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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
ERRO MÉDICO
Por: Juliana Andrade Nunes
Orientador
Prof. Dr. Sérgio Ribeiro
Rio de Janeiro
2004
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
ERRO MÉDICO
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”
em Direito do Consumidor
.
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AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a Deus, que em meus sonhos e
preces nunca deixou de ser real, meu mais profundo agradecimento.
Aos meus pais, pelo imenso apoio e incentivo que sempre me deram.
A Lara, minha amiga e companheira nessa jornada, com a qual pude trocar e
dividir idéias e conhecimentos.Além de ter sido uma grande companhia nessas
muitas idas e vidas ao centro do Rio.Com certeza sua presença tornou os
obstáculos menores...
A vocês, mestres, muita obrigada por contribuírem para a realização deste
propósito.
E aos demais funcionários desta Casa, meus agradecimentos pela dedicação
no desempenho de suas imprescritíveis funções, certo de que farão parte de
minhas lembranças.
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DEDICATÓRIA
Aos meus pais, que me deram a vida e me ensinaram a vivê-la com dignidade,
não bastaria um obrigado.A vocês, que me iluminaram os caminhos obscuros
com afeto e dedicação para que eu os trilhasse sem medo e cheio de
esperança, não bastaria um muito obrigado.A vocês, que se doaram inteiros e
renunciaram aos seus sonhos, para que, muitas vezes eu pudesse realizar os
meus, não bastaria um muitíssimo obrigado.A vocês, pais por natureza, por
opção e amor, não bastaria dizer que não tenho palavras para agradecer tudo
isso. Mas é o que acontece agora, quando procuro sofregamente uma forma
verbal de exprimir uma emoção ímpar.Uma emoção que palavras dificilmente
traduziriam.
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“Que os médicos se confortem: o exercício de sua arte não está em perigo; a
glória e a reputação de quem a exerce com tantas vantagens para a
Humanidade não serão comprometidas pela culpa de um homem que falhasse
sob o título de Doutor”.
Procurador-Geral Dupin, da Corte Civil do Tribunal de Cassação de Paris,
início do Século XIX.
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RESUMO A presente monografia trata-se de um estudo sobre a relação entre o prestador
de serviço da área médica sob a ótica da relação de consumo.
O Código de Defesa do Consumidor, desde seu surgimento, vem sendo cada
vez mais utilizado e aplicado nas relações jurídicas e nos trouxe, sem dúvidas,
inovações significativas e modernidade ao direito brasileiro.
Tal estudo despertou a atenção principalmente em virtude das peculiaridades e
vicissitudes que tornam a profissão nas áreas biológicas, única e incomparável
a outros ramos de atividade exercida por profissionais liberais.
É, sem duvida uma atividade oferecida por um prestador de serviço.No entanto,
não se compara a demais por vários motivos: entre os quais, pela participação
e atuação do próprio paciente no que tange ao sucesso ou insucesso do
tratamento.Ou ainda pelo caráter não exato da ciência médica, que se mostra
limitada ao âmbito do conhecimento.Ou, pela própria peculiaridade e resposta
diversa apresentada por cada organismo humano, ainda que se lhe aplique
tratamentos uniformes.
Por estes e outros inúmeros aspectos, o serviço prestado por este profissional
liberal deve ser analisado de forma ímpar, para a apuração de sua
responsabilidade na esfera cível.
Procurou-se colacionar diversos posicionamentos, ainda que divergentes, de
diversos autores.
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Analisemos, pois, com detalhes a relação estabelecida entre este profissional e
o consumidor dos seus serviços, os tipos de erros médicos, a forma de
responsabilizar e punir tais erros.
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METODOLOGIA
Os métodos que levam a elaboração deste trabalho foram leituras de
vários livros, jornais, revistas especializadas, pesquisas à internet e troca de
informações e entrevista a alguns médicos, advogados e juízes.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO- 10
CAPÍTULO I 14
CAPÍTULO I 30
CAPÍTULO III- 42
CAPITULO IV- 46
CAPITULO V- 52
CAPITULO VI- 55
CAPITULO VII 56
CONCLUSÃO 72
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 83
ANEXO 78
ÍNDICE 85
FOLHA DE AVALIAÇÃO 88
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INTRODUÇÃO
Desde o início da vida em sociedade, e logicamente, desde que o homem
passou a assimilar técnicas de cura e diagnósticos dos males que atormentam
a sua vida e a de seu semelhante, a humanidade passou a ver os médicos
como verdadeiros deuses, entidades divinas cuja responsabilidade maior é de
livrar o mundo dos males que o afligem e devolver a paz, segurança e,
evidentemente, a saúde perdida.
No Brasil, estima-se que existam, hoje, cerca de dez mil processos tramitando
nos tribunais contra médicos acusados de falta de ética e profissionalismo na
prática da medicina, em sua maioria argüindo pela responsabilidade civil do
requerido.
Contudo, a problemática desta imensa responsabilidade sobre a área médica
traz repercussões penais, civis e administrativas, as quais nascem em
decorrência de atos falhos cometidos pelo profissional e que acabam gerando
conseqüências danosas a seus pacientes.
Verificam-se hoje freqüentes casos de omissão por parte dos profissionais da
área de saúde, bem como erros, cirurgias desnecessárias ou indevidas,
tratamento impróprio, extrações ou transplantes imperfeitos, prescrição e
colocação de aparelhos inadequados e outras desagradáveis conseqüências
de imperícia, negligência ou imprudência.
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Para fins efetivos, o ato médico deve ser configurar livre de qualquer espécie
de omissão que possa ser caracterizada como inércia, indiferença,
passividade, descaso ou abandono do paciente.
Quanto às entidades hospitalares, soma-se ao quadro já descrito os problemas
de dificuldades de acesso agravadas com constantes greves decorrentes de
reivindicações salariais, cobrança coercitiva antecipada, não atendimento, não
atendimento por falta de elementos de cunho formal, quando não atendimento
imperfeito, etc.
As falhas médicas vêm aumentando em parte justamente por este quadro
degenerado do sistema de saúde do país. A péssima remuneração dos
médicos e a falta de condições ideais de trabalho são os motivos apontados
pelos profissionais, bem como o stress constante, que os torna mais passíveis
de falhas e cometimento enganosos.
Conseqüentemente, o que ocorre com os pacientes também vítimas desses
infortúnios sofridos por muitos médicos são, não raro, mortes, lesões
irremediáveis, choques, desgastes emocionais e outras tantas perturbações
aos doentes e a seus familiares, que constituem, sob o ponto de vista jurídico,
quando culpado o agente, ou a entidade, atos ilícitos, caracterizando violações
aos direitos da personalidade humana e sancionável em diferentes níveis: civil,
penal e administrativo.
Tangenciando estes fatos, ocorre a responsabilidade médica, ou seja, a
obrigação do profissional em sofrer as conseqüências das faltas por eles
cometidas o exercício da sua especialidade.
A responsabilidade médica como é aceita hoje tem os seus fundamentos na
moral e na legislação.
Moralmente os seus alicerces são a consciência e a observância lei natural,
Consciência é a capacidade de autocrítica moral que preside a elaboração dos
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critérios de conduta, de ação, e de julgamento dos valores.A paz de espírito, a
consciência tranqüila é o desejo constante dos que agem com
responsabilidade moral.
O fim existencial indica, juntamente com a razão moral, a retidão da natureza,
isto é, o modo correto de viver, e garante a sobrevivência orgânica e
psíquica.O homem tem vontade racional, visando imperativos da consciência e
tendência para valores, tento muito mais dentro de si do que o conhecimento
intuitivo dos animais.Apreende a realidade e aperfeiçoam conhecimentos
instintivos.O conhecimento do bem e do mal e a percepção imediata de certas
regras de condutas, como a gratidão, a fidelidade, a honestidade, a justiça etc.
é que estabelecem a consciência moral.
FATORES DE RISCO
Não há como se falar em erro médico sem mencionar antes alguns fatores que
podem levar à configuração do ato lesivo.Inúmeras podem ser as
circunstâncias que acarretam o erro, mas convêm destacar algumas, a título
ilustrativo, a saber:
1- Péssimas condições para pleno e bom exercício da medicina, variando
desde a falta de recursos materiais até o excesso de pacientes diante de
um número de profissionais disponíveis para o atendimento de toda a
massa que busca orientação e aconselhamento.
2- Formação médico-universitária inapropriada ou deficiente diante do
péssimo sistema de ensino vigente em algumas instituições do país,
bem como a acomodação do profissional que não procura especializar-
se e atualizar se cada vez mais em sua área profissional.
3- Interesses meramente comerciais, onde o paciente é visto como um
polpudo cheque ou notas de dinheiro seja por iniciativa isolada do
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médico em especialidades rendosas ou em conjunto por meio de
cooperativas ou empresas médicas comprometidas com o lucro.
4- O baixo nível salarial dos profissionais empregados de empresas
públicas.
5- O alto nível de stress diante da realidade sócio-econômica do país e das
péssimas condições de trabalho e emprego.
6- Distorções e desorganização do sistema de saúde pública, que
acarretam complexas implicações de ordem ética e legal.
7- A falta de compromisso do médico.
8- Precária fiscalização do exercício profissional por parte das entidades
de classe, que nem sempre procuram ajustar o profissional às normas
éticas que regem seu ofício.
Existem outros fatores, mas acima se destacam os mais preocupantes e
vistos como diretamente ligados à maioria dos casos de erro médico.
CAPÍTULO I
ERRO MÉDICO
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1-Conceito
O Direito Brasileiro considera o contrato entre um médico e um paciente
como sendo um acordo bilateral de meios e não de fins, ou seja, o
profissional se compromete a tratar do paciente sem a obrigação de cura-lo,
fazendo uso de todo o seu conhecimento técnico-científico e oferecendo o
melhor de se para alcançar os melhores resultados possíveis. Assim, não
tem o médico a obrigação de curar, mas sim de fazer o possível para
melhorar a saúde do paciente.
Entretanto, quando se trata de cirurgia plástica visando ao embelezamento
e/ou rejuvenescimento estético, essa obrigação de meios, no entender de
alguns tratadistas do direito civil pátrio, transforma-se em obrigação de
resultados.
Convém, portanto, definir a cirurgia plástica como sendo: a subespecialidade
do ramo da medicina geral que tem por finalidade, modificar, reconstruir,
reconstituir ou embelezar parte externa do corpo deformada por
enfermidade, traumatismo ou anomalia congênita, reunindo o nobilíssimo
ramo da medicina que trata de doenças por meio de cirurgia, com a beleza
da arte de improvisar e criar.
Esta finalidade pode ser necessária e reparadora ou puramente estética.
O que põe em debate é concluir se a cirurgia plástica envolve obrigação de
meio ou de resultado.Questão está ainda muito controvertida, tanto na
jurisprudência quanto na doutrina.
Baseado na teoria da culpa, a ser analisada a seguir, é que Júlio Cezar
Meirelles Gomes e Genival Veloso França definem “erro médico” em sua
obra “Erro Médico”.
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“Erro Médico é a conduta profissional inadequada que supõe uma
inobservância técnica, capaz de produzir um dano à vida ou à saúde de
outrem, caracterizada por imperícia, imprudência ou negligência”.
No nosso Direito Brasileiro para que se configure a responsabilidade civil do
médico por erro ocorre a necessidade de que se prove a conduta delituosa
no exercício da atividade médica.Cabe, pois ao paciente provar que o
profissional médico incorreu em culpa.
O erro médico também pode ser entendido como “o mau resultado ou
resultado adverso decorrente de ação ou omissão do médico”.
Quanto à configuração do erro do médico, pode-se citar a explicação de
GOMES:
“O erro médico pode se verificar por três vias principais. A primeira delas é o
caminho da imperícia decorrente da” falta de observação das normas
técnicas “, por despreparo prático” ou “insuficiência de conhecimento” como
aponta o autor Genival Veloso de França. É mais freqüente na iniciativa
privada por motivação mercantilista.O segundo caminho é o da imprudência
e daí nasce o erro quando o médico por ação ou omissão assume
procedimentos de risco para o paciente sem respaldo científico, ou,
sobretudo, sem esclarecimentos à parte interessada.O terceiro caminho é o
da negligência, trata com descaso ou pouco interesse os deveres e
compromissos éticos com o paciente e até com a instituição.O erro médico
pode se realizar também por três vias esconsas quando decorrente do
resultado adversos da ação médica, do conjunto de ações coletivas de
planejamento para prevenção ou combate às doenças”.
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O Manual de Orientação Ètica Disciplinar do Conselho Federal de Medicina
define o erro médico com sendo
“A falta do médico no exercício da profissão. È o mau resultado ou resultado
adverso decorrente da ação ou da omissão do médico, por inobservância de
conduta técnica, estando o profissional no pleno exercício de suas
faculdades mentais. Excluem-se as limitações pela própria natureza da
doença, bem como as lesões produzidas deliberadamente pelo médico para
tratar um mal maior. Observa-se todos os casos de erro médico julgado nos
Conselhos de Medicina ou na Justiça, em que o médico foi condenado, o foi
por erro culposo”.
1. 1. Responsabilidade Médica
O paciente vítima de erro médico pode acionar o profissional de três
esferas distintas: criminal, cível e junto ao Conselho Regional de Medicina.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, parágrafo 6°, bem
como o Código de Defesa do Consumidor, em prestadoras de serviços
públicos, assim, como para os prestadores de serviços em geral.Os
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dispositivos mencionados enquadram hospitais, clínicas, casas de saúde,
laboratórios, dentre outros, como responsáveis, independentemente da
comprovação de culpa, pelos danos alegados por aqueles que usaram seus
serviços.Para iss é necessário que o paciente ou vítima comprove que fez uso
do serviço oferecido pela empresa, e que sofreu um dano por conseqüência
desse serviço.Não importa se houve culpa por parte daqueles que prestou o
serviço na configuração do dano à vítima, pois reza da Carta Magna e o Código
de Defesa do Consumidor de que existe o dever de indenizar e, caso seja de
interessante da perda prejudicada, o posterior ingresso em juízo contra o
causador direto do dano.
Já a responsabilidade subjetiva, que se aplica aos médicos enquanto
profissionais liberais, existe o dever de indenizar se a vítima ou paciente
demonstrar, em juízo, que existiu culpa por parte do profissional contratado
para a realização do serviço médico, dentro dos fatores de culpa que nascem a
partir da negligência, imprudência ou imperícia.
Legalmente a responsabilidade médica está fundamentada nas normas
jurídicas civis e penais que consubstanciam os anseios comportamentais da
época.Baseia-se, entretanto, nos critérios da avaliação da culpabilidade do
agente a partir de duas teorias distintas: a teoria da responsabilidade subjetiva
ou teoria da culpa e a teoria da responsabilidade objetiva ou teoria do risco.
