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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
COISA JULGADA
Por: Adilson Muniz Moreno
Orientador
Prof. Dr. Jean Alves Almeida
Rio de Janeiro
2008
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
COISA JULGADA
Apresentação de monografia à
Universidade Candido Mendes como
requisito para a conclusão do Curso de
Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito
Processual Civil.
Por: Adilson Muniz Moreno
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus mestres que no
ínterim deste curso nos brindaram com
tão vasto conhecimento, ministrando
a matéria que compõe o nosso
entendimento, que visa ampliar
conhecimentos, dando-nos um norte.
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, com todo carinho.
À minha esposa, ao meu lado me
incentivando e apoiando nas minhas
conquista, meu maior amor e carinho.
RESUMO
O presente trabalho monográfico, em primeiro plano, é uma contribuição
Àqueles que se interessam pelo estudo do Direito, especialmente pela garantia
de direitos através do instituto jurídico denominado coisa julgada,
constitucionalmente protegido no inciso XXXVI, do art. 5, da Carta Maior.
Elaborado de forma cuidadosamente argumentativa, atuando sob a linha
da pesquisa bibliográfica, o tema será abordado de forma objetiva e concisa,
através da leitura e interpretação de leis e obras doutrinarias relativas à
matéria.
Não obstante o estudo abordar sobre o instituto da Coisa Julgada, sobre
o qual já foram produzidas dezenas de monografias, mas que permanece
sendo uma fonte inesgotável de questões e controvérsias, e cujo fascínio é
latente por se tratar de uma garantia fundamental da maior relevância, a
presente pesquisa possui especificidades, tendo em vista discorrer sobre a
Ação Declaratória Incidental e a Ação Rescisória, institutos jurídicos de
essencial correlação com o tema de nosso trabalho; além de apresentar suas
várias facetas, bem como, demonstrar a aplicabilidade prática da matéria ora
em estudo.
A pesquisa visa analisar um precioso instrumento de defesa e amparo
contra as arbitrariedades cometidas, para a efetivação de uma sociedade mais
democrática, buscando elucidar pontos controversos, apresentando as
diferentes correntes, mas, contudo, indicando o entendimento majoritário, ou
seja, o qual prevalece no ordenamento jurídico pátrio, não deixando duvidas
quanto ao sentido a ser seguido.
A pesquisa se interessa, ‘a priori’, em encontrar respostas aos
problemas que devem ser superados, para o correto desenvolvimento do tema
em estudo, partindo de uma questão principal: quais partes da sentença ficam
cobertas pela autoridade da coisa julgada?
Como conseqüência desta pergunta central temos, necessariamente, de
responder o seguinte:
Como se dá a formação da Coisa Julgada? Quais os elementos
necessários para conceituar, com clareza e objetividade, a Coisa Julgada
Formal e a Material? O que se entende por limites objetivos e subjetivos da res
iudicata? Entre outros elementos que devem ser identificados e definidos com
exatidão par constituírem fatores determinantes a compreensão do presente
trabalho cientifico.
Conclusivamente, ao longo do trabalho serão analisadas outras faces
integrantes do instituto jurídico da Coisa Julgada, constituindo pedra angular do
presente estudo identificar seu procedimento e suas vertentes no ordenamento
jurídico brasileiro, e, a partir dos fundamentos levantados pelo tema, definir sua
atualização concreta e seu alcance; cuidando, ainda, de demonstrar a
importância da aplicação de tão importante instituo para a solução do conflito
de interesses.
METODOLOGIA
A metodologia utilizada para elaboração deste trabalho foi a da
pesquisa bibliográfica, na qual envolve a seleção de artigos publicados que
abordam o assunto em questão.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................9
CAPÍTULO I – Revisão da Literatura ............................................................... 11
CAPÍTULO II – Conceitos e Considerações Preliminares................................ 13
CAPÍTULO III – Coisa Julgada Formal e Material............................................ 21
CAPÍTULO IV – Limites Objetivos da Coisa Julgada ....................................... 26
CAPÍTULO V – Ação Declaratória Incidental ................................................... 34
CAPÍTULO VI – Limites Subjetivos da Coisa Julgada ..................................... 48
CAPÍTULO VII – Ação Rescisória .................................................................... 55
CONCLUSÃO...................................................................................................64
BIBLIOGRÁFIA CONSULTADA........................................................................66
INDICE..............................................................................................................68
FOLHA DE AVALIAÇÃO...................................................................................70
INTRODUÇÃO
Na orientação de Ada Pellegrini Grinover, estabelecer os limites da coisa
julgada significa responder a seguinte pergunta: quais partes da sentença
ficam cobertas pela autoridade da coisa julgada?
Entretanto, para que possamos responder à referida pergunta, surge
que façamos algumas considerações a respeito da sentença e da própria coisa
julgada, para que, só então, possamos abordar juridicamente os limites
objetivos e, ainda, os subjetivos da res iudicata.
A coisa julgada aparece no Ordenamento Jurídico-Processual Brasileiro
como um fator decisivo e definitivo no equacionamento dos conflitos de
interesses. Ela é a garantia ad eternum para as partes envolvidas no deslinde,
o que assegura a paz e a tranqüilidade avidamente ansiadas pelo corpo social.
A Doutrina Processual do nosso país, inspirada em teorias
contemporâneas, andou muito bem acerca das considerações relativas ao
nobre instituto em tela, auferindo as mais veementes motivações tanto do
legislador de 1939 quanto do de 1973.
Assim, com o presente trabalho objetivamos expor os principais
fundamentos expressos tanto pela Doutrina Processualista Civil brasileira, na
figura de ilustres representantes como Ada Pellegrini Grinover, Moacyr Amaral
dos Santos, Vicente Greco Filho e Alexandre Freitas Câmara, como pelas
Jurisprudências monocráticas e dos Tribunais, no que versa sobre os limites
objetivos da coisa julgada. Matéria de grande complexidade, e que deve ser
analisada num todo, como parte de um sistema de perfeita e harmônica
interação.
Destarte, em preliminares, aludiremos o conceito de coisa julgada, como
efeito primacial da sentença. Os limites objetivos da res iudicata, como mérito
do presente estudo, serão detalhadamente apreciados, bem como, todas as
hipóteses em que tais limites são excepcionados.
Abordaremos, também, com intuito de proporcionar a esta exposição,
maior concretude e entendimento, a Ação Declaratória Incidental e a Ação
Rescisória, uma vez estarem intimamente ligadas ao tema em estudo, bem
como os limites subjetivos da coisa julgada, matéria de grande extensão na
atualidade, principalmente após o advento da Constituição Federal de 1988, a
mais social das Constituições brasileiras.
CAPÍTULO I
REVISÃO DA LITERATURA
Este trabalho tem por função primordial, não exaurir o exame dos fatos -
eis que podem ser objeto de novas reflexões - mas, focalizar os mais
diferentes ângulos da questão para alcançar uma elucidação; contando para
tal, com a inestimável colaboração dos ensinamentos, entre outros, dos
Mestres Vicente Greco Filho e Alexandre Freitas Câmara, extraídos de suas
obras, respectivamente, Direito Processual Civil Brasileiro (14a ed., 2a vol.
Saraiva, São Paulo, 2000) e Lições de Direito Processual Civil (6ª ed., volume
I, Ed. Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2001).
O nobre Professor Vicente Greco Filho em sua obra Direito Processual
Civil Brasileiro adotou como critérios para exibir sua linha de pensamento,
diga-se, extremamente bem acolhida pela doutrina pátria, em princípio, um
texto expositivo de uma posição teórica, com a respectiva fundamentação,
sem, contudo, desenvolver uma discussão sobre posições doutrinárias que, a
despeito do interesse científico, não tem no direito processual brasileiro
repercussão prática; além do mais, fórmula ele hipóteses de solução
controvertida, fornecendo, porém, soluções juridicamente sustentáveis. Por
fim, de modo sucinto, quando possível, ou seja, dependendo do caso,
apresenta as conclusões a que chegaram os tribunais, vistas sob um prisma
crítico.
Com relação ao Professor Alexandre Câmara, podemos afirmar que sua
obra Lições de Direito Processual Civil mergulha no psicodrama da solução
dos conflitos de interesses, refletindo uma visão global do processo através de
uma linguagem simples e acessível, e apresentando não só a sua opinião, mas
também a posição dos mais importantes juristas que tratam de cada um dos
assuntos, analisando as mais relevantes polêmicas doutrinárias; inserindo as
informações de Direito Comparado e de evolução histórica dos institutos que
ao longo dos capítulos a eles destinados (sem que se apresentassem tais
informações em capítulos separados).
Tais obras dos Ilustres Professores, dentre outras de imensa relevância,
revestem-se de utilidade ímpar para o pós-graduando, mas, também, ao
operador de Direito, seja ele advogado militante, magistrado, promotor de
justiça, ou qualquer outro profissional do direito, pois, além de instrumentos
poderosos e fontes de consulta obrigatória, configuram-se como algumas das
mais modernas visões do direito processual contemporâneo, cuja evolução
acelerada comprava-se a cada instante.
O presente trabalho científico, fruto de ampla pesquisa, promoverá um
recenseamento de algumas questões resolvidas e aperfeiçoadas, ao longo do
tempo, pela doutrina e jurisprudência, acerca de um instituto jurídico de suma
importância em qualquer ordenamento jurídico, em virtude de a Coisa Julgada
trazer a segurança necessária às relações processuais. Para tanto,
abordaremos os principais e mais aceitos entendimentos doutrinários, bem
como, apresentar-se-ão as correntes divergentes de grande valia ao bom
desenvolvimento do tema ora em estudo; momento em que as posições
definidas pelos ilustres doutrinadores supracitados serão expostas e
confrontadas, na busca contínua por traduzir toda proeminência do instituto da
Coisa Julgada em sede do Ordenamento Jurídico-Processual pátrio.
CAPÍTULO II
CONCEITOS E CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
Para que possamos analisar o instituto da Coisa Julgada e, então,
passarmos ao exame de seus limites objetivos, faz-se necessário expormos
algumas considerações quanto à recorribilidade da sentença.
Com a sua publicação, a sentença torna-se irretratável, não podendo
ser modificada ou revogada pelo mesmo órgão jurisdicional que a proferiu. No
entanto, pode a sentença ser impugnada pelo vencido sob o fundamento de
vício do procedimento e, até mesmo, de ter sido prolatada de forma injusta ou
equivocada.
