surgimento da associação dos docentes da universidade ... · uma articulação ampla de ações e...
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*Graduanda em História pela Universidade Federal de Sergipe
Surgimento da Associação dos Docentes da Universidade Federal de
Sergipe: A História Oral do Movimento Docente da Universidade Federal de
Sergipe (1979-1981).
MARINA LEITE SUZART*
Introdução
A política educacional para o ensino superior brasileiro, particularmente para as
universidades públicas, surgiu de forma tardia. Somente nos anos 1930, essa política
ganhou estatuto legal, de âmbito nacional, impulsionadas, principalmente, pelas
transformações econômicas do capitalismo urbano-industrial que exigia maior grau de
escolaridade da classe trabalhadora. Para Ignez Navarro, “era preciso, portanto, tornar o
aparelho escolar um instrumento de produção e reprodução da força de trabalho e da
própria estrutura de classes”. Assim, o Estatuto das Universidades Brasileiras, criado em
1931, principiou a organização dessas instituições, a partir da junção de faculdades
isoladas de ensino superior existentes no país. Esse estatuto propõe uma formação
acadêmica marcada pela supervalorização do trabalho intelectual, forjando “quadros
dirigentes (burocratas e profissionais liberais) necessários às classes dominantes, ou seja,
os intelectuais orgânicos das empresas capitalistas e do serviço público” (NAVARRO,
2001, p.62-3 e 64).
Nos anos de 1960, a União começou a reconhecer e inspecionar os
estabelecimentos particulares e públicos de ensino superior, especificamente, coordenada
pelo Conselho Federal de Educação, baseada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, de 1961, (LDB 4.024/61). Com o golpe civil-militar, em 1964, o ensino
superior passou por uma grande expansão, porem acompanhada também pela
privatização, financiada em parte pelo capital internacional. Para Silvana Aparecida
Bretas, isso:
“Ampliou e possibilitou com maior eficiência a chamada Administração Indireta –
autarquias e fundações -, entidades que passam a atuar de maneira empresarial, para
se tornarem competitivas frente as instituições congêneres internacionais, do que
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resultou também as empresas tipicamente nacionais manterem-se dependentes da
proteção estatal” (BRETAS, 2014, p. 123).
Esse crescimento exigiu também mais educadores com mais titulação acadêmica
devido a inserção de novas tecnologias na divisão social do trabalho. Contraditoriamente,
“o avanço da modernidade faz crescer as possibilidades de emersão de novos sujeitos
sociais como protagonistas atuantes (...) e estabelecendo novos patamares de organização
social” (ALMEIDA et al., 2011, p.4).
A partir de 1974, as bases do Estado autoritário começariam a ficar abaladas com
a “crise do milagre econômico”. As reações nacionais e internacionais contra a repressão
à sociedade realizada pelo governo Médici provocou um amplo movimento pela volta à
democracia, impondo-se ao regime a necessidade de uma “abertura política”, iniciada
somente no governo Ernesto Geisel.
Além disso, o aumento das taxas de inflação e concentração de renda geraram o
aumento de greves trabalhistas no país, protagonizadas pelos metalúrgicos do ABC
paulista, professores, e outros setores, descumprindo a legislação trabalhista autoritária
(lei antigreve e impedimentos à organização/ação sindical). Nesse período, surgirá o
chamado ‘novo sindicalismo’, que desembocou na construção da Central Única dos
Trabalhadores (CUT), em oposição ao sindicalismo da Central Geral dos Trabalhadores
(CGT), herdeira do sindicalismo da Era Vargas, orientado pela política de conciliação de
classes e de atrelamento ao Estado. A criação da nova central sindical tinha como objetivo
uma articulação ampla de ações e reivindicações da classe trabalhadora na construção de
um novo projeto emancipador.
Na categoria dos docentes universitários, muitas associações locais já existiam
nesse período, entre elas, a Associação dos Docentes da Universidade Federal de Sergipe
(ADUFS). Vinculadas com as movimentações de caráter nacional para a criação da
Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior (ANDES) ocorreram diversos
encontros entre as seções sindicais.
