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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA INSTITUTO DE GEOGRAFIA
CURSO DE GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA – BACHARELADO
ESTRATÉGIAS DE LUTA PELA TERRA E POLÍTICAS DE ASSENTAMENTOS RURAIS EM MINAS GERAIS (1985-2012): disputas
e conquistas dos movimentos sociais rurais camponeses
RICARDO LUIS DE FREITAS
UBERLÂNDIA – MG 2013
RICARDO LUIS DE FREITAS
ESTRATÉGIAS DE LUTA PELA TERRA E POLÍTICAS DE ASSENTAMENTOS RURAIS EM MINAS GERAIS (1985-2012): disputas
e conquistas dos movimentos sociais rurais camponeses
Monografia apresentada ao Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia como requisito a obtenção do título de Bacharel em Geografia. Orientador: Prof. Dr. João Cleps Junior
UBERLÂNDIA – MG 2013
RICARDO LUIS DE FREITAS ESTRATÉGIAS DE LUTA PELA TERRA E POLÍTICAS DE ASSENTAMENTOS RURAIS EM MINAS GERAIS (1985-2012): disputas e conquistas dos movimentos sociais rurais camponeses
Uberlândia, 10 de setembro de 2013 Banca Examinadora:
______________________________________________________________ Prof. Dr. João Cleps Junior (Orientador) – Universidade Federal de Uberlândia
______________________________________________________________ Prof. Dr. Marcelo Cervo Chelotti – Universidade Federal de Uberlândia
______________________________________________________________ Profa. Dra. Vera Lúcia Salazar Pessôa – Universidade Federal de Goiás/Campus
Catalão
Amigos que tanto amo! A jornada que escolhemos
não é de sossego nem de mágoas. É o caminhar seguro e valente
desfraldando a bandeira da esperança, do otimismo e da convicção!
Daisaku Ikeda
AGRADECIMENTOS
De toda elaboração deste trabalho, considero que esta parte é de uma
importância significativa, pois aqui, poderei expressar a minha gratidão e os meus
agradecimentos por todos(as) que fizeram parte da minha jornada na Universidade e
fora dela também.
O resultado deste trabalho é fruto de leituras, viagens para eventos acadêmicos,
organização de eventos, bem como, visita aos bares e encontros informais como
almoços e churrascos promovidos ao longo desses anos.
Agradeço meu mestre da vida Daisaku Ikeda que me inspira e me motiva a lutar
pela construção de uma sociedade mais pacífica e harmoniosa.
Agradeço aos meus pais Dougival e Melissa por me darem a oportunidade de
aprender sobre a grandiosidade da vida e lutar pelos meus ideias. Aos meus irmãos
Aline, Merielle e Leonardo pelos incentivos e pelo apoio incondicional recebido.
Ao João Cleps, reconheço seu trabalho em me orientar, sempre com muita
atenção e dedicação. Com ele aprendi sobre a necessidade de sermos bons profissionais
e que comprometimento proporciona resultados satisfatórios nessa caminhada. Muito
obrigado pela oportunidade.
A todos os meus familiares, tias, tios, primos e primas minha eterna gratidão por
fazer parte dessa grande família.
Aos meus amigos da “Família BSGI” aos quais tenho o orgulho em tê-los por
perto, muito obrigado.
Agradeço a todos os membros do Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA,
ao qual tenho o orgulho e o privilégio de fazer parte e de ter conhecido essas pessoas.
Dentre as quais destaco, Lucimeire, Andrêza, Luciana, Ricardo Leite, Airton, Danielle,
Virna, Taiana, Felipe, Renata, Humberto, Eduardo, Laís, André, Márcia, Daise, Raquel
e Wesley,com todos eles aprendi muito, sempre dando gargalhadas, especialmente no
tradicional “bloco do café”. Essas pessoas ficarão eternamente guardadas na minha
vida.
Agradeço aqueles amigos que fizeram parte de outros laboratórios, e que
estavam constantemente no LAGEA, Daniele Araújo, amiga para todas as horas e que
muito me ensinou com sua sinceridade e firmeza. Com o Dercio aprendi com sua
humildade, com o Gilson sua dedicação constante. William com sua sinceridade e
coragem de viver intensamente cada momento. A vocês dedico meus sinceros
agradecimentos.
Fabiana Borges Victor, essa sim me aturou e suportou, dentro da sala de aula e
também no LAGEA. Grande companheira e amiga, de risadas e inúmeras gargalhadas,
como também alguns momentos de lágrimas e desespero. Amizade essa que tenho a
pretensão de levar pelo resto de minha vida.
Thiago Alves, um grande amigo que sempre esteve comigo na graduação
especialmente nos trabalhos de grupo e depois veio fazer parte do LAGEA. Ensinou-me
o valor de uma amizade sincera e positiva.
Natália Campos, com ela aprendi a ter calma e paciência e nunca me desesperar,
mesmo naquelas situações mais críticas e complicadas. Companheira de todas as horas
contei com ela no facebook e com sua presença infalível e constante no LAGEA.
Jessica, pessoa sincera e firme, amiga de muitas risadas. Compartilhamos alguns
momentos de desespero juntos. Sua amizade contribuiu para que eu pudesse enxergar
que não estava sozinho, tenho ela no facebook.
Nesse percurso duas pessoas passaram a fazer parte de minha vida, nos
conhecemos nas aulas da pós-graduação, Eleusa e Marília. Passamos ter uma amizade
firme com muito carinho e respeito, com elas poderei contar sempre.
Agradeço também a Professora Vera que me inspira e ser um pesquisador que
possa contribuir para o avanço da teoria. Sua humildade, seriedade e dedicação,
motivam muito as pessoas, especialmente no meu caso que estou começando.
Ao Professor Marcelo, fui seu aluno em algumas disciplinas da graduação e
continuei sendo na pós. Um professor muito dedicado e comprometido e grande
parceiro com quem pude contar em vários momentos.
A Mizmar pela atenção, sempre me ajudando nos momentos de desespero.
Agradeço ao apoio financeiro da Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e Assuntos
Estudantis – PROEX/UFU e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico – CNPq pelas bolsas de extensão e iniciação científica, respectivamente.
Muito obrigado por tudo, valeu!
RESUMO
As transformações ocorridas em razão do processo de modernização da agricultura no Brasil geraram desdobramentos distintos entre os diferentes grupos que ocupavam esse território. Nesse contexto, aqueles grupos excluídos desse processo, os camponeses, bem como, o surgimento da luta pela terra serão abordados neste trabalho, que tem como objetivo, apresentar e discutir a questão da reforma agrária em Minas Gerais, a partir de dados e estudos realizados pelo Banco de Dados da Luta pela Terra (DATALUTA) e fontes básicas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e Comissão Pastoral da Terra (CPT). Apresentamos, inicialmente, os dados da evolução da estrutura fundiária com a finalidade de mostrar o panorama da distribuição e concentração da propriedade da terra em Minas Gerais nos anos de 1993, 1998, 2003 e 2011. Consideramos também, a evolução das ocupações de terras e manifestações sociais buscando compreender o processo que, em Minas Gerais, envolve as disputas pela terra. Por último, é analisado o processo de Reforma Agrária, propriamente dito, por meio dos tipos de assentamentos criados por período de governo, compreendendo os anos de 1985 a 2012. Serão apresentados e analisados os tipos mais importantes decorrentes da desapropriação regularização e o reconhecimento, bem como, a compra de terras mediante a programas de crédito fundiário, em específico o Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF) e outros complementares, apoiados pelo Banco Mundial, na denominada Reforma Agrária de Mercado - RAM.
Palavras-chave: Modernização da Agricultura. Luta Pela Terra. Assentamentos Rurais. Minas Gerais. DATALUTA.
ABSTRACT
The changes that occurred on the account of the agricultural modernization process have generated distinct effects between the different groups that occupied this territory. In this context, those groups who have been excluded from this process, the peasants, as well as the emergence of the struggle for land will be addressed in this work. The objective of this paper is to present and discuss the issue of agrarian reform in Minas Gerais, from data and studies by the Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA [Database of Struggle for Land] and basic sources of the Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA [National Institute of Colonization and Agrarian Reform] and the Comissão Pastoral da Terra (CPT) [Pastoral Land Commission]. We present, initially, the data of the evolution of land structure in order to show the overview of the distribution and concentration of land ownership in Minas Gerais in 1993, 1998, 2003 and 2011. We also consider the evolution of land occupations and social events with the intent to understand the process that, in Minas Gerais, surround the disputes over land. Lastly, we analyze the process of agrarian reform itself, basing in the types of settlements created by government’s tenure, comprising the years 1985 to 2012. It’s being presented and analyzed the most important types arising from expropriation, regularization and recognition, as well as the purchase of land supported by land credit programs, in particular the Programa Nacional de Crédito Fundiário - PNCF [National Land Credit] and other complementary, supported by the World Bank, the so-called Reforma Agrária de Mercado – RAM (Agrarian Reform Market).
Keywords: Agricultural Modernization. Fight for land. Rural Settlements. Minas Gerais. DATALUTA.
LISTAS DE ILUSTRAÇÕES
LISTA DE FIGURAS
Figura 01- Minas Gerais – Principais Rodovias do Estado 22 Figura 02- Manifestação – Bloqueio de Rodovia no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
54
Figura 03 - Manifestação – Ocupação de Espaço Público no Noroeste de Minas Gerais
57
Figura 04 - Manifestação – Ocupação de Prédio Público em Belo Horizonte 59
LISTA DE TABELA
Tabela 1 - Minas Gerais - Condição do Produtor – 1970 a 2006 29
LISTA DE GRÁFICO
Gráfico 01 - Minas Gerais – Evolução do Número de Tratores nos Estabelecimentos Agropecuários – 1970 a 2006
30
LISTA DE PRANCHAS
Prancha 1 - Minas Gerais - Número de Ocupações de Terra por Movimento, 1985 – 2012
44
Prancha 2 - Minas Gerais – Tipologias das Manifestações do Campo Número de Manifestações por Município, 2000 – 2012
53
Prancha 3 - Minas Gerais - Índice de Gini da Estrutura Fundiária em 1993, 1998, 2003 e 2011
61
LISTA DE MAPAS
Mapa 1: Minas Gerais – Geografia das Manifestações do Campo Número de Manifestações por Município, 2000 – 2012
51
Mapa 2: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período 1986-1990 – Governo José Sarney
66
Mapa 3: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período 1990-1995 – Governo Collor/Itamar
68
Mapa 4: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Primeiro Mandato de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998)
71
Mapa 5: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária de Mercado criados no período do Governo Fernando Henrique Cardoso (1996-2003)
76
Mapa 6: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Segundo Mandato de Fernando Henrique Cardoso (1998-2003)
77
Mapa 7: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Primeiro Mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2007)
81
Mapa 8: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Segundo Mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (2007-2011)
84
Mapa 9: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Governo de Dilma Roussef (2011-2015)
85
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS Animação Pastoral Rural – APR
Banco da Terra – BT
Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA
Banco Nacional de Desenvolvimento Social – BNDES
Caminho de Libertação dos Sem Terra – CLST
Central Única dos Trabalhadores - CUT
Combate à Pobreza Rural – CPR
Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco – CODEVASF
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG
Consolidação da Agricultura Familiar – CAF
Crédito Fundiário – CF
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA
Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais - EPAMIG
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais - FETAEMG
Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar – FETRAF
Fundo de Investimento do Nordeste – FINOR
Fundo de Investimentos Setoriais – FISET
Instituto Nacional de Colonização e Reforma agrária - INCRA
Fundação Rural Mineira de Colonização e Desenvolvimento Agrário – RURALMINAS
Liga Operária Camponesa - LOC
Ligas do Camponeses Pobres - LCP
Ministério Extraordinário para o Desenvolvimento e a Reforma Agrária – MIRAD
Movimento de Libertação dos Sem Terra – MLST
Movimento de Luta pela Terra – MLT
Movimento de Luta Socialista – MLS
Movimento de Luta Unida Pela Terra – MLUPT
Movimento de Trabalhadores – MT
Movimento Democrático dos Sem Terra - MDST
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
Movimento Popular Pela Reforma Agrária – MPRA
Movimento dos Trabalhadores Rurais – MTR
Movimento Terra, Trabalho e Liberdade – MTL
Organização para Libertação dos Sem Terra – OLST
Organização dos Trabalhadores no Campo – OTC
Partido Comunista do Brasil - PCB
Partido dos Trabalhadores - PT
Plano Nacional de Reforma Agrária - PNRA
Sistema Nacional de Crédito Rural - SNCR
Política Nacional de Crédito Fundiário – PNCF
Programa Cédula da Terra – PCT
Programa de Crédito Integrado e Incorporação dos Cerrados - PCI
Programa de Assentamento Dirigido do Alto Paranaíba - PADAP
Programa de Desenvolvimento dos Cerrados - POLOCENTRO
Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados –
PRODECER
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF
Projeto de Assentamento - PA
Projeto de Reassentamento de Atingidos por Barragens – PRB
Reforma Agrária de Mercado – RAM
Sindicato dos Trabalhadores Rurais – STRs
Sindicato Rural - SR
Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE
União Democrática Ruralista – UDR
SUMÁRIO INTRODUÇÃO 15 1 AS MUDANÇAS OCORRIDAS NO CERRADO E A EMERGÊNCIA DE NOVOS SUJEITOS NA QUESTÃO AGRÁRIA
19
1.1. A modernização da agricultura nos anos 1970 e seus desdobramentos sobre o Cerrado do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
19
1.2 A luta pela terra no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba: histórico e os conflitos protagonizados pelos camponeses
30
1.3 Ofensiva em defesa da propriedade privada da terra: as organizações ruralistas 36 2 AS ESTRATÉGIAS DE LUTA PELA TERRA NO ESTADO DE MINAS GERAIS
39
2.1 A ocupação como forma de acesso à terra 39 2.2 Os movimentos de luta pela terra em Minas Gerais 43 2.3 As manifestações em Minas Gerais 50 2.4 Concentração de terra em Minas Gerais 60
3 REFORMA AGRÁRIA E POLÍTICAS DE CRIAÇÃO DE ASSENTAMENTOS RURAIS EM MINAS GERAIS POR PERÍODO DE GOVERNO (1985 - 2012)
63
3.1 A Reforma Agrária no Governo José Sarney (1986 - 1990) 63 3.2 A Reforma Agrária nos Governo Fernando Collor de Mello e Itamar Franco (1990 – 1994)
67
3.3 A Reforma Agrária nos Governos Fernando Henrique Cardoso (1995 – 2003) 69 3.4 A reforma agrária nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2011) 78 3.5 A Reforma Agrária no Governo Dilma Roussef (2011-2015) 84
CONSIDERAÇÕES FINAIS 87
REFERÊNCIAS 90
15
INTRODUÇÃO
O Brasil é reconhecido mundialmente como um dos principais produtores e
exportadores de produtos agropecuários, como a soja, a cana de açúcar, o café, a laranja,
e a pecuária, principalmente voltada para o comércio de carnes (gado, suínos e aves).
No entanto, o Brasil ainda apresenta algumas contradições decorrentes do
desenvolvimento do capitalismo na agricultura.
Pode-se destacar que para sustentação do poder de grupos hegemônicos que
controlam o país, faz-se necessário a discussão de questões sobre as disputas territoriais
existentes. Por isso, questões referentes as demandas das populações camponesas são
deixadas para o segundo plano, ou tratadas como caso de polícia.
Assim, revela-se um permanente conflito entre os modelos de desenvolvimento
da agricultura no país, tendo sua concentração em dois polos principais: o agronegócio e
agricultura camponesa. Dessa forma, a escolha pela análise sobre os conflitos entre os
modelos de desenvolvimento para a agricultura torna-se importante. Entendemos que o
grau de conflitividade é a expressão concreta da significação da reforma agrária no
contexto atual do desenvolvimento contraditório da sociedade brasileira.
Registra-se em todo território nacional uma estrutura fundiária altamente
concentrada. Por meio da representação cartográfica será possível observamos que as
regiões onde se concentram os projetos de desenvolvimento do agronegócio é onde há
uma tendência de se ter uma concentração da estrutura fundiária mais acentuada.
No caso deste trabalho, iremos destacar o estado de Minas Gerais para
apresentar nossas análises e reflexões sobre as transformações ocorridas a partir dos
anos de 1970 até o momento recente (2012).
Historicamente, Minas Gerais se consolidou devido a sua importância política,
contando com o protagonismo das oligarquias agrárias regionais presente no estado. Foi
com a atuação dessas oligarquias que inúmeros investimentos foram destinados para
Minas Gerais. Nesse contexto, temos a partir dos anos de 1970 vários investimentos do
governo federal para a produção de gênero da agropecuária para exportação. As
mudanças promovidas por esse processo resultou em desdobramentos distintos. Os
grupos beneficiados por estes investimentos, além de ganharem recurso financeiro por
meio dos programas de desenvolvimento e ocupação do Cerrado, conseguiram
concentrar e ampliar ainda mais suas riquezas.
16
Aos camponeses pobres restou a migração para cidade ou o engajamento na luta
pela reforma agrária. Muitos deles passaram a viver como parceiros, arrendatários,
agregados ou assalariados rurais nas lavouras de cana-de-açúcar, café e algodão. A luta
pela terra gerou uma dinamicidade, colocando Minas Gerais como destaque nacional no
número de conflitos envolvendo a posse da terra.
Logo, ocorreu o movimento que questionou a ordem imposta. Conforme
Fernandes (2000), esses camponeses, excluídos e expropriados pela alta produtividade e
pela concentração de terras, tendem a organizar-se em busca de sua reterritorialização,
mediante a ocupação de terras, e como resultado tem-se a criação dos assentamentos
rurais. Em termos mais amplos da questão agrária, a contribuição da pesquisa é o de
apresentar um panorama sobre a luta pela terra desenvolvida em Minas Gerais nas
últimas quatro décadas.
Este trabalho é resultado dos projetos desenvolvidos no período do curso de
graduação. Participamos nos projetos de extensão financiados pela Pró-Reitoria de
Extensão, Cultura e Assuntos Estudantis – PROEX/UFU. Destaca-se os seguintes
projetos: Territorialização do Capital e Luta pela Terra em Minas Gerais: Uma Pesquisa
sobre os Movimentos Socioterritoriais do Triângulo Mineiro (2009 - 2009); Da prisão
da dívida ao território da política: O Movimento dos Atingidos pela Reforma Agrária de
Mercado (MARAM)- conhecimento e direitos sociais (2009 - 2010); Agricultura
Familiar como Base para o Desenvolvimento Territorial Local e Sustentável: avaliando
experiências de projetos de Reforma Agrária no Triângulo Mineiro; Geografia dos
conflitos no campo em Minas Gerais: pesquisas, metodologias e estudos a partir do
Banco de Dados da Luta pela Terra – DATALUTA.
Participamos também de projetos de Iniciação Científica financiados pelo
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, com os
projetos: A Produção de Agrocombustível: reprodução de capitais e impactos
socioterritoriais em Minas Gerais (2011 - 2012); Questão agrária, território e
agronegócio em Minas Gerais: as disputas territoriais na produção de agroenergia no
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2012 - 2012).
A participação nesses projetos nos permitiu realizarmos alguns trabalhos de
campos nos assentamentos de reforma agrária de mercado no município de Iturama e
em Ituiutaba, bem como, alguns assentamentos de reforma agrária. Embora, optamos
por não explorá-los em específico no presente trabalho.
17
Para construção deste trabalho, optamos por realizar uma revisão teórica de
reflexões e conceitos adotados na Geografia que estudam a problemática da questão
agrária presente no país. A partir das políticas públicas agrícolas e sobre a reforma
agrária, buscamos estudar a conflitualidade do processo, associando questões sobre os
instrumentos utilizados pelo Estado/capital e as estratégias dos camponeses em busca de
sua reprodução socioeconômica.
A metodologia utilizada para a elaboração deste trabalho, em termos teóricos,
teve como finalidade compreender as disputas e os desdobramentos da
(re)territorialização do campesinato. Neste processo, encontram-se algumas barreiras,
como a disputa por território pelos agricultores empresariais/agronegócio e os
camponeses, fatores que têm merecido destaque para as pesquisas geográficas.
Como objetivo geral, procuramos compreender as transformações decorrentes do
processo de modernização da agricultura, bem como as estratégias desenvolvidas pelos
camponeses e as conquistas dos assentamentos rurais criados no período de 1985 – 2012
no estado de Minas Gerais.
Dentre os principais objetivos específicos desse trabalho, destacam-se:
- Apresentar as principais estratégias desenvolvidas pelos camponeses na luta pela terra
no período de1985 a 2012;
- Descrever as políticas públicas de Reforma Agrária, a partir do período de abertura
política e do 1º PNRA (Plano Nacional de Reforma Agrária elaborado em 1986), em
Minas Gerais nos diferentes períodos de governo, até o presente (2012);
- Apresentar as principais formas de obtenção e criação de assentamentos rurais,
desapropriação, regularização e reconhecimento, bem como, os criados pela reforma
agrária de mercado;
- Espacializar as ocupações e manifestações camponesas em Minas Gerais.