No sistema judiciário nacional, em que se consagra o duplo grau de
jurisdição, a impugnação da sentença ocorrerá por meio de Recurso. Este
consiste no pedido de reexame da causa pelo órgão jurisdicional
hierarquicamente superior ao que proferiu a decisão. Os recursos deverão ser
interpostos dentro de prazo determinado, o qual varia de acordo com a
´espécie´ de recurso) que deverá ser contado a partir da data da publicação da
sentença ou da sua intimação às partes, de acordo com o disposto no artigo
506 do CPC. Estes prazos são preclusivos, por outras palavras, uma vez
esgotados não mais se admite a interposição de recurso.
Enquanto recorrível, ou enquanto sujeita a recurso por haver sido
interposto, a sentença apresenta-se apenas como um ato judicial, mero ato do
magistrado tendente a traduzir a vontade da lei diante do caso concreto.
Assim, somente pelo esgotamento dos prazos legais para recorrer, excluída a
possibilidade de uma nova formulação, é, pois, insuscetível de reforma, a
sentença que, em princípio, não produz os seus efeitos regulares, principais ou
secundários, não passando, então, de uma situação jurídica. Pendente o
recurso, não se atingiu ainda a finalidade do processo, que é a composição da
lide, pelo julgamento final da res in iudicium deducta. E, portanto, o Estado não
satisfez nem ultimou a prestação jurisdicional, a que está obrigado.
Entretanto, momento chegará em que não mais serão admissíveis
quaisquer recursos, em virtude de não terem sido utilizados nos respectivos
prazos, ou ainda, porque não caibam ou não haja mais recursos a serem
interpostos. Não mais suscetível de reforma por meio de recursos, a sentença
transita em julgado, tornando-se imutável dentro do processo. Quando a
mesma adquire imutabilidade pela preclusão dos prazos para recurso, ocorre a
coisa julgada formal.
Nesse sentido, preconiza Dinamarco, “as definições doutrinárias, como
regra geral, simbolizam a coisa julgada pela imutabilidade do que foi decidido
no processo”. (DINAMARCO, Cândido Rangel, 2001, p. 296).
Quando da sentença não mais cabe recurso, tem-se a res iudicata. As
questões que outrora existiam, de fato e de direito, foram julgadas. Passa em
julgado a decisão e não os fundamentos, e o que se julga da questão de fato
apenas concerne da decisão.
De certo, o número de recursos em nosso sistema é grande, porém,
limitado; tornando, num determinado momento, irrecorrível a decisão judicial
ou pelo fato de se terem esgotado os recursos presentes em nosso
ordenamento ou, pelo fato de não se ter interposto o recurso cabível no prazo
previsto. Assim é que, no momento em que se torna irrecorrível a decisão
judicial, com o conseqüente trânsito em julgado, surge a coisa julgada.
Nos baseando na concepção de Vicente Greco Filho, podemos dizer
que a coisa julgada é a imutabilidade dos efeitos da sentença, ou da própria
sentença, que decorre de estarem esgotados os recursos eventualmente
cabíveis.
Nelson Nery Junior assim identifica a formação da coisa julgada:
Depois de ultrapassada a fase recursal, quer porque não se recorreu, quer porque o recurso não foi conhecido por intempestividade, quer porque foram esgotados todos os meios recursais, a sentença transita em julgado. Isto se dá a partir do momento em que a sentença não é mais impugnável. (NERY JUNIOR, N. NERY, 1997. p. 677)
A Lei de Introdução ao Código Civil, em seu art. 6º, parágrafo 3º,
estabelece, diga-se desde logo, de forma insatisfatória: “Chama-se coisa
julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não cabe recurso”. Por
sua vez, o nosso Código de Processo Civil, em seu artigo 467, dispõe o
seguinte: “Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna
imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou
extraordinário”.
Sobrevindo o instituto da coisa julgada, os efeitos substanciais da
sentença, ficam imutáveis: nem ao autor, nem ao réu é lícito rediscutir o
conteúdo declaratório da decisão judicial em toda a extensão da demanda
proposta. Em conformidade com o artigo 468 do Código de Processo Civil, ela
“tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas.”
Para Enrico Tullio Liebman, a “coisa julgada é uma qualidade que se
agrega aos efeitos da sentença”, ou ainda, “é a imutabilidade do comando
emergente de uma sentença”. Sendo assim, entende-se que a coisa julgada
é uma qualidade de eficácia declaratória da sentença, um plus que a ela se
acrescenta, na medida em que a sentença produz certos efeitos, quais sejam:
declaratórios, constitutivos, condenatórios, e a estes efeitos junta-se uma
qualidade, a imutabilidade. Essa qualidade, conclui Liebman, constitui o
mencionado instituto. Sendo, em última instância, coisa julgada, a
imutabilidade dos efeitos da sentença.
Sobre o mesmo tema pronunciou-se Moreira:
A coisa julgada é uma situação jurídica que passa a existir após
o trânsito em julgado da decisão judicial (sentença ou acórdão), mas
precisamente a situação que se forma no momento em que a
sentença se converte de instável em estável. (MOREIRA, José
Carlos Barbosa, 1999, p. 281)
Portanto, no tocante à natureza jurídica da coisa julgada temos, na
concepção de Liebman, que a coisa julgada não é um efeito da sentença, algo
que decorra naturalmente dela, mas sim uma qualidade que passa a revesti-la
a partir de certo momento.
Moreira ao analisar criticamente a teoria de Liebman, dá uma nova
concepção a respeito da coisa julgada:
Ao nosso ver, (...) o que se coloca sob o pálio da incontrastabilidade,
com referência à situação existente ao tempo em que a sentença foi
prolatada, não são os efeitos, mas a própria sentença, ou, mais
precisamente, a norma jurídica concreta nela contida.( MOREIRA,
José Carlos Barbosa, 1982, p. 278)
Já para Alexandre Freitas Câmara, a coisa julgada se revela como uma
situação jurídica, como o mesmo dispõe:
Com o trânsito em julgado da sentença, surge uma nova situação,
antes inexistente, que consiste na imutabilidade e indiscutibilidade do
conteúdo da sentença, e estes dois elementos é que são, em verdade
a autoridade da coisa julgada” (CÂMARA, Alexandre Freitas,
2001. p. 339).
Porém, a posição mais aceita pela doutrina brasileira, no tocante à
natureza jurídica da coisa julgada, é a defendida por Vicente Greco Filho,
segundo o qual a “coisa julgada é efeito da sentença”, (GRECO FILHO,
Vicente, 2000. p. 264).
2.1. JUSTIFICAÇÃO OU FUNDAMENTAÇÃO DA AUTORIDADE DA COISA JULGADA
Não se pode ignorar a existência de sentenças injustas que nem mesmo
por serem injustas deixam de fazer a coisa julgada. A doutrina, a respeito,
oferece duas ordens de fundamentos para justificar tais hipóteses: uma de
ordem política e outra de ordem jurídica.
Com relação ao fundamento de Ordem Jurídica da Coisa Julgada,
inúmeras são as teorias que investigam tal fundamentação do instituto em lide,
dentre as quais podemos destacar: presunção de verdade, ficção de verdade,
extinção da obrigação jurisdicional, etc. Embora pese a importância acadêmica
de tais discussões, a repercussão prática que implica a concepção filosófica do
processo, não nos ateremos à análise de todas as teorias, mas, tão-somente,
a uma delas: a de Liebman.
A idéia de que a sentença era a própria coisa julgada, ou que a coisa
julgada era o próprio objeto litigioso definitivamente decidido, nos remete à
tradição romana. Dessa concepção desenvolveram-se duas linhas de
pensamento:
a primeira entende a coisa julgada como efeito da sentença que a
completa, tornando-se imutável e plenamente eficaz;
a segunda vê a coisa julgada como uma qualidade dos efeitos da
sentença ou da própria sentença, a imutabilidade, que não é um efeito da
sentença nem uma complementação da própria sentença, mas apenas um
atributo dos efeitos originais do julgado.
Filiando-se a Liebman – o qual considera que a coisa julgada consiste
na imutabilidade da sentença em sua existência formal e ainda dos efeitos dela
provenientes -, o novo Código de Processo Civil não considera a coisa julgada
como um efeito de sentença; mas sim, qualifica-a como uma qualidade
especial do julgado, que reforça sua eficácia através da imutabilidade conferida
ao conteúdo da sentença como ato processual (coisa julgada formal) e na
imutabilidade dos seus efeitos (coisa julgada material).
Não se afasta o Código nem mesmo daqueles que como Chiovenda
fundamentaram a autoridade da res iudicata na vontade do Estado de tornar
imutável e indiscutível a sentença a partir do momento em que se fazem
preclusos todos os recursos. Em verdade, é a lei, como vontade do Estado,
que confere à sentença aquela autoridade, a partir de dado momento (vide
parágrafo 3º, art. 6º, LICC). É ainda a lei, através do art. 468 do CPC, que lhe
dá força de lei: “A sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem
força de lei nos limites da lide e das questões decididas”.
Sua força, sua autoridade, nem mesmo a lei poderá desconhecer ou
contrariar. A coisa julgada é imutável e indiscutível mesmo em face da lei. Por
preceito constitucional, em seu art. 5º, inciso XXXVI: “a lei não prejudicará o
direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
Fundamento de Ordem Política da Coisa Julgada: o instituto da coisa
julgada foi concebido com o objetivo de evitar a perduração de situações
indefinidas, o que é indesejável na vida social, pois compromete a sua própria
segurança.
As qualidades que cercam os efeitos da sentença, configurando a sua
julgada, revelam as inegáveis necessidades sociais, reconhecidas pelo Estado,
de evitar a perpetuação dos litígios, em prol da segurança que os negócios
jurídicos reclamam da ordem jurídica. A própria lei quer que haja um fim à
controvérsia da parte; visto que a paz social o exige. Também é a própria lei
que confere à sentença a autoridade de coisa julgada, concedendo-lhe,
igualmente, a força da lei para as partes do processo.
Há motivos de ordem prática, de exigência social, a impor que a partir
de dado momento, se verifica com a preclusão dos prazos para recursos, a
sentença se torna imutável, adquirindo a autoridade de coisa julgada. Desse
modo, a exigência de ordem prática ao se instituir a coisa julgada é a de não
mais se permitir que se volte a discutir acerca de questões já soberanamente
decididas pelo Poder Judiciário. Apenas a preocupação de segurança nas
relações jurídicas e de paz na convivência social é que explicam a coisa
julgada.
CAPÍTULO III
COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL
Para que se possa compreender com precisão os limites da coisa
julgada, convém fazer uma incursão pela distinção entre a coisa julgada formal
e a coisa julgada material.
Os conceitos de coisa julgada material e de coisa julgada formal se
tocam, de modo que o segundo é pressuposto do primeiro, ou seja, a coisa
julgada material exige a formal.
Comumente se diz que a coisa julgada formal decorre simplesmente da
imutabilidade da sentença dentro do processo em que foi proferida, e que a
coisa julgada material, ao contrário, consiste na imutabilidade da sentença com
os efeitos para fora do processo em que foi proferida.
