termodinamica em sistemas biologicos

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Termodinamica em Sistemas Biologicos

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  • Termodinmica em Sistemas Biolgicos

    Prof. Romildo Nogueira

    1. Fundamentos da lgica da organizao do universo e a manifestao da vida.

    A fsica quntica revelou que o universo no estvel quanto supunha

    os princpios mecnicos e atmicos. As leis da natureza, imutveis e previsveis

    na perspectiva clssica das dimenses macroscpicas, no se aplicam

    dimenso microscpica, o que sugere que, a nvel subatmico, a realidade

    probabilstica.

    A ruptura decisiva da fsica quntica com a fsica clssica, ocorrido em

    1927, com os princpios da incerteza e da complementaridade. O princpio da

    incerteza de Heisenberg estabelece que no se pode conhecer, ao mesmo tempo,

    a posio e a velocidade de uma dada partcula. O princpio da

    complementaridade afirma que a matria ora se apresenta como partcula , ora

    como onda. Ao contrrio do que formulava a viso clssica essas propriedades

    no so excludentes, mas complementares. Em suma, h mais conexes do que

    do que excluses entre os fenmenos que o racionalismo cartesiano pretende

    distintos e contraditrios.

    Um universo que foi, a princpio, considerado pela cincia como

    dominado por uma ordem imperturbvel: estvel, regular e previsvel. Neste

    universo, onde as estrelas estavam sempre nos mesmos lugares; os planetas

    descreviam, incessantemente, as mesmas rbitas; os ciclos de vida, tanto animal

    quanto vegetal, se reproduziam, de forma repetitiva, ao longo dos tempos, na

    multiplicao e na renovao das espcies.

    Entretanto, num segundo olhar, a cincia desvendou uma outra realidade:

    a de um universo - desde a sua origem - sujeito disperso, expanso, sujeito

    a revolues e em contnua evoluo. Nele, as estrelas nascem, explodem e

    morrem e acidentes ecolgicos e geo-climticos ocasionam perdas e destruio,

  • perturbando e modificando a evoluo das espcies e as interaes nos

    ecossistemas. Entretanto, esses incidentes que, a princpio, pareciam s

    desordem, propiciam uma nova ordem no comportamento do universo.

    Paul Valery afirma que duas calamidades ameaam o mundo: a ordem e a

    desordem. Na verdade, tanto uma quanto outra, isoladas, seriam

    catastrficas. Um universo determinista, em que reinasse a ordem pura, seria

    semelhante a uma mquina, sem novidades, sem criao, sem devir, enfim

    engessado, e com poucas possibilidades de crescimento. Da mesma forma, um

    universo regido pela desordem no chegaria organizao, pois seria incapaz

    de manter e conduzir a novidade e, por conseguinte, seria incapaz de levar uma

    evoluo para frente. Um mundo absolutamente determinado, tanto quanto

    um completamente aleatrio, pobre e mutilado; o primeiro, incapaz de

    evoluir, e o segundo de nascer (Edgar Morin).

    O cosmos e a vida surgiram em condies de turbulncia, de erupo e de

    tormenta, portanto em condies de desordem. Essa desordem, derivada de um

    calor intenso, significa uma agitao desordenada das partculas e dos tomos,

    que, aleatoriamente se encontram, dando origem formao de galxias e da

    prpria vida.

    Somos todos vivos e no-vivos constitudos da mesma essncia. Os seres

    vivos so constitudos de molculas desprovidas de vida. Essas molculas,

    quando isoladas e examinadas individualmente comportam-se de maneira

    idntica a matria inanimada. Apesar disso, os organismos vivos apresentam

    atributos peculiares, os quais no so encontrados nos aglomerados de matria

    inanimada.

    Alguns atributos so inerentes aos seres vivos: so complexos e altamente

    organizados em relao matria inanimada; cada parte componente de um

    organismo vivo tem funo especfica; tem capacidade de extrair e transformar

    a energia de seu meio ambiente , a qual eles usam para construir e manter suas

    intricadas estruturas, a partir de materiais primrios simples (so

    negentrpicos); tem capacidade de efetuar auto-replicao.

  • A matria inanimada no tem essa capacidade de utilizar a energia

    externa para manter sua prpria organizao estrutural. Ao absorver energia a

    matria inanimada geralmente passa para uma situao de maior desordem

    (so entrpicos).

