tudo comeÇou com meio Ônibus (cap. 4)
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Quarto capítulo da história do empresário do setor de transportes Jelson da Costa Antunes.TRANSCRIPT
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Como o acesso fosse muito limitado, os empreendedores decidiram
montar uma linha de ônibus que fizesse a ligação do Jabaquara
à Praça Clóvis Beviláqua, no centro da capital paulistana. Foram
adquiridas seis licenças, na época cedidas por veículos, e, assim,
criada a Auto Viação Jabaquara. Para gerir o novo negócio, foi
convidado o engenheiro aeronáutico, oficial aviador da Aeronáutica Italiana, Tito Mascioli,
que participara da primeira travessia do Oceano Atlântico, em 1931, quando conhecera o
Brasil. Anos depois voltaria ao país para ficar e fazer história.
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Afi cionado por inovações tecnológicas e
com profundo conhecimento em logística de
transportes, seu Tito, como viria a ser conhe-
cido, fez a empresa progredir rapidamente.
Cerca 40% do transporte urbano de São Paulo
era feito pela Auto Viação Jabaquara quando,
em 1946, foi criada a Companhia Municipal
de Transportes Coletivos, que encampou to-
das as empresas particulares. A família Rocha
Miranda decidiu, então, retirar-se do setor
de transporte de passageiros. Artur Brandi
mudou-se para o Rio de Janeiro e, até 1955,
tocou a Viação Relâmpago, criada em socie-
dade com seu Tito. Relâmpago de quem seu
Jelson compraria aquele já famoso primeiro
“meio ônibus”.
Em 1947, Tito Mascioli adquiriu a Via-
ção São Paulo–Santos Ltda., que, desde 1943,
já fazia a viagem ao Litoral paulista, com du-
ração de uma hora e quarenta minutos. A es-
trela que estampava os ônibus ganhou uma
cauda cinco anos depois e foi a inspiração para
o novo nome da empresa: Viação Cometa S.A.
E os carros da Cometa passaram a ser vistos
Brasil afora, como “as luzes da estrada”.
America Magazine
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Chegam os Twin Coachs e a Cometa
cresce
Trinta ônibus americanos Twin Coach chegaram ao
Porto de Santos, em 1948, adquiridos pela Viação
Cometa. Modernos, rodavam com motor Fageol de 6
cilindros, 180 hp de potência e com câmbio devida-
mente adaptado ao sobe-e-desce da estrada em serra.
A negociação dos carros fabricados em Kent, no Es-
tado de Ohio, foi feita por Ítalo Breda, que viera para
a Cometa com a aquisição da Auto Viação São Pau-
lo-Santos, da qual seu pai era um dos proprietários.
Breda, que mais tarde fundaria a própria empresa, já
mantinha contato com a fábrica dos Estados Unidos,
viajou para lá e ainda conduziu os testes realizados
com o primeiro carro desembarcado no Brasil. Foi ele
o autor do laudo que levou o fabricante a adaptar as
engrenagens do câmbio às condições do trajeto feito
pelos ônibus.
Em 1949, a Cometa incorporou a Expresso
Bandeirantes Viação S.A. e, no ano seguinte, passou
a operar o transporte coletivo urbano da cidade de
Campinas, por meio da subsidiária Companhia Cam-
pineira de Transporte Coletivo, serviço que exploraria
até 1988.
A Cometa não parava de crescer e ampliou a área
de atuação no interior do Estado de São Paulo ao com-
prar, também em 1950, a Rápido Serrano Viação S.A.
Diferentemente da Expresso Bandeirantes, que tivera
o nome extinto ao ser incorporada, a marca Rápido
Serrano foi conservada, fazendo as linhas São Paulo–
Campinas, São Paulo - Jundiaí e São Paulo - Sorocaba.
O Twin Coach
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O mito João Havelange
- “De quem é a Viação Cometa?”
- “Do Havelange, claro. Do
João Havelange da FIFA.”
