aqui e as práticas do dia-a-dia da
escola.
Também não se pode cair no erro de achar que o livro didático é completamente
determinante nas práticas escolares. É um dos mais importantes instrumentos, mas cada
professor utilizou e utiliza da forma como lhe convém. Pode utilizar outros materiais e
pode ainda discordar e criticar as posições do livro. A existência do professor estabelece
uma “constante relação entre textualidade e oralidade”.17 Sem contar ainda com tantos
outros materiais e recursos que podem ser utilizados. O próprio Rocha Pombo expõe esta
ideia em seus prefácios:
A meu ver, um livro didático, sobretudo se se destina a classes primárias, já preenche algumas condições de um bom compêndio se consegue sugerir às crianças o que o mestre tem de explicar e desenvolver, pois, para os que aprendem, o livro, quando muito, guia e orienta: o mestre é quem ensina.18
Bittencourt ressalta quatro facetas do livro didático: 1 – é uma mercadoria, que está
intimamente ligada a evolução das técnicas de sua fabricação, a comercialização e,
consequentemente, aos interesses do mercado; 2 – é um “depositário dos diversos
conteúdos educacionais”, que pode ser considerado uma fonte para recuperar
conhecimentos, costumes, mentalidade de uma determinada época; 3 – é um instrumento
pedagógico, que está inscrito nas condições e métodos de ensino de sua época; 4- é, por
fim, um veículo de um determinado sistema de valores e de uma cultura. De forma mais
geral, segundo a definição de Choppin, o manual didático é “el soporte, el depositario de
los conocimientos y de las técnicas que en uno momento dado uma sociedad cree oportuno
que la juventud debe adquirir para la perpetuación de sus valores.”19
A análise de livros didáticos também não deve deixar de levar em conta que se
trata de um produto da indústria cultural, como já enunciado. Os livros de Rocha Pombo
são alguns dos primeiros de história escritos no Brasil por brasileiros, mas possuíam os 17 BITTENCOURT, op. cit. p.289. 18 ROCHA POMBO. História do Paraná: resumo didático. 2.ed. São Paulo: Melhoramentos, s/d. 19 CHOPPIN, A. “Pasado y presente de los manuales escolares”. In: BERRIO. J. R. La Cultura Escolar de Europa: tendencias históricas emergentes. Madrid: Biblioteca Nueva, 2000. p.109.
14
concorrentes estrangeiros, que eram muito mais utilizados e aceitos. Deve-se procurar
entendê-los não apenas com relação ao seu conteúdo, mas também seus procedimentos de
produção, difusão, circulação, escolha e aquisição.20
Os dois maiores consumidores são alunos e professores, e é possível observar que
alguns o consideram como fundamental para o aprendizado, outros como um obstáculo.
Pode ainda ser o organizador dos conteúdos a serem aprendidos ou até um elemento de
status, que garante uma situação social privilegiada a quem o possui. Este último elemento
mostra que “o uso e a posse do livro didático inserem-se, assim, em uma complexa teia de
relações e representações sociais.”21 Estes vários usos do manual didático mostram,
segundo Choppin, que o livro também tem um objetivo de modelar a sociedade de
amanhã, transformando o autor do livro não só na simples testemunha de seu tempo, mas
também em ator social.
A função do livro didático no início do século XX foi a de divulgação dos
conhecimentos específicos para o conhecimento escolar; veículo de disputas intelectuais
entre educadores religiosos e laicos; formador de métodos de ensino; complemento das
lições orais dos professores, acompanhando sempre as divisões entre infância e
adolescência.22
O trabalho do historiador que utiliza o livro didático como fonte primária possui
algumas características particulares. Em primeiro lugar, este é um objeto que, bem ou mal,
todas as pessoas que tiveram uma escolarização de algum nível possuem algum
conhecimento, algum contato. Assim, é preciso lidar com todos os tipos de opinião, desde
os que o consideram como importante e fundamental para a educação até os que pensam
que o livro é o responsável pela pouca qualidade do ensino.
Em segundo lugar, como já foi dito, o livro didático é um produto, resultante da
iniciativa privada. Algumas informações relevantes para o trabalho acadêmico, como
tiragens, número de edições, quais os estados e as escolas que compraram o livro,
poderiam ser pesquisadas nas próprias editoras, já que, como é o caso da Editora
Melhoramentos, existem até hoje. Porém, estas instituições dificultam o acesso a estas
informações, provavelmente por questões econômicas.
20 MUNAKATA, K. “O livro didático e o professor: entre a ortodoxia e a apropriação”. In: MONTEIRO, A., GASPARELLO, A e MAGALHAES, M (orgs). Ensino de História: sujeitos, saberes e práticas. Rio de Janeiro: Mauad X; FAPERJ, 2007. 21 BITTENCOURT, op. cit. p. 3. 22 Ibid., p.340-342
15
Em terceiro lugar, o livro didático é, na maioria das vezes, considerado como um
objeto de utilidade passageira. As mudanças constantes de currículo e a apresentação de
novos compêndios mais completos e atualizados fazem com que os livros fiquem
ultrapassados. Isto faz com que, ainda que seja produzido em grandes quantidades, sua
localização e acesso sejam difíceis, e sua preservação mínima.
A localização das fontes para este trabalho teve foco em três lugares: em primeiro
lugar, os sebos. É comum encontrar vários tipos de compêndios em sebos, que geralmente
apresentam péssimos estados de conservação.23 Em segundo lugar, as bibliotecas. O nível
de dificuldade é variado, mas em geral também não possuem boa conservação e, no caso
deste trabalho, as obras são geralmente apenas de consulta local. Há dificuldades ainda
com organização, excesso de zelo pelos livros considerados raros, impedindo o acesso, ou
ainda, livros que sumiram das estantes, como é muito comum na Biblioteca Pública do
Paraná.
Em terceiro lugar, gostaria de destacar a Biblioteca do Livro Didático, que se
encontra dentro da biblioteca da Faculdade de Educação da USP. É resultado do projeto
coordenado pela Profª. Dra. Circe Maria Fernandes Bittencourt e facilita de grande forma
trabalhos que se baseiam em livros didáticos. Além da grande conservação dos livros, o
acesso ao acervo é muito fácil e ágil, e o catálogo encontra-se disponível na internet.24 Em
seu acervo pode-se encontrar livros de todas as disciplinas brasileiras, desde o fim do
século XIX até os livros mais atuais. Os livros didáticos de Rocha Pombo que localizei
neste acervo foram História da América, em suas duas edições, História de São Paulo,
História do Brasil: para o ensino elementar, História do Brasil: para o ensino
secundário, História do Brasil: curso fundamental e Nossa Pátria.
23 O trabalho de pesquisa em sebos tem sido muito facilitado pela preocupação destes em disponibilizar seu acervo na internet. Desta forma é possível consultar rapidamente diversas lojas, inclusive de outros estados. 24 http://www2.fe.usp.br/estrutura/livres/index.htm
16
2. A TRAJETÓRIA E O PENSAMENTO DE ROCHA POMBO
Rocha Pombo nasceu em Morretes em 4 de dezembro de 1857 e morreu no Rio de
Janeiro em 1933. Vindo de família protestante, iniciou sua carreira letrada como professor
em Morretes, substituindo seu pai, Manoel Francisco Pombo, em 1875. Este já estava
inserido na política local, chegando a ser suplente de vereador pelo Partido Conservador.25
Segundo Piloto, seria esta sua verdadeira vocação durante toda sua vida: “Professor desde
os verdes anos, se-lo-á até os últimos dias da longa existência, e é sempre no apostolado
de ensinar, orientar, desbravar, que êle funda jornais, sobe à tribuna parlamentar, e escreve
obras.”26 Aos vinte anos criou o primeiro periódico republicano da cidade, o jornal O
Povo, que possuía caráter republicano e abolicionista. Enviou seu primeiro artigo para a
revista Escola, do Rio de Janeiro. As informações sobre a época que viveu em Morretes
são muito poucas. Diz-se que Rocha Pombo era um autodidata27, mas não fica bem
esclarecido os meios que o levaram a perseguir esta erudição. Sua educação regular teria
sido completada apenas em primeiras letras (correspondente ao atual ensino primário), em
Morretes28, o que nos leva a indagar a forma com que continuou buscando sua erudição.
Com o desenvolvimento de sua carreira de jornalista mudou-se para Curitiba,
provavelmente porque era um centro intelectual mais promissor, onde o jovem Rocha
Pombo teria mais oportunidades. Passou a colaborar com o jornal Galeria Ilustrada (1880)
e também começou a publicar livros de literatura, sendo o primeiro A Honra do Barão, de
1881. Este foi primeiramente publicado em forma de folhetim no jornal A Pátria, de
Montevidéu. Em 1882 publicou seu segundo romance, Dadá. Passou a colaborar também
com o jornal Gazeta Paranaense, do Partido Conservador, que era liderado por Idelfonso
Pereira Correia, o barão do Serro Azul, com quem Rocha Pombo possuía uma relação de
amizade.
Em 1883 foi para Castro, onde escreveu A Religião do Belo e A Supremacia do
Ideal e passou a colaborar com o jornal Echo dos Campos.29 É também nesta cidade que se
casou com Carmelita Madureira Azambuja, filha de grandes fazendeiros da região.
Segundo Maria Tarcisa Silva Bega, sua ida para Castro aconteceu pelo interesse do
25 BEGA, op. cit. 26 PILOTO, V. Rocha Pombo. Curitiba, 1953. p. 15. 27 Ibid. 28 SILVA, op. cit., p. 2. 29 QUELUZ, G. L. Rocha Pombo: Romantismo e Utopias (1880-1905). Dissertação (Mestrado em Historia) – Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1994.
17
Partido Conservador em construir bases mais sólidas num local que era dominado por
liberais. Acreditava-se que Rocha Pombo teria grande força política por seu sucesso na
atuação em jornais e livros publicados. Neste momento é que entrou para o Partido
Conservador e foi eleito deputado pelo 2º distrito com mandato de 1916 a 1918. Queluz
afirma que o motivo de sua entrada no partido é por ter iniciado um conflito com o Partido
Liberal no jornal Echo dos Campos. Porém, sua breve carreira política não teve sucesso,
seus projetos reformistas não agradaram o Partido, colocando-o em uma posição de
“deslocado” perante as elites. Por não agradar a nenhum partido, abandonou a política, só
retornando em 1916, como deputado, mas com caráter honorífico por sua atuação como
historiador.
Com o insucesso de sua carreira política, Rocha Pombo iniciou, novamente em
Curitiba, um novo “empreendimento jornalístico” que foi O Diário Popular em 1887 e, a
partir de 1892, colaborou com o Diário do Comércio, do qual se tornou proprietário.
Continuou também com suas obras literárias, publicando O Guairá (1886) e Nova Crença
(1887).
Sua atuação nos jornais contou com discussões de diversos assuntos, como a
educação, a imigração, a literatura e o comércio. Esse é o perfil principal de “intelectual”
de Rocha Pombo, se preocupando com questões atuais de sua sociedade. Assim, de acordo
com Névio de Campos, “sua ação política se efetivou nos periódicos”.30 Seu fracasso na
política foi compensado por sua atuação jornalística, representando sua “principal
estratégia político-cultural”.31
Seus planos de criação da Universidade estiveram sempre presentes. Em 1892
conseguiu concessão do poder público para sua criação, chegou a comprar o terreno, mas
o apoio cessou, e seu projeto fracassou. Esse fracasso está intimamente ligado ao seu
fracasso como político.32 Sobre este fracasso Valfrido Piloto comenta que “sua idéia (...)
era demais para o ambiente, e incômoda para a má política”.33
Ainda em 1892 publicou o livro Visões e o romance Petrucello. Nesta época
escreveu a crônica Para a História, livro que retrata a Revolução Federalista, só publicado
em 1980.
30CAMPOS, N. Intelectuais Paranaenses e as Concepções de Universidade: 1892-1950. Tese (Doutorado em Educação) – Setor de Educação, Universidade Federal do Paraná, 2006. p. 24. 31 Ibid., p.32. 32 Ibid., p.24. 33 PILOTO, V. Morretes e Rocha Pombo. (Da conferência proferida em Morretes, em 1983, nos festejos do 250º aniversário de sua fundação). Morretes: Prefeitura Municipal: 1991. p. 23.
18
Participou da revista O Cenáculo entre 1895 e 1897. Em 1896 foi para Paranaguá,
onde colaborou com o periódico Aurora.
Em 1897 foi morar no Rio de Janeiro, onde iniciou sua carreira de historiador com
seu primeiro livro didático, História da América (1900), ainda com a obra O Paraná no
Centenário (1900), a coleção de dez volumes da História do Brasil, que foi iniciada em
1905, uma de suas obras mais famosas e importantes e a obra literária simbolista No
Hospício, do mesmo ano. Foi também professor de história Geral da Universidade do
Povo a partir do ano de 191234 e professor concursado do Colégio Pedro II e da Escola
Normal. Valfrido Piloto faz uma relação entre o insucesso do projeto de construção da
Universidade no Paraná e sua ida para o Rio de Janeiro: “Não tendo podido empreender
isso (a Universidade), foi embora de sua terra. Foi dar trabalho a sua espantosa tenacidade,
erigindo, num esforço gigantesco, a mais ampla, completa e invejada ‘História do
Brasil.”35
Em 1911 publicou Contos e Pontos; em 1918, outro compêndio, História de São
Paulo, além de Notas de Viagem; em 1922, a História do Rio Grande do Norte e, em
1930, outro livro didático, História do Paraná. Em 1933 foi eleito para a Academia
Brasileira de Letras, mas já estava com a saúde debilitada. Morreu em 26 de junho de
1933, aos 76 anos.
2.1 O PENSAMENTO DE ROCHA POMBO
Duas das grandes preocupações a que se dedicou Rocha Pombo foram a história e a
educação. Educador desde muito jovem, ainda em Morretes, e intelectual preocupado com
o assunto durante toda sua vida, como podemos observar em seus artigos em jornais e
obras dedicadas ao assunto. A preocupação com a história, no entanto, veio mais tarde, já
quando morava no Rio de Janeiro e passou a escrever as obras já citadas. No exercício de
estudo de seus livros didáticos de história acredito estar perpassando as duas esferas, por
isso menciono brevemente a concepção do autor sobre estes dois ramos do conhecimento.
Comprovou, Rocha Pombo, exaustiva e exuberantemente ser o exercício da ciência histórica, para ele, num ponto de honra. Despiu-se de todas as possíveis paixões já tidas, e até das suas propensões religiosas ou
34 SILVA. op.cit. p. 4 35 PILOTO. Rocha Pombo. op. cit. p. 20.
19
ideologias, para empreender a vasta obra, e sempre assim procedeu ao trabalho de assuntos históricos.36
No prefácio do primeiro volume da História do Brasil, Rocha Pombo escreve
sobre “A Concepção Moderna da História”, e é a partir deste texto que comento sua
concepção de história. O autor inicia com a discussão que até hoje presenciamos: seria a
história uma ciência? Rocha Pombo acredita que sim, pois já pode-se “ordenar os
phenomenos que se manifestam nos aggrupamentos humanos isolados; si já nos
habilitamos a systematizar factos relativos á vida e ao desenvolvimento de uma nação.”37
As leis aplicadas as demais ciências sociais podem virar leis históricas. Por exemplo,
Rocha Pombo menciona o progresso. Em nota, o autor ainda explica aquilo que entende
por progresso: os avanços que fazem os intelectuais, com suas descobertas e ideias, é o
“trabalho de ir passando para o domínio das collectividades as conquistas que vão fazendo
os indivíduos mais capazes de esforço intellectual”.38 É interessante notar aqui que, ao
contrário de muitos autores da época que pensavam o progresso como um avanço material,
Rocha Pombo se preocupa muito com o avanço intelectual e moral, daí sua grande atenção
com a história e a educação. Segundo o autor, o que faz com que a história não pareça uma
ciência é essa aparente desordem, que faz acreditarmos que tudo é eventual na vida dos
povos. Mas, conforme os intelectuais vão avançando, vai-se percebendo as relações, a
ordem, e a sistematização da história.
