texto psicologia na educação

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Unidade I Esta unidade irá indicar em que o conhecimento da Psicologia pode servir à educação e ao ensino dos conteúdos escolares. A perspectiva privilegiou a integração de um corpo teórico sólido com a prática diária na escola. Irá se conceituar o objeto de estu- do da Psicologia em geral, destacando-se as áreas que mais dizem respeito à educação escolar e que definem o campo da Psicologia aplicada à educação.

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PSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO

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  • Unidade I Esta unidade ir indicar em que o conhecimento da Psicologia

    pode servir educao e ao ensino dos contedos escolares. A perspectiva privilegiou a integrao de um corpo terico slido com a prtica diria na escola. Ir se conceituar o objeto de estu-do da Psicologia em geral, destacando-se as reas que mais dizem respeito educao escolar e que definem o campo da Psicologia aplicada educao.

  • 1. A construo social do sujeito "Na ndia, onde os casos de meninos-lobos foram relativamente

    numerosos, descobriram-se, em 1920, duas crianas, Amala e Kamala, vivendo no meio de uma famlia de lobos. A primeira tinha um ano e meio e veio a morrer um ano mais tarde. Kamala, de oito anos de idade, viveu at 1929. No tinham nada de humano, e o seu comportamento era exata-mente semelhante quele dos seus irmos lobos.

    "Elas caminhavam de quatro, apoiando-se sobre os joelhos e coto-velos para os pequenos trajetos e sobre as mos e os ps para os trajetos longos e rpidos.

    "Eram incapazes de permanecer em p. S se alimentavam de carne crua ou podre, comiam e bebiam como os animais, lanando a cabea para a frente e lambendo os lquidos. Na instituio onde foram recolhi-das, passavam o dia acabrunhadas e prostradas numa sombra; eram ati-vas e ruidosas durante a noite, procurando fugir e uivando como lobos. Nunca choravam ou riam. Kamala viveu oito anos na instituio que a acolheu, humanizando-se lentamente. Ela necessitou de seis anos para aprender a andar e pouco antes de morrer s tinha um vocabulrio de 50 palavras. Atitudes afetivas foram aparecendo aos poucos.

    "Ela chorou pela primeira vez por ocasio da morte de Amala e se apegou lentamente s pessoas que cuidaram dela e s outras com as quais conviveu.

    "A sua inteligncia permitiu-lhe comunicar-se com outros por ges-tos, inicialmente, e depois por palavras de um vocabulrio rudimentar, aprendendo a executar ordens simples."*

    O relato acima descreve um fato verdico e permite entender em que medida as caractersticas, humanas dependem do convvio social. Amala e Kamala, as meninas-lobas da ndia, por terem sido privadas do conta-to com outras pessoas, no conseguiram se humanizar: no aprenderam a se comunicar travs da fala, no foram ensinadas a usar determinados

    * B. Leymond, "Le dveloppement social de Kenfant et de l'adolescent", Bruxelas, Dcssart, 1965, pp. 12-14; apud Maria Lucia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins, Introduo filosofia, So Paulo, Moderna, 1986, p. 2.

    /rt

  • utenslios e instrumentos sociais, no desenvolveram processos de pen samento lgico.

    O caso de Amala e Kamala representa, no entanto, uma exceo. Em geral, o beb nasce, cresce, vive e atua em um mundo social. na intera-o com outras pessoas que as necessidades do ser humano tendem a ser satisfeitas. Estas necessidades implicam sua prpria sobrevivncia fsi-ca alimentao, abrigo, proteo ao frio etc. e sua sobrevivncia psicolgica carcias, incentivos, amparo, proteo, segurana e co-nhecimento. por intermdio do contato humano que a criana adquire a linguagem e passa, por meio dela, a se comunicar com outros seres humanos e a organizar seu pensamento.

    Vivendo em sociedade, a criana aprende a planejar, direcionar e avaliar a sua ao. Ao longo desse processo, ela comete alguns erros, reflete sobre eles e enfrenta a possibilidade de corrigi-los. Experimenta alegrias, tristezas, perodos de ansiedade e de calma. Trata de buscar consolo em seus semelhantes. No concebe a vida em isolamento.

    tambm no convvio social, atravs das atividades prticas reali-zadas, que se criam as condies para o aparecimento da conscincia, que a capacidade de distinguir entre as propriedades objetivas e est-veis da realidade e aquilo que vivido subjetivamente. Atravs do traba-lho, os homens se organizam para alcanar determinados fins, respon-dendo aos impasses que a natureza coloca sobrevivncia. Para tanto, usam do conhecimento acumulado por geraes e criam, a partir do tra-balho, outros conhecimentos.

    Ao transformar a natureza, os homens criam cultura, refinam, cada vez mais, tcnicas, instrumentos saber, enfim e transformam a si mesmos: desenvolvem as suas funes mentais (percepo, ateno, memria, raciocnio) e a sua personalidade (sua maneira de sentir e atu-ar no mundo).

    O papel da Psicologia investigar as modificaes que ocorrem nos pu)cessos envolvidos na relao do indivduo com o mundo (cognitivos, emocionais, afetivos etc.), analisando os seus mecanismos bsicos. Para realizar sua proposta, a Psicologia interage com outras cincias tais como a Medicina, a Biologia, a Filosofia, a Gentica, a Antropologia, a Sociologia, alm da Pedagogia. Estes ramos do conhecimento esto imbricados uns nos outros, de tal forma que, muitas vezes, difcil saber em que domnio se est atuando.

    Tanto o mdico como o psiclogo tm, como se sabe, interesse em entender o efeito de drogas, doenas ou carncias alimentares sobre o

  • crescimento e o desenvolvimento, bem como as alteraes que provo-cam, do ponto de vista fsico e psicolgico, tanto na criana como no adulto. Neste sentido, a Psicologia pode buscar dados e informaes na Medicina e vice-versa.

    No caso das outras cincias, a situao semelhante. Da Biologia, a Psicologia recolhe subsdios para compreender aspectos particulares das diversas formas de vida: vegetal, animal e humana. Em especial, o interesse est em conhecer as modalidades de adaptao que lhes permi-tem a sobrevivncia. Desta forma, ser possvel, entre outras coisas, assegurar o conhecimento das diferenas entre a ao caracterizada por reflexos ou por instintos (que so especficos da espcie, biologicamen-te herdados e at certo ponto invariveis, embora sejam poucos) daque-las que demonstram inteligncia, ou seja, intencionalidade. Por outro lado, certos comportamentos como os que ocorrem na deficincia men-tal (e que so, ao menos parcialmente, hereditrios) podem ser melhor compreendidos com o auxlio da Gentica.

    De igual maneira, o entendimento da relao entre o comportamen-to de jovens e velhos e as alteraes fsicas e psicolgicas que marcam a entrada na adolescncia e na velhice, em grande parte, determinados pela atividade das glndulas endcrinas e pela bioqumica do sistema sangneo, ganha em aprofundamento e abrangncia ao se amparar na Fisiologia.

    preciso notar ainda que os sentimentos, a maneira de perceber o real e a significao que se d a um ou outro evento parecem variar sen-sivelmente, dependendo do grupo tnico, religioso ou scio-econmico do qual se faz parte. Da que os dados da Antropologia e da Sociologia podem, conseqentemente, ser de absoluta relevncia para o estudo da personalidade e do desenvolvimento das caractersticas sociais.

    Ao se dedicar ao estudo de tantos e diferentes aspectos, a Psicologia acaba por desenvolver campos de investigao mais especficos e deli-mitados. Importam, para a educao, os conhecimentos advindos da Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem, reas especficas da cincia psicolgica. E disto que se tratar a seguir.

    Verificao de leitura 1. Por que se fala que as caractersticas humanas dependem do convvio

    social e do trabalho sobre a natureza?

    IH

  • 2. Segundo o texto, qual o papel da Psicologia? 3. Como a Psicologia se relaciona com outras cincias? 4. Quais as reas da Psicologia que o texto salienta como sendo as mais

    importantes para o trabalho do professor?

    2. A Psicologia do Desenvolvimento Para >e estudar o desenvolvimento das crianas, deve-se comear com um en-tendimento da unidade dialtica entre duas linhas radicalmente diferentes: a biolgica e a cultural. Para adequadamente estudar tal processo, preciso co-nhecer estes dois componentes e as leis que governam seu entrelaamento a cada estgio de desenvolvimento infantil (Vygotski, 1978).

    Desenvolvimento o processo atravs do qual o indivduo constri ativamente, nas relaes que estabelece com o ambiente fsico e social, suas caractersticas. Ao contrrio de outras espcies, as caractersticas humanas no so biologicamente herdadas, mas historicamente forma-das. De gerao em gerao, o grau de desenvolvimento alcanado por uma sociedade vai sendo acumulado e transmitido, indo influir, j des-de o nascimento, na percepo que o indivduo vai construindo sobre a realidade, inclusive no que se refere s explicaes dos eventos e fen-menos do mundo natural.

    Para que a apropriao das caractersticas humanas se d, preciso que ocorra atividade por parte do sujeito: necessrio que sejam forma-das aes e operaes motoras e mentais, como, por exemplo, empilhar, puxar, comparar, ordenar.

    A formao dessas habilidades se d ao longo da interao do indi-vduo com o mundo social. Ele deve dominar o uso de um nmero cada vez maior de objetos e aprender a agir em situaes cada vez mais com-plexas, buscando identificar os significados desses objets e situaes.

    A Psicologia do desenvolvimento pretende estudar como nascem e como se desenvolvem as funes psicolgicas que distinguem o homem tle outras espcies. Ela estuda a evoluo da capacidade perceptual e

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  • motora, das funes intelectuais, da sociabilidade e da afetividade do ser humano. Descreve como essas capacidades se modificam e busca expli-car tais modificaes. Por intermdio da Psicologia do Desenvolvimen-to possvel constatar que as manifestaes complexas das atividades psquicas no adulto so frutos de uma longa caminhada. Da a importn-cia desta disciplina para a Pedagogia: subsidiar a organizao das condi-es para a aprendizagem infantil, de modo que se possa ativar, na crian-a, processos internos de desenvolvimento, os quais, por sua vez, sero transformados em aquisies individuais.

    Verificao de leitura 1. O que o processo de desenvolvimento humano? 2. O que distingue a espcie humana de outras espcies animais, segun-

    do expe o texto acima? 3. Como so transmitidas ao indivduo as conquistas que marcaram o

    desenvolvimento da espcie humana, ou seja, como se formam as habilidades humanas?

    4. O que estuda a Psicologia do Desenvolvimento?

    3. A Psicologia da Aprendizagem Assim, para aprender conceitos, generalizaes, conhecimentos, a criana deve formar aes mentais adequadas. Isto pressupe que essas aes se organizam ativamente. Inicialmente, assumem a forma de aes externas que os adultos formam na criana e s depois se transformam em aes mentais internas (A. Leontiev, O desenvolvimento do psiquismo).