Pode-se desta forma afirmar, que a coisa julgada formal é a
imutabilidade da sentença, e coisa julgada material é a imutabilidade de seus
efeitos, ou melhor, àquela coisa julgada formal se acrescentaria ainda a
imutabilidade dos efeitos da sentença (declaratórios, constitutivos ou
condenatórios), e a esta imutabilidade dos efeitos é o que se daria o nome de
coisa julgada material. Assim sendo, a coisa julgada formal seria comum a
todas as sentenças, enquanto a coisa julgada material só poderia se formar
nas sentenças de mérito. Como leciona o doutrinador Alexandre Câmara
“todas as sentenças transitam em julgado (coisa julgada formal), mas apenas
as sentenças definitivas alcançam a autoridade da coisa julgada (coisa julgada
material)” (CÂMARA, Alexandre Freitas, 2001, p. 396).
Estabelece o Código de Processo Civil em seu artigo 467: “Denomina-
se coisa julgada material a eficácia que torna imutável e indiscutível a
sentença não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”.
Wellington Moreira Pimentel critica o conceito do nosso código: “A alusão à
sentença não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário, com a qual o
art. 467 encerra a definição da coisa julgada material é um tanto equívoca, pois
compreende igualmente a idéia de coisa julgada formal.”
De acordo com a orientação de Liebman, a res iudicata formal e a
material são degraus de um mesmo fenômeno. Uma vez proferida a sentença
de mérito e preclusos os prazos legais, tal sentença torna-se imutável (primeiro
degrau). Em conseqüência disso, se tornam imutáveis os seus efeitos
(segundo grau); de modo que aquilo que foi discutido dentro de certo processo,
não pode ser rediscutido em outro processo.
A res iudicata formal constitui pressuposto da material ou substancial.
Enquanto a coisa julgada formal torna imutável o ato processual sentença
dentro do processo, resguardando tal ato de recursos definitivamente
preclusos, a coisa julgada material torna imutáveis os efeitos produzidos por
ela e lançados fora do processo; ou seja, o que há é a imutabilidade da
sentença, no mesmo processo ou em qualquer outro processo, entre as
mesmas partes e versando sobre o mesmo objeto.
Nestes termos, a coisa julgada formal consiste na imutabilidade da
sentença pela preclusão dos prazos para recursos. O fenômeno da imutabili-
dade ocorre em virtude da não possibilidade de a sentença ser reformada por
meio de recursos ou porque dela não caibam mais recursos, ou ainda, porque
estes não foram interpostos no prazo determinado por lei, ou porque do
recurso se desistiu ou, interposto, ao mesmo tempo se renunciou. Logo, a
coisa julgada formal consiste na imutabilidade da decisão dentro do mesmo
processo pela ausência de meios de impugnação possíveis (sejam estes
recursos ordinários ou extraordinários).
A coisa julgada formal pode existir sem qualquer eficácia da substancial.
Todas as sentenças, em certo momento, fazem coisa julgada formal. Contudo,
para as sentenças de mérito, quando da ocorrência da res iudicata formal,
ocorre também – salvo algumas exceções – a coisa julgada material.
Quando não mais se pode discutir, mesmo em outro processo, o que se
decidiu na sentença ocorre a res iudicata substancial; esta consiste no
fenômeno da imutabilidade dos efeitos que se projetam fora do processo,
impedindo que uma nova demanda seja proposta sobre a mesma lide.
Percebemos, com isso, o efeito negativo ou preclusivo da coisa julgada
material, que se constitui na proibição de qualquer outro juiz vir a decidir a
mesma ação; assim como não podem as partes voltar a litigar e nem pode o
legislador vir a regular diferentemente a relação jurídica.
A coisa julgada material só se dá em relação às sentenças de mérito, ou
seja, só faz coisa julgada material a sentença que julga o mérito da demanda
e não a que extingue o processo sem o julgamento do mérito; já com relação a
coisa julgada formal, esta se forma dentro do processo, em virtude da
sentença não mais se sujeitar a recurso, impedindo a reapreciação da matéria
no mesmo processo.
Após o trânsito em julgado da sentença e ocorrendo o instituto da coisa
julgada substancial, há ainda uma possibilidade de a sentença ser atacada,
através da Ação Rescisória – instituto jurídico que será melhor abordado em
capítulo próprio, tendo em vista suas peculiaridades e por encontrar-se tão
vinculado à coisa julgada substancial, tornando-se tópico essencial de nosso
estudo. A ação rescisória, como prevê o artigo 485 do CPC, visa corrigir
distorções gritantes (grave defeito formal ou de conteúdo de decisão), até o
prazo máximo de 2 (dois) anos. Depois disso, não existe qualquer
possibilidade de modificação da sentença, mesmo que esta esteja errada ou
seja injusta.
A coisa julgada material torna impossível a rediscussão da lide, como já
foi visto. Contudo, o mesmo não ocorre quando existe fato novo ou diferente
que venha a constituir fundamento jurídico para outra demanda. O fato que
constitui fundamento jurídico novo enseja outra demanda, diferente, e a coisa
julgada se refere a demandas idênticas nos 3 (três) elementos, isto, é, mesmas
partes, mesmo pedido e a mesma causa de pedir.
Em geral, as sentenças produzem a coisa julgada quando se esgotam
todos os recursos possíveis ou quando findo o prazo para sua interposição.
Contudo, determinadas sentenças, por razões de interesse público, só
produzem efeitos se forem confirmadas pelo Tribunal, não importando que
tenha havido ou não interposição de recurso pela parte vencida. Desse modo,
somente podem produzir seus efeitos depois de examinadas pelo Tribunal – ou
seja, não podem fazer coisa julgada as sentenças de primeiro grau – as
sentenças proferidas, por exemplo, em ações de anulação de casamento ou
contra a Fazenda Pública. Trata-se do que se conhece por reexame obrigatório
ou duplo grau de jurisdição obrigatório, que no Código anterior recebia o nome
de apelação ou recurso de oficio.
3.1. DECISÕES QUE NÃO PRODUZEM COISA JULGADA
MATERIAL
Toda sentença produz coisa julgada formal, desde a mais complexa até
a mais simples. Entretanto, nem toda sentença produz a coisa julgada material.
Somente as sentenças que julgam o mérito da demanda produzem a coisa
julgada material.
Conseqüentemente, só produzem coisa julgada formal (e não material
ou substancial):
a) as sentenças terminativas, por extinguirem o processo sem
solução do mérito (artigo 267 do Código de Processo Civil);
b) as sentenças proferidas em processo de jurisdição voluntária, por
não haver lide a ser decidida;
c) as sentenças que decidem as relações jurídicas continuativas (si
et in quantun), pois embora a sentença transite em julgado, todas as vezes que
sobrevier modificação de fato ou de direito, a lei permite a revisão da sentença,
através de ação de revisão.
Cumpre informar que os despachos de mero expediente não fazem
coisa julgada material e nem mesmo formal.
CAPÍTULO IV
LIMITES OBJETIVOS DA COISA JULGADA
O tema ora em estudo trata da verificação do alcance da imutabilidade e
indiscutibilidade da sentença transitada em julgado, na busca por saber o que
transitou em julgado.
A coisa julgada não atinge toda a sentença, que é constituída por três
partes: o relatório, a fundamentação ou motivação, e a decisão ou conclusão
ou, ainda, dispositivo. Assim, a análise dos limites objetivos da coisa julgada
consiste na delimitação de qual parte da sentença que, efetivamente, faz coisa
julgada.
No relatório, onde a causa é simplesmente exposta, não há dúvida de
que a coisa julgada não está presente; por outro lado é passivo o
entendimento de que ela abrange o dispositivo. O problema surge ao tratarmos
da fundamentação, pois neste sentido, há discussão se a coisa julgada
abrange também esta parte da sentença ou se diz respeito apenas à
conclusão.
O artigo 468 do Código de Processo Civil dispõe que a “sentença que
julgar total ou parcialmente a lide tem força de lei nos limites da lide e das
questões decididas”.
O Estado, através do processo, compõe os litígios entre as partes,
conforme estabelecido no pedido e na contestação. Os litígios ou lides, por sua
vez, consistem nos conflitos de interesses que serão solucionados no
processo; as questões são as razões invocadas pelas partes para justificar sua
pretensão ou resistência, e vão criar as controvérsias.
A lide existe no processo independentemente das questões, e vice-
versa. Contudo, o mais comum e que a lide apresente uma ou mais questões,
constituindo uma controvérsia. No caso de possuir várias questões, pode-se
apresentar todas elas no processo, sendo este denominado integral; no
entanto, existe a possibilidade de que não sejam apresentadas em juízo todas
as questões, o que consistirá num processo parcial. Neste último caso, de
julgamento parcial, a coisa julgada somente recairá sobre o que for julgado.
Através da sentença o Estado soluciona a lide, por intermédio da
resolução das questões que lhe foram propostas. A sentença é a decisão da
lide e, por isso, deve se ater aos limites desta. De tal forma, a sentença faz
coisa julgada e tem força de lei dentro desses limites.
Quando a sentença decide uma lide costuma, também, decidir questões
apresentadas pelas partes para justificar sua posição em relação ao conflito.
Ao contrário do que se observa com a decisão da lide, há muita controvérsia
no sentido de se considerar ou não que a decisão das questões faz coisas
julgadas. Esse ponto será abordado logo adiante, mas podemos adiantar que,
a princípio, a decisão das questões não faz coisa julgada, servindo apenas
para estabelecer os limites desta.
O artigo 469 (CPC) limita o alcance da coisa julgada, determinando
quais as partes que constituem a sentença e que não fazem coisa julgada,
quais sejam: “I – os motivos, ainda que importantes para determinar o
alcance da parte dispositiva da sentença; II – a verdade dos fatos
estabelecida como fundamento da sentença; III – a apreciação da questão
judicial, decidida incidentemente no processo”.
Tudo isso será de grande importância na apreciação do juiz, para que
este chegue à conclusão e para dar sentido à decisão. Entretanto, não se pode
incidir sobre essas questões a imutabilidade da coisa julgada; tais questões
poderão ser discutidas em outro processo, onde o Juiz terá toda a liberdade de
apreciá-las, independentemente de como tiverem sido consideradas em
processo anterior.
Além disso, apesar de o Código não citar expressamente, podemos
observar que também não faz coisa julgada a interpretação de um direito na
decisão do caso concreto; esta interpretação não terá força de lei nos casos
futuros. Nem as súmulas do Supremo Tribunal Federal possuem efeito
vinculante, ou seja, não obrigam o Juiz a se interpretar de forma específica, no
caso de haver decisões reiteradas nesse sentido, que acabem influenciando os
juízes.