O próprio Rocha Pombo, porém, não realizava pesquisas apoiadas em fontes
primárias, em arquivos, como o fazem hoje os historiadores. Este é um elemento relevante
para compreender seu pensamento acerca da história. Ele mesmo reconhecia a importância
da visita aos arquivos na Europa, mas lamentava não possuir a oportunidade de fazê-lo.39
Assim, este intelectual se baseava nas pesquisas de outras pessoas para construir sua
narrativa e sua interpretação. Assim nos diz Maria Tarcisa Silva Bega:
A análise, mesmo que superficial, de suas obras históricas indica que o autor navegava numa corrente oposta à dos historiadores da época como Capistrano de Abreu, por exemplo, que entendiam a historiografia como produção apoiada nas fontes documentais. Rocha Pombo, sem condições financeiras para pesquisas inéditas, utilizava-se de pesquisas de outros procurando expressar a
36 PILOTO, V. Morretes e Rocha Pombo. op.cit. 37 ROCHA POMBO. “Prefácio”. In: História do Brasil. 10 v. Rio de Janeiro: JF Saraiva e C. Editores, [1905-1930] 38 Ibid., p. VIII 39 NESTOR VITOR. Obra Crítica. v. 3 Rio de Janeiro/ Curitiba: Fundação Casa Rui Barbosa/ Secretaria do Estado da Cultura e do Esporte, 1979. p.6.
20
sua interpretação do que deveria ser o homem brasileiro e noções como de nacionalidade e brasilidade.40
Capistrano de Abreu era um dos mais renomados historiadores contemporâneos de
Rocha Pombo, e considerava a construção da história sem fontes primárias um “pecado
original”. E esta era a tendência de todos os autores do IHGB. Segundo Ricardo
Benzaquem de Araújo, Capistrano critica, em sua obra O Descobrimento do Brasil, de
1883, a teoria de que um francês chamado Cousin teria descoberto a América antes de
Colombo. O motivo para esta crítica é exatamente o fato de que não são apresentadas
fontes primárias, contemporâneas, que comprovem o fato.41 A fonte primária, para
Capistrano, é o que caracteriza uma obra como histórica, e dá um caráter de verdade a sua
narrativa. Qualquer obra que não utiliza fontes é caracterizada mais como crônica do que
como um trabalho científico. Porém, mesmo com as críticas, já na época, ao trabalho de
Rocha Pombo, parece que sua importância não diminuiu. A historiografia brasileira ainda
estava se desenvolvendo, havia uma carência de obras e autores nacionais estudando a
história do Brasil e estas críticas não impediram que muitos ainda se utilizassem da obra
de Rocha Pombo como referência no assunto.
A concepção de educação de Rocha Pombo é outro fator relevante para meu
estudo. As ideias acerca disto são algumas das conclusões presentes em meu relatório de
Iniciação Científica, na análise de seus artigos publicados no jornal Gazeta Paranaense,
do ano de 1882. Rocha Pombo defende a educação gratuita e obrigatória. Defende a
municipalidade da instrução, sendo o governo municipal responsável por uma educação de
qualidade, preparando bem os professores e controlando a frequência dos alunos. Segundo
ele, a número de escolas devia ser proporcional às necessidades da população.
O século XIX vê um grande crescimento populacional em todo o mundo. Neste
momento o crescimento acarreta e é acarretado principalmente pela urbanização e
industrialização. André Petitat nos mostra que, no fim do século XIX, os índices de
analfabetismo na Europa eram muito grandes. Esta realidade fez com que a educação de
uma forma geral se voltasse para as massas, com o objetivo de atingir a toda a população.
Rocha Pombo associa esta educação de massas ao trabalho industrial. Segundo Petitat,
existem vários elementos de relação entre a industrialização e instrução na Europa do
40 BEGA, op. cit. p.488 41ARAÚJO, R. B. “Ronda Noturna: Narrativa, crítica e verdade em Capistrano de Abreu”. In: Revista Estudos Históricos, n. 1, 1988.
21
século XIX.42 Em primeiro lugar, a utilização de tecnologia, que exigia conhecimentos
transmissíveis e aplicáveis através da escrita, mas este fator abrangia apenas uma parte dos
trabalhadores. Também a possibilidade de mobilidade social e geográfica fez com que as
pessoas procurassem a educação, pois eram conhecimentos indispensáveis para uma
ascensão. Há também um fator religioso, já que as igrejas contribuíram para popularizar a
instrução. Mas para este autor, o elemento que mais facilitou a massificação da educação
foi responsabilizar o Estado pela sua disseminação. Seu crescimento, o serviço militar
obrigatório, o sufrágio universal, e a obrigatoriedade da educação são elementos que
passaram a multiplicar as necessidades de uma educação e principalmente, da
alfabetização.
Petitat avalia questões gerais da Europa, que nos ajudam a compreender algumas
questões que estavam acontecendo no Brasil, principalmente porque era o grande modelo
seguido aqui. Porém, quando se pensa no contexto brasileiro, é preciso entendê-lo em suas
especificidades. Petitat nos apresenta questões importantes para nossa compreensão, mas
foca sempre a realidade europeia, e é preciso adaptar a análise do autor para podermos
compreender a relação entre trabalho e indústria feita por Rocha Pombo. O momento em
que este escreve é marcado pela transição do trabalho escravo para o livre. Este intelectual
acredita ser a educação um meio de elevar a qualidade do trabalho no Brasil. Isto, porém,
ainda não estava sendo feito no governo do Paraná daquele ano, de Carlos de Carvalho:
“os apuros em que está pondo a lavoura a extincção da escravatura, vão denunciando
claramente as imperfeições do ensino publico no Brazil.” 43 A educação deveria acontecer
para que os trabalhadores tivessem o mínimo de instrução, para que seu trabalho fosse
produtivo.
No entanto, não defende que a educação seja de qualquer tipo. Deveria ser uma
instrução específica, que levasse as pessoas ao trabalho e que lhes garantisse qualidade,
não apenas o ensino do alfabeto. “(...) não será o alphabeto o envangelho de nossa
almejada regeneração social; nem será a defeituosa instrucção que o Estado paga ás
crianças o meio de preparar o futuro da nação.”44 Ensinar apenas primeiras letras ao povo,
não fazia com que seu trabalho se tornasse mais produtivo, apenas lhes ocupava, enquanto
poderiam estar trabalhando, como aparece ainda no texto endereçado ao governo Carlos de
Carvalho:
42PETITAT, A. Produção da Escola/Produção da Sociedade: análise sócio-histórica de alguns momentos decisivos da evolução escolar no ocidente. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. p. 151. 43 ROCHA POMBO, Gazeta Paranaense. Curitiba, 13/05/1882. 44 Ibid.
22
De facto, s. ex. tem conseguido a creação de aulas nocturnas para adultos em quasi todas as escolas publicas. O movimento tem sido circunscripto até ahi. Ora, demos que cada escola nocturna pudesse apresentar annualmente dez ou vinte homens sabendo o alphabeto: que vantagens resultaria disso para o paiz! Serião talvez muitos homens mais roubados ao trabalho productivo; serião outros innumeros aspirantes a empregos publicos.45
Uma educação apropriada levaria o trabalhador a tornar mais produtivo e
aproveitável seu trabalho. Isto fica claro nos trechos que cita de M. Wickersham: “A
instrucção não inspira o desgosto do trabalho, mas impelle o homem a fazer completar
pela machina toda a parte do trabalho para que é necessária força...”46 e de Laveleye47: “A
agricultura se queixa da falta de braços, e responde-se-lhe que o unico recurso é substituil-
os por machinas. Mas para empregar machinas é preciso que os operarios sejão habeis,
cuidadosos, intelligentes etc..”48
É neste momento que se observa a relação entre a educação e o processo de
industrialização. A ideia de máquinas, e cada vez máquinas mais complexas, possui uma
íntima relação com a industrialização, para Rocha Pombo, e ainda uma apologia à
tecnologia. Magnus Pereira afirma que o Paraná do século XIX não possuía os requisitos
considerados necessários para a industrialização, porém, a indústria do mate era muito
avançada e tecnificada. “Não fosse pela utilização simultânea de mão-de-obra livre e
escrava, a indústria ervateira, caso localizada na Europa, incluir-se-ia sem qualquer
ressalva entre tantos outros ramos industriais que seguiram trajetórias similares”.49 Assim,
Rocha Pombo pensa a industrialização baseado nos exemplos do exterior, mas também no
exemplo paranaense, do qual era muito próximo.
Este discurso da instrução voltada ao trabalho tinha dois objetivos, a meu ver. Em
primeiro lugar, pretendia uma mudança efetiva no trabalho braçal, que fosse mais
especializado e aproveitável. Em segundo lugar, pretendia fazer com que a escola
procurasse modelar a forma de pensar do homem para um tipo de atividade específica. Os
objetivos, segundo Mirian Jorge Warde, eram “mais do que o atingimento de altos graus
de eficiência do trabalho; a finalidade principal era a conquista/amoldamento da alma
humana.”50 Isto porque o Brasil estava passando por uma transição entre trabalho livre e
45 ROCHA POMBO. Gazeta Paranaense. Curitiba, 13/05/1882. 46 Ibid., 17.05.1882. 47 Émile Louis Victor de Laveleye (1822-1892). Economista belga, também escreveu obras de história e literatura. 48 ROCHA POMBO. Gazeta Paranaense. Curitiba, 13/05/1882. 49 PEREIRA, M. R. M. Semeando iras rumo ao progresso. Curitiba: Ed. UFPR, 1996. p.18. 50 WARDE, M. J. “Prefácio”. In: CARVALHO, M. M. C. Molde nacional e forma cívica: higiene, moral e trabalho no projeto da Associação Brasileira de Educação (1924-1931). Bragança Paulista, SP: EDUSF, 1998.
23
escravo, e as pessoas ainda não viam o trabalho como algo que dignificaria o homem, mas
como uma tarefa degradante.
24
3. HISTÓRIA DA AMÉRICA
História da América é um livro didático que foi publicado duas vezes, nos anos de
1900 e 1925. Seu texto foi escrito para um concurso promovido pelo Estado para obras
didáticas que tratassem da América. Para o presente trabalho, tive acesso às seguintes
fontes: o parecer de Manuel Bonfim, que aprova o texto no concurso, e as duas edições do
livro. Quanto ao texto do livro, trato de três versões diferentes: 1- o manuscrito inicial, que
Rocha Pombo mandou para o concurso, antes de ser aprovado e publicado (não tive acesso
a este texto, mas deduzo seu conteúdo a partir das críticas de Bonfim); 2- a primeira
edição, já alterada pelas sugestões de Bonfim e 3- a segunda edição.
A primeira edição da História da América inicia com o edital do concurso que
aprovou Rocha Pombo, de 1898. Neste texto estão presentes as intenções do concurso, de
fazer um livro para a educação, destinado não apenas aos educadores, mas principalmente
aos alunos. O edital determina que o livro deveria tratar da história da América, menos o
Brasil, que teria espaço reservado em outros manuais, em outras oportunidades. Deveria
ressaltar os grandes fatos e grandes homens da história dos povos pré-colombianos, da
descoberta, colonização e independência. Menciona ainda algumas regras do concurso,
como o prêmio do vencedor.
Logo depois do edital essa edição traz o parecer de Manuel Bonfim, apresentado ao
Conselho Superior de Instrucção Publica do Distrito Federal, em abril de 1899. Manuel
Bonfim era, neste momento, professor de Educação Moral e Cívica na Escola Normal do
Rio de Janeiro, e posteriormente tornar-se-ia diretor da Instrução Pública, além de autor de
livros didáticos de história. Bonfim inicia afirmando que o único trabalho inscrito no
concurso foi o de Rocha Pombo, e isto não o surpreende, já que reconhece ser a história
uma disciplina científica, não fácil de ser produzida, diferente da literatura. Na seqüência,
tece muitos elogios a narrativa de Rocha Pombo, afirmando que este escreve história como
os clássicos, e sua escrita apaixonada comove o leitor.
Manuel Bonfim faz uma resenha da obra, observando algumas características,
como a valorização de elementos morais, além dos comumente assinalados sociais e
políticos. Esta visão de moralidade é a visão da colonização como exploração, como um
saque. Os portugueses e espanhóis não teriam vindo a América com o objetivo de se
estabelecer, mas de tomar destas terras tudo o que podiam para se beneficiar, tomar as
riquezas dos povos que aqui encontraram e ainda escravizá-los criando um conflito entre o
25
colono e o nativo. Bonfim observa ainda que esta postura não era individual dos colonos,
mas incentivada pelo Estado espanhol, que lucrava muito com as arrecadações. Faz ainda
uma comparação com a colonização da América do Norte, que teria sido mais estável, por
indivíduos que buscavam “a paz e a liberdade espiritual, individuos que traziam o firme
propósito de crear aqui uma segunda patria”.51
Bonfim concorda com esta visão, porém critica algumas posições do autor. A
narrativa apaixonada de Rocha Pombo critica muito enfaticamente alguns personagens
históricos, presidentes e governadores, que ele apresenta como criminosos e é, na visão de
Bonfim, exagerada, chegando a afirmar: “ (...) dentre os seus julgamentos e conceitos, ha
muitos que desejariamos alli não estivessem. (...) Taes condemnações não cabem nas
paginas de uma história (...)”.52 As críticas principais, segundo Bonfim, são aos nossos
inimigos, principalmente os ditadores Rosas53, Francia54 e Lopez.55 Porém são
consideradas críticas muito exageradas, quando apenas a narração dos fatos bastaria,
principalmente quando escritas por um brasileiro:
Taes juizos, que da parte de qualquer outro seriam pelo menos, precipitados, da parte de um brasileiro, tornam-se mesmo suspeitos. Homens que foram nossos adversarios, cuja política o governo brazileiro de então contrariou e combateu, e que foram vencidos, elles impõem-se ao nosso respeito e á nossa generosidade. O Brazil será sempre suspeito para julgal-os, principalmente a esses do Paraguay, maxime antes que a Historia tenha averiguado e decidido a parte em que concorremos para a desgraça dessa inditosa nação.
No texto final da obra, que foi publicado, a caracterização destes ditadores está
amenizada, certamente pela interferência de Bonfim. Os ditadores são mostrados pelo
autor como tiranos, que governaram com violência, mas em nenhum momento aparecem
os julgamentos citados por Bonfim. Rocha Pombo, acredito, teria feito este exagero para
exaltar a participação do Brasil, já que, segundo o autor, a Guerra do Paraguai derrubou
este governo ditador, e salvou o Paraguai, ideia que se repete ainda em Nossa Pátria.
Manuel Bonfim ainda reconhece que, apesar de considerar as críticas muito
exageradas, a imparcialidade do historiador é impossível, e que, não apenas por se tratar
de um livro didático, a história deveria ser vazia de críticas e análises. Os textos 51 BONFIM, M. “Parecer”. In: ROCHA POMBO. História da América. 1. ed. Rio de Janeiro: Laemmert & C. Editores, 1900. 52 Ibid. Grifo no original. 53 Juan Manuel de Rosas (1793-1877). Foi Governador de Buenos Aires de 1829 a 1832, e depois, novamente de 1835 a 1840, desta segunda vez com amplos poderes públicos, como um presidente da República. 54 José Gaspar Rodríguez Francia (1776-1840). Foi um ideólogo da independência do Paraguai em 1811, tornando-se chefe do governo temporário e, em 1816, governo permanente. 55 Francisco Solano López (1827 -1870). Presidente do Paraguai de 1862 a data de sua morte.
