trajetÓria de vida dos reassentados da usina hidrelÉtrica de irapÉ no vale do jequitinhonha –...

25
Revista Geografar www.ser.ufpr.br/geografar Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013 ISSN: 1981-089X TRAJETÓRIA DE VIDA DOS REASSENTADOS DA USINA HIDRELÉTRICA DE IRAPÉ NO VALE DO JEQUITINHONHA MINAS GERAIS TRAJECTORY OF LIVES OF RESETTLED OF IRAPÉ POWER PLANT IN VALE DO JEQUITINHONHA MINAS GERAIS (Recebido em 19.09.13; Aceito em: 06.12.13) Gilmar Fialho de Freitas Mestrando em Geografia Universidade Federal de Viçosa Viçosa, MG, Brasil e-mail: [email protected] Marcelo Leles Romarco de Oliveira Prof. Dr. do Departamento de Economia Rural Universidade Federal de Viçosa Viçosa, MG, Brasil e-mail: [email protected] Bruno Costa da Fonseca Graduando em Bacharelado em Cooperativismo Universidade Federal de Viçosa Viçosa, MG, Brasil e-mail: [email protected] RESUMO A concretização dos grandes projetos hidrelétricos no Brasil traz à tona uma discussão fundada na dualidade entre as partes envolvidas no processo: de um lado os empreendedores, dotados de um discurso desenvolvimentista voltado às demandas de uma sociedade industrializada; e do outro as populações rurais atingidas, que compulsoriamente são deslocadas para um reassentamento. Sendo assim, este estudo buscou entender como estão estruturadas as relações sociais desses segmentos afetados, de suas estratégias adaptativas em articulação com o

Upload: marcelo-romarco-oliveira

Post on 09-Sep-2015

8 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

A concretização dos grandes projetos hidrelétricos no Brasil traz à tona uma discussão fundada na dualidade entre as partes envolvidas no processo: de um lado os empreendedores, dotados de um discurso desenvolvimentista voltado às demandas de uma sociedade industrializada; e do outro as populações rurais atingidas, que compulsoriamente são deslocadas para um reassentamento.

TRANSCRIPT

  • Revista Geografar www.ser.ufpr.br/geografar Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013 ISSN: 1981-089X

    TRAJETRIA DE VIDA DOS REASSENTADOS DA USINA HIDRELTRICA DE IRAP NO VALE DO JEQUITINHONHA MINAS GERAIS

    TRAJECTORY OF LIVES OF RESETTLED OF IRAP POWER PLANT IN

    VALE DO JEQUITINHONHA MINAS GERAIS

    (Recebido em 19.09.13; Aceito em: 06.12.13)

    Gilmar Fialho de Freitas Mestrando em Geografia

    Universidade Federal de Viosa Viosa, MG, Brasil

    e-mail: [email protected]

    Marcelo Leles Romarco de Oliveira Prof. Dr. do Departamento de Economia Rural

    Universidade Federal de Viosa Viosa, MG, Brasil

    e-mail: [email protected]

    Bruno Costa da Fonseca Graduando em Bacharelado em Cooperativismo

    Universidade Federal de Viosa Viosa, MG, Brasil

    e-mail: [email protected]

    RESUMO

    A concretizao dos grandes projetos hidreltricos no Brasil traz tona uma discusso fundada na dualidade entre as partes envolvidas no processo: de um lado os empreendedores, dotados de um discurso desenvolvimentista voltado s demandas de uma sociedade industrializada; e do outro as populaes rurais atingidas, que compulsoriamente so deslocadas para um reassentamento. Sendo assim, este estudo buscou entender como esto estruturadas as relaes sociais desses segmentos afetados, de suas estratgias adaptativas em articulao com o

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    181 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    territrio que atualmente ocupam, como tambm do universo de valores que do sentido a estas relaes. A partir desta constatao, este artigo tem por objetivo conhecer a trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha, desde os locais de origem at o atual momento em que residem nos reassentamentos. Para isso, utilizamos como procedimentos metodolgicos tanto tcnicas quantitativas quanto qualitativas, em que o mtodo principal escolhido foi o estudo de caso, com uma amostra de 61 reassentados distribudos em 10 associaes diferentes, em 5 municpios da regio: Turmalina, Leme do Prado, Jos Gonalves de Minas, Capelinha, e gua Boa. Atravs deste estudo, constatamos que a trajetria de vida dessas populaes que so reassentadas marcada pela inevitabilidade que um processo de reassentamento forado possui, e que estes esto, constantemente, imersos em um processo de mudana e de re-significao dos seus meios de vida.

    Palavras Chaves: Trajetria, Vale do Jequitinhonha, reassentados, meios de vida

    ABSTRACT

    The implementation of large hydropower projects in Brazil brings up a discussion based on the duality between the parties involved in the process on the one hand entrepreneurs endowed with a speech developmental facing the demands of an industrialized society, and the other rural populations affected, which are compulsorily displaced for resettlement. Therefore, this study sought to understand how social relations are structured these segments affected, their adaptive strategies in conjunction with the territory that currently occupy, but also the universe of values that give meaning to these relationships. From this finding, this paper aims to understand the trajectory of lives of resettled Irap Power Plant in Vale do Jequitinhonha, from the places of origin to the present time residing in resettlement. For this, we use as instruments both quantitative and qualitative techniques, in which the main method chosen was the case study, with a sample of 61 resettled distributed in 10 different associations in five municipalities in the region: Turmalina, Leme do Prado, Jos Gonalves de Minas, Capelinha, and gua Boa. Through this study, we could realize that the life histories of these populations which are resettled is marked by inevitability that a process of forced resettlement has, and they are constantly immersed in a process of change and re-signification of their livelihoods.

    Keywords: Trajectory, Vale do Jequitinhonha, resettled, livelihoods

    1 INTRODUO

    A construo das grandes barragens, assim como outros grandes obras de

    infraestrutura, passam pela justificativa, ou mesmo por uma promessa, de apoio ao

    desenvolvimento e progresso da regio aonde os empreendimentos so projetados

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    182 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    e implantados. Os argumentos mais comuns que podem ser observados so de que

    esses investimentos se fundamentam em: novas oportunidades de emprego que so

    gerados, na dinamizao da economia local, na melhoria da infraestrutura

    disponibilizada populao, entre outros. Estes seriam classificados como os

    impactos positivos da construo das grandes barragens, levando-se em conta a

    perspectiva de seus apoiadores.

    Esta abordagem, portanto, no deve servir como referncia quando tratamos

    das diversas comunidades rurais que so atingidas, direta e indiretamente, por

    esses empreendimentos. preciso enxergar quo grande so as dificuldades dos

    reassentados em reproduzir suas vidas sob novas bases materiais e

    organizacionais, especialmente longe da gua, elemento fundamental para o

    sucesso de suas atividades produtivas e referencial simblico mximo de

    espacialidade. Um discurso desenvolvimentista e territorializador que vem dos

    interessados na construo de grandes empreendimentos hidreltricos se choca

    com uma realidade sensvel e scio-culturalmente construda ao longo da vida dos

    ribeirinhos, o que revela as profundas irracionalidades e injustias cometidas quando

    o que est em jogo a imposio e no o dilogo.