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Por fim, o presente trabalho visa historicizar a trajetória do movimento docente
da Universidade Federal de Sergipe (UFS) na criação da Associação dos Docentes da
Universidade Federal de Sergipe (ADUFS), entre o período de 1979 a 1981. Através do
análise dos registros documentais encontrados na Associação Nacional dos Docentes do
Ensino Superior, na Associação de Docentes da Universidade Federal de Sergipe e no
Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal de Sergipe. Principalmente, de
atas de congressos e encontros sindicais, jornais, ofícios, dos Cadernos ANDES.
Somado a isso, a análise das entrevistas realizadas com alguns dirigentes
sindicais que colaboraram “para a definição dos rumos tomados pela entidade e dos
possíveis caminhos a serem percorridos, das tensões e contradições que estiverem e ainda
estão presentes na conformação da identidade deste movimento sindical de intelectuais”.
(NAVARRO, 2001, p.55).
As entrevistas foram realizadas com seguintes professores: Antônio Edilson
Nascimento, José Costa, Antônio Ponciano Bezerra e Claudete Sales Sampaio.
Escolhidos por critérios qualitativos, principalmente, por serem dirigentes sindicais que
participaram cotidianamente da associação docente. A escolha do local das entrevistas foi
a sala do Laboratório de Pós-Graduação de História. Os materiais utilizados para registro
do relato oral foram o gravador e uma câmera digital. Também fora construído um roteiro
baseado no perfil dos entrevistados, sendo fundamental para o direcionamento da
entrevista. Por fim, foram entregues as transcrições das entrevistas para as suas devidas
correções\alterações pelos próprios docentes, respeitando os limites éticos e participativos
da História Oral.
2 - A CRIAÇÃO A UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE (UFS)
A Universidade Federal de Sergipe foi criada em 1963, pela lei n. 1.194, de 11
de junho, sancionada por João de Seixas Dória, governador do Estado de Sergipe,
autorizando a integração dos estabelecimentos de ensino superior existentes no Estado,
ou seja, a junção das Faculdades de Química, de Ciências Econômicas, de Filosofia, de
Medicina, de Serviço Social e de Direito. A iniciativa recebia amplo apoio das lideranças
representativas de cada faculdade, inclusive, as estudantis. Porém as concepções
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ideológicas, administrativas e jurídicas sobre o modelo fundacional da futura
universidade, imposto pela LDB, levantariam diversos debates e conflitos.
Silvana Bretas afirma que as direções das Faculdades de Filosofia, de Serviço
Social, de Química e de Ciências Econômicas apoiavam o modelo fundacional, em
consonância com as políticas educacionais do governo federal, representando os setores
sociais mais conservadores e privatistas. A exemplo disso, fora uma reunião do
representante do Conselho Federal de Educação, Newton Sucupira, em 1968, onde
estavam presentes “o governador do Estado, Celso Carvalho; o prefeito da capital,
Godofredo Diniz; o comandante do 28° Batalhão de Caçadores; Coronel Tércio Veras, e
o Arcebispo Dom José Vicente Távora (ATA DE REUNIÃO DA CES/CEE/SE, 18 de
setembro de 1966)” (In. BRETAS, 2014, p. 139).
A criação da Fundação, mesmo com a incorporação dos antigos professores das
antigas escolas isoladas exigiu a abertura de mais concursos públicos para docentes com
mais especializações acadêmicas. Na entrevista do professor Edilson Nascimento relatou
sobre a sua vinda para Sergipe, ainda como mestrando em Biofísica, e traz um pouco do
panorama sobre o nível acadêmico dos docentes da UFS, no período:
“Doutor[es] era[m] pouco[s], contávamos no[s] dedo[s], tinha[m] o professor Eduardo
Garcia, a professora Gizelda [Morais], depois chegou o professor [Félix D’Ávila].
Tinha uns cinco ou seis com doutorado. [O] pessoal jovem, [eu] acho, muit[os] de
fora, já chegava[m] aqui com mestrado [concluído] ou fazendo mestrado” (Edilson
Nascimento, 02-03-2016).