26
simplesmente factuais levam os alunos a decorá-los, deixando de lado faculdades
superiores. Bonfim afirma ainda que existem alguns erros na obra, exemplificando o caso
da revolta de 1890 na República Argentina, que teria sido provocada pela Armada, que é
uma confusão com a revolta chilena da mesma época.
Neste momento pode-se notar uma certa contradição do texto de Bonfim. Afirma
ele que o historiador deve sim fazer reflexões, comentários e críticas em sua narrativa, mas
que não deve jamais julgar a história e seus personagens. Mas como saber a diferença
entre um e outro? Quais os limites? Estes comentários do autor podem, a meu ver, ter dois
significados. A primeira possibilidade é a da preocupação do texto formal, daquilo que
seria o “exagero” da escrita do historiador. A segunda opção, e aquela que acredito ser a
mais provável no discurso de Manuel Bonfim, é a de possíveis questões diplomáticas.
Bonfim defende a ideia da fraternidade entre os povos americanos, e o fato de julgar e
acusar os passados governos dos outros países poderia ferir este princípio, e talvez ofendê-
los, por não fazermos parte deste passado. Isto fica evidenciado nos momentos em que diz
que Rocha Pombo não poderia fazer estas críticas, principalmente por ser brasileiro.
Por fim, Bonfim faz algumas observações sobre questões gerais do livro,
principalmente com relação ao edital do concurso, que não foi seguido à risca. Em
primeiro lugar, a separação entre capítulos do livro, que deveria ser feita em três partes
(período pré-colombiano, colonial, e independente) e foi feita em quatro. Porém o próprio
Bonfim já afirma que esta divisão foi refeita, sendo os dois últimos capítulos
transformados em apenas um, e subdividido. Na segunda edição do livro, o edital não mais
deve ser seguido, já que o concurso era apenas para a primeira edição, e a separação volta
a ser em quatro partes, como era no primeiro texto, antes da interferência de Bonfim. Esta
é a única diferença dos textos da primeira e da segunda edições, não há, entretanto,
modificações no conteúdo da obra, nem na separação de capítulos. Mas, mesmo assim,
afirma Rocha Pombo que trata-se de três fases da história americana, denominando-as na
introdução desta segunda edição como: “a phase dolorosa (a da conquista); a phase do
noviciado ou da aprendizagem (a da colonia); e a phase heroica (a da independencia e da
organização nacional)”.
Os títulos destas partes são: 1 – Período pré-colombiano, 2 – Período Colonial, 3 –
Emancipação das colônias americanas e 4 – Integração das nacionalidades americanas (na
primeira edição esta quarta parte é uma subdivisão da terceira, porém o nome e o conteúdo
são mantidos). Também este capítulo de meu trabalho foi subdividido desta forma, apenas
para uma melhor organização do texto.
27
Também afirma Bonfim, de volta na primeira edição, que as partes do livro que
tratam especificamente de História do Brasil devem ser excluídas. Entretanto, há uma nota
de rodapé neste momento que afirma “Por deliberação ulterior do Conselho esses capítulos
foram mantidos”. Esta é uma das duas recomendações de Bonfim que não foram seguidas
por Rocha Pombo, sendo a segunda comentada mais adiante. Por fim, Bonfim ainda faz
um detalhamento de cada uma das três partes, ressaltando as partes que estão muito
extensas e as que podem ser ainda mais desenvolvidas. No prefácio da edição de 1925,
entretanto, Rocha Pombo afirma ter modificado a separação dos capítulos, já que para a
segunda edição não mais precisa seguir o formato do concurso. Afirma, no entanto, que
não fez alterações no conteúdo.
Este parecer é um texto bastante importante para a análise desta obra. Não sabemos
ao certo se existiram outros textos da mesma natureza, escritas por outros autores, mas
comparando o parecer com o texto do livro podemos saber exatamente o que foi alterado
do texto original escrito por Rocha Pombo. Podemos saber mais especificamente quais
eram as ideias deste autor, e quais foram sugeridas, por se tratar de material oficial.
O prefácio do livro é mantido igual nas duas edições. Inicia com um discurso
claramente progressista, e condenando a invasão europeia. Rocha Pombo afirma que os
dois impérios da América – o México e o Peru – estavam caminhando para a civilização,
avançando, no momento em que chegaram os europeus. Certamente, se não fosse pela
interferência europeia, estas sociedades teriam evoluído muito mais, em alguns séculos.
As diferenças de índole e a inferioridade do indígena levaram à redução de sua cultura.
Mesmo sem conhecer a fundo a história das sociedades pré-colombianas, Rocha Pombo
afirma que a chegada do europeu significou uma ruptura em sua história. O fato mais
notável deste momento é o encontro de duas raças, duas culturas, que se mesclaram.
A América foi, desde o começo, um lugar onde houve diversidade, diversos povos
em contato. Neste momento o autor faz uma grande valorização ao que chama de “Ideia
Americana”. Este sentimento americano está sempre presente na obra, pois seria o
elemento que moveu os povos, procurando a emancipação e lutando por seus países:
(...) o estimulo que dirige todo um conjunto de povos, irmãos pela solidariedade do destino, para a ampla vida nova, que recebe da historia o que o passado fez de grande, e funda no amor e na justiça, no dever e no direito, que constituem a plenitude da existência moral, o desenvolvimento deste augusto patrimonio.
Assim, Rocha Pombo entende que a história da América traz uma lição de
moralidade, de fraternidade, e é preciso que seja conhecida por todos nós para buscarmos
28
a união dos países americanos, ressaltando nosso amor pela liberdade, e dando nova feição
ao nosso civismo. Estas passagens são muito importantes, pois mostram que o autor
acreditava, de certa forma, que o estudo do passado serve para melhorarmos e
transformarmos o presente, um caráter escatológico da história. É interessante observar
que no pequeno texto de abertura da segunda edição, de 1925, o historiador retoma este
assunto. Afirma que, desde que foi escrito o compêndio, o sentimento de união e o espírito
de fraternidade entre os povos americanos foi fortalecido. Rocha Pombo encontra um
desejo dos países americanos em conhecerem uns aos outros, como se fossem uma família.
E neste comentário, o próprio autor reconhece que sua obra, escrita vinte e cinco anos
antes, trilhou o rumo certo dos acontecimentos e das suas tendências. Exprime, ainda, seu
desejo de um dia dar continuidade a esta obra, iniciada em 1897, com os acontecimentos
dos 25 anos que separam esta edição da primeira e também com os movimentos
intelectuais surgidos nos 50 anos precedentes.
Voltando agora ao prefácio da obra, o autor ainda ressalta o fato de a história da
América ser pouco estudada nas escolas, o que acredita dar-se pela inexistência de bons
materiais didáticos.56 Por fim, afirma que seu critério histórico é o mesmo dos
historiadores clássicos e contemporâneos, é o amor à verdade. Faz uma breve reflexão
sobre a ação das massas e dos indivíduos na história, citando as teorias de Taine57, e chega
à conclusão de que a individualidade é a síntese de uma determinada época, e em torno
dela está a vida coletiva. Daí a importância de ensinar os feitos, nomes, obras e
pensamentos do passado. Quando se destaca um determinado personagem de uma época é
possível entendê-la. Esta é a visão tradicional de história presente em toda a obra de Rocha
Pombo. É uma história construída por grandes nomes e grandes fatos e neste prefácio
deixa clara sua escolha.
3.1 PERÍODO PRÉ-COLOMBIANO
Esta parte do livro é dedicada a dois grandes assuntos: a descrição da América –
relevo, clima, fauna e flora – e os povos indígenas – organização, política, monumentos,
cultura, com grande destaque para os dois impérios, Inca e Asteca. Bonfim observa que
56 Interessante notar que o estudo da história da América nunca foi priorizado nas escolas, até os dias de hoje. Como observou Rocha Pombo, a preferência sempre é dada à história do Brasil e à história geral – ou Universal, como era conhecida na época. 57 Historiador francês, viveu entre 1828 e 1893.
29
esta parte é muito extensa, e que deveria conter apenas o essencial. Em seguida faz uma
sugestão de reagrupamento de capítulos com seus respectivos nomes. Estas sugestões são
integralmente acatadas por Rocha Pombo.
No início, o autor faz uma longa descrição da geografia, clima, relevo, fauna e
flora da América. Apresenta a ideia de que a imensidão e a diversidade de climas faz com
que a América seja um lugar de igualdades, fraternidade: “parece destinada a fazer-se a
estação definitiva das raças humanas, fortemente accentuadas no seu temperamento e
capazes de fazer-se depositarias do patrimonio espiritual indestructivel que será a base da
unidade da civilização no planeta”. E ainda: “o espírito americano é um em todo o
continente”. Assim, o autor constrói uma argumentação de igualdade e fraternidade dos
diferentes países americanos baseado na diversidade, em oposição à Europa.
Este longo detalhamento de rios, montanhas, fronteiras, animais, plantas, clima, é
um detalhamento bastante incomum nos livros didáticos de história atuais, como já foi
mencionado. Mas é algo recorrente nos livros didáticos de Rocha Pombo, e previsto no
edital do concurso. Por isso podemos deduzir que, nesta época, era considerado conteúdo
desta disciplina, e servia como base, fundamento, para se compreender os fatos históricos
que são apresentados posteriormente. Sobre isto comenta Manoel Bonfim:
Se o Conselho exigiu que elle consignasse uma parte ao estudo da phisyographia, historia natural e prehistoria, foi para melhor methodizar a exposição, fornecendo, desde o começo, o subsidio necessario para a boa comprehensão de alguns phenomenos historicos ligados á natureza physica do continente americano.
As críticas de Bonfim foram bem acatadas nesta parte do texto. Em primeiro lugar,
quanto à extensão do texto. Bonfim afirmava que esta descrição física era muito extensa,
chegando a 85 páginas! Afirmava que era importante este subsídio, como citado acima,
mas que a extensão que propusera Rocha Pombo fora muito exagerada. E a versão final da
obra, muito reduzida, apresenta apenas 33 páginas.
Também observa Manuel Bonfim que o autor do livro inicia um de seus capítulos
afirmando que “sob o ponto de vista botânico, as duas penínsulas (América do Norte e
América do Sul) não oferecem grandes diferenças.” Bonfim discorda radicalmente desta
postura, afirmando que a única semelhança entre os dois hemisférios é a riqueza em
espécies. No livro que temos acesso, Rocha Pombo corrige exatamente estes pontos,
passando a explicar, brevemente, em um parágrafo cada, as características da flora nos
dois continentes.
30
Depois desta parte da botânica é que temos a segunda sugestão de Bonfim que não
foi acatada por Rocha Pombo. Sugere Manuel Bonfim que seja acrescentada uma breve
descrição da natureza geológica americana, mas isto não está presente no texto final. Em
seguida, Bonfim faz uma descrição da fauna americana, com uma ausência de grandes
mamíferos. Esta descrição é incorporada no texto de Rocha Pombo, porém de forma mais
sintetizada.
Quanto à descrição da população nativa, Rocha Pombo reconhece que havia
diferenças entre as diversas tribos, mas não explora estas diferenças a fundo. Apenas
afirma que todos deveriam possuir parentesco, pelas semelhanças físicas. Esta discussão
era bastante recorrente na historiografia da época. Alguns historiadores ainda tratavam os
índios como sendo um só povo, com uma só cultura. Outros já começavam a reconhecer as
diferentes etnias, culturas, e particularidades das tribos, como, por exemplo, Von Martius,
que influenciou a obra de Rocha Pombo. Porém, o reconhecimento destas diferentes etnias
é apenas mencionado, tanto por Von Martius como por Rocha Pombo, sem buscar detalhes
ou aprofundamentos.
Na descrição de Rocha Pombo sobre os índios, fica evidente seu caráter evolutivo.
A interpretação do “desenvolvimento” destes povos é baseada no quanto e em quais
aspectos se parecem com os europeus. Os critérios usados são o avanço nas construções de
prédios e monumentos, principalmente, mas também a comunicação com outros
continentes, organização política, língua, costumes etc. Ainda, para valorizar a figura do
índio, o autor aponta que a democracia moderna já existia nas sociedades indígenas mais
avançadas – Peru e México - pois estes colocavam a comunidade antes do indivíduo, a
educação era comum a todos, os cargos eram sempre elegíveis etc. É interessante notar
que, neste momento, Rocha Pombo não parte do estranhamento para pensar o índio, mas
da semelhança. É claro que o conceito de democracia é distorcido para valorizar o
indígena, e para afirmar que também a América foi influenciada por estas culturas.
Entretanto, esta visão entra em contradição quando compara os Incas e Astecas
com os demais índios do território americano. As tribos que não faziam parte dos dois
grandes povos aparecem como se tivessem deixado os impérios. Assume o autor que no
passado, todos fizeram parte de um dos dois, e que entraram em decadência no momento
em que se separaram. Essas tribos é que são consideradas inferiores, bárbaras. Esta visão
de que os indígenas estariam num momento de decadência de sua civilização é uma clara
influência de Von Martius, que, em 1845, escreve um texto afirmando que os índios não
31
estavam no estágio “primitivo” do homem, mas em declínio58. Para Rocha Pombo, a
evidência de que teriam feito parte no passado é a semelhança encontrada em alguns
costumes. Afirma Rocha Pombo:
Portanto, separadas do Mexico e do Perú, as numerosas tribus que viviam no continente apresentavam pela maior parte todos os caracteristicos da barbaria regressiva, algumas entrando já no período subsequente do primeiro sedentarismo, e muitas delas, as do centro principalmente, haviam descido á nomadia.
Cinco capítulos inteiros são dedicados aos dois grandes impérios: Inca e Asteca.
Além de descrever sua cultura, organização, monumentos, o autor compara
constantemente estes povos com os povos asiáticos da China e Índia. O último capítulo da
primeira parte do livro é muito interessante, pois faz uma reflexão sobre qual seria o
destino destes povos se os europeus não tivessem intervindo. Nomeado “Prognostico sobre
o destino provavel da civilização aborigena interrompida”, o décimo primeiro capítulo
inicia supondo que a semelhança entre os povos da América e da Ásia seja exatamente por
terem os índios americanos proveniência asiática. Rocha Pombo questiona se os povos
americanos iriam evoluir sempre da mesma forma. O próprio autor responde que não, que
estas sociedades estavam à beira de uma grande mudança. As tensões constantes mostram
que estavam prestes a entrar em grandes guerras e a se militarizar. As tribos menores iriam
atacar os impérios, e iria acontecer algo muito parecido com o ataque dos bárbaros aos
romanos, na antiguidade. Arrisca ainda a afirmar que, se os europeus tivessem chegado
aqui depois destas transformações, teríamos uma nova era na história, e seriam oferecidos
à Europa, “os novos e ricos elementos constituídos pelas raças fortes da América”.
Esta capacidade de reflexão acerca do processo histórico é uma característica
notável na obra de Rocha Pombo. Neste momento, o autor deixa um pouco de lado sua
narrativa de grandes fatos, grandes heróis e longas descrições para pensar, analisar aquilo
que está escrevendo. Pode-se ver que Rocha Pombo, apesar de ver a história como um
desencadeamento lógico de fatos, neste ponto da obra aponta outras possibilidades, que
talvez os acontecimentos tivessem ocorrido de forma diferente. Sua capacidade de
comparação é também uma característica bastante enriquecedora. Entretanto, mesmo suas
reflexões estão marcadas por uma visão cientificista e progressista de história. Quando
coloca a hipótese de que se os europeus não tivessem chegado aqui no século XV, afirma
58 Ver MARTIUS, C. F. P. Von. “Como se deve escrever a História do Brasil – Dissertação oferecida ao Instituto Histórico e Geográfico do Brasil”. In: O estado do direito ente os autóctones do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da USP, 1982.