    De acordo com esta perspectiva, Ribeiro e Galizone (2003) ao estudarem a

    questo da gua, as polticas de gesto e a populao rural do Vale do

    Jequitinhonha em Minas Gerais, apontam que apesar da aplicao de esforos e

    recursos pblicos necessrios ao desenvolvimento do campo, grande parte da

    populao rural permaneceu, e permanece, margem da produo intensiva, dos

    mercados e at mesmo das discusses que envolvem o direcionamento de aes

    que lhes contemplem melhores condies de vida.

    Num primeiro momento, Ribeiro e Galizone (2003) apresentam a ideia de que

    elaborar e transmitir conhecimentos uma atividade permanente para estas

    populaes rurais, pois a sua produo de alimentos e outros bens baseiam-se em

    suas prticas. Por essa razo, o territrio e suas formas sociais de apropriao tm

    para essa populao uma enorme importncia e uma forte valorizao subjetiva. No

    caso especfico apresentado sobre o Vale do Jequitinhonha, as nascentes e os

    pequenos cursos d'gua so fatores fundamentais para a localizao dessas

    populaes, assim como da organizao de suas atividades sociais e econmicas.

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    183 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    Portanto, a construo da Usina Hidreltrica Presidente Juscelino Kubitschek

    no Vale do Jequitinhonha, mais conhecida como Usina de Irap, pertencente

    Companhia Energtica do Estado de Minas Gerais (CEMIG), ocasionou uma

    mudana profunda nos meios de vida de seus atingidos, que somam mais de mil

    famlias ribeirinhas. Registros apontam que 47 comunidades, em reas dos

    municpios mineiros de Berilo, Jos Gonalves de Minas, Leme do Prado, Turmalina,

    Gro Mogol, Cristlia e Botumirim, foram afetadas e deslocadas de suas terras.

    Nesse sentido, a construo da Usina Hidreltrica de Irap, imps s famlias

    atingidas, uma mudana compulsria de seus meios de vida. Diante desse

    panorama, importante ressaltar que as comunidades atingidas possuam formas

    diferenciadas de relaes sociais, culturais, econmicas e territoriais que dificilmente

    podero ser reaplicadas em outra localidade, ou seja, observa-se a tentativa de

    homogeneizao da diversidade sociocultural das comunidades

    Assim sendo, este trabalho tem como objetivo entender e analisar a trajetria

    de vida dos atingidos da Usina Hidreltrica de Irap, destacando inicialmente como

    contexto de anlise, como era a vida destes ribeirinhos em suas comunidades de

    origem, destacando a estruturao de suas vidas de acordo com as condies

    econmicas, sociais e ambientais em que viviam. Em seguida procuramos conhecer

    como foi construda a ideia da necessidade de abandonarem suas antigas

    localidades para irem para um reassentamento, e tambm de entender como se deu

    este processo. Por fim, apresentamos o contexto atual de vida dessas famlias nos

    seus respectivos reassentamentos, buscando apresentar os pontos positivos e

    negativos desse novo estilo de vida em comparao com as condies anteriores.

    2 MATERIAL E MTODOS

    A pesquisa foi desenvolvida utilizando-se tanto de tcnicas qualitativas como

    quantitativas. Esse tipo de estudo justificado, sobretudo, pela valorizao do

    produto final do trabalho que esses dois tipos de reflexo podem trazer. Conforme

    analisa Gobo (2005), as vantagens de estudos que conciliam as duas abordagens

    tm garantido maior grau de formalizao, ou seja, se inscrevem no mbito de

    estudos que adotam um mtodo reflexivo. Segundo o mesmo autor, [...] a atividade

    de formalizar convida o pesquisador a explicitar os seus argumentos, as instituies

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    184 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    e os conhecimentos tcitos, a fim de fornecer aos leitores as informaes para um

    dilogo no interior da comunidade cientfica (p.92).

    O mtodo utilizado neste trabalho se trata do estudo de caso. Este se

    caracteriza como um tipo de pesquisa cujo objeto uma unidade social que se

    analisa profundamente. Visa o exame detalhado de um ambiente, neste caso rural.

    Tem por objetivo, tambm, proporcionar vivncia da realidade por meio da anlise e

    tentativa de soluo para um problema extrado da vida real. O estudo de caso tem

    se tornado a estratgia preferida quando os pesquisadores procuram responder s

    questes como e por que certos fenmenos ocorrem. Adotando um enfoque

    exploratrio e descritivo, o pesquisador que pretende desenvolver um estudo de

    caso dever estar aberto s suas descobertas, utilizando uma variedade de dados

    coletados por meio de variadas fontes de informao. O principal objetivo de um

    estudo de caso , segundo Godoy (1995), aprofundar a descrio de um

    determinado fenmeno.

    Os dados coletados em cada territrio de investigao foram de fundamental

    valia para dar conta do desafio de juntar os pedaos das diversas dinmicas

    analisadas para entender e localizar s reas rurais que constituram a base deste

    estudo, compreendidos aqui como espaos histricos, polticos, social, econmico e

    culturalmente institudos e instituidores de identidades.

    Destarte, buscamos inspirao no ponto de vista idiogrfico que, segundo

    analisa Rebughini (2005), [...] utilizada em antropologia e em etnologia, mas

    sempre mais frequente tambm na sociologia (p.244). Ainda segundo o autor, no

    mbito da comparao idiogrfica, procede-se, primeiro, uma investigao sobre

    como se formam e se expressam determinados fenmenos, em cada um dos

    contextos a serem comparados para, em seguida, se buscar possveis relaes

    entre esses aspectos. A comparao, porm, tal como adverte Rebughini (2005),

    [...] no deve ser nunca entendida como mtodo de controle das hipteses [...] e,

    sim, [...] como tcnica para melhor compreender, descrever e explicar os

    fenmenos observados e comparados (p. 246).

    Portanto, considerando que, exceo de oito famlias que residiam na rea

    atingida do municpio de Berilo que optaram pela venda de suas propriedades, as

    demais 122 famlias residentes em reas rurais dos municpios de Jos Gonalves

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    185 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    de Minas, Leme do Prado, Capelinha, gua Boa e Turmalina, foram remanejadas e

    reassentadas.

    Desse universo, participaram do estudo 61 titulares de lotes, chefes de

    famlias, organizados em dez Associaes de Moradores dos Reassentamentos

    situados nos cinco j referidos municpios. A seguir, apresentamos um quadro

    detalhando o universo da pesquisa, destacando os municpios e suas respectivas

    associaes que foram selecionadas, assim como apresento o nmero de famlias

    que foram reassentadas nas associaes e as famlias que foram selecionadas para

    este estudo:

    Tabela 1: O universo de pesquisa

    Fonte: Dados da pesquisa, 2010

    Direcionamos, ainda, aos titulares dos lotes, um questionrio composto de

    questes objetivas relativas s seguintes dimenses: econmica, social, cultural, de

    infraestrutura, e de produo, com a finalidade de caracterizar tanto os participantes

    como seus contextos anteriores e atuais de vida.

