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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O PAPEL DA FAMÍLIA NO PROCESSO
DE INCLUSÃO SOCIAL DOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA
Por: Valéria Mendonça Figueiredo
Orientador
Prof.ª Ms. Maria da Conceição Maggioni Poppe
Rio de Janeiro
2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O PAPEL DA FAMÍLIA NO PROCESSO
DE INCLUSÃO SOCIAL DOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Terapia de
Família
Por: Valéria Mendonça Figueiredo
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DEDICATÓRIA
A Deus em primeiro lugar, pois sem ele seria
impossível chegar até aqui.
Ao meu marido, meus filhos e meus pais pelo
grande incentivo e compreensão nas vezes em
que precisei estar ausente em determinados
momentos de suas vidas.
Aos meus familiares e amigos por estarem ao
meu lado apostando e contribuindo também para
esta conquista.
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AGRADECIMENTOS
Ao meu Senhor Jesus Cristo por ter pago um alto preço para que hoje eu
desfrutasse do que Ele conquistou para mim.
À Professora Maria Poppe, orientadora da monografia, que com sua
competência, experiência e dedicação muito me auxiliou na realização deste
trabalho.
Aos professores do Curso de Terapia de Família da Universidade Candido
Mendes, pela postura pedagógica e pelos ensinamentos que profundamente
contribuíram para minha formação pessoal e acadêmica.
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BEM-VINDO À HOLANDA
Freqüentemente me pedem para descrever a experiência de dar à luz
uma criança com deficiência.
Seria como...
Ter um bebê é como planejar uma fabulosa viagem de férias PARA A
ITÁLIA.
Você compra montes de guias e faz planos maravilhosos! O Coliseu. O
Davi de Michelangelo. As gôndolas em Veneza. Você pode até aprender
algumas frases em italiano. É tudo muito excitante.
Após meses de antecipação, finalmente chega o grande dia! Você
arruma as malas e embarca. Algumas horas depois, você aterrissa. O
comissário de bordo chega e diz: Bem-vindo à Holanda!
Holanda?? Diz você. O que quer dizer com Holanda? Eu escolhi a
Itália! Eu devia ter chegado à Itália. Toda a minha vida eu quis conhecer a
Itália! Mas houve uma mudança no plano de vôo. Eles aterrissaram na
Holanda e é lá que você deve ficar.
O mais importante é que eles não levaram você para um lugar horrível e
desagradável, com sujeira, fome e doença. É apenas um lugar diferente.
Você precisa sair e comprar outros guias. Deve aprender uma nova
língua. E irá encontrar pessoas que jamais imaginara.
É apenas um lugar diferente. É mais baixo e menos ensolarado que a
Itália. Mas, após alguns minutos, você pode respirar fundo e olhar ao redor.
Começa a notar que a Holanda tem moinhos de vento, tulipas e até
Rembrandts e Van Goghs.
Mas, todos os que você conhece estão ocupados indo e vindo da Itália,
comentando a temporada maravilhosa que passaram lá. E por toda a sua vida
você dirá: Sim, era onde eu deveria estar. Era tudo o que eu havia planejado.
A dor que isso causa nunca, nunca irá embora. Porque a perda desse
sonho é uma perda extremamente significativa.
Porém, se você passar toda vida remoendo o fato de não ter chegado à
Itália, nunca estará livre para apreciar as coisas belas e muito especiais
existentes na Holanda. (Emily Perl Knisley, 1987)
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RESUMO
A proposta deste estudo consiste em verificar o principal papel da
família como facilitadora do processo de inclusão social do portador de
deficiência, o importante papel da educação, mostrando grande valor dessas
pessoas usufruírem das mesmas oportunidades quanto a seu acesso e a
influência da Terapia de Família neste processo. Busca alertar também que
uma sociedade inclusiva beneficia a todos, já que a relação com o outro e com
o meio fará com que, juntos, sejamos capazes de viver, aprender e vencer as
barreiras ao longo da vida. Para isso, o presente estudo enfatiza a
necessidade de um trabalho de apoio e intervenção na família, o que poderá
refletir positivamente no desenvolvimento da criança portadora de deficiência e
sua efetiva inserção na sociedade.
Palavras-chaves: família – inclusão social – educação.
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METODOLOGIA
A investigação foi realizada por meio de pesquisa bibliográfica em livros,
artigos e internet, através de material previamente selecionado, o que nos
proporcionou em esclarecimento maior sobre o assunto, com conteúdos que
realmente trouxeram qualidade de informação. Realizamos também, o estudo
de casos com três pessoas portadoras de deficiência em uma instituição de
ensino, utilizando o Método de Observação Participante e Entrevistas Abertas,
o que no propiciou elucidar várias questões sobre o tema estudado.
A metodologia utilizada neste trabalho foi de grande valor sentido de
desmistificar a incapacidade das pessoas portadoras de deficiência e analisar
o papel fundamental da família no processo de inclusão social dos portadores
de deficiência.
Nós não devemos deixar que as incapacidades das
pessoas nos impossibilitem de reconhecer suas
habilidades. As características mais importantes das
crianças e jovens com deficiência são as suas
habilidades. Hallahan e Fauffman (1994).
Este estudo envolveu diversos autores que tem se preocupado em
investir na temática da inclusão social, entender a dinâmica da família neste
processo e sua interação com a sociedade. No entanto, ressaltamos dentre
eles algumas referências fundamentais à realização do mesmo: GIL (2002),
que nos esclareceu de forma muito significativa as várias acepções do termo
inclusão social; SASSAKI (1997), que nos auxiliou a compreender os impasses
de uma sociedade inclusiva e CAVALCANTI e BASTOS (2009), com suas
contribuições ao elucidarem o papel da família e a construção social deficiente.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I – O que é inclusão social 12
CAPÍTULO II – O papel da família no processo 20
de inclusão social dos portadores de deficiência
CAPÍTULO III – Estudo de casos 28
CONCLUSÃO 34
BIBLIOGRAFIA 37
FOLHA DE AVALIAÇÃO 40
9
INTRODUÇÃO
O estudo em questão visa contribuir para a conscientização de uma
inserção cada vez maior no âmbito social, focando a igualdade de direitos no
acesso à educação e ao mercado de trabalho, compreendendo as limitações e
habilidades inerentes a todo ser humano.