O Novo Código Civil Brasileiro, sancionado em janeiro de 2002,
mantém a teoria da culpa, o qual suprimiu o art. 1545 do antigo código.Os
dispositivos que versam sobre o tema são encontrados nos artigos 929 a 946,
que dispõem sobre a obrigação de indenizar, baseada em responsabilidade
civil.
A partir da teoria da culpa a responsabilidade civil do agente nasce da
comprovação de sua culpa.
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Em nossa legislação o Código de Defesa do Consumidor, vigente no
Brasil, é um bom exemplo de caracterização da responsabilização subjetiva,
pois que se verifique de culpa dos profissionais liberais, além do que
estabelece a inversão do ônus da prova em seu artigo 6°, incisos VI e VIII,
como sendo direitos básicos do consumidor.
“VI-a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais,
individuais, coletivos e difusos”.
VII: a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive a inversão do
ônus da prova, a favor, no processo civil, quando a critério do juiz, for
verossímil a alegação ou quando for ele hiposuficiente, segundo as regras
ordinários de experiência “.
Ainda o mesmo Código estabelece em seu artigo 14, parágrafo 4°: ” a
responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a
verificação de culpa”.
Já a teoria não exige a prova de culpa do agente, uma vez que esta
passa a ser presumida pela lei ou simplesmente se dispensa a sua
comprovação por quem quer que seja.Simplesmente não ocorre a necessidade
de se provar a culpa do agente para estabelecer o nexo causal entre conduta e
o dano causado, bastando apenas que o agente responsável por um ato lesivo
coloque em risco algum bem jurídico de outrem por meio de seu ato. Deve
existir apenas o nexo causal entre o ato lesivo de alguém e o prejuízo
acarretado a outrem. Os doutrinadores chamam esta teoria de teoria do risco
ou responsabilidade sem culpa, ou seja, todo aquele que danificar bem alheio é
responsável pelo seu ressarcimento, sem a necessidade de se comprovar a
culpa do agente, bastando existir apenas o nexo causal entre o ato lesivo e o
prejuízo ou dano.
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A partir destes pressupostos, compreende-se que há duas espécies de
responsabilidade médica no Direito Brasileiro: a ética (ou moral), e a legal,
subdividida em civil e penal.
O Código Civil Brasileiro adota a palavra dano em sentido amplo,
abrangendo tanto os danos materiais (lesão aos direitos reais e pessoais),
como os danos morais (direito da personalidade e da família).
1.1 1 –Responsabilidade Ética
O médico Hipócrates, na sua escola de Cós, deu muita ênfase aos
ensinamentos éticos da medicina.Seu juramento chega aos nossos
dias repetidos por milhares de médicos em todo o mundo, fazendo-os
sentir, na alma todo o peso da responsabilidade de sua profissão.
O princípio da responsabilidade é uma determinação natural das
sociedades humanas organizadas.Todo homem mentalmente são e
mentalmente desenvolvido é considerado responsável.E sobre o
médico recai a obrigação de sofrer as conseqüências de certas faltas
que comete no exercício de sua arte e que lhe podem acarretar ação
civil ou penal.
A ética é necessária para formar verdadeiro conceito das coisas e
saber dar-lhe estimação que cada um merece: saber distinguir a virtude
do vício, reprovando este e estimulando aquela.
Através dos tempos sempre houve a necessidade primaz de estruturar
eticamente a vida social e de organizar, também eticamente, as
profissões, porque fora da lei moral e dos bons costumes não pode
haver disciplina, trabalho organizado, confiança mútua e entendimento
entre os homens.
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A ética profissional médica tem entre nós sua legislação específica e
sua competente jurisdição especial: os Conselhos de Medicina e o
Código de Ética.E todos estão obrigados a seguir este código de
conduta moral no exercício de sua profissão, o qual em seus 87
artigos, ocupa-se dos deveres morais dos médicos no exercício do seu
ministério.A simples consciência moral do médico como guia para o
seu comportamento não é suficiente.Há, pois uma lei expressa a
observar.
1.1 2- Responsabilidade Civil
A responsabilidade civil do médico tem sua primeira aparição com a Lei
das XII Tábuas, onde se permitiu uma transação entre a vítima e o autor,
convertendo uma pena em uma indenização.
No Direito Brasileiro, a matéria está contida no artigo 186 do código
Civil: “aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito, ou causar prejuízo a outrem, ainda que exclusivamente moral,
comete ato ilícito”.
Desdobrando-se o art.186 do código Civil, acima transcrito, verificamos
que ele envolve algumas idéias que implicam a existência de alguns
pressupostos, ordinariamente necessários, para que a responsabilidade civil
emerja. Inicialmente a lei se refere a alguém que por ação ou omissão causa
dano a outrem.Surge, portanto, a menção a um agente que causa dano a
outrem através de ato comissivo ou omissivo.
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1.1 2.1-Pressupostos da responsabilidade civil: A)-ação ou omissão
lesiva do médico B)-dano injusto, de conteúdo pessoal, moral ou patrimonial;
C)-nexo causal, a relação de causa (ação), e efeito (dano).
O acórdão publicado na RT 694/84 traz um texto muito esclarecedor do
desembargador Sousa Lima:
“(...) a responsabilidade civil do médico não é idêntica à dos outros
profissionais, já que a sua obrigação é de meio e não de resultado, exceção
feita à cirurgia plástica. Se isso é assim não é porque o médico deva ser
considerado um privilegiado em relação aos outros profissionais, mas porque
lida ele com a vida e a saúde humana, que são ditadas por conceitos não
exatos, alguns até mesmo não explicados pela Ciência. Nestes termos, cabe
ao médico tratar o doente com zelo e diligência com todos os recursos de sua
profissão para curar o mal, mas sem se obrigar a faze-lo, de modo que o
resultado final não pode ser cobrado, ou exigido”.
No que diz respeito á ação lesiva, esta se caracteriza com a culpa, no
caso a imprudência, a negligência e imperícia.
O dano é toda ofensa ou prejuízo moral, material ou patrimonial que o
paciente possa sofrer em conseqüência do ato médico.
O nexo de cauda e efeito é a relação causal entre o médico e o dano.A
causa de um dano resultaria do somatório dos fenômenos sucessivos,
alcançando um determinado efeito prejudicial aos patrimônios pessoal e real do
indivíduo.
Além disso, toda doutrina sobre o assunto é unânime em afirmar que a
responsabilidade civil do médico é contratual, ou seja, a obrigação configurada
por meio de contrato escrito ou verbal entre o paciente e seu médico.
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Em suma, a responsabilidade civil nasce sempre que houver, por parte
de um agente, seja pessoa física ou jurídica, violação de um dever jurídico, e
dessa violação resultar um certo dano a outrem.
1.1 3-Responsabilidade Penal
Esta é a responsabilidade mais antiga do médico.Como foi visto
anteriormente, na época de Hamurabi (Babilônia 2.500 a.C.), o médico
respondia com a amputação das mãos pelo dano que viesse a causar a Lex
Aquília (Roma, 572 d.C) obrigava o médico a indenizar, aos senhores, os
danos causados aos deus escravos e aplicava-lhe a pena máxima no caso de
morte de um cidadão romano, mas também obrigava o médico a indenizar a
morte de um escravo sob seus cuidados e aquele que agisse com negligência,
imprudência ou imperícia poderia ser exilado ou deportado. No Egito, as regras
da arte de curar estavam contidas nos livros sagrados e, quando os médicos se
desviavam do cumprimento destas regras, estava, sujeito a inúmeras penas,
inclusive a de morte.E a matéria foi se desenvolvendo passo a passo coma
evolução gradativa das sociedades humanas.
Nos dias de hoje, a lei penal brasileira prevê diversas hipóteses da
responsabilidade penal do médico.No Código Penal vigente desde 1940,
estabelece-se:
Art.15-Diz-se o crime:
I-doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de
produzi-lo;
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II-culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência,
negligência ou imperícia.
Em ambas as questões, enquadrada-se outros dois dispositivos penais:
homicídio, descrito pelo artigo 121 do mesmo Código Penal e as lesões
corporais, no artigo 129.
Em qualquer fase de uma atuação médica: diagnóstico, prognóstico e
tratamento, pode haver erros que se caracterizam como culpa.
Quanto à negligência, imprudência e imperícia, tanto podem
apresentar-se como figuras criminais próprias ou antônomas, como
constituírem simplesmente circunstâncias agravantes de outros
crimes.Configura-se, geralmente, em atos, ou na omissão de providências que
deveriam ser tomadas pelo indivíduo no exercício de profissão, arte ou
ofício.Assim exige-se que cada um seja perito em seu ofício.
Se o profissional se dedica com afinco ao trabalho escolhido terá,
sempre, alargados os horizontes da sua dedicação, cada vez mais obrigados a
especializar-se para melhor capa citar-se.Assim, em cada atividade
profissional, o seu executor deve empregar constantes esforços de
aperfeiçoamento, em contato permanente com a evolução obtida no seu setor
de atividade especializadas.
A participação do médico no erro sempre se configura como culposa e
não dolosa.O que fugir dos fatores de negligência, imprudência ou imperícia
não se considera como sendo erro médico.
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Negligência, Imprudência e Imperícia.
A negligência, a imprudência e a imperícia são os fatores mais comuns que
levam ao erro médico e à posterior propositura de ações indenizatórias na
Justiça e na abertura de processos ético-profissionais nos Conselhos Regionais
de Medicina contra os médicos.
Imprudente seria a conduta positiva praticada pelo agente que, por não
observar o seu dever de cuidado, causasse o resultado lesivo que lhe era
previsível.Na definição de Aníbal Bruno, “consiste a imprudência na prática de
um ato perigoso sem os cuidados que o caso requer”.A imprudência é, portanto
um fazer alguma coisa.
A imprudência se caracteriza pelo risco tomado pelo profissional no
exercício de ser dever, optando por uma atuação de caráter perigos e
esquecendo-se dos cuidados necessários para alcançar o fim colimado: a
saúde do paciente.Muitos médicos praticam determinados atos sem disporem
de recursos necessários para se chegar ao sucesso do empreendimento,
podendo ser estes recursos materiais ou humanos.
Negligência, ao contrário, é um deixar de fazer aquilo que a diligência
normal impunha.Deriva do Latim negligentia, e significa um descuido, desleixo,
uma falta de diligência, incúria, preguiça, com uma falta de desatenção e um
profundo menosprezo.Ela se configura quando o profissional deixa de observar
os deveres impostos à execução de qualquer ato.Pode ocorrer quando o
doente é abandonado à própria sorte ou em mãos inexperientes, assim como
quando sofrer a omissão, a violação do dever de diligência e a impontualidade
do médico.
Imperícia deriva do Latim imperitia de imperitus, que significa
ignorante, inábil, inexperiente.Fala-se imperícia quando ocorre uma inaptidão,
momentânea ou não, do agente para o exercício de arte ou profissão.Diz-se
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que a imperícia está ligada, basicamente, à atividade profissional do
agente.Um cirurgião plástico, por exemplo, pode durante um ato cirúrgico,
praticar atos que, naquela situação específica, conduzam à imperícia.Com isso
não se quer dizer que esse profissional seja imperito, mas sim que, nesse caso
concreto, atuou com imperícia.
Associados às três figuras culposas anteriormente citadas, somam-se
as questões da péssima remuneração dos especialistas, principalmente os que
trabalham em hospitais públicos, o stress do profissional e os problemas
ocasionados por um imperfeito sistema de saúde, o qual termina sendo melhor
demonstrado em um setor de emergência, dificultado pelas más condições de
trabalho, de poder prestar o atendimento adequado e mais vulnerável às falhas
profissionais no momento de decidir sobre a conduta a ser seguida para o
auxilio do doente.
1.2- Da natureza da responsabilidade médica
Colocou-se na doutrina e ainda persiste, embora com menor
relevância, a questão da natureza jurídica da relação do médico e seus
pacientes, divididos os entendimentos sobre se tratar de uma relação
contratual ou delitual.
A professora Tereza Ancona Lopes de Magalhães examinou a matéria
em profundidade em artigo sobre a “Responsabilidade Civil dos Médicos e
colocou pá de cal sobre a questão, destacando que”:
“A discussão a respeito do enquadramento da responsabilidade médica
dentro da culpa contratual ou extracontratual está hoje superada. A doutrina e
a jurisprudência são francamente pela responsabilidade ex contratu do
médico”.
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Está é a regra geral, o que não impede que se verifiquem situações em
que tal responsabilidade é de natureza extracontratual.
Basta que se analisem as situações em que o atuar do médico ocorra
em situações emergenciais onde não preexistam possibilidades de
consentimento ou informação ás pessoas atendidas ou responsáveis legais v.g.
atendimento a acidentado em via pública; atendimento a incapaz sem o
consentimento de representante legal; atendimento contra a vontade do
paciente, como no caso de tentativa de suicídio.Há referências doutrinarias
também a situações onde se faz presente também um delito penal, como
mutilação inútil ou experimento sem fins lucrativos ou prejuízos materiais ou
morais que possam advir de uma visita médica etc.
Independentemente de ser o dano produzido dentro ou fora do
contrato, a obrigação de reparar persiste da mesma forma, daí porque a
doutrina não vislumbra senão diferença secundária entre as responsabilidades
dita contratuais e extracontratuais, apesar do Código Civil Brasileiro haver
separado os dois tipos de responsabilidade.
Tendo em vista a natureza muito especial do contrato de assistência
médica, de sorte a exigir prova de culpa pelo evento danoso, tanto na
responsabilidade contratual como na extracontratual, e uno é o conceito de
culpa para ambas as hipóteses.
Como assevera José de Aguiar Dias, em sua obra clássica a
responsabilidade do médico é contratual e que há casos em que esta
responsabilidade é extracontratual.
1.3- Contrato de meio e contrato de resultado
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A doutrina, na análise dos tipos de contrato, costuma dividi-los em
contratos de resultado e contrato de meio, classificação de relevantes efeitos
no plano material e, sobretudo no plano processual, em que opera uma total
mudança ao ônus da prova.
O fato de ser o contrato enquadrável numa das duas referidas espécies
influi sobre a definição do objeto do negócio jurídico, isto é, a configuração da
prestação devida, e, conseqüentemente, sobre a conceituação do
inadimplemento.
O fato de ser o contrato enquadrável numa das duas referidas espécies
influi sobre a definição do objeto do negócio jurídico, isto é, a configuração da
prestação devida, e, conseqüentemente, sobre a conceituação do
inadimplemento.