    3. RESULTADOS

    3.1 - A vida beira do rio (local de origem)

    Nesse momento de nossa reflexo, tivemos como objetivo conhecer a vida

    dos reassentados na poca em que moravam beira do Rio Jequitinhonha, ou seja,

    conhecer seus hbitos, costumes e sua forma de viver. Como era a relao com os

    Municpios Associaes Selecionadas N de Famlias Reassentadas N de Famlias selecionadas

    Jos Gonalves de Minas 29 Famlias 18 Famlias

    Leme do Prado 40 Famlias 17 Famlias

    Turmalina Povoado Peixe Cru 22 Famlias 11 Famlias

    Capelinha 19 Famlias 7 Famlias

    gua Boa 14 Famlias 8 Famlias

    Total 11 Associaes 124 Famlias 61 Famlias

    Corao de Maria e Unio de

    Todos

    Quilombo Boa Sorte, Corao de

    Jesus e Mandassaia

    Fartura, So Caetano e Santa

    Brbara

    Novo Horizonte e Ribeiro

    Vermelho

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    186 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    parentes, vizinhos, com a terra, com o rio, as formas de produo e as descries do

    local de origem.

    A grande maioria dos reassentados moravam na regio de origem desde que

    nasceram, seguindo o exemplo de seus pais. Esse fato nos chama a ateno para a

    maior probabilidade da existncia de um espao de relaes bem formadas ao longo

    dos anos. Soma-se a isso o vnculo com os elementos da paisagem e os vnculos

    sociais bem estruturados entre as pessoas e nas formas de expresso das culturas

    e prticas religiosas, que na maioria das vezes foram herdadas ao longo dos anos.

    Essa questo demonstrada atravs da Tabela 2:

    Tabela 2 - Tempo que residia na propriedade de origem

    Fonte: Dados da pesquisa, 2010

    Em relao ao tempo de residncia na propriedade de origem, verificou-se

    que 3,27% moravam na rea atingida pela barragem de um a cinco anos; 4,91%

    entre cinco e dez anos; 6,55% entre dez e vinte anos; e 82,00% h mais de vinte

    anos, revelando assim que a grande maioria era morador antigo na regio. Esta

    situao indica tambm a dificuldade dessas famlias em deixar tudo que

    construram, sejam bens materiais ou simblicos, para, forosamente, recomearem

    a vida em um lugar estranho.

    O trabalho da grande maioria dos reassentados em seus locais de origem

    girava em torno da obteno dos alimentos necessrios para o sustento da famlia,

    podendo incluir a venda de excedentes em determinadas situaes. Conforme

    afirma Wanderley (2009) um dos aspectos relevante sobre o campons e sua forma

    de produzir diz respeito natureza da produo que posta a venda. Esta produo

    no se trata de um excedente que sempre produzido na perspectiva de ir alm a

    Tempo que residia na propriedade de origem %

    Um ano 0,00%

    At 5 anos 3,27%

    At 10 anos 4,92%

    At 20 anos 6,55%

    Mais de 20 anos 81,99%

    No se aplica 3,27%

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    187 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    sua reproduo e de sua famlia, e sim um complemento aos seus meios de vida e

    de obteno de instrumentos para o trabalho. Na produo camponesa no h a

    escolha por plantar para vender ou para o sustento, a troca do excedente realizada

    no mercado uma alternativa para a garantia de condies mnimas de sua

    reproduo.

    Boa parte dos homens, pais de famlia, tambm trabalhavam a dia de servios

    para aqueles que demandassem, como no caso das plantaes de eucalipto que

    prevalecem na regio. A maioria dos reassentados comearam a trabalhar muito

    cedo para a ajudar nas necessidades da casa. De acordo com Candido (2003, p.

    31):

    Este modo de produo no deve ser considerado apenas como reproduo da existncia fsica dos indivduos, ele j uma espcie determinada da atividade destes indivduos, uma determinada maneira de manifestar a sua vida, uma determinada maneira de viver destes indivduos [...]

    Conforme analisa Sposito (2010) uma possibilidade observada para

    caracterizar os espaos se trata do modo de vida que seus habitantes ocupam num

    determinado contexto histrico. A vida rural ainda muito dependente da

    valorizao da vida comunitria, onde boa parte de seus comportamentos so

    regidos por relaes de parentesco e vizinhana, e por influncia de sua

    religiosidade.

    Contudo, a questo da produo era extremamente limitada ao consumo da

    famlia, j que o acesso cidade era muito difcil e a condio financeira das famlias

    no permitia outra forma de consumo, como por exemplo, o uso de produtos

    industrializados. A casa do ribeirinho recebia uma produo bastante diversificada,

    como: milho, feijo, mandioca, batata, frutas e hortalias. De acordo com Heredia

    (1979, p. 77 -78):

    Os produtos fornecidos pelo roado so os que asseguram o abastecimento dos meios necessrios para o consumo familiar, consumo que se materializa na casa. Consequentemente, o roado que d condies de existncia casa como local de consumo []

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    188 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    No caso da profisso dos reassentados em seus locais de origem, esta ficava

    restrita ao roado para os homens com ajuda das mulheres quando necessrio,

    principalmente no plantio e na colheita em que a necessidade de mo de obra era

    maior, e estas se dedicavam ainda as atividades da casa, cuidar dos filhos e das

    hortas de quintal. Nestes termos, o trabalho da mulher apenas reconhecido como

    ajuda e no como uma profisso. O trabalho de Heredia (1979) tambm destaca o

    papel da mulher no roado e como esta vista:

    Por outro lado, as atividades da casa, por estarem ligadas ao consumo, no so consideradas como trabalho e correspondem esfera de domnio feminino. O campo de ao da mulher a casa e, por consequncia, considera-se que esta no trabalha. Sem dvida, muitas vezes, como j pudemos observar, as mulheres desenvolvem tarefas no roado; alm do mais, dentro das atividades prprias ao roado, a semeadura uma atividade considerada feminina e realizada exclusivamente por mulheres. Alm disso, cabe a elas outro tipo de tarefas, como por exemplo as limpezas peridicas que os cultivos requerem depois de serem plantados, embora homens e crianas tambm participem desta atividade (HEREDIA, 1979, p. 80)

    muito comum na regio trabalhos meia ou com outro tipo de parceria,

    assim como era muito frequente as trocas de dias. Essas prticas ainda so

    frequente nos reassentamentos, mas em grau inferior. Outro ponto de destaque

    que a questo da incidncia de outras fontes de renda muito pequena, aonde

    apenas algumas famlias produzem alguns produtos como doces e conservas para o

    mercado dos municpios (produo individualizada), e alguns relatos de produo de

    panelas de pedras, ou algumas pessoas que trabalhavam aonde se produziam as

    peas.