Para os professores a responsabilidade em tornar-se professor de ensino superior
ainda muito jovem foi ressaltada: “logo que me formei [na UFS], entrei aqui como
professor, algo quase instantâneo. Continuei no trabalho que fazia ainda como estudante,
mas, agora, de forma um pouco diferente, fazia como professor” (Ponciano Bezerra, 13-
05-2015). Edilson Nascimento comenta que a docência até se confundiam com o
comportamento de um estudante de graduação:
“Em [1969], fui pra Brasília, fiz o terceiro cientifico. Entrei na UNB. Sai da UNB [e]
fui para Recife. Lá entrei no mestrado de Biofísica. [Era] m mestrado com muito[s]
problema[s], [pois] não tinha quem orientasse a gente. Foi ai [que] surgiu a ideia de
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vim pra Aracaju, em 1976, pra ser orientado pelo Prof. Eduardo Garcia. [...] Depois
volt[ei] para Recife. E venho [novamente para Aracaju] em 2 agosto de 1978, como
professor colaborador [da] Universidade Federal de Sergipe, [instalada ainda] na Vila
Cristina. Apesar de chegar [efetivamente só] em [1979], já estava mais ou menos
enturmado com o pessoal, porque [já] morei com Zé Luís, que era presidente do DCE.
[Eu] tinha um jeito de estudante. De vezes em quando, me esquecia que era professor.
Achava que era estudante” (Edilson Nascimento, 02-03-2016).
No início da década de 1970, os professores da UFS já eram associados na
Associação de Servidores da Universidade Federal de Sergipe (ASUFS). Porém, a mesma
organizava conjuntamente docentes e técnicos administrativos da universidade. Tinha um
caráter bem assistencialista, promovendo festas, competições de futebol, convênios com
médicos, empréstimos financeiros restrito aos associados, entre outros. No Boletim de
Notícias, de 1976, informou “ASUFS firmou o convenio com a Eletromóveis, onde o
associado terá um abatimento de 10% no valor da sua compra. [...] E por fim, o valor do
empréstimo do associado a ASUFS aumentará de 600 cruzeiros para 1000 cruzeiros”
(BOLETIM DE NOTICIAS, Ano VI – Número 97-76).
O professor Edilson Nascimento contou com entusiasmo sobre a sua
participação na ASUFS no período:
“Quando [cheguei] em Aracaju [...] não existia ADUFS. [E sim] a ASUFS, que era a
Associação dos Servidores [da UFS]. Me associei! Era doido pra me sindicalizar,
participar de alguma coisa e tudo mais. Às vezes, de caráter bem assistencialista. [...]
[O presidente da ASUFS] era o jornalista, Hamilton Apolônio, [vindo da cidade de]
Própria. Depois dele, veio Wellington. Eu participei muito da ASUFS, mas depois da
ADUFS, eu me afastei” (Edilson Nascimento, 02-03-2016).
O professor Ponciano Bezerra também era associado à ASUFS e relata sobre
suas contribuições no movimento:
“Sou um dos fundadores! Não me lembro a data, mas acho que é de 1975. Se não me
engano, é [1975], a fundação da ASUFS. Fiz parte e até hoje não saí dela. Você sab[ia]
que ainda sou da ASUFS [atual SINTUFS]? Foi o que primeiro [que] apareceu como
sindicato aqui. [...] Mas logo depois, o interesse de se criar uma associação de
professores surg[iu]. Nesse período, eu estava entrando no doutoramento.” (Ponciano
Bezerra, 13-05-2015).
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Vera Lúcia Jacob ao estudar o movimento docente da Universidade Federal do
Pará caracterizou o assistencialista dessas primeiras associações como um reflexo do
ensino religioso que acompanhou a primeira geração de docentes das universidades
brasileiras. Na entrevista, o professor Ponciano Bezerra relatou um pouco sobre os limites
da participação dos professores, principalmente, do seu Departamento de Letras:
“a força da Igreja atuava junto às pessoas com muita facilidade, procurando mudar
rumos. Então, você tinha de se ajustar à tradição: respeitabilidade absoluta aos
professores, submissão, reverência, frequentar calendários religiosos e executar
serviços comunitários diversos. Existia essa quase exigência. A presença de Dom
Luciano Duarte era muito forte. Os cursos das humanidades eram marcados pelo seu
saber e pelo seu poder. Uma pessoa meio rebelde, como o Ponciano, no mínimo, era
[considerado] um doido: “aquilo é um doido, então, não mexa!” (Ponciano Bezerra,
13-05-2015).