Sendo a família o lugar onde estão as pessoas mais próximas e
significativas para o deficiente, consideramos que é nela que se dará início o
processo de inclusão, vencendo os desafios e descobrindo a cada dia novas
possibilidades de lidar com os obstáculos e construir um projeto de vida
promissor. Mas para que isso ocorra, essa família precisará contar com a
cooperação da sociedade, dos profissionais da educação, da saúde e das
autoridades, com atualização das políticas públicas, para que haja
concretização efetiva da inclusão social.
O trabalho será estruturado de forma a apresentar material para reflexão
dos que estão envolvidos em uma sociedade inclusiva, que se prepara a cada
dia para acolher as pessoas portadoras de deficiência.
Os fatores que mais me motivarão na realização deste trabalho foram a
desmistificação da imagem da incapacidade dos portadores de deficiência e a
importância de sua interação junto a sociedade.
Nosso principal objetivo está em analisar a contribuição da família nos
aspectos positivos e negativos, no processo de inclusão social dos portadores
de deficiência e, mais especificamente, refletir sobre o significado de inclusão
social na atualidade, ressaltar a contribuição da educação como facilitadora da
autonomia social dos portadores de deficiência e identificar as dificuldades
enfrentadas pela família no processo de inclusão social.
A família, principalmente os pais, muitas vezes contribui para a
segregação dos filhos portadores de deficiência, porque tem uma tendência
natural de protegê-los dos preconceitos sociais. No entanto, é na família que o
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portador de deficiência encontrará suporte fundamental para a conquista de
maior independência possível em relação a sociedade em que está inserido.
O trabalho aborda um tema de grande relevância, que é a inclusão
social dos portadores de deficiência. A contribuição da educação, da Terapia
de Família e principalmente da própria família, no processo de inclusão social,
são pontos fundamentais neste estudo.
A importância do tema escolhido se dá a partir do contato que tive (em
algumas classes em que lecionei) com alunos portadores de deficiência. Nós,
enquanto profissionais, precisamos auxiliá-los no processo de
desenvolvimento, tanto nos aspectos físico, social e cultural. No entanto, para
que isso ocorra, é necessário que se mantenha um relacionamento estreito
com a família, pois ela é o berço do processo de inclusão e é nela, que se terá
início o aprendizado mais significativo para a vida da criança, sendo ou não
portadora de deficiência. Pais e educadores caminham juntos na missão de
valorizar, incentivar e estimular o seu desenvolvimento, independência e
autonomia. Por isso, resolvi desenvolver em minha monografia a importância
do papel da educação e a fundamental importância da família no processo de
inclusão social dos portares de deficiência.
No primeiro capítulo, é definida, em vários aspectos, o que é e como se
dá esse processo. Também é levantada a questão das escolas regulares,
tendo estas como papel fundamental iniciar o processo de inclusão do
indivíduo portador de necessidades especiais na sociedade inclusa. E ainda, a
grande influência do professor para o sucesso do processo de inclusão.
O capítulo 2, analisamos o papel da família no processo de inclusão
social dos portadores de deficiência. Os obstáculos, o estigma, a segregação e
a realidade econômica vivenciadas por muitas são pensadas aqui, assim
como, o cuidado dispensado aos seus filhos e o olhar das equipes
multidisciplinares.
E, finalmente, no capítulo 3, é descrito o estudo de casos de alguns
alunos portadores de necessidades especiais e relatos de pais e alunos que
convivem com estes portadores de deficiência. Também são relatadas
algumas atividades com alunos inclusos em classes regulares, enfatizando a
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importância das mesmas serem realizadas em grupo. Resultando, assim, a
interação entre os alunos e o desenvolvimento da inclusão no processo de
educação. É mencionado, ainda, a importância da família como àquela que
será a primeira cooperadora para integrá-los à sociedade, trazendo apoio e
segurança, valorizando seus desempenhos e ajudando-os na auto-estima.
O tema é amplo permitindo estudos sucessivos e atuantes que possam
conscientizar e contribuir para o sucesso da inclusão. No entanto, não se tem a
intenção de explorar todos eles, o estudo por hora enfatizado procura chamar
a atenção para a família como principal empreendedora no processo de
inclusão, a parceria fundamental da educação neste processo e alguns
movimentos relacionados à políticas públicas.
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CAPÍTULO I
O QUE É INCLUSÃO SOCIAL?
Este capítulo tem o objetivo de trazer reflexões de alguns estudiosos
sobre o tema da pesquisa, com base nos estudos de Marta Gil (2002).
Este termo “inclusão social” tem sido bastante veiculado e discutido, em
substituição ao conceito utilizado anteriormente de “integração social”, em
muitos países, não apenas no Brasil.
Segundo Steineman, (1994), integração significa o (re)-estabelecer de
formas comuns de vida de aprendizagem e de trabalho entre pessoas
deficientes e não deficientes. Integração significa ser participante, ser
considerado, “fazer parte de”, ser levado a sério e ser encorajado. A integração
requer a promoção das qualidades próprias de um indivíduo, sem
estigmatização e sem segregação. Realizar pedagogicamente a integração
significa, seja no jardim de infância, na escola ou no trabalho, que todas as
crianças e adultos (deficientes ou não) brinquem, aprendam, trabalhem de
acordo com seu nível próprio de desenvolvimento em cooperação com os
outros (In: Gil, 2002).
As palavras “integrado” e “integração” derivam do latim “integrare” que
vêm do adjetivo “interger”, que originalmente significa intacto, não tocado, sem
mácula, são, virgem, inteiro, completo.
Portanto, a palavra “integração”, neste sentido, deve ser interpretada
como alguma coisa de original e natural, sendo a “segregação” (o estado de
não-integração) algo anormal, construído, artificial.
“ Inclusão” sif. Ação ou efeito de incluir (-se).
“Incluir”, v.t. abranger, compreender. 2 – Inserir, introduzir. P.3. Inserir-
se, fazer parte. Incluindo, adj. (Luft. 2002, p. 382).
Atualmente, os termos adequados para conceituar o portador de
deficiência são: Pessoa portadora de deficiência, Pessoa com deficiência ou
pessoa com necessidades especiais. Estes termos sinalizam que, em primeiro
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lugar, referimo-nos a uma pessoa que, dentre outros atributos e
características, tem uma deficiência, mas ela não é esta deficiência. O que
importa em primeiro lugar é a pessoa.
Em termos gerais, podemos definir “pessoa como portadora de
deficiência” é a que apresenta, em comparação com a maioria das pessoas,
significativas diferenças físicas, sensoriais ou intelectuais decorrentes de
fatores inatos e/ou adquiridos, de caráter permanente e que acarretam
dificuldades em sua interação com o meio físico e social.