Na obrigação de resultado, o contratante obriga-se a alcançar um
determinado fim, cuja não-consecução importa em descumprimento do
contrato.
Na obrigação de meio, o que o contrato impõe ao devedor é apenas a
realização de certa atividade, rumo a um fim, mas sem ter o compromisso de
atingi-lo.O objeto do contrato limita-se à referida atividade, de modo que o
devedor tem de empenhar-se na procura do fim que justifica o negócio jurídico,
agindo com zelo e de acordo com a técnica própria de sua função; a frustração,
porém, do objetivo visado não configura inadimplemento, nem, obviamente,
enseja dever de indenizar o dano suportado pelo outro contratante.Somente
haverá inadimplemento, com seus consectários jurídicos, quando a atividade
for mal desempenhada.E o que se passa, em princípio, com a generalidade
dos contratos de prestação de serviços.
1.4-Natureza do contrato médico
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
28
O contrato de prestação se serviços médicos têm um objetivo comum:
a busca da cura do enfermo.Mas a ciência médica e a própria natureza do
paciente não permitem garantir que essa meta seja assegurada.Ambos se
empenharão na tarefa de perseguir esse objetivo, porém sem a certeza de
poderem alcança-lo.A prestação contratual do médico, então, cinge-se a pôr
seus conhecimentos técnicos à disposição do paciente, desempenhando-os
com zelo e adequação. Se cumpri tal prestação, o contrato terá sido cumprido,
malgrado o insucesso do tratamento, no tocante á meta de curar ou salvar o
doente.Ressalva a doutrina:
“Ao assistir o cliente, o médico assume obrigação de meio, não de
resultado. O devedor tem apenas que agir é a sua própria atividade o objeto do
contrato. O médico deve apenas esforçar-se para obter acura, mesmo que não
a consiga”.(kfouri Neto)
Também na jurisprudência o enfoque é o mesmo: entre o médico e o
cliente, há um inegável e autêntico contrato.Contudo, o fato de se considerar
como contratual a responsabilidade médica não tem, ao contrário do que
poderia parecer, o resultado de presumir a culpa.O médico não se compromete
a curar, mas a proceder de acordo com as regras e os métodos da profissão.
Se se tratasse se obrigação de resultado, como ocorre com a maioria
dos contratos, o profissional estaria obrigado a atingir o fim último visado pelo
ajuste.E falhando no seu intento teria descumprido a obrigação assumida.
O contrato médico apresenta-se, dentro do quadro geral das
obrigações negociais, como um contrato de prestação de serviços, que não se
rege pela legislação do trabalho, porque versa sobre atividade de profissional
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
29
liberal.A prestação devida é, da parte do médico, o serviço correspondente à
sua formação técnica, e, da parte do cliente, é o pagamento dos honorários
correspondentes ao serviço prestado. A configuração do contrato de meio é a
regra em tem de prestação se serviços médicos.Há, todavia, algumas
situações em que a dita prestação se torna obrigação de resultados, tais como
na realização de raios-X, de exames laboratoriais, de cirurgia plástica
puramente contratual, que por si só justifica a responsabilidade indenizatória
pelo dano causado ao paciente.
CAPÍTULO II
1- A ação indenizatória e ônus da prova
O direito processual civil distribui o ônus da prova, de cardo com o
art.333 do CPC, da seguinte maneira:
a)- ao autor da ação cabe provar o fato constitutivo do seu direito, isto
é, o fato jurídico com que se sustenta a prestação deduzida em juízo contra o
réu;
b)- ao réu cabe provar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do
direito dos autos, ou seja, se o réu admite ter ocorrido o fato invocado pelo
autor, cabe a ele, contestante, provar o fato superveniente que afirma estar
impedindo a ocorrência do efeito afirmado pelo adversário.
Aplicando-se estas regras a uma ação comum de indenização por
descumprimento de contrato de resultado, ficará a cargo do autor a prova:
a)-do descumprimento do contrato;
b)- do prejuízo sofrido; e
c)- do nexo causal entre este e o descumprimento da obrigação.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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Não se exige prova da culpa do inadimplente, porquanto esta se revela
implícita na inobservância do dever de realizar a prestação contratual. Com
efeito, para o direito civil, a culpa é sempre a omissão de uma cautela que o
agente necessariamente deveria observar. E porque a conduta não observou a
cautela exigível, tornou-se "censurável" ou "reprovável", devendo o agente
responder pela reparação do prejuízo que adveio para a vítima do ato injurídico
praticado.
No caso da violação do dever contratual, não tem a vítima que provar a culpa
do inadimplente, porque decorre ela naturalmente do próprio desrespeito ao
dever de cumprir a obrigação negocial.
Pode, eventualmente, o devedor alegar que, malgrado o não-cumprimento
objetivo da prestação, o evento não lhe pode ser imputado porque provocado
por caso fortuito ou por ato do próprio credor. Se isto acontecer, estará
invocando fato modificativo ou extintivo do direito normal do contratante que
propôs a ação. O ônus da prova será do réu e não do autor, segundo o art.
333, II, do CPC.
Focalizando especificamente o contrato de prestação de serviços médicos, a
situação probatória se modifica, em face da natureza especial da obrigação
contraída pelo prestador de serviços.
Pelo art. 1.545 do CC, não basta ao ofendido demonstrar a lesão que lhe
adveio do tratamento médico. A responsabilidade indenizatória funda-se na
culpa in concreto, e não apenas na frustração do tratamento dispensado ao
paciente.
A ruína da saúde do cliente do médico não se equipara à ruína do prédio que o
engenheiro construiu para seu cliente. Este se comprometeu a construir um
edifício sólido. Se a obra ruiu, a culpa está evidenciada pela própria ruína, vale
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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dizer, o engenheiro não cumpriu, a contento, a prestação que lhe cabia. Já o
médico não se obrigou a curar o paciente, embora esteja obrigado a empenhar-
se em tal propósito.
A culpa do médico, pela natureza do contrato que firma com o cliente, somente
será configurada quando os seus serviços tiverem sido prestados fora dos
padrões técnicos. Por isso, o fato constitutivo do direito de quem pede
indenização por erro médico se assenta no desvio de conduta técnica cometido
pelo prestador de serviços. Como esse desvio é uma situação anormal dentro
do relacionamento contratual, não há como presumi-lo. Cumprirá ao autor da
ação prová-lo adequadamente (CPC, art. 333, I).
Na verdade, o serviço técnico do médico, com zelo e adequação, vêm a ser a
própria prestação contratual. Logo, quando o paciente se diz vítima de erro
médico, na verdade está apontando o inadimplemento da prestação devida.
Provar a culpa do médico, então, não é demonstrar apenas o elemento
psicológico ou subjetivo da responsabilidade civil. É provar o inadimplemento
mesmo da prestação devida pelo médico. E em qualquer ação de indenização
por responsabilidade contratual, cabe sempre ao autor o ônus de provar o
inadimplemento do réu. O que se dispensa, nos contratos de resultado, é a
prova da culpa, nunca a do inadimplemento e a do dano.
A conduta irregular do médico é a um só tempo o inadimplemento e a culpa,
razão pela qual o autor não se desobriga do ônus processual da prova senão
comprovando a conduta culposa do médico. Sem a configuração desse tipo de
conduta, jamais se admitirá como não cumprido o contrato de serviços
médicos, salvo, é claro, nas hipóteses excepcionais de contratos médicos de
resultado, quando bastará ao paciente provar o dano e o nexo causal.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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2- A prova da culpa médica
Como o risco de falha, de insucesso e até de lesões é normal na prestação de
serviços médicos, os tribunais, em princípio, não são liberais com o ônus da
prova a cargo do paciente ou de seus dependentes, quando se trata de ação
indenizatória fundada em erro médico. Nenhum tipo de presunção é de admitir-
se, cumprindo ao autor, ao contrário, o ônus de comprovar, de forma idônea e
convincente, o nexo causal entre uma falha técnica, demonstrada in concreto, e
o resultado danoso queixado pelo promovente da ação indenizatória.
Nem sempre é possível um juízo rigoroso, preciso, sobre a falha técnica e seu
nexo com a lesão ou dano. Os tribunais, por isso, adotam, às vezes, princípios
antigos e universalmente aceitos como o da previsibilidade e o da
razoabilidade. O julgador segue sua experiência da vida, e da observação do
que comumente acontece pode chegar a juízos de valor sobre a conduta
profissional, quando se mostre muito difícil uma conclusão puramente técnica
sobre a causa da lesão.
O ideal, porém, é exigir o magistrado, sempre, a prova pericial, para obter
esclarecimentos que, de ordinário, não se comportam na esfera de seus
conhecimentos e que se sujeitam a regras técnicas específicas e complexas.
Isto não quer dizer que o Juiz fique escravo do laudo pericial. O CPC é claro ao
estatuir que "o Juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua
convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos" (art. 436).
A perícia não é uma superprova que se coloque acima das demais e que não
permita questionamento algum. Se fosse inatingível a conclusão do técnico,
este, e não o magistrado seria o verdadeiro Juiz da causa e anulada restaria a
função jurisdicional do último.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
33
O laudo pericial, todavia, vale, não pela autoridade técnica de quem o
subscreve, mas pela força de convencimento dos dados que o perito conseguiu
levantar, a partir da ciência por ele dominada. Esses mesmos dados podem ser
cotejados com outros elementos probatórios disponíveis ou submetidos a
exame crítico e racional do Juiz, para chegar-se a conclusões diversas
daquelas apontadas pelo experto. O Juiz não possui os conhecimentos
técnicos do perito, mas dispõe de discernimento e experiência para rever os
termos do silogismo em que se apoiou o laudo e, por isso, pode criticar e
desprezar sua conclusão.
A culpa que se apura no processo de indenização por dano de
responsabilidade médica, além do dolo (vontade criminosa de lesar),
compreende as formas de negligência, imprudência e imperícia.
Como já citado anteriormente pela negligência, a culpa equivale a uma conduta
passiva (omissiva). Ocorre quando o médico deixa de observar medidas e
precauções necessárias. São exemplos desse tipo de culpa: "o esquecimento
de pinça ou tampão de gaze no abdômen do paciente"; o abandono do cliente
no pós-operatório, "provocando com essa atitude danos graves"; o erro de
diagnóstico provocado por "exame superficial" e inadequado; a aplicação de
soro antitetânico na vítima sem, antes, submetê-la aos testes de sensibilidade,
acarretando, com isso, sua morte por deficiência cardíaca (MAGALHÃES, T. A.
Lopes).
Ocorre a imprudência por meio de atitude ativa (comissiva), praticada quando o
médico "toma atitudes não justificadas, precipitadas, sem usar de nenhuma
cautela" (MAGALHÃES, T. A. Lopes), como o cirurgião que não aguarda a
chegada do anestesista e ele mesmo se encarrega de anestesiar o paciente,
provocando sua morte por parada cardíaca; ou como o médico que realiza em
trinta minutos uma cirurgia que normalmente demandaria uma hora,
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34
acarretando, com seu açodamento, dano ao paciente; ou, ainda, como o
médico que libera o acidentado, quando deveria mantê-lo no hospital sob
observação durante algum tempo, e com isso provoca sua subseqüente morte;
ou como o cirurgião que abandona técnica operatória segura e habitual para
utilizar técnica nova e arriscada, "sem comprovada eficiência", e provoca lesão
ou morte ao paciente (KFOURI NETO).
Dá-se a imperícia quando o causador do dano revela, em sua atitude
profissional, "falta de conhecimento técnico da profissão" (MAGALHÃES, T. A.
Lopes) ou "deficiência de tais conhecimentos" (KFOURI NETO).
O diagnóstico é uma operação delicada e que nem sempre tem condições de
ser feito de maneira unívoca e isenta de erros. Por isso, entende-se que o erro
de diagnóstico, por si só, não representa um ato de imperícia (FRANÇA,
Genival Veloso de. Direito médico. 6ª ed. São Paulo: Fundação Editorial BYK-
Procienx).
Se, porém, houve erro grosseiro e injustificável, ou se o médico foi afoito,
formando desde logo o diagnóstico sem aguardar a evolução do quadro clínico
e sem proceder a exames laboratoriais que o caso exigia, configurada estará à
culpa.
A imperícia, a imprudência e a negligência, todavia, nunca serão presumidas.
Caberá sempre ao paciente ou a quem alega em juízo a culpa do médico em
qualquer de suas modalidades o ônus de provar os fatos que, concretamente, a
configuraram.
3- Culpa isolada e culpa concorrente
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O problema da concorrência de culpa ocorre com freqüência nas equipes
médicas e nos serviços de hospital, durante intervenções cirúrgicas e
internamentos.
A causa do dano pode ser atribuída a serviços secundários ligados à estrutura
do hospital, por exemplo, caso em que o cirurgião, que não tem ingerência em
tais serviços, não responderá pela indenização. Ao hospital caberá suportá-la,
dentro do princípio de que o patrão responde pelos atos culposos de seus
prepostos (Súmula nº 341 do STF).
Dentro da equipe médica que participa de certo ato cirúrgico é preciso separar
aqueles que se sujeitam às ordens do cirurgião e aqueles que exercem função
técnica complexa e inerente à sua especialização. Os que cumprem ordens do
chefe da equipe são meros prepostos. Por sua falhas responde o preponente,
independentemente de culpa própria. Já com relação ao anestesista, que hoje
é um médico especialista, o cirurgião, em princípio, não responde por suas
falhas, a não ser que, tendo sido rejeitado expressamente pelo paciente, só
veio a atuar por deliberação do médico chefe da equipe.
No pré e pós-operatório, a falha do anestesista é, sempre autônoma, não
havendo razão para atingir o cirurgião (MAGALHÃES, T. A. Lopes).
A culpa da vítima ou de seus familiares muitas vezes elide a responsabilidade
médica, em situações, por exemplo, como a da não-observância das
prescrições do médico ou a saída prematura do hospital, ou a não-participação
ao médico de incidentes ocorridos após a intervenção ou o tratamento e que
agravaram o estado do enfermo.
4- O dano e sua prova
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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Para haver obrigação de indenizar não basta a situação injurídica. Sem dano
efetivo, ainda que provado um ato ilícito do médico, não haverá lugar para se
falar em responsabilidade civil.
O autor da ação indenizatória tem o ônus de provar qual foi efetivamente o
dano que o erro médico culposo lhe acarretou, sob pena de decair de sua
pretensão.
Os danos indenizáveis, na espécie, podem ser físicos (prejuízo corporal),
materiais (perdas patrimoniais: lucros cessantes, gastos médicos hospitalares,
medicamentos, viagens, aparelhamentos ortopédicos, pensão aos
dependentes do paciente morto, etc.) e morais (lesão estética, a dor sofrida, o
mal-estar gerado por distúrbios na área das funções sexuais, frustração de
carreira, como no caso de artista mutilado, etc.).