    3.2 - A construo da hidreltrica Etapas do reassentamento

    Com a definio de que as obras da UHE Irap deveriam comear, aps a

    obteno das licenas necessrias, iniciou-se as etapas do reassentamento das

    famlias que seriam atingidas. Primeiramente, buscou-se identificar junto aos

    reassentados como foi formada a ideia sobre a necessidade de sair de seu local de

    origem para o reassentamento. Conforme os relatos, foi formada dentro de um

    ambiente de muita expectativa por parte das famlias reassentadas. A ideia principal

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    189 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    que moveu as famlias pelo acordo da necessidade de relocao perpassou pela

    esperana de construo de uma vida melhor, principalmente quando se relaciona a

    expectativas de maiores oportunidades para os filhos, de estudo e emprego.

    Em Durkheim e Mauss (2001), evidencia-se ento que a diversidade dos

    elementos so formados por mecanismos, do qual construmos, projetamos e

    localizamos em um determinado espao nossas representaes do mundo sensvel.

    Portanto, se torna visvel as classificaes que atribumos s coisas e indivduos,

    tendo por pressuposto a busca por uma ordenao em grupos distintos, aonde suas

    demarcaes sejam evidentes e determinveis. As especificidades das relaes

    anteriormente destacadas situam-se dentro de um espao que determinado e que

    verdadeiramente faz parte da vida de seus habitantes.

    Munidos por esta forma de representao do espao a ser concebido, o

    primeiro contato formal com a ideia de ser reassentado, foi atravs de reunies

    proporcionadas pela CEMIG nas comunidades atingidas, tendo em vista que no

    momento das reunies o rgo empreendedor j chegava munido de todas as

    informaes necessrias que foram elaborados atravs de estudos contratados pela

    empresa. Na verdade, a ideia comeou a aparecer atravs dos boatos e mesmo a

    partir de pessoas estranhas que chegavam regio. Esses sempre causavam

    grande estranhamento. Atravs dos relatos, fica bem evidente que todas as

    questes envolvidas na relocao eram tratados com bastante detalhe nas reunies,

    mas bastante instigante se era acessvel aos reassentados a compreenso dos

    fatos, j que suas expectativas poderiam estar acima dos questionamentos.

    No caso das comunidades que foram formadas no estilo de agrovilas as

    famlias afirmavam que imaginavam como seriam formados os reassentamentos, e

    tambm disseram que realmente foi como imaginavam, com apenas alguns detalhes

    de variaes. Neste caso, associa-se ao fato de que a CEMIG ressaltava sempre

    que as comunidades sofreriam o mnimo de mudanas em sua forma, apenas

    incluindo alguns elementos tipicamente urbanos, como: gua encanada, calamento

    e iluminao pblica. A seguir observa-se uma foto tirada em uma das mais

    tradicionais comunidades que foram reassentadas, a Comunidade de Peixe Cru no

    municpio de Turmalina-MG, que vem justamente para ilustrar o estilo de agrovilas

    utilizados nos reassentamentos.

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    190 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    Figura 1: Povoado de Peixe Cru, em Turmalina MG.

    Fonte: fotos dos autores, 2010

    J nas associaes formadas com as famlias dispersas em seus lotes,

    aonde se observa uma maior distncia entre as casas, evidente a reclamao

    sobre isolamento e pouca relao entre as mesmas. A mudana neste caso foi

    maior, justificando a afirmao dos reassentados de que imaginavam que os

    reassentamentos fossem diferentes, ou mesmo no chegaram a medir as

    consequncias do distanciamento entre os vizinhos. Os relatos quase sempre

    evidenciavam que nos locais de origem a proximidade, tanto geogrfica como afetiva

    entre a vizinhana, era maior.

    Os estudos e debates relacionados ao processo das construes das grandes

    hidreltricas, tende em sua maioria, infelizmente, a promover a reduo da

    diversidade sociocultural e a simplificar sua complexa organizao social e territorial.

    De acordo com os estudos de Vainer (1993, p.564), os discursos oficiais que

    prestam servio ao lado empreendedorista das negociaes:

    [...] vm sempre na voz passiva, a expressar sua objetivao num discurso globalmente fundado na naturalizao da vida social: assim, temos: populaes afetadas, atingidas, impactadas, deslocadas, remanejadas, preservadas, reassentadas, sempre passivas, inexoravelmente condenadas a ser campo de ao de um outro, meio ambiente impactado pela interveno do empreendedor/empreendimento hidreltrico.

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    191 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    Tendo em vista a complexidade do processo, uma das primeiras etapas que

    compreenderam o processo de reassentamento dos atingidos pela Usina Presidente

    JK foi a seleo das terras para onde seriam relocadas essas famlias. Em seguida

    comearam as escolhas dos lotes por parte dos reassentados. As famlias deveriam

    escolher suas terras, se assim fosse de sua vontade, respeitando as proximidades

    que existiam no local de origem, a fim de que laos de vizinhana, amizade e

    parentesco se mantivesse na nova localidade.

    A maior parte das terras escolhidas para formar os lotes para o

    reassentamento das famlias atingidas foram nas chapadas que circundam a rea do

    reservatrio formado pela barragem. Porm, registra-se casos de famlias que foram

    reassentadas a mais de 100 KM da regio de origem, como por exemplo alguns

    reassentamentos formados na reas rurais de Capelinha e gua Boa. Nas agrovilas

    observou-se relatos de que as famlias puderam escolher a sua vizinhana, ou seja,

    escolhiam os lotes de acordo com quem estava reassentado ao lado, ou mesmo a

    formao de alguns grupos de famlias que a partir de ento escolhiam seus lotes

    juntos.

    A seguir apresenta-se algumas informaes sobre a participao dos

    reassentados na escolha das terras aonde seriam demarcados os reassentamentos,

    bem como de sua participao na escolha do lote que atualmente reside:

    Tabela 3 - Participao na Etapa de Seleo das Terras e dos lotes no Reassentamento

    Fonte: Dados da pesquisa, 2010

    Atravs da Tabela 3, observa-se que a grande maioria dos reassentados

    (91,80%) participaram da escolha das terras as quais seriam destinadas a formao

    dos reassentamentos. Assim como 78,69% tambm afirmaram que puderam

    escolher seus respectivos lotes que atualmente ocupam. Atravs desses dados

    conclui-se que houve uma grande mobilizao popular em torno de vrias decises

    importantes, como na situao apresentada anteriormente. A escolha das terras se

    deu de forma prevista no acordo e a populao esteve no direito de escolher para

    Participao nas etapas Participao na seleo das terras (% ) Participao na seleo dos lotes (% )Sim 91,80% 78,69%

    Em parte 3,28% 9,84%

    No 4,92% 11,47%

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    192 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    quais "terras" iriam e onde seus lotes situariam. As terras do reassentamento foram

    repartidas seguindo os critrios e os tamanhos definidos pelo acordo. Durante essa

    etapa buscou-se preservar as proximidades e os laos afetivos existentes entre as

    famlias na comunidade de origem, a fim de que permanecessem prximos na nova

    localidade e para que a adaptao se desse de uma maneira menos impactante

    possvel.