32
que certamente a história teria se desencadeado da outra determinada forma. Como se
fosse possível prevê-la. Esta previsão é baseada na linha do tempo europeia, que a
América estaria retraçando. Também as comparações possuem este caráter. A narrativa de
Rocha Pombo possui um tom teleológico, dando a entender que os fatos históricos nunca
acontecem de maneira única e isolada, mas sempre seguem o rumo de uma sociedade que
já esteve na mesma fase da evolução.
3.2 PERÍODO COLONIAL
A segunda parte do livro é dividida em capítulos que seguem a seguinte sequência
de temas (não sendo apenas um capítulo para cada tema): o descobrimento, seguido de
alguns comentários de conjuntura da Europa; as explorações e as lutas entre europeus e
índios; as primeiras explorações dos territórios, separadamente México, Peru, e juntos no
mesmo capítulo Chile, Rio da Prata e Califórnia; as questões da luta e incorporação dos
índios; os escravos africanos (que, ao contrário dos índios, possuem apenas um capítulo a
seu respeito); e, por fim, as administrações das colônias, divididas em 1 – colônias
portuguesas, 2 – colônias espanholas, dividido em A – México, B – Nova Granada, C –
Peru, D – Chile, E – Rio da Prata, F – Antilhas; 3 – colônias francesas e 4 – colônias
inglesas.
As sugestões de alterações do parecer de Manuel Bonfim foram todas acatadas
nesta segunda parte do livro. A maioria delas é com relação à separação e nomeação dos
capítulos. Com relação ao conteúdo, apenas sugere que o autor descarte uma parte do texto
em que pretende justificar os motivos do tráfico negreiro. Para Bonfim este foi um crime
sem justificações.
Quando inicia a parte de livro que trata do período colonial da América, afirma
Rocha Pombo que os europeus já “pressentiam” a existência da América há muito tempo.
A mais antiga evidência disto é o livro Timeu, de Platão, em que o filósofo ouve a história
que passa na Ilha Atlântica, no Oceano Atlântico. Esta narração é, para o autor, uma
evidência de que desde aquele tempo já se sabia da existência da América. Além de
Platão, também Aristóteles e Virgilio mencionavam elementos que fazem crer a Rocha
Pombo que já naquela época se tinha intenção de navegar em direção ao ocidente.
Esta postura de Rocha Pombo é uma clara tentativa de engrandecer a América. A
ideia de que o novo continente era algo esperado há séculos pelos europeus parece mais
33
enriquecedora que a de um simples acaso. Quando descreve os progressos navais e as
grandes navegações do século XV afirma que os europeus tinham o claro e único objetivo
de chegar à América. Ainda a ideia de novidade vem atrelada à modernidade, já que,
segundo o autor, “o alvorecer dos tempos modernos, isto é, a transição da Idade Média
para a Nova, assinala-se na Historia Humana por uma especie de commoção dos espiritos
(...)”, cujo principal elemento causador foi a existência de novos mundos.
Mais interessante que observar esta exagerada tentativa de valorização da chegada
à América é notar, na passagem acima, que Rocha Pombo identifica o “alvoroço” como
resultante da “transição da Idade Média para a Nova”. Fica evidente aqui a importância de
atrelar a chegada à América ao início da “Idade Moderna”, querendo passar a ideia clara
de que o novo mundo significa a modernidade, e a consequente desvalorização da “Idade
Média” ainda com a ideia de “Idade das Trevas”.59 E essa passagem de Idades é muito
enfatizada, como se as mudanças tivessem ocorrido no cotidiano de todas as pessoas, e
principalmente na sua mentalidade, que saía da ignorância e entrava na luz, representando
um momento de extrema ruptura. Porém há um detalhe talvez um pouco sutil, que deve ser
pensado. A narrativa de Rocha Pombo deixa a sensação de que a separação entre “Idade
Média” e “Idade Moderna” estava acontecendo naquele momento, como se fosse uma
clara ruptura na história, quando sabemos que estas denominações e separações entre
“Idades” foram feitas muito posteriormente por historiadores. Não fica claro se Rocha
Pombo realmente acreditava que as pessoas do século XV viram esta transição, ou se
queria que seu leitor acreditasse nisto.
A figura de Cristóvão Colombo é uma das mais exaltadas de todo o livro. Nos
primeiros capítulos desta segunda parte, as navegações e o descobrimento aparecem como
um empreendimento pessoal, e sua viagem é contada em detalhes, como se fosse uma
ficção com um personagem principal e seus pensamentos, sentimentos, medos. Colombo
foi um “predestinado”, um “emissário desconhecido do Destino”, que protagonizou o
grande feito. A exaltação desta figura, com detalhamentos de sua vida, faz parte da
concepção de história de Rocha Pombo, já mencionada, que destaca sempre os poucos
nomes que teriam “feito” a história.
Depois da descoberta do Novo Mundo, Rocha Pombo repete determinadas vezes
como era grande a glória de Colombo. Com estas glórias teria feito muitos inimigos, todos
descritos como sendo cobiçadores ambiciosos, inclusive Américo Vespúcio, que usurpou a
59 Este termo não é usado pelo autor, mas sua narrativa remete a esta ideia.
34
honra de nomear as terras. Porém, quando passa a narrar a conquista do vasto território, a
foco deixa de ser Colombo e a história do continente passa a ser a história da trajetória do
conquistador Cortez e depois Pizarro.
No entanto, neste momento, o tom da narrativa muda completamente. Ao contrário
de Colombo, Cortez e Pizarro não são homens “predestinados”, heróis destinados a
grandes feitos. São homens muito inteligentes e virtuosos, mas também gananciosos e
violentos, sabendo se aproveitar das inimizades das tribos indígenas em proveito próprio,
para alcançar o ouro e as riquezas. Nesta obra, os conquistadores representam todos os
espanhóis e, claro, uma civilização avançada, muito à frente dos índios. Porém, não
poupam nada ou ninguém para conseguir o que querem. Massacram a população local,
com suas armas superiores. Nas palavras do próprio autor: “Não pouparam nem velhos,
nem mulheres, nem crianças. A carnificina horrorizou alguns dos proprios hespanhoes.”
Porém, Pizarro possui menos importância que Cortez, por ter traído a Espanha ao tentar
fazer um governo independente da Coroa, na América e, por isso, é menos glorificado pelo
autor.
Para Rocha Pombo, há uma diferença entre os primeiros exploradores, que
descobriram a América, e aqueles que vieram depois. Os descobridores – principalmente
representados por Colombo – eram pessoas virtuosas, com boas intenções. Os europeus
que vieram depois foram movidos pela notícia das riquezas desta terra, queriam levar toda
riqueza que pudessem para a Europa, sem intenção de se estabelecer aqui. Eram
saqueadores e vinham das “camadas inferiores das grandes cidades: quer dizer – ou eram
criminosos degradados, ou homens pervertidos pela miséria e pelos vícios, e para os quaes
a vida de aventureiros, favoneada de todas as esperanças, era um vasto horisonte aberto no
escuro da sua desgraça.”
A meu ver, esta narrativa traz uma visão complexa, com algumas contradições. O
objetivo de Rocha Pombo é o de valorizar a cultura latino-americana, em detrimento da
visão eurocêntrica da história. Por isto é que passa a fazer esta imagem dos espanhóis, de
saqueadores, gananciosos, impiedosos, que massacraram a população local. Mas em
nenhum momento o autor deixa de admirar-se com a enorme diferença do progresso entre
os dois grupos. Os índios não são virtuosos nesta narrativa, apenas mais fracos. Os
europeus, apesar de seu péssimo caráter, ainda são considerados superiores.
Esta contradição acontece, acredito, pois este não é o discurso recorrente nas outras
obras de Rocha Pombo. Sempre vemos o autor narrando os europeus e a Europa como o
modelo de virtudes e progresso que devemos seguir. Nesta obra em específico, procura
35
adotar outra postura, mas não consegue se desfazer totalmente da visão do europeu como
ideal.
Esta visão contraditória dos europeus em História da América era também comum
em seu contemporâneo Manoel Bonfim. Segundo este autor, os primeiros colonos que
vieram ao Brasil tinham um objetivo de fazer uma exploração estável, porém, os demais
colonos não tinham este mesmo objetivo. Bonfim escreveu diversas obras com esta
opinião negativa dos europeus. Seu objetivo era criar uma tradição e uma historiografia
latino-americana, em detrimento do eurocentrismo. A diferença entre os dois autores é que
Rocha Pombo apresenta esta visão apenas em História da América, e Manoel Bonfim
lutou por esta causa toda sua vida. Porém, os intelectuais que possuíam esta visão não
eram a maioria. Silvio Romero, por exemplo, escreveu uma obra chamada América Latina
para reafirmar o eurocentrismo e refutar a obra de Manoel Bonfim.60
De volta à obra de Rocha Pombo, a narrativa toma um tom quase literário. A
trajetória dos personagens é narrada em detalhes, cada passo, cada batalha, cada
pensamento, cada sentimento. Como já foi dito anteriormente, Rocha Pombo não constrói
sua história com fontes primárias, mas com trabalhos de outros historiadores. Não se sabe
exatamente quais eram estes historiadores nos quais se baseava. Não há citações das obras,
apenas encontramos passagens que dizem: “diz um historiador...”, mas qual historiador e
qual obra, não temos informação. O máximo que temos acesso é uma lista de bibliografia
indicada no fim dos capítulos da primeira edição. Acredito que muitas das passagens da
obra sejam parte da imaginação do autor, que deduz os sentimentos e pensamentos dos
personagens. E ainda pode-se observar que o autor atribui valor aos personagens, sendo
sempre heróis ou vilões. Os primeiros são sempre íntegros, honestos, corajosos,
inteligentes. Os segundos não possuem caráter, são desonestos e ambiciosos. Esta é mais
uma característica importante a compreensão da concepção de história de Rocha Pombo, e
da construção de sua narrativa.
Com relação aos jesuítas e missionários, Rocha Pombo mantém o tom crítico. Os
padres aparecem como pessoas corajosas, que corriam grandes riscos para ajudar o povo
indígena. Fundaram escolas, missões, catequizaram os índios, todas ações que este povo
precisava. Para Rocha Pombo, estas ações dos missionários foram positivas, ajudando os
índios a serem incorporados na nova sociedade que se formava. Entretanto, Rocha Pombo
critica a forma como foram feitas estas ações. O padre era a figura central das reduções, os
60 REIS, J. C. “Manoel Bonfim e a identidade nacional brasileira.” In: LOPES, Marcos Antonio. (Org.) Grandes Nomes da História Intelectual. São Paulo: Contexto, 2003.
36
índios trabalhavam para ele e lhe deviam obediência. As escolas apenas ensinavam a
religião, já que uma instrução mais completa, científica, faria com que estes índios se
libertassem, e a religião era apenas a católica, sendo eliminadas as crenças dos índios.
Criava-se um regime que se caracterizava “por uma submissão absoluta, pelo
cancellamento da personalidade do selvagem, pela ignorancia, pelo fanatismo, e pelo ódio
voltado a todo estrangeiro”. Segundo Rocha Pombo, a forma como os padres tratavam os
índios era melhor que a forma como os exploradores os tratavam, com escravidão,
violência e morte. Mas ainda assim, exploradores e missionários, são “dois meios de matar
o espirito de uma raça.”
No que refere à construção do povo americano, Rocha Pombo observa que os
europeus eram em sua grande maioria homens, e das mais baixas camadas sociais e mais
baixo caráter. Estes homens se procriavam com as mulheres indígenas, que eram reduzidas
as piores condições de submissão, e as consequências e tal união foram repercutidas por
várias gerações. Esta análise simples do autor o faz chegar a conclusão de que o povo
americano apenas absorveu os vícios das duas raças, sem absorver também as virtudes. E
este passado é o motivo pelo qual o povo americano da sua época seja tão cheios de vícios,
sendo, para o autor, a razão de a América se encontrar em tão ruins condições no momento
que escreve, quando comparado com os EUA e a Europa.
A partir desde ponto é que Rocha Pombo inclui o africano em sua obra, mas em
apenas um capítulo. O tráfico negreiro é descrito como parte da ganância do europeu, que
trouxe os braços necessários para a exploração dos recursos da América o mais rápido
possível, já que estes europeus não tinham intenção de aqui se estabelecer. O autor afirma
que a comercialização de pessoas era uma prática já comum dentro do continente africano,
e atribui juízo de valor com relação ao caráter do africano. Os chefes das tribos não tinham
problemas em vender seus súditos e seus inimigos capturados. Afirma Rocha Pombo que
as comunidades africanas estavam em grande atraso. A única virtude do negro era sua
força física, e só trabalhava sob violência. Não possuía inteligência nem habilidades. A
visão do negro é bastante tradicional, é um personagem passivo, que estava nesta situação
exatamente pela falta de virtudes, e aceitava sua condição por isto. Ao contrário do índio,
que é caracterizado pelas inúmeras revoltas e rebeliões. O autor ignora completamente as
rebeliões e resistência dos negros. Esta imagem do africano fica bastante evidente nesta
passagem do texto:
37
O soffrimento, talvez que se deva crer veiu a despertar a consciência da raça. A tortura obrigou o negro a pensar no seu destino, á força de sentir o seu martyrio. Chegado á velhice, o africano deixava-se dominar por uma espécie de vaga nostalgia: dansando o seu samba, ao som lugubre de canções que lhe recordavam a terra distante, perdida para sempre, o velho africano chorava, numa resignação espantosa com a sorte, aceitando os males que padecia, como si fossem imposições ineluctaveis, de uma suprema misericordia, cujos segredos ninguem pode desvendar. O branco para elle era um ser de outra esphera. Diante do senhor ficava sempre como si estivesse em presença de ser sobrehumano. Assim degradado até a animalidade, o negro entregava-se a toda especie de vícios, e principalemente na embriaguez, ia como que afogando o sentimento de sua desgraça. Raras vezes chegava a protestar contra a tyrania do senhor. (...)
Novamente o autor enfatiza a característica passiva do negro, posteriormente,
quando descreve os movimentos de independência da América. Especificamente no
capítulo que fala do Haiti, Rocha Pombo chama atenção para o papel do negro. Este não
aparece mais como um personagem passivo, mas como um personagem que praticou
inúmeras revoltas e lutou pela emancipação. Porém, esta característica é tratada como uma
exceção, como uma característica original da história do Haiti. Esta visão de exceção é que
resulta na ênfase na passividade do africano, já que no restante do continente teria sido
diferente.
Manuel Bonfim, em seu parecer, faz alguns comentários sobre este assunto. Em
primeiro lugar compara a escravidão dos negros, que para ele foi um crime, com a da
Antiguidade, que teria sido um passo para o progresso. E afirma ainda que não importava
a situação dos negros na África: mesmo que eles tenham melhorado suas condições ao
virem para a América, a questão que importa é a degradação do senhor, que diminui seu
caráter ao possuir escravos.
Assim, o negro também trouxe seus vícios para a composição da população
americana. Esta visão de que a população foi formada por vícios tão fortes de cada uma
das etnias parece possuir um tom de justificativa da pobreza e “atraso” em que se
encontrava a América. Ora, o objetivo de Rocha Pombo com este livro, já ficou claro, é o
de criar, fortalecer a cultura latino-americana e, no entanto, nesta passagem, o povo
americano é descrito como tendo sido formado apenas por vícios. É quase como querer
culpar as etnias do passado pela situação difícil da América.
