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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A HOMOLOGAÇÃO DA DESISTÊNCIA DO RECURSO NO
PROCESSO CIVIL
Por: Ivan Capoli Silva
Orientador
Prof. Dr. Jean Alves Pereira Almeida
Rio de Janeiro
2008
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A HOMOLOGAÇÃO DA DESISTÊNCIA DO RECURSO NO
PROCESSO CIVIL
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Direito
Processual Civil
Por: . Ivan Capoli Silva
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RESUMO
A desistência da ação é uma das formas de extinção do processo sem
resolução do mérito. O texto do CPC é expresso ao afirmar da necessidade de
sua homologação para produção de feitos no mundo jurídico, visto não haver
ainda sentença.
A desistência do recurso, por sua vez, no iter do processo, parte de uma
sentença prolatada. O CPC não expressa a necessidade de sua homologação.
A prática dos Tribunais empresta à desistência do recurso o mesmo
procedimento da desistência da ação: a homologação pelo juiz. Os tribunais,
por intermédio de seus Regimentos Internos, corroboram tal praxe.
Caberia, então, a homologação da desistência do recurso em sede
processual civil?
O nosso entendimento é que não cabe homologação em face da
desistência do recurso. O que ocorre é uma questão de prática processual
tendo como base a desistência da ação. Os regimentos internos não são
hierarquicamente superiores à legislação Federal, no caso o Código de
Processo Civil
Homologa-se a desistência da ação, produzindo sentença sem
julgamento do mérito. No caso do recurso, já há sentença preexistente que não
carece de ser homologada. É preclusão lógica.
METODOLOGIA
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Pesquisa etimológica; da legislação federal; da doutrina (clássica e
atualizada); da jurisprudencial e bibliográfica.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Origem Histórica 11
CAPÍTULO II - O Mercado 20
CAPÍTULO III – A Proposta 39
CONCLUSÃO 47
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 52
BIBLIOGRAFIA CITADA (opcional) 55
ANEXOS 58
ÍNDICE 59
FOLHA DE AVALIAÇÃO 63
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INTRODUÇÃO
Segundo o Regimento Interno do STF cabe ao Relator homologar as
desistências, ainda que o feito se ache em mesa para julgamento. Este
preceito é acompanha pelos Regimentos Internos do STJ e do TRF 2ª Região,
entre outros.
O art. 267, VIII do CPC enuncia que o processo se extingue, sem
resolução do mérito quando o autor desistir da ação. No parágrafo único do art.
158 do CPC diz que a desistência não produzirá efeitos enquanto não for
homologada por sentença.
É obrigatória a homologação da desistência da ação no Processo
Civil? Numa interpretação literal e gramatical dos textos acima tem-se que é
compulsória a homologação da desistência da ação. Este entendimento é
pacífico na Doutrina e na Jurisprudência.
Problema: Quanto à homologação da desistência do recurso, é
cabível? Aí reside o problema. Hipótese: Pela regra do CPC não cabe
homologação da desistência do recurso.Como, porém, o CPC não é expresso
sobre a questão, Doutrina e Jurisprudência tem debatido a questão.
Não se trata, porém, de simples solução pela interpretação literal e
teleológica da lei. Há que se buscar as raízes etimológicas da palavra
desistência, como o instituto era concebido no CPC anterior (1939), uma
análise jurídica do ato homologação, do ato desistência, do ato renúncia. É
necessário que se verifique a localização do tema no CPC de 1973, ou seja,
Livro I – Do Processo de Conhecimento, Título VI – Da Formação, Da
Suspensão e Da Extinção do Processo comparando com o Título X – Dos
Recursos, Capítulo I – Das Disposições Gerais.
Há de se verificar, também, sobre os efeitos e limites da desistência e
do recurso, como também o juízo de admissibilidade dos recursos, passando
pela coisa julgada material e formal.
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Como se vê, então, a questão é mais complexa do que inicialmente se
apresenta. Para isto que se presta o presente trabalho, que não objetiva
esgotar o tema, mas contribuir para um aprefeiçoamento do Tema Desistência
no Processo Civil Brasileiro.
Para tanto, foi-se buscar o pensamento dos principais doutrinadores
processuais a respeito do tema como também pesquisa jurisprudencial.
Na certeza de que não cabe homologação da desistência do recurso é
que se inicia este trabalho.
CAPÍTULO I
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ORIGEM HISTÓRICA
O CONCEITO
...Mene incepto, desistere victam?
1.1 – Origem Histórica
De acordo com o Dicionário Latino Português de Fernando Torrinha,
desistir vem de desisto, is, ere, stiti, situm, verbo tansitivo ou intransitivo que
significa deixar, desisitr de, cessar.
No Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa temos
que desistência vem do latim medieval desistentia. O verbo português
desistir significa renunciar, não prosseguir num intento. Do latim desistere
que denota afastar-se, deixar de.
No Novo Dicionário da Língua Portuguesa de Aurélio Buarque de
Holanda, desistência tem origem no latim desistentia, que significa ato ou
efeito de desistir. Ainda, desistir – do latim desistere que é verbo transitivo
indireto ou intransitivo: não prosseguir (num intento), renunciar.
O Dicionário jurídico da Academia Brasileira de Letras Jurídicas define
a desistência como ato ou efeito de desistir e que na técnica processual, é a
renúncia feita pelo autor à instância ou à ação, antes ou depois da contestação
(nesta última hipótese com o consentimento do réu). Sua natureza jurídica é de
causa de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267 do CPC). É
termo técnico que se usa, também para indicar a renúncia a recurso (art. 501
do CPC).
Jônatas Milhomens, no seu Vocabulário Prático do Direito, conceitua a
desistência como mudar de parecer, cessar, descontinuar de, parar, que
significa na terminologia jurídica, a renúncia, que se faz de alguma coisa ou de
algum direito, seja em consequência de evidente abandono, seja motivado por
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uma transação. Assim, a desistência mostra-se como renúncia recompensada,
ou se apresenta como renúncia pura e simples.. Na desistência pura e simples,
a vontade do desistente (ato unilateral) será o bastante para que se verifique
válida, desde que nela não se envolva qualquer prejuízo a outrem, que se
possa opor ao ato de renúncia.
Milhomens conceitua a desistência da ação como o ato pelo qual o
autor de uma demanda renuncia ao andamento dela. Enquanto a ação não é
contestada, não tornando assim o caráter litigioso, a desistência será ato
voluntário do autor, sem qualquer intervenção da parte contrária. Caso
contrário, é necessária, a aprovação da parte contrária. Embora não se faça
mister a elaboração do “termo de desistência”, somente valerá após sua
homologação por sentença.
Já no Dicionário Jurídico de autoria de Maria Helena Diniz, a autora
apresenta três aspectos no conceito de desistência: 1) Direito Civil – a)
remissão da dívida pelo credor; b) renúncia a um direito; c) transação; d)
abandono; 2) Processo Civil – é a intenção do autor de não prosseguir com a
ação por ele proposta ou com o recurso interposto; 3) Processo Penal –
reconciliação do querelante e do querelado na audiência inaugural do processo
e julgamento dos crimes de calúnia e injúria, arquivando-se a queixa.
Conceituando a desistência da ação ensina que é o ato pelo qual o autor
renuncia à demanda, manifestando sua vontade de que a ação proposta não
tenha prosseguimento. Essa decisão somente produzirá efeitos após sua
homologação por sentença judicial, não obstando, porém, o prosseguimento
por reconvenção e o seguimento da ação declaratória incidental.
Alexandre Freitas Câmara conceitua a desistência da ação como
sendo a abdicação expressa da posição processual, alcançada pelo autor,
após o ajuizamento da ação.
De acordo com Pontes de Miranda a extinção do processo apaga ex
tunc a relação jurídica processual. Segundo ele, ao analisar o CPC de 1939,
fim à instância: a) o Normal que ocorre com a decisão da causa; e b) Anormal
que ocorre com a extinção do processo, a desistência homologada pelo juiz e a
transação. O Código de 1973 não separou a extinção do processo e a
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cessação do processo (no art. 267, VII e VIII, estão o compromisso arbitral e a
desistência).
O processo extingue-se sem julgamento do mérito se o autor desiste
da “ação” (no sentido do direito processual). Até a resposta do réu, pode o
autor desistir da ação, a seu arbítrio. Depois de decorrido o prazo, não: precisa
do consentimento do réu (art. 267, § 4°). Diferente é o que se passa com a
renúncia do autor, no tocante ao direito, à pretensão e à ação, ou só a à ação
(no sentido do direito material), porque aí, há a extinção do processo com
julgamento do mérito: a ação, ou o direito, a pretensão e a ação deixaram de
existir.
Ocorre o mesmo em caso de reconvenção, em que o reconvinte
desistiu da ação.
1.2 – O CPC de 1939
O Código de Processo Civil de 1939 atestava no seu art. 818:
“O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem anuência do recorrido ou
dos litisconsortes, desistir do recurso interposto”.
A renúncia era à pretensão de recorrer; a desistência era ao recurso. A
desistência do recurso é unilateral e independe de concordância ou aceitação
da outra parte. A razão está em que ela não se entende com a relação jurídica
processual, mas apenas com a extensão dessa ao juízo do recurso. A lei
equiparou tal desistência ao que ocorre, antes da contestação, quando o autor
desiste (art. 181 CPC): já existe relação jurídica processual, a desistência faz
cessar tal relação, e, no entanto, o Código de 1939 permite a desistência
unilateral. Pontes de Miranda acrescenta que não devem pois procurar
fundamentos profundos para a regra do 181 CPC: os seus propósitos políticos
foram de ordem prática. A bilateralidade da desistência devera, a priori,
começar da vocatio in ius, desde quando se iniciam deveres de ambas as
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partes e direitos a favor do réu. O Código o fez mais tarde: “Apresentada a
contestação, o autor não poderá...” (art. 181).
Diferente da renúncia é a desistência, que supõe interposto o recurso.
Esta desistência, declaração de vontade, também unilateral, se pode fazer em
qualquer tempo, sem anuência do recorrido ou dos litisconsortes do recorrente.
Acrescenta Pontes de Miranda, comentando o CPC de 1939, que a deserção é
espécie desistência que não admite prova em contrário, se bem que possa
ser elidida pela regra do art. 813, isto obrigaria a construí-la como efeito de
prazo preclusivo, em que o quod plerumque tit atua para concepção da regra.