Em seguida, buscamos também informações por meio dos dados sobre as
ocupações de terra, manifestações e assentamentos rurais disponíveis no Banco de
Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, organizando por período de governo.
Posteriormente, os dados foram representados em gráficos, tabelas e a sua
espacialização feita utilizando ferramentas cartográficas e programas como Philcarto
4.5 e o CorelDRAW X5.
Este trabalho está estruturado em três capítulos, além desta introdução,
considerações finais e as referências citadas e consultadas. No primeiro capítulo,
18
apresentamos uma caracterização das transformações políticas e econômicas ocorridas a
partir dos anos de 1970. Consideramos que o governo dos militares promoveu uma
política de incentivos à modernização da agricultura o que significou impactos no
campo. A região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba tornou-se o principal polo de
atração desses investimentos. São descritos, portanto, os principais efeitos desse
processo de modernização, inclusive no mundo do trabalho rural com os principais
conflitos, e o início das greves dos camponeses assalariados.
O segundo capítulo trata das estratégias desenvolvidas pelos camponeses no
conflito polarizado entre reforma agrária versus modernização técnica da agricultura. A
crise no mundo do trabalho rural promovida pela introdução da máquina no processo
produtivo fazendo com que grupos e entidades de apoio à reforma agrária passem a
organizar os camponeses para a realização da luta pela terra. Desse modo, procuramos
apresentar os principais agentes articuladores dessa ação. Dentre os principais
instrumentos de luta desenvolvidos pelos camponeses, destacamos as ocupações de terra
e as manifestações. Este capítulo termina com a apresentação da espacialização do
índice de Gini da Estrutura Fundiária no estado de Minas Gerais dos anos de 1993,
1998, 2003 e 2011.
O terceiro capítulo discute os desafios e as conquistas dos camponeses ao longo
dos últimos 30 anos de luta pela terra, sendo alterada conforme a conjuntura política.
Os assentamentos de reforma agrária se materializam no espaço agrário brasileiro
fundamentalmente pela luta dos camponeses. Com uma perspectiva diferente da lógica
do capital, os camponeses lutam para conseguir uma pequena parcela de terra onde
possam produzir alimentos para o autoconsumo, abastecimento interno e a sua
comercialização em escala local e regional. Apresentamos, por meio de mapas, os
assentamentos criados por período de governo 1985 – 2012, considerando que o tema
reforma agrária foi revigorado politicamente nesse momento. Destacamos os principais
acontecimentos que interferiram na reforma agrária em cada governo e terminamos este
capítulo comentando sobre os resultados dos dez anos do governo do Partido dos
Trabalhadores (PT) e os seus resultados para os movimentos sociais rurais.
19
1 AS MUDANÇAS OCORRIDAS NO CERRADO E A EMERGÊNCIA DE
NOVOS SUJEITOS NA QUESTÃO AGRÁRIA
As transformações ocorridas no Brasil, no início da década de 1970,
promoveram inúmeras mudanças no espaço agrário, tanto no que diz respeito à
ocupação por novas lavouras nas áreas de Cerrado quanto à introdução de novas
técnicas produtivas. Esse momento ficou conhecido como “modernização
conservadora”, sendo caracterizado especialmente pela melhoria técnica da agricultura
empresarial, contado com inúmeros investimentos por parte do Estado para o seu
desenvolvimento.
Em Minas Gerais a região escolhida para implantar os projetos de
desenvolvimento dos governos militares foi o Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. Inicia-
se nesse contexto as principais ações como, por exemplo, as greves dos camponeses
assalariados.
Neste item iremos discorrer sobre os principais desdobramentos protagonizados
pelos camponeses no processo de modernização. Os resultados das ações desses sujeitos
irão resultar em um novo elemento da questão agrária no estado de Minas Gerais.
1.1. A modernização da agricultura nos anos 1970 e seus desdobramentos sobre o
Cerrado do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
O Estado brasileiro criou as condições para que essa melhoria na base técnica
pudesse promover o aumento da produção e da produtividade de gêneros agrícolas
destinados à exportação. O interior do Brasil, sobretudo o bioma Cerrado, foi
efetivamente a principal área a ser ocupada para atender a demanda internacional de
produção dessas culturas.
O termo "modernização conservadora1", nos faz refletir sobre os interesses do
Estado, juntamente com os grupos de industriais e as elites agrárias, de se manterem no
controle econômico e político do Brasil. O processo de modernização não chegou de
maneira igualitária à população rural do país, pelo contrário, quem desfrutou dos
benefícios da modernização foram grupos muito reduzidos da população brasileira. O
1 Sobre este conceito maiores detalhes em Graziano da Silva (1981).
20
modelo adotado foi o de investir em médias e grandes propriedades, permanecendo
dessa maneira inalterada a concentração da propriedade fundiária no país. Para Sauer
(2010),
Estas mudanças foram realizadas basicamente através de pesados investimentos governamentais no setor industrial, buscando modernizar a economia nacional e destruindo sua antiga base agrícola. O principal instrumento, utilizado pelo Estado para promover esta transformação, foi o crédito agrícola subsidiado que capitalizou os grandes proprietários, possibilitando a crescente incorporação de insumos industriais na produção agropecuária. Os subsídios governamentais abriram a oportunidade para investimentos pesados na agropecuária, promovendo seu avanço tecnológico através do uso de tratores e máquinas, sementes selecionadas, fertilizantes químicos e pesticidas etc. (SAUER, 2010 p. 29).
O principal protagonista desse desenvolvimento, o Estado, irá participar na
regulação dos preços mínimos, além de oferecer créditos a juros baixos, o
financiamento e fornecimento de pesquisa na agropecuária e ainda o desenvolvimento
de projetos de ocupação em áreas do Cerrado.
A política de preços mínimos foi o instrumento governamental utilizado por
meio de regulações ou impostos, que teve como objetivo estabelecer o valor mínimo da
produção agrícola, como por exemplo, o café, a cana-de-açúcar e a soja. Para que se
tornasse vantajoso, foi preciso que os valores desses gêneros no mercado internacional
ficassem abaixo do valor estabelecido pelo estado brasileiro, tendo assim, uma maior
segurança na produção agrícola.
Outro instrumento importante, que viabilizou as alterações na base técnica da
agricultura brasileira foi o Sistema Nacional de Crédito Rural - SNCR, criado em 1965.
Devido ao SNCR, foi possível o incentivo à produção, ao investimento e à
comercialização dos produtos oriundos da agropecuária. Destacam-se os ciclos da cana-
de-açúcar, do algodão, do café, da mandioca, do milho e da soja (MARTINS, 2013).
Nesse momento, temos também o fortalecimento de diversos centros de
pesquisas para desenvolver as melhores condições com base em pesquisas científicas
para o aumento da produção e produtividade dos gêneros agrícolas.
O interesse econômico pelo cerrado data do século XIX, quando pesquisadores de outros países visitaram o Brasil. Entretanto, as razões de ordem econômica para a sua exploração surgiram a partir da década de 70, conforme já destacado. A criação do Centro de Pesquisa Agropecuária do Cerrado (CPAC), órgão ligado à EMBRAPA, contribuiu para o desenvolvimento de estudos sobre a correção de solos para atender às
21
necessidades das diversas lavouras a serem cultivadas na região. (PESSÔA; SILVA, 1997, s./p.)
As mudanças nas pesquisas agropecuárias começaram a ocorrer em 1975,
momento que se inicia uma série de ações do Estado, com o objetivo de acelerar o
desenvolvimento agrícola em alguns estados onde domínio morfoclimático do Cerrado
está presente, sendo voltada a atenção para Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso e
Distrito Federal. Ao mesmo tempo em que se iniciam as atividades de pesquisa, tem-se
a organização de uma infraestrutura para atender essa nova demanda oriunda da
produção, como a construção de rodovias ligando o polo produtivo aos principais portos
para exportação e para o armazenamento, tivemos a implantação de silos e armazéns.
Assim, A região do Triângulo Mineiro passa a ser reconhecida como uma área que, localizada junto aos grandes mercados urbanos do país, constitui uma grande fronteira a ser ocupada. Além disso, as características naturais dessas áreas – marcadas pela topografia plana e por solos até então considerados improdutivos –, favoreciam a mecanização e a aplicação de quantidades consideráveis de corretivos e fertilizantes, atendendo às necessidades de expansão econômica geradas pelo modelo capitalista. Ora, as estratégias desenvolvimentistas e integracionistas do governo militar tinham, entre os seus objetivos primordiais, o desenvolvimento industrial e a expansão da fronteira agrícola [...]. (GOMES; CLEPS JR., 2006, p. 132-133).
De maneira geral, esses projetos voltaram-se para a produção de monocultura de
exportação, para a pecuária extensiva e para a construção de agroindústrias, com forte
presença do modelo tecnológico disseminado pela Revolução Verde. Isso promoveu
intensas transformações na base técnica da produção agrícola, sendo adotado um novo
padrão tecnológico baseado na utilização integrada de mecanização e insumos
químicos.
Encontram-se no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, terras com uma topografia
plana, o que facilita a mecanização, além de uma logística de transporte adequada
principalmente as rodovias que otimizam o escoamento da produção. Dentre as rodovias
temos as federais, BR 365, BR 364, BR 050, BR 153, BR 262, BR 146 e as estaduais
MG 188, MG 190, MG 225, MG 230, MG 341, MG 427, MG 452 e MG 497. Na
sequência apresentamos a figura 1, que representa a malha rodoviária presente em
Minas Gerais.
Dentre as BR's citadas, destaca-se a BR 262 que liga diversos municípios do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba a Vitória, capital do Espírito Santo, tendo o porto de
exportação, sendo uma via de escoação da produção agrícola da região. A BR 262 está
22
estrategicamente localizada como um dos principais corredores de acessos à região
Centro-Oeste do país. Outra rodovia importante é a BR 050, que liga a região do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba à capital federal Brasília e ao porto de Santos no
estado de São Paulo, é também uma via de circulação e comercialização das
mercadorias que são produzidas nesta região.
Figura 01- Minas Gerais – Principais Rodovias do Estado
Fonte: Ministério dos Transportes Outro componente presente no apoio do Estado foi a assistência técnica e a
extensão rural oferecida aos novos produtores do Cerrado, contribuindo para a difusão
das novas tecnologias. A pesquisa desenvolvida pela Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária - EMBRAPA CERRADO foi consolidada como principal objetivo, o
desenvolvimento de tecnologias para viabilizar uma efetiva ocupação do Cerrado.
A equipe de pesquisadores, formada especialmente por engenheiros agrônomos,
saiu a campo e começou a realizar um diagnóstico sobre as limitações do uso agrícola
23
do solo do Cerrado. Eles constataram a existência de seis problemas tendo em vista que
a primeira se referia As informações existentes sobre os recursos naturais eram bastante generalizadas e insuficientes para dar suporte a um programa de desenvolvimento regional. Em segundo lugar, as chuvas, embora, quantitativamente satisfatórias, eram mal distribuídas e com ocorrência de veranicos durante a fase reprodutiva dos cultivos. A baixa fertilidade dos solos era outro fator limitante. [...] O quarto problema era o manejo deficiente, pois o cultivo por métodos inadequados conduziria à rápida degradação do solo. A incidência de pragas e doenças em áreas de monocultivo, característica predominante dos sistemas produtivos constituiu-se no quinto problema. Finalmente, o conhecimento sobre as peculiaridades ambientais da região e suas características econômicas e sociais na ocupação humana eram bastante restritos. (EMBRAPA, 2012, s/p).
Diversos centros de pesquisa são envolvidos no trabalho de levantamentos das
informações necessárias dos recursos naturais disponíveis, tais como, outras unidades
da EMBRAPA, Empresas Estaduais, no caso de Minas Gerais a Empresa de Pesquisa
Agropecuária de Minas Gerais - EPAMIG, Institutos e algumas Universidades. A área
de abrangência das pesquisas é em nível regional, microrregional e local, possibilitando
uma aproximação sobre a realidade do Cerrado.
As descobertas científicas, somadas aos fatores de ordem política, técnica e
econômicas, levadas aos produtores, contribuíram para resultados rápidos e expressivos.
A política agrícola dos governos militares foi o fator importante que promoveu o
sucesso desses projetos.
É preciso considerar que a participação do Estado e de grupos estrangeiros
foram decisivas para que o Cerrado tornasse uma das principais áreas de expansão da
produção agrícola no Brasil. Os investimentos em pesquisas relacionadas ao
melhoramento das condições produtivas do solo foi o primeiro passo para criar as
condições necessárias que pudessem atender as necessidades nutricionais dessas
culturas, principalmente no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba como área de expansão
dessa produção.
Quanto às características químicas, segundo Prado (2005), os solos do Cerrado,
são bastante ácidos, com pH que pode variar de menos de 4 a pouco mais de 5. Esta
forte acidez é devida em boa parte aos altos níveis de Al3+ o que os torna
aluminotóxicos para a maioria das plantas agrícolas, sendo economicamente inviável a
produção agrícola em condições naturais.
No que concerne ao clima da região “segundo a classificação de Koppen é o
Cwa, ou seja, clima mesotérmico úmido com seca no inverno e chuva no verão. A
24
temperatura média anual é de 22º C com um total pluviométrico de 1500 mm/ano, e
presença de uma estação seca bem definida de maio a setembro.” (LIMA, ROSA,
FELTRAN FILHO, 1989, p.130). As condições climáticas favorecem o bom
desempenho de espécies de gramíneas e oleaginosas contando principalmente com um
ótimo índice pluviométrico e com uma regularidade ideal para o bom desenvolvimento
dessas culturas.
Ab`Saber (2003), nos aponta para essa modificações em que estava passando o
Cerrado, dizendo que
Durante as três últimas décadas, algumas regiões do Centro-Sul do Brasil mudaram do ponto de vista da organização humana, dos espaços herdados da natureza, incorporando padrões modernos que abafaram, por substituição parcial, velhas e arcaicas estruturas sociais e econômicas. Essas mudanças ocorreram, principalmente, devido à implantação de novas infra-estruturas viárias e energéticas, além da descoberta de impensadas vocações dos solos regionais para atividade agrárias rentáveis. (AB`SABER, 2003, p. 35).
Nesse sentido, esses investimentos para melhorar as condições de acidez do solo
com o uso de corretivos para atender às necessidades químicas das diversas culturas a
serem cultivadas na região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, contribuíram para
tornar o Cerrado uma área onde se concentrou diversos investimentos governamentais.
Toda essa infraestrutura criada, promoveu uma elevação do valor da terra em um curto
período.
A mesorregião geográfica Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba teve grande
influência com a construção da capital federal, Brasília. Para Vesentini (1986),
[...] um dos temas mais reiterados pelo discurso geopolítico brasileiro, desde os seus primórdios, foi a necessidade de se interiorizar a capital federal, de transferi-la para o Planalto Central. Essa ideia normalmente vem interligada a outras, num conjunto onde aparecem os seguintes temas (e proposta de ação): a integração mais efetiva do espaço nacional; a ocupação do interior do país mediante uma marcha para o Oeste; o estabelecimento de uma divisão territorial (administrativa) mais racional do país; a construção de uma rede de transporte densa e eficaz, para facilitar a interiorização da economia e da população[...]. (VESENTINI, 1986, p. 30).
O Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba foi beneficiado, em primeiro lugar, pela sua
posição geográfica estratégica para os diversos fluxos de circulação existentes. Então,
desde sua formação já servia como passagem para várias rotas, onde desenvolvia um
importante papel de apoio a tropeiros e mineradores, fato que contribuiu para o
25
desenvolvimento de atividades comerciais mais intensas na região. As transformações
econômicas e produtivas geraram um intenso movimento migratório, com isso o estado
mineiro registrou um acentuado e significativo aumento populacional.
Dessa forma, o Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba começou a se destacar em
nível nacional como ponto de apoio à comercialização e distribuição, e ainda na
produção de gêneros agrícolas. Intermediando os principais mercados consumidores do
país São Paulo, Rio de Janeiro e as outras regiões do estado de Minas Gerais, assim
como Goiás e Mato Grosso, as movimentações comerciais se intensificaram, houve um
desenvolvimento socioeconômico e rápido processo de urbanização como sustentação
de atividades econômicas, inclusive da industrialização.
A marcha expansionista do capital não se restringe à incorporação de novas
áreas para o aumento da produção, mas também tem-se a busca pela água que seja de
boa qualidade e que possa atender as necessidades hídricas das culturas da soja, cana-
de-açúcar e café. Assim, o Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba tornou-se uma das regiões
mais atrativas para esses investimentos, tendo como base as terras com topografia pouco
acidentada e os inúmeros cursos de água presentes nessa região.
A ocupação do Cerrado foi precedida de uma série de medidas governamentais
para facilitar o emprego de tecnologias modernas beneficiando ao mesmo tempo o
processo de industrialização. O capital investido em melhoria técnica foi possível por
meio do financiamento do crédito rural, importante instrumento que garantiu o
fortalecimento de regiões tradicionais, assim como a incorporação de novas áreas.
Szmrecsány e Ramos (1997) apontam que
Uma outra característica do crédito rural foi a de que ele expandiu sobremaneira a utilização dos chamados “insumos modernos” na agropecuária brasileira. [...] As culturas que mais se beneficiaram foram aquelas que usavam ou que vieram usar insumos sob domínio e/ou de origem industrial. Isto explica o fato de que [...] como os casos do café e cana – lavouras que já haviam sofrido impacto da Revolução Verde em outros países, tais como o trigo, o arroz e a soja. Isso ajuda a entender também porque, em 1980, as culturas de maiores uso de adubação, defensivos ou irrigação, não eram exatamente essas, embora se possa destacar os casos do trigo, do café, da soja [...]. (SZMRECSÁNY; RAMOS, 1997, p. 240).
Dessas culturas, foram escolhidas duas para serem produzidas na região do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, o café e a soja. Elas foram introduzidas por
programas governamentais que buscavam o aumento das exportações no país. É preciso
considerar que foi a partir do golpe militar de 1964, que se promoveu a recomposição
26
do pacto político dominante que sustentava a industrialização e que manteve a
participação das elites agrárias no poder. Como resultado, o governo militar promoveu
uma política de incentivo à modernização da agricultura, com o objetivo de transformar
áreas não ocupadas pela agricultura capitalista em grandes empresas.
Nesse contexto, o Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba é inserido nos planos
econômicos governamentais, como o I Plano Nacional de Desenvolvimento (1972-
1974) e II Plano Nacional de Desenvolvimento (1975-1979), cujo objetivo principal era
estruturar e planejar o modelo de desenvolvimento que se pretendia alcançar no Brasil,
Pessôa e Silva (1997).
Dentre os principais programas governamentais desenvolvidos no Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba destacam-se, o Programa de Crédito Integrado e Incorporação
dos Cerrados – PCI (1972), o Programa de Assentamento Dirigido do Alto Paranaíba –
PADAP (1973), o Programa de Desenvolvimento dos Cerrados – POLOCENTRO
(1975) e o Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos
Cerrados – PRODECER (1976)2.
Esses programas promoveram uma completa transformação no Cerrado do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, visto que a ocupação dessa região se baseava
anteriormente na produção extensiva de gado para a produção de leite e da agricultura
camponesa. Nos estabelecimentos dos camponeses, a produção geralmente era de feijão,
milho e mandioca e concentrando nos grandes estabelecimentos a produção de soja,
cana-de-açúcar, arroz e trigo.
O aprofundamento do desenvolvimento capitalista no campo brasileiro foi o
principal responsável por deteriorar as condições de vida dos camponeses. Grande
parcela da população que vivia no campo eram trabalhadores nas fazendas, trabalhando
como meeiros, arrendatários, parceiros, assim como os posseiros que já residiam em
suas terras.
Desse modo, no período militar, é possível verificarmos que houve um
fortalecimento das oligarquias rurais, com o apoio do Estado por meio dos programas
de desenvolvimentos, de colonização e de crédito. No entanto, as oligarquias que
passam a controlar o Cerrado do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba a partir do final da
década de 1970 são oriundas em grande medida de outros estados do país. Para a
2 Para maiores detalhes sobre esses programas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba ver Pessôa (1989).
27
produção de soja, temos principalmente os gaúchos e paulistas e alguns agricultores do
Sul de Minas, já na produção do café, vieram os paranaenses e paulistas. O resultado foi
o avanço, nos primeiros anos da década de 80, das culturas de mercado externo (café,
soja, cana-de-açúcar) em detrimento das culturas de mercado interno (arroz, feijão,
milho, mandioca). Pessôa e Silva (1997).
Essas mudanças que ocorreram na região promoveu a expulsão dos camponeses
das propriedades rurais, considerando a industrialização da agricultura, para a parcela
pobre do campo, aumentando as desigualdades e a miséria. Para Graziano da Silva
(2003), [...] completada a industrialização propriamente dita, se inicia nos anos 60 a industrialização da própria agricultura: constitui-se um seguimento específico destinado a fornecer máquinas e insumos para o campo; e transforma-se as relações de trabalho, consolidando-se o assalariamento nos setores mais dinâmicos da agricultura no Centro-Sul do País. A agricultura já perdera a auto-suficiência de que dispunha no complexo rural para produzir os próprios meios de produção de que necessitava e os bens de consumo final, [...] E, agora, a agricultura passa a operar como se fosse ela mesma uma indústria de um ramo qualquer da produção: ela não apenas compra a força de trabalho e os insumos que necessita de certas indústrias como também vende seus produtos, os quais converteram, em sua grande maioria, em matérias-primas para outras indústrias. O processo produtivo perde aquelas características artesanais próprias de atividades camponesas e passa a exibir uma divisão do trabalho crescente, como na fase da manufatura e da grande indústria. (GRAZIANO DA SILVA, 2003, p. 90 grifo nosso).