    Como os organismos vivos constitudos de molculas intrinsecamente

    inanimadas, difere to radicalmente da matria no-viva?

    Por que razo os organismos vivos parecem ser mais do que a soma de

    seus componentes inanimados?

    Os filsofos antigos responderiam que os organismos vivos so dotados de

    uma fora vital (vitalismo), que tem sido rejeitada pela cincia moderna. Na

    atualidade a bioqumica e a biofsica molecular tem como objetivo central

    determinar como os agregados de molculas inanimadas, que constituem os

    seres vivos, interagem entre si para manter e perpetuar a condio vital.

    As molculas encontradas na matria viva, denominadas de biomolculas,

    apresentam composio qumica qualitativamente diferente do meio fsico em

    que vivem. A maioria dos componentes qumicos dos organismos vivos de

    natureza orgnica. Essas molculas so ricas em carbono, oxignio e nitrognio.

    Em contraste, os elementos carbono e nitrognio no so abundantes na

    matria inanimada.

    Os compostos orgnicos presentes na matria viva ocorrem numa

    extraordinria variedade e muitos deles so extremamente complexos. Mesmo

    uma bactria, uma clula bastante simples, como a Escherichia coli contm

    cerca de 5 mil compostos. No organismo humano, deve existir cerca de 100 mil

    protenas diferentes. Alm disso, existe uma grande diversidade protica nos

    diferentes organismos, de maneira que nenhuma das molculas proticas da

    bactria E. coli idntica a qualquer uma das protenas encontradas no

    homem, ainda que algumas funcionem de maneira muito semelhante. De fato,

    cada espcie de organismo tem seu conjunto prprio, quimicamente distinto, de

    molculas de protenas e cidos nuclicos. Considerando o nmero de espcies

    de seres vivos existentes, uma tentativa intil tentar isolar, identificar e

  • sintetizar todas as molculas orgnicas encontradas na matria viva. Por outro

    lado, a bioqumica e a biofsica molecular tem mostrado que as biomolculas

    so formadas por uma lgica bastante simples. As protenas, por exemplo,

    consistem de cadeias de aminocidos ligados covalentemente. So compostos

    pequenos e de estrutura conhecida e somente vinte categorias diferentes deles

    so encontrados nas protenas, que ao se organizarem em diferentes seqncias

    podem formar a enorme variedade de protenas existentes nos seres vivos. De

    maneira similar, todos os diferentes cidos nuclicos (DNA e RNA) encontrados

    nos seres vivos so feitos somente por oito monmeros primrios, denominados

    nucleotdeos. Portanto, a lgica molecular da condio vital, parece obedecer

    aos seguintes axiomas: existe uma simplicidade bsica na organizao

    molecular dos seres vivos e existe um princpio bsico de economia molecular,

    que permite ao seres vivos conter as molculas mais simples possveis e o menor

    nmero possvel delas. Existe s o suficiente para permitir a aquisio dos

    atributos da vida e da identidade especfica nas condies ambientais vigentes

    para ela.

    2. Transformaes de energia nos seres vivos.

    A complexidade molecular e a ordem estrutural dos organismos vivos, em

    contraste com a estrutura ao acaso da matria inanimada, tm implicaes

    profundas na maneira como o ser vivo transforma a energia absorvida do seu

    meio para se manter organizado.

    Uma breve reviso dos princpios da termodinmica ser realizada como

    o objetivo de mostrar como o ser vivo utiliza a energia do meio ambiente na sua

    organizao molecular. Isto contrria, a matria inanimada que ao absorver

    energia se desorganiza.

    A Termodinmica surgiu com o advento da revoluo industrial, onde o

    interesse principal era a possibilidade de transformao de calor em trabalho,

    assim como, eficincia das mquinas trmicas nesse processo. O princpio da

    equivalncia descoberto por Mayer (1842), foi fundamental na compreenso da

  • relao quantitativa entre calor e trabalho, e portanto nos processos de

    produo de trabalho a partir do calor. Segundo este princpio, num processo

    termodinmico cclico, a quantidade total de trabalho dividida pela quantidade

    total de calor igual a um valor constante, denominado equivalente mecnico

    do calor. Se o trabalho e o calor forem medidos em Joule a sua razo igual

    unidade.

    Wtotal / Qtotal = 1, ou Qtotal - Wtotal = 0, ou seja a diferena entre o calor total

    e o trabalho total num processo termodinmico cclico zero.

