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SISTEMAS DE AERONAVES REMOTAMENTE PILOTADAS E O
CONTROLE DO ESPAÇO AÉREO: UMA ANÁLISE GEOPOLÍTICA.
Leonardo Haberfeld1
RESUMO
A proliferação dos Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas (RPAS) no espaço aéreo,
comumente denominados como drones, tem apresentado questionamentos e demandas cujas
magnitudes envolvem diversos setores da sociedade. Nesse contexto e à luz dos conceitos de
hard e soft power das relações internacionais, o Brasil não apresenta a adoção de políticas de
Estado que fomentem o desenvolvimento dos sistemas de aeronaves remotamente pilotadas
(RPAS) nos eixos militar, político e econômico. Tal ausência de ações políticas impede o
Estado brasileiro de utilizar essa nova tecnologia aeronáutica como ferramenta de influência
nas relações internacionais, sendo essa a conclusão do presente trabalho. Utilizando-se da
análise estruturalista qualitativa, ao conceber modelos explanatórios, para a modelagem do
cenário brasileiro no segmento aeronáutico não tripulado; o presente artigo buscou analisar a
atuação política do Estado brasileiro relacionada aos RPAS `luz dos conceitos de hard e soft
power por intermédio da revisão bibliográfica e documental. Por fim, o presente artigo
desenvolve-se na análise da inserção dos RPAS como ferramenta possível de ser utilizada nas
relações internacionais, das atuações dos Estados Unidos da América, da China e da União
Europeia, as quais têm sido proeminentes e influenciadoras dos rumos técnicos e operacionais
dos RPAS; e do cenário brasileiro no segmento aeronáutico não tripulado.
Palavras-Chave: Espaço Aéreo. Drone. Hard Power. Soft Power. Sistema de Aeronaves
Remotamente Pilotadas.
ABSTRACT
The proliferation of Remotely Aircraft Aircraft Systems (RPAS) in the airspace, commonly
known as drones, has presented questions and demands whose magnitudes involve several
sectors of society. In this context and considering the concepts of hard and soft power in
international relations, Brazil does not present the adoption of State policies that foster the
development of remotely piloted aircraft systems (RPAS) in the military, political and
economic axes. This absence of political actions prevents the Brazilian State from using this
new aeronautical technology as a tool of influence in international relations, which is the
conclusion of the present work. Using qualitative structural analysis, when designing
explanatory models, to model the Brazilian scenario in the unmanned aeronautical segment; the
present article sought to analyze the political action of the Brazilian State related to RPAS
considering the concepts of hard and soft power through the bibliographical and documentary
revision. Finally, the present article has developed in the analysis of the insertion of the RPAS
as a possible tool to be used in international relations, the actions of the United States of
America, China and the European Union, which have been prominent and influenced the
1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciências Aeronáuticas da Universidade da Força Aérea (PPGCA-
UNIFA). E-mail para contato: [email protected]
technical directions and operational aspects of the RPAS; and the Brazilian scenario in the
unmanned aeronautical segment.
Keywords: Airspace Control. Drone. Hard Power. Soft Power. Remotely Piloted Aircraft
Systems.
INTRODUÇÃO
Qualquer atividade que possa impactar nas operações aéreas ao redor do mundo, causa
grande preocupação e envolvimento por parte da Organização de Aviação Civil Internacional
(ICAO, do inglês International Civil Aviation Organization) no intuito de se mitigar essa
possibilidade e de manter os níveis de segurança e do fluxo da navegação aérea mundial nos
mais altos patamares de eficiência. Com esse objetivo, a ICAO institui para as diversas áreas
relacionadas à aviação recomendações e procedimentos padronizados internacionalmente,
denominados SARP (do inglês, Standards And Recommended Procedures), os quais atuam para
a promoção da padronização dos requisitos operacionais, da segurança e do desenvolvimento
eficiente do transporte aéreo, segundo a ICAO (2015a).
Em paralelo, a crescente demanda pelo emprego de Sistemas de Aeronaves Não
Tripuladas (UAS, do inglês Unmanned Aircraft Systems) ou Remotamente Pilotadas (RPAS,
do inglês Remotely Piloted Aircraft Systems), comumente conhecidos como drone, tem
preocupado Estados e Organizações quanto à segurança das operações no espaço aéreo, sejam
relacionadas aos possíveis impactos nas navegações aéreas ou às operações nas cercanias dos
aeródromos.
Esses novos vetores aéreos, em virtude das suas características, envolvem contingências
técnicas e operacionais que necessitam do envolvimento de várias entidades. Governos,
fabricantes, instituições acadêmicas e Organizações Não Governamentais, envolvem-se na
realização de testes, delineamento de concepções e desenvolvimento de tecnologias que
favoreçam a integração segura dos RPAS no espaço aéreo, não os segregando das aeronaves
tripuladas.
Na linha dessa evolução, os Estados Unidos da América (EUA), a China e a União
Europeia (UE) têm atuado de forma proeminente e investido tanto na fabricação de drones
militarizados quanto no desenvolvimento de concepções operacionais e de tecnologias que
permitam a interação dos drones com as aeronaves tripuladas e emprego em diversos segmentos
econômicos da sociedade civil. Tal investimento, ao se buscar o consentimento de uma
organização supranacional, como a ICAO, e influenciar a adoção de parâmetros técnicos e
operacionais concebidos por suas indústrias, ensejam, intrinsecamente, a constante busca por
poder, seja no campo tecnológico ou militar, permeando os conceitos de hard e soft power das
relações internacionais (RI)
Nesse contexto, surge o seguinte questionamento: qual o posicionamento político do
Estado brasileiro em relação a esse segmento aéreo, de forma a utilizar tal tecnologia, como
ferramenta de influência no seu entorno estratégico, na América do Sul, em relação aos
conceitos de hard e soft power?
