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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO LICENCIATURA EM PEDAGOGIA Thaysa Calandino Faria Machado A importância da ludicidade no processo de ensino-aprendizagem: a ruptura entre a passagem da Educação Infantil para o Ensino Fundamental Orientadora: Profª Dra. Irene Giambiagi Rio de Janeiro, 13 de maio de 2019

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

Thaysa Calandino Faria Machado

A importância da ludicidade no processo de ensino-aprendizagem: a ruptura entre a

passagem da Educação Infantil para o Ensino Fundamental

Orientadora: Profª Dra. Irene Giambiagi

Rio de Janeiro, 13 de maio de 2019

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Thaysa Calandino Faria Machado

A importância da ludicidade no processo de ensino-aprendizagem: a ruptura entre a

passagem da Educação Infantil para o Ensino Fundamental

Monografia apresentada à Faculdade de Educação da UFRJ, como re-

quisito parcial à obtenção de título de licenciada em Pedagogia.

Orientadora: Profª Dra. Irene Giambiagi

Rio de Janeiro, 13 de maio de 2019

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A importância da ludicidade no processo de ensino-aprendizagem: a ruptura entre a

passagem da Educação Infantil para o Ensino Fundamental

Thaysa Calandino Faria Machado

Monografia apresentada à Faculdade de Educação da UFRJ,

como requisito parcial à obtenção de título de licenciada em

Pedagogia.

Aprovada em: _____/_____/______

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________________________Orientadora: Profa. Dra. Irene Giambiagi

Faculdade de Educação/ UFRJ

____________________________________________________________________Prof. Dr. Reuber Gerbassi Scofano

Faculdade de Educação/ UFRJ

____________________________________________________________________Profa. Dra. Luciene Cerdas

Faculdade de Educação/ UFRJ

Rio de Janeiro, 13 de maio de 2019

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Dedicatória

Dedico este trabalho à mulher que foi e é minha fonte infinita de amor,

de superação e de inspiração, que se fez presente em todos os momen-

tos da minha vida e foi a chave principal para que eu chegasse até esta

etapa da minha vida, minha vozinha Idalina Fontinha de Oliveira.

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Agradecimentos

Agradeço primeiramente a Deus, que me abençoou, capacitou e me deu forças para chegar

até aqui, apesar das adversidades da vida.

Aos meus pais, Rosane e Marco Aurélio, que me deram a vida e que foram meu sustento nos

dias de luta e nos dias de glória, não medindo esforços para que eu conquistasse meus sonhos. A

meu irmão, Marco Aurélio Junior, que é meu amigo de todas as horas. E aos meus avós, Idalina e

Adilson, que participaram ativamente de cada passo meu enquanto puderam, fica o legado e a

saudade. Obrigada por cada incentivo, amor, palavra de conforto. A vocês, minha eterna gratidão.

Ao meu marido, Renan Machado, que sempre me incentivou a me tornar a melhor versão de

mim. Obrigada pela compreensão, pelo carinho, por acreditar e realizar comigo todos os nossos

sonhos!

Aos meus filhos, Miguel e Theo, que são a minha maior motivação, a minha fonte

inesgotável de amor. Obrigada por cada olhar, cada gesto, por existirem na minha vida. Sem vocês,

nada disso teria sentido!

Às amigas que caminharam comigo ao longo dessa trajetória, Raiane Mendes, Thaynara

Costa, Carina Oliveira e Rayane Oliveira, que foram os presentes que a UFRJ me deu. Obrigada

pelas palavras amigas, pela partilha e pelo incentivo!

À minha orientadora, Irene Giambiagi, que me acolheu quando precisei, que foi além de

orientadora, uma grande amiga. E que, com todo carinho, ajudou-me a construir este trabalho.

Obrigada pela amizade, pelos ensinamentos e pelos momentos de troca!

Finalmente, aos mestres e doutores da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que

contribuíram muito para a minha formação, cada um à sua maneira. Obrigada!

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Epígrafe

Brincar é uma das atividades mais enriquecedoras da vida de um in-divíduo. Não restam dúvidas de que as crianças têm o melhor empre-go do Mundo.

Sofia Esteves

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Resumo

Os objetivos principais que nortearam a elaboração deste trabalho foram discutir a importância dolúdico para o desenvolvimento infantil e analisar a concepção do brincar como uma importantemetodologia de aprendizagem para crianças em idade compreendida da Educação Infantil aos anosiniciais do Ensino Fundamental. Destacou-se a ruptura que ocorre na transição entre a EducaçãoInfantil e o Ensino Fundamental, com ênfase no papel do professor em tal processo e naimportância desse profissional em prol de contribuir para o desenvolvimento integral de crianças de0 a 6 anos com propostas lúdicas mediadas por brinquedos, jogos e brincadeiras. O trabalho estáorganizado em três capítulos: o primeiro capítulo disserta sobre o conceito do lúdico, seus diversossignificados e sua importância para a educação; o segundo, sobre a transição da educação infantilpara o ensino fundamental e o terceiro, sobre a metodologia de aprendizagem tendo o lúdico comofoco e a importância do papel do professor como estimulador da aprendizagem. A pesquisa buscoufundamentação teórica em diversas fontes, tendo como referencial teórico os seguintes autores:Huizinga, Winnicott, Vygotsky, Wallon, Piaget e Kishimoto. Para enriquecer a análise da pesquisabibliográfica desenvolvida, optou-se pela realização de uma entrevista previamente estruturada comuma profissional da educação com experiência relevante na área estudada. A monografia enfatiza obrincar como ferramenta de aprendizagem na infância. Destaca-se, finalmente, que o brincar é algoessencial para o desenvolvimento integral da criança e que precisa, a todo momento, ser valorizadoe incentivado pelos profissionais do seu convívio.

PALAVRAS-CHAVE: Lúdico, Educação Infantil, Ensino Fundamental, Processo de Ensino-Aprendizagem, Desenvolvimento Cognitivo.

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Siglas

BNCC – Base Nacional Comum Curricular

CDP – Conhecimentos didático-pedagógicos

CEB – Câmara de Educação Básica

CIEP – Centro Integrado de Educação Pública

CNE – Conselho Nacional de Educação

DCNEI – Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC – Ministério de Educação e Cultura

ONU – Organização das Nações Unidas

RCNEI – Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil

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Sumário

Introdução .................................................................................................................................11

Capítulo 1: Conhecendo o conceito de ludicidade ...................................................................13

1.1 Entendendo outros conceitos de lúdico.........................................................................17

1.2 A relação entre o lúdico e a Educação...........................................................................20

Capítulo 2: Educação Infantil e Ensino Fundamental – superando rupturas............................27

2.1 A Educação Infantil.......................................................................................................27

2.2 O Ensino Fundamental..................................................................................................30

2.3 A ruptura entre a passagem da educação infantil para o ensino fundamental...............31

Capítulo 3: O brincar como metodologia de aprendizagem e o papel do professor................35

3.1 O diálogo entre a teoria e a prática...............................................................................38

Considerações Finais.................................................................................................................43

Referências Bibliográficas........................................................................................................45

Anexo.........................................................................................................................................

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Introdução

Considerando que ao longo de muito tempo a criança foi reconhecida e tratada apenas como

um ser em miniatura e desconsiderada em suas particularidades e necessidades, pode-se mencionar

que as concepções em torno do que seja infância e de como a criança deva ser vista e inserida na

sociedade a que pertence, de modo geral, sofreram grandes modificações ao longo das décadas,

conforme o conceito de Philipe Ariès (1981) sobre infância.

Ariès foi um historiador pioneiro na análise e na concepção da infância, ele dissertava sobre

como as crianças eram consideradas seres inferiores que tinham uma infância reduzida, pois nem

todas as crianças viviam a infância propriamente dita, devido a suas condições sociais, econômicas

e culturais. Os sinais de desenvolvimento de sentimento com a infância tornaram-se mais

significativos a partir do fim do século XVI e durante o século XVII, quando os costumes

começaram a mudar, como a preocupação com a educação, os modos de se vestir e a separação das

crianças de classes sociais diferentes.

Tendo em vista as mudanças mencionadas, refletir a respeito das necessidades e

características próprias dessa fase de desenvolvimento do ser humano tornou-se uma das mais

consideráveis preocupações de professores, pais, estudiosos e demais pessoas interessadas por essa

etapa do desenvolvimento infantil.

A presente pesquisa tem como objetivos principais discutir a importância do lúdico para o

desenvolvimento infantil, com ênfase na ruptura do processo educacional na transição entre a

educação infantil e os anos iniciais do ensino fundamental, etapa esta em que não há presença

significativa do lúdico, e analisar a concepção do brincar como uma das mais importantes

metodologias de aprendizagem para crianças em idade de 0 a 6 anos, enfatizando o papel do

professor nesse processo e a importância desse profissional em prol de contribuir para o

desenvolvimento integral das crianças com propostas lúdicas mediadas por brinquedos, jogos e

brincadeiras.

A monografia foi organizada em três capítulos: o primeiro capítulo aborda definições e

conceitos em torno do lúdico e da importância da ludicidade para o desenvolvimento da criança e

para a educação; o segundo trata da educação infantil, do ensino fundamental e da presença ou da

falta do lúdico em ambos; e o terceiro capítulo, da possibilidade de utilização da ludicidade e do

brincar como ferramentas de aprendizagem em ambiente escolar e do papel do professor nesse

contexto.

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Ao longo da pesquisa foi realizada uma entrevista previamente estruturada com uma

profissional da educação com experiência relevante na área estudada, que foi de grande auxílio para

a conclusão deste trabalho. Essa entrevista teve um papel fundamental para auxiliar-me a refletir

sobre a importância do lúdico e do papel do professor nesse aspecto. Acredita-se que a professora

ofereceu informações de caráter qualitativo que complementou a análise documental. A entrevista

foi realizada no dia 30 de abril de 2019, na Faculdade de Educação da UFRJ, e teve duração de 40

minutos. O roteiro das perguntas realizadas pode ser encontrado em anexo, ao final desta

monografia.

Para a elaboração do presente trabalho buscou-se fundamentação teórica em diversas fontes.

O referencial teórico consistiu nos seguintes autores: Huizinga (2005), historiador e linguista

holandês, conhecido por suas pesquisas nas áreas de história cultural, de teoria da história e de

crítica da cultura; Winnicott (1975), pediatra e psicanalista inglês, defensor da imaginação, que

enfatizou a importância do brincar e de criar para a criança; Vygotsky (2003), psicólogo pioneiro no

conceito de que o desenvolvimento das crianças ocorre por meio de suas interações sociais; Wallon

(1995), filósofo, psicólogo, médico e político francês, que inovou ao considerar a afetividade como

um dos aspectos centrais do desenvolvimento; Piaget (1964), biólogo, psicólogo e epistemólogo,

considerado um dos mais importantes pensadores do século XX; e Kishimoto (2001), educadora

especialista em Educação Infantil. Foram também consultados outros autores que abordam o lúdico

e o ato de brincar, bem como o jogo, o brinquedo e a brincadeira como metodologia de

aprendizagem e de desenvolvimento infantil.

Por fim, apresento minhas considerações finais sobre o trabalho com base nas teorias

pesquisadas, nos teóricos estudados e na entrevista realizada. Foi possível para mim melhor

compreender o brincar e as demais atividades conduzidas pelo lúdico como uma importante

estratégia para que as crianças se desenvolvam, de forma satisfatória, dentro dos aspectos

cognitivos, emocionais e afetivos que a ludicidade possibilita.

