tecnologia assistiva no atendimento psicopedagÓgico …
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TECNOLOGIA ASSISTIVA NO ATENDIMENTO PSICOPEDAGÓGICO DE
UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL1
Cassiandra da Rosa Sampaio2
Fabiane Sarmento Oliveira Fruet3
RESUMO
Este trabalho apresenta a importância do uso da Tecnologia Assistiva, em especial a
Comunicação Alternativa, como apoio ao atendimento psicopedagógico de um aluno com
deficiência intelectual, como forma de assegurar os direitos de acesso e a permanência na
escola. Vivencia-se hoje uma nova realidade, a inclusão desses alunos nas classes regulares.
Diante essa nova realidade surge as tecnologias a serviço da Educação, que visam o acesso
e a efetiva participação da pessoa com deficiência nas salas de aula do ensino regular. Por
meio deste estudo, investigou-se as potencialidades do software Boardmaker com um aluno
com deficiência intelectual. Assim, foi possível verificar o quanto os dados gráficos e a
forma de utilização das pranchas de comunicação alternativa puderam auxiliaram na
aprendizagem desse aluno. Com o uso desse recurso, também conclui-se que o aluno se
encontra no período simbólico do seu desenvolvimento. Período este que permite a criança
criar imagens mentais na ausência do objeto, é o período da fantasia, do faz de conta, em
que acontece também a função semiótica que permite o surgimento da linguagem.
ABSTRACT
This work shows the importance of using assistive technology, especially communication
alternative funding to support attendance of a psychology student with intellectual
disabilities as a way of ensuring the rights of access and retention in school. Is now
experiencing a new reality, including these students in regular classrooms. Given this new
reality emerged technologies in the service of education, aimed at access and effective
participation of people with disabilities in the classrooms of regular schools. Through this
study, we investigated the potential of boardmaker software with a student with intellectual
disabilities. Thus it was possible to verify how much data and how to use graphics boards
of alternative communication could help in the learning of students. Using this feature, also
concludes that the student is in the symbolic period of its development. Period which allows
the child to create mental images in the absence of the object, is the period of fantasy, make
believe, it happens also to semiotic function that allows the emergence of language.
PALAVRAS-CHAVE
Atendimento Psicopedagógico, Deficiência Intelectual, Tecnologia
Assistiva, Comunicação Suplementar e Alternativa, Software Boardmaker.
1 Artigo apresentado ao Curso de Mídias na Educação da Universidade Federal de Santa Maria, como
requisito parcial à obtenção do título de Especialista em Mídias na Educação. 2 Aluna do Curso de Mídias na Educação da Universidade Federal de Santa Maria.
3 Professora Orientadora, Mestre, Universidade Federal de Santa Maria.
2
1. INTRODUÇÃO
A presença cada vez maior das tecnologias da informação e da comunicação
(TICs) no meio escolar tem alertado os professores para as potencialidades de tais
recursos no cotidiano de sala de aula. No atendimento psicopedagógico, a utilização das
tecnologias pode vir a mostrar importantes resultados na aprendizagem das noções
básicas primárias de alunos com deficiências ou síndromes.
A Constituição Federal, através do artigo 205, garante o direito à educação a
todos os indivíduos. Quando a constituição se refere ao termo ―todos os indivíduos‖,
subtende-se que não há distinção. No artigo 206 é ressaltada a igualdade de condições
para acesso e permanência na escola. Assim, fica claro que não é permitido nenhum tipo
de discriminação ou impedimento da matrícula do indivíduo com deficiência ou
dificuldade de aprendizagem na rede regular de ensino.
A inclusão requer mais que integração, requer respeito à individualidade de cada
um, considerando as necessidades e desejos apresentados pelo indivíduo com
deficiência. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN
9.394/96), o Atendimento Educacional Especializado, é assegurado no artigo 58, § 1º e
§ 2º, ressalta que
§ 1º. Haverá, quando necessário, serviço de apoio
especializado, na escola regular, para atender as
peculiaridades da clientela de Educação Especial.
§ 2º. O atendimento educacional será feito em classes,
escolas ou serviços especializados, sempre que, em função
das condições específicas dos alunos, não for possível a sua
integração nas classes comuns de ensino regular. (LDB
9.394/96).