De acordo com o exposto, verifica-se que o art. 468 do CPC nos leva à
conclusão de que apenas aquilo que foi deduzido no processo e, por
conseguinte, objeto de cognição judicial é alcançado pela autoridade da coisa
julgada.
4.1. MOTIVOS DA SENTENÇA
O Código é claro quando dispõe expressamente que os motivos, por
mais importantes que sejam para a fixação do dispositivo da sentença, não
incidem na imutabilidade da coisa julgada. Assim, não resta qualquer dúvida no
sentido de que somente o dispositivo da sentença faz coisa julgada.
Contudo, nem sempre foi assim. Tal questão já produziu mais
divergências, não só no Brasil, como a nível mundial, desde a Antiguidade.
Havia doutrinadores que consideravam sob a proteção da coisa julgada os
motivos da sentença, de forma ampla ou restrita.
Savigny elaborou uma doutrina que exerceu grande influência nos
demais estudiosos acerca do tema, baseando-se no fato de que integravam a
coisa julgada os motivos da sentença, mas não todos, apenas os fundamentos
ou elementos objetivos, ou seja, os elementos que constituíam a relação
jurídica; ficando de fora os motivos subjetivos que ajudassem na formação da
convicção do Juiz.
Essa doutrina, no entanto, não foi adotada pela Alemanha e Áustria
nem, posteriormente, pela França e Itália, que dispuseram em seus códigos
que os motivos não eram abrangidos pela coisa julgada, que se fazia presente
apenas no dispositivo da sentença.
Os doutrinadores brasileiros, sob a égide do Código de Processo Civil
de 1939, em sua maioria, já se determinavam em consonância com a doutrina
germânica dominante. E, atualmente, tal questão é pacífica, visto que o
Código vigente acabou com qualquer dúvida que pudesse ainda atingir os
doutrinadores.
Sendo assim, os motivos esclarecedores do dispositivo podem até estar
inseridos neste, mas não terão reflexos fora do processo. Os motivos da
sentença se limitam ao plano lógico da elaboração do julgado, influenciam a
sua interpretação, mas não são acobertados pela coisa julgada; limitando-se
esta à resposta do pedido do autor, e não à sua explicação lógica.
Normalmente a parte dispositiva da sentença encontra-se resumida no
final desta. Entretanto, pode ocorrer de o Juiz decidir alguma questão principal
durante a fundamentação, que depois não venha a ser reproduzida,
formalmente, tem conteúdo dispositivo, e por isso, fará coisa julgada.
É nesse sentido o ensinamento de Liebman, que é muito citado pelos
doutrinadores brasileiros, e que ajuda a esclarecer essa questão. Segundo
esse entendimento, não devemos deixar de considerar que a coisa julgada se
restringe apenas à parte dispositiva da sentença. Contudo, é preciso entender
tal expressão num sentido substancial e não formalista, de modo a abranger
não só a parte final da sentença, mas também qualquer ponto em que o Juiz,
eventualmente, decida sobre os pedidos das partes.
De acordo com a posição de Humberto Theodoro Junior (Curso de
Direito Processual Civil. vol. I, 22ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 1997), no
caso de o fundamento ser essencial, a ponto de mudar o julgamento se for
retirado, é considerado praticamente parte do dispositivo.
Com isso, ele quer dizer que o dispositivo pode alcançar o fundamento,
que será protegido pela coisa julgada, no caso de a razão da sentença ser a
invocação de um fato jurídico básico, ou seja, de um acontecimento que tenha
provocado a eclosão da lide. O mesmo não ocorre em relação aos fatos
simples, que são úteis apenas na formação da convicção do julgador,
constituindo os motivos da sentença, que não serão alcançados pelo
dispositivo.
Seguindo os ensinamentos de Greco Filho, e tendo por base o disposto
nos arts. 469 e 470 do CPC, pode-se afirmar que apenas o dispositivo da
sentença transita em julgado. Quanto à motivação da sentença, esta não é
alcançada pela coisa julgada, como se verifica pela simples leitura dos artigos
supracitados. (Direito Processual Civil Brasileiro, 2º vol., Ed. Saraiva, 2000,
p. 268).
4.2. VERDADE DOS FATOS
Nós já poderíamos considerar que a verdade dos fatos não faz coisa
julgada pelo simples fato de ela estar inserida dentre os motivos da sentença,
como resultado da apreciação das provas; assim, já poderíamos encaixá-la no
inciso I do artigo 469 (CPC).
Entretanto, além disso, o legislador do Código de Processo Civil foi mais
taxativo, prevendo isso expressamente no inciso II do referido artigo, segundo
o qual não faz coisa julgada “a verdade dos fatos, estabelecida como
fundamento da sentença”.
É por essa razão que um mesmo fato, considerado verdadeiro em um
processo, pode ser considerado falso em outro, desde que, embora discutindo
o mesmo fato, o novo julgamento se refira à lide ou questões diversas. Assim
sendo, as provas transportadas de um processo para outro poderão receber
valorações diferentes em cada um deles, sem que haja obstáculo da coisa
julgada no primeiro processo.
4.3. QUESTÕES PREJUDICIAIS
As questões prejudiciais dizem respeito a fatos, questões ou relações
anteriores à controvérsia, que constituem antecedentes lógicos da conclusão
da sentença e que, além disso, poderiam ser objeto de processo separado, por
reunirem as condições suficientes para tal.
Essas questões não constituem o dispositivo da sentença; ao contrário,
antecedem o mesmo fazendo, assim, parte de sua preparação. E é por isso
que não fazem coisa julgada, conforme dispõe o inciso III, do art. 469, do
Código Processual Civil nacional.
Assim, a questão prejudicial decidida incidentalmente no processo é
resolvida pelo Juiz sem produzir efeitos fora do processo em que foi proferida,
ou seja, não é protegida pela coisa julgada. A eficácia dessa decisão limita-se
à preclusão, para que a mesma questão não seja suscitada mais de uma vez
no mesmo processo.
Integrando este entendimento, segundo o mestre Barbosa Moreira, a
apreciação das questões prejudiciais (que se dá na fundamentação da
sentença) não é alcançada pela autoridade de coisa julgada salvo se tiver
havido ‘ação declaratória incidental’, hipótese em que a resolução desta
questão também será alcançada pela autoridade de coisa julgada, eis que terá
também passado a fazer parte do objeto principal do processo, não mais
sendo objeto de apreciação incidenter tantum.
O artigo 470 do Código Processo Civil prevê uma hipótese em que a
decisão sobre a questão prejudicial terá efeito de coisa julgada, no caso de “a
parte requerer (arts. 5º e 325), o Juiz for competente em razão da matéria
e constituir pressuposto necessário para o julgamento da lide”. Nesse
caso a lide terá sido ampliada para englobá-la, também, como uma de suas
questões internas.
Para que as questões prejudiciais façam coisa julgada material, é
preciso que a parte requeira a declaração incidental, ou seja, é necessária a
propositura da ‘ação declaratória incidental’, que será melhor abordada
posteriormente.
De tal forma, atendidos a esses requisitos – quais sejam: requerimento
pela parte de ação declaratória incidental, competência do Juiz em razão da
matéria, e constituir pressuposto para o julgamento da lide -, a resolução da
questão prejudicial, provocada por ação incidental, terá eficácia de coisa
julgada.
A posteriori, por ser abrangida pela ação declaratória incidental, a
questão prejudicial será novamente abordada.
CAPÍTULO V
AÇÃO DECLARATÓRIA INCIDENTAL
I. ORIGEM E DIREITO COMPARADO
A Ação Declaratória Incidental, que é também denominada Ação
Declaratória Incidente (ou Declaração Incidente), teve origem na França, de
onde passou para a Itália, Alemanha, Áustria (atingindo neste país a sua forma
mais perfeita) e outros países, nos quais vigora há longos anos. No entanto,
certos autores afirmam que as ações declaratórias, em geral, tiveram origem
na actiones praejudiciales no período formulário do Direito Processual
Romano e nas ações relativas às questões de estado no período da cognitio
extra ordinem. Quanto ao Processo Comum e ao Canônico vigoravam as
chamadas “ações provocatória”, que tinham por finalidade compelir aquele que
alegava um direito a propor ação que dizia ter direito, sob pena de um efeito
declaratório negativo se aquele que dizia ter o direito não provava o alegado ou
não agia.
Tendo em vista a importância do Direito Comparado falaremos um
pouco da repercussão do referido instituto nos países em que possui maior
concretude:
ITÁLIA
Embora a legislação italiana não contemplasse expressamente a
referida Ação, a Doutrina foi absorvendo a elaboração dos autores franceses.
A penetração deste instituto gerado pelos franceses nos pensamentos e
trabalhos doutrinários italianos já podia ser notada no século XIX, onde autores
como Pisanelli – que admitia o princípio da declaração incidente, porém, de
modo pouco claro - Pescatore – este sustentava a insuficiência da contestação
para permitir o julgamento da prejudicial com força de coisa julgada, fazendo-
se mister ‘alegação expressa’ -, e Martirolo – o qual compartilhava a mesma
opinião de Pescatore.
Posteriormente, o Ilustre Chiovenda profere tal instituto como verdadeira
ação que “propende, como a ação declaratória proposta independentemente
de outro processo, a obter, mediante julgado, a certeza jurídica sobre a
existência de uma vontade concreta de lei: a característica de ação
declaratória incidente consiste em que o interesse de agir decorre, aí, da
contestação de um ponto prejudicial formulada numa lide procedente”.
Como se pode notar, a ação declaratória incidental vai se enraizando
aos poucos no Direito italiano e cada vez mais tomando força, até que, em
1940, o Código de Processo Civil italiano veio expressamente, em seu artigo
34, dispor sobre o instituto, nos seguintes termos:
“Accertamenti incidentali. Il giudice, se per legge o per esplicita demanda
di uma delle parti è necessario decidere com eficacia di giudicato uma
questione pregiudiziale Che appartiene per materia o valore alia competenza di
um giudice superiore, remette tutta la causa questo ultimo, assegnando alle
parti um termine perentorio per riassunzione della causa devanti a lei”.
ALEMANHA
A Alemanha foi o primeiro país a disciplinar legalmente a ação
declaratória incidental. Reza o artigo 280 da ZPO: “até a conclusão da
audiência em que se pronuncia a sentença, pode o autor, por ampliação do
seu pedido, e o demandado, por meio de demanda reconvencional, pedir que o
Tribunal se pronuncie sobre alguma relação jurídica controvertida no curso do
processo e de cuja existência ou inexistência dependa, no todo ou em parte, a
solução do litígio”.
Para o legislador alemão, o pedido declaratório incidental formulado
pelo autor constitui verdadeira ação e, quando apresentado pelo réu, uma
demanda reconvencional.