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Capítulo 1 - Conhecendo o conceito de ludicidade

Na história da humanidade, ludicidade e cultura se entrelaçam, refletindo astransformações sociais e tecnológicas de cada civilização. Há milênios,vários povos revelaram interesse pela prática de jogos físicos, inclusive comuso de bola e estabelecimento de regras definidas. Pinturas em tumbas defaraós ilustram o uso de jogos de tabuleiro desde o Egito antigo. No séculoVI de nossa Era, surgiu o jogo de xadrez na Índia. No Renascimento, foramcriados, por exemplo, os jogos de percurso. Na atualidade, destacam-se osjogos digitais que usufruem de uma crescente aceitação mundial. Ou seja,uma miríade de práticas de natureza lúdica disseminou-se através dostempos, demonstrando sua forte imbricação com a experiência humana.

Antônio Villar Marques de Sá

Ludicidade não é um tema simples de ser compreendido, devido ao leque de olhares que se

abrem e abarca seus diversos significados. Citarei os conceitos que considero fundamentais para o

desenvolvimento e uma melhor compreensão deste trabalho. A discussão aqui comentada sobre o

lúdico será formado por análises biológicas, antropológicas, sociológicas e filosóficas.

A ideia de lúdico abordada aqui tem como base a obra "Homo Ludens: o jogo como

elemento da cultura", de Johan Huizinga. Huizinga entende o lúdico, chamado por ele de jogo,

como algo anterior à cultura, constituinte primário dos seres humanos:

O jogo é fato mais antigo que a cultura, pois esta, mesmo em suas definiçõesmais rigorosas, pressupõe sempre a sociedade humana; mas, os animais nãoesperaram que os homens os iniciassem na atividade lúdica (HUIZINGA,2005, p.3).

Os jogos também fazem parte de elementos comuns que o homem partilha com os animais,destaca ainda Huizinga:

Bastará que observemos os cachorrinhos para constatar que, em suas alegresevoluções, encontram-se presentes todos os elementos essenciais do jogohumano. Convidam-se uns aos outros para brincar mediante um certo ritualde atitudes ou gestos. Respeitam a regra que os proíbe de morderem, ou pelomenos com violência, a orelha do próximo. Fingem ficar zangados e, o que émais importante, eles, em tudo isto, experimentam evidentemente imensoprazer e divertimento (idem, 2005, p.3).

De acordo com essa informação, Huizinga busca definir o conceito de lúdico para além das

atividades biológicas. Explicitado em várias teorias, o jogo pode ser entendido como toda e

qualquer atividade humana, como descarga de energia vital, instinto de imitação, fuga da realidade

ou preparação para as tarefas da vida e em sociedade; ambas podem ser exercidas sem o chamado

jogo, mas este permanece presente, acredito que por causa da relação que ele estabelece com o

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mundo e com as necessidades biológicas que ele supre, como o prazer. Nas palavras ainda de Johan

Huizinga:

O mais simples raciocínio nos indica que a natureza poderia igualmente teroferecido a suas criaturas todas essas úteis funções de descarga de energiaexcessiva, de distensão após um esforço, de preparação às exigências da vida,de compensação de desejos insatisfeitos etc., sob a forma de exercícios ereações puramente mecânicos. Mas não, ela nos deu a tensão, a alegria e odivertimento no jogo (idem, 2005, p.5).

O sentido do jogo está na relação com o seu significado e na grandeza para os seus

jogadores. Esse sentido de jogo é ligado às emoções como noções de divertimento, alegria e prazer.

Entretanto, não quer dizer que o jogo esteja imerso somente onde há riso e alegria, pelo contrário, o

jogo faz-se presente dentro da seriedade, através da concentração. Esse contraste entre jogo e

seriedade tem origem na Idade Média e é ainda mais complexo, condiz com a concepção de

Huizinga.

O jogo pode e costuma ocorrer dentro de uma intensa seriedade. Vejamos, por exemplo,

alguém que está jogando xadrez ou participando de uma dança. Para tal, ele evoca prazeres como

concentração e inserção, e nem por isso deixa de ser jogo. O jogo abre uma brecha, um espaço no

cotidiano, no sóbrio do cotidiano, abre um leque de possibilidades, além das responsabilidades do

cotidiano que, por isso, pode introduzir um espaço lúdico no meio do sério. De certo modo,

enquanto a seriedade o repulsa, o jogo o atrai, porque ambos se completam. Porém, o riso não é

nenhum critério para que se tenha, de fato, o jogo.

Huizinga identifica o divertimento e o prazer como as principais significações do jogo para

os que jogam, como sentido da realização lúdica, como motivo pelo qual se joga, ou, em último

caso, como a causa do jogo, por que se joga. De acordo com isso, identificam-se dois aspectos

fundamentais para os jogadores: a luta por algo, vista como competição, e a representação que se

faz de algo, a imaginação. Afirma o autor a esse respeito:

A função do jogo, nas formas mais elevadas que aqui nos interessam, pode demaneira geral ser definida pelos dois aspectos fundamentais que neleencontramos: uma luta por alguma coisa ou a representação de alguma coisa(idem, op.cit., p.16).

A luta por algo pode ser definida como prova da superioridade em alguma atividade. A

competição induz ao mundo paralelo com regras no jogo, que pressupõe que alguém sairá vencedor.

Compete-se por algo, para provar que se é melhor em alguma área e para ser reconhecido por isso.

Compete-se para algo, avaliando-se a qualidade, como no que se é melhor, sabedoria, força etc. E

compete-se contra algo, um adversário que não precisa necessariamente ser outra pessoa. O que se

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ganha não é o objetivo de competir, o objetivo é o que a vitória causa, como tensão e incerteza, que

levam ao divertimento e ao prazer.

A representação de algo pode ser definida como exposição à visão de outro, como a criação

de um papel no lugar de outro. De acordo com Lino de Macedo:

Por que jogar e brincar são formas de representação? Uma das consequênciasmaravilhosas, nesse contexto de repetir, variar, recombinar e inventar, é podercriar representações. Quando brincam de casinha, as crianças vivem aexperiência de reconstruir o cotidiano e simbolizar a vida. Graças a isso,podem suportar ou compreender os tempos que a mãe, por exemplo, ficalonge delas (MACEDO, 2007, p.7).

A partir dessa citação, entende-se que seja criado um mundo paralelo, na imaginação, no

qual qualquer elemento pode ser representado por outro. Por exemplo, a apresentação de uma dança

tem vários significados, mas um movimento pode mudar toda uma repercussão, deixar de significar

amor e significar seu oposto. Isso porque somos nós que interpretamos tal representação. Não quer

dizer que seja amor ou ódio, quer dizer que é como a identificamos. Uma dança não é amor ou ódio,

é um movimento que deixa sua realidade para representar algo para alguém. Essa é a diferença entre

imaginação e representação; representar é criar uma imagem figurativa da realidade, e é aí que o

jogo se encontra.

A criança, quando brinca de faz-de-conta, faz uso da imaginação, “porque esta experiência é

o material com o qual constrói seus edifícios de fantasia” (VYGOTSKY, 2003, p.17). Ela se isenta

da realidade e passa a representar um papel imaginário dentro desse novo mundo, criado por ela.

Dessa forma também são representações, as peças de teatro, as pinturas, as artes plásticas, toda

forma de arte. O jogo tem essa função representativa e o elemento estético, dentro dessa valsa de

harmonia, é geralmente instigador do divertimento e do prazer, como quando uma menina sonha em

ser princesa e um menino sonha em ser um herói.

Quando se estabelece a base do jogo, através do divertimento e do prazer como sentido do

lúdico, da representação e da competição como suas principais funções, passa-se pela delimitação

de suas características formais, definidas por Huizinga em cinco aspectos fundamentais, que

descrevo a seguir.

O primeiro fator fundamental definidor do jogo é o fato de ser livre. Livre, porque é uma

escolha; o indivíduo não é incluído obrigatoriamente, é uma atividade voluntária e não necessária. A

liberdade é um requisito do jogo, sua prática é direcionada a momentos de lazer, quando se faz o

que se tem vontade.

O segundo fator fundamental definidor do jogo nos retira da vida "real", é a imaginação. O

faz de conta é um conceito relacionado a esse aspecto. O indivíduo cria um universo paralelo, com

os jogadores cientes de que aquilo proporciona um intervalo da realidade. Nesse sentido, afirma

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Macedo: "Jogos sempre foram experiências de trocas. Daí a importância de estabelecer contratos,

fixar limites de espaço e tempo, definir objetivos. Realizar um percurso é uma das brincadeiras

preferidas das crianças" (MACEDO, op.cit., p.8)

O terceiro fator fundamental definidor do jogo é o desinteresse. O indivíduo não joga pelo

prêmio, mas para exercer a finalidade de jogar. Desinteresse produtivo e incerteza sobre o resultado

são características que guardam profunda relação dentro desse aspecto.

O quarto fator fundamental definidor do jogo é o fato delimitador do tempo e do espaço.

Sempre possui início, meio e fim com determinado tempo de realização. Essa limitação temporal do

jogo, em contato com a liberdade, permite-se que tenha a oportunidade da repetição. Conforme

Lino de Macedo disserta:

Por que jogar e brincar pedem a repetição? Esses desafios encantam peloprazer funcional de sua realização. Mesmo que se cansem, as criançasquerem (esperam) continuar jogando e brincando. Há um afeto perceptivo, ouseja, algo que agrada ao corpo e ao pensamento. Até o medo e a dor ficamsuportáveis, interessantes, porque fazem sentido. Por isso, trata-se de umaexperiência que pede repetição por tudo aquilo que representa ou mobiliza.Graças a isso, aprendemos a identificar informações ou qualidades nas coisasou em nós mesmos - para reconhecer coisas agradáveis e desagradáveis e,assim, variar as experiências e combiná-las das mais variadas formas (idem,op.cit., p. 8).

Um jogo de basquete, por exemplo, poderá ser repetido, mas os acontecimentos serão

inéditos.

O quinto e último fator fundamental definidor do jogo é a ordem e a regra. Para ser jogo,

precisa haver regras, e estas precisam ser reconhecidas e aceitas pelos jogadores. O jogo com as

regras também cria ordens. Huizinga considera esse aspecto como caráter estético do jogo.

Abordados os aspectos formais do jogo, suas funções e seus sentidos, pode-se perceber que,

através de cada elemento aqui citado, Huizinga define o jogo:

(...) o jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certoslimites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, masabsolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhadode um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de serdiferente da vida quotidiana (HUIZINGA, op.cit., p.33).

A reflexão nos leva a ver que a noção de lúdico não se identifica completamente com a de

jogo. O jogo contém o lúdico, o lúdico contém o jogo, porém nem sempre cobre totalmente o seu

sentido; pode ultrapassá-lo. Lúdico e jogo são conceitos próximos, que se completam, mas há um

certo “jogo” de ajuste e sobreposição de significados. Os significados de um e do outro procuram

encontrar-se e mantêm um movimento de identificação e manutenção da autonomia, sendo difícil

decidir qual é o mais amplo e qual é o mais estreito. Pode-se pensar que o lúdico tem a maior

grandeza, que tem uma extensão de significado mais ampla; por outro lado, é possível encarar

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ambos significados de modo contraditório, concluindo que haveria mais elementos indicados e

envolvidos no conceito de jogo do que no de lúdico. Contudo, precisa-se reconhecer que ambos os

termos comportam um modo mais amplo e outro mais restrito de significado, e é preciso explorar

com cuidado os conceitos envolvidos para esclarecer ideias.

Johan Huizinga trabalhou o conceito de lúdico somente como jogo, entretanto, a meu ver,

ele não dedicou atenção suficiente para alguns aspectos que considero importantes, como

divertimento, prazer e alegria. Dessa forma, busco ampliar nos próximos subitens os conhecimentos

sobre esse conceito para melhor compreensão do lúdico.

1.1 Entendendo outros conceitos de lúdico

Apresento aqui algumas reflexões sobre aspectos do lúdico que me parecem merecer uma

atenção especial, para além dos conceitos de Huizinga. Para isso, conto com o referencial teórico do

psicanalista Winnicott (1975), do psicólogo Vygotsky (2003), do filósofo e psicólogo Wallon

(1995), do biólogo e psicólogo Jean Piaget (1964), e da educadora Kishimoto (2001).