De acordo com a LDB 9.394/96 e a Constituição Federal, a demanda da inclusão
e o avanço tecnológico, surpreende-me a matriz curricular deste curso (Mídias na
Educação) não abordar tais questões. Por isso, a abordagem deste trabalho buscou
levantar o conjunto de recursos tecnológicos disponíveis que possam contribuir para a
execução de atividades específicas do Atendimento Educacional Especializado,
possibilitando tratar com mais eficiência, as razões das deficiências dos alunos
encaminhados, bem como discutir a inclusão das tecnologias a serviço da Educação
Especial.
Diante dessa realidade cada vez mais próxima das escolas, foram investigados
um conjunto de recursos tecnológicos que contribuem para proporcionar ou ampliar
habilidades funcionais de pessoas com deficiência, disponíveis nas mesmas, que possam
3
contribuir para a comunicação e adaptação de materiais e atividades, a fim de que
possibilite desenvolver de modo mais eficiente à aprendizagem dos alunos com algum
tipo de deficiência. Bem como discutir o uso das tecnologias assistivas a serviço da
Educação Especial e da Psicopedagogia.
Desse modo, também pesquisou-se o uso do software Boardmaker4 como uma
das
formas de comunicação com um aluno do 1° ano do ensino fundamental da rede
municipal de ensino fundamental do município de Pantano Grande- RS com deficiência
intelectual e com grave comprometimento na comunicação verbal. Isso foi possível por
meio da construção de pranchas para que fossem estabelecidos rotinas, novas
aprendizagens e novos conhecimentos.
Este trabalho nasce de uma necessidade de questionar porque um curso que trata
de tecnologias não abrange a Tecnologia Assistiva em tempos de inclusão digital e
social. Aponta questões sobre Psicopedagogia e aprendizagem, deficiência intelectual,
tecnologia assistiva e comunicação alternativa, finalizando com os resultados da
investigação do uso do software Boardmaker no atendimento psicopedagógico com um
aluno com deficiência intelectual.
2. PSICOPEDAGOGIA E APRENDIZAGEM
O processo de aprendizagem começa bem cedo, como uma tendência nata,
quando aprende-se a mamar, falar, andar, pensar e uma porção de outras coisas que vão
garantir a sobrevivência dos humanos.
Diante disso, existe atualmente uma área do conhecimento que se dedica ao
estudo do processo de aprendizagem e como os diversos elementos, envolvidos nesse
processo, podem facilitar ou prejudicar o desenvolvimento dos indivíduos. Essa área é a
Psicopedagogia (Pp) que busca na Psicologia, na Psicanálise, na Psicolinguística, na
Pedagogia, na Neurologia os conhecimentos necessários para a compreensão dos
processos envolvidos na aprendizagem.
4 O Boardmaker é um programa de desenho combinado com uma base de dados gráficos que apresenta
mais de 4500 Símbolos de Comunicação Pictórica (Picture Communication Symbols – PCS). É indicado
para usuários com necessidades de comunicação alternativa, contando com funções de predição de
palavras, abreviatura e expansão e à elevada qualidade de vozes sintetizadas que transforma o computador
numa poderosa ferramenta de aprendizagem.
4
As possibilidades de aprender estão relacionadas às condições físicas e psíquicas
da criança, e, infelizmente, um número reduzido de crianças parecem não dispor do
equipamento neurofisiológico básico para uma boa aprendizagem. Sabe-se hoje também
que algumas aquisições cognitivas só são possíveis em fases genéricas de particular
sensibilidade, e que, passada essa fase privilegiada, a aquisição fica prejudicada.
Existem, portanto, momentos propícios, nos quais o meio deve estimular a
aquisição de funções cognitivas que serão pré-requisitos para as aprendizagens escolares
(Piaget,1979). Deve-se lembrar do princípio fundamental de Piaget (1979) que coloca o
desenvolvimento normal da inteligência como uma sucessão estritamente invariável de
fases (sensório-motora, pré-operatória, operatória concreta e formal), na qual o acesso a
fase seguinte necessita da integração da fase precedente, sendo que qualquer
perturbação numa fase acarreta perturbação na seguinte.
