teatro do oprimido e juventudes: revelando um … · 2019-02-10 · teatro do oprimido e...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES
CURSO DE LICENCIATURA EM TEATRO
YOGI MEDEIROS DE BRITO LUCENA
TEATRO DO OPRIMIDO E JUVENTUDES: REVELANDO UM ITINERÁRIO
FORMATIVO
NATAL-RN
2018
YOGI MEDEIROS DE BRITO LUCENA
TEATRO DO OPRIMIDO E JUVENTUDES: REVELANDO UM ITINERÁRIO
FORMATIVO
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao
curso de Licenciatura em Teatro da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, como requisito
para obtenção do título de licenciado.
Orientador: Prof. Dr. Jefferson Alves Fernandes
NATAL-RN
2018
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte.
UFRN - Biblioteca Setorial do Departamento de Artes - DEART
Lucena, Yogi Medeiros de Brito.
Teatro do oprimido e juventudes : revelando um itinerário
formativo / Yogi Medeiros de Brito Lucena. - 2018.
73 f.: il.
Monografia (licenciatura) - Universidade Federal do Rio Grande
do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Licenciatura
em Teatro, Natal, 2018.
Orientador: Prof. Dr. Jefferson Alves Fernandes.
1. Teatro do oprimido. 2. Juventudes. 3. Professor-artista. 4.
Metodologias. I. Fernandes, Jefferson Alves. II. Título.
RN/UF/BS-DEART CDU 792
Elaborado por Yogi Medeiros de Brito Lucena - CRB-X
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES
CURSO DE LICENCIATURA EM TEATRO
ATA DE DEFESA
Às dezessete horas e trinta minutos do dia seis do mês de dezembro do ano de dois mil e
dezoito, na sala 24 do prédio do Departamento de Artes, o discente YOGI MEDEIROS DE
BRITO LUCENA apresentou seu Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, intitulado:
‘’TEATRO DO OPRIMIDO E JUVENTUDES: REVELANDO UM ITINERÁRIO
FORMATIVO’’, requisito obrigatório para a obtenção do título de Licenciado em Teatro da
UFRN. O trabalho foi avaliado pela Banca Examinadora composta pelo Prof. Dr. Jefferson
Fernandes Alves (orientador), pela Profa. Ma. Mayra Montenegro de Souza (examinadora) e
pela Profa. Ma. Tatiane Cunha de Souza (examinadora externa), sendo considerado
APROVADO com Média Final: 10,0.
Prof. Dr. Jefferson Fernandes Alves ____________________________________Média: 10,0
Profa. Ma. Mayra Montenegro de Souza ________________________________ Média: 10,0
Profa. Ma. Tatiane Cunha de Souza ____________________________________ Média: 10,0
Media Final: 10,00
Natal, 06 de dezembro de 2018
A Francisco das Chagas (in memorian), meu avô, que
com todo seu amor partiu e foi continuar suas narrativas
poéticas na eternidade.
A Suzana Brito, minha mãe, que foi a primeira pessoa a
me apoiar a fazer arte.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a aquela que me deu a vida e é responsável pela minha chegada até
aqui, minha mãe, Suzana Brito, a primeira pessoa a quem me apoiou a fazer arte e a quem eu
dedico este trabalho.
A minha irmã, Paola Brito, que sempre esteve ao meu lado, com seus conselheiros e
seu companheirismo.
A minha família, aos que demonstraram apoio, na medida do possível, em fazer a Arte
que me propus a fazer.
Aos meus amigos da universidade que sempre se fizeram presentes durante toda a
trajetória, apoiando e incentivando a todo o momento, amigos especiais que foram Samuel
Leon, Taize Tertulino, Irielly Letícia e Thâmara Cunha.
A Daniel Amorim, pela amizade e companheirismo de sempre.
A todos os meus professores da universidade que me aproximou de caminhos e
possibilitaram descobertas ao longo da graduação.
Ao meu orientador, Jefferson Fernandes, por toda a paciência que teve durante o
processo, pessoa na qual eu admiro muito.
A minha banca examinadora, Mayra Montenegro, minha professora especial na qual
tenho uma enorme admiração, carinho e respeito pelo seu amor e dedicação em suas poéticas
de professora e artista. E a Tatiane Cunha, que tive a oportunidade de trabalhar junto e se
tornou a minha maior referência de docência em teatro.
Por fim, a todos os meus alunos que estão presentes no meu trabalho e puderam
compartilhar comigo toda essa trajetória.
“Quando a educação não é libertadora, o sonho do
oprimido é se tornar o opressor.”
Paulo Freire
RESUMO
Esta pesquisa se deu após três trabalhos pedagógicos realizados com as juventudes,
investigando as possibilidades das técnicas e modalidades do Teatro do Oprimido (TO) de
Augusto Boal: Teatro-imagem, Teatro-jornal, Teatro-fórum e Teatro-invisível como práticas
para o ensino da linguagem teatral. Atuei e refleti sobre o percurso do entendimento de um
professor(a)-artista de teatro, até a prática pedagógica de fato e os seus desdobramentos das
técnicas e exercícios dentro e fora do fazer cênico. Explicito essas três experiências como
relatos, dando ênfase no caminho metodológico construído e as descobertas com a prática dos
exercícios, jogos e metodologias propostas pelo TO. Os resultados apontados apresentam-se
no âmbito das reflexões teórico/práticas em consonância com experiências cênicas realizadas
com as juventudes. Pretendo assim, revelar esses itinerários formativos, buscando apontar as
contribuições deste para o ensino de teatro.
PALAVRAS-CHAVE: Teatro do Oprimido. Juventudes. Professor-artista. Metodologias.
ABSTRACT
This research was carried out after three pedagogical works carried out with the youths,
investigating the possibilities of the techniques and modalities of Augusto Boal's Theater of
the Oppressed (OT): Theater-image, Theater-journal, Theater-forum and Theater-invisible as
practices for the teaching of theatrical language . I acted and reflected on the course of the
understanding of a subject-teacher (a) -artist, to the actual pedagogical practice and its
unfolding of the techniques and exercises inside and outside the scenic making. I explain
these three experiences as reports, giving emphasis to the methodological way of building and
the discoveries with the practice of exercises, games and methodologies proposed by TO. The
results pointed out are within the scope of the theoretical / practical reflections in line with
scenic experiences with the youths. I intend, therefore, to reveal these formative itineraries,
seeking to point out the latter's contributions to theater teaching.
KEYWORDS: Theater of Oppressed. Youth. Teacher-artist. Methodologies.
LISTA DE IMAGENS
Imagem 01: Árvore do Teatro do Oprimido.............................................................................24
Imagem 02: Cena de Teatro-imagem com temática de gravidez na adolescência....................35
Imagem 03: Cena de Teatro-imagem com temática de automutilação.....................................36
Imagem 04: Cena de Teatro-imagem apresentada no evento “Pausa Para o Teatro”...............38
Imagem 05: Cena de Teatro-imagem apresentada na Cientec 2017.........................................40
Imagem 06: Apresentação da performance “O GRITO” no Ato Público Contra a Reforma da
Previdência em 2017.................................................................................................................42
Imagem 07: Apresentação da perfomance “O GRITO” na CIENTEC 2017............................43
Imagem 08: Cena de Teatro-imagem com temática de suicídio...............................................46
Imagem 09: Cena de Teatro-imagem com temática de bullying nas escolas...........................47
Imagem 10: Cena de Teatro-fórum com temática de bullying.................................................48
Imagem 11: Exercício de escolha dos relatos...........................................................................53
Imagem 12: Cena de Teatro-imagem a partir do relato de racismo..........................................54
Imagem 13: Cena de Teatro-imagem a partir do relato de violência contra a mulher..............55
LISTA DE TABELAS
Tabela 01: Etapas do processo desenvolvido no PIBID...........................................................34
Tabela 02: Etapas do processo desenvolvido no Trilhas Potiguares........................................45
Tabela 03: Etapas do processo desenvolvido no Estágio IV....................................................52
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................13
CAPÍTULO 1 – O QUE ENSINO ENQUANTO FAÇO TEATRO...................................15
1.1 Ensinando e fazendo teatro do oprimido............................................................21
1.2 Ensinando para as Juventudes.............................................................................26
CAPÍTULO 2 – PRÁTICAS PEDAGÓGICAS COM AS JUVENTUDES E SEUS
DESDOBRAMENTOS DENTRO E FORA DO FAZER CÊNICO..................................29
2.1 Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID)..................30
2.1.1 Caracterização do contexto e dos(as) participantes............................31
2.1.2 Percurso metodológico percorrido........................................................32
2.1.3 Resultados e reflexões.............................................................................41
2.2 Trilhas Potiguares no município de Serrinhas dos Pintos/RN..........................44
2.2.1 Caracterização do contexto e dos(as) participantes............................44
2.2.2 Percurso metodológico percorrido........................................................45
2.2.3 Resultados e reflexões.............................................................................49
2.3 Estágio Supervisionado de Formação de Professores – Ensino Médio............50
2.3.1 Caracterização do contexto e dos(as) participantes............................50
2.3.2 Percurso metodológico percorrido........................................................52
2.3.3 Resultados e reflexões.............................................................................57
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................59
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................62
APÊNDICE A: RELATO ‘’ERA SÓ BRINCADEIRA...’’.................................................64
APÊNDICE B: RELATO ‘’PIORES MOMENTOS ‘’ ......................................................65
APÊNDICE C: RELATO ‘’VIVENDO OS DOIS LADOS DA HISTÓRIA’’..................66
APÊNDICE D: RELATO ‘’PIOR MOMENTO DA MINHA VIDA’’..............................67
APÊNDICE E: TRABALHO DESTAQUE PARA PUBLICAÇÃO EM LIVRO:
TEATRO DO OPRIMIDO: DESCOBRINDO POSSÍVEIS PEDAGOGIAS E
POLÍTICAS TEATRAIS.......................................................................................................68
13
INTRODUÇÃO
Quando criança olhava o céu, sua beleza, sua magia, sua imensidão. Acreditava que ali
tinha toda a força necessária para guiar e realizar tudo que aspirava naquele corpo de criança
quando chegasse à vida adulta, era só pedir. Quando estava chegando nessa fase da vida
adulta a necessidade e as responsabilidades estavam me levando para outro caminho, mas
chegou um momento em que resolvi parar e olhar pro céu novamente como fazia quando
criança e buscar por um antigo desejo: o teatro.
Esse passo me fez chegar em 2012 ao grupo de Teatro UnP Encena1, com apenas 15
anos de idade, onde foi um lugar que puder ter a oportunidade de fazer algo que realmente
considerava importante, me experimentei, me encontrei e me descobri. Subsequente a isso
cheguei ao curso de Licenciatura em Teatro da UFRN em 2015.1.
A ideia desta pesquisa se deu depois de todas as experiências cênicas e pedagógicas
que tive com o Teatro do Oprimido (TO), criado pelo brasileiro Augusto Boal, e suas
modalidades, técnicas e discussões com as juventudes. Onde no segundo capítulo desta
pesquisa explicito melhor o seu contexto histórico, conceito e discussões acerca dessa
modalidade teatral.
Foram três experiências, a primeira aconteceu no período que fui bolsista no Programa
Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID no subprojeto Teatro, a segunda no
programa de extensão universitária Trilhas Potiguares e a terceira no Estágio Supervisionado -
Ensino Médio; componente curricular obrigatório do curso de Licenciatura em Teatro da
UFRN. São três espaços formativos da universidade, onde também no segundo capítulo desta
pesquisa conceituo melhor cada um. Explicito o caminho percorrido para o entendimento do
termo “professor-artista”, para se denominar e se descobrir como tal, até a chegada ao TO.
A compreensão que lido sobre as juventudes, que não é uma compreensão homogênea
de Juventude, mas sim de “Juventudes” que tem itinerários, lugares, expectativas e percursos
culturais distintos “É nesse sentido que enfatizamos a noção de juventudes, no plural, para
enfatizar a diversidade de modos de ser jovem existente” (DAYRELL; CARRANO, 2014, p.
104).
E dentro desses três contextos educacionais tinha algo em comum: preparar um projeto
de ensino de Teatro para essas juventudes. Na primeira experiência me veio à questão:
“levando em consideração esses sujeitos, qual proposta seria a melhor opção para uma
1 Projeto de extensão da Universidade Potiguar (UnP), que funcionou até o ano de 2015.
14
intervenção teatral?”. Segundo Inês Teixeira (2014), elaborar uma proposta pedagógica requer
uma metodologia que aproxime o jovem:
Penso que estamos diante de um desafio: tocar nossos jovens alunos,
trabalhando com eles propostas e atividades que os interesse, que colaborem
com a sua formação integral, que os implique e os envolva com a aula, com
a escola, com os processos de construção do conhecimento, cumprindo com
as nossas responsabilidades profissionais, que são humanas e sociais;
compromisso esse nem sempre fácil de ser renovado. (TEIXEIRA, 2014, p.
35).
Foi como cheguei ao Teatro do Oprimido e suas metodologias. Não através da
graduação de Teatro em si, pois durante toda a graduação não tive nenhum contato prático
com as metodologias e técnicas do TO nos componentes curriculares, tive no campo teórico, e
mesmo assim no período da primeira experiência nem no campo teórico ainda tinha chegado,
a prática e sua aplicação foi uma descoberta que tive na primeira experiência, que foi o
PIBID, e subsequente nas outras duas. O Estágio é um componente curricular do curso mas a
aplicação do TO foi devido a uma escolha pessoal.
É de suma importância o método de Boal, um brasileiro que fala sobre as nossas
opressões, as opressões da nossa terra, ser pesquisado e estudado na universidade, criando
acervos e referências dessa metodologia para a sua aplicação. Porém a sua metodologia não é
valorizada forma que deveria como aponta Pinto (2017):
O método de Boal, tão pouco reconhecido, e vergonhosamente deixado de
lado nas escolas de teatro, nas universidades públicas e particulares dos
Brasil (o que não acontece em muitos países) deveria, na verdade, ser
matéria obrigatória nos cursos superiores de Teatro, licenciatura
principalmente. (PINTO, 2017, p. 199)
Esta pesquisa é um passo que dou para mudar essa realidade, pois aponto a
necessidade que esse teatro faz na nossa prática educativa e artística. Portanto, a partir dessas
três experiências a pesquisa tem como objetivo descrever, revelar esses itinerários formativos,
compartilhando essas metodologias de trabalho, buscando apontar as suas contribuições para
o ensino de teatro em uma abordagem juvenil.
15
1. O QUE ENSINO ENQUANTO FAÇO TEATRO
Neste capítulo, proponho a discussão acerca do termo “professor(a)-artista”, enquanto
sujeito de múltiplas possibilidades de ampliação de suas práticas, seja a pedagógica ou
artística, que muitas vezes não são dissociadas, e o entendimento do termo em diálogo com
autores e experiência pessoal.
Cada vez mais surgem pesquisas científicas sobre o conceito e o que se entende por
ser um artista, provavelmente pelo fato de serem muitas as formas de se fazer arte e,
consequentemente, de ser artista. Para além de um conceito universal são avaliados, também,
dentro de parâmetros fixos e da modalidade artística que se refere. Dentre as formas de ser
fazer arte, venho discutir a partir da modalidade teatral e do profissional do teatro as
experiências e reflexões pautadas a partir da pedagogia desses professores(a)-artistas no
ensino de teatro.
Desde o ingresso no curso de Licenciatura em Teatro na Universidade Federal do Rio
Grande do Norte no ano de 2015.1, tenho notado por partes dos docentes da graduação a
utilização deste termo como uma proposta metodológica das disciplinas, até mesmo no que se
refere ao projeto político pedagógico do curso:
O curso de graduação em Teatro deve ensejar, como perfil desejado do
formando, capacitação para a apropriação do pensamento reflexivo e da
sensibilidade artística, compreendendo sólida formação técnica, artística,
ética e cultural, com aptidão para construir novas formas de expressão e de
linguagem corporal e de propostas estéticas, inclusive como elemento da
valorização humana e da auto-estima(sic), visando a integrar o indivíduo na
sociedade e tornando-o participativo de suas múltiplas manifestações
culturais. (UFRN, 2013, p. 11).