O lúdico é reconhecido como algo que estimula as crianças através da brincadeira, da

fantasia e do divertimento. Trata-se de um conceito bastante amplo. Segundo Vygotsky, o lúdico

tem grande influência no desenvolvimento das crianças, pois é através dele que elas aprendem a

agir, têm sua curiosidade estimulada, obtêm autoconfiança e iniciativa, além de desenvolver a

linguagem do pensamento e da concentração. Também tem origem na capacidade simbólica, em que

as imagens são consideradas essenciais para instrumentalizar a criança, tendo como objetivo a

construção do conhecimento, da socialização e da imaginação. A esse respeito, afirma Kishimoto:

"Quando brinca, a criança toma certa distância da vida cotidiana, entra no mundo imaginário"

(KISHIMOTO, 2001, p.113).

De acordo com Winnicott, conceitos como brinquedo, brincadeira e jogo são formados ao

longo de nossa vida. Cada criança define seu significado de forma singular e caracteriza suas

brincadeiras como fonte de seu divertimento. Porém, pressupõe-se que haja conceitos distintos

dentro do lúdico: o jogo é concebido como algo que contém regras, o brinquedo como algo

manipulável e a brincadeira como o ato de brincar em si, como esclarece Kishimoto:

O vocábulo “brinquedo” não pode ser reduzido à pluralidade de sentido do jogo, pois, conota criança que tem uma dimensão material, cultural e técnica. Enquanto objeto, é sempre suporte de brincadeira. É o estimulante material

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para fazer fluir o imaginário infantil. E a brincadeira? É a ação que a criança desempenha ao concretizar as regras do jogo, ao mergulhar na ação lúdica. Pode-se dizer que é lúdico em ação. Dessa forma, brinquedo e brincadeira relacionam-se diretamente com a criança e não se confundem com o jogo (idem, op.cit., p.11)

Para o psicanalista Winnicott, as crianças são capazes de encontrar quaisquer objetos e

inventar brincadeiras com muita facilidade, porque isso lhes dá prazer: "a maioria das pessoas diria

que as crianças brincam porque gostam de o fazer, e isso é um fato indiscutível. As crianças têm

prazer em todas as experiências de brincadeira física e emocional" (WINNICOTT, 1982, p.161).

As crianças brincam por prazer, brincam para dominar sentimentos de angústia e ansiedade,

elas adquirem experiências brincando. A brincadeira é uma parcela importante de sua vida, é a

prova evidente da capacidade criadora, da vivência. A ludicidade é de extrema relevância para o

crescimento integral das crianças. O lúdico fornece à criança um desenvolvimento sadio; ao brincar,

a criança aumenta sua autoestima e independência, desenvolve diversos campos, como a

afetividade, a psicomotricidade, a sociabilidade e a cognição.

De acordo com a ideia de Vygotsky de que o desenvolvimento das crianças ocorre em função

das interações sociais e de suas condições de vida, a criança, através da brincadeira, reproduz o

discurso externo e o internaliza, construindo seu próprio pensamento. A linguagem tem importante

papel no desenvolvimento cognitivo da criança na medida em que sistematiza suas experiências e

ainda contribui na organização dos processos em andamento. Para ele, "as maiores aquisições de

uma criança são conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro tornar-se-ão seu nível básico

de ação real e moralidade" (VYGOTSKY, op.cit., p.14).

A brincadeira proporciona às crianças uma "zona de desenvolvimento proximal", que é a

distância entre o seu nível de desenvolvimento cognitivo, determinado pela capacidade de resolver

um problema sozinha, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da resolução de

um problema sob a orientação de um adulto ou com a colaboração de um colega. Por intermédio das

atividades lúdicas, a criança diminui muitas situações e emoções vividas em seu cotidiano, as quais,

pela imaginação por intermédio do faz-de-conta, são reinventadas. Essa representação do cotidiano

acontece mediante a combinação entre experiências já passadas e novas possibilidades de

reprodução e interpretação do real, de acordo com suas afeições, necessidades, desejos e paixões.

Essas ações são de extrema importância para a atividade criadora do ser humano.

Na concepção de Wallon, o conceito de infantil é sinônimo de lúdico, toda atividade da

criança é lúdica, porque exerce-se o jogo antes mesmo de se integrar e transformar o meio, ou seja,

a natureza é livre de jogo, este é uma atividade voluntária da criança, se for obrigatório deixa de ser

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jogo e se transforma em trabalho e/ou ensino. O autor defende que o desenvolvimento humano está

ligado ao meio em que o indivíduo está inserido nos aspectos afetivo, cognitivo e motor.

Ao longo de seus estudos com enfoque na motricidade no desenvolvimento da criança,

Henri Wallon classificou os jogos infantis em quatro categorias: jogos funcionais, caracterizados

por movimentos simples de exploração do corpo, através dos sentidos; jogos de fricção, que seriam

atividades lúdicas caracterizadas pelo faz-de-conta, na presença da situação imaginária, o que vai

ao encontro com as ideias de Vygotsky; jogos de aquisição, quando a criança começa a se conhecer

e conhecer o meio onde vive, e os jogos de fabricação, que são jogos manuais de brincar, criar e

montar que se transformam em objetos.

Conforme as ideias de Kishimoto, a brincadeira é um mergulho no lúdico, ou até mesmo o

lúdico em ação. Enquanto brinca, a criança explora o mundo e suas possibilidades, ao mesmo tempo

em que se insere nesse meio e desenvolve de forma lúdica e espontânea suas capacidades

cognitivas, motoras e afetivas. O lúdico compreende a proposta de brinquedos, jogos e brincadeiras,

proporcionando à criança o desenvolvimento de suas habilidades e contribuindo para o seu processo

de aprendizagem. Cabe ressaltar que todos têm o direito de aprender e aprender com prazer.

Os jogos e as brincadeiras se tornam presentes em todas as fases da vida dos seres humanos,

tornando especial e indispensável sua existência. De certa forma, o lúdico se faz presente e

acrescenta um ingrediente essencial no relacionamento entre as pessoas, possibilitando que a

criatividade desabroche, aflore.

De acordo com as ideias de Jean Piaget, que caracteriza o lúdico denominando-o jogo, o ato

de jogar é uma atividade natural do indivíduo. Para ele, inicialmente a prática lúdica surge como

uma série de exercícios motores simples e sua finalidade é o prazer de seu funcionamento.

O jogo começa desde os primórdios de diferenciação entre assimilação e acomodação, dessa

maneira constituem-se os jogos de exercício. Para Piaget, existem três tipos de jogos: os jogos de

exercício, os jogos simbólicos e os jogos de regras.

Os jogos de exercício, também denominados de jogos sensório-motores, desenvolvem-se

através da assimilação. É o primeiro jogo que aparece no desenvolvimento das crianças e é

fundamental, pois é nessa fase que a criança começa a explorar o mundo e a conhecer seus sentidos,

movimentos e sensações. Após essa fase, os jogos simbólicos entram em evidência. A função desse

tipo de atividade lúdica, segundo Piaget,

consiste em satisfazer o eu por meio de uma transformação do real emfunção dos desejos: a criança que brinca de boneca refaz sua própria vida,corrigindo-a à sua maneira, e revive todos os prazeres e conflitos,resolvendo-os, compensando-os, ou seja, completando a realidade através daficção (PIAGET, 1973, p.29).

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Esses jogos ocorrem no período dos dois aos sete anos, no qual as crianças começam a

representar, a simbolizar atividades da vida real. O principal jogo simbólico é brincar de fazer de

conta, o que permite que a criança desenvolva a imaginação, além de compreender o mundo e a

realidade. É quando começa a se interessar por outros tipos de jogos. O autor afirma que "(...) é

evidente que os jogos de construção não definem uma fase entre outras, mas ocupam, no segundo e,

sobretudo, no terceiro nível, uma posição situada ao meio de caminho entre o jogo e o trabalho

inteligente (...)" (Piaget apud Rizzi, 1997, p.27).

Para Piaget, os jogos de regras surgem aos quatro anos de idade das crianças, quando elas

abandonam a fase egocêntrica, possibilitando-lhes desenvolver relacionamentos socioafetivos, e não

desaparecem nunca mais. Esses jogos distinguem-se em dois tipos de regras: as transmitidas e as

espontâneas. As regras transmitidas são regras de jogos institucionais que têm influência de

gerações anteriores, já as regras espontâneas são regras de natureza contratual ou momentânea. O

autor afirma que os jogos de regras envolvem combinações sensório-motoras ou intelectuais das

crianças.

Ao discorrer sobre o desenvolvimento cognitivo, Piaget é uma referência a ser destacada.

Segundo ele, crianças dos dois aos seis ou sete anos encontram-se no estágio de desenvolvimento

que é chamado de pré-operatório. O pensamento das crianças durante esse tempo ainda não segue

regras elaboradas e é totalmente entregue à fantasia. É um período caracterizado por uma vasta

imaginação, curiosidade, movimento e desejo de aprender e conhecer através do lúdico e do uso de

múltiplas linguagens.

É importante destacar que o brincar remete-nos a um lugar construído a partir de

importantes encontros humanos. Winnicott pressupõe a criatividade humana como existente em

cada um de nós como uma tendência ao amadurecimento, que é sempre uma obra inacabada, em

construção. De acordo com Birmoser, sempre temos algo a alcançar, pois "brincar é necessidade de

estabelecer um gesto de acordo com a criatividade e a espontaneidade do viver" (BIRMOSER,

2009, p.129).

O sentido de brincar é exatamente esse, uma experimentação que a cada momento nos

apresenta uma nova dimensão de uma questão do viver, é a passagem, o trânsito, a viagem. É a

possibilidade do constante caminhar.

1.2 Reflexão sobre o lúdico e seu uso educacional

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Após ponderarmos o conceito de lúdico em diferentes literaturas que o apresentam,

percebem-se certas divergências e concordâncias em sua compreensão, pois alguns autores fazem

associação do lúdico aos jogos, brincadeiras, brinquedos, e outros o abordam como uma atividade

diferente e fundamental para o desenvolvimento da criança. Entretanto, todos os autores estudados

ao longo deste trabalho concordam que o lúdico associa-se ao divertimento.

Para iniciarmos a nossa reflexão sobre o lúdico e seu papel na educação, destaco aqui o

pensamento de Rubem Alves, que exemplifica meu entendimento sobre as dificuldades enfrentadas

durante o processo de ensino-aprendizagem: “Suspeito que nossas escolas ensinem com muita

precisão a ciência de comprar as passagens e arrumar as malas. Mas tenho sérias dúvidas de que

elas ensinem aos alunos a arte de ver enquanto viajam” (ALVES, 2011, p. 30).

Educar não se limita a repassar informações e mostrar apenas um caminho, aquele que o

professor considera o mais correto; significa abrir um leque de oportunidades que possibilitem a

tomada de consciência de si, dos outros e da sociedade como um todo. De acordo com Paulo Freire,

É preciso insistir: este saber necessário ao professor de que ensinar não étransferir conhecimento, não apenas precisa ser aprendido por ele e peloseducandos nas suas razões de ser - ontológica, política, ética, epistemológica,pedagógica -, mas também precisa ser constantemente testemunhado, vivido(Freire, 2014, p.47).

É preciso saber aceitar a si e ao outro, como ser pensante, incentivar o desenvolvimento e a

evolução; é necessário oferecer ferramentas para que cada um trilhe seu próprio caminho de forma

consciente. A criança, independentemente de tempo e sociedade, sempre brincou. Trata-se de uma

forma de sentir prazer em fazer. Mesmo que os professores busquem outros métodos que auxiliem o

processo de aprendizagem, as crianças sempre vão encontrar na brincadeira o desenvolvimento de

suas habilidades e características culturais.