5- A relação de causalidade
O último encargo probatório que toca ao autor da ação indenizatória refere-se
ao nexo causal que haverá de ter existido entre o dano sofrido pela vítima e o
ato culposo do médico.
Cabe, pois, àquele que reclama a reparação do dano provar que, sem o erro
cometido, culposamente, pelo facultativo, não teria o paciente sofrido a lesão.
"Não é suficiente, para que seja exigível a responsabilidade civil, que o
demandante haja sofrido um prejuízo nem que o demandado tenha agido com
culpa. Deve reunir-se um terceiro e último requisito, a existência de um vínculo
de causa e efeito entre a culpa e o dano; é necessário que o dano sofrido seja
a conseqüência da culpa cometida" (MAZEAUD e TUNC, Tratado teórico y
práctico de la responsabilidad civil, delictual y contractual. Buenos Aires: Ejea).
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
37
Por outro lado, como adverte KFOURI NETO, "o laço causal deve ser
demonstrado às claras, atando as duas pontas que conduzam à
responsabilidade. Se a vítima sofre o dano, mas não se evidencia o liame de
causalidade com o comportamento do réu, improcedente será o pleito”.
Importa lembrar que as provas incompletas ou duvidosas prejudicam a parte
que tem legalmente o ônus da prova. Prova insuficiente, lacunosa ou
inconvincente é o mesmo que ausência de prova.
O nexo causal, por sua vez, pode ser destruído pela prova de caso fortuito ou
de culpa exclusiva da vítima. Se, porém, com o caso fortuito ou com a culpa do
ofendido concorreu, também, a culpa do médico, não se isentará ele do dever
de indenizar. A reparação será apenas reduzida em seu quantitativo.
CAPÍTULO III
1- Algumas situações especiais
A participação do médico anestesista no ato cirúrgico oferece alguma
dificuldade no tocante à definição de responsabilidade civil pelo resultado
danoso sofrido pelo paciente. Mesmo sendo a falha cometida pelo encarregado
da anestesia, antiga jurisprudência imputava ao cirurgião dever de indenizar,
na qualidade de chefe da equipe médica.
A evolução da técnica relativa à matéria levou o anestesista a transformar-se
num médico especialista, que hoje desempenha sua função com completa
autonomia. Mas nem por isso se pode, como alguém já pretendeu, afirmar que
o anestesista contrai obrigação de resultado (PANASCO, Vanderby Lacerda. A
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
38
Responsabilidade Civil, Penal e Ética dos Médicos. 2ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1984).
O que hoje se admite, pacificamente, é que o insucesso e os acidentes de
anestesia se submetem ao regime comum da responsabilidade médica. Vale
dizer: a indenização, in casu, depende de prova, a cargo da vítima, de culpa do
anestesista pelo evento danoso, segundo o princípio próprio das obrigações de
meio.
O anestesista não tem responsabilidade maior nem menor do que o médico em
geral. Responde, portanto, por erro culposo ou doloso, mas o resultado
adverso não se presume provocado por culpa, razão pela qual incumbe à
vítima demonstrar concretamente a imperícia, imprudência ou negligência do
anestesista.
A propósito, está assentado na doutrina que: a) a responsabilidade do
anestesista é individual nos períodos pré e pós-operatórios; b) durante a
intervenção cirúrgica, a concorrência de culpa pode acontecer entre o cirurgião
e o anestesista, mas dependerá das circunstâncias do caso concreto; c) em
princípio, cada um responde por seus próprios atos, de sorte que não se pode
imputar falha do anestesista à responsabilidade do cirurgião, posto que "o
anestesista é autônomo e seu campo de atuação é distinto" (KFOURI NETO).
Outra situação especial, no tocante ao ônus da prova, é a que diz respeito ao
cirurgião plástico. Costuma-se distinguir a situação de médico que realiza a
cirurgia puramente estética e a daquele que promove a cirurgia estética
reparadora. Em relação à primeira, às vezes se fala em obrigação de resultado,
ocorrendo culpa presumida quando a cirurgia não atinge o resultado esperado
(Revista Jurídica 184/90). Na segunda hipótese, prevaleceria a regra geral da
obrigação de meio e não de resultado (KFOURI NETO).
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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Os tribunais, porém, abrandam, freqüentemente, o rigor na inculpação do
cirurgião plástico, mesmo nas intervenções puramente estéticas, de modo a
não equipara-las sempre às obrigações de resultado. A demonstração da culpa
in concreto é quase sempre exigida (TJRJ, Ap 10.898, Ac. 11.03.1980, Yussef
Said Cahali). Assim, não é de presumir-se a culpa do cirurgião apenas por não
ter sido alcançado o embelezamento esperado. Todavia, "se o tratamento
agravar os defeitos, deformar, enfear, em vez de embelezar, nesse caso o
resultado é levado em consideração", havendo presunção de culpa profissional
(TJRJ, Ac. 21.09.1982, RT 566/191).
O STJ já adotou igual entendimento, ao assentar que "o profissional que se
propõe a realizar cirurgia, visando a melhorar a aparência física do paciente,
assume o compromisso de que, no mínimo, não lhe resultarão danos estéticos,
cabendo ao cirurgião a avaliação dos riscos. Responderá por tais danos, salvo
culpa do paciente ou a intervenção de fator imprevisível, o que lhe cabe provar"
(STJ, 3ª T., AGRG-AI 37.060-9/RS, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, Ac. 28.11.1994,
RSTJ 68/83).
Em outro caso, o STJ foi mais rigoroso ainda, pois chegou a afirmar claramente
a obrigação de resultado assumida pelo médico que se compromete a realizar
cirurgia puramente estética. Eis o aresto:
"Contratada a realização de cirurgia estética embelezadora, o cirurgião assume
obrigação de resultado, sendo obrigado a indenizar pelo não-cumprimento da
mesma obrigação, tanto pelo dano material quanto pelo dano moral, decorrente
de deformidade estética, salvo prova de força maior ou caso fortuito" (STJ, 3ª
T., RESP 10.536/RJ, Rel. Min. Dias Trindade, Ac. 21.06.1991, RSTJ 33/555).
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Não há, solução unívoca, mas é certo que se trata com maior rigor a
responsabilidade do cirurgião plástico que se encarrega de intervenção
puramente estética, pois quase sempre lhe tocará o ônus da prova para livrar-
se do dever de indenizar, em caso de insucesso da operação.
Um último dado merece destaque: a infecção hospitalar e outras seqüelas
suportadas pelo paciente em razão de seu internamento.
Quanto à infecção hospitalar, suas origens tanto podem localizar-se nas
condições ambientais como nas próprias condições pessoais do paciente,
capazes de provocar a auto-infecção.
Aceita-se que o risco de infecção é inerente ao ato cirúrgico e que não existe,
em lugar algum do mundo, índice zero de infecção. Recomenda-se, em litígios
em torno do assunto, a pesquisa probatória em torno das práticas adotadas
pelo hospital para controle de desinfecção. Se há diligências constantes nesse
sentido, não há culpa do estabelecimento. Se forem ausentes ou insuficientes
as medidas rotineiras de prevenção contra a infecção hospitalar, tem-se como
configurada a culpa do hospital pela infecção contraída pelo paciente durante a
internação.
A responsabilidade civil dos hospitais seja por infecção hospitalar, seja por
qualquer outra lesão sofrida pelos pacientes em razão dos serviços de
internação, não se inclui na regra do art. 1.545 do CC (obrigação de meio).
Aplica-se-lhes, portanto, a teoria comum da responsabilidade contratual,
segundo a qual o contratante se presume culpado pelo não alcance do
resultado a que se obrigou. Não se trata de teoria pura do risco, porque sempre
será licito ao hospital provar a não-ocorrência de culpa para eximir-se do dever
de indenizar. Mas o ônus da prova da culpa não caberá, como ocorre no caso
de erro médico, ao paciente ofendido. Quem se apresenta como vítima de
lesão sofrida durante internamento somente terá de provar, para obter a
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
41
competente indenização, o dano e sua verificação coincidente com sua estada
no hospital. A culpa estaria presumida contra o estabelecimento, até prova em
contrário.
CAPÍTULO IV
1-Fatores concorrentes para o erro médico:
Os fatores concorrentes para o erro médico são aqueles que
contribuem para a geração do erro, aumentando sua incidência ou agravando
sua expressão.
Júlio César de Meirelles Gomes aponta os seguintes fatores:
-Condição adversa para o exercício da medicina, desde a escassez de
recursos materiais, o número excessivo de pacientes ou limitação dos meios de
diagnósticos e cura impostos pelos contratos de medicina de grupo ou seguro-
saúde.
-O atendimento em massa, das massas desassistidas de baixa renda; um
padrão massificado de cunho social adverso. A medicina a serviço das
campanhas ou esmagada nos pequenos centros médicos localizados em
comunidades muito pobres;
-A morbi-mortalidade crescente da sociedade brasileira;
- O contrato mais freqüente com o médico desprovido de recursos adequados
na instituição pública; a par da extraordinária dificuldade de acesso ao próprio
sistema público ou privado de alto poder resolutivo;
-A formação médica deficiente em nível de graduação, que dispensa
comentários.A inexistência de educação continuada na pós-graduação;
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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A utilização crescente na medicina de procedimentos de lata complexidade
tecnológica, de difícil controle, além da introdução de procedimentos de alto
risco;
-A capacidade tecnológica em descobrir o erro médico, por exemplo:
tomografia computadorizada, ecografia, etc;
- O mercantilismo desvairado e selvagem, por iniciativa isolada do médico em
especialidades rendosas ou em conjunto por meio de cooperativa ou empresas
comprometidas com o lucro.É lícito ainda cogitar sobre o estímulo quantitativo
existente na prática dos convênios, forma prevalente de remuneração doa ato
médico.
Dentre os citados, o fator que mais contribui para ocorrência do erro médico, é
o atendimento em massa.O médico que labuta sobrecarregado, por exemplo,
um plantonista de emergência, por certo não poderá despender do tempo
necessário e indispensável para oferecer um atendimento de qualidade a
todos os pacientes.E, se não pode realizar seu trabalho com a perfeição e
eficiência que gostaria, é bem possível que deixe passar alguns detalhes
importantes que poderia contribuir na busca da solução a problemática
apresentada pelo atendido.
Por certo, assim agindo, pode vir a causar danos a estes pacientes, m algumas
vezes, irreversíveis.
2- O médico, o exercício da medicina e seus deveres.
A medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humana e da
coletividade e deve ser exercida sem discriminação de qualquer natureza, e o
médico deve agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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profissional.Para que isso aconteça, deve ter boas condições de trabalho a ser
remunerado de forma justa, de tal maneira que possa viver com conforto e
possa se atualizar constantemente, podendo sempre indicar o procedimento
adequado ao paciente. A péssima remuneração do profissional é fato
impeditivo de sua atualização e aprimorarão de seus serviços.
Na área de emergência médica, onde ocorrem as maiorias dos erros
médicos, o trabalho é longo, penoso, estressante, sem adequado repouso e
alimentação.Os médicos são chamados a tomar conta e a coordenar o cuidado
de muitos pacientes simultaneamente. Eles devem estar cientes de suas
limitações para dar o melhor cuidado aos seus pacientes assim não diminui sua
efetividade pela fadiga ou frustração.
O médico insere-se nos três setores básicos de qualquer hospital: o de
pronto atendimento, o de internamento e o de atendimento ambulatorial.
No primeiro, o médico deve direcionar seus esforços no sentido de
prestar os primeiros cuidados clínicos ao paciente.Se o individuo tiver dado
entrada em estado de risco iminente de vida, procurará o profissional primar
pela manutenção ou restabelecimento de seus sinais vitais através dos
recursos próprios, como desobstrução da traquéia, respiração boca a boca,
massagem do tórax, combate à hemorragia etc.
O setor de internamento comporta as unidades de terapia intensiva
(para onde são levados os pacientes em estado grave) e a sala de cirurgia.
O setor ambulatorial é utilizado, basicamente, para realização de
consultas regulares e exames rotineiros.
O vínculo entre o médico e o paciente se configura com a consulta,
aonde a apuração de eventuais sintomas para se chegar a um diagnóstico e
um prognóstico precisos, e então se estabelecer a melhor terapêutica a ser
adotada. As fases de uma consulta bem efetuada compõem-se da Anamnese,
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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dos exames físicos geral e especiais, e da requisição de exames subsidiários
ou complementares.
Ao ser fixado o diagnóstico e previsto o prognóstico, estabelece-se o
tratamento a ser ministrado ao doente.A terapêutica prescrita é o caminho a
ser seguido pelo paciente para debelar o mal que o atormenta.Vê-se, então a
importância de uma consulta bem realizada, pois uma falha em qualquer de
suas fases poderá comprometer o diagnóstico, o prognóstico e por
conseqüência, o tratamento. Desta maneira, constatada a imprudência, a
negligência ou a imperícia, o médico responderá pelas eventuais
conseqüências.
Pela lei, é defeso ao médico deixar de atender em setores de urgência
e emergência, quando for de sua obrigação faze-lo, colocando em risco a vida
dos pacientes.Esta é a obrigação maior da profissão médica, caracterizando o
respeito pela vida de seu semelhante.
O direito ao setor de emergência é um direito individual de toda a
pessoa humana, assim como o direito à vida.
No hospital, o médico, ao entrar em contato com o paciente, deverá
proporcionar o melhor de si, respeitando a dignidade de seu paciente.Ele
trabalha num ambiente com enfermeiros, técnicos de raios-X, técnicos de
laboratório, assistentes sociais e outros médios.Deve existir relacionamento
onde impere a cordialidade e a competência profissional. Os médicos têm a
obrigação de dar o melhor de sua atenção técnica e ética a todos os pacientes
que venham em busca de seu auxílio, e a instituição que mantém o profissional
tem a obrigação de proporcionar a ele, direta ou indiretamente, uma educação
médica continuada, que possa manter sua qualidade no atendimento.
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Segundo o médico Hipócrates, a “medicina seria o encontro de uma
consciência limpa com uma consciência angustiada”.Infelizmente, nos dias de
hoje, encontra-se um salário e um número.
O médico deve respeitar as normas de conduta do mundo
contemporâneo e cumprir bem o seu dever, ou então procurar outra atividade
que tenha menos compromisso com a tradição e o futuro passando pelo
presente, a ciência e a moral.