    A aprendizagem o processo atravs do qual a criana se apropria ativamente do contedo da experincia humana, daquilo que o seu gru-po social conhece. Para que a criana aprenda, ela necessitar interagir com outros seres humanos, especialmente com os adultos e com outras

    "VI

  • crianas mais experientes. Nas inmeras interaes em que se envolvo desde o nascimento, a criana vai gradativamente ampliando suas for-mas de lidar com o mundo e vai construindo significados para as suas aes e para as experincias que vive. Com o uso da linguagem, esses significados ganham maior abrangncia, dando origem a conceitos, ou seja, significados partilhados por grande parte do grupo social. A linguagem, alm disso, ir integrar-se ao pensamento, formando uma importante base sobre a qual se desenvolver o funcionamento intelec-tual. O pensamento pode ser entendido, desta forma, como um dilogo interiorizado.

    Objetos e conceitos existem, inicialmente, sob a forma de eventos externos ao indivduo. Para se apropriar desses objetos e conceitos preciso que a criana identifique as caractersticas, propriedades e fina-lidades dos mesmos. A apropriao pressupe, portanto, gradativa inte-riorizao. Atravs desse processo, possvel aprender o significado da prpria atividade humana, que se encontra sintetizada em objetos e conceitos. Assim, ao se analisar uma mesa, pode-se notar que ela resu-me, em si, anos de trabalho e tecnologia: preciso maquinrio apropria-do para lixar a madeira, instrumentos como o martelo e chaves de fenda para mont-la, apetrechos para refin-la, como lixa e verniz. Entender o que significa uma mesa implica conhecer as suas principais caractersti-cas e finalidades mesa para jogar, comer, estudar etc. , compreen-dendo o quanto de esforo foi necessrio para conceb-la e realiz-la.

    A Psicologia da Aprendizagem estuda o complexo processo pelo qual as formas de pensar e os conhecimentos existentes numa sociedade so apropriados pela criana. Para que se possa entender esse processo necessrio reconhecer a natureza social da aprendizagem. Como j foi dito, as operaes cognitivas (aquelas envolvidas no processo de conhecer) so sempre ativamente construdas na interao com outros indivduos.

    Em geral, o adulto ou outra criana mais experiente fornece ajuda direta criana, orientando-a e mostrando-lhe como proceder atravs de gestos e instrues verbais, em situaes interativas. Na interao adul-to-criana, gradativamente, a fala social trazida pelo adulto vai sendo incorporada pela criana e o seu comportamento passa a ser, ento, ori-entado por uma fala interna, que planeja a sua ao. Nesse momento, a lala est fundida com o pensamento da criana, est integrada s suas operaes intelectuais.

    Reconhece-se, dessa maneira, que as pessoas, em especial as crian-as, aprendem atravs de aes partilhadas mediadas pela linguagem e

  • pela instruo. A interao entre adultos e crianas, e entre crianas, portanto, fundamental na aprendizagem. A Psicologia da Aprendiza-gem, aplicada educao e ao ensino, busca mostrar como, atravs da interao entre professor e alunos, e entre os alunos, possvel a aquisi-o do saber e da cultura acumulados.

    O papel do professor nesse processo fundamental. Ele procura es-truturar condies para ocorrncia de interaes professor-alunos-obje-to de estudo, que levem apropriao do conhecimento. De maneira geral, portanto, essa viso de aprendizagem reconhece tanto a natureza social da aquisio do conhecimento como o papel preponderante que nela tem o adulto. Estas consideraes, em conjunto, tm srias implica-es para a Educao: procede-se, na aprendizagem, do social para o individual, atravs de sucessivos estgios de internalizao, com o auxlio de adultos ou de companheiros mais experientes.

    Verificao de leitura 1. O que aprendizagem humana? Como ela ocorre? 2. O que estuda a Psicologia da Aprendizagem? 3. Dois conceitos foram destacados no texto: interiorizao e

    apropriao. O que eles significam?

    4. A Psicologia na Educao A educao escolar qualitativamente diferente da educao no sentido amplo. Na escola, a criana se depara com uma tarefa particular: aprende as bases dos estudos cientficos, ou seja, um sistema de concepes cientficas (A. Leontiev e A. R. Luria, 1968).

    Em geral, comete-se o erro de pensar que a aprendizagem comea apenas na idade escolar. Conseqentemente, parte-se do princpio de que os ensinamentos que ocorrem na escola principiam na sala de aula.

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  • Na verdade, muitos anos antes de entrar na escola, a criana j vem desen-volvendo hipteses e construindo um conhecimento sobre o mundo, o mesmo mundo que as matrias ditas escolares procuram interpretar. No incio da alfabetizao, por exemplo, ela j tem uma concepo de escri-ta, uma idia a respeito do que se pode ou no escrever, uma concepo sobre o sistema de representao grfica. Coisa semelhante ocorre com a Matemtica. Antes de entrar na escola, a criana j se deparou inme-ras vezes com a noo de quantidade, realizando, inclusive, operaes de clculo. Um conjunto de noes e de conceitos j se encontra, portan-to, estabelecido.

    Em resumo, a tarefa de ensinar, em nossa sociedade, no est con-centrada apenas nas mos dos professores. O aluno no aprende apenas na escola, mas tambm atravs da famlia, dos amigos, de pessoas que ele considera significativas, dos meios de comunicao de massa, das expe-rincias do cotidiano, dos movimentos sociais. Entretanto, a escola a instituio social que se apresenta como responsvel pela educao sis-temtica das crianas, jovens e at mesmo de adultos.

    No ambiente escolar a criana sofre uma transformao radical em sua forma de pensar. Antes de se entrar nela, os conhecimentos so assi-milados de modo espontneo, a partir da experincia direta da criana. Em sala de aula, ao contrrio, existe uma inteno prvia de organizar situaes que propiciem o aprimoramento dos processos de pensamento e da prpria capacidade de aprender.

    Da a importncia de se buscar maximizar esses resultados, colo-cando a servio da educao e do ensino o conjunto dos conhecimentos psicolgicos sobre as bases do desenvolvimento e da aprendizagem. Com eles, o professor estar em posio mais favorvel para planejar a sua ao.

    Verificao de leitura 1. Por que foi dito que um erro pensar que a aprendizagem tem incio

    apenas na idade escolar? 2. Qual a diferena entre a aprendizagem que se d nas situaes cotidi-

    anas e o aprendizado escolar?

  • Unidade II A criana

    Esta unidade apresenta as bases psicolgicas dos processos ropor uma nova posio: a inter acionista. Justifica-se tal escolha cm funo desta concepo se mostrar mais fecunda e mais promis-sora quanto s suas contribuies atuao do professor e situa-o de sala de aula.

  • 1. Concepes de desenvolvimento: correntes tericas e repercusses na escola As diversas teorias de desenvolvimento apresentadas a seguir

    apiam-se em diferentes concepes do homem e do modo como ele chega a conhecer. Tais teorias, como em qualquer estudo cientfico, dependem da viso de mundo existente em uma determinada situao histrica e evoluem conforme se mostram capazes ou incapazes de explicar a realidade.

    A viso de desenvolvimento enquanto processo de apropriao pelo homem da experincia histrico-social relativamente recente. Durante longos anos, o papel da interao de fatores internos e externos no desenvolvimento no era destacado. Enfatizava-se ora os primeiros, ora os segundos. Os filsofos e os cientistas criaram, assim, teorias ou abordagens denominadas inatistas que salientam a importncia dos fatores endgenos e teorias ou abordagens chamadas ambientalistas onde especial ateno se d ao do meio e da cultura sobre a condu-ta humana.

    Cada uma dessas concepes ser analisada em separado.

    Verificao de leitura Complete: a) O ttulo desta unidade nos informa que o texto ir apresentar

    de desenvolvimento, ou seja, tericas e suas repercusses

    b) As diversas teorias de desenvolvimento apiam-se em diferentes e

    Tais concepes, por sua vez, dependem

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  • c) Este livro defende uma viso de desenvolvimento enquanto ocorrendo atravs da inte-

    rao de determinantes e

    d) Tal viso diferente da concepo inatista, que salienta - e da concepo ambientalista, que enfatiza

    1.1. A Concepo Inatista A natureza, dizem-nos, apenas o hbito. Que significa isso? No h hbitos que s se adquirem pela fora e no sufocam nunca a natureza? o caso, por exem-plo, do hbito das plantas, cuja direo vertical se perturba. Em se lhe devolven-do a liberdade, a planta conserva a inclinao que a obrigaram a tomar, mas a seiva no muda, com isto, sua direo primitiva; e se a planta continuar a vege-tar, seu prolongamento voltar a ser vertical. O mesmo acontece com os homens (J-J. Rousseau, Emlio).

    A concepo inatista parte do pressuposto de que os eventos que ocorrem aps o nascimento no so essenciais e/ou importantes para o desenvolvimento. As qualidades e capacidades bsicas de cada ser humano sua personalidade, seus valores, hbitos e crenas, sua forma tlr |icnsar, suas reaes emocionais e mesmo sua conduta social j se encontrariam basicamente prontas e em sua forma final por ocasio do nascimento, sofrendo pouca diferenciao qualitativa e quase nenhuma iransformao ao longo da existncia. O papel do ambiente (e, portanto, da educao e do ensino) tentar interferir o mnimo possvel no proces-so do desenvolvimento espontneo. da pessoa.

    As origens da posio inatista podem ser encontradas, de um lado, na Teologia: Deus, de um s ato, criou cada homem em sua forma defini-tiva. Aps o nascimento, nada mais haveria a fazer, pois o beb j teria cm si 08 germes do homem que viria a ser. O destino individual de cada criana j estaria determinado pela "graa divina".

  • Do outro lado, a posio inatista apia-se num entendimento errneo de algumas contribuies importantes ao conhecimento biolgico, tais como a proposta evolucionista de Darwin, a Embriologia e a Gentica.

    A evoluo, para Darwin, bilogo ingls que viveu no sculo passa-do, resulta de mudanas graduais e cumulativas no desenvolvimento das espcies. Essas mudanas, por sua vez, decorrem de variaes heredit-rias que fornecem vantagens adaptativas em relao s condies ambi-entais prevalecentes. O papel do ambiente bastante limitado. Cabe-lhe apenas determinar, dentre as possibilidades naturais de variao, quais so as mais adaptativas para a espcie, isto , as que melhor permitem espcie sobreviver num ambiente especfico. S os mais aptos de uma determinada espcie aqueles capazes de se adaptar ao meio sobreviveriam.

    Aplicada ao desenvolvimento humano, essa teoria foi freqente-mente mal interpretada. Ao servir de base para a posio inatista, no se levou em conta que o ambiente tem um impacto decisivo sobre o ciclo de vida dos membros de cada espcie, muito embora no possa produzir neles alteraes que venham a ser transmitidas a futuras geraes. A teoria darwiniana acabou, assim, sendo erroneamente entendida como postulando aquilo que nunca pretendeu: que os fatores ambientais eram incapazes de exercer um efeito direto tanto na espcie quanto no organismo.

    Em relao espcie humana, deixou-se de lado a influncia da experincia individual de cada pessoa; equiparou-se, conseqentemen-te, o complexo comportamento scio-cultural do homem quele que tpico de organismos inferiores, onde se observa pouca ou nenhuma diferenciao.