A desistência pode ser parcial. É processualmente válida a promessa
de desistir do recurso (“aliter”, a de renúncia). Para se determinar a extensão
da desistência, mais se há de atender ao sentido da declaração que às
palavras. A desistência e a promessa de desistência não compreendem
renúncia à interposição de outro recurso, ou do mesmo, dentro do prazo.
A extensão da relação jurídica processual no grau de recurso significa
que podendo terminar aí, normalmente – estende-se. O juiz muda, sem que
deixe de ser juiz, desde o início, a outra figura subjetiva da relação, no lugar do
Estado (autor, Estado; Estado, réu). Entretanto, há uma diferença entre a
relação jurídica processual, até então, e a mesma relação jurídica processual,
depois.. Cada recurso é extensão. Se só uma parte recorre, a outra não tem
atividade positiva. Uma das conseqüências disso está em que, para a
desistência da ação (art. 181), é preciso o consenso da outra parte, ou a
apreciação judicial de se dar ao caso do art. 181, parágrafo único, ao passo
que, para a desistência do recurso, é desnecessário (prescindível) o seu
consenso e, até mesmo, inoperante a discordância. A essas considerações
atendem as leis para redigir preceitos como os dos arts. 181 e 818. Ainda,
sendo o recurso parcial (autor vencedor em parte, réu vencido em parte), cada
um dos interessados, para desistir, prescinde do consenso do outro.
Tendo havido o ato processual do recurso não cabe perguntar-se se a
parte ou o terceiro, aqui, quis realmente recorrer. É o princípio fundamental
de direito processual que os atos processuais – da parte, ou do juiz, ou
dos aderentes – têm existência, valor e eficácia, sem se levar em conta a
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“vontade” de quem os praticou. Desde que se “encheu” o que a lei reputou
indispensável à existência, validade ou eficácia, o ato processual existe, vale e
é eficaz, independentemente do que se haja querido. O que importa é a
declaração configurada pelo ato. Por isso mesmo, a própria renúncia
extrajudicial ou a desistência extrajudicial do recurso é inoperante: prova,
talvez plenamente, a vontade de renunciar ou de desistir, porém não tem
existência processual, tal como a transação e a desistência não-homologadas
(arts. 206 e 207 do CPC de 1939)
Na regra processualista de 1939, antes de serem remetidos os autos,
conhecia da desistência o juiz recorrido, ainda que se tratasse de apelação.
Nesse caso, a despeito da extensão da relação processual, a declaração de
vontade que é a desistência, integrada pelo ato judicial declarativo, tem a
eficácia constitutiva negativa para destruir aquela extensão de relação
processual (arts. 809 e 818).
Em geral, a desistência do recurso independe de termo; mas há de
haver “declaração de vontade”, ainda que tácita ou pelo silêncio, com o
elemento integrativo (declarativo) da homologação ou outro ato do juiz, ou
tribunal (por exemplo a cognição do recurso).
O juiz podia, antes de homologar a desistência do recurso, ouvir a
parte contrária; porém essa audiência não faz depender de qualquer
comunicação de vontade da parte contrária a tomada do recurso, nem pode
prejudicar o desistente. (4ª. Câmara do Tribunal de Apelação do Distrito
Federal, 2 de abril de 1940, Revista Forense, 82/347).
CAPÍTULO II
A DESISTÊNCIA DA AÇÃO
1.1 – A Extinção do Processo
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O Código de Processo Civil cuida nos artigos 267 e 269 das hipóteses
de extinção do processo sem e com julgamento do mérito, respectivamente.
De acordo com Fredie Didier Júnior, o legislador relacionou esses artigos à
sentença, visto ser esse o ato que encerra o procedimento em primeira
instância, conforme o texto do § 1° do art. 162: “Sentença é o ato do juiz
proferido conforme os arts. 267 e 269 desta Lei”.
A redação do Código induz o entendimento de que toda decisão
judicial, que tenha por conteúdo uma das hipóteses previstas nesses artigos,
será uma sentença. Porém deve se ter muito cuidado com a terminologia. Os
arts. 267 e 269 não prevêem hipóteses em que necessariamente o processo
será extinto nem estabelecem matérias que sejam exclusivas de sentença, a
despeito da redação do § 1° do art. 162 do CPC de 1973.
Os arts. 267 e 269 identificam o conteúdo de certas decisões judiciais,
determinando quando se considera que há e não há exame do mérito da causa
e, consequentemente, se a decisão pode ou não ficar protegida pela coisa
julgada. Somente as decisões de mérito ficam acobertadas pela coisa julgada.
A nova redação do art. 269 do CPC corrobora esta assertativa: “Há resolução
de mérito...”. A nova redaçaõ do art. 267 do CPC, com a troca do “julgamento
de mérito” por “resolução de mérito”, permanece, porém, com referência à
extinção do processo. Perdeu-se a chance de corrigir, também, a redação do
caput do art. 267, que assim deve ser lido: “ Não há exame de mérito”.
Fredie Didier Jr. sistematiza as hipóteses da relação jurídico-
processual sem exame do mérito em 4 (quatro) tipos:
a) Extinção por Inadmissibilidade – trata-se de extinção sem
julgamento decorrente da aplicação da sanção de invalidade do
procedimento (incisos I, IV, V, VI, VII do art. 267);
b) Extinção por Morte – se o autor morrer e o direito for
intransmissível (inciso IX);
c) Extinção por Revogação – que decorre de manifestação de
vontade de uma ou de ambas as partes (incisos II, III e VIII;
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d) Extinção por Confusão – que, na verdade, não implica
decisão terminativa.
A desistência do prosseguimento, ainda segundo Fredie Didier, é um
ato unilateral do demandante. Tecnicamente, não se trata da desistência da
ação, como afirma o inciso VIII do art. 267; é, sim, desistência do
prosseguimento do processo.
Admite-se a desistência parcial, hipótese em que não haverá extinção
do processo, pois a parcela não desistida deve prosseguir para ulterior
julgamento. Se houver litisconsorte passivo necessário, não pode o autor
desistir do prosseguimento do processo apenas em relação a um dos co-réus.
Nada impede, contudo, que, no litisconsórcio facultativo ativo, apenas um dos
autores desista; no caso do litisconsórcio facultativo passivo, é possível que
apenas em relação a um dos réus-litisconsortes haja a desistência.
Não se confunde a desistência com o abandono de que trata o inciso
III do mesmo art. 267, que é “conduta tácita”, ao contrário da desistência, que é
expressa.
Não se admite a desistência após a prolação da sentença. Pode o
autor, se ganhou a causa, renunciar ao direito de executar ou desistir da
execução eventualmente já ajuizada; ou, se perdeu, renunciar ao direito de
recorrer ou desistir do recurso que já interpôs. Nesse sentido Leonardo José
Carneiro Cunha cita acórdão da 2ª. Turma do STJ no RESP 89.474/SP, DJ de
24/05/1999. Se, porém, o autor desistir da causa que já foi julgada, não, há,
pois, mais do que desistir, uma vez que “a prestação jurisdicional almejada ja
foi entregue”.
A diferença entre a desistência do processo e a desistência do recurso
consiste no fato da primeira extingui-lo sem julgamento do mérito (art. 267, VIII,
do CPC); já a desistência do recurso pode implicar extinção do processo “com
ou sem” julgamento do mérito, a depender do conteúdo da decisão recorrida,
como também pode não implicar a extinção do processo: caso de uma
desistência de um agravo de instrumento. A desistência do processo precisa
ser homologada pelo magistrado (art. 158, parágrafo único, do CPC),
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dispensada na desistência do recurso (art. 501 do CPC). A do processo
depende do consentimento do réu, se já houve resposta (art. 267, §4°, do
CPC); na desistência do recurso, o consentimento é dispensado (art. 501 do
CPC)
Estão incorretas as expressões “pedir desistência” e “pedido de
desistência”. Não se pede desistência; desiste-se. O que o desistente requer é
a “homologação da desistência”, tendo em vista que esta somente produz
efeitos após a chancela judicial (art. 158, parágrafo único do CPC).
Se já houve oferecimento de defesa, a homologação da desistência
exige o consentimento do demandado – ainda que tenha sido apresentada a
contestação por curador especial (art. 9°, II, do CPC). É o oferecimento da
defesa, mesmo antes do vencimento do prazo, o parâmetro para saber se há
ou não necessidade de prévio consentimento, e não o simples escoamento do
prazo de resposta do réu, como indica o § 4° do art. 267 do CPC.
Há casos, porém, que a primeira manifestação do réu no processo é a
interposição de um recurso – agravo de instrumento – contra eventual decisão
liminar que lhe seja desfavorável. Neste caso, mesmo que ainda não tenha
havido a apresentação da resposta, a homologação da desistência do
processo exige a vênia do réu. Se houve o escoamento do prazo de defesa
sem qualquer resposta (revelia), não há necessidade de consentimento do
demandado. Reiterada jurisprudência do STF, contudo, admite a desistência
do mandado de segurança a qualquer tempo, independentemente da anuência
do impetrado.
No caso do réu, em sua defesa, requeira a extinção do processo sem
julgamento do mérito. Aqui, não teria o réu como o réu rejeitar a desistência
apresentada, por absoluta falta de interesse – para contestar é necessário ter
interesse, afirma o art. 3° do CPC. É que a desistência do demandante lhe
proporciona o exato resultado almejado: a extinção do processo sem exame do
pedido. A recusa do consentimento não pode ser fruto de mero capricho do
réu.
Assim, mais correta era a redação do CPC de 1939, que
expressamente determinava a averiguação do interesse do réu em negar
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consentimento à desistência: “A recusa do réu será rejeitada, se da
desistência não lhe resultar prejuízo”. (art. 181, parágrafo único).
A desistência do processo é ato distinto da renúncia ao direito sobre o
que se funda a demanda. Ambos são atos processuais dispositivos, que
exigem do advogado poder especial para agir: “A procuração geral para o
foro, conferida por instrumento público, ou particular assinado pela parte,
habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo para
receber citação inicial, confessar, reconhecer a procedência do pedido,
transigir, desistir, renunciar ao direito sobre que se funda a ação, receber,
dar quitação e firmar compromisso”. (art. 38 do CPC).
A desistência, porém, não se refere ao direito demandado, mas
apenas ao prosseguimento do processo (daí implicar decisão terminativa); a
renúncia, ao contrário, diz respeito ao próprio direito em que se pauta a
demanda – gera, pois, extinção do processo com julgamento do mérito.
