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UMA METODOLOGIA DE PREVISÃO DE DEMANDA DE GÁS NATURAL:
APLICAÇÃO NA REGIÃO DO CARIRI/CEARÁ
Eng. Abraão Ramos da Silva
Eng. MS Moisés do Santos Rocha
Prof. Dr. João Bosco de Arruda Furtado Grupo de Estudo e Pesquisa em Infraestruturas de Transporte e Logística da Energia
Universidade Federal do Ceará
RESUMO
O artigo trata de um processo de modelagem de previsão da demanda por gás natural em uma região ainda não
atendida por um gasoduto. Este processo utiliza modelo de escolha discreta com o uso conjunto de dados de
preferência revelada e declarada, e viabilizou a obtenção da demanda estimada pelo energético para compor uma
metodologia de avaliação da viabilidade da distribuição secundária do gás natural em uma região do interior do
Estado do Ceará. Os resultados mostraram-se consistentes com o observado na prática e serviram de subsídio à
elaboração de políticas de distribuição do gás natural no sentido de formar mercado para o energético.
ABSTRACT
This paper concerns to a demand forecasting modeling process applied to elicit values involved with natural gas
potential consumers in an area not yet assisted by natural gas pipeline network. The modeling process utilizes
discrete choice theory and is based in the conjoint use of stated and revealed preference data. Demand estimated
figures has been input to an evaluation methodology concerning the implementation of schemes of natural gas
secondary distribution as a strategy of expanding markets. Results showed consistency and usefulness to support
the expansion of gas natural network through marketing strategies.
1. INTRODUÇÃO
Segundo estudo realizado pela British Petroleum, intitulado “BP StatisticalReviewof World
Energy” (2012), as reservas provadas de gás natural no mundo cresceram cerca de 23% na
última década, totalizando, aproximadamente, quase 209 trilhões de m3 no ano de 2011. Já no
Brasil, considerando esse mesmo período, as reservas provadas tiveram um aumento de
150%, chegando, em 2011, a mais de 459 milhões de m3, o que revela, claramente, um
diferencial positivo de desempenho no caso brasileiro. Atualmente, no país, o gás natural já
representa um décimo da matriz energética nacional e, conforme o ranking geral acerca das
reservas provadas de gás natural no mundo, apresentado no estudo da British Petroleum
(junho/2012), o Brasil ocupava o 31º lugar.
O Estado do Ceará, por sua vez, busca a segurança energética em termos de fornecimento de
gás natural. Além da rede de gasodutos de transporte da Petrobras, que serve ao litoral leste
do Estado e à Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), existe ancorado no Porto do Pecém
um navio-tanque de GNL, com equipamento regaseificador de gás natural e com capacidade
de fornecer 7 milhões de m3 diários (ANP, 2010). Este navio-tanque (terminal Golan Spirit)
atende prioritariamente a demanda de duas termelétricas (TermoCeará e TermoFortaleza),
ambas localizadas no Complexo Industrial-Portuário do Pecém (CIPP), no Município de
Caucaia/RMF. No entanto, segundo a CEGÁS (2010), há superavit na oferta, equivalente a
quatro milhões de metros cúbicos por dia de gás, quando as termelétricas não estão
operacionais.
Diante deste cenário, e considerando uma estrutura de oferta que garanta o cumprimento dos
contratos de fornecimento do energético, torna-se oportuno o desenvolvimento de projetos
que auxiliem na viabilização da expansão da distribuição de gás na área de influência do
CIPP, a partir da oferta disponível tanto no terminal Golan Spirit quanto no gasoduto
Guamaré-Pecém. Uma vez que a atual expansão da oferta de gás natural tem ocorrido por
meio do atendimento a pequenos e médios consumidores (média escala) na RMF e se deseja
interiorizar esta oferta, é necessário fazer uso da distribuição secundária (gasoduto virtual)
como indutora de mercado. Em todo o país, o setor industrial apresenta-se como o maior
consumidor de gás natural e é considerado, também, um dos principais responsáveis pela
criação e ampliação do mercado nacional deste energético.
