sr. francisco josé eguiguren praeli relator sobre os...

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1 20 de outubro de 2017 Sr. Francisco José Eguiguren Praeli Relator sobre os Direitos dos Povos Indígenas Comissão Interamericana de Direitos Humanos Organización de los Estados Americanos Sr. Paulo Abrão Secretário Executivo Comissão Interamericana de Direitos Humanos Assunto: audiência Situação de direitos humanos dos povos em isolamento voluntário e contato inicial na Amazônia e o Gran ChacoPrezados Srs. Francisco José Eguiguren Praeli e Paulo Abrão: As organizações indicadas se dirigem respeitosamente à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, com a finalidade de entregar relatório sobre a situação de direitos humanos dos povos em isolamento voluntário e contato inicial no Brasil, tema que será abordado durante a audiência convocada para o dia 23 de outubro de 2017, na cidade de Montevidéu, durante o 165º Período de Sessões da CIDH. I. INTRODUÇÃO Há pouco menos de 30 anos o Estado brasileiro viveu um importante ponto de inflexão em sua relação histórica com os povos indígenas. Se no plano geral a promulgação da Constituição Federal de 1988 em 08 de outubro de 1988 consagrou o fim da ditadura civil- militar e foi o mais importante marco no processo de redemocratização do país, no que diz respeito aos povos indígenas significou a ruptura com o paradigma da tutela e com a perspectiva integracionista que pautavam as políticas públicas dirigidas aos povos indígenas até então. No que concerne especificamente aos povos indígenas isolados e de recente contato, em 1987 já havia sido operada internamente à Fundação Nacional do Índio (Funai) uma mudança crucial de orientação na ação indigenista até então adotada por este órgão de Estado (e, anteriormente, pelo Serviço de Proteção ao Índio SPI). Diante das graves consequências das práticas de “atração” e de inúmeros contatos forçados promovidos pelo Estado ao longo de

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20 de outubro de 2017

Sr. Francisco José Eguiguren Praeli Relator sobre os Direitos dos Povos Indígenas

Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Organización de los Estados Americanos

Sr. Paulo Abrão Secretário Executivo

Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Assunto: audiência “Situação de direitos

humanos dos povos em isolamento voluntário e

contato inicial na Amazônia e o Gran Chaco”

Prezados Srs. Francisco José Eguiguren Praeli e Paulo Abrão:

As organizações indicadas se dirigem respeitosamente à Comissão Interamericana de

Direitos Humanos, com a finalidade de entregar relatório sobre a situação de direitos humanos

dos povos em isolamento voluntário e contato inicial no Brasil, tema que será abordado durante

a audiência convocada para o dia 23 de outubro de 2017, na cidade de Montevidéu, durante o

165º Período de Sessões da CIDH.

I. INTRODUÇÃO

Há pouco menos de 30 anos o Estado brasileiro viveu um importante ponto de inflexão

em sua relação histórica com os povos indígenas. Se no plano geral a promulgação da

Constituição Federal de 1988 em 08 de outubro de 1988 consagrou o fim da ditadura civil-

militar e foi o mais importante marco no processo de redemocratização do país, no que diz

respeito aos povos indígenas significou a ruptura com o paradigma da tutela e com a perspectiva

integracionista que pautavam as políticas públicas dirigidas aos povos indígenas até então.

No que concerne especificamente aos povos indígenas isolados e de recente contato, em

1987 já havia sido operada internamente à Fundação Nacional do Índio (Funai) uma mudança

crucial de orientação na ação indigenista até então adotada por este órgão de Estado (e,

anteriormente, pelo Serviço de Proteção ao Índio – SPI). Diante das graves consequências das

práticas de “atração” e de inúmeros contatos forçados promovidos pelo Estado ao longo de

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décadas – que causaram centenas de mortes e até mesmo o desaparecimento de povos inteiros –,

um grupo de sertanistas propôs aquelas que seriam as bases para a institucionalização da política

de proteção de povos indígenas isolados, tendo como diretrizes fundamentais o imperativo do

não-contato e o desenvolvimento de ações de proteção territorial. Data deste momento o

conjunto de portarias que instituiu o Sistema de Proteção ao Índio Isolado, aprimorado

posteriormente por meio de outros atos administrativos do órgão indigenista e decretos

relacionados à estrutura do órgão indigenista1.

Todo o conjunto de práticas acumulado e empregado até então pelo Estado para contatar

povos ou grupos em isolamento foi reorientado para o desencadeamento de ações visando à sua

localização e proteção territorial em respeito à manifesta recusa destes povos/grupos em

estabelecer contatos permanentes. Essa mudança de perspectiva foi sendo gradativamente

incorporada e aprimorada ao longo dos anos subsequentes e teve como principais resultados o

avanço expressivo no processo de investigação e sistematização de informações sobre povos

indígenas isolados, consolidando uma metodologia que é ainda hoje referência no tema; a

constituição de Frentes de Proteção Etnoambiental em substituição às antigas Frentes de

Atração e Frentes de Contato; a ampliação de ações permanentes de proteção territorial em

diferentes regiões da Amazônia brasileira; e avanços na regularização fundiária de terras

indígenas com a presença confirmada de índios isolados.

No que diz respeito às políticas de pós-contato, embora ainda restem desafios imensos

para o seu desenvolvimento e implementação à luz dos direitos inaugurados com a Constituição

Federal de 1988, também houve avanços significativos – atestados, por exemplo, pela

baixíssima mortalidade verificada nos processos de contato ocorridos desde 1996, em

comparação com inúmeros contatos promovidos pelo órgão em décadas anteriores.

Esse conjunto de mudanças conferiu ao Brasil papel de liderança no desenvolvimento

de políticas públicas de proteção e promoção de direitos de povos indígenas isolados, inspirando

outros países na América do Sul e servindo de importante referência em processos de consulta

que subsidiaram a elaboração de recomendações e diretrizes sobre o tema no plano

internacional2.

1 Em ordem cronológica: Portaria Funai nº 1900/87, que estabelece as diretrizes para o então Departamento de Índios

Isolados – DII (substituída pela Portaria Funai nº 281/2000); Portaria Funai nº 1901/87, que cria o Sistema de

Proteção ao Índio Isolado – SPII e aprova competência do então Departamento de Índios Isolados (substituída pela

Portaria Funai nº 290/2000, que estabelece que a execução da política de localização e proteção de índios isolados

seja efetivada pela Frentes de Proteção Etnoambiental, dentre outras providências); Portaria Funai nº 1047/88, que

regulamenta o Sistema de Proteção ao Índio Isolado; Portaria Funai nº 277/2000, de 20 de abril de 2000, que altera a

nomenclatura das Frentes de Contato para Frentes de Proteção Etnoambiental; Portaria Funai nº 230/2006; que

constitui o Comitê de Gestão com a finalidade de apoiar, coordenar e assessorar nas atividades, a nível nacional,

pertinentes à localização e proteção dos grupos indígenas isolados e de recente contato; Decreto nº. 7056, de 28 de

dezembro de 2009, que aprova o Estatuto e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções

Gratificadas da Fundação Nacional do Índio (substituído pelo Decreto nº 7.778, de 27 de julho de 2012); Portaria

Funai nº 501/2016, que institui o Conselho da Política de Proteção e Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas

Isolados e de Recente Contato; Portaria Funai n° 148/2017, que nomeia os membros do Conselho mencionado

anteriormente.