Para Piaget (1979), os aspectos citados chamam-se possibilidades do aprender e,
analisar as dificuldades do ponto de vista da criança implica considerar o desejo de
aprender. Trata-se da energia necessária ao bom funcionamento cognitivo. Por isso, o
atendimento psicopedagógico utiliza recursos e matérias que permitem a criança
ampliar o seu mundo de experiências, exercitando a curiosidade, a atenção, o pensar, a
criatividade e o prazer na produção de forma particular e específica. No caso da DI a
ênfase na intervenção, no tratamento básico recairá, portanto, na instauração de
estratégias mais funcionais do processo de aprender.
3. DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
Tudo que se refere à deficiência Intelectual (DI), a sua realidade, o seu
tratamento, sofreu mudanças profundas nos últimos anos quanto ao conceito, análise e
atenção prática. O que hoje entende-se como deficiência intelectual foi identificada e
conhecida no passado, mas apenas passou a ser objeto de atenção pedagógica a menos
de dois séculos.
O conceito de DI é fundamentado no déficit de inteligência, abrangendo várias
causas pré, peri e pós-natais. Entretanto, a variação da inteligência dos DI não
depende somente do seu genótipo, mas também das diferenças ambientais (DIAMENT,
2005). Na nova versão do manual de definição e classificação da American Association
on Mental Retardation (1992), DI é definida
5
A deficiência intelectual refere-se a limitações substanciais
no desenvolvimento corrente. Caracteriza-se por um
funcionamento intelectual significativamente inferior à
média, que ocorre juntamente com limitações associadas
em duas ou mais das seguintes áreas de habilidades
adaptativas possíveis: comunicação, cuidado pessoal, vida
doméstica, habilidades sociais, utilização da comunidade,
autogoverno, saúde e segurança, habilidades acadêmicas
funcionais, lazer e trabalho. (AMERICAN ASSOCIATION
ON MENTAL RETARDATION, 1992-doc. eletrônico).
Importantes conceitos comuns a diversos modelos cognitivos são aplicáveis à
DI. Para Fierro (1988), a pessoa com deficiência tem dificuldades especiais em adquirir
conhecimentos. Suas dificuldades parecem ter a ver com todos os processos cognitivos
e os parâmetros de inteligência. Fierro (1988) destaca que
1. Se a inteligência se caracteriza em termos tanto de
velocidade como de eficiência de processamento, de
aprendizagem, de aquisição de conhecimentos, isso
significa que os sujeitos com deficiência são mais lentos e
também menos eficientes em processar, em aprender. 2. Se
na eficácia de novas aprendizagens são relevantes tanto a
base e a organização de conhecimentos prévios como as
estratégias de processar e aprender, nos sujeitos com
deficiência supõe-se que há déficit não apenas nas destrezas
e nos saberes prévios, mas também nas estratégias.
(FIERRO, 1988, p.196)
Logo, nas estratégias gerais de aprendizagem, de manejo da experiência,
encontramos sem dúvida o déficit básico em que consiste a DI.
A ênfase na intervenção, no tratamento básico da DI recairá, portanto, na
instauração de estratégias mais funcionais do processo de aprender.
Diante disso, é preciso pensar em metodologias, técnicas e em ferramentas que
permitam compensar déficits e necessidades. Com o avanço da educação inclusiva,
surgem, em nossa sociedade, mudanças de atitudes em relação à diversidade. É, na área
da tecnologia, que surge um termo ainda novo, a Tecnologia Assistiva, a qual é uma
importante aliada no processo da inclusão social de pessoas com necessidades especiais.
4. TECNOLOGIA ASSISTIVA
Tecnologia Assistiva é, segundo Sartoretto e Bersch (2011), um termo ainda
novo, utilizado para identificar todo o arsenal de recursos e serviços que contribuem
para proporcionar ou ampliar habilidades funcionais de pessoas com deficiência e,
consequentemente, promover vida independente e inclusão. É também definida como
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"uma ampla gama de equipamentos, serviços, estratégias e práticas concebidas e
aplicadas para minorar os problemas encontrados pelos indivíduos com deficiências"
(COOK; HUSSEY, 1995- doc. digital).