De fato, o advogado João Ha-
velange chegou a presidir a Cometa e
manteve uma participação minoritária
na empresa até o momento da venda
para o Grupo JCA, em 2002. Sua ami-
zade e parceria com Tito Mascioli data-
vam de 1940, quando, recém-formado,
viera do Rio de Janeiro para São Paulo
e passara a trabalhar como advogado
da Auto Viação Jabaquara.
Sete anos depois estava na Co-
meta e foi presidente da antiga Confe-
deração Brasileira de Desportos - CBD
(atual Confederação Brasileira de Fute-
bol - CBF) de 1956 a 1974 e diretor da
Fédération Internationale de Football
Association - FIFA no período de 1974
a 1998. Virou, então, o grande cartão
de visitas da empresa, representando-a
seja lá em que parte do mundo estives-
se. Como seu Tito e os fi lhos Arthur
e Felipe fossem bastante reserva-
dos e preferissem não aparecer,
Havelange cumpria muito bem
esse papel de porta-voz. Daí muita
gente acreditar, até hoje, que o dono da
Cometa era o Dr. João Havelange.
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É um pássaro? Um avião?
ARodovia Presidente Dutra fora recém-
inaugurada quando chegaram ao Brasil
os ônibus que se tornariam ícone do trans-
porte rodoviário e “a cara da Cometa”. Um
sucesso em termos de rendimento e marca.
Seu design e estrutura seriam referências
para modelos futuros da empresa. Eram
trinta carros norte-americanos GM Coach
modelo PD-4104, com 41 poltronas reves-
tidas de corvim estampado de flores verme-
lhas, carroceria de alumínio, prateada, com
faixas creme e azul, além de um belíssimo
cometa na parte traseira. A bordo dessas
máquinas com motor traseiro transversal
de 6 cilindros e 211 cv de potência, suspen-
são a ar, vidros ray-ban e ar-condicionado, a
Cometa avançou até os anos 1980.
Tão marcante era a sua passagem, tão
forte a revolução que impunha, que o mo-
delo foi batizado de “Morubixaba”, expres-
são indígena que significa “chefe da tribo”.
Como não houvesse limite de velocidade
naquele tempo, rodava pela estrada a 120
quilômetros por hora, arrebanhando fãs,
com o ronco peculiar de seu motor de dois
tempos.
Ao longo da década de 1950, outras
inovações seriam implementadas, seguin-
do a política da empresa de “crescer para
dentro”1: ao invés de ampliar o número e a
extensão das linhas, a ordem era aprimorar
e consolidar o que já existia. Concentrou suas
atividades, então, nos Estados de São Paulo,
1 A expressão era usada por Arthur Mascioli, ex-proprietário da Viação Cometa, para explicar a política de expansão da empresa: “em vez de cres-cer para fora, como faz a maioria dos concorren-tes, optamos por crescer para dentro. Preferimos criar uma sólida base interna a ampliar o número e a extensão das linhas.” Revista Transporte Mo-derno, ano 26, nº 284, setembro de 1987.
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Rio de Janeiro, Minas Gerais e Paraná, facilitando o con-
trole e suporte técnico. Seguindo essa diretriz, a extensão
da área de atuação da empresa foi limitada a um raio de no
máximo 600 quilômetros da capital paulista. Já acredita-
vam, na época, que as viagens longas eram mais adequadas
ao transporte aéreo.
Num tempo em que dar um telefonema consistia em
verdadeiro exercício de paciência, a Cometa foi pioneira ao
introduzir, em 1956, um eficiente sistema de comunicação
por rádio, que integrava ônibus, viaturas auxiliares e ter-
minais rodoviários. As redes formadas por rádios trans-
missores Motorola VHF (Very High Frequency) contavam
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Ser motorista da Cometa era
uma honra. Os Morubixa-
bas eram vistos na estrada como
verdadeiros postos avançados
da Polícia Rodoviária. Perdeu o
caminho e precisa retornar? Na
próxima parada, pergunte a um
motorista da Cometa.