O desenvolvimento da criança se dá através do lúdico. O lúdico é comprendido como

estratégia indispensável para ser utilizada como estímulo na construção do conhecimento humano e

no crescimento das diferentes habilidades operatórias. De acordo com as ideias de Piaget (1964), o

brinquedo auxiliará a criança a desenvolver uma diferenciação entre a ação e o significado. A

criança dessa fase de desenvolvimento, o estágio operatório-concreto, passa já do ambiente

concreto que a rodeia para o abstrato. O brincar relaciona-se diretamente com a aprendizagem.

Brincar é aprender. Quando a criança está brincando, ela está aprendendo, combina diversas ações

motoras entre si, divertindo-se em repetir várias vezes as mesmas ações, além de exercitar a

aprendizagem motora, social e cultural.

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Segundo Kishimoto (2010), toda criança que participa de atividades lúdicas adquire novos

conhecimentos e desenvolve habilidades de forma natural, o que motiva um forte interesse em

aprender e assegura o prazer. Ainda de acordo com a autora, as atividades lúdicas devem ser

voltadas para a idade da criança; nestas, os professores são responsáveis pela intermediação do

andamento das atividades, utilizando a metodologia necessária, com o objetivo de que as crianças

obtenham êxito, sem deixar que a brincadeira se torne monótona, e para que elas a desenvolvam da

melhor maneira possível:

Para a criança, o brincar é a atividade principal do dia-a-dia. É importanteporque dá a ela o poder de tomar decisões, expressar sentimentos e valores,conhecer a si, aos outros e o mundo, de repetir ações prazerosas, de partilhar,expressar sua individualidade e identidade por meio de diferentes linguagens,de usar o corpo, os sentidos, os movimentos, de solucionar problemas e criar.Ao brincar, a criança experimenta o poder de explorar o mundo dos objetos,das pessoas, da natureza e da cultura, para compreendê-lo e expressá-lo pormeio de variadas linguagens. Mas é no plano da imaginação que o brincar sedestaca pela mobilização dos significados. Enfim, sua importância serelaciona com a cultura da infância, que coloca a brincadeira comoferramenta para a criança se expressar, aprender e se desenvolver (idem,op.cit., p.1).

Assim, pensar o lúdico como uma das mais importantes metodologias de aprendizagem na

infância e como principal ferramenta de integração e socialização da criança é de extrema

importância, principalmente àqueles interessados no processo de desenvolvimento infantil.

Vygotsky é o responsável pela teoria da aprendizagem denominada sociointeracionismo. Ele

acredita que o desenvolvimento cognitivo depende das interações sociais que os indivíduos

estabelecem uns com os outros e com a sociedade como um todo em um contexto linguístico. A

linguagem e os instrumentos materiais são os mediadores dessa relação do indivíduo com o meio no

qual se insere. No caso do desenvolvimento das estruturas intelectuais, Vygotsky atribui à

linguagem um papel destacado, pois ela organiza o real através dos conceitos que mediam a relação

entre o indivíduo e o objeto do conhecimento. Relação que não é de sentido único, mas dialética, na

qual ambos se transformam igualmente.

De acordo com essas ideias e mantendo o foco na infância, Vygotsky identifica a relevância

das brincadeiras para a aprendizagem e para o desenvolvimento psíquico. Ele considera a

brincadeira como resultado de necessidades não satisfeitas de crianças, que as projetam no mundo

imaginário criado por elas mesmas. Assim, "uma criança brincando com uma boneca, por exemplo,

repete exatamente o que sua mãe faz com ela" (VYGOTSKY, op.cit., p.123). Ao realizar essa

projeção para o mundo imaginário, as crianças se afastam das necessidades ligadas a estímulos

perceptivos mais imediatos, desprendendo-se do real e produzindo significados sobre os objetos.

Esse processo é de extrema importância para o desenvolvimento de novas estruturas cognitivas e

psíquicas, pois desloca o indivíduo dos comportamentos habituais, aos quais já está acostumado, e

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dos aprendizados já consolidados, criando o que o autor intitula de zona de desenvolvimento

proximal, na qual os desafios que provoca, colaboram para que a aprendizagem aconteça.

A presença de outros indivíduos acompanhando esses processos é fundamental, pois permite

à criança carregar-se de aprendizados culturais por meio da interação. Desse modo, Vygotsky

valoriza não só a interação lúdica entre o indivíduo e o meio, mas também a presença de outros

indivíduos mediando culturalmente essa relação. A brincadeira em si é construída como resultado de

processos sociais. Nesse sentido, Angela Borba acredita que

no brincar, as crianças vão também se constituindo como agentes de suaexperiência social, organizando com autonomia suas ações e interações,elaborando planos e formas de ações conjuntas, criando regras de convivênciasocial e de participação nas brincadeiras (BORBA, 2009, p. 71).

Piaget concorda com Vygotsky na identificação do desenvolvimento cognitivo através da

relação do sujeito com o meio em que ele é inserido. Atribuindo, entretando, prioridade às estruturas

internas biológicas do sujeito, Piaget exemplifica estágios de desenvolvimento nos quais cada

indivíduo obtém sua visão de mundo, sua construção do real. Dessa maneira, a ideia de Piaget

torna-se diferente da de Vygotsky também ao concluir que a formação do pensamento é

desenvolvida por fatores biológicos, e não pela linguagem. Nesse caso, o aprendizado acontece de

forma espontânea na interação do indivíduo com o ambiente, diferentemente da concepção de

Vygotsky, segundo a qual ocorre uma mediação linguística interpessoal.

O jogo é inserido na teoria de Piaget com um papel diferente daquele reconhecido por

Vygotsky. Kishimoto afirma que, para o primeiro, a função do jogo não é desenvolver novas

estruturas cognitivas, em um processo que denomina de acomodação, desequilibrando os esquemas

mentais do sujeito. Sua função está relacionada à incorporação, por parte da criança, de objetos do

meio exterior aos esquemas mentais internos preexistentes, esquema este denominado de

assimilação. Desse modo, através do jogo é possível reconhecer o estágio de desenvolvimento

cognitivo em que a criança se encontra, observando que cada estágio está associado a um tipo de

jogo. Uma criança no estágio sensório-motor brincará de jogos de exercício; em contrapartida, uma

no pré-operatório fará uso de brincadeiras simbólicas, e no estágio operatório estarão presentes os

jogos de regras. Cada um desses jogos satisfaz as necessidades das crianças de dominar o mundo

exterior, encaixando-o nos esquemas mentais que possuem, de acordo com sua idade. Enquanto nas

ideias de Vygotsky a criança se transcende no jogo, em Piaget ela demonstra o que já sabe. Piaget

conecta, dessa forma, a brincadeira ao processo imitativo, no qual as crianças adquirem seus

significados a partir do que vivenciam.

Além dos debates que envolvem teorias da aprendizagem, há uma discussão sobre a relação

que os jogos e as brincadeiras estabelecem com a cultura, pois "a cultura torna-se parte da natureza

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de cada pessoa" (VYGOTSKY, op.cit., p.24). Deve-se a Winnicott o pensamento sobre o qual o

espaço lúdico vai permitir à criança criar e entreter uma relação aberta e positiva com a cultura, pois

o brincar é visto como um mecanismo psicológico que garante ao indivíduo manter uma distância

em relação ao real, o brincar torna-se padrão de toda atividade cultural. Conforme Brougère acredita

numa concepção como essa o paradoxo é que o lugar de emergência e deenriquecimento da cultura é pensado fora de toda cultura como expressão porexcelência da subjetividade livre de qualquer restrição, pois esta é ligada àrealidade. A cultura nasceria de uma instância e de um lugar marcados pelaindependência em face de qualquer outra instância, sob a égide de umacriatividade que poderia desabrochar sem obstáculos. O retrato é, semdúvida, exagerado, mas traduz a psicologização contemporânea do brincar,que faz dele uma instância do indivíduo isolado das influências do mundo,pelo menos quando a brincadeira real se mostra fiel a essa ideia, recusando,por exemplo, qualquer ligação objetiva muito impositiva, caso do brinquedoconcebido exteriormente ao ato de brincar. Encontramos aqui de volta o mitoromântico tão bem ilustrado em L’enfant étranger, de Hoffmann, onde obrinquedo se opõe ao verdadeiro ato de brincar. Alguns autores negam aqualquer construção cultural estável até mesmo o termo ‘brincadeira’, ‘jogo’.Seriam uma apropriação do ‘brincar’, essa dinâmica essencial ao ser humano(BROUGÈRE, 1998, p.103).

A cultura lúdica, definida por Brougère como "um conjunto de regras e significações

próprias do jogo, que o jogador adquire e domina no contexto de seu jogo" (1998, p.23), tem

relação com a cultura geral de uma sociedade, pois faz parte dela. Nesse sentido, a cultura lúdica

individual seria produto da cultura lúdica social, poder-se-ia dizer que a cultura lúdica social é

produto da cultura geral, porque o jogo produz e é produzido pela cultura ao mesmo tempo. Inserida

na cultura geral, a cultura lúdica amplia a relação com outras crianças e adultos, pois é "brincando

com os outros, participando de atividades lúdicas, que as crianças constroem um repertório de

brincadeiras e de referências culturais que compõem a cultura lúdica infantil, ou seja, o conjunto de

experiências que permite às crianças brincarem juntas” (idem, op.cit., p.23). Ou seja, “a cultura

lúdica torna a brincadeira possível, mas é no próprio espaço social do brincar que ela também

emerge e é enriquecida" (Borba, op.cit., p.47). Nesse meio, as crianças aprendem a compreender e

conceber sua própria maneira de brincar, construindo e acrescentando valores junto à cultura atual.

De acordo com as ideias de Patrícia Corsino

a brincadeira infantil constitui-se numa atividade em que as crianças sozinhasou em grupo procuram compreender o mundo e as ações humanas, devendoser concebida, no cotidiano de uma proposta educativa para as criançaspequenas, como inerente ao processo de construção de conhecimento, decomunicação, de trocas e de experiência de cultura (CORSINO, 2006, p.8).

Baseando-se nessa diversidade de visões sobre as relações que se estabelecem entre o lúdico

e a educação, procurou-se aqui fazer um breve resumo da importância que um tem para o outro,

visando a abranger ao máximo a multiplicidade de contribuições. Foi possível destacar as seguintes

funções do lúdico para a educação, seguidas de exemplos de possibilidades de temas que são

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explorados por cada categoria, com respaldo nos conceitos de Vygotsky (2003), Winnicott (1975) e

Kishimoto (2001):

• Possibilitar aprendizados de ordem cognitiva: pensamento, curiosidade, criatividade,

simbolização, representação mental, raciocínio, exploração, imaginação, linguagem.

• Possibilitar aprendizados de ordem psicológica/emocional: afetividade, desejos, alteridade,

autoconhecimento, expressão, frustração, empatia, autonomia, maturidade.

• Possibilitar aprendizados de ordem física/motora: coordenação motora fina e grossa, controle

e conhecimento do próprio corpo, habilidades, manipulação de objetos.

• Possibilitar aprendizados de ordem social: socialização, regras, democracia, responsabilização,

interações sociais, hábitos, conhecimentos culturais.

• Avaliar o educando: avaliação de comportamento, avaliação de aprendizado, avaliação do

desenvolvimento, avaliação do conhecimento prévio, descoberta dos interesses.

•Auxiliar metodologicamente o aprendizado de conteúdos dos alunos: ambiente agradável e

atrativo, relaxamento, adaptação de conteúdos, recursos para facilitar a aprendizagem,

prazer, diversão.

Sobre os aspectos acima destacados, é importante mencionar que esses aprendizados não

ocorrem de forma isolada, mas de maneira interligada. Pontuam-se funções do lúdico para a

educação de maneira muito ampla, de forma geral e superficial. Diversas habilidades não

comentadas no resumo poderiam ser citadas por serem apresentadas por meio de atividades lúdicas

de várias maneiras. Cabe-se ainda lembrar que cada habilidade mencionada pode ser aprofundada

no que se refere a sua significância para a educação. Porém, o objetivo aqui apresentado não foi dar-

lhe um caráter de completude, mas sim relatar, em forma de exemplos, algumas das funções do

lúdico mais observadas ao longo da revisão bibliográfica realizada para a elaboração deste trabalho.