Para tal, buscou-se a elucidação desse questionamento a partir da elaboração de três
Questões Norteadoras (QN):
QN1: Qual a relação existente entre os sistemas de aeronaves remotamente pilotadas e os
conceitos de hard e soft power das relações internacionais?
QN2: Como as principais potências mundiais têm tratado o assunto?
QN3: Como se encontra o cenário dos RPAS no Brasil?
Nesse contexto, o presente trabalho propôs-se, como objetivo geral, analisar a atuação
política do Estado brasileiro relacionada aos RPAS `luz dos conceitos de hard e soft power. Por
conseguinte, foram definidos os seguintes Objetivos Específicos (OE):
OE1: relacionar os RPAS com conceitos das relações internacionais;
OE2: discriminar as ações adotadas em relação aos RPAS por EUA, UE e China; e
OE3: discriminar as ações adotadas pelo Estado brasileiro em relação ao OE2.
Após a consecução dos OE, realizou-se análise da interação entre os OE para se atingir o
objetivo geral.
A relevância do presente trabalho reside na proposição de uma análise da necessidade da
adoção de políticas estatais para o fomento do segmento RPAS pelo Estado brasileiro no intuito
de se posicionar no cenário internacional, influenciando decisões técnicas no âmbito da ICAO e
delineando o emprego dos RPAS na América do Sul.
Outrossim, o presente artigo não esgota as possibilidades das análises supracitadas por,
ainda, se tratar de trabalho inicial para o desenvolvimento de uma pesquisa mais aprofundada no
assunto.
1. DESENVOLVIMENTO
1.1 METODOLOGIA
No presente artigo, realizou-se uma pesquisa descritiva, segundo Gil (2002), por ter
como objetivo descrever as características que relacionam os RPAS com os conceitos da teoria
realista das relações internacionais (RI) e as políticas adotadas por EUA, UE e China na
implementação do segmento aeronáutico não tripulado. Ademais, como pesquisa documental,
pois se utilizou de manuais técnicos e operacionais, da documentação utilizada pela ICAO e de
agências especializadas para tratar dos assuntos afetos aos RPAS. Outrossim, uma pesquisa
exploratória, pois buscou propiciar maior familiaridade com as tecnologias dos RPAS e seus
possíveis impactos nas relações internacionais.
Para a construção dos modelos representativos e o da relação entre as variáveis
estabelecidas e analisadas, utilizou-se da teoria do estruturalismo da pesquisa qualitativa, de
acordo com Thiry-Cherques (2006). O estruturalismo procura enfocar as resultantes da
atividade do campo observado, seno que uma vez reconhecidas estas resultantes, identifica-se
as operações que as produzem.
Entretanto, as tecnologias e os conceitos operacionais que envolvem o segmento em foco
são bastante diversos, caracterizando uma amplitude que prejudicaria a pesquisa. Dessa forma,
pretende-se limitar a pesquisa somente às ações que propiciem inferências acerca da relação entre
as políticas e ações adotadas inerentes a esse novo segmento aeronáutico e a correlação com os
conceitos de hard e soft power nas relações internacionais.
Nesse contexto e para consecução do OE1, buscou-se estruturar modelo que abrangesse
as características inerentes às tecnologias aeronáuticas do segmento não tripulado e sua relação
de influência no cenário global. Pois, “a cooperação em C&T2, além de avançar a fronteira do
conhecimento, possui potencial para fortalecer as relações entre os países” (DOMINGUES,
2015) e os significados dos conceitos, como segurança, soberania e poder, podem ser alterados
com os avanços tecnológicos, segundo Haas e Keohane (1993 apud WEISS, 2005. Tradução
nossa).
Afeto ao OE2, estruturou-se modelo com as principais ações adotadas por EUA, UE e
China para o provimento de capacidades para a operação dos RPAS em seus espaços aéreos e
de influência dos RPAS em suas economias . Buscou-se, assim, correlacionar tais ações com
aspectos inerentes à teoria realista e inferir as intenções de influência global desses três atores
2 C&T – Ciência e Tecnologia.
no segmento RPAS. Ademais, buscou-se a consecução do OE3 pela análise das atividades
desenvolvidas no Brasil correlacionados ao modelo constituído no OE2.
Por fim, analisou-se a correlação entre os modelos, permeando as ações adotadas,
delineando as possibilidades de aplicação dos conceitos das RI com a tecnologia dos RPAS,
utilizando-se da análise estruturalista, a qual “não revela a origem dos elementos nem o modo
como operam, mas as condições, as formas de relações, que se definem por sua sintaxe, isto é,
pelas leis de concordância, de subordinação e de ordem a que estão sujeitos os elementos, sendo
a prova do modelo a sua eficácia explicativa” (THIRY-CHERQUES, 2006, p.144), denotando
possibilidades para a análise qualitativa do cenário existente.
1.2 A EVOLUÇÃO DA AVIAÇÃO MUNDIAL E OS SISTEMAS DE AERONAVES
REMOTAMENTE PILOTADAS (RPAS)
O crescimento do segmento aeronáutico, a longo tempo, tem atuado como indicador
econômico, podendo causar impactos positivos ou negativos nas riquezas dos Estados.