Por isso, Schonke ressalta que, ajuizada pelo autor, temos um caso de
cumulação de ações objetivas a posteriori e, quando requerida pelo réu, um
caso especial de reconvenção. Em oposição, Rosenberg-Schwab sustenta que
o instituto é sempre uma Ação, mesmo quando requerida pelo réu.
Tendo por base o dispositivo legal, o pedido da referida declaração pode
ser formulado até o encerramento da audiência, por outras palavras, até o fim
do debate oral.
ÁUSTRIA
Foi neste país que o instituto da ação declaratória incidental atingiu a
sua forma mais perfeita.
Estatui o parágrafo 236 da ZPO austríaca: “Fino allá chiusura della
pertrattazione oral in seguito lla quale vience emanata la sentenza, l´attore quò
proporre, senza consenso Del convenuto, Che um rapporto giurdicio e um
deritto diventato controverso nel corso del processo, dalla cui sussistenza o
insussistenza dipende nel tutto o in parte la decisione sul petito, venga
accertato nella sentenza da emanarsi sulla petizione o in um´altra sentenza
precedente alla stessa. Questa disposizione non sarà applicata, se sul´oggeto
dela nuova proposto quò trattarsi soltanto in um procedimento speciale,
prescrito esclusivamente por vertenea di tale specie, oppure se lê prescrizioni
sulla competenza materiale dei giudicie-se oppongono allá decisione proposta.
Art. 259 – cap. 2. Durante il dibatimento orale il convenuto quò fare uma
proposta per accertamento a sensi del par. Senza bisogno Del consenso
dell´attore. (tradução – De Manestrina).
PORTUGAL
Em Portugal, a matéria em lide é disciplinada no Livro III, Título I,
Capítulo II, artigo 237, nos seguintes termos:
“Alteração do pedido e da causa de pedir na falta de acordo:
1) Na falta de acordo, a causa de pedir só pode ser alterada ou
ampliada na réplica, se o processo a admitir, a não ser que a alteração
ou ampliação seja conseqüência de confissão feita pelo réu e aceita
pelo autor.
2) O pedido pode também ser alterado ou ampliado, além do
momento da réplica, quando o autor, em qualquer altura, reduzir o
pedido ou ampliá-lo até o encerramento da discussão em 1ª instância,
se a ampliação for o desenvolvimento ou a conseqüência do pedido
primitivo.
3) Se a modificação do pedido for feita na audiência de instrução e
julgamento, ficará a constar da ata respectiva”.
II. CONCEITO
No Brasil, este importante instituto foi introduzido em nosso Direito em
1973 pelo artigo 5º do atual Código de Processo Civil.
Entretanto, o atual Código de Processo Civil criou este tipo de ação de
modo negligente e desorganizado; nele nós não encontramos a expressão
ação declaratória incidental em nenhum artigo, inciso ou parágrafo. Tal
instituto só aparece implicitamente, pois essa Ação foi distribuída pelo
legislador em nosso Código, constando em 3 (três) artigos esparsos,
totalmente desordenados, o que mostra total falta de técnica legislativa. Esses
artigos são:
Artigo 5º: “Se, no curso do processo, se tornar litigiosa relação jurídica
de cuja existência ou inexistência depender o julgamento da lide, qualquer das
partes poderá requerer que o Juiz a declare por sentença”.
Artigo 325: “Contestando o réu o direito que constitui fundamento do
pedido, o autor poderá requerer, no prazo de 10 (dez) dias, que sobre ele o
Juiz profira sentença incidente, se da declaração da existência ou inexistência
do direito depender, no todo ou em parte o julgamento da lide.”
Artigo 470º: “Faz, todavia, coisa julgada a resolução da questão
prejudicial, se a parte requerer (arts. 5º e 325), o Juiz for competente em razão
da matéria e constituir pressuposto necessário para o julgamento da lide”.
Ao perceber que a ação declaratória incidental havia sido criada pelo
atual Código de modo genérico, empírico, negligente, a Doutrina e a
Jurisprudência começaram a discutir a matéria em tela – a qual foi objeto de
grandes conferências acadêmicas (em nível de graduação e pós-graduação) e
controvérsias entre muitos processualistas ilustres -, esse debate perdurou a
década de 70 (setenta) até meados dos anos 80 (oitenta), quando, enfim, a
Doutrina e a Jurisprudência literalmente ‘cansaram’ do deslinde e hoje a
questão está em sua quase totalidade cristalizada, edificada. Sendo assim
depois de muitas discussões, os nossos Tribunais e os nossos mais eminentes
processualistas chegaram praticamente a conclusões uníssonas. São quatro
os principais temas que antes eram matéria de discussão/debate e que
hodiernamente são considerados pontos pacíficos:
1º) A ação declaratória incidental ocorre nos mesmos autos da ação
principal, e não em autos apartados. Assim, podemos verificar que o fato de
ela ser uma ação não obsta que corra nos mesmos autos da principal. Não é
pelo fato de ser ação que se deve concluir que a sua postura dê origem à
formação de autos próprios, diferentes daqueles em que se processa a ação
principal; esta é uma conclusão errônea. Além disso, pelo fato de a ação em
lide não trazer nenhum acréscimo à atividade processual das partes e do Juiz,
no que se refere às provas ou às questões suscitadas, não há motivos para se
agir diversamente.
2º) Não se faz necessário que esta ação seja proposta através de uma
petição inicial como se fosse uma ação comum. É preciso apenas que a(s)
parte(s) peça(m), expressamente, de modo resumido, que o Juiz se pronuncie
incidentalmente naquela questão prejudicial.
3º) Em relação aos prazos:
a) o autor tem o prazo de 10 (dez) dias, após a defesa do réu
(contestação), para entrar com o pedido de declaração incidente;
isto é, deve impetrá-la no prazo de réplica, sob pena de
preclusão.
b) o réu pode impetrá-la no prazo de defesa – 15 (quinze) dias; ou
seja, na sua contestação.
4º) O julgamento da ação principal e da declaração incidente deve ser
feito sempre simultaneamente pelo Juiz da instância inferior. Nesse sentido
está pacificada a Jurisprudência: a sentença deverá ser apenas uma. De tal
forma, o Juiz não poderá julgar, em caso algum, primeiro a questão prejudicial
– sendo assim, não ficará essa suspensa.
A ação declaratória incidental, é, pois, a ação (e não mero incidente
processual) proposta por pelo menos uma das partes – autor ou réu, em
processo pendente, visando à ampliação da autoridade da coisa julgada
também às questões prejudiciais que, de outra forma, seriam apreciadas
incidenter tantum.
5.1. QUESTÕES PREJUDICIAIS
O tema da ação declaratória incidental está intimamente ligado ao dos
limites objetivos da coisa julgada, que são regulados pelos artigos 468 e 469
do Código de Processo Civil, tendo este adotado uma posição restritiva quanto
àqueles, não estendendo os efeitos da imutabilidade à questão prejudicial
decidida incidenter tantum, em contraposição à posição teórica de Savigny,
que entendia estender-se a coisa julgada aos “motivos objetivos” da decisão.
Sob o prisma do sistema do Código (arts. 468 e 469), somente o
pronunciamento judicial sobre o pedido é idôneo para adquirir a autoridade da
coisa julgada. Esta não abrange a fundamentação da sentença, na qual se
compreende a solução das questões atinentes às relações jurídicas, assim
denominadas aquelas de cuja existência ou inexistência, logicamente,
depende a da relação deduzida em juízo pelo autor, por meio da demanda que
deu origem ao processo.
Ministra a Lei, entretanto, o meio de converter-se a questão prejudicial
em outra também principal (caso seja essa vontade de uma ou de ambas as
partes), a par da que já fora de início submetida ao juiz. Tal expediente
consiste, precisamente, no requerimento de que trata o art. 5º do Código de
Processo Civil, e que por natureza constitui a ‘petição inicial’ de uma ação
declaratória incidental. A partir desse momento a questão subordinada, assim
como a subordinante, passam a integrar, em conjunto, o objeto do processo, e
o pronunciamento judicial sobre ambas se revestirá, todo ele, da autoridade da
coisa julgada, em consonância ao disposto no art. 470 do Código de Processo
Civil.
No curso do processo, o Juiz, com freqüência, é chamado a resolver
diversas questões (pontos controvertidos) de cuja solução depende o deslinde
do mérito da causa. A questão prejudicial consiste no antecedente lógico-
jurídico controvertido que deve ser decidido pelo juiz no mesmo processo.
Sendo a prestação jurisdicional indeclinável, está o juiz autorizado a decidir
todas as questões prejudiciais. Todavia, essas questões são decididas
incidentemente, apenas com a finalidade de se poder chegar à questão
principal, não fazendo, porém, coisa julgada, porque esta incide apenas sobre
a questão principal.
Tais questões, denominadas prejudiciais porque constituem premissas
necessárias da conclusão, são, normalmente resolvidas incidentemente
(incidenter tantum), de tal modo que o pronunciamento judicial respectivo não
se proteja fora do processo, vale dizer, não se constitui a coisa julgada
material.
O pronunciamento do juiz a respeito da questão prejudicial da questão
principal não estará incluído na parte dispositiva da sentença e sim em seus
fundamentos. Logo, ‘a priori’, aquela questão continua pendente, de modo que,
se houver outro processo ela poderá ser novamente suscitada, uma vez que o
decidido pelo juiz não fará coisa julgada, pois foi decidido apenas incidenter
tantum.
Para que a relação jurídica prejudicial também seja julgada como
principal, fazendo coisa julgada, é preciso que, sobre ela, haja pedido
expresso, nos termos do art. 325 do Código do Processo Civil, que é o pedido
da declaração incidente, que também, pode ser denominado propositura da
‘ação declaratória incidental’. Considera-se proposta a Ação Declaratória
Incidental quando o Juiz despacha o requerimento.
Pode ocorrer, porém, que uma das partes, ou ambas, pretenda, desde
logo, ver definitivamente resolvida tal questão prejudicial, com força de coisa
julgada, de modo a evitar novas discussões futuras, cujos inconvenientes são
de meridiana clareza, sendo assim, farão uso da ‘ação declaratória incidental’.
5.2. NATUREZA E OBJETOS DA AÇÃO DECLARATÓRIA
INCIDENTAL
Os melhores doutrinadores vêem na declaração incidente uma ação
distinta, de natureza declaratória, e que se desenvolverá no mesmo processo
em que se desenvolve a ação principal. Dessa forma, podemos concluir que a
declaração incidente é ação de natureza obviamente declaratória, sendo
assim, não constitui mero incidente processual.