A industrialização da agricultura ocorre de modo parcial, não atingindo a todas
as fases do processo produtivo dos gêneros agrícolas. Pode-se destacar a colheita das
culturas de café, cana-de-açúcar e algodão, fase da produção, que, aliás, vem recebendo
significativas inovações tecnológicas nos últimos anos.
Os camponeses serão assalariados rurais em algumas fazendas devido à expulsão
promovida pelo processo de industrialização no campo. Nesse sentido, eles passam a
trabalhar na colheita do café, principalmente nos municípios de Araguari, Campos Alto,
Carmo do Paranaíba, Coromandel, Monte Carmelo, Patrocínio e São Gotardo. Na
colheita do algodão, nos municípios de Ituiutaba, Centralina e Iturama, e no corte da
cana-de-açúcar em Fronteira, Passos e Uberaba.
Podemos delinear algumas dificuldades vividas por esses camponeses,
considerando-se principalmente as longas jornadas de trabalho, em que o limite legal é
de 48 horas de trabalho semanal, os dados do Censo Demográfico de 1980 mostram que
30,9% da População Economicamente Ativa agrícola declarou estar submetida a uma
jornada maior, segundo Graziano da Silva (2003).
28
Outra dificuldade que agravava ainda mais as condições de vida dos
trabalhadores eram as baixas rendas obtidas pelo seu trabalho. Em sua maioria, os
camponeses obtinham uma renda muito inferior ao salário mínimo aumentando dessa
maneira o aprofundamento das desigualdades no campo.
É preciso considerar que os camponeses desempenhavam nessas empresas
agrícolas um trabalho acessório, sendo necessário o seu exercício apenas em alguns
momentos do processo produtivo, especialmente na colheita. Isso acentuou ainda mais a
pobreza, pois o momento da colheita era curto e nos demais períodos esses camponeses
se empregavam em outras propriedades ou viviam nas periferias dos centros urbanos.
Por outro lado, uma parcela significativa da população rural não conseguiu ser
absorvida pelo processo de industrialização, e assim inicia-se a migração do campo para
a cidade, o êxodo rural. Essa ampla disponibilidade de mão-de-obra, vai fazer com que
muitos vão viver do subemprego gerando assim a crise do espaço urbano que não estava
estruturada para receber esse contingente vindo do campo.
De modo gradativo, a industrialização da agricultura vai dispensando os
camponeses do trabalho na lavoura, sendo necessário agora incorporar um aparato de
maquinários que farão o trabalho anteriormente realizado por eles.
As mudanças ocorridas na década de 1970 terão seus efeitos, principalmente nos
anos de 1980. A mundialização do capital, as alterações nos sistemas produtivos e no
modo de vida do camponês, irão ser diretamente afetados, a crise e a pobreza no campo
aumentam de modo considerável.
No início dos anos de 1980 temos o surgimento de inúmeros conflitos no
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, dentre os quais podemos destacar: dificuldade dos
camponeses de ter acesso à terra e a expulsão de inúmeros camponeses – meeiros,
arrendatários e parceiros, pela incorporação de novas áreas à agricultura empresarial;
falta de oportunidade de emprego no campo promovido pela introdução da máquina no
processo produtivo; problemas relativos à questões trabalhistas, no que tange, ao valor
pago pela colheita, assim como, o cumprimento das garantias trabalhistas presentes no
Estatuto do Trabalhador Rural.
Ao analisarmos os dados dos Censos Agropecuários no período de 1970 a 2006,
no estado de Minas Gerais, iremos identificar que houve um aumento do número de
proprietários e uma gradativa redução do número das demais categorias da condição do
produtor. A seguir, apresentamos a tabela 1 demonstrando essas mudanças.
29
Segundo Neto e Gomes (2004), a condição do produtor em relação às terras
pode influenciar de forma concreta no momento da incorporação de novas tecnologias.
Um aspecto a ser considerado é o fato do produtor, na condição de parceiro,
arrendatário e ocupante, ter pouco estímulo para adoção de processos tecnológicos mais
eficientes, levando-se em consideração a ocupação temporária e a precariedade do
acesso aos recursos.
Tabela 1 – Minas Gerais - Condição do Produtor* – 1970 a 2006
1970 1975 1980 1985 1995/1996 2006** Proprietário 387 397 415 060 422 811 472 853 439 335 476.184 Arrendatário 24 537 16 497 21 618 21 521 15 688 14.570
Parceiro 11 102 9 253 8 840 16 335 16 018 12.912 Ocupante 30 989 22 705 27 362 40 779 25 636 25.533
* Considerou-se produtor a pessoa física ou jurídica que detivesse a responsabilidade da exploração do estabelecimento, quer fosse o mesmo constituído de terras próprias ou de propriedade de terceiros, os produtores foram classificados em proprietário, arrendatário, parceiro e ocupante. ** A inclusão das categorias de “Produtor Sem Área” e “Assentado Sem Titulação Definitiva”, são apresentadas no Censo Agropecuário de 2006, no entanto, iremos abordar essas categorias no próximo item. Fonte: IBGE - Censo Agropecuário de 1970, 1975, 1980, 1985, 1995-1996 e 2006. Org.: FREITAS, R. L., 2013
Um dos motivos dos desestímulos do produtor nessa condição, mencionados
pelo autor, é não ter a posse definitiva. Os resultados econômicos conquistados ficam
comprometidos pelo fato dos camponeses terem de pagar renda ao proprietário
reduzindo assim o seu ganho.
Outro ponto importante a ser considerado é o uso de tratores como indicador do
maior avanço relativo da modernização de Minas Gerais. Consideramos o trator como a
máquina ou mecanismo que produz tração, fazendo aração, plantio e até mesmo
auxiliando no processo de colheita, variando o nível tecnológico de cada cultura. Na
sequência apresentamos o gráfico 1 com o crescimento do número de tratores em Minas
Gerais.
30
Gráfico 1 – Minas Gerais – Evolução do Número de Tratores nos Estabelecimentos Agropecuários – 1970 a 2006
Fonte: IBGE - Censo Agropecuário de 1970, 1975, 1980, 1985, 1995-1996 e 2006. Org.: FREITAS, R. L., 2013
Neste contexto, podemos ponderar o uso da máquina no processo produtivo
como um fator que contribui para a exclusão dos camponeses. É importante
observarmos que é a partir de 1980 que começaram as greves e os conflitos e
concomitantemente a isso há um aumento expressivo na aquisição de tratores.
1.2 A luta pela terra no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba: histórico e os conflitos
protagonizados pelos camponeses
Após o ano de 1968, a Igreja Católica passa a apoiar as lutas dos trabalhadores
rurais, denunciando as atrocidades cometidas pelos patrões, assim como, o trabalho na
organização para conquista de uma vida digna. É necessário considerarmos que
estávamos nos primeiros anos da ditadura militar, sendo a repressão aos movimentos
sociais rurais muito intensas, o que deixou a Igreja quase que sozinha como instituição
mediadora das demandas dos camponeses.
A Igreja passa a realizar mobilizações de grupos locais, e denunciando a
violência e os maus tratos, por meio da Comissão Pastoral da Terra – CPT, criada em
1975. Para Sauer (2010),
A fundação da CPT nacional, em 1975, foi resultado das experiências pastorais das igrejas da Amazônia (Poletto, 1985), incluindo a diocese de Goiás. D. Tomás Balduino participou ativamente desse processo de formação, incentivando a criação de uma equipe da terra no Estado, ainda em 1975, uma das primeiras CPTs estaduais do país. Essa iniciativa ampliou-se por todo o país, envolvendo muitas igrejas locais, agentes de pastoral e
31
lideranças populares. A CPT se transformou em uma referência política fundamental como um espaço de resistência ao processo de expropriação das populações rurais e denúncia dos conflitos agrários daí decorrentes. (SAUER, 2010, p. 49).
A CPT desempenhou um papel importante na organização dos camponeses
pobres. Os trabalhos começaram nas periferias das cidades, a partir de estudos da
Teologia da Libertação. A Teologia da Libertação é uma tentativa de interpretar a
Escritura através do sofrimento dos pobres. Nesse sentido, uma ala mais progressista da
Igreja Católica, por volta de 1950, começou a se engajar e posicionar de modo mais
claro sobre a postura da Igreja em relação às mazelas que vivia a população do campo
brasileiro.
Influenciados pelas conquistas dos camponeses a partir do marxismo,
especialmente na América do Sul, enfatizando a redistribuição da riqueza, é que se
começa a atuação da Igreja em defesa dos pobres. O entendimento de luta de classe era
desenvolvido nos partidos políticos, sindicatos de trabalhadores rurais e movimentos
sociais. É importante considerarmos que a Igreja Católica não faz uma leitura marxista
da bíblia, mas uma interpretação a partir de um processo excludente considerando a
realidade concreta dos excluídos e assim, começaram os trabalhos de base.
Os agentes da pastoral começam os trabalhos de maneira quase que na
clandestinidade, recomendando-lhes em seus encontros com os camponeses que
permanecessem no sigilo absoluto na definição de suas estratégias para a realização da
luta.
Apesar da repressão e da perseguição dos militares, os conflitos agrários e demandas por terra se mantiveram na agenda política nacional. Sindicatos rurais, lideranças populares e agentes pastorais (a maioria deles sob coordenação da CPT) organizaram e mobilizaram os camponeses [...]. As demandas sociais por terra mantiveram o tema agrário na agenda nacional, forçando respostas do governo, mas também permitindo a organização de setores da sociedade brasileira. Mesmo ocupando um importante espaço político, a Igreja Católica e a CPT não estavam completamente sozinhas na defesa dos direitos das populações rurais. Apesar da intervenção dos militares na Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG, fundada em 1963), o que perdurou até o final dos anos de 1960, sindicatos de trabalhadores rurais, continuou lutando, mesmo que muitas dessas ações e resistências tenham ficado restritas a um nível local[...]. (SAUER, 2010, p. 79).
Até 1990, todas as ocupações de terra no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba,
foram organizadas pelos Sindicato dos Trabalhadores Rurais - STRs, CPT, Federação
dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais - FETAEMG e a Central
32
Única dos Trabalhadores – CUT, e alguns líderes do Partido dos Trabalhadores – PT,
que apoiavam e acompanhavam a luta. A CPT e a CUT, tinham uma postura mais
combativa e radical nas definições e encaminhamentos da luta, criticando a postura da
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG e da FETAEMG
que nessa região tinham uma visão de conduzir a luta pela reforma agrária, por meios
institucionais, sem conflitos com os fazendeiros e patrões.
A CPT Regional do Triângulo iniciou suas atividades no ano de 1978, com o
apoio dos bispos de Uberlândia e Uberaba. Esses municípios considerados polos
regionais, para o desenvolvimento de atividades ligadas ao comércio e as atividades
ligadas à agropecuária. Para Micheloto (1990), a criação dessa entidade permitiu
articular as tarefas de instigar a tomada de consciência dos trabalhadores do campo,
“tendo como instrumento o evangelho”, e o apoio mais concreto aos movimentos
sociais, principalmente na área sindical.
A atuação da CPT no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba,
[...] Segundo um dos coordenadores da entidade, a prioridade da atividade pastoral é o desenvolvimento da organização, principalmente sindical, dos bóias-frias. Isso implica em estimular os trabalhadores a fundar o seu sindicato nos municípios onde ele é inexistente e em organizar oposições sindicais onde o sindicato é considerado “fraco” ou “pelego”. O trabalho da pastoral é visto como trabalho de base, consistindo principalmente na “descoberta e formação de lideranças.” [...]. (MICHELOTO, 1990, p. 68).
O trabalho realizado pela CPT e demais entidades de apoio à reforma agrária,
apresentaram resultados mais concretos, a partir dos anos de 1990, momento em que se
registra avanços significativos, sendo considerada a região de maior concentração de
conflitos pela posse da terra no estado de Minas Gerais. Esses trabalhos de base
contribuíram para formação de várias lideranças que com o passar dos anos por diversos
fatores foram dividindo-se e formando-se novos movimentos, colaborando para uma
maior espacialização e territorialização3 da luta pela terra na região.
Dentre os principais conflitos existentes no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba,
com o apoio dessas entidades, podemos destacar, o protesto dos trabalhadores
camponeses boias-frias no município de Araguari4. No início dos anos de 1980, foi
3 Sobre a discussão dos conceitos de territorialização e espacialização das lutas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, ver em Fernandes (1994, 1999, 2000). 4 Para maiores detalhes sobre a greve dos bóias-frias no café em Araguari, Minas Gerais, ver Oliveira (1991).
33
realizada a primeira greve ocorrida na região que mobilizou uma significativa parcela de
camponeses que trabalhavam nas lavouras de café. Essa ação trouxe conquistas
trabalhistas importantes para os camponeses dessa região. Analisando o contexto, o
movimento reivindicava condições de trabalho mais dignas e lutava contra a exploração
e opressão praticada por parte dos cafeicultores.
[...] Tal greve foi deflagrada devido ao não cumprimento das leis pelos empresários rurais, onde os trabalhadores se revoltaram e não se direcionaram para as fazendas fazendo com que o trabalho parasse momentaneamente. Com esse ato a produção parou por uma semana até que as reivindicações fossem atendidas [...]. Essa movimentação foi um momento onde os trabalhadores mostraram seu poder de decisão não aceitando as condições impostas pelos cafeicultores, demonstrando que estes não são agentes passivos, mas que atuam ativamente dentro do processo das relações sociais de trabalho. (SANTOS, 2010, p.71).
Essa paralisação das atividades representou um avanço na luta dos camponeses
por melhores condições de trabalho, tendo em vista que, uma parcela considerável de
trabalhadores não era da região. A greve foi organizada e articulada principalmente pelo
STRs de Araguari e a FETAEMG.
Em 1980, ocorria a greve nos canaviais de Passos, que foi conduzida por agentes
externos aos canaviais daquela região. Essa ação foi dirigida por um membro do Partido
Comunista do Brasil - PCB que tivera em Pernambuco no ano anterior e tentou aplicar o
modelo adotado, no estado de Minas Gerais. A ação foi deflagrada contra a vontade do
próprio presidente do STRs de Passos.
[...] A greve foi feita a revelia da lei, por acharem os trabalhadores que não havia tempo para conduzi-la dentro dos preceitos legais, o que a enfraqueceu. Apesar de enfraquecida, os canavieiros conseguiram um acordo e voltaram ao trabalho, mas a oposição feita ao movimento pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais – FETAEMG e pelo próprio Sindicato de Passos contribui para que as campanhas salariais de 1981 e de 1982 não tiveram sucesso [...]. (ANDRADE, 1994, p. 215).
No ano de 1984 ocorreram as greves dos trabalhadores camponeses dos
canaviais nos municípios de Fronteira e Uberaba. Com essas greves,
[...] os trabalhadores vem conseguindo realizar contratos coletivos de trabalho que melhoraram sua situação e têm contribuído para que os canavieiros façam alianças com outras organizações sindicais, como a CPT a Oposição Sindical e o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, que vem enfraquecendo a posição conciliadora da FETAEMG. (ANDRADE, 1994, p. 215).
34
Outro momento que marcou avanços significativos nas lutas no Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba, foi a greve coordenada pelo STRs – Centralina entidade esta
fundada em 1963, sendo considerada uma das mais antigas da região. Até por volta de
1987, o sindicato manteve uma postura essencialmente assistencialista e na resolução de
conflitos trabalhistas. Assim,
[...] formado essencialmente em trabalhos católicos que vinham sendo desenvolvidos na região por irmãs da Ordem Franciscana Brasileira, vai coordenar entre os dias 16 e 21 de março de 1987, uma greve dos trabalhadores rurais de Centralina, que reivindicavam o aumento da remuneração pela arroba colhida de algodão. Piquetes foram organizados para barrar os caminhões de trabalhadores e mais de mil boias-frias aderiram a greve. [...] apesar de não ter trazido grandes conquistas imediatas, a greve marcou um grande avanço político, consolidando a imagem da oposição sindical, que venceu as eleições para diretoria do STR neste mesmo ano, com um programa que avançava muito politicamente em relação ao que estava posto, incluindo, por exemplo, a luta pela reforma agrária. (GOMES, 2004, p. 111).
Temos no ano seguinte, em 1988, no Pontal do Triângulo Mineiro no distrito de
Limeira d’Oeste, naquele momento, ligado ao município de Iturama, a greve dos
camponeses boias-frias da cultura de algodão, promovida pelo STR de Iturama. As
famílias eram originárias, em sua maioria, dos municípios vizinhos, tais como
Capinópolis, São Francisco de Sales, Ituiutaba, Iturama, assim como dos municípios de
Carneirinho, Limeira d’Oeste e União de Minas, então distritos de Iturama.
[...] O que motivou a realização da greve, [...] foi o preço pago pelos fazendeiros [de Iturama] pela arroba colhida do algodão, bem abaixo das expectativas dos trabalhadores. Como os patrões não entraram em acordo com a Delegacia Sindical, iniciou-se um processo de mobilização para a greve. Se a estratégia dos empregadores consistia em não conceder centavo algum a mais do que já pagavam, os trabalhadores exigiam seus direitos, caso contrário iriam impedir a saída de caminhões que transportavam os boias-frias.[...] (GUIMARÃES, 2002, p. 54).
O elemento comum em todas as greves ocorridas no Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba estava relacionado à precariedade das condições de trabalho no campo. No
caso da greve do município de Iturama, notou-se outros desdobramentos, sendo
considerada o embrião da luta pela terra na região. Como não houve acordo com o
fazendeiro em melhorar o pagamento da arroba de algodão colhido, o STR de Iturama
convidou agentes da CPT Regional Triângulo para organizarem uma ocupação de terra.
Nesse momento dois frigoríficos de Iturama foram fechados, ficando desempregados
35
cerca de 500 pessoas, o que motivava ainda mais a realização de ocupações de terras,
pelas dificuldades financeiras.
As greves dos camponeses realizadas ao longo dos anos de 1980 contribuíram
para amadurecer a organização e os objetivos de lutar pelo acesso a terra. Conquistar
uma fração de terra significava a melhoria nas condições de trabalho e de vida, a não
subordinação ao patrão. A terra representava um valor simbólico, pois se criava a
possibilidade de cada camponês tornar-se autônomo e liberto. Não significava que eles
queriam a terra para realizar-se como proprietários privados, mas por meio da luta,
queriam a libertação e a superação da sujeição a um patrão, que o explorava e o
expropriava. Nos campos, nas roças, vivendo como parceiros, arrendatários ou agregados, homens, mulheres, jovens e crianças faziam um pouco de tudo. Plantavam, desmatavam regiões, criavam animais, arrendavam terras, eram capatazes ou empregados permanentes. A vida de perambulação afetava os antigos parceiros, ora vivendo em uma fazenda, ora mudando-se para outra. A produção para subsistência era ameaçada pela permanente exigência de retirada da terra lavrada concedida, ou mesmo arrendada pelos fazendeiros. [...](GUIMARÃES, 2002, p. 50).
A crise do trabalho no e do campo no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba pode
ser identificada por dois elementos. O primeiro, diz respeito a intensa exploração que
estava submetido o camponês. Os conflitos decorrentes devido ao não cumprimento do
Estatuto do Trabalhador Rural foi o que motivou a organização dos camponeses com o
apoio de diversas entidades para realização da reforma agrária. Vale ressaltar que as
condições de trabalho eram péssimas além de receberem o valor inferior ao trabalho
empregado. Os conflitos entre camponeses e fazendeiros ocorreram principalmente por
questões relacionadas aos pagamentos, a partir disso temos outros desdobramentos,
entre os quais se destaca a luta pela terra. O apoio da CPT, SRTs, FETAEMG, CUT e
CONTAG foram a base para inúmeras conquistas, porém, em um curto período a
reestruturação produtiva pela qual passa essa região modificaria completamente as
relações de trabalho no campo.
O segundo elemento importante, foi a introdução do trator como um dos
principais instrumentos do processo da modernização do campo. O trator, no sentido
mais amplo, refere-se às máquinas e aos implementos agrícolas que foram
desenvolvidos para minimizar os custos da produção e atender a demanda do ritmo de
36
exportação crescente que passava o país naquele momento. Isso contribuiu para a
formação de grande contingente de reserva de mão-de-obra.
Na situação de pobreza e miséria que se encontravam esses camponeses, a
alternativa era a luta pela sua dignidade. Muitos foram para as cidades, contudo, a
realidade de subemprego, as más condições de trabalho e a sua pouca oferta eram
semelhantes à realidade do campo. O engajamento desses camponeses na luta pela terra
foi o fator definidor que passou a compor a nova questão agrária nessa região. Portanto,
a luta pela terra no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, começou em um momento de
crise promovido pela exploração do capitalismo no campo, modificando as relações de
trabalho e a introdução de novos instrumentos no processo produtivo.