Tem como objetivo, conforme apresentam as autoras, proporcionar à pessoa com
deficiência maior independência, qualidade de vida e inclusão social, através da
ampliação de sua comunicação, mobilidade, controle de seu ambiente, habilidades de
seu aprendizado, trabalho e integração com a família, amigos e sociedade.
As tecnologias assistivas possuem classificações que se dão pela promoção da
organização desta área de conhecimento que servirá ao estudo, pesquisa,
desenvolvimento, promoção de políticas públicas, organização de serviços, catalogação
e formação de banco de dados para identificação dos recursos mais apropriados ao
atendimento de uma necessidade funcional do usuário final. São elas, de acordo com a
classificação de Sartoretto e Bersch (2011):
a) Auxílios para a vida diária - materiais e produtos para auxílio em tarefas
rotineiras tais como comer, cozinhar, vestir-se, tomar banho e executar
necessidades pessoais, manutenção da casa etc.
b) Comunicação aumentativa (suplementar) e alternativa (CAA ou CSA)- recursos,
eletrônicos ou não, que permitam a comunicação expressiva e receptiva das
pessoas sem a fala ou com limitações da mesma. São muito utilizadas as
pranchas de comunicação com os símbolos PCS ou Bliss além de vocalizadores
e softwares dedicados para este fim.
c) Recursos de acessibilidade ao computador - equipamentos de entrada e saída
(síntese de voz, Braille), auxílios alternativos de acesso (ponteiras de cabeça, de
luz), teclados modificados ou alternativos, acionadores, softwares especiais (de
reconhecimento de voz, entre outros.), que permitam as pessoas com deficiência
a usarem o computador.
d) Sistemas de controle de ambiente - sistemas eletrônicos que permitem as pessoas
com limitações moto-locomotoras, controlar remotamente aparelhos eletro-
eletrônicos, sistemas de segurança, entre outros, localizados em seu quarto, sala,
escritório, casa e arredores.
e) Projetos arquitetônicos para acessibilidade - adaptações estruturais e reformas na
casa e/ou ambiente de trabalho, através de rampas, elevadores, adaptações em
banheiros entre outras, que retiram ou reduzem as barreiras físicas, facilitando a
locomoção da pessoa com deficiência.
7
f) Órteses e próteses - troca ou ajuste de partes do corpo, faltantes ou de
funcionamento comprometido, por membros artificiais ou outros recursos
ortopédicos (talas, apoios etc.). Incluem-se os protéticos para auxiliar nos
déficits ou limitações cognitivas, como os gravadores de fita magnética ou
digital que funcionam como lembretes instantâneos.
g) Adequação Postural - adaptações para cadeira de rodas ou outro sistema de
sentar visando o conforto e distribuição adequada da pressão na superfície da
pele (almofadas especiais, assentos e encostos anatômicos), bem como
posicionadores e contentores que propiciam maior estabilidade e postura
adequada do corpo através do suporte e posicionamento de
tronco/cabeça/membros.
h) Auxílios de mobilidade - cadeiras de rodas manuais e motorizadas, bases
móveis, andadores, scooters de 3 rodas e qualquer outro veículo utilizado na
melhoria da mobilidade pessoal.
i) Auxílios para cegos ou com baixa visão - auxílios para grupos específicos que
inclui lupas e lentes, Braille para equipamentos com síntese de voz, grandes
telas de impressão, sistema de TV com aumento para leitura de documentos,
publicações, entre outros.
j) Auxílios para surdos ou com deficiência auditiva - auxílios que inclui vários
equipamentos (infravermelho, FM), aparelhos para surdez, telefones com
teclado — teletipo (TTY), sistemas com alerta táctil-visual, entre outros.
k) Adaptações em veículos - acessórios e adaptações que possibilitam a condução
do veículo, elevadores para cadeiras de rodas, camionetas modificadas e outros
veículos automotores usados no transporte pessoal.
São esses recursos, serviços e tecnologias importantes aliadas no processo da
inclusão social e escolar de alunos com deficiência intelectual.