Segundo a ICAO (2016), o segmento aeronáutico mundial emprega 58,1 milhões de pessoas,
direta ou indiretamente, e contribui com mais de US$ 2,4 trilhões para o Produto Interno Bruto
global. Dessa relação, entende-se que a inserção de novos sistemas aéreos, que possam vir a
impactar na segurança e no desenvolvimento da aviação mundial, carece de meticulosa
apreciação e análise.
Segundo O’Brien (2013), o crescente interesse na utilização de sistemas aéreos não
tripulados (Unmanned Aircraft Systems – UAS) tem gerado uma considerável preocupação
acerca da atuação no espaço aéreo desses equipamentos em relação às demais aeronaves. De
acordo com ICAO (2015b), preocupada com o desenvolvimento desse segmento na aviação
mundial, a ICAO estabeleceu o Grupo de Estudos para os Sistemas Aéreos Não Tripulados
(Unmanned Aircraft Systems Study Group – UASSG) em 2007, para prover marcos regulatórios
metaconstitucionais que auxiliassem os Estados signatários no trato desse novo usuário do
espaço aéreo. Em 2014, com os trabalhos desenvolvidos pelo UASSG e a crescente demanda
da utilização dos UAS, estabeleceu-se na ICAO o Remotely Piloted Aircraft Systems Panel
(RPASP), responsável por reunir representantes dos diversos Estados Signatários da ICAO,
Organizações Não Governamentais e de empresas multinacionais representativas na aviação
mundial para debaterem acerca da inclusão de recomendações regulatórias dos, agora
denominados, Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas (RPAS) nos Anexos e
documentos da ICAO. Ademais, a ICAO estabeleceu, conforme a ICAO (2016), orientações
acerca do desenvolvimento dos RPAS e sua interação com os demais usuários no espaço aéreo.
Em relação à evolução do segmento aeronáutico global e sua interação com o espaço
aéreo, diversos Estados criaram programas com o intuito de proverem meios e tecnologias para
a inserção dos novos conceitos e dos marcos regulatórios desenvolvidos pela ICAO. Como
exemplos desses programas para o aperfeiçoamento da navegação aérea e do uso do espaço
aéreo, tem-se o SESAR da EUROCONTROL na União Europeia, o NEXTGEN da FAA
(Federal Aviation Administration) nos EUA, o CAAMS (China’s Strategy for Modernizing Air
Traffic Management) da China, o SIRIUS do DECEA (Departamento de Controle do Espaço
Aéreo, Brasil), dentre outros atores globais, os quais “mapearam seu planejamento [...], a fim
de garantir a interoperabilidade global de curto e longo prazo de suas soluções para a navegação
aérea” (ICAO, 2016. Tradução nossa). Outrossim, todos os Estados detentores de tais
programas possuem representações no RPASP, com o objetivo de influenciarem a
determinação dos SARP e, dessa forma, estabelecerem parâmetros de forma global nesse
segmento. baseados nos interesses industriais dos respectivos Estados.
1.3 OS RPAS E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
De acordo com Posen (2003), a propriedade do espaço aéreo pertence ao país cujo
território é subjacente a esse volume de ar, contudo pouquíssimos Estados são capazes de negar
o uso de seus espaços aéreos acima de 15.000 ft. Essa afirmativa nos traz à tona a questão da
tríade força-poder-interesse, a qual segundo Castro (2012) compreende o entendimento da
criação do poder dos atores internacionais associada aos componentes da força e do interesse.
Podendo ser a variável força entendida como a capacidade dissuasória do Estado por uso da
violência material ou imaterial, segundo Castro (2012), e o interesse, pode-se inferir na
literatura, como o reflexo imaterial dos desejos precípuos do Estado.
Dessa correlação de poder, força e interesse, verificamos que a teoria realista das
relações internacionais nos apresenta justamente tais variáveis, mediante o desejo, ou interesse,
do Estado em sobreviver, pois “no caso do realismo clássico, [...], temos a recorrente abordagem
da segurança, da sobrevivência e da lógica de poder para tais fins na esfera interativa humana”
(CASTRO, 2012, p.315).
Ademais, Castro (2012) pontua que as forças armadas necessitam de serem bem
equipadas com armas de alto grau tecnológico e capacidade de destruição para a defesa da
soberania. Verifica-se, assim, que o interesse do Estado no aparelhamento tecnológico de suas
forças armadas advém da concepção realista da manutenção do poder no cenário político
internacional ou, em uma menor escala, no seu entorno estratégico, por intermédio do hard
power nas relações internacionais.
Em relação aos RPAS, pode-se perceber o investimento na produção desse vetor para a
aplicação militar na segurança nacional ou na projeção de poder sobre o espaço aéreo de nações
em conflito, alinhado com o hard power, pois
Durante a última década, as aeronaves remotamente pilotadas (RPA) tornaram-se um
componente crítico na aplicação do poder aéreo e uma das plataformas mais “sob
demanda” que a Força Aérea fornece à força combinada. A RPA acentua os princípios
fundamentais de persistência, flexibilidade e versatilidade da missão. Juntamente com
a coleta de informações e capacidades de ataque, elas têm um histórico comprovado
como multiplicadoras de força durante as operações de contingência da última década
(USAF, 2014, p. 11. Tradução nossa).