Humberto Theodoro nos ensina que pela desistência, o autor abre mão
do processo, não do direito material que eventualmente possa ter perante o
réu. Daí por que a desistência da ação provoca a extinção do processo sem
julgamento do mérito e não impede que, futuramente, o autor venha outra vez
a propor a mesma ação, uma vez que inexiste, no caso, a eficácia da coisa
julgada.
A desistência da ação é ato unilateral do autor, quando praticado antes
de vencido o prazo de resposta do réu, não depois dessa fase processual.
Na verdade, porém, o que é decisivo é a contestação, pois se o réu
apresentou sua defesa, mesmo antes de vencido o prazo de resposta, já não
mais poderá o autor desistir da ação sem o assentimento do demandado. O
ato passa a ser necessariamente bilateral (CPC, art. 267, §4°).
Pontes de Miranda, comentando o § 4° do art. 267 do CPC de 1973
acrescenta o termo desistência tardia:
“ O art. 267, § 4°, acertadamente, estatui que, decorrido o
prazo para a resposta, que é de quinze dias (art. 297),
com a observância do art. 298, e do parágrafo único,
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concernentes à pluralidade de réus, somente se pode
desistir da ação (ou da reconvenção, ou da oposição) se
a parte contrária (réu, reconvindo, oposto) consente ”
(MIRANDA, 1975, p.442).
Alexandre Freitas Câmara em Lições de Direito Processual Civil, no
seu sistema, conceitua a desistência da ação como ato processual dispositivo
da parte, usando o critério subjetivo de classificação dos atos processuais. Os
atos processuais classificam-se em atos das partes e do órgão judicial. O das
partes em: postulatórios, dispositivos, instrutórios e reais.
Atos dispositivos são declarações de vontade destinadas a dispor da
tutela jurisdicional. Podem ser unilaterais, quando praticados por apenas uma
das partes, como o reconhecimento do pedido, a renúncia à pretensão ou a
desistência da ação.
Jurisprudência sobre o tema:
1. AÇÃO – Desistência – Imprescindibilidade da concordância da
parte adversa – Anulação da sentença homologatória da
desistência que se impõe – Inteligência do art. 267, § 4° do
CPC.
Ementa Oficial: Para homologação de pedido de desistência
formulado pelo autor, é imprescindível a concordância da ré, na
forma do § 4° do art. 267 do CPC. Sendo demonstrada a ausência
de intimação regular da União, deve ser anulada a sentença
homologatória de pedido de desistência formulado pelo autor.
(TRF 1ª. Região, RT 849/402, julho/2006).
1.2 – A Extinção Anômala do Processo
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Para alguns autores a desistência da ação se enquadra como uma
forma de extinção anômala do processo.
O art. 329 do CPC afirma que: “Ocorrendo qualquer das hipóteses
previstas nos arts. 267 e 269, II a V, o juiz declarará extinto o processo”.
Luiz Guilherme Marinoni, analisando a questão, assim diz:
“ Quando impossível ao juiz, em vista de alguma situação
impeditiva, proferir sentença julgando procedente ou
improcedente o pedido, cabe a extinção anômala do
processo ” (MARINONI, 2007, vol 2 p.233).
A Lei 11.232/2005 (arts. 267 e 269) substituiu a expressão
“julgamento” por “resolução”, mas, aqui, isso não traz qualquer repercussão.
Na desistência da ação, o autor desiste de ver seu pedido “apreciado”
pelo juiz, mas não de seu direito material, que poderá ser invocado perante a
própria jurisdição ou mesmo exercido fora dela.
Para o Ministro Luiz Fux, a desistência da ação está inserida no
contexto da “alteração dos elementos de identificação das ações”, que iria de
encontro à regra da manutenção dos elementos identificadores das ações. A
base deste entendimento está no princípio da estabilidade da demanda.
Preceitua o art. 264 do CPC: “Feita a citação, é defeso ao autor
modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu,
mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei.
Parágrafo único – A alteração do pedido ou da causa de pedir em
nenhuma hipótese será permitida após o saneamento do processo”.
Tendo em vista a ratio essendi da vedação à alteração é não desiquilibrar as
partes, nem desvirtuar a atuação jurisdicional, o dispositivo não impede que os
sujeitos manifestem atos de disponibilidade processual, como a renúncia, o
reconhecimento da procedência do pedido, a transação ou a desistência da
ação, porque nesses casos cessam a atividade de defesa e a função
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especulativa do juízo. Acrescenta Luiz Fux, no seu Curso de Direito Processual
Civil:
“ Com exceção da desistência da ação, que é ato
meramente formal, as demais manifestações de vontade
extinguem a própria pretensão material, consolidando
uma decisão de mérito, cujo, conteúdo é ditado pela
vontade das partes, com força de coisa julgada material ”
(FUX, 2005, p.201).
Para Fux a desistência atinge, apenas, a ação processual e, para
manifestá-la, o autor somente precisa do consentimento do réu se este já
estiver oferecido a sua resposta antes do prazo legal ou decorrido este. Caso o
réu se tenha mantido inerte e, portanto, revel, a desistência, porque lhe é
benéfica, dispensa nova convocação do demandado.
Havendo vários réus, sendo possível a desistência em relação a algum
deles ainda não citado, a mesma não se opera imediatamente com relação
aos já convocados, até porque isto poderia gerar uma revelia “de surpresa”.
Por esta razão, o art. 298 do CPC, parágrafo único dispõe que os
litisconsortes passivos devem ser avisados da desistência, para que se inicie,
em relação a eles, o prazo da resposta que, em princípio, somente iniciar-se-ia
com a citação do último dos demandados.
O processo como relação jurídica foi comparado, em sede de doutrina
singular, com a própria vida; na complexidade de sua existência, ele, o
processo, nasce e morre também. O processo durante a sua existência pode
submeter-se a crises que alteram o marco normal da sua vida: no itinerário da
“formação, suspensão e extinção do processo” - Livro I – Do Processo
de Conhecimento – Título VI do CPC (arts. 262 a 269).
A formação do processo corresponde a sua instauração gradual, com
a primeira aparição do autor através da demanda e posterior convocação do
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demandado em respeito aos princípios constitucionais do contraditório, do
devido processo legal e da ampla defesa.
A extinção do processo, em regra, efetiva-se pela exaustão da
função jurisdicional com a resposta do Judiciário ao pedido da parte através da
sentença de mérito. Esta é a que define o litígio, daí, também, denominar-se
sentença definitiva. Porém, há casos que, por força de uma crise, não surge
para o juiz o dever de julgar o pedido, porquanto, obstáculos formais impedem-
no dessa incumbência, como ocorre, por exemplo, quando ausente uma das
condições da ação.
Nessas hipóteses, extingue-se, também, o processo, mas de forma
anômala, sem uma resposta sobre a questão de fundo. Na verdade, o
processo termina, mas a função de julgar o mérito, de definir a situação
litigiosa com o crivo da imutabilidade do decidido, emprestado pela coisa
julgada material, não se verifica. Esta é a razão pelo qual essa sentença
formal, que não aprecia o mérito, recebe o nome de sentença terminativa.
A suspensão do processo ocorre quando há uma paralisação
temporária na marcha dos atos processuais.
Novamente acerca da extinção, sabe-se que o processo tem seu ciclo
vital, cujo ápice ocorre com a extinção pela solução do litígio, cumprindo o juízo
seu ofício jurisdicional.
Ao conferir uma resposta à questão de fundo, o juiz, no exercício da
função jurisdicional, atinge o escopo dessa atividade estatal que é conferir
certeza e estabilidade às relações jurídicas através da palavra oficial do
Judiciário.
No processo de conhecimento, esse desígnio é alcançado pela
definição do litígio através da sentença ou, caso haja recurso, por via do
acórdão.
Destarte, muito embora, a solução normal do processo seja a definição
do litígio, com o julgamento do mérito, alguns fatos de natureza formal
impedem o juízo de alcançar esse desígnio. Em excelente ensino acerca do
assunto, diz Luiz Fux:
23
“ A lei processual, preconizando a Teoria de Liebman,
distingue as hipóteses de extinção do processo com e
sem julgamento do mérito conforme a decisão atinja o
modo de ser da pretensão deduzida em juízo. Não a
alcançando, a extinção será terminativa; atingindo-a na
sua existência, será definitiva ” (FUX, 2005, p.438).
É imperioso, assim, que se assente a natureza da decisão posto
submetida a regimes jurisprudenciais completamente diversos.
Para esse fim de categorização das decisões, importa menos o nomen
júris à essência do que foi decidido. Assim, não se encaixando nas hipóteses
do art. 267 do CPC, a decisão será definitiva.
Nesta linha de raciocínio, extinção anômala do processo, desistir da
ação significa abdicar, momentaneamente, do monopólio da jurisdição acerca
do litígio, exonerando o Judiciário de pronunciar-se sobre a causa.
A desistência equivale à revogação da propositura da ação.
Trata-se de instituto de cunho processual, não atingindo o direito
material objeto da ação. A parte que desiste da ação engendra faculdade
processual, deixando incólume o direito material, tanto descompromete o
Judiciário de se manifestar sobre a pretensão de direito material.
É diversa da figura da “renúncia” ao direito em que se funda a ação,
prevista textualmente como causa de extinção do processo com análise do
mérito. Na renúncia, a abdicação significa despojamento do direito material,
razão pela qual o juiz, em caso de dúvida sobre o alcance da manifestação da
parte, deve insta-la a declinar o seu desígnio de forma clara; se pretende
desisitir ou renunciar...
O art. 267, § 4° é que fixa o termo limite no término do prazo de
defesa.
Considerando-se em razão de ser do dispositivo, é inegável que, sendo
revel, o autor pode desistir sem sua anuência, salvo se funcionar no
processo o curador especial em razão da revelia decorrente da citação
24
ficta, que nesse caso, deve manifestar-se. Nas hipóteses de litisconsórcio,
cumpre distinguir as espécies para verificar se a desistência exige a
manifestação de todos os litisconsortes ou de apenas um deles.
Assim, tratando-se de litisconsórcio necessário, a desistência somente
pode operar-se pela anuência de todos. Diversamente, no litisconsórcio
passivo simples, a desistência da ação exige, apenas, manifestações
individualizadas.
O mesmo princípio, que veda o mutatio libeli após o saneamento
impede, também, que haja desistência da ação após a decisão definitiva do
juiz.
O que as partes podem engendrar é a transação quanto ao objeto
litigioso definido jurisdicionalmente. Mas, em hipótese alguma lhes é lícito
desprezar a sentença, como se nada tivesse acontecido, de sorte a permitir,
após a desistência da ação, que potencialmente outra ação seja reproposta.