Este instituto processual tem por objetivo uma relação jurídica, a teor do
art. 5º do Código do Processo Civil. Sob outro prisma, não pode ser objeto
deste instituto, por não serem questões prejudiciais:
a) o fato jurídico;
b) os atributos das pessoas, coisas e atos; que a pessoa
tenha esta ou aquela idade; que uma coisa seja ou não divisível; que
uma sociedade seja civil ou comercial;
c) a simples questão jurídica, sem situação de fato tangível,
que lhe sirva de base.
5.3. LEGITIMIDADE PARA PROPOR AÇÃO DECLARATÓRIA
INCIDENTAL
A priori, deve-se esclarecer que o juiz não tem legitimidade para propor
esta ação, nem mesmo que este alegue o princípio da economia processual.
Em tempo algum, poderá o juiz de ofício declarar com força de coisa julgada a
questão prejudicial, isto porque ele está violando o princípio do dispositivo: “ne
procedet iudez ex officio” (não procederá o juiz de ofício), ou ainda, não há
jurisdição sem provocação. Sendo assim, jamais pode o juiz outorgar jurisdição
que não seja pedida por menos de uma das partes.
Sendo a declaração incidente uma verdadeira ação, ela somente terá
lugar se houver iniciativa de uma das partes, segundo o velho brocardo “nemo
iudez sine actores” consagrado no art. 2º do Código de Processo Civil.
Essa iniciativa se faz através de requerimento do autor ou do réu,
segundo a expressão repetida nos artigos 5º e 325, realçada no art. 470 do
Código de Processo Civil.
Assim, pelo disposto no art. 5º do Código de Processo Civil e de acordo
com a doutrina uniforme, o poder de requerer declaração sobre questão
incidente cabe a qualquer das partes, entendida esta como autor e/ou réu.
Assim sendo, a cumulatividade superveniente do processo, em razão de sua
propositura, caracterizar-se-á:
1º - Pela existência de dois pedidos orientados no mesmo sentido (isto
é, ambos formulados pelo autor em face do réu);
2º - Por dois pedidos orientados em sentidos opostos (um formulado
pelo autor em face do réu, outro pelo réu em face do autor). Nesse caso, a
ação declaratória incidental equipara-se substancialmente a uma reconvenção;
esta última pode ser utilizada com finalidade típica da primeira, ou seja, a do
pronunciamento, com força de julgada, sobre questão judicial da suscitada
‘principaliter’ na ação do autor reconvido. Porém, os dois institutos são distintos
nos seus requisitos de admissibilidade e na sua disciplina formal, não obstante
os pontos de contato e até certa fungibilidade que entre eles às vezes se
observa.
PRAZOS
O art. 5º não estabelece qualquer limitação de prazo para o
requerimento de declaração da existência ou inexistência da relação jurídica
prejudicial, a não ser implicitamente, o de que seja ele formulado no primeiro
grau da jurisdição (verbis “que o juiz declare por sentença”: cf. arts. 162, par.
1º e 163). Da norma contida no art. 325, todavia, resulta que, se o réu
contestar a existência daquela relação, e o autor quiser vê-la declarada, terá
10 (dez) dias para requerer que o juiz sobre ela profira sentença incidente.
Como a admissibilidade do requerimento se subordina à ocorrência de
controvérsia sobre a prejudicial (conforme disposto no artigo 5º do CPC), e o
réu, em princípio, não terá outra oportunidade de suscitá-la senão da
contestação (vide art.. 303 do CPC), segue-se que, em regra, a ‘ação
declaratória incidental’ só poderá ser proposta pelo autor no decênio (10 dias)
do art. 325.
Todavia, nas hipóteses excepcionais em que ao réu se facultam novas
alegações depois da contestação, concebe-se que apenas então venha a
relação jurídica prejudicial a tornar-se litigiosa, por iniciativa do réu, que se
omitiria a respeito ao contestar.
Quanto à ação declaratória proposta pelo réu, o princípio da igualdade
das partes (vide art. 125, inciso I, do CPC) induz a cogitar-se, também para
ele, da fixação de um prazo para a apresentação do requerimento a que alude
o art. 5º do novo Código. Considerações de ordem prática, ligadas à chicana,
aconselham a que se estenda além da fase postulatória, ao menos como
regra, a possibilidade de requerer o réu a declaração da existência da relação
jurídica prejudicial. Ele o fará ‘a priori’, na mesma oportunidade da
contestação, cumprindo, entretanto, todavia, aqui também ressalvar as
hipóteses de que cuida o artigo 303.
Determina o art. 321 do Código de Processo Civil que o autor, ao
demandar declaração incidente, promova nova citação do réu, ainda que
ocorra revelia (a fartiori, se não ocorrer); deve entender-se, por analogia, que o
autor precisa ser citado, se a ação declaratória incidental é proposta pelo réu.
Assim sendo, ao citado, naturalmente, abre-se oportunidade para defender-se.
O prazo para resposta, aqui também é de 15 (quinze) dias. Embora o
texto legal só aluda expressamente ao caso de requerimento de declaração
formulado pelo autor, mais uma vez impõe-se a aplicação analógica da regra à
hipótese inversa: se a declaração for requerida pelo réu, disporá o autor,
citado, de 15 (quinze) dias para responder. A disciplina da resposta, nos seus
vários aspectos, é a mesma, em princípio, a que se submete a resposta do
réu, ao pedido veiculado na ação originária.
5.4. FINALIDADE DA AÇÃO DECLARATÓRIA INCIDENTAL
A ação declaratória incidental tem por finalidade atender ao princípio da
economia processual, por isso impede nova discussão em processos futuros,
sobre questão prejudicial já decidida com força de coisa julgada.
Além disso, visa também impedir a ocorrência de sentenças conflitantes,
uma vez que, uma vez que, nos processos interiores, seja sempre possível
argüir-se, ou decretar de ofício, a coisa julgada que no processo anterior se
formou sobre a questão prejudicial.
Por essas razões, a ação declaratória incidental cumpre relevante papel
ao evitar o desperdício da Justiça.
CAPÍTULO VI
LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA
Fixar os limites da coisa julgada significa responder à pergunta: quem é
atingido pela autoridade de coisa julgada material? O problema consiste em
saber quais as pessoas alcançadas pela coisa julgada, se esta atinge as partes
na relação processual ou é extensível a terceiros.
Adota-se no Direito brasileiro a regra, fixada no art. 472 do CPC,
conhecida desde o Direito Romano onde se afirmava que res interalios
iudicata, aliis non praeiudicare. Tal limitação do alcance da coisa julgada às
partes sempre foi defendida pela melhor doutrina, donde podemos citar
Liebman e Chiovenda.
A regra romana conservou-se com o princípio fundamental, ou seja, a
coisa julgada atinge somente as partes, não a terceiros. Estes não podem se
prejudicados - res inter alios iudicata, aliis non prejudicare. Agasalhou as
Ordenações o princípio de que “A sentença não aproveita nem empece mais
às pessoas entre que é dada” (Ordenações, Livro III, título 81, pr.).O princípio
se justifica no mais elementar sentimento da justiça. A sentença é proferida no
processo das partes, traduzindo-lhes a vontade da lei componedora da lide.
Por isso, tem força de lei entre as partes. Terceiros estranhos ao processo,
entretanto, os quais, até mesmo podem ignorar a existência deste, e cujos
direitos são regulados e tutelados pela lei, estão livres de subordinação à
sentença, que é lei entre as partes, e contra a qual poderão reagir quando
estas os prejudicar.
O problema, no direito romano de ordo judiciorum provatorum (período
das legis actiones e formulário), nem se colocava porque a sentença era
resultante de um acordo extraprocessual de submissão à decisão do
magistrado de modo que nem se cogitava de a coisa julgada atingir terceiros.
No terceiro período do processo romano(da cognitio extra ordinem), por ser a
sentença proveniente de poder estatal, em virtude da oficialização da justiça,
foi sentido o problema da repercussão da coisa julgada sobre terceiros, mas
que ficavam excluídos de seus efeitos porque a sentença não podia ter valor
absoluto, porquanto dirigia ao bem da vida trazido pelas partes de acordo com
a livre apreciação do juiz. Formula-se, então, a máxima ers inter alios acta nec
nocete nec prodest(a decisão proferida perante outros nem prejudica nem
beneficia).
No direito germânico, que dominou a Europa após a queda de Roma
Ocidental, as decisões eram proferidas pelo povo e mais tarde pelos escabinos
perante o povo, sendo que estes se limitavam a interpretar a vontade divina
por meio de ordálias ou juízos divinos. Como decisão, era alcançada perante
todos, sendo resultante da vontade de Deus, tinha valor absoluto e, portanto,
valia para todos.
No direito comum, no final da idade média, o problema era tratado
segundo situações casuísticas, admitindo-se de certos terceiros, que tivessem
interesses secundários, pudessem ser atingidos pela coisa julgada, desde que
a relação jurídica decidida atingisse acessoriamente.
As teorias modernas procuram resolver o problema, primeiro tentando
sintetizar a posição de terceiros em relação às partes e, depois, sistematizar os
tipos de efeitos produzidos pela sentença, admitindo-se então, que os
efeitos reflexos atingissem terceiros, mas direitos Sá as partes. Porém, a
situação somente se esclareceu quando se distinguiu sentença e coisa
julgada.
A sentença, ato de conhecimento e vontade de poder estatal
jurisdicional, quando é editada, se põe no mundo jurídico e, como tal, produz
alterações à relação jurídica de que são titulares terceiros, porque as relações
jurídicas não existem isoladas, mas inter-relacionadas no mundo do direito.
Assim, os efeitos da sentença podem atingir tanto as partes quanto a
terceiros. Todavia, estes efeitos são, tão-somente, imutáveis para as partes,
isto é, a imutabilidade dos efeitos da sentença, que é a coisa julgada, só atinge
as partes envolvidas na lide.
Pode ocorrer, porém, que certas relações jurídicas, por dependerem de
outra que está sob julgamento, conforme a decisão proferida, se transmudem
de tal forma no plano de direito material que terceiro se vê atingido
inevitavelmente pelas conseqüências da sentença. Isso, porém, não quer dizer
que ele tenha sofrido a imutabilidade da coisa julgada; sofreu, sim, os efeitos
civis da sentença e em virtude da modificação produzida no plano material não
tem ele ação ou direito de recompor a ação anterior.