2 De que são exemplo os seminários e consultas realizados pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os

Direitos Humanos (ACNUDH) e Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que culminaram,

respectivamente, na elaboração das Diretrizes de Proteção para os Povos Indígenas em Isolamento e em Contato

Inicial da Região Amazônica, o Grande Chaco e a Região Oriental do Paraguai e no relatório Povos Indígenas em

Isolamento Voluntário e Contato Inicial nas Américas: Recomendações para o Respeito Integral a Seus Direitos

Humanos.

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É importante destacar que os avanços mencionados não se deram de maneira uniforme

em todas as regiões onde há informações sobre a presença de índios isolados no Brasil. O

número e a área de atuação das Frentes de Proteção Etnoambiental, por exemplo, sofreram

oscilações ao longo do tempo, deixando povos e respectivos territórios sujeitos a diversos tipos

de violência e pressão. Os avanços mencionados tampouco foram suficientes para reverter o

quadro de violações de direitos sofridas pelos povos/grupos indígenas isolados e de recente

contato no país.

As situações de alta vulnerabilidade dos povos isolados em toda a região amazônica são

em larga medida um dado estrutural em função do histórico de colonização e modelos de

desenvolvimento adotados pelos Estados nacionais, intimamente relacionados aos interesses

sobre os territórios indígenas por parte de setores do agronegócio, da grilagem e especulação

fundiária, da mineração, de empreendimentos de infraestrutura de modo geral e de diversas

cadeias produtivas ilícitas, além da ação proselitista missionária. Na atual conjuntura

nacional, contudo, tais setores ganharam força e institucionalidade, impondo retrocessos

no plano legislativo por meio de suas representações no Congresso Nacional e ocupando e

comandando setores estratégicos do governo federal especialmente afetos aos povos

indígenas no Brasil – o que motivou, inclusive, pedido de audiência por parte de um conjunto

amplo de organizações indígenas e da sociedade civil por ocasião do 162º Período de Sessões da

Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em 24 de maio de 2017, na cidade de

Buenos Aires3.

Como consequência, os efeitos dessas pressões sobre os povos indígenas e seus

territórios têm se agravado, resultando no aumento da violência e de violações de direitos

fundamentais destes povos. No caso específico dos povos/grupos indígenas isolados e de

recente contato tais efeitos são particularmente graves, verificando-se atualmente risco

iminente de genocídio em diferentes regiões da Amazônia brasileira.

II. POVOS INDÍGENAS ISOLADOS E DE RECENTE CONTATO NO BRASIL –

INFORMAÇÕES GERAIS

Atualmente o Estado brasileiro reconhece a existência de 113 registros de índios

isolados no Brasil (Tabela 1) 4. 'Registro' é a unidade básica utilizada pela Fundação Nacional

do Índio (Funai) no processo de investigação e sistematização de dados sobre a presença de

índios isolados. A metodologia de investigação utilizada pela Funai envolve pesquisa

documental e bibliográfica, levantamento de relatos junto a populações indígenas e não

indígenas, análise de imagens de satélite, sobrevoos e expedições em campo5.

3 Audiência “Mudanças em políticas públicas e leis sobre povos indígenas e quilombolas no Brasil”. Informações

detalhadas constam em relatório encaminhado à CIDH na ocasião.

4 Para mais informações, ver os seguintes documentos: “I Reunião do Conselho da Política de Proteção e Promoção

dos Direitos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato – Documento de subsídios”, CGIIRC/Funai,

Brasília, maio de 2017; e “Povos indígenas isolados em território brasileiro: documento de atualização do banco de

registros”, Fabrício Amorim, CGIIRC/Funai, maio de 2016. 5 Para maiores informações sobre a metodologia de localização de povos/grupos indígenas isolados desenvolvida e

utilizada no Brasil, bem como sobre o histórico da política de proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas

isolados e de recente contato, ver, além dos documentos citados na nota anterior, o documento “Isolados no Brasil –

Política de Estado: da tutela para a política de direitos - uma questão resolvida?”, de Antenor Vaz, Informe 10,

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Os registros são classificados de acordo com sua situação, que corresponde ao grau de

conhecimento que se tem sobre a presença de povos/grupos indígenas isolados em determinada

região, fruto de investigação sistemática realizada pelas Frentes de Proteção Etnoambiental

vinculadas à Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC/Funai). Dos

113 registros de índios isolados reconhecidos atualmente pelo Estado brasileiro, 26 são

Referências Confirmadas (ou seja, povos/grupos cuja existência foi administrativamente

comprovada); 26 são Referências em Estudo (quando há fortes evidências da existência de

povo/grupo indígena isolado em determinada região, no entanto ainda não comprovada); e 51

Informações (que correspondem a relatos previamente qualificados sobre a existência de índios

isolados em determinada região, mas que demandam investigação mais aprofundada para que

sejam considerados Referências em Estudo).

Tabela 1 - Registros de Índios Isolados no Brasil (quantitativo geral)6

Referências Confirmadas 26

Referências em Estudo 26

Informações 51

TOTAL 113

Atualmente há vinte terras indígenas no Brasil com presença confirmada de

povos/grupos indígenas isolados, todas no bioma Amazônia. Parte expressiva dos registros de

índios isolados que constam na base de dados da Funai ainda carece de estudos conclusivos

sobre a existência dos respectivos povos/grupos, bem como de ações protetivas por parte do

Estado (77 dos 113 registros reconhecidos pelo Estado atualmente). Destes 77 registros ainda

em fase de investigação pela Funai, 17 encontram-se fora de terras indígenas delimitadas,

em regiões com altas taxas de desmatamento e/ou afetadas por empreendimentos de

infraestrutura no norte do estado do Mato Grosso, no oeste do estado do Maranhão, no

centro-sul do estado do Pará e em Rondônia. A insegurança territorial também afeta

atualmente povos/grupos que se encontram em terras indígenas sob restrição de uso7 e que

aguardam a conclusão do processo de regularização fundiária.

IWGIA – 2011, disponível no endereço http://www.servindi.org/pdf/informe_10.pdf (acesso em 17 de outubro de

2017).