1.3 – O Ato Processual Desistência
O Código Processual Civil traz no Título V, do Livro I, o tema: Dos Atos
Processuais, dividindo-os entre os atos da parte (arts. 158 a 161), atos do juiz
(arts. 162 a 165) e dos atos do escrivão ou do chefe de secretaria (arts. 166 a
171).
Humberto Teodoro Júnior no seu Curso de Direito Processual Civil, nos
amplia a visão quanto à desistência ao contemplá-la como ato processual que
é. Acrescenta que consideram-se atos da parte os praticados pelo autor ou
réu, pelos terceiros intervenientes ou pelo Ministério Público, no exercício de
direitos ou poderes processuais, ou para cumprimento de ônus, obrigações ou
deveres decorrentes da relação processual. Citando Couture, classifica os atos
em atos de obtenção e atos dispositivos.
Os atos de obtenção procuram obter do órgão jurisdicional a satisfação
de uma pretensão manifestada nos autos; e os dispositivos têm por fim criar,
25
modificar ou extinguir situações processuais. Os atos de obtenção
compreendem: a) atos de petição; b) atos de afirmação; c) atos de prova.
Quanto aos atos dispositivos, também chamados de causação,
porque nele o ato de vontade da parte tende a produzir justamente o efeito
procurado por sua intenção tal como ocorre, nos atos jurídicos do direito
privado, podem ser subdivididos em: a) atos de submissão; b) atos de
desistência (atos unilaterais) – quando há desistência do processo ou renúncia
ao direito nele postulado, quer do autor, quer do réu; podendo se referir a
questões de direito material (art. 269,V) e de direito processual (art. 267,III); c)
atos de transação.
Para José Rogério Cruz e Tucci, a desistência da ação há de ser
considerada como um ato processual dispositivo da parte. É de se notar que,
ao contrário do que se dá com os atos processuais das partes em geral, a
desistência da ação não produz efeitos desde logo, fazendo-se essencialmente
para que tais efeitos se produzam a homologação da mesma por sentença,
conforme art. 158 parágrafo único do CPC.
Também sendo a desistência da ação manifestada antes do
oferecimento da resposta do demandado, é ato unilateral, devendo ser
homologada sem que se faça a oitiva do demandado. Já na desistência, após
a resposta do réu, faz-se necessário a prática de atos processuais dispositivos
concordantes.
Faz-se necessário, então, o consentimento do réu para que a
desistência possa ser homologada por sentença, extinguindo-se o processo
sem resolução do mérito.
A redação do art. 267, §4° do CPC é absolutamente imprecisa, pois
condiciona a produção de efeitos da desistência à concordância do réu toda
vez que a mesma for manifestada depois de decorrido o prazo da resposta, o
que não se revela adequado.
O § 4° do art. 267 justifica-se pelo fato de que também o réu tem
direito a receber o pronunciamento do mérito. Além disso, evita-se que o autor,
prevendo resultado negativo, naquele feito, desista e, com isso, garanta a
possibilidade de repropor a demanda.
26
A melhor doutrina exige o consentimento do réu. Quer-se, com isto,
dizer o seguinte: decorrido o prazo da resposta e tendo o réu permanecido
revel (havendo, pois, ausência de contestação), poderá o autor desistir
livremente da ação, sem que o consentimento do demandado se faça
necessário. De outro lado, tendo o réu oferecido resposta antes do término do
prazo para a prática do ato, seu consentimento será necessário, ainda que a
desistência tenha sido manifestada antes do termo final daquele.
Por isso, Freitas Câmara assim como Humberto Theodoro entendem
que o momento a partir do qual o consentimento do réu é exigido para que a
desistência surta efeitos é o do oferecimento da contestação, e não o termo
final do prazo para resposta.
Relembre-se, ainda, que a desistência indireta da ação deve ser
evitada. Assim, já oferecida a contestação (e sendo, portanto, exigido seu
consentimento para que o autor possa, eficazmente, desistir da ação), não se
poderá admitir a extinção do processo por abandono unilateral sem que haja a
provocação do demandado, sob pena de ao autor ser permitido obter, por via
oblíqua, o que não lhe permite a lei conseguir por via direta: “Extingue-se o
processo, sem resolução de mérito: quando, por não promover os atos e
diligências que lhe competir, o autor abandonar a causa por mais de 30
(trinta) dias”. (art. 267, III do CPC).
1.4 – O Ato Processual Homologação
O Dicionário da Academia Brasileira de Letras Jurídicas conceitua a
homologação como sendo o ato pelo qual o juiz, sem julgar o conflito de
interesses suscitado, limita-se a dar validade e eficácia à deliberação ou ao
acordo entre as partes, desde que atendidas as prescrições legais.
De acordo com o Vocabulário Jurídico de Plácido e Silva, a
homologação vem do latim que vem do verbo grego omologein, que significa
reconhecer. A autoridade judicial ratifica, confirma ou aprova um outro ato, a
fim de que possa investir-se de força executória ou apresentar-se com validade
27
jurídica, para ter eficácia legal. Cedo se homologa o ato, intervém
simplesmente o magistrado para o efeito de lhe imprimir o caráter público de
que carece, e para ter força de execução de que também necessita.
Maria Helena Diniz, em seu Dicionário Jurídico, conceitua
homologação como sendo a decisão pelo qual o magistrado aprova um acordo
ou ato processual, levado a efeito, para que irradie conseqüências jurídicas.
1.5 – Efeitos da Desistência da Ação
Dispõe o art. 158 e parágrafo único do CPC: “Os atos das partes,
consistentes em declarações unilaterais, ou bilaterais de vontade,
produzem imediatamente a constituição, a modificação ou a extinção de
direitos processuais. A desistência da ação só produzirá efeito depois de
homologada por sentença”.
Isto quer dizer que a regra é que os efeitos do ato processual são
imediatos e não dependem de redução a termo nem de homologação judicial.
A desistência da ação, porém, só produz efeito depois de homologada por
sentença. O mesmo se dá com a conciliação das partes (art. 449) e a
sentença homologatória de conciliação ou de transação (art. 475-N,III) com
redação dada pela Lei n° 11.232/2005, que revogou o art. 584 do CPC.
A desistência, quer como ato unilateral, quer como bilateral, só produz
efeito depois de homologada por sentença. É que a relação processual não
envolve apenas as partes, mas também o juiz, que, por isso, não pode ficar
estranho ao ato extintivo.
Ao tomar conhecimento da pretensão, o juiz pratica, embora numa só
sentença, dois atos jurisdicionais distintos: a homologação da desistência, para
que ela surta os efeitos de direito, e a declaração da conseqüente extinção do
processo, em razão do ato homologado.
A sentença terminativa que encerra o processo sem julgamento do
mérito não faz coisa julgada material, visto que não chegou a apreciar a
substância da controvérsia estabelecida entre as partes em torno da situação
28
jurídica material: “A sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem
força de lei nos limites da lide e das questões decididas”. (art. 468 do
CPC).
O seu efeito é de apenas de coisa julgada formal, isto é, o de impedir
que dentro do mesmo processo volte a parte a postular novo julgamento,
depois de exaurida a possibilidade de impugnação recursal.
Não é defeso à parte, porém, o direito de renovar a propositura da
ação: “Salvo o disposto no art. 267,V, a extinção do processo não obsta a
que o autor intente de novo a ação. A petição inicial, todavia, não será
despachada sem a prova do pagamento ou do depósito das custas e dos
honorários de advogado”. (art. 268 do CPC).
Há, não obstante, três casos previstos no CPC em que a sentença
terminativa, tal como a definitiva (ou de mérito), impede a renovação do
processo: isto se dá quando a extinção tiver sido decretada por
reconhecimento de litispendência, coisa julgada ou perempção.
Nelson Nery acrescenta:
“ Quando o autor desistir da ação, o mérito não
pode ser apreciado, devendo o magistrado proceder à
extinção do processo sem ingressar no exame do mérito.
(...) A desistência da ação nada tem a ver com o direito
material nela discutido, razão pela qual, nada obstante
tenha havido desistência da ação, esta pode ser
reproposta em processo futuro ” (JÚNIOR, 2002, p.595).
A desistência da ação acarreta a extinção do processo sem julgamento
do mérito. Decorrência do princípio da disponibilidade processual, a
desistência consiste na abdicação expressa da posição processual, alcançada
pelo autor, após ajuizamento da ação.
Como já visto, a desistência da ação, não se confunde com a renúncia
ao direito sobre que se funda a ação, pois esta última figura produz a extinção
29
do processo sem resolução do mérito e, portanto, produz coisa julgada
material (art. 269, V do CPC). Já a sentença homologatória de desistência não
impede a repropositura da demanda.
1.6 – Limites à Desistência da Ação
A desistência da ação só pode ser feita até antes da sentença de 1ª.
instância, porque, até aí, ainda a relação jurídica, para a qual foi pedida a
tutela jurisprudencial, não ficou fixada pelo Judiciário, achando-se no âmbito
livre da vontade das partes, notadamente da parte autora da ação.
O atual CPC admite a desistência da ação, enquanto não tenha havido
julgamento do mérito, conforme art. 267, VIII.
No dizer de Francisco Raitani:
“ Depois do julgamento do mérito, se não tiver havido
rejeição do pedido, o processo só se extingue, como
dispõe o art. 267 quando as partes transigirem, quando
houver a prescrição, quando o autor renunciar o direito
sobre que se funda a ação ” (RAITANI, 2000, p.242).
Depois da sentença só pode haver renúncia do direito material por
parte do vencedor.
A desistência da ação não se confunde com a renúncia do direito. A
renúncia refere-se a direitos, a situações estabelecidas ou pelo menos
sustentadas como se fossem tais, implicam abrir mão, o perder por vontade
própria.
A sentença, como ato do Poder Público, fixa a situação jurídica. Por
isso acentuava o eminente processualista José Frederico Marques, que a
desistência do processo, denominada de desistência pelo art. 181 do CPC de
1939, é negócio jurídico processual, que subtrai do juiz o dever de julgar a
pretensão do autor.
30
O efeito da desistência da ação é o de evitar que o processo seja
julgado.
Depois da sentença, já a parte não pode desistir da ação. O Judiciário
já declarou, com efeito de lei, qual o direito. É o que diz o art. 468 do CPC: “A
sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos
limites da lide e das questões decididas”.