Quantas e quantas vezes não se ouviu
esse conselho: “Vá sempre atrás de um carro
da Cometa, principalmente se tiver chuva ou
neblina”?!
E a fama não surgira do nada. A preo-
cupação com a avaliação e formação de seus
motoristas sempre caracterizou a empresa.
Muitos vinham da roça, aprendiam a dirigir
um trator, um caminhão e chegavam à cida-
de para ser motorista de ônibus. Era preciso
formá-los com muito critério.
Em 1948, quando não ha-
via ainda o exame psicotécnico obrigatório, a
Cometa criou o próprio departamento médi-
co e psicotécnico, com metodologia e equipa-
mentos importados dos Estados Unidos. Eram
realizados testes de qualidade da visão, reação
ao ofuscamento, reação a estímulos, entre ou-
tros, algo que não se fazia em nenhum outro
lugar no país. Nisso também a Cometa foi pio-
neira e serviu de referência quando ocorreu a
implantação de normas de transporte a nível
nacional.
Selecionados, os novos motoristas da
Cometa passavam por um treinamento que
não incluía só conhecimentos técnicos e pro-
cedimentos ao volante, mas ainda a apresenta-
ção pessoal e – muito importante! – o bom re-
lacionamento com os passageiros. A princípio,
o departamento recebia também motoristas
de outras empresas para exame, mas decidiu
focar o serviço nos próprios profi ssionais, de
America
Magazine
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forma a elevar a qualidade. Qualidade que
se materializava em segurança, credibilida-
de e numa excelente imagem no mercado.
A fama de absoluto rigor na avaliação
dos motoristas da Cometa era tão grande,
que até se criou certo folclore em torno dis-
so. Uma das “lendas” conta que, em dado
momento do teste, era colocado um ovo
atrás de um pneu traseiro do carro, num
declive suave – e o motorista que quebrasse
o ovo ao partir estava fora. Como também
se dizia que não era aceito aquele que der-
rubasse o copo de água colocado sobre o
painel do ônibus.
A Viação Cometa foi a primeira em-
presa a adquirir um bafômetro e instituir
o gráfico de serviço do motorista (GSM).
Numa folha com 24 quadradinhos que re-
presentavam as 24 horas do dia, o condutor
do carro marcava horas de serviço ao vo-
lante, em serviço mas fora do volante, ho-
ras fora de serviço e as oito horas de sono
que ele devia cumprir nos dormitórios da
empresa. Antes disso, nada de estrada.
Além de atento ao caminho, o mo-
torista da Cometa tinha e – tem de estar!
– sempre alerta. Um caso que ilustra essa
necessidade ocorreu numa viagem entre
São Paulo e Curitiba. Se hoje reclamam que
a estrada é precária, muito pior era nessa
época. Entre um buraco e outro, uma pas-
sageira entrou em trabalho de parto! Como
a empresa fosse pioneira no sis-
tema de comunicação, o condutor
do carro não estava sozinho. Não
havia nenhum hospital nas cida-
des próximas, e o motorista fez,
então, contato por rádio com a
agência da cidade de Registro, pedindo que
deixassem tudo preparado para socorrer a
passageira. Mas nada disso foi necessário,
afinal. Como o trabalho de parto avanças-
se rapidamente e a mulher sofresse com as
dores, o motorista teve de encostar o carro
e acabou trazendo à luz mais uma brasilei-
rinha. A bordo de um Cometa!
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com 500 estações móveis que equipavam
os ônibus que rodavam em linhas longas
e as viaturas auxiliares, mais 65 estações
fixas situadas ao longo das rotas e nos
terminais das linhas, além de oito repe-
tidoras. A empresa operou com esse siste-
ma até meados dos anos 1990.
Outro passo lá adiante dado pela
Cometa foi a implantação do computa-
dor, em janeiro de 1958, começando com
um tabulador IBM. Em 1964, a empresa
investiria na modernização de seu CPD
(Centro de Processamento de Dados), ad-
quirindo um computador Ramac 35 da
IBM. À válvula!