Rocha Pombo lutou pelo fim da escravidão, e no momento em que escreve a
abolição tinha recentemente ocorrido no Brasil. E tão rapidamente o autor consegue
afirmar que as diferenças entre as etnias acabaram junto com a escravidão e que, apesar de
o processo ter sido doloroso, a formação de um povo através da miscigenação é causa de
uma “verdadeira pacificação historica”. A narrativa de Rocha Pombo é em muitos
38
momentos contraditória, de tal maneira que gera dificuldades no entendimento de seu
pensamento. Neste ponto da formação étnica do povo americano pode-se ver um grande
exagero. A formação, no passado, era repleta de sofrimentos, injustiças e vícios. Mas
todos estes males foram completamente vencidos para formar uma sociedade de justiça e
igualdade. E chega a afirmar ainda que o negro escravo do Brasil viveu em muito melhor
condição que aqueles que viviam na África, como selvagens. Esta visão de que em sua
atualidade os problemas foram resolvidos pode ser porque, neste momento, estava-se
construindo o sentimento de nação no Brasil, e para isso era preciso uma perspectiva
otimista. Esta visão otimista é muito presente em Nossa Pátria, e será discutida mais a
fundo no próximo capítulo.
Depois desta questão étnica, a obra inicia uma narrativa sobre a organização dos
governos espanhol e português na América. Além de grandes nomes de grandes heróis,
nesta parte, passam a ter destaque também as instituições, que foram criadas pelo governo.
Esta parte é dividida em seis, conforme a divisão territorial da época: 1 – México, quando
a figura de Cortez tem destaque principal; 2 – Nova Granada, que, num primeiro
momento, foi explorada para a extração de riquezas, sem o estabelecimento de
povoamentos, fincando em “atraso”; 3 – Peru, onde fica claro uma admiração do autor
pelos Incas, com constantes revoltas e uma cultura bem expressiva; 4 – Chile e 5 – Rio da
Prata, que foram as províncias que mais prosperaram, graças principalmente a boa índole
dos colonizadores que fizeram uma boa administração e as revoltas indígenas em número
reduzido; e, por fim, 6- Antilhas, que possuía grandes riquezas naturais, mas não teve
atenção grande por parte das metrópoles.
Apesar de todas as críticas, a forma de colonização de Portugal e Espanha, Rocha
Pombo entende que eram os dois únicos países com legitimidade para tal. Demonstra isto
em um capítulo destinado aos piratas, que para ele seriam todos aqueles que não eram
portugueses ou espanhóis, que vinham para a América em busca de riquezas. E ainda o
autor critica por serem atos incentivados pelos governos dos outros países europeus, como
Holanda, França e Inglaterra. Estes países são considerados como usurpadores, invejosos,
com claro juízo de valor por parte do autor. As partes da América que se tornaram
território francês são consideradas como usurpações do direito da Espanha às terras.
No final desta segunda parte da obra, o autor volta a comentar sobre a América do
Norte. No início da narrativa, Rocha Pombo conta a história de John Smith, um inglês “de
um caracter generoso e romanesco, de um espirito vivo e delicado, muito valente e muito
altivo (...)” Este personagem teria sido um aventureiro, que fazia amizade com os nativos.
39
Foi preso por uma tribo que o iria executar, mas foi salvo pela filha do cacique,
Pocahontas. Esta índia seria sua companheira, ajudando-o a explorar o continente. Mais
uma vez pode-se observar a valorização que o autor dá às lendas e histórias pessoais,
misturando os fatos históricos baseados em uma investigação de acordo com critérios
estabelecidos daqueles fatos vindos de imaginação e literatura.
A colonização deste território é considerada como um sucesso. As terras foram
divididas e famílias começaram a vir para a América para se estabelecerem
permanentemente. Esta é a grande diferença das duas colonizações, segundo o autor: o
fato de os europeus terem o objetivo de permanecer no território norte-americano e não no
latino-americano. Assim, toda a administração que foi construída foi muito eficaz, baseada
em valores morais muito fortes, como a liberdade religiosa, a propriedade e a democracia.
Parece-me que o exagerado elogio de Rocha Pombo à colonização da América do
Norte e a grande crítica a colonização da América Latina acontece para explicar a situação
que enxerga na sua atualidade. Para o autor é clara a diferença entre as duas partes do
continente com relação ao nível de progresso. Isto é bem explorado em outros textos, a
ideia de que o Brasil e os países do sul e centro da América estariam em “atraso” com
relação à América do Norte, principalmente os EUA. Este trabalho é uma forma de
“justificar” com o passado estas diferenças, de uma forma anacrônica, já que toda a análise
do passado é feita de acordo com o que o autor vê no presente.
Mesmo quando menciona o conflito com os índios, Rocha Pombo ameniza os
problemas, afirmando que “com muito geito e cautela, e ás vezes com rigor, iam os
colonos impondo-se ao respeito dos bandos errantes que batiam os sertões”, e que o
sentimento na colônia era de tranquilidade, animação geral e prosperidade. Estas
passagens que comparam a América do Norte com a América Latina mostram que a ideia
de “América” para Rocha Pombo era de todo o continente. Sua busca por fraternidade e
unidade do continente inclui os países do norte, principalmente porque são eles o grande
exemplo que devemos seguir, sendo o “modelo” norte-americano exagerado em diversas
partes do texto.
Esta ideia da diferença de caráter dos colonizadores da América do Norte e da
América Latina não é exclusiva de Rocha Pombo, mas está muito presente na
historiografia. Oliveira Viana afirma que os homens da Inglaterra e dos Estados Unidos
tinham um “idealismo orgânico” que formava homens práticos e objetivos, que tinham em
mente a sociedade que desejavam construir. Já no Brasil este mesmo autor afirma que
existia uma “cegueira” para a realidade, apenas um sentimento imaginativo, e que não
40
existia aqui um “povo” coeso com suas ideias, mas interesses de grupos menores.61
Também, posteriormente, em Sérgio Buarque de Holanda, há uma atribuição de “culpa”
aos colonizadores portugueses pelo suposto “fracasso” do Brasil, já que estes não
souberam explorar as riquezas deste território, enquanto os colonizadores ingleses, mesmo
com menos riqueza natural, tiveram mais sucesso. A comparação entre as duas formas de
colonização é quase inevitável para a historiografia, e é muito comum atribuir o sucesso lá
e o fracasso aqui ao tipo de colonização e ao próprio colonizador.
3.3 EMANCIPAÇÃO DAS COLÔNIAS AMERICANAS E INTEGRALIZAÇÃO DAS
NACIONALIDADES AMERICANAS
Como já foi mencionado, existe uma diferença nas duas edições quanto a esta
divisão. Na primeira edição, estes são dois subtítulos da terceira parte do livro:
Emancipação das colônias americanas e Integralização das nacionalidades americanas.
Já na edição de 1925, são separados em duas partes, mas os títulos são mantidos, assim
como o texto e a separação de capítulos. É uma mudança apenas formal. Na primeira
divisão, Emancipação das colônias americanas, os temas tratados são os seguintes: em
primeiro lugar, uma conjuntura da América, e depois os movimentos de emancipação,
tratados separadamente por região geográfica, a saber: EUA, Nova Granada, Rio da Prata,
Chile, Paraguai, México, Cuba, Haiti e Brasil. A segunda divisão, Integralização das
nacionalidades americanas, trata um pouco da política, economia e guerras pós-
independência, também separados por país: EUA, México, Guatemala, São Salvador,
Honduras, Nicarágua e Costa Rica (estes últimos 5 conjuntamente); Argentina; Uruguai e
Paraguai (conjuntamente); Chile; Peru e Bolívia (conjuntamente); Colômbia, Venezuela e
Equador; Brasil; Haiti e São Domingos. Por fim, um capítulo sobre os “Prognósticos dos
destinos do novo mundo”.
Com relação ao parecer de Bonfim, os comentários desta terceira parte dizem
respeito apenas à separação e titulação de capítulos, e todos são acatados por Rocha
Pombo.
61 BRESCIANI, S. “Identidades inconclusas no Brasil do século XX – fundamentos de um lugar-comum”. In: BRESCIANI, S; MAXARA, M. (Orgs.). Memória e (res)sentimento: indagações sobre uma questão sensível. Campinas: Editora da Unicamp, 2001.
41
O período colonial é descrito por Rocha Pombo como um período de extremo
sofrimento por parte das colônias. A grande matança dos índios, a escravidão violenta dos
negros e a tirania do governo da metrópole são os pontos mais enfatizados. Portanto, este
momento de independência toma uma importância enorme, daí as longas descrições de
cada batalha, de cada governo local, de cada capitão.
Rocha Pombo inicia a última parte de seu livro fazendo uma descrição da situação
da América nas décadas que antecederam as independências. Em primeiro lugar, analisa o
que chama de “progresso econômico”, ou seja, o avanço na agricultura, na criação de
animais e, principalmente, na mineração. Este “progresso”, afirma o autor, possuía muito
sucesso por causa da aquisição fácil de riquezas. Porém, afirma que o progresso político
na América Latina não caminhava com a mesma rapidez. Quando compara com a situação
norte-americana, afirma que a Inglaterra dava a suas colônias condições de progredir,
chegando até, afirma Rocha Pombo, a ultrapassar a metrópole. A colônia possuía certa
autonomia, sendo o governo inglês mais um símbolo que um governo propriamente dito.
Porém, nas colônias espanholas e portuguesa, o governo não conseguia ter sucessos.
Este momento é o da mais clara comparação entre os dois tipos de colonização.
Mais uma vez, como já foi dito anteriormente, há um grande exagero na análise das
diferenças. É como se a colonização inglesa tivesse sido feita apenas de acertos, por
pessoas de boa índole, e a colonização portuguesa e espanhola fosse exatamente o
contrário. Rocha Pombo acredita que um os principais motivos que marcaram esta
diferença foi exatamente a diferença na abundância de riquezas. Na parte sul da América
as riquezas eram muito fáceis, o que fazia com que as pessoas não precisassem trabalhar
tanto. Já na América do Norte foi o contrário. Não havia tantas riquezas e, por isto, tinham
que usar mais do esforço e, assim, passaram a valorizar mais o trabalho. Esta visão da
superioridade do desenvolvimento da América do Norte com relação à América do Sul era
um pensamento muito comum da época, e não exclusivo deste autor, como já discutido.
Novamente pensando a construção da sociedade americana, o autor afirma que a
América inglesa foi constituída por famílias, pessoas que queriam se estabelecer
permanentemente e que possuíam valores fortes. Na América portuguesa e espanhola foi o
contrário. Vieram da Europa apenas aventureiros, que procuravam riqueza rápida, e
acabavam mesclando-se com os índios e negros. Não eram “correntes normais de povos
que se mesclavam (...)”, mas apenas a união dos vícios de cada raça.
A independência da América começou pela América do Norte. Isto é mais um
motivo para longo elogio por parte do autor, já que, para ele, era exatamente a parte do
42
continente que menos precisava da emancipação. Ao narrar o desencadeamento da
independência, o autor sempre destaca os grandes heróis, mas também destacando que era
uma luta de todo o povo americano, baseado nos ideais de liberdade e trabalho.
Posteriormente, o autor dá grande destaque à figura de Washington e à construção da
constituição dos EUA.
Na América espanhola o impulso para a independência não era simplesmente a
grande virtuosidade do povo, mas o excesso de tirania do governo da metrópole. E, no
caso exclusivo do Paraguai, foi a ambição de alguns poucos homens. É claro que é de
grande importância para o autor o fato de terem estes povos o exemplo dos EUA a seguir.
Novamente o autor dá destaque a grandes heróis, principalmente Simon Bolívar e San
Martin, mas aqui o papel do líder é visto com outros olhos. Na América Latina estes heróis
das independências são os líderes e o autor dá a entender que a emancipação não teria sido
feita sem a presença deles, apenas pelo povo. Ao contrário dos líderes dos EUA, que são
homens que se destacaram num universo de homens virtuosos, mas que a independência
foi feita por todo o povo.
No momento em que descreve a independência de Nova Granada (Colômbia e
Venezuela) é que Rocha Pombo faz a única menção a uma fonte primária: a declaração de
independência de Bolívar. Porém, utiliza-se deste texto apenas de forma ilustrativa. O
autor cita passagens do texto para mostrar o tamanho ódio que movia o grande líder:
“Hespanhoes e canarios – dizia – contai com a morte ainda que indiferentes, si não
trabalhaes activamente em favor da liberdade da América. Americanos, contai com a vida,
mesmo quando fordes culpados.”62 E ainda cita a história do capitão Antonio Ricaurte,
história esta contada por Bolívar, que teria explodido a si mesmo para evitar que suas
munições fossem pegas pelos espanhóis – claro exemplo de que a fonte foi usada para
ilustração dos sentimentos dos colonos.
Os processos de independência foram acontecendo separadamente e até criando
rivalidades entre as colônias. É certamente algo que diferencia a independência da
América portuguesa. Rocha Pombo explica isto por dois fatores: primeiro, porque os
governos coloniais já eram separados e, segundo, por falta de líderes mais fortes. A crença
do autor em uma história feita por poucos homens é realmente predominante em toda obra,
e este é só mais um exemplo. Porém, o autor identifica um sentimento de solidariedade
entre os vários países que estavam se formando, como que tentando identificar um
62 Simon Bolívar citado por ROCHA POMBO, J. F. História da América. 1. Ed. São Paulo: Laemmert & C. Editores, 1900. p. 202.
43
sentimento de semelhança, a “fraternidade” dos povos americanos, que, na realidade, o
próprio autor pretende construir com a obra.
A independência do México é vista pelo autor como uma independência diferente
da maioria dos países americanos. Em um primeiro momento existia um conflito interno
dentro desta província. As denominadas classes exploradas eram aquelas que queriam e
lutavam pela emancipação. No entanto, as classes mais privilegiadas queriam manter a
ordem das coisas, para manter seus privilégios. Porém, em 1812 é aprovada na Espanha
uma constituição que pretendia modificar estes privilégios e, então, esta classe superior do
México decide também lutar pela independência, para manter seus privilégios.
Rocha Pombo entende a história como um desencadeamento lógico de
acontecimentos, que segue um desenvolvimento rumo ao progresso. Em seu texto sobre as
independências, sua narrativa sempre leva o leitor a acreditar que os movimentos de
emancipação eram uma tendência óbvia, motivados pelo sentimento de liberdade da
época. Era simplesmente a forma como os acontecimentos tinham que ocorrer. A ideia de
que a independência foi feita não por sentimentos nobres, mas por interesses econômicos,
era para ele um ato de má índole. Isto fica claro na passagem: “O facto material da
separação da colonia não foi obra do espirito americano: e quem poderia suspeitar que a
paixão do despotismo viesse a fazer aquillo que só se deve esperar do sentimentos de
liberdade?”. Outra passagem ainda que demonstra como o autor acreditava no
desencadeamento lógico da história é o momento em que escreve sobre a Guerra de
Secessão dos EUA. A vitória do norte era natural para o autor, já que era quem defendia o
fim da escravidão e a industrialização: “Pelo que se viu tambem o Sul aceitou a lição: da
guerra civil, por fim, não restou, mesmo entre os escravagistas vencidos, mais do que uma
resignação muito sensata com as leis mais simples e ineluctaveis da historia.”63
Para finalizar esta primeira divisão da terceira parte do livro, Rocha Pombo fala
sobre a emancipação do Brasil. Mesmo sendo contra o edital do concurso, esta parte foi
mantida, como já foi mencionado, pelo Conselho Superior de Instrução Pública. Porém é
uma parte longa do texto, mais longa que às dedicadas aos outros países. O artifício que
usa o autor para que não fique tão desproporcional a porção dedicada ao Brasil com
relação a dos outros países é o de diminuir o corpo da letra. Isto apenas na primeira edição,
que é a única que deve seguir o edital. Mas fica bem claro que esta é a única parte do texto
63 Ibid., p. 288.
44
em que é usada a letra diminuída. Os capítulos que antecedem e aqueles que sucedem
utilizam a fonte maior.