    Os primeiros conhecimentos produzidos na Embriologia tambm forneceram subsdios para as teorias inatistas. Na verdade, esses primei-ros dados apontavam para seqncias de desenvolvimento praticamente invariveis que seriam, em grande parte, reguladas por fatores endge-nos, ou seja, de origem interna. Supunha-se que o desenvolvimento in-tra-uterino ocorria em um ambiente fisiolgico relativamente constante e isolado de estimulaes externas. Mas o modelo fornecido pela Embriologia, quando projetado para a vida aps o nascimento, mostra-va-se inadequado: nele, a experincia individual no teria qualquer impacto sobre o organismo.

    Por outro lado, dados mais recentes da Embriologia indicam que o ambiente interno tem um papel central no desenvolvimento do embrio,

    In

  • assim como o ambiente externo fundamental para o desenvolvimento itfs-natal. No h, pois, bases empricas ou tericas que sirvam de apoio para a viso inatista no mbito da Psicologia. Tal viso, no entanto, gerou uma idia de homem que produziu uma abordagem rgida, autori-tria e, sobretudo, pessimista para a educao de crianas e adolescen-tes. Como, na concepo inatista, o homem "j nasce pronto", pode-se abrias aprimorar um pouco aquilo que ele ou, inevitavelmente, vir a ser. Em conseqncia, no vale a pena considerar tudo o que pode ser leito em prol do desenvolvimento humano. O ditado popular "pau que nasce torto morre torto" expressa bem a concepo inatista, que ainda hoje aparece na escola, camuflada sob o disfarce das aptides, da pron-tido e do coeficiente de inteligncia. Tal concepo gera preconceitos prejudiciais ao trabalho em sala de aula.

    Verificao de leitura I Na viso inatista, como surgem as caractersticas humanas e qual o

    papel da educao e do ensino na formao do indivduo? ' Quais as origens da posio inatista? ( Quem foi Charles Darwin? (Procure numa enciclopdia). Como ele

    explica o comportamento das diferentes espcies? Por que o texto diz que uma interpretao errnea do pensamento de Darwin foi tomada pela posio inatista? Qual seria a interpretao correta daquele pensamento?

    4. O que Embriologia? (Procure em livros de Biologia, ou numa enci-clopdia.) De que maneira os primeiros conhecimentos na Embriolo-gia forneceram subsdios para as teorias inatistas de desenvolvimen-to? De que forma dados mais recentes desta rea contrariam as posi-es inatistas?

    5. Como o pensamento liberal toma concepes inatistas para formular uma Pedagogia?

  • Sugestes de temas para debates em classe: 1. Como se explicariam as diferenas entre crianas brasileiras de uma

    zona rural e de uma zona urbana determinadas, ou pertencentes a classes sociais distintas?

    2. Prepare argumentos para discutir, com os colegas e o professor, como o ditado popular "pau que nasce torto morre torto" que ex-pressa tipicamente a concepo inatista traz conseqncias para a prtica escolar e como tais conseqncias prejudicam um trabalho voltado para a apropriao do saber escolar pelos alunos.

    1.2. A Concepo Ambientalista Fizemos um estudo da motivao da criana no reprimida e descobrimos mais do que podamos usar. Nossa tarefa era preservi-la, fortificando a criana con-tra o desnimo. Introduzimos o desnimo to cuidadosamente quanto introdu-zimos qualquer situao emocional, iniciando ao redor dos seis meses. Alguns dos brinquedos, em nossos cubculos com ar condicionado, so projetados para criar perseverana. Um trecho de uma melodia de uma caixa de msica, ou um padro de luzes faiscantes, arranjado de maneira a seguir uma resposta apro-priada, digamos, apertar uma campainha. Mais tarde, a campainha dever ser apertada duas vezes. possvel construir um comportamento fantasticamente perseverante sem mostrar frustrao ou raiva. Pode no surpreend-lo saber que alguns dos nossos experimentos falharam: a resistncia ao desnimo tor-nou-se quase estpida ou patolgica. Corre-se alguns riscos em trabalhos des-se tipo, claro. Felizmente, podemos reverter o processo e restaurar a criana ao nvel satisfatrio (B. F. Skinner, Walden II).

    Como se pode notar no trecho acima, a concepo ambientalista atribui um imenso poder ao ambiente no desenvolvimento humano. O homem concebido como um ser extremamente plstico, que desenvol-ve suas caractersticas em funo das condies presentes no meio em que se encontra. Esta concepo deriva da corrente filosfica denomina-da empirismo, que enfatiza a experincia sensorial como fonte do conhe-cimento. Ainda segundo o empirismo, determinados fatores encontram-

    W

  • se associados a outros, de modo que possvel, ao se identificar tais associaes, control-las pela manipulao.

    Na Psicologia, o grande defensor da posio ambientalista um norte-americano, B. F. Skinner. A teoria proposta por ele preocupa-se cm explicar os comportamentos observveis do sujeito, desprezando a anlise de outros aspectos da conduta humana como o seu raciocnio, os seus desejos e fantasias, os seus sentimentos. Partindo de uma concepo de cincia que defende a necessidade de medir, comparar, lestar, experimentar, prever e controlar eventos de modo a explicar o objeto da investigao, Skinner se prope a construir uma cincia do comportamento.

    Na concepo do comportamento defendida por Skinner e seus seguidores, o papel do ambiente muito mais importante do que a matu-rao biolgica. Na verdade, so os estmulos presentes numa dada si-tuao que levam ao aparecimento de um determinado comportamento. Como isso ocorre?

    Segundo os ambientalistas (ou comportamentalistas, tambm cha-mados de behavioristas, do ingls behavior = comportamento), os indi-vduos buscam maximizar o prazer e minimizar a dor. Manipulando-se os elementos presentes no ambiente que, por esta razo, so chamados de estmulos possvel controlar o comportamento: fazer com que au-mente ou diminua a freqncia com que ele aparece; fazer com que ele desaparea ou s aparea em situaes consideradas adequadas; fazer com que o comportamento se refine e aprimore etc. Da o motivo pelo qual se atribui concepo ambientalista uma viso do indivduo en-quanto ser extremamente reativo ao do meio.

    Mudanas no comportamento podem ser provocadas de diversas maneiras. Uma delas requer uma anlise das conseqncias ou resulta-dos que o mesmo produz no ambiente. As conseqncias positivas so hamadas de reforamento e provocam um aumento na freqncia com que o comportamento aparece. Por exemplo, se aps arrumar os seus 1'imqiicdos (comportamento), a criana ouvir elogios de sua me (conse-qncia positiva), ela procurar deixar os brinquedos arrumados mais vr/es, porque estabeleceu uma associao entre esse comportamento e aquele da sua me. J as conseqncias negativas recebem o nome de l>unldo c levam a uma diminuio na freqncia com que certos compor-iamentos ocorrem. Por exemplo, se cada vez que Joo quebrar uma vidra-da ao jogar bola (comportamento), ele for obrigado a pagar pelo estrago (conseqncia negativa), ele passar a tomar mais cuidado ao jogar, diminuindo os estragos cm janelas.

  • Quando um comportamento absolutamente inadequado e se con-sidera desejvel elimin-lo totalmente do repertrio de comportamen-tos de um certo indivduo, usa-se o procedimento dito de extino. Nele o objetivo quebrar o elo que se estabeleceu entre o comportamento visto como indesejvel e determinadas conseqncias do mesmo. Para tanto, preciso que se retire do ambiente as conseqncias que o man-tm. Por exemplo, quando uma criana faz baguna em sala de aula para chamar a ateno da professora, mas esta no d mostras de que notou o comportamento da criana, provvel que a criana pare de fazer bagun-a. Este comportamento foi extinto porque deixou de promover o apare-cimento de determinadas conseqncias (ateno da professora).

    Mais recentemente, outros tericos afirmaram que o comportamen-to humano tambm se modifica em funo da observao de como agem outras pessoas, que se tornam modelos a serem copiados. Quando os comportamentos dos modelos so reforados, tende-se a imit-los e quando so punidos, procura-se evit-los. Observar um amiguinho chutar a bola de uma certa maneira e fazer gol, possivelmente far com que a criana imite essa forma de chutar para obter o mesmo resultado.

    Na viso ambientalista, a ateno de uma pessoa , portanto, funo das aprendizagens que realizou ao longo da sua vida, em contato com estmulos que reforaram ou puniram seus comportamentos anteriores. No entanto, apesar desse acentuado peso dado s conseqncias que um certo comportamento acarreta, elas apenas justificam as alteraes que se observa na freqncia de aparecimento do mesmo. Para explicar o sur-gimento de novos comportamentos ou daqueles valorizados em uma dada sociedade preciso prestar ateno aos estmulos que provocam o aparecimento do comportamento desejado. De igual modo, a eliminao de modos de ser visto como imprprios tambm exige ateno aos est-mulos que desencadeiam a conduta tida como inadequada. Pode-se, assim, dizer que o comportamento sempre o resultado de associaes estabelecidas entre algo que provoca (um estmulo antecedente) e algo que o segue e o mantm (um estmulo conseqente).

    Quando um comportamento for associado a um determinado est-mulo, ele tende a reaparecer quando estiverem presentes estmulos semelhantes. Este fenmeno chamado de generalizao. Quando os estmulos so objetos, a cor, a forma e o tamanho so aspectos importan-tes para que haja percepo de semelhana e generalizao de comporta-mentos. Aps a aquisio da linguagem pela criana, as palavras tor-nam-se a base para generalizaes. Mas no s isso. Alm de a criana aprender a perceber semelhanas entre estmulos e a generalizar com-

  • portamentos, ela tambm aprende o inverso, ou seja, a discriminar est-mulos a partir das suas diferenas. Uma criana que aprendeu a palavra "cachorro" associando-a a um animal de quatro patas, pode us-la, inici-almente, para nomear outros animais de quatro patas, como gatos e coe-lhos. Rapidamente, contudo, ela aprende a distinguir as caractersticas definidoras de um cachorro como o latido e passa a discriminar corretamente as vrias espcies de animais.

    A aprendizagem, na viso ambientalista, pode assim ser entendida como o processo pelo qual o comportamento modificado como resulta-do da experincia. Alm das condies j mencionadas para que a apren-dizagem se d estabelecimento de associaes entre um estmulo e uma resposta e entre uma resposta e um reforador , importante que sc leve em conta o estado fisiolgico e psicolgico do organismo. Crian-as com fome tornam-se apticas: no prestam ateno aos estmulos, li;!o conseguem discrimin-los, no percebem as associaes que estes provocam. Como conseqncia, no conseguem aprender. Crianas pri-vadas de afeto tornam-se excessivamente dependentes da aprovao da professora: so incapazes de tomar iniciativa, por medo de que a sua maneira de comportar-se provoque sanes e reprimendas.

    Para que a aprendizagem ocorra preciso, portanto, que se conside-iv a natureza dos estmulos presentes na situao, tipo de resposta que se cs|)cra obter e o estado fsico e psicolgico do organismo. ainda impor-tante aquilo que resultar da prpria aprendizagem: mais conhecimen-tos, elogios, prestgio, notas altas etc.