    Num processo cclico termodinmico, quando a variao de uma certa

    grandeza nula, diz-se que tal grandeza uma funo de estado. Portanto,

    Qtotal - Wtotal uma funo de estado e denominada de energia interna.

    Clausius chamou o princpio da equivalncia entre calor e trabalho de

    primeiro princpio da termodinmica e o enunciou nos seguintes termos: Em

    todos os processos cclicos em que o calor produz trabalho, consome-se uma

    quantidade de calor igual ao trabalho produzido, e vice-versa, ao gastar uma

    certa quantidade de trabalho, obtm-se uma mesma quantidade de calor.

    A primeira lei da termodinmica tambm chamada lei da conservao

    da energia e , comumente, anunciada na seguinte forma:

    E = Q W,

    onde E a energia interna do sistema e Q o calor fornecido e W o

    trabalho realizado pelo sistema.

    O primeiro princpio da termodinmica nada afirma a respeito da

    possibilidade de uma dada transformao se realizar e nem informa sobre o

    sentido em que tal transformao pode evoluir.

    O segundo princpio da termodinmica afirma , segundo o enunciado de

    Clausius, que impossvel que uma mquina cclica possa produzir, como

    nico efeito, a transmisso contnua de calor de um corpo de menor

    temperatura a outro de maior temperatura.

  • Considerando uma fonte quente e uma fonte fria como um sistema, pode-

    se escrever: ( Q fonte quentesistema / T fonte quente) + (Q fonte fria sistema / T fonte fria) = 0.

    A quantidade Q / T denominada de entropia, tambm uma funo de

    estado termodinmica, ou seja nula num processo cclico.

    A segunda lei da termodinmica , do ponto de vista da mecnica

    estatstica, estabelece que os processos fsicos e qumicos tendem para um

    aumento da desordem no universo ou da sua entropia. Por exemplo, se

    colocado uma gota de um soluto num solvente a tendncia natural a gota se

    difundir dentro do solvente. Desta maneira, a gota ao se espalhar no interior

    do solvente no pode mais se organizar em forma de uma gota, aumentando a

    desordem do sistema. Nesse caso diz-se que o sistema (solvente + soluto) teve

    sua entropia aumentada. Observe que gota ao se difundir teve sua energia

    (armazenada no gradiente qumico) transformada em energia cintica para

    difuso do soluto, e portanto o gradiente de energia armazenada se perde no

    decorrer do processo. Os processos naturais nunca ocorrem de modo a reduzir

    a desordem global do universo, ou a sua entropia . Como ento que os seres

    vivos podem criar e manter sua estrutura extremamente ordenada e complexa

    num meio ambiente que est sempre aumentando a sua desordem?

    Os organismos vivos no constituem excees s leis da termodinmica.

    Eles incorporam, de seu meio ambiente, uma forma de energia que pode ser

    utilizada por eles nas condies especiais de temperatura e presso nas quais

    vivem (energia livre) e, em seguida, repe ao meio ambiente uma quantidade

    equivalente de energia em forma, menos utilizvel (calor e outras formas de

    energia). A modalidade utilizvel de energia que as clulas incorporam

    denominada energia livre, que pode, ser definida como o tipo de energia capaz

    de produzir trabalho em condies de temperatura e presso constantes.

    No formalismo termodinmico a energia livre (de Gibbs) uma funo de

    estado definida pela combinao das seguintes funes de estado: G = E + PV -

    TS , onde E a energia interna , PV o produto da presso pelo volume e TS o

    produto da temperatura pela entropia. Portanto, num sistema onde a

    temperatura e a presso esto constantes ou seja, onde possam variar somente

  • a energia interna, o volume e a entropia, a varivel pertinente na avaliao da

    espontaneidade e do equilbrio a energia livre G. Essa grandeza quando

    expressa por mol, recebe o nome de potencial qumico, e ser bastante usado no

    estudo do transporte de substncias, seja em meios homogneos ou

    heterogneos.

    O meio ambiente dos seres vivos absolutamente essencial para eles, no

    somente como uma fonte de energia livre, mas tambm como uma fonte de

    matrias-primas. Os organismos vivos so sistemas abertos, pois trocam tanto

    energia como matria com o meio ambiente e, ao fazerem isso, transformam

    ambos. uma caracterstica dos sistemas abertos o fato deles no estarem em

    equilbrio com os seus meios ambientes. Ainda que os organismos vivos

    paream estar em equilbrio, uma vez que eles no apresentam modificaes

    visveis, em realidade, eles se encontram em estado estacionrio.

