sessão leitura poética 2014

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POESIA: “QUANTO MAIS POÉTICO MAIS VERDADEIRO”

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Semana da Leitura ; Dia Mundial da Poesia; Para os Meus alunos... com Ternura.

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Page 1: Sessão leitura poética 2014

POESIA: “QUANTO MAIS POÉTICO MAIS VERDADEIRO”

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Pronúncio

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PORTUGAL

Três sílabasDebruçadas sobre o mar

João Pedro Mésseder

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Prelude to a Kiss

A Reason To Believe

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FECHOU A ESCOLA EM GRIJÓAo Frederico Amaral Neves

IDantes ouviam-se as crianças a caminho da escolae eram como pássaros de som nas manhãs de Grijó.Não eram muitas, mas as vozes joviaisdavam sinal de que a aldeia resistia,continha à distância o deserto que a rondacomo a alcateia ronda uma rês tresmalhada.

Agora as crianças, todas as manhãs,são acondicionadas como mercadoriasnuma viatura com vocação de furgoneta.Lembram judeus amontoadosem vagões jota a caminho de algures.Vão aprender em terra estranha o que os seus paise os pais dos seus pais aprenderam em Grijó.

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II

Só se voltam a ouvir ao fim da tardequando a viatura as despeja no largo da aldeiacomo artigos que ficaram por vender.Mas ouvem-se pouco, porque vêm cansadas.Ouvem-se pouco e triste porque o seu diafoi deportado para outra terra ondenão se lhe firmam raízes.

O senhor ministro das Finanças está contente,porque poupa meia dúzia de euroscom a violenta trasfega da infância.

Mas está triste Grijó, porque já não ouveas suas aves da manhã a caminho da escola— e por isso pode dizer-se que a aldeia encolheu,ficaram uns metros mais pertoas dunas de amanhã.

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IIICaladas as vozes tagarelas das crianças,nos dias de Grijó poucas mais vozes se ouvemdo que as de alguns velhos que antecipamem palavras raras, conformadas,o dia em que o silêncio cobrirá com estrondoo (des)povoado definitivamente.

O senhor ministro das Finanças terá poupadomais alguns euros com a instauraçãodeste opressivo silêncio final,e ficará contente.

Grijó não.

A. M. Pires Cabral

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I Want to ride my Bicycle

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A UMA BICICLETA DESENHADA NA CELANesta parede que me vesteda cabeça aos pés, inteira,bem hajas, companheira,as viagens que me deste.

Aqui,onde o dia é mal nascido,jamais me cansouo rumo que deixouo lápis proibido...

Bem haja a mão que te criou!

Olhos montados no teu selimpedalei, atravesseie viajeipara além de mim.

Luís Veiga Leitão

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Vegetativa lágrima

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DA FRÁGIl SABEDORIA e ARTE DA RESPIRAÇÃO

Há dias em que, de tanto ruído, não ouço nada. Mas ainda nãoEstou surdo e fico silencioso, como parecem estar as estrelas.

Se queres conquistar um público, se te queres vender(tal a TV, os políticos, os best-sellers), terás de baixar a bola – Bater com o focinho no chão da multidão. Se porém o que desejas éSer, procurar “voar outro” (Pessoa) – terás que o fazer sozinho.

O luxo não é possuir coisas, o luxo é cantar, olhar o verde das ultimas árvores, a terra sumarenta do outono; o luxoÉ dizer ao filho que aprenda com os erros e despir-me naPraia e que o sol me possua ou as águas ou o teu olhar.Um luxo que por vezes me intimida porque o mundo estáDoente e tudo se desmorona em volta.

O silêncio, o que é o silêncio ? Perguntei ao mestre. - Uma floresta cheia de ruído.