Marta Gil sinaliza:
Os aspectos que adquirem maior relevância nas pessoas
portadoras de necessidades especiais no contexto da
inclusão são as desvantagens funcionais que elas
apresentam. Nem sempre a comunidade escolar está
preparada para lidar com elas e não sabe o que fazer.
Isso cria um desconforto na integração social, fazendo
com que muitos evitem as crianças com deficiência ou
façam piadinhas de mau gosto (p. 22).
O modelo de inclusão implica que a sociedade deve se preparar para
garantir que todos façam parte dos variados espaços sociais e a melhor forma
de incluir estas crianças com necessidades especiais é através da educação,
pois as leis determinam que sejam matriculadas em escolas regulares junto
com os alunos considerados normais, pois todas as pessoas deficientes ou
não, têm todo direito de permanecer na sua comunidade local ou não, com
direito à educação, saúde, emprego e serviços sociais como qualquer cidadão.
Porém são pouquíssimas as escolas preparadas para receber estas pessoas
com necessidades especiais.
O ano de 1981 foi designado pela ONU – Organização da Nações
Unidas, de Ano Internacional das Pessoas Portadoras de Deficiência (PPD) e
assimilou um marco fundamental na luta pelos direitos destas. Na esteira do
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conceito de integração vieram outros como os de autonomia, independência,
“empowerment” e equiparação de oportunidades que podem ser considerados
passos em direção ao conceito atualmente vigente de inclusão social.
Marta Gil recorre à autoridade de Romeu Sassaki (1997) para definir
estas palavras:
Autonomia: é a condição de domínio no ambiente físico e social preservando
ao máximo a privacidade e a dignidade da pessoa que a exerce. Ter maior ou
menor autonomia significa que a pessoa com deficiência tem maior ou menor
controle nos ambientes que ela freqüenta; rampas facilitam a autonomia no
espaço físico, por exemplo.
Independência: é a faculdade de decidir sem depender de outras pessoas,
como familiares ou profissionais especializados. Uma pessoa com deficiência
pode ser mais ou menos independentes em decorrência da quantidade e da
qualidade de informações a que tiver acesso, mas também de sua
autodeterminação para tomar decisões.
Empowerment significa o processo pelo qual uma pessoa ou um grupo de
pessoas usa o seu poder pessoal, inerente a sua condição, para fazer
escolhas e tomar decisões, assumindo, assim, o controle de sua(s) vida(s).
Neste sentido, independência e empowerment são conceitos
interdependentes, não se outorga esse poder às pessoas; o poder pessoal
está em cada ser humano desde o seu nascimento.
O termo equiparação de oportunidades é definido pela Disabled
Peoples’ Internacional (1981), como o processo mediante o qual os sistemas
gerais da sociedade, tais como o meio físico, a habilitação e o transporte, os
serviços sociais e de saúde, as oportunidades de educação e trabalho e a vida
cultural e social, incluídas as instalações esportivas e de recreação, são feitos
acessíveis para todos. Isto inclui a remoção das barreiras que impedem a
plena participação das pessoas deficientes em todas as áreas, permitindo-lhes,
assim, alcançar uma qualidade de vida igual à de outras pessoas.
Nesta definição, está implícito o princípio da igualdade de direitos: O
princípio de direitos iguais implica que as necessidades de cada um e de todos
são de igual importância e que essas necessidades devem ser utilizadas como
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base para o planejamento das comunidades e que todos os recursos precisam
ser empregados de tal modo que garantam que cada pessoa tenha
oportunidade igual de participação .
A igualdade de oportunidades em educação é essencial dada a
importância da mesma na transmissão de atitudes, conhecimentos e
competências que a sociedade como um todo encara como importantes para
todas as crianças e jovens.
Como bem enfatiza Sassaki (1997):
É fundamental equipararmos as oportunidades para que
todas as pessoas, incluindo portadores de deficiências,
possam ter acesso a todos os serviços, bens, ambientes
construídos e ambientes naturais, em busca da realização
de seus sonhos e objetivos.
Na seqüência desses movimentos e conquistas é elaborado o conceito
de inclusão social, processo que funciona em mão dupla: a sociedade e os
seguimentos até então incluídos (inclusive o das PPD) buscam viabilizar
soluções e alternativas, para garantir a equiparação de oportunidades e
direitos. Os principais valores que norteiam esse processo são: a aceitação e a
valorização da diversidade, o exercício da cooperação entre diferentes e a
aprendizagem da multiplicidade.
Verifiquemos:
Pode-se dizer que a integração é um processo bilateral
que pressupõe a participação e a ação compartilhada ao
mesmo tempo dividido e somada. É um movimento de
conquista do espaço (interno e externo) tanto daquele
que pertence ao chamado grupo de minoritários quanto
aos demais participantes da comunidade. (SECRETARIA
DE EDUCAÇÃO ESPECIAL – MEC, 1998).
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Em se tratando de uma questão de direitos cívicos, um dos principais
direitos de qualquer minoria é o de escolha e conforme prevê a legislação, os
pais ou tutores destes alunos têm liberdade de escolher o que acham melhor
para suas crianças.
Resumindo, pelo caminho percorrido até aqui, podemos dizer que uma
das principais lições que podemos tirar é que não há um formato padronizado
para a integração dos alunos diferente/deficientes na escola regular. Cada um
dos aspectos da integração – definição, objetivos, níveis, dificuldades,
vantagens e desvantagens, entre outros, apresenta uma enorme diversidade.
Marta Gil cita um documento publicado pela comissão Européia em
1996, que diz:
Deve reconhecer-se que a integração dos alunos com
necessidades educativas especiais implica muito mais do
que colocar simplesmente o aluno numa escola regular.
Trata-se de um processo em que o aluno tem
oportunidades para se desenvolver e progredir em termos
educativos para uma autonomia econômica e social. A
integração é igualmente um processo em que as próprias
escolas necessitam mudar e se desenvolver com o
objetivo de proporcionar um ensino de elevado nível a
todos os alunos e o máximo de acesso aos que têm
necessidades educacionais especiais (p.20).
1.1– O papel da escola regular no processo de inclusão.
O primeiro passo é sensibilizar, treinar, dando subsídios teóricos e
práticos para todos os funcionários da instituição: diretores, professores,
orientadores e todo o pessoal de apoio. É importantíssimo também sensibilizar
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os pais principalmente os dos não deficientes, pois todos devem desempenhar
um papel ativo no processo de inclusão.