    Na viso ambientalista, a nfase est em propiciar novas aprendiza-gens, por meio da manipulao dos estmulos que antecedem e sucedem ii comportamento. Para tanto, preciso uma anlise rigorosa da forma como os indivduos atuam em seu ambiente, identificando os estmulos iuc provocam o aparecimento do comportamento-alvo e as conseqn-i las que o mantm. A esta anlise d-se o nome de anlise funcional do comportamento. Nela defende-se o planejamento das condies ambi-cnlais para a aprendizagem de determinados comportamentos.

    A introduo de teorias ambientalistas na sala de aula teve o mri-to de chamar a ateno dos educadores para a importncia do planeja-mento de ensino. A organizao das condies para que a aprendizagem ocorra exige clareza a respeito dos objetivos que se quer alcanar (obje-tivos instrucionais ou operacionais), a estipulao da seqncia de ativida-d e que levaro ao objetivo proposto e a especificao dos reforadores que sero utilizados. A concepo ambientalista da educao valoriza o papel do professor, cuja importncia havia sido minimizada na aborda-

  • gem inatsta. Coloca em suas mos a responsabilidade de planejar, orga-nizar e executar com sucesso as situaes de aprendizagem. Para tanto, o professor pode fazer uso de vrios artifcios para reforar posi-tivamente os comportamentos esperados: elogios, notas, diplomas etc., premiando tambm a entrega de lies caprichadas e corretas.

    Por outro lado, as teorias ambientalistas tiveram tambm efeitos nocivos na prtica pedaggica. A educao foi sendo entendida como tecnologia, ficando de lado a reflexo filosfica sobre a sua prtica. A nfase na tecnologia educacional exigia do professor um profundo co-nhecimento dos fatores a serem considerados numa programao de ensino, contudo tal conhecimento no era transmitido a eles. Programar o ensino deixou de ser uma atividade cognitiva de pesquisar condies de aprendizagem para se tornar uma atividade meramente formal de co-locar os projetos de aula numa frmula-padro.

    A principal crtica que se faz ao ambientalismo quanto prpria viso de homem adotada: a de seres humanos como criaturas passivas face ao ambiente, que podem ser manipuladas e controladas pela simples alterao das situaes em que se encontram. Nesta concepo, no h lugar para a criao de novos comportamentos. Na sala de aula, ela acar-retou um excessivo diretvismo por parte do adulto. Deixou-se de valo-rizar e fazer uso de situaes onde a aprendizagem pode se dar de modo espontneo, como aquelas onde as crianas cooperam entre si para alcan-ar um fim comum. Tal concepo prope que as situaes de ensino devam ser bem estruturadas e planejadas previamente, recorrendo-se, sempre que possvel, presena de computadores, televiso e outros recursos audiovisuais.

    No h, na concepo ambientalista, preocupao em explicar os processos atravs dos quais a criana raciocina e que estariam presentes na forma como ela se apropria de conhecimentos. Outras concepes de desenvolvimento, analisadas a seguir, buscam essa explicao.

    Verificao de leitura 1. Assinale a alternativa correta:

    So palavras-chaves no comportamentalismo:

  • a) reforo e cognio b) recompensa e controle c) demonstrao e reproduo d) descoberta e improvisao e) conscientizao e autocontrole

    2. Assinale a alternativa correta: Qual dos termos abaixo no pertence ao conjunto de princpios conceitos e tcnicas propostas por Skinner? a) reforador b) punio c) controle d) discriminao e) personalidade

    Complete: Na concepo ambientalista, o homem concebido como um

    que desenvolve suas caractersticas em funo _ _ _ _ _ _ _ Tal concepo deriva do , corrente

    filosfica que enfatiza I l'or que se atribui ao ambientalismo uma viso do indivduo como ser

    passivo? '< O ambientalismo declara que o comportamento controlado por suas

    conseqncias. Explique como voc entende essa declarao. Se quiser, d exemplos. O que aprendizagem, na viso ambientalista?

    / O que necessrio para a ocorrncia da aprendizagem, nessa visa lerica?

    H Quais os mritos da viso ambientalista na educao?

    y. Quais os efeitos nocivos dessa viso? 'JC

  • 1.3. A Concepo Interacionista: Piaget e Vygotski Dug (seis anos e meio), o que um sonho? Ns sonhamos noite. A gente pensa em alguma coisa. De onde vm os sonhos? Nio sei. O que voc acha? Que ns mesmos que fazemos os sonhos. Onde est o sonho en-quanto a gente sonha? Li fora. Onde? Aqui (mostra a lua, atravs da janela). Por que l fora? Porque ns nos levantamos. E da? Ele foi embora. Enquanto a gente sonha, onde o sonho est? Na nossa casa. Onde? Na nossa cama. Onde? Bem pertinho. E se eu estiver l no seu quarto, eu posso v-lo? No... sim, porque voc vai estar perto da cama (Piaget, A representao do mundo na criana).

    Para os psiclogos interacionistas, o fato de Dug ser capaz de res-ponder a perguntas como essas mostra que as crianas procuram sempre, de forma ativa, compreender aquilo que vivenciam e explicar aquilo que lhes estranho, construindo hipteses que lhes paream razoveis. Elas vo, portanto, construindo os seus conhecimentos por meio de sua in-terao com o meio. Nessa interao, fatores internos e externos se inter-relacionam continuamente, formando uma complexa combinao de influncias. Dessa maneira os interacionistas discordam das teorias ina-tistas, por desprezarem o papel do ambiente, e das concepes ambien-talistas porque ignoram fatores maturacionais.

    Os interacionistas destacam que o organismo e meio exercem ao recproca. Um influencia o outro e essa interao acarreta mudanas sobre o indivduo. , pois, na interao da criana com o mundo fsico e social que as caractersticas e peculiaridades desse mundo vo sendo conhecidas. Para cada criana, a construo desse conhecimento exige elaborao, ou seja, uma ao sobre o mundo.

    A concepo interacionista de desenvolvimento apia-se, portan-to, na idia de interao entre organismo e meio e v a aquisio de co-nhecimento como um processo construdo pelo indivduo durante toda a sua vida, no estando pronto ao nascer nem sendo adquirido passivamen-te graas s presses do meio. Experincias anteriores servem de base para novas construes que dependem, todavia, tambm da relao que o indivduo estabelece com o ambiente numa situao determinada.

    Especial importncia atribuda ao fator humano presente no ambi-ente. atravs da interao com outras pessoas, adultos e crianas que, desde o nascimento, o beb vai construindo suas caractersticas (seu

  • modo de agir, de pensar, de sentir) e sua viso de mundo (seu conheci-mento).

    Tomaremos duas correntes tericas no interacionismo: a elaborada por Piaget e seus seguidores e a defendida por tericos soviticos, em especial por Vygotski. Estas duas correntes sero brevemente analisa-das, apontando-se suas semelhanas e diferenas.

    A teoria de Jean Piaget Jean Piaget (1896-1980) o mais conhecido dos tericos que defen-

    dem a viso interacionista de desenvolvimento. Formado em Biologia e lilosofia, dedicou-se a investigar cientificamente como se forma o conhecimento. Ele considerou que se estudasse cuidadosa e profunda-mente a maneira pela qual as crianas constroem as noes fundamentais de conhecimento lgico tais como as de tempo, espao, objeto, causa-lidade etc. poderia compreender a gnese (ou seja, o nascimento) e a evoluo do conhecimento humano.

    Inicialmente, Piaget trabalhou com dois psiclogos franceses, Miiiet e Simon, que, por volta de 1905, tentavam elaborar um instrumen-to para medir a inteligncia das crianas que freqentavam as escolas liancesas. Tal instrumento o teste de inteligncia Binet-Simon foi 0 primeiro teste destinado a fornecer a idade mental de um indivduo e iit* hoje utilizado, depois de ter sofrido sucessivas adaptaes. Ao ana-lisar as respostas das crianas do teste, Piaget comeou a se interessar pelas respostas erradas das crianas, salientando que estas s "erravam" l>oit]uc as respostas eram analisadas a partir do ponto de vista do adulto. Na verdade as respostas infantis seguiam uma lgica prpria.

    Piaget concebeu, ento, que a criana possui uma lgica de funcio-namento mental que difere qualitativamente da lgica do funciona-mento mental do adulto. Props-se conseqentemente a investigar 1 orno, atravs de quais mecanismos, a lgica infantil se transforma em ljtica adulta. Nessa investigao, Piaget partiu de uma concepo de desenvolvimento envolvendo um processo contnuo de trocas entre o tiriianismo vivo e o meio ambiente.

    Equilbrio/Equilibrao A noo de equilbrio o alicerce da teoria de Piaget. Para este au-

    lor, lodo organismo vivo quer seja uma ameba, um animal, uma crian-

  • a procura manter um estado de equilbrio ou de adaptao com seu meio, agindo de forma a superar perturbaes na relao que ele esta-belece com o meio. O processo dinmico e constante do organismo buscar um novo e superior estado de equilbrio denominado processo de equilibrao majorante.

    Para Piaget, o desenvolvimento cognitivo do indivduo ocorre atra-vs de constantes desequilbrios e equilibraes. O aparecimento de uma nova possibilidade orgnica no indivduo ou a mudana de alguma caracterstica do meio ambiente, por mnima que seja, provoca a ruptu-ra do estado de repouso da harmonia entre organismo e meio cau-sando um desequilbrio.

    Dois mecanismos so acionados para alcanar um novo estado de equilbrio. O primeiro recebe o nome de assimilao. Atravs dele o organismo sem alterar suas estruturas desenvolve aes destinadas a atribuir significaes, a partir da sua experincia anterior, aos elemen-tos do ambiente com os quais interage. O outro mecanismo, atravs do qual o organismo tenta restabelecer um equilbrio superior com o meio ambiente, chamado de acomodao. Agora, entretanto, o organismo impelido a se modificar, a se transformar para se ajustar s demandas impostas pelo ambiente.

    Embora assimilao e acomodao sejam processos distintos e opostos, numa realidade eles ocorrem ao mesmo tempo. Por exemplo, ao pegar uma bola, ocorre assimilao na medida em que a criana pequena faz uso do esquema de pegar (uma certa postura de brao, mo e dedos) que j lhe conhecido, atribuindo bola o significado do "objeto que se pega". No entanto, a acomodao tambm est presente, uma vez que o esquema em questo precisa ser modificado para se ajustar s caractersti-cas do objeto. Assim, a abertura dos dedos e a fora empregada para ret--lo so diferentes quando se pega uma bola de gude ou uma bola de futebol.

    Ao longo do processo de desenvolvimento existem, no entanto, ocasies em que um desses mecanismos prepondera sobre o outro. As-sim, h momentos em que a assimilao prevalece sobre a acomodao, como ocorre no jogo simblico infantil, onde o mesmo esquema apli-cado a diferentes objetos (ou diferentes esquemas a um mesmo objeto), modificando-lhes os significados. possvel, por exemplo, ver a crian-a pequena usar em suas brincadeiras uma folha de jornal de diferentes maneiras: para cobrir uma boneca, para faz-la voar como se fosse um avio, para servir como bola. Mas a criana pode tambm aplicar o esquema de "jogar para cima" a uma bola de papel, a uma folha de jornal, a uma boneca etc.

  • Por outro lado, h momentos em que a acomodao mais importan-te que a assimilao, como se passa na imitao, onde a criana procura copiar as aes de um modelo, ajustando seus esquemas aos da pessoa imitada.