Porém, a entrada de novos docentes nas universidades acirraram as disputas
contra esse “senso comum e a velhas concepções do mundo em geral”
(MOCHCOVITCH, 1988, p. 19). Afinal, muitos já haviam presenciado, durante a década
de 1960, as agitações populares pelas “Reformas de Base”, por uma educação mais
democrática e pública para a sociedade brasileira. Para Ignez Navarro, muitos que se
inseriram no movimento sindical a chamavam de “Pós-Graduação da UNE”. Claudete
Sampaio, vinda da Bahia para ser professora colaboradora no Departamento de
Psicologia, da UFS, comentou sobre as suas antigas experiências no movimento
estudantil:
“Quando eu vim para Aracaju, [já] tinha uma história de militância. Fui do diretório
acadêmico de psicologia na UFBA e em seguida fui do Diretório Central dos
Estudantes da UFBA, naquele tempo, com toda a repressão [...] não cheguei verdinha
para fazer movimento docente [...]. [Cheguei aqui] como professora, mas [com a
carga] do movimento estudantil da Bahia, inclusive, [participei da] reconstrução da
UNE” (Claudete Sampaio, 21-05-2010).
3 – A CRIAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO DOS DOCENTES DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE (ADUFS).
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No final da década de 1970, o movimento docente já somava esforços para a
criação de uma entidade a nível nacional, lutando por uma universidade pública e
democrática. O fortalecimento da identidade sindical proporcionou o debate sobre o
reconhecimento da carreira docente pela União. Em fevereiro de 1979, ocorreu o I
Encontro Nacional de Associações dos Docentes (I ENAD), reunindo representantes de
24 associações sindicais. No evento encaminhou-se a criação de uma Coordenação
Nacional das Associações Docentes para coordenar e unificar as lutas de todo o
movimento docente do país.
A participação dos professores de diversas associações nesses eventos ou o
afastamento de alguns para realizarem especializações acadêmicas em outros estados,
principalmente no Centro-Sul, potencializou a troca de experiências entre si. O professor
Ponciano Bezerra relatou sobre algumas dessas contribuições externas:
“Era em 1977, foi quando fiz o exame para [doutorado na] USP. Então, naquela época,
já [tinha] mais recursos [financeiros], vinha constantemente aqui [Aracaju]. Em São
Paulo, frequentei vários lugares, onde já se falava realmente numa associação de
professores universitários. Lembro-me de várias reuniões na PUC-SP. Nesse sentido,
compareci, mandei informações, documentos para Luiz Alberto, Gilsa Luiza,
mostrando como as coisas estavam acontecendo. [...] Já existia essa vontade em
algumas universidades, como na UFBA, a APUB, que é bem anterior à nossa. [...]
Tínhamos e temos compromissos políticos frente à oposição, na época, ainda era o
regime militar. O maior compromisso era com a queda disso aí” (Ponciano Bezerra,
13-05-2015).
Mesmo com as dificuldades em mobilizar os docentes num período de exceção
política- ideológica, a Associação de Docentes do Ensino Superior (ADUFS) foi criada
em 10 de novembro de 1979. Tendo, inicialmente, uma diretoria provisória com os
seguintes professores e cargos, respectivamente: Presidente - José Silvério Leite Fontes;
Vice-presidente - Manuel de Resende Pacheco; Secretária - Socorro de Maria Rufino
Oliveira; Tesoureira - Gilza Luísa Mota Gomes.
Mesmo não entrando em contato com os documentos escritos referente ao
primeiro Estatuto Provisório, as entrevistas orais são capazes de elaborar “uma ‘outra
história’ com base em documentos efetuados para circunstancias em que a interdição não
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permitiu registros ou apenas gerou um tipo de registro” (MEIHY e HOLANDA, 2014, p.
24). Na entrevista com o professor Antônio Ponciano Bezerra comentou sobre um
possível envolvimento político dessa chapa provisória com o reitor da UFS, José Aloísio
de Campos, indicação feita pelo Presidente da República, João Figueiredo:
“Eu vou lhe dizer o que sei. Uma coisa de que não gosto é de me comprometer tanto,
mas vou dizer! Essa primetoria era comprometida com o reitor. Vão dizer: ‘você
nunca gostou dele!’. Dr. Aluísio de Campos possuía um carisma, [mas] não de minha
parte! Eu nunca [entendi] o porquê. Esse grupo da primeira chapa [da ADUFS]
utilizou pouco recurso humano novo. Era um grupo identificado como de esquerda, o
que não posso negar. Existiam jovens, ex-alunos deles, com condições de integrar essa
chapa, mas terminaram ‘dançando’. Quem é que ia dizer, ‘eu quero ser o tesoureiro’,
se a tesouraria já tinha sido indicada para ser de um Silvério! Ou ‘quero ser isso’, se
já estava com a Gilza. [...]. [Essa diretoria] era um grupo pequeno e diferente do que
há hoje. Tinha um certo limite de atuação, pois não gostaria de contrariar ou de criar
alguma coisa que parecesse uma reação ao de mandato de Dr. Aluísio. Era um grupo
pequeno e diferente do que há hoje. Naquela época, tínhamos departamentos que
apenas havia realizado um ou dois, no máximo, três concursos para docentes.
Predominava o pessoal fundador da UFS. [...] Gostávamos de um Silvério, de uma
Thétis, de Lourdinha, mas eles tinham limites. [...] Então, aquela foi uma chapa para
não mexer com a Reitoria. Não vejo outra forma de explicação. Isso foi verdadeiro”
(BEZERRA, 13-05-2015).
Tal oralidade trouxe as divergências político-ideológicas entre o grupo de
professores “mais velhos” e o grupo de docentes “mais novos” da universidade, porem o
mesmo destacou que a centralidade em fortalecer da ADUFS unificou ambas as partes e
reconhece também o respaldo que a antiga geração tinha ainda no espaço universitário:
“[...] deram legitimidade ao grupo mais novo, pois tinham amizades tradicionais e
reconhecimento de luta e muita credibilidade, [devido] sua história de militância. Não
podíamos fazer ou assumir um movimento sindical só com aquela juventude. Adesões
[de professores] das áreas de Economia [e] Direito, [também] fundadores da UFS,
[que] depositaram credibilidade ao movimento. Deram legitimidade à luta e votavam
na gente. Às vezes, eram contra, mas termina[vam] conosco” (Ponciano Bezerra, 13-
05-2015)
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Inclusive, na entrevista do professor Edilson Nascimento relatou que seu
envolvimento com o movimento sindical fora por incentivo do seu orientador, Prof.
Eduardo Garcia, indicaria para compor a chapa da primeira diretoria do sindicato, com o
carga de vice-presidência. Porém, na entrevista do professor Edilson Nascimento acabou
confidenciando mais informações sobre o primeiro processo eleitoral da associação:
“Houve o seguinte, o estatuto provisório criado dizia qual dia seria a [data das
eleições]. Silvério sempre foi muito legalista, e estava trabalhando pra fazer eleição
nesse dia. Mas [houve uma] confusão toda, o vice- presidente dele traiu! [Risos] E eu
sei que não houve eleição. Inicialmente, não cheguei a dar papel nenhum. [Eu] era
vice, [mas] de ‘boca’, [por] indicação de Eduardo! Depois fui pra ele dizer que não!
Que não queria e tudo mais. Talvez por causa dessa falta de articulação [acabou
atrasando] a eleição [...]. Fizemos uma reunião na Faculdade de Filosofia, num
auditório. Eu lembro quando (...) Eduardo Garcia [disse]: Nós queremos uma
associação. Nós vamos ter que fazer uma eleição! Vai acontecer o que? Vai deixar de
existir essa? Coisa bem logica! Vai deixar de existir a Associação porque não fizemos
eleições? Vamos fazer! Fez a eleição! Ai teve a primeira diretoria, [que] foi [com]
Lenalda? Foi, Lenalda! E Gilza, acho que foi depois. E desde então participei dos
conselhos de representantes” (Edilson Nascimento, 02-03-2016).
Percebe-se pelas falas do professor Edilson um certo constrangimento pela sua
saída da chapa e as consequências políticas que isso causou adiando as eleições do
sindicato. Porém, a reunião dos docentes para a retomada de um novo processo eleitoral
refletiu a vontade coletiva na construção da ADUFS.
A nível nacional, realizou-se o III ENAD, em Campinas - SP, no período de 10
a 17 de fevereiro de 1981, onde fora debatido as “propostas de ação para o I CNDU
agrupadas nos seguintes eixos: ‘Democratização e Autonomia’, ‘Salarial, Sindical e de
Carreira’, ‘Mais verbas, Ensino Público e Gratuito’ e ‘Ensino e Pesquisa’”. (NAVARRO,
2007, p.179). Dias após esse evento, ocorreu o I Congresso Nacional de Docentes
Universitários (I CNDU), com a presença de delgados de 61 associações docentes, no dia
19 de fevereiro de 1981, no mesmo local. Na plenária final, com 227 votos favoráveis, a
Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior (ANDES) foi criada.
Nos relatos dos professores fora bastante ressaltado a participação da ADUFS
em toda a construção da ANDES. A professora Claudete Sampaio comentou:
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“[Já] era o momento de organização da ADUFS. Pouco depois foi o momento da
ADUFS trabalhar para construir junto [à outras] seções sindicais. [Muitas] se
formaram nesse processo de construção do ANDES, mas algumas outras já existiam
como associação. No caso, nós éramos uma delas, e organizamos aqui várias reuniões
nacionais da comissão pró-Andes” (Claudete Sampaio, 25-05-2010)
Na entrevista com o professor José Costa ressaltou com muito entusiasmo sobre
a indicação do seu nome, como representante da ADUFS no I CNDU, em Campinas,
presenciando um momento histórico para o movimento docente, a criação da ANDES:
“Então, esse grupo conseguiu formalizar a criação da Associação, e que estava
sintonizava com a movimentação nacional, com a criação oficial da ANDES.
Aconteceu exatamente quando eu era Secretário da ADUFS, e fui um representante
da ADUFS na assembleia que criou oficialmente a ANDES” (COSTA, 13-05-2016).
No meio do ano de 1981, a ANDES realizou o II Conselho Nacional de
Associações Docentes (II CONAD), em Salvador – BA, entre os dias 5 a 7 de julho de
1981, contando com a professora Ilka Bichara como delegada da ADUFS no evento.
Um dos encaminhamentos do evento foi a construção da Semana de Mobilização
Nacional em Defesa da Educação Pública. Aqui, na UFS, o Jornal de Sergipe, no dia 22
de setembro, relatou sobre a indefinição dos professores na adesão à essa paralisação a
nível nacional. A assembleia puxada pela ADUFS, no dia anterior, debateu sobre os
“diversos problemas enfrentados pelos docentes, com especial atenção para o
enquadramento de colaboradores e auxiliares de ensino bem como uma mudança na
carreira do magistérios nas Instituições Federais” (JORNAL DE SERGIPE, Ano IV
número 955 p. 3). O texto jornalístico ressaltou ainda, sobre o sucateamento promovido
pelo MEC com o enxugamento das verbas para as universidades públicas do país, pois o
problema dos professores colaboradores só seria solucionado com a abertura de novos
concursos públicos. Na UFS, por exemplo, possibilitaria o enquadramento de 200
professores colaboradores e auxiliares de ensino existentes, dentre os 500 professores que
desenvolvem atividades na universidade sergipana. O professor Antônio Ponciano
relatou:
“Eu entrei no movimento sindical aqui na universidade ainda durante as primeiras
discussões relacionadas a criação de Associação Docente. Na época estava à frente, o
professor Silvério, que puxou um pouco essa discussão, e que envolvia [...]
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professores colaboradores, [...] que estavam entrando [na UFS] sem nenhuma garantia
[ou] segurança. Que foi esses professores que participaram, diretamente, da criação
da Associação Docente, como a professora Ilka.” (Ponciano Bezerra, 13-05-2015).
Na entrevista com Edilson Nascimento fez a mesma ressalva:
“Era professor colaborador, e um dos primeiros movimentos desde que cheguei, era o
dos colaboradores, era uma grande quantidade. Na verdade, nós fizemos uma
campanha que era importante [nos] associar[mos] a ADUFS. Acho que a ADUFS
cresceu muito com a participação dos colaboradores, era pessoal mais mobilizado né”
(Edilson Nascimento, 02-03-2016).
E por fim, a professora Claudete Sampaio reforçou:
“[...] porque a ADUFS no seu surgimento teve a luta dos professores colaboradores,
um número significativo de professores que tinham feito um concurso e que
[ninguém] estava sendo aceito. Então no bojo dessa luta foi de que se deu, eu não me
lembro exatamente se o nascedouro ou fortalecimento da ADUFS, porque minha
memória não está assim tão apurada. Mas me lembro que foi o momento importante
de assembleias com participação da maioria dos departamentos” (Claudete Sampaio,
21-05-2010).
Em Sergipe, as eleições para a primeira diretoria da ADUFS já haviam ocorrido,
neste mesmo ano, contando com a seguinte composição de professores e cargos,
respectivamente: Presidente – Lenalda Andrade Santos; Vice-presidente - Josué Modesto
dos Passos Subrinho; Secretário - José Costa de Almeida e o Tesoureiro - Júlio Cezar
Gandarela Rezende. Essa gestão da ADUFS vigorou entre o período de 1981 a 1983.
4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho visa compreender o papel desempenhado pelos docentes da
Universidade Federal de Sergipe, na criação da Associação dos Docentes da Universidade
Federal de Sergipe - ADUFS, no período de 1979 a 1981, quando fora criada a ANDES
- Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior. Os procedimentos
metodológicos utilizados na pesquisa são baseados na História Oral, com o estudo
bibliográfico em torno da temática, dando suporte para a análise de entrevistas com
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dirigentes sindicais, que trazem na suas memórias, os impasses e tensões em torno da
defesa da educação pública, gratuita e de qualidade.
A realização de entrevistas com os docentes foram centrais no suporte teórico
necessário para as hipóteses levantadas. O documento final destas, as transcrições, foram
reflexo do procedimento de constante diálogo, em tempo real, entre o entrevistado e o
entrevistador. Assim, a preparação, anteriormente, com a elaboração um roteiro, foram
essenciais no desenvolvimento do trabalho. Somado a isso, o trabalho também
salvaguardou outros documentos históricos, disponíveis na ADUFS, acessível ao público
externo, após um longo processo de digitalização. Para Meihy, a História Oral tem esse
“compromisso com a “devolução” dos resultados do projeto é condição básica (...) pois
os projetos que se valem de entrevistas que cumprem sempre um papel social” (MEIHY
e HOLANDA, 2014, p. 17).
Essa diversidade de fontes historiográficas permitiu um diálogo entre elas,
resultando no levantamento de informações inéditas ou de diversas versões dos fatos
conflitantes presentes na memória coletiva dos docentes. Ressaltamos, que as gravações
e transcrições não se esgotam nas conclusões desta pesquisa, pois o historiador “não é um
investigador da verdade do passado, mas um interprete do passado, condicionado pelas
suas opiniões políticas, pela sua condição social, pelos valores da sociedade em que vive
(...) e assim, a objetividade histórica se constrói pouco a pouco, através de revisões
incessantes da produção” (ABRÃO, 2007, p.10).
A memória coletiva traz os vínculos de identidade do grupo entrevistado, como
os fatos ou lugares que marcaram a trajetória individual e de todo movimento sindical.