Entretanto, o aparelhamento tecnológico apresenta um custo, estando esse relacionado
à economia. Segundo Castro (2012), a economia, a geopolítica e a geoestratégia são
logicamente indissociáveis na determinação das esferas de influência e da gravitação de poder
em torno de um Estado. Sendo, assim, nem sempre é vantajoso ao Estado valer-se somente do
hard power e, por isso, muitas nações poderosas buscam por intermédio do soft power atuar na
modelagem das preferências do outro, influenciando o processo decisório, de acordo com
Owens e Nye (1996 apud WEISS, 2005. Tradução nossa). Nessa transição do hard para o soft
power, o desenvolvimento tecnológico tem lugar de destaque, “devido à atratividade e
influência que a C&T3 exercem, elas podem servir como um ativo nacional de poder global que
logra transcender os interesses nacionais” (DOMINGUES, 2015).
Nesse contexto, ao se perceber que
Os Sistemas de Aeronaves Não Tripuladas (UAS), mais especificamente os Sistemas
de Aeronaves Remotamente Pilotadas (RPAS), estão se tornando rapidamente parte
do dia a dia de nossas vidas. O vasto campo de possibilidades de utilização está
criando uma nova indústria com um largo potencial econômico. Os desenvolvimentos
3 C&T - Ciência e Tecnologia
tecnológicos estão acontecendo em um ritmo muito mais rápido do que houve com a
aviação tripulada. O desafio reside na integração entre os mundos das aeronaves
tripuladas e não tripuladas de forma segura e eficiente em virtude do uso do mesmo
espaço aéreo por ambas (EUROCONTROL, 2017. Tradução nossa).
verifica-se, desse modo, um nicho de influência e adaptação do soft power no segmento
tecnológico aeronáutico e que os investimentos em RPAS podem atuar como um ativo da nação
desenvolvedora dessa tecnologia, posicionando-a como polo de tecnologia inovadora e atraindo
interesse externo para o país, pois “a comprovada liderança em tecnologia de ponta com
pesquisas nas áreas de [...], indústria aeroespacial e cibernética, por exemplo, revela um
aumento da formação do capital intelectual que acaba atraindo interesse externo, gerando maior
magnetismo para o país” (CASTRO, 2012).
1.4 EUA, UNIÃO EUROPEIA, CHINA E OS RPAS
De acordo com O’Brien (2013), a demanda americana pela utilização dos RPAS na
segurança nacional e na segurança pública demandou intensos debates em como acomodar
esses equipamentos no espaço aéreo nacional americano (NAS, do inglês National AirSpace).
Com isso, o Congresso americano em 2003 incluiu no texto do documento Vision 100 – The
Century of Aviation Reauthorization Act (P.L. 108-176), que o gerenciamento do tráfego aéreo
americano deveria “acomodar um vasto campo de operações de aeronaves, incluindo [...]
veículos aéreos não tripulados” (O’BRIEN, 2013, p. 7. Tradução nossa).
Outra forma de se perceber a importância dada ao assunto pelos EUA é a atenção
dispensada pelo Congresso americano, o qual, por intermédio do PL 112-95, estabeleceu que a
FAA deverá implementar um plano para o provimento da integração dos RPAS no espaço aéreo
nacional americano a partir de 2025, segundo O’Brien (2013). Segundo a USAF (2014), o
Congresso estabeleceu, no National Defense Authorization Act for FY09, ser vital para o
Departamento de Defesa americano (DoD) e para a FAA trabalharem em conjunto para prover
o acesso ao espaço aéreo nacional americano aos RPAS em apoio às requisições militares.
Nesse quesito, o DoD em sua concepção operacional de integração do espaço aéreo
prevê “ uma estrutura comum para a prática, procedimentos e padrões de voo dos UAS no
espaço aéreo nacional e internacional” (USAF, 2014, p.80. Tradução nossa). Corrobora com
essa posição a questão de que, segundo Brasil (2017), em 2015 o DoD operava mais de 7.000
drones no âmbito internacional, em locais como Afeganistão e Iêmen, e nacional, fronteira
EUA-México.
Em 2016, a FAA implementou o regulamento acerca do voo de pequenos RPAS
(denominado SUAS, do inglês Small Unmanned Aircraft Systems) e aeromodelos no espaço
aéreo americano, o Small Unmanned Aircraft Regulations (Part 107). Na sequência em 2017, a
FAA lança a concepção do LAANC (Low Altitude Authorization and Notification Capability),
sistema que pretende processar em tempo real a autorização de acesso ao espaço aéreo
requeridas pelos operadores de drones4. Como medida do mercado de drones nos EUA, a FAA
marcou em janeiro de 2018 o número de 1.000.000 de drones registrados, sendo
aproximadamente 88% para uso recreativo e os outros 22% para uso comercial5.
A União Europeia, por sua vez, por intermédio da sua agência para o controle do espaço
aéreo (EUROCONTROL) estabeleceu um plano estratégico para a implementação dos RPAS
nos céus europeus, de forma a prover a “interoperabilidade e a harmonização do gerenciamento
do tráfego aéreo em escala Pan-europeia” (EUROCONTROL, 2015, p. 9. Tradução nossa).
No âmbito político europeu, a “Declaração de Varsóvia”6 estipula como urgente o
desenvolvimento das potencialidades dos drones em suporte à liderança global e à
competitividade da UE. Busca, também, estimular a criação de um mecanismo de coordenação
entre as diversas agências europeias, incluindo a de defesa, para o estabelecimento de estrutura
regulatória que considere as necessidades da indústria e de projetos fundamentais para a
integração dos drones.
Segundo Brasil (2017), o mercado europeu de drones tem chamado a atenção de
investidores globais, em especial para países que apresentam um quadro regulamentar,
operacional e tecnológico bem fundamentado.
Atinente a essa linha de pensamento, em junho de 2018, o Parlamento Europeu, no
intuito de padronizar as iniciativas nacionais independentes, aprovou legislação que tem por
objetivo “dar resposta ao desenvolvimento do setor dos drones e aos problemas que estes podem
colocar a nível da aviação civil” (NADKARIN; SOONE, 2018. Tradução nossa).