    Antes das definies referentes s distribuio das terras e dos lotes era

    preciso que fosse feita uma avaliao prvia de benfeitorias do lote de origem, para

    que o reassentado fosse indenizado de acordo com os bens que possua. Uma das

    modalidades aplicada quanto a forma de ressarcimento aos reassentados sobre as

    perdas que teriam com o abandonar de suas terras de origem, se deu atravs de

    indenizaes monetrias.

    Portanto, as informaes apresentadas a seguir demonstra a opinio dos

    reassentados se realmente foram indenizados, assim como estava previsto no

    acordo de realocao:

    Tabela 4 - Pagamento de Indenizaes aos Reassentados

    Fonte: Dados da pesquisa, 2010

    Atravs da Tabela 4, observa-se que 86,89% dos entrevistados afirmaram

    ter recebido as indenizaes, sendo que 73,77% disseram que a indenizao se deu

    de forma integral e apenas 13,12% afirmaram que estas se deram parcialmente.

    Somente uma pequena parcela de 9,84% dos entrevistados afirmaram no terem

    sido indenizados. O no pagamento de indenizaes a algumas famlias deve-se,

    basicamente, ao no enquadramento s proposies elaboradas pela CEMIG, ou

    seja, algumas famlias no possuam benfeitorias na regio de origem ou mesmo

    porque moravam com outras famlias.

    Portanto, as benfeitorias que os reassentados possuam em seus locais de

    origem foram descritas como bem avaliadas, o que refletiu nas indenizaes

    monetrias recebidas pelas famlias. A maior parte dos pesquisados afirmaram ter

    Pagamento de Indenizaes %

    Foi Indenizado 73,77%

    Foi Indenizado Parcialmente 13,12%

    No Foi Indenizado 9,84%

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    193 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    sido justo aquilo que lhes foi oferecido. Aqui destacamos com bastante nfase o

    depoimento recolhido sobre a administrao desses recursos por muitas famlias

    indenizadas. Em poucos casos, percebe-se famlias que souberam investir o seu

    dinheiro e esto melhorando sua condio financeira a cada dia. Por outro lado,

    observa-se relatos de famlias que no souberam coordenar seus gastos e hoje

    vivem em situaes iguais ou piores s condies que ocupavam antes de serem

    reassentadas.

    Nas palavras de Sigaud (1992) observa-se os efeitos perversos contidos nas

    polticas do setor eltrico, que so responsveis pelo deslocamento compulsrio e

    extremamente desorganizado de milhares de cidados brasileiros, contribuindo para

    seu empobrecimento e por uma profunda transformao do seu modo de vida.

    Torna-se bastante comum na regio a aquisio, por parte dos

    reassentados, de veculos automotores com o dinheiro pago pelas indenizaes,

    sem medir as consequncias dos possveis gastos que o transporte pode trazer

    futuramente (manuteno). Destaca-se tambm outras formas de investimentos

    (equipamentos domsticos, de produo e outros) que muitas vezes esto

    subordinadas pessoas de m f, aproveitando o baixo grau de informao e

    escolaridade que h entre os reassentados. Evidencia-se com isso a falta de

    orientao dos rgos responsveis pelo empreendimento e reassentamento dos

    atingidos em, de alguma forma, orientar ou mesmo acompanhar a administrao dos

    recursos por estas famlias. Fica bem evidente que os indenizadores pensam

    apenas em cumprir a meta de indenizar, conferindo s famlias a responsabilidade

    sobre seus investimentos.

    Outra questo que destacamos com bastante nfase se trata dos impactos

    socioculturais que o empreendimento trouxe para aquelas comunidades atingidas.

    Quando os primeiros interessados chegaram a regio, no caso a empresa que

    avaliava o potencial energtico do rio, perceberam que algumas medidas deveriam

    ser tomadas em relao ao rico acervo cultural que o Vale do Jequitinhonha

    possua. Antes do processo de reassentamento, nas reunies que eram realizadas

    para a definio de como as famlias atingidas seriam reassentadas, os

    reassentados afirmaram que estas questes em relao preservao de seus

    costumes, cultura e prticas religiosas foram discutidas. Estes tambm afirmaram

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    194 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    que os empreendedores diziam que tudo no reassentamento, as festas e outras

    manifestaes, seriam iguais como eram feitas no local de origem.

    Houve alguns relatos de que a CEMIG contratou algumas pessoas para que

    fizessem o registro dessas manifestaes, assim como no que diz respeito em

    relao ao patrimnio arqueolgico, para serem reproduzidas nas atuais localidades.

    Aqui, portanto, chamamos a ateno para uma discusso difcil de ser realizada

    nessas reunies, j que o tema bastante subjetivo, ou mesmo, que as famlias

    atingidas no compreendessem a verdadeira dimenso do problema a ser gerado,

    ou tambm, que estivessem mais preocupadas com outros assuntos.

    Nesse sentido, nos estudos de Santos (2007), desenvolveu-se uma reflexo

    muito relevante a se destacar sobre as implicaes sociais das barragens, voltando-

    se para uma dimenso que geralmente se torna bem negligenciada: o sofrimento e a

    dor dos expropriados,

    [...] os relatos sobre o deslocamento compulsrio evocam uma pluralidade de situaes de transformao, traduzidas em perdas, que contemplam desde o espao fsico, o estranhamento da nova situao vivida at as relaes cotidianas e de proximidade. Desta perspectiva, creio ser possvel afirmar que, com a interveno sobre o espao fsico para a formao do lago, atinge-se violentamente as relaes sociais, desestruturando-as. esta desestruturao que conforma o substrato do lamento e da dor. (SANTOS, 2007, P. 194)

    inegvel que as comunidades atingidas por barragens possuam formas

    diferenciadas de relaes sociais, culturais, econmicas e territoriais que dificilmente

    podero ser reaplicadas em outra realidade. Assim como tambm fato a tendncia

    de homogeneizao da diversidade sociocultural das comunidades deslocadas.

    3.3 A vida no reassentamento

    A vida dos reassentados em suas atuais localidades est estruturada em

    situaes bem diversas, j que ntido um tratamento diferenciado oferecido s

    comunidades atingidas. S para ressaltar possveis contentamentos e

    descontentamentos, observa-se que em comunidades mais distantes dos ncleos

    urbanos e com disperso das famlias em seus respectivos lotes, os reassentados

    afirmaram que sua vida no anda to bem, porm ressaltamos que nesta questo

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    195 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    pode haver situaes pessoais, familiares, ou mesmo de infraestrutura que justifique

    a opinio. Tambm indiscutvel, que a maioria das famlias que esto situadas nas

    agrovilas, se consideram satisfeitas com a sua vida aonde esto. De fato, como

    observado, muitos aspectos estruturais e de acesso a servios necessrios

    condicionam a sua opinio.