Nos dias de hoje, o doente não vê mais no médico a figura do cidadão
caridoso e sábio, mas um assalariado impontual, desumano, negligente,
irresponsável que visa apenas receber uma às custas da sua saúde.E, ao
mesmo tempo, muitos médicos vêem no doente alguém exigente e ranzinza
cujo retorno e retribuição será apenas um valor pecuniário.
A medicina é uma atividade que, sobre visar a promoção, a prevenção
e a recuperação da saúde do homem, oferecer muito risco, tanto para aquele
que se beneficia da sua ação, como para aquele que a exerce.Todo ato médico
encerra a possibilidade de produzir maus resultados ao invés de bons. Hoje,
devido à problemática econômica que vive o país, testemunha-se uma
verdadeira socialização da medicina, rompendo os princípios básicos da
medicina libera, piorando seus serviços e prejudicando a dignidade do seu
exercício. A responsabilização do agente por ato danoso praticado segue a
mais importante via de satisfação de interesse do lesado no campo do
Direito.Os efeitos sancionários e reparatórios que, de suas funções definem,
são as respostas mais adequadas na ordem jurídicas para ações ilícitas
praticadas em detrimento de direitos da personalidade.
Infelizmente, casos como exames superficiais do paciente e
conseqüente diagnóstico baseados em erro, cirurgias desnecessárias, omissão
de tratamento ou demora no reencaminhamento do paciente para outro
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
46
especialista, imprudência nas transfusões de sangue, prescrições incorretas de
medicamento, abandono do paciente, receita ilegível, dentre outros, estão
sendo cada vez mais comuns nos hospitais e consultórios médicos do
país.Profissionais que juram sob a proteção do manto de Hipócrates em
preservar a saúde e a vida de seu semelhante estão cada vez mais agindo com
negligência, imperícia e imprudência.
Evidentemente que o médico não pode jamais ser responsabilizado por
possíveis insucessos terapêuticos. Não se pode exigir de nenhum profissional a
garantia de êxito de qualquer tratamento, pelo simples fato de que a ciência
médica não é um conhecimento matemático, absoluto, infalível.Lidando com
elementos dos mais complexos, e com fatores variáveis de paciente a paciente,
a medicina tem algo de conjectural, de fortuito, de hipotético. O que se exige do
médico não é que ele garanta o resultado de sua ação, mas que empregue os
meios técnicos e científicos de que dispõe a sua arte para alcançar o fim
almejado, que é acura da enfermidade ou sua prevenção.
Em síntese, deve o médico trabalhar em prol da saúde, da ética e do
profissionalismo mediante o respeito aos seguintes deveres:
-Dever de informação, isto é, o dever de informar ao paciente tudo o
que tenha a ver direta ou indiretamente com sua saúde, bem como lhe
demonstrar os procedimentos a serem tomados diante da relação médico-
paciente em curso de forma clara e transparente.
-Dever de atualização, que é contínuo aprimoramento da profissão
médica, acompanhando o progresso e a evolução da ciência médica, de forma
a espantar o fantasma da imperícia.
-Dever de abstenção de abuso, ou seja, de não se exceder em
medidas arriscadas e desnecessárias, o que pode vir a acarretar dano por
imprudência.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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- Dever de vigilância, o que significa estar atento e fazer o melhor
possível para não incorrer em qualquer tipo de omissão que possa caracterizar
inércia, passividade ou descaso, obrigando o profissional a ser atencioso e
cuidadoso em seu ofício, impedindo a configuração de qualquer tipo de
negligência.
CAPÍTULO V
1- IATROGENIA
No estudo do ato médico, desempenha papel importante a doença que surge
em conseqüência da intervenção médica ou medicamentosa.
Distinguem-se três tipos: lesões previsíveis e também esperadas; previsíveis,
mas inesperadas, decorrentes do perigo inerente a todo e qualquer
procedimento; e falhas decorrentes do comportamento humano no exercício da
profissão, passíveis de suscitar o problema da responsabilidade legal.
Em maior ou menor grau, os médicos e seus auxiliares são iatrogênicos pelo
que dizem e não dizem e pelo que fazem ou deixam de fazer.
Distingue acidente, intercorrência fortuita, mais inesperada do que imprevisível,
que pode ocorrer tanto no processo diagnóstico como no terapêutico, da
complicação, aparecimento de uma nova condição mórbida no decorrer de uma
doença devida ou não à mesma causa.
Disserta a respeito do contraditório e até certo ponto chocante admitir-se a
existência de perigo na sua própria prevenção, mostrando, com CROCE e
TOLEDO, em 1987, os vários mecanismos pelos quais as drogas podem ter
uma ação indesejável: superdosagem, efeitos colaterais, efeitos secundários,
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
48
interações entre drogas, intolerância, indiossincrasias e alergias ou
hipersensibilidade.
Define como reação adversa uma resposta inesperada e, a tal ponto
prejudicial ao paciente, que supere as vantagens dos efeitos esperados. Os
efeitos secundários são: respostas colaterais, de tolerância maior ou menor,
conforme o paciente, mas que não impedem formalmente o uso de
medicamentos. Quando um medicamento ou droga é posto no mercado, seus
efeitos colaterais costumam ser conhecidos e, por lei, aparecem nas bulas dos
produtos, alertando o paciente para o fato de que tais sintomas podem ocorrer
e podem até ser esperados. Entretanto, nem sempre se conhecem os efeitos
tardios para o próprio indivíduo e, muito menos, naqueles em idade fértil, nas
gerações seguintes.'
O médico, ao prescrever um medicamento, deve ter conhecimento das
respostas do organismo, de seu mecanismo de ação e com muita profundidade
deve saber os efeitos colaterais indesejáveis, podendo-se muitas vezes avaliar
o nível da escola de onde provém um profissional pelo seu grau de
conhecimento dos efeitos das drogas que usa.
Alertado por algumas decisões judiciais quanto a um entendimento errôneo da
utilização do soro antitetânico, recomenda a indicação deste só na vigência da
doença infecciosa, uma vez que ele, por si só, pode desencadear a chamada
doença do soro, que é uma reação anafilática ao soro do cavalo do qual é
obtido. Assim, diante de um ferimento recente, mesmo que contaminado, a
conduta correta é debridar o ferimento, limpá-lo cirurgicamente bem e ministrar
anatox e grandes doses de penicilina.
“Os contrastes iodados têm outro mecanismo para desencadear reação
adversa da mais ampla escala, da urticária ao choque, e que, se se assemelhar
às alérgicas, é chamada anafilactóide. Certos casos podem apresentar
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náuseas, vômitos, cefaléias, edema agudo do pulmão, insuficiência renal e
convulsões”.
Disserta, finalmente, a Anestesiologia, entre as 55 especialidades médicas
oficialmente reconhecidas de alto risco no Brasil, ressaltando que talvez se
deva à Sociedade Brasileira de Anestesiologia o mérito de a especialidade
estar entre as menos denunciadas por Erro Médico entre os julgados que
levantou: 1/89, ou seja, 1,12%.
CAPÍTULO VI
1- A Responsabilidade médica no Código de Defesa do Consumidor
A Constituição de 05.10.1988 enumera entre os 11 princípios que o art. 107, V,
manda observar para que a ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa assegure a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social, a "defesa do consumidor'', que o art. 5º,
XXII, já determinava promovesse o Estado, na forma da lei, que, em obediência
ao disposto no art. 48 das DT, deveria ser elaborada, sob a forma de Código,
pelo Congresso Nacional, dentro de 120 dias da promulgação da Carta.
Só ocorreu, no entanto, aos 11.09.1990, pela Lei 8.078 (119 artigos nominais,
pois muitos foram vetados).
Define o art. 2º como sendo consumidor "toda pessoa física ou jurídica que
adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final'', incluindo, no
conceito de fornecedor”, toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada,
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nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados que
desenvolvem atividades de produção... ou prestação de serviços''.
"Serviços'', § 2º”, é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,
mediante remuneração... salvo as decorrentes das relações de caráter
trabalhista.''
Dentre os direitos básicos do consumidor enumerados no art. 6º interessam ao
presente estudo os:
"I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por
práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou
nocivos;
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços,
com especificação correta de quantidade, características, composição,
qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais,
individuais, coletivos ou difusos;
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com VII - o acesso aos
órgãos judiciários e administrativos, com vistas à prevenção ou, a inversão do
ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for
verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras
ordinárias de experiências.''
Sob a rubrica Da Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço, dispõe
o art. 14 que o fornecedor de serviços responde, independentemente da
existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por
defeitos relativos à prestação dos mesmos, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
51
Considera defeituoso o serviço quando não fornece a segurança que o
consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias
relevantes, entre as quais aponta:
I - o modo de seu fornecimento;
II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi fornecido.
Não considera o serviço defeituoso pela adoção de novas técnicas.
Só exclui a responsabilidade do fornecedor de serviços quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Determina, finalmente, que a responsabilidade pessoal dos profissionais seja
apurada mediante a verificação de culpa.
Distingue FRANCISCO CHAGAS DE MORAES, Responsabilidade Civil do
Médico, REVISTA JURÍDICA, vol. 176, junho de 1992, os casos de relações
que envolvam a prestação de serviços realizada pelos médicos em que venha
ocorrer um acidente de consumo terão sua responsabilidade civil apurada pela
prática do erro médico (medical malpractice); - dos médicos que mantenham
vínculo empregatício com pessoas jurídicas de direito privado ou público, em
que a reparação será suportada pelos referidos estabelecimentos, com direito
destes últimos de regresso, ou seja, de “reaver, daquele por quem pagou, o
que houver pagado’’ (Súmulas 187 e 188 do STF)”:
“A responsabilidade civil do médico na qualidade de profissional liberal, em face
do disposto no art. 14, § 4º, do CDC, será apurada mediante verificação da
culpa, regra, aliás, aplicável a todos os demais profissionais liberais, cujo
elenco está relacionado no anexo art. 577 da CLT. Quando se tratar de
serviços médicos prestados por hospital, como fornecedor de serviços (art. 14,
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
52
caput), a apuração da responsabilidade independe da existência de culpa,
conforme esclarece ANTÔNIO HERMAN DE VASCONCELLOS e BENJAMIN”:
'O Código é claro ao asseverar que só para a 'responsabilidade
pessoal' dos profissionais liberais é que se utiliza o sistema alicerçado em
culpa. Logo, se o médico trabalhar em hospital responderá apenas culpa,
enquanto a responsabilidade do hospital será apreciada objetivamente’.
Uma vez comprovado o nexo causal entre o defeito do serviço e o dano sofrido
pelo consumidor, o profissional seria responsável tão-somente pela reparação
do dano patrimonial. Ocorre que inovou o CDC ao prever no art. 6º, VI, como
direito básico do consumidor, 'a efetiva prevenção e reparação de danos
patrimoniais e morais'. A presença do dano moral em nosso Direito não
representa novidade, pois, como bem observa CLÓVIS DO COUTO E SILVA,
tendo em vista o que dispõem os arts. 1.547 e 1.548 do CC, os quais prevêem
a reparação do dano moral, nos casos de injúria e calúnia (RT 667/14). Como
no conceito de fornecedor de serviços (art. 3º), estão arroladas, além das
pessoas naturais (profissionais liberais), as pessoas jurídicas, no caso os
hospitais, segue-se que ambas são alcançadas pela normatividade contida no
art. 6º, VI.
Estabeleceu o CDC no Cap. das Práticas Comerciais, entre outras
condutas proibidas, a referida no art. 39, VI, o qual veda ao fornecedor de
serviços executá-los sem a prévia elaboração de orçamento e autorização
expressa do consumidor, excluídos os decorrentes de práticas anteriores, entre
as mesmas pessoas. Talvez, pela referência legal a Práticas Comerciais (Tít. I
pág. V), alguns profissionais liberais demonstrem preocupações, eis que sua
atividade não tem qualquer característica de mercantil. Entretanto, é bom
lembrar que tal referência, devido à técnica legislativa, ocorreu tendo em vista
que a qualificação contida no conceito de fornecedor (art. 3º) abrange não só
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
53
as pessoas físicas ou jurídicas que desenvolvam atividade de produção e
outras assemelhadas, ao lado das de prestação de serviços, entre as quais
estão os profissionais liberais.
Ora, se é certo que o Código de Ética dos a) médicos, b) psicólogos e c)
advogados, respectivamente nos arts. a) 3º, 65, 89 e 909; b) 40 e 41; e c)
Secção VIII, incs. I - V, disciplina e cuida do tema honorário, é porque existe
razão para tanto. Tratando-se de conduta proibida - execução de serviços sem
prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor - seu
descumprimento daria azo à aplicação de uma sanção administrativa, isto é, a
multa, nos termos do disposto nos arts. 56 I, e 57 do CDC.''
Entende que a prestação de serviços efetuada pelos médicos, face ao advento
do CDC, não virá sofrer mudanças significativas.
Realça, entretanto, que a possibilidade da criação de associações de
consumidores que o referido Código estimulará, uma vez que atribui ao
Departamento Nacional de Defesa do Consumidor, da Secretaria Nacional do
Direito Econômico - MJ, ou órgão federal que venha a substituí-lo, como
organismo de coordenação da política do Sistema Nacional de Defesa do
Consumidor, entre suas dez atribuições, a de:
“I - incentivar, inclusive com recursos financeiros e outros programas especiais,
a formação de entidades de defesa do consumidor pela população e pelos
órgãos públicos estaduais e municipais, aliada à divulgação que a mídia dá aos
erros médicos, talvez venha ocorrer incremento das reclamações. Como as
entidades médicas representativas da categoria acompanham a aplicação das
novas regras do Código de Defesa do Consumidor, as pendências, por certo,
concluir-se-ão por uma solução”.
Realçando como pontos mais importantes do Código à propaganda enganosa,
a informação do doente e a questão da honorária - acaba de demonstrar o Dr.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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ROBERTO GODOY, do CRMSP, em sua exposição a respeito das Atribuições
dos Conselhos Regionais de Medicina - que, efetivamente, não muda o Código
as questões já tratadas no Código de Ética Médica, "que é, para o cliente do
médico, o melhor Código de Defesa do Consumidor'', e que vai além dos
posicionamentos legais.
CAPÍTULO VII
1- Erro médico na cirurgia plástica
Quando se trata de cirurgia plástica visando ao embelezamento e/ou
rejuvenescimento estético, essa obrigação de meios, no entender de alguns
tratadistas do direito civil pátrio, transforma-se em obrigação de resultados.
Convém, portanto, definir a cirurgia plástica como sendo: a subespecialidade
do ramo da medicina de cirurgia geral que tem por finalidade, modificar,
reconstruir, reconstituir ou embelezar parte externa do corpo deformada por
enfermidade, traumatismo ou anomalia congênita, reunindo o nobilíssimo ramo
da medicina que trata de doenças por meio de cirurgia, com a beleza da arte
de improvisar e criar. Esta finalidade pode ser necessária e reparadora ou
puramente estética.