Após a sentença, esse ato do Poder Público só pode ser anulado pelos
meios de direito. A lei estipula quais são: 1) Transação, art. 1025 do Novo
Código Civil (NCC); 2) Ação Rescisória, art. 485 do CPC; 3) Prescrição para
o exercício do direito reconhecido pela decisão judiciária, art. 178, § 1°, VIII do
NCC; 4) Renúncia e o Abandono, art. 589, II e III do NCC.
Daí, no silêncio da lei, há que admitir-se que a desistência pode ter
lugar até a sentença definitiva (de mérito) em 1ª instância. Sobre esta questão
acrescenta Raitani:
“ A desistência da ação ou do processo só se dá, pois,
validamente, até antes da sentença de 1ª instância ou
originária. Até aí vigora a vontade das partes. Depois da
sentença vigora a vontade do Poder Judiciário, só se
desfaz pelos meios de direito, entre os quais não se acha
a desistência da ação. É que a ação já terminou ”
(RAITANI, 2000, p.244).
1.7 – A Desistência na Legislação Federal
Segundo Fredie Didier a decisão que homologa a desistência tem,
ainda, um efeito anexo: o juízo que a homologou fica prevento para julgar a
demanda, se eventualmente ela for reproposta: “Distribuir-se-á por
31
dependência as causas de qualquer natureza: II – quando, tendo sido
extinto o processo, sem julgamento de mérito, for reiterado o pedido,
ainda que em litisconsórcio com outros autores ou que sejam
parcialmente alterados os réus da demanda”. (art. 253, II do CPC, com
redação dada pela Lei 11.280/2006).
O art. 3° da Lei Federal n° 9.469/97 determina que os representantes
judiciais da União, suas autarquias e fundações, bem como das empresas
públicas federais, só podem concordar com a desistência da causa se o autor
renunciar ao direito sobre que se funda a demanda. Como não bastasse a
desistência, o autor há de renunciar ao direito, de modo que a decisão fique
acobertada pela “coisa julgada material”. Embora aparentemente violenta,
trata-se de medida legítima, obviamente não aplicável a qualquer hipótese,
como nos seguintes exemplos: a) nas ações cautelares, em que não são
veiculadas pretensões materiais passíveis, pois, de renúncia; b) nas situações
em que o próprio ente público, em sua peça de defesa, havia solicitado a
extinção do processo sem análise do mérito.
A desistência na ação civil pública tem regramento expresso. Quando
a associação autora desiste da causa de forma infundada, autoriza-se que o
outro co-legitimado à propositura da demanda coletiva, inclusive o Ministério
Público, a suceda, assumindo a posição ativa da causa: “Em caso de
desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o
Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa”. (art.
5°, § 3° da Lei 7.347/85).
Não se admite desistência na ADI (ação direta de
inconstitucionalidade) e na ADC (ação declaratória de constitucionalidade):
“Proposta a ação direta, não se admitirá desistência” e “proposta a ação
declaratória, não se admitirá desistência” (arts. 5° e 16 da Lei 9.868/1999,
respectivamente).
Caberá ao autor o pagamento das custas processuais remanescentes
(art. 26 do CPC; art. 14, § 1° da Lei 9.289/96). Se parcial a desistência, a
responsabilidade pelas despesas processuais será proporcional à parte de que
se desistiu (art. 26, § 1° do CPC).
32
Relativamente ao Ministério Público e ao Código de Processo Penal,
inexiste na lei processual civil norma correspondente à inscrita no art. 576 do
Código de Processo Penal, que o proíbe de desistir do recurso interposto: “O
Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto”.
Quanto à ação penal, temos: “O Ministério Público não poderá desistir da
ação penal”. (art. 42 do CPP).
Quanto à oposição à desistência por parte do Ministério Público,
adverte Luiz Fux:
“ A desistência da ação exige, por vezes, a anuência de
outros partícipes da relação processual. Assim é que,
intervindo em favor do incapaz, o Ministério Público pode
opor-se à desistência ” (FUX, 2005, p.448).
Não havendo anuência nos casos em que ela se torna obrigatória, o
juiz deve compor a lide mediante julgamento sem qualquer influência nessa
atitude, a desistência formal manifestada.
1.8 – A Desistência em face dos Direitos Indisponíveis
Há decisões que têm rejeitado a homologação da desistência, sob o
fundamento de que a causa em jogo não permite essa espécie de ato
dispositivo. Recentemente, por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça não
admitiu a homologação de desistência de uma investigação de paternidade
feita pelo representante do menor-autor:
“EMENTA – Civil e Processual. Ação Investigatória de
Paternidade. Desistência da própria menor, por sua tutora. Descabimento.
Direito Indisponível. Apuração da verdade real. Exame DNA positivo.
Conformação do pai investigado.
I – O direito ao reconhecimento da paternidade é indisponível,
pelo que não é possível à tutora do menor desistir da ação já em curso,
33
ao argumento de que a adoção que se propunha ela própria fazer era
mais vantajosa à tutelada, e que, a todo tempo, seria possível à autora
novamente intentar igual pedido, por imprescritível (...)
III – Corretos, pois, a sentença e o acórdão estadual que,
rejeitando o pedido de desistência, julgaram procedente ação
investigatória.
IV – Recurso especial não conhecido.
No voto, o Ministro Relator Aldir Passarinho Júnior pontua:
Ao nosso sentir razão não assiste à autora. É que o presente
recurso versa sobre direito indisponível, não havendo possibilidade de
desistência. Assim se entendido, não há como se cogitar ofensa ao art.
267, VIII do Estatuto Processual Civil (...)
Analisando o instituto da desistência da ação juntamente com o
tema em estudo, podemos entender, num primeiro momento, que sendo o
direito à filiação indisponível, não seria admissível a desistência da ação
investigatória de paternidade ou ação de alimentos em favor do nascituro
por sua representante legal que, no caso é sua genitora (...)
É de se indeferir a homologação de desistência de ação de
investigação de paternidade cumulada com alimentos, por parte do autor,
absolutamente incapaz, representado por sua mãe, uma vez que,
tratando-se de direitos indisponíveis, é a desistência prejudicial aos
superiores interesses do menor, que devem ser preservados, embora
possa, a qualquer tempo, propor nova ação com o mesmo propósito”.
(STJ, 4ª. Turma, RESP 472608-AL – 2002/0136005-7, publicado no
DJ de 09/06/2003).
Em sentido contrário: “Pode haver desistência da ação que verse
sobre direitos indisponíveis, pois a desistência não atinge o direito
material discutido n ação, não impedindo sua repropositura”. (RJTJSP
115/103).
35
Refere-se ao requisitos de admissibilidade em fase preliminar, antes do
juízo de mérito.
Segundo Barbosa Moreira, em seu livro “O Novo Processo Civil
Brasileiro”, podem ser: 1) Intrínsecos – relativos à existência do direito: a)
cabimento; b) legitimação para recorrer; c) interesse para recorrer; 4)
inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer. 2)
Extrínsecos – relativos ao exercício do direito de recorrer: a) tempestividade;
b) regularidade formal; c) preparo.
Sérgio Bermudes, comentando o CPC, entende os requisitos acima
classificado-os em: 1) Subjetivos – atinentes à pessoa que interpõe o recurso;
2) Objetivos – recursos considerados em si próprios.
O Ministro Luiz Fux, na concepção de extinção anômala do processo,
pondera que neste juízo de admissibilidade dos recursos há de ser
considerado sobre a inexistência de fato impeditivo do direito de recorrer.
Fux ensina que requisito de admissibilidade de caráter negativo
do direito de recorrer é a inexistência de fatos impeditivos ao exercício da
recorribilidade, acrescentando:
“ A doutrina do tema aponta a desistência, a renúncia, a
aceitação da decisão e a transação acerca do objeto
litigioso como fatos impeditivos do direito de recorrer,
decorrentes da preclusão,lógica que esse negócios
processuais encerram em confronto com o ônus da
impugnação ” (FUX, 2005, p.947).
A desistência é a revogação da manifestação de recorrer já
engendrada. A renúncia antecede a manifestação de recorrer e a aceitação é o
conformismo com o conteúdo da decisão, revelado por atos incompatíveis e
sem reservas (arts. 501, 502 e 503 do CPC).
36
Essas manifestações de disponibilidade, quanto ao direito de recorrer,
independem da aceitação da outra parte, posto que somente recorre quem
sucumbe, o que significa dizer que esses atos consolidam antecipadamente a
vitória da parte contrária. Diferentemente, na ação, a lei exige o consentimento
do réu (art. 267, § 4° do CPC), uma vez que, enquanto pende o processo,
perdura a incerteza e não se sabe quem tem razão.
A presença de litisconsortes não torna exigível a necessidade da
anuência quanto à desistência dos demais, uma vez que, sendo simples o
litisconsórcio, os recursos dos litisconsortes são independentes; e sendo
unitário, a desistência de um não se estende aos outros: “O recurso
interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, alvo se distintos
ou opostos os seus interesses” (art. 509 do CPC).
Destarte, admite-se a desistência a qualquer tempo antes do
julgamento final do recurso, mesmo já iniciado e proferido o voto do relator,
sem a conclusão do julgado.
Deveras, em geral, a desistência do recurso manifesta-se por petição
escrita, conforme o caso, ao órgão perante o qual se o interpôs ou ao relator
do Tribunal, mas nada impede que tal se faça, oralmente, na própria sessão de
julgamento.
Jurisprudências acerca do assunto:
1. RESP 63.702 (95/0017575-4) – SP
EMENTA – Processo Civil. Julgamento iniciado e adiado por
pedido de vista. Desistência manifestada. Homologação requerida pela
Recorrente. Deferimento.
ACÓRDÃO – Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam
os Ministros da 4ª. Turma do STJ (...) homologar a desistência pela parte
recorrente. (Publicado no DJ em 26/08/1996).
2. RESP 21.323-3 – GO (1992/0009404-0)
EMENTA – Processo Civil – Recurso – Desistência Oral – Sessão
de Julgamento.
37
I – Em geral a desistência do recurso manifesta-se por petição
escrita, conforme o caso, ao órgão perante o qual se o interpôs ou ao
relator do Tribunal, mas nada impede que tal se faça, oralmente, na
própria sessão de julgamento, ainda que iniciada a votação. (publicado
no DJ em 24/08/1992).
3. EDRESP 98.473-RS (1996/0037947-5)
EMENTA – Embargos de Declaração. Transação. Desistência do
recurso. Comunicação, depois do julgamento do recurso especial, o fato
anterior da transação acordada entre as partes, com desistência do
recurso, são acolhidos os embargos de declaração, com efeito
modificativo, para desfazer aquele julgamento e homologar a desistência.