O autor afirma que os horrores praticados por Portugal foram os mesmos que pela
Espanha, porém valoriza mais a emancipação como luta contra a tirania. Entretanto,
afirma que o Brasil não conseguiu se tornar completamente independente de Portugal em
1822, mas apenas em 1889. O império teria sido um prolongamento da colônia. Rocha
Pombo, como já foi dito, era republicano. E neste momento fica claro esta sua escolha
política. Segundo o autor, apenas a República poderia definitivamente se opor à tirania da
monarquia portuguesa. Afirma o autor: “A monarchia pode ter sido, e pode ser mesmo
ainda, um excellente regimen para outros povos: mas o que é incontestavel é que ella é
incompativel com o espirito que se creou na América”.
Apesar de hoje sabermos que quanto maior a proximidade do objeto, maior a
tendência da parcialidade do historiador, já foi dito que Rocha Pombo possuía uma
concepção de história diferente da que temos hoje. Fica muito claro a facilidade do autor
em fazer este tipo de juízo quando fala do Brasil, mas não tanto quando fala de outros
países. Porém, acredito que essa parcialidade no assunto não é apenas uma desatenção do
autor. Acredito que esta passagem em especial foi feita conscientemente, como parte da
militância pela República, da qual Rocha Pombo fez parte toda sua vida.
Novamente se faz o exagero de elogios aos grandes nomes. A Inconfidência
Mineira é muito valorizada, principalmente a figura de Tiradentes, que curiosamente
sempre que é mencionada aparece em fonte itálica talvez por se tratar de um apelido, ou
para dar ainda mais ênfase ao personagem, que, afirma o autor, chega mesmo a representar
a própria liberdade. Nas palavras do autor: “O Tiradentes representa para os brazileiros
tudo que tem de generoso e santo o enthusiasmo pela liberdade”.
Rocha Pombo termina a obra com um capítulo intitulado “Prognostico dos destinos
do Novo Mundo”. Neste capítulo afirma que os primeiros europeus que vieram para a
América fugiam da tirania de seus países e aqui encontraram a liberdade que tanto
sonhavam. Este novo sentimento é o que move o continente, durante toda a obra, entrando
em conflito com o governo da metrópole que se impunha à colônia. Rocha Pombo
novamente descreve os enormes sofrimentos que passaram os povos das colônias, e não
apenas índios e escravos, mas os próprios colonos que aqui se estabeleceram. Ficou tão
claro o sentimento de luta que mesmo depois da emancipação os países não conseguiram
achar a paz, entrando em guerras entre si. Foram os vícios que deixaram os europeus, que
impediram os americanos de progredir. Este capítulo é como um panorama geral da obra,
45
com as opiniões do autor. Acredito que seja para enfatizar mais uma vez que os insucessos
dos países da América Latina são culpa da colonização europeia. É por isso que afirma
Rocha Pombo, tão enfaticamente, que até seus dias há sequelas dos vícios trazidos pelos
europeus. E mais uma vez traz esta imagem de conflito entre o americano e o europeu,
como para afirmar ou até construir uma identidade americana.
Ao final de cada uma das quatro partes do livro há uma síntese dos capítulos. São
pequenos parágrafos, com cerca de cinco a dez linhas cada, que sintetizam as ideias que o
autor considera mais importantes de cada capítulo. A síntese da primeira divisão do livro,
que trata do período pré-colombiano, é em apenas duas páginas, com destaque para as
concepções de “superioridade” e “avanço” dos índios do Peru e do México, ideia que já
foi discutida anteriormente. Na síntese da segunda divisão da obra, relativa ao período
colonial, são mantidas as ideias principais já mencionadas, que estão presentes no texto
completo: a valorização de Colombo, depois os acontecimentos narrados a partir da
trajetória de Cortez e Pizarro, a ideia de que os colonos europeus queriam apenas
enriquecer rapidamente e voltar para a Europa, a ocupação e administração das diversas
partes do território. A grande diferença é que não é dada importância aos capítulos que
tratam da América do Norte. São as menores sínteses, tendo de duas a três linhas. Esta
síntese da segunda parte é um pouco mais extensa, já que possui mais capítulos, tendo, no
total, cinco páginas.
Com relação às sínteses, não há mudanças de uma edição para a outra, ambas
possuem quatro sínteses idênticas. A única diferença é quando há separação das partes,
que segue conforme as alterações já mencionadas. Na primeira edição, a terceira síntese é
chamada “Synthese dos capitulos da secção 1ª da terceira parte”, e a segunda edição
chama-se “Synthese dos capitulos da terceira parte”. Os nomes e os textos dos capítulos
contidos nestas divisões, entretanto, são idênticos nas duas edições.
O objetivo destas sínteses, acredito, é facilitar o estudo dos alunos e professores.
Não possui uma função de índice, já que há um índice no fim do livro, indicando nome e
página dos capítulos. Talvez seja uma forma de leitura rápida, para que as pessoas que
utilizam o livro relembrem o que leram, já que é uma obra extensa, ou algum tipo de
preparação para provas e avaliações. Não acredito que substitua a leitura do texto integral,
já que é um texto muito rico e bastante complexo, enquanto a síntese pode não fazer muito
sentido para quem não leu o texto completo.
46
Na primeira edição existem ainda pequenas listas bibliográficas no fim dos
capítulos. Esta lista indica obras de autores principalmente franceses e espanhóis. Dentre
as citadas estão cientistas naturalistas, como Alcide D'Orbigny, Alphonse Bertillon e
Humboldt; relatos de viagens à América, Félix Azara; obras historiográficas, como
Brasseur de Bourbourg e Washington Irving e mesmo outros materiais didáticos, como o
Compendio de Historia da America, do chileno Diego Barros Arana. Os autores
brasileiros citados são Gonçalves Dias, com a obra Brazil e Oceania, e Rocha Pitta,
História da América Portugueza.
47
4. NOSSA PÁTRIA
O livro Nossa Pátria foi a obra que mais teve reedições de toda da coleção de
Rocha Pombo. A primeira edição é de 1917, e as edições que foram utilizadas para este
trabalho foram a 67ª (sem data) e a 83ª (1949). O prefácio da 67ª edição, escrito pelo
próprio autor em 1917, intitula-se “Este Livrinho” e afirma que a obra é destinada às
“crianças e homens simples do povo”. O autor afirma saber que está num momento de
criação do “culto a patria” e afirma que o objetivo deste livro é tornar conhecida a pátria
àqueles que devem amá-la, já que não se ama aquilo de que não se possui uma tradição,
um orgulho. Ainda mostra mais uma vez sua visão de que a história é feita para o presente,
afirmando: “Sentir o que fizeram de grande os nossos antepassados equivale a tomar o
compromisso de os continuar na história”.
Já o prefácio da 83ª edição é escrito pela editora, com algumas frases do prefácio
original. Afirma este pequeno texto que Rocha Pombo estava sempre fazendo algumas
alterações na obra, nas diferentes edições, e após sua morte a editora se preocupou em
manter o texto, apenas acrescentando as informações dos “últimos tempos”. Ainda há um
pequeno texto que fala sobre a vida e outras obras de Rocha Pombo. Este livro em
específico possui ainda uma característica que nos permite saber onde, quando e por quem
foi utilizado. Em sua primeira página há uma assinatura de sua proprietária, Maria Nadir
de M. Doria. A data escrita pela aluna é 1954, e estudava na St. Paul’s School, escola
britânica e bilíngue de São Paulo. Esta era uma escola de elite, que é um dado importante
para esta trabalho, pois mostra que este livro não estava sendo utilizado apenas em escolas
públicas.
A linguagem utilizada nesta obra é muito diferente da História da América.
Apresenta uma linguagem mais infantil, com frases que, em geral, possuem de 3 a 4 linhas
e capítulos que não passam de 5 páginas, muitas imagens, uma letra bem maior. As ideias
são muito simples, sem o aprofundamento que vemos na obra analisada anteriormente, o
que faz com que o livro como um todo seja muito mais curto. História da América é um
livro de mais de 400 páginas de texto corrido. Já Nossa Pátria possui cerca de 150 páginas
O fato de as ideias serem pouco exploradas e aprofundadas pelo autor dificulta um pouco a
análise desta obra, já que não possui um desencadeamento e explicação destas ideias, para
que possamos melhor entendê-las. Esta é a linguagem típica do livro didático, o texto
simples e breve, muitas imagens e letra grande.
48
A divisão de capítulos não é feita de forma totalmente cronológica. Inicia com
questões de exaltação da pátria, como a importância do povo brasileiro, explicação dos
símbolos do país e a importância da independência. Segundo Rocha Pombo a
independência é o momento mais importante de nossa história, e por isto recebe lugar de
destaque na obra, já em seu início. Depois destes capítulos iniciais é que a obra torna-se
cronológica, narrando os acontecimentos de acordo com a sequência dos acontecimentos.
O texto é já iniciado com valorizações do sentimento de pátria. O motivo
apresentado pelo autor para que o leitor ame sua pátria é por fazer parte de seu povo. É
apresentada a ideia do “semelhante”, nosso irmão, que são as pessoas com quem
trabalhamos e nos relacionamos, que falam a mesma língua, que possuem os mesmos
antepassados.
Patria – terra de nossos pais; onde viveram nossos avós; onde temos todas as recordações da nossa vida e da nossa familia; onde tudo nos fala á alma – campos e mares, florestas e montanhas – e onde parece que até as estrellas e os proprios ares nos alegram mais que os outros céus! É por isso mesmo que amamos a nossa Patria mais que as outras patrias.64
Assim, o texto é iniciado com uma ideia de unidade do povo brasileiro, usando o
argumento da semelhança entre as pessoas, que seria o motivo do orgulho da pátria. Neste
ponto, o autor caracteriza “pátria” como a população que a habita, principalmente com
relação a sua semelhança.
O segundo capítulo é dedicado à explicação dos símbolos do Brasil. O escudo de
armas, o hino, mas, principalmente, a bandeira. As cores verde e amarelo são muito
ressaltadas, pois, afirma o autor, apesar de a bandeira ter sido feita quando se formou a
nação, estas cores já simbolizavam nossa terra. A nossa bandeira, portanto, “nos lembra o
nosso passado, nos une no presente, e nos encoraja para o futuro (...)”.65 Assim, é possível
notar a importância das cores verde e amarelo, que para o autor são anteriores à própria
bandeira, dando uma ideia de que são inatas, ou pelo menos natas junto com o próprio
país. E isto não está presente apenas no texto. As imagens apresentadas são, em sua
maioria, em preto e branco, mas todos os momentos em que aparece a bandeira, ou
elementos destas cores, há a presença das cores, que passam a chamar muito mais atenção
do leitor. A bandeira é, para Rocha Pombo, um símbolo da união do país, representando o
povo brasileiro.
64 ROCHA POMBO. Nossa Pátria: narração dos factos da historia do Brasil, atravez da sua evolução com muitas gravuras explicativas. 67. ed. São Paulo: Melhoramentos: s/d. p. 5. 65 Ibid, p.8
49
Afirma ainda o autor que só possui bandeira nacional aqueles países que são livres
e não obedecem a outros. Esta afirmação possui um caráter muito claro de referência ao
capítulo seguinte, que trata da independência. Segundo o autor “é este – o da nossa
independencia – o facto mais notavel da nossa historia”66. Há uma grande ênfase na ideia
de “nação soberana”, que não reconhece poder acima do seu, fazendo um claro
contraponto entre liberdade e o passado colonial.
O momento da independência é descrito como uma grande festa de toda a
população, e como resultado da vontade do povo. Segundo o autor, o povo realizou a
independência, liderado por José Bonifácio, figura que possui um capítulo inteiro dedicado
à sua heróica trajetória. É interessante notar que o autor mostra o povo como ator social,
mas seu pensamento dá, neste ponto, a entender este “povo” como uma massa homogênea.
E como já foi mencionado, este autor não acredita na coletividade como representante de
ações relevantes, daí a figura do líder, José Bonifácio, que é descrito de forma heroica e
ufanista.
Depois disto é que Rocha Pombo passa a narrar a história de forma cronológica.
Muito diferente da descrição da História da América, o autor afirma que, por 1500 anos, o
mundo ignorou a existência da América. Isto é explicado pelo autor por questões
geográficas, já que o mundo conhecido era aquele que podia ser percorrido a pé, e para se
alcançar a América era preciso tecnologias até então desconhecidas. Na História da
América, o continente americano é um devir, um acontecimento que os europeus
esperavam. Já nesta obra, o descobrimento é uma casualidade, bem menos valorizada.
Pode-se notar nesta parte do texto que Rocha Pombo ignora a história ocorrida antes de
Cristo. Isto pode dar-se por dois motivos: para valorizar ainda mais a religião cristã, que é
a religião da pátria, ou porque, talvez, entenda que a civilização tenha começado com o
Império Romano, dando pouca importância às sociedades anteriores.
Ao lugar de Colombo, que é o principal protagonista do descobrimento em
História da América, nesta obra temos Cabral como grande personagem de destaque, mas
nem de perto a narração elogiosa favorece tanto a Cabral. As questões que dizem respeito
à Espanha, à colônia Espanhola e ao papel deste país no descobrimento são simplesmente
omitidos neste livro, já que o objetivo do autor é o Brasil.
É comum nesta obra capítulos inteiros dedicados à trajetória e às ações dos
“heróis”. Um exemplo é o capítulo dedicado a D. Henrique. Este é narrado como o grande
66 Ibid., p.9.
50
homem que possibilitou as grandes navegações, por ter dirigido os trabalhos de navegação
e fundado a escola de Sagres. Afirma o autor que “é a este homem que a humanidade deve
tudo o que se fez no século XV (...)”. Aqui se encontra uma semelhança desta obra com a
História da América: a grande valorização dos heróis, dos grandes nomes, a ponto de a
história ser construída a partir de trajetórias pessoais.
Rocha Pombo afirma que a partir de 1500 se inicia a povoação no continente
encontrado. Depois, no capítulo dedicado aos índios, corrige afirmando que esta terra já
estava povoada, porém os povos que estavam aqui eram “muito atrasados quanto á
civilização”. É claro que neste momento a ideia de “civilização” é uma comparação
evolutiva com o nível tecnológico e cultural dos europeus. Apresenta uma concepção de
“atraso” dos índios muito menos desenvolvida que na obra analisada anteriormente. Os
índios são caracterizados como nômades, que viviam em cabanas todos juntos, homens,
mulheres e crianças. Fabricavam suas próprias armas e sua comida. Possuíam sua religião
e eram muito supersticiosos, tinham medo de tudo. Afirma Rocha Pombo que dentro das
tribos todos eram muito amigos, mas entre as diversas tribos estavam sempre em conflito,
em guerra. Para o autor isto se explica pois “só o homem civilisado é que confia mais na
razão que na força, e resolve tudo pelo direito e não pelas armas”.67
Esta última frase mostra bem a diferença da visão das duas obras. Em Nossa
Pátria, o europeu é “superior” exatamente por não empregar a violência, enquanto que em
História da América é um saqueador. Aqui o europeu é apresentado como um ser pacífico
que resolve seus problemas com a razão e o direito. Não menciona Rocha Pombo nesta
obra a violência com que os índios foram escravizados pelos brancos. A questão da
escravidão indígena aparece porque, segundo o autor, os portugueses chamaram os índios
para ajudá-los no cultivo das terras e estes se recusaram, o que fez com que fossem
escravizados. Naquele livro, o europeu é um saqueador, violento e cheio de vícios, que
destruiu a cultura dos índios e levou embora as riquezas desta terra. Neste, aparece como
herói, valorizado a ponto de o autor os considerar antepassados dos brasileiros: “os
portuguezes, nossos avós”.68
No capítulo chamado “Sentimento de pátria”, o autor retoma o pensamento
presente em História da América, afirmando que inicialmente o colono veio para o Brasil
para levar a riqueza de volta a sua terra natal. Todavia, logo em seguida, afirma que este
sentimento foi mudando, o português começou a gostar daqui, criar sentimentos,
67 Ibid, p. 29. 68 Ibid, p. 17.
51
principalmente pelo trabalho que foi impedir a vinda de estrangeiros. Portanto, a ideia da
colonização como saque é apresentada, de forma muito rápida. Entretanto, nesta obra, é
apresentada como algo passageiro, já que logo depois os europeus mudaram seus
objetivos. Este pensamento condiz com o enfoque do restante da obra, já que esta terra é
descrita com tanta virtuosidade que pareceria estranho se os portugueses não gostassem
daqui. A afirmação da existência de um “povo” brasileiro seria contraditória se aqueles
que formam este povo – como o português – não tivessem o objetivo de aqui se
estabelecer.
