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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO

SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL/PDE

ARTIGO

REGISTROS FOTOGRÀFICOS E ORAIS DE MORADORES DA

REGIÃO NORTE DE LONDRINA (1970- 2011)

Londrina

2012

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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO

SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL/PDE

DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

Professor PDE: Dinah de Godoy Wielewicki Correa.

Área PDE: Paraná: História e Historiografia.

NRE: Londrina.

Professor Orientador IES: Profª Drª Márcia Elisa Teté Ramos

IES vinculada: Universidade Estadual de Londrina.

Escola de Implementação: Escola Estadual Monsenhor Josemariá Escrivá.

Público objeto da intervenção: alunos da 7° série do ensino fundamental

TEMA DE ESTUDO DO PROFESSOR PDE

HISTÓRIA LOCAL: MEMÓRIAS DA REGIÃO NORTE DE LONDRINA

TÍTULO

REGISTROS FOTOGRÀFICOS E ORAIS DE MORADORES DA REGIÃO NORTE DE

LONDRINA (1970- 2011).

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Índice

1. Introdução..........................................................................................................4

2. Desenvolvimento...............................................................................................6

2.1. Mudanças Históricas obtidas pela História Oral..............................................7

2.2. A proposta implementada:

construindo história e conhecimento histórico........................................................11

3. Considerações Finais........................................................................................17

4. Referências........................................................................................................19

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1. Introdução

Nesse artigo nos propomos a socializar os resultados do trabalho didático-

pedagógico com fontes orais no ensino de história, proposto como projeto de

ensino para o PDE. Utilizamos como instrumento de investigação histórica:

entrevistas com antigos moradores do Conjunto Habitacional Milton Gavetti onde a

Escola Estadual Monsenhor Josemaria Escrivá originou-se, e fotografias

ambientadas nos períodos de 1970 a 2011 destes mesmos moradores.

Optamos por trabalhar com a História Local por entender que um sujeito ou

comunidade que desconhece a sua história e o seu conteúdo, dificilmente poderá

agir como um sujeito ativo, capaz de fazer escolhas e agir de forma transformadora

na sociedade em que vive.

E é com o intento de fazer com que as pessoas conheçam a própria história

que esse projeto foi criado, para os que os novos moradores do bairro onde foi

instalada a escola, saibam como os primeiros homens e mulheres que se

estabeleceram no local teceram suas relações para dar conta de suas

necessidades, desafios, expectativas, enfrentando as dificuldades de

sobrevivência, infraestrutura e acesso a outros bairros.

Devem ser criadas condições para que os alunos de hoje possam perceber-

se como sujeitos históricos assim como os que foram entrevistados e entrevistaram

outras pessoas por intermédio deste projeto, além disso, que saibam valorizar

essas memórias que são documentos de uma história que costuma ser anônima.

Com o trabalho desenvolvido pretendeu-se atender o que diz as Diretrizes

Curriculares da Educação Básica – História – do Paraná:

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Nestas Diretrizes Curriculares para Educação Básica, propõe-se formar sujeitos que construam sentidos para o mundo, que compreendam criticamente o contexto social histórico de que são frutos e, que, pelo acesso ao conhecimento, sejam capazes de uma inserção cidadã e transformadora da sociedade (PARANÁ, 2010, p.31).

Em acordo com tais Diretrizes e com a Lei n. 13.381/01, que torna

obrigatório o ensino de conteúdos de História do Paraná no Ensino Fundamental e

Médio da Rede Pública Estadual, os conteúdos relacionados à política habitacional

vigente na década de 1970 no Brasil serão correlacionados com a História do

Paraná e seus efeitos na História Local.

Estudar a História do Brasil e as histórias locais relacionadas à mundial, entendendo-a para além da História europeia, permite questionar com o estudante as ideias históricas permeadas de preconceitos que são difundidos pelos meios de comunicação de massa. A partir da valorização de novas narrativas históricas é possível construir ideias históricas sistematizadas em um diálogo com o Outro (PARANÁ, 2010, p. 75).

Na prática de sala de aula, há 22 anos no ensino fundamental, tenho

percebido que apesar de todas as discussões na educação que trouxeram novas

perspectivas para o ensino de história, permaneceram muito forte na consciência

histórica do aluno a figura dos herois e a valorização dos documentos oficiais, além

disto, é perceptível na fala dos educandos que os mesmos não se reconhecem

como sujeitos históricos e nem mesmo aqueles que, por não estarem entre as

classes dominantes, tem seus nomes reconhecidos entre os autores da história.

Em relação à história de Londrina percebe-se um esvaziamento de

informação ao se fazer apologia do “pioneiro”, que seria, segunda esta visão

apologética, os primeiros que chegaram ao território e com seu empreendedorismo,

coragem, competência fizeram desta terra o lugar perfeito para o desenvolvimento

da cultura do café, deram os primeiros passos para urbanização da cidade

culminando no progresso do momento atual. Nota-se que o educando entende a

história da sua cidade, e consequentemente da sua região, como o resultado da

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ação de “pioneiros”, que seriam verdadeiros herois. Primeiramente os herois

ingleses que desbravaram as