Entretanto, faz-se necessário mensurar que, em certa medida, todas essas funções do lúdico

na educação estão presentes. Através do lúdico faz-se possível proporcionar todos esses aspectos.

Contudo, o educador precisa ter consciência de sua intencionalidade pedagógica ao trabalhar

ludicamente. Vale a pena destacar reflexões de Paulo Freire a respeito do importante papel do

educador: "percebe-se, assim, a importância do papel do educador (...), o educador já teve ou

continua tendo experiência da produção de certos saberes (...), nas condições de verdadeira

aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução

do saber ensinado" (FREIRE, 2014, p.28). Portanto, não adianta simplesmente esperar que qualquer

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planejamento que se pretenda lúdico possa satisfazer todas as funções acima citadas. É necessário

que o professor estude, pesquise e continue sempre inovando nos métodos educacionais, pois, como

acreditava Paulo Freire, não há ensino sem pesquisa nem pesquisa sem ensino.

Dessa forma, assume-se agora um papel investigativo. Trabalhei neste capítulo os conceitos

de lúdico e sua relação com a educação; no próximo capítulo farei uma análise sobre a educação

infantil e os anos iniciais do ensino fundamental e sobre o quanto o lúdico se faz presente nesses

ambientes e nas aprendizagens das crianças que os frequentam, sempre ciente de que o lúdico é algo

indispensável ao desenvolvimento das crianças.

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Capítulo 2 - Educação Infantil e Ensino Fundamental – superando rupturas

A educação infantil e o ensino fundamental são os dois primeiros segmentos que compõem

a educação básica brasileira. A educação infantil termina quando o ensino fundamental começa;

sendo assim, complementam-se. Porém, não é bem desse modo que vem acontecendo, conforme

abordaremos neste capítulo.

Capítulo 2.1 - A Educação Infantil

A Educação infantil é considerada a primeira etapa da educação básica, é a fase que atende a

crianças de 0 a 5 anos. Essa fase está dividida em dois segmentos: creche de 4 meses a 3 anos e pré-

escola de 4 a 5 anos. Mas, de acordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a

concepção de educação infantil não foi sempre assim. Anteriormente, era considerada como a fase

"pré-escolar", ou seja, era uma etapa anterior, independente e preparatória para a escolarização, que

só seria iniciada no Ensino Fundamental. A educação infantil era aceita como algo fora da educação

formal, e só se tornou dever do Estado quando foi promulgada a Constituição de 1988.

Posteriormente, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em

1996, a Educação Infantil passa a ser parte integrante da Educação Básica, junto com o Ensino

Fundamental e o Ensino Médio. Porém, embora seja reconhecida como

direito de todas as crianças e dever do Estado, a Educação Infantil passa a serobrigatória para as crianças de 4 e 5 anos apenas com a EmendaConstitucional nº 59/2009, que determina a obrigatoriedade da EducaçãoBásica dos 4 aos 17 anos. Essa extensão da obrigatoriedade é incluída naLDB em 2013, consagrando plenamente a obrigatoriedade de matrícula detodas as crianças de 4 e 5 anos em instituições de Educação Infantil (BNCC,2018, p. 36).

Como primeira etapa da educação básica, a educação infantil é o início do processo

educacional. Durante anos, a concepção dada a essa primeira etapa foi a de somente cuidar, e a

criança era definida como um ser em miniatura, desconsiderado de todas as suas necessidades e

particularidades (ARIÈS, 1981); podemos então observar que com a inclusão da Educação Infantil

na BNCC, um passo muito importante é dado nesse processo histórico de sua integração ao

conjunto da Educação Básica.

Nessa direção, as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (DCNEI,

Resolução CNE/CEB nº 5/2010), em seu Artigo 4º, definem a criança como

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sujeito histórico e de direitos, que, nas interações, relações e práticascotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca,imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona econstrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura(BRASIL, 2010, p. 10).

Ainda de acordo com as DCNEI, os fundamentos estruturantes das práticas pedagógicas

dessa etapa da Educação Básica são as interações e a brincadeira, experiências nas quais as crianças

podem construir e apropriar-se de conhecimentos por meio de suas ações e interações com outras

crianças e com os adultos, o que proporciona, além do desenvolvimento, aprendizagens e

socialização. Com relação às interações e ao desenvolvimento, Kishimoto especifica a importância

de brincar:

A introdução de brinquedos e brincadeiras na educação infantil implicadefinir o que se pensa da criança. Quem é ela? Brinca? O brincar éimportante? A criança, mesmo pequena, sabe muitas coisas: toma decisões,escolhe o que quer fazer, interage com pessoas, expressa o que sabe fazer emostra, em seus gestos, em um olhar, uma palavra, como é capaz decompreender o mundo. Entre as coisas de que a criança gosta está o brincar,que é um dos seus direitos. O brincar é uma ação livre, que surge a qualquerhora, iniciada e conduzida pela criança; dá prazer, não exige como condiçãoum produto final; relaxa, envolve, ensina regras, linguagens, desenvolvehabilidades e introduz a criança no mundo imaginário (KISHIMOTO, 2010,p.1).

Tendo como base esses eixos estruturantes das práticas pedagógicas e as competências

gerais da Educação Básica propostas pela BNCC, seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento

asseguram, na Educação Infantil, condições para que as crianças aprendam em situações nas quais

possam executar um papel ativo em ambientes que as convidem a vivenciar desafios, e a sentirem-

se provocadas a disseminá-los, nas quais possam construir significados sobre si, sobre os outros e

sobre o mundo social. São eles:

•Conviver com outras crianças e adultos, em pequenos e grandes grupos,utilizando diferentes linguagens, ampliando o conhecimento de si e do outro,o respeito em relação à cultura e às diferenças entre as pessoas.

•Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e tempos,com diferentes parceiros (crianças e adultos), ampliando e diversificando seuacesso a produções culturais, seus conhecimentos, sua imaginação, suacriatividade, suas experiências emocionais, corporais, sensoriais, expressivas,cognitivas, sociais e relacionais.

•Participar ativamente, com adultos e outras crianças, tanto do planejamento dagestão da escola e das atividades propostas pelo educador quanto darealização das atividades da vida cotidiana, tais como a escolha dasbrincadeiras, dos materiais e dos ambientes, desenvolvendo diferenteslinguagens e elaborando conhecimentos, decidindo e se posicionando.

•Explorar movimentos, gestos, sons, formas, texturas, cores, palavras, emoções,transformações, relacionamentos, histórias, objetos, elementos da natureza,na escola e fora dela, ampliando seus saberes sobre a cultura, em suasdiversas modalidades: as artes, a escrita, a ciência e a tecnologia.

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•Expressar, como sujeito dialógico, criativo e sensível, suas necessidades,emoções, sentimentos, dúvidas, hipóteses, descobertas, opiniões,questionamentos, por meio de diferentes linguagens.

•Conhecer-se e construir sua identidade pessoal, social e cultural, constituindouma imagem positiva de si e de seus grupos de pertencimento, nas diversasexperiências de cuidados, interações, brincadeiras e linguagens vivenciadas nainstituição escolar e em seu contexto familiar e comunitário (BNCC, 2018,p.38).

Essa concepção de criança como ser ativo, que observa, questiona, que conclui, que faz

julgamentos e assimila valores, que constrói conhecimentos e se apropria do conhecimento por

meio da ação e das interações com o mundo físico e social, não deve resultar no confinamento

dessas aprendizagens a um processo de desenvolvimento natural. Em contrapartida, impõe-se a

necessidade de imprimir intencionalidade educativa às práticas pedagógicas na Educação Infantil,

tanto na creche quanto na pré-escola.

Em termos de legislação internacional, a Declaração Universal de Direitos da Criança

(ONU, 1959), no Princípio VII, estabelece que: “A criança deve desfrutar plenamente de jogos e

brincadeiras, os quais deverão estar dirigidos para a educação; a sociedade e as autoridades públicas

se esforçarão para promover o exercício deste direito”. Já em nível nacional, o Estatuto da Criança e

do Adolescente (ECA), aprovado no BRASIL em 1990 determina no Capítulo II, Artigo 16, Inciso

IV, que o direito à liberdade da criança e do adolescente compreende o seguinte aspecto: “brincar,

praticar esportes e divertir-se” (BRASIL, 1990).

Na legislação educativa, os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil

(BRASIL, 1998, p.13) afirmam como um princípio que respalda a qualidade: “o direito das crianças

a brincar, como forma particular de expressão, pensamento, interação e comunicação infantil”. Já as

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 2010) definem que o brincar é

uma das atitudes que definem a criança (BRASIL, 2010, p. 12); que a proposta pedagógica deve ter

como objetivo garantir o direito da criança ao brincar (BRASIL, 2010, p. 18); e que se devem

respeitar os seguintes princípios estéticos: “da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da

liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais” (BRASIL, 2010, p. 16).

De acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998), é preciso

oferecer às crianças condições para as aprendizagens que ocorrem por meio das brincadeiras:

"Educar significa proporcionar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de

forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de

relação interpessoal, de ser e estar com outros em uma atitude básica de aceitação" (RCNEI, 1998,

p.23). Os documentos evidenciam que as atividades lúdicas ampliam as oportunidades às nossas

crianças para que internalizem alguns conteúdos curriculares por meio do que faz parte do seu

cotidiano, que é o brincar.

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Portanto, há razões para afirmar que o lúdico dispõe de relativo respaldo legislativo no

contexto da educação brasileira, e é sempre restrito à Educação Infantil, conforme será analisado

mais adiante.

Capítulo 2.2- O Ensino Fundamental

O ensino fundamental tem nove anos de duração, é a etapa mais longa da educação básica e

atende a estudantes de 6 a 14 anos. Cabe lembrar que crianças e adolescentes, ao longo desse

período, passam por uma série de mudanças, em aspectos físicos, cognitivos, afetivos, emocionais,

entre outros. De acordo com as "Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de

Nove Anos (Resolução CNE/CEB nº 7/2010), essas mudanças impõem desafios à elaboração de

currículos para esta etapa de escolarização, de modo a superar as rupturas que ocorrem na passagem

não somente entre as etapas da Educação Básica, mas também entre as duas fases do Ensino

Fundamental: Anos Iniciais e Anos Finais" (BNCC, 2018, p.57).

Segundo a BNCC, nos dois primeiros anos do Ensino Fundamental, a ação pedagógica deve

ter como foco a alfabetização, com o objetivo de garantir muitas oportunidades para que os alunos

se apropriem do sistema de escrita alfabética de modo articulado ao desenvolvimento de outras

habilidades de leitura e de escrita e ao seu envolvimento em práticas diversificadas de letramento.