Mas, parecia existir uma dicotomia neste termo, devido a alguns docentes
universitários da licenciatura conduzirem uma disciplina prática de técnica corporal, por
exemplo, sem uma metodologia que pense no entendimento dos conteúdos e das técnicas para
propor aos discentes a sua aplicação em contextos educacionais, parecendo uma disciplina
apenas para dominar técnicas, tal qual como um curso de bacharelado, gerando a impressão
que engessar as possibilidades de aplicar a prática artística em uma proposta pedagógica, onde
uma forma parecia inviabilizar a outra.
Essa dicotomia foi desaparecendo no momento de cursar os estágios supervisionados
obrigatórios, onde, além de discutir e refletir sobre o ensino de teatro, entrava na prática,
16
possibilitando a reflexão de como seria a pedagogia do professor(a) enquanto artista no
contexto formal de ensino. Encontrei aqui a singularidade proposta pelo curso de buscar o
equilíbrio entre essas formas.
Antes de aprofundar neste termo e entender o seu uso, ocorreu de defini-lo apenas
como uma pessoa com duas profissões na mesma área. Segundo Costa (2009), um professor
artista seria “alguém que, mesmo se formando em um curso de licenciatura em teatro, também
fazia peças, entrava em cartaz, atuava como ator; ou seja, alguém que dava aulas de teatro e
fazia teatro.” (COSTA, 2009, p. 19).
Até entender que essa formação do professor(a)-artista trabalha com a ideia da
formação de um profissional que não se oriente pela dicotomia - o fazer artístico do
pedagógico, sendo capaz de transitar entre esses dois ambientes.
De acordo com Koudela e Almeida Júnior (2015), quando os processos da docência e
arte se encontram podem se configurar os próprios modos operantes do fazer teatral, pois
“quando arte e pedagogia atuam em conjunto, fazem nascer novas qualidades estéticas e
socioculturais que transformam o próprio conceito e a prática teatral” (KOUDELA;
ALMEIDA JÚNIOR, 2015, p. 12).
Portanto, não são processos distintos paralelos um ao outro, são processos que podem
reconfigurar e dar novas possibilidades as práticas, não somente a teatral, mas as duas, em um
processo de mão dupla.
Este processo de reciprocidade entre as práticas parece promover uma forma arejada
de pensar que ensinar teatro e fazer teatro podem ser vistos como processos intrínsecos, de
modo que “a prática pedagógica desses professores é alimentada pela prática artística e vice-
versa” (COSTA, 2009, p. 28), podendo encontrar lugares de confluência entre esses
processos.
Nunes (2004) traz um questionamento sobre a definição do professor de teatro: qual
profissional seria mais habilitado para ensinar teatro: um/uma professor(a), um artista ou um
professor(a)-artista? Toda pessoa que se propõe a fazer um curso de licenciatura em teatro
deveria responder essa questão, pelo menos para si mesmo.
A partir do momento que fazemos essa questão conseguimos pensar rapidamente
no/na professor(a) dissociado do/da artista e o/a artista dissociado do/da professor(a), e é
perceptível que o/a professor(a)-artista é um complemento de forças, um binômio, dois
elementos, ideias, conceitos, representando novas possibilidades harmoniosas, novos
caminhos complementares, configurando-se através dessa junção. Tornando esse
questionamento em uma pergunta retórica.
17
Nessa formação de professor(a)-artista se faz crucial que o/a professor(a) tenha total
consciência do que ensina, a vivência artística por parte desse docente possibilita um domínio
das metodologias que esse ensino exige e torna a sua didática mais flexível, mais rica técnica
e artisticamente.
Portanto, é importante que o/a professor(a) de teatro seja uma pessoa envolvida com a
prática teatral, pois ele pode ser um mediador que estimula nos alunos e principalmente COM
os alunos experiências de criação, de reflexão e de conhecimentos em teatro. Se esse
professor não tem esse tempo hábil para desenvolver essa prática fora da escola, que seja
somente dentro da escola com os alunos, onde o professor é artista com os alunos.
Refletindo por esse viés, o/a professor(a)-artista é quem melhor reúne essas condições,
uma vez que realiza trabalhos no próprio espaço cênico-teatral. O envolvimento na criação de
um espetáculo, os procedimentos na manipulação dos elementos técnicos da cena, os erros
cometidos e refazimentos da cena, além da própria imprevisibilidade da criação de uma cena,
são movimentos do trabalho dos profissionais do teatro que potencializam ideias e contribuem
fundamentalmente na condução de suas experiências no processo de ensino-aprendizagem.
Levando em consideração o diálogo que o/a professor(a) estabelece com os alunos,
que podem ser processos colaborativos de trabalho junto com os alunos, aprendendo a
produzir arte com eles, pensando que o ato de ensinar nunca acontece separado do ato de
aprender, como dizia Freire (1996) que é no processo e na relação entre o aprender e o ensinar
que se estabelece entre o professor e o educando, que se encontra a chave para romper com
este sistema de educação autoritário e unilateral, é preciso repensar a prática pedagógica a
partir dos sujeitos que a compõe e lembrar que os processos educativos são vias de mão dupla.
[...] embora diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma ao formar e
quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que
ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos, nem formar é ação pela
qual o sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e
acomodado [...] Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao
aprender. (FREIRE, 1996, p.23)
Os processos de ensino-aprendizagem do/da professor(a)-artista, está muito pautado
nesse processo do aprender ao ensinar, devido os processos de criação serem sempre esse
lugar da aprendizagem e quando despertamos a criatividade de outros sujeitos estamos
lidando com potencialidades de corpos que não conhecemos, e junto com os alunos
descobrimos novas possibilidades de criação.
18
Essa questão pode para parecer muito obvia, mas ainda há professores de teatro, nas
diversas instâncias educacionais acreditando que devem ensinar apenas os conteúdos teóricos
do teatro aos seus alunos em modelo totalmente unilateral, e na maioria dos casos, são
professores que não estão na ativa da prática artística ou até mesmo nunca tiveram e não se
experimentaram, nem mesmo com seus alunos.
Por outro lado, percebi que a rotina dos professores de teatro da minha cidade (Natal-
RN) é sobrecarregada, devido à logística de tempo e as obrigações, afazeres que a profissão
de professor(a) exige, onde professores(as) de teatro reclamam que não possui o devido tempo
para exercer as suas práticas artísticas como deveria.
Falando sobre o professor do ensino formal, o teatro chega às escolas através da
disciplina de artes como a Lei nº 13.278 já instituiu a obrigatoriedade desse componente. “As
artes visuais, a dança, a música e o teatro são as linguagens que constituirão o componente
curricular de que trata o § 2o deste artigo.” (BRASIL, 2016, n.p.)
Em escolas públicas, o/a professor(a) pode trabalhar até cerca de 40h semanais, onde
ocupa todo o seu tempo durante a semana se dividindo entre planejamento e aulas. Em escolas
particulares, na grande maioria, o professor necessita trabalhar em vários lugares diferentes
devido ao pagamento da hora/aula ser baixo e para conseguir ter uma boa renda no final do
mês precisa se sobrecarregar trabalhando em vários lugares diferentes.
E para, além disso, ser professor pode ocupar muito mais do que as horas destinadas
para o trabalho em sala de aula e planejamento, como aponta Inês Teixeira (2014):
Quem ainda não pensou em seus meninos alunos, em uma aula, ou quem
nunca pensou em problemas da escola quando dirigia um carro, lavava uma
vasilha, tomava banho, enquanto cuidava do corpo, quando conversava com
um colega ou amigo em algum lugar? Qual de nós não realizou as mais
diversas tarefas – dirigir, lavar louça, tomar banho, cuidar do corpo ou
conversar com um amigo – pensando em seus meninos, naqueles garotos,
nossos alunos, em uma aula específica ou até mesmo nos problemas da
escola? Fora da escola e da sala de aula, nos momentos mais imprevisíveis e
distantes do universo estudantil, eles sempre retornam ao nosso universo sem
nem mesmo pedir licença. (TEIXEIRA, 2014, p. 14).
A partir dessa realidade, me deparei com o seguinte questionamento: Como o/a
professor(a) de teatro vai exercer sua prática artística nessas condições? Será possível?
Conversando com alguns poucos professores(as) de teatro residentes na cidade, da rede
pública e particular, percebi um pouco de frustração por parte deles e delas por esses motivos,
é uma questão muito comum entre os/as professores(as) de teatro. Por a escola ocupar demais
19
e não conseguir ter o tempo suficiente e necessário para as suas práticas artísticas e por
interesses pessoais e financeiros preferiram dar a ênfase no trabalho da docência.
Até o momento que conheci Tatiane Cunha2 no período em que fui bolsista do PIBID,
em uma conversa com ela sobre esse assunto/questionamento, obtive a seguinte resposta: „‟É
possível sim, vamos ser artistas junto com os nossos alunos, vamos buscar assim a nossa
solução‟‟. No qual passei a concordar com ela.
A partir dessa resposta e da própria metodologia de ensino proposta por Tatiane,
percebi que o artista na função de professor, ou vice-versa, pode desenvolver processos e
métodos didático-pedagógicos como estratégia artística para o ensino de teatro, sendo a “aula”
um sistema educacional e também poético ou uma aula-espetáculo de teatro.
A partir dos conceitos e teorias apresentados pelos autores trabalhados, em conversas
que tive com outros professores, pude avaliar que cada um tem o seu entendimento e as suas
estratégias de continuar com os seus trabalhos artísticos.
Para uns, não faz sentindo ensinar teatro e não estar no foco da atenção da plateia com
o pouco de tempo livre fora da escola. Outros realizam como parte da sua própria
metodologia de ensino na escola.
Existe também aqueles para quem, além de tudo isso, o trabalho docente é um meio de
vida. Um trabalho que se precisa fazer esteja satisfeito ou não, goste-se ou não, para que se
possa receber um pagamento e prover o próprio sustento. Quando se tem a felicidade de
gostar do próprio trabalho, então o prazer e a obrigação se fundem num mesmo objetivo.
Os professores(as) quando estão na ativa com seus processos fora da escola, como a
prática, a participação em oficinas, vivências, residências artísticas, tudo isso pode se
transformar em novos materiais de conhecimentos teatrais para o/a professor(a) trazer para a
sala de aula e experimentar com os seus alunos, ampliando sua visão.
Todo o meu trabalho artístico que construí anteriormente e posteriormente a
universidade foi o de ator, e por ser ator sou artista, então posso me considerar como um
professor-ator ou professor-artista ou até mesmo professor-artista-ator, ambos possuem a
mesma intencionalidade.
Podemos perceber que os próprios processos da docência podem se assemelhar ao do
ator, pois segundo Ferracini (2003) “ser um ator significa, então, doar-se. E é nesse “se”,
nesse pequenino pronome oblíquo, que está à beleza de sua arte. O presente que o ator deve
dar à platéia, o objeto direto que complementa o verbo dar, é a própria pessoa do ator”
2Professora da rede pública de ensino do Rio Grande do Norte/ supervisora PIBID, mestra em Artes Cênicas,
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
20
(FERRACINI, 2003, p. 24). Assim como o ator deve doar-se a sua plateia, o professor se doa
para os seus alunos, e percebemos que as suas práticas e percursos podem se complementar
enquanto processos.
A docência é sempre um desafio, é como se a cada nova turma de alunos fosse uma
nova possibilidade; fazendo o/a professor(a) reinventar toda a sua experiência e repertório
para aquela nova realidade; tal qual como o trabalho do ator. A cada nova prática poética é
preciso analisar suas experiências, suas técnicas corporais-vocais e estar aberto para as novas
possibilidades de criação junto à proposta desse novo processo; reinventando sua experiência
e preencher ainda mais seu repertório.
Antes de qualquer intervenção/aula é preciso que o docente pesquise, planeje, elabore
planos de aula com uma sequência metodológica eficaz para os sujeitos-aprendizes, para o/a
professor(a) poder colocar o corpo-voz em movimento, ele/ela precisa passar por esses
processos de planejamento; atores também precisam de preparação antes de pisar no tablado,
há processos e processos para a atuação, mas talvez algo que seja comum para os atores, é
pensar a melhor forma possível de passar essas narrativas para o seu público, tal qual como o
professor.
Em um espaço de ensino formal, podemos pensar que o público são os alunos, o
professor é o ator e a aula um espetáculo, tal encontro soa como uma troca de conhecimentos
e experiências, cada aluno é individual, assim como o público, a sala de aula é um universo de
possibilidades, assim como o espetáculo, o professor é o proponente do discurso, assim como
o ator.
Portanto, a partir de todas essas reflexões, proponho a ideia do/da professor(a)-artista
enquanto profissional que está sempre buscando a sua prática artística ao passo que realiza
suas práticas pedagógicas, pensando nos seus processos de criação enquanto processos
formativos para o seu repertório de docente.
Foram através de três experiências pedagógicas que vieram à tona essas questões,
experiências na qual, tive que me experimentar artisticamente, para em seguida, experimentar
pedagogicamente. Essas experiências foram com o Teatro do Oprimido (TO) e suas
modalidades, sendo que alguns dos seus conceitos serão abordados no segundo capítulo deste
trabalho.
Não tive contato à primeira vez com o TO e suas modalidades na universidade, no
campo prático não tive nenhuma vivência. Foi um processo de experimentação e pesquisa em
um curto espaço de tempo, para logo em seguida rapidamente preparar um projeto de ensino.
21
Esta descoberta se deu na primeira experiência, a do PIBID, Ao analisar a
caracterização da escola e da turma, iniciamos as reuniões de planejamento para a elaboração
do projeto de ensino, os bolsistas com a supervisora. A supervisora Tatiane sugeriu para a
gente trabalhar com a metodologia do TO, alegando que se propõe questionar as relações
opressivas existentes na sociedade e construir possíveis mudanças de pensamentos, atitudes e
comportamentos.
A partir disto, surgiu à questão, por parte dos bolsistas, sobre o pouco conhecimento
acerca do TO, mas pelos argumentos que a supervisora nos deu, concordamos que seria a
melhor opção para aquela turma, assim, surgiu o projeto.
Então, nosso primeiro passo, enquanto equipe foi iniciar momentos de estudos sobre o
TO, Tatiane fez uma contextualização do conteúdo, assistimos o documentário “Boal”
(direção de Zelito Vianna) e outros vídeos, realizamos jogos com os bolsistas. Tatiane
elaborou uma apostila, de acordo com os estudos do Centro do Teatro do Oprimido (para o
estudo com os bolsistas e posteriormente como material didático para os alunos), separamos
por capítulos a leitura do livro: Jogos para Atores e Não-atores de Augusto Boal (2001) para
posteriormente realizarmos seminários sobre este livro.
Tive que passar pela experiência da prática do TO no meu corpo para posteriormente
meus alunos experimentarem nos corpos deles e à medida que eu fazia teatro do oprimido,
ensinava teatro do oprimido, descobrindo junto com os alunos nossas capacidades
investigativas e de expressão.
1.1 Ensinando e fazendo Teatro do Oprimido
Venho conceituar somente o que é necessário para o entendimento do trabalho, pois
são muitas as teorias e os legados deixados sobre essa arte. Historicamente, é um pouco difícil
precisar uma data, o Teatro do Oprimido (TO) foi criado pelo brasileiro Augusto Boal mais
determinantemente a partir da década de 70, no quadro de reação às ditaduras que varreram a
América Latina à época, aonde o golpe militar foi instaurado no Brasil em 1964 e durou até
1985. Muitas pesquisas dessa época tiveram que ser interrompidas por causa do golpe, Boal
continuou a sua, ainda que em outros países. Essa proposta, sistematizada em seus livros e
divulgada em vários países, tem como base a idéia de que o teatro é uma linguagem que,
como outras, podem ser aprendidas e utilizadas por qualquer pessoa ou grupo.
22
Augusto Pinto Rodrigues Boal, nascido no Rio de Janeiro em 1931 e adotado pelo
teatro paulista e mundial a partir da década de 50, é um dos nomes mais sonantes do teatro
brasileiro. Encenador, dramaturgo, ensaísta, escritor, político, teórico, revolucionário, são
atividades as quais se dedicou, sem que nenhuma delas ou mesmo o seu conjunto possam
definir com maior alcance a sua personalidade, o humanismo e a grandeza de espírito que o
caracterizou.