O que se põe em debate é concluir se a cirurgia plástica envolve obrigação de
meio ou de resultado. Eis aí, o cerne jurídico da controvérsia: Saber se a
cirurgia plástica estética envolve uma obrigação de meio ou de resultado para o
cirurgião.
No que respeita à cirurgia plástica, conclui-se a doutrina majoritária que, o
resultado de uma intervenção cirúrgica estética, não difere daquela dos demais
cirurgiões, pois que submete o paciente aos mesmos riscos e depende da
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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mesma álea. Seria, como a dos médicos em geral, uma obrigação de
meios.Mas essa questão é ainda bastante controvertida dentro do nosso
Direito.
No tocante a esta especialidade, os tribunais pátrios, não têm visto com muita
benevolência a prática desta ciência médica, que é a cirurgia estética,
evidentemente impressionados com a finalidade posta a serviço de uma
vaidade na maioria das vezes considerada fútil. Com o que não concorda já
uma boa parcela da doutrina e jurisprudência. Alie-se ao fato de que o Código
de Ética Médica proíbe ao médico, por ser tal atitude contrária ao costume e à
ética profissional, dar expectativa de resultado ao paciente em qualquer prática
médica.
O principal argumento utilizado por parte dos civilistas pátrios para transpor a
cirurgia estética ao campo das obrigações de resultado está assentado no
compromisso do cirurgião de obter com o ato cirúrgico um determinado
resultado, considerando que não há patologia a ser enfrentada, ou seja, o
paciente quase sempre se encontra em estado de higidez.
Somam-se a tal postura, fatores comerciais, tendo em vista testemunharmos
na atualidade a existência de uma parcela, embora pequena, de "médicos
comerciantes", despidos do espírito profissional e humanitário que deve nortear
a nobre atividade do médico. Neste sentido, vêem-se Clínicas de Cirurgia
Plástica, com anúncios publicitários inseridos em revistas, jornais, colunas
sociais e até "out dors". Propagandas nas quais o profissional se compromete a
obter um determinado resultado, e esta promessa é quase sempre de um corpo
perfeito, ou pleno rejuvenescimento do incauto e desinformado paciente.
Alguns desses profissionais utilizam-se mesmo de programas de computador
que projetam a nova imagem (nariz, boca, olhos, seios, nádegas, etc), através
de montagem, escolhida na tela do computador ou na impressora, para que o
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
56
cliente decida. Estabelece-se, sem dúvida, entre médico e paciente relação
contratual de resultado que deve ser honrada. Portanto, 'pacta sunt servanda".
Assistimos estarrecidos a programas de TV em que o profissional se
compromete a transformar qualquer desavisada numa "Marilyn Monroe",
garantindo pleno êxito na cirurgia, o que atrai a pertinência de indisfarçável
contrato de obrigação de resultado. Esta conduta, ilegal, por não satisfazer as
exigências do nosso direito objetivo, que exige objeto lícito e forma prescrita ou
não defesa em lei, refoge ao mundo jurídico (embora possa produzir efeitos
indesejados), e como tal não pode ser considerado nos limites deste trabalho.
Não se pode penalizar a classe médica desta especialidade, constituída em
quase sua universalidade de profissionais corretos, por exceções que servem
apenas para confirmar a regra.
Não se pode também, justificar a conduta de profissionais omissos e
desidiosos que muito mais se aplicam às técnicas de venda de serviços. Menos
ainda, fazer apologia à indústria da medicina, até tendo em vista o caudaloso e
desmedido crescimento de faculdades e escolas que, ano a ano, vêm
colocando no mercado, profissionais totalmente despreparados, tudo aliado ao
"status" que se busca na especialidade de "cirurgião plástico", como adverte,
em retificação de voto, com brilho invulgar o Ministro WALDEMAR ZVEITER,
relator de acórdão inserto na RT nº 767/121:
“Agora, estamos no nosso País e decidindo para o nosso povo dentro de um
contexto especialíssimo, em que existem faculdades de medicina de fim de
semana, nas quais proliferam médicos que saem sem o preparo e sem
adequação necessária e de cujas clínicas de cirurgias plásticas, em qualquer
dos jornais das grandes capitais que se abra, encontra-se propaganda médica,
atraindo os pacientes para esse tipo de cirurgia estética de embelezamento”.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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... Temo que, se abrirmos a jurisprudência para tentar permitir, estas proliferem
num povo como o nosso, onde a massa ainda é ignorante, há deficiência da
informação científica, certo que temos assistido a vários casos de mortes de
pacientes “.
No mesmo acórdão o voto do Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES
DIREITO, destacou a necessidade de se alcançar o equilíbrio na administração
da Justiça neste campo da cirurgia plástica:
"Na verdade, nos últimos tempos tem sido volumoso o noticiário sobre os
aspectos legais da prática da medicina sob variados ângulos, assim o do
diagnóstico, tratamento, apoio e acompanhamento dos pacientes, sem falar, é
claro, dos procedimentos cirúrgicos. E, de modo vigoroso, vêm sendo postos
em relevo o direito dos pacientes e as obrigações dos profissionais da
medicina. Esse momento de exaltação no setor é conseqüência de longo
período de obscurantismo no que se refere à responsabilidade civil dos
médicos. É chegado, agora, um tempo de necessária reflexão para reconhecer
que os pacientes também têm obrigações e os médicos também têm direitos,
tudo para permitir um equilíbrio imperativo para a administração da justiça,
ainda mais nesse trânsito da humanidade com novas descobertas e avanços
da ciência médica" (RT nº 767/118).
A finalidade destas linhas, portanto, não é abordar o comportamento de maus
profissionais que caminham à margem do direito. Por isso, é até compreensível
o debate que se trava diante da responsabilidade do cirurgião plástico. Que ela
é mais ampla não restam dúvidas, pois o paciente ao procurá-lo encontra-se,
quase sempre, em estado de higidez e ausência de patologia.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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Todavia, a cirurgia puramente estética não significa necessariamente a
ausência de uma patologia. Ocorre, e isto tem sido bastante comum, que um
paciente procure um cirurgião plástico para corrigir uma deformidade, por
exemplo, de um nariz avantajado, que enfeiando-lhe o rosto, cause-lhe
transtorno de personalidade como depressão, complexos e comportamento
neurótico que lhe impeça o exercício de atividades profissionais, sociais e até
afetivas.
É certo que as dores da alma são inestimáveis, sua carga repercute em
perturbações nas relações psíquicas, como faz ver, SILVIO DE MACEDO (O
Problema Moral - Maceió, Ed. Edufal):
"Há um fio de tecido humano feito de moral. Esta é bem mais concreta para os
homens que as pedras, porque as coisas que nos ferem mais, são as que
atingem os espírito".
Além do que, dispõe a Lei nº 3.268/57, regulamentada pelo Decreto nº
44.045/58, em seu art. 51 que: "São lícitas as intervenções cirúrgicas com
finalidade estética, desde que necessárias ou quando o defeito a ser removido
ou atenuado seja fator de desajustamento psíquico". O Código de Ética Médica
atual foi posto em vigor pela Resolução nº 1.246, de 08 de janeiro de 1988, do
Conselho Federal de Medicina (D.O.U. de 26.02.88).
Desta maneira, uma verdade se extrai: A responsabilidade do cirurgião plástico
estético é maior que a do cirurgião geral, não tendo, todavia, tal fato, o condão
de inserir-se em uma obrigação de resultado.
Necessário, assim, que o julgador se atenha à prova dos autos, aos limites da
postulação e aos ditames da ordem jurídica com a devida flexibilidade, sem o
que perderiam os profissionais acusados sua mais valiosa garantia: o da
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
59
isenta, imparcial e correta aplicação do ordenamento jurídico, a fim de manter o
equilíbrio na administração da Justiça e a conseqüente e tão necessária
organização social.
Muitos juristas entendem ser a responsabilidade do cirurgião estético de igual
natureza do cirurgião geral, ou seja, obrigação de meios, devendo, no entanto,
ser apreciada com maior rigor. Alberto J. Buenes ("in", Responsabilidad Civil de
Los Médicos, Buenos Aires, Ed. Abaco), anota que: "Os enxertos reparadores
em pacientes com deformidade cicatricial, especialmente os queimados, a
correção de lábio leporino ou de fissura palatina, as osteotomias de
recomposição plástica após consolidação viciosa, as cirurgias de mãos
mutiladas em acidente de trabalho, as terríveis deformidades resultantes dos
acidentes automobilísticos e inúmeras outras ocorrências são exemplos do que
um profissional da área pode fazer, dentro do campo da cirurgia plástica
reparadora, para abolir uma alteração patológica, seja ela adquirida ou
congênita".
O que se pretende, postas estas considerações, é que os Tribunais expressem
aquilo que se considera legítimo justo e correto na caracterização da obrigação
do cirurgião plástico, notadamente na cirurgia estética: a coerência de
responsabilizar o profissional porque ele realmente errou grosseiramente ou foi
omisso, e não porque, sua área está inserida numa obrigação de resultado,
segundo alguns entendimentos doutrinários.
Ainda neste aspecto, a única particularidade a se acrescentar à
responsabilidade do cirurgião plástico estético, reside no aumento dos deveres
de informação ao paciente, que deve ser exaustivo e de pleno consentimento,
claramente manifestado, esclarecido e determinado.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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2- Breves noções históricas A cirurgia plástica como subespecialidade do ramo da cirurgia geral, surgiu a
partir de 1914, em razão da readaptação e correção funcional dos feridos em
guerra, conforme obra clássica e irretocável de WANDERBY LACERDA
PANASCO (A Responsabilidade Civil, Penal e Ética dos Médicos, Ed. Forense,
Rio, 1ª Ed., 1979).
Desta forma e por mais estranho e irônico que possa parecer, foi em
conseqüência da 1ª Grande Guerra Mundial e seus mutilados que a cirurgia
plástica teve seu início e divulgação como especialidade.
Historicamente já no final do século XIX, com as primeiras próteses nasais, os
conhecimentos dos cirurgiões adquirem dimensões incipientes, dando
surgimento ao que hoje se denomina rinoplastia. E, em 1930 é criada a
Sociedade Científica Francesa de Cirurgia Reparadora Plástica e Estética.
No século XVI, (os informes no tempo não são precisos) o italiano Gaspar
Tagliacozzi, utilizou-se de enxertos do braço para reconstruir narizes e orelhas.
Segundo ainda informes relatados em acórdão publicado na RT 767/118, o
Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, assegura que
historicamente esta especialidade é antiqüíssima, precedendo de muitos
séculos a própria cirurgia geral, e que quando se faz menção apenas do
aspecto estético desta especialidade, não se leva em conta o trabalho corretivo
e reconstrutivo de deformidades congênitas e adquiridas nas fendas faciais,
lábio leporino, seqüelas de queimaduras, etc. E que na Índia antiga já se
praticavam cirurgias de reconstrução nasal.Na verdade, procedimentos para
reconstrução do apêndice nasal, do pavilhão da orelha e dos lábios são
mencionados em escritos muito antigos, havendo referência, ainda no século
XIII, de trabalhos na Sicília e na Calábria de famosos cirurgiões da época.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
61
A expressão COSMETOLOGIA surgiu no Congresso Internacional de
Dermatologia, em Bucareste, em 1935. E em 1950 foi criada a Sociedade
Francesa de Cosmetologia, constituindo-se os seus objetivos na "terapeutique
de la laiderus".
A partir de 1950, os Tribunais Franceses, Espanhóis e Italianos, admitiram as
cirurgias destinadas a embelezar o corpo como atividade médica legalmente
justificada. É o direito abraçando o fato social, adotado como de regra, pelas
maiores democracias.
Percebe-se assim, que a finalidade da cirurgia plástica, não é a garantia de
uma vaidade fútil como a têm alguma vez visto os tribunais. Prestam-se assim,
tanto a cirurgia plástica corretiva como a estética, a corrigir defeitos não
somente físicos como também àqueles que atingem a complexa alma humana.
3- Natureza jurídica da obrigação-de meios ou de resultados De qualquer maneira, é ainda polêmica a natureza jurídica da cirurgia estética,
quando o contratante busca melhorar a aparência, contrariamente da cirurgia
reparadora, onde se pretende a correção das lesões ou defeitos congênitos ou
adquiridos.
Diante da lei, em prestígio aos institutos e princípios do direito, há que se
observar à importância de o jurista ater-se não só ao que o legislador
pretendeu regular no momento da sua elaboração, mas também as
transformações que inevitavelmente surgem em face da evolução histórica dos
fatos, ou seja, o que ele, legislador queria se vivesse no mundo atual.
Surge daí a necessidade de os métodos hermenêuticos jurídicos estarem
constantemente atualizados, a fim de se tornarem úteis quando da aplicação
do direito. São, aliás, variadas as situações que se apresentam para solução,
exigindo, evidentemente, um exame sistematizado e vinculado a sugestões
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
62
doutrinárias e a interpretações jurisprudenciais que tentam aproximar-se das
realidades provocadas pelas variadas causas determinantes da
responsabilidade civil.
Foco gerador de entraves ao julgamento da conduta do médico, posiciona-se
na falta da compreensão de alguns institutos do direito. O exame desta conduta
impõe uma série de cuidados que visam não só a evitar as errôneas
interpretações da lei, futuras nulidades, como também a suprimir, banir de uma
vez a indesejável injustiça da qual muitas vezes excelentes e renomados
profissionais da medicina são vítimas, a exemplo do que ocorreu em um
recente acórdão, referindo-se a estes profissionais, qualificou-os de "máfia de
branco", numa generalização de todo injustificada.
E o Direito brasileiro ainda titubeia no que respeita a adequação do rumo a
seguir em face ao progresso científico e à globalização cada vez mais
abrangentes. E como se sabe o direito deve esposar o fato social.
Por isso, a necessidade de atualização, situa-se na medida em que com o
considerável avanço da medicina, testemunhamos na realidade, o que há vinte
anos abordavam-se em livros e filmes de ficção, como a clonagem de
espécies, desenvolvimento de novas técnicas como terapias genéticas,
tecnologia do DNA, novas drogas, projeto genoma, globalização de
descobertas, etc. E neste campo da cirurgia plástica, as novidades não param
de surgir, encontrando-se em plena evolução, com soluções e métodos de
tratamentos novos a cada momento, longe de se esgotarem os acontecimentos
fáticos.