    3. Equilbrio versus homeostasia.

    Na natureza, os diversos processos, como por exemplo, a queda de um corpo

    no campo gravitacional, o movimento de uma carga positiva no sentido do campo

    eltrico e a difuso de um corante num lquido, ocorre sem a influncia de um

    agente externo e sempre no sentido que o da espontaneidade. Os processos

    espontneos buscam os estados de mnima energia e mxima entropia (so

    entrpicos). Por outro lado, os processos no espontneos, como por exemplo, a

    subida de um corpo no campo gravitacional, o movimento de uma carga positiva

    contraria ao sentido de um campo eltrico, no ocorrem natureza, a menos que

    agentes externos aos processos tenham participao. Esses processos no-

    espontneos no levam o sistema ao equilbrio e so negentrpicos. Processos com

    essas caractersticas, ocorrem sempre acoplados a processos espontneos. Quando

    dois processos esto acoplados aquele que evolui no sentido da espontaneidade

    recebe o nome de processo movente e o que evolui no sentido no-espontneo

    denominado processo movido.

    Um processo s ocorre na natureza, ou seja s h movimento de matria se

    existirem foras associadas a esses processos. O processo movente evolui a favor

    da fora ao qual ele est relacionado e o processo movido no sentido contrrio dela.

  • Se as foras forem iguais tem-se o equilbrio do sistema, caracterizado pela

    ausncia da evoluo no tempo de qualquer um dos dois processos (movente e

    movido).

    Os seres vivos no se encontram em equilbrio com o seu meio ambiente,

    porm em estado estacionrio. Esse estado se caracteriza por uma condio de

    equilbrio aparente de uma parte do sistema, onde as variveis de estado

    caractersticas (concentrao, densidade, temperatura, volume, etc.), se mantm

    inalteradas com o tempo s custas de outros processos. Assim, o nvel da gua num

    reservatrio poder no mudar com o tempo porque no entra nem sai gua do

    mesmo (equilbrio) ou porque a quantidade de gua que sai bombeada de volta

    (estado estacionrio).

    As clulas mantm seus gradientes eletroqumicos as custas de um processo

    dinmico (estacionrio), onde a degradao do gradiente eletroqumico de cada on

    compensada por transporte ativo desse on (com consumo de ATP). Esse processo

    dinmico que ocorre nos seres vivos denominado de homeostasia. A vida se

    mantm devido a processos homeostsicos e no a processos envolvendo o

    equilbrio com o meio ambiente. Equilbrio celular significa a sua morte. Viver

    lutar contra a condio de equilbrio.

    A maquinaria de transformao de energia dos seres vivos construda

    inteiramente de molculas orgnicas frgeis e instveis, que so incapazes de

    resistir a temperaturas elevadas, correntes eltricas intensas, ou condies

    extremamente cidas ou bsicas. A clula viva tambm essencialmente

    isotrmica; a qualquer tempo, todas as partes da clula tm praticamente a mesma

    temperatura. Alm disso, no existem diferenas significantes de presso entre

    uma parte e a outra da clula. Por essas razes, as clulas so incapazes de utilizar

    o calor como fonte de energia. As clulas vivas, portanto, no se assemelham s

    mquinas trmicas ou eltricas, com as quais estamos familiarizados. Ao contrrio,

    elas obedecem a um outro importante axioma da lgica molecular da condio

    vital: as clulas funcionam como mquinas isotrmicas. A energia que as clulas

    absorvem de seu meio ambiente armazenada na forma de energia qumica, cuja

    utilizao permite a realizao do trabalho qumico envolvido na biossntese de

  • componentes celulares, o trabalho osmtico necessrio para o transporte de

    materiais na clula, o trabalho mecnico da contrao e locomoo.

    4. Temperatura e calor

    O conceito de temperatura intuitivo e est sempre associado sensao

    de quente e frio e sua medida realizada observando-se a expanso de uma

    coluna de mercrio, instrumento denominado de termmetro. A idia de

    expanso de um determinado volume associado com o aumento da

    temperatura induz proporcionalidade entre temperatura (T) e energia

    cintica translacional mdia das molculas (EC) do material que se expande

    na coluna do termmetro. Considerando, por simplicidade, um termmetro

    a gs a relao entre a temperatura (T) e a energia cintica mdia

    translacional das molculas do gs (EC)m pode ser expressa da seguinte

    forma:

    (EC) m = (3/2) kT,

    onde k constante de Boltzmann. Portanto, a temperatura de um sistema

    est relacionada energia cintica mdia translacional das suas molculas.