Criador e incentivador do TO, Boal se tornou com ele conhecido mundialmente e tal
reconhecimento lhe valeu, em 2008, a indicação para o prêmio Nobel da Paz e em 2009, foi
nomeado pela Unesco o embaixador mundial do teatro. Há indícios de pesquisas que as suas
metodologias e técnicas são estudadas e pesquisadas mais em outros países do que na sua
própria terra, na qual se dedicou tanto na luta a favor dos oprimidos, está pesquisa é um passo
que dou para mudar essa realidade. Boal faleceu no dia 2 de maio de 2009, aos 78 anos de
idade, no Centro de Tratamento Intensivo do Hospital Samaritano, em Botafogo, na Zona Sul
do Rio de Janeiro, por insuficiência respiratória, pois ele sofria de leucemia.
O que me interessa no seu teatro, são essas portas que ele abriu para que qualquer
pessoa possa ao menos experimentar o fazer teatral, ter uma experiência, democratizando os
meios de produção teatral, transformando-o em uma linguagem acessível para todos, onde
qualquer pessoa pode ter capacidade de dialogar com a cena, de atuar na cena e até mesmo ser
o propulsor dela, isso não quer dizer que o teatro é uma arte chula, como aponta Pinto (2017),
Cansei de defender Boal com as suas próprias falas e idéias, debatendo com
gente de teatro que ou o ignorava, ou desqualificava como atado. Cultura
Popular é cultura menor. É uma denominação da classe hegemônica que
propõe a diferença. A deles erudita, a do povo popular. Assim se passa com
o Teatro do Oprimido: é tido como teatro menor, não teatro, e por aí vai.
Afinal pode ser feito por qualquer um(a) [...]. (PINTO, 2017, p. 200)
Portanto, é uma arte que todos possam se experimentar, até aqueles que não foram
beneficiados em ter acesso a ela. O TO surgiu, em especial, para atender à necessidade de que
o Teatro fosse uma ferramenta para a transformação social ou um ensaio para ela, criticando o
Teatro dito burguês ou de entretenimento, é teatro de luta e político, como aponta Boal
(2013):
O Teatro do Oprimido jamais foi um teatro equidistante que se recuse a
tomar partido - é teatro de luta! É o teatro dos oprimidos, para os oprimidos,
sobre os oprimidos e pelos oprimidos, sejam eles operários, camponeses,
23
desempregados, mulheres, negros, jovens ou velhos, portadores de
deficiências físicas ou mentais, enfim, todos aqueles a quem se impõe o
silêncio e de quem se retira o direito à existência plena. (BOAL, 2013, p. 26)
O nome Teatro do Oprimido é uma referência direta à obra Pedagogia do Oprimido
(2011) de Paulo Freire, que tem como principal objetivo a elaboração e construção do
conhecimento ligado ao processo de conscientização crítica da realidade; propondo a
superação da relação “opressor x oprimido”, no qual Boal se aprofunda na discussão dessa
relação em seus escritos.
A relação entre opressor e oprimido pode ser muito relativa, onde ambos podem
apresentar comportamentos flexíveis em relação a suas ações e decisões, portanto não é um
estado puro, uma pessoa pode ser só opressora ou só oprimida, como também pode ser
opressora e oprimida na mesma situação, como indaga o próprio Boal (2013),
Oprimidos e opressores não podem ser candidamente confundidos com anjos
e demônios. Quase não existem em estado puro, nem uns nem outros. Desde
o início do meu trabalho com o Teatro do Oprimido, fui levado, em muitas
ocasiões, a trabalhar com opressores no meio dos oprimidos, e também com
alguns oprimidos que oprimiam. (BOAL, 2013, p. 21)
O TO é totalmente político, não em um sentido partidário, mas em um sentido humano
e social ligado aos processos sobre pensar e agir perante a sociedade, um ser-político
transformador. Portanto pensando por esse viés, o que torna o TO totalmente politizado é o
cunho do teatro como intervenção social, como aponta Almada (2017),
E é bom, aliás, que se distinga aqui o teatro político do teatro de intervenção
social, até porque toda ação humana é política, o que significa dizer que o
fazer teatral já é uma atitude política, mesmo que a representação do real dê
apenas no campo da pesquisa estética. Já o teatro de intervenção social é
aquele que, impregnado de política e de determinada ideologia, propõe com
seus participantes atitudes e reflexões para transformar a sociedade em que
vivemos, na expectativa de que sejam mudanças e transformações para
melhor, como é óbvio[...] (ALMADA, 2017, p. 14).
24
Inspirado no teatro épico3, que também é uma poética/estética teatral que privilegia
esses contextos sócio-políticos da sociedade, Bertolt Brecht4 foi um dos expoentes desse
teatro. Boal se inspirou em seu legado, mas deixando bem claro que ele ainda criticava
algumas questões do teatro de Brecht, como por exemplo, a postura passiva do público, onde
o seu Teatro ultrapassou essa questão.
O TO possui algumas modalidades/técnicas, que Boal apresenta na Árvore do Teatro
do Oprimido. Na árvore, todas as técnicas são germinadas em um solo fértil da Ética, da
Política, História, Filosofia e da Economia. São elas: Teatro-imagem, Teatro-fórum, Teatro-
jornal, Arco Íris do Desejo, Teatro-invisível, Ações Diretas e Teatro-legislativo. Como indaga
o próprio Boal (2013) a respeito do objetivo de criação dessa árvore: “O objetivo de toda a
árvore é dar frutos, sementes e flores: é o que desejamos para o Teatro do Oprimido, que
busca não apenas conhecer a realidade, mas transformá-la ao nosso feitio. Nós, os oprimidos”
(BOAL, 2013, p. 19).
Imagem 01: Árvore do Teatro do Oprimido.
3 O conceito de teatro épico diz respeito a um teatro político-didático que possui a técnica do
distanciamento entre espetáculo e espectador para que este seja capaz de refletir de forma ativa sobre as questões
abordados no espetáculo. 4 Eugen Bertholt Friedrich Brecht foi um destacado dramaturgo, poeta e encenador alemão do século XX,
propulsor desse teatro épico.
25
Fonte: ibidem, p. 16.
As modalidades mais praticadas em todas as minhas experiências foram o Teatro-
imagem, Teatro-fórum, Teatro-jornal e Teatro-invisível, portanto, irei me aprofundar nos
conceitos e discussões sobre elas.
O Teatro-imagem dispensa o uso das palavras, para que possa desenvolver outras
formas perceptivas da cena. Usa-se apenas o corpo, fisionomias, objetos, distâncias e
proximidades entre corpos, ou seja, é uma linguagem não verbal. O Teatro-Imagem foi uma
forma encontrada por Boal para trabalhar com comunidades indígenas da América Latina
respeitando a diversidade linguística e não fazendo dela um entrave para a comunicação. A
encenação baseia-se em linguagens não verbais. A partir da leitura da linguagem corporal,
busca-se a compreensão dos fatos representados na imagem. É mais uma forma de demonstrar
que o Teatro do Oprimido é acessível a todos, utilizando-se de outras formas que não a
linguagem verbal, já que essa varia de acordo com os povos.
O Teatro-fórum “talvez a forma de Teatro do Oprimido mais democrática” (BOAL,
2013, p. 17), os espectadores da cena passam a se chamar de spect-atores e são convidados a
entrar em cena, o espectador vê, assiste, o espect-ator vê e age, ou melhor, vê para agir – “na
cena e na vida”, diz Boal (2013), através da mediação do curinga, ator encarregado de mediar
à participação do público, para substituir o lugar do oprimido a fim de solucionar a situação-
problema da cena através do diálogo, tal qual como Paulo Freire pensou a educação.
O Teatro-jornal propõe desmistificar a pretensa imparcialidade dos meios de
comunicação. O que era muito comum nos jornais e imprensa na época da ditadura militar no
Brasil, era a parcialidade e falta de informações verídicas circulando a favor dos opressores.
Portanto, essa técnica foi uma resposta estética à censura imposta, no Brasil, pelos militares,
para escamotearem conteúdos, inventarem verdades e iludirem a população. Nesta técnica,
encena-se o que se perdeu nas entrelinhas das notícias censuradas, criando imagens que
revelam silêncios.
Criada em 1971, no Teatro de Arena de São Paulo, esta técnica foi muito utilizada
também para revelar informações distorcidas pelos jornais, todos sobre censura oficial. Ainda
hoje é usada para explicitar as manipulações utilizadas pelos meios de comunicação. Ou seja,
encena-se aquilo que se esconde nas entrelinhas do jornal.
O Teatro-invisível são ações ensaiadas por um grupo de atores, realizadas
teatralmente, mas de forma não revelada ao público ocasional de transeuntes, um teatro
invisível, em que o público acredita que está vivenciando uma situação real.
26
O que tem em comum entre todas essas modalidades são as escolhas temáticas que
cada cena irá tratar, são temas sociais que tratam de alguma situação de opressão, que tenha
uma relação entre um opressor e um oprimido (seja uma pessoa ou um próprio sistema), a
partir da cena é discutido qual relação é essa, o tema abordado e possíveis formas de
solucionar essa situação-problema.
Diante das minhas experiências pedagógicas com as juventudes tive que preparar um
projeto de ensino de Teatro. Na primeira experiência, me veio a seguinte questão: levando em
consideração esses sujeitos, qual proposta seria a melhor opção para uma intervenção teatral?
Para isso, antes é importante qual noção de Juventude irei lidar.
1.2 Ensinando para as juventudes
Os direitos dos jovens são pouco estabelecidos, perpetuando-se, assim, estereótipos e
desigualdades. Ao longo do trabalho, procuro traçar um perfil dessas juventudes,
estabelecendo suas conexões e desconexões com a educação, a cultura e o mundo do trabalho.
Os jovens devem ser considerados na pluralidade de suas manifestações e percebidos como
agentes econômicos, políticos, simbólicos e educacionais. E também como parceiros
estratégicos e protagonistas em processos e iniciativas que os envolvam.
Há enormes desafios na educação do jovem, para o jovem e com o jovem. Na área da
educação, destaca-se a importância da formação para o mundo do trabalho e a capacidade de
empreender, esta última sempre aliada ao projeto de vida dos jovens e pensada numa
dimensão coletiva, comunitária e participativa. Em apoio às trajetórias pessoais, aos projetos
de vida e à promoção social das juventudes, as políticas públicas têm importância
fundamental. As variadas redes e conectividades nas quais os jovens estão inseridos, as redes
sociais, os coletivos e a mobilização ao redor de causas são, muitas vezes, promotoras de seu
sucesso.
A primeira coisa que pensamos no momento de definir um jovem ou tempo da
juventude é a faixa etária que ele está no momento, mas a idade não define o jovem por si só.
Segundo Dayrell e Carrano (2014),
27
Uma primeira preocupação é não reduzirmos a nossa compreensão da
juventude a uma definição etária ou a uma idade cronológica. Como nos
lembra Carrano, a definição de ser jovem através da idade é uma maneira de
se definir o universo de sujeitos que habitariam o tempo da juventude.
(DAYRELL; CARRANO, 2014, p. 110)
Portanto, a idade é apenas uma identificação em que tempo aquele jovem está dentro
desse universo.
Não vou lidar aqui com uma compreensão homogênea de Juventude, mas sim de
“Juventudes” sujeitos que tem itinerários, lugares, expectativas e percursos culturais distintos
uns dos outros. “É nessa direção que não podemos trabalhar com a noção de que existe uma
juventude, pois são muitas as formas de ser e de se experimentar o tempo de juventude.
Assim, digamos: juventudes.” (ibidem, p. 104).
No momento atual, é evidente que é importante compreender as interseções entre as
juventudes e as questões sociais, trazendo para o primeiro plano o debate sobre os direitos
humanos, a cidadania e a participação social e política, isso tudo influência no modo que
aquele sujeito irá vivenciar esse tempo.
As distintas condições sociais (origem de classe e cor da pele, por exemplo),
a diversidade cultural (as identidades culturais e religiosas, os diferentes
valores familiares etc.), a diversidade de gênero (a heterossexualidade, a
homossexualidade, a transexualidade, por exemplo) e até mesmo as
diferenças territoriais se articulam para a constituição dos diferentes modos
de vivenciar a juventude. (ibidem, p. 112)
É muito comum enxergar o jovem como uma idade ou tempo-problemático, reduzindo
a complexidade dessa etapa da vida apenas para o problema, mas não devemos transformar o
tempo na juventude em um tempo-problema, muito pelo contrário, até porque muitos dos
problemas não foram produzidos por jovens, já existiam muito antes, mas como o jovem-
sujeito não tem a credibilidade de um adulto para se expressar por ainda está em processos de
descobertas, da mesma forma que um adulto está, mas não no mesmo tempo.
Pensamos muito nos jovens como uma projeção de futuro, pensamos no que ele vai se
tornar daqui a alguns anos e não em um sujeito do momento presente, isso já pode torná-lo
um oprimido(a), pelo fato de não sentir que tem voz para expressar as suas questões
subjetivas por não ter credibilidade no seu discurso. As linguagens artísticas expressivas é um
28
elemento importante para a construção e expressão dessas distintas identidades e devem ser
igualmente valorizadas.
As culturas juvenis. A partir da década de 1990 assistimos, no Brasil, a uma
nova forma de visibilidade dos jovens em que a dimensão simbólica e
expressiva tem sido cada vez mais utilizada por eles e elas como forma de
comunicação, expressas nos comportamentos e atitudes pelos quais se
posicionam diante de si mesmos e da sociedade. A música, a dança, o vídeo,
o corpo e seu visual, dentre outras linguagens culturais, têm sido os
mediadores que articulam jovens que se agregam para trocar ideias, ouvir
um som, dançar, dentre outras diferentes formas de lazer e de expressividade
pública. (DAYRELL; CARRANO, 2014, p. 115)
Por meio desta pesquisa, irei percorrer este grande exercício de pensar uma proposta
educativa para as juventudes sobre diferentes aspectos tendo, ao mesmo tempo, um fio
condutor que os une: o Teatro do Oprimido.
29
2. PRÁTICAS PEDAGÓGICAS COM AS JUVENTUDES E SEUS
DESDOBRAMENTOS DENTRO E FORA DO FAZER CÊNICO
Neste capitulo, venho descrever sobre as três experiências pedagógicas que tive com
as juventudes a partir das metodologias do TO. Refletindo sobre o percurso metodológico e
seus desdobramentos no fazer artístico e na vida, apontando a importância deste teatro para a
proposta educacional desses jovens.
O Teatro é um campo-epistêmico próprio de conhecimento escolar-acadêmico, antes
de tudo, é importante os jovens ter acesso a essa linguagem como um direito, como direito do
conhecimento, como direito do acervo histórico e como direito de expressão. Podendo
incorporar esse conhecimento por três dimensões: a leitura, a produção e a contextualização,
incorporando isso como acervo do exercício da formação humana integral que o próprio
Ensino Médio já se propõe.
A experiência do teatro na escola amplia a capacidade de dialogar, a
negociação, a tolerância, a convivência com a ambiguidade. No processo de
construção dessa linguagem, o jovem estabelece com os seus pares uma
relação de trabalho combinando sua imaginação criadora com a prática e a
consciência na observação de regras. O teatro como diálogo entre palco e
plateia pode se tornar um dos parâmetros de orientação educacional nas
aulas de teatro; para tanto, deverá integrar-se aos objetivos, conteúdos,
métodos e avaliação da área. (BRASIL, 1997, p. 66).
A linguagem Teatral é um espaço da própria experimentação e do exercício da
expressividade dos sujeitos de conhecer os pontos de vista sobre o mundo, da mesma forma
como funciona os processos de descobertas das Juventudes. O Teatro catalisa isso como um
exercício de se reinventar, de se constituir enquanto sujeitos.
Para além disso, o Teatro do Oprimido é um campo de conhecimento que possue
metodologias mais dinâmicas e que coloca o corpo em movimento, rompendo com a
compreensão, dos próprios jovens que o corpo parado é intrínseco ao ato de aprender. O
pedagogo brasileiro Paulo Freire (1996) chama de “educação bancária”, uma educação em
que o aluno se senta na cadeira ou carteira de forma passiva e o professor lhe transfere o
conhecimento. Na tentativa de romper com este modelo Freire nos propõe uma alternativa:
É isto que nos leva, de um lado, à crítica e à recusa ao ensino “bancário”, de
outro, a compreender, que apesar dele, o educando a ele submetido não está
fadado a fenecer; em que pese o ensino “bancário”, que deforma a
30
capacidade criativa do educando e do educador, o educando a ele sujeitado
pode, não por causa do conteúdo cujo “conhecimento” lhe foi transferido,
mas por causa do processo mesmo de aprender, dar, como se diz na
linguagem popular, a volta por cima e superar o autoritarismo e o erro
epistemológico do “bancarismo”. (FREIRE, 1996, p. 25).