Embargos acolhidos. (publicado no DJ em 14/04/1997).
4. RESP 30.678-8 – RJ (1992/0013747-4)
EMENTA – Não é dado ao Tribunal determinar, de ofício, que volte
a figurar como ré quem do processo já foi excluída em virtude de
desistência. (publicado no DJ em 01/03/1993).
5. RESP 89.474 (96.012559-7) – SP
EMENTA – Processual Civil e Tributário. Desistência. Ação. ICM.
Cana-de-açúcar. Base de Cálculo. Recurso conhecido e provido.
Estando o processo em fase recursal, o autor-derrotado não pode
desistir da ação, ainda mais havendo discordância do réu-vencedor. Só o
recurso pode ser alvo da desistência unilateral e incondicionada.
(publicado no DJ em 24/05/1999).
6. AÇÃO – Desistência – Inocorrência – Necessidade de
manifestação de vontade expressa nesse sentido – Situação que não
pode ser presumida – Hipótese de abandono da causa configurado –
38
Obrigatoriedade de ser a parte intimada pessoalmente antes da extinção
do feito – Inteligência do art. 267, § 1, do CPC.
EMENTA – A desistência da ação não pode ser presumida,
devendo haver manifestação de vontade expressa da parte nesse sentido
(...), nos termos do art. 267, § 1° do CPC. (RT 807/417).
A lei, diferentemente do que ocorre com a ação em 1° grau, não exige
expressamente a homologação da desistência do recurso. Não obstante, nos
Tribunais, a providência vem prevista e delegada aos relatores dos recursos,
como, por exemplo, RISTF, art. 21,VIII: “São atribuições do Relator: VIII –
homologar as desistências, ainda que o feito se ache em mesa para
julgamento”.
No RISTJ, art. 34-IX: “São atribuições do Relator: IX – homologar
as desistências, ainda que o feito se ache em pauta ou em mesa para
julgamento”.
No Regimento do TRF2a. Região: “Ao Relator incumbe: VII –
homologar a desistência do feito, ainda que incluído na pauta de
julgamento”.
E no RITST, art. 75, II: “Ao Tribunal Pleno, à Seção Administrativa,
às Seções Especializadas e às Turmas cabe, ainda, nos processos de sua
competência: II – homologar os pedidos de desistência dos recursos,
decidir sobre pedido de desistência de ação quanto aos processos
incluídos em pauta para julgamento e homologar os acordos em
processos de competência originária do Tribunal”.
O nosso entendimento é que não cabe homologação em face da
desistência do recurso. O que ocorre é uma questão de prática processual
tendo como base a desistência da ação. Os regimentos internos não são
hierarquicamente superiores à legislação Federal, no caso o Código de
Processo Civil.
Homologa-se a desistência da ação para que produza sentença sem
julgamento do mérito. No caso do recurso, já há sentença preexistente que não
carece de ser homologada. É preclusão lógica.
39
1.2 – Impedimentos Recursais
São fatos cuja presença tornam vedada a interposição do recurso. Na
hipótese de se interpor recurso em processo onde se tenha dado algum dos
impedimentos, deverá ser proferido “juízo negativo de admissibilidade do
recurso”, que não poderá ter seu mérito apreciado pelo órgão ad quem.
A desistência do recurso já interposto é impedimento recursal. Difere
da renúncia, essencialmente, por ser posterior à interposição do recurso,
enquanto a renúncia se dá, necessariamente, antes do mesmo ser julgado.
Jurisprudência sobre o tema:
RECURSO – Ação – Desistência – Autora que desistiu da demanda
e foi condenada aos ônus da sucumbência – Impossibilidade de
conhecimento do apelo diante da existência de fato impeditivo do direito
de recorrer.
EMENTA – A desistência de ação figura como fato impeditivo do
direito de recorrer. Assim, em virtude da ausência de pressuposto
recursal, não deve ser conhecido o recurso de inconformada autora que
desistiu da ação e foi condenada ao pagamento dos honorários de
sucumbência. (RT 796/435).
1.3 – A Desistência do Recurso
De acordo com o Vocabulário Prático de Direito, de Jônatas
Milhomens, a desistência de recurso é o abandono ou a renúncia ao recurso
interposto, conseqüente ou derivado do próprio “direito de recorrer”. A
deserção do recurso põe em evidencia uma desistência tácita, pois que a falta
de preparo pode ser modo de renunciá-lo, salvo se, em tempo oportuno, sendo
caso, vem o recorrente justificar o abandono e mostrar justo impedimento.
40
Na terminologia jurídica, a renúncia em certos casos, aspectos e
figurações é denominada especialmente: a renúncia da ação intentada, pela
qual se põe termo à demanda, é desistência.
Não se renuncia ao que não se tem ou ao que não se exerce. Por
exemplo, não se pode renunciar da apelação antes que se tenha proferido
sentença. É que, não havendo ainda decisão, nada há a renunciar.
Maria Helena Diniz, em seu Dicionário Jurídico, conceitua a desistência
do recurso como sendo um ato unilateral do recorrente de manifestar sua
vontade ao órgão judicante de que não seja julgado o recurso por ele
interposto, extinguindo-se o procedimento recursal com a homologação
judicial.
Preceitua o art. 501 do CPC: “O recorrente poderá, a qualquer
tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do
recurso”. De acordo com Fredie Didier, o recurso é uma demanda e, nessa
qualidade, pode ser revogada pelo recorrente. A revogação do recurso chama-
se “desistência”. Nesse sentido, segue o pensamento de José Carlos Barbosa
Moreira, que equipara a desistência do recurso a um ato de revogação. Para
Barbosa Moreira chama-se desistência do recurso ao ato pelo qual o
recorrente manifesta ao órgão judicial a vontade de que não seja julgado, e,
portanto, não continue a ser processado, o recurso que interpusera. Vale pela
revogação da interposição.
Para Pontes de Miranda, a desistência do recurso é a “declaração de
vontade” pela qual o recorrente quer que o procedimento do recurso não
continue, porque se retira o que manifestara quando exercera a pretensão
recursal. A desistência do recurso é unilateral e independe de concordância ou
aceitação de outra parte ou de litisconsorte.
A razão está em que ela não entende com a relação jurídica
processual, mas apenas com a extensão dessa ao juízo do recurso. O Código
de 1973 equiparou tal desistência ao que ocorre antes de decorrido o prazo
para a resposta, quando o autor desiste (art. 267, § 4°): já existe relação
jurídica processual, a desistência faz cessar tal relação, e, no entanto o Código
permite a desistência unilateral.
41
Ainda acrescenta o renomado mestre que há a retirada da “vox”. Com
a desistência cessa o recurso e, em consequência, nenhum julgamento
haverá.
Avaliando a figura da deserção, em face da desistência da ação, diz
Pontes de Miranda:
“ Se o recorrente deixa de preparar, no prazo legal, o
recurso, dele não desistiu: dele desertou. O caso é de
deserção ” (MIRANDA, 1975, p.102).
Este autor clássico do direito brasileiro, comentando acerca da
desistência do recurso e da deserção, diz:
“ A deserção é espécie de desistência que não admite
prova em contrário, posto que possa ser elidida pela regra
jurídica do art. 507;mas isso nos obriga a construí-la
como efeito de prazo preclusivo, em que o quod
prelumque fit atua para concepção da regra ” (MIRANDA,
1975, p.101 e 102).
A desistência distingue-se da figura deserção, que consiste no fato de
tornar-se inadmissível o recurso pela omissão do recorrente em proceder ao
respectivo preparo no prazo devido; como preceitua Barbosa Moreira, não
seria próprio falar aqui em “desistência tácita”:
“ A deserção é pura conseqüência objetiva da falta de
preparo oportuno, prescindindo de qualquer indagação
sobre a vontade do recorrente, que tanto pode haver-se
omitido intencionalmente como por mera negligência ou
descuido ” (MOREIRA, 2005, p.332).
42
A desistência do recurso pode ser parcial ou total e, pode ocorrer até o
início do julgamento (até a prolação do voto).
“Em sentido diverso, aceitando homologar a desistência
ao fundamento de que é possível desistir do recurso até
que se termine o julgamento, decisão na Questão de
Ordem no REsp 556.685-PR, rel. Min. César Asfor Rocha,
j. em 11/02/2004”.
O recorrente pode desistir por escrito ou em sustentação oral. Inclusive
come bem esclarece Barbosa Moreira:
“ Pode-se, entretanto, desistir oralmente, na própria
sessão de julgamento (antes de iniciada a votação!): a lei
não impõe forma especial (art. 154do CPC) ” (MOREIRA,
2005, p.332).
Já para Pontes de Miranda, sobre o tempo do cabimento da
desistência, assevera:
“ É princípio assente, em direito processual civil, que, se
já foi proferido o julgamento, ou se, começada a tomada
dos votos, algum voto já foi proferido, não mais se pode
desistir (...) depois de proferido o julgamento, seria
absurda qualquer desistência; a fortiori, depois da
publicação ” (MIRANDA, 1975, p.100).
43
Não comporta condição nem termo. Trata-se de ato dispositivo que
independe de consentimento da parte adversária (CPC, art. 501) e de
homologação judicial para a produção de efeitos. E, isso porque os atos
praticados pelas partes produzem efeitos imediatos (CPC, art. 158), somente
necessitando de homologação para produzir efeitos a desistência da ação
(CPC, art. 158, parágrafo único), e não a desistência do recurso. Esta, como
vimos acima, independe de homologação.
“ A desnecessidade da homologação judicial não
significa exclusão de toda e qualquer atuação do juiz (ou
do tribunal). É óbvio que este há de conhecer do ato e
exercer sobre ele o normal controle sobre os atos
processuais em geral (...) aqui, toda a eficácia remonta à
desistência, cabendo tão só ao juiz ou ao tribunal apurar
se a manifestação de vontade foi regular e – através de
pronunciamento meramente declaratório – certificar os
efeitos já operados”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa.
Comentários ao Código de Processo Civil. 11 ed, p.337).
A desistência pressupõe recurso já interposto; se o recurso ainda não
foi interposto, e o interessado manifesta vontade de não interpô-lo, o caso é de
renúncia.
O diploma de 1973, como o anterior, dá a desistência do recurso
tratamento diverso do adotado para a desistência da ação, que, depois do
prazo para a resposta, se condiciona ao consentimento do réu (art. 264, § 4°).