1.3 Ofensiva em defesa da propriedade privada da terra: as organizações
ruralistas
Há que se considerar que na região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba que
ocorre também a organização de algumas entidades de defesa a propriedade privada da
terra, formadas no interior do Sindicato Rural - SR, a União Democrática Ruralista –
UDR. Segundo seus preceitos é uma entidade de classe que se destina a reunir ruralistas
e os grandes produtores e que tem como princípio fundamental a preservação do direito
de propriedade e a manutenção da ordem e respeito às leis do país.
A entidade teve sua primeira sede regional fundada em 1985, na cidade de Presidente Prudente - SP, e posteriormente no ano 1986, na cidade de Goiânia - GO, em seguida foi fundada a primeira UDR - Nacional, com sede em Brasília - DF. Os proprietários rurais sentiram a necessidade de se mobilizarem para conscientizar o Congresso Nacional a criar uma Legislação que assegurasse os direitos de propriedade. Na época, uma ala política de esquerda radical queria acabar com esse direito com objetivo explícito de se implantar um sistema comunista no Brasil. A reação dos ruralistas foi imediata, decidiram então fundar a União Democrática Ruralista - UDR. Foi a maior mobilização do setor já visto neste país. Com isso, conseguiu-se colocar na Constituição de 1988 a Lei que preserva os direitos de propriedade rural em terras produtivas. (UDR, 2013, s/p).
Desde a sua criação a UDR tem atuado principalmente no sentido de coagir e
intimidar os camponeses nas ocupações de terras, sendo que as unidades dessa entidade
estão presentes em todo território nacional. Essa entidade tem incentivado e promovido
a violência no campo, garantindo assim, a permanência da concentração da propriedade
fundiária no país. Após o fim do regime militar, aproximadamente 30 anos de luta pela
37
terra vários camponeses foram assassinados, sofreram tentativas de homicídio, foram
ameaçados e torturados. Essas ações foram promovidas principalmente pelo comando
de lideranças das oligarquias rurais locais e regionais da UDR, segundo relatórios da
CPT. Conforme o Relatório Conflitos de Terra no Brasil, elaborado pela CPT,
A tradicional terra do “entendimento” – pretendido berço da pacificação chamada “nova república” – revelou em 1985, ser, antes de tudo, uma terra de “coronéis modernos”, tendo em comum com os antigos a violenta defesa do “patrimônio”. Continuando as “histórias do sertão”, Minas teve 65 áreas de conflito de terra, e nelas houve enorme violência. Foram mortos 50 pessoas, houve 5 feridos e 5 presos. Atingiram 21.123 pessoas numa área de 100.953ha.. Há um número elevado de ameaçados de morte. (CPT, 1985, p. 19).
Isso nos revela que no processo de redemocratização e abertura política, a
violência que viviam os camponeses em Minas Gerais era ainda sim muito intensa. A
maior parte dessa violência era realizada com a união dos fazendeiros para impedir as
recentes ocupações de terras que se iniciara.
Outra frente importante que a UDR atua é na bancada ruralista presente no
Congresso Nacional e no Senado Federal, criando instrumentos legais para criminalizar
e dificultar o acesso à terra aos camponeses. A bancada ruralista tem forte influência
sobre os sucessivos governos que tivemos no Brasil, contribuindo decisivamente para a
não realização da reforma agrária. Conforme Ribeiro (2009),
[...] o contexto de presença e atuação da bancada ruralista ao longo de sua trajetória no cenário político, historicamente o grupo se coloca como porta-voz das entidades do patronato rural brasileiro, como a União Democrática Ruralista (UDR), a Sociedade Rural Brasileira (SRB), Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA). Logo, a articulação entre essas organizações civis e os parlamentares integrantes da bancada ruralista configura como um dos elementos centrais de defesa e ampliação dos interesses dos segmentos da agricultura capitalista (proprietários, produtores, agentes da cadeia produtiva, entidades de representação) nos espaços de tomada de decisões do Estado. Tal vínculo se estreita mais quando se verifica que vários líderes de entidades patronais disputam o pleito eleitoral e se elegem deputados federais ou senadores, o que lhes permite compor e organizar a bancada ruralista. No espaço político do Congresso, atuam efetivamente como representação de sua base social, em especial das entidades patronais. Essa situação é marcante na trajetória do referido segmento parlamentar. (RIBEIRO, 2009, p. 71).
Além disso, a UDR atua aliada com a mídia que deturpa os fatos e coloca a luta
pela terra como uma ação criminosa à sociedade civil contando com o trabalho
articulado e tendencioso de seus integrantes. Conforme declarações dos representantes,
38
eles tentam “conscientizar” os poderes Legislativo, Executivo e o Judiciário, para o
cumprimento da lei e da ordem.
No Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba criou-se em 1997 a União de Defesa a
Propriedade Rural – UDPR, sediada em Ituiutaba, tendo os mesmos princípios da UDR.
Essa nova entidade foi responsabilizada por vários despejos que foram realizados de
forma arbitrária, especialmente na região do Pontal do Triângulo Mineiro, que é a
região de maior tensão agrária no estado, conforme Gomes (2004).
Portanto, a década de 1980 é significativa devido às transformações ocorridas na
região, o que motivou a organização dos camponeses. A luta pela terra protagonizada
pelos camponeses será marcada por inúmeras conquistas, assim como, momentos de
retrocesso, sendo presente nesse contexto a intensa violência e descaso do poder
público.
39
2 AS ESTRATÉGIAS DE LUTA PELA TERRA NO ESTADO DE MINAS
GERAIS
A conjuntura de tensão promovida pela introdução da máquina no processo
produtivo fazendo com que inúmeros trabalhadores perdessem seus postos de trabalho
contribuiu para que a luta por terra e consequentemente pela reforma agrária passasse a
fazer parte da agenda de entidades como os STRs, CPT e CONTAG. Desse modo,
procuramos apresentar os principais agentes articuladores na organização dos
camponeses trabalhadores.
Dentre os principais instrumentos de luta desenvolvidos pelos camponeses,
destacamos as ocupações de terra e as manifestações. Este capítulo trata das estratégias
desenvolvidas pelos camponeses no conflito polarizado entre reforma agrária versus
modernização técnica da agricultura e termina com a apresentação da espacialização da
estrutura fundiária no estado de Minas Gerais dos anos de 1993, 1998, 2003 e 2011.
2.1 A ocupação como forma de acesso à terra
Em meados das décadas de 1970 e 1980, o regime político dos militares começa
a apresentar sinais de fraqueza. Somado aos anos de violência e repressão vividos pelos
trabalhadores do campo e da cidade, a falta de emprego e moradia, é que os movimentos
sociais rurais ressurgiram na cena política desse país. No campo, além das greves dos
camponeses assalariados, foram organizadas as primeiras ocupações de terra.
A década de 1980 foi importante para a organização dos camponeses
assalariados, as greves trouxeram conquistas trabalhistas significativas, no entanto, a
crise, a pobreza, o desemprego e a violência no campo ainda estavam presentes.
As ocupações iniciaram-se em um momento de crise tanto na política quanto na
economia. A luta pela terra se transformou na luta pela reforma agrária, que significava
a esperança na construção de um país melhor. A ocupação de terra será a principal
estratégia de luta dos movimentos sociais rurais e entidades de apoio à reforma agrária.
Ao realizarem uma ocupação, os camponeses tornam o conflito público, criando
assim um fato político, chamando a atenção de diversos seguimentos da sociedade.
Dentre os principais destacamos o poder judiciário, o legislativo e o executivo, com
suas instituições responsáveis por intermediar o conflito, além da sociedade civil que
40
passa a ter conhecimento das diversas situações pelas informações veiculadas pela
imprensa. Desse modo, a ocupação se apresenta como a garantia de ter acesso à terra,
ela representa uma necessidade de sobrevivência.
Para Fernandes (2000), Primeiro, é preciso dizer que a ocupação é uma ação decorrente de necessidades e expectativas, que inaugura questões, cria fatos e descortina situações. Evidente que esse conjunto de elementos modifica a realidade, aumentando o fluxo das relações sociais. São os trabalhadores desafiando o Estado, que sempre representou os interesses da burguesia agrária e dos capitalistas em geral. [...] A ocupação é, então, parte de um movimento de resistência a esses processos, na defesa dos interesses dos trabalhadores, que é a desapropriação do latifúndio, o assentamento das famílias, a produção e reprodução do trabalho familiar, a cooperação, a criação de políticas agrícolas voltadas para o desenvolvimento da agricultura camponesa, a geração de políticas publicas destinadas aos direitos básicos da cidadania. (FERNANDES 2000, p. 281-282).
Nesse sentido, compreendemos que a ocupação é a primeira estratégia no
processo de espacialização e territorialização da luta dos camponeses sem-terra. No ato
da ocupação já começa a organização do acampamento, espaço este que poderá
permanecer por alguns anos, sendo constante a presença de ameaças, de intimidações e
de despejos sem ordem judicial, e com violência extrema o assassinato de suas
lideranças. O termo ocupação nos remete à utilização de algum espaço que não é
ocupado ou utilizado. Nessa perspectiva, a ocupação nada mais é do que a pressão
frente ao poder público, criando-se com isso um ponto de conflito.
Há que se considerar que a territorialização efetiva do campesinato só ocorrerá
na etapa posterior à ocupação, a criação do assentamento. É nesse território que as
relações tornam-se mais seguras e efetivas, no sentido de que eles não correm o risco de
serem despejados ou expulsos desse espaço conquistado.
Para Fabrini (2003), a ocupação é um pré-requisito para a territorialização
camponesa, porque a partir da terra conquistada se desdobram novas lutas num processo
que se realiza no enfrentamento entre a territorialização das relações capitalistas e/ ou
campesinato. A ocupação em si não define a territorialização, mas marca o início desse
processo.
É preciso considerar que a ocupação é um fato dinâmico e que o seu sucesso vai
depender da correlação de forças políticas locais, regionais, estaduais e nacionais. Os
grupos contrários à luta dos camponeses sem-terra são articulados, e tentam de todas as
formas desestruturar e desestabilizar os acampamentos e enfraquecer a luta.
41
Segundo Stédile (2005),
[...] Se de nosso lado conseguirmos fazer uma grande ocupação, com milhares de pessoas, isso se constitui numa força suficiente e importante. Se o latifúndio for influente, for político, tiver muita força, aumentam as dificuldades. Mas as ocupações de terra continuam a ser a principal forma de pressão de massas que os camponeses têm para, de forma prática, fazer a reforma agrária avançar e terem acesso direto à terra para trabalhar. Trabalho, escola para seus filhos e a oportunidade de produzir. (STÉDILE 2005, p. 117).
Antes da ocupação efetiva de uma propriedade, há um planejamento minucioso
por parte dos movimentos do campo, assim como a definição das famílias que irão
participar da ocupação. Neste planejamento, está a escolha da propriedade, levando em
consideração se está dentro dos pré-requisitos para a realização da reforma agrária,
como por exemplo, se cumpre a função social e se está dentro dos índices de
produtividade estabelecidos por lei. Após tais averiguações iniciam-se as reuniões
promovidas pelos movimentos para decidir sobre o número de famílias participantes,
levando em consideração é claro o tamanho da propriedade.
É importante sinalizarmos que uma estratégia utilizada por todos os movimentos
de luta pela terra e as entidades de apoio à reforma agrária é a presença da família nas
ocupações. Ao levar mulheres, crianças e idosos para o acampamento, há uma demanda
por escolas e cuidados médicos dos idosos, embora nem sempre sejam atendidos. Isso
simboliza não só o homem à frente da luta pela conquista do assentamento rural, mas
também uma vitória da sociedade, caso fosse diferente, a luta poderia certamente não ter
o êxito, como se tem com a união do grupo familiar. Essa estratégia foi desenvolvida
principalmente dentro do MST e sendo utilizada posteriormente por todos os
movimentos de luta pela terra.
Assim, diante desta organização, partem para a realização da ocupação, que
[...] cerca de 92% dos assentamentos existentes no país teve, na sua origem, o conflito de terra promovido, sobretudo, pelas ocupações. Ao ocuparem terras, os movimentos sociais produzem a explicitação do conflito agrário, tornando aquela área ocupada prioritária para a ação do poder público. Assim, as instituições do Estado, sobretudo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), iniciam o processo de identificação do interesse social por aquela propriedade examinando o cumprimento de critérios de produtividade e função social da terra, podendo desencadear a desapropriação e assentamentos das famílias. (BARBOSA; FEITOSA, 2006, p. 177).
42
Dessa maneira, as famílias dão origem ao acampamento, o que se torna um
espaço de resistência e de sobrevivência. A partir daí forma-se o território do
acampamento, estabelecendo também um poder que determina as leis e normas internas
deste novo espaço criado, e isso respeitado por todos que ali habitam e frequentam. Este
pequeno território se torna mais articulado, pois agora passa a existir um determinado
número de pessoas e famílias que antes não existiam nesta porção de terra.
As ocupações representam a atuação dos diversos movimentos presentes no país.
Um ponto importante que temos de considerar são os “rachas5” que ocorrem nessas
organizações por disputas e divergências entre as próprias lideranças. Geralmente, estas
divisões dentro dos movimentos, estão ligadas à questões relacionadas ao poder e as
diferenças quanto à metodologia de luta.
Isso representa dois aspectos importantes, o primeiro refere-se a uma maior
espacialização da luta pela terra. Tendo entidades distintas lutando em um estado onde
a concentração de terra é um fato alarmante, multiplica-se os conflitos pela posse da
terra. O segundo ponto, é o enfraquecimento de alguns grupos consolidados e muitas
vezes uma atuação efêmera dos novos movimentos, deixando de existir após um
período de luta.
Há que se considerar que as atuais lideranças dos movimentos sociais rurais,
precisam ser pessoas que se “profissionalizam6” na luta pela terra. A profissionalização
de lideranças é uma condição para que o movimento sobreviva, em outras palavras, os
movimentos vão além da espontaneidade da formação de um grupo popular, exige
disciplina, a ênfase na formação de novas lideranças, a existência de uma hierarquia e
estratégia de ação.
5 Sobre as divisões e o surgimento de novos movimentos ver em Mitidiero Junior (2002) 6 Idem
43
2.2 Os movimentos de luta pela terra em Minas Gerais7
A luta pela terra é um processo dinâmico que varia conforme a conjuntura
política, contando com o desenvolvimento de novas estratégias de luta, assim como, o
surgimento de vários atores que protagonizam as ações e que contestam a ordem
territorial imposta. Esse dinamismo, faz parte também da atuação dos movimentos
sociais rurais contribuindo para concentrar no estado de Minas Gerais um elevado
número de movimentos sociais rurais.
Nesse sentido, destacamos os principais movimentos sociais rurais que tem
atuado em Minas Gerais, considerando o número de ocupações realizado por eles. Na
sequência apresentamos a prancha 1, que representa as ocupações de terras realizadas
por movimento.
7 No estado mineiro temos a existência de cerca de 27 movimentos registrados na base do DATALUTA (2013) . Existem outros movimentos que têm atuado de maneira isolada no estado de Minas Gerais, entre os quais destacamos, Caminho de Libertação dos Sem Terra – CLST; Movimento de Luta Unida Pela Terra – MLUPT; Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB; Movimento Popular Pela Reforma Agrária – MPRA; Movimento dos Trabalhadores Rurais – MTR; Organização para Libertação dos Sem Terra – OLST e Organização dos Trabalhadores no Campo – OTC. Esses movimentos, embora estejam presentes no espaço agrário mineiro, não foram representados na Prancha 01 por considerarmos representativo o número acima de quatro ocupações.
45
A Liga Operária Camponesa - LOC surgiu da ruptura com o sindicalismo de
Estado, em setembro de 1995. Tem-se registro da primeira ação de ocupação realizada
no ano de 1996, em um terreno da prefeitura de Belo Horizonte, a Vila Corumbiara.
Embora, inicialmente tenha se apresentado como um movimento de origem urbana, as
lutas serão desenvolvidas no campo,
A Liga Operária, [vem] lutando pela conformação da aliança operário-camponesa, tem mobilizado entre os operários e na cidade, recursos materiais e humanos para apoio à luta dos camponeses pobres pela terra e destruição do latifúndio; para apoio à produção dos camponeses pobres e luta contra os monopólios e açambarcadores; e para a defesa, contra os ataques do latifúndio e do velho Estado, do que está sendo conquistado e construído. (LOC, s/d, s/p).
Dentre os principais objetivos aprovados no 1º Congresso no ano de 1997, a
LOC tem como premissa fortalecer a aliança operário-camponesa, para luta pela terra
através do Programa Agrário, pela conquista de uma verdadeira e nova democracia. A
atuação da Liga Operário Camponesa tem se concentrado especialmente no Norte de
Minas Gerais.
Em relação às Ligas do Camponeses Pobres - LCP são várias no Brasil, atuando
em inúmeros municípios. É importante dizer que a LCP é um braço da LOC que foi um
racha da Organização Ala Vermelha, que por sua vez era uma cisão do Partido
Comunista do Brasil, uma organização de linha maoísta.
Pode ser assinalada a existência da Liga dos Camponeses Pobres do Norte de Minas Gerais, no Centro-Oeste de Minas Gerais e a Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia. Todas essas organizações tiveram origem nas Comissões Camponesas de Luta – CCL, que começaram a surgir no ano de 2000. Segundo o INCRA, a Liga dos Camponeses Pobres LCP do Norte de Minas Gerais possui 19 acampamentos e administra 3 assentamentos reunindo cerca de 1500 famílias. [...] A direção da LCP afirma ser contrária à reforma agrária, porque “só a revolução agrária libertará”, e admite utilizar armas na disputa pela terra. “Não pegamos e armas por enquanto por que ainda não precisou. Mas não sei, com o passar do tempo, do jeito que as coisas vão ...” diz “Camarão”. (AZAMBUJA, 2006, s/p).
A LCP tem uma postura mais combativa e defende a revolução agrária. Sua
atuação se concentra no Norte de Minas e no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. As
negociações do movimento com o INCRA têm encontrado dificuldades devido a não
aceitação dos trâmites burocráticos do Estado por parte do movimento e a defesa de
mudanças mais profundas e radicais.
46
O Movimento de Luta pela Terra – MLT foi fundado em 1991 em Itamaraju,
estado da Bahia, por conta da crise nas lavouras de cacau. Este movimento foi criado
por uma liderança expulsa do MST. Chega em Minas Gerais por volta do ano de 1995 e
sua atuação concentra-se no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.
O Movimento Terra, Trabalho e Liberdade – MTL surgiu no interior do processo
de intensificação da luta pela terra na região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, em
conjunto com a Animação Pastoral Rural – APR, entidade esta criada pela dissidência
dentro da CPT estadual e a regional Triângulo Mineiro. A CPT estadual proibiu a
realização de ocupações de terra na região, defendendo que sua postura era organizar os
camponeses, e que a CPT regional estava indo além do que era sua responsabilidade,
quanto sua postura mais combativa e clara sobre os encaminhamentos da luta pela terra
na região.
De fato, foi o primeiro movimento social rural que nasceu nessa região no ano
de 1995, denominado Movimento Democrático dos Sem Terra - MDST.
Posteriormente, passa a se chamar Movimento de Luta Pela Terra – MLT passando,
assim, a realizar várias ocupações na região. Esse movimento ficaria mais conhecido na
região a partir do ano de 1997, quando realiza a ocupação da fazenda Rio das Pedras, no
município de Uberlândia.
Neste mesmo ano, o MLT participa da construção de um movimento nacional e
representa 40% dos delegados presentes no lançamento do Movimento de Libertação
dos Sem Terra – MLST. De 1997 até o ano 2000, o MLST será o movimento que
realizará o maior número de ocupações no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. No final
do ano 2000, o MLST regional Triângulo Mineiro rompe com a direção nacional,
passando a ser denominado de MLST de Luta.
É importante dizer que a ocupação da Fazenda Tangará será um marco
significativo quanto ao histórico de terras ocupadas, pois os conflitos com os sem terras
se davam em áreas de pecuária e pessoas físicas, e agora em uma empresa de
exploração de eucalipto. Dentre os principais acontecimentos que o MTL esteve
envolvido, foi a ocupação da Fazenda Tangará, que resultou na criminalização de seus
principais líderes,
No processo julgado em primeira instância pelo mesmo juiz Joemilson Donizetti Lopes, João Batista, Dim Cabral e Marilda Ribeiro, advogada e coordenadora do MTL, foram novamente condenados por extorsão, incitação ao crime e formação de quadrilha. De acordo com a denúncia, os dirigentes
47
do Movimento “se associaram para a prática de crimes, saqueando e invadindo terras particulares, comandando e incitando pessoas à prática de crimes de roubo de gado, veículos, equipamentos agrícolas e objetos pertencentes à Fazenda Tangará. [...] A Fazenda Tangará, uma área de mais de 5000 hectares, localizada no município de Uberlândia, que era de propriedade da CIF – Companhia de Integração Florestal, uma empresa que recebeu vultosos recursos públicos para o cultivo de eucalipto na década de 70, foi considerada improdutiva pelo INCRA. Em torno de 700 famílias coordenadas pelo MTL ocuparam-na, pela primeira vez, em 1999, que após despejo promovido pela polícia montaram acampamento na rodovia por 6 meses, e a reocuparam em março de 2000. A partir daí se estabeleceu um intenso conflito, que envolveu a polícia, juízes e promotores que sempre atuavam para defender os interesses do latifúndio improdutivo e de tudo faziam para derrotar a luta dos trabalhadores sem terra. Hoje a área é um grande assentamento onde vivem mais de 250 famílias. (MTL, 2009, s/p).