O TO tira o jovem desse corpo estacionado na cadeira, possibilitando uma construção
crítica de situações individuais ou coletivas, como um lugar de fala, onde desmistifica a ideia
do Teatro como ferramenta só de entretenimento, mas sim de transformação social.
As poéticas e pedagogia do Teatro do Oprimido ajudam a elaboração da construção de
pensamentos críticos dos jovens acerca dos acontecimentos político-culturais e a sua própria
condição enquanto sujeito que vive em sociedade, por sua importância e necessidade de
investigação dessas questões por meio da linguagem Teatral.
Os temas que emergem têm haver com as suas próprias inquietações e a necessidade
de se expor, de se colocar diante do olhar do outro, não se trata de uma vaidade, mas sim, com
práticas simbólicas e práticas espetaculares que operam com esse processo de ver e ser visto
pelo outro, pois é importante para o jovem esse espaço da expressão, de estar diante o olhar
do outro.
2.1 Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID)
O PIBID é um Programa do Ministério da Educação, gerenciado pela
CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior),
cujo objetivo maior é o incentivo à formação de professores para a Educação
Básica e a elevação da qualidade da escola pública. Sendo um programa de
iniciação à docência, os participantes são alunos dos cursos de Licenciatura
que, inseridos no cotidiano de escolas da rede pública, planejam e participam
de experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter
inovador e interdisciplinar, e que buscam a superação de problemas
identificados no processo de ensino-aprendizagem. As equipes, em diversas
áreas do conhecimento, são formadas por: estudantes de graduação
(licenciandos), professores das escolas públicas conveniadas (supervisores) e
Coordenadores de Área (professores da UFRN). (UFRN, 2018, n.p.)
Fui bolsista do subprojeto PIBID-TEATRO-UFRN no período de dois anos (2016-
2017). Essa experiência aconteceu no ano de 2017 na Escola Estadual Lauro de Castro,
localizada na Rua Souza, 54, Cidade da Esperança, Natal - RN.
31
Os coordenadores de área eram o professor Dr. Sávio Araújo5 e a professora Ms.
Laura Maria de Figueiredo6. A equipe desta escola era composta por oito bolsistas de Teatro,
que além de mim, eram Camila Alexsandra da Silva Morais Chaves7, Gláucia Cícera de
Souza Andrade8, Irielly Letícia Brito da Silva
9, Thallyson Rodrigo de Oliveira Dantas
10,
Thâmara Monique Cunha11
e Thásio Igor do Nascimento Dias12
, a supervisora professora Ms.
Tatiane Cunha de Souza, professora de Artes da escola.
2.1.1 Caracterização do contexto e dos(as) participantes
A experiência foi desenvolvida na turma do 8º ano vespertino, que tinha cerca de 35
alunos, dentro da disciplina de Artes. Era composta por jovens-adolescentes e jovens-adultos
com faixa etária de 14-18 anos, podendo ser considerada uma turma “desregular” devido à
alguns dos alunos estarem em uma idade onde se é considerável já estar em uma série mais
avançada.
O contexto que aqueles jovens estavam inseridos pode justificar essa realidade, como
relata a Prof. Tatiane Cunha sobre o contexto da escola:
[...] a escola é localizada na periferia da cidade de Natal, no bairro da Cidade
da Esperança. Esse é um dos dez bairros mais violentos da cidade. O que
reflete diretamente no alunado da escola, além de muitos alunos não
possuírem estrutura básica de alimentação, higiene etc. Sendo o ato de ir à
escola, um ato de resistência em si, resistindo à violência, à fome, a miséria,
ao crime; configurando-se como uma busca por um futuro digno e diferente
da realidade em que vivem. (Tatiane Tenório, professora de Artes da Escola
Estadual Lauro de Castro)
A turma era bastante diversificada em relação a comportamentos, tinham jovens mais
introvertidos, outros bastantes extrovertidos, alguns que eram extremamente tímidos, bem
5 Professor Dr. Jose Sávio Oliveira de Araújo, coordenador no PIBID em 2017, professor do curso de
Licenciatura em Teatro, UFRN. 6 Professora Ms. Laura Maria de Figueiredo, coordenadora do PIBID em 2017, professora do curso de
Licenciatura em Teatro, UFRN. 7 Graduanda em Licenciatura em Teatro, bolsista do PIBID em 2017, UFRN.
8 Graduanda em Licenciatura em Teatro, bolsista do PIBID em 2017, UFRN.
9 Graduanda em Licenciatura em Teatro, bolsista do PIBID em 2017, UFRN.
10 Graduando em Licenciatura em Teatro, bolsista do PIBID em 2017, UFRN.
11 Graduanda em Licenciatura em Teatro, bolsista do PIBID em 2017, UFRN
12 Graduando em Licenciatura em Teatro, bolsista do PIBID em 2017, UFRN.
32
característico da diversidade comportamental das juventudes. Porém, um comportamento
específico que aquele grupo possuía era a relação entre eles cheia de atitudes opressivas,
acontecendo constantemente, que consequentemente causou uma dificuldade no processo de
ensino-aprendizagem.
Percebemos que na turma tinham alguns jovens com comportamentos e necessidades
pontuais, como: alguns não demonstravam interesse em participar das aulas, isso é algo
característico específico do contexto escolar, pois como estão inseridos dentro de uma
disciplina da escola, alguns alunos enxergam isso como uma obrigatoriedade, que de fato é,
mas enxergam em um sentido negativo. Outros tinham receio de fazer „‟errado‟‟ as atividades
ou sentiam vergonha dos comportamentos opressores dos outros colegas; enquanto uma
pequena parcela se disponibilizava, mas era interrompida pelas brincadeiras e dispersão dos
outros.
Esse diagnóstico dos alunos foi realizado durante a caracterização da escola e durante
as primeiras aulas práticas. Sempre após as aulas, avaliávamos a aprendizagem daquele dia,
investigando os conhecimentos prévios dos alunos em teatro e o que eles estavam aprendendo
de novo. Vale destacar que apenas alguns alunos se expressavam de forma objetiva, os alunos
mais retraídos tinham dificuldade de definir a aula com apenas uma palavra. Após cada aula,
fazíamos reuniões para encontrar novas estratégias para o desenvolvimento do ensino-
aprendizagem.
2.1.2 Percurso metodológico percorrido
Para realizarmos o projeto, apresentamos o objeto de estudo para os alunos,
primeiramente fazendo uma contextualização do Teatro do Oprimido e de todo apanhado
histórico, de como ele surgiu e a posição político-social de Augusto Boal. Então, cada aluno
recebeu o material didático que foi construído por Tatiane em diálogo com os bolsistas.
Sentados em roda, estudamos a apostila, compreendendo o contexto histórico, as
metodologias e a árvore do Teatro do Oprimido.
Começamos um debate sobre as experiências opressoras vividas por cada um, aluno,
bolsistas e professora; configurando-se como um momento de explicação sobre o Teatro do
Oprimido. Realizamos em seguida, a apreciação do documentário “Boal” com pausas para
explicações e debates acerca das relações de opressão existentes no meio político-social do
33
país e do mundo levantado no filme. Assim, os alunos compreenderam a estética do Teatro do
Oprimido, conhecendo Boal, suas metodologias e ações em diversos espaços e países.
Depois desse período de contextualização do conteúdo, partimos para a parte prática
do trabalho. Boal propõe que “O plano geral da conversão do espectador em ator pode ser
sistematizado no seguinte esquema geral de quatro etapas” (BOAL, 2013, p. 128). Vale
ressaltar que não realizamos a sequência na ordem e nem de forma separada, inclusive uma
etapa pode acontecer em paralelo ou subsequente da outra, foi a adaptação necessária que
precisamos fazer, apenas tínhamos a consciência de que os alunos precisavam passar por
essas etapas, não necessariamente em uma ordem cronológica.
A primeira etapa, “Conhecimento do corpo”, compreende uma “Sequência de
exercícios em que se começa a conhecer o próprio corpo, suas limitações e suas
possibilidades, suas deformações sociais e suas possibilidades de recuperação” (ibidem, p.
128). Neste sentido, realizamos exercícios com objetivos de desenvolver a atenção e
concentração, sensibilização e soltura vocal, gestual, corporal.
A segunda etapa, “Tornar o corpo expressivo”, compreende uma “Sequência de jogos
em que cada pessoa começa a se expressar unicamente através do corpo, abandonando outras
formas de expressão mais usadas e cotidianas” (ibidem, p. 128) Neste sentido, realizamos
jogos improvisacionais13
, explorando as possibilidades de expressão corporal de todos os
alunos.
O “Teatro como linguagem” corresponde à terceira etapa. Segundo Boal (2013),
“Aqui se começa a praticar o teatro como linguagem viva e presente, e não como produto
acabado que mostra imagens do passado‟‟ (BOAL, 2013, p. 128)”. Desta forma,
continuávamos realizando os jogos de improvisação, só que desta vez, jogos estes que
finalizassem com uma proposta mais cênica e focalizamos as modalidades do TO, escolhendo
os instrumentos de pesquisa para o grupo, que foram o Teatro-imagem, Teatro-jornal, Teatro-
fórum e Teatro-invisível.
Esta etapa possui três graus, o seu funcionamento depende da modalidade escolhida, o
primeiro grau chama-se “Dramaturgia Simultânea”, onde os espectadores “escrevem”
simultaneamente aos atores que representam, é como se fosse o período da escolha temática
para a criação do exercício, no nosso caso, optamos por escolher outras formas para o
surgimento dos temas; o segundo grau chama-se “Teatro-imagem”, onde os espectadores
intervêm diretamente, “falando” através de imagens feitas com os corpos dos participantes; o
13
Jogos a partir de contextos improvisacionais.
34
terceiro grau chama-se “Teatro-debate”, onde os participantes intervêm na cena entre eles
mesmos como exercício para a quarta etapa.
O “Teatro como discurso” corresponde à quarta etapa. Segundo Boal (2013), “formas
simples em que o espectador-ator apresenta o espetáculo segundo suas necessidades de
discutir certos temas ou de ensaiar certas ações.” (BOAL, 2013, p. 128). Nesta etapa, a partir
das modalidades do TO, apresentávamos os exercícios com objetivo de refletir e discutir
acerca de suas relações opressivas.
Tabela 01: Etapas do processo desenvolvido no PIBID.
MESES
2017
Conhecimento
do projeto
Conhecimento do
corpo
Tornar o corpo
expressivo
Teatro como
linguagem
Teatro
como
discurso
Fevereiro X
Março X X
Abril X X X
Maio X X X X
Junho X X X
Julho X X X
Agosto X X
Setembro X X
Outubro X X
Novembro X X
Fonte: Natal, 2017.
No Teatro-Imagem realizamos alguns jogos improvisacionais de iniciação ao Teatro-
Imagem, depois partimos para um exercício cênico trabalhando com imagens estáticas
corporais. Separamos alguns grupos e, nesse primeiro momento, lançamos os temas, e
posteriormente, eles escolhiam cada tema. A indicação era cada grupo escolher um tema e
construir uma imagem corporal coletiva contendo uma relação de opressão a partir do tema,
em que se destacasse o(s) oprimido(s) e os opressores(s).
Enquanto os alunos estavam segurando as imagens estáticas iniciávamos uma
discussão com os outros alunos sobre ela, tinham quatro pontos que discutíamos em cada
imagem, que eram: Qual o tema da imagem? Quais são os signos presentes na imagem que
podem revelar esse tema? Quem é o opressor e oprimido e qual relação estabelecida entre os
35
dois? Quais possíveis soluções para a resolução dessa situação-problema?, Ao final da
discussão o grupo desmontava e falava sobre o processo de criação da imagem, também a
partir desses quatro pontos de discussão.
O segundo passo era complementar a foto com um movimento, seguido da ação que a
imagem estava pedindo, foi nessa sequência que realizamos as apresentações das imagens,
para ficar mais subtendido do que ela se tratava.
Os alunos experimentaram e se desempenharam bastante para elaborar as imagens,
trouxeram signos e significados mais diretos como um sorriso de alegria no rosto, lágrimas de
tristeza, apertos de mão, como também trouxeram signos mais simbólicos e sensíveis,
estimulando a sua criatividade, tal qual como se propõe o Teatro-imagem, que de acordo com
Nunes (2004):
[...] uma ferramenta essencial para envolvê-los e estimular suas criatividades
para o inicio do trabalho e adentrar no universo do TO, debateram sobre
diversas questões de opressão vivenciadas por eles, propondo diversas
possíveis soluções. Cumprindo seu objetivo „‟cujo objetivo principal é
revelar e submeter à análise as opressões que se instrumentam nas relações
dos corpos entre si e na sua colocação no espaço. (NUNES, 2004, p. 147)
Trago duas cenas específicas dos exercícios realizados em sala de aula para
exemplificar melhor a experiência:
Imagem 02: Cena de Teatro-imagem com temática de gravidez na adolescência.
Foto: Arquivo Pessoal.
36
O tema desta imagem era gravidez na adolescência, menina/aluna sendo oprimida
pelos colegas de classe. Começamos a discutir sobre o tema e em meio às discussões, os
alunos concluíram que é uma gestação de alto risco decorrente das preocupações que traz à
mãe e ao recém-nascido, a gravidez nesta faixa etária pode acarretar problemas biológicos e
principalmente sociais para a menina/mãe.
Foi nesse momento que a discussão esquentou, na foto, a menina está sendo xingada e
sofrendo discriminação simplesmente pelo fato de ser a mulher, enquanto o menino que a
engravidou, por ser homem, não estava sofrendo da mesma forma. Os alunos entraram nessa
discussão da violência e classe de poder de gênero, onde a menina é a mais socialmente
culpada por ter o útero que vai carregar o bebê e o menino é considerado o „„pegador‟‟ da
turma, como diziam eles.
Dentre várias possíveis soluções que discutimos para a resolução do problema, uma
delas, que foi proposta por um aluno/homem, foi o menino/pai assumir as responsabilidades
da mesma forma da menina, como na imagem mostra o colega propondo a resolução do
conflito abraçando a menina, simbolizando que, ambos, são iguais socialmente pelo ocorrido.
Um fato dessa imagem em específico, é que uma das meninas que está participando da
cena, posteriormente ficou grávida, em que percebemos que esses temas realmente estavam
acontecendo com esses jovens e foi um lugar para que juntos possamos discutir sobre e nos
conscientizar de possíveis atos opressores.
Imagem 03: Cena de Teatro-imagem com temática de automutilação.
Foto: Arquivo Pessoal.
37
Nesta imagem, o tema era automutilação, diversos dos nossos alunos estavam
apresentando problemas com autoestima e atitudes depressivas. Na imagem, uma menina está
sentada se cortando, devido estar em um estado de depressão profunda, enquanto os pais estão
virados de costas para ela fingindo que não estão vendo a situação.
Os alunos chegaram a uma conclusão de que os pais estavam sendo opressores nessa
situação, eles não estão realizando a ação direta de oprimir como, na primeira imagem os
opressores estavam fazendo, mas estão sendo imparciais a uma situação que não deveriam ser.
Existem situações que a imparcialidade pode matar ou fazer mal a uma pessoa, seria uma
opressão indireta, mas uma opressão, como eles estavam discutindo.
A solução que chegamos para essa situação era, primeiramente, que as pessoas que
estão à volta devem compreendê-la, encarando que essa pessoa está necessitando de ajuda
buscando compreendê-la de todas as formas possíveis. Uma aluna da turma, também posterior
a isso, veio com um pedido de ajuda aos bolsistas no qual estava sofrendo depressão no meio
de uma aula, onde ela alegava que as pessoas estavam compreendendo seus comportamentos
de forma errada. Além de fazer com o Teatro do Oprimido: colocar em pauta essa situação e
discutir poeticamente através de arte, tivemos uma reunião com Tatiane e decidimos solicitar
o apoio psicológico da escola para dar auxílio a aluna e solicitar o seu responsável, que no
seu caso era a mãe, para estar ciente do ocorrido e também dar apoio a ela.