6 Adaptado do documento “I Reunião do Conselho da Política de Proteção e Promoção dos Direitos dos Povos

Indígenas Isolados e de Recente Contato – Documento de subsídios”, CGIIRC/Funai, Brasília, maio de 2017. 7 Instrumento previsto no Decreto 1.775, de 8 de janeiro de 1996 (que dispõe sobre o procedimento de demarcação de

terras indígenas no Brasil): “Art. 7° O órgão federal de assistência ao índio poderá, no exercício do poder de polícia

previsto no inciso VII do art. 1° da Lei n° 5.371, de 5 de dezembro de 1967, disciplinar o ingresso e trânsito de

terceiros em áreas em que se constate a presença de índios isolados, bem como tomar as providências necessárias à

proteção aos índios” (texto integral disponível no endereço http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D1775.htm,

acessado em 18 de outubro de 2017). Este instrumento é temporário e tem a finalidade de assegurar as condições

básicas para a reprodução física e cultural de povos/grupos isolados, bem como para o desenvolvimento de trabalhos

de localização de índios isolados e de estudos de identificação e delimitação no âmbito do processo de regularização

fundiária da terra indígena respectiva.

Fonte: Funai, 2017.

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III. RETROCESSOS NA POLÍTICA DE PROTEÇÃO DE POVOS INDÍGENAS ISOLADOS E DE

RECENTE CONTATO E VIOLAÇÕES DE DIREITOS

Verifica-se no presente um processo de enfraquecimento e precarização do órgão

indigenista sem precedentes desde pelo menos o processo de redemocratização do país. A

dotação orçamentária geral da Funai, que teve expressivo aumento entre 2006 e 2013 – de R$

475.981.373 para R$ 819.092.988, respectivamente – entrou em queda a partir de 2014,

chegando a R$ 553.031.192 em 20168, com graves consequências para a política indigenista

como um todo (Gráfico 1).

No que concerne à Coordenação Geral de Índios Isolados, o orçamento foi de R$

1.411.995 em 2006 (quando havia apenas 06 Frentes de Proteção Etnoambiental – atualmente

são 11), chegou a R$ 7.944.246 em 2014, caindo para R$ 3.584.089 em 2016 e R$ 2.657.699

em 2017 (Gráfico 2). Estimativa do governo federal indica que o orçamento em 2018 será

de R$ 2,2 milhões (23% a menos que 2017), quando seriam necessários pelo menos R$ 3,5

milhões para manter minimamente as atividades desenvolvidas pelas 11 Frentes de

Proteção Etnoambiental existentes hoje.

8 Fonte: Instituto Socioambiental, a partir de dados do Siop/Ministério do Planejamento, de 2017 (orçamentos anuais

apresentados correspondem à soma dos valores para custeio e investimentos reajustados, corrigidos pelo IPCA-

IBGE), disponíveis no endereço https://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-socioambientais/isolados-e-

desprotegidos (acessado em 18 de outubro de 2017).

Gráfico 1 - Orçamento da Funai (série histórica 2000-2017)

Fonte: Instituto Socioambiental, 2017 (a partir de informações do Siop/Ministério

do Planejamento). Orçamentos anuais apresentados correspondem à soma dos

valores para custeio e investimentos reajustados, corrigidos pelo IPCA-IBGE.

Gráfico 1 - Orçamento para proteção de povos indígenas isolados e de recente contato (série histórica 2000-2017)

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6

A situação é ainda mais grave diante da recente aprovação no Congresso Nacional da

Emenda Constitucional nº 95/2016, que institui novo regime fiscal e estabelece teto de gastos

públicos do governo federal nos próximos 20 anos. A Emenda limita os gastos dos poderes

executivo, legislativo e judiciário em 2017 à despesa primária paga no exercício de 2016,

corrigida em 7,2%9. Para os próximos 19 anos, os gastos não poderão ultrapassar o valor do

limite do ano anterior, corrigido pela inflação (medida pela variação do Índice de Preços ao

Consumidor Amplo – IPCA). Os impactos desta medida sobre a política indigenista são

brutais, uma vez que o patamar orçamentário da Funai que servirá de referência para os

próximos vinte anos já se encontra defasado em uma década e é insuficiente para que o

órgão cumpra minimamente sua missão institucional. Também é importante ressaltar a

desproporcionalidade dos cortes de gastos entre os diferentes setores do governo federal e

respectivas políticas públicas: em 2017, primeiro ano em que passou a vigorar a EC nº

95/2017, sequer foi garantida ao orçamento da Funai a correção inflacionária de 7,2% em

relação ao ano anterior.

Atualmente há 19 Bases de Proteção Etnoambiental (BAPE) em funcionamento,

vinculadas às 11 FPE. Destas, 03 têm contado com equipes apenas em caráter intermitente.

Cinco BAPE foram fechadas entre 2012 e 2014 em função de limitações financeiras e de

recursos humanos – uma delas, a BAPE Jandiatuba, era responsável pela proteção de indígenas

isolados em setor da TI Vale do Javari onde possivelmente ocorreu um massacre impetrado por

garimpeiros em agosto de 2017, caso que se encontra em investigação por parte do Ministério

Público Federal e Polícia Federal.

O quadro de recursos humanos do órgão indigenista, historicamente deficitário,

também tem sido gravemente impactado. No início de 2017 o Governo Federal extinguiu 87

cargos comissionados, impactando, sobretudo, Coordenações Técnicas Locais (CTL) e a

Coordenação Geral de Licenciamento Ambiental (CGLIC) do órgão10

. Entre os anos de 2011 e

2015, a CGIIRC realizou a análise e o acompanhamento de pelo menos 23 processos de

licenciamento ambiental de empreendimentos, subsidiando a CGLIC na elaboração de

manifestações técnicas. Atualmente há pelo menos 24 registros sobre a presença de povos

indígenas isolados em área de influência de projetos de infraestrutura – 07 destes

registros correspondem a povos/grupos isolados com existência confirmada pelo Estado

brasileiro. Além disso, 06 povos de recente contato são atingidos atualmente por

empreendimentos: Awá Guajá (duplicação da Ferrovia dos Carajás), Arara, Parakanã e

Araweté (Usina Hidrelétrica Belo Monte), Amondawa (Rodovia BR-429), Waimiri-Atroari

9 O texto integral da Emenda Constitucional nº 95/2016 está disponível no endereço

http://www2.camara.leg.br/legin/fed/emecon/2016/emendaconstitucional-95-15-dezembro-2016-784029-

publicacaooriginal-151558-pl.html (acessado em 19 de outubro de 2017). Informações sobre a tramitação da Proposta

de Emenda Constitucional nº 55/2016, que originou a EC 95/2016 estão disponíveis no endereço

https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/127337 (acessado em 19 de outubro de 2017). Para

uma análise mais detalhada sobre os cortes orçamentários na Funai e impactos da PEC 55 na política indigenista, ver

a “Nota técnica 190 - Orçamento e Direitos Indígenas na Encruzilhada da PEC 55”, do Instituto de Estudos