    A temperatura de um corpo varia quando ele recebe ou fornece calor.

    As molculas de um corpo esto em constante agitao trmica e so

    responsveis por sua energia trmica. Quando o corpo recebe ou cede calor,

    h um aumento ou diminuio dessa energia trmica, indicado pela variao

    de sua temperatura. Quando um sistema mantm sua temperatura constante

    porque sua energia trmica no varia, e portanto o corpo nem cedeu nem

    recebeu calor. Ento, o calor pode ser entendido como a energia que

    transita entre corpos de diferentes temperaturas colocados em contato,

    reduzindo a energia trmica de uns e aumentando a energia trmica de

    outros.

    O calor sempre flui do corpo quente para o frio e a quantidade de calor

    trocada Q, durante a variao de temperatura t de um corpo, depende de

    sua massa, da prpria variao da temperatura e do material de que ele

    constitudo. Assim,

  • Q = mct,

    Onde a constante c denominada de calor especfico e varia de um

    material para outro. O calor especfico a quantidade de calor necessria

    para elevar 1 grama de uma certa substncia de 1 oC . O calor especfico da

    gua 1 cal / (g. oC) enquanto o calor especfico do ar 0,17 cal / (g.

    oC).

    Como o homem mantm sua temperatura corporal? O homem

    mantm, a despeito das variaes da temperatura ambiente, a sua

    temperatura interna entre 36,7 e 37oC, quando medida na boca, ou entre

    37,3 e 37,6 oC para medies retais. Isso se deve existncia de mecanismos

    reguladores que controlam eficientemente a produo e a eliminao do

    calor corporal. Em ambientes frios, o calor gerado no interior do corpo deve

    ser conservado, enquanto nos ambientes quentes deve ser dissipado para o

    meio. A temperatura interna do corpo depende, assim, desse balano. Os

    animais que so capazes de controlar a prpria temperatura interna so

    chamados homeotermos.

    O homem um animal homeotermo (sangue quente). Claude Bernard (1876),

    demonstrou que, nos animais expostos ao frio, o calor corporal era produzido pela

    contrao muscular (termognese mecnica) e pelas reaes bioqumicas

    exotrmicas (termognese qumica).

    A termognese mecnica est baseada na produo de calor que ocorre

    durante o calafrio. O calafrio uma resposta muscular apresentada por

    muitos animais, entre os quais o homem, quando so subitamente expostos

    ao frio. Pode tambm ser observado nos estados febris, quando a

    temperatura corporal ascende rapidamente.

    O calafrio caracterizado por uma contrao desordenada dos msculos

    esquelticos. Trata-se de uma resposta involuntria e, durante a sua

    ocorrncia, o consumo de oxignio pode elevar-se de 2 a 5 vezes. O calafrio

    resultante de uma atividade nervosa descontrolada. Isso foi mostrado, por

    Cottle & Carlson, (1954), quando aboliram o calafrio bloqueando a

    transmisso neuromuscular, usando o curare. Alm disso, o uso da fenesina,

  • droga que atua principalmente na medula, abole tambm o calafrio, por

    inibir os neurnios motores (Griggio, 1982).

    Os animais homeotermos nem sempre utilizam a termognese mecnica

    durante a adaptao ao frio. Pequenos animais (ratos) , aclimatados ao frio

    conseguem produzir calor suficiente para suas necessidades trmicas, pelo

    uso da termognese qumica, ou seja, aumentando seu metabolismo interno.

    O prprio homem, quando submetido a um ambiente que se esfria

    vagarosamente, pode compensar a sua demanda de calor, por esse

    mecanismo.

    A termognese qumica, apesar de mais lenta do que a termognese

    mecnica, o meio mais importante para manuteno da temperatura

    corporal. O calor produzido no corpo humano pelas reaes exotrmicas

    que ocorrem no metabolismo das gorduras, dos aucares e das protenas. As

    gorduras so uma fonte importante de energia trmica, sobretudo aquelas

    localizadas no tecido adiposo marrom. As clulas desse tecido convertem

    com facilidade a energia dos seus estoques. O tecido adiposo marrom existe

    em camundongo, hamster, macacos, humanos e outros animais.