Por muitos anos, a Cometa foi a úni-
ca empresa do setor a utilizar computador
na integração de serviços, e hoje seu CPD
é referência de qualidade e eficiência.
A prosperidade nos anos 1960
Os chamados Lagartão e Imperial,
tecnicamente identificados como
GM PD-4101 e PD-4103, haviam sido
comprados da Expresso Brasileiro de Via-
ção Limitada e foram usados para o come-
ço da operação da linha São Paulo - Curi-
tiba, em 1961.
A parceria com a Scania começou
nesse mesmo ano, quando a Cometa ad-
quiriu um chassi B-71 importado para
testes e mudou as regras na empresa, que,
naquele tempo, tinha cerca de 300 carros
da Mercedes-Benz, sendo uma das maio-
res frotas da marca no mundo.
Em 1962, foi inaugurada uma nova
garagem central no bairro da Vila Maria,
zona norte de São Paulo, onde a empresa
funciona até os dias de hoje. E, em mea-
dos dos anos 1960, a Cometa implantou o
serviço de transporte urbano em Ribeirão
Preto, que operaria até 1983.
Os chamados carros Papo Amarelo
nasceram em 1963, com carroceria em
duralumínio, da Ciferal do Rio de Janei-
ro. Embora mais caro, o material era mais
resistente e leve, poupando motor, freios
e pneus, permitindo ao carro rodar rapi-
damente. Consolidava-se a parceria tam-
bém com a Ciferal. Dessas parcerias, saí-
ram o Flecha de Prata, Jumbo B, Jumbo
C, Turbo Jumbo e o famoso Dinossauro,
lançado em 1972. Sempre mantendo o
jeitão dos ônibus norte-americanos, bri-
lhando pelas estradas.
Em 1976, o Dinossauro passou por
pequenas mudanças no visual. Abando-
nou elementos, como pára-choques de
alumínio, vidros traseiros e tomadas de
ar, para incorporar traseira, pára-choques
em fibra de vidro, motor intercoolado e
caixa transversal.
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As corujinhas da Cometa
Até aquele momento só homens trabalhavam na Via-
ção Cometa. Fim dos anos 1960. Foi quando elas
chegaram deixando os ônibus da empresa ainda com
mais cara de avião. No princípio eram dez. Experiente,
Dirce de Oliveira, que já vinha da Impala, dava treina-
mento às recém-admitidas rodomoças da Cometa. As
candidatas eram submetidas ao exame psicotécnico,
passavam por uma entrevista que testava seu “nível in-
telectual e o desembaraço”, tinham de ter mais de 18
anos e “boa aparência”.
E o que fazia uma rodomoça? Recepcionava o pas-
sageiro, cuidava para que ele viajasse confortavelmente,
com manta e travesseiro, servia-lhe o café, o lanchinho
e fi cava atenta às janelas, que naquele tempo ainda eram
“de abrir”. Afi nal, era preciso fechar as cortininhas para
que o vento não incomodasse ninguém.
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Equilíbrio era fundamental para
caminhar pelo ônibus em movimento, de
salto alto, com uma bandeja nas mãos.
O uniforme, feito especialmente para
elas, incluindo os sapatos, tinha uma saia
“bem curtinha”. Mas aí de quem fizesse
gracinha com uma delas! O próprio mo-
torista nem parava para conversar com a
rodomoça, porque era advertência na cer-
ta. Tudo na maior disciplina e respeito.
Chegaram a formar um time gran-
de, já que saíam carros comerciais de
hora em hora, todos com a rodomoça a
bordo. Mais tarde, o serviço ficou restrito
aos carros-leito, que faziam as linhas que
ligavam São Paulo a Curitiba, Rio de Ja-
neiro, Juiz de Fora, Belo Horizonte e São
José do Rio Preto.
De volta da viagem, na garagem da
Vila Maria, subiam para os alojamentos
e tinham que descansar por pelo menos
seis horas. Durante as viagens, que dura-
vam oito, nove, doze horas, nem pensar
em dormir. A fiscalização estava sempre
atenta e era preciso ter os olhos sempre
bem abertos. Daí o apelido carinhoso: co-
rujinhas.