Socioeconômicos (Inesc), disponível no endereço http://www.inesc.org.br/noticias/biblioteca/publicacoes/notas-

tecnicas/nts-2016/nota-tecnica-190-orcamento-e-direitos-indigenas-na-encruzilhada-da-pec-55/view (acessado em 18

de outubro de 2017). Para uma análise das violações dos direitos indígenas promovidas pela política de austeridade

econômica adotada pelo Brasil no presente, ver páginas 62 a 75 da publicação “O Impacto da Política Econômica de

Austeridade nos Direitos Humanos”, da Plataforma DHESCA Brasil, disponível no endereço

http://austeridade.plataformadh.org.br/files/2017/10/publicacao_dhesca_preliminar_2_baixa.pdf (acessado em 18 de

outubro de 2017). 10 Decreto nº 9.010, de 23 de março de 2017, disponível no endereço http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-

2018/2017/Decreto/D9010.htm (acessado em 18 de outubro de 2017).

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7

(Linha de Transmissão Manaus-Boa Vista). O enfraquecimento de CTLs e da CGLIC impacta

diretamente a proteção destes povos, ao reduzir a capacidade da Funai de realizar análises

técnicas e de desenvolver ações junto aos mesmos.

Além dos cortes, os riscos inerentes ao trabalho nas FPE e a falta de regulamentação

para o exercício das atividades desenvolvidas têm provocado a evasão de servidores, seja por

desligamento ou por transferências para outras unidades do órgão. Apenas 62,5% dos 120

servidores que ingressaram na Funai em 2010 por meio de concurso público para atuar

especificamente nestas unidades do órgão encontram-se em serviço em 2017. A maioria das

BAPE existentes hoje só tem funcionado por contar com a dedicada colaboração de indígenas

e não indígenas, de caráter temporário e não raras vezes voluntária. Parte expressiva de

servidores da FPE na ativa, incluindo a maioria dos Coordenadores, não são funcionários do

quadro permanente do órgão e, portanto, encontram-se mais sujeitos a desligamentos

motivados por razões políticas.

Ingerências políticas sobre o órgão por parte das bancadas ruralista e evangélica no

Congresso Nacional, inclusive em áreas técnicas, também têm impactado a política de

proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas isolados e de recente contato. Na gestão

do presidente Michel Temer, o cargo de presidente do órgão tem sido abertamente negociado11

em troca de apoio no Congresso contra as graves denúncias de corrupção que recaem sobre o

presidente e o círculo de políticos mais próximos a ele, incluindo alguns de seus ministros.

O atual presidente e seu antecessor foram indicados pela bancada do Partido Social

Cristão (PSC) na Câmara dos Deputados, proeminente na bancada evangélica e historicamente

pouco afeita, senão contrária, às pautas prioritárias dos povos e organizações indígenas no

legislativo. A Diretoria de Proteção Territorial (à qual estão vinculadas as áreas técnicas

responsáveis pelo reconhecimento e regularização fundiária de terras indígenas, sua proteção e

monitoramento territorial e também a proteção e promoção de direitos de povos indígenas

isolados, além da coordenação geral de geoprocessamento) e a Ouvidoria do órgão são

atualmente ocupadas por indicações de parlamentares da ala mais radical da bancada ruralista

na Câmara dos Deputados12

– grupo político que tem promovido a criminalização de pessoas e

instituições que atuam na defesa e na afirmação de direitos indígenas no país.

A Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato também está sob

ameaça de ingerência política. Encontra-se em tramitação no órgão indigenista o pedido de

exoneração da atual Coordenadora Geral de Índios Isolados e de Recente Contato e da

11 A este respeito, ver as seguintes matérias: http://politica.estadao.com.br/blogs/coluna-do-estadao/na-verdade-funai-

e-do-psc-do-deputado-andre-moura-diz-ministro-da-justica/;

https://www.cartacapital.com.br/blogs/parlatorio/ministro-da-justica-admite-que-entregou-a-funai-ao-psc;

https://brasil.elpais.com/brasil/2017/04/20/politica/1492722689_804462.html;

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/05/1881355-exonerado-ex-chefe-da-funai-ataca-governo-e-fala-em-

ditadura.shtml; http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/05/1881397-serraglio-diz-que-ex-chefe-da-funai-demorou-

a-autorizar-obra-em-terra-indigena.shtml; http://trabalhoindigenista.org.br/funai-vive-uma-ditadura-diz-presidente-

exonerado/; http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/05/1882392-general-e-nomeado-para-presidir-a-funai.shtml

(acessadas em 18 de outubro de 2017).

12 A este respeito, ver as seguintes matérias: http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,servidora-acusada-de-

favorecer-porto-de-eike-batista-em-terra-indigena-e-indicada-para-a-funai,70001754741;

https://www.cartacapital.com.br/blogs/cartas-da-esplanada/governo-indica-envolvida-em-violacao-de-direitos-

indigenas-para-cuidar-da-demarcacao-de-terras-na-funai (acessadas em 18 de outubro de 2017).

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8

Coordenadora de Planejamento e Apoio às FPE, e de nomeação de indicações políticas para os

respectivos cargos.

Em carta divulgada em setembro de 2017, um conjunto amplo de servidores da

Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato e das Frentes de Proteção

Etnoambiental manifestou preocupação com o fato: “caso haja intenção real de nomeações

sem diálogo com as FPEs, como é de costume, e de pessoas sem o devido preparo técnico

necessário, consideraríamos que seria um desmonte técnico, ou eventual ingerência política

na CGIIRC e FPEs. (...) As ações de proteção territorial e de promoção de direitos são

norteadas por uma metodologia de trabalho extremamente criteriosa, consolidada ao longo de

30 anos e orientada por princípios como o do não contato, da precaução, da garantia da

posse plena e da proteção ambiental dos territórios indígenas. (...) Em especial, gostaríamos

de alertar Vossas Senhorias [Presidente e Diretora de Proteção Territorial da Funai]

sobre as consequências que as indicações meramente políticas na CGIIRC podem acarretar

para o bem-estar físico e cultural dos povos indígenas isolados e de recente contato no

Brasil, haja vista que alguns desses povos estão submetidos a situações vulnerabilidade

extrema, incluindo o risco de genocídio (por exemplo, nas TIs Vale do Javari - AM,

Araribóia-MA e Yanomami - RR e AM)”.