Para desenvolver mais um espaço para a construção de conhecimentos de teatro em
comunidade e possibilitar a ampliação do diálogo entre escola e comunidade, relacionado à
apreciação teatral, fizemos uma pausa com o trabalho do Teatro-imagem e firmamos parceria
com o Grupo de Teatro Eureka no qual conseguimos a apresentação do espetáculo de teatro
de rua “Cambalhotas” em uma praça próxima a escola. Todos os alunos foram liberados para
irem apreciar o espetáculo, no qual estava participava como ator. Em seguida, realizamos um
debate com a turma sobre as relações de opressão presentes na dramaturgia, que se tratava das
opressões sofridas pelo artista popular na sociedade, a discussão foi necessária e calorosa.
Com o objetivo de compartilhar as cenas, realizamos a Pausa Para o Teatro, um evento
com o intuito de produzir e apreciar o teatro na escola, apresentando ao público o objeto de
estudo da turma. A pausa foi aberta para toda comunidade escolar, realizamos apresentações
de cenas de Teatro Imagem na sequência do foto-movimento-ação, desta vez as cenas foram
38
escolhas temáticas dos próprios grupos e apresentadas no pátio escola. Ao final de cada cena,
um bolsista conduzia o debate entre o público e os „„alunos-atuantes14
‟‟.
Imagem 04: Cena de Teatro-imagem apresentada no evento “Pausa Para o Teatro”.
Foto: Arquivo Pessoal.
Depois do Teatro-imagem, resolvemos adentrar na técnica do Teatro-jornal.
Selecionamos jornais e os alunos se dividiram em grupos escolhendo uma notícia que
retratasse alguma situação de opressão referente às suas vivências e suas realidades.
Realizamos a cena a partir de três possibilidades, como propõe o próprio Boal: Com o
jornal em mãos, primeiramente realizamos uma leitura simples, onde destacamos a notícia
que se pretende trabalhar, fazendo uma leitura da mesma de forma objetiva desvinculando-a
da ideologia do jornal em que ela se encontra. Depois realizamos uma leitura cruzada
buscando duas fontes da mesma notícia, fazendo a leitura de ambas e relacionando aquela
notícia com a realidade em que eles vivem, de forma que surjam novos olhares. A terceira foi
o improviso, onde exploraram possibilidades de criação de uma cena sobre a notícia.
Posterior a isso, selecionaram os personagens, possíveis falas, lugares, tudo isso
presentes nas notícias. Para compor a dramaturgia da cena de Teatro-jornal. Com o texto
construído pelos alunos, começamos os ensaios, para então compartilhar em sala de aula as
cenas. Foi um exercício de muita aprendizagem e envolvimento explorando a técnica no
teatro-jornal.
14
Termo utilizado pela professora Tatiane Cunha para determinar os alunos fazedores desse teatro, tal qual como
Boal propõe o termo „„spect-atores‟‟.
39
Depois do Teatro-jornal, exploramos as técnicas do Teatro-fórum onde os/as alunos(a)
participaram da aula compreendendo o seu conceito e a função dos spect-atores. Para isso,
realizamos uma aula de campo para o Teatro de Cultura Popular com o intuito dos alunos
apreciarem o espetáculo teatral “Debaixo da Pele”, também do Grupo de Teatro Eureka.
Em uma cena específica o espetáculo propõe a participação do público. Fazendo
questionamentos acerca da temática do espetáculo possibilitando o diálogo direto com ela,
discutindo o racismo presente na história do Brasil, partindo de uma linha cronológica desde o
Brasil Colônia até os dias atuais. Essa cena em que tem a participação do público assemelhou-
se aos fóruns propostos por Boal, pois os atores fazem alguns questionamentos às pessoas
presentes. De certo modo os alunos conseguiram compreender, apreciando, a técnica que
estávamos trabalhando em sala de aula.
Desta vez possibilitamos a escolha temática da criação das cenas a partir da música “O
Homem na Estrada - Racionais”, ideia da bolsista Camilla Moraes. Com o intuito de despertar
nos alunos mais interesse possibilitando trabalhar com músicas que eles gostam de ouvir.
Ampliando mais uma vez as possibilidades metodológicas para escolha acerca dos temas.
Cada aluno marcou toda a letra da música identificando as relações de opressão e também
fazendo paralelo com as suas vivências.
Em seguida, iniciamos o jogo-espetáculo de Teatro-fórum. Dividimos novos grupos e
cada grupo teve que construir uma cena, a partir da escolha de uma das relações de opressor e
oprimido presente na música, relacionando esses conflitos com a sua própria vivência,
proporcionando uma reflexão sobre uma possível solução para esse problema. Através desse
exercício os alunos conseguiram compreenderam as funções do curinga e do espec-ator.
Pensando em realizar a quarta etapa deste processo, que seria a de teatro como
discurso, participamos da XXIII Semana de Ciência, Tecnologia e Cultura – CIENTEC–
UFRN, em que levamos os alunos para apresentar o trabalho realizado a partir do Teatro-
imagem para os demais bolsistas do programa e público transeunte da CIENTE no stand do
PIBID-Teatro. Então, voltamos com as cenas de Teatro-imagem para apresentar na feira. Os
alunos apresentaram novamente as cenas como, por exemplo, a de automutilação, que
explicitei anteriormente nesse trabalho, onde uma aluna expressa através do Teatro do
Oprimido a sua dor transformando-a em uma imagem artística para ser discutida.
40
Imagem 05: Cena de Teatro-imagem apresentada na Cientec 2017.
Foto: Arquivo Pessoal.
Após essa apresentação, ficou nítido a necessidade desses jovens de falar e se
posicionar a respeito dessas situações opressivas vivenciadas por eles, onde percebemos que
estava sendo de suma importância esse trabalho, pois estava se tornando um lugar de fala,
considerando esses jovens como sujeitos-políticos.
Quando estávamos finalizando a experiência do Teatro-fórum, resolvemos exibir o
filme “Escritores da Liberdade” de 2007 dirigido por Richard LaGravenese. Devido alguns
alunos apresentar baixa autoestima com comportamentos depressivos em relação à escola e a
vida. Resolvemos inserir no planejamento a exibição do filme, pois ele trata sobre essas
questões, mais uma vez, questões que permeiam essa fase da vida.
No Teatro-invisível, antes de começar com o trabalho resolvemos fazer uma cena
entre os bolsistas e a supervisora para os alunos adentrarem neste universo e também
descontrair um pouco. A situação da cena que combinamos era a seguinte: Tatiane e três
bolsistas (eu, Thâmara e Irielly) chegávamos na hora exata que a aula iria começar, enquanto
isso Gláucia e Thalysson chegavam atrasados e justificavam que a aula na universidade tinha
acabado mais tarde e eles precisavam almoçar antes de ir a escola. A partir disso, Tatiane
começava a oprimi-los dizendo que a necessidade do trabalho é mais importante que qualquer
coisa, inclusive a fome, a discussão entre a gente ficou calorosa até que paramos e revelamos
para a turma que tinha sido uma cena. Depois desse momento conceituamos o Teatro-
invisível e começamos com os trabalhos.
41
A metodologia para as escolhas temáticas dessa técnica eram a partir de situações-
problemas presentes dentro da escola, como por exemplo, os comportamentos opressores dos
professores com os alunos, a direção com os alunos, problemas de relação com os colegas de
classe, chegando até na cozinha e portaria da escola. Também trabalhando com divisão de
grupos, cada grupo realizou a cena a partir de um roteiro de ações, pensando em expor essas
situações, eles improvisaram e convenceram a plateia a solucionar a situação apresentada. O
lugar onde a cena era apresentada seria onde poderia acontecer àquela situação se fosse real,
tencionando o próprio lugar no espaço.
Os alunos realizavam as cenas e ao final, explicávamos para o público que era uma
cena teatral. Boal não propõe revelar que é teatro, mas como estávamos dentro de um
ambiente escolar, tínhamos que adaptar os conceitos para a segurança dos nossos e nossas
alunos(a).
2.1.3 Resultados e reflexões
Durante todo o ano de trabalho no Lauro de Castro, realizávamos a avaliação de uma
forma contínua, percebendo a participação dos/das alunos(as) nas aulas e a realização das
atividades. Aconteceu em um determinado momento, por exemplo, que realizamos uma
atividade escrita para percebermos o aprendizagem dos alunos e como eles organizavam essa
experiência em uma escrita.
A participação dos alunos nos debates em sala de aula a partir das cenas, os registros
feitos no diário de bordo (parte do caderno destinado para os registros dessa experiência) e as
apresentações das cenas, também foram avaliações. Percebemos uma maturidade por partes
dos alunos ao longo do trabalho.
Temos as cenas de Teatro-imagem, Teatro-jornal, Teatro-fórum e Teatro-invisível
como resultados desse trabalho. Tatiane propõe uma avaliação contínua com os alunos feita
também com a gente. Onde ela explicita essa forma avaliativa muito eficaz, onde ela dizia:
„„Para mim, é impossível avaliar alguém e não se autoavaliar, por isso, estávamos sempre
dialogando sobre a nossa ação nas atividades e propondo também, a autoavaliação dos
alunos.‟‟ (Tatiane Cunha, professora de Artes da Escola Estadual Lauro de Castro).
Escrevemos um resumo com o título „„Teatro do Oprimido: Descobrindo possíveis
pedagogias e politicas teatrais‟‟ acerca desse trabalho e submetemos em três congressos
acadêmicos e obtivemos a aprovação para a participação no formato de comunicação oral no
42
ano de 2017 que foram eles: ABRACE – Associação Brasileira de Pesquisa em Artes Cênicas
– UFRN, V JITOU – Jornada Internacional de Teatro do Oprimido nas Universidades –
UNIRIO e o ERELIC – II Encontro do PIBID do Nordeste – UFCG.
Participamos do Encontro Integrativo dos PIBID na UFRN em que ministramos uma
oficina intitulada: “Estética do Oprimido: pedagogias e políticas teatrais‟‟ destinada para
outros bolsistas do PIBID.
Totalmente influenciados com TO no trabalho com os alunos, Tatiane idealizou a
performance “O GRITO” no Ato Público Contra a Reforma da Previdência no ano de 2017,
em Natal/RN, representando a Escola Estadual Lauro de Castro e também apresentamos na
CIENTEC 2017, na UFRN, desta vez com a participação dos alunos.
Imagem 06: Apresentação da performance “O GRITO” no Ato Público Contra a Reforma da Previdência em
2017.
Foto: Arquivo Pessoal.
Tatiane pensou a performance inspirada em uma cena do espetáculo "Fogo de
Monturo", dirigido por Luciana Lyra. Os bolsistas, Thâmara e eu, decidimos nos unir neste
ato contra a reforma da previdência que estava querendo entrar em votação nesse ano,
revelando um governo totalmente descompromissado com os professores-trabalhadores e
sobretudo com a Arte (em todas as suas linguagens).
Em 2018, escrevemos novamente nosso resumo no V Congresso da ABRACE e
apresentamos em formato de comunicação oral, tiveram ótimas avaliações. Submetemos
também no I Congresso de Iniciação Científica da Educação Básica do RN - 2018 (CIC-
43
EB/RN – 2018) e fomos aprovados, Tatiane escreveu um breve artigo15
acerca dessa
experiência e ele foi publicado no livro do CIC-EB/RN – 2018.
Imagem 07: Apresentação da perfomance “O GRITO” na CIENTEC 2017.
Foto: Wallacy Medeiros.
Em relação aos jovens ficou nítido e comprovado que o TO é uma metodologia de
interesse pelo fato de se aproximarem com as suas questões subjetivas e de opressão. Quando
o trabalho é pensado COM os sujeitos, ele se torna mais visceral, como aponta Pinto (2017):
Uma vez uma colega provocou: por que não trabalhar o que eles querem e
gostam? Porque não respeitá-los? Respondi que entendo que, como ouvi
alguém dizer, tudo é feito para que nada aconteça, e se aceitarmos
prontamente essas propostas reforçamos essa situação. (PINTO, 2017, p.
199).
A arte foi um meio desses jovens se experimentarem e buscarem os seus sentidos, seja
na escola ou na vida, de modo que “a subjetividade do oprimido aparece como uma forma
possível de luta e protesto contra a realidade opressora. Ela reivindica, por meio da arte
cênica, o direito de ampliar os instintos humanos pela sublimação artística” (ALMADA,
2017, p. 183).
Para finalizar essa experiência, explicito um relato de Tatiane presente no artigo que
produzimos, onde basicamente resume os resultados alcançados através de todo esse percurso:
15
Disponível nos apêndices.
44
Todas essas experiências reverberaram em nossas práticas na sala de aula,
nos momentos de tomada de decisão para a construção do percurso
pedagógico. Assim, confirmei com esse projeto, a necessidade propor um
percurso didático para o Ensino do Teatro de maneira flexível, preocupado
com a voz, com o interesse e o significado da arte para os alunos-atuantes.
Construímos esse processo junto aos alunos-atuantes, possibilitando a
criticidade e a consciência de sujeitos construtores de suas próprias histórias.
(Tatiane Cunha, professora de Artes da Escola Estadual Lauro de Castro).
2.2 Trilhas Potiguares no município de Serrinhas dos Pintos/RN
O Trilhas Potiguares consiste em um Programa de Extensão com efetiva interação
entre a Universidade e a comunidade de pequenos municípios do Rio Grande do Norte, com
até 15.000 habitantes. A ação em cada município participante constitui um Projeto de
Extensão e o conjunto de municípios (projetos) forma o Programa Trilhas Potiguares.
Participei do programa durante dois anos consecutivos em dois municípios diferentes,
a experiência em questão se deu no ano de 2018 no município de Serrinha dos Pintos, a
viagem foi no período de 22 a 29 de julho, sendo que ocorreram encontros meses antes para a
preparação das oficinas e do projeto. Ministrei quatro oficinas de Teatro para diferentes
públicos, três delas tinham como tema o Teatro do Oprimido.
2.2.1 Caracterização do contexto e dos(as) participantes
Durante as reuniões de preparação do projeto de Serrinha, no início, são passados para
a gente as demandas de cada área que o município está necessitando no momento, a
coordenadora passou a informação que o município estava enfrentando um problema grave
em relação aos jovens residentes da cidade, alguns estavam apresentando quadros de
depressão com tentativas de suicídio e tinha acabado de completar um ano que uma jovem
tinha se suicidado no município. Além disso, como a cidade é muito pequena eles estavam
sem expectativas de futuro e muito desmotivados com tudo. Esse relato foi passado para a
gente em relação a situação dos jovens-adolescentes de Serrinha.
45
Diante disso, a coordenadora me propôs que a oficina de Teatro destinada para eles
fosse algo voltado para trazer a reflexão dessas questões e situações que eles estão
vivenciando, ela mesma falou na possibilidade do T.O., mas como ela não tinha
conhecimento, não sabia se realmente seria algo com potencial para chamar a atenção desses
jovens. Concordei com a opinião dela sobre a proposta de criação da oficina e como já me
fazia dois anos que estava pesquisando sobre as poéticas do T.O., tive certeza no momento
que seria a melhor opção para aqueles jovens de acordo com o contexto que foi passado.
Desde então comecei a preparar o projeto da oficina, o objetivo geral era desenvolver
uma experiência prática em torno do Teatro do Oprimido, para tensionar reflexões nos jovens
a discutirem as suas relações de vida, suas potencialidades artísticas, políticas e culturais,
ampliando assim as suas possibilidades de expressão, onde a proposta inicial era dois dias de
oficina com quatro horas em cada dia e jovens-adolescentes a partir de 16 anos com 20
participantes; a coordenadora ficou bastante entusiasmada com a minha proposta.
Quando de fato chegamos ao município que comecei a ter contato com os jovens que
iriam participar das oficinas, percebi nos seus comportamentos, sujeitos bastante dispostos a
participar de tudo, muito animados, cheios de vida, comportamentos muito opostos do que foi
passado para a gente, de uma certa forma fiquei um pouco preocupado em relação a escolha
do T.O., pensando que poderia não ser mais uma boa proposta para eles.
2.2.2 Percurso metodológico percorrido
Nesta experiência, como era um modelo de oficina com o total de oito horas, tive que
sistematizar uma proposta mais objetiva e efetiva, elaborei a proposta baseada apenas na
metodologia do Teatro Imagem e do Teatro-fórum, um evoluindo para o outro como uma
sequência de criação, primeiro dia, trabalhar com as técnicas do teatro imagem e no segundo
dia recuperar as imagens e construir, a partir delas, o teatro-fórum.