Palavras vãs…Vãs são as palavras quando o silêncio, ou Apenas um sorriso, dizem o que há a dizer…o que não éPossível dizer-se…necessário dizer…

- Como está a tua mulher? Não é minha, apenas viajamos juntos. Casimiro de Brito

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Ir no ficar

Refrações

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AVE ; PÁSSARO; ÁRVOREAve

Aladaa palavra soltaa veloz consoante do voo

Pássaro

Sobre o campoum som de flechauma palavra veloz

ÁRVORE

É feita de aves e ventoE a linfa que a percorrenutre por dentro a palavracomo o v que alimenta o verdeo vento a erva e o vale João Pedro

Mésseder

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Sentido no branco

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PÁGINAAberta a primeira sílaba

como o branco à esperaDo primeiro açoDo primeiro traço

doprimeiro verso?

João Pedro Mésseder

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Daqui Nasceu Portugal

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TERNURA

Deixa beijarTua fonteTeus cabelosTuas mãosCom mansidãoNeste lençolFeito de SolTeus lábios não

Matilde Rosa Araújo

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Fundo…frágil segredo

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DOS VERSOS QUE LI…VER SÓ COM OS OLHOS…PORTUGUÊS E VIVO…

Dos versos que eu li(Bem mais de um milhão)Tão poucos senti No meu coração!E dos que o tocaramQuantos lá ficaram?Quantos florirão?E esses ainda(Tão menos ainda!)Que fruto darão?

Ver só com olhosÉ fácil e vão:Por dentro das coisasÉ que as coisas são.

Português e vivoÉ diminutivo.

Só fazemos bemTorres de Belém.

Carlos Queiroz

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Árvore à janela

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PEQUENA ORAÇÃO ; QUASE-IRONIA; CANÇÃO BASTANTE ROMÂNTICA

Quando a nossa dor descansa,E as lágrimas nos olhos são mais frescas que o orvalho nas flores…Ave-Maria.

Esta tristeza caladaÉ coitada, minha amiga…Companheira dedicada,Confrangida e delicada,Não me abandona por nada…… E eu gosto que ela me siga.

A minha vida é umaTorre de espumaToda a tremer…

Se vem o vento, A minha vidaEnfraquecida,Sem um lamentoVai-se perder!...

Que pena tenhoDa minha vida!

Cristovam Pavia

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Senhores do silêncio

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Solidão

Como quem tece um xalepara o frio da almainvento os teus braçosnos meus ombros,o verão da tua bocana minha pele.No meu outono, agreste,invento-te.E a tua lembrança,que não foi nem houve, porque não existesou o teu destino é longee noutro lugaratravessa a noite.

Luísa Dacosta

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Porto espelho de sentidos

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NOS SEMÁFOROS… MERCADO DO BOLHÃO…. ALEGRIA DESCONHECIDA

NOS SEMÁFOROS DA RUA DE SANTA CATARINA

Ao menos os teus olhospermanecem verdestodo o ano

MERCADO DO BOLHÃO

No meio das couves de sabóia e dos espinafreso sorriso geladode um molho de nabos

Jorge de Sousa Braga

Jorge de Sousa Braga

de súbitoo prazer de sentir o solmanso de Inverno

caminhar suavemente no passeio numa hora morta

encontrar no vidro das casas comerciaiso espanto do rosto

o risco distraído de atravessar a rua

depoistalvez comer uma maçãum caféfumar um cigarroobservar uma mulher pela transparência do vidro

Amanhã vai ser diferente Francisco Duarte Mangas

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Fúria de Senhor

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INCONSTÂNCIAProcurei o amor que me mentiu.Pedi à Vida mais do que ela dava.Eterna sonhadora edificavaMeu castelo de luz que me caiu!

Tanto clarão nas trevas refulgiu,E tanto beijo a boca me queimava!E era o sol que os longes deslumbravaIgual a tanto sol que me fugiu!

Passei a vida a amar e a esquecer...Um sol a apagar-se e outro a acenderNas brumas dos atalhos por onde ando...

E este amor que assim me vai fugindoÉ igual a outro amor que vai surgindo,Que há de partir também... nem eu sei quando...

Florbela Espanca

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MINHA TRAGÉDIA

Tenho ódio à luz e raiva à claridadeDo sol, alegre, quente, na subida.Parece que a minh’alma é perseguidaPor um carrasco cheio de maldade!