Justifica-se tal diversidade: no procedimento de primeiro grau, o réu pode ter
interesse próprio na emissão da sentença de mérito, preferindo ver logo
julgada a lide, para furtar-se aos incômodos que decorreriam de eventuais
reproposituras da demanda, e por fim ao estado de incerteza conseqüente à
pendência do processo, sem julgamento do mérito. Aqui, porém, já existe uma
decisão, que a desistência do recurso normalmente fará prevalecer em
44
definitivo, sem que disso, em princípio, advenha qualquer prejuízo à outra
parte.
A desistência é conduta determinante (determina resultado
desfavorável a quem a pratica) e, como tal, somente produz efeitos em
relação ao recorrente. Em caso de litisconsórcio unitário, a desistência do
recurso somente é eficaz se todos os liticonsortes desistirem.
A desistência do recurso pode resultar de transação feita entre o
recorrente ou os recorrentes e o recorrido ou os recorridos. Sendo assim, há
efeito processual do negócio jurídico de direito material.
A unilateralidade do negócio jurídico da desistência, semelhante com o
que se observa na renúncia e na denúncia, faz independente de aceitação ou
anuência do recorrido o ato jurídico do desistente. Para que haja exigência, é
preciso que exista regra jurídica especial, tal como ocorre com a desistência da
ação.
Novamente, analisando o instituto da desistência, o professor Pontes
de Miranda, explanando sobre a desistência parcial e a promessa de desistir
pontua que não há desistência tácita do recurso e que esta pode ser parcial. É
processualmente válida a promessa de desistir do recurso. A extensão da
relação jurídico processual no grau de recurso: ao invés da relação terminar,
estende-se. Cada recurso é extensão.
Tendo havido o ato processual do recurso, não cabe perguntar-se se a
parte ou o terceiro quis realmente recorrer. É princípio fundamental de direito
processual que os atos processuais da parte, ou do juiz têm existência, valor e
eficácia, sem se levar em conta a “vontade” de quem os praticou.
Desde que se “encheu” o que a lei reputou indispensável à existência,
validade ou eficácia, o ato processual existe, vale e é eficaz,
independentemente do que se haja querido. O que importa é a declaração
configurada pelo ato. Por isso mesmo, a própria renúncia extrajudicial ou a
desistência extrajudicial do recurso é inoperante: prova, talvez plenamente, a
vontade de renunciar ou de desistir, porém não tem existência processual, tal
como a transação e a desistência da ação, não homologadas.
45
O procedimento recursal extingue-se em razão da desistência. Não se
trata de extinção por inadmissibilidade, mas, sim, pela revogação do recurso; a
desistência não torna inadmissível o recurso: torna-o inexistente. A desistência
não extingue o procedimento recursal se houver outro recurso pendente de
análise; o procedimento deve prosseguir, agora com objeto litigioso menor.
Também não haverá extinção do processo após a desistência do recurso,
como acontece nos casos de desistência do agravo de instrumento, por
exemplo.
A desistência impede uma nova interposição do recurso de que se
desistiu, mesmo se ainda dentro do prazo. Esse recurso, uma vez renovado,
será considerado inadmissível, pois a desistência é fato impeditivo que, uma
vez verificado, implica a inadmissibilidade do procedimento recursal. Verifica-
se, então, que a desitência não extingue o procedimento recursal por
inadmissibilidade, mas uma vez interposto novamente o recurso revogado,
esse “novo” procedimento recursal, e não o primeiro, será havido por
inadmissível.
O poder de desistir do recurso é especial e deve constar
expressamente na procuração outorgada ao advogado (art. 38 do CPC). Se a
desistência implicar a extinção do processo, com decisão de mérito
desfavorável ao recorrente (desistência da apelação contra sentença de
mérito, por exemplo), além do poder de desistir ao advogado deve ter sido
outorgado, também, o poder de disposição do direito material discutido
(transigir), sem o qual a desistência, nesse caso, será ineficaz em relação ao
suposto representado.
As desistências da ação e do recurso não se confundem. A desistência
do processo (da ação) extingue-o sem julgamento do mérito (art. 267, VIII,
CPC); a desistência do recurso pode implicar extinção do processo com
julgamento do mérito ou sem julgamento do mérito, a depender do conteúdo
da decisão recorrida, como também não pode implicar a extinção do processo.
A desistência do processo precisa ser homologada pelo magistrado (art. 158,
parág. único, CPC), o que não acontece na desistência do recurso. A
desistência do processo depende do consentimento do réu, se já houve
46
resposta (art. 267, § 4° do CPC); na desistência do recurso, o consentimento é
dispensado (art. 501 do CPC).
Tecnicamente, por fim, estão incorretas as expressões “pedir
desistência” e “pedido de desistência”. Não se pede a desistência; desiste-se.
Jurisprudência sobre o assunto:
RECURSO – Desistência – Admissibilidade – Desnecessidade de
anuência da parte contrária – Inteligência do art. 501 do CPC.
EMENTA – O agravante pode desistir de recurso por ele interposto
a qualquer tempo, sem necessidade de anuência da parte contrária,
segundo o art. 501 do CPC. (STF-RT 832/172).
1.4 – A Homologação do Recurso
A tradição de boa parte dos tribunais brasileiros, quanto à matéria,
pode ser resumida na decisão abaixo:
“Assim, em razão do requerimento da agravante, à luz do art. 501
do CPC, homologo a desistência deste recurso de AgIn 50178-4/180
(200601084882), a fim de que surta seus efeitos jurídicos e legais”. (RT
852/299).
Barbosa Moreira, novamente, ensina que a desistência parcial,
validamente manifestada, restringe o objeto do recurso, preexcluindo a
cognição do órgão ad quem no tocante à(s) parte(s) que desistiu; a desistência
total produz a extinção do procedimento recursal, independentemente de termo
ou quaisquer outras formalidades. Ao contrário do diploma de 1939, que
continha exigência expressa a respeito no art. 16, onde se falava, em termos
genéricos, de “desistências”, o Código vigente dá a entender que a
desistência do recurso não precisa sequer ser homologada. Seguindo esta
linha de entendimento, ou seja, de acordo estão José Frederico Marques,
47
Amaral Santos, Pontes de Miranda, Sérgio Bermudes, Humberto Theodoro
Júnior, Nélson Nery Júnior, Pinto Ferreira.
Com efeito, o art. 158 caput e parágrafo único do CPC, concluem que
a única exceção à regra é somente para a desistência da ação. O órgão
judicial, tomando conhecimento da desistência do recurso e verificando-lhe a
regularidade, simplesmente declarará extinto o procedimento recursal,
podendo acontecer, no entanto, que o feito haja de prosseguir em razão da
existência de outro recurso contra a mesma decisão, ou por ser interlocutória
aquela de que se tinha recorrido.
A desnecessidade da homologação não significa exclusão de toda e
qualquer atuação do juiz (ou tribunal). É óbvio que este há de conhecer do ato
e exercer sobre ele o normal controle sobre os atos processuais em geral.
Complementa, criteriosamente, Barbosa Moreira:
“ A diferença em relação às hipóteses de ato
dependente de homologação reside em que, nestas, o
pronunciamento judicial tem natureza constitutiva,
acrescenta algo de novo, e é ele que desencadeia a
produção dos efeitos, ao passo que, aqui, toda a eficácia
remonta à desistência, cabendo tão só ao juiz ou ao
tribunal apurar se a manifestação de vontade foi regular
e, através de pronunciamento meramente declaratório,
certificar os efeitos já operados ” (MOREIRA, 2005,
p.335).
Acerca do efeito da desistência sobre a decisão recorrida, o Código de
1973 silencia sobre o ponto. De acordo com Barbosa Moreira, deve-se
entender, a princípio, que com a desistência do recurso, validamente
manifestada, passa em julgado a decisão recorrida, desde que o único
obstáculo erguido ao trânsito em julgado seja a interposição de recurso pelo
desistente.
48
1.5 – Efeitos da Desistência do Recurso
Se a causa está pendente de recurso interposto pelo autor, pode este
desistir do recurso, mas não pode desistir da ação. Com a desistência do
recurso opera-se o trânsito em julgado da decisão recorrida: com a desistência
da ação far-se-ia cair a decisão de mérito, “ e não é admissível que o autor,
mesmo com a aquiescência do réu, inutilize uma verdadeira sentença
proferida, não sobre a relação processual, mas sobre a relação substancial,
uma sentença que tem o alcance de pôr termo ao litígio.
José Carlos Barbosa Moreira, comparando os efeitos da desistência do
recurso com outras figuras, leciona:
“ Os efeitos também são diferentes: a renúncia, a
aquiescência e a deserção fazem inadmissível o recurso;
a desistência torna-o inexistente, sem que caiba indagar
se ele era ou não admissível ” (MOREIRA, 2005, p.332).
Pontes de Miranda sentencia que a declaração de vontade, que é a
desistência, integrada pelo ato judicial declarativo, tem a eficácia constitutiva
negativa para destruir a extensão de relação jurídico processual.
O negócio jurídico unilateral da desistência da ação julgada por
sentença extingue-a (arts. 267, VII, e 158, parágrafo único); não se exige o
mesmo à desistência do recurso. Não há, a respeito desta, o que se estatui a
propósito da desistência da ação, que só produzirá efeito depois de
homologada por sentença, o que permite a apelação, art. 513 do CPC: “Da
sentença caberá apelação (arts. 267 e 269)”. Se o juízo não atribui eficácia
extintiva à desistência do recurso, de tal ato judicial cabe agravo (art. 522 do
CPC).
Na apreciação do ato de desistência do recurso, não se precisa de
mais do que o ter-se por extinto o procedimento recursal.
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Se nenhum outro recurso foi interposto, que obste ao trânsito em
julgado, a desistência, depois do prazo para interposição de recurso (pode ser
outro), faz transitar em julgado a decisão que fora recorrida. Se parcial a
desistência, somente quanto à parte do recurso interposto, de que desistiu, há
a eficácia do trânsito em julgado. O restante tem de ser julgado.
1.6 – Renúncia ao Recurso
De acordo com o Dicionário Jurídico da Academia Brasileira de Letras
Jurídicas, renúncia vem do latim renuntiatio, é o ato de vontade,
personalíssimo e inquestionável, de desistir, alguém, de alguma coisa ou de
algum direito.