O caminho metodológico seria passar pelas quatro etapas, focalizando na terceira,
onde iniciaríamos no Teatro-imagem e seguiríamos para o Teatro-debate sendo o Teatro-
fórum, de forma clara e objetiva, ainda seguindo as etapas do corpo:
Tabela 02: Etapas do processo desenvolvido no Trilhas Potiguares.
DIAS Conhecimento Conhecimento do Tornar o Teatro como Teatro
46
do projeto corpo corpo
expressivo
linguagem como
discurso
1° DIA X X X X X
2° DIA X X X
Fonte: Natal, 2018.
No primeiro dia de oficina apareceram cerca de 35 jovens para participar, por mais que
a proposta fossem 20 jovens inscritos com antecedência, decidi deixar todos participarem. No
primeiro momento realizei um alongamento coletivo e em seguida quatro jogos
improvisacionais do próprio Boal que trabalhava a interação, desinibição, expressão corporal
e vocal. No segundo momento partimos para a criação das cenas a partir do Teatro-Imagem,
mesmo exercício realizado no Lauro de Castro, (FOTO+MOVIMENTO+AÇÃO), só que
desta dez os jovens ao final da discussão teriam que propor as soluções substituindo alguém
da imagem, já para ir preparando para o teatro-fórum.
Foi onde surgiram apenas dois temas nos seis grupos: suicídio e bullying nas escolas,
depois que discutimos essas questões pedi para o grupo desmontar a imagem e falar se
conseguimos acertar as suposições e também sobre a escolha da imagem, desta vez, para a
solução do problema apresentado pela imagem, solicitei que grupo refizesse a imagem e
depois que realizassem a ação, teriam que solucionar o problema apresentado. Apresento
imagens das cenas para explicitar melhor a experiência:
Imagem 08: Cena de Teatro-imagem com temática de suicídio.
Foto: Arquivo Pessoal.
47
Cena de Teatro-imagem com a temática de suicídio, onde um jovem acabou de tentar
se suicidar e os outros estão tentando ajuda-lo. Eles comentaram que foi inspirado em um
caso real, onde fazia aproximadamente um ano que uma amiga próxima a eles tinha se
suicidado no município. Na imagem, não tem explicito um opressor, pois eles alegaram que
construíram a imagem a partir da solução, que teria sido assim, como está na imagem, se eles
tivessem tido a oportunidade de ter ajudado a amiga deles. Percebi, neste momento, que essa
situação deveria ser levada para outras instancias do município, foi o que fizemos
posteriormente.
Imagem 09: Cena de Teatro-imagem com temática de bullying nas escolas.
Foto: Arquivo Pessoal.
Nesta imagem, estão explicitando a violência entre os alunos nas escolas, que segundo
eles, é muito comum nas escolas do município. Na discussão, falamos muito sobre relações
afetivas de companheirismo, de ajuda e respeito pelo próximo para possíveis soluções do
conflito.
Veio à surpresa, esse exercício causou um impacto muito grande nos participantes;
houve muito choro, comoção de todo o grupo na apresentação de cada cena, discussões
pessoais entre os participantes e relatos comoventes. A coordenadora, que estava presente na
oficina, resolveu solicitar a psicóloga do CRAS para participar da oficina no segundo dia, pois
seria muito necessário, principalmente pela imagem do suicídio.
48
Neste dia, foi complicado deitar e conseguir dormir, pensando naqueles jovens,
naquelas histórias, naquelas questões, naquelas situações. Os participantes começaram a
comentar sobre a oficina pela cidade, e devido ser um município muito pequeno, todos
estavam comentando, fazendo postagens nas redes sociais, recebi inúmeras mensagens de
repercussão que a oficina estava tomando. No segundo dia, apareceram mais jovens para
participar, devido a repercussão e a psicóloga do CRAS, Kathlee Kelly.
Nesse dia, no primeiro momento realizamos um alongamento coletivo e em seguida
quatro jogos improvisacionais do próprio Boal, novamente como no primeiro, apenas os jogos
eram diferentes. Na segunda parte, recuperamos as cenas de Teatro-imagem e evoluímos para
o Teatro-fórum. No exercício, cada grupo teria que criar uma cena a partir da imagem e no
momento ápice de opressão, a cena teria que parar e o curinga estimular os participantes a
entrarem em cena para resolver o conflito através do diálogo.
No total, oito cenas foram apresentadas, em todas as cenas houve muita interação e
participação dos observadores. Ao final de cada cena, a psicóloga fazia uma intervenção
discutindo sobre os temas e as situações do ponto de vista da psicologia, no qual enriqueceu
muito as discussões. Percebi que, no segundo dia, os jovens não estavam mais tão emotivos
como no primeiro, discutiam de forma mais objetiva e mais crítica.
Imagem 10: Cena de Teatro-fórum com temática de bullying.
Foto: Arquivo Pessoal.
49
Está cena de Teatro-fórum, apresentada no segundo dia, continuava com a temática do
bullying, onde transformaram uma situação especifica de racismo, uma aluna sendo excluída
das outras por causa do cabelo que não era liso. Neste dia, junto com a psicóloga, puxamos a
discussão para a resolução fazendo o intermédio dos espec-atores que iriam entrar para
solucionar o problema, possibilitando-os refletir sobre o que iriam propor para solucionar. O
caso da imagem do suicídio não foi transformada em Teatro-fórum, pois já consideramos que
as soluções foram explicitas e a psicóloga puxou um debate acerca dessas situações, e a partir
dessa oficina, já estava pensando em trabalhos que poderia realizar com os jovens posterior a
isso.
2.2.4 Resultados e reflexões
Através dessa oficina, a psicóloga da cidade conseguiu perceber o que estava
acontecendo e conseguiu encontrar um caminho para começar a trabalhar e pensar em
estratégias para esses jovens. Segue um relato apresentado por ela sobre a oficina:
A oficina Teatro dos Oprimidos apresentada pelos estudantes da UFRN para
o grupo de Adolescentes do Serviço de Convivência e Fortalecimento de
Vínculo do CRAS de Serrinha dos Pintos/RN, proporcionou momentos de
muito diálogo, atenção e exteriorização de sentimentos que estavam
resguardados. As técnicas utilizadas provocaram discussões dos mais
variados assuntos, bem como, condições de expressão corporal, que
ajudaram no desenvolvimento e equilíbrio das emoções de todos que
participaram‟‟ (Kathleen Kelly, Psicóloga do município de Serrinha dos
Pintos/RN)
É nítido, no relato de Kelly que, só foi possível essa exteriorização dos conflitos,
através do corpo colocado em movimento, que isso foi possibilitado através do teatro. Uma
professora de teatro, residente na cidade, também acompanhou todas as oficinas no sentindo
de aprender essas técnicas e ficou maravilhada com o impacto que causou nos jovens:
Durante os dias 23 de julho a 27 acontecia o Trilhas Potiguares, onde o
teatro do oprimido foi incluído, dirigido por Yogi. As oficinas teatrais para
jovens foram muito produtivas, as experiências vivenciadas e únicas que
jamais serão esquecidas. Através do teatro do oprimido os adolescentes
criaram coragem e entraram em cena para debater assuntos polêmicos do
nosso convívio, aprenderam muito, e principalmente respeitar a opinião,
tiveram a chance de opinar mostrando suas próprias percepções e tiveram
mais liberdade e aceitação. As oficinas foram uma novidade para o
50
município, pois não se tinha conhecimento sobre. (Aline Nunes de Lacerda,
facilitadora de teatro no programa do Governo Federal, o novo Mais
Educação).
Até hoje, aqueles jovens me vem à cabeça; até hoje eles me tiram o sono; até hoje eu
penso e reflito sobre eles, tenho desejo de voltar naquele lugar e conversar com eles
novamente, saber como anda as suas questões expressivas. Tenho certeza que o TO cumpriu
com seus objetivos naquele lugar.
A experiência de Serrinha veio à tona de forma muito perceptível, o poder criativo e
crítico que os jovens possuem, mas não experimentam, eles estavam nessa situação de
vulnerabilidade devido não se experimentarem e não saberem que são capazes de criar. O
teatro os possibilitou essa descoberta poética, “permitiu àqueles jovens mostrarem seu
potencial criativo e crítico. Permitiu que passassem a ser vistos e a se verem de outra forma”.
(PINTO, 2017, p. 195).
2.3 Estágio Supervisionado de Formação de Professores – Ensino Médio
Os Estágios Supervisionados, que são disciplinas obrigatórias do curso de
Licenciatura em Teatro da UFRN, de uma forma geral, é um espaço de aprendizagem e
experiência acerca dos processos de ensino-aprendizagem em docência, onde se podem
colocar em prática os conhecimentos adquiridos na Universidade. Um lugar de troca de
experiência, tendo em vista que não opera somente em um ensino verticalizado para os
estagiários em Teatro, e sim com todo o conjunto participativo, incluindo os professores
supervisores, os alunos das respectivas escolas, os colegas de estágio, as escolas e até mesmo
o professor orientador.
Podemos perceber que cada nível de Ensino da Educação opera de uma forma
singular, onde nos estágios I, II e III é proposto a imersão no universo da Educação Infantil e
Fundamental. O Estágio Supervisionado IV proporciona uma experiência teórico-prática com
o Ensino Médio pensando na Educação de Jovens e até mesmo Jovens-Adultos.
2.3.1 Caracterização do contexto e dos(as) participantes
51
Então, essa experiência que está por vir foi realizada durante o Estágio Supervisionado
IV, no período de setembro a dezembro de 2018 no Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN) no Campus Natal-Central, localizado na Avenida
Senador Salgado Filho, 1559, no Bairro Tirol. Natal – RN, CEP 59015-000. O IFRN é uma
instituição Brasileira de ensino superior, médio, técnico e outras modalidades de ensino,
vinculada diretamente ao Ministério da Educação. Criado mediante transformação do Centro
Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte (CEFET-RN), o IFRN possui hoje
uma estrutura multicampi, com unidades de ensino em diversas regiões estratégicas do estado
do RN (22 unidades).
Nesse contexto, esses jovens estão inseridos num lugar onde a cultura e as linguagens
artísticas estão presentes na sua formação, fazendo a caracterização básica do lugar, o
Instituto possui o Núcleo de Artes – NUARTE, onde são desenvolvidos coletivos e projetos
de extensão e pesquisa na área das Artes. Os projetos são: Coletivo de Arte e Cultura;
Coletivo de Cinema (gerido pelos alunos e apoiado pelo NUARTE); Cursos de Violão e
Iniciação Musical, Orquestra e Coral infantil. Tendo ainda, aulas de desenho e pintura no
ateliê do NUARTE. Semestralmente vários projetos de pesquisa são desenvolvidos, como por
exemplo, a Cena-Web e o Museu Virtual Doces do Seridó. No NUARTE também funciona o
NEABI (Núcleo de estudos afro-brasileiro e Indígena). Há um grupo de pesquisa formado por
professores, denominado CASO (Cultura, Arte e Sociedade).
No campus existe a sala de Teatro, onde também funciona um acervo para os cenários
dos espetáculos já feitos no instituto e também possui um espaço livre para a realização de
aulas. Além disso, existe a sala-acervo de figurinos e adereços cênicos onde possui um
bolsista trabalhando e qualquer aluno com matrícula pode fazer o uso dos materiais que estão
na sala, pois o campus também já possuiu um grupo de Teatro, que no momento do Estágio
estava inativo, pois a professora de Artes Cênicas estava afastada devido ao seu doutorado.
Existe o Auditório Pedro Silveira e Sá Leitão que comporta 490 lugares, onde possui uma
estrutura que possibilita a apresentação de peças de Teatro incluindo a estrutura básica
(Iluminação, espaço cênico que comportam cenários e camarins).
Na estrutura curricular do Ensino Médio, a disciplina de Artes é obrigatória e ocorre
durante o período total de um ano e meio, onde cada semestre é trabalhado uma linguagem,
no primeiro semestre Música, no segundo Artes Visuais e no terceiro Artes Cênicas, no caso
do campus Natal Central existe um foco na linguagem Teatral, pois não tem professor efetivo
nas áreas específicas de Dança e nem de Circo.
52
O estágio ocorreu na turma do 1° Ano Vespertino do curso de Controle Ambiental,
com 40 jovens, com faixas etárias entre 15 e 16 anos, alunos no ano de ingresso no instituto,
onde já passaram pela linguagem da Música e estavam nas Artes Visuais, ministrado pela
Profa. Dra. Suély Gleide16
supervisora do estágio. O dia era na sexta-feira das 13h às 14h30,
ou seja, foram duas aulas por semana. Fiz o estágio em parceria com meu colega de turma
Samuel Leon17
.
Foi importante ressaltar toda essa caracterização para podermos perceber por essa
estrutura que esses jovens possuem diversas possibilidades de experimentar as linguagens
artísticas e o instituto incentiva bastante. Os próprios jovens são envolvidos e muito
participativos nesses projetos, isso torna essa realidade bastante propícia para uma
intervenção teatral, esse foi o primeiro ambiente escolar em que as artes, assim como o teatro,
já era comum no cotidiano dos jovens.
2.3.2 Percurso metodológico percorrido
Nesta intervenção, devido o período de tempo ser bastante curto, optei por realizar
duas aulas teóricas acerca do TO, com o intuito de detalhar melhor o conteúdo e os alunos
compreenderem mais, exibindo slides, vídeos e imagens. Houve bastante questionamento e
interesse por parte dos alunos tornando as aulas bastante dialogadas.
Na prática, resolvi experimentar somente o Teatro-imagem, procurando encontrar
outras possibilidades com está modalidade para as juventudes, ainda seguindo as etapas de
conhecimento do corpo.
Tabela 03: Etapas do processo desenvolvido no Estágio IV.
DIAS
Conhecimento
do projeto
Conhecimento do
corpo
Tornar o
corpo
expressivo
Teatro como
linguagem
Teatro
como
discurso
1° DIA X
2° DIA X
16
Professora de artes visuais, IFRN. 17
Aluno do curso de Licenciatura em Teatro, UFRN.
53
3° DIA X X X
4° DIA X X X X
6° DIA X X X
Fonte: Natal, 2018.
Nas primeiras intervenções práticas, realizamos exercícios e jogos improvisacionais de
iniciação ao teatro-imagem, onde os jogos já possibilitavam a construção de imagens para a
discussão acerca do tema, relações e identificação do opressor e oprimido finalizando com
possíveis soluções para o conflito.
Com o objetivo de provocar e evoluir nas discussões, pensamos diferente, no momento
de realizar de fato as cenas em relação às duas experiências anteriores. Para isso, na terceira
aula, discutimos sobre relatos reais de opressão e realizamos jogos com esse objetivo, até que
finalizamos com o exercício de cada aluno escrever um relato de alguma situação de opressão
que já vivenciou, eles não podiam se identificar e não tinha limites para a escrita, deixei
explicito que aqueles relatos iria servir de material para a criação de cenas para evitar
possíveis constrangimentos.
No quarto e último dia espalhei esses relatos pelo chão, dividi grupos e eles tinham
que passear pela sala e escolher quatro relatos, cada grupo se reunia e discutia sobre esses
quatro relatos, refletindo sobre a situação, as relações entre opressor e oprimido e possíveis
soluções, depois da discussão o grupo teria que escolher apenas um relato e criar a cena de
Teatro-imagem a partir dele.
Imagem 11: Exercício de escolha dos relatos.
Foto: Arquivo Pessoal.
54
A sequência do exercício para a apresentação foi a seguinte: imagem estática durante
certo tempo, em seguida, uma pessoa que estava na imagem descongelava e caminhava até a
frente para ler o relato, da mesma forma que a pessoa escreveu; explicitando até o dia e a
hora, em seguida ela encara o público e volta para o seu lugar na imagem, quando ela se
posicionava, todos realizavam o movimento+ação. Dessa forma, já sabiam do tema da
imagem e das relações entre opressores e oprimidos, a discussão seria na temática e possíveis
soluções.