    As etapas do desenvolvimento cognitivo Piaget definiu o desenvolvimento como sendo um processo de

    cquilibraes sucessivas. Entretanto, esse processo, embora contnuo, caracterizado por diversas fases, ou etapas, ou perodos. Cada etapa define um momento de desenvolvimento ao longo do qual a criana constri certas estruturas cognitivas. Segundo Piaget, o desenvolvi-mento passa por quatro etapas distintas: a sensoriomotora, a pr-opera-tria, a operatrio-concreta e a operatrio-formal. Vejamos como se caracterizam.

    I) A etapa sensoriomotora Vai do nascimento at, aproximadamente, os dois anos de idade.

    Nela, a criana baseia-se exclusivamente em percepes sensoriais e em

  • ambiente. Tais esquemas, formas de inteligncia exteriorizada, vo-se modificando com a experincia. Gradativamente, a criana vai diferen-ciando-os e tornando-os cada vez mais complexos e maleveis, o que lhe permite estabelecer ligaes entre fatos como, por exemplo, bolsa e mame, som de sirene e polcia. Ou seja, os esquemas iniciais do origem a esquemas conceituais, modos internalizados de agir para conhecer, que pressupem pensamento.

    A partir da construo de esquemas pela transformao da sua ativi-dade sobre o meio, a criana vai construindo e organizando noes. Nesse processo, afetividade e inteligncia so aspectos indissociveis e influenciados, desde cedo, pela socializao.

    . Dentre as principais aquisies do perodo sensoriomotor, destaca--se a construo da noo de "eu", atravs da qual a criana diferencia o mundo externo do seu prprio corpo. O beb o explora, percebe suas diversas partes, experimenta emoes diferentes, formando a base do seu autoconceito. Mas no s isso. Ao longo desta etapa, a criana ir elaborar a sua organizao psicolgica bsica, seja no aspecto motor, no perceptivo, no afetivo, no social e no intelectual.

    Alm de perceber a diferena entre si mesma e os objetos ao seu redor, a criana ser capaz de estabelecer tambm diferenas entre tais objetos, chegando, finalmente, concepo de uma realidade estvel, onde a existncia dos objetos independente da percepo imediata. Esta uma grande conquista. Aps ter sido capaz de identificar um obje-to, separando-o dos demais, o beb, todavia, age em relao a esse objeto apenas se ele estiver visvel sua frente. Se um beb de cinco meses de idade estiver brincando com um objeto e se este for coberto por um pano, imediatamente ele volta sua ateno para outra coisa, agindo como se o primeiro objeto, por ter sido coberto, tivesse deixado de existir. S mais tarde, aos oito meses, o beb se apercebe que o objeto est ali, debaixo do pano. Experimenta grande satisfao com este fato, escondendo o objeto com o pano e descobrindo-o, vrias vezes.

    Nesse mesmo perodo, as concepes de espao, tempo e causalida-de comeam a ser construdas, possibilitando criana novas formas de ao prtica para lidar com o meio. Aos poucos, o perodo sensoriomo-tor vai-se modificando. Esquemas cada vez mais complexos so constru-dos, de forma a preparar e a dar origem ao aparecimento da funo sim-blica, ou seja, a capacidade de representar eventos futuros, de libertar-se, portanto, do universo restrito do aqui-e-agora. O aparecimento da funo simblica altera drasticamente a forma como a criana lida com o meio e anuncia uma nova etapa, denominada pr-operatria.

    jn

  • II) A etapapr-operatria A etapa pr-operatria marcada, em especial, pelo aparecimento

    da linguagem oral, por volta dos dois anos. Ela permitir criana dispor alm da inteligncia prtica construda na fase anterior da possibi-

    lidade de ter esquemas de ao interiorizados, chamados de esquemas representativos ou simblicos, ou seja, esquemas que envolvem uma idia preexistente a respeito de algo. capaz de formar, por expmplo, representaes de avio, de papai, de sapato, de que no se deve bater em outra criana etc.

    A partir dessas novas possibilidades de lidar com o meio, dos dois anos em diante a criana poder tomar um objeto ou uma situao por outra, por exemplo, pode tomar um boneco por um beb ou pode tomar uma bolsa, colocando-a no brao e agindo como se fosse sua me prepa-rando-se para sair de casa. Pode ainda substituir objetos, aes, situa-es e pessoas por smbolos, que so as palavras. Compreende que "papai" refere-se a uma pessoa especfica, que dizer "gua" (e mais tar-de "qu gua" ou "nen qu gua" ou "quero gua") indica a expresso de um desejo. Tem origem, ento, o pensamento sustentado por conceitos.

    O pensamento pr-operatrio indica, portanto, inteligncia capaz de aes interiorizadas, aes mentais. Ele , entretanto, diferente do pensamento adulto, como fcil de se constatar. Em primeiro lugar, depende das experincias infantis, refere-se a elas, sendo portanto um l>ensamento que a criana centra em si mesma. Por esta razo, o pensa-mento pr-operatrio recebe o nome de pensamento egocntrico (ou seja, centrado no ego, no sujeito). um pensamento rgido (no-flex-vel) que tem como ponto de referncia a prpria criana. Considere o seguinte dilogo:

    Adulto: Quantos irmos voc tem? Criana: Eu tenho s um irmo. Adulto: E seu irmo, quantos irmos tem? Criana: Meu irmo!? Ora, nenhum... Fica claro que, muito embora a criana saiba que possui um irmo,

    .1 lgica do seu pensamento no lhe permite compreender que o seu irmo lambm tem um irmo. Ela s consegue conceber a sua famlia tomando a si mesma como referncia, no se colocando do ponto de vista do outro.

    Outra caracterstica do pensamento desta etapa o animismo. Este leiino indica que a criana empresta "alma" (anima, em latim) s coisas

  • e animais, atribuindo-lhes sentimentos e intenes prprios do ser huma-no. Assim, freqente ouvi-la dizer que a mesa m quando nela machu-ca a sua cabea, de que o vento "quer" embaraar o seu cabelo penteado.

    O pensamento da criana de dois a sete anos apresenta, ainda, uma outra caracterstica, bastante similar ao animismo. o antropomorfis-mo ou a atribuio de uma forma humana a objetos e animais. As nuvens, por exemplo, podem ser concebidas como grandes rostos que sopram um hlito forte.

    Uma outra caracterstica interessante e prpria do pensamento pr-operatrio a transdedutividade. Ao invs de partir de um princpio geral para entender um fato particular como se faz na deduo ou de um aspecto particular para compreender o seu princpio geral de funcio-namento como no caso da induo , a criana parte do particular para o particular. Isto aponta para a enorme dificuldade que as crianas de dois a sete anos tm, tanto para elaborar leis, princpios e normas gerais a partir de sua experincia cotidiana, como para julgar, apreciar ou entender a sua vida cotidiana a partir de princpios gerais.

    Piaget exemplifica com um fato ocorrido com ele mesmo: estava colocando uma panela de gua para esquentar, a fim de ter gua quente para se barbear, quando um dos seus filhos lhe perguntou por que fazia isso. Piaget, naturalmente, respondeu: "Para fazer a barba!". Dias mais tarde, ao ver uma panela de gua sendo levada ao fogo, a mesma criana exclamou: "Papai vai se barbear!". Ora, essa criana, no perodo pr-operatrio, no aprendeu que a gua quente enquanto princpio geral pode ser usada em diferentes situaes particulares: na cozinha, para amolecer os gros duros do feijo; ao fazer a barba, para no machucar a pele do rosto: na limpeza, para derreter a crosta das gorduras etc.

    O pensamento pr-operatrio tambm extremamente dependente da percepo imediata, sofrendo com isto uma srie de distores. As-sim, por exemplo, uma criana de cerca de cinco anos ter dificuldade em considerar iguais duas filas compostas do mesmo nmero de elementos, se uma delas "parecer" mais comprida que a outra, como no desenho abaixo.

    0000000000000 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

    Naturalmente, a fila que parece maior ser considerada como con-tendo mais elementos, mesmo que a criana tenha-se certificado, ante-riormente, de que as quantidades eram, em uma e outra fda, absolula-

  • mente iguais. por isso que Piaget afirma que a criana, no perodo pr-operatrio, no tem noo de conservao. Para ela, mudando-se a apa-rncia do objeto, muda tambm a quantidade, o volume, a massa e o peso do mesmo.

    As aes no perodo pr-operatrio, embora internalizadas, no so ainda reversveis. Por exemplo, ao se pedir para uma criana de quatro anos para acrescentar trs laranjas a uma determinada quantidade de laranjas e depois para retirar trs laranjas, ela no entender que ficou com o nmero inicial de laranjas, a no ser que faa contagem das laran-ias disponveis em todos os momentos de operao. Falta-lhe, portanto, uma das condies de pensamento necessrias para que haja uma opera--lo: a reversibilidade. por isso que este perodo recebe o nome de pr-operatrio. Nele, a criana ainda no capaz de perceber que possvel retornar, mentalmente, ao ponto de partida.

    III) A etapa operatrio-concreta Por volta dos sete anos de idade, as caractersticas da inteligncia

    Infantil, a forma como a criana lida com o mundo e o conhece, demons-irum que ela se encontra numa nova etapa de desenvolvimento cogniti-vo: a etapa operatrio-concreta. Ao se comparar as aquisies deste perodo com aquele que o precedeu, observa-se que grandes modifica-r e s ocorreram.

    Em primeiro lugar, nesta etapa que o pensamento lgico, objetivo, .idi|iiire preponderncia. Ao longo dela, as aes interiorizadas vo-se tornando cada vez mais reversveis e, portanto, mveis e flexveis. O pensamento se torna menos egocntrico, menos centrado no sujeito. A cora a criana capaz de construir um conhecimento mais compatvel com o mundo que a rodeia. O real e o fantstico no mais se misturaro em siia percepo.

    Alm disso, o pensamento denominado operatrio porque rever-ivel o sujeito pode retornar, mentalmente, ao ponto de partida. A crian-

    '..i o|)era quando tem noo, por exemplo, de que 2 + 3 = 5, pois sabe que \ 2. De igual modo, a compreenso de que uma dada quantidade de

    mgila no se altera, se eu emprego a mesma poro para fazer uma salsi- lia e a seguir para transformar a salsicha cm bola, tambm constitui uma operao.

  • A construo das operaes possibilita, assim, a elaborao da noo de conservao. O pensamento agora baseia-se mais no raciocnio que na percepo. Como conseqncia, alterar a disposio de duas filei-ras, contendo ambas o mesmo nmero de elementos, no far o menino ou menina achar que as fileiras possuem nmero diferente de elementos. Da mesma forma que capaz de perceber que a quantidade se conserva, independentemente da disposio dos elementos no espao, a criana operatria tem noo de conservao quanto massa, peso e volume dos objetos.

    Neste perodo de desenvolvimento o pensamento operatrio de-nominado concreto porque a criana s consegue pensar corretamente nesta etapa se os exemplos ou materiais que ela utiliza para apoiar seu pensamento existem mesmo e podem ser observados. A criana no consegue ainda pensar abstratamente, apenas com base em proposies e enunciados. Pode ento ordenar, seriar, classificar etc.