É preciso vencer os obstáculos encontrados pelo caminho da inclusão,
evidenciado mais nos professores por acharem que não saberão trabalhar com
esses alunos, porém os profissionais por mais capacitados que estejam não
têm respostas para todos os problemas. Haverá sempre a necessidade da
integração com professores com os demais profissionais de equipes
multidisciplinares para que haja reciprocidade na experiência e no
aprendizado. Antigamente, usava-se o termo “integração” e os alunos eram
preparados para estudar nas classes regulares. Hoje, se usa o termo “inclusão”
e é a escola que deverá ser preparada para receber esses alunos, pois, como
diz a Lei (9.394/96) de diretrizes e bases, “nenhuma escola pode se recusar a
atender uma criança portadora de necessidade especial”. E não basta apenas
oferecer um trabalho pedagógico para elas, é necessário um desafio constante
dos educadores que ainda têm que cumprir a tarefa de impedir que haja
discriminação desses alunos em sala.
Não se pode esquecer que as interações sociais não acontecem
automaticamente num grupo social, as pessoas tendem a escolher os
parceiros com interesses e valores semelhantes, evitando as diferenças. O fato
de estarem na mesma sala não faz com que as crianças imediatamente
comecem a interagir com colegas que têm alguma diferença.
Além das mudanças arquitetônicas, a escola regular precisa modificar
todo um conjunto de normas e regulamentos que são verdadeiramente
segregadores dos alunos com deficiência.
Segundo a Declaração de Salamanca: UNESCO (1994):
As escolas devem ajustar-se a todas as crianças,
independentemente das suas condições físicas, sociais,
lingüisticas ou outras. Neste conceito, devem incluir-se
crianças com deficiência ou superdotados, crianças de
rua ou crianças que trabalham, crianças de populações
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imigradas ou nômades, crianças de minorias lingüisticas,
étnicas ou culturais e crianças de áreas ou grupos
desfavorecidos ou marginais (In: Gil, 2002).
Assim, principalmente na área pedagógica, não parece correto ter-se
como ponto de referência as deficiências ou incapacidades (atitude ainda
freqüente em muitas escolas), mas sim compreender que o que é importante é
o ser humano. Tal como a ergonomia já faz no domínio do trabalho com
adaptação do posto de trabalho à pessoa, às suas habilidades e
características individuais; no campo da pedagogia, teremos que evitar que a
deficiência se coloque entre o professor e o aluno, impedindo-nos de ver a
pessoa que está por detrás dessa deficiência.
Para concluir esse episódio, destacamos a seguinte definição de Escola
Regular (www.gov.sc.br):
Um espaço em que se procura resgatar a função social
de promover apropriação e produção de conhecimento,
assumindo um papel de agente transformador nas
relações estabelecidas na sociedade, buscando a
superação das práticas discriminatórias,
homogeneizantes e estigmatizantes. (In: Gil, 2002).
1.2 - A influência do professor no processo de inclusão.
Estudos indicam que a atitude do professor é um dos fatores que mais
contribui para o sucesso de qualquer medida de integração do aluno com
deficiência. De fato, como comprovam as práticas do dia-a-dia nas nossas
escolas, não basta determinar legalmente a integração para que ela aconteça.
A integração é, em última instância, um processo de fornecer aos alunos
com deficiência uma educação com o máximo de qualidade e de eficácia, no
sentido da satisfação das suas necessidades individuais. Ora, este objetivo
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depende fundamentalmente do papel do professor nomeadamente de
variáveis como a vontade em levar a cabo as tarefas de ensino destes alunos
e a sua transformação ou preparação pedagógica para o fazer.
Atualmente, os professores, cada vez mais, se atualizam para conhecer
os seus alunos, suas particularidades de desenvolvimento, para oferecer a
interação entre as disciplinas da escola para realizar projeto educacional, onde
trabalham unidos aos pais, à comunidade, à escola. Continuam estudando,
trocando experiências de trabalho e atualizando seus conhecimentos tirando
dúvidas, planejando teorias próprias para explicar como ensinar e como as
crianças aprendem. É importante que os professores saibam e entendam cada
vez mais os conteúdos curriculares, os processos de ensino e de
aprendizagem.
20
CAPÍTULO II
O PAPEL DA FAMÍLIA NO PROCESSO DE INCLUSÃO SOCIAL
Este momento da pesquisa destina-se a abordar a influência da família
nos aspectos positivos e negativos no processo de inclusão social das pessoas
portadoras de deficiência.
O âmbito familiar tem um efeito potencialmente forte e durável para o
ajustamento desde a infância. O vínculo e a interação familiar saudáveis
servem de base para o desenvolvimento pleno das potencialidades das
crianças e adolescentes. Scheker, Miriam (2005).
Muitas famílias encaram o desafio da missão de cuidar dos filhos
portadores de deficiência com um encorajamento extraordinário, e ainda que,
em condições precárias economicamente (por amor a seus filhos), conseguem
movimentar-se em busca de ajuda e, assim, formar um vínculo com equipes
que possam auxiliá-las a ultrapassar as barreiras enfrentadas no processo de
inclusão. No entanto, há também àquelas famílias que por falta de
conhecimento sobre deficiências e sobre as possibilidades de desenvolvimento
das habilidades de seus filhos, assim como, a falta de conhecimento de seus
direitos, acabam favorecendo (ainda que se intenções) a segregação do
portador de deficiência ante a sociedade, a desassistência e a violação dos
direitos da criança.
A família precisa manter sempre um elo de ligação com as instituições
de saúde e educação, entre outras, no sentido de ampliar a cada dia a
autonomia das pessoas portadoras de deficiência.
Uma pessoa surda, por exemplo, tem a possibilidade de atuar nas mais
diversas áreas profissionais desde que, tenha sido ajudador e essa ajuda tem
início no seio da família – a desenvolver sua linguagem.
Penso que a pessoa que cuida precisa entender seus limites, porém
mais do que isso, precisa ter acesso a informações disponíveis nos meios de
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comunicação, porque através da informação ela chegará aos setores que
ofereçam recursos de atendimento e apoio ao portador de deficiência.
Até algum tempo atrás, PPD Viviam enclausurados, não freqüentavam
a escola, não trabalhavam, não iam a shoppings, cinemas, praças ou parques
de diversão, viviam trancafiadas dentro da própria casa, recebendo umas
poucas visitas dos familiares mais próximos, sendo tratadas como pessoas
doentes acima de tudo. É terrível imaginar que além da dor do isolamento,
essas pessoas também carregavam sentimentos como medo, vergonha,
angústia e culpa, baseados na imaginação ou na própria realidade.