4.1 COMUNICAÇÃO SUPLEMENTAR E ALTERNATIVA (CSA)
A comunicação suplementar e alternativa (CSA) são recursos, eletrônicos ou
não, que permitem a comunicação de pessoas sem a fala e ou limitação da mesma. O
mais utilizado são as pranchas de comunicação com os símbolos PCS (Símbolo de
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Comunicação Pictórica). Segundo a American Apeech-Language-Hearing Association
(Asha) (1989),
Comunicação Suplementar e Alternativa é uma área da
prática clínica que se propõem a compensar (temporária ou
permanentemente) a incapacidade ou deficiência do
indivíduo com desordem severa de comunicação
expressiva. (ASHA, 1989, p.93)
A CSA tem o objetivo de valorizar todos os sinais expressivos de uma pessoa,
organizando-os para que se estabeleça uma comunicação eficiente. Dirige-se a pessoas
que não possuem fala ou escrita funcional devido a diversas disfunções: paralisia
cerebral, deficiência intelectual, autismo, acidentes vasculares cerebrais, entre outros.
Podem ser de baixa ou alta tecnologia, como veremos a seguir.
a) Baixa Tecnologia: pranchas de comunicação (Figura 1), mesa com símbolos,
prancha de moldura, avental (Figura 2), cartões (Figura 3), cadernos de
comunicação, porta documentos, álbum de fotografias.
Figura 1 - Pranchas de comunicação
Fonte:www.souautistaesoucapaz.blogspot.com
Figura 2 - Avental de comunicação
Fonte: www.portalsaofrancisco.com.br
Figura 3 - Cartões de comunicação
Fonte: http://www.assistiva.com.br
b) Alta Tecnologia: computadores (Figura 4), teclados especiais (Figuras 4 e 7),
mouses adaptados (Figuras 5, 6 e 7), acionadores (Figura 8), softwares especiais
(Figura 9) como o BoardMaker (ver item 4.1.1).
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Figura 5 - Mouse de Esfera
Fonte: http://www.clik.com.br
Figura 7 - Mouse e teclado especial
Fonte: http://www.clik.com.br
Figura 9 – Software Boardmaker Fonte:http://portoalegre.olx.com.br
Figura 4 - Computador com teclado adaptado Fonte:http://redeparede.com.br
Figura 6 - Mouse por toque Fonte: http://www.clik.com.br
Figura 8 – Acionadores Fonte: http://www.clik.com.br
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4.1.1 Boardmaker Speaking Dynamically Pro
Figura 10 - Interface inicial do software
Fonte: Software Boardmaker
É o principal software usado por clínicas, terapeutas e educadores na criação e
impressão de materiais educacionais de comunicação. O Boardmaker é um programa de
desenho combinado com uma base de dados gráficos que apresenta mais de 4500
Símbolos de Comunicação Pictórica (Picture Communication Symbols – PCS). É
indicado para usuários com necessidades de comunicação alternativa, contando com
funções de predição de palavras, abreviatura e expansão e à elevada qualidade de vozes
sintetizadas que transforma o computador numa poderosa ferramenta de aprendizagem.
O objetivo desse recurso é ampliar o repertório comunicativo que envolve habilidades
de expressão e comunicação. Tais recursos são construídos de forma personalizada,
levando em conta as necessidades do usuário.
Para o uso de recursos de comunicação alternativa são confeccionados cartões e
pranchas de comunicação através do sistema de símbolos gráficos, que se trata de uma
coleção de imagens gráficas que apresentam características comuns entre si. São
desenhos simples, claros, de fácil reconhecimento e adequados para usuários de
qualquer idade.
Boardmaker significa – produtor de prancha – ele possui uma biblioteca de símbolos
PCS(Símbolos de Comunicação Pictórica) com várias ferramentas que permitem a
utilização de recursos personalizados. Através deste software são confeccionadas
pranchas e materiais educacionais que são impressos e disponibilizado aos alunos.
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Figura 11 - Interface do software Boardmaker
Fonte: Software Boardmaker
Apresenta-se alguns exemplos de atividades educacionais acessíveis com o uso
do Boardmaker. Na figura 12, uma atividade construída para que o usuário da
Comunicação Alternativa responda questões apontando os símbolos gráficos PCS.
Apontar os animais.