O documento também alerta para as graves consequências dos recentes cortes

orçamentários na Funai sobre povos indígenas isolados e de recente contato: “Conforme

proposta de distribuição interna de recursos para o Projeto de Lei Orçamentaria (PLOA) -

2018 encaminhada recentemente pela gestão da Funai, o orçamento previsto para a política

pública direcionada aos povos isolados e de recente contato, para o ano de 2018, será cerca

de 60% menor em comparação com a LOA de 2015 ficando, desta forma, bastante abaixo da

linha de cortes gerais da Funai. Nesse sentido, caso o orçamento destinado à

operacionalização das FPEs não seja imediatamente readequado em função de nossas

atribuições regimentais, ocorrerá o fechamento de Bases e paralisação geral das atividades

das FPEs, acarretando num aumento vertiginoso de invasões ilegais aos territórios

ocupados pelos povos indígenas isolados, sob atuação das FPEs, culminando em situações

de conflitos, massacres e de consequente genocídio dos povos indígenas isolados. Todos os

avanços pós-constitucionais e de reconhecimento da política indigenista brasileira serão

derrubados, colocando o Estado brasileiro definitivamente no quadro de países violadores

de direitos humanos. Será, sem dúvida, um dos maiores retrocessos da história indigenista

brasileira”13

.

A atual situação dos povos indígenas isolados e de recente contato no Brasil é de fato

extremamente grave. Em diferentes regiões da Amazônia brasileira verifica-se uma escalada de

violência alarmante. A seguir serão relatados alguns casos críticos que ilustram essa situação e

revelam, em seu conjunto, alguns dos principais desafios enfrentados para a proteção de povos

isolados e de recente contato no Brasil. Em vista da existência de 77 registros sobre a presença

de índios isolados que ainda não dispõem de investigações conclusivas, é possível que estejam

em curso neste momento muitos outros casos similares aos que por ora serão apresentados.

No Maranhão, isolados Awá têm sido severamente impactados pela ação madeireira e

incêndios florestais, sobretudo na Terra Indígena Arariboia. Entre 1988 e 2015, o Maranhão

13 Carta dos servidores das Frentes de Proteção Etnoambiental e da Coordenação-Geral de Índios Isolados e de

Recente Contato da Funai – 12 de setembro de 2017.

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9

teve 2,4 milhões de hectares (24 mil km2) de florestas desmatados; 21,7 mil hectares (217 km

2)

foram desmatados apenas no ano de 201514

. As poucas áreas de florestas preservadas no estado

do Maranhão concentram-se nas terras indígenas, que têm sido assoladas por incêndios

florestais nos últimos anos, com graves impactos sobre isolados15

. A TI Arariboia teve 225 mil

hectares queimados em 2015 (54,4% de sua área total). O fogo atingiu área habitada por

grupo em isolamento do povo Awa, que ficou encurralado. Durante os incêndios as

equipes de brigadistas encontraram diversos vestígios dos isolados (tapiris, utensílios,

rastros) 16

. Esta terra indígena permanece intensamente invadida por madeireiros e

impactada por incêndios florestais. Também foi constatada a dificuldade de oferta de água

potável para os indígenas isolados e há graves riscos de contatos e conflitos com

madeireiros. A atividade madeireira e incêndios florestais também têm grassado em outras

terras indígenas onde há registros de índios isolados no Maranhão: os incêndios de 2015

atingiram 75 mil hectares da TI Alto Turiaçu (14,1% de sua área); 67 mil hectares da TI Awa

(57,5% de sua área) e 11 mil hectares da TI Caru (6,3% de sua área), impactando, além dos

isolados, os povos Guajajara-Tenetehara, Ka’apor e Awa Guajá de recente contato.

Na TI Vale do Javari há fortes indícios de que tenha ocorrido um massacre de indígenas

isolados no rio Jandiatuba em agosto de 2017, impetrado por garimpeiros17

. Foi constatada a

atividade ilegal de garimpo de ouro no alto curso deste rio, em área habitada exclusivamente por

indígenas isolados cuja existência é comprovada desde a década de 1970 pelo Estado brasileiro.

Ao menos seis balsas foram identificadas dentro da terra indígena. Em sobrevoo realizado pela

Funai em conjunto com o Exército no mês de setembro, foi identificada uma balsa de

garimpo abandonada a poucos quilômetros de malocas e roçados de indígenas isolados;

tapiris e malocas haviam sido queimados recentemente e foram identificados pontos azuis

em um dos roçados (possivelmente pedaços de lonas plásticas), o que comprova a

ocorrência de interação entre garimpeiros e indígenas isolados e corrobora a hipótese de

conflitos com mortes de isolados. A investigação do caso pelo Ministério Público Federal e

Polícia Federal segue em curso. Caso seja confirmado, este será o mais grave crime de

genocídio conhecido na América do Sul desde o Massacre de Haximu, quando 16

Yanomami (incluindo crianças, velhos e mulheres) foram brutalmente assassinados por

garimpeiros brasileiros na Venezuela, em área fronteiriça com o Brasil – caso que foi apreciado

pela CIDH (Petição 11.745).

Passados 24 anos desde o referido massacre, a invasão garimpeira segue sendo o maior

problema enfrentado pelos Yanomami, provavelmente o mais populoso povo de recente contato

do mundo (apenas no Brasil vivem hoje cerca de 25 mil Yanomami, em mais de 240 aldeias).

Estima-se que há atualmente 4 mil garimpeiros atuando no interior da TI Yanomami, no

Brasil. As invasões aumentaram drasticamente após o fechamento das três Bases de

Proteção Etnoambiental da Funai: Serra da Estrutura, Demarcação e Korekorema. O

fechamento deixou o grupo isolado yanomami conhecido como Moxihathethea (cuja

existência é confirmada pelo Estado brasileiro) totalmente vulnerável à ação garimpeira

constatada nas imediações da Serra da Estrutura. As aldeias yanomami nos rios Mucajaí e

14 Dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento da Amazônia Legal (Prodes), 2016. 15 Para mais informações, ver http://boletimisolados.trabalhoindigenista.org.br/2016/03/22/estado-de-alerta-

incendios-no-ma-afetam-indigenas-e-acuam-isolados/ (acessado em 17 de outubro de 2017). 16 Ver http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&action=read&id=8410 (acesso em 17 de outubro de 2017). 17 Ver http://trabalhoindigenista.org.br/nota-de-repudio-acao-garimpeira-e-possivel-genocidio-de-indigenas-isolados-

no-rio-jandiatuba/ (acessado em 17 de outubro de 2017). O caso foi amplamente noticiado na imprensa nacional e

internacional.