    IV) A etapa operatrio-formal A principal caracterstica da etapa operatrio-formal, por sua vez,

    reside no fato de que o pensamento se torna livre das limitaes da reali-dade concreta. O que significa isso? Como j foi assinalado, a criana que se encontra no perodo operatrio-concreto s consegue pensar correta-mente, com lgica, se o contedo do seu pensamento estiver represen-tando fielmente a realidade concreta. Por exemplo, a partir de diversas situaes envolvendo observao de cavalos, fotos de cavalos e hist-rias sobre cavalos, a criana constri a noo de cavalo como sendo um animal de porte grande, de quatro patas, que gosta de comer capim e que utilizado no transporte de coisas ou pessoas.

    No nvel operatrio-formal, a partir dos 13 anos de idade, a criana se torna capaz de raciocinar logicamente mesmo se o contedo do seu ra-ciocnio falso. Por exemplo, possvel combinar com duas crianas de idades diferentes, uma no perodo operatrio-concreto e outra no opera-trio-formal, que a figura de uma coruja desenhada em um papel recebe-r o nome de "cavalo". A seguir, pede-se a elas que identifiquem oral-mente qual o nome de um animal de porte grande, que come capim e transporta pessoas ou coisas. A criana do perodo operatrio-concreto ir ignorar o que foi anteriormente combinado e dir que o nome do ani-mal proposto cavalo. J a mais velha, que j apresenta um pensamento

  • operatrio-formal, ir afirmar que o animal em questo poderia receber qualquer nome, exceo de cavalo, uma vez que, por definio (e no concretamente), "cavalo" o nome que, na situao, se convencionou dar coruja.

    Dessa maneira, a criana operatrio-formal pode pensar de modo lgico e correto mesmo com um contedo de pensamento incompatvel com o real. J a criana operatrio-concreta no: ela se desequilibra e falseia no raciocnio, porque prisioneira da realidade concreta.

    A libertao do pensamento das amarras do mundo concreto, adqui-rido no operatrio-formal, permitir ao adolescente pensar e trabalhar no s com a realidade concreta, mas tambm com a realidade possvel. Como conseqncia, a partir de treze anos, o raciocnio pode, pela pri-meira vez, utilizar hipteses, visto que estas no so, em princpio, nem lalsas nem verdadeiras: so apenas possibilidades. Uma vez de posse dessa faculdade de produzir e operar com base em hipteses, possvel derivar delas todas as conseqncias lgicas cabveis. A construo lpica da etapa operatrio-formal , assim, o raciocnio hipottico-dedu-livo: ele que permitir ao adolescente estender seu pensamento at o infinito.

    por isso que o adolescente, contando agora com essa ampla capa-cidade de pensar o mundo, abandona-se, com freqncia, ao exerccio de montar grandes sistemas de explicao e transformao do universo, da matria, do esprito ou da sociedade. Ao atingir o operatrio-formal, o adolescente atinge o grau mais complexo do seu desenvolvimento cog-nitivo. A tarefa, a partir de agora, ser apenas a de ajustar, solidificar e estofar as suas estruturas cognitivas.

    Piaget acredita que existem, no desenvolvimento humano, diferen-tes momentos: um pensamento, uma maneira de calcular, uma certa concluso, podem parecer absolutamente corretos em um determinado perodo de desenvolvimento e absurdos num outro. As etapas de desen-volvimento do pensamento so, ao mesmo tempo, contnuas e descont-nuas. Elas so contnuas porque sempre se apiam na anterior, incorpo-i ando-a e transformando-a. Fala-se em descontinuidade no desenvolvi-mento, por outro lado, porque cada nova etapa no mero prolongamento da que lhe antecedeu: transformaes qualitativas radicais ocorrem no modo de pensar das crianas. As etapas de desenvolvimento encontram-se, assim, funcionalmente relacionadas dentro de um mesmo processo.

    Deve-se, ainda, observar que as faixas etrias previstas para cada etttpfa no so rigidamente demarcadas. Ao contrrio, elas se referem

    45

  • apenas s mdias de idade onde prevalecem determinadas construes de pensamento. Nesse sentido, o modelo piagetiano fortemente marca-do pela maturao, pois atribui-se a ela o fato de crianas apresentarem sempre determinadas caractersticas psicolgicas em uma mesma faixa de idade. Tal modelo pretende, por isso, ser universal.

    No obstante, Piaget reconhece que, a despeito de preponderar em determinadas faixas etrias uma forma especfica de pensar e atuar sobre o mundo, podem existir atrasos ou avanos individuais em relao norma do grupo. Essa variao pode ser devida, em grande parte, natu-reza do ambiente em que as crianas vivem. Contextos que colocam desafios s crianas so potencialmente mais estimulantes para o desen-volvimento cognitivo.

    As diferentes etapas cognitivas apresentam, portanto, caractersti-cas prprias e cada uma delas constitui um determinado tipo de equil-brio. Ao longo do desenvolvimento mental, passa-se de uma para outra etapa, buscando um novo e mais completo equilbrio que depende, entre-tanto, das construes passadas.

    No possvel passar, por exemplo, da etapa sensorimotora para a operatrio-concreta, "pulando" a pr-operatria. A seqncia das eta-pas sempre invarivel, muito embora, como j foi visto, a poca em que as mesmas so alcanadas possa no ser sempre a mesma para todas as crianas. De igual modo, as etapas do desenvolvimento cognitivo no so reversveis: ao se construir uma determinada capacidade mental, no mais possvel perd-la.

    Dos quatro fatores bsicos responsveis pela passagem de uma etapa de desenvolvimento mental para a seguinte a maturidade do sistema nervoso, a interao social (que se d atravs da linguagem e da educao), a experincia fsica com os objetos e, principalmente, a equi-librao, ou seja, a necessidade que a estrutura cognitiva tem de se de-senvolver para enfrentar as demandas ambientais o de menor peso, na teoria piagetiana, a interao social. Desta maneira, a educao e em especial a aprendizagem tem, no entender de Piaget, um impacto redu-zido sobre o desenvolvimento intelectual. Desenvolvimento cognitivo e aprendizagem no se confundem: o primeiro um processo espont-neo, que se apia predominantemente no biolgico. Aprendizagem, por outro lado, encarada como um processo mais restrito, causado por si-tuaes especficas (como a freqncia escola) e subordinado tanto equilibrao quanto maturao.

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  • Verificao de leitura 1. Assinale a alternativa correta:

    Na teoria piagetiana de desenvolvimento, a noo bsica :

    a) associao b) equilibrao c) controle d) induo e) impulso

    2. Assinale a alternativa correta: Na teoria piagetiana, o desenvolvimento humano resulta:

    a) da imitao de certos modelos sociais b) das influncias e controles sofridos pelo indivduo c) da maturao do potencial de que o indivduo dispe d) da contnua interao entre indivduo e meio e) da superao de conflitos entre os impulsos e a realidade social

    i Assinale a alternativa correta: A maioria das crianas de oito anos apresenta um desenvolvimento cognitivo caracterstico da etapa denominada:.

    a) operatrio-concreta b) sensoriomotora c) pr-operatria d) representacional e) operatrio-formal

    I Assinale a alternativa correta: A dificuldade da criana de dois anos e trs anos para abandonar seus esquemas de interpretao para considerar o ponto de vista de outra pessoa caracteriza o que Piaget chamou de:

  • a) egosmo b) descentrao c) intuio d) egocentrismo e) internalizao

    5. Complete: Na teoria piagetiana, os dois mecanismos acionados para alcanar estados de equilbrio na interao indivduo-meio so chamados:

    e Atravs do primeiro, o indivduo Atravs do segundo, o indivduo

    6. Responda: Quais as caractersticas cognitivas da criana no perodo de sete a doze anos de idade, segundo Piaget?

    7. Complete: Os quatro fatores responsveis pela passagem de uma etapa de de-senvolvimento mental para a seguinte so:

    e

    8. Assinale a alternativa correta: Para Piaget, ensinar significa:

    a) encorajar o pensamento espontneo da criana b) transmitir verbalmente certos conceitos c) no interferir no que a criana faz d) reforar determinados comportamentos da criana e) demonstrar simpatia e aceitao incondicional criana

    9. Assinale a alternativa correta: Os escritores inventaram e ainda hoje inventam histrias infantis que retratam bem o pensamento pr-operatrio da criana. Em seus con-tos, criam um mundo agitado, cheio de movimentos e encontros, que a criana pequena pode perceber e entender perfeitamente, por-

    48

  • que as situaes fantsticas que lhe so apresentadas correspondem, especialmente, a uma caracterstica do pensamento pr-operatrio, de-nominada:

    a) animismo b) operatividade c) motricidade d) egosmo e) formalismo

    A teoria de Vygotski Um outro tipo de interacionismo proposto por Lev Seminovitch

    Vygotski (1896-1934). Nascido na Rssia, ele escreveu, em sua curta vi-da, uma ampla e importante obra, da qual apenas alguns livros foram li aduzidos para o portugus.

    No trabalho de Vygotski e no dos seus seguidores, especialmente no dos seus compatriotas Luria e Leontiev, encontra-se uma viso de de-senvolvimento baseada na concepo de um organismo ativo, cujo pen-samento construdo paulatinamente num ambiente que histrico e, em i ssncia, social. Nessa teoria dado destaque s possibilidades que o in-divduo dispe a partir do ambiente em que vive e que dizem respeito ao acesso que o ser humano tem a "instrumentos" fsicos (como a en-xada, a faca, a mesa etc.) e simblicos (como a cultura, valores, cren-as, costumes, tradies, conhecimentos) desenvolvidos em geraes pre-cedentes.

    Vygotski defende a idia de contnua interao entre as mutveis condies sociais e a base biolgica do comportamento humano. Partindo Ir estruturas orgnicas elementares, determinadas basicamente pela matu-laflo, formam-se novas e mais complexas funes mentais, a depender da natureza das experincias sociais a que as crianas se acham expostas.

    A forma como a fala utilizada na interao social com adultos e colegas mais velhos desempenha um papel importante na formao e or-ganizao do pensamento complexo e abstrato individual. O pensamento Inlnntil, amplamente guiado pela fala e pelo comportamento dos mais experientes, gradativamente adquire a capacidade de se auto-regular. Por exemplo, quando a me mostra a uma criana de dois anos um objeto r diz "a faca corta c di", o fato de ela apontar para o objeto c de as-sim descrev-lo provavelmente provocar uma modificao na percepo

    AC)

  • e no conhecimento da criana. O gesto e a fala matemos servem como sinais externos que interferem no modo pelo qual o menino ou a menina age sobre seu ambiente: com o tempo, ocorre uma interiorizao pro-gressiva das direes verbais fornecidas criana pelos membros mais experientes de um ambiente social.

    Esta interiorizao progressiva das orientaes advindas do meio so-cial no se faz, entretanto, de forma linear. Caso isto ocorresse, no se poderia pressupor, como Vygotski de fato o faz, que a criana seja um ser ativo. Adicionalmente, sua teoria seria, antes de mais nada, marcada por um forte determinismo do social no individual, uma vez que este l-timo simplesmente espelharia o primeiro.