    Conforme analisa Melucci (2001), possvel identificar diferenas entre as

    novas e velhas solidariedades, uma vez que as ltimas se constituem em tempos de

    globalizao e individualismo. Na acepo do autor, as velhas solidariedades eram

    aquelas que se baseavam muito na proximidade. Os vnculos se davam nas

    residncias, nas vizinhanas, na famlia, no trabalho. E isso que de alguma

    maneira tem se modificado, porque as relaes agora esto mais distantes, a

    mobilidade espacial maior, as migraes so mais intensas. Em todo o mundo

    est se criando uma deslocalizao e, portanto, se criam novas razes que de

    alguma maneira estavam criados nas comunidades tradicionais. Essas razes

    comunitrias perderam-se e criou-se um problema, ou seja, as velhas solidariedades

    esto dando lugar ao individualismo.

    To fundamental quanto falar das solidariedades tambm ter em mente que,

    o que muitas vezes se busca compreender a qualidade de vida de um determinado

    grupo. Conforme analisa Souza (1982, p.15), a qualidade de vida:

    [...] abrange tanto a distribuio dos bens de cidadania os bens e direitos que uma sociedade, em dado momento, julga serem essenciais quanto a de uma srie de bens coletivos de natureza menos tangvel e nem por isso menos reais em suas repercusses sobre o bem-estar social.

    Do ponto de vista da Organizao das Naes Unidas (ONU), a qualidade de

    vida est relacionada a satisfao do cidado, no que diz respeito ao acesso a

    alimentao, aos servios de sade, ao conhecimento, as boas condies de

    trabalho, ao lazer e a participao nas atividades econmicas, culturais e polticas

    da comunidade.

    Neste estudo, tambm bastante pertinente ressaltar que a felicidade de

    determinados grupos, como por exemplo a satisfao de parte dos atingidos em

    suas novas localidades, geralmente est associada a uma boa administrao da

    famlia e dos recursos que ela dispe, sobretudo aqueles que foram adquiridos

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    196 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    atravs das indenizaes. Ou seja, sempre preciso evidenciar que um conjunto

    de fatores que define a opinio em relao determinados assuntos. Contudo,

    nesse momento destacamos a importncia das descries e observaes sobre

    como est organizada a vida do reassentado nessas novas localizaes, bem como

    as disposio das condies e servios essenciais ao seu dia a dia.

    A questo referente ao acesso escola bastante complicado. Um fato

    interessante a insero do transporte escolar na vida desses estudantes dos

    reassentamentos. Com a nucleao das escolas nos centros urbanos, ou a

    construo de unidades escolares apenas em aglomerados habitacionais, as

    Prefeituras e/ou Estado disponibilizam nibus ou vans para o transporte dos alunos.

    Em tese, a escola estando localizada ou no prximo residncia familiar, os alunos

    em idade escolar no deveriam ficar sem estudar. A CEMIG no se responsabilizou

    pela construo de escolas, a no ser nas agrovilas, por considerar que a educao,

    assim como a sade de responsabilidade do Estado. Outro ponto importante a ser

    pensado se trata da questo da centralizao das escolas em reas urbanas ou em

    pequenos aglomerados, que de uma maneira ou de outra, pode dificultar a insero

    desse aluno no seu contexto.

    Tabela 5 - Acesso escola na comunidade de origem e no reassentamento

    Fonte: Dados da pesquisa, 2010

    Na propriedade de origem, uma grande parcela dos entrevistados (60,65%)

    afirmaram que tinham acesso escola com proximidade, isto devido muitas vezes

    a um carter mais informal que a educao assumia alguns anos atrs, onde existia

    uma grande subdiviso de escolas rurais, que funcionavam at mesmo em casas de

    algumas dessas famlias. Tambm possvel perceber o aumento de opinies que

    revelam que as escolas ficaram mais distantes com o reassentamento (52,46%), fato

    tambm que se relaciona a uma maior incidncia de jovens que frequentam o ensino

    mdio, que geralmente s oferecido nas cidades.

    Acesso escola Local de origem (%) Reassentamento (%)

    Prximo residncia 60,65% 44,26%

    Distante da residncia 24,60% 52,46%

    No tinha (tem) acesso escola 14,75% 1,64%

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    197 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    indiscutvel a maior oportunidade criada quando nos referimos ao acesso

    dos estudantes escola aps o reassentamento. Tambm obtivemos casos de

    pessoas (inclusive adultos) que esto voltando a estudar, e que manifestaram seu

    descontento com a dificuldade de acesso ao nvel superior na regio.

    Com relao ao acesso aos postos de sade, a CEMIG somente construiu

    nas agrovilas ou aglomerados urbanos. Outros casos identificados foram que alguns

    reassentamentos foram implantados nas vizinhanas de algum distrito ou

    aglomerado urbano que j possuam postos de sade antes da transferncia das

    famlias. O atendimento nos postos de sade, semelhana do que acontece em

    diversas regies do pas, bastante precrio, descontnuo e insuficiente. A

    disponibilidade de mdicos irregular e de enfermeiros tambm, e estas questes

    so focos de reclamaes dos moradores da regio.

    Outra questo, no menos importante, se trata das possibilidades de lazer

    nos reassentamentos formados. A grande ausncia de infraestrutura de lazer no

    meio rural generalizada no Brasil como um todo, portanto, no seria diferente nos

    reassentamentos estudados. Atualmente, as principais atividades de lazer

    verificadas esto, especialmente, nas agrovilas, onde foram construdos campos de

    futebol, quadras poliesportivas, uma sede para a associao que serve para

    atividades sociais, igreja e, em um aglomerado urbano encontrou-se at uma piscina

    semi-olmpica. Nos demais lugares a regra geral um precrio campo de futebol e

    bares com mesas de sinuca. A seguir, atravs da Tabela 6 observa-se as opinies

    dos reassentados sobre a disponibilidade de alguma forma de lazer nos

    reassentamentos em relao ao seus locais de origem:

    Tabela 6 - Infraestrutura de lazer no local de origem e no reassentamento

    Fonte: Dados da pesquisa, 2010

    Mais de 65,57% dos reassentamentos no dispem de qualquer rea de

    lazer, especialmente para a juventude, o que dificulta e muito a manuteno dos

    Infraestrutura de lazer Local de origem (%) Reassentamento (%)

    Havia/h 44,26% 14,75%

    Havia/h parcialmente 21,31% 18,04%

    No havia/h 34,43% 65,57%

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    198 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    filhos dos agricultores no meio rural. Alves Filho (2008), pesquisando

    assentamentos de reforma agrria do INCRA em Minas Gerais tambm encontrou

    esta mesma ausncia de lazer para os filhos dos beneficirios da reforma agrria e

    se tornando uma das variveis responsveis pelo xodo dos jovens do meio rural

    para a cidade, especialmente para aqueles que tiveram acesso a mais tempo

    escola. Do outro lado, podemos observar que a maior parte dos pesquisados

    (65,57%), afirmaram que dispunham desse ambiente em suas localidades de

    origem, mesmo que de maneira parcial. Essa referncia, na maioria dos casos,

    condiz com as proximidades que as residncias dos reassentados possuam do rio,

    que foi citado em diversos momentos como a melhor alternativa de lazer que essa

    populao desfrutava na sua regio de origem.