Hoje muita coisa mudou, porque as políticas públicas e as ações
setoriais e intersetoriais têm contribuído para isso, principalmente no que diz
respeito aos direitos do deficiente.
Ao longo dos tempos, duas declarações internacionais tem lugar de
destaque no campo de deficiência.
A primeira, adotada pela UNU por meio de Assembléia Gera em 1971,
trata de sete preceitos em benefício das pessoas com deficiência mentais:
Igualdade de direitos; acesso a maiôs de
desenvolvimento de suas habilidades; emprego
(dentro de suas limitações); convívio social;
nomeação, quando necessário, de uma pessoa que
o proteja; direito de processar alguém por
exploração ou tratamento degradante; e diversos
procedimentos referentes a limitações da deficiência
(Organizações das Nações Unidas, 1971).
A segunda adotada pela ONU em 1975, por meio da Resolução a.3447,
entitulada como, A Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, é
composta de 13 parágrafos:
• Garantia de todos os direitos, sem distinção ou discriminação; • Respeito inerente à dignidade humana, independentemente da gravidade da deficiência;
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• Direito a uma vida decente e a mais normal possível; • Garantia dos mesmos direitos civis e políticos de outros seres humanos; • Direito de essas pessoas serem capacitadas e de se tornarem autoconfiantes; • Direito a tratamento médico, psicológico, funcional (colocação de aparelhos corretivos e próteses), reabilitação médica e social, educação, treinamento vocacional, assistência, aconselhamento, integração social; • Direito à segurança economia e social, á manutenção de emprego ou de atividade produtiva remunerada; • Direito a uma vida familiar ou institucional adaptada, a participar de atividades sociais, criativas e recreativas; • Direito de as pessoas com deficiência terem proteção contra a exploração, a discriminação, o abuso, a degradação; • Direito de ter assegurada assistência legar que leve em conta a condição física e mental da pessoa com deficiência (Organização das Nações Unidas, 1975)
Entendemos que o impacto sofrido pela família de um portador de
deficiência pode gerar, em primeira instância, um sentimento de negação da
realidade, frustração, tristeza e sensação de impotência da capacidade de
cuidar da criança.
Segundo Cavalcante e Bastos (2009), as famílias precisam de apoio, de
orientação e de ampliações das condições de assistência de todos os seus
membros para que tenham condições de amparar melhor todos e cada um,
conforme suas necessidades.
No entanto, muitas famílias se fecham no processo de desenvolvimento
de seus filhos portadores de deficiência, não interagem, não constroem novos
laços sociais, não buscam alternativas de apoio e de acompanhamento,
comprometendo a autonomia dessas crianças e a situação das mesmas tende
a agravar.
Recorro à autoridade de Fátima Gonçalves Cavalcanti e Celga Maria
Bastos (2009) para relatar, de forma resumida, um estudo de casa
23
apresentado por elas para facilitar a visualização de como a desassistência
pode impactar a saúde e a qualidade de vida das pessoas com deficiência.
Maria Antonia compareceu à consulta médica, pela
primeira vez, levando sua filha Angélica de 13 anos,
com grave deficiência mental. Até aos oito anos, ela
fez acompanhamento com um neurologista, usando
medicamentos controlados e, desde então, nunca
mais foi às outras consulta, mas continua tomando a
medicação até hoje, já que Maria Antônia trabalha
em uma clínica e, por isso, tem acesso aos
medicamentos sem que dependa ir à consulta. O pai
é faxineiro de um edifício próximo à residência. O
casal veio do Nordeste e não conta com a ajuda de
ninguém, no entanto, recebem o Benefício de
Prestação Continuada (BPC). A jovem fica o tempo
todo no colo da mãe e saliva muito. Em conversa
mais detalhada com a Assistente Social, descobriu-
se que a jovem ficava sozinha trancada em um
quarto, sem nenhum tipo de assistência, enquanto
os pais estavam trabalhando. A assistente social e a
médica explicaram a mãe a necessidade de se fazer
uma notificação junto ao Conselho Tutelar para que
Angélica fosse colocada em uma escola e que a
família se reorganizasse para atender as
necessidades da filha. Tempos depois, o Conselho
tutelar conseguiu uma escola, no entanto, a “baba”
da jovem foi colocada como obstáculos pelos
professores, pois a estava impedindo de participar
das atividades propostas.
(p.272-275)
24
A família de Maria Angélica precisava de ajuda para entender a situação
de extrema precariedade a que a filha estava submetida. O fato de eles não
terem procurado a mais tempo por um centro de atendimento especializado e
terem deixado a filha trancada em um quarto, afastando-a completamente do
convívio social, gerou, mesmo que inconscientemente, uma condição de maus-
tratos abandono de incapaz e violação dos seus direitos, ainda que não fosse
deficiente.
De acordo com a Rede Nacional de Direitos Humanos, (1997) destacamos a
seguinte definição:
Direitos humanos são os direitos fundamentais de
todas as pessoas, sejam elas mulheres, homens,
negros, homossexuais, índios, idosos, pessoas
portadoras de deficiências, populações de fronteiras,
estrangeiros e imigrantes refugiados, portadores de
HIV positivo, crianças e adolescentes, policiais,
presos, despossuídos e os que tem acesso à
riqueza. Todos devem ser respeitados como
pessoas e sua integridade física protegida e
assegurada. (www.rndh.gov.br-17-11-2009)
A sociedade ainda hoje, age de forma muito preconceituosa,
acreditando que a deficiência é problema de quem a tem e de seus familiares.
Talvez, por isso, muitas famílias sem orientação sobre as possibilidades de
desenvolvimento da capacidade de seus filhos, acabam isolando-se da
sociedade na tentativa de os protegerem e preservarem.
Os obstáculos encontrados no processo de inclusão conferem à família
um sentimento de estigma e marginalização, retardando, ainda mais, o
processo de autonomia dos portadores de deficiência.
De acordo com (Glat e Duque, 2003), o papel dos profissionais é
fundamental para minimizar esses sentimentos e promover orientação e
esclarecimentos sobre as capacidades do filho portador de deficiência.
25
É necessário também fornecer a essas famílias, independente de sua
condição sócio-econômica e cultural, informações precisas e atualizadas sobre
a condição de seu filho, buscando com eles alternativas de atendimento e
orientando-os nas situações problema do dia a dia (Glat e Duque, 2003.p.19).