Figura 12 – Pranchas de atividades
Fonte: http://depalavraempalavrainclusao.blogspot.com
Na figura 13, uma atividade de matemática com o tema "igual" e "diferente" foi
construída com o Boardmaker. Utilizando a "escrita com símbolos" está a pergunta:
Qual é o igual? Visualiza-se então o símbolo de uma boneca. Abaixo estão três opções
de símbolos: "carro", "boneca" e "sorvete". O aluno deverá apontar a resposta correta.
Logo abaixo está a outra pergunta sobre "qual é o diferente?" e visualiza-se o símbolo
da "borboleta". Abaixo duas opções de resposta: "vaca" e "borboleta".
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Figura 13 – Prancha de atividade matemática Fonte: http://depalavraempalavrainclusao.blogspot.com
Na figura 14, temos um exemplo de texto com símbolos. O primeiro verso da
poesia "Leilão de Jardim", de Cecília Meireles, foi digitada com o recurso "Simbolar"
do Boardmaker. Desta forma, cada palavra aparece com a representação simbólica do
PCS, acima do texto escrito. O verso diz: Quem me compra um jardim com flores?
Borboletas de várias cores, lavadeiras e passarinhos, ovos verdes e azuis nos ninhos?
Figura 14 – Texto com símbolos
Fonte: http://depalavraempalavrainclusao.blogspot.com
O software Boardmaker pode ser associado a outro programa chamado Speaking
Dynamically Pro, que significa ―falar dinamicamente‖, estes dois softwares juntos se
tornam uma importante ferramenta para construção de pranchas de comunicação com
emissão de voz pré-gravada representando a mensagem escolhida e, para se comunicar
com voz o usuário usará um computador ou um vocalizador portátil (Figura 15), que é
um recurso eletrônico de gravação e reprodução de voz que ajuda na comunicação das
pessoas sem fala ou escrita funcional.
No vocalizador, o conteúdo gravado é reconhecido através de figuras que ficam
sobre as teclas, quando a tecla é acionada, sua mensagem pré- gravada é reproduzida. É
retangular com vinte e cinco áreas de mensagens visíveis, onde estão símbolos gráficos.
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Cada área de mensagem ao ser pressionada emitirá uma mensagem de voz gravada
anteriormente. Apresenta alça de transporte e botões de volume e troca de níveis.
Figura 15 – Vocalizador
Fonte: http://depalavraempalavrainclusao.blogspot.com
Atualmente, mais do que ensinar é necessário olhar para o que o aluno produz e
identificar o que ele já sabe e o que lhe impede que avance na aprendizagem, traçando
estratégias e ações necessárias para superar tais dificuldades.
Segundo Hamze (doc. eletrônico), quando a educação é construída pelo sujeito
da aprendizagem no cenário escolar, prevalecem a resignificação dos sujeitos, novas
coreografias, novas formas de comunicação e a construção de novas habilidades,
caracterizando competências e atitudes significativas. Nos bastidores da aprendizagem,
há a participação, mediação e interatividade, porque há um novo ambiente de
aprendizagem, remodelização dos papéis dos atores e coautores do processo,
desarticulação de incertezas e novas formas de interação mediadas pela orientação,
condução e facilitação dos caminhos a seguir.
Por isso, o exercício diário do professor é criar situações para que o aluno exerça
sua função de aprendente participando de situações que favoreçam sua aprendizagem.
Sartoretto e Bersch (2011), dizem que com relação aos alunos com deficiência, torna-se
indispensável à criação de condições de aprendizagem através da construção de recursos
de aprendizagem e acessibilidade, pois, os recursos educacionais têm função decisiva
nas possibilidades de aprendizagem dos alunos.
Considerando as diferentes concepções de ensino e aprendizagem, salientam
ainda que seja importante o desenvolvimento de recursos de acessibilidade que atendam
a elas de forma que o aluno seja instigado, para que possa ser sujeito ativo na
construção do conhecimento.
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E finalizam ( Sartoretto e Bersch ,2011), que o objetivo é: conhecer a realidade
do aluno e os desafios enfrentados, e ser criativo, pois junto com ele, pode-se construir e
utilizar recursos que permitirão sua expressão e participação ativa em desafios
educacionais.
Na hora de selecionar uma tecnologia, é importante ter claro algumas questões
importantes a serem pensadas:
que todos os recursos devam ser utilizados como forma de inclusão e não
para gerar preconceito e diferenciação.