4 https://www.faa.gov/uas/. Acesso em: 10/08/2018. 5 https://www.transportation.gov/briefing-room/faa-drone-registry-tops-one-million. Acesso em 20/07/2018 6https://www.easa.europa.eu/sites/default/files/dfu/Warsaw%20Declaration%20on%20Drones_24%20Nov%202
016_final_EN.PDF. Acesso em 10/08/2018.
Com relação ao emprego militar, segundo Brasil (2017b), os projetos sobre RPAS
militarizados são conduzidos basicamente por França e Reino Unido, apesar da Europa possuir
diversas empresas fortes no segmento aeronáutico. Outrossim, com o objetivo de competir com
os EUA nesse segmento, foi instituído o “programa MALE 2020, que reuniu a Airbus Defence
and Space, a Dassault Aviation e a Finmeccanica” (BRASIL, 2017b), fabricantes aeronáuticas
reconhecidas, para a produção de um RPAS do tipo MALE7 militarizado europeu.
No cenário asiático, a China estabeleceu em 2006, o Plano “Made In China 2025” que
estabelece o mercado de desenvolvimento de drones como o motor essencial da economia
chinesa para os próximos 15 anos, de acordo com Pereira (2016). Outrossim,
A China tem desenvolvido um dos maiores e mais complexos programas de drones
no mundo e está se aproximando rapidamente dos Estados Unidos na corrida pelo
desenvolvimento da tecnologia, redefinindo as condições da concorrência global na
área. Este programa inclui um enorme projeto militar-industrial, centros de pesquisa
universitários e militar, financiamento, infraestrutura e um número crescente de
drones operacionais espalhados por todos os ramos das forças armadas chinesas
(PEREIRA, 2016, p.62)
De acordo com Weinberger (2018), a política americana de exportação de drones
armados favoreceu a venda de drones militarizados chineses no Oriente Médio, pois
a China enfrenta uma baixa competição para a venda desses equipamentos (drones),
pois muitos dos países que os produzem estão restritos na venda dessa tecnologia por
serem signatários do Regime de Controle da Tecnologia de Misseis (MTCR) [...],
além de submeter as exportações dessa tecnologia a um maior escrutínio do que a
China (USA, 2017, p.21. Tradução nossa).
Em adição, pesquisas realizadas no mercado de drones para uso civil, segundo Joshi
(2017), apresentam quatro empresas chinesas entre as seis maiores fabricantes do segmento,
sendo a DJI a “[...] líder mundial na manufatura de drones civis, absorvendo uma participação
de 70% do mercado de drones” (JOSHI, 2017. Tradução nossa). A influência e a disseminação
dos SUAS chineses, em especial os da DJI, é tão grande que o Exército dos EUA teve de emitir
um memorando proibindo a utilização pelas unidades militares desses equipamentos com receio
7 MALE – Medium Altitude Long Endurance. https://www.defensenews.com/unmanned/2018/05/25/europes-
first-male-drone-hits-the-skies-using-space-based-tech/. Acessado em: 10/08/2018.
da possibilidade de espionagem cibernética chinesa por intermédio dos drones8. Cenário, este,
em que se verifica a influência da indústria chinesa no mercado consumidor.
1.5 O CENÁRIO BRASILEIRO
[...] embora o país apresente grande potencial para o uso civil de drones e apesar da
crescente pressão de fabricantes, operadores e distribuidores de produtos importados
e das apropriadas iniciativas do DECEA, no que toca a regras e procedimentos para o
acesso ao espaço aéreo, o esclarecimento da sociedade e mercado brasileiros, a
capacitação, a base industrial e a regulamentação da operação e da exploração
comercial de serviços aéreos baseados em drones são ainda incipientes
(VASCONCELLOS, 2016)
No Brasil, no que tange a aplicação civil desses equipamentos, observa-se que o
segmento aeronáutico não tripulado tem sido tratado de forma particularizada pelas entidades
envolvidas com o segmento aeronáutico. A Secretaria de Aviação Civil (SAC), enquanto
ministério, buscou fomentar um grupo de estudos interagência para o desenvolvimento de um
marco regulatório, inclusive lançando um programa de conscientização denominado “Drone
Legal”9. Tal grupo foi descontinuado em 2017 em função do marco legal civil ter sido instituído
por intermédio do Regulamento Brasileiro de Aviação Civil (RBAC-E94) da Agência Nacional
de Aviação Civil (ANAC), a qual trata o assunto abordando somente os aspectos inerentes a
sua área de competência em consonância com a Lei nº 11.182/2005.
Em relação ao uso do espaço aéreo, o Comando da Aeronáutica, por intermédio do
DECEA, tem tratado de fomentar e coordenar o crescimento do setor, buscando mitigar os
possíveis impactos que possam vir a prejudicar a aviação tripulada nos céus brasileiros, desde
de 2010 com a emissão da AIC 21/10, e a partir de 2015 por intermédio da norma ICA 100-40,
de acordo com Brasil (2016), e das Circulares de Informação Aeronáutica AIC-N 17, 23 e 24.
Bem como, com a criação do sistema SARPAS, em 2016, para a solicitação de acesso ao espaço
aéreo com RPAS pelos operadores de pela internet e agilização da análise de impacto ao tráfego
aéreo pelos analistas do DECEA10. O segmento aéreo não tripulado no Brasil apresenta “[...]