    Outra questo que este estudo se ateve diz respeito ao abastecimento de

    gua s famlias reassentadas. A maioria destas afirmaram utilizar atualmente como

    fonte principal as redes de distribuio de gua dos reassentamentos, o que tem

    gerado bastante descontentamento entre alguns reassentados. A questo negativa

    apresentada, se deve ao fato que grande parte dessas famlias possuam facilidade

    de acesso gua no local de origem, pois moravam beira do rio, e atualmente a

    disponibilidade de gua controlada pela distribuio encanada, assim como feito

    nas cidades, o que tem gerado inmeras discusses. Tambm importante

    ressaltar a construo de reservatrios de gua da chuva, para que o assentado

    tambm possua gua para outras finalidades durante os perodos de seca. No atual

    momento, ressaltando a visita dos pesquisadores aos reassentamentos em agosto

    de 2012, tambm repercute-se a possvel implantao de cobrana sobre a

    distribuio da gua encanada, ou seja, os reassentados em breve vo estar

    pagando pela gua utilizada.

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    199 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    Tabela 7 - Fonte de abastecimento de gua utilizada na propriedade de origem e no

    reassentamento

    Fonte: Dados da pesquisa, 2010

    A Tabela 7, apresentam os dados referentes fonte de abastecimento de

    gua que e foi utilizada pelos assentados no reassentamento e na propriedade de

    origem. A maioria (73,76%) dos entrevistados afirmaram utilizar atualmente como

    fonte as redes de distribuio de gua dos reassentamentos. J no local de origem,

    39,35% dessas famlias utilizavam as guas do rio, prtica que era comum para

    essa populao caracterizada como ribeirinha. Tambm era bastante comum o uso

    de minas ou fontes, destacado por 18,03% dos entrevistados, e menos relevante o

    uso de poos em 3,28% dos casos pesquisados. Os dados apresentados

    demonstram a grande mudana sofrida na vida dos reassentados em relao a este

    bem natural indispensvel vida dos seres humanos, pois o que antes era

    abundante hoje controlado pelas torneiras.

    A gua nos reassentamentos no utilizada somente para o consumo

    humano, mas tambm para os animais domsticos e para o cultivo das terras. A

    partir de ento, buscou-se conhecer as consideraes dos reassentados sobre as

    terras dos reassentamentos. Podemos observar que h um equilbrio entre as

    opinies de que so boas ou ruins, isso se d devido basicamente aos lugares

    fsicos onde essas famlias foram reassentadas, ou seja, algumas famlias foram

    reassentadas longe da propriedade de origem, que em sua quase totalidade era

    pertencente a uma rea semirida, para regies de transio com a faixa norte da

    Zona da Mata Mineira, de clima mais ameno e com solos mais frteis. As famlias

    que se mantiveram mais prximas de sua regio de origem foram, em sua maioria,

    Fonte de abastecimento de gua Local de origem (%) Reassentamento (%)

    Rede 22,95% 73,76%

    Rio 39,35% 1,64%

    Poo 3,28% 13,12%

    Mina/Fonte 18,03% 4,92%

    Outras 16,39% 4,92%

    No se aplica 0,00% 1,64%

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    200 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    as que afirmaram ter decado as condies de produo, sobretudo pela falta de

    gua.

    Quando questionamos o nvel de participao dos reassentados nas

    atividades desenvolvidas pelas Associaes de Moradores, as informaes

    demonstram que, quase a totalidade dos reassentados entrevistados afirmaram que

    participam das aes realizadas pelas associaes, muitas vezes movidos pelo

    intuito de receber alguma forma de ajuda que esta possa proporcionar.

    Tabela 8 - Participao nas atividades da associao dos moradores do reassentamento

    Fonte: Dados da pesquisa

    A grande maioria dos reassentados (95,08) afirmaram que a participao

    junto a essas associaes de extrema importncia para o bom andamento de

    algumas aes realizadas pelas famlias dentro de seus lotes. atravs das

    associaes que muitos dos reassentados conseguem adquirir instrumentos e

    prticas para viabilizar muitas de suas atividades, como por exemplo: uso de

    implementos agrcolas na produo, orientaes para plantios coletivos, aquisio

    de conhecimentos tcnicos e prticos atravs dos cursos que so oferecidos, e

    assistncia tcnica especializada da EMATER e de outras entidades. Conforme

    Sigaud (1992), para que se produza uma boa coeso entre essas famlias parece ter

    sido decisivo o surgimento de associaes no interior dos reassentamentos

    formados, que passaram a funcionar como grupos de presso junto a diferentes

    organismos do Estado, no sentido de forar a liberao de recursos para obras de

    infraestrutura, assim como para a obteno de crdito.

    O grau de participao dos reassentados nos casos analisados devem

    considerar inmeras especificidades encontradas em cada uma dessas unidades.

    Observamos que muitas das associaes so consideradas bem sucedidas por

    apresentarem pessoas confiveis e responsveis que as conduzem, e pelo alto grau

    de mobilizao popular que essas reas possuem, sobretudo quando so marcadas

    as reunies para discutirem o andamento das diversas aes a serem

    Participao na Associao %

    Participa 95,08%

    No participa 4,92%

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    201 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    implementadas. Contrariamente, em alguns casos, registra-se queixas por partes

    dos reassentados de m conduo das atividades, que na maioria das vezes

    atribuda a culpa ao presidente da associao.

    J quando nos referimos s questes culturais que envolvem a vida nesses

    novos lugares, o que se registra so perdas significativas no momento atual em

    relao preservao da cultura de origem, seus costumes, suas prticas religiosas

    no interior do reassentamento. Muito pouco, no momento, feito com relao ao

    assunto. Registra-se um distanciamento grande da Igreja Catlica em relao aos

    reassentados, j que grande parte destes se declararam catlicos. Ainda sim so

    realizadas algumas festas tradicionais, que movimentam bastante as comunidades,

    principalmente nas agrovilas que possuem maior quantidade de pessoas. Por

    exemplo: Festa do Bom Jesus no ms de agosto, no Povoado de Peixe Cru em

    Turmalina- MG. Fato essencial para que estas festividades tradicionais continuem

    existindo que as identidades devem estar ancoradas ao sentimento de

    pertencimento a uma determinada localidade, e assim criar [...] uma conscincia de

    si na relao com o outro [...] (CARNEIRO, 1998, p.13).