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10

Uraricoera também se encontram extremamente vulnerabilizadas após a desativação das

BAPE Demarcação e Korekorema. Essa situação motivou o Ministério Público Federal a

propor uma Ação Civil Pública contra a União, a Funai e o Estado de Roraima para o a

reativação destas bases e o restabelecimento das atividades de proteção em caráter

permanente18

. Um dos trechos desta ação destaca que “[a] permanência de não índios nestes

locais exercendo o garimpo ilegal, viola o usufruto exclusivo dos indígenas [determinado pela

Constituição Federal de 1988], ocasiona graves interferências em seu modo tradicional de vida,

transmissão de doenças – como malária e DSTs -, exploração sexual, desorganização social,

além de prejuízo à paz da comunidade, especialmente de grupos isolados ou com pouco contato

com não índios”. O garimpo também têm causado graves danos ambientais e à saúde dos

Yanomami19

- a TI Yanomami detém os piores índices de mortalidade geral e infantil no Brasil.

No norte do Mato Grosso, especulações sobre a redução da TI Kawahiva do Rio Pardo

têm provocado aumento de invasões de grileiros e madeireiros20

. Após 17 anos desde a

publicação da primeira portaria de restrição de uso e de disputas judiciais, a TI Kawahiva do

Rio Pardo finalmente teve sua portaria declaratória publicada pelo Ministério da Justiça em 20

de abril de 201621

. Em abril de 2017, contudo, o então Ministro da Justiça e Segurança Pública,

Osmar Serraglio, sinalizou para uma comitiva composta por vereadores e pelo prefeito do

município de Colniza-MT que iria avaliar a portaria22

. Serraglio é um expoente parlamentar da

bancada ruralista na Câmara dos Deputados, onde foi relator da PEC 215. Em sua curta

passagem pelo ministério, deu declarações contrárias à demarcação de terras indígenas que

contribuíram para o acirramento de conflitos23

. Os rumores de que a TI Kawahiva do Rio

Pardo seria reduzida foram suficientes para desencadear disputas entre grileiros e

fazendeiros na região. O município de Colniza já liderou a lista de municípios com maior

índice de homicídios no país, no início dos anos 2000, e recentemente foi palco de uma chacina

que vitimou brutalmente 09 trabalhadores rurais em disputas por terra24

. A invasão de

madeireiros a partir do distrito de Guariba tem se intensificado no presente e representa

sério risco à vida dos isolados Kawahiva. Os dois últimos sobreviventes Piripkura

Kawahiva também têm enfrentado o aumento de invasões de madeireiros em seu

território, que se encontra desde 2008 sob sucessivas portarias de restrição de uso.

Entre 2014 e 2015 ocorreram 04 processos de contato no Brasil. O primeiro deles

ocorreu em junho de 2014, na TI Kampa e Isolados do Rio Envira, estado do Acre, na região de

fronteira Brasil-Peru. Um grupo até então conhecido como "Isolados do Xinane" (em alusão ao

18 Ver http://www.mpf.mp.br/rr/sala-de-imprensa/noticias-rr/mpf-propoe-acao-para-reativar-bases-de-protecao-

etnoambiental-da-terra-yanomami (acesso em 18 de outubro de 2017). 19 Ver https://brasil.elpais.com/brasil/2017/04/20/politica/1492722067_410462.html e

https://brasil.elpais.com/brasil/2014/12/26/politica/1419618934_407302.html (acessados em 18 de outubro de 2017). 20 Ver https://povosisolados.wordpress.com/2017/05/27/especulacoes-sobre-diminuicao-da-ti-kawahiva-do-rio-pardo-

acirra-conflitos-e-disputas-por-terras-na-regiao/ (acesso em 17 de outubro de 2017). 21 Portaria nº 481, de 19 de abril de 2016, disponível no endereço

http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=41&data=20%2F04%2F2016. Para mais

informações, ver http://boletimisolados.trabalhoindigenista.org.br/2016/05/02/isolados-do-rio-pardo-a-historia-de-

sobrevivencia-do-ultimo-grupo-kawahiva/, http://www.funai.gov.br/index.php/comunicacao/noticias/3727-mj-

declara-as-terras-indigenas-estacao-parecis-mt-kawahiva-do-rio-pardo-mt-sissaima-am-e-murutinga-tracaja-am,

https://globoplay.globo.com/v/2754692/ e https://globoplay.globo.com/v/2757398/ (acessados em 17 de outubro de

2017). 22 Ver http://racismoambiental.net.br/2017/04/11/revelado-plano-genocida-para-abrir-territorio-de-tribo-isolada-na-

amazonia/ (acessado em 17 de outubro de 2017). 23 Ver http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/03/1865209-ministro-da-justica-critica-indios-e-diz-que-terra-nao-

enche-barriga.shtml (acessado em 17 de outubro de 2017). 24 Ver https://g1.globo.com/mato-grosso/noticia/mp-denuncia-cinco-por-chacina-que-matou-nove-trabalhadores-

rurais-em-colniza-mt.ghtml (acessado em 17 de outubro de 2017).

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11

nome de um afluente do rio Envira) travou contato com indígenas Ashaninka e, em seguida,

com a Funai25

. A partir da década de 2000 houve um aumento expressivo da atividade

madeireira e do narcotráfico no lado peruano desta região de fronteira, inclusive em áreas

protegidas, como o Parque Nacional Alto Purus e a Reserva Territorial Murunahua (criada para

a proteção de indígenas isolados). A TI Kampa e Isolados do Rio Envira também foi invadida:

em 2011, a equipe da FPE Envira teve que abandonar a BAPE Xinane em razão da presença de

um grupo de narcotraficantes fortemente armados no local; um narcotraficante de origem

portuguesa chegou a ser preso em duas ocasiões ao tentar passar por esta terra indígena, vindo

do Peru26

. Estes indígenas de recente contato do Xinane (34 atualmente) relataram a

ocorrência de conflitos com homens que portavam armas de fogo, que teriam vitimado

membros de seu grupo. Também há evidências de que conflitos entre diferentes

povos/grupos isolados nesta área de fronteira entre o Brasil e o Peru estão sendo

potencializados pela ação de narcotraficantes e madeireiros.

Em dezembro de 2014, duas mulheres e um homem do povo Awa que viviam isolados

foram encontrados por indígenas Awa de recente contato da aldeia Awa, na TI Caru (estado do

Maranhão), durante uma caçada. As duas mulheres apresentavam sintomas de gripe,

estavam febris e extremamente debilitadas (uma delas pesava 38 kg na ocasião).

Relataram estar em constante fuga de madeireiros que atuam ilegalmente na TI Caru,

bem como de outro grupo familiar Awa que ainda vive em isolamento e com o qual teriam

ocorrido relações de agressão. Após o contato, passaram a viver nas aldeias Awa e Tiracambu,

na TI Caru. As duas mulheres foram diagnosticadas com tuberculose e em maio de 2015 foram

removidas para São Luís, onde permaneceram em tratamento durante meses. Em julho de 2016

as duas mulheres decidiram "isolar-se" novamente, deixando a aldeia Tiracambu para viver na

mata. Recentemente uma delas foi encontrada novamente por indígenas Awa de recente contato,

também durante uma caçada. A outra mulher faleceu por causa ainda desconhecida,

provavelmente associada ao seu quadro de saúde que já era bastante debilitado. A TI Caru segue

sofrendo intensa ação madeireira.