8 https://www.usatoday.com/story/news/2017/08/04/report-army-bans-dji-drones-because-concerns-cyber-
vulnerabilities/540720001/. Acessado em: 20/07/2018. 9 http://www.transportes.gov.br/drone-legal.html. Acessado em: 10/05/2018. 10 http://www.decea.gov.br/drone. Acessado em: 15/04/2018
atualmente cerca de 34.000 RPAS civis registrados na ANAC, 65% dos quais são para fins
recreativos e 35% para uso comercial, sendo o SUAS utilizado amplamente em diversas
aplicações da sociedade civil, segundo BRASIL (2017), e “a maioria das operadoras registradas
são pessoas físicas, com apenas 6% delas sendo empresas ou entidades legais”
(VASCONCELLOS; HABERFELD, 2018. Tradução nossa).
No âmbito político, apesar do Brasil ser signatário da Convenção de Chicago e ter
promulgado em sua estrutura jurídica as tratativas acordadas, de acordo com Brasil (1946), o
Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), Lei nº 7.565/86, não aborda a questão das aeronaves
remotamente pilotadas. Apesar da existência de uma comissão para reforma do CBA no Senado
(CEAERO, Comissão Especial destinada a examinar o PLS 258/2016)11, parece não haver um
prazo para a conclusão dos trabalhos e os temas relacionados à aviação não tripulada aparentam
ser bastante incipientes. Muitas iniciativas de Projetos de Lei foram apresentadas em câmaras
estaduais para regulação do uso do espaço aéreo por veículos aéreos não tripulados (VANT)12
e foram vetados devido a serem inconstitucionais, pois o artigo 21 da Constituição Federal
brasileira em vigor, estabelece que a exploração do uso do espaço aéreo cabe à União. Nessa
esfera, existem os projetos PL9425/201713 e PL8751/201714, os quais tratam, respectivamente,
do uso de drones por órgãos de segurança pública e uso próximo a escolas, igrejas, residências,
entre outras estruturas e sua relação com direitos à privacidade e à segurança. Contudo, não se
encontra nenhum projeto de fomento da indústria no segmento não tripulado ou relacionado ao
desenvolvimento de estruturas para a integração dos RPAS ao espaço aéreo não segregado.
No âmbito militar, o Ministério da Defesa, em 2004, publicou a Portaria Normativa nº
606/MD, a qual dispôs acerca da obtenção de veículos aéreos não tripulados com diversas
orientações normativas, dentre as quais destaca-se o artigo 5º item X, o qual estipula “[...] fim
de manter o estímulo continuado à indústria de defesa, conscientizando, assessorando,
fomentando seu desenvolvimento e abrindo a possibilidade de sua participação competitiva nas
oportunidades comerciais, industriais e tecnológicas decorrentes da implementação desta
Diretriz[...]” (BRASIL, 2004). Em consonância, a Estratégia Nacional de Defesa, segundo
11https://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao;jsessionid=BDD586A1368839589194095690A6455A?0&codc
ol=2031. Acessado em: 10/08/2018. 12 O termo VANT é considerado obsoleto pela ICAO, de acordo com ICAO (2015b). 13 http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2166867. Acessado em:
10/08/2018. 14 http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2153688. Acessado em:
10/08/2018.
Brasil (2012) aponta para o emprego de aeronaves não tripuladas no aperfeiçoamento das
capacidades de alerta, vigilância e monitoramento das Forças Armadas. A END estipula como
segunda diretriz para evolução da Força Aérea o “[...] avanço nos programas de Aeronaves
Remotamente Pilotadas, primeiro de vigilância e depois de combate [...]” (BRASIL, 2012),
contudo o Brasil ficou ausente na “Declaração Conjunta sobre Exportação e Uso Subsequente
de Veículos Aéreos Não Tripulados Armados ou de Ataque”, conforme USA (2017). Contudo,
programas de fomento para a inserção do segmento não tripulado no Brasil, como o projeto
VANT da Polícia Federal15 e a empresa HARPIA16, joint venture conduzida pela EMBRAER
para exploração desse segmento, foram descontinuados por questões, aparentemente,
orçamentárias.
Por fim, no mercado brasileiro, estudos apontam “[...] 15 empresas atuando como
fabricantes de VANT no Brasil. Mas nem todas as aeronaves em uso no País foram produzidas
aqui. Boa parte vem da China, da Europa e dos EUA” (BRASIL, 2017, p.57), denotando a
influência externa e o possível mercado consumidor para o desenvolvimento da indústria
nacional.
1.6 APRESENTAÇÃO DOS DADOS E ANÁLISE
A análise dos referenciais possibilitou verificar a importância dada ao segmento
aeronáutico não tripulado em virtude das potencialidades de aplicação nos âmbitos militar e
civil, bem como à preocupação acerca de possíveis impactos às aeronaves tripuladas quando da
integração ao espaço aéreo não segregado, pois a “introdução de aeronaves remotamente
pilotadas [...] não deve de maneira alguma aumentar os riscos na segurança das aeronaves
tripuladas” (ICAO, 2015b. Tradução nossa).
Ademais, podemos perceber que os RPAS por serem “uma tecnologia emergente”
(ICAO, 2015b. Tradução nossa) atuam na vanguarda do desenvolvimento tecnológico. Dessa
forma, pode-se inferir que os RPAS possuem representatividade na condução das relações
internacionais, pois “[...] tecnologia e relações internacionais afetam uma a outra. [...] A
15 https://epocanegocios.globo.com/Brasil/noticia/2017/07/pf-abandona-operacao-com-veiculos-aereos-nao-
tripulados-para-combate-ao-crime-organizado.html. Acessado em: 10/08/2018.