A família tem necessidade de interação com as equipes
multidisciplinares para que consiga trazer para o filho um tratamento
adequado, assim como, a reorganização da sua dinâmica familiar.
Compreendemos que se essa família for estimulada a se envolver ativamente
na sociedade, mais rapidamente terá condição de exercer cada membro a sua
função e trazer àquele que é portador de a possibilidade de aprender a amar, a
formar sua personalidade e a conquistar sua autonomia.
Desta forma, tanto família quanto sociedade caminharão a passos
largos para que a inclusão social dor portadores de deficiência seja
efetivamente constituída.
2.1 – A influência da Terapia de Família no processo de inclusão social.
Conforme (Silva, 2005):
Seria de extrema importância identificar as
necessidades de informação da família para
estabelecer programas de orientação
fundamentados no que a família precisa ou quer
discutir com os profissionais de saúde. A família que
possui um ou mais membros com necessidades
especiais é a primeira integradora de seu filho na
sociedade, tendo de aprender a conviver e também
ensinar-lhe as primeiras lições de vida.
Dentre muitas equipes que poderiam auxiliar as famílias dos portadores
de deficiência, não poderíamos deixar de destacar a influência da Terapia de
Família neste processo de inclusão social.
26
Compreendemos que a terapia familiar foi desenvolvida por muitos
estudiosos que trabalhavam com diferentes propósitos. Neste sentido, há
várias terapias de família com formas distintas de tratar cada uma delas.
Todavia, estaremos refletindo aqui o conceito mais influente nesse campo, o
da Teoria Geral dos Sistemas, em que um sistema é compreendido como um
conjunto de elementos unidos por uma forma de interdependência que forma
um todo, ou seja, um conjunto de elementos que se relacionam entre si e com
o meio em busca de um resultado final (Bertalanfly, 1975).
Com base na teoria de Van Bertalanfly (1972), entendemos a família
como um sistema aberto, em interação com seu ambiente. As ações e
comportamentos de um dos membros influenciam e são influenciados pelos
comportamentos de todos os outros. Neste sentido, todas as partes do sistema
tem relação entre si, de forma que uma mudança numa delas, acarretará
mudança nas demais.
Esta concepção de família como um sistema aberto nos permite
compreender que há sempre a interação recíproca entre os membros da
mesma, e o sofrimento ou a dificuldade de um deles, mexe com a dinâmica de
toda ela. Nesta perspectiva a família que tem um de seus membros portadores
de deficiência passa por um processo de desequilíbrio no sistema e cremos
que talvez a intervenção de um especialista em terapia de família na visão
sistêmica se faça necessária para auxiliar-la a encontrar sua homeostase, ou
seja, o seu ponto de equilíbrio. No entanto para que haja uma intervenção com
sucesso a família precisa estar aberta ao trabalho e assim, o terapeuta estará
sugerindo as possibilidades e os objetivos do processo terapêutico.
Um foco terapêutico importante é a resiliência, que enfatiza buscar e
implementar processos que possibilitem que as pessoas lidem de modo mais
eficiente com situação de crise ou estresse e, além disso, saiam fortalecidos
dos mesmos (Wash 1998).
Outro fator importante para que se obtenha sucesso no processo de
orientação das famílias é, que se respeite as características próprias de cada
uma delas, como bem enfatiza D’Antino (1998, p.35):
27
Acredito, porém, que quanto mais estruturada
emocionalmente for a família, com relações afetivas
satisfatórias, convivências de trocas verdadeiras, e
quanto mais precocemente puder ser orientada,
tanto maior será sua possibilidade de reestruturação
e redimensionamento de funções e papéis e,
consequentemente, de facilitação do processo de
desenvolvimento de seu filho, na totalidade do Ser.
A participação de grupos de intervenção e programas de auxílio pode
ser de muita ajuda aos pais de portadores de deficiência, pois auxiliam no
acesso de informações e dos recursos para adaptação, gerando a
possibilidade de compartilhar suas vivências com outras pessoas que passam
por situações parecidas, na dificuldade para lidar com o nascimento de um
filho deficiente, os pais devem procurar orientação para se adaptarem a nova
situação.
A ajuda aos pais, quando qualitativa e oportuna, terá um efeito muito
significativo, principalmente se for realizada nos primeiros anos de vida da
criança.
28
CAPÍTULO III
ESTUDO DE CASOS
Este momento da pesquisa destina-se ao estudo de alguns casos de
pessoas portadoras de deficiência que superaram suas dificuldades e
alcançaram resultados surpreendentes no processo de inclusão.
Os casos em estudo, tem origem na instituição de ensino C.I.E.P. 114,
Maria Gavázio Martins, uma escola inclusiva. Realizamos uma pesquisa
qualitativa com método de observação participante.
Os estudos de casos apresentados neste trabalho nos transportam para
verificar, de forma mais abrangente, como se dá o processo de inclusão social
dos portadores de deficiência.
As pessoas relatadas aqui são pessoas de meu convívio na instituição e
tenho acompanhado a trajetória delas há alguns anos. No entanto, as
entrevistas aconteceram no período de outubro de 2009 e utilizei a técnica de
entrevistas abertas, de forma individual, em que introduzi o tema e os
entrevistados discorreram livremente sobre o assunto. Desta forma, pude
explorar amplamente a questão e as perguntas foram respondidas dentro de
uma conversação informal. Utilizei como instrumentos: papel, caneta e no
terceiro caso, um gravador portátil (com autorização do entrevistado).
1º caso:
Aluno D. , portador de deficiência mental com comprometimento na
visão. Este aluno ficou 32 anos afastado das salas de aula, pois sua mãe
achava que esse seria o melhor modo de protegê-lo. Aos 41 anos D. voltou a
estudar. Foi matriculado na classe de alunos especiais e um ano depois foi
incluído na classe de aceleração de aprendizagem.
29
No início o aluno se demonstrava um tanto constrangido por sua
deficiência e, mais ainda, por sua muita idade. O primeiro passo foi uma
conversa aberta com a turma na presença do aluno, expondo todas as
dificuldades e limitações; foi dito aos alunos que teriam que abraçar essa
causa juntos para verem o amigo vencer, pediram que agissem naturalmente e
o tratassem com respeito e consideração, de acordo com sua idade.