E a conseqüência, de toda essa profusão exuberante de tecnologia científica,
não somente que surge nesta área da cirurgia plástica, como em qualquer
outra especialidade médica, evidentemente, é o excessivo número de ações de
responsabilidade civil que se proliferam no mundo todo, especialmente nos
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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Estados Unidos da América, onde em 1970, segundo dados estatísticos, um
quarto dos médicos respondia por ações de reparação de danos (conforme, A
Responsabilidade Civil, Penal e Ética dos Médicos, WANDERBY LACERDA
PANASCO, Rio, 1984, 2ª Ed.). E mais ainda, naquele país, segundo estatística
recente divulgada na Revista Veja, 70% dos médicos obstetras são
processados anualmente. Todavia, no Brasil padecemos de pauperismo
franciscano no tocante a dados estatísticos, notadamente sobre a
responsabilização dos cirurgiões plásticos.
As posições jurisprudenciais, apesar de cautelosas nos últimos tempos, vêm
caminhando prudentemente, distinguindo entre cirurgia reparadora, na qual há
que se apurar a culpa do médico, com a obrigação de meios, e cirurgia estética
ou embelezadora, na qual o médico se compromete a uma obrigação de
resultado, onde há de se presumir em favor daquele economicamente mais
fraco que, seduzido pela asfixiante propaganda, pretende melhorar seu aspecto
estético.
Com facilidade pode-se concluir pelas injustiças que advêm desta sistemática
da obrigação de resultado, especialmente na cirurgia estética e reparadora
onde se desenvolve o fator álea, como comporta qualquer submissão de
paciente à cirurgia em qualquer outra área.
Decisões há que embora não entendam configurada a culpa, condena o
profissional pelo simples fato do mesmo aplicar-se à cirurgia plástica. A
injustiça chega, muitas vezes a ponto de apenar o médico por um resultado
inerente à constituição física e carga genética do paciente, como cicatrizes
hipertróficas, quelóides, etc.
Desta postura decorre uma incoerência absurda, qual seja, a de
responsabilizar o cirurgião plástico estético, quando o resultado não querido, e
menos ainda esperado, advém de uma resposta adversa do organismo do
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
64
paciente. Ninguém pode se obrigar à realização plena de uma obrigação que,
na maioria das vezes está fora dos seus limites de atuação e deliberação. Não
se nega, no entanto, que há profissionais que prometem determinado
resultado, aqueles já referidos, que inserem anúncios em jornais e revistas,
prometendo corpos esculturais, rejuvenescimento pleno, etc., devendo, por
isso, em muitos casos, obrigar-se a atingi-lo.
Todavia, nem mesmo, eventual compromisso com determinado resultado e a
ausência de patologia, ocorrentes na cirurgia puramente estética, não devem e
não servem para descaracterizar a unidade científica do ato cirúrgico, não
importando a especialidade, pois ambos tem a mesma natureza.
As cirurgias reparadoras, de normal, se inserem em uma finalidade terapêutica,
evidentemente associada a uma busca da estética, até porque nenhuma
deformidade física é agradável aos olhos. O mesmo há que se dizer, no que
tange a cirurgia estética ou embelezadora, pois que, sendo o motivo principal a
busca da estética, há também nelas o lado terapêutico que jamais pode ser
ignorado, até tendo em vista os graus de desequilíbrio emocional que uma
alteração estética pode ocasionar a um indivíduo.
O renomado médico e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-
USP, Dr. MÁRIO EDUARDO P. MONTEIRO DE BARROS, membro titular da
Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, manifestando-se sobre as
divergências entre cirurgias reparadoras e estéticas, tão debatidos nos meios
médicos e jurídicos, enfrenta aspecto inusitado observando que:
"A OMS (Organização Mundial da Saúde), define a saúde como:” Um estado
completo de bem estar físico, mental e social “, e não a ausência de patologia.
E, partindo deste conceito não há como negar que a cirurgia plástica estética
traz enorme benefício ao paciente, e estes quando procuram o cirurgião
plástico sentem dor. Não apenas dor física, mas dor moral, emocional.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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Esclareça-se com exemplos: Encontre uma solução para uma criança
magoada e entristecida em seus melhores anos, pelo complexo causado por
deformidade cicatricial, especificamente os queimados, marcados por lábio
leporino,”orelhas de abano" ou resultantes de acidente automobilístico, que de
normal provocam a cruel curiosidade humana pelo destaque da anormalidade.
Diga para uma mulher ainda jovem, portadora de câncer de pele, cuja retirada
cause cicatriz deformante no rosto, não ser necessária a intervenção de
cirurgião plástico a fim de preservar a estética, resultando em estigma auto
segregatício. Peça para uma adolescente, exaurida em seu vigor, ser feliz e
comportar-se dentro dos padrões de normalidade, quando não há roupa que
lhe permita esconder seios enormes, que projetando-se para frente pelo peso,
cause-lhe ainda dores e deformidade na coluna. Os problemas psicológicos
surgem dependendo dos conceitos pessoais de beleza, estética e de
anormalidade, resultantes da complexidade do sentimento humano.
E expressando vasta experiência adquirida do exercício do magistério e da
clínica, o conceituado cirurgião, com toda ponderação esclarece que:
"Nossa especialidade é a cirurgia plástica, e tudo que se faz neste campo, é ao
mesmo tempo reparador e estético. Inúmeras são as cirurgias estéticas que se
realizam por recomendação de psiquiatras e psicólogos pelos benefícios que
trazem à auto estima e segurança dos pacientes. Quantas pessoas, crianças,
adolescentes, adultos, que se excluem do convívio social, por não aceitarem
suas próprias características e defeitos físicos. E se, existindo uma
possibilidade de contornar, amenizar o problema que as aflige, essa solução
pode ser considerada terapêutica ou pura vaidade?".
Concluindo que:
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
66
"Quanto às conseqüências do ato cirúrgico, quando se trata da fisiologia
humana, além da técnica correta e usual empregada pelo médico, dentro dos
mais rígidos critérios da conduta cirúrgica, outros componentes podem influir
no resultado cirúrgico. O imprevisível, que em grande parte está fora dos
limites de nossa atuação. Nenhum médico pode afirmar que uma cirurgia tem
100% de possibilidade de êxito e 0% de insucesso".(30%), ginecomastia (20%)
e lipoaspiração (10%). A pesquisa, no entanto, não diferencia as cirurgias
estéticas e reparadoras, aduzindo ainda que a ginecomastia é o
desenvolvimento excessivo das glândulas mamárias nos homens e devem ser
retiradas, sendo, portanto, tal cirurgia estética e reparadora.
Recentemente, segundo informes da Revista Época (19.6.00), a procura de
cirurgiões plásticos pela população masculina, vem crescendo nos últimos
anos, os dados estatísticos em 1994 era de 5% por homens e em 2.004, esta
procura passou a 30%. Estes dados, inequivocamente demonstram a
incapacidade humana de lidar com defeitos, qualquer que seja sua origem,
genética ou adquirido.
Por tais razões, com máxima vênia, hão de ruir duas concepções, porque,
errôneas, injustas e imprestáveis à exata compreensão do instituto da
responsabilidade, notadamente do cirurgião plástico: A primeira, a distinção
entre cirurgia plástica reparadora e estética. E a segunda, a conceituação de
obrigação de meio para uma e de resultado para outra. Em outro dizer, a
cirurgia plástica - seja reparadora, seja estética - é sempre uma obrigação de
meio de diligência e prudência e não de fim ou resultado.
4-Questionamentos e conclusões a respeito da cirurgia plástica
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67
Uma das discussões surgidas com o mapeamento do código genético humano,
anunciado ao mundo em 26/6/2000, é o temor de que o homem passe a brincar
de Deus. A pesquisa científica aproxima-nos dos mistérios da criação. Como
conceber, todavia, que os cientistas criem um ser parecido com o homem, mas
desprovido de livre arbítrio, porque condicionado à vontade dos cientistas. Este
sim é tema para longos e filosóficos debates.
Conclue-se, pois que o ponto de convergência e o critério gerador de entraves
ao julgamento da conduta do médico, posiciona-se, como exposto, na
despersonalização do atendimento médico que vem ocorrendo nos últimos
anos, aliado ao incentivo da mídia; também na falta de compreensão de alguns
institutos do direito, que devem ser debatidos, sobre o necessário
aperfeiçoamento de nosso sistema processual, tendo em vista o objetivo maior,
que é levar ao Poder Judiciário um padrão de qualidade semelhante ao das
melhores democracias contemporâneas. Além, evidentemente de se evitar
injustiças das quais são vítimas, muitas vezes, renomados e zelosos médicos.
Vivenciamos um retrocesso à antigüidade, quando ainda não se cogitava de
responsabilidade. Hoje, percebe-se que as "vítimas", abraçam-se muito mais à
idéia de vindita, e muitas vezes, salvo justificadas exceções, ao que se pode
considerar de verdadeira extorsão. Basta surgir um hematoma para que surja a
idéia de responsabilizar o médico.
Assim, apesar de tanta controvérsia, evidencia-se que a flexibilidade deve ser
adotada no critério da apuração da conduta do profissional, caso contrário,
jamais livrar-se-á de condenação.
Portanto, repita-se, há que se excluir duas concepções, por errôneas, injustas e
imprestáveis à exata compreensão do instituto da responsabilidade neste
campo da Cirurgia Plástica: A primeira, a divisão entre cirurgia plástica
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reparadora e estética. E a segunda, a conceituação de obrigação de meio para
uma e de resultado para outra.
A essência da culpa, a toda evidência reside na previsibilidade dos
acontecimentos, sendo este seu ponto nuclear. Sem ela é impossível
fundamentar ou justificar um juízo de reprovação. Não se há de reconhecer a
responsabilidade civil do médico cirurgião plástico, quando o resultado não
pode ser previsto ou evitado. E por este raciocínio, não se consegue atinar
como seria possível responsabilizar um cirurgião plástico estético, quando seu
atuar está fora da linha causal.
O médico trabalha sempre com uma margem de risco inerente à sua atividade,
circunstância que deve ser sempre avaliada e apresentada ao paciente. Se
previsível alguma reação adversa, inerente a terapia aplicada, esta à evidência,
deve ser comunicada ao paciente, que conseqüentemente deve assumir o risco
pelo resultado.
Assim, independentemente da classificação que se adote sobre a natureza
jurídica da atuação do médico, se decorrente de um contrato ou de intervenção
imposta pelas contingências inexoráveis da vida, deve-se perquirir a culpa
como elemento primordial, excluindo-a quando inexistir o liame causal.
Ponto finalizando, esposada a teoria da culpa pelo art. 929 a 946 do Código
Civil, no que concerne a responsabilidade do médico, a regra geral dita que
este, no desempenho de sua nobre atividade, não pode obrigar-se a obter a
cura do doente e assumir o compromisso de reabilitar sua saúde. O que se
exige do médico, seja qual for sua especialidade, é a prestação de serviços
zelosos, atentos, conscienciosos, a utilização de recursos e métodos
adequados e de agir conforme as aquisições da ciência. O que não se pode
admitir, sempre com a máxima vênia, é uma corrente jurisprudencial em pleno
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
69
desalinho com a realidade moderna dos avanços da ciência médica e da
ciência jurídica.
A solução, a meu sentir, é que por primeiro, se adote aqui o mesmo que se
adota nos hospitais do Canadá, Estados Unidos e da Inglaterra, ou seja,
quando o paciente que se interna para este tipo de cirurgia reparadora e
estética, o médico deve fazer uma preleção, sobre os deveres do paciente
antes da cirurgia, de suas próprias obrigações no tocante à assistência até a
alta médica, expor as probabilidades de êxito e riscos cirúrgicos, fatores
aleatórios independentes de sua atuação (como cicatrizes hipertróficas, etc.),
exigindo-se ainda do paciente que leia o documento de autorização e que o
assine. Tudo, inclusive a fim de não alimentar a "indústria da indenização".
Por tudo, pode-se concluir, senão uma unanimidade, mas uma simetria de
opiniões, que o ato do médico, incluindo-se evidentemente a do cirurgião
plástico, constitui uma obrigação de meios. O profissional não se obriga a curar
o doente - que seria contra a lógica do criador -, mas prestar-lhe assistência e
cuidados conscienciosos adequados ao estado do paciente e de acordo com
sua ciência e regras consagradas pela prática cirúrgica. Repita-se, qualquer
contrato para melhorar a aparência física do paciente por meio de cirurgia não
depende somente de diligência e perícia do cirurgião, mas de fatores idênticos
aos de qualquer outra cirurgia, devendo, por conseguinte, a responsabilidade
do médico ser apurada, conforme prescreve o Código Civil, mediante a
verificação de culpa.
"Até cortar os defeitos pode ser perigoso, nunca se sabe qual o defeito que
sustenta nosso edifício interior" (CLARICE LISPECTOR).
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
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CONCLUSÃO
O médico na sua missão de prevenir, aliviar, tratar e curar, está no centro das
atividades preservadoras da vida. A sua atividade profissional lida com bens
supremos do indivíduo, protegidos pela ordem estatal. Daí as íntimas relações
entre a Medicina e o Direito.
O exercício dadivoso da medicina permanece envolvida em uma série de atos
que não permitem que se torne exclusivamente privada, pois a vida e a saúde
das pessoas são de interesse da coletividade, constituindo com isso bens
inalienáveis, e o Estado tem como elemento fundamental a vida e a saúde das
pessoas. Com a evolução dos tempos, a falta de legislação disciplinando
relacionamento, e a ausência de normas rígidas e regulamentares, que tornem
obrigatórios os deveres de um e de outro, não são compatíveis com a realidade
social.
O direito médico não pode deixar de estar subordinado à moral médica, na
tentativa de uma harmonia, pois se o direito distanciar-se demasiadamente da
moral e da ética, iremos criar um positivismo jurídico exagerado que sempre
leva a julgamentos impiedosos e a terríveis contradições, os quais não se
conciliam com a necessária autonomia da medicina. E a maneira para criar
esse fim é justamente a criação de normas, as quais são impostas aos seus
membros como forma de obter seus fins necessários. Se criarmos uma
legislação especifica, dá-se ao médico a capacidade de exercer a profissão em
sua plenitude, dentro dos limites da legalidade, estabelecendo, no profissional e
na sua ciência, a confiança do indivíduo e da sociedade.
Em situações, como na urgência e na emergência, é que se sente a premente
necessidade de certos dispositivos que não deixem dúvidas quanto ao
exercício pleno da medicina, pois é ela uma profissão que engloba
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71
características das mais diversas, eminentemente pessoais e circunstanciais,
que a tornam diferente das demais profissões. E no iminente perigo de vida,
que o médico e paciente se encontram mais desprovidos de uma legislação
que os ampare. Assim, se um seguidor de uma determinada religião recusa
uma transfusão de sangue, quando esse é o único meio de escapar da morte,
fica o médico na obrigação de salvar-lhe a vida, enquanto o paciente sente-se
no direito de salvar a alma. Uma profissão que penetra na intimidade da vida
do indivíduo e se estende à coletividade, necessita de um grande apoio jurídico
que lhe dê segurança e garantia no exercício de sua atividade.