Como aponta o Parecer CNE/CEB nº 11/2010, “os conteúdos dos diversos componentes

curriculares [...], ao descortinarem às crianças o conhecimento do mundo por meio de novos

olhares, lhes oferecem oportunidades de exercitar a leitura e a escrita de um modo mais

significativo” (BRASIL,2010, p.59). Ainda de acordo com a BNCC, ao longo do Ensino

Fundamental –em particular nos anos finais, os estudantes se deparam com desafios de maior

complexidade, sobretudo devido à necessidade de se apropriarem das diferentes lógicas de

organização dos conhecimentos relacionados às áreas. Tendo em vista essa maior especialização, é

importante, nos vários componentes curriculares, retomar e ressignificar as aprendizagens do

Ensino Fundamental – nos anos iniciais no contexto das diferentes áreas, visando ao

aprofundamento e à ampliação de repertórios dos estudantes. Como disserta Barbosa,

Os indicadores de qualidade do ensino fundamental no Brasil, sejam eles doensino público ou privado, não vêm mostrando resultados muito positivos, ouseja, não temos garantida a aprendizagem para todas as crianças quefrequentam a escola. A ampliação da obrigatoriedade da frequência deve,necessariamente, estar vinculada à construção de uma nova concepção deanos iniciais do ensino fundamental que garanta a aprendizagem(BARBOSA, 2009, p. 6)

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Assim, sabe-se que também é importante instigar a autonomia dos adolescentes,

proporcionando-lhes condições e ferramentas para acessar e interagir criticamente com diferentes

fontes de informação e de conhecimento. Conforme a BNCC (2018, p.58), “a escola pode contribuir

para o delineamento do projeto de vida dos estudantes, ao estabelecer uma articulação não somente

com os anseios desses jovens em relação ao seu futuro, como também com a continuidade dos

estudos no Ensino Médio. Esse processo de reflexão sobre o que cada jovem quer ser no futuro, e de

planejamento de ações para construir esse futuro, pode representar mais uma possibilidade de

desenvolvimento pessoal e social". Porém, chama a atenção o fato de que nada no documento se

refere às atividades lúdicas.

Capítulo 2.3 - A ruptura entre a passagem da educação infantil para o ensino fundamental

A transição entre os dois primeiros segmentos da educação básica requer muito cuidado e

atenção, para que haja uma constância nas mudanças que acontecerão e para que garanta a

continuidade e a integração dos processos de aprendizagens das crianças. Desse modo, torna-se

necessário estabelecer estratégias de acolhimento e adaptação para as crianças e para os professores,

a fim de que essa nova etapa se construa tendo como base uma perspectiva de percurso educativo.

De acordo com os estudos de Andrea Rapoport, a criança possui necessidades e características

específicas que precisam ser ponderadas nos processos e práticas educativas, como é possível

observar nas próprias palavras destacadas abaixo:

O ingresso no ensino fundamental é mais um momento de transição na vida dacriança, trazendo-lhe muitas novidades e desafios, às vezes vividos com plenaalegria e tranquilidade, outras com insegurança, ansiedade ou medo. Dessaforma, este é um evento que requer adaptação da criança e de todos osenvolvidos no processo. Considerando-se a entrada com seis anos de idade, aspeculiaridades da faixa etária e a recente implantação do ensino fundamentalde nove anos nas redes de ensino públicas e privadas no Brasil, a adaptaçãoestá envolvendo um universo maior, pois se constitui em fato novo para todos(RAPOPORT, FERRARI e SILVA 2009, p.23).

Para que as crianças superem de forma positiva os desafios da transição, é necessário um

equilíbrio entre as mudanças introduzidas, a continuidade das aprendizagens, o acolhimento afetivo

e as atividades lúdicas, de forma que a nova etapa se construa com base no que os educandos

conhecem e são capazes de fazer, evitando a fragmentação e a descontinuidade do trabalho

pedagógico. Se não houver uma preocupação com essas questões, o tempo em que a criança brinca

será reduzido e a sua forma de se expressar e aprender também será afetada, conforme bem

destacam Rapoport, Ferrari e Silva no trecho reproduzido a seguir:

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A mudança para o ensino fundamental de nove anos, no qual criançasingressam com seis anos no primeiro ano e não mais com sete anos naprimeira série, faz com que se repense o trabalho a ser realizado,considerando-se as suas características, Ou seja, a proposta pedagógica precisater como ponto de referência as peculiaridades infantis, as características dedesenvolvimento e aprendizagem e a realidade do contexto socioeconômico ecultural no qual os educandos encontram-se inseridos (RAPOPORT,FERRARI e SILVA, 2009, p.9).

Além de nos preocuparmos com a transição da educação infantil para o ensino fundamental,

também temos que nos preocupar com o fato de que essa transição está acontecendo mais cedo,

como destacado acima por Rapoport, Ferrari e Silva. Em função de algumas modificações que

ocorreram ao longo dos anos, no atual contexto educacional brasileiro, as crianças entram no ensino

fundamental com um ano antes do que de acordo com a legislação precedente. Com a sanção da Lei

n. 11.274, que regulamenta o ensino fundamental de nove anos (BRASIL, 2006), crianças de seis

anos são submetidas ao esquema tradicional do ensino fundamental, segmento este em que os

espaços lúdicos são menos valorizados, quando não abandonados. Dessa forma,

faz-se necessária a " adequação tanto da Educação Infantil para acolher ascrianças das creches, quanto do Ensino Fundamental para acolher as criançasde seis anos. Nas duas situações torna-se necessário viabilizar a ampliação,obtendo recursos financeiros, disponibilizando e adequando salas de aula,pessoal docente e toda a infraestrutura necessária para atender à demanda.Também não se pode negligenciar os fatores pedagógicos que perpassam oacolhimento, com reflexão e estudo sobre concepções de infância, deEducação Infantil, de Ensino Fundamental; incorporação de novos conceitos,alterações no tempo de duração do Ensino Fundamental, substituição dosistema seriado por ciclos, reformulações nas avaliações do processo, entreoutros" (CORSINO, 2003, p.61).

De acordo com Barbosa, sabe-se que a ampliação da escolarização para toda uma geração de

crianças pequenas é uma grande conquista porque fundamenta um direito subjetivo de todos os

cidadãos brasileiros: o direito à educação. Não é só isso, o cumprimento desse direito tem um efeito

político formidável. Porém, a forma como este direito é adquirido não é simples como parece.

Parece-me, inclusive, que seja até um pouco perverso se não forem levados em consideração os

cuidados para o ingresso das crianças menores no ensino fundamental, como fundamenta a autora:

Entrar com seis anos na escola, aprender a gramática desta instituição,compreender seu modo de funcionamento não é tarefa rápida e fácil parauma criança. Construir um pensamento sobre a leitura e a escrita, sobre omundo que nos cerca, adquirir hábitos de estudo, dar significado à culturaescolar é um processo longo e complexo. E muito difícil, especialmente emuma sociedade tão pouco letrada e escolarizada como a nossa (BARBOSA,2009, p.6).

Barbosa denomina de "efeito perverso" os processos que estão se multiplicando no Brasil,

através de ações movidas pelo Ministério Público, que reivindica o ingresso do primeiro ano das

crianças de 5 ou 6 anos, e o trabalho de preparação para a alfabetização desenvolvida com as

crianças de 4 ou 5 anos na pré-escola. Percebe-se que, em nome da defesa de um direito, como a

frequência à escola, outros tantos direitos são violados, como o direito ao desenvolvimento motor,

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ao convívio em grupo e ao objetivo deste trabalho, que é o direito ao lúdico, à brincadeira. E

antecipa, sem a menor necessidade, um processo de aprendizagem que necessita de uma vasta

experiência educacional das crianças.

Supõe-se, então, que não se podem transferir para o primeiro ano do ensino fundamental os

conteúdos e as formas de trabalhar da antiga primeira série, pois ao fazer isso poderão ser criadas

condições para que as crianças experimentem a frustração e o fracasso, levando-as a se sentirem

incapazes de fazer o que é esperado delas. De acordo com o Ministério de Educação e Cultura

(MEC),

Não se trata de transferir para a criança de seis anos os conteúdos eatividades da tradicional primeira série, mas de conceber uma nova estruturade organização de conteúdos em um ensino fundamental de nove anos,considerando o perfil de seus alunos (BRASIL, 2004, p.16).

As crianças de seis anos têm suas peculiaridades, possuem características e necessidades

específicas que precisam ser respeitadas nas práticas educativas. É necessário que o sistema escolar

tenha preocupação com o processo de ingresso e adaptação desses alunos. Conforme as ideias de

Andrea Rapoport, " pensar o processo de adaptação é muito importante, pois, além de se configurar

em um momento de transição e, talvez, da primeira experiência escolar de muitas crianças, os

alunos do primeiro ano têm seis anos de idade" (idem, 2009, p.34).

Procurando organizar o processo de transição, pensando no ingresso das crianças no

primeiro ano do ensino fundamental, pode-se refletir em algumas propostas que auxiliem na

adaptação delas. Estudos indicam que é importante realizar uma entrevista prévia com os pais para

que se conheça o histórico da criança, as suas experiências anteriores e suas expectativas. Os

conhecimentos sobre essas informações são de grande valia para melhor compreender o educando e

sua família, sabendo que a escola e a família devem trabalhar juntas para fortificar o processo

educacional.

Os conhecimentos prévios das realidades infantis que compõem a totalidade de uma classe

escolar, as necessidades e características de cada criança, estruturadas com referenciais teóricos que

norteiam a proposta pedagógica, são ações essenciais para o fazer pedagógico do docente.

Através dessa reflexão que articula dados da realidade, referenciais teóricos e saberes

construídos ao longo da prática cotidiana surgem componentes que podem propiciar a banalização

da ação educativa do professor em nível de processos, planejamentos e práticas de ensino-

aprendizagem. De acordo com Sarmento e Rapoport, a criança precisa de oportunidades para que

desenvolva seu conhecimento através de sua realidade:

Convivendo em uma sociedade letrada, em que são veiculados diversosportadores de textos, a criança passa a construir outras formas derepresentação. Através dos desenhos, numa fase inicial denominados de

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garatujas e, posteriormente, por meio da escrita, a criança expressa sua formade perceber e compreender o mundo circundante. A sensibilidade e aimaginação criadora são potencializadas quando a criança tem oportunidadesde se expressar por meio de rabiscos, desenhos, pinturas e colagens e decontatos com diferentes produções artísticas. O ato de desenhar é umaatividade simbólica e, como tal, a criança opera com signos culturaismotivados, repletos de sentidos, os quais estão relacionados diretamente como desenvolvimento cultural da criança (SARMENTO e RAPOPORT, 2009,p.44).

Acredita-se que na ação educativa deve ser priorizado o desenvolvimento das múltiplas

linguagens, da criatividade, do lúdico, da socialização, da criatividade e da autonomia das crianças

que ingressarem no primeiro ano do ensino fundamental. Nesse sentido, Winnicott atestava que

nos anos pré escolares a brincadeira é um meio fundamental para a criançaresolver os problemas emocionais que fazem parte do desenvolvimento. Abrincadeira também é um dos métodos característicos da manifestaçãoinfantil, um meio para perguntar e explicar (WINNICOTT,1997, p.70).

A criança desta fase necessita estar imersa em um ambiente lúdico, isto é, rico em materiais

que proporcionem o desenvolvimento de várias formas de expressão, que vão além da oralidade e

da escrita, englobando também o desenhar, o brincar, as artes, a musicalidade e a expressão

corporal. Nessa perspectiva, tempos e espaços precisam ser assegurados para que, principalmente

no contexto escolar, seja sempre garantido o direito da criança de ser criança e viver sua infância.

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Capítulo 3 - O brincar como metodologia de aprendizagem e o papel do professor

Vale declamar, dançar, cantar, contar uma história e, também, propor o jogona sala de aula, tornando-se, para além de professor ou professora, umparceiro de aventuras e de sonhos. Isto tem um custo, dá mais trabalho,exige uma dose a mais de dedicação e outras tantas de amor. Todavia arecompensa não pode ser medida e, seguramente, nem explicada.

Simão de Miranda

Atualmente vivemos em uma sociedade na qual as mídias digitais têm dominado o espaço

do lúdico, tanto na infância quanto na vida adulta de milhões de pessoas ao redor do mundo. Dessa

maneira, na expectativa de resgatar práticas culturais tradicionais e de promover novas formas de

aprendizagem dentro e fora das escolas, nas últimas décadas, o brincar e os aspectos lúdicos

envolvidos nessa práxis essencial ao ser humano ganharam um espaço cada vez maior nas pesquisas

e nas rodas de discussões envolvendo educadores e profissionais da área, e passou a ser visto como

uma das mais interessantes e eficientes ferramentas de aprendizagem para as novas gerações.