    Alguns animais no utilizam a termognese mecnica durante a

    adaptao ao frio. Entre eles o co, o coelho e a cobaia. O coelho faz a

    aclimatao ao frio, eriando os plos, com o objetivo de criar uma camada

    de ar que funciona como isolante trmico.

    Nos animais pecilotrmicos (sangue frio), grande parte da regulao da

    temperatura corporal consiste em alteraes do comportamento, como a

    procura de locais quentes quando a temperatura cai. Isso implica restries tanto do

    comportamento quanto do ambiente em que esses animais podem viver.

    A produo de calor em situao de metabolismo basal de aproximadamente

    1,5 Kcal / min para um homem adulto com 70 Kg e com 1,8 m2 de superfcie corporal.

    O calor gerado principalmente no fgado, crebro, corao e msculos esquelticos.

    Quando em atividade essa produo de calor pode elevar-se at 9,0 Kcal / min para

    um esforo muito elevado.

  • O corpo humano perde calor (termlisis) pelos seguintes mecanismos:

    Vaporizao; Radiao; Conveco; Conduo.

    Vaporizao a passagem de uma substncia do estado lquido para o estado

    gasoso. A vaporizao pode ocorrer por:i. ebulio que uma vaporizao rpida e

    turbulenta observada quando o lquido atinge a sua temperatura de ebulio;ii.

    calefao observada quando o lquido entra em contato com uma superfcie

    superaquecida. Nesse caso, a vaporizao muito rpida e a temperatura do fluido

    permanece menor do que sua a sua temperatura de ebulio;iii. evaporao processo

    lento e realizado a baixa temperatura. No corpo humano, a vaporizao se faz por

    evaporao da gua pela pele e pelos pulmes.

    A perda de calor corporal por evaporao normalmente equivale cerca de 20 a

    25% do calor total perdido pelo corpo humano. Para cada grama de suor o corpo

    perde 0,58 Kcal. Nas febres e nas doenas onde ocorrem hiperventilao pulmonar

    por taquipnia (respirao curta e acelerada), essa perda muito aumentada. Nos

    grandes queimados, ao contrrio, a perda de calor por evaporao est

    prejudicada. Isso ocorre porque a quantidade de lquido que chega superfcie do

    corpo muito grande e no h tempo suficiente para sua completa evaporao.

    Ainda mais, o lquido rico em protenas, sobretudo albuminas, o que aumenta

    sua tenso superficial e prejudica, assim, a sua evaporao. Nesses pacientes, a

    reduo da termlise por evaporao colabora para hipertermia que eles

    costumam apresentar.

    Na radiao o calor dissipado por meio de ondas eletromagnticas. Cerca de

    60% da perda de calor corporal feita por radiao. Todo corpo com temperatura

    maior do que 0 oC emite radiaes eletromagnticas (raios infravermelhos) devido a

    sua temperatura. O fluxo de calor resultante se dirige do corpo mais quente para o

    mais frio. Assim, a taxa de resfriamento de um corpo depende do seu poder emissivo.

    O fluxo de calor para o meio circundante ser tanto maior, quanto maior for a rea do

    emissor e maior for o gradiente trmico entre ele e o meio. A capacidade que a pele

    tem para receber calor do corpo e, em seguida, dissipa-lo sob forma de radiao

    eletromagntica fundamental na transferncia de calor entre o corpo e o meio.

  • Um fator importante na perda de calor por radiao poder emissivo ou potncia

    emissiva (P) de um corpo que a razo entre o fluxo () de calor que o corpo emite e

    a quantidade de calor por unidade de tempo(n) que seria emitida pelo corpo negro

    se estivesse submetido s mesmas condies experimentais, ou seja:

    P = () / (n)

    O corpo negro tem as propriedades de absorver totalmente as radiaes

    recebidas, seja ela ultravioleta, luz visvel ou infravermelho e emitir radiao de

    acordo com sua temperatura.

    A pele humana, funciona como um irradiador de calor, emite raios infravermelhos

    com comprimentos de onda que vo de 5 a 20 m. A pele humana tem uma potncia

    de irradiao igual a 97% daquela do corpo negro, independente da sua cor. Isso

    mostra que ela tem um excelente poder emissivo.