É nesse momento que principiaram intensas perseguições às lideranças dos
movimentos sociais rurais, criminalizando a luta pela terra. O dono da Fazenda Tangará,
juntamente com a elite agrária local e regional, articularam inúmeros acontecimentos
para colocar a luta dos camponeses como uma imagem de desordem e delito.
Já no ano de 2002, o MLST de Luta se une a outros dois movimentos, o
Movimento de Luta Socialista – MLS e o Movimento de Trabalhadores – MT, e passa
a constituir o Movimento Terra, Trabalho e Liberdade – MTL, tendo uma atuação
expressiva na região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.
A Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar – FETRAF MG nasceu
em 2004, baseada no novo sindicalismo CUTista. A criação dessa nova federação
vinculada à CUT, representa uma postura mais combativa e radical na luta pela terra.
Nesse sentido, é importante destacarmos que embora exista a FETAEMG vinculada a
CONTAG, a FETRAF tem uma ideologia diferente dessas anteriores, que segundo eles
representa um sindicalismo “pelego”. Sobre sua origem, a FETRAF
Nasceu consciente de que o grande desafio é lutar para levar o desenvolvimento para 40% da população que vive, mora e produz no campo brasileiro. O nascimento se deu num grande momento: o Congresso de Fundação realizado nos dias 22 a 25 de novembro de 2005, em Luziânia, Estado de Goiás, com a presença de 1200(mil e duzentos) delegados(a) e 250 convidados. Entre os convidados estiveram o Presidente Lula, vários Ministros, Deputados, Senadores, ONG´s, o Presidente da CUT Nacional e uma grande delegação cutista, Movimentos Sociais e uma grande delegação Internacional. Eles foram os padrinhos do nascimento deste instrumento que os agricultores familiares do Brasil decidiram criar. (FETRAF, s/d, s/p).
A FETRAF tem atuado no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, principalmente no
município de Araxá, onde se concentra 90% das ocupações realizadas em Minas Gerais
48
desde a sua fundação. Há que se considerar que existe uma unidade da federação nesse
município.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, foi um dos primeiros
movimentos a chegar em Minas Gerais a convite da CPT Norte de Minas. Conforme
Fernandes (2000),
Em Minas Gerais, o MST nasceu nos vales do Mucuri e Jequitinhonha. Em 1984, nas comunidades Eclesiais de Base do município de Poté começaram as primeiras reuniões, promovidas pela Comissão Pastoral da Terra. Nas CEBs as famílias discutiam as experiências de lutas que o MST vinha realizando nos estados do Sul. Os trabalhadores estavam interessados em conhecer mais a respeito das ocupações de terra e em como construir o Movimento em Minas. [...] Nesse encontro surgiu um série de divergências a respeito das formas de luta em suas diferentes frentes. Predominava a concepção de que deveriam apoiar as lutas de resistência dos posseiros, principalmente pelo fato do aumento do número de assassinatos [...]. Defendiam também a atuação nas lutas dos assalariados. A ocupação de terra não fora contemplada nas deliberações. Essas decisões dificultaram o processo de construção do MST[...]. No final de 1989, o MST iniciara os trabalhos nas regiões Noroeste de Minas e Triângulo Mineiro. (FERNANDES, 2000 p.135 - 137).
O MST se consolidou como um movimento importante em diversas regiões do
estado mineiro, destacando-se sua atuação no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba,
Noroeste de Minas, Norte de Minas, Vale do Jequitinhonha, Vale do Mucuri, Vale do
Rio Doce e Metropolitana de Belo Horizonte. A presença do MST no Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba, se deu pelo convite de agentes da Pastoral da Terra,
principalmente no momento do acampamento no município de Iturama, que teve como
conquista o PA Nova Santo Inácio Ranchinho, em 1993. Nessa fase do acampamento, o
MST teve conflitos internos com a CUT, o que ocasionou o rompimento com o
acampamento. A regional MST Triângulo Mineiro foi criada no ano de 1997, em que se
registrou um aumento do número de ocupações realizadas por este movimento.
A região Norte de Minas tem uma atuação expressiva deste movimento, sendo
uma região central de conflitos agrários. O agravamento da questão agrária é decorrente
dos projetos financiados pelo Fundo de Investimento do Nordeste – FINOR e Fundo de
Investimentos Setoriais – FISET, ambos sobre a coordenação da Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE, na qual o Norte de Minas faz parte.
“Podem-se verificar quatro pilares deste processo, que são: agricultura/fruticultura
irrigada, monocultura de eucalipto, pecuária extensiva e monocultura de algodão”.
(FEITOSA; BARBOSA 2006, p. 179).
49
Os resultados para os camponeses, desse processo de desenvolvimento, na
região aprofundaram ainda mais os conflitos, principalmente na área onde concentrava-
se os posseiros. Para o desenvolvimento da agricultura empresarial, era necessário a
incorporação de novas áreas, daí o início da expulsão dos camponeses de suas terras e o
aumento do número de assassinatos.
A atuação do MST foi fundamental para o assentamento de centenas de famílias
na região, contribuindo assim para redefinir e melhorar a vida dos camponeses
assentados, mesmo que de maneira fraca. Em outras palavras, ao compararmos o nível
de concentração de riqueza no estado de Minas Gerais, o Norte de Minas ainda é o
destaque de concentração da propriedade fundiária.
O Movimento de Libertação dos Sem Terra – MLST nasceu da união de
diferentes líderes de movimentos regionais dos estados do Maranhão, Rio Grande do
Norte, Paraíba, Pernambuco, Bahia, São Paulo e Minas Gerais, no ano 2000. Em alguns
estados não haviam acampamentos organizados, ficando a cargo das lideranças
estaduais realizarem a organização das famílias e as ocupações.
Esse movimento já nasce nacional, no entanto, alguns problemas entre as
lideranças vão fazer com que o movimento se divida no seu processo de luta. Para
Mitidiero Junior (2002),
Foi com estas três importantes lideranças do Triângulo Mineiro que ocorreu o racha interno no MLST, devido a uma discussão direta com o principal líder do movimento, Bruno Maranhão. Acontecido o racha toda a base do movimento nesta região seguiu as posições ditadas por Barroso, João Batista e Marilda formando um novo movimento social no campo: o Movimento de Libertação dos Sem Terra de Luta ou o MLST de Luta. Apenas uma antiga liderança dos sindicatos rurais desta região (Divinão) e uma destacada liderança do movimento (Ana Rita) foram a favor das argumentações de Bruno Maranhão, permanecendo no movimento inicial. De um lado um movimento nacional que acabava de perder grande parte de sua base e de outro um recém formado movimento social no campo, organizado no Estado de Minas Gerais, expandindo suas ações para o Estado de Goiás. Ou o MLST Nacional passava a ter a missão de reconstruir sua base no Triângulo Mineiro e o MSLT de Luta, passava a desenvolver autonomamente a luta pela terra naquela região. (MITIDIERO JUNIOR, 2002, p. 242).
O MLST Nacional, após o rompimento com o MLST de Luta, atual MTL, se
consolidou como um movimento que tem atuado de maneira intensa realizando
inúmeras ocupações em Minas Gerais, concentrando principalmente na região do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. Atualmente, nessa região, juntamente com o MST
são os movimentos que têm realizado o maior número de ocupações.
50
Quanto à CONTAG, STR e a CPT, optamos por representá-las em um único
mapa devido as ações conjuntas que essas entidades vem realizando ao longo do tempo.
A CPT não realiza ocupações de terra como uma entidade individual, sempre atua como
apoio e na organização dos camponeses, e a ação é realizada em conjunto.
A atuação dos inúmeros Sindicatos e da CONTAG se deu fundamentalmente
pela ajuda da CPT, no processo de desenvolver nos camponeses a consciência de que
para conquistar algo era necessário primeiro se organizar, e em seguida desenvolver as
estratégias da luta. Essas três organizações realizaram ocupações de terras em todo o
estado.
2.3 As manifestações em Minas Gerais
As manifestações são compostas de várias pessoas que, geralmente, se unem
para expressar publicamente reivindicações, oriundas de uma determinada demanda. A
atitude de tornar público a existência dos conflitos no campo, pelos movimentos sociais
rurais, tem sido uma das estratégias de luta desenvolvida no processo de ação pela
reforma agrária.
Nesse sentido, o MST acrescentou em seu plano de ação uma nova estratégia de
luta, antes a ação principal do movimento era a ocupação de latifúndios, a partir de 1998
passa a promover as manifestações públicas realizadas em diversos espaços, trazendo os
problemas agrários para pauta de discussão desse país. Antes, exigia terras para semear,
agora, além de terras, quer discutir as condições dos financiamentos que o governo lhe
proporciona. As manifestações geralmente ocorrem no perímetro urbano, sejam os
bloqueios de rodovias, marchas e caminhadas, acampamentos, concentração em espaço
público e a ocupação de prédios públicos. Nos últimos anos
[...] foram registrados diversos atos em favor da Reforma Agrária e outros protestos contra a violência, ou pedindo a desapropriação, ou regularização de terras, renegociação de dívidas, incentivo à pequena produção, em defesa da soberania alimentar, contra a privatização da água e a construção de barragens e em defesa do meio ambiente. Estes atos culminaram em ocupações de prédios públicos, acampamentos, caminhadas, passeatas e bloqueios de ferrovia, balsa e rodovias. Também foram registrados diversos atos pelo país contra a impunidade, a injustiça e a violência no campo. (CLEPS JR. 2011, p. 139).
51
Cada uma dessas tipologias de ações de manifestações ocorrem em um local
específico, assim como buscam o objetivo de atingir determinado grupo de pessoas, seja
da sociedade civil ou dos representantes dos governos. As manifestações têm sido
realizadas como forma de pressão perante o poder público, para atender as
reivindicações oriundas das demandas de acampados e assentados. A seguir,
apresentamos o mapa 1, com a representação das manifestações ocorridas em Minas
Gerais.
Mapa 1: Minas Gerais – Geografia das Manifestações do Campo Número de Manifestações por Município, 2000 – 2012.
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
A maior parte das manifestações ocorre em Belo Horizonte, centro político e
econômico do estado. As principais ações são promovidas na capital devido ao fato de
ser o centro de tomada de decisões e resolução dos conflitos agrários em Minas Gerais.
Cidades consideradas polos regionais também são palco das ações dos movimentos, tais
como, Uberlândia no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, Unaí no Noroeste de Minas,
Montes Claro no Norte de Minas e Governador Valadares no Vale do Rio Doce.
52
Segundo Moura; Victor; Cleps Júnior (2012),
As manifestações sociais, neste sentido e principalmente as relacionadas ao campo, representam importantes instrumentos estratégicos de luta, capacidade de articulação e organização dos movimentos sociais, despertando na população e aos órgãos públicos as discussões sobre o contexto social brasileiro e em especial os problemas e dificuldades no campo. A concentração fundiária, falta de políticas públicas para o meio rural, direitos não atendidos, enfim, um conjunto de fatores que exigem dos movimentos sociais expor suas forças de mobilização por meio das manifestações no processo de luta pela terra. (MOURA; VICTOR; CLEPS JUNIOR, 2012, p. 3).
No momento da realização das ações, todos que estão envolvidos na luta pela
terra participam. Com base nos dados do Banco de Dados de Luta Pela Terra –
DATALUTA, conseguimos identificar as principais demandas dos acampados,
considerando que as manifestações estão relacionadas à exigência de desapropriações,
protesto contra reintegração de posse, bem como, contra a violência no campo e a
cobraça de uma atuação mais efetiva da Comissão dos Direitos Humanos na
investigação de assassinatos no campo.
É importante sinalizar que os acampados e os assentados estão em fases
diferentes na luta pela terra, tendo demandas específicas. Dessa forma, os assentados
apresentam em sua pauta de reivindicações, a criação de política agrícola para os
camponeses assentados da reforma agrária, liberação de crédito agrícola e incentivo à
pequena produção. Outra ação recorrente liderada pelos assentados é a ocupação do
INCRA, para agilizar os processos de liberação de recursos financeiros destinados aos
assentamentos.
Essas manifestações são oriundas da continuidade das relações conflitantes entre
os camponeses, os agentes do agronegócio, os latifundiários e os capitalistas agrários. E
é justamente tornar o conflito público o objetivo central dessas ações. Na sequência
apresentamos a prancha 2, representando as tipologias das manifestações em Minas
Gerais.
53
Prancha 2 - Minas Gerais – Tipologias das Manifestações do Campo Número de Manifestações por Município, 2000 – 2012
54
Outras ações que ocorrem com menor frequência foram registradas, tais como,
audiência pública, celebração religiosa, cerco a construções, encontros, greve de fome e
mutirão. Essas ações ocorreram de uma a quatro vezes no estado. As demais tipologias
representadas ocorreram acima de cinco vezes.
Dentre as principais tipologias de manifestações realizadas pelos camponeses, está o
bloqueio de rodovias. Ao impedirem o fluxo de uma via de circulação de pessoas, veículos
com mercadorias, de maneira simultânea atingem dois objetivos. O primeiro é a chegada da
imprensa, especialmente a televisiva para noticiar a ação, e o segundo objetivo é o momento
dos movimentos distribuírem panfletos para a população, demonstrando o objetivo da ação. É
evidente que carros como ambulâncias furam o bloqueio pelas condições em que se
encontram os pacientes.
A seguir, apresentamos na figura 2 uma notícia de manifestação de bloqueio de
rodovia ocorrida no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.
Figura 2- Manifestação – Bloqueio de Rodovia no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra, arquivo 2012.
55
O bloqueio de rodovia faz parte da Jornada Nacional de Lutas, reunindo inúmeros
movimentos e entidades de apoio à reforma agrária. Dezenas de bloqueios vêm ocorrendo em
Minas Gerais, e um dos principais propósitos é cobrar do poder judiciário a condenação dos
assassinos envolvidos na chacina no acampamento Terra Prometida, conhecido nacionalmente
como Massacre de Felisburgo, no Vale do Jequitinhonha.
Fechar uma via de trânsito e impedir a passagem dos veículos é uma forma eficaz de atingir visibilidade, principalmente porque as poucas horas de bloqueio podem causar consequências como impedir o transporte de produtos, engarrafamentos, etc. São ações que modificam a dinâmica tanto econômica, quanto política do local ou região, mesmo que por pouco tempo; modificam assim a normalidade do cotidiano, e é esse um dos principais objetivos. (MOURA; VICTOR; CLEPS JUNIOR, 2012, p. 8).
Entre outras demandas, o bloqueio de rodovias tem como meta a exigência de
realização da política agrícola, contra o investimento dos governos estadual e federal nas
mineradoras, investigação de crimes ambientais e conflitos relacionados à água. É válido
apontarmos que essas ações tem a participação conjunta de movimentos. Realizam o bloqueio
de rodovias em vários pontos ou reúnem um grupo maior e fecham uma via de grande
circulação.
Como pode ser observado na representação cartográfica, os bloqueios são promovidos
principalmente nas cidades que tem uma importância significativa na região, onde ocorre o
encontro de inúmeras rodovias, essas ações acontecem também nas cidades do entorno. A
principal região onde ocorreu o maior número de bloqueios de rodovias foi o Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba, pela sua importância de circulação e acesso ao centro do país, região
Centro-Oeste, assim como, aos principais centros populacionais do país, região sudeste.
Outra ação desenvolvida nas manifestações é o acampamento. Existe uma diferença
entre o acampamento realizado em uma ocupação de terra e o acampamento resultado de uma
manifestação. Na ocupação de terra, ao montarem um acampamento, forma-se um espaço de
resistência sendo que os camponeses irão permanecer por alguns meses ou anos, dependendo
do tempo da expedição da liminar de reintegração de posse ou da conquista da terra. Já no
acampamento resultado da manifestação, a duração é de no máximo quinze dias, sendo que a
média é de cinco dias. O objetivo é pressionar na sede dos poderes executivo e legislativo,
para que agilizem e atendam as pautas dos camponeses. Em sua maioria, os acampamentos
são montados em frente ao prédio do INCRA-MG, Assembleia Legislativa de Minas Gerais,
ambas na capital do estado, Belo Horizonte. Nas demais regiões do estado, eles acampam em
56
frente a prefeituras, praças no centro da cidade, a fim de chamar a atenção da população local
para os problemas agrários presentes na região.
As caminhadas e as marchas são outras formas de manifestações. É importante
compreendermos que os símbolos religiosos foram transformados em um elemento de luta
política. As ações tais como marchas, caminhadas, romarias e peregrinações foram por anos
atos promovidos principalmente pela Igreja Católica, com o significado de penitência, fé e
esperança.
As ações tradicionais promovidas pela religião tinham como destino dessas
caminhadas os santuários e os centros religiosos. Especialmente no Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba, temos a cidade de Romaria, representando um exemplo dessas peregrinações,
praticada até os dias atuais (2013). Os movimentos camponeses transformaram essa ação,
direcionando as caminhadas e marchas para as cidades aos centros do poder político e
econômico. Em Minas Gerais, elas ocorrem rumo à capital Belo Horizonte. Chaves, (2000),
comenta sobre essas transformações dizendo que,
[...] De uma peregrinação ao território sagrado, elas se transformaram em marcha, caminhada em direção ao espaço político. De um processo de reafirmação e renovação da fé através do sacrifício cujo termo o peregrino reencontra nos lugares considerados santos a comunhão com o transcendente, em uma caminhada que cimenta a esperança através da união de todos, firmada diante de um poder temporal. Transfigurada em luta por reforma agrária, essas novas caminhadas realizaram a passagem da esperança messiânica de uma terra que é promessa para a esperança política de uma terra que deve ser conquistada. [...] As romarias converteram-se em marchas rumo aos centro de poder político, reivindicando direitos que cumpre ao Estado fazer valer. Entretanto, a mesma prática de peregrinação é passível de ser revestida de inúmeros significados e assumiu, nos últimos anos, uma pletora variada de manifestações no Brasil. (CHAVES, 2000, p. 22).
As principais marchas e caminhadas ocorridas em Minas Gerais tinham como
bandeira de luta em memória do Massacre de Eldorado dos Carajás (1995), Massacre de
Corumbiara (1996), e o Massacre de Felisburgo (2004). Essas ações apresentavam em comum
a luta para cobrar justiça, o fim da impunidade e violência no campo. Para Moura (2000),
[...] É um movimento que traz como patrimônio o sacrifício de vários dos seus membros, mas assimilando, por outro lado a parte heróica do sacrifício, nunca se apresentando como um movimento derrotado. Pelo contrário, ele aproveita-se politicamente desse enfrentamento com as forças latifundiárias para mostrar a toda a sociedade a necessidade de se mudar a estrutura fundiária brasileira. Os mortos de Eldorado dos Carajás e de outras regiões são cobrados politicamente e apresentados como símbolos emblemáticos do arcaísmo social do Brasil. Cada vez que se assiste na televisão uma agressão que termina em morte da população camponesa, todos nós paramos para uma reflexão do que representa o movimento sem-terra. As condições de vida, a pobreza em que se encontram, a perversidade política dos donos das terras, tudo isto é visto e comparado. Daí o problema da reforma agrária
57
está hoje em dia posto em discussão nacional, com o respaldo da opinião pública, segundo mostram as pesquisas em todo o território nacional. (MOURA, 2000, p. 134-135).
Essas mobilizações têm chamado a atenção da sociedade civil. É fato que, dos
assassinatos cometidos contra os camponeses no Brasil, segundo a CPT os que foram julgados
e condenados não chegam a 10%. Isso nos revela o quanto os movimentos e a sociedade de
modo geral, precisam avançar para apurar e investigar os crimes.
A concentração no espaço público é outra tipologia de manifestação. Esta ação tem o
intuito de promover atos de protestos, geralmente em frente das agências do Banco do Brasil,
no INCRA, em praças e sedes do poder executivo e legislativo. Essa ação tem a duração de
algumas horas e busca sensibilizar a sociedade civil e chamar a atenção do poder público. A
seguir, apresentamos na figura 3 uma reportagem sobre as ocupações de espaço público.
Figura 3 - Manifestação – Ocupação de Espaço Público no Noroeste de Minas Gerais
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra, arquivo 2012.
58
As principais ações de concentração em espaço público apresentam como
manifestações contra a impunidade e a violência no campo. Em Minas Gerais de 2000 a 2012,
manifestaram especialmente contra a impunidade do Massacre de Felisburgo, o assassinato
dos auditores fiscais do Ministério do Trabalho em Unaí (2004), bem como, atos contra a
construção de usinas hidrelétricas, transposição do Rio São Francisco e a expansão do
agronegócio do eucalipto no norte do estado.