    Conforme bem demonstrou Giddens (1990), nas sociedades tradicionais o

    passado algo venerado e todas as simbologias so peas fundamentais para a

    perpetuao de tais experincias entre as geraes. A tradio aparece como uma

    forma de lidar com o tempo e o espao, que ento estruturado pelas prticas

    sociais recorrentes.

    4 CONCLUSO

    O caso estudado traz discusso a violncia de que os empreendimentos

    hidreltricos significam quando se observa a inevitabilidade do deslocamento, tendo

    em vista que este um processo forado. As grandes decises esto nas mos

    daqueles que detm os critrios tcnicos de atuao, ou seja, os grandes

    empreendedores, e o dilogo com a sociedade se d somente quando quase tudo j

    est definido. O que se observa nestes processos so meras formalidades que

    trazem carter legitimador e de convencimento de que a obra necessria e de que

    todos vo sair ganhando. Conforme foi descrito, os passos dados na trajetria de

    vida dos atingidos de Irap revelam que pouca margem foi dada s possibilidades

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    202 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    de mudanas e de adequao das necessidades dos reassentados, demonstrando

    que a possibilidade de reverso de determinadas situaes so muito pequenas, a

    medida que no se pode mais voltar a morar aonde j est alagado.

    Apesar de trazermos para essa discusso final a constatao de que algumas

    famlias atingidas se demonstraram felizes com suas atuais condies de vida,

    sobretudo devido boa administrao de seus recursos e suas terras, as barragens

    ainda so vistas, conforme apresenta Sigaud (1992), como se fosse algo temporrio,

    significando apenas um susto na vida dos atingidos, em que a recuperao se dar

    de forma bem rpida diante de algumas medidas de mitigao e compensao que

    podem ser propostas. Neste ponto, elencamos novamente, a constatao da

    insatisfao de muitos daqueles que foram abordados pela pesquisa em relao

    diversos aspectos que compreendem a vida individual e coletiva dessas populaes.

    Os motivos de uma possvel infelicidade, ou at mesmo o contrrio, so bastante

    complexos; que podem variar desde as relaes mais simples entre as pessoas e

    seus meios de vida de outrora, ou de relao com a natureza, que se tornaram

    essncia para suas vidas; at mesmo devido incorporao da mentalidade de que

    o homem de hoje s pode se realizar plenamente quando est inserido na dinmica

    capitalista e dos benefcios que ela pode trazer.

    Muito ainda est por se fazer neste percurso que to longo, na perspectiva

    de que os atingidos por barragens sejam reconhecidos em sua condio humana e

    cidad, em que no pese somente os deveres mais como tambm o pleno exerccio

    de seus direitos. Questionamos com um olhar crtico as vises que so atribudas

    aos nossos rios de que so grandes jazidas de energia, prontas para gerarem

    riquezas. Ao passo que, do outro lado desconhece-se, ou mesmo fora-se

    desconhecer, que os rios tambm so expresso territorial mxima na vida de

    muitas pessoas, servindo este como recurso essencial condio de reproduo do

    homem e de todo acervo cultural que este constri ao longo das geraes.

    7 BIBLIOGRAFIA

    ALVES FILHO, E. Legitimao de saberes dos trabalhadores rurais e sustentabilidade dos assentamentos de Minas Gerais. Departamento de Economia, Universidade Federal de Viosa, Viosa, Relatrio de Pesquisa, 2008.

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    203 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    CANDIDO, Antnio. Os parceiros do Rio Bonito: estudo sobre o caipira paulista e a transformao dos seus meios de vida. So Paulo. Livraria Duas Cidade, 2003 CARNEIRO, M. J. Ruralidade: novas identidades em construo. Estudos Sociedade e Agricultura. Rio de Janeiro, n. 11, 1998. DURKHEIM, mile & MAUSS, Marcel. Algumas formas primitivas de classificao: contribuio para o estudo das representaes coletivas. In: Ensaios de Sociologia. So Paulo. Perspectiva, 2 Edio, 2001. GIDDENS, Anthony. Consecuencias de la modernidad. Madrid: Alianza, 1990. GOBO, Giampietro, O Projeto de pesquisa nas investigaes qualitativas. In MELUCCI, Alberto. Por uma sociologia reflexiva Pesquisa qualitativa e cultura. Petrpolis: Vozes, 2005, p.91-115. GODOY, A. S. Introduo pesquisa qualitativa e suas possibilidades. In: Revista de Administrao de Empresas. So Paulo: v.35, n.2, p. 57-63, abril 1995. HEREDIA, Beatriz Maria Alasia de. A morada da vida: trabalho familiar de pequenos produtores do Nordeste do Brasil. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979. MELUCCI, Alberto. A inveno do presente Movimentos Sociais nas Sociedades Complexas. Petrpolis/ RJ: Vozes, 2001. REBUGHINI, Paola, (2005). A comparao qualitativa de objetos complexos e os efeitos da reflexibilidade. in MELUCCI, Alberto. Por uma sociologia reflexiva Pesquisa qualitativa e cultura. Petrpolis: Vozes, p.237-261. RIBEIRO. E. M. ; GALIZONI, F. M. gua, populao rural e polticas de gesto: O caso do Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais. Revista Ambiente e Sociedade, Vol. V - no 2 - p. 129 - 146 jan./jul. 2003. SANTOS, Snia B. M. Lamento e Dor. Uma anlise scio-antropolgica do deslocamento compulsrio provocado pela construo de barragens. Tese de Doutorado. Programa de Ps-Graduao em Cincias Sociais. Universidade Federal do Par/Universit de Paris, 2007. SIGAUD, Lygia. O efeito das tecnologias sobre as comunidades rurais: o caso das grandes barragens. RBCS, n.18, ano 7, 1992. SOUZA, Amaury (Org.). Qualidade de vida urbana Introduco, Rio de Janeiro: Zahar, 1982. (Debates Urbanos n. 7). SPOSITO, Maria Encarnao Beltro. Cidade e campo: Relaes e contradies entre urbano e rural. So Paulo, Editora Expresso Popular, 2010

  • Freitas, G.F.; Oliveira; M. L. R.; Fonseca, B. C. Trajetria de vida dos reassentados da Usina Hidreltrica de Irap no Vale do Jequitinhonha

    Minas Gerais

    204 Revista Geografar - Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013.

    VAINER, Carlos Bernardo. Regionalismo e projeto nacional: uma reflexo sobre regionalismos velhos e novos. Cadernos Ippur UFRJ, Rio de Janeiro, n.2, p. 21-34, 1993. WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. O mundo rural como espao de vida: reflexos sobre a propriedade da terra, agricultura familiar e ruralidade. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2009. (Recebido em 19.09.2013. Aceito em 06.12.2013)