Em setembro de 2014 um grupo de seis pessoas do povo Korubo foi contatado por

indígenas Kanamari nas proximidades da aldeia Massapê, no rio Itaquaí, Terra Indígena Vale do

Javari. Em outubro do mesmo ano ocorreu o contato com os outros 15 membros deste mesmo

grupo, na mesma região do rio Itaquaí. Este segundo contato foi realizado por equipe da Funai,

com a participação ativa dos Korubo contatados anteriormente. O grupo contatado relatou ter

havido mortes por doenças no período que antecedeu os dois eventos de contato,

provavelmente associadas às frequentes invasões de pescadores e no rio Itaquaí. Uma

equipe da Funai constatou que seus roçados haviam sido abandonados. Após o contato, o grupo

passou a viver no rio Ituí, com os Korubo contatados em 1996, com os quais têm relações

próximas de parentesco.

No final de 2014 ocorreram conflitos entre indígenas Matis e outro grupo isolado do

povo Korubo na bacia do rio Coari, com mortes de ambos os lados. Nas últimas décadas

ocorreram rearranjos territoriais envolvendo estes dois povos. Desde meados da década de 2000

esse processo envolveu mudanças de aldeias e diversos encontros e interações entre os Matis e

25 Ver http://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2014/08/funai-suspeita-que-indios-isolados-buscaram-contato-apos-

agressao.html e http://boletimisolados.trabalhoindigenista.org.br/2015/12/09/envira-das-correrias-aos-projetos-de-

integracao-economica/ (acessado em 17 de outubro de 2017). 26 Ver http://apiwtxa.blogspot.com.br/2011/08/segue-tensao-na-fronteira-brasil-peru.html (acessado em 17 de outubro

de 2017)

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12

os Korubo no Coari27

. Ambos os povos têm relações imbricadas, envolvendo guerras, raptos e

outras modalidades de troca ao longo de sua história. Embora a Funai tenha monitorado as

dinâmicas territoriais dos dois povos e acompanhado esse processo nos últimos anos, a

precarização do órgão certamente contribuiu para o acirramento do conflito.

Em 2015 os Matis estabeleceram contato com 21 Korubo (o mesmo grupo com o qual

se deram os conflitos mencionados) entre as aldeias Tawaya e Bukuwak, no rio Branco. Após

intervir neste processo de contato, a equipe da Funai constatou grande apreensão dos Korubo de

permanecer junto aos Matis, em razão dos conflitos ocorridos anteriormente. Os Korubo

manifestaram o desejo de se juntar aos grupos contatados, o que ocorreu após período de

quarentena, seguindo protocolo rígido para a prevenção de surtos epidêmicos recorrentes em

casos de contato. Atualmente os grupos contatados em 1996, 2014 e 2015 estão vivendo nas

aldeias Talaoca e Tapalaya, no rio Ituí, e somam uma população de 82 pessoas. Tem sido

verificada alta incidência de malária entre eles.

Os contatos relatados põem em evidência a complexidade de contextos de vizinhança e

compartilhamento territorial entre isolados e “contatados” no presente, sobretudo em regiões

habitadas por diferentes povos, como é o caso do Vale do Javari. Embora os processos de

contato tenham possibilitado à Funai e à Sesai a elaboração de protocolos de atuação e Planos

de Contingência para cada caso, a falta de normatização e entraves burocráticos para

operacionalizar ações que demandam curto tempo de resposta ainda constituem sérios

obstáculos. Também é preciso que se assegure a qualificação das equipes e estrutura adequada

para o atendimento continuado à saúde junto a povos/grupos de recente contato.

Contudo, as transformações nas dinâmicas territoriais verificadas em diferentes

contextos na Amazônia brasileira demandam não apenas o fortalecimento orçamentário e de

recursos humanos de órgãos do Estado, mas um aprimoramento da política indigenista voltada à

proteção de povos/grupos isolados, o que passa pela ampliação do diálogo dessa política pública

com os povos, comunidades e organizações indígenas e suas políticas, bem como pela

ampliação da participação destes povos, comunidades e organizações não apenas nos trabalhos

de campo, mas nos espaços de tomada de decisão e de reformulação permanente dessa política e

das respectivas estratégias para a sua implementação28

. Infelizmente o que tem se verificado por

parte do Estado brasileiro é o esvaziamento e a paralização de espaços de participação dos

povos indígenas e organizações da sociedade civil nas políticas públicas, na contramão dos

desafios enfrentados em distintas regiões.

Na atual conjuntura brasileira a política de proteção de povos indígenas isolados e de

recente contato e os avanços obtidos nas últimas três décadas não se encontram apenas

ameaçados, mas em franca desconstrução, impossibilitando o enfrentamento de velhos e novos

desafios neste campo específico da política indigenista no Brasil. Como consequência, casos de

27 Para mais informações sobre essa questão, ver http://trabalhoindigenista.org.br/nota-do-cti-sobre-reivindicacao-

matis/ e https://povosisolados.wordpress.com/2017/06/18/nos-tapiris-korubo-uma-perspectiva-indigenista-das-

tensoes-e-distensoes-korubo-e-matis/ (acessados em 18 de outubro de 2017). 28 Essa questão foi tema central do encontro internacional “Olhares sobre as Políticas de Proteção aos Povos

Indígenas Isolados e de Recente Contato”, que reuniu representantes de diversos povos e organizações indígenas e da

sociedade civil da Colômbia, Brasil, Paraguai, Peru e Venezuela. Resultado das mesas de debate, grupos de trabalho e

discussões em plenária ao longo do evento, a Carta de Brasília – Manifesto em defesa dos povos indígenas isolados

e de recente contato na Bacia Amazônica e Gran Chaco apresenta um conjunto amplo de propostas (ver

http://trabalhoindigenista.org.br/encontro-olhares-sobre-as-politicas-de-protecao-aos-povos-indigenas-isolados-e-de-

recente-contato-reafirma-o-compromisso-pela-garantia-da-protecao/, acessado em 17 de outubro de 2017).

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violação de direitos fundamentais destes povos têm aumentado drasticamente, verificando-se

riscos reais de crimes de genocídio em diferentes regiões da Amazônia brasileira.

O ajuste fiscal e outras medidas que vêm sendo adotadas pelo atual governo para o

enfrentamento da crise econômica no Brasil têm impactado de maneira desproporcional os

povos indígenas, e servido de pretexto para promover o desmonte da política indigenista e dos

direitos indígenas, atendendo sobretudo interesses da bancada ruralista no Congresso Nacional,

mas também de setores da mineração, de infraestrutura e de grupos missionários.