O índio, como já foi dito, é descrito como muito violento em relação a seus
semelhantes de outras tribos. Todavia, em relação ao português aparece como passivo,
aceitando a imposição de sua cultura. Apenas em uma passagem afirma o autor que as
lutas entre as duas raças foram “os maiores embaraços que perturbaram a vida da colônia”,
mas sem nenhuma explicação. No início da obra, o autor afirma que os índios imitavam
“os portugueses em tudo o que estes faziam”; e ainda, com relação a religião, afirma que o
índio olhava para a cruz e sentia-se “arrebatado de alegria à vista daquele estranho sinal
que lhe falava ao coração”. Estas passagens fazem parte da ideia de inferioridade dos
índios, que o autor menciona em várias partes da obra. Segundo estas passagens os índios
teriam visto com bons olhos a ideia de incorporar a superioridade dos europeus.
Com relação ao africano, pode-se dizer que, proporcionalmente, é muito mais
explorado em Nossa Pátria. Possui um capítulo apenas, mas também ao índio é dedicado
apenas um. Também aqui Rocha Pombo trata de amenizar a violência da escravidão. Os
africanos foram “trazidos” da África, onde viviam já em escravidão. Esta mesma ideia
aparece no outro compêndio, e me parece que é uma forma de amenizar e legitimar a
escravidão na América. Os reis africanos “vendiam gente como se fosse gado” e o que os
portugueses fizeram foi simplesmente comprá-los.
O negro aparece passivo nas duas obras, e em Nossa Pátria ainda mais
enfaticamente. Afirma o autor que logo que aqui chegaram os africanos ficaram amigos de
seus senhores, sendo muito obedientes, espertos e trabalhadores, contribuindo muito para
o progresso de nosso país. A diferença desta obra com a História da América é que aqui o
negro não é simplesmente passivo por seu caráter. Sua passividade resulta de uma suposta
harmonia entre as duas etnias. Segundo Rocha Pombo, os negros que morreram foram
atingidos por saudade, não por violência, doenças etc. E ainda pode-se ver que o autor
mantém seu discurso de que, acabada a escravidão, a igualdade passou a existir entre as
diferentes raças, sendo, em seus dias, “todos como irmãos”. Não são mencionadas as
52
diferenças sociais e jurídicas que continuaram existindo no Brasil, mesmo após o fim da
escravidão. Esta obra possui este caráter ufanista e otimista por se tratar de uma obra
específica da construção do sentimento pátrio. Não se trata de uma obra de história do
Brasil apenas, mas da história da Pátria, e para criar uma pátria, o autor recorre a um
discurso extremo de valorização do passado.
Entretanto, há um capítulo dedicado ao assunto dos quilombos. Afirma
rapidamente o autor que alguns senhores tratavam os escravos de forma desumana, como
se fossem animais, e por isto os escravos fugiam e se uniam nas matas, onde viviam como
feras, como viviam antes da África. Mas, apesar de mostrar um pouco sobre os quilombos,
em nenhum momento a descrição mostra resistência dos africanos, apenas fugas da
crueldade de alguns senhores:
Havia, porém, senhores muito deshumanos, que tratavam as pobres creaturas como se fossem simples animaes. (...) Cansados do seu infortunio, muitos escravos fugiam dos engenhos, e mettiam-se como bichos, pelas florestas, preferindo viver com as feras.69
Quando trata da abolição, mais no fim da obra, o autor reafirma esta ideia passiva
dos escravos, pois em nenhum momento aparecem os negros como atores no processo. O
fim da escravidão veio pelas mãos dos brancos, que lutaram contra a vontade dos
fazendeiros, com destaque para a figura de Euzébio de Queiroz. Como já foi dito, Rocha
Pombo era abolicionista, e a escravidão era para ele um obstáculo na marcha ao progresso.
Assim, narra um processo feito por homens que queriam o melhor para o país, mas nunca
aparece contribuição da luta dos escravos.
Com relação à formação étnica da população brasileira, Rocha Pombo afirma
exatamente o oposto da outra obra analisada. A junção das três etnias resultou na junção
de suas virtudes, enquanto em História da América foi a junção de vícios. E ainda nomeia
estas características, que são reduzidas a: “altivo”, característica dos índios, “amoroso”
dos negros, e “intelligente”, dos europeus. Rocha Pombo não poderia apresentar a mesma
ideia da formação étnica que na outra obra. Nossa Pátria é um livro que pretende valorizar
o passado do Brasil para formar coesão e legitimação do sentimento pátria que está
construindo. Em História da América é narrada a junção dos vícios das três etnias, o que
justifica o papel de “atraso” do Brasil. Já nesta obra há uma negação deste atraso, já que o
passado do país é feito apenas de glórias. Os dois pontos de vista são usos do passado para
69 Ibid., p.56. Grifo no original.
53
motivos do presente. Porém, como são motivos diversos, o uso do passado é também
diverso, sendo adaptado para cada caso.
Esta ideia de entender a população brasileira a partir do estudo e observação de
cada uma das três raças (brancos, negros e índios) é muito presente na historiografia
brasileira. Foi iniciada com Von Martius, autor que influenciou a obra de Rocha Pombo,
como já foi apontado. Porém continuou sendo usada por muito tempo, com autores como
Oliveira Vianna e, posteriormente, Gilberto Freyre. Isto mostra que o autor era
influenciado por ideias da historiografia, porém, a aplicação em suas obras é bastante
complexa, pelo fato de não ser constante. Esta variação de pontos de vista acontece de
acordo com o objetivo específico de cada obra.
A concepção de história de Rocha Pombo é mantida, o que muda é apenas seu
discurso. Isto pode ser observado pela valorização de lendas, que em nenhum momento o
autor questiona como sendo verdadeiras ou não. Neste livro, a lenda que narra é a de
Caramuru, um branco que teria se casado com uma índia, e feito toda sua tribo respeitá-lo
e temê-lo, já que possuía a tecnologia da arma de pólvora. É uma história muito parecida
com a de Pocahontas, narrada em História da América e, provavelmente por este motivo, é
que seja considerada importante para o autor.
Ainda sobre a concepção de história de Rocha Pombo, podemos afirmar que suas
características mais marcantes fazem parte do que Ricardo Benzaquen de Araújo chama de
“concepção clássica”. Para este autor, esta visão da história traz algumas ideias presentes
nos textos de Rocha Pombo. Em primeiro lugar, o passar dos acontecimentos é um
aperfeiçoamento moral dos homens, ideia que já foi explorada neste trabalho. Em segundo
lugar, a “associação que praticamente desconhece a diferença entre o passado e o presente
e mantém o futuro sob o mais estrito controle”.70 Esta ideia é a que já foi discutida, sobre a
narrativa de Rocha Pombo com objetivos do presente em seu estudo do passado. Por fim, a
narrativa que em muitos momentos se aproxima da literatura, que é o caso do exemplo
citado. Benzaquen de Araújo escreve este texto para pensar a concepção moderna de
história de Capistrano de Abreu, que utiliza uma narrativa completamente diversa desta
“concepção clássica”. Interessante notar tão grande diferença de visão de dois autores
contemporâneos sobre a história.
Há também uma valorização da figura dos jesuítas. Estes aparecem no livro como
homens bons, que procuraram uma alternativa diferente da força para fazer os índios
70 ARAÚJO. op cit.
54
viverem felizes com os portugueses. São descritos como santos que dedicaram suas vidas
para uma causa alheia. A crítica à destruição da cultura indígena, presente na obra
analisada anteriormente, desaparece completamente e, em seu lugar, há uma visão de
“bondade” dos padres. As figuras dos padres Anchieta e Antonio Vieira são as mais
comentadas e elogiadas. Novamente há o desaparecimento da crítica aos europeus. Seja
quanto aos exploradores, colonos, senhores de escravos ou jesuítas, o autor muda
totalmente sua visão crítica para uma ufanista.
Rocha Pombo dá grande destaque à fundação e desenvolvimento das cidades, com
vários capítulos dedicados ao assunto. Estes capítulos são muito descritivos, valorizando
todas as questões que envolvem a cidade. Explica Rocha Pombo que havia uma diferença
entre cidade, freguezia e villa, sendo a cidade um título dado pelo rei a um determinado
povoamento. As freguesias nasciam da fundação de uma capela em um determinado lugar,
e geralmente não possuíam muitos habitantes. Depois de fundada uma camara, a freguezia
tornava-se uma villa. A esta câmara preocupa-se o autor em descrever com detalhes: era
formada por pessoas escolhidas “pela gente principal” da população. Tinham por objetivo
administrar a cidade, manter o policiamento, abrir e conservar caminhos, e construir o
pelourinho, símbolo da justiça e do poder do rei.
Rocha Pombo faz uma comparação com as cidades da sua época. Ao contrário do
que encontrava então, segundo o autor, as cidades eram muito precárias, as casas mal
construídas, as ruas tortas e havia pouca iluminação. As mulheres viviam fechadas com
trabalhos pesados e os vizinhos não se visitavam, encontrando-se apenas aos domingos na
missa. As pessoas que moravam nas cidades eram muito ricas, e as mais pobres ficavam
em sítios e fazendas. Não havia fogão, fósforo, nem água encanada. Há uma descrição das
roupas que usavam as pessoas, com a preocupação de afirmar que eram poucas e de má
qualidade:
Mas, se as roupas eram poucas, devia, ainda assim, custar muito a fazer, porque eram feitas a mão. Não havia, como hoje, machinas de costura. E era preciso ainda fazer o proprio panno, tecendo a lã e o algodão em pequenos teares, pois o pouco panno que vinha da Europa era muito caro.
Este destaque das cidades, principalmente nos momentos de comparação do
passado e do presente, nos mostra que o autor relacionava a urbanização com o progresso
material. Isso fica evidente, pois todas as mudanças que ocorreram nas cidades,
apresentadas pelo autor, são mudanças positivas, e principalmente de tecnologias. O autor
quer mostrar ao leitor o quanto a vida nas cidades avançou, cita objetos simples que foram
55
inventados e que facilitaram a vida das pessoas. E ainda a ideia da máquina, que é sempre
muito presente no pensamento deste historiador, ligado a idéia do avanço e de uma
apologia à tecnologia.
Outro capítulo que traz o mesmo tipo de observações é o décimo oitavo, intitulado
“Tempos que passaram”. São observações das formas como viviam as pessoas no Brasil
Colônia, sempre em comparação com a época do autor. Afirma o quanto demorava a
viagem de uma cidade a outra, não existia correio, então as notícias corriam muito
vagarosamente, não existiam jornais etc. No fim deste capítulo afirma o historiador:
Felizmente, esses tempos passaram. Só lamentamos que, tendo trabalhado tanto pelo nosso bem, os nossos antepassados não fossem tão felizes como nós. É, por isso, que devemos veneral-os cada vez mais.71
Estas passagens são muito interessantes, pois mostram a ideia de progresso como
avanço material, para Rocha Pombo. A ideia de que os antepassados trabalharam por seus
sucessores é um pensamento claro de progresso e, mesmo tendo sido tão “atrasados” e
“infelizes” os homens do passado, temos que venerá-los, construir sua história, para
observar o caminhar que levou o Brasil até o momento de ápice, que é a atualidade do
autor.
Depois destes capítulos sobre as cidades e o atraso do Brasil colonial, o autor
escreve um capítulo com a descrição física do Brasil. Muito mais simples e resumida que
na História da América, mas é preciso notar que, em Nossa Pátria, esta descrição
encontra-se no meio do livro, e não no início, como na outra obra. Mas ainda assim, o
autor nos mostra novamente a importância que atribui a este tipo de informação numa obra
de história. E aqui, novamente, o ponto principal levantado é o da riqueza da fauna e flora
brasileiras, que enriquecia os colonos. Porém, desta vez, este enriquecimento é benéfico ao
Brasil, já que nesta obra os portugueses não tinham o objetivo de levar todas as riquezas
da colônia.
Com relação aos europeus dos outros países que não Portugal e Espanha, Rocha
Pombo repete seu discurso apresentado na outra obra. Os “estrangeiros” eram pessoas de
má índole, invejosos, muitas vezes criminosos e usurpadores. O grande destaque é dado
aos franceses e holandeses. A ideia de “estrangeiros” mostra que Rocha Pombo acreditava
na legitimidade dos portugueses e espanhóis para a exploração do Novo Mundo. Os que
não eram estrangeiros eram as três raças que povoaram o Brasil (índios, negros e
71 ROCHA POMBO. Nossa Pátria, op. cit. p. 60.
56
portugueses), que “ali estiveram sempre alliadas contra aqueles usurpadores (...)”.72 A
criação do “outro”, o estrangeiro, permite que se veja a população brasileira como uma só,
mascarando os conflitos e a heterogeneidade. É mais uma dos artifícios utilizados pelo
autor para criar a ideia de “pátria” e de “nação”.
Na questão dos bandeirantes, o autor toma novamente o tom de heroísmo, e narra
seus feitos como se o real objetivo dos bandeirantes fosse o de expandir as terras
brasileiras, com muita coragem. Os índios e espanhóis que encontravam no caminho eram
combatidos. Em nenhum momento afirma que os bandeirantes capturaram índios, apenas
que aumentaram e povoaram o interior do território. Segundo o autor, um dos grandes
feitos dos bandeirantes foram as minas encontradas, que resultaram em alguns conflitos,
mas tornaram o Brasil e Portugal mais ricos. “E como se vê – os bandeirantes que tinham
feito o Brasil maior, agora o tornavam mais rico”.73
O momento em que a narrativa deixa de ser tão otimista e passa a ser mais crítica é
quando trata do assunto do governo de Portugal. Segundo o autor, o governo fazia leis
para tentar tomar da colônia toda a riqueza que possuía, prejudicando muito os colonos.
Era proibido fundar fábricas aqui, tendo assim que comprar os produtos portugueses. Os
impostos eram altíssimos, e as leis muito rigorosas. O rei tratava os colonos como se
fossem seus empregados, e fazia-os viverem em uma situação muito difícil.
Este assunto é um dos mais extensos de toda a obra, tendo no total seis capítulos.
Os tipos de impostos e a precariedade da vida dos colonos são descritos em detalhes.
Mesmo os governadores, que em alguns capítulos anteriores eram heróis, agora são vilões.
Para o autor, tudo isto criava um sentimento da necessidade de uma independência.