16 https://exame.abril.com.br/negocios/embraer-defesa-seguranca-encerra-atividades-da-harpia-sistemas/.
Acessado em: 10/08/2018.
influência mútua da ciência, tecnologia e relações internacionais são tão importantes e
penetrantes que as áreas deveriam ser reconhecidas como subdisciplinas” (WEISS, 2005.
Tradução nossa).
Inerente às teorias de hard power e soft power, verificou-se a relação do hard power
com a aplicação militar dos RPAS, expandindo as capacidades da projeção do poder
aeroespacial de algumas nações, tendo os RPAS “entregado todos os dias um poder aeroespacial
de combate disciplinado e efetivo” (USAF, 2014, p.11. Tradução nossa). Com relação ao soft
power, verificou-se a viabilidade da tecnologia inerente ao segmento não tripulado influenciar
decisões no âmbito político (as decisões adotadas pela ICAO na construção dos SARP e pelo
parlamento europeu em padronizar ações nas nações signatárias) e econômico (como a
influência mercadológica de empresas chinesas no setor). Cabe ressaltar nesse contexto a
percepção a influência no mercado consumidor americano da indústria chinesa, no emprego de
SUAS chineses pelo Exército americano, levando ao Estado-Maior americano emitir um
memorando para que fosse banida a utilização desse equipamento nas unidades dessa força.17
Nesse contexto, pode-se perceber a influência e a relação existente entre os RPAS e as
relações internacionais no âmbito das C&T e de projeção do poderio militar, em atenção ao
OE1, cujas características estão apresentadas no modelo estruturado constante no quadro 1.
SEGMENTO CARACTERÍSTICAS CONCEITO
RPAS
Desenvolvimento tecnológico;
Projeção de poder aeroespacial;
Projeção industrial.
Hard Power
Influência nas relações internacionais;
Influência em regulamentações;
Influência em decisões governamentais;
Influência no mercado consumidor externo;
Ampliação do mercado laboral interno.
Soft Power
17 https://www.usatoday.com/story/news/2017/08/04/report-army-bans-dji-drones-because-concerns-cyber-
vulnerabilities/540720001/. Acessado em: 20/07/2018.
Quadro 1 – Modelo da relação RPAS e Relações Internacionais (Fonte: o autor)
Com relação às ações adotadas por EUA, UE e China, pode-se verificar que os
interesses desses países, na manutenção da projeção de poder por intermédio do uso de RPAS
em conflito, na busca por domínio no comércio de drones e na influência exercida no processo
de constituição de regulamentações desse segmento aeronáutico, denotam a atuação em três
eixos bastante nítidos ao se analisar o referencial teórico, sendo esses eixos o militar, o político
e o econômico.
No âmbito militar, verificou-se um interesse no desenvolvimento e no emprego desses
vetores, na medida em que se percebe que
Progressivamente, os drones estão se tornando uma parte fundamental das operações
militares, [...], sendo previstos, na próxima década, gastos de US$ 30 bilhões em
pesquisas sobre VANTs militares. Em 2012, o Instituto Internacional de Estudos
Estratégicos (IISS) identificou 11 países (Estados Unidos, França, Alemanha, Itália,
Turquia, Reino Unido, Rússia, China, Índia, Irã e Israel) como tendo drones militares
armados (BRASIL, 2017b, p.25).
O envolvimento do congresso americano, o estabelecimento de uma constituição pelos
Estados da EU com a participação de representantes da ICAO “[...] para ações bem coordenadas
para o desenvolvimento de um ecossistema de drones europeu [...]” como a “Declaração de
Varsóvia”18 e o Plano “Made in China 2025” denotam o eixo político relacionado ao segmento
não tripulado.
Em adição, o impacto gerado pelos drones no setor econômico, segundo Mazur e
Wiśniewski (2016), é da ordem de U$ 127 bilhões, “esse é o valor dos atuais serviços e mão de
obra de negócios que têm um alto potencial de substituição em um futuro muito próximo por
soluções com drones” (MAZUR; WIŚNIEWSKI, 2016, p.1. Tradução nossa), sendo esse
mercado tão expressivo economicamente e dominado pela indústria chinesa em torno de 70%
conforme mencionado anteriormente.
18https://www.easa.europa.eu/sites/default/files/dfu/Warsaw%20Declaration%20on%20Drones_24%20Nov%202
016_final_EN.PDF. Acesso em 10/08/2018.
Nesse ínterim, pode-se perceber as ações adotadas por EUA, UE e China com relação
aos eixos militar, político e econômico, em atenção ao OE2, cujas características seguem
apresentadas no modelo constante no quadro 2.
EIXO ATOR CARACTERÍSTICA
MILITAR
EUA Desenvolvimento de drones militarizados;
Projeção do poder aeroespacial.
UE Projeto de fabricação de drone MALE militarizado;
Emprego pela França e Reino Unido.
CHINA
Desenvolvimento de drones militarizados;
Ampliação do emprego de drones militarizados nas
Forças Armadas chinesas.
POLÍTICO
EUA
Atuação do Congresso americano;
Regulamentação consolidada;
Projetos de agências governamentais para o
desenvolvimento do setor.
UE
Atuação do Parlamento Europeu na unificação de
parâmetros;
“Declaração de Varsóvia”.
CHINA Plano “Made in China 2025”;
Política de exportação de drones militarizados.
ECONÔMICO
EUA
Investimentos no desenvolvimento de drones;
Marco regulatório;
Influência em padronizações técnicas.