    O processo de internalizao , ao contrrio, um processo ativo, no qual a criana apropria-se do social de uma forma particular. Reside a, na verdade, o papel estruturante do sujeito: interiorizao e transformao interagem constantemente, de forma que o sujeito, ao mesmo tempo que se integra no social, capaz de posicionar-se frente ao mesmo, ser seu critico e seu agente transformador. Assim, medida que as crianas crescem, elas vo internalizando a ajuda externa que se torna cada vez menos necessria: a criana mantm, agora, o controle sobre sua prpria conduta.

    Atravs da prpria fala, o ambiente fsico e social pode ser melhor apreendido, aquilatado e equacionado: a fala modifica, assim, a qualidade do conhecimento e pensamento que se tem do mundo em que se encontra.

    Ao internalizar instrues, as crianas modificam suas funes psi-colgicas: percepo, ateno, memria, capacidade para solucionar pro-blemas. dessa maneira que formas historicamente determinadas e so-cialmente organizadas de operar com informao influenciam o conheci-mento individual, a conscincia de si e do mundo. Por exemplo, a viso de mundo e as conseqentes formas de interagir com as crianas ado-tadas pelos adultos no sculo XV diferem substancialmente das utilizadas hoje em dia, especialmente se as compararmos com as do mundo urbano moderno, fortemente influenciado pelos meios de comunicao de massa. Traduzem formas diferentes de organizar, planejar e atuar sobre a rea-lidade.

    Assim, as funes mentais superiores como a capacidade de so-lucionar problemas, o armazenamento e o uso adequado da memria, a formao de novos conceitos, o desenvolvimento da vontade apare-cem, inicialmente, no plano social (ou seja, na interao envolvendo pes-soas) e apenas elas surgem no plano psicolgico (ou seja, no prprio in-divduo). A construo do real pela criana, ou seja, a apropriao que esta faz da experincia social, parte, pois, do social (da interao com os outros) c, paulatinamente, internalizada por ela.

  • Segundo Vygotski, a aquisio de um sistema lingstico reorganiza, pois, todos os processos mentais infantis. A palavra d forma ao pensa-mento, criando novas modalidades de ateno, memria e imaginao. Mas no s isto. Alm de indicar um objeto do mundo externo, ela lambm especifica as principais caractersticas desse objeto (abstraindo-as da caractersticas dos demais objetos), generaliza as caractersticas perce-bidas e as relaciona em determinadas categorias. Da a importncia da linguagem para o pensamento: ela sistematiza a experincia direta da c riana e serve para orientar o seu comportamento.

    A relao entre fala extrema e pensamento modifica-se ao longo do desenvolvimento. At por volta dos trs anos de idade, a fala acompa-nha, freqentemente, o comportamento infantil. comum a criana de dois anos agir e descrever o que faz, ao mesmo tempo. A partir de en-to observa-se que a fala comea a preceder o comportamento: o me-nino ou a menina anuncia o que ir fazer a seguir. A fala adquire, pois, mna nova funo, que caracterstica do pensamento complexo: a de planejar a ao, de guiar as atividades da criana. Isto verificado

  • A construo do pensamento complexo e do abstrato Para Vygotski, o processo de formao de pensamento , portanto,

    despertado e acentuado pela vida social e pela constante comunicao que se estabelece entre crianas e adultos, a qual permite a assimilao da experincia de muitas geraes.

    Como j foi dito, a linguagem intervm no processo de desenvol-vimento intelectual da criana praticamente j desde o nascimento. Quan-do os adultos nomeiam objetos, indicando para a criana as vrias rela-es que estes mantm entre si, ela constri formas mais complexas e sofisticadas de conceber a realidade. Sozinha, no seria capaz de adquirir aquilo que obtm por intermdio de sua interao com os adultos e com as outras crianas, num processo em que a linguagem fundamental.

    Em sala de aula, por exemplo, ao ensinar, o professor destaca al-guns objetos existentes no ambiente chama a ateno dos alunos para determinados aspectos enquanto negligencia outros e levanta questes acerca dos elementos destacados. Nessa interao com o professor os alunos tm oportunidade para reestruturar sua percepo, discriminar pon-tos centrais daqueles que so acessrios ou pouco relevantes. Tais for-mas comportamentais usadas pelo professor na situao de aprendizagem vo sendo apropriadas pelos alunos que podem passar a us-las de modo independente, ao tentar compreender novos aspectos de ambiente.

    Desenvolvimento e aprendizagem

    Vygotski considera trs teorias principais que discutem a relao entre desenvolvimento e aprendizagem. Na primeira, desenvolvimento encarado como um processo maturacional que ocorre antes da aprendiza-gem, criando condies para que esta se d. preciso haver um deter-minado nvel de desenvolvimento para que certos tipos de aprendizagem sejam possveis. Esta , em essncia, a posio defendida por Piaget. Na segunda teoria, a comportamentalista ou behaviorista, a aprendizagem desenvolvimento, entendido como acmulo de respostas aprendidas. Nessa concepo, o desenvolvimento ocorre simultaneamente aprendizagem, ao invs de preced-la. O terceiro modelo terico sugere que desenvolvi-mento e aprendizagem so processos independentes que interagem, afe-lando-se mutuamente: aprendizagem causa desenvolvimento c vice-versa.

  • Para Vygotski, no entanto, nenhuma das propostas acima satisfa-tria, muito embora ele reconhea que aprendizagem e desenvolvimento sejam fenmenos distintos e interdependentes, cada um tomando o outro possvel. Questionando a interao entre estes dois processos, Vygotski aponta o papel da capacidade do homem de entender e utilizar a lingua-gem. Assim, v a inteligncia como habilidade para aprender, desprezan-do teorias que concebem a inteligncia como resultante de aprendizagens prvias, j realizadas. Para ele, as medidas tradicionais de desenvolvi-mento, que se utilizam de testes psicolgicos padronizados, focalizam apenas aquilo que as crianas so capazes de realizar sozinhas.

    Segundo o especialista russo, a referncia do indivduo com parcei-ros mais experientes cria uma "zona de desenvolvimento potencial"*. Ele usou este termo para se referir distncia entre o nvel de desenvolvi-mento atual determinado pela capacidade de soluo, sem ajuda, de problemas e o nvel potencial de desenvolvimento medido atravs da soluo de problemas sob a orientao ou em colaborao com as crianas mais experientes. Duas crianas que obtiveram o mesmo resul-lado num teste de inteligncia (e que parecem, portanto, muito semelhan-tes em termos de maturao e de aprendizagens prvias) podem ser completamente diferentes, quando se considera os aspectos do desenvol-vimento que ainda precisam ser construdos para que se apropriem de aprendizagens previstas para o prximo nvel de idade.

    Desse ponto de vista possvel afirmar que a diferena entre as crianas deve-se, em grande parte, a diferena qualitativas em seu am-biente social, ou seja, a diferente forma de relacionarem-se com as pes-soas em seus ambientes. Essas formas auxiliam as crianas a entrarem em sintonia com os procedimentos e os modos de realizao das tarefas

  • completar. Neste sentido, pode ser utilizado tanto para mostrar a forma como a criana organiza a informao, como para verificar o modo como o seu pensamento opera. Tal conceito de extrema importncia para um ensino efetivo. Apenas conhecendo o que as crianas so capazes de realizar com e sem ajuda externa que se pode conseguir planejar as si-tuaes de ensino e avaliar os progressos individuais. Portanto, o papel da educao e, conseqentemente, o da aprendizagem, ganham destaque na teoria de desenvolvimento de Vygotski, que tambm mostra que a qualidade das trocas que se do no plano verbal entre professor e . alunos ir influenciar decisivamente na forma como as crianas tornam mais complexo o seu pensamento e processam novas informaes.

    Para Vygotski, em resumo, o processo de desenvolvimento nada mais do que a apropriao ativa do conhecimento disponvel na socie-dade em que a criana nasceu. preciso que ela aprenda e integre em sua maneira de pensar o conhecimento da sua cultura. O funcionamento intelectual mais complexo desenvolve-se graas a regulaes realizadas por outras pessoas que, gradualmente, so substitudas por auto-regula-es. Em especial, a fala apresentada, repetida e refinada, acabando por ser internalizada, permitindo criana processar informaes de uma forma mais elaborada.

    Verificao de leitura 1. Complete:

    Nos trabalhos de Vygotski, Luria e Leontiev, encontra-se uma viso de desenvolvimento baseado na concepo de indivduo como

    cujo desenvolvimento

    2. Complete: As possibilidades de que o indivduo dispe no ambiente em que vive para o seu desenvolvimento dizem respeito ao acesso que o ser huma-no tem a Em outras palavras, partindo de : determinadas , formam-se

    dependendo

    54

  • 3. Como as crianas adquirem a capacidade para se auto-regular, se-gundo Vygotski?

    4. Qual a relao entre fala externa e pensamento, para Vygotski? 5. O que a "zona de desenvolvimento potencial"? 6. Qual a contribuio da teoria de Vygotski educao?

    Piaget e Vygotski: diferenas e semelhanas Do que foi visto, possvel afirmar que tanto Piaget como Vygotski

    concebem a criana como um ser ativo, atento, que constantemente cria hipteses sobre o seu ambiente. H, no entanto, grandes diferenas na maneira de conceber o processo de desenvolvimento. As principais de-las, em resumo, so as seguintes:

    a) Quanto ao papel dos fatores inter-nos e externos no desenvolvimento Piaget privilegia a maturao biolgica; Vygotski, o ambiente

    social. Piaget, por aceitar que os fatores internos preponderam sobre os exlernos, postula que o desenvolvimento segue uma seqncia fixa e universal de estgios. Vygotski, ao salientar o ambiente social em que a i riana nasceu, reconhece que, em se variando esse ambiente, o desen-volvimento tambm variar. Neste sentido, para este autor, no se pode acoitar uma viso nica, universal, de desenvolvimento humano.

    b) Quanto construo real Piaget acredita que os conhecimentos so elaborados espontanea-

    mente pela criana, de acordo, com o estgio de desenvolvimento em que esta se encontra. A viso particular e peculiar (egocntrica) que as crian-as mantm sobre o mundo vai, progressivamente, aproximando-se da lonccpo dos adultos: torna-se socializada, objetiva. Vygotski discor-da ile que a construo do conhecimento proceda do individual para o MHlal. Em seu entender a criana j nasce num mundo social e, desde o nascimento, vai formando uma viso desse mundo atravs da interao iom adultos ou crianas mais experientes. A construo do real , ento,

  • mediada pelo interpessoal antes de ser internalizada pela criana. Desta forma, procede-se do social para o individual, ao longo do desenvolvi-mento.

    c) Quanto ao papel da aprendizagem Piaget acredita que a aprendizagem subordina-se ao desenvolvi-

    mento e tem pouco impacto sobre ele. Com isso, ele minimiza o papel da interao social. Vygotski, ao contrrio, postula que desenvolvimento e aprendizagem so processos que se influenciam reciprocamente, de modo que, quanto mais aprendizagem, mais desenvolvimento.

    d) Quanto ao papel da linguagem no desenvolvimento e relao entre linguagem epensamento Segundo Piaget, o pensamento aparece antes da linguagem, que

    apenas uma das suas formas de expresso. A formao do pensamento depende, basicamente, da coordenao dos esquemas sensorimotores e no da linguagem. Esta s pode ocorrer depois que a criana j alcanou um determinado nvel de habilidades mentais, subordinando-se, pois, aos processos de pensamento. A linguagem possibilita criana evocar um objeto ou acontecimento ausente na comunicao de conceitos. Piaget, todavia, estabeleceu uma clara separao entre as informaes que podem ser passadas por meio da linguagem e os processos que no parecem sofrer qualquer influncia dela. Este o caso das operaes cognitivas que no podem ser trabalhadas por meio de treinamento especfico feito com o auxlio da linguagem. Por exemplo, no se pode ensinar, apenas usando palavras, a classificar, a seriar, a pensar com re-versibilidade.