De acordo com José Carlos Barbosa Moreira, a renúncia ao direito de
recorrer é o ato pelo qual uma pessoa manifesta a vontade de não interpor o
recurso de que poderia valer-se contra determinada decisão. Independe da
aceitação da outra parte (art. 502 CPC). Não se admite renúncia a termo ou
sob condição. A renúncia é sempre anterior à interposição do recurso, mas não
se admite a renúncia antes do momento em que o direito de recorrer seria
exercitável – não se admite renúncia anterior à prolação da decisão, que
poderia ser impugnada.
Se, após a renúncia, o recurso for interposto, será considerado
inadmissível, pois a renúncia é fato extintivo do direito de recorrer.
Como requisitos da renúncia, temos que só se pode renunciar
validamente ao direito de recorrer a partir do momento em que ele já seria
exercitável no caso concreto: assim como não se desiste do recurso ainda não
interposto, tampouco se renuncia a recurso ainda não interponível. Renunciar
ao direito de recorrer, antes de proferida a decisão, é renunciar a um direito
que ainda não se tem e, a rigor, nem sequer se sabe se nascerá – o que
depende do sentido em que venha a pronunciar-se o órgão judicial. Não há
que se admitir que se renuncie a um (futuro) direito não apenas incerto, senão
também indeterminado no conteúdo. Ora, é imprevisível o teor da decisão que
50
o juiz proferirá. A possibilidade de renunciar validamente surge apenas no
instante da possibilidade de interpor-se o recurso.O termo final é a própria
interposição (depois da qual só cabe falar de desistência, não de renúncia), ou
a ocorrência de qualquer fato que já torne inadmissível o recurso.
Não exige a lei forma especial para a renúncia. Todavia, dadas as
características do ato, entende-se que deve constar de petição escrita, dirigida
ao órgão perante o qual pende o feito. Não há necessidade da lavratura de
termo, nem de homologação judicial (art. 158).
Como a desistência do recurso, a renúncia ao direito de recorrer
tampouco admite condição ou termo. O texto reza expressamente que ela
“independente da aceitação da outra parte”.
Pontes de Miranda, dissertando sobre o tema, explana que o CPC de
1973 no art 502, permitiu a renúncia ao direito de recorrer, não só à pretensão:
“A renúncia ao direito de recorrer independe da aceitação da outra parte”.
Daí, se tira que há a renunciabilidade do direito ao recurso. Não se trata de
renúncia a futuro ou eventual direito de recorrer, mas sim de direito que já
existe. Não se poderia admitir, por exemplo, que antes ou mesmo depois de
iniciada a ação, mas sem que ainda se houvesse proferido decisão ou
sentença recorrível, se permitisse a renúncia. O direito ao recurso ainda não
nasceu. Só se renuncia ao direito ao recurso depois de conhecida a decisão ou
a sentença de que a parte ou interessado, com legitimação a recorrer, pode
recorrer. A lei não falou de renúncia a recurso, a recorrer, mas apenas de
renúncia ao direito de recorrer, que é o direito ao recurso.
A regra jurídica atinge qualquer direito a recorrer, seja na primeira, ou
na única instância, seja em qualquer instância superior. Trata-se de declaração
unilateral de vontade, que pode ser escrita, ou oral, ou tácita, mas tem de ser
clara e categórica. Comparando a desistência com a renúncia, diz Ponte de
Miranda, comentando o CPC de 1973:
“ Desiste-se do recurso que se interpusera. Renuncia-se
ao recurso que ainda se pode interpor. A previedade da
renúncia é que a caracteriza. Ali, quem desiste extingue,
51
com tal atitude, o direito que exerceu. Aqui, quem
renuncia pré-corta o direito ” (MIRANDA, 1975, p.109).
Com a renúncia ao direito de recorrer, inconfundível com a desistência,
há declaração unilateral de vontade, razão por que independe de aceitação da
outra parte. Com ela, nem se renunciou à ação de direito material, nem à
”ação” de direito processual. O direito a renunciar somente pode advir de já ser
recorrível o julgado. Não se renuncia ao que ainda não existe. Com a
publicação do julgado começa a recorribilidade; portanto, o direito ao recurso e
a renunciabilidade. Não há a antecipação da renúncia, posto que se achava no
Anteprojeto do CPC de 1973.
Renunciado o direito ao recurso, o renunciante não mais pode recorrer,
posto que, tratando-se de litisconsórcio unitário, o recurso por outro
litisconsorte lhe aproveita.
A renúncia não depende dos litisconsortes, posto que, se unitário o
litisconsórcio, não tenha a eficácia que lhe correspondera se o litisconsórcio
não fosse unitário. Para que houvesse a coisa julgada, seria necessário que
todos os litisconsortes unitários houvessem renunciado.
A parte pode aceitar expressa ou tacitamente a resolução judicial; de
modo que a sua aquiescência torna irrecorrível, por ela, a resolução judicial.
Trata-se de declaração de vontade, unilateral; e não vale, se ainda não há
resolução judicial proferida. Desde que o exercício da pretensão a recorrer e o
ato da parte são incompatíveis, houve, ou pode ter havido, no plano do direito
material, renúncia. Na dúvida, não há renúncia. Portanto: não há renúncia a)
por fatos equívocos ou ambíguos; b) se houve protesto ou reserva, pois aí não
vale a regra Protestatio facto contraria nihil operatur.
Depois da resolução judicial, mas antes da apelação ou de outro
recurso, o direito brasileiro (art. 502) admite a renúncia, ainda que tácita. Não
se confunda renúncia tácita com deixar passar o prazo (preclusão). A renúncia
tácita, de fundo canonístico, atendia a sugestões do sistema canônico de
apelabilidade das sentenças interlocutórias em geral. As Ordenações Filipinas,
52
Livro I, Título 24, § 20, eram invocadas para as desistências serem por termo
nos autos, - o que hoje também se há de entender. Nas Ordenações Filipinas,
Livro III, Título 79, § 2°, está dito:
“ Nem será recebido apelar o que por alguma maneira
consentiu na sentença dada contra ele; porque se fosse
presente ao tempo, que a sentença contra ele fosse
publicada, não apelando dela, e fazendo algum auto, por
que mostrasse consentir nela, não será jamais recebido a
apelar dela assim como se pedisse tempo para pagar o
em que era condenado, em tal caso, ainda que houvesse
apelado da sentença, por tal auto mostrara consentir nela,
e renunciar à apelação, em tanto que já a não poderá em
algum tempo ” (MIRANDA, 1975, p.113).
A aceitação expressa ou tácita, que é a causa da renúncia tácita ao
recurso, tem seus pressupostos: ser posterior à sentença.
Não se confunde a renúncia com a aceitação ou aquiescência à
decisão, embora ambas importem inadmissibilidade de recurso eventualmente
interposto. A “aceitação” é o ato por que alguém manifesta a vontade de
conformar-se com a decisão proferida. Pode ser escrito ou tácita.
Admite-se aceitação parcial ou total. A aquiescência pode ocorrer
antes ou depois do recurso interposto. A aceitação e a renúncia implicam
“preclusão lógica” do direito de recorrer.
53
CONCLUSÃO
A desistência da ação é tema complexo. Seu entendimento mais
profundo requer mais que uma análise do CPC. A Doutrina é farta no tema “Do
Processo de Conhecimento”, porém excassa no tema “Extinção do Processo
por Desistência”.
A própria cultura popular diz que o brasileiro não desiste nunca. Daí a
dificuldade natural em pensar em desistir...renunciar...como se fosse um
derrotado.
O processo é como a vida, tendo início, meio e fim. O estudo da morte
e de suas causas, pela medicina e demais ciências, muito contribui para a
preservação e prolongamento da vida. Com a desistência do processo ocorre o
mesmo...
O princípio que norteia a desistência é o da disponibilidade processual.
A desistência da ação é uma forma de extinção anômala do processo,
encerrando-o sem julgamento (resolução) do mérito. Seu principal efeito é
que, homologada por sentença, produz coisa julgada formal. Por isso, é
obrigatória a homologação da desistência da ação para que produza seus
efeitos. Tema pacífico neste trabalho, na Legislação, na Doutrina e na
Jurisprudência.
É obrigatória a homologação da desistência do recurso? Não.
Primeiro, porque em grau de recurso, o consentimento do réu é
dispensado, consequentemente não há que se falar em homologação pelo juiz
em face da vontade das partes.
Segundo, já há sentença de mérito. Desistindo-se do recurso, forma-se
coisa julgada material e o CPC não exige, expressamente, a homologação
como pré-requisito de eficácia do recurso desistido.
54
Terceiro, enquanto a homologação da desistência da ação implica na
extinção do processo (coisa julgada formal), a desistência do recurso extingue
o procedimento recursal, não extingue o processo, fazendo coisa julgada
material.
No Processo de Conhecimento, o juiz julga procedente ou
improcedente o pedido. Na sentença homologatória da desistência da ação,
porém, isto é impossível. Na desistência do recurso há sentença preexistente
que julgou o pedido procedente ou improcedente (dái, a necessidade de
recurso). Não há o que se homologar, visto estar julgado o pedido.
Os Tribunais devem, por fim, revogar os textos de seus regimentos
internos quanto à homologação da desistência do recurso. Não cabe , em sede
recursal, homologação da desistência.
55
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2 – JÚNIOR, Nélson Nery. Código de Processo Civil Comentado. 6ª. edição.
São Paulo:RT, 2002.
3 – MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Ségio Cruz. Curso de Processo
Civil. 6ª edição. São Paulo: RT, 2007.
4 – MIRANDA, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 12ª
edição. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
5 – MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo
Civil. 12ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
6 – BRAITANI, Francisco. Prática de Processo Civil. 22ª edição. São Paulo:
Saraiva, 2000.
58
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A DESISTÊNCIA DA AÇÃO 15
1.1 - A Extinção do Processo 15
1.2 – A Extinção Anômala do Processo 20
1.3 – O Ato Processual Desistência 25
1.4 – O Ato Processual Homologação 27
1.5 – Efeitos da Desistência da Ação 28
1.6 - Limites à Desistência da Ação 30
1.7 - A Desistência na Legislação Federal 32
1.8 – A Desistência em face dos Direitos Indisponíveis 33
CAPÍTULO II
A DESISTÊNCIA DO RECURSO 36
1.1 – Juízo de Admissibilidade 36
1.2 – Impedimentos Recursais 40
1.3 – A Desistência do Recurso 41
1.4 – A Homologação do Recurso 48
1.5 – Efeitos da Desistência do Recurso 50
1.6 – Renúncia ao Recurso 50
CONCLUSÃO 55
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 58