Em 2005, a Cometa quebraria mais
um grande tabu entre as empresas de
transporte rodoviário ao recrutar mulhe-
res para integrar seu quadro de motoris-
tas e, em 2006, também para a oficina.
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Nasce a CMA
Em 1983, a Ciferal, grande parceira da
Cometa na produção de carrocerias,
apresentava sérias dificuldades e entrou em
concordata. Como não encontrasse quem
prosseguisse o trabalho que a empresa do Rio
de Janeiro desenvolvia para a sua firma, seu
Tito optou por abrir a própria fábrica de car-
rocerias, a Companhia Manufatureira Auxi-
liar - CMA. Reuniu, para isso, uma série de
profissionais que já trabalhavam na produção
do Dinossauro.
A CMA fora instalada numa área de
11.000 metros quadrados. Da linha de pro-
dução, saía diariamente um Dinossauro IV.
Esse carrão da Cometa em nada que se pa-
recia com as antigas jardineiras: tinha freios
ABS, câmbio Confort Shift hidráulico, que
pré-selecionava as marchas, e caixa de mu-
danças com sete velocidades. Posteriormente,
o Dinossauro seria rebatizado de Flecha Azul.
Em 1984, deslizava sem solavancos pela
estrada, o primeiro Flecha Azul Automático,
prefixo 5223, com chassi BR-116 e caixa ele-
troautomática, importada da Suécia. Ainda
no mesmo ano, foi lançada uma nova série, a
53, composta por carros equipados com câm-
bio automático computadorizado. O anúncio
da novidade comparava os bancos de legítimo
couro vermelho aos de um Rolls Royce, ven-
dendo luxo e tecnologia.
A movimentada linha Rio - São Paulo
No dia 17 de dezembro de 1985, entrou em
funcionamento a Ponte Rodoviária Rio -
São Paulo. Inspirada no modelo da Ponte Aérea, a
operação entre as duas importantes cidades bra-
sileiras ficou sob a responsabilidade de um con-
sórcio de empresas. No lançamento, o movimento
era intenso no Terminal Rodoviário do Tietê, em
São Paulo. Plena semana de Natal e ali estavam
presentes Tito Mascioli, da Cometa, Camilo Cola,
da Itapemirim, e Laurindo Romano, da Expresso
Brasileiro, além de executivos das três empresas
reunidas no consórcio.
As concessões de operação da linha já exis-
tiam antes do estabelecimento da Ponte, desde
1951, e pertenciam à Única, à Cometa e à Pássaro
Marrom. A Única operou até 1980, quando trans-
feriu a linha para a Viação Itapemirim. A Pássaro
Marrom nunca chegou a utilizar a concessão, que
vendeu para a Cometa que ficou, então, com duas
licenças. A 1001 já rodava na Via Dutra fazendo a
linha Niterói - São Paulo desde os anos 1960, mas
não integrava a Ponte. Até que, em 1998, quando
a Expresso Brasileiro decidiu deixar o serviço, a
Cometa lhe vendeu uma de suas concessões,
Na efevercência do Plano Cruzado, a Ponte
Rodoviária chegou a oferecer cerca de 250 via-
gens por dia, atingindo uma média anual de 3
milhões de passageiros. A partir de 1988, o país
declinou e não foi diferente com o movimento da
Ponte Rodoviária, que diminuiu em 50%.
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A dura realidade dos anos 1990
Em 1986, a Cometa atingiu a mar-
ca de 1.150 ônibus, sendo 900 ro-
doviários e 250 urbanos, totalizando
22 garagens. Cada equipe cuidava de
50 carros no esquema de manutenção
preventiva, enquanto a corretiva era
feita na matriz.
O Flecha Azul V, da série que ia
até o prefi xo 7118, chegou à
estrada em 1994. As poltronas
1-2 e 3-4 não tinham mais as
janelas rebaixadas, herança
dos antigos.