Ó minha vã, inútil mocidade,Trazes-me embriagada, entontecida! ...Duns beijos que me deste noutra vida,Trago em meus lábios roxos, a saudade! ...

Eu não gosto do sol, eu tenho medoQue me leiam nos olhos o segredoDe não amar ninguém, de ser assim!

Gosto da Noite imensa, triste, preta,Como esta estranha e doida borboletaQue eu sinto sempre a voltejar em mim! ...

Florbela Espanca

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EM VÃO

Passo triste na vida e triste sou,Um pobre a quem jamais quiseram bem!Um caminhante exausto que passou,Que não diz onde vai nem donde vem.

Ah! Sem piedade, a rir, tanto desdémA flor da minha boca desdenhou!Solitário convento onde ninguémA silenciosa cela procurou!

E eu quero bem a tudo, a toda a gente...Ando a amar assim, perdidamente,A acalentar o mundo nos meus braços!

E tem passado, em vão, a mocidadeSem que no meu caminho uma saudadeAbra em flor a sombra dos meus passos!

Florbela Espanca

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Deposição de outono

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TEXTOUTONO ; DANÇA

Cai...

A primeira acastanhadafolha-texto de OutonoNa minha serenidade.

Brilham na teiaos olhos orvalhoda incansável e bela tecedeira.

Como bailarina em pontasdescia a amarelada folhasuave, delicada, em doce rodopio...

Paixão da queda.

A. V

A. V

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De anjos e de loucos…

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EU…JÁ NÃO SEI QUERO SONHO

Vou sabendo aceitar a visitação silenciosa da ternura. Instala-se. Nada diz. Acabo por a perceber perfeitamente. Eu já...

Rejeito a frágil folha rosto de lágrima percorrida. O meu olhar não tem pressa. Eu não...

Que este rumor interior de beleza comovida regressa sempre ao lugar de partida. Eu sei...

Como barco em horizonte distante, acenar recolhido até que. Eu quero...

Continuar a entregar-me despudoradamente ao Instante que Existe no passado - presente, nesta força imorredoira de merecer-me de Vida merecida. Eu sonho...

A. V

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Solitude standing

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ENVELHEÇO COM A TARDECai mansa, etérea e fria a tarde.

Cinco horas da tarde. Os senhores do Jardim olham-me com espanto ou anseio de alimento.

Está frio, aconchego o cachecol, levanto as abas do sobretudo, coloco as mãos no bolso. Distendo as pernas.

Olho de olhar alongado para um rio profundo, lagunar, que me observa.Estou só, completamente só. Estou bem.

Ouço o arfar compassado da minha respiração em dó menor ao som do Stabat Mater de Pergolesi, cantado por angélica voz de contratenor.

Começa a ser comum perscrutar o silêncio que habita em mim, ou por problema de habitação, o que vai sobrando de mim no silêncio.

Estou só, profundamente só. Pleno, comovido a leste de mim, que para minha perdição – salvação só me encontro na bússola do cá dentro.

Um frágil ramo de tília desnudada observa-me. Sorrio-lhe e a brisa abana-a como se treme.

Esvai-se a tarde em horizontes laranja. As primeiras luzes-candeias tremeluzem do lado de lá. Convoco-as para o meu lado de cá, companheiras de entardecimento.

Estou só. Profundamente só. Envelheço com a tarde e estou bem.

Preciso destes amplexos de serenidade para ser feliz.

Despeço-me deste escuro verde-musgo com um sorriso aos bancos vermelhos. Aceno-lhes por dentro, e , no seu vazio de ninguém, vislumbro promessas pacificadoras de outros entardeceres.

Com o fim da tarde envelheço e estou feliz. Talvez Ele andasse por ali, de certeza que andou por ali, hálito profundo de vida…

Talvez. Resolvi fixá-lo com a minha Pelikan no meu moleskine .

Caminho arborizado e noturno entre as áleas. Uma nesga de lua espreita-me. Algumas raízes de mim ali ficam.

Envelheci com a tarde.

Não me importo, gostamos.