A imagem sendo apresentada na voz do oprimido tornava a cena mais forte, os corpos
ficavam em um estado de mais atenção e a discussão posterior ficava mais rica em relação aos
argumentos e os espect-atores sentiam a voz do oprimido, por tanto, talvez a cena não seria
mais um Teatro-imagem por possuir a fala, apenas partia dessa modalidade e em seguida se
transformava em uma cena-imagem-relato de opressão. Selecionei duas cenas especificas para
exemplificar melhor a atividade:
Imagem 12: Cena de Teatro-imagem a partir do relato18
de racismo.
Foto: Arquivo Pessoal.
A imagem trata de um cena de racismo no universo infantil, várias crianças brancas
estão rindo e excluindo do seu ciclo de amizade uma criança negra, a oprimida relata que
18
Relato disponível dos Apêndices.
55
passou por essas situações na infância, o relato original de inspiração intitulado „„Era só
brincadeira...‟‟ para a criação desta imagem está disponível nos apêndices deste trabalho.
O interessante da discussão dessa cena foi questionarmos o fato dos opressores serem
crianças, onde concluímos que eles estão em uma etapa muito forte de reprodução, no sentido
de formação e não de maldade como um opressor adulto formado com suas opiniões, neste
caso, concluímos que os opressores, na verdade, estão por volta dessas crianças, elas
observam esses comportamentos opressores e reproduzem esses atos. Uma das possíveis
soluções foi um intermédio dos pais e da escola, pois estão neles a responsabilidade de
solução do conflito quando se trata de crianças.
Imagem 13: Cena de Teatro-imagem a partir do relato19
de violência de gênero.
Foto: Arquivo Pessoal.
Esta outra imagem se trata de violência e hierarquia de gênero. O seu relato original,
intitulado como „‟Piores Momentos‟‟, também está disponível nos apêndices deste trabalho,
mas achei interessante descrevê-lo aqui:
Ele fazia questão de me diminuir, tirar tudo que há de melhor em mim,
quebrava coisas nas nossas discussões e socava a parede: Me fazia temer.
Força sexo sem eu querer, se aproveitou de um momento de fraqueza
enquanto estava bêbada. Dizia sempre que eu não encontraria algo melhor e
eu acreditava nisso. Brigava por alguém comentar ou curti minha foto,
19
Relato disponível nos Apêndices.
56
brigava por sair com amigas, brigava por não querer relações sexuais. E foi
assim por um ano e dois meses. (Relato de aluna do IFRN)
Na cena, uma menina era violentada por um menino enquanto pessoas que estavam ao
seu redor fingiam que não estavam vendo e nem escutando. Volto para aquela questão do
opressor passivo, pois muitas vezes o silêncio pode ser opressor, e foi exatamente isso que as
alunas que fizeram a cena alegaram.
Após a apresentação da cena houve um silêncio, algo que não era comum, pois,
sempre que as cenas terminavam começava uma euforia para a discussão dela. Percebi
naquele momento, que eles sabiam de quem se tratava o relato e também deu para perceber
que não era uma pauta inédita, por um momento fiquei preocupado por pensar que a menina
fosse ficar constrangida até o momento que começaram com a discussão.
Assim que demos início aos debates, as alunas começaram a se pronunciar
intensamente. Era nítido que todas sabiam de quem se tratava e também que a pessoa não
estava mais naquela situação e já havia superado. Fiquei aliviado, durante as discussões foi
falado que era uma situação muito complicada, que a pessoa que está passando pela situação
necessita da ajuda de outras pessoas para perceber que o seu amor consigo mesma já é o
suficiente para a sua existência, como citou uma aluna durante a discussão: „„infelizmente
crescemos achando que necessitamos deles para ter uma existência plena, mas não precisamos
e há todo momento vamos estar aqui para falar isso pra qualquer uma que precisar ouvir‟‟.
União e força foram palavras presentes nas soluções para esta opressão.
Aconteceram duas situações inéditas de discussão acerca de ser opressor e oprimido
neste estágio, o primeiro, foi o relato apresentado pelo título „„Vivendo os dois lados da
história20
‟‟, onde o sujeito-oprimido narra que durante muito tempo foi o opressor, até que
chegou um determinado momento que ele se tornou oprimido e só foi capaz de perceber o
quanto que ele era opressor depois dessas nossas discussões em sala de aula, em que fiz o
seguinte questionamento „„É mais fácil identificarmos quando estamos sendo opressores ou
oprimidos?‟‟. Até que chegamos ao consenso que talvez seja quando estamos sendo
opressores, por isso a importância da discussão acerca dessas questões, pois, podemos
perceber e reavaliar as nossas condutas.
O segundo foi um relato apresentado pelo título „„Pior momento da minha vida21
‟‟,
onde o sujeito-oprimido narra que durante muito tempo sofreu preconceito porque as pessoas
20
Disponível nos apêndices. 21
Disponível nos apêndices.
57
achavam que ele seria gay, portanto, ele sentiu na pele a opressão que essas pessoas resistem
diariamente e começou a ter empatia pela causa. A partir disso, lancei o seguinte
questionamento: „„Precisamos ser gays para lutar contra a homofobia?‟‟. E todos responderam
que não, como em qualquer causa social, não precisamos estar na pele do oprimido para ir
contra essa violência, isso é uma questão humana e de empatia pelo próximo, como
concluíram os alunos.
2.3.3 Resultados e reflexões
Ao finalizar as cenas, percebi que a experiência do relato deixaram os jovens mais
autorais do processo, como se eles tivessem mais propriedade da situação em relação à
atuação e à criação poética das imagens, “Ao improvisarem as cenas, trabalhando o Teatro
Imagem, ao criarem os textos, a coreografia, a música, a partir de relatos de sua própria
realidade, percebem-se atores, autores coreógrafos, encenadores” (PINTO, 2017, p. 199).
Nesta experiência do estágio em específico, percebi que os alunos já possuíam um
senso crítico muito forte, devido ao local que eles estavam inseridos, mas que era muito
perceptível que essa expressividade não era explorada nas demais esferas das suas vidas, por
colocarmos os jovens nesse lugar de burlar as suas expressividades enquanto sujeitos, não só
nesta experiência, mas em todas as outras. Ficou nítido que essas juventudes já possuem
muitas experiências de vida, e quando a arte vem para esses jovens, começa a transformação,
como aponta Pinto (2017) em relações as suas experiências de TO com as juventudes:
Aí começa a transformação. O que lhes é negado pela família, escola, igreja,
amigos, sociedade, o teatro lhes permite: falar de si próprio, falar de sua
relação com o outro, perceber-se em relação de alteridade. Perceber que pode
e deve colocar pra fora o seu potencial criador. Perceber quem são seus
opressores e suas ideologias, e assim tentar enfrentá-los. Vai continuar
gostando da que a TV manda gostar? Vai, mas pode passar a ter senso crítico
sobre o que lhe serve ou não. (ibidem, p. 199)
A partir disso podemos perceber que esses jovens, dentro de seus processos de
investigação sobre as suas subjetividades, se tornam mais abertos para vivenciar de forma
íntegra toda a sua juventude, pensando no seu momento presente, não vivendo de projeção
como geralmente a sua posição é colocada, mas vivendo de efemeridade, como a vida é.
58
Todos eles já são o que são no momento presente, no agora, a juventude não necessariamente
é uma etapa que será superada ou etapa com um fim predeterminado como explicita Dayrell e
Carrano (2014):
Consideramos que a categoria juventude é parte de um processo de
crescimento totalizante, que ganha contornos específicos no conjunto das
experiências vivenciadas pelos indivíduos no seu contexto social. Isso
significa entender a juventude mais amplamente e não como uma etapa com
um fim predeterminado e muito menos como um momento de preparação que
será superado quando se entrar na vida adulta. (DAYRELL; CARRANO,
2014, p. 111)
Portanto, esse mundo das expressividades artísticas, infelizmente pode aparece como
um espaço privilegiado de práticas, representações e símbolos, no qual os jovens buscam
demarcar uma identidade juvenil. Muitas vezes essas experiências são vivenciadas longe dos
olhares dos pais ou responsáveis para melhor expressarem a sua liberdade. Os jovens
constituem as suas culturas juvenis e a arte, para lhe dar uma identidade.
59
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Foi no início da minha juventude que experimentei o teatro pela primeira vez, deve ser
por isso que parei nesse lugar. Recordo-me do turbilhão de pensamentos e sensações que
hospedava no meu corpo naquele período e não tinha espaço para me expressar. Lembro-me
também, do teatro vindo e organizando tudo isso, enquanto aquela vida adulta mesquinha, no
qual não me pertencia, tentou me levar. Eu me agarrei no teatro e acreditei nele, estamos
juntos até hoje!
Durante a experiência em Serrinha, uma jovem-participante me questionou se afinal
não é todo e qualquer teatro que tem o poder de transformar o sujeito. Respondi que pode sim,
mas cada um da sua forma, existem outras formas tão poéticas e eficazes quanto, mas a
singularidade como Boal pensou esse teatro que sempre existiu e analisou, burilou,
amalgamou, transformou e metodizou, que é ferramenta conhecida e utilizada em mais de 60
países, nos mostra uma poética poderosa com esse poder de transformar. Não é a única, mas é
eficiente, poética, lúdica, arrebatadora. Depende de que lado estamos.
Essa jovem-participante encheu os olhos de lágrimas e me respondeu: “um dia se eu
tiver a oportunidade de ir à capital vou buscar por esse teatro, aqui provavelmente não vamos
ter mais, estou sentindo coisas que nunca senti antes e não sei explicar, só sei que para mim
muita coisa na vida faz sentido agora, obrigado.” Ela me abraçou e depois saiu. Enquanto eu
observava aquela menina indo embora, as lágrimas começaram a descer, consegui me
reconhecer naquela olhar. Foi a mesma sensação que tive quando experimentei o teatro pela
primeira vez na minha juventude, a mesma semente que ficou nela ficou em mim anos atrás,
da mesma forma que tive a oportunidade de sair do interior e ir buscar por esse teatro, espero
que com ela também tenha. Está exatamente neste lugar a poética do professor-artista e da
discussão da importância da prática em decorrência da docência como explicitei ao longo do
trabalho.
Me descobri artista na minha juventude, me descobri professor na universidade, mas
me descobri professor-artista no momento que essa menina me falou isso, porque pude sentir
sua força artística a partir da minha, somos artistas, nós dois, estávamos fazendo arte, apenas
o trabalho da docência ficou por minha parte.
Aqui, pude refletir e discutir possibilidades e a importância da função do TO para as
juventudes, assim, possamos avançar com esta ideia que é uma potente ferramenta
educacional e deve ser analisada da forma que merece. Pelas vivências que explicitei, é uma
60
saída, ou pelo menos uma possibilidade de avanço numa possível verdadeira transformação.
Seja pelo uso dos educadores em projetos de inclusão, seja nos projetos populares de
resistência ou na militância. Seja na formação dos nossos professores(as)-artistas de teatro ou
nossa gente de teatro de uma forma geral, nesse processo artístico-pedagógico é
NECESSÁRIO que a universidade entenda, absorva, faça expandir o conhecimento sobre o
TO.
A universidade deveria ter pelo menos uma, ou mais de uma disciplina obrigatória
sobre Teatro do Oprimido, seja no ponto de vista de técnicas, de atuação, de história, de
metodologias de ensino, de estética, de resistência, de conhecimento humano. Durante toda
essa pesquisa, consegui ter contato com livros, artigos científicos, pesquisas, teses,
dissertações acerca da importância do Teatro do Oprimido; já passou da hora da universidade
abranger da forma que merece.
Trabalhando com as juventudes por essa ótica do TO e também considerando que sou
jovem e ainda estou vivenciando, porém, a minha juventude já está em outro tempo em
comparação à juventude dos meus alunos. Percebi uma coisa em comum entre todas essas
juventudes: que é o medo. O medo da passagem inevitável do tempo e da condição efêmera
da vida.
A música “Tempo Perdido”, de autoria de Renato Russo, divulgada em 1986, no disco
“Dois”, o segundo da banda Legião Urbana, trata dessas reflexões. Apesar do título, a
mensagem da música é a de que sempre podemos buscar pela vida, concluindo que nada foi
“tempo perdido", todas as experiências são válidas e contribuem para o nosso crescimento
pessoal.
Por fim, deixo aqui escrita toda à letra da música, para lembrar que sempre
podemos mudar nossas prioridades e nossos modos de viver, sempre devemos nos dedicar ao
que realmente é importante e faz sentido para nós, lutando contra as forças opressoras que nos
oprimem. Sempre podemos voltar, nos experimentar, todos os dias, viver uma eterna
juventude, nunca é tempo perdido, pois somos tão jovens!
Tempo Perdido – Renato Russo
Todos os dias quando acordo
Não tenho mais
O tempo que passou
Mas tenho muito tempo
Temos todo o tempo do mundo
Todos os dias
Antes de dormir
Lembro e esqueço
61
Como foi o dia
Sempre em frente
Não temos tempo a perder
Nosso suor sagrado
É bem mais belo
Que esse sangue amargo
E tão sério
E selvagem! Selvagem!
Selvagem!
Veja o sol
Dessa manhã tão cinza
A tempestade que chega
É da cor dos teus olhos
Castanhos
Então me abraça forte
E diz mais uma vez
Que já estamos
Distantes de tudo
Temos nosso próprio tempo
Temos nosso próprio tempo
Temos nosso próprio tempo
Não tenho medo do escuro
Mas deixe as luzes
Acesas agora
O que foi escondido
É o que se escondeu
E o que foi prometido
Ninguém prometeu
Nem foi tempo perdido
Somos tão jovens
Tão jovens! Tão jovens!
62
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
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Anderson; ALMADA Izaías. Augusto Boal: Embaixador do Teatro Brasileiro. Rio de
Janeiro: Mundo Contemporâneo, 2017.
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BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.278, de 2 de maio de 2016. Disponível
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Licenciatura da FUNDARTE/UFRGS. Dissertação de Mestrado em Educação, UFRGS,
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São Paulo: Paz e Terra, 1996.
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63
KOUDELA, Ingrid Dormien; ALMEIDA JUNIOR, José Simões. Léxico de pedagogia
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NUNES, Silvia Balestreri. Boal e Bene: contaminações para um teatro menor. Tese de
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principal/institucional>. Acesso em: 24 out. 2018.
______. Projeto Político Pedagógico do curso de Licenciatura em Teatro da UFRN.
Natal: 2013.
64
APÊNDICE A: RELATO ‘’ERA SÓ BRINCADEIRA...’’
65
APÊNDICE B: RELATO ‘’PIORES MOMENTOS ‘’
66
APÊNDICE C: RELATO ‘’VIVENDO OS DOIS LADOS DA HISTÓRIA’’
67
APÊNDICE D: RELATO ‘’PIOR MOMENTO DA MINHA VIDA’’
68
APÊNDICE E: TRABALHO DESTAQUE PARA PUBLICAÇÃO EM LIVRO:
TEATRO DO OPRIMIDO: DESCOBRINDO POSSÍVEIS PEDAGOGIAS E
POLÍTICAS TEATRAIS.