é importante que se conheça exatamente o que se pretende com o uso da
tecnologia, principalmente, as necessidades do sujeito que utilizará este
recurso.
é que a escolha da tecnologia assistiva deve oferecer uma melhora na
qualidade de vida do sujeito, visando sua autonomia, e não somente
aspectos cognitivos ou de aprendizagem.
É importante destacar que toda tecnologia é provisória e, em caso do sujeito ter
capacidade para desenvolver uma ação de forma autônoma, sem apoio de tecnologias,
deve ser encorajado a fazê-lo, e ter sempre em mente que o principal critério para a
seleção de uma tecnologia é sua avaliação constante, visando sempre à autonomia e o
desenvolvimento do sujeito.
5. CONTEXTO E RESULTADOS DA INVESTIGAÇÃO
Neste estudo, investigou-se um aluno da rede municipal de ensino fundamental
do município de Pantano Grande- RS. Ele tem 12 anos e 1 mês de idade, com aspecto
sindrômico, sem etiologia definida, com deficiência intelectual e epilepsia associada5.
Apresenta desempenho no desenvolvimento na faixa dos 3 anos de idade, com grave
atraso na linguagem expressiva.
Ele é atendido na escola na modalidade de atendimento psicopedagógico
especializado uma vez por semana, com atividades lúdicas e de promoção de mais
5 Grupo de sintomas associados a uma mesma patologia e que em seu conjunto definem um quadro
clínico de uma condição médica. Neste caso são sintomas de causas desconhecidas, que não caracterizam
uma só doença, mas um grupo de doenças.
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autonomia e condições de realização das atividades da vida diária. Esse aluno faz
acompanhamento fisioterápico (duas vezes por semana), fonoaudiológico (quinzenal),
neurológico (trimestral) e frequenta um projeto de inclusão social(uma vez por semana),
onde participa de oficinas de música, informática e recreação. Faz uso de medicamentos
antiepiléticos6, ansiolíticos
7 e antipsicóticos
8. Ele está em atendimento psicopedagógico
há três anos e apresenta um grande avanço no seu desenvolvimento, no que tange a
atenção, tempo de concentração, o brincar, o faz de conta, regras, limites e rotina.
Apresenta uma boa habilidade para estímulos visuais e auditivos.
Por isso, no início do segundo semestre de 2011, foi dado o início a um trabalho
com pranchas de comunicação de baixa tecnologia, que foram criadas através do
software Boardmaker. Em um primeiro momento, com o tema ―O que eu gosto de
comer e o que eu não gosto de comer‖. Foi utilizado um plano inclinado como suporte
para a prancha. Os cartões foram plastificados sendo colado velcro na parte de trás para
que prendesse na prancha, que também recebeu velcro (Figura 16).
Figura 16 - Plano inclinado
Fonte: Arquivo pessoal
Primeiramente, foram apresentados ao aluno os cartões de comunicação de
alimentos em geral (Figura 17 e 18). Após, foi sendo questionado quais aos seus
alimentos prediletos e dentre tantos cartões foi selecionando conforme seu gosto.
6 Antiepilético é um medicamento para epilepsia.
7 Ansiolítico é um medicamento para diminuir a ansiedade e a tensão.
8 Antipsicóticos é um medicamento usado no tratamento sintomático das psicoses.
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Figura 17 - Prancha do que o aluno mais gosta de comer
Fonte: Arquivo pessoal
Figura 18 - Prancha do que o aluno não gosta de comer
Fonte: Arquivo pessoal
Em outro momento, foram trabalhados cartões de comunicação com o tema ―As
pessoas da família‖ (Figura 19).
Figura 19 - Cartões de comunicação ―As pessoas da família‖
Fonte: Arquivo pessoal
São processos muito lentos de construção do conhecimento e de aprendizagem,
mas que tem como objetivo principal estabelecer a comunicação com o aluno de
entendê-lo e compreendê-lo melhor, visando sua autonomia para que possa acessar o
17
conhecimento diante de suas limitações. O aluno reconhece esta ferramenta de trabalho
e já aprendeu a usá-la, monta e desmonta suas pranchas sem ajuda, associa gestos a
alguns cartões durante as atividades.