As ocupações em prédios públicos, são realizadas a maior parte, na sede do INCRA e
na Assembleia Legislativa em Belo Horizonte. Essa ação faz parte da Jornada Nacional de
Lutas, que vem denunciar quase duas décadas de impunidade do Massacre de Eldorado dos
Carajás, Pará. As reinvidicações estão relacionadas a Jornada de Lutas por uma Educação do
Campo, contra a impunidade de crimes no campo. Nos últimos dois anos (2010 – 2012),
ocorreram conflitos em relação à atuação do juiz Otávio de Almeida Neves, titular da Vara de
Conflitos Agrários do estado, denúncia de impunidade e imparcialidade foram apresentadas
por promotores do Ministério Publico Estadual.
De acordo com o promotor do Centro de Apoio Operacional de Conflitos Agrários do Ministério Público, Afonso Henrique de Miranda Teixeira, a Vara de Conflitos Agrários está atuando contra os movimentos de luta pela terra. Para ele, o juiz não aplica o princípio norteador do direito agrário da função social da terra, descumpre normas processuais legais e revoga dispositivos que criaram a própria vara. O promotor Renato Augusto de Mendonça apontou evidências de que o magistrado teria afrontado os deveres de imparcialidade. Ele deu exemplos de casos que comprovariam a denúncia, tais como emissão de liminares sem que elas sequer tenham sido pedidas, além de reintegrações de posse consideradas arbitrárias até por magistrados federais. (ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS, 2013, s/p).
Desse modo, inúmeras ações têm sido realizadas para cobrar do poder público a
resolução desse problema. Outra denúncia apresentada nas ocupações do INCRA – MG é a
morosidade em se realizar as desapropriações de terra, tendo a existência de acampamentos há
mais de 10 anos, com famílias resistindo a condições extremas de dificuldade. A assistência
técnica é outro problema apontado pelos movimentos, sendo ineficiente à demanda dos
assentados,quando não muito, inexistente. Em seguida, apresentamos na figura 4 uma
reportagem sobre uma ocupação no prédio do INCRA.
59
Figura 4 - Manifestação – Ocupação de Prédio Público em Belo Horizonte
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra, arquivo 2013.
Conforme a matéria apresentada, a ocupação de prédio público é uma maneira de
pressionar o poder executivo, representado pelo INCRA, a busca de melhoria dos
assentamentos já existentes e o assentamento de famílias acampadas. Muitos camponeses
questionam a permanência da condição do acampamento dentro do assentamento, afirmando a
falta de infraestrutura básica de água e energia elétrica.
Essas ações realizadas pelos movimentos sociais rurais têm como objetivo comum a
diminuição das desigualdades no campo. As ocupações e as manifestações visam a conquista
do assentamento e/ou a melhoria dele. É importante compreendermos a geografia das
desigualdades nesse estado tendo como elemento de analise a concentração da propriedade
fundiária em Minas Gerais.
60
2.4 Concentração de terra em Minas Gerais
Os dados das últimas duas décadas sobre o índice de Gini da estrutura fundiária (1993,
1998, 2003 e 2011) evidenciam a grande desigualdade na distribuição da posse da terra em
Minas Gerais. Conforme podemos observar na Prancha 3, a seguir, o Norte e o Noroeste de
Minas são as regiões que apresentam maiores índices de concentração da propriedade.
Também são as regiões em que são registradas maior intensidade das ações dos movimentos
sociais rurais, principalmente por meio das ocupações de terras e manifestações, de acordo
com o Relatório Dataluta Minas Gerais de 2011.
As mesorregiões que apresentam maiores concentrações de terras são: Norte de Minas
(microrregiões de Januária, Janaúba, Pirapora, Grão Mogol, Salinas e Bocaiuva); Noroeste de
Minas (a concentração da propriedade é forte na microrregião de Paracatu); Vale do
Jequitinhonha (microrregiões de Diamantina e Capelinha); região Metropolitana de Belo
Horizonte (Sete Lagoas e Belo Horizonte); Vale do Mucuri (Teófilo Otoni) e Central Mineira
(Curvelo). Nessas microrregiões, o Índice de Gini apresenta concentração forte e muito forte
(0,701 a 0,900) em 2003 e 20118.
8 De acordo com Câmara (1949) = Concentração nula (0,000 a 0,100); Concentração nula a fraca (0,101 a 0,250); Concentração fraca a média (0,251 a 0,500); Concentração média a forte (0,501 a 0,700); Concentração forte a muito forte (0,701 a 0,900) e Concentração muito forte a absoluta (0,901 a 1,000). In: CÂMARA, L. A concentração da propriedade agrária no Brasil. Boletim Geográfico, Rio de Janeiro, v. 7, n. 77, p. 516-528, ago., 1949.
61
Prancha 3 – Minas Gerais - Índice de Gini da Estrutura Fundiária em 1993, 1998, 2003 e 2011
Fonte: DATALUTA - Org.: FREITAS, R. L., 2012
Ao compararmos os conflitos existentes no estado, observa-se que onde tem-se a
maior concentração de riqueza, tem-se consequentemente maior pobreza, podemos considerar
então, que o número de conflitos é maior.
62
Nas mesorregiões Norte de Minas, Vale do Jequitinhonha e Vale do Mucuri, o
agronegócio tem se apropriado do território, especialmente pelo avanço de projetos de
reflorestamento, sobretudo de eucaliptos e pinus. Além disso, investimentos têm sido
realizados na agricultura e pecuária empresarial, o que gera conflitos pela posse da terra e a
apropriação dos recursos hídricos. Os casos mais conhecidos envolvem conflitos entre
comunidades geraizeiras e empresas reflorestadoras voltadas à sustentação do complexo
siderúrgico do estado (MAZZETTO SILVA, 2009; DATALUTA, 2011).
As regiões que apresentam um elevado índice de concentração da estrutura fundiária
nos últimos anos, tornaram-se atrativas aos investimentos dos governos e dos capitalistas nos
projetos de agricultura irrigada, especialmente no Norte de Minas. Isso ocorre em decorrência
das condições edafoclimáticas e das melhorias das técnicas de produção, destacando-se
principalmente o ramo da fruticultura.
De modo concomitante, é visível que os investimentos nesses projetos agropecuários
têm dinamizado a economia regional, no entanto, uma parcela considerável da população não
é beneficiada por esse desenvolvimento econômico. Os resultados para a população local e
regional são o aumento da concentração de riquezas e, consequentemente, a não alteração da
estrutura fundiária, o que de fato é um problema para o desenvolvimento econômico efetivo.
63
3 REFORMA AGRÁRIA E POLÍTICAS DE CRIAÇÃO DE ASSENTAMENTOS
RURAIS EM MINAS GERAIS POR PERÍODO DE GOVERNO (1985 - 2012)
A luta pela reforma agrária tem como fruto a criação de assentamentos rurais que
representam o território da recriação e reprodução do campesinato brasileiro. Na maioria das
vezes os conflitos são marcados pela violência física, psicológica e simbólica, e como último
recurso para silenciar esse descontentamento vê-se como agressão extrema o uso do
assassinato dos camponeses.
Os assentamentos de reforma agrária se materializam no espaço agrário brasileiro
fundamentalmente pela luta dos camponeses. Com uma perspectiva diferente da lógica do
capital, os camponeses lutam para conseguir uma pequena parcela de terra onde possam
produzir alimentos para o autoconsumo, abastecimento interno e a sua comercialização em
escala local e regional.
Neste capítulo discutiremos os desafios e as conquistas dos camponeses ao longo dos
últimos 30 anos de luta pela terra, sendo alterada conforme a conjuntura política.
Apresentamos, por meio de mapas, os assentamentos criados por período de governo 1985 –
2012, ponderando que o tema reforma agrária foi revitalizado politicamente nesse período.
3.1 A Reforma Agrária no Governo José Sarney (1986 - 1990)
O enfrentamento entre agricultura camponesa e a capitalista, destacam-se como
importante território camponês os assentamentos de reforma agrária, em que as novas e as
antigas sociabilidades são reavivadas e recriadas com a conquista da terra. Dessa maneira,
ergue-se um conjunto de saberes e conhecimentos secularmente acumulados nos
assentamentos, ou seja, saberes que estavam sendo erodidos e perdidos com a expulsão e
expropriação dos camponeses e que são recriados e recuperados como estratégias de
existência pela resistência dos camponeses Fabrini (2010).
Fernandes (2008), destaca a conflitualidade da questão agrária brasileira em que sua
vastidão alcança o campo e a cidade, atinge todas as instituições e abarca todas as dimensões
do desenvolvimento. Com sua complexidade, a questão agrária se manifesta, principalmente,
por meio das ocupações e acampamentos, nas lutas sociais que se manifestam no território e
tendo como resultado a criação dos assentamentos rurais, gerando continuamente
conflitualidade.
64
Nesse sentido, com o fim da ditadura militar e o início do período da redemocratização
política no país, a questão agrária se apresentou muito dinâmica. Tancredo Neves foi eleito
presidente do Brasil e com ele cria-se a esperança de que a reforma agrária seria realizada.
Tancredo morreu antes de assumir o cargo e o seu vice, José Sarney tornou-se presidente.
Foi criado o Ministério Extraordinário para o Desenvolvimento e a Reforma Agrária –
MIRAD e começa-se a elaboração do Plano Nacional de Reforma Agrária – PNRA, a
proposta do governo foi apresentada no IV Congresso dos Trabalhadores Rurais. O plano
deveria ser apreciado pela sociedade e entidades envolvidas nas lutas pela reforma agrária e
em poucos meses estaria em execução.
Devido às pressões dos latifundiários o prazo para apreciação foi prorrogado. Com
isso, os proprietários de terra por meio do Conselho de Segurança Nacional, alteraram
seriamente o PNRA e fizeram aprovar as propostas e os interesses das oligarquias agrárias.
No I PNRA foi estabelecida a desapropriação de terra improdutiva. No entanto, temos
algumas ressalvas, principalmente, na defesa da propriedade privada da terra. Essa defesa está
presente no poder legislativo, pois, por exemplo, a bancada ruralista tem uma participação
ativa na não realização da reforma agrária como também na Constituição Federal
No sentido de garantir o direito de propriedade da terra, mas condicioná-la ao interesse social, a Constituição Federal estabelece (art. 161) uma medida para coibir a inobservância do princípio da função social da propriedade; a desapropriação por interesse social para fins de Reforma Agrária, ‘mediante pagamento de justa indenização’. Essa desapropriação tem por finalidade, promover a justa e adequada distribuição da propriedade; induzir exploração racional da terra; permitir a recuperação social e econômica das regiões; estimular pesquisas pioneiras; entre outros fins (art. 18 do Estatuto da Terra). É, por isso, um meio e não um fim em si mesmo. A negociação e o entendimento é o instrumento primeiro a ser tentado. (I PNRA, 1985).
Em seguida, são apresentadas as áreas que não podem ser desapropriadas para criação
de assentamentos rurais
A desapropriação por interesse social para fins de Reforma Agrária não pode atingir qualquer propriedade, mas apenas aquela que não cumpre sua função social conforme prevê o Estatuto da Terra. Desse modo, estão isentos dessa modalidade de desapropriação os imóveis que satisfizerem os requisitos para serem enquadrados como empresa rural (art. 19, § 3º, letra “b”, do Estatuto da Terra). A lei exclui da desapropriação, portanto, o empreendimento de pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que explore econômica e racionalmente o imóvel rural (art. 4º, inciso VI, do Estatuto da Terra), com respeito à função social da terra. (I PNRA, 1985).
65
Nesse momento questionou-se se as áreas que estão ocupadas pelo agronegócio (cana-
de-açúcar, soja, milho, pecuária, algodão, eucalipto etc.), jamais serão desapropriadas pela
reforma agrária, pois são grandes parcelas de “terras produtivas”.
Os fazendeiros agiram de maneira muito intensa nesse momento para impedir a
desapropriação das propriedades. Com Sarney na presidência, eles tinham a tranquilidade de
que os privilégios e as regalias seriam mantidos, entretanto, a proposta do I PNRA os
surpreenderam. De fato, eles não haviam participado da elaboração do plano. Em seus
discursos diziam que foram excluídos do processo, não foi democrático, pois não foram
ouvidos, sendo eles a parte mais interessada no desenvolvimento do campo no país.
Se a reforma agrária proposta pelos setores da Igreja e dos comunistas infiltrados no
governo, fosse colocada em prática, acabaria com o monopólio da propriedade privada da
terra no país. Diante disso, os fazendeiros saíram a campo dispostos a brigar.
[...] Em outros termos: a propriedade privada da terra precisa ser preservada. Para isso, todos os meios são válidos: organizar os proprietários para fazer “a guerra, se necessário”, à reforma agrária; fazer campanha de desmoralização dos “reformistas” do INCRA e do MIRAD; forçar o governo a rever seu “plano” contando com o peso dos militares – os velhos aliados; organizar a União Democrática Rural, para defender a propriedade e os proprietários das agressões dos socialistas, do governo, da Igreja e dos sem terra; realizar leilões de bois para organizar a “caixinha” juntando recursos para defesa e para colocar na constituinte gente que garanta o atual direito de propriedade; comprar armas e organizar milícias privadas; planejar o assassinato de lideranças dos trabalhadores rurais. (CPT, 1986, p. 14).
Foi em meio a essa investida dos proprietários de terras que se intensificou o
agravamento da questão agrária. As ocupações de terras e a formação dos acampamentos às
margens das rodovias foram as principais estratégias utilizadas pelos STRs, movimentos
sociais rurais e entidade de apoio a reforma agrária. Outro elemento importante, foi o aumento
do número de conflitos envolvendo as más condições de trabalho. Isso fazia com que
inúmeros trabalhadores ingressassem nos grupos de luta pela terra.
Assim, temos que a violência praticada anteriormente no campo ocorria de maneira
aleatória e indiscriminada, porém, ela passa a ser cometida de maneira planejada e seletiva
tendo como principais alvos lideranças dos STRs dos movimentos de luta pela terra e os
agentes das pastorais.
No final do ano de 1984, foi anunciada por Tancredo Neves em sua campanha, uma
estratégia que facilitaria a gestão do governo, a política de descentralização do poder. De certa
maneira, essa estratégia foi aceita por Sarney, o que trouxe efeitos catastróficos aos
camponeses.
66
É preciso compreender que ao falarmos de descentralização, ela vai acontecer de
modo diferente, seja nos grandes centros urbanos do país, como Belo Horizonte, por exemplo.
No entanto, essa mesma política foi aplicada nas pequenas cidades do interior tendo um
resultado inverso para os camponeses, pois quem passa a exercer o poder do Estado são as
oligarquias agrárias locais, fortalecendo a fonte do poder local dos latifundiários.
Ao considerarmos as conquistas dos camponeses no governo de José Sarney, iremos
observar que doze assentamentos rurais foram criados no estado de Minas Gerais, todos
obtidos por meio da desapropriação. As cinco regiões em que se conquistaram os primeiros
assentamentos rurais de reforma agrária foram o Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, Noroeste
de Minas, Norte de Minas, Vale do Jequitinhonha e Vale do Mucuri. Em seguida,
apresentamos no mapa 2 os assentamentos rurais criados no governo de José Sarney.
Mapa 2: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período 1986-1990 – Governo José Sarney
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
Essas regiões têm em comum o histórico de uma estrutura fundiária altamente
concentrada como demonstramos no item 2.4 sobre o Índice de Gini da estrutura fundiária.
67
Outro fator importante foi a atuação da Igreja Católica e dos sindicatos foram decisivos para a
conquista desses territórios camponeses.
Alguns assentamentos foram criados pela luta de posseiros, que resistiram na área,
sendo vitoriosa a conquista da desapropriação. Outros foram resultado da organização e
mobilização dos trabalhadores excluídos pelo processo de modernização da agricultura
ocorrido em escalas diferentes nessas regiões.
3.2 A Reforma Agrária nos Governo Fernando Collor de Mello e Itamar Franco (1990 – 1994)
No governo de Fernando Collor de Mello houve um retrocesso no que se refere à
criação de assentamentos rurais no estado de Minas Gerais. Collor era oriundo da classe de
latifundiários do estado de Alagoas, completamente contra a realização da reforma agrária.
A política de repressão e violência contra os camponeses ressurge, e isso promoveu
uma retração na luta pela terra e poucos assentamentos foram criados no país. Para resolver a
questão da reforma agrária, em 1990, foi criada a Secretaria Nacional de Reforma Agrária -
SNRA, que passava a ser gestora de várias funções que até então eram delegadas ao INCRA.
Em 1991, o governo extinguiu a secretaria e, a partir daí, o INCRA voltou a ser o único órgão
a cuidar da reforma agrária, estando, contudo, diretamente subordinado ao Ministério da
Agricultura e Reforma Agrária. O governo Collor, além de não fazer a reforma agrária, resolveu reprimir o MST. Acionou a Polícia Federal, o que é uma agravante, pois não é uma tropa de choque, é repressão política pura. O agente da Polícia Federal é um sujeito mais preparado, mais sedimentado. Não batiam mais nas nossas canelas, batiam na cabeça. Essa repressão nos afetou muito, muita gente foi presa. Começaram a fazer escuta telefônica. Tivemos, no mínimo, quatro secretarias estaduais invadidas pela Polícia Federal [...] existia o sentimento de que era preciso resistir. Por outro lado, a direita se sentiu vitoriosa, porque alterou a correlação de forças. E passou a pressionar nos estados, por meio dos governadores, das PMs, da articulação dos fazendeiros etc. Foi uma loucura. Foram três anos comendo o pão que o diabo amassou. A entrada do governo Itamar Franco foi um alívio muito grande. Do ponto de vista das conquistas, reabriu um período semelhante ao da Nova República, embora mais atrasado. (STÉDILE, 2005, p. 69-70).
Em 1992 com o impeachment do presidente Fernando Collor, por participar de
esquema de corrupção, assume o vice-presidente Itamar Franco. Com este novo presidente
foram retomados os diálogos com os movimentos de luta pela terra.
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Foi nesse mesmo ano que a nova Lei Agrária9 era apresentada para aprovação no
Senado, que a aprovou e criou emendas na lei que pudessem vir a impedir os obstáculos à
realização da reforma agrária. Contudo, ao ser analisada pelo Congresso Nacional a bancada
ruralista conseguiu modificar emendas importantes para o processo desapropriatório.
De fato, e Lei Agrária não trouxe mudanças significativas como esperado pelos
camponeses. Um dos elementos que representou “avanço” diz respeito à prévia e justa
indenização. A seguir, apresentamos o mapa 3 com os assentamentos criados no governo
Collor/Itamar.
Mapa 3: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período 1990-1995 – Governo Collor/Itamar
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
Como apresentado no mapa 3, os treze assentamentos criados no estado de Minas
Gerais são resultados das ocupações e acampamentos formados nos anos anteriores. É
importante considerarmos que oito assentamentos foram obtidos nos anos de 1988 e 1989, ou
seja, anterior ao governo Collor/Itamar. Há que se considerar que o governo foi dividido em
9 Lei Nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993.
69
duas gestões cerca de dois anos cada uma, sendo quatro assentamentos criados na presidência
de Fernando Collor e os outros nove na gestão do presidente Itamar Franco.
3.3 A Reforma Agrária nos Governos Fernando Henrique Cardoso (1995 – 2003)
Já no governo de Fernando Henrique Cardoso, de 1995 a 2003, registrou-se um
aumento significativo dos conflitos no campo, especialmente em relação às ocupações de
latifúndios improdutivos. Isso se deve à política adotada pelo governo federal, que
aprofundou ainda mais as desigualdades sociais e, consequentemente, a pobreza no campo.
A opção adotada pelo governo naquele momento foi a de investir capital no
desenvolvimento do agronegócio e na privatização de empresas estatais. Dessa forma,
assistimos que a nação torna-se subordinada ao capitalismo internacional, contando para isso
com a abertura do mercado para produtos estrangeiros e a economia entregue ao controle do
capital financeiro.
No que tange aos aspectos sociais, a luta pela terra começa a ganhar mais força em meados
da década de 1995. Podemos destacar como os principais fatores: a) a intensa exclusão social à
qual estavam submetidos os trabalhadores do campo e a marginalização de uma ampla parcela
da sociedade, o que aumentava as desigualdades por conta da crise inflacionária; b) o
surgimento de diversos movimentos e entidades que se constituíram como os principais
agentes na condução das negociações e nas mobilizações, pressionando o poder público para
que atendessem a essas demandas, especialmente do meio rural e c) a intensa perseguição as
lideranças dos movimentos de luta pela terra em todo país.
Foi em meio a esse contexto que intensificaram as inquietações no campo brasileiro.
Se por um lado o governo FHC estava preocupado com sua imagem, sobretudo em ganhar
prestígio da sociedade já que o país vivia uma crise inflacionária altíssima, com isso cria-se o
Plano Real (1995) que de fato foi um sucesso, por conseguir controlar a inflação. Por outro
lado, os movimentos sociais começaram com uma atuação de ocupações de maneira muito
expressiva, sendo o maior número de ocupações registradas após a redemocratização política
no país.