Neste contexto, os segmentos industrial, de serviços e automotivo qualificam-se como
usuários potenciais e formadores de demanda por gás no interior do Estado do Ceará, onde se
encontram importantes polos de desenvolvimento, como a microrregião do Cariri, formada
pelos municípios de Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, no corredor Sul do Estado. Neste
corredor, os segmentos industriais mais significativos, do ponto de vista da demanda por gás,
são o calçadista, o ceramista e de alimentos, todos apresentando processos produtivos que
podem usar o gás como insumo energético.
O presente trabalho deriva de estudo que objetivou elaborar uma metodologia de
determinação da viabilidade da distribuição secundária do gás natural, a partir do navio-
tanque de GNL do Porto do Pecém. Apresenta-se uma modelagem de previsão de demanda
pelo energético com base na teoria de escolha discreta e utilizando conjuntamente dados de
preferência revelada e declarada. Esta modelagem foi aplicada ao Cariri Cearense, ainda não
atendidos pela malha gasodutoviária do Estado.
2. DESCRIÇÃO DA METODOLOGIA PROPOSTA
2.1 A Modelagem de Previsão.
Os estudos de demanda baseados no comportamento de escolha dos consumidores apresentam
grande consistência microeconômica e são aplicados em diversos setores da Economia. Estes
estudos utilizam os chamados modelos de escolha discreta.
Uma vantagem dos modelos de Escolha Discreta é a abordagem de preferências intransitivas
dos indivíduos, ou seja, preferências diferentes entre indivíduos de mesmas características
socioeconômicas. Por isso, a utilidade é tratada como uma variável aleatória, formada por
uma componente determinística ou sistemática, e outra componente aleatória, que reflete as
“razões não modeladas explicitamente” da escolha de um indivíduo. Dessa forma, a utilidade
de uma alternativa i para um indivíduo n ( ) pode ser representada pela seguinte expressão
= (1)
em que : : Utilidade global de uma alternativa i para um indivíduo n;
: Componente sistemática da utilidade de uma alternativa i para um indivíduo n;
: Componente aleatória da utilidade de uma alternativa i para um indivíduo n.
A representação mais comum da componente determinística é sob a forma linear, definidas a
seguir:
(2)
em que:
: Atributo k da alternativa i para o indivíduo n;
:Constante específica da alternativa;
: Peso relativo do atributo na composição da função utilidade.
As constantes específicas da alternativa são parâmetros que representam todos os efeitos não
aleatórios de escolha da alternativa e que não são refletidos nos atributos definidos no modelo.
É relacionada com a componente determinístico (Vin) da utilidade. Os termos aleatórios, por
sua vez, podem ser interpretados sob várias hipóteses simplificadoras e formas de distribuição
de probabilidade. Essa liberdade deu origem a vários modelos de escolha discreta, formulados
sempre no intuito de explicar, da melhor forma possível, o comportamento dos termos .
Qualquer que seja a modelagem de escolha, a sua concepção é fundamentada principalmente
no planejamento da coleta de dados de preferência revelada (PR) e preferência declarada
(PD), fontes de dados mais importantes utilizadas na estimação dos modelos. Os dados PR
representam as escolhas já realizadas por usuários de produtos (bens ou serviços), e refletem o
comportamento real de escolha. Por outro lado, os dados PD fornecem informações a respeito
da escolha de um indivíduo diante de um conjunto de alternativas previamente definidas,
hipotéticas ou não.
Por outro lado, a principal limitação dos dados PD consiste no fato de não refletirem o
comportamento atual do mercado, característica peculiar dos dados PR, como já mencionado.