Acredito que esta mudança na visão da obra seja para valorizar mais ainda a
independência, já que é, segundo o historiador, o ponto mais importante da história do
Brasil. Porém, conta o autor, que quando os brasileiros estavam prestes a lutar pela
independência, o rei de Portugal veio para o Brasil, fugindo da invasão de Napoleão. Por
mais que os colonos tivessem esperança de que as coisas mudassem, a exploração
continuou, os colonos continuavam sofrendo. Rocha Pombo trata do assunto da vinda da
família real em apenas um capítulo, sem muita importância, e sem mencionar um
benefício para o Brasil. Para o autor, os portugueses recém-chegados queriam apenas mais
riquezas, não tinham o objetivo de se estabelecer aqui. Nem as melhorias na cidade do Rio
de Janeiro chamam atenção do autor. A volta do rei para Portugal é narrada como
72 Ibid., p. 71. 73 Ibid., p. 82. Grifo no original.
57
resultante da revolta dos colonos. O autor descreve que todo o povo brasileiro estava
querendo lutar por sua independência, um sentimento comum.
Quando chega a parte do livro que trata da independência, que o autor prepara em
todos os capítulos anteriores, D. Pedro aparece como um tipo de herói, por ter rompido
com Portugal. Porém é um português, e a ênfase dada ao grande homem da independência
não foi para ele, mas para o “brasileiro” José Bonifácio. Segundo o autor, depois de
proclamada a emancipação, havia a dificuldade de organizar o país. Houve oposição, mas
sempre dos portugueses que moravam no Brasil. Pode-se notar neste ponto a facilidade
que encontra Rocha Pombo para afirmar quem eram os portugueses e quem eram os
brasileiros. Sabemos que no Brasil Colônia e no momento da independência não havia um
povo brasileiro tão bem demarcado. A heterogeneidade e a fragmentação eram muito
grandes. Havia portugueses que aqui moravam, seus filhos, mestiços, índios, negros,
espanhóis etc. O povo brasileiro é o que pretendia formar Rocha Pombo, no início do
século XX. O fato de afirmar, durante toda a obra, os feitos do “povo brasileiro” é uma
forma de legitimar o que estava construindo. A preocupação desta obra é mostrar a coesão
deste povo no passado, para que as semelhanças sejam sentidas no presente.
Depois de tratada a independência, o autor afirma que o “Império” era uma forma
de governar parecida com a monarquia, porém o imperador não podia governar de acordo
com sua vontade, mas como previam as leis. Entretanto, D. Pedro I queria governar como
um rei, como governava seu pai, e então a população começou a deixar de apoiá-lo, tendo
este que passar o trono a seu filho. Porém, isto não faz com que este personagem perca
totalmente sua esperança. É um tipo de herói diferente dos comumente presentes na obra,
não é o tipo completamente virtuoso, mas fez parte do momento mais importante na
história do Brasil, segundo Rocha Pombo. Isto está presente no seguinte trecho:
Tornou-se o imperador tão mal visto, e metteu-se em tais embaraços, que teve que passar a coroa a seu filho e sahir do Brasil. Os brasileiros, porém, não esqueceram os serviços por elle prestados á pátria, tanto assim que lhe ergueram uma bella estatua nua praça do Rio de Janeiro. Está elle ali representado no momento em que deu o grito de independência, no Ypiranga.74
A época da regência é descrita pelo autor como um período muito conturbado. A
principal característica foram os levantes feitos na época, principalmente os Farrapos no
Rio Grande do Sul. Este tipo de conflito é condenado pelo autor, que defende a unidade do
território brasileiro. Segundo ele, este momento de tensões faz com que D. Pedro II 74 Ibid., p. 109.
58
assuma seu cargo antes mesmo de atingir a idade. Este sim é descrito como um grande
herói. Muito querido pelos brasileiros, conseguiu pôr o país em ordem.
Grande destaque é dado neste momento à Guerra da Cisplatina. Novamente
aparece a figura do “tyranno” Rosas, da Argentina, que entra em conflito com o Império
brasileiro. Esta caracterização deste governante é acentuada, dando à narrativa um tom
maniqueísta, já que o Brasil estava defendendo o povo uruguaio. Depois, ainda, o Brasil
derruba este governo, salvando os dois países da tirania: “E os brasileiros fizeram isso á
sua custa, e sem lucro nenhum, a não ser a gloria de haver defendido a independência e a
liberdade dos dois povos vizinhos.”75 Este discurso é repetido na parte do livro que fala
sobre a Guerra do Paraguai, sendo o Brasil o libertador dos países vizinhos, o mesmo
ponto de vista presente na História da América. Estas guerras são contadas com bastante
detalhamento, sempre com grande valorização na participação “salvadora” do Brasil.
Termina este assunto afirmando: “A guerra é uma coisa horrível; e só se torna justa num
caso como este, em que é preciso livrar de taes algozes a pobre humanidade”.76
Neste ponto é que temos mudanças no texto de uma edição para outra. Na 67ª
edição, o capítulo 40 intitula-se “Vamos agora libertar o povo paraguayo” e na 83ª o
mesmo capítulo chama-se “A luta contra Lopez”. E no capítulo seguinte há uma
diminuição das características vingativas, cruéis e criminosas deste personagem. O texto
deste capítulo é resumido, passando a amenizar as críticas, tornando a obra mais polida.
Interessante notar que foi a mesma alteração feita em História da América, o que mostra
que esta visão radical de Rocha Pombo não era bem aceita na época.
No capítulo intitulado “As nossas letras, artes e sciencias”, o autor menciona que a
preocupação do país quanto à instrução era a de aumentar o número de escolas primárias.
A imprensa estava crescendo em número e importância, e os poetas, naturalistas e artistas
também são nomeados, sendo que na 83ª edição foram acrescentados os nomes mais
recentes.
Também foram feitas reformas, entre elas –a mais destacada pelo autor – é a que
deu liberdade religiosa ao povo. Segundo Rocha Pombo, anteriormente não era possível
para pessoas não católicas exercerem cargos públicos e serem enterradas no cemitério, e as
crianças tinham que ser batizadas para serem registradas. Isto possui muita importância
para o autor por ele próprio ser protestante. Estas reformas quanto a liberdade religiosa são
descritas em detalhes na 67ª edição, e na 83ª são resumidas, apenas com a afirmação de
75 Ibid., p. 117. 76 Ibid., p. 125.
59
que era necessária a “liberdade de consciência – que quer dizer: as leis nada têm a ver com
a crença religiosa de ninguem”.77 Note-se que esta expressão, liberdade de consciência,
possui, para o autor, uma conotação estritamente religiosa, não abrangendo outras esferas.
A proclamação da República é descrita pelo autor de forma similar à
independência, como resultado da vontade de todo o povo brasileiro, como se todo o povo
participasse destes processos. Apesar do grande herói que é D. Pedro II para o autor, o
povo já não queria mais a monarquia, por lembrar os tempos difíceis da Colônia. Como o
imperador estava doente, o exército viu o momento de fazer o que o povo tanto esperava,
proclamar a República.
Esta parte é também bastante valorizada pelo autor, que, como já foi dito, defendia
a República. Esta é descrita pelo autor como um período de muita ordem, com a
construção da Constituição e do Congresso, e o início das eleições no país. Porém, narra o
autor, que logo em seguida começaram desordens, o presidente marechal Deodoro
dissolveu o Congresso entrando em conflito com o que Rocha Pombo chama de
“verdadeiros republicanos”. Segundo Rocha Pombo, o período da presidência do marechal
Floriano também foi conturbado, sendo os conflitos sempre condenados pelo autor, que
desaprova as revoltas que aconteciam no país, já que qualquer movimento contrário à
República é considerado como desordem. Depois, com a eleição de Prudente de Moraes
acabam os conflitos e a República firma-se. Em um penúltimo capítulo são elencados
todos os presidentes que teve o Brasil, até 1922 (Artur Bernardes) na 67ª edição e até 1946
(Eurico Gaspar Dutra) na 83ª edição.
Para terminar a obra, há um capítulo chamado “O que hoje é o Brasil”, que faz
reflexões acerca do importante papel do Brasil na América. E isso pode ser visto, segundo
o autor, na história narrada neste livro. Para ele, o Brasil foi sempre em busca de justiça
com relação as outras nações, e todos os conflitos foram resolvidos. Os princípios que
regem as ações do país com relação aos outros são a concórdia e a fraternidade. E ainda
afirma que são com estes princípios que vamos para o futuro. O papel da história em tudo
isto é o mais fundamental, sempre procurando reafirmar o sentimento de “pátria”:
Estamos, então chegados ao momento em que é preciso dizer para nós próprios: nesses dias em que se procura tornar mais vivo ainda o sentimento da Patria, o que é muito grato aos nossos corações é sentir como é bella a nossa historia; como tem lances que nos commovem, e que mostram como é nobre a funcção que, com o concurso de outras tantas, a nossa raça vai ter na América.78
77 Ibid., p. 134. 78 Ibid, p. 154.
60
Neste fim da obra aparecem algumas ideias presentes em História da América
como a de fraternidade entre os países, com a valorização do papel do Brasil como
mantenedor da democracia e da justiça. Este também é um ponto em comum com Manoel
Bonfim, que afirma que o Brasil modelou a América.79 Porém, me parece que nesta obra a
“América” para Rocha Pombo é apenas a América do Sul, enquanto na outra obra é todo o
continente americano. Em Nossa Pátria, os Estados Unidos não aparecem, e não possuem
a importância que podemos ver no outro livro. Isto provavelmente pois Nossa Pátria é
uma obra que tem o claro objetivo de construir o sentimento da pátria brasileira, e quem
ocupa este lugar de nação mais virtuosa, representativa e influente é o próprio Brasil.
Também, ao final, há uma síntese dos capítulos, mas em forma de tabela. A
separação, porém, não é conforme os capítulos, mas conforme os séculos, do primeiro ao
quinto século da história do Brasil. Cada divisão inicia destacando uma “característica
geral”, a “economia” e a “cultura”, e depois alguns acontecimentos cronológicos.
Com relação às imagens podemos notar que a maioria são os retratos dos
personagens relatados, enfatizando ainda mais a ideia de herói. Há ainda muitas imagens
de Debret, mostrando paisagens, costumes, e momentos importantes, como a primeira
missa. Em sua grande maioria são em preto e branco. Algumas poucas coloridas ficam em
destaque, e pode-se notar que sempre as imagens da bandeira são coloridas, já que é o
símbolo mais importante, segundo o autor. Também há mapas em cores, distribuídos pela
obra. Há também número considerável de fotos de monumentos e estátuas. A função
destas imagens é simplesmente ilustrativa, sem qualquer tipo de análise, reflexão ao
problematização.
79 REIS, José Carlos. “Manoel Bonfim e a identidade nacional brasileira.” In: LOPES, Marcos Antonio. (Org.) Grandes Nomes da História Intelectual. São Paulo: Contexto, 2003. p.497.
61
5. CONCLUSÕES
Quando se compara as duas obras, a característica mais gritante é a diferença de
objetivo. História da América possui um objetivo de criar um sentimento de fraternidade
entre os países da América, e ainda explicar com o passado os motivos pelos quais os
países da América Latina encontram-se na situação de “atraso” em relação aos países
desenvolvidos. Assim, há uma utilização do passado para atingir estes fins. A história de
cada país é narrada, e há sempre um destaque para o papel do Brasil como interceptor,
levando a justiça e a paz, “salvando” os demais países de governos tirânicos. Há também
uma desvalorização da formação do continente, com críticas aos vícios dos povos que o
formaram, principalmente quanto aos europeus. Este é o passado que pretende justificar o
presente, segundo a visão do autor de “atraso”. Porém, quanto a seu presente, Rocha
Pombo possui uma visão otimista, afirmando que a maioria dos problemas foi resolvida, e
que a América entrou no rumo do progresso que o autor tanto estimava. Esta ideia
desvalorizada do passado e idealizada do presente mostra uma sutil idéia de que o
continente estava destinado a êxitos no futuro.
Já Nossa Pátria possui um objetivo completamente diferente. Seu objetivo é narrar
a história do Brasil de forma a transformar o sentimento patriótico do leitor. E o uso do
passado é feito todo com este objetivo. Assim, ao contrário de História da América, há
uma grande valorização otimista do passado, com muitos elogios e ufanismos. A própria
narrativa traz o “povo brasileiro” como ator, muitas vezes, ainda que fique em segundo
plano em relação aos grandes heróis. As duas obras utilizam o passado com objetivos do
presente do autor, e isso fica muito claro porque, com a mudança do objetivo presente, há
uma mudança radical do passado, sendo usadas visões e perspectivas diferentes e muitas
vezes conflitantes.
Também se pode notar diferenças significativas quanto à linguagem,
aprofundamento e extensão dos textos. E acredito que isto esteja intimamente relacionado
com a diferença do número de edições de cada obra. História da América é uma obra
extensa, com mais de 400 páginas. Possui maior aprofundamento das discussões e uma
linguagem mais elaborada. Isto nos mostra que era destinada para as camadas mais
avançadas do ensino, aos alunos mais velhos e que provavelmente pretendiam seguir a
carreira erudita. E sabemos que esta era a porção menor da educação brasileira do início
do século XX, daí um dos motivos para serem feitas apenas duas edições. Já Nossa Pátria
62
é um livro pequeno, com letras grandes e muitas imagens, e uma linguagem simples. Seu
público alvo eram os alunos do ensino primário, o mais frequentado nesta época, e
também era aquele que se pretendia universal.
Um segundo fator é com relação ao tipo dos livros. Sabe-se que não era comum a
disciplina de história da América nos currículos, enquanto que a disciplina de história do
Brasil era a mais comum, já que se estava formando a ideia de “pátria” e havia grande
valorização da história do país.
Por fim, a diferença dos conteúdos é bastante clara. Nossa Pátria não é apenas um
livro de história do Brasil. É mais que isso. É um livro que tem o claro objetivo de criar
nos alunos o sentimento da pátria, dando grande valorização aos símbolos, como bandeira,
hino, heróis etc. A história, neste caso, serve como legitimadora do discurso do autor. Já
História da América faz exatamente o contrário. Seu texto pretende mostrar os motivos do
“atraso” da América, montando um passado cheio de vícios, com uma visão muito crítica.
Rocha Pombo usa um tom pesado, preocupando-se em denunciar a forma “egoísta” como
a América Latina foi colonizada, contrapondo com a história da América do Norte, que foi
feita de forma “honesta”, visando o bem da colônia.
Pelo relato de Manuel Bonfim podemos perceber que Rocha Pombo não era o
único com este tipo de pensamento. Porém, acredito que não condizia exatamente com os
objetivos do ensino da história da época, que estava mais preocupado com o elogio à
pátria e seu passado. Entretanto, fica aqui uma lacuna, que deve ser pesquisada
posteriormente: a comparação com outros manuais da época, identificando as mudanças
ou continuidades deste discurso.
Deve-se entender que Rocha Pombo era um intelectual preocupado com as
questões de seu tempo, mas também com sua imagem e reputação. História da América
foi seu primeiro compêndio, e lhe rendeu uma posição de destaque na produção nacional.
Não pode ser considerado como um fracasso, já que foi muito elogiado, e foi feita uma
nova edição, muitos anos depois. Porém, acredito ter deixado de lado este discurso crítico
da história porque a visão ufanista lhe rendia mais sucesso, e esta é a visão repetida em
todos os demais livros didáticos por ele escritos. Assim, não vejo História da América
como um fracasso, mas os demais livros lhe proporcionaram mais sucesso.
63
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___________. Nossa Pátria: narração dos factos da história do Brasil, através de sua
evolução. 83. ed. São Paulo: Melhoramentos, 1949.
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