    A pele a principal fonte de radiao calorfica do corpo humano. O suprimento

    sanguneo para esse rgo abundante e est sob o controle do sistema nervoso

    central. Nas extremidades, em particular, existem muitas comunicaes entre artrias

    e veias de pequeno calibre. Isso cria condies para a formao de grande fluxo

    sanguneo, pois no tendo o sangue que percorrer os capilares, a resistncia ao fluxo

    baixa. Por esta razo, nas extremidades ocorre grande troca de calor com o meio

    ambiente.

    As mudanas na temperatura ambiente alteram a circulao do sangue na

    superfcie do corpo e isso se deve liberao de mediadores qumicos, tal como a

    acetilcolina. A temperatura da pele tambm pode ser alterada por reflexos nervosos.

    As informaes, captadas pelos receptores de frio e de calor situados na pele, chegam

    ao crebro atravs dos nervos sensitivos. Esses sinais so ento processados e

    retornam aos vasos que esto na regio do estmulo. Os nervos simpticos e

    parassimpticos conduzem esses estmulos e, assim, controlam a circulao sangunea

    da regio.

    A conveco a transferncia de energia trmica de um sistema para outro que

    se faz atravs da movimentao de massas de fluido. Esse movimento provm da

    diferena entre o empuxo do meio e o peso das partculas do fluido. Quando o ar

  • aquecido, ele se expande, aumentando o seu volume e reduzindo sua densidade. Isso

    faz com que a fora de empuxo do meio se torne maior do que o peso da massa de ar

    expandido e, por conseguinte, a camada de ar empurrada para cima. O inverso

    ocorre, quando o ar resfriado. Assim, quando as molculas de ar entram em contato

    com a pele e so aquecidas (por conduo), elas se expandem rarefazendo o meio e

    criando os gradientes de temperatura necessrios formao das correntes de

    conveco. Por este mecanismo, o ar aquecido sobe e substitudo por uma massa

    de ar mais fria. O efeito refrigerador, que a conveco do ar exerce sobre a pele, foi

    chamado de clima privado.

    Conduo a forma de transferir calor quando h contato direto entre um corpo frio e outro quente. A conduo importante quando se estuda a perda de calor atravs das roupas e em situaes especiais, como as que ocorrem nos trabalhos ou nos esportes sob a gua.

    Uma equao para o fluxo de calor pode ser estabelecida. Considere uma barra condutora de calor, isolada do ambiente, ligada a dois corpos mantidos a temperaturas diferentes. A equao que permite calcular o fluxo () do calor que se propaga do corpo mais quente para o mais frio :

    = -k.S.dT/dX, onde k a constante de condutividade trmica da barra, S a rea da barra e dT/dX o

    gradiente de temperatura ao longo da barra.. A condutividade trmica depende do

    material onde a conduo est ocorrendo. A condutividade trmica do ar igual a 0,026

    cal/ m.s. oC, da borracha 0,372 cal/ m.s. oC, do cobre 401 cal/ m.s. oC e da pele 0,898 cal/

    m.s. oC. Portanto, a condutividade do cobre 15423,08 vezes maior que a do ar e a da

    pele 34,54. O ar tem uma baixssima condutividade.

    A termoregulao corporal.

    A regulao da temperatura corporal depende do ajuste adequado entre a

    termognesis e a termlisis. Para isto, o organismo possui sensores que registram a

    temperatura superficial e interna e atravs dos centros de processamento disponibilizam

    os efetores adequados e induzem a adoo de comportamentos prprios s diversas

    condies ambientais e do organismo.

  • Num ambiente confortvel em repouso e com o corpo desnudo, a maior perda de

    energia se produz por radiao. Quando o organismo se encontra num ambiente de

    temperatura elevada ou durante o exerccio, aumenta o fluxo da circulao perifrica

    por vasodilatao, o qual favorece o transporte de calor do interior para a superfcie

    corporal por conveco. O esquentamento da pele produz uma maior irradiao. Alm

    disso, diminui a circulao de retorno dos membros pelas veias profundas e, portanto, se

    reduz a troca de calor em contracorrente, aumentando a temperatura interna e

    provocando aumento da sudorese.

    A resposta ao frio consiste em vasoconstrico perifrica, desvio da circulao de

    retorno dos membros atravs das veias profundas, aumento da atividade muscular e da

    taxa metablica. No homem a proteo contra o frio mais importante se constitui no

    abrigo, o qual resultado de um comportamento.

    As relaes entre os sensores,os centros de processamento e os efetores so

    descritos em detalhes nos tratados de Fisiologia e no ser tratado neste texto.