Por isso, a literatura recomenda, sempre que viável, a modelagem com dados conjuntos PR e
PD, pois assim é possível, ao mesmo tempo, unir as vantagens e diminuir as limitações de
cada fonte de dados. Em casos de estudos de previsão de demanda, especificamente, a
modelagem conjunta de dados PD e PR é condição sine qua non para a obtenção de cenários
consistentes e constitui a única maneira de incluir alternativas ainda não existentes no
mercado. Em estudos de análise trade-off, que permitem a determinação da importância
relativa dos atributos, deve-se usar somente dados PD.
No Brasil, ainda são recentes os estudos que abordam esta temática. No entanto, no Exterior,
foram desenvolvidos diversos estudos que analisam o comportamento de consumidores de
diversas commodities e serviços. Portanto, trata-se de uma metodologia relativamente recente
e de grande utilidade no trato de problemas em áreas como Marketing, Planejamento de
Transportes, Desenvolvimento Estratégico etc.
Com respeito a estudos de demanda de combustíveis, como o gás natural, podem-se destacar
os trabalhos promovidos pelo California Energy Commission, nos EUA, que abordam,
principalmente, a demanda por combustíveis veiculares (Brownstoneet al, 2000). Estas
metodologias, no entanto, podem ser aplicadas em vários mercados energéticos que utilizam o
gás natural. A junção dos cenários de demanda de cada um dos setores forma,
consequentemente, a demanda por gás natural nos setores industrial, comercial, veicular e
residencial. A Figura 1 mostra esquematicamente o uso conjunto dos dados de PD e PR na
abordagem de previsão de escolha de energéticos e outros produtos.
Figura 1: Método de Enriquecimento de Dados,
Fonte: Louviere et al (2000).
2.2. A Elasticidade da Demanda
A elasticidade da demanda de um produto define o quanto a demanda variará quando ocorre
uma variação unitária em algum atributo que compõe a função de utilidade do produto. A
expressão para o cálculo da elasticidade em modelos MNL é dada por (Louviere et al, 2000):
Onde:
: Elasticidade média de demanda de uma alternativa i, em relação a um atributo
da alternativa j;
Elasticidade de demanda de uma alternativa i para um individuo n em relação a um
atributo da alternativa j;
: Probabilidade de escolha da alternativa i para um indivíduo n;
: Atributo k de uma alternativa j para um indivíduo n; e
1, se i=j (elasticidade direta)
=
0, se i ≠ j (elasticidade cruzada)
2.3 Metodologia do Estudo
A metodologia do Estudo mais amplo buscou possibilitar a análise de viabilidade de
estruturas de distribuição secundária de GNL, com vistas a subsidiar proposições para a
expansão de mercado do gás natural, utilizando-se os conceitos da modelagem de escolha
discreta para representar a tomada de decisão de escolha de energéticos, a partir da obtenção
de dados conjuntos de preferência revelada e preferência declarada, nos setores industrial e de
serviços na área de estudo (Cariri/CE). As etapas do Estudo foram:
a) Estado da Arte da Distribuição do GNL à Luz dos Objetivos da Pesquisa – foi feita
uma revisão da Literatura de distribuição secundária do gás natural, tendo como foco os
(3)
(4)
objetivos do Estudo e os processos, tecnologias e a estrutura de distribuição deste energético
no Ceará;
b) Definição das Variáveis-Chaves no Processo de Escolha do Insumo Energético nos
Setores Cozinha Industrial e Grandes Consumidores – em função da análise dos estudos
encontrados na literatura e com base em entrevistas com especialistas do setor de gás natural
foi possível elencar diversas variáveis que influenciam, de algum modo, a escolha do insumo
energético utilizado nos processos produtivos industriais e no setor de cozinhas industriais;
c) Caracterização e Análise do Corredor em Estudo com foco nos Consumidores
Potenciais de Gás Natural – envolveu uma extensa coleta de dados secundários para subsidiar
a caracterização e análise dos potenciais consumidores localizados na área de estudo em
termos de localização, porte e categoria de atividades;