Acredita-se que através do lúdico, como já dito anteriormente, é possível conseguir vários

níveis de desenvolvimento em muitos aspectos. Este, quando cultivado com a verdadeira dimensão

que assume, melhora significativamente os índices de qualidade da educação, de uma forma geral.

Dessa maneira, essa atividade desmembra-se em várias vertentes e põe-se em evidência como

relevante objeto de estudo aos pesquisadores e professores interessados no processo do

desenvolvimento cultural, biológico e histórico do ser humano, como explicitado a seguir, de

acordo com os autores Dallabona e Mendes:

• do ponto de vista filosófico, o brincar é abordado como um mecanismo paracontrapor à racionalidade. A emoção deverá estar junto na ação humana tantoquanto a razão;

• do ponto de vista sociológico, o brincar tem sido visto como a forma maispura de inserção da criança na sociedade. Brincando, a criança vaiassimilando crenças, costumes, regras, leis e hábitos do meio em que vive;

• do ponto de vista psicológico, o brincar está presente em todo odesenvolvimento da criança nas diferentes formas de modificação de seucomportamento;

• do ponto de vista da criatividade, tanto o ato de brincar como o ato criativoestão centrados na busca do “eu”. É no brincar que se pode ser criativo, e éno criar que se brinca com as imagens e signos fazendo uso do própriopotencial;

• do ponto de vista pedagógico, o brincar tem-se revelado como umaestratégia poderosa para a criança aprender (DALLABONA;MENDES,2004, p.108).

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Refletindo sobre a ludicidade como uma maneira de proporcionar aprendizagens às crianças

pequenas, cabe evidenciar que somente na década de 1990 é que a Educação Infantil passou a ser

concebida como um dos mais importantes níveis de ensino e etapa essencial para o

desenvolvimento do ser humano como um ser que faz parte da sociedade.

Dessa forma, houve modificações ao longo dos anos e assumiu-se a concepção de que a

instituição de educação infantil não ofereceria somente cuidados ligados à higiene e à saúde, mas

também cuidados quanto ao desenvolvimento pedagógico das crianças. Entre outras

recomendações, segundo especificado no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil,

essa etapa da formação escolar é assim concebida:

A instituição de educação infantil deve tornar acessível a todas as criançasque a frequentam, indiscriminadamente, elementos da cultura queenriquecem o seu desenvolvimento e inserção social. Cumpre um papelsocializador, propiciando o desenvolvimento da identidade das crianças, pormeio de aprendizagens diversificadas, realizadas em situações de interação.Na instituição de educação infantil, pode-se oferecer às crianças condiçõespara as aprendizagens que ocorrem nas brincadeiras e aquelas advindas desituações pedagógicas intencionais ou aprendizagens orientadas pelosadultos. É importante ressaltar, porém, que essas aprendizagens, de naturezadiversa, ocorrem de maneira integrada no processo de desenvolvimentoinfantil (BRASIL, 1998, p.23).

Diante das considerações desenvolvidas ao longo deste estudo em relação à influência do

lúdico no processo de desenvolvimento do ser humano, principalmente na infância, torna-se

pertinente lembrar que, no caso da Educação Infantil, cabe ao professor, como mediador de

aprendizagens, oportunizar situações em que o brincar seja valorizado como estratégia de

aprendizagem, e não somente no caso da Educação Infantil como também no Ensino Fundamental,

visto que é preciso construir uma proposta própria de ensino para as crianças de seis anos que

garanta o espaço lúdico, que valorize as experiências e respeite os diferentes ritmos das crianças,

principalmente trabalhando de forma equilibrada e constante, o crescimento intelectual e o

socioafetivo delas. É necessário que haja uma continuidade das propostas pedagógicas, como

destaca Ana Rosa Abreu:

a atuação do professor que busca apoiar efetivamente seus alunos exige umaatitude de acolhimento, tanto nos aspectos estritamente didáticos quanto nosde relação interpessoal. (...). Esse acolhimento requer do professor autilização de conhecimentos no campo da didática - para propor e apoiar seusalunos nas situações de aprendizagens relativas às áreas de conhecimentoescolar - e também de conhecimentos sobre mecanismos sociológicos,culturais e psicológicos que estão envolvidos no "desejo de saber e nadecisão de aprender" para subsidiar a reflexão sobre as representaçõespessoais que faz dos seus alunos e a forma que se relaciona com eles(ABREU, 2000/2001, p.18).

Dessa maneira, pode-se considerar que a proposta para o ensino fundamental deveria

priorizar a definição de uma classe de aprendizagem lúdica, focada na aquisição e no

desenvolvimento cognitivo das crianças. O lúdico foi entendido como o papel principal para o

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trabalho desenvolvido com os alunos, ele auxilia na construção de valores e regras, no

desenvolvimento da socialização e na apropriação de conceitos nas diversas áreas de conhecimento.

Como disserta Simão de Miranda:

a atividade lúdica cria uma zona de desenvolvimento própria na criança, demaneira que, durante o período em que joga, ela está sempre além da suaidade real. O jogo constitui-se, assim, uma fonte muito importante dedesenvolvimento (MIRANDA, 2016, p.22).

Entende-se, dessa forma, que a potencialidade do jogo não é importante apenas no curso do

desenvolvimento, mas também nos processos de ensino-aprendizagem, com o objetivo de construir

uma aprendizagem significativa. De acordo com Miranda, a aprendizagem significativa não é um

conceito novo, é uma aprendizagem que deve articular-se com os conhecimentos prévios dos

alunos, para que tenha sentido para eles, para que sejam protagonistas da própria aprendizagem,

assumindo o papel principal no cenário de processo de ensino e aprendizagem. Os Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCNs) também se referem a essa modalidade de aprendizagem ao

indicarem que,

para que uma aprendizagem significativa possa acontecer, é necessárioinvestir em ações que potencializem a disponibilidade do aluno para aaprendizagem, o que se traduz, por exemplo, no empenho de estabelecerrelações entre seus conhecimentos prévios sobre um assunto e o que estáaprendendo sobre ele (BRASIL, op.cit., p.122).

Estes termos, embora distanciem-se das aprendizagens de cunho somente cognitivo,

inspiram-nos a continuarmos a refletir na prática de estratégias didáticas que mobilizem

aprendizagens produtivas, efetivas, criativas e lúdicas nas escolas. As atividades lúdicas são

estratégias didáticas que favorecem a aprendizagem significativa e criativa. Friedrich Froebel,

pedagogo alemão (1782-1852), acreditava que as brincadeiras são o primeiro recurso no caminho da

aprendizagem e alegava que era

fundamental que a pedagogia considere a criança como atividade criadora edesperte, mediante estímulos, as suas faculdades para a criação produtiva.Com ele se fortalecem os métodos lúdicos na educação. O grande educadorconsegue pelo jogo, um admirável meio para promover a educação dascrianças (COTRIM; PARISI apud MIRANDA, 2016, p.19)

Portanto, o professor da educação infantil e do ensino fundamental necessita ter uma boa

compreensão de como se dá o desenvolvimento infantil, ter um olhar atento e escuta sensível, obter

uma relação honesta e respeitosa com o aluno, entendendo que a criança é um sujeito pensante e de

direitos, que tem na brincadeira uma atividade orientadora e no professor um exemplo de

afetividade.

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A questão da afetividade nas práticas pedagógicas, desenvolvidas nas salas de aula pelos

educadores, sempre esteve presente no âmbito educacional, mas recentemente tem se constituído

como um objeto específico de estudo e pesquisa. Henri Wallon acreditava que a afetividade possui

um papel fundamental no desenvolvimento das crianças e que é um recurso necessário ao professor

para que possa aumentar a eficácia durante o processo de ensino-aprendizagem. Um educador

atencioso que presta atenção nas necessidades das crianças, por exemplo, constrói memórias

positivas e contribui de forma benéfica para uma aprendizagem significativa. Já o professor que

ofende e é impaciente ao ensinar, pode afetar o aluno de forma negativa, criando possíveis

bloqueios na aprendizagem das crianças. Nas palavras de Paulo Freire, “às vezes, mal se imagina o

que pode passar a representar, na vida de um aluno, um simples gesto do professor” (FREIRE apud

LEITE, 2006, p.15).

É necessário ter consciência de que a relação entre professor e aluno é permeada pela

afetividade, a educação pressupõe uma ação participativa, que envolve ambos, em toda sua

complexidade. Dessa maneira,

é a sensibilidade do professor, sua experiência, a sua vivência em cadaencontro, a sua atenção genuína, o seu ouvir lúcido, a sua motivação paracompreender o outro que serão os guias para decidir o como, o quando, oquanto é possível aproximar-se dessas condições. A função da emoção naação educativa é a de abrir caminho para a aprendizagem significativa, isto é,aquela aprendizagem que vai ao encontro das necessidades, interesses eproblemas reais das crianças e que resulta em novos significadostransformadores da sua maneira de ser, (…) possibilitando a descoberta denovas ideias (MAHONEY apud TASSONI, 1993, p.70-71).

Dessa forma, promover um trabalho pedagógico que possibilite um entrelaçamento entre os

aspectos cognitivos e afetivos, desenvolvendo uma aprendizagem significativa através das relações

que se estabelecem em sala de aula, é necessário, mas não é fácil. É preciso, a meu ver, que o

professor planeje condições adequadas, que entenda e esteja atento às necessidades dos seus alunos,

pois acredito que, diante da íntima relação entre afetividade e atividade cognitiva, e de acordo com

a perspectiva de Wallon de que é possível atuar sobre o cognitivo através do afetivo, e vice-versa,

torna-se evidente que condições afetivas favoráveis facilitam a aprendizagem.

3.1 – O diálogo entre a teoria e a prática

Ao longo da elaboração deste trabalho senti falta de algo além das teorias pesquisadas e de

minhas experiências como estagiária. Uma tarde, durante um dos encontros acadêmicos na UFRJ

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junto à minha orientadora, encontrei com Valdete Viana Tavares da Silva Pinto, uma profissional da

educação com rica experiência na área estudada para a realização desta monografia e, convidei-a

para uma entrevista com perguntas pré-estabelecidas, na qual ela prontamente aceitou. Valdete

Viana é formada em magistério de nível médio, cursou pedagogia e trabalhou como professora do

ensino fundamental e do ensino médio para formação de professores, tendo sido também diretora de

um CIEP por 13 anos. Atualmente ela é técnica de assuntos educacionais concursada na UFRJ.

Desenvolvi cinco perguntas que facilitariam a minha compreensão do uso do lúdico em sala

de aula e do papel do professor e da formação do mesmo. A entrevista foi realizada no dia 30 de

abril de 2019, no Rio de Janeiro, na Faculdade de Educação da UFRJ, e teve duração de 40 minutos.

O roteiro das perguntas realizadas encontra-se em anexo, ao final desta monografia.

Ao longo da entrevista, pude perceber que Valdete têm um posicionamento bem

estabelecido sobre a diferença entre a educação infantil e o ensino fundamental. Ela acredita que o

uso do lúdico é importante em ambos, como é possível observar em suas próprias palavras:

(...) o ensino fundamental é aquela coisa chata, é que a gente não podiadeixar nunca morrer a educação infantil, a educação infantil mesmo na suaessência, porque o que acontece? É que na educação infantil, dependendo doprojeto que você trabalhe, ele vai despertar para essa parte aí do letramento,quando você conta uma história, quando você pede a ele pra ficar em cimade um palquinho fazendo algo de teatro, né?, quando ele vai decorar algumtexto que você ajuda ou a própria mãe ajuda pra poder declamar no Dia dasMães, uma atividade que tenha lá na escolinha, então você trabalha isso aí,mas sem falar, não precisa você dizer, claro que não é trabalhar em cima doconstrutivismo que você não pode conceituar as coisas, não é isso, mas vocêjá começa a trabalhar o aluno para ele pode já estar naquele período deletramento, tentando encaixar ele, e não fazer como a maioria do ensinofundamental anda fazendo, é tudo cartilha.