Assim sendo, a vida e a saúde como bens mais nobres e mais protegidos, e
existindo apenas legislação esparsa nos diversos códigos, leis e decretos
regulamentando o exercício profissional médico e o comportamento dos
indivíduos ante a Medicina, sente-se a necessidade da criação de um Direito
Médico, autônomo e independente.
"Durante muitos séculos, a medicina esteve revestida de caráter religioso e
mágico, atribuindo-se aos desígnios de Deus a saúde e a morte. Neste
contexto, não se responsabilizava o médico que apenas participava de um
ritual, talvez inútil, mas dependentemente da vontade Divina. O médico era
visto como um profissional cujo título lhe garantia a onisciência, médico da
família, amigo e conselheiro, figura de uma relação social que não admitia
dúvida sobre a qualidade de seus serviços, e, menos ainda, a litigância sobre
eles. O ato do médico se resumia na relação entre uma confiança e uma
consciência”. As circunstancias atuais estão mudadas. As relações sociais se
massificaram e intensificaram, distanciando o médico do cliente. A própria
denominação dos sujeitos da relação foi alterada, passando para usuário e
prestador de serviços, tudo visto sobre uma sociedade de consumo, cada vez
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mais consciente de seus direitos, reais e fictícios e mais exigentes quanto aos
resultados.
As portas do novo milênio, a medicina, como ciência, surpreende, maravilha,
encanta e realiza o inimaginável, diminuindo o sofrimento, curando ou
prolongando a vida. Conhecimentos crescem em progressão geométrica e a
obsolência ocorre em anos, não mais em décadas.
Por outro lado o espetacular desenvolvimento da ciência que determinou o
aumento de recursos tecnológicos, que foi colocado à disposição do
profissional; Com eles cresceram as oportunidades de diagnóstico e tratamento
e, conseqüentemente, os riscos. A eficácia é o que caracteriza a medicina
moderna para a quase totalidade das pessoas que têm acesso a essa medicina
moderna.
As expectativas do doente se ampliaram: a seguridade social estendeu o uso
dos serviços médicos. E o doente que também é um segurado, confunde
facilmente o direito à seguridade com o direito a cura; se esta não ocorre, logo
se suspeita de um erro médico.
Acrescenta-se a isso a disposição da mídia de escandalizar o infortúnio, e
facilmente encontraremos a explicação para o incremento do número de
reclamações judiciais versando sobre o nosso tema. Essas ações são
facilitadas porque não dependem da quebra de uma relação de respeito e afeto
que existia com o médico da família, pois muitas das vezes hoje o reclamante
não teve relação com o médico, ou a teve muito superficial.
A missão do médico é salvaguardar a saúde das pessoas. Seu conhecimento,
sua e sua consciência são dedicados ao cumprimento desta missão.
A condição peculiar do médico, ao cuidar do ser humano, exige não só
profundos conhecimentos científicos, mas também uma visão certeira e
humana. Na combinação dessa dupla exigência a profissão médica revela
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também o seu caráter artístico. Impõe-se entender o que o médico faz pelo
doente como também o que ele deixa de fazer, e, muito mais do que isso, a
maneira como é feito. Não fosse essa complexidade suficiente para dificultar a
localização do acerto ou do erro, há de se considerar o reverso da medalha
quando se lembra da resposta biológica do organismo ao desequilibro de sua
ecologia pela doença complementada pelo psiquismo do paciente, a colaborar,
voluntariamente ou involuntariamente, na evolução do processo patológico.
Nesse contexto é difícil estabelecer a verdade, o certo, o errado, e muito mais,
o que ocorreu de errado, para se poder encontrar o Erro médico e imputar
culpa àquele que fez o juramento de Hipócrates, escrito há mais de 2.500 anos,
por esse notável homem que arrancou dos deuses a arte de curar e a entregou
aos homens.
A medicina, arte de curar, profissão de amor e respeito ao ser humano,
santuário de afeto e compaixão pela dor alheia, receptáculo das grandezas de
espírito, divina força dos que buscam mitigar os seus males e altar da fé
daqueles que a exercem, vem perdendo a sua altivez e a aureolar seriedade
que sempre a envolveu mergulhando no fosso nocivo da incompetência. A
Altura atingida pelo trabalho, competente e diligente, realizado com o carinho
que suas ações exigem, deu ao clinico Miguel Couto condições e autoridade
para afirmar: A medicina é a mais nobre das profissões, se ela decai, é porque
os seus cultores enfraquecem.
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ANEXOS 1
INTERNET
Jornal Costa Verde
Editor: Elmo Pedroso Fone 9714-0980
Abril/Maio de 2003 - Ano XI - Nº 86
SUSPEITA DE ERRO MÉDICO EM MARICÁ
Foto: Elmo Pedroso
Dia 6 de abril seria o dia mais feliz da vida da secretária Lizandra Rangel dos Santos, 24 anos e do pintor Alexandre Barros dos Santos, de 30, moradores de Inoã, terceiro distrito de Maricá. Isso porque daria a luz a sua primeira filha, Vitória. Deu entrada dia 5 de abril, as 21:30h, no Hospital Municipal Conde Modesto Leal, sentindo as primeiras dores do parto.
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"Apesar de Lizandra estar gritando de dor, o médico se limitou a dizer que o parto seria realizado durante a madrugada e foi embora, alegando que iria descansar. Reclamamos atendimento, mas ele simplesmente pediu que uma auxiliar de enfermagem examinasse ela", contou Denise Barros, cunhada da secretária. "Desesperada, minha cunhada repetia que estava com medo de perder a criança", lembrou Denise, que também é auxiliar de enfermagem. "Conheço os procedimentos. Quem deveria ter examinado Lizandra era o médico", reclamou. O pré-natal, segundo familiares, foi realizado no próprio hospital com a medica Claudia Rogéria Leite. Foram feitos exames detalhados de ultra-sonografia que não apontaram nenhuma anormalidade.
De acordo com a cunhada, o médico foi acordado pelos gritos da paciente, no fim da madrugada. Lizandra já estava em trabalho de parto. "Uma enfermeira ainda teve a cara de pau de reclamar que ela estava gritando, pois estava acordando os outros bebes e poderia também interromper o descanso do médico", contou indignada. "Finalmente, quando o médico atendeu minha cunhada, ainda disse de forma grosseira: "Se não está preparada para ter filhos, eu não tenho culpa"', acrescentou Denise. Na sala de parto, o médico teria solicitado a presença de dois pediatras na tentativa de reanimar o bebe, no entanto, sem êxito. "Durante o trabalho de sutura em Lizandra, ela perguntou o que havia acontecido e o médico respondeu que havia ocorrido um problema com o bebe. Quando minha c u n h a d a perguntou se a criança estava viva, o médico respondeu com frieza, que não. Duas horas após o parto ele deu alta para Lizandra afirmando que nem sabia o que havia acontecido, pois estava tudo certo", relatou Denise. Lizandra vai denunciar ao Conselho Regional de Medicina (Cremerj) o obstetra Dr. Albertinho, do Hospital Municipal Conde Modesto Leal, em Maricá. Ela acusa o médico de omissão e imperícia, responsabilizando-o pela morte de seu filho durante o parto, realizado. Ainda abalada com a tragédia, ela registrou queixa contra o cirurgião na 82ª DP (Maricá)
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ANEXO 2
INTERNET
Erro médico extirpa mamilos em cirurgia de
redução dos seios
Outro caso de erro médico em cirurgia plástica decidido pelo TJRS, desta vez com a condenação do médico Klaus Wietzke Brodbeck a indenizar uma paciente com a importância de R$ 47.458,00 mais custas e honorários de 15%. A decisão é da 9ª Câmara Cível, que deu provimento parcial à apelação da autora, para aumentar o valor que fora fixado na sentença de primeiro grau.
O processo revela que em 5 de janeiro de 1999 a paciente baixou para a correção de uma "hipertrofia mamária". O resultado foi desastroso: "seqüelas terríveis, deixando cicatrizes de aspecto repulsivo e retirando dos seios os respectivos mamilos" – segundo a petição inicial assinada pelo advogado Nestor Carlos Arnt.
Em contestação, o médico Klaus Brodbeck negou qualquer conduta culposa, garantindo que "a cirurgia processou-se sem qualquer complicação, pela técnica clássica de Ivo Pitanguy" e que "não tinha obrigação de resultado, mas era apenas de meio".
A sentença deferiu indenização de R$ 12.800,00 com atualização pelo IGP-M desde a data do laudo pericial (17.12.2001) e juros a contar da citação (19.10.2000). Seguiram-se dois apelos – sendo provido, em parte, o da autora.
A desembargadora Mara Larsen Chechi, ao votar, ressaltou que o laudo pericial reconheceu que os seios "não apresentam mamilos". Ao afirmar a responsabilidade do médico Klaus Brodbeck, a julgadora afasta houvesse o cirurgião alertado a paciente sobre os riscos, "porque não se presume que ela tivesse se submetido à cirurgia, antevendo riscos de deformação de parte de seu corpo relacionada com a feminilidade, o erotismo e a maternidade".
O julgado unânime de 9ª Câmara deferiu R$ 19.200,00 (valor sugerido pelo perito do Juízo), sendo a correção monetária contada da data da cirurgia. O médico já interpôs recurso especial ao STJ.
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Sem confirmação oficial do órgão de classe, o Espaço Vital foi informado de que a paciente também ingressou com procedimento ético contra Brodbeck, em demorada tramitação no Conselho Regional de Medicina. (Proc. Nº 70005056551)
Fonte:Espaço Vital Virtual 23/09/
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ANEXO 3
REVISTA ÉPOCA
Em busca de justiça Mulheres acusam médico de provocar sérias deformações em cirurgia plástica
Em vez de acesso ao charmoso mundo das mulheres bonitas e saudáveis, a cirurgia plástica trouxe deformações e neuroses para 56 funcionárias públicas, cabeleireiras e donas de casa de Campo Grande (MS). A maioria está marcada por cicatrizes nos seios e no abdome. Há mulheres que passaram a usar bengala porque estão com a pele da barriga presa a uma das pernas. Outras perderam os mamilos. Todas têm problemas psicológicos. Com ganhos que não passam de R$ 600 mensais, elas não conseguem pagar assistência médica nem reverter os problemas resultantes da plástica. Todas foram operadas pelo mesmo médico: Alberto Jorge Rondon de Oliveira. Formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1980, ele trabalha em Mato Grosso do Sul há mais de dez anos e não é filiado à Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Ex-deputado estadual, atualmente preside o diretório municipal do PPB. Ficou conhecido como "monstro do bisturi" a partir de abril, quando as ex-pacientes começaram a mostrar publicamente as marcas de suas incisões. Placedes Silva, de 48 anos, foi uma das primeiras a acusar o médico de imperícia, negligência e imprudência. Operou-se com Rondon no ano passado para reduzir seios e abdome. Hoje, mal anda. "A pele da minha perna está presa à barriga e meus músculos foram atingidos", diz. Na segunda-feira 3, Placedes e outras 20 mulheres entraram com ação no Conselho Regional de Medicina pedindo a cassação de seu registro profissional. Pretendem também exigir indenização por lesões corporais e danos psicológicos. Na quarta-feira 5, foi a vez de 35 mulheres pedirem ajuda ao governo do Estado para processar o cirurgião. "As complicações não podem ser atribuídas a ele. Depois das operações elas não voltavam mais ao consultório", diz o advogado do acusado, Rene Siufi. A versão das ex-pacientes é outra. Afirmam que o médico não as atendia depois das primeiras complicações. Rondon era o único cirurgião plástico credenciado pelo Previsul, o instituto de previdência dos funcionários do Estado. Sob o argumento de que plásticas estéticas eram corretivas, ele conseguia aprovar as guias das clientes e operá-las com a cobertura do seguro-saúde. O médico exigia de R$ 500 a R$ 600 por fora, mas realizava o serviço pelo instituto. Regina de Oliveira, de 39 anos, diz que conseguiu a autorização para a cirurgia em 15 minutos, sem fazer exames.
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Luciene Sodré, de 31 anos, conta que foi operada em 1997. "Depois da cirurgia na mama, fiquei com uma cicatriz horrorosa." Com Carmélia Silva, de 44, foi pior. Ela fez a cirurgia de redução de seios em 1998, teve complicações, mas foi atendida por Rondon apenas uma vez, por telefone. "Perdi o mamilo e a aréola", diz. Todas as ex-pacientes do médico garantem que não foram advertidas a respeito de cicatrizes nem de riscos da cirurgia.
Vanda Célia, de Campo Grande
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
80
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comentado pelos autores de Anteprojeto, 7° ed, 2001.
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CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, Coordenação de José Ederienos
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VASQUEZ, A.S. Ética, 10° edição.Ed, Civilização Brasileira, 1196.
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
82
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 6
METODOLOGIA 8
SUMÁRIO 9
INTRODUÇÃO 10
CAPÍTULO I 14
ERRO MÉDICO
1. Conceito
1.1Responsabilidade médica 17
1.1.1-Responsabilidade Ética 19
1.1. 2-Responsabilidade Civil 21
1.1. 3-Responsabilidade penal 22
1.2–Da natureza da responsabilidade médica 26
1.3-Contrato de meio e contrato de resultado 27
1.4–Natureza do contrato médico 28
CAPITULO II
1. A ação indenizatória e o ônus da prova 30
2. A prova da culpa médica 33
3. Culpa isolada e culpa concorrente 36
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4. O dano e sua prova 37
5. A relação de causalidade 37
37
CAPITULO III
1. Algumas situações especiais 38
CAPITULO IV
1. Fatores concorrentes para o erro médico 42
2. O médico, o exercício da medicina e seus deveres. 44
CAPITULO V
1. Iatrogenia 48
CAPITULO VI
1. A responsabilidade médica no Código do Consumidor 51
CAPITULO VII
1. Erro médico na cirurgia plástica 56
2. Breves noções históricas 62
3. Natureza jurídica da obrigação de meios e resultados 63
4. Questionamentos e conclusões a respeito da cirurgia plástica 69
CONCLUSÃO 72
ANEXOS 77
Monografia Erro Médico Juliana A. Nunes
84
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 83
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes, Projeto A Vez do
Mestre.
Título da Monografia: Erro Médico
Autor: Juliana Andrade Nunes
Data da entrega: 25/10/2004
Avaliado por: Conceito: