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Artigo sobre movimento e cultura surda. Artigo sobre movimento e cultura surda.TRANSCRIPT
Texto disponível em: Apostila de Libras. UFRGS, 2014.
2. SURDOS
Bianca Ribeiro Pontin
Emiliana Faria Rosa
Quem é o surdo? Qual seu papel na sociedade? O que ele representa? O surdo é
um sujeito cultural e linguístico com características particulares que o deixa exposto a
múltiplas possibilidades, assim:
Ser surdo, nascer surdo, põe a pessoa numa situação extraordinária; deixa-a exposta a uma gama de possibilidades linguísticas e [...] a uma gama de possibilidades intelectuais e culturais que o resto de nós, como falantes naturais [...] mal podemos começar a imaginar. (SACKS, 1990 p. 135)
As características particulares descritas acima são diretamente demonstradas
pela importância da experiência visual e da língua de sinais.
O que é ser surdo? Ser surdo é um sujeito que pela ausência da audição possui
uma experiência visual e é usuário da língua de sinais. A língua de sinais é um dos
fatores que leva a construção da identidade, comunidade e cultura surda. Mas, além da
língua de sinais, tem a questão também da experiência e da cultura visual, a questão do
olhar. Assim, a audição não é considerada como falta pelos surdos.
Ser surdo vai além de uma definição clínica ou de decibéis. Ser surdo é possuir
uma cultura, uma língua; é participar de uma comunidade de iguais, interagindo,
adquirindo e expandindo saberes.
A surdez é uma experiência visual [...] e isso significa que todos os mecanismos de processamento de informação, e de todas as formas de compreender o universo em seu entorno, se constroem como experiência visual. (SKLIAR, 2005, p.27)
O sujeito surdo representa um indivíduo que através da experiência visual
constrói-se um sujeito participante da comunidade surda e da sociedade. Assim:
O surdo que se conhece e conhece seus direitos e ideais, fortalecido identitariamente e culturalmente. Membro de uma comunidade na qual
se revela sujeito dotado de segurança e capacidade de mostrar o que deseja para si e para seus semelhantes. (ROSA, 2009, p. 39)
Sendo assim, o surdo deve ser compreendido não pela falta, mas pela diferença.
Diferença que complementa a experiência e interação com o outro.
2.1 - Identidade surda
Identidade? No dicionário diz (2014)1: 1. O que faz que uma coisa seja da
mesma natureza que outra. 2. Conjunto de caracteres próprios e exclusivos de uma
pessoa (nome, idade, sexo, estado civil, filiação etc.): verificar a identidade de alguém.
3. Identidade pessoal, consciência que alguém tem de si mesmo. 4. Princípio de
identidade, princípio fundamental da lógica tradicional, segundo o qual "uma coisa é
idêntica a si mesma" ("a é a").
Podemos pensar assim: quem sou eu? Ou o que não sou? Como me constituo?
Qual é a minha bandeira? Mas a identidade é aberta, sempre em construção e que move
o sujeito em diferentes posições. No livro Identidade e diferença, Woodward (2012, p.
8), coloca que “a identidade adquire sentido por meio da linguagem e dos sistemas
simbólicos pelos quais elas são representadas”.
Hall (1997) proporciona grandes reflexões sobre identidade, mas deixa claro que
não é possível fazer afirmações conclusivas, mas sim possibilidades e aproximações.
Podemos dizer que a identidade é formada através da interação entre o eu e a sociedade
e na pós-modernidade, as identidades são fragmentadas devido à globalização. A
identidade é múltipla, móvel, contraditória, instável, mutável, e não definida por causa
de grupos políticos ou por novos movimentos sociais. Também muda de acordo com o
modo como o sujeito é interpelado através dos discursos disponíveis e identificados
circulantes. A identidade também pode ser moldada pela cultura.
A sociedade nos leva a fazer escolhas, agir de um jeito ou outro, dependendo do
contexto e nas situações de opressão, usamos “máscaras” para nossa sobrevivência.
Acrescento um complemento para esta explicação de que a identidade está relacionada à
subjetividade.
Identidade é referente à subjetividade, ou seja, um espaço de ‘luta’ entre o mundo interno (indivíduo) e o mundo externo (social); tendo
1 http://www.dicio.com.br/identidade/
por resultado tanto em marcas singulares na formação do indivíduo quanto na construção de valores em uma cultura que se associarão à experiência histórica do indivíduo e da comunidade que habita, afinal é a subjetividade que auxilia na relação com o outro. (ROSA, 2009, p.79)
As relações que formam e constituem subjetividades também podem causar no
indivíduo a multiplicidade de identidades, ou seja, traços identitários formados ao longo
de sua existência.
Os sujeitos não são mais constituídos por uma única identidade, mas por traços identitários com os quais se identificam momentaneamente. Por outro lado, as identidades são sempre narrativas históricas, por estarem delimitadas em um tempo e espaço específico. Caracterizam-se pela utilização da linguagem e dos sistemas simbólicos que a representam, meio pelo qual conferimos sentido às práticas e relações sociais. (HALL, 1997, p.18)
As identidades se constituem ao longo da vida das pessoas, que nos seus
processos de construção identitária vão sendo subjetivadas por diferentes discursos.
Mas, e identidade surda? Nas palavras de Gladis Perlin (2012) para compreender a
identidade surda, no campo de investigações dos estudos culturais, precisamos nos
afastar do conceito de corpo danificado para chegar a uma representação da alteridade
cultural que indica a identidade surda.
A identidade surda é construída no encontro entre surdo-surdo, que normalmente
nas escolas de surdos ou na comunidade surda, como associações de surdos,
descobrindo entre eles experiências semelhantes, mesmas necessidades, mesmos
artefatos culturais2. Porém, a identidade surda é marcada pela diferença e muitas vezes a
diferença é sustentada pela exclusão.
É evidente que as identidades surdas assumem formas multifacetadas em vista
das fragmentações a que estão sujeitas face à presença do poder ouvintista que lhe
impõe regras, inclusive, encontrando no estereótipo surdo uma resposta para a negação
da representação da identidade surda ao sujeito surdo. (SKLIAR, 2012, p.54)
Entendendo que a identidade é multifacetada, então nem todos os surdos
possuem a mesma identidade, pois eles passam por processos de subjetivação
diferentes, por vários motivos como: aquisição precoce ou tardia da língua de sinais, a
privação ou não da linguagem, etc.
2 Segundo Strobel (2008), os artefatos culturais são peculiaridades do povo surdo que perpassam por experiências semelhantes, são sujeitos viso-espaciais e usuários de língua de sinais.
Há pessoas com deficiência auditiva que, influenciados pela sociedade
majoritária, não aceitam a língua de sinais por se sentirem deficientes, inferiores.
Outros, anos depois de oralização, são interpelados ao descobrir a comunidade surda
quando adultas e passam a assumir a identidade surda, usando a língua de sinais. Há
aqueles que transitam no meio dos dois mundos. Também há aqueles que usam a
“máscara” dependendo do contexto, uma hora se dizem “deficiente auditivo” e outra
hora se denominam “surdo”. Na comunidade surda, há aqueles que se denominam
surdos “puros”, por usarem a língua de sinais, se diferenciando dos surdos oralizados e
surdos implantados. Pode-se ver que a identidade surda é variável, conforme suas
representações e reações frente à história social e o surdo pode se identificar com um ou
com outro ou com alguns grupos. Também vale reconhecer a existência da identidade
surda negra, surdo gay, surdo down e outros.
Então, ser surdo é uma condição plural e as identidades surdas podem ser
tantas…
Nota: e o termo surdo-mudo? Este termo era bastante utilizado antigamente pelo
senso comum, pois ao verem a língua de sinais, muitos acreditavam que era porque não
podiam falar. Mas se considerar o lado clínico do corpo, a mudez é ligada à ausência ou
algum impedimento do órgão fonador. Então, muitos surdos não têm problemas com
órgão fonador e sim (nem todos) à falta de retorno auditivo - mas isso não importa
porque os surdos, culturalmente, falam com as mãos e ouvem com olhos. A comunidade
surda, organizada pela FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração dos
Surdos), teve que fazer campanha, através de adesivos e outros, para conscientizar as
pessoas a usar o termo adequado. Assim, divulgou: Surdo- mudo: apague essa idéia,
colocado com um X na palavra mudo.
Resumindo um pouco sobre a questão da representação, no lado clínico-
terapéutico os sujeitos surdos são vistos como deficientes e por outro lado, o o socio-
antropológico, interpreta os surdos como sujeitos pertencentes da minoria linguistica
cultural. Essas duas representações estão presentes até os dias atuais em muitos campos
distintos de saber.
2.2 - Cultura surda
Existem vários significados para a palavra cultura, mas relacionado às pessoas
surdas, ela representa identidade. Hall (1997) diz que a cultura “determina uma forma
de ver, de interpelar, de ser, de explicar, de compreender o mundo”. Sendo assim, os
surdos têm seus hábitos, modos de ver, compreender, explicar, os quais são
compartilhados na comunidade surda, junto às experiências, as histórias, o humor; este
compartilhamento ocorre através do visual, do olhar, da língua de sinais. Pode-se assim
afirmar que a cultura surda se expressa através da língua de sinais.
Enfatizamos que a língua de sinais é o marcador mais forte e compartilhado
entre surdos, fazendo com que os surdos se sintam em casa nos espaços comunitários ou
não. Outros marcadores incluem a questão do olhar, a presença do outro para sinalizar.
Karin Strobel, em seu livro As imagens do outro sobre a cultura surda, define
cultura surda como:
o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e modificá-lo a fim de torná-lo acessível e habitável ajustando-o com suas percepções visuais, que contribuem para a definição das identidades surdas. [...] Isso significa que abrange a língua, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo. (STROBEL, 2008, p. 27).
Nesta mesma obra, ela também apresenta 8 artefatos culturais que podem
caracterizar a cultura surda, além de discutir sobre a questão da inclusão. Outra
publicação recente é o livro com o título Cultura Surda na Contemporaneidade:
Negociações, Intercorrências e Provocações3, obra que é escrita por diferentes
pesquisadores/autores envolvidas com a educação e movimentos surdos do Brasil e de
outros países.
2.3 - Comunidades surdas
As comunidades culturais e/ou linguísticas que conhecemos são alemães,
italianos, indígenas, etc., mas e a comunidade surda? Abrange a pessoas que são surdas,
ou não; nem todos os participantes da comunidade surda são usuários da língua de
sinais, porém possuem relação direta e indireta com as pessoas surdas. A comunidade
também pode ser entendida como um sistema social onde as pessoas vivem,
compartilham, dividem as responsabilidades, necessidades, metas, etc. É bom lembrar
3 Organizado pelos autores: Karnopp; Klein; Lunardi-Lazzarin. Publicado pela editora ULBRA, ano de 2011.
que a comunidade surda não tem ligação com território local, mas está espalhada em
diferentes territórios.
Existem órgãos “formais” que representam a comunidade surda como a FENEIS
(Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos), CBDS (Confederação
Brasileira de Desportos de Surdos), associações de surdos, etc. além de escolas de
surdos, igrejas, e alguns pontos de encontro determinado pelos grupos de surdos.
Enfatiza-se que a escola de surdos e/ou bilíngue é um espaço importante pois é
onde começa o encontro com outros surdos. O encontro surdo-surdo possibilita uma
forma de viver positivamente a condição de ser surdo. Quando isolados e estando junto
somente com ouvintes, os surdos se veem como inferiores, incompletos. Hoje em dia,
com a expansão e aprimoramento de tecnologias, existem muitas comunidades surdas,
via internet, através de redes sociais.
Nas comunidades surdas, existem líderes e militantes da causa surda, do orgulho
surdo e umas das “regras” é a utilização e valorização da língua de sinais. Há também
comunidades surdas somente com surdos oralizados que fazem seus movimentos
exigindo os direitos do jeito deles e a língua de sinais não é contada como fator
principal.
No dia 26 de setembro, a comunidade surda brasileira, comemora o Dia
Nacional do Surdo, data em que são relembradas as lutas por direito de cidadania como
melhor trabalho, educação, saúde. Essa data foi escolhida pelo fato da primeira escola
para surdos ser inaugurada no mesmo dia, em 1857, com o nome de Instituto Nacional
de Surdos Mudos do Rio de Janeiro, atual INES (Instituto Nacional de Educação de
Surdos). Já a Federação Mundial dos Surdos (WFD – World Federation Deaf)4 celebra
no 30 de setembro.
Em Porto Alegre/RS, a associação de surdos é chamada de Sociedade dos
Surdos do Rio Grande do Sul (SSRS)5, foi fundada em 14 de abril de 1962 e se localiza
na rua Dr. Salvador França, 1800, no bairro Jardim Botânico.
3 - MOVIMENTO, HISTÓRIA E EDUCAÇÃO DE SURDOS
4 http://wfdeaf.org/5 www.ssrs.org.br
Fragmentos da História da Educação e Movimento dos Surdos
Século XVI Primeiras tentativas de educação dos surdos. Girolamo Cardano (1501-1578) retira o conceito de que o surdo não pode ser ensinado.
1520-1584 Pedro Ponce de Leon, monge beneditino (Espanha), é o primeiro educador a desmutizar surdos.
1750 O abade Charles Michel de L’Epée inicia a instrução formal de duas crianças surdas, com grande êxito. Em 1760, transforma sua casa na primeira escola pública para surdos (Instituto de Surdos e Mudos em Paris), utilizando uma abordagem através da língua de sinais.
1745-1751 O abade Etienne François Dechamps, também na França, abre em sua casa uma escola para crianças surdas, utilizando uma abordagem gestualista, e publica diversos trabalhos.
1815 Thomas Hopkins Gallaudet visita o abade L’Epée com o objetivo de conhecer seu trabalho. Convida um dos melhores alunos (Laurent Clerc) para implantar nos Estados Unidos o ensino a surdos utilizando a Língua de Sinais. Fundam a primeira escola americana para surdos em Connecticut, em 1817.
1857 Eduard Huet, professor de francês surdo, convidado por D. Pedro II, cria no Rio de Janeiro o Instituto Nacional dos Surdos-Mudos – INSM6. Começa provisoriamente em uma sala do Colégio Wassiman (no centro do Rio de Janeiro), com duas crianças surdas.
1864 Criada nos Estados Unidos a Universidade Nacional para Surdos-Mudos, hoje Universidade Gallaudet[3].
1880 Congresso Internacional de Educadores de Surdos realizado em Milão, na Itália. Graham Bell usa todo o seu prestígio na defesa do Oralismo. Juan Jacob Valade Gabel, professor do Instituto de Paris, apresenta um método de educação visando a eliminar os gestos e as Línguas de Sinais. Trava-se grande disputa. Os professores surdos são excluídos da votação. O Oralismo vence com a recomendação da proibição oficial do uso das Línguas de Sinais nas escolas.
1960 Willian Stokoe, nos Estados Unidos, publica o primeiro estudo linguístico sobre a ASL, demonstrando que é uma língua com todas as características equivalentes às das línguas que se utilizam da modalidade oral.
Década de 1960
Dorothy Shifflet, professora secundária, mãe de menina surda, descontente com os métodos oralistas, começa a utilizar um método combinado de linguagem sinalizada, fala, leitura labial e treino auditivo, numa escola na Califórnia, denominando seu trabalho de Total Approach – conhecida como Comunicação Total.
6 Hoje Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), situado na Rua das Laranjeiras, 232, Rio de Janeiro.
1969 Eugênio Oates, missionário americano, faz a primeira tentativa de registrar a Língua de Sinais Brasileira. Publica um pequeno dicionário de Sinais o qual vem a ser o primeiro ato de atenção à Língua de Sinais em nosso país.
1977 Criado no Rio de Janeiro a Federação Nacional de Educação e Integração dos Deficientes Auditivos, FENEIDA, com diretoria de ouvintes.
Final da década de 70
Introduzida a Comunicação Total no Brasil pela professora Ivete Vasconcelos, fundadora da Escola Santa Cecília, escola especial particular para surdos, sob a influência do Congresso Internacional de Gallaudet.
1983 Criação no Brasil da Comissão de Luta pelos Direitos dos Surdos.
1981 Início das pesquisas sistematizadas sobre a Libras no Brasil. Na 33ª Reunião Anual da SBPC, em Salvador (BA), pela primeira vez a linguista Lucinda Ferreira Brito fala sobre Bilinguismo para surdos.
1986 O Centro SUVAG (PE) faz sua opção metodológica pelo Bilinguismo, tornando-se o primeiro lugar no Brasil em que efetivamente esta orientação passou a ser praticada.
1987 Criação da Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (FENEIS), em 16/05/1987, sob a direção de surdos.
1991 A Libras é reconhecida oficialmente pelo Governo do Estado de Minas Gerais (lei nº 10.397 de 10/1/91).
1996 Iniciam-se pesquisas e estudos sobre a Educação de Surdos no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS. Funda-se o NUPPES (Núcleo de Pesquisas em Políticas Educacionais para Surdos), sob a orientação do Prof. Carlos Skliar.
1996 Instala-se, em Porto Alegre, um escritório regional da FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos), que tem sede no Rio de Janeiro.
1999 A Libras é oficializada no Rio Grande do Sul (lei nº 11.045, publicada no Diário Oficial do Estado do dia 31 de dezembro de 1999).
2005 Decreto nº 5.626/05 - Regulamenta a Lei 10.436 que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras
2006 UFSC oferece o primeiro curso superior de Letras/ Libras (turma pioneira), na modalidade EAD para 9 polos formando professores especificamente para ensino de Libras.
2008 A disciplina de Libras começa a ser oferecida como obrigatória em cursos de Licenciatura na UFRGS
2011 Nos dias 19 e 20 de maio, compareceram mais de 1000 surdos em
Brasília solicitando escola bilíngue após ameaça de fechamento do INES. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=seZsYxhVnfA
2014 Aprovado a oferta e garantia da escola bilíngue para surdos e deficientes auditivos no PNE - Plano Nacional de Educação.
* Maiores detalhes históricos se encontra na apostila da disciplina História da Educação de Surdos do curso de Letras/ Libras, UFSC. Disponível em: http://www.Libras.ufsc.br/colecaoLetrasLibras/eixoFormacaoEspecifica/historiaDaEducacaoDeSurdos/assets/258/TextoBase_HistoriaEducacaoSurdos.pdf
3.1 - Teorias da educação dos surdos
Para situar que há ou houve diferentes teorias sobre a educação de surdos e
como ela foi influenciada.
ORALISMO COMUNICAÇÃO TOTAL EDUCAÇÃO BILÍNGUE
Nesta teoria o ensino formal
colocava o professor como
superior sem que os alunos
pudessem se manifestar
livremente. A metodologia de
ensino era fixa, assim como a
avaliação. Os alunos surdos
tinham que aprender a
oralizar, repetindo
exaustivamente as falas do
professor.
Diante do visível fracasso do
Oralismo percebeu-se a
necessidade de mudanças. A
sociedade passa a ter mais
atenção à diversidade e
diferença, o que favorece a
educação de surdo; levando as
escolas a adotarem a língua
de sinais e a comunicação
total. Esta se mostra como
uma junção da língua de
sinais com a língua oral a fim
de se ter um possível meio
facilitador para o aprendizado
da língua oral. É preciso
lembrar que esta modalidade
pode gerar conflitos, visto as
A diversidade e o
multiculturalismo se fazem
presentes através da
identidade, alteridade,
subjetividade, etc. E isto irá
influenciar a educação de
surdos. Na educação bilíngue
os surdos reivindicam uma
educação na qual todos os
alunos surdos sejam
ensinados através da língua de
sinais e a língua portuguesa
como segunda língua (através
da escrita). Respeita assim a
língua natural dos surdos
tanto no ambiente social
quanto educacional.
diferenças linguísticas da
Libras e da língua portuguesa.
3.2 - Políticas, movimento surdo e legislação
Visando melhorias, observa-se uma crescente política, tanto linguística quanto
social, em prol dos direitos dos surdos e da língua de sinais. É bom lembrar que nem
sempre foi assim e por muitos anos os surdos foram marginalizados e deixados a parte
do processo social e educacional.
A identidade surda, historicamente, foi reprimida dentro da cultura ouvinte,
onde os surdos não podiam expor normalmente sua língua e cultura. Reprimida pelos
médicos, familiares, a escola e outros que não aceitavam e ainda, alguns, não aceitam a
falta da audição, muitos procuram por métodos de normalização, como correção através
de cirurgias, medicações, treinamento fonoaudiólogo, prótese auditiva e implante
coclear, na esperança de que esses artefatos possam ser eficazes para tornar o sujeito
surdo parecido com os que ouvem.
A educação de surdos está marcada por estas tentativas normalizadoras desde o
momento em que a língua de sinais foi proibida no século XIX, e hoje, mesmo diante da
força dos movimentos surdos para que a língua seja respeitada, há uma aceitação sutil
desta língua, porém com status inferior à língua oral.
Para os surdos a língua de sinais e uma educação bilíngue são necessárias e
fundamentais para dar continuidade ao processo linguístico, histórico, identitário e
cultural desta comunidade.
Atualmente, os sujeitos surdos ainda batalham para serem vistos e reconhecidos
como diferentes, não deficientes. Algumas conquistas como a Lei e o Decreto de
Libras7, publicações de literatura surda, educação bilíngue etc. já foram conquistadas,
mas são anos de permanente luta, de perdas e ganhos em que os discursos mudam a
cada época. Antes os sujeitos surdos eram vistos numa lógica de que deveriam saber
oralizar, hoje os surdos são orientados com diferentes visões dependendo dos discursos
que subjetivam.
7 Lei Federal 10.436 de 24 de abril de 2002, e Decreto Federal 5626 de 22 de dezembro de 2005
3.2.1 - Lei de Libras
Segue, em anexo, nesta apostila a lei de Libras8 para conhecimento e
compreensão. Observa-se nesta lei não somente o que ela rege, mas o grau de
importância para a difusão da Libras como língua da comunidade surda.
Pode-se dizer que a lei de Libras é fato recente embora sua reivindicação seja
antiga. Foram mais de 25 anos de luta para que a lei fosse oficializada.
3.2.2 - Decreto
O Decreto de Libras9 regulamenta a lei descrita anteriormente e amplia os
saberes sobre a língua de sinais e seus contextos. E através deste Decreto, a criação da
disciplina de Libras foi efetivada nas universidades.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, e o art. nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm. Acesso em: 10 de jul de 2011. BRASIL. Lei n.º 10.436 de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10436.htm. Acesso em 10 de jul de 2014. BRITO, Lucinda Ferreira. Por uma gramática de Língua de Sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; UFRJ, Departamento de Lingüística e Filologia, 1995. FROMKIN, V. & RODMAN, R. An Introduction to Language. Forth Worth: 5ª ed., Harcourt Brace Jovanovich College, 1993. HALL, Stuart. The Work of Representation. In: HALL, Stuart.(Org.) Representation. Cultural Representations and Signifying Practices. Sage/Open University: London/Thousand Oaks/New Delhi, 1997KARNOPP, L. B. Aquisição do parâmetro configuração de mão na Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS): estudo sobre quatro crianças surdas, filhas de pais surdos. Porto Alegre, PUC: Dissertação de Mestrado, 1994.
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