Para a professora Claudete Sampaio a “[história da] UFS se confunde um pouco com
minha história profissional” (CLAUTEDE SAMPAIO, 21-05-2010). Na visão do
professor Edilson, mesmo com o seu afastamento do movimento docente, relatou:
“tenh[o] muita saudade da associação, era tão bom!” (EDILSON NASCIMENTO, 02-
03-2016). Ou nas memorias do professor José Costa explicou que “foi uma participação
muito rica e gratificante, de forma que, eu posso dizer, que houve um Jose Costa antes da
participação desses movimentos, e depois, eu adquirir uma visão muito mais comunitária,
a minha visão de cidadania, de cidadão brasileiro” (JOSE COSTA, 15-03-2016).
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Em todas as entrevistas verificamos essa articulação dos docentes de um passado
vivido com a atualidade, pois os sujeitos entrevistados vivem um processo social ainda
em curso. Por isso, a metodologia da História Oral supera as leituras economicistas, ao
inserir os professores como sujeitos ativos na construção da história do sindicalismo
docente. O professor Ponciano Bezerra na sua entrevista relatou:
“A lembrança sempre agrada às pessoas. Às vezes, fico pensando, quando leio algo
sobre a UFS, sobre o que poderia ajudar, naquela temática: “Falaram algo que poderia
fornecer uma informação útil e, de repente, não estou ali”. Então, vou contar porque
me movimentei nessa direção de aderir à luta sindical” (Ponciano Bezerra, 13-05-
2015)
Assim, o trabalho “História Oral do Movimento Docente na Universidade
Federal de Sergipe: Surgimento da Associação dos Docentes da Universidade Federal de
Sergipe (1979-1981)”, recupera as memórias vivas do movimento docente que assumiram
a identidade de trabalhadores sindicalizados na luta por uma universidade pública,
democrática, gratuita e de qualidade. Para Meihy, a História Oral é:
“uma percepção do passado como algo que tem continuidade hoje e cujo processo
histórico não está acabado. A presença do passado no presente imediato das pessoas
é razão de ser da história oral (...) garante sentido social à vida de depoentes e leitores
que passam a entender a sequência histórica e a sentirem-se parte do contexto em que
vivem” (MEIHY, 1996, pg. 10).
Por isso, a Associação dos Docentes da Universidade Federal de Sergipe
(ADUFS) permanece, até os dias atuais, fortalecendo a identidade sindical de diversas
gerações de docentes, e, sendo referência política e ideológica para diversos setores da
sociedade.
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5 – REFERÊNCIAS
- ALMEIDA, A.; FERREIRA, J. S.; TRÓPIA, P. ANDES 30 anos: sindicato de base,
democrático e de luta. Uberlândia; Editora ANDES, 2011. 65 p.
- J. MEIHY, José Carlos Sebe B. Manual de História Oral. São Paulo: Loyola, 1996.
78 p.
- J. MEIHY; HOLANDA, Fabíola. História Oral: como fazer, como pensar. 2 ° ed. São
Paulo: Contexto, 2014. 179 p.
- MOCHCOVITCH, Luana Galano. Gramsci e a escola. São Paulo: Editora Ática. Série
Princípios, 1988. 79 p.
- MONTENEGRO, Antônio Torres. História, Metodologia, memória. 1° ed. São Paulo:
Editora Contexto, 2010. 188 p.
- NAVARRO, Ignez Pinto. ANDES: Um Sindicato de Intelectuais, História e
Memória (1981-1994). Coleção Universidade e o Mundo do Trabalho – ADUFMAT,
2001.806 p.
5.1 – FONTES ORAIS
- BEZERRA, Antônio Ponciano. Entrevista concedida a Antônio Fernando de
Araújo Sá, no 13 de maio de 2016.
- COSTA, José. Entrevista concedida a Antônio Fernando de Araújo Sá, no 15
de março de 2016.
- NASCIMENTO, Antônio Edilson. Entrevista concedida a Antônio Fernando
de Araújo Sá, no 02 de março de 2015.
- SAMPAIO, Claudete Sales. Entrevista concedida a Antônio Fernando de
Araújo Sá, no 21 de maio de 2010.
5.2 – FONTES HEMEROGRÁFICAS