Com relação à aprendizagem utilizaram com o D. uma estratégia bem
observada por Marta Gil, a “aprendizagem cooperativa”, em que os alunos são
colocados em grupos de trabalho e organizados na base da heterogeneidade
das suas habilidades (por exemplo, juntando alunos com dificuldades especiais
numa determinada área com alunos mais habilitados no assunto em estudo).
D. a cada dia surpreendia, inclusive sobressaindo à muitos na leitura e
produção textual.
De acordo com os dados de investigação conhecidos, as estratégias de
aprendizagem cooperativa levam a uma melhoria significativa das atitudes por
parte dos alunos não deficientes face aos seus colegas com dificuldades
especiais ou mesmo com deficiências graves, ao mesmo tempo em que
permite a estes um aumento significativo da sua auto-estima e das atitudes
em face de si mesmos.
No final do ano D. foi acelerado para 5ª série do Ensino Fundamental e
foi convidado a participar de um evento na Secretaria Estadual de Educação e
ali, prestou um depoimento falando a respeito do seu rendimento e a
importância de se trabalhar a auto-estima em sala de aula. Seu depoimento
comoveu a todos e, no final, ele deixou a seguinte frase:
“Esse foi o primeiro pódio de muitos outros que pretendo subir”.
2º caso:
Aluna M., portadora da deficiência física paraplegia, com
comprometimento na coordenação motora. Sua deficiência é de causa pré-
natal, e desde bebê a família a encaminhara a um programa de “estimulação
precoce”, com objetivo de desenvolver suas capacidades e sua independência
nas atividades cotidianas.
30
Aos 7 anos de idade, M. foi matriculada na classe de alfabetização. O
primeiro passo foi adaptar sua carteira, colocando-a em uma melhor posição
em relação ao quadro, procurou-se criar uma relação de confiança com a
aluna, descartando a hipótese de ela vir a ter medo ou vergonha de não
aprender o que está sendo ensinado.
É muito importante para uma criança portadora de deficiência
física aprender, desde pequena, a não se autolimitar. Ela precisa ter em mente
que não é doente e que apesar destas limitações, pode ter uma boa
convivência na sociedade.
Para que essa boa convivência e interação aconteça, é preciso que o
professor saiba comunicar-se com o aluno. A M., por exemplo, era muito
introvertida, tímida, sentia-se inferior aos outros e, por várias vezes pensou em
desistir. No entanto, procuraram o tempo todo encorajá-la, trabalharam
sempre a questão da auto-estima e o progresso da aluna no processo ensino-
aprendizagem se deu por terem se preocupado com a reciprocidade na
comunicação, “a interação verbal”.
Este conceito foi amplamente abordado no artigo de Diana Luz: “A
comunicação deve ser, portanto, repensada, não mais como um fenômeno de
mão única, do emissor ao receptor, mas como um sistema interacional” (p. 42).
Benveniste (1966), Baktin (1981) e Goffman (1967 e 1973) foram
grandes estudiosos citados no artigo de Diana Luz por tratarem a
comunicação nesse âmbito, de “sistema interacional”, apontando sempre a
questão da reciprocidade na comunicação.
Foram feitas algumas adaptações na sala de aula, mas foi efetivamente
o diálogo e a boa conversação que fez com que M. entendesse que tinha, a
mesma oportunidade que os outros para desenvolver suas potencialidades e
satisfazer suas necessidades. Os demais alunos também entenderam que
manter a boa comunicação seria o essencial para o desempenho da turma de
modo geral, e não apenas da aluna supracitada.
Hoje M. está com 18 anos e cursa a 8ª série do Ensino Fundamental.
Ela não desistiu, porque foi na escola que aprendeu a confiar em si mesma,
percebeu que era capaz de realizar a maioria das atividades, mesmo levando
31
um pouco mais de tempo, e pôde contar com a ajuda de profissionais e alunos
que criaram essa relação de confiança.
3º caso
F., deficiente visual, professor de Língua Portuguesa de classe regular
de ensino.
Relatamos o caso do professor F., no ensejo de evidenciar que a
inclusão social de fato beneficia a todos. Sendo ele o deficiente e os alunos
“normais”, o mesmo, mostra como é precioso atribuir as mesmas
oportunidades ao aluno e ao profissional e a importância do seu trabalho no
processo ensino-aprendizagem.
Segundo o professor F., a família tem um papel fundamental no
desenvolvimento da autoconfiança de qualquer criança, principalmente das
portadoras de deficiência. Embora não seja fácil, a família precisa entender
que o portador de deficiência é, antes de tudo e acima de tudo, uma pessoa
total, evitando focalizar a atenção na sua condição visual. Assim, ela deve
oferecer condições para seu crescimento como indivíduo, tornando-o capaz de
ser feliz e produtivo dentro de sua realidade, de sua potencialidade e seus
limites.
A escola, por sua vez, ao abrir suas portas para receber os que
enxergam e os que não enxergam, tanto alunos quanto professores, torna-se
um espaço de inclusão, promovendo trocas enriquecedoras entre toda a
equipe escolar, os alunos e suas famílias.
Os professores, no entanto, devem estar atentos às habilidades e
referencial perceptual que o deficiente visual revela. A partir daí, o professor
pode oferecer-lhe oportunidades para entrar em contato com novos objetos,
pessoas e situações, facilitando seu processo de aprendizagem.
O professor F. foi alfabetizado e passou parte de sua escolaridade
estudando em um instituto especial para deficientes visuais, porém, só
conseguiu sentir-se confortável e decolar com sucesso quando foi incluso em
escola regular, onde conseguiu concluir o Ensino Fundamental e Médio. Logo
depois, cursou a faculdade de Letras.
32
Hoje, o professor F. possui duas matrículas na Rede Estadual de
Ensino, desenvolvendo um trabalho espetacular na disciplina de Língua
Portuguesa, onde os conteúdos são desenvolvidos, na maioria das vezes, sob
técnicas de redação e produção textual. Seus alunos produzem redações com
o tema proposto por ele e, a partir da leitura das mesmas, o professor vai
trabalhando os conteúdos designados para aquela aula.
Os resultados das atividades propostas pelo professor são sempre
positivos e o mesmo já possui, inclusive, inúmeros livros de redações
compostos pelos seus alunos.