Por não saber usar ainda o computador de forma adequada (alta tecnologia), faz-
se uso das pranchas no plano inclinado (baixa tecnologia), portanto todas as pranchas
são criadas antecipadamente dentro das suas áreas de interesse.
O aluno gosta muito de ouvir histórias, em especial a história dos Três
Porquinhos. Leu-se, ouviu-se e dramatizou-se essa história. E está em construção a
história dos Três Porquinhos através da ferramenta Simbolar9 (Figura 20). Ferramenta
esta que à medida que o texto é digitado em uma tecla Simbolar, os símbolos
correspondentes aparecem acima de cada palavra.
Figura 20 - Interface do software com a tecla Simbolar em destaque
Fonte: Software Boardmaker
Essa ferramenta permite ainda que se possa, ao usar a prancha, optar-se pela
varredura dos símbolos ou das palavras, assim como a predição do texto. Alguns
símbolos podem ser criados ou inseridos através da Internet ou de fotos e podem ser
acrescentados posteriormente.
Foram apresentados neste trabalho a experiência da comunicação, da expressão
de uma pessoa que não fala, que não verbaliza seus desejos os seus gostos, mas os
comunica. O enorme potencial de desenvolvimento e aprendizagem do aluno é incrível.
É necessário disponibilizar a essas pessoas novos recursos de acessibilidade, novos
ambientes, uma nova sociedade que as inclua em seus projetos e em suas possibilidades.
9 Ferramenta que permite criar sentenças, histórias e frases, além de outros materiais educacionais de
maneira fácil e rápida.
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Não apenas propiciar o crescimento e a auto-realização da pessoa com
deficiência, mas, principalmente, possibilitar a essa comunidade crescer, expandir-se,
humanizar-se, através das riquezas de um maior e mais harmonioso convívio com as
diferenças.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A possibilidade de diferentes tecnologias assistivas mediarem situações e ações
pedagógicas traz uma grande diversidade de experiências considerando as variáveis que
atuam no processo ensino-aprendizagem de alunos com deficiência intelectual. De
modo geral, estratégias pedagógicas devem ser bem estruturadas com vistas a um
processo de aprendizagem que desenvolva a autonomia e contribua no desenvolvimento
positivo da autoimagem desses alunos. Portanto, trabalhar, na perspectiva tecnológica,
inserindo a possibilidade de diferentes ambientes educacionais, pode permitir novas
formas de construir o conhecimento, favorecendo a aprendizagem do aluno, tanto em
nível individual quanto coletivo, através da colaboração entre os sujeitos.
O mediador do processo, o professor, deve resgatar, através da utilização, tanto
de softwares educacionais, como de objetos de aprendizagem, intervenções pedagógicas
que contribuam para a efetivação do processo de ensino-aprendizagem, visando à
construção integrada do conhecimento. Assim, acredita-se que os envolvidos no
processo educacional, frente aos recursos que a tecnologia assistiva oferece, poderão
reconhecer novas formas de adequar a busca de informações com a construção de
conhecimentos, redefinindo o desenvolvimento de habilidades e valores que
contribuirão na formação desses alunos como sujeitos histórico-sociais e culturais.
Então, observou-se que a utilização do software Boardmaker é um pouco
complexa para o aluno com deficiência intelectual e não possibilita que ele, sozinho o
acesse com facilidade, tendo que estar sempre acompanhado do professor para a sua
utilização e a criação de pranchas. Uma questão importante a ser apontada se refere ao
alto custo do programa. Ele é distribuído para as Salas de Recursos pelo Ministério da
Educação e Cultura (MEC), mas não em sua totalidade. Outro ponto está na sua
utilização, que só é permitida com o uso de chave de acesso do CD, tornando o acesso
restrito apenas as salas que possui o programa. Entretanto, trata-se de um software
bastante eficiente como recurso para o desenvolvimento psíquico do aluno, pois valoriza
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a diversidade como agente de transformação de uma sociedade mais consciente e dá voz
às pessoas com necessidades educacionais especiais de modo a viabilizar a participação
social e o exercício da cidadania.
REFERÊNCIAS
AMERICAN ASSOCIATION ON MENTAL RETARDATION. Retraso mental.
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