Em 1998, o Presidente
Fernando Henrique Cardo-
so assinou decreto-lei2 que
dispunha sobre a exploração
dos serviços rodoviários in-
terestadual e internacional
de transporte coletivo de passageiros
diretamente pela União, ou mediante
concessão, tratava em um de seus pa-
rágrafos, da implantação de novos ser-
2 Decreto nº 2.521, de 20 de março de 1998. O Art. 11 incumbe ao Ministério dos Transportes decidir sobre a conveni-ência e a oportunidade da licitação para prestação do serviço rodoviário interesta-dual ou internacional de transporte cole-tivo de passageiros.
viços em ligações já atendidas por ser-
viço regular. Na prática, uma quebra de
reserva de mercado. A Cometa, que até
então tinha seu espaço garantido, foi
abalada pela concorrência. A margem
de lucro da empresa, que, em 1995,
fora de 13%, caiu para 1% em 2000.
A Cometa adotou uma política
arriscada diante da situação. Aumen-
tou a oferta para combater a concor-
rência, não só das demais empresas do
setor, mas, principalmente, dos clan-
destinos e automóveis de passeio. Na
prática, com taxa de lotação abaixo da
média, ela “pagava” para transportar.
Já deixara o setor urbano em Ribeirão
Preto, onde tinha 600 empregados,
e, em Campinas, onde chegara a ter
1.200 contratados. Os proprietários
da Cometa começavam a acreditar que
o transporte de passageiros já não era
mais um bom negócio. Para se manter,
era preciso inovar de alguma maneira.
Em abril de 2000, começaram a
rodar na linha São Paulo - Franca os
CMA-VIII e, em setembro de 2001, os
ônibus da Cometa, afi nal, abandonam
aquele jeitão norte-americano que tan-
tas saudades deixariam, mostrando-se
mais modernos e competitivos no mer-
cado. Na linha Rio - São Paulo, a chapa
lisa de alumínio substituiu a corrugada
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e se integrou à parte superior, acaban-
do com o degrau que caracterizava o
teto do carro. Um grande Cometa to-
mou o lugar das faixas laterais, e as ja-
nelinhas de correr foram trocadas por
grandes vidraças coladas. Rodando
sobre três eixos, traziam ar-condicio-
nado, câmbio semi-automático e eram
80 centímetros mais longo, chegando a
14 metros de comprimento e manten-
do o número de 46 poltronas. Aumen-
tava o conforto dos passageiros. Para
muitos, a mudança foi um choque, mas
a Cometa precisava inovar no design.
O que acontecia há algum tempo é que,
embora a frota fosse periodicamente
renovada, para o passageiro fi cava a
impressão de que os carros eram ve-
lhos, já que o padrão visual não mu-
dava. Mas foram mantidas as cores, o
azul e o prata, que rodavam pela estra-
da desde aqueles primeiros “foguetes”.
Mas as difi culdades não eram
poucas, e a tradicionalíssima Cometa,
ainda que praticamente sem dívidas,
via ameaçado seu lugar no mercado.
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A Cometa reconquista o espaço com o
Grupo JCA
Em 2002, concluindo uma negociação que du-
rou cerca de três anos, a Viação Cometa foi
vendida para o Grupo JCA. Jelson da Costa An-
tunes muito admirava Tito Mascioli e a própria
Cometa, e assumiu para o grupo – que já detinha
o controle da Auto Viação 1001, Rápido Ribeirão
Preto, Catarinense, Rápido Macaense e da subsidi-
ária Barcas S.A. – o desafio de recolocar a empresa
em seu merecido lugar. Com respeito à história e à
sólida cultura da Cometa, seu Jelson sabia que era
preciso modernizá-la, não só na gestão como na
oferta de serviços. Ônibus mais modernos, novos
e com cara de novos.