d) Determinação da Forma Funcional dos Modelos de Previsão da Demanda por Gás
Natural – a partir dos resultados obtidos nas etapas anteriores foi possível propor uma forma
funcional para a função de utilidade de cada insumo energético disponível na área de estudo,
para os casos das categorias consideradas;
e) Pesquisa de Campo/Dados PR – nesta etapa, foi elaborado o questionário PR, feita a
programação de campo e a execução do levantamento das informações primárias desejadas;
f) Ranking das Variáveis para o Experimento PD – a partir das respostas do questionário
PR, foi possível estabelecer uma hierarquia em termos de importância das variáveis
consideradas como chaves no processo de escolha do insumo energético para os processos
produtivos;
g) Montagem do Experimento PD – utilizando-se as quatro variáveis mais importantes no
processo de escolha do insumo energético, foram elaborados dois questionários PD, os quais
foram aplicados aos mesmos respondentes do questionário PR, nas categorias grandes
consumidores e cozinha industrial, nos corredores em estudo;
h) Estimação dos Modelos de Previsão de Demanda – com a obtenção dos dados PR e
PD foi possível fazer a estimação dos modelos de escolha cujas formas funcionais foram
definidas na etapa d);
i) Determinação da Demanda por Gás Natural nos Cenários Analisados – com os
modelos calibrados, foi possível estimar a demanda por gás natural nas duas categorias
consideradas;
j) Conclusões e Recomendações – finalmente, a demanda estimada foi a principal
variável-insumo da metodologia de avaliação da viabilidade da distribuição secundária do gás
natural. Uma análise de sensibilidade subsidiou as principais conclusões do Estudo,
ressaltando-se alguns aspectos considerados essenciais para a estruturação viável do sistema
de distribuição do gás natural no corredor em estudo.
3. ESTUDO DE CASO
3.1 Caracterização da área de estudo enquanto potencial consumidora de gás natural.
Segundo o IBGE (2010), a Região Metropolitana do Cariri ocupa uma área de pouco mais de
5 mil km2 e contava com uma população de, aproximadamente, 540 mil habitantes. A região
abriga os municípios de Barbalha, Caririaçu, Crato, Farias Brito, Jardim, Juazeiro do Norte,
Missão Velha, Nova Olinda e Santana do Cariri. Dentre esses, os municípios hoje
conturbados - Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, que formam o hoje intitulado Crajubar -
ocupam posição de destaque na região, dado sua concentração demográfica, por apresentarem
os melhores indicadores socioeconômicos da região e pelo fato de atuarem como polos de
desenvolvimento no interior do Estado do Ceará.
O consumo total diário de insumos energéticos na categoria cozinha industrial na RMC
envolve 392 empresas e equivale a cerca de 5.200 m3 de gás natural por dia. Isto corresponde
a 57% do consumo total diário de insumos energéticos nos dois corredores enfocados no
Estudo mais amplo, nesta categoria. No que tange à categoria grandes consumidores, o
consumo diário de energéticos na RMC é de cerca de 177.000 m³/dia. Os municípios de
Barbalha e Crato respondem por 82% do consumo de energéticos na região.
3.2 A Modelagem no Caso de Estudo
O caso de estudo envolveu dois dos quatro segmentos que compõem o mercado do gás natural
na área de estudo: as grandes e médias indústrias com potencial para uso do energético
(exceto co-geração, por haver um consenso sobre a não viabilidade do gás natural nesta
categoria, nas regiões enfocadas) e os empreendimentos que utilizam cozinha industrial
(restaurantes, bares, hospitais, escolas, shoppings centers e hotéis) nessas regiões.
A pesquisa de campo constatou que os energéticos então empregados nos segmentos grandes
consumidores eram a lenha (predominante) e o GLP, os quais comporão o conjunto de
escolha dos consumidores juntamente com o gás natural, no caso da disponibilidade deste
último. Já no caso do segmento cozinhas industriais, o conjunto de escolha seria o mesmo,
com a predominância atual observada do GLP. Os segmentos residencial e automotivo não
foram estudados nesta pesquisa.