UE
Investimentos no desenvolvimento de drones;
Marco regulatório;
Influência em padronizações técnicas.
CHINA
Investimentos no desenvolvimento de drones;
Domínio do mercado dos SUAS;
Exportação de drones militarizados.
Quadro 2 – Modelo da atuação dos EUA, UE e China no segmento RPAS (Fonte: o autor)
Com relação ao Estado brasileiro, verificou-se na citação de Vasconcellos (2016) a
adoção de ações ainda incipientes para o fomento do segmento não tripulado. Apesar, de
iniciativas independentes de agências e órgãos governamentais, como o marco regulatório civil
RBAC-E94, o qual “estabelece as condições para a operação de aeronaves não tripuladas no
Brasil considerando o atual estágio do desenvolvimento desta tecnologia” (BRASIL, 2017a,
p.3). Bem como, a atuação do DECEA em possibilitar o acesso ao espaço aéreo.
Outra ação interessante foi a implementação do sistema SARPAS, sistema inovador no
segmento, o qual em abril de 2018 já havia processado 37.000 requisições de acesso ao espaço
aéreo por RPAS, segundo Vasconcellos e Haberfeld (2018).
Contudo, mesmo com a Portaria Normativa 606/MD e com a END, não houve o fomento
da indústria nacional de RPAS, bem como não há politicas consolidadas no âmbito da nação
para o desenvolvimento de concepções operacionais e técnicas.
Desse modo, percebe-se que as ações adotadas pelo Brasil com relação aos eixos de
atuação apresentados no OE2, em atenção ao OE3, adotam as seguintes características
constantes no modelo abaixo.
ATOR EIXOS CARACTERÍSTICA
BRASIL
MILITAR
Plano de aquisição de drone militarizado;
Descontinuidade de projetos;
Inexistência de indústria de drones militarizados.
POLÍTICO
Marco regulatório;
Ausência de políticas públicas de fomento do setor;
Proposições equivocadas de regulamentação;
Ausência de políticas de exportação de drones brasileiros.
ECONÔMICO
Marco regulatório;
Mercado incipiente;
Ausência de grandes industrias de RPAS.
Quadro 3 – Modelo da atuação do Brasil no segmento RPAS (Fonte: o autor)
Por fim, ao se correlacionar os modelos estruturados para os OE, verifica-se a ausência
da atuação do Estado brasileiro atinente ao conceito de hard power e uma atuação muito
modesta relacionada ao soft power, somente considerada pela existência de um marco
regulatório, conforme nota-se no modelo constante no quadro 4.
SEGMENTO CARACTERÍSTICAS CONCEITO BRASIL
RPAS
Desenvolvimento tecnológico. Hard Power Não apresentou
Projeção de poder aeroespacial. Hard Power Não apresentou
Influência nas relações internacionais. Soft Power Não apresentou
Influência em regulamentações. Soft Power Apresenta
Influência em decisões governamentais. Soft Power Não apresentou
Influência no mercado consumidor
externo
Soft Power Não apresentou
Ampliação do mercado laboral interno. Soft Power Apresenta
Quadro 4 – Modelo de correlação da atuação no Brasil e RI no segmento RPAS (Fonte: o autor)
2. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em um primeiro momento, percebeu-se a relação do segmento aeronáutico não
tripulado, seja pelo seu emprego bélico, seja pela inovação tecnológica pertinente aos RPAS,
com conceitos das relações internacionais de uso de poder, hard power, ou de uso de influência,
soft power.
Ademais, foi perceptível a atuação do EUA e UE, por intermédio de suas organizações
políticas e regulatórias de uso do espaço aéreo no provimento de concepções e testes
operacionais com os RPAS, na busca por influenciar o desenvolvimento de marcos normativos.
Além disso, vislumbrou-se ações para o desenvolvimento de drones militares e o amplo uso
desses ao redor do mundo. Verificou-se, também, a atuação da China na busca por hegemonia
no mercado mundial de venda dos SUAS e de drones militarizados para comporem seu
empoderamento armamentista no continente asiático. Em consequência, a análise dessas
percepções possibilitou o delineamento de características das ações adotadas por esses atores
tão proeminentes no cenário global em relação aos RPAS.
Por fim, verificou-se a atuação do Estado brasileiro em relação às características
anteriormente delineadas acerca do segmento RPAS e, ao se correlacionar a atuação do Brasil
nesse segmento com os conceitos das relações internacionais, percebeu-se a ausência de um
posicionamento ativo no que tange às ações correlatas aos conceitos de hard e soft power.
Desta feita, conclui-se que o Estado brasileiro necessita de investimentos em políticas
públicas para o fomento do segmento aéreo não tripulado, seja civil ou militar, acrescentando
capacidade ao país para atuar de forma efetiva no cenário internacional e em especial no seu
entorno estratégico, seja influenciando decisões ou seja dissuadindo intenções.
Em função da relevância do tema para o Estado brasileiro, novos trabalhos poderão ser
realizados para identificar outros fatores que contribuam para a concepção de políticas públicas
de fomento do segmento RPAS nacional. Poderão, também, ser avaliadas as possibilidades de
mitigação às contingências que impedem o investimento na indústria de drones militarizados. Em
uma pesquisa com mais recursos e tempo disponíveis, poder-se-ia verificar não só as correlações
citadas no trabalho, mas, também, determinar as potencialidades dessas correlações de forma
mais aprofundada que possibilitassem futuramente a estruturação das políticas necessárias aos
RPAS no espaço aéreo brasileiro e que fortalecessem o Brasil como ator proeminente nas relações
internacionais.
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