    J para Vygotski, pensamento e linguagem so processos interde-pendentes, desde o incio da vida. A aquisio da linguagem pela crian-a modifica suas funes mentais superiores: ela d uma forma definida ao pensamento, possibilita o aparecimento da imaginao, o uso da memria e o planejamento da ao. Neste sentido, a linguagem, diferen-temente daquilo que Piaget postula, sistematiza a experincia direta das crianas e por isso adquire uma funo central no desenvolvimento cognitivo, reorganizando os processos que nele esto cm andamento.

  • Verificao de leitura 1. Preencha resumidamente o quadro abaixo, comparando as teorias de

    Piaget e Vygotski.

    DIFERENAS w 11 1*1 H M i i y n w PIAGET VYGOTSKI

    Papel dos fatores internos e externos no desenvolvimento

    Processo de construo real

    Papel da aprendizagem

    Papel da linguagem no desenvolvimento; relao entre linguagem e pensamento

    57

  • buscar auxlio especfico, modificar o comportamento que tem face a uma disciplina. Desse ponto de vista, a avaliao do professor leva o aluno a se auto-avaliar, a perceber quais so os seus pontos fortes e quais so os pontos fracos que devem ser superados. A informao dada aos alunos sobre o seu desempenho na escola no deve, portanto, ser encara-da como um simples ato de punio ou de recompensa. Na verdade, a avaliao , antes de tudo, um elemento extremamente til, que possibi-lita aos alunos verificar se o caminho escolhido o mais adequado ou se, inversamente, preciso modificar a conduta para trabalhar as dificul-dades que encontram.

    Verificao de leitura 1. Por que foi dito que a idia de que "o aluno tem graves problemas

    emocionais" pode colocar sobre o aluno o peso de uma questo que no apenas responsabilidade dele?

    2. O que caberia escola fazer em relao ao desenvolvimento afetivo dos alunos? Por qu?

    3. Qual a importncia das ligaes afetivas no desenvolvimento? 4. A teoria freudiana chama a ateno do professor para a interao

    entre e . 5. Quais as relaes entre afetividade e cognio? 6. Quais as relaes entre motivao e aprendizagem?

    Seminrio ou estudo de caso Apoiado em observaes em sala de aula, como voc discutiria o

    problema das dificuldades de aprendizagem? Considere o papel da afe-tividade e da cognio tal como ocorreu no ambiente interacional da sala de aula. Quais as oportunidades de que a criana dispe para raciocinar, satisfazer necessidades, partilhar significados com o professor e com as outras crianas? As crianas apresentam um estado fisiolgico satisfa-trio: tm sono? tm fome? enxergam ou escutam bem? Dispem de materiais para explorar e manipular? Tm oportunidades para interagir e dialogar?

    U

  • Unidade IV O desenvolvimento de crianas e adolescentes

    Esta unidade aborda, mais diretamente, o trabalho na escola a partir da concepo interacionista de desenvolvimento humano. Discute-se aqui as trocas que se estabelecem em sala de aula, os procedimentos de ensino, a maneira como o professor lida com o "erro" dos alunos, o papel da linguagem na instruo e o trabalho cm grupo, na classe. O debate destes temas dever propiciar uma formao docente mais segura quanto aos fundamentos do ensino e mais criativa quanto sua expresso na prtica profissional.

  • 1. A atuao docente no desenvolvimento de crianas e adolescentes Um dos maiores desafios com o qual a escola se defronta resolver

    de forma efetiva uma das suas principais metas: a de propiciar aos alunos a possibilidade de realizar, com os materiais e os meios disponveis, algo que ainda no tenha sido feito, ou de fornecer condies para que aquilo que j foi feito seja visto ou refeito a partir de uma nova perspectiva. No se quer, assim, que a escola atue apenas como reprodutora de conheci-mentos ou de tcnicas j desenvolvidas. Ao contrrio, preciso que a criao seja ela cientfica, seja ela artstica tenha lugar no espao escolar. Como fazer isto?

    Em primeiro lugar, para se saber o que novo preciso conhecer profundamente aquilo que j existe. S ento possvel evitar a repeti-o ou a redescoberta de elementos, relaes ou posies j disponveis no acervo das produes humanas. Isso requer que a sociedade e em especial a escola representem contextos frutferos de aprendizagem.

    Ambas precisam fornecer condies de dilogo da criana com adultos e companheiros mais experientes, de modo que as conquistas j efetivadas sejam apropriadas e incorporadas pelas geraes mais novas. Mas no s isso. importante, ainda, que a sociedade em geral e a es-cola em particular valorizem as pequenas construes infantis no dia-a-dia, compreendendo e incentivando a rica interao entre o novo e o conhecido. De modo mais amplo, necessrio que se estimule e encora-je o prprio prazer de aprender, freqentemente ausente da vida e das salas de aula.

    Essa no uma tarefa simples. Exige, daqueles preocupados com a educao, interesse e ateno para pequenos progressos, sensibilidade para avaliar os esforos despendidos e, sobretudo, capacidade de elabo-rar formas produtivas de orientar o trabalho das crianas. Elogios a uma resoluo diferente de um problema de Matemtica, a uma composio original, a um desenho bem explorado, so apenas uma pequena parte do processo de forjar o novo. imprescindvel que adultos, professores ou no, constituam modelos e atuem como colaboradores, na tentativa de reconstruir o passado para transform-lo. Para tanto, preciso indicar como separar o secundrio do central, discutir as respostas obtidas, ori-entar a formulao de novas hipteses e apontar aquilo que produo pessoal, diferenciando-a das j existentes. MN

  • Ao longo da interao adulto-eriana, cabe ao primeiro mediar e ajudar os mais jovens a se introduzirem no universo cultural da sua so-ciedade, confiando em sua competncia para ensinar e naquela das crian-as para se apropriarem do conhecimento j elaborado. Isso requer uma atitude positiva frente aprendizagem dos iniciantes. Se o adulto no manifestar compreenso e empatia face s dificuldades do processo de aprender, provavelmente minar a base que as geraes futuras necessi-tam para construrem novas formas de pensar e atuar sobre o mundo.

    ) Verificao de leitura 1. Como a escola pode responder ao desafio de no apenas reproduzir,

    mas tambm criar conhecimentos?

    2. A Concepo Interacionista na escola A viso interacionista de desenvolvimento traz importantes contri-

    buies para a prtica pedaggica. Ao considerar que a criana constri progressivamente novos conhecimentos e novas formas de pensar, a escola passada dar maior nfase ao processo de aprendizagem do aluno. No desejvel que a criana simplesmente saiba coisas, mas sim e sobretudo que pense competentemente sobre as mesmas. O objetivo, assim, no fornecer verdades prontas e acabadas aos alunos, mas , antes, capacitar o aluno a elaborar o conhecimento que se espera seja alcanado.

    A interao em sala de aula Na interao professor-alunos, supe-se que o primeiro ajude inici-

    almente os segundos na tarefa de aprender, porque essa ajuda logo lhes possibilitar pensar com autonomia. Para aprender, o aluno precisa ter ao seu lado algum que o perceba nos diferentes momentos da situao de aprendizagem e que lhe responda de forma a ajud-lo a evoluir no proces-so, alcanando um nvel mais elevado de conhecimento. Por meio da interao que se estabelece entre eles e esse parceiro mais experiente e sensvel o professor ou um colega o aluno vai construindo novos conhecimentos, habilidades e significaes.

  • Cabe ao professor conhecer de perto os seus alunos para estar fami-liarizado com os modos atravs dos quais eles raciocinam. Conhecendo bem o pensamento dos alunos, ele est em posio de organizar a situa-o de aprendizagem e, sobretudo, interagir com eles, ajudando-os a elaborar hipteses pertinentes a respeito do contedo em pauta, por meio de constante questionamento das mesmas. Com isso, os alunos podem, pouco a poiico, elaborar conceitos e noes.

    Os comportamentos do professor e dos alunos esto, portanto, dis-postos em uma rede de interaes envolvendo comunicao e comple-mentao de papis, onde expectativas recprocas so colocadas. Nessas interaes importante que o professor procure colocar-se no lugar dos alunos para compreend-los, ao "mesmo tempo que os alunos podem, com a ajuda do mestre, conhecer as opinies, os propsitos e as regras que este busca estabelecer para o grupo-classe.

    Na troca de influncias que ento acontece, o professor procura entender, a cada momento, os motivos e dificuldades dos aprendizes, suas maneiras de sentir e reagir diante de certas situaes, fazendo com que as interaes em sala de aula prossigam de modo produtivo, superan-do obstculos que surgem no processo de construo partilhada de co-nhecimentos. Assim, comportamentos como perguntar, expor, incenti-var, escutar, coordenar e participar de debates, explicar, ilustrar e outros podem ser expressos pelos alunos e pelo professor numa rede de partici-paes onde os indivduos consideram-se, reciprocamente, como inter-locutores que constroem o conhecimento pelo dilogo.

    Um exemplo possvel: aluno A pergunta, professor responde, aluno B pergunta, professor incentiva aluno C a explicar aos colegas, aluno C expli-ca, aluno D d exemplo, aluno A tambm d exemplos, aluno J mostra seu exerccio ao professor, professor recebe e comenta o exerccio, aluno M solicita que o professor torne a explicar, professor explica e prope exerccios no caderno, alunos fazem os exerccios, professor elogia o esforo da classe. *

    Participando ativamente, os alunos tm diferentes oportunidades de coordenar suas aes tanto com as dos colegas como com as do profes-sor, usando diversos modos de expresso: oral, escrita, grficos, corpo-rais etc. A interao em sala de aula envolve, pois, ajuste de aes que levam construo partilhada (ou seja, conjunta) de significados nas si-tuaes de aprendizagem. Nesse processo, mestre e aprendizes se respei-tam como pessoas, como sujeitos nicos que possuem experincias di-versas dentro de uma mesma cultura.

    o/i

  • Procedimentos de ensino Nesse quadro de referncias, um ensino pautado exclusivamente

    em aulas, onde o professor apenas expe um contedo sem dialogar com os alunos sobre o mesmo, est fadado ao fracasso. preciso que os alu-nos participem ativamente da aprendizagem, fazendo perguntas e pro-pondo solues. Para tanto, incentiva-se a pesquisa e o raciocnio lgi-co em tarefas de soluo de problemas. No se recomenda, pois, que a aprendizag