No dia 9 de dezembro de 2002, a Cometa
lançou em São Paulo os primeiros veículos de uma
frota de mais de 100 ônibus com design moder-
no e inovador. A carroceria em que o prata
dominava até então ganhou uma pintura
que ressaltava a idéia de conquista
do espaço: em azul, uma meia esfera
representando o planeta Terra. Por
trás dela, o sol surgindo como um
arco amarelo. Nas linhas claras, o mo-
vimento das estrelas e, por fim, a ima-
gem real de um cometa. Nas laterais e na
traseira: “Cometa”. A nova Cometa.
Motor eletrônico, intercooler de
7,2 litros, alcançando 326 cavalos de po-
tência. Com os novos carros, seu Jelson e o Grupo
JCA introduziam também uma família de serviços
e tarifas e trabalhavam a diversificação da frota,
adequando condições de conforto a cada tipo de iti-
nerário. Com grande festa, foram lançados os car-
ros com duas classes de serviço, os Double Decker,
com poltronas-leito no primeiro piso e executivas
no piso superior.
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volta a crescer
Com a modernização do Terminal Ro-
doviário do Tietê, em São Paulo, ao
final de uma grande reforma, a Cometa
passou a oferecer aos clientes uma Sala
Vip onde pudessem aguardar o embarque
com conforto e tranqüilidade. Como bem
dizia a propaganda, “um oásis no Terminal
Tietê”. Investimento do Grupo JCA, a Sala
Vip passava a atender aos passageiros da
Cometa, da 1001 e da Catarinense.
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Como forma de fazer frente à pressão
do transporte clandestino e aos chamados
“corujões”, que algumas empresas aéreas
ofereciam na madrugada, com tarifas com-
patíveis às rodoviárias, em 2004 a Cometa
investiu na diversificação de serviços. For-
taleceu a infra-estrutura para fretamento
e encomendas. E, em 2006, cresceu com a
aquisição das linhas São Lourenço - São
Paulo, Caxambu - São Paulo, Barra Man-
sa - São Paulo, Volta Redonda - São Paulo,
São José dos Campos - Caxambu, São Pau-
lo - Conceição do Rio Verde, São José dos
Campos - São Lourenço, São José dos Cam-
pos - Lambari, São Paulo - Cruzília e São
Paulo - Andrelândia, ligando os Estados de
São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais,
que, até então, eram exploradas pela Re-
sendense.
Também em 2006 foram introduzi-
das as vendas de passagem via internet e os
ônibus Double Service, com poltronas-leito e
executivas no mesmo piso. No Terminal Ro-
doviário Tietê, o passageiro passou a contar
com a Sala Net, para a retirada de seu bilhe-
te adquirido por meio do site da empresa.
Nesse tempo, as marcas da nova ges-
tão já eram visíveis, não só ao mercado,
mas também aos antigos funcionários da
empresa que, valorizados, assumiram no-
vas posições, empenhados em fazer sua
Cometa subir.
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Em 2007, quando da vigésima edição do
Prêmio Maiores e Melhores do Transporte e
Logística, a Cometa foi aclamada vencedora
pela décima vez, na categoria Rodoviário de
Passageiros, sendo a terceira vez consecutiva.
No ano seguinte, sua garagem G1 recebeu a
Certificação da Qualidade de Serviços Auto-
motivos IQA - Instituto da Qualidade Auto-
motiva. Foi a primeira transportadora da li-
nha pesada (caminhões e ônibus) a receber o
selo da qualidade do IQA, com a relevância de
trabalhar diariamente com vidas humanas,
quando qualidade significa, entre outras coi-
sas, responsabilidade e segurança. A empresa
tem como meta obter a certificação de todas
as garagens.
Hoje, com quadro funcional enxuto,
processos internos modernizados, família de
serviços e tarifas consolidada, transportando
cerca de 800 mil passageiros por mês, entre
os Estados de São Paulo, Minas Gerais, Para-
ná e Rio de Janeiro, num total de 7 milhões
de quilômetros rodados, numa média mensal
de 28.915 viagens, pode-se dizer que a mítica
Cometa reconquistou seu espaço e está pron-
ta para subir mais e mais.