Devemos lembrar que a inclusão deve ser trabalhada na sociedade,
onde fazemos parte, devemos nos questionar sobre a nossa inserção na
sociedade. Pensando na inclusão como interação na sociedade, pode-se dizer
que é ter um olhar para cada um, levando-se em conta suas possibilidades,
suas habilidades incentivando-o, ajudando-o a desenvolvê-las de maneira
saudável e prazerosa, aflorando a sua auto-estima, integrando-o com outras
pessoas, familiares para que possam ter autodeterminação futuramente como
cidadão sendo capaz de arcar com sua possibilidade e digno de ser aceito na
sociedade, tendo também livre arbítrio, preparando-o para ser aceito na
sociedade quando não mais estiverem presentes seus familiares.
Cabe ao professor realizar atividades nas quais possam trabalhar mais a
competência dos alunos e não fixar prazos, pois é uma forma de respeito ao
portador de necessidades especiais.
É importante criar atividades grupais dinâmicas e interessantes para os
alunos PNE e os demais alunos da turma regular para que o grupo possa
vivenciar experiências comuns aos alunos da mesma faixa etária. Para
trabalhar produção textual, por exemplo, começamos sempre montando um
texto coletivo em que cada aluno cita uma palavra, então, vamos estruturando,
organizando, apontando os erros, até sua completude.
Outras atividades de grupo tais como registro no Livro da Vida (registro
coletivo das atividades mais importantes daquele dia); planificação das
atividades diversificadas (escolha de atividades para serem trabalhadas
naquele dia); comunicação (apresentação dos grupos às outras crianças e à
33
professora do que estavam; entre outras, são muito bem aceitas pelo aluno
PNE. Há ainda, atividades como informática educativa, participação em
competições esportivas, excursões, saídas para conhecer a comunidade, sala
de leitura e confecção de jornais da turma para desenvolver a leitura e a
escrita, aulas de artesanato e muito mais. Assim, o trabalho em grupo
beneficia não só os portadores de deficiência, mas a todos.
Com relação à avaliação destes alunos, esta deverá ser feita em vista
do percurso do aluno no decorrer do curso, considerando o seu sucesso, a
partir do que é capaz de fazer para enfrentar suas dificuldades, sua construção
de conhecimentos ao longo de suas atitudes, sua organização e participação
ativa em sala de aula, levando em conta seus avanços em todos os aspectos
do seu desenvolvimento no processo de ensino e aprendizagem.
Em se tratando dos pais dessas crianças com necessidades especiais,
estes devem ser orientados e preparados no processo de inclusão para não se
sentirem inferiorizados diante dos amigos e familiares, às vezes,
envergonhados com a deficiência do filho, tornando-os super protegidos e até
mesmo exclusos do mundo das pessoas “normais”. A inclusão deve ser social,
com a participação ativa da família, amigos, equipes médicas, profissionais de
um modo geral e da sociedade, para receber esta criança deficiente.
34
CONCLUSÃO
Esta pesquisa objetivou analisar a contribuição da família no processo
de inclusão da socialização e do desenvolvimento global de seus filhos. Com
efeito, é na família que se tem início o processo de inclusão, pois é ela quem
intermediará a integração de seus filhos junto a sociedade.
Refletimos aqui as dificuldades enfrentadas pelos familiares e a
necessidade deles receberem orientação e apoio da Terapia de Família,
considerando que este apoio minimiza as ansiedades da família frente ao filho
portador de necessidade e ajuda na busca de novas alternativas para o
enfrentamento, organização e convivência saudável entre seus membros.
Objetivou-se também, elucidar o auxílio das equipes multidisciplinares,
no sentido e promoverem um trabalho de fortalecimento na estrutura familiar,
pois estes profissionais, através da informação que possuem, podem introduzir
estratégias e meios de adaptação para melhor organização na dinâmica destas
famílias.
Em relação à educação, a pesquisa procurou evidenciar a necessidade
de se abrir cada vez mais espaços para a capacitação dos professores e toda
comunidade escolar, além, da adaptação do ambiente nas escolas regulares,
para que os alunos com necessidade educativas especiais tenham as mesmas
oportunidades no processo ensino-aprendizagem que os alunos “ditos”
normais.
O chefe do Setor de Neuropsiquiatria Infantil do serviço psiquiátrico da
Santa Casa de Misericórdia, Fábio Barbirato afirma que as crianças portadores
de necessidades especiais podem se desenvolver muito no convívio com
crianças “normais”, pois “ao conviver com as crianças normais elas
reorganizam estruturas cerebrais que podem ajudar no seu desenvolvimento. A
inclusão permite o desenvolvimento máximo do limite da criança”. Para o
médico saúde e educação devem caminhar juntas. O ideal é que estas
crianças recebam atendimento adequado o mais cedo possível. (Folha dirigida,
fevereiro/março, 2002).
35
Segundo Claudia Werneck (1997):
Partindo da premissa de que quanto mais a criança
interage espontaneamente com situações
diferenciadas, mais ela adquire o genuíno
conhecimento, fica fácil entender porque a
segregação não é prejudicial apenas para o aluno
com deficiência. A segregação prejudica a todos,
porque impede que as crianças das escolas
regulares tenham oportunidades de conhecer a vida
humana em todas as dimensões e desafios. Sem
desafios, como evoluir? (p.18)
Diante desta proposta de inclusão, a sociedade tem importante papel e
deve olhar os portadores de necessidades especiais com olhos despidos de
preconceitos, deve ainda, se preparar para a inclusão, para sua concretização,
visto que esta capacitação está presente em cada um de nós, desde que,
tenhamos empatia e aceitação, sendo necessário sem dúvida, a cooperação
das autoridades com atualizações de políticas públicas no campo da inclusão
social para que essas pessoas usufluam, com dignidade, os direitos iguais aos
de todo cidadão. Assim, a sociedade será educada para adotar a visão
inclusivista, acerca dos direitos e das necessidades da população em geral.
O trabalho monográfico procurou, acima de tudo, desmistificar a imagem
da incapacidade das pessoas com necessidades especiais, considerando que
as mesmas podem desfrutar de melhor qualidade de vida e desenvolver ao
máximo suas habilidades.
Nosso trabalho tem a pretensão, ainda que modesta, de conscientizar a
sociedade para a questão das pessoas portadoras de deficiência, elucidar o
fascinante papel da família no processo de inclusão social e verificar a
importância das equipes multidisciplinares neste processo. Reconhecemos,
entretanto, que este trabalho não se esgota neste momento. Aqui somente foi
possível dar uma breve noção da riqueza que o trabalho com essa população
36
pode apresentar. Lutar pela inclusão social dever ser compromisso de cada um
e de todos ao mesmo tempo.
37
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Nome da Instituição:
Título da Monografia:
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