O governo FHC atuou em três vertentes significativas em relação a realização da
reforma agrária. De certo modo, essas ações elaboradas e praticadas por este governo irão
refletir especialmente na política de criação de assentamentos rurais. São elas:
[...] A primeira, é estimular o mercado de terras, em que as próprias forças capitalistas atuam no assentamento. A chamada reforma agrária de mercado na
70
verdade é apenas uma verbalização, não tem nada de conceito. A forma como o governo obtém as terras teria que ser da forma mais capitalista possível. Qual é esta forma? A compra e venda. [...] A segunda ferramenta básica que o governo está usando é a propaganda. Ele parte de uma falsa interpretação de que o apoio social que o MST [assim como outros movimentos e entidades de apoio a reforma agrária] e a reforma agrária têm na sociedade não é porque temos uma causa justa, porque somos lutadores ou porque somos um movimento social, mas sim porque teríamos habilidade em fazer propaganda, como se a ocupação fosse um ato de marketing político. Partindo dessa visão, o governo interpreta que, se também fizer propaganda, rebate a nossa. [...] Finalmente, há um terceiro componente na atual conjuntura da reforma agrária: a política especifica de FHC com relação ao MST. [...] Ele desmereceu a reforma agrária ao fazer uma análise equivocada de que não havia mais problema agrário e, portanto, de que não havia necessidade de reforma agrária. Bastaria no máximo fazer assentamentos. Para ele, o movimento social não existia ou não tinha importância. Teve que ir mudando de tática, porque não conhecia a dimensão do problema.[criminalização e o uso da violência] [...] (STÉDILE, 2005, p. 141-142).
Foi no governo de FHC que tivemos dois fatos de violências que repercutiram
nacional e internacionalmente. O primeiro teve início no dia 14 de julho de 1995, quando
centenas de famílias ocuparam uma pequena parte da fazenda Santa Elina, no município de
Corumbiara, estado de Rondônia. Na madrugada do dia 9 de agosto do mesmo ano, aconteceu
o Massacre de Corumbiara10. Os camponeses, que viveram vinte e cinco dias de esperança da
terra prometida, foram executados sumariamente; mulheres tornaram-se escudos humanos de
policiais e jagunços; pessoas foram torturadas por longas horas; o acampamento foi destruído
e incendiado e pelo menos onze camponeses foram executados, entre eles, uma criança de
sete anos.
O segundo caso foi o de Eldorado dos Carajás, um dos muitos que demonstra o quão
conflituosa é a luta pela terra. Em 17 de abril de 1996, o massacre foi o resultado de
reivindicações de desapropriação de uma grande fazenda, pertencente a um grileiro do estado
do Pará, resultando no assassinato de dezenove sem terras.
O MST da região cobrava a ação dos órgãos públicos e, com a lentidão do processo, a
iniciativa dos milhares de sem-terra foi marchar até a capital para possíveis negociações entre
movimento e governo estadual. Houve, então, um bloqueio de rodovia próximo a Eldorado
dos Carajás, no sul do estado, que se findou no conflito entre policiais militares, fazendeiros e
sem-terra. Até hoje (2013) nenhum dos 156 envolvidos (policiais, oficiais, jagunços e
fazendeiros) foram condenados. O caso ganhou repercussão internacional e o presidente FHC
se viu pressionado a realizar desapropriações de terras em todo o Brasil, o que também
refletiu em Minas Gerais.
10 Para maiores detalhes ver Mesquita (2001).
71
No ano de 1997 foi realizada a primeira marcha nacional dos trabalhadores sem terra,
liderada pelo MST, mas em conjunto com diversos movimentos. O objetivo foi cobrar justiça
aos massacres ocorridos e para agilizar o processo de reforma agrária. Milhares de pessoas
oriundas de todas as regiões do país caminharam cerca de três meses até Brasília. Naquele
momento, o presidente FHC aceitou negociar com os sem-terra, mas não prometeu fazer a
reforma agrária.
Em abril de 1998, mês considerado significativo para o MST que faz referência ao
segundo ano do massacre de Eldorado dos Carajás, eles surpreendem o governo FHC
oferecendo à mobilização de cerca de 25.000 famílias e ocupando 308 fazendas em dezoito
estados. Consideramos que a maior parte dos assentamentos originados, são resultados de
ocupações de terras, assim, foram criados 102 vias de desapropriação de terra. Na sequência
apresentamos o mapa 4, que representa os assentamentos criados no primeiro mandato de
FHC.
Mapa 4: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Primeiro Mandato de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998)
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
72
Em Minas Gerais, foram realizadas dezoito ocupações sendo uma delas considerada
um marco na história da luta pela terra no estado e especialmente na região do Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba. Esse acontecimento tem um significado importante, pois ao mesmo
tempo que em anos anteriores dois massacres haviam ocorrido no país, não haviam prendido
nenhuma pessoa pelos assassinatos. Essa impunidade contribuiu também para o aumento do
número de assassinatos de lideranças envolvidas em conflitos pela posse da terra.
O que aconteceu no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, foi a tentativa de assassinato e
abuso psicológico contra Frei Rodrigo de Castro Ameddé Péret11 coordenador da CPT
regional Triângulo Mineiro e integrantes do MST e da CUT. Naquele momento, Frei Rodrigo
trabalhava em conjunto com o MST, em defesa da implantação de um assentamento no
município de Santa Vitória.
Na sequência apresentamos um trecho da descrição dos acontecimentos, extraído do
Relatório dos Direitos Humanos do Brasil Rural.
Na manhã do dia 21 de setembro de 1998, oitenta famílias do MST ocuparam a fazenda Perobas, em Santa Vitória. Proprietários de terras ligados à União de Defesa das Propriedades Rurais (UDPR) organizaram uma milícia fortemente armada e foram para a área onde estavam os trabalhadores. [...] Por volta das 14:00 horas, perto de cem proprietários de terras armados chegaram, alguns vestindo capuzes. [...] Enquanto isso, frei Péret e Marcelo Resende, outro representante da Pastoral, estavam em Santa Vitória, tentando contatar autoridades civis e militares do estado de Minas Gerais. Enquanto estavam lá, eles souberam que os proprietários de terras tinham chegado a um acordo com o MST e deixado a área. Ao saber a notícia, eles, juntamente com membros de outros sindicatos de trabalhadores, dirigiram-se para a fazenda Perobas em dois carros. Um carro, um Elba amarelo, levava membros da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e integrantes do MST. O outro carro, um Gol, levava frei Péret, Marcelo Resende e outro representante da CUT na região do Triângulo Mineiro. A dez quilômetros de Santa Vitória, duas caminhonetes levando fazendeiros de terras armados apareceram e forçaram os dois carros a parar. O Gol permaneceu entre as duas caminhonetes, enquanto o Elba estava à frente da primeira perua. Dois passageiros do Elba, o ativista do MST e o membro da CUT, sofreram ferimentos físicos, mas conseguiram escapar sob os tiros dos proprietários de terras. Os passageiros do Gol foram forçados pelos fazendeiros a deixar o veículo. Um dos fazendeiros disse: ”Vamos dar um passeio com eles”. Outro replicou: “Agora não dá para fazer o que combinamos, porque você deixou o outro fugir”. Nesse momento, um fazendeiro atingiu frei Péret no rosto, fazendo-o cair no chão. Os outros fazendeiros então começaram a chutar seu corpo e atacar os outros dois passageiros. Frei Péret recebeu dois chutes na cabeça, que causaram uma convulsão na qual ele mordeu a língua violentamente. Depois da primeira convulsão de frei Péret, alguns dos agressores permitiram que seus colegas o colocassem no carro. Então, um dos fazendeiros apontou sua arma em direção à cabeça de frei Péret e atirou. A bala atingiu a parte de trás do banco no qual frei Péret estava sentado. Se a bala tivesse atravessado o banco do carro, teria atingido as suas costas. Pouco tempo depois a polícia chegou, e os fazendeiros fugiram. [...] Até o momento de finalização deste relatório, o Centro de Justiça Global não havia recebido nenhuma resposta a este ofício. (RELATÓRIO DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL RURAL, s/a, s/d).
Como apresentado, uma das estratégias utilizadas pelo governo FHC foi o de dialogar
sobre reforma agrária de modo mais violento e agressivo, como não havia punição aos crimes, 11 Frei Rodrigo Peret pertence à Ordem dos Frades Menores do Triângulo Mineiro e é membro da Comissão Pastoral da Terra – CPT regional Triângulo Mineiro.
73
a intensidade da violência foi se multiplicando. Isso foi a marca de uma estrutura social
altamente desigual o que colaborava para tornar caso de polícia questões sensíveis à
população camponesa consequentemente a não solução da questão agrária.
Outra ferramenta importante para combater os crescentes movimentos de luta pela
terra, no ano de 1996, foi anunciada oficialmente a criação do projeto Cédula da Terra.
Porém, somente em 1997 ele foi implantado em quatro estados da região Nordeste (Ceará,
Maranhão, Pernambuco, Bahia) e Norte de Minas Gerais. Considerado um programa
complementar à Política Nacional de Reforma Agrária e que contou com o apoio do Banco
Mundial, Governo Federal e elites agrárias que articularam em nível local a implantação dessa
proposta. O Cédula da Terra define-se da seguinte forma
Consiste basicamente na criação de uma linha de crédito para a compra de terras por trabalhadores sem terra ou minifundistas. Os trabalhadores se reuniam em associações, legalmente constituídas, as quais seriam responsáveis para negociar diretamente a compra com os proprietários. As associações deveriam indicar a terra que seria então adquirida mediante financiamento disponibilizado pelo banco, o qual, após aprovado o projeto pela unidade técnica estadual, pagava diretamente ao proprietário. (SAUER, 2003, p.87).
Em 2001, o projeto de Cédula da Terra foi substituído pelo Banco da Terra. Essa
política complementar à reforma agrária gerou diversos embates e desdobramentos, como a
desarticulação dos movimentos de luta pela terra, já que o acesso é pouco burocrático e
rápido, mas também trouxe como consequência a criação de uma dívida que deveria ser paga
pelos camponeses. De início, as terras eram compradas por meio do financiamento do Banco
Mundial e o do Banco do Brasil e pagas pelos camponeses no prazo de vinte anos, com
carência de três anos.
Essa política desenvolvida entre o governo brasileiro e o Banco Mundial nos remete
ao entendimento de que não é nova a questão da distribuição desigual da terra, que representa
um grande obstáculo ao alívio da pobreza, e como resultado impede o desenvolvimento
econômico. Nesse sentido, Ramos Filho (2010), analisando o contexto socioeconômico e
político brasileiro do final dos anos 1990, aponta qual foi a responsabilidade do Estado
mediante tal política de reforma agrária
Diante do acirramento da tensão social e da intensificação da oposição ao modelo neoliberal nos países que implementaram os ajustes estruturais, o Banco Mundial viu-se na necessidade de controlar as pressões e os movimentos sociais, para ter caminho livre ao aprofundamento da implementação do modelo neoliberal. A forma definida para este programa foi a condução, a partir dos anos 90, de uma segunda onda de ajustes, cujos fundamentos residem no aprofundamento da redução do papel do Estado com vistas à promoção do crescimento econômico [...].(RAMOS FILHO, 2010, p. 14).
74
Assim, a Reforma Agrária de Mercado - RAM buscou, em primeira instância,
beneficiar o proprietário de terra e diminuir os conflitos, pois tal política faria com que a terra
se tornasse um produto do mercado; aliás, um produto do latifundiário. O governo federal,
realizou dessa maneira, a descentralização da responsabilidade de resolver os problemas
agrários, pois antes desses programas era da União o compromisso de fazer a reforma agrária
e nesse momento passava a ser dos estados e dos municípios.
Para implantar oficialmente um projeto, exigiu-se a formação de uma “associação de
produtores”. Assim, quando a propriedade é vendida à associação de agricultores familiares,
ela tem que ser paga em dinheiro, e não em títulos, como é na reforma agrária convencional
via desapropriação. Sobre essa questão, Mendonça e Resende (2005) afirmam que
Essa política foi executada com apoio financeiro do Banco Mundial, contrariando o preceito legal que determina a desapropriação como principal instrumento de obtenção de terras improdutivas. O modelo do Banco Mundial promove a privatização do território através das regras do mercado. Segundo essa concepção, os camponeses devem buscar maior “eficiência”, através de sua integração ao agronegócio [...]. (MENDONÇA; RESENDE, 2005 s/p).
Embora a região do Norte de Minas tenha sido beneficiada num primeiro momento
com a implantação deste projeto, foram outras regiões que tiveram maior número de
assentamentos de reforma agrária de mercado territorializados. Essas regiões são o Sul de
Minas e a Zona da Mata, que em termos de estrutura econômica, social, cultural e geográfica
são diferentes do Norte de Minas. O público-alvo do projeto são agricultores pobres e sem
terras (assalariados, arrendatários, parceiros) e/ou aqueles que tinham terras insuficientes para
sua subsistência. Essas dificuldades geraram um quadro de precariedade nas áreas (não há
produção, não há infraestrutura básica adequada etc.), explicitando as razões porque as
pessoas foram unânimes em afirmar que não conseguiriam pagar as suas dívidas, nem mesmo
a primeira parcela, SAUER (2003).
Para a criação dos assentamentos RAM, não ocorreu uma participação ativa dos
agricultores familiares no processo de negociação e implantação do assentamento. As
reuniões e até mesmo a organização das associações iniciais, foram articuladas por agentes
externos, ou seja, não agricultores, foram os políticos, proprietários de terras e até pessoas
ligadas ao Banco Mundial e ao Banco do Brasil, interessadas em ofertar o financiamento para
a compra da propriedade. O tempo de espera para se ter acesso a um lote após a criação do
assentamento é relativamente rápido se compararmos com os assentamentos do INCRA; em
geral, dois, três até quatro meses, tomando como base o período que vai da formação da
75
associação, passando pela escolha da propriedade a ser comprada até a liberação dos recursos
para financiamento do imóvel.
Diversas linhas de créditos foram criadas pelas políticas e programas da Política
Nacional de Crédito Fundiário – PNCF, dentre as quais destacamos: o Programa Cédula da
Terra - PCT, uma linha de crédito em que os beneficiários recebiam financiamento específico
destinado à obtenção dos recursos fundiários e à implantação da infraestrutura básica; o
Banco da Terra – BT, em que o financiamento se dava por meio do Fundo de Terras e da
Reforma Agrária; o Crédito Fundiário – CF, que substituiu o Banco da Terra; o Combate à
Pobreza Rural – CPR, que visava a oferecer financiamento aos trabalhadores rurais sem terra,
pequenos produtores rurais com acesso precário à terra e proprietários de minifúndios
(imóveis cuja área não alcança a dimensão da propriedade familiar); a Consolidação da
Agricultura Familiar – CAF, cuja finalidade era a aquisição de imóveis rurais, com as
benfeitorias já existentes e investimentos em infraestrutura básica e para o início da produção;
Nossa Primeira Terra/Consolidação da Agricultura Familiar – NPT/CAF, criada para atender
à demanda de jovens sem-terra ou filhos de agricultores familiares, na faixa etária de 18 a 28
anos, que quisessem permanecer no meio rural e investir em uma propriedade, um programa
cujo objetivo era contribuir para a solução dos problemas do ordenamento agrário que
agravam o êxodo rural.
No estado de Minas Gerais, temos a criação dos assentamentos RAM nas
mesorregiões geográficas do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, Noroeste e Norte de Minas,
Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Zona da Mata e Sul de Minas. Ao espacializarmos a
localização desses assentamentos, observamos que duas mesorregiões destacam-se, Zona da
Mata e Sul de Minas. Na sequência, apresentamos ao mapa 5 sobre a localização dos
assentamentos RAM em Minas Gerais.
76
Mapa 5: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária de Mercado criados no período do Governo Fernando Henrique Cardoso (1996-2003)
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
A forma como é promovida a reforma agrária por intermédio do Banco Mundial
reproduz com mais intensidade a pobreza e o caos no campo mineiro. Além disso, ocorre a
desarticulação dos movimentos de luta pela terra, e a geração da dívida que o camponês
adquire, precisando produzir para pagar. Portanto, a região onde se tem pouca ou nenhuma
atuação dos movimentos sociais, é também onde se concentra o maior número de
assentamentos da RAM. Conforme apresentado na prancha 1, as poucas ocupações realizadas
pelos movimentos nessas regiões contribuiu para implantação de um elevado número dessa
tipologia de assentamento.
A organização do espaço rural das mesorregiões Zona da Mata e Sul de Minas é
basicamente constituída por pequenas propriedades rurais, o que colabora para o sucesso da
implantação do projeto. Além disso, outro ponto importante é a ideologia de que, por meio do
acesso à terra, os problemas dessas pessoas serão resolvidos, muito presente no discurso dos
77
responsáveis pela articulação do projeto, embora o que efetivamente aconteça seja a geração
de mais dificuldades.
Desse modo, há um controle desses territórios, pois o poder econômico está
incorporado ao processo de dominação e subordinação dos camponeses ao capital. A ideia de
produzir para atender ao mercado e quitar a dívida é o elemento básico do dia a dia dos
assentados por esse projeto.
No segundo mandato de FHC, a política que predominou foi a RAM, embora em
Minas Gerais tenha havido assentamentos criados pela RA e por projetos estaduais. Como
pode ser observado no mapa 6 dos assentamentos criados em seu segundo mandato.
Mapa 6: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Segundo Mandato de Fernando Henrique Cardoso (1998-2003)
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
Tem-se a continuidade quanto a diversificação de tipologias de assentamentos rurais
criados. É instalado no Norte de Minas Gerais projeto de agricultura irrigada. Foram criados
onze Projetos Estaduais - PE, sendo quatro no município de Matias Cardoso e sete em Jaíba.
Este projeto foi criado em parceria com os governos estadual e federal, com o objetivo
de produzir frutas para exportação. Resultado do planejamento e da ação conjunta de duas
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instituições governamentais, a Fundação Rural Mineira de Colonização e Desenvolvimento
Agrário – RURALMINAS, representando o estado de Minas Gerais, e a Companhia de
Desenvolvimento do Vale do São Francisco – CODEVASF, instituição do governo federal.
Existem outras modalidades de lotes no projeto Jaíba, além do familiar, temos os lotes
empresariais.
Como pode ser observado no mapa 6, foram criados 74 assentamentos rurais via
desapropriação embora a propaganda política em seu segundo mandato tenha sido alvo de
inúmeras críticas.
No ano de 1999, o governo federal lançou o documento “Agricultura Familiar,
Reforma Agrária e Desenvolvimento Local para um Novo Mundo Rural”. O novo
instrumento utilizado pelo governo foi desconsiderar todos os problemas enfrentados pelos
camponeses considerando agora uma nova fase da agricultura familiar, tratando não mais
como homem do campo e sim como o novo agricultor familiar. Isso ocorre devido à
continuidade das pressões exercidas pelos movimentos sociais rurais.
Outra ação importante desse governo, foi a criação de uma política de crédito agrícola
destinada à pequena agricultura, que foi o Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar – PRONAF. Várias dificuldades foram encontradas pelos assentados,
“principalmente quanto ao posicionamento da maioria dos próprios bancos oficiais na
execução dos programas que, além de descumprirem muitas de suas regras, só financiavam
aos produtores integrados a empresas agroindustriais, ou a cooperativas por elas controladas”
(GOMES, 2004, p. 66).
Desse modo, os movimentos sociais rurais perceberam a necessária mudança de
estratégias, e se antes a forma principal de luta era a ocupação de latifúndios, a partir do
governo FHC passa a ser também as manifestações. Como abordamos no capítulo 2 é a partir
dessas ações que se pode perceber a realidade do campo e suas formas de manifestação,
explicitando, o conflito.
A política que se desenvolveu foi a da não desapropriação, ou seja, a de compra de
terras financiada pelo Banco Mundial, para impedir os conflitos (caso ocorressem
desapropriações) entre camponeses e latifundiários.
3.4 A reforma agrária nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2011)
Nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva, podemos considerar que a questão agrária
foi deixada de lado. No período de 2003 a 2007, durante o primeiro mandato, a esperança dos
79
movimentos de luta pela terra é que se efetivasse a reforma agrária neste país. No entanto, o
que houve foi um retrocesso no número de assentamentos criados. Continuou inalterada a
política de financiamento de terras pelo Banco Mundial, havendo apenas mudança do nome
de alguns programas e a criação de novas linhas de crédito.
Lula não resolveu nem enfrentou questões estruturais, tais como, a permanência de
modo marginal e subalterno no sistema capitalista dos camponeses. As políticas públicas,
criadas para atender as demandas dos camponeses, não os emanciparam enquanto sujeitos,
tendo com base o fato de que os recursos destinados aos camponeses foram bem inferiores aos
que foram destinados ao agronegócio.