3.2.1. Os Modelos de Preferência Revelada
Em vista do exposto, a estrutura para os modelos de preferência revelada é a de um binário
logit, como mostrado na Figura 2 abaixo:
Figura 2 – Estrutura binária dos modelos de preferência revelada.
As variáveis chaves pesquisadas para compor a forma funcional das funções de utilidade de
cada energético foram inicialmente oito, tendo sido escolhidas, em pesquisa de campo piloto,
apenas as três primeiras consideradas mais marcantes (de maior peso) pelos respondentes:
para o segmento grandes consumidores – custo direto do energético, custo de adaptação da
empresa para utilizar o energético e custo ambiental; para o segmento cozinhas industriais -
custo direto do energético, custo de adaptação da empresa para utilizar o energético e risco de
fornecimento. Assim, a forma funcional do experimento de preferência revelada foi:
(5)
Onde:
- componente sistemático da utilidade do energético i;
- constante específica do energético i;
- custo direto do energético i;
- coeficiente do custo direto do energético i na expressão (5)
3.2.2. Os Modelos Preferência Declarada (PD)
A estrutura para o modelo de preferência declarada é também um binário logit, com o gás
natural substituindo o GLP, de alto custo em comparação com a lenha. A estrutura PD está
mostrada na Figura 3:
Figura 3 – Estrutura binária dos modelos de preferência declarada.
A forma funcional da função de utilidade do segmento grandes consumidores no experimento
PD é:
(6)
Onde:
: componente sistemático da utilidade do energético i;
: constante específica do energético i;
- custo direto do energético i;
- custo de adaptação da empresa para utilizar o energético i;
- variável dummy representando o custo ambiental associado ao energético i;
- coeficiente relacionado ao custo j na expressão (6).
3.2.3. Os Modelos Conjuntos
A estrutura para o modelo conjunto PR e PD inclui o energético gás natural, ainda não
existente no mercado, e é mostrada na Figura 4 abaixo:
Figura 4 – Estrutura do modelo conjunto PR e PD.
As funções de utilidade dos energéticos para o segmento grandes consumidores são
apresentadas como segue:
(7)
Onde:
: componente sistemático da utilidade do energético i;
: constante específica do energético i, corrigida segundo procedimento sugerido por
McFadden (1974);
: custo direto do energético i;
- custo de adaptação da empresa para utilizar o energético i;
- variável dummy representando o custo ambiental associado ao energético i;
- coeficiente relacionado ao custo j relativo ao melhor modelo obtido no processo de
estimação.
No caso do segmento cozinhas industriais as funções dos energéticos são semelhantes àquelas
do segmento grandes consumidores, com a diferença que a variável dummy ‘custo ambiental’
( ) é substituída pela variável dummy ‘risco de fornecimento’ ( ).
A correção das ASC's é necessária porque os estimadores de máxima verossimilhança não são
eficientes quando se trata de constantes específicas. McFadden (1974) propõe uma fórmula de
correção representada pela expressão:
Logo, Hg é a probabilidade de escolha da alternativa, calculada com a função de utilidade
não calibrada; e Wg é o percentual da alternativa na população.
3.2.4 O Experimento PD
O experimento de Preferência Declarada buscou introduzir o gás natural como energético
hipotético nos corredores estudados, para os dois segmentos de consumidores considerados.
Tanto no caso do segmento grandes consumidores quanto no do segmento cozinhas
industriais buscou-se customizar o questionário PD para refletir melhor a realidade dos
respondentes face aos conjuntos de escolha que lhes seriam apresentados.
No segmento grandes consumidores foi escolhido - no catálogo do Manual de Projetos de
Experimentos (Hahn and Shapiro, 1966) - o Plano 44b, Master Plan 8 que se refere a
experimentos com quatro variáveis, duas com três níveis e duas com dois níveis. Os valores
das variáveis e os níveis utilizados estão mostrados na Tabela 1.