Diante dessas considerações, destaco que a ludicidade é uma estratégia didática de grande

valor às aprendizagens infantis. Winnicott atestava que

nos anos pré-escolares a brincadeira é um meio fundamental para a criançaresolver os problemas emocionais que fazem parte do desenvolvimento. Abrincadeira também é um dos métodos característicos da manifestaçãoinfantil, um meio para perguntar e para explicar (WINNICOTT apudMIRANDA, 2016, p.20).

A aprendizagem lúdica é necessária em todos os aspectos desenvolvidos pela criança na

educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental. Nesse sentido, Miranda (2016, p.21)

relembra “Chateau, pedagogo francês (1908-1990), [que] defendia que o brincar é o laboratório do

espírito e do intelecto, onde ocorrem as experiências necessárias que colaboram com as vivências

que hão de vir”. A ludicidade como atividade didática criativa corrobora para uma aprendizagem

significativa, que é norteada pelo educador.

Durante a entrevista, deparei-me com a professora defendendo a valorização do lúdico na

formação do professor. Nas palavras de Valdete: Aí a gente volta para a questão da formação de

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professores, porque para o professor trabalhar o lúdico, ele tem que ter aprendido isso na sua

formação. (…) Você pergunta se o lúdico é importante na prática docente dos anos iniciais? SIM!

Em que medida? TEM QUE COMEÇAR POR VOCÊ, PROFESSOR! Ela me fez pensar na

formação do professor que está diretamente ligada à sua prática, “ será que a educação do educador

não se deve fazer mais pelo conhecimento da disciplina que ensina? ” (LABORIT apud NÓVOA,

1995, p.17). A maneira como cada professor ensina está diretamente relacionado ao que ele é como

pessoa quando exercem o ensino e como foram ensinados durante a sua formação. De acordo com

Pierre Dominicé, também citado por Nóvoa,

(…) o saber sobre a formação provém da própria reflexão daqueles que seformam. É possível especular sobre a formação e propor orientações teóricasou fórmulas pedagógicas que não estão em relação com os contextosorganizacionais ou pessoais. No entanto, a análise dos processos deformação, entendidos numa perspectiva de aprendizagem e de mudança, nãose pode fazer sem uma referência explícita ao modo como adulto viveu assituações concretas do seu próprio percurso educativo (DOMINICÉ apudNÓVOA, 1995, p.24).

Retorno às palavras de Valdete, quando, ao final da entrevista, ela dá conselhos aos

professores recém-formados: ter compromisso, comprometimento, amor à profissão e qualificação,

o tempo todo se capacita, capacita e procura sempre melhorar! A história de vida e formação do

professor marca a maneira de pensar e agir de forma pedagógica, por isso, acredito eu que a

professora enfatizou que qualificação é importante, para que o docente se aperfeiçoe e sempre dê o

seu melhor. De acordo com Paulo Freire:

Ensinar, aprender e pesquisar lidam com dois momentos do ciclognosiológico: o em que se ensina e se aprende o conhecimento já existente eo em que se trabalha a produção do conhecimento ainda não existente (…),pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e meeduco (FREIRE, 2014, p. 30-31).

Ensinar exige comprometimento, mas é troca de conhecimento, de vivência e de prática e é

na prática que tudo acontece. Quando perguntei à Valdete como ela trabalhava o lúdico na prática,

ela respondeu: quando trabalhava a educação infantil e eu fazia com elas exposições, as meninas

se vestiram de Emília, os meninos de Visconde, fazia brincadeiras com as crianças. Isso tem que

ser trabalhado na formação. Eu fazia eles praticarem, me vesti de moleque mesmo, eu fui pra

avenida, prática pedagógica é prática. As ideias da professora vão ao encontro das ideias de Paulo

Freire (2014, p.140) para quem: “a prática educativa é tudo isso: afetividade, alegria, capacidade

científica, domínio técnico a serviço da mudança ou, lamentavelmente, da permanência do hoje”,

porque ainda existem educadores que permanecem nas folhas xerocadas citadas por Valdete Viana:

O que os professores costumavam levar? Coisinhas xerocadas!

Nesse sentido, acredito que o professor deva ter interesse para entender o processo de

aprendizagem de seus alunos, acompanhar seus avanços, avançar com eles, procurar de forma

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afetiva motivos para que os alunos tenham o papel principal de seu ensino-aprendizagem, de forma

lúdica. A esse respeito, Pellisson discorre:

Um professor preocupado em desenvolver uma prática educativa significativapara o aluno, que crie e intensifique o desejo de aprender, precisa acreditar nacapacidade que o aluno possui de transformação, criação, descoberta ecrescimento. Tem que considerar que cada aluno traz consigo uma riqueza deexperiências, conhecimentos e possibilidades, que dadas as oportunidades,vão se revelando ao longo do processo, na construção do seu próprio saber(PELLISSON, 2006, p.304).

O ato de ensinar exige do professor que, goste dessa prática. Volto então aos conselhos de

Valdete para os professores em início de carreira, conselho que eu dou, (…) que tenha amor à

profissão, pois quando o aluno envolve-se quando percebe, no professor, laços afetivos com seu

objeto de trabalho, ele está sem dúvida melhor disposto para a aprendizagem. O aluno percebe

quando o professor gosta de exercer a profissão, independentemente de quem seja o aluno. Como

disserta Paulo Freire:

Não importa com que faixa etária trabalhe o educador ou a educadora. Onosso é um trabalho realizado com gente, miúda, jovem ou adulta, mas genteem permanente processo de busca. Gente formando-se, mudando, crescendo,reorientando-se, melhorando, mas, porque gente, capaz de negar os valores,de distorcer-se, de recuar, de transgredir. Não sendo superior nem inferior aoutra prática profissional, a minha, que é a prática docente, exige de mim umalto nível de responsabilidade ética de que a minha própria capacitaçãocientífica faz parte. É que lido com gente (FREIRE, op.cit., p.141).

A esse respeito, Valdete declara: aí você entra naquele ambiente que fica uma pessoa lá na

frente só falando, falando e falando, com uma lousa na frente ou põe uma lousa digital (…) Então

como você quer que a criança goste daquele ambiente? O professor lida com gente, precisa ter uma

prática lúdica, centrada na criança e no seu processo de aprendizagem. Nas palavras de Mitjáns

Martínez:

Centrar o processo docente no aluno, em suas necessidades e possibilidades,tendo o professor como guia e facilitador; respeitar a individualidade, escutaros alunos, considerando suas perguntas, ideias e sugestões; individualizar oprocesso de ensino-aprendizagem, implementar um trabalho particularizadode acordo com as características e ritmo de desenvolvimento de cada aluno;fazer perguntas provocativas e sugestivas, evitando dar respostas imediatasàquelas feitas pelos alunos (MARTÍNEZ apud MIRANDA, 2016, p.15).

Na escola, dentro da sala de aula, sendo o principal mediador entre o aluno e o objeto de

estudo, é função do professor a tarefa de, acreditando na importância de seu trabalho e na

capacidade de seu aluno, cativar esse aluno para a questão do querer aprender, do querer ouvir, do

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querer aprender para voltar no dia seguinte. Compete ao professor encontrar meios de forma lúdica

para despertar no aluno o desejo de estar na escola, de pertencer àquele ambiente. A meu ver o

professor deve sempre estimular a curiosidade na criança, exercendo sua prática docente com

metodologias que despertem seu interesse e que o motivem a aprender. É essencial, em síntese, que

o aluno se sinta efetivamente envolvido com o ato de conhecer, de modo que se torne sujeito do seu

próprio processo de aprendizagem.

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Considerações finais

Com base no que foi estudado para a elaboração deste trabalho, considero importante

destacar que é na fase da infância que as crianças adquirem novos conhecimentos, desenvolvem

habilidades e conquistam capacidades que intervêm ao longo de todo o processo de seu

desenvolvimento e na vida adulta de forma positiva e/ou negativa, conforme o contexto em que

estão inseridas nesse período.

Dessa maneira, acredito que ponderar estratégias que favoreçam, intensifiquem e aprimorem

as aprendizagens adquiridas pelas crianças durante a infância, principalmente na Educação Infantil

e nos primeiros anos do Ensino Fundamental, é importante para o desenvolvimento delas como

indivíduos, como seres sociais pensantes, e torna-se algo de extrema relevância e passível de

pesquisas e discussões para todos aqueles que lidam diretamente com as crianças em seu momento

mais intenso de desenvolvimento.

Nessa perspectiva, com base nas teorias e nos teóricos estudados ao longo deste trabalho, foi

possível para mim melhor compreender o brincar e as demais atividades conduzidas pelo lúdico,

como uma das mais importantes estratégias para que as crianças se desenvolvam, de forma

satisfatória, dentro dos aspectos cognitivos, emocionais, afetivos e físicos que a ludicidade pode

possibilitar.

Dessa forma, quando estão brincando, as crianças podem se tornar algo que não sejam ou

que ainda não seja, porque é através das brincadeiras que elas podem tudo que imaginarem, como

agir com objetos inanimados e interagir conforme padrões não determinados pela realidade social

em que vivem, ultrapassando os próprios limites.

O brincar possibilita que as crianças desenvolvam suas próprias habilidades de pensar. Elas

se tornam capazes de superar as suas próprias condições infantis agindo como se fossem maiores,

como quando imitam os pais ou os professores, desafiando cada vez mais seus limites.

Por isso, é importante que o adulto, cujo foco neste trabalho é o professor, compreenda e

reflita a respeito de como o lúdico pode influenciar o desenvolvimento infantil, e que a continuidade

dele no decorrer da transição entre a educação infantil e o ensino fundamental é de suma

importância. Defendo que os professores oportunizem a seus alunos o máximo de circunstâncias em

que o brincar seja priorizado, que seja o foco principal.

Cabe, então, às instituições de educação infantil e de ensino fundamental criarem

oportunidades de tempo e de espaço, pois o tempo e o espaço determinam a característica de cada

brincadeira, além de dispor de materiais adequados e possibilitar aos professores conhecimentos

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sobre o ato de brincar. Estou convencida de que as brincadeiras são atividades que podem e devem

ser incentivadas nos dois primeiros segmentos da educação básica.

Portanto, considerando os primeiros segmentos da educação básica e o ambiente que o

compõe, pude concluir que o principal objetivo no processo de ensino-aprendizagem seja promover

vivências que viabilizam o desenvolvimento sadio e integral de crianças na faixa etária de 0 a 6

anos de idade. Compete, pois, aos professores, como principais mediadores e facilitadores das

aprendizagens, refletir sobre sua prática no âmbito das capacidades e interesses das crianças sob sua

responsabilidade, bem como organizar e possibilitar situações em que o brincar seja utilizado como

ferramenta de aprendizagem. Incumbe ainda aos professores propiciar momentos em que o

aprendizado não ocorra sempre da mesma maneira, e que seja substituído por oportunidades de

aprender por meio de jogos, brinquedos e brincadeiras.

Finalmente, a entrevista realizada na UFRJ com a professora Valdete, possibilitou-me

observar possíveis caminhos para uma abordagem lúdica no dia a dia do exercício da profissão

docente nos anos iniciais do ensino fundamental. Durante o processo de elaboração desta

monografia, eu pesquisei teóricos e ouvi a voz que representa a prática na escola, o que me levou a

refletir e reconstruir meus próprios conhecimentos.

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ANEXO

Perguntas norteadoras da entrevista com a profissional de educação Valdete Viana.

1. Conte-me sobre sua formação e descreva sua trajetória como professora.

2. Na sua opinião, no que difere a educação infantil do ensino fundamental?

3. Ao seu ver, o lúdico é importante na prática docente dos anos iniciais? Em que medida?

4. Como você trabalhava o lúdico na prática?

5. Quais são seus conselhos para um professor em início de carreira?

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