Acompanhamos ao longo de seus mandatos a destinação de vultosos investimentos
destinados ao agronegócio (cana-de-açúcar, soja e pecuária), contando com o apoio de
diversos ministérios, assim como, do apoio fundamental do Banco Nacional de
Desenvolvimento Social – BNDES. Parece-nos contraditório, que quem financia os projetos
do agronegócio é o BNDES, que surgiu com o objetivo de financiar projetos econômicos
sociais e o que realizou-se foi o fortalecimento de grandes grupos econômicos presentes na
cúpula do poder hegemônico nesse país.
Outro aspecto que o governo Lula deixou de lado foi a criação de políticas de
desenvolvimento para agricultura camponesa. Essa insuficiência de políticas destinadas para
esse grupo gerou resultados negativos, pois ao criar os assentamentos é preciso que
instrumentos legais possam dar continuidade no progresso desses novos territórios.
Diante disso, podemos considerar que a economia rural tem sido dinamizada por
programas de distribuição de renda, tais como, o Bolsa Família e a aposentadoria rural que
tem contribuído para a permanência dos camponeses no meio rural. Observem que a
dinamização econômica no campo não chega via Política Nacional de Reforma Agrária -
PNRA e sim por meio de outras políticas destinadas tanto à população rural quanto à urbana.
No que tange a alteração da estrutura fundiária essa permaneceu concentrando ainda
mais. Nos últimos anos foram registradas inúmeras operações de aquisição de terras “pelas
corporações nacionais e transnacionais e o império que, com o apoio dos governos, se
apropria de terras em diversos países da America Latina, África e Ásia mediante um processo
recente denominado de estrangeirização”. (FERNANDES, 2013, p. 192).
No que diz repeito à obtenção de terras para a reforma agrária viu-se nesse governo
uma verdadeira fuga para não ocorrer enfrentamentos e conflitos pela posse da terra. A
80
desapropriação não foi a principal forma de obtenção e sim a regularização12 e o
reconhecimento13. Os assentamentos criados por esta forma de obtenção não altera a estrutura
fundiária, pois não são áreas do agronegócio ou da especulação imobiliária e sim terras da
União.
A reforma agrária de Lula, em seus dois mandatos, resultou em torno de 37% da meta do II PNRA para o primeiro mandato[...]. A regularização fundiária respondeu por 74% da área dos assentamentos, a desapropriação representou 11%, o restante ficou com outras modalidades de obtenção de terras como compra, reconhecimento etc. Embora o governo Lula não tenha atingido a meta, esse resultado parcial não pode ser desconsiderado. O acesso a terra para mais de 377 mil famílias, que somadas as famílias assentadas em governos anteriores chegam a 1 milhão, e muito significativo para o desenvolvimento do Brasil. Esse numero representa uma parcela importante da formação da população camponesa brasileira, que contribuiu para diminuir a intensidade da queda da população rural. (FERNANDES,2013 p.195).
Em 2003, surge o II Plano Nacional de Reforma Agrária – PNRA. Ao contrário do que
esperavam os movimentos sociais, o que de fato ocorreu foi a incorporação de um novo
instrumento para propagandear o aumento do número de assentamentos, dando origem à
regularização fundiária. Para Oliveira (2006), [...] infelizmente, o MDA/Incra insiste em tentar confundir a todos divulgando que assentou, nos 5 anos do II PNRA, um total de 448.954 famílias. Tenho escrito que esses dados divulgados pelo governo Lula sobre a reforma agrária, referem-se à Relação de Beneficiários emitidas, as "famosas" RBs. Assim, continuo a tarefa de esclarecer a todos que as RBs não se referem apenas aos assentamentos novos, elas são emitidas também para os assentamentos relativos à regularização fundiária (Resex, PAE, etc). As RBs são também emitidas para regularizar a situações das famílias dos assentamentos antigos reconhecidos pelo Incra para que os já assentados tenham acesso às políticas públicas. Elas são inclusive emitidas para regularizar a situação de assentados em decorrência de herança, daqueles que compraram lotes de boa fé, e daqueles que foram substituídos nos assentamentos antigos por abandono ou outros motivos permitidos por lei, etc. (OLIVEIRA, 2006, s/p).
Sobre a necessidade desse novo instrumento, o II PNRA informa que
A prioridade de implantação do programa de regularização fundiária levará em conta, entre outros fatores, a densidade de pequenas posses na região, a previsão de obra ou intervenção pública capaz de instabilizar as pequenas posses [...], a disposição do respectivo governo do estado em formar parceria para a implantação do projeto e a existência de conflito motivado por questões fundiárias. (II PNRA, 1985).
12 O programa Regularização Fundiária atende as áreas rurais devolutas de domínio da União e consiste numa ação social garantindo segurança jurídica aos agricultores familiares e o acesso às demais políticas públicas do governo, entre elas o crédito rural e a assistência técnica. As área em que se concentra a regularização são aquelas em que estão ocupadas por posseiro, no caso de Minas Gerais são áreas onde projetos de desenvolvimento territorial e local são desenvolvidos, construção de usinas hidrelétricas. 13 Conforme o decreto nº 4.887, de 20 de novembro de 2003, o reconhecimento é a delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos. Em Minas Gerais as áreas de reconhecimento concentram-se no Vale do Jequitinhonha, Vale do Mucuri e Norte de Minas.
81
Do total de 107 assentamentos criados em Minas Gerais no primeiro mandato do
governo Lula, 28 foram obtidos por meio da regularização fundiária. Esses dados, de fato,
revelam que nesse período há um decréscimo do número de assentamentos criados pela
reforma agrária. Na sequência apresentamos o mapa 7 referente aos assentamentos criados no
primeiro mandato do presidente Lula.
Mapa 7: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Primeiro Mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2007)
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
Ainda no primeiro mandato de Lula, em Minas Gerais ocorreu o Massacre de
Felisburgo, no dia 20 de novembro de 2004, em que cinco sem-terra morreram e vinte ficaram
feridos após o ataque de dezessete pistoleiros contra um acampamento do MST. Passados
tantos anos, os criminosos ainda estão impunes. Esse fato, contribuiu para a criação de
inúmeros assentamentos em todo o estado.
Como pode ser observado no mapa 7, temos a criação do Projeto de Reassentamento
de Atingidos por Barragens – PRB. Esses assentamentos são resultados de investimentos do
governo federal por meio do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC que reestrutura
82
a organização do território. Dentre os vários objetivos desse programa, está a criação de
infraestrutura e projetos de implantação de usinas Hidrelétricas.
Em Minas Gerais, as PRBs foram planejadas a partir da instalação de três grandes
barragens no Vale do Jequitinhonha, as usinas Irapé, Murta e Itapebi. Somente a usina Murta
não foi construída, a Irapé é a maior dentre as duas construídas no Vale do Jequitinhonha. A
construção dessa usina contribuiu para o surgimento de inúmeros conflitos para as populações
que ali habitavam, considerando que a realocação, as indenizações e o reconhecimento das
PRBs se dão em condições de precariedade e de descaso do poder público para com os
camponeses.
No ano de 2002, a CEMIG deu início, mediante a formação de um consórcio de construtoras, às obras civis para a construção da barragem de Irapé, localizada no alto Jequitinhonha. O alagamento atingiu núcleos urbanos e áreas rurais numa extensão de 115 quilômetros do Rio Jequitinhonha e de 50 quilômetros de um dos seus afluentes, o Itacambiruçu. Foram afetadas em torno de 3.564 pessoas, residentes em 47 comunidades ribeirinhas, localizadas em áreas dos municípios mineiros de Berilo, José Gonçalves de Minas, Leme do Prado, Turmalina, Grão Mogol, Cristália e Botumirim. (ALVES FILHO; SALCIDES, 2010, p. 2).
Os ocupantes da área inundada eram agricultores tradicionais, cuja ocupação nessa
região era antiga. Existia também a presença de comunidades negras algumas delas sendo
remanescentes de quilombolas e que também foram afetadas pela construção dessa barragem.
No caso de algumas comunidades negras, a morosidade do governo federal em realizar a
titulação de suas terras foi uma das razões que motivou as comunidades quilombolas a se unir
em busca da garantia de seus direitos. No ano de 2004, elas criaram a N´Golo, a Federação das
Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais. Como desafio, permanecem nessa luta
com o objetivo de que sejam entregues o reconhecimento e a titulação de seus territórios.
A segunda usina projetada para ser construída no Rio Jequitinhonha é a Usina
Hidrelétrica de Energia Murta, localizada no médio Jequitinhonha. Desde 2001, o Consórcio
Murta Energética não conseguiu tirá-la do papel. O impedimento de sua implantação está
ligado aos problemas ambientais, além de ser considerada um modelo antigo de projeto de
hidrelétrica. Outro problema que o consórcio tem enfrentado, são as manifestações
especialmente do Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB, que vem apontando as
falhas no projeto e os riscos ambientais se caso a usina vier a ser construída.
A terceira barragem planejada foi a UHE de Itapebi implantada no baixo
Jequitinhonha, construída no estado da Bahia, pelo Grupo Garaniana foi inaugurada em 2002,
o reservatório alagou uma área de 62 quilômetros quadrados.
83
Oficialmente sediada na Bahia, seus efeitos atingiram populações do baixo vale do
Jequitinhonha no estado mineiro. Dentre os principais grupos atingidos, destacam-se as
lavadeiras do Jequitinhonha, os pescadores e os extratores de pedras preciosas – turmalina e
topázio sendo encontrado em abundância nessa região.
Diante disso os PRBs apresentam um desafio ainda maior para esses camponeses. De
modo geral, inúmeros problemas tem sido apresentados quanto a essa tipologia de
assentamento rural no estado de Minas Gerais.
As principais queixas dos camponeses se referem ao não cumprimento de acordos
entre as comunidade que habitavam a área antes da inundação e os consórcios que
administram esses empreendimentos. Outra reivindição diz respeito à falta de infraestrutura
dos reassentamentos (falta de escolas, postos de saúde, energia e de acesso à água tratada).
Segundo os trabalhadores, 50% das crianças das famílias que moravam na beira do rio estão
sem frequentar a escola desde janeiro de 2006, falta transporte público e escolar. (ALVES
FILHO; SALCIDES, 2010, p. 6)
O governo Lula mascarou os números da reforma agrária contabilizando o PRB como
conquista dos camponeses o que de fato não procede. Ao implantar uma PRB não há
desapropriação de terra permanecendo a estrutura fundiária altamente concentrada. O que de
fato ocorre é a regularização em terras da União.
No segundo mandato do governo Lula, de 2007 a 2011, permaneceu o ritmo de
decréscimo do número de criação de assentamentos rurais. Os movimentos sociais, entidades
e intelectuais afirmam que o governo Lula, em seus oito anos de mandato, não realizou a
reforma agrária, e sim, apenas deu continuidade à política distributiva de terras em áreas
especialmente de conflitos. Em seguida apresentamos o mapa 8 sobre a localização dos
assentamentos criados no segundo mandato do Lula.
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Mapa 8: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Segundo Mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (2007-2011)
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
Conforme apresentado no Mapa 8, foram criados 55 assentamentos rurais via
desapropriação e 8 PRB via regularização. A desapropriação é defendida pelos movimentos
sociais e intelectuais, porque mesmo que indenize o proprietário, é a única política que
desconcentra a estrutura fundiária.
Os assentamentos criados em seu segundo mandato foram resultados de muitos anos
dos acampamentos que já existiam anteriormente ao seu governo. Muitos movimentos sociais
rurais apontam que a pior fase da luta pela terra se deu a partir dos governos Lula, pois este
não se apresentava como um adversário concreto contra a realização da reforma agrária.
3.5 A Reforma Agrária no Governo Dilma Roussef (2011-2015)
Por fim e no momento mais recente, no governo Dilma Roussef a Reforma Agrária
apresenta o pior resultado dos últimos dezesseis anos. Os números comprovam que a
execução da reforma agrária não é prioridade do governo atual e o que tem sido feito de
criação de assentamentos é, em sua maioria, obtido por regularização.
85
O acesso a terra por camponeses no Brasil pouco avançou no primeiro ano do governo de Dilma Rousseff (PT). Dados oficiais do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) revelam que a presidenta conquistou em 2011 a pior marca dos últimos dezessete anos, contrariando a expectativa dos movimentos sociais do campo. Não bastasse isso, Dilma está bem atrás do que Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) realizaram no primeiro ano de seus respectivos governos. Em 2011, 22.021 famílias conquistaram lotes em assentamentos, o que representa 51% da marca de FHC em 1995, quando 42.912 foram assentadas. Já em relação ao governo de seu antecessor, Dilma atingiu 61% do resultado de Lula, que em 2003 assentou outras 36.301 famílias. (SCARSO, 2012, s/p).
Conforme pode ser observado no mapa 9 a seguir tivemos a criação de apenas seis
assentamentos rurais. Isso se deve à postura gerencial de nossa presidente que aposta no
modelo de desenvolvimento para o Brasil investindo na agricultura empresarial.
É importante compreendermos que esses 10 anos de governo do Partido dos
Trabalhadores - PT, atacou de modo sorrateiro os movimentos sociais, especialmente os
ligados ao meio rural. Não podemos nos esquecer de que o PT é originário do movimento
social que foi se transformando ao longo dos últimos anos. A seguir, apresentamos o Mapa 9
sobre os assentamentos criados no governo Dilma.
Mapa 9: Minas Gerais - Assentamentos de Reforma Agrária criados no período do Governo de Dilma Roussef (2011-2015)
Fonte: Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA, 2013
86
Podemos traçar algumas considerações sobre essas mudanças ocorridas neste governo,
sendo que inúmeras lideranças e militantes de diversos partidos políticos e movimentos
passaram a ocupar cargos no governo. Quem assumiu a interlocução com os movimentos de
origem, foram as antigas lideranças reproduzindo agora o discurso do governo, o que
contribui para o arrefecimento das luta e uma menor articulação das mobilizações.
Outra estratégia utilizada pelo governo é o contínuo diálogo com os movimentos
sociais e a aparente sensibilidade das demandas apresentadas. Embora, se compararmos
melhora na interlocução com os governos anteriores, isso não significa necessariamente, o
atendimento das reivindicações e resolução das demandas apresentadas por eles.
87
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo de desenvolvimento da base técnica da agricultura contribuiu para as
transformações na paisagem natural do bioma Cerrado brasileiro, como também, nas relações
de trabalho, devido à modernização da agricultura, que aconteceu de maneira direcionada a
atender determinados grupos hegemônicos do poder. Podemos considerar que o processo
modernizante descortinou uma nova fase no campo brasileiro e consequentemente no estado
de Minas Gerais.
Nesse contexto, a maioria dos camponeses foi excluída dos “benefícios” do processo
de modernização. Assim, a luta pela reforma agrária ressurge como uma possibilidade de
garantir sua sobrevivência e permanência no campo.
Conforme apresentado, o processo histórico-político vivido pelo Brasil desde a
redemocratização, demonstra que os diversos governos que assumiram a responsabilidade de
conduzir o país, não criaram políticas públicas que efetivamente garantissem as condições de
acesso à terra. Entendemos a criação dos assentamentos rurais como uma resposta aos
conflitos agrários.
Nesse ponto, apreendemos que a violência praticada contra os camponeses, em sua
maioria, não envolve o empenho efetivo do poder público, sobretudo do poder judiciário, em
responsabilizar e punir os envolvidos nesses conflitos. Exemplo dessa situação foram as
chacinas cometidas e aqui relatadas, que não tiveram a condenação e a prisão de fazendeiros,
policiais militares, jagunços e demais envolvidos.
Compreendemos que a ocupação foi a principal tática no processo de espacialização e
territorialização da luta dos camponeses sem-terra. Nessa perspectiva, a ocupação é uma
forma que eles encontraram para fazer pressão frente ao poder público, criando-se com isso
uma questão de conflito que precisa da intervenção do Estado para resolvê-la. Em outros
termos, é necessário considerar que a ocupação é um acontecimento dinâmico e que o
resultado da conquista da terra irá depender da relação de forças presente na área do conflito.
Os grupos contrários à luta dos camponeses sem-terra, tentam de todas as formas
desestabilizar os acampamentos e enfraquecer a luta, com o uso da violência de maneira
explícita, bem como o desenvolvimento de políticas públicas que visam minimizar os
conflitos.
Um dos principais instrumentos que fortaleceu o processo de luta e que contribuiu
para uma maior visibilidade perante a opinião pública e o poder público, a partir de 1998,
88
foram as manifestações, indicativo de que a luta constante das organizações sociais na busca e
a disputa por outro modelo de desenvolvimento para a sociedade e o campo brasileiro vem
sendo almejada. A espacialização dos dados da reforma agrária (ocupações e manifestações),
por meio de mapas, demonstra que nas regiões de expansão e controle territorial pelo
agronegócio é onde predominam os assentamentos de RA, devido principalmente às ações dos
movimentos sociais rurais que apresentam para a sociedade o confronto existente no estado de
Minas Gerais.
Dentre as principais reivindicações estão o fornecimento de crédito para habitação e a
obtenção de licença ambiental, e a garantia dos recursos do PRONAF – bem como, a criação
de novas linhas de crédito, a realização de desapropriações de terras e a exigência de justiça
pelos crimes contra os camponeses.
Conforme esse estudo, áreas onde as intensidades dos conflitos resultam em um
adensamento dos assentamentos, criados no período de 1985 a 2012 como é o caso de
algumas regiões mineiras como Noroeste, Norte de Minas e Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba, têm tornado visíveis essa presença, o que tem contribuído para a promoção do
desenvolvimento local e regional.
Essas regiões são áreas onde historicamente a agricultura capitalista empresarial
predominava com diversos incentivos do estado, bem como, a presença de ruralistas
organizados que tentavam impedir o avanço da luta pela terra. Dessa maneira, são as regiões
que tem apresentado ao longo dos anos inúmeros conflitos envolvendo a posse da terra.
Vemos que a criação do assentamento rural é apenas a primeira etapa de um processo
de luta bem mais amplo. Os assentados necessitam de apoio técnico e financeiro para
produzir, e isso são ações que compete ao governo proporcionar, são fatores que os próprios
movimentos sociais do campo apontam como situação emergente. Tudo isso, demonstra que a
reforma agrária é necessária e fundamental para o desenvolvimento efetivo do campo
brasileiro.
Outro ponto que merece destaque com o presente estudo, refere-se aos assentamentos
da RAM, pela perspectiva mercadológica da compra da terra, concentram-se nas regiões
mineiras com menor atuação dos movimentos sociais, até mesmo por se tratar de uma
estratégia em “amenizar os conflitos do campo”. Mesmo que famílias sejam assentadas e
tenham acesso à terra para cultivo e trabalho, os assentamentos do tipo RAM acabam por
gerar o endividamento do camponês, e não trazem melhorias para os beneficiários do projeto,
89
que se vêem envolvidos em um complexo problema, principalmente no que diz respeito às
suas dívidas da compra da terra.
A RAM se tornou uma medida mais interessante para o governo, que visou atender
parte da população do campo que reivindicava o acesso à terra, mas sem interferir ou
prejudicar as elites agrárias por meio das desapropriações da reforma agrária, como muitos
estudiosos já demonstraram. De fato, ocorre uma redução no papel do Estado, e a maior
participação dos bancos financiadores.
A diminuição das ocupações e assentamentos criados evidencia, de acordo com os
estudos do Banco de Dados da Luta pela Terra (DATALUTA), o gradual abandono da
política de reforma agrária neste país. O modelo de desenvolvimento escolhido pelos
sucessivos governos foi e continua sendo o de fortalecer e desenvolver o agronegócio, fonte
de ampliação e reprodução do capital.
Por outro lado, o governo tem desenvolvido políticas de distribuição de renda, como o
Programa Bolsa Família, o que não altera de maneira concreta a condição desses beneficiários
que ficam a mercê da conjuntura política. Isso contribui para a diminuição do número de
pessoas presentes nos acampamentos, diminuindo consideravelmente as ocupações de terra.
Em síntese, o desafio para os movimentos sociais rurais e entidades de apoio à reforma
agrária ainda permanece, tendo em vista que o pior momento da luta pela terra é um fato
concreto ainda nos dias atuais (2013). Cabe pensarmos, nos desdobramentos e nos caminhos
para os camponeses assentados pela reforma agrária. É necessário que se crie políticas
diferentes e mais sintonizadas às demandas diversas, principalmente dos assentados da
reforma agrária, e a diversidade apresentada pelas populações do campo brasileiro .
Como principais resultados deste estudo, ressaltamos que as políticas de
assentamentos rurais são desenvolvidas conforme a atuação dos movimentos sociais rurais.
Quando se tem uma atuação mais expressiva, especialmente na realização de ocupações de
terras, há um maior número de assentamentos criados.
A tendência futura é de que a criação de novos assentamentos rurais terá cada vez
mais dificuldades de se concretizar. Considerando, além da diminuição do número de
ocupações e consequentemente a implantação de assentamentos e as estratégias utilizadas
pelos sucessivos governos para não realizar desapropriações de terras, bem como, desarticular
a luta política.
90
De certo modo, a realização deste trabalho, nos possibilitou pensarmos se o
assentamento rural de reforma agrária emancipa o campesinato brasileiro e promove a
geração de uma vida digna para a população atendida por essa política pública. Nesse sentido,
podemos considerar que nossa análise buscou avançar para além dos aspectos econômicos e
produtivos.
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