Tabela 1- Quadro de variáveis e níveis utilizados para grandes consumidores no experimento
PD.
A aplicação do catálogo de projetos ortogonais permitiu a elaboração dos questionários de PD
para os segmentos analisados: grandes consumidores e cozinhas industriais.
No segmento cozinhas industriais, foi escolhido no Catálogo o Plano 15b, Master Plan 6 (FF)
que se refere a experimentos com três variáveis, duas com três níveis e uma com dois níveis,
conforme Tabela 2. A variável custo ambiental não foi considerada por ter sido detectada
insignificante para os respondentes deste segmento.
Níveis
considerados
Variável
Custo
Energético
(R$/m3)
Custo de
Adaptação
Risco de
Fornecimento
Custo
Ambiental
0 2,6 0 Alto Alto
1 1,45 100.000,00 Médio Baixo
2 0,13 600.000,00 - -
Tabela 2 - Variáveis e níveis utilizados para cozinhas industriais no experimento PD.
4. ANÁLISE DOS RESULTADOS
Após realizar o processo de calibração e análise de desempenho dos modelos para cada
segmento de mercado abordado, foram determinadas as probabilidades de escolha de cada
energético e, consequentemente, o consumo potencial dos energéticos no caso da introdução
do gás natural no conjunto de escolha dos consumidores.
A Tabela 3 mostra a estimativa da demanda (em equivalentes m3
por dia de gás natural) a
partir da probabilidade de escolha por cada energético obtida na modelagem, em cada
segmento de mercado, na região do Cariri.
Tabela 3 – Demanda global estimada de gás natural na RMC
Energético Probabilidadede
Escolha pelo
Energético
Demanda
Estimada
(Equiv.GN-
m3/dia)
Gra
nd
es
con
sum
idore
s Prob_lenha 0,823 145.271
PROB_GLP 0,024 4.236
PROB_GN 0,153 27.007
Total 1,0 176.514
Cozi
nh
a
Ind
ust
rial Prob_Lenha 0,278 1.437
PROB_GLP 0,26 1.344
PROB_GN 0,462 2.388
Total 1,0 5.169
Consumo global potencial 181.682
Fonte: GLEN/UFC, 2013.
Esta demanda, cerca de 182 mil m3/dia, constituiu a variável-chave na metodologia de
avaliação da viabilidade da estrutura de distribuição secundária considerada no Estudo.
A elasticidade direta da demanda de cada energético define o quanto a demanda por este
energético diminuirá quando ocorrer um aumento unitário no seu custo. As elasticidades
podem ser vistas nas figuras 5 e 6, a seguir:
Níveis
considerados
Variável
Custo
Energético
(R$/m3)
Custo de
Adaptação
Risco de
Fornecimento
0 1,45 0 Médio
1 2 1.500,00 Baixo
2 2,6 4.000,00 -
Figura 5 - Figura 6 -
Observe-se que o GLP apresenta, nos dois casos, a maior resposta à variação no preço unitário
do energético, certamente por ser muito mais caro que a lenha e não obstante estar
consolidado com menor risco de fornecimento e menor impedância na legislação ambiental
quanto ao seu uso. Já a demanda pelo gás natural se mostra bem menos sensível à variação no
seu preço que o GLP, o que indica uma maior competitividade potencial do gás natural em
ambas as categorias.
Observa-se da Tabela 4, para a categoria grandes consumidores, que a lenha apresenta cerca
de duas vezes a elasticidade cruzada do GLP, ou seja, um aumento no preço unitário da lenha
implicará em cerca do dobro de perda da sua demanda, em relação ao GLP. Isto está coerente
com as incertezas legais e ambientais associadas ao uso da lenha, ainda predominante na
categoria.
Tabela 4 - Elasticidade cruzada dos energéticos predominantemente utilizados nos corredores
estudados.