Consideramos que o acompanhamento e a ação de organismos multilaterais como a

CIDH são de fundamental importância para frear este processo de deterioração dos direitos

humanos dos povos indígenas no Brasil, que tem efeitos particularmente graves sobre os

povos/grupos isolados e de recente contato. Neste sentido, a seguir apresentamos um conjunto

de recomendações de caráter urgente à CIDH.

IV. RECOMENDAÇÕES À COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS:

1. Que se inste o Estado Brasileiro a vedar cortes e o contingenciamento de recursos

destinados às ações de proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas isolados e

de recente contato, de responsabilidade do Ministério da Justiça e Segurança Pública e

executadas pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), por meio da Coordenação Geral

de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC) e Frentes de Proteção Etnoambiental

(FPE). Esta medida é fundamental porque, no caso específico dos povos indígenas

isolados e de recente contato, os sucessivos cortes e contingenciamentos orçamentários

impostos à FUNAI desde 2014 têm implicado não apenas retrocessos nas políticas

públicas, mas também graves violações de direitos humanos destas populações e o risco

iminente de genocídio em diferentes regiões da Amazônia brasileira – sendo as

situações de maior risco verificadas atualmente nas áreas de atuação da FPE Madeirinha

Juruena (Estado do Mato Grosso), da FPE Awa (Estado do Maranhão), da FPE Vale do

Javari (Estado do Amazonas) e da FPE Yanomami/Yekuana (Estado do Amazonas).

2. Que o Estado brasileiro adote a mesma medida acima recomendada visando à garantia

dos recursos destinados à Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) para o

atendimento à saúde dos povos indígenas, notadamente aqueles recursos destinados a

povos de recente contato e povos contatados que vivem em terras indígenas também

habitadas por povos indígenas isolados ou em terras contíguas a estas.

3. Tendo em vista os contatos ocorridos em 2014 e 2015 e a iminência de novos contatos

em diferentes regiões da Amazônia brasileira, é urgente que se inste o Estado brasileiro

a garantir os recursos financeiros e humanos necessários para a implementação de

planos de contingência e o adequado manejo de situações de contato e de surtos e

epidemias. Neste sentido, é fundamental que situações de contato sejam consideradas

casos emergenciais similares a outros casos de calamidade pública em que se dispõe de

mecanismos e instrumentos que agilizam a ação de órgãos de Estado.

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4. Que o Estado brasileiro, por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) e

da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), publique Portaria Conjunta que defina os

princípios, diretrizes e estratégias para a atenção à saúde dos povos indígenas isolados e

de recente contato, nos termos já consensuados entre os dois órgãos mencionados e

consolidados em redação pronta para assinatura e publicação; e que assegure as

condições para a sua imediata implementação.

5. Que se inste o Estado Brasileiro a reativar em caráter de urgência a Base de Proteção

Etnoambiental Jandiatuba, vinculada à Frente de Proteção Etnoambiental Vale do

Javari, na Terra Indígena Vale do Javari, face à gravíssima constatação de atividade de

garimpo em área habitada exclusivamente por índios isolados nesta terra indígena, à

constatação de interações entre garimpeiros e isolados nesta área que corroboram a

denúncia de possível massacre promovido por garimpeiros, bem como à iminência de

genocídio caso esta atividade ilícita não seja efetivamente coibida na bacia do rio

Jandiatuba.

6. Que medida similar seja adotada visando à reativação das Bases de Proteção

Etnoambiental Cautário e Mirante da Serra (vinculadas à FPE Uru-Eu-Wau-Wau);

Jacareúba/Katawixi, Piranha e Canuaru (vinculadas à FPE Madeira-Purus); e Serra da

Estrutura Demarcação e Korekorema (vinculadas à FPE Yanomami e Ye’kuana). E,

ainda, que sejam envidados esforços igualmente urgentes para o fortalecimento das

onze FPE existentes atualmente, bem como das Coordenações Regionais e respectivas

Coordenações Técnicas Locais cuja atuação também é fundamental para a proteção e

promoção dos direitos de povos indígenas isolados e de recente contato.

7. Que o Estado brasileiro seja exortado a concluir os processos de regularização fundiária

das terras indígenas com presença confirmada de povos indígenas isolados, a saber:

Terra Indígena Kawahiva do Rio Pardo, Terra Indígena Piripkura e Terra Indígena

Apiaká do Pontal e Isolados, no Estado do Mato Grosso; Terra Indígena Pirititi, no

Estado de Roraima; Terra Indígena Kaxuyana-Tunayana e Isolados e Terra Indígena

Ituna/Itatá, no Estado do Pará; Terra Indígena Igarapé Taboca do Alto Tarauacá, no

Estado do Acre; Terra Indígena Jacareúba/Katawixi, no Estado do Amazonas; e Terra

Indígena Tanaru, no Estado de Rondônia.

8. Que o Estado brasileiro assegure as condições necessárias para que a Fundação

Nacional do Índio desenvolva ações de qualificação e localização29

das 26 Referências

em Estudo e das 51 Informações sobre a presença de índios isolados, registros estes que

carecem de estudos conclusivos sobre a existência de índios isolados.

9. Que o Estado brasileiro destine recursos financeiros e humanos específicos para que o

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (IBAMA) e a Polícia

Federal desenvolvam ações de prevenção e combate a ilícitos em terras indígenas,

29 “Qualificação” e “Localização” correspondem às fases iniciais do processo de investigação e sistematização de

dados sobre a existência de povos indígenas isolados, de acordo com a metodologia adotada pelo Estado Brasileiro.

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especialmente naquela habitadas por povos indígenas isolados e de recente contato em

razão da alta vulnerabilidade destes povos.

10. Que o Estado brasileiro assegure e amplie a participação dos povos, comunidades e

organizações indígenas, bem como de outras organizações da sociedade civil, na

orientação e deliberação das políticas públicas dirigidas à proteção de povos indígenas

isolados e de recente contato. Neste sentido, é fundamental que sejam convocadas

reuniões regulares do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), criado por

meio do Decreto nº 8.593, de 17/12/15; e do Conselho da Política de Proteção e

Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato da

Fundação Nacional do Índio, criado por meio da Portaria nº 501/PRES, de 31/05/2016.

Atenciosamente,

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib

Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – Coiab

Centro de Trabalho Indigenista – CTI

ANEXO:

Mapa Geral de Registros de Índios Isolados no Brasil (Funai, 2017).

Page 16: Sr. Francisco José Eguiguren Praeli Relator sobre os ...apib.info/files/2017/10/2017-Relatorio_PIIRC_Brasil_vFinal.pdf · dezembro de 2009, que aprova o Estatuto e o Quadro Demonstrativo

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Anexo 1 - Mapa Geral de Registros de Índios Isolados no Brasil (Funai, 2017)