TEATRO DO OPRIMIDO: DESCOBRINDO POSSÍVEIS PEDAGOGIAS E
POLÍTICAS TEATRAIS
Camila Alexsandra da Silva Morais Chaves22
; Gláucia Cícera de Souza Andrade23
; Irielly
Letícia Brito da Silva24
; Thallyson Rodrigo de Oliveira Dantas25
; Thâmara Monique Cunha26
;
Thásio Igor do Nascimento Dias27
; Yogi Medeiros de Brito Lucena28
;
Estudantes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e na época participantes do
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID)
Laura Maria de Figueiredo29
;
Professora Mestra da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e Coordenadora do
PIBID
Tatiane Cunha de Souza30
Professora Mestra da Escola Estadual Lauro de Castro e Supervisora do PIBID
RESUMO
22
Graduanda em Licenciatura em Teatro, bolsista PIBID, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
autora-relatora, [email protected]. 23
Graduanda em Licenciatura em Teatro, bolsista PIBID, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
autora-relatora, [email protected]. 24
Graduanda em Licenciatura em Teatro, bolsista PIBID, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
autora-relatora, [email protected]. 25
Graduando em Licenciatura em Teatro, bolsista PIBID, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
autor-relator, [email protected]. 26
Graduanda em Licenciatura em Teatro, bolsista PIBID, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
27Graduando em Licenciatura em Teatro, bolsista PIBID, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
autor-relator, [email protected]. 28
Graduando em Licenciatura em Teatro, bolsista PIBID, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
autor-relator, [email protected]. 29
Professora Adjunta da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/ coordenadora PIBID, mestra em
Artes, Universidade de São Paulo, autora-relatora, [email protected]. 30
Professora da rede pública de ensino do Rio Grande do Norte/ supervisora PIBID, mestra em Artes
Cênicas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, autora-relatora,
69
Esta comunicação é fruto do trabalho pedagógico realizado com a turma do 8° ano
vespertino da Escola Estadual Lauro de Castro/Natal-RN, em 2017. Investigamos a metodologia
do Teatro do Oprimido de Augusto Boal: Teatro Imagem, Teatro Jornal, Teatro Fórum e
Teatro do Invisível, como práticas para o ensino da linguagem do teatro articuladas com
pedagogias e políticas teatrais, de autores como Paulo Freire e Flávio Desgranges. Tal prática
pedagógica está inserida dentro PIBID – TEATRO – UFRN, em que atuamos e refletimos sobre
a teoria e os desdobramentos pedagógicos das técnicas e jogos do Teatro do Oprimido. Para esta
comunicação, explicitamos o caminho metodológico construído: as descobertas com a prática
dos exercícios, jogos e metodologias propostas pelo Teatro do Oprimido, a discussão social
entre opressor-oprimido e o entendimento do aluno como um „espect-ator‟, sujeito atuante da
ação dramática e da sua vida; capaz de compreender seu meio social e de transformá-lo de
acordo com as suas reflexões diárias. Os resultados apontados, apresentam-se no âmbito das
reflexões teórico/práticas em consonância com experiências cênicas realizadas. Pretendemos
assim, descrever e compartilhar a metodologia deste trabalho com o ensino de teatro, bem como
apontar as contribuições desse para o currículo de Arte-Teatro na educação básica.
PALAVRAS-CHAVE: Estética do Oprimido; Ensino de Teatro; PIBID-TEATRO UFRN.
1. INTRODUÇÃO
O projeto foi desenvolvido com a turma do 8º ano vespertino da Escola Estadual Lauro
de Castro, localizada na periferia da cidade de Natal, no bairro da Cidade da Esperança. Um dos
dez bairros mais violentos da cidade. O que reflete diretamente no alunado da escola, além de
muitos alunos não possuírem estrutura básica de alimentação, higiene etc. Sendo o ato de ir à
escola, um ato de resistência em si, resistindo à violência, à fome, à miséria, ao crime;
configurando-se como uma busca por um futuro digno e diferente da realidade em que vivem.
Para o desenvolvimento do projeto com a turma do 8º ano vespertino, utilizamos os mais
diversos espaços da escola, criando espaços de arte em espaço comuns do dia-a-dia. A turma do
8º vespertino, era uma turma bastante diversa, existindo os alunos que gostavam de se expressar
e outros que eram extremamente tímidos. Porém, a relação entre eles nos chamou atenção,
atitudes violentas e repressivas aconteciam constantemente, originando uma dificuldade no
ensino-aprendizagem. Assim, surge o projeto, da necessidade em possibilitar aos alunos da
turma do 8º ano vespertino, a se expressarem enquanto corpo atuante em sociedade; a partir das
reflexões de relações opressivas, propostas na prática do Teatro do Oprimido, idealizado por
Augusto Boal. Percebemos que na turma tinham alunos com características e necessidades
pontuais, como: alguns não demonstravam interesse em participar das aulas, outros tinham
“medo de fazer errado” ou sentiam vergonha do julgamento da própria turma; enquanto uma
70
pequena parcela se disponibilizava, mas era interrompida pelas brincadeiras e dispersão da
maioria dos alunos. Ao analisar esses fatos, iniciamos as reuniões de planejamento com os
bolsistas, em que sugeri, enquanto professora-supervisora, trabalhar com a metodologia do
Teatro do Oprimido, o qual se propõe questionar as relações opressivas existentes na sociedade
e construir possíveis mudanças de pensamentos, atitudes e comportamentos. Então, nosso
primeiro passo foi iniciar um intensivo de estudo. Realizei a contextualização do conteúdo,
assistimos o documentário “Boal” (direção de Zelito Vianna) e outros vídeos, assim como
realizei jogos com os bolsistas, elaborei uma apostila, de acordo com os estudos do Centro do
Teatro do Oprimido (para o estudo com os bolsistas e posteriormente como material didático
para os alunos) e separamos a leitura do livro: Jogos para Atores e Não-atores de Augusto Boal.
Esse diagnóstico dos alunos foi realizado durante as aulas práticas de expressão corporal que
realizei com o apoio dos graduandos do PIBID-TEATRO, e sempre após as aulas, avaliávamos
a aprendizagem daquele dia, investigando os conhecimentos prévios dos alunos em teatro e o
que eles estavam aprendendo de novo. Vale destacar que apenas alguns alunos se expressavam
de forma objetiva, os alunos mais retraídos tinham dificuldade de definir a aula com apenas uma
palavra. Após cada aula, me reunia com os graduandos para encontrar novas estratégias para o
desenvolvimento das aulas.
2. METODOLOGIA
Para realizarmos o projeto, apresentamos o objeto de estudo para os alunos,
primeiramente fazendo uma contextualização do Teatro do Oprimido e de todo apanhado
histórico, de como ele surgiu e a posição político-social de Augusto Boal. Então, cada aluno
recebeu o material didático que foi construído por mim em diálogo com os bolsistas. Sentados
em roda, estudamos a apostila, compreendendo o contexto histórico, as metodologias e a árvore
do Teatro do Oprimido. Começamos um debate sobre experiências opressoras vividas por cada
um, aluno, bolsistas e professora-supervisora; configurando-se como um momento de
explicação sobre o Teatro do Oprimido. Realizamos em seguida, a apreciação do documentário
“Boal” com pausas para explicações e debates à cerca das relações de opressão existentes no
meio político-social do país e do mundo, levantados no filme. Assim, os alunos compreenderam
a estética do Teatro do Oprimido, conhecendo Boal, suas metodologias e ações em diversos
espaços e países. Na sequência, realizamos alguns jogos dramáticos para então chegarmos ao
Teatro Imagem: fizemos jogos e exercícios trabalhando com imagens. Separamos alguns grupos
e lançamos temas, como: violência, drogas, amizade, abuso de poder, preconceito e gravidez na
adolescência. A indicação era cada grupo escolher um tema e construir uma imagem corporal
coletiva contendo uma relação de opressão a partir do tema, em que se destacasse o(s)
oprimido(s) e opressores(s). Com o objetivo de desenvolver mais um espaço para a construção
71
do conhecimento em comunidade e possibilitar a ampliação do diálogo entre escola, arte e
comunidade, relacionado a apreciação teatral, firmamos a parceria com Grupo de Teatro Eureka
e conseguimos a apresentação do espetáculo de teatro de rua “Cambalhotas”. Em seguida,
realizamos um debate com a turma sobre as relações de opressão presentes na dramaturgia.
Logo, fizemos a Pausa Para o Teatro, um evento com o intuito de produzir e apreciar o teatro,
apresentando ao público o objeto de estudo da turma. A pausa foi aberta para toda comunidade
escolar, realizamos apresentações de cenas de Teatro Imagem (FOTO-MOVIMENTO-AÇÃO),
a partir do tema escolhido por cada grupo e apresentadas na escola, no horário do intervalo. Ao
final de cada cena, um bolsista conduzia o debate entre o público e os alunos-atuantes. Partimos
para a metodologia do Teatro Jornal, com os jornais em mãos, os alunos se dividiram em grupos
e escolheram uma notícia de jornal que retratassem alguma situação opressiva relacionada a
vida deles. Em seguida, selecionaram os personagens, possíveis falas, lugares presentes na
notícia, para compor a dramaturgia da cena de Teatro Jornal. Com a dramaturgia construída por
eles, começamos os ensaios, para então compartilhar em sala de aula a partir de uma cena
teatral. Em seguida, os alunos participaram da aula compreendendo o conceito do Teatro-Fórum
e a função do espect-ator. Logo, fizemos uma Aula de Campo para o Teatro de Cultura Popular
com o intuito dos alunos apreciarem o espetáculo teatral “Debaixo da Pele”, também do Grupo
de Teatro Eureka. O espetáculo propõe a participação ativa da plateia, fazendo questionamentos
e possibilitando o diálogo direto com ela ao longo do espetáculo, discutindo, através da arte, a
negritude brasileira, a partir de uma linha cronológica desde o Brasil Colônia até a atualidade.
Tal espetáculo, assemelha-se aos fóruns propostos por Boal e os alunos conseguiram
compreender, na prática, o objeto de estudo que estávamos desenvolvendo em sala de aula.
Trabalhamos com a música “O Homem na Estrada - Racionais”, com o intuito de refletir sobre
as relações opressivas existentes na letra da música, ampliando as possibilidades metodológicas
de aprendizagem para os alunos. Partimos para o Jogo do Teatro Fórum, dividimos novos
grupos e cada grupo teve que construir uma cena, a partir da escolha de uma das relações
opressivas presentes na música, relacionando esses conflitos com a sua própria vivência,
proporcionando uma reflexão sobre uma possível solução para esse problema. Os alunos
compreenderam as funções do curinga e do espec-ator. Destaco o momento de improvisação de
cada cena e o empenho dos alunos em sugerir soluções para as situações-problemas
apresentadas. Como forma de romper com os muros da escola, participamos da XXIII Semana
de Ciência, Tecnologia e Cultura – CIENTEC–UFRN, em que compartilhamos o trabalho
realizado com a turma do 8º ano para os demais bolsistas do programa, alunos e professores da
Universidade e comunidade em geral. A nossa participação aconteceu com a apresentação de
cenas de Teatro Imagem. Os alunos apresentaram cenas com temáticas escolhidas a partir de
relações opressivas que já haviam vivenciado ou estavam vivenciando como, automutilação, em
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que uma aluna expressa através da arte, sua dor e sua necessidade de transformar essa dor em
um objeto artístico. Esse trabalho possibilitou entendermos, realmente, as relações opressivas
vividas por cada aluno da turma e como eles precisam expressar seus conflitos para poderem
entender quem são e como podem solucioná-los ou buscar ajuda para isso; além dos alunos
estarem agindo como atuantes na vida e na arte. Logo, depois dessa experiência, escolhemos
exibir o filme “Escritores da Liberdade” devido a constatação de alguns alunos apresentarem
baixo autoestima. Resolvemos inserir no planejamento a exibição do filme, como forma de
debater as questões dos adolescentes e situações que surgem nessa fase da vida. Seguimos para
o trabalho com o Teatro do Invisível, em que discutimos sobre situações-problemas dos alunos,
vividas na escola, como por exemplo: abuso de poder dos professores, direção, algum problema
com os amigos da escola, na cozinha, portaria etc. Cada grupo desenvolveu a cena a partir de
um roteiro pré-estabelecido, pensando em expor a situação-problema, improvisar, convencer a
plateia e solucionar a situação apresentada. Ou seja, a situação-problema determinava o lugar
em que a cena deveria ser realizada. Os alunos realizavam o Teatro do Invisível e ao final,
explicávamos para o público que era uma cena teatral. Para finalizar, realizamos uma cena de
Teatro do Invisível com os alunos, eu (professora-supervisora) e os bolsistas. Os alunos
participaram, opinando firmemente, se posicionando a favor ou contra a discussão. Nesse
momento, os alunos já eram capazes de expor suas opiniões, as relações interpessoais evoluíram
e o interesse para aprender aumentou consideravelmente.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Essa avaliação dos resultados e discussão será apontada de maneira qualitativa. Durante
todo o percurso do trabalho, a avaliação foi feita de forma contínua, a partir da participação dos
alunos nas aulas, a feitura das atividades. Realizamos, por exemplo, uma atividade escrita para
compreender o nível de aprendizagem dos alunos a partir de perguntas objetivas e subjetivas
sobre do Teatro do Oprimido, a relação que eles estabeleceram com o conteúdo, assim como as
relações de opressões vividas em sala de aula e fora dela. Além dessa atividade escrita, os
debates em sala de aula, a escrita no diário de bordo (caderno destinado para registros artísticos)
e as apresentações das cenas, também foram instrumentos de avaliação do trabalho. Percebemos
o quão foi exitosa a transformação de entendimento, atitudes e comportamentos dos alunos.
Aqueles que se mostravam dispersos e que apresentavam conflitos com os demais, passaram a
participar, debater em sala de aula os assuntos apresentados e até se sentiram à vontade para
sugerir temáticas opressivas vividas por eles, em cena. Como resultado, também, tivemos as
cenas construídas pelos alunos de Teatro-Imagem, Teatro-Jornal, Teatro-Fórum e Teatro do
Invisível. A avaliação contínua com os alunos também era feita comigo e com os bolsistas. Para
nosso grupo, é impossível avaliar alguém e não se auto avaliar, por isso, estávamos sempre
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dialogando sobre a nossa ação nas atividades e propondo também, a auto avaliação dos alunos.
Busquei parcerias com grupos e espetáculos que estavam em cartaz na cidade e consegui que os
alunos os apreciassem. Nesse percurso, senti a necessidade de me qualificar procurei
bibliografias para aprofundar o planejamento. Além disso, escrevi o trabalho em três congressos
acadêmicos e obtive a aprovação para a participação no formato de comunicação oral:
ABRACE – Associação Brasileira de Pesquisa em Artes Cênicas – UFRN, V JITOU – Jornada
Internacional de Teatro do Oprimido nas Universidades – UNIRIO e o ERELIC – II Encontro
do PIBID do Nordeste – UFCG. Participamos do Encontro Integrativo dos PIBID‟S da UFRN
em que ministramos uma oficina intitulada: “Estética do Oprimido: pedagogias e políticas
teatrais” que surgiu a partir das práticas teatrais realizadas no projeto. Assim como, realizamos a
Performance “O GRITO”, que ocorreu dentro do Calendário de Lutas da Escola Estadual Lauro
de Castro e também na CIENTEC 2017, na UFRN. Tais experiências reverberaram em nossas
práticas na sala de aula, nos momentos de tomada de decisões para a construção do percurso
pedagógico. Assim, confirmamos com esse projeto, a necessidade de propor um percurso
didático para o Ensino do Teatro de maneira flexível, preocupada com a voz, com o interesse e
o significado da arte para os alunos-atuantes. Construí esse processo junto aos bolsistas e aos
alunos-atuantes, possibilitando a criticidade e a consciência de sujeitos construtores de suas
próprias histórias.
4. CONCLUSÕES
A experiência desenvolvida com a turma do 8º ano vespertino no ano de 2017 comprova
que o trabalho realizado a partir da metodologia do Teatro do Oprimido apresenta caminhos
para o Ensino de Teatro de maneira relevante e significativa para professores e alunos. Assim,
afirmamos que esse trabalho pode ser desenvolvido por outros educadores. Para isso, é
necessário realizar um bom diagnóstico, investigando as relações interpessoais dos alunos,
propondo um diálogo sobre as relações opressivas que vivemos, possibilitando a voz ativa de
cada aluno sobre as relações que vivem no seu dia-a-dia, desenvolvendo a autonomia desses,
nas descobertas dessas situações vividas, reflexões e tomada de decisões. Os professores que se
inspirarem nesta prática poderão esperar o desenvolvimento de alunos criativos e ativos, alunos-
atuantes, capazes de criar cenas de teatro que dialogam diretamente com as relações opressivas
vivenciadas por eles e pelo coletivo em que vive, alunos que propõe mudanças de realidades,
tanto na cena quanto para a sociedade.
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos alunos da turma do 8º ano vespertino do ano de 2017, por se
disponibilizarem, aos bolsistas PIBID-TEATRO-UFRN, por juntos, construirmos um percurso
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metodológico revelador para a pedagogia teatral. Agradeço, a professora coordenadora, Laura, a
UFRN, a Escola Estadual Lauro de Castro, a Capes e ao Governo do Estado.
REFERÊNCIAS
BOAL, Augusto. Jogos para atores e não atores. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011.
DESGRANGES, Flávio. Pedagogia do teatro: provocação e dialogismo. São Paulo: Editora
Hucitec; Mandacaru, 2011.
_____________. Pedagogia do espectador. São Paulo: Editora Hucitec; Mandacaru, 2015.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1996.
____________. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.