Elasticidade-custo cruzada do energético
[=(-probenerg) x Custoenerg x Coef_Custo]
Categoria Lenha GLP
Grandes Consumidores 0,020097 0,011805
Cozinha Industrial 0,000029 0,000542
Já para a categoria cozinha industrial, a resposta em perda de demanda à diminuição no preço
do concorrente é cerca de dezoito vezes maior para o GLP em relação à lenha. Isto se deve,
certamente, à grande diferença de custo unitário hoje cobrada, para a mesma equivalência
energética, entre a lenha e o GLP nos corredores estudados (custo cerca de vinte vezes maior
do GLP em relação à lenha). Isto sugere um nicho de mercado para o gás natural, se o preço
unitário deste for ofertado menor que o do GLP e a legislação ambiental/escassez regional
ficar mais rigorosa em relação ao uso da lenha.
A Tabela 5 apresenta as demandas estimadas de gás natural (em m3/dia) na categoria grandes
consumidores na Região Metropolitana do Cariri. Observa-se que Barbalha e Crato lideram a
Elasticidade direta dos energéticos
para o segmento grandes
consumidores.
Elasticidade direta dos energéticos
para o segmento cozinha
industrial.
demanda potencial pelo energético
A Tabela 6 mostra a demanda potencial, desagregada por segmento de mercado consumidor,
na categoria grandes consumidores. Deve-se atentar para o fato de que os segmento
“cimento” e “cerâmicas” representam mais de 75% da demanda total estimada do gás natural
nos corredor estudado. Da mesma forma, os segmentos “calçadista” e “gesso” se destacam em
termos de demanda pelo energético na região estudada.
Tabela 6 – Demanda potencial diária de GN, por segmento, na categoria grandes
consumidores.
Tabela 5- Demanda diária potencial de GN, por cidade,
na categoria grandes consumidores.
Cidade Demanda diária potencial
de GN (m3)
Barbalha 13.066
Crato 9.102
Juazeiro do Norte 4.287
Missão Velha 488
Total 26.943
Segmento Demanda diária
potencial de GN (m3)
Cerâmica 39.410
Calçadista 3.557
Bebidas 266
Alumínio 5
Cimento 55.333
Papel 160
Velas 10
Automobilística 4
Biscoitos 78
Farmacêutica 611
Gesso 1.939
Laticínio 18
Mineração 7.693
Química 79
Torrefação 14
Rações 244
Metal-mecânica 65
Total 109.485
No que tange à categoria cozinha industrial, a demanda estimada de gás natural, na região do
Cariri, é de 2.387 m³ diários de gás. Os segmentos “restaurantes” e “padaria” respondem por
quase dois terços da demanda total estimada pelo gás natural na região.
6. CONCLUSÕES
O Estudo demonstrou a consistência e importância do uso da modelagem discreta, com dados
conjuntos PR e PD, na estimação da demanda pelo gás natural em regiões ainda não assistidas
pela rede de gasodutos. A demanda estimada serviu de variável-chave na determinação dos
níveis de preço que geram a viabilidade da distribuição secundária do gás natural bem como
possibilitou destacar os segmentos de mercado mais tendentes a utilizar aquele energético,
uma vez disponibilizado pela Companhia Distribuidora na região de estudo.
A utilização do gás natural na região é uma alternativa ao uso da lenha, hoje ainda bastante
usada em função de seu baixo preço e apesar das restrições legais por seu impacto negativo no
meio ambiente.
Finalmente, vale destacar que a realização de investimentos em infraestrutura e nos serviços
públicos oferecidos à população da RMC, a exemplo da ampliação e diversificação da matriz
energética da região, é fundamental para a consolidação dos Arranjos Produtivos Locais
(APL`s) e o fortalecimento da economia na região como um todo, incrementando, dessa
maneira, as oportunidades de emprego e a geração de renda, principalmente para os
segmentos mais desfavorecidos e vulneráveis da população local.
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