Quanto ao grau de influência dos efeitos sobre suas relações jurídicas,
podemos classificar das seguintes maneiras:
a) terceiros absolutamente indiferentes: estes nada tem a fazer porque
não sofrem nenhuma influência da sentença proferida entre outros, são
totalmente estranhos à relação deduzida em juízo.
b) terceiros com interesse de fato: estes, também, nada podem fazer
porque não serão atingidos em relações jurídica, mas apenas em expectativas
de fato; por sofrerem prejuízos de fato, mas não de direito em razão a
sentença serão equiparados aos primeiros.
c) terceiros juridicamente interessados: com interesse igual ao das
partes, como por exemplo, o dono de um imóvel que toma conhecimento que
seu bem foi objeto de ação reivindicatória entre outros e o autor ganhou a
demanda e, portanto, a declaração de propriedade do imóvel: nesse caso, o
terceiro que não é atingido, como se disse, pela imutabilidade da coisa julgada,
tem ação própria (ou teria a oposição dependendo da época e de seu
conhecimento), para pleitear o seu direito contra quem se diz atualmente dono,
ação, aliás, da mesma natureza que gerou a sentença sobre o bem. O terceiro,
nesta situação não irá discutir a sentença anterior, nem pretender desfazê-la,
mas sim obter uma nova que proclame o seu direito próprio.
Assim, terceiros, se juridicamente prejudicados pela eficácia natural da
sentença, poderão insurgir-se contra esta (inclusive em outro processo),
porquanto não é atingido pela coisa julgada material.
Este é o entendimento que deve ser dado ao art. 472, primeira parte. Do
Código, que, de maneira simples estabelece: “a sentença faz coisa julgada
às partes entre as quais é dada, na beneficiando, nem prejudicando
terceiros”. Significa esta regra que terceiros não são alcançados pela
imutabilidade e indiscutibilidade da sentença, o que permite a estes vir a
discutir em juízo a questão já resolvida por sentença protegida pela autoridade
de coisa julgada.
O dogma da limitação subjetiva da coisa julgada às partes vem sendo
rompido, no processo moderno, nas ações coletivas ajuizadas em defesa de
interesses metaindividuais (ambiente, consumidor, proteção do patrimônio
histórico, cultural e artístico etc.). No Brasil, após a coisa julgada erga omnes
da Ação Popular, a lei da Ação Civil Pública e, por último, o Código de Defesa
do Consumidor vieram ampliar os limites subjetivos da coisa julgada,
estruturando-os de acordo com o resultado do processo, ou seja, secundum
eventum litis – art. 103 CDC, aplicável à Ação Civil Pública (ex vi art. 21 desta).
Assim, conforme o caso, a autoridade da sentença poderá alcançar a todos,
para beneficiá-los (salvo no caso de improcedência por insuficiência de
provas), ou ser utilizado apenas em favor dos membros da classe, sem
possibilidade de prejudicar suas pretensões individuais.
Nas ações de estado, conforme os princípios e a lei, a sentença produz
coisa julgada às partes entre as quais é dada, não em relação a terceiros. Mas,
por doutrina tradicional, as sentenças, nas causas relativas ao estado das
pessoas, desde que proferidas entre legítimos contendores, tem eficácia erga
omnes e, portanto, a coisa julgada atingiria terceiros.
O Código de Processo Civil procurou atenuar essa conclusão conflitante
com princípio aludido, dispondo no art. 472, segunda parte: “nas coisas
relativas ao estado de pessoas, se houvessem sido citados no processo,
em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz
coisa julgada em relação a terceiros”.
Entende-se por terceiro juridicamente prejudicado, toda pessoa que sem
ter sido parte no processo, for titular de alguma relação jurídica material
afetada pela decisão da causa (sentença proferida inter alios). É terceiro
juridicamente prejudicado, por exemplo, o fiador com relação à sentença que
decidiu a relação jurídica entre credor e afiançado. Mas é terceiro prejudicado
apenas de fato (e não juridicamente) o credor, com relação ao devedor vencido
numa ação reivindicatória.
Condição sine qua non, portanto, para que estes sejam atingidos pela
coisa julgada, é que sejam citados para a ação, em litisconsórcio necessário,
todos os envolvidos, desde que diretos e juridicamente interessados. Aliás, à
vista dessa condição, não há terceiros que possam considerados prejudicados
pela sentença.
O Código adotou a concepção doutrinária dominante no direto moderno
que, no que concerne ao estado das pessoas, a sentença tem que valer para
todos porque o estado da pessoa está ligado de tal forma à personalidade que
ninguém pode ter um estado apenas para alguns e não para outros, ou seja,
ser casado perante alguns e divorciado perante outros.
Entre as legislações modernas, algumas acolhem expressamente a
validade da coisa julgada perante terceiros, tais como: o Código de Processo
Civil Português, art. 674, que inclusive adotou os requisitos do Direito Romano
para a produção da eficácia erga omnes; o espanhol (Código Civil, art. 1252,
par. 2º); o alemão (ZPO, arts. 629 e 643), para as causas matrimoniais e de
filiação justificando a doutrina tal solução em virtude da natureza especial do
direito litigioso, do interesse público e do predomínio do princípio inquisitivo.
Na França e na Itália os códigos são omissos, mas a doutrina acolheu o
princípio romano. No direito Canônico nega-se, mesmo para as partes, a coisa
julgada nas questões de estado.
CAPÍTULO VII
AÇÃO RESCISÓRIA
A formação da coisa julgada tem o efeito de sanar todas as invalidades
intrínsecas do processo, quais sejam: nulidades absolutas ou relativas e
anulabilidades. Porém, em certos casos, no momento do trânsito em julgado
da sentença há o surgimento de um novo tipo de vício, ao qual se denominou
rescindibilidade. Este tipo de vício é passível de ataque através de um remédio
muito específico, o instituto jurídico denominado ação rescisória.
A ação rescisória faz desaparecer a coisa julgada, o que implica
remoção do obstáculo à nova discussão acerca daquilo que já havia sido
decidido por sentença definitiva. Com o desaparecimento do obstáculo, através
da rescisão da sentença coberta pela autoridade de coisa julgada, caberá ao
órgão julgador da ação rescisória, em diversas oportunidades, rejulgar a
matéria objeto de apreciação da sentença rescindida.
Assim sendo, pode-se definir a ação rescisória, conforme nos ensina o
mestre Barbosa Moreira, como “ação por meio da qual se pede a
desconstituição de sentença transitada em julgado com eventual regulamento,
a seguir, da matéria nela julgada”. Em outras palavras, a ação rescisória visa,
precipuamente, desconstituir materialmente sentença transitada em julgado.
Há que se notar que, a ação rescisória não pretende a anulação da
sentença, eis que não se trata de caso de nulidade ou anulabilidade. O que se
quer, com tal demanda, é a rescisão da sentença; sendo que sentença
rescindível é aquela transitada em julgado, que possui vício elencado
expressamente em lei e capaz de autorizar sua rescisão.
A ação rescisória não é recurso, mas ‘ação autônoma de impugnação’.
Isso se explica pelo fato de que a ação rescisória só é cabível após a formação
da coisa julgada, ou seja, após o término do processo; já o recurso, por sua
vez, ocorre na mesma relação processual em que se prolatou a decisão
atacada. Portanto, temos que, a ação rescisória faz surgir processo novo,
diverso daquele em que foi proferida a sentença a ser rescindida.
Trata-se, a ação rescisória, de demanda cognitiva, razão pela qual o
processo que se forma no momento de seu ajuizamento á processo de
conhecimento. A decisão de procedência do juízo rescisório será, conforme o
caso, meramente declaratória, constitutiva ou condenatória.
No tocante ao cabimento da ação rescisória, a mesma é cabível, em
nosso sistema, somente contra sentenças de mérito abrigadas pela autoridade
de coisa julgada. Esse entendimento é extraído do texto do art. 485 do CPC, o
qual, em seu bojo determina: “...a sentença de mérito transitada em
julgado, pode ser rescindida quando...”. Portanto, torna-se incabível a
propositura de ação rescisória para atacar sentença terminativa, levando-se
em consideração que tal demanda seria juridicamente impossível (em
consonância com a corrente majoritária da doutrina pátria, encabeçada pelo
ilustre Barbosa Moreira).
Cabe salientar que as sentenças julgadas rescindíveis são transitadas
em julgado, uma vez que a coisa julgada é requisito para que possa considerar
uma sentença como rescindível, pois antes do trânsito em julgado ela será tão
somente nula ou anulável. Assim, após a preclusão das vias recursais, a
nulidade encontrar-se-á sanada, podendo ocorrer, então, a rescindibilidade.
Quanto as hipóteses, de rescindibilidade da sentença, estas são
expressamente previstas por lei, e devem ser interpretadas restritivamente, eis
que a possibilidade de ataque à coisa julgada substancial é de todo
excepcional. Desta forma, apenas nos casos elencados no art. 485 do Código
de Processo Civil é que poderá admitir a rescisão da sentença.
A primeira de tais hipóteses é a da sentença proferida por juiz que tenha
dado por prevaricação, concussão ou corrupção. (segundo disposto no art.
485, inciso I, CPC). A prática, pelo juiz, de qualquer destes ilícitos, torna
rescindível a sentença.
Nesta hipótese de rescindibilidade, não se poderá julgar improcedente
o pedido de rescisão da sentença sob o argumento de que a mesma é justa,
isso é, tenha dado adequada solução é demanda que apreciou. A sentença
deverá ser rescindida e, em seguida, no Juízo rescisório, o Tribunal deve julgar
novamente a causa, podendo, obviamente, dar solução de idêntico teor ao da
sentença descontinuada.
Em tal caso, previsto no inciso I do Art. 485, em consonância ao preceito
do ilustre Humberto Theodoro Júnior “caberá ao juízo competente para
conhecer da Ação Rescisória, tão somente, verificar se ocorreu algum
daqueles ilícitos, e, em caso positivo, rescindir a sentença”, (THEODORO
JUNIOR, Humberto, 1997, pág. 640).
Finalmente, ainda com relação ao inciso I do art. 485 do CPC, há que se
afirmar que a sentença de primeiro grau de jurisdição proferida por juiz que
tenha praticado algum dos ilícitos presentes no supracitado artigo, não será
rescindível se tiver sido julgado algum recurso contra a mesma, pois neste
caso o acórdão substituiu a sentença, desaparecendo, assim, o ato ilegal. Em
sentido contrário a tal corrente dominante, entendendo que nesta hipótese é
rescindível o acórdão, uma vez que a prestação jurisdicional foi maculada.
Temos a posição defendida pelo doutrinador Ernane Fidélis dos Santos
(Manual de Direito Processual Civil, 4ª 6 ed., vol. I, São Paulo. Ed. Saraiva,
1996, pág. 583).
Com relação ao segundo motivo à rescindibilidade da sentença, o
mesmo trata do caso de a sentença ter sido proferida por juiz ou por juízo
absolutamente incompetente, conforme a inteligência do artigo 485, inciso II,
CPC.
Através da leitura do dispositivo ora em análise, pode-se verificar que
apenas o impedimento, e não a suspeição, gera a mencionada
rescindibilidade. Isto ocorre pelo fato de o sistema processual em vigor
considerar o impedimento vício mais grave que a suspeição, determinando,
desta forma sua sobrevivência ao trânsito em julgado.
Assim, também, o Código de Processo Civil dá tratamento diferenciado
às incompetências absoluta e relativa; tendo em vista que somente aquela
permite a rescisão da sentença definitiva coberta pela autoridade de coisa
julgada substancial. Tal fato se dá porque a incompetência relativa, inerte o
demandado em argüi-la, provoca a prorrogação da competência, ou seja, o
juízo relativamente incompetente tornar-se-á competente se a incompetência
não for excepcionada a tempo.
Há que se ressaltar que no caso de ações rescisórias propostas com
fundamento no inciso II do artigo 485, não ocorrerá o chamado juízo rescisório,
visto que o Tribunal deve, após rescindir a sentença (atuando como juízo
rescindente), remeter os autos ao juízo competente para que julgue novamente
a causa.
Seguindo no estudo do artigo 485, prevê seu inciso III como causa da
rescindibilidade da sentença, o fato de a mesma ter sido resultado “de dolo da
parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as
partes, a fim de fraudar a lei”.
No tocante à primeira, cabe salientar, inicialmente, que ocorre o dolo
referido toda vez que a parte vencedora, faltando a seu dever de lealdade e
boa-fé (vide inciso II do artigo 14 do CPC), haja impedido ou dificultado a
atuação processual do vencido, ou influenciando a formação do juízo do
magistrado, afastando-o da verdade; neste sentido leciona o Mestre Barbosa
Moreira.
Deve-se afirmar, ainda, na esteira dos ensinamentos de Humberto
Theodoro Junior que:
É fundamental que o resultado final do processo tenha sido o que foi
em razão do dolo, isto é, se não tivesse havido comportamento
doloso, o resultado do processo teria sido diverso; caso contrário, a
sentença não poderá ser rescindida. (THEODORO JUNIOR,
Humberto, 1997, pág. )
Hipótese diversa, mas que recebeu tratamento no mesmo dispositivo de
lei, é a da colusão processual. Tal instituto jurídico se encontra definido no art.
129 do CPC, segundo o qual “convencendo-se pelas circunstâncias da
causa, de que autor e réu se serviram do processo para praticar ato
simulado ou conseguir fim proibido por lei, o juiz proferirá sentença que
obste aos objetivos das partes”, ou seja, a colusão processual e o fato
consistente na utilização do processo, pelas partes, para praticar ato simulado
ou atingir fim ilícito.
O artigo 485, inciso III, do Código de Processo Civil, leva ao extremo a
intenção do legislador de combater a colusão processual, permitindo a
rescisão da sentença de mérito que tenha sido proferida por juiz o qual não
verificou a colusão no curso do processo original. De certo, deve-se observar
que ambas as partes estejam de acordo quanto à utilização do processo para
alcançar fim ilícito ou praticar ato simulado, como bem nos ensina o nobre
Pontes de Miranda.
Já o inciso IV do art. 485, ora em estudo, traz em seu bojo o
entendimento de que é passível de ser rescindida a sentença que “ofender a
coisa julgada”. Obviamente, trata-se da hipótese decorrente da situação
jurídica de imutabilidade e indiscutibilidade do que ficou decidido por sentença
de mérito coberta pela autoridade da coisa julgada material.
Conforme notamos durante o presente trabalho, a coisa julgada
substancial (ou material) impede qualquer nova discussão e decisão a respeito
do que ficou coberto por seus limites, sendo proibida a prolação de qualquer
sentença que desconsidere a coisa julgada; pouco importando se a nova
sentença tem conteúdo igual ou diverso de sentença transitada em julgado.
Assim sendo, ofende a coisa julgada a sentença que decide demanda
idêntica àquela que gerou a sentença firme. E, da mesma forma haverá ofensa
à coisa julgada se, em julgamento de questão diversa da que fora decidida por
sentença transitada em julgado, mas a ela subordinada, não se levar em
consideração o que se decidiu acerca da questão subordinante.
Segundo o disposto no inciso V do artigo 485 do CPC, é rescindível a
sentença que “violar literal disposição de lei”. Este dispositivo trata da
violação do Direito em tese, o qual ocorre quando o órgão prolator da sentença
rescindenda afronta o direito positivo, entendendo-se a palavra “lei”, contida
em seu texto, no sentido amplo.
Seguindo o entendimento majoritário, em especial o ensinamento do
Ilustre Barbosa Moreira, temos que tanto as normas jurídicas materiais quanto
as processuais, uma vez violadas, permitem a rescisão da sentença.
Também é caso de rescindibilidade da sentença quando esta “se
fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal
ou seja provada na própria ação rescisória”, nos termos do artigo 485,
inciso IV, do Código de Processo Civil. Vale lembrar que é preciso verificar se
a sentença subsistiria sem a prova apontada como falsa, ou seja, somente a
prova falsa alicerce da sentença é que permitirá a rescisão.
Admite-se, ainda, a rescisão da sentença de mérito coberta pela
autoridade da coisa julgada, no caso previsto no inciso VII, do art. 485, pelo
qual e rescindível a sentença quando, “depois da sentença, o autor obtiver
documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso,
capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável”.
Cabe ressaltar que inobstante o referido artigo, em seu inciso VII, falar
em “autor” para se referir, obviamente, àquele que propõe a ação rescisória,
este não será, necessariamente, o autor da demanda original.
Quanto à referência a “documento novo”, não se pode concluir de que
trata a lei de documento cuja formação ocorreu após a sentença. Pelo
contrário, o documento que permite a rescisão da coisa julgada já deveria
existir ao tempo da prolação da sentença que se quer atacar.
No entanto, há que se dizer, ainda, que existe um requisito temporal a
ser observado, isto é, exige-se que o documento novo tenha sido obtido depois
da sentença.
Nos termos do artigo 485, VIII, do CPC, é rescindível a sentença
transitada em julgado “quando houver fundamento para invalidar
confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença”.
Finalmente, o inciso IX do art. 485 permita a rescisão da sentença de
mérito no caso de ter a mesma se fundado em “erro de fato, resultante de
atos ou de documentos da causa”. Lembrando, ainda, que segundo disposto
nos parágrafos 1º e 2º do supracitado artigo, respectivamente, “há erro,
quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar
inexistente um fato efetivamente ocorrido” e “que não tenha havido
controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato”.
CONCLUSÃO
Os limites objetivos da coisa julgada visam dar uma ‘maior apreciação’
aos litígios a serem solucionados e equacionados pelo Poder Judiciário. Essa
maior apreciação se refere à fundamentação da sentença, que, em regra, não
faz coisa julgada, e, portanto, deve, em princípio, ser reavaliada se novamente
for alegada uma questão prejudicial ou uma verdade de fato que antes já fora
decidida.
O fato é que a importância desta questão prejudicial decidida na
fundamentação pode variar de processo para processo, dependendo do
posicionamento do juiz. Isso dá maior mobilidade à convicção deste, não
ficando atrelado a uma decisão anterior, que pode não vir a ser a mais correta.
Só que a regra do código nacional admite “exceções” que venham a dar maior
mobilidade à resolução de questões processuais que possam prender em
processos supervenientes, e tais “exceções” são chamadas Ações
Declaratórias Incidentais e Autônomas, que estendem a incidência da coisa
julgada à parte da fundamentação da sentença, impedindo discussões em
processos futuros.
Assim, temos a consagração dos princípios da economia e da
celeridade processual nos quais o Processo Civil deve se inspirar com o
objetivo de propiciar às partes uma justiça barata e rápida.
Desse modo, se uma situação jurídica sofrer o risco de ser questionada
por várias vezes, aquele que for o interessado (seja autor, réu ou ambos) pode
propor uma ação em que se declare tudo que tivesse sido decidido
anteriormente, fazendo coisa julgada no tocante a quaisquer questionamentos
futuros. De tal forma, aquilo que fora decidido teria a eficácia de ser imutável e
indiscutível.
A Ação Declaratória Autônoma, com mesma função e objeto da Ação
Declaratória Incidental, ou seja, a declaração de uma relação jurídica, que já
fora argüida e decidida anteriormente, se diferencia desta última, pelo fato do
juízo competente para julgar a questão prejudicial, seja diverso do juízo que
decide na ação principal, quando a divergência de competência seja em razão
da matéria.
Os limites subjetivos da coisa julgada advêm de um princípio romano,
que diz que a sentença só tem eficácia da coisa julgada entre as partes
vinculadas à ação. Só que este princípio, hoje, é considerado uma meia-
verdade, porque a coisa julgada na sentença pode atingir terceiros.
A tradição remanescente do Direito Romano e que serviu de alicerce
para o nosso direito posto, era consubstanciada em demandas individuais, ao
contrário do que ocorre hodiernamente no direito contemporâneo nacional e
comparado, onde se insurgem fenômenos adstritos ao próprio
desenvolvimento da sociedade e que visam à proteção dos direitos difusos
através de demandas de interesses coletivos e sociais, as chamadas ações
coletivas.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
AMARAL, Moacyr dos Santos. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil.
21ª ed. São Paulo, Saraiva, 1996.
AZAMBUJA, Carmem. Rumo a uma Nova Coisa Julgada. Porto Alegre. Ed.
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MOREIRA, José Carlos Barbosa. Eficácia da sentença e autoridade da coisa
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NERY JUNIOR, N. NERY, R.M.A. Código de processo civil comentado e
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dos Tribunais, 1997.
THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 22ª ed.
Ver. Atual., 1º vol. Rio de Janeiro, Forense, 1997.
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 7
SUMÁRIO 8
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I
REVISÃO DA LITERATURA 11
CAPITULO II
CONCEITOS E CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES 13
2.1 – Justificação ou fundamentação da coisa julgada 17
CAPITULO III
COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL 21
3.1 – Decisões que não produzem coisa julgada material 25
CAPITULO IV
LIMITES OBJETIVOS DA COISA JULGADA 26
4.1 – Motivos da sentença 29
4.2 – Verdade dos fatos 31
4.3 – Questões prejudiciais 32
CAPITULO V
AÇÃO DECLARATORIA INCIDENTAL 34
5.1 – Questões prejudiciais 41
5.2 – Natureza e objetos da ação declaratória 43
5.3 – Legitimidade para propor ação declaratória incidental 44
5.4 – Finalidade da ação declaratória incidental 47
CAPITULO VI
LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA 48
CAPITULO VII
AÇÃO RESCISORIA 55
CONCLUSÃO 64
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 66
ÍNDICE 68
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
Título da Monografia: COISA JULGADA
Autor: Adilson Muniz Moreno
Data da entrega: 06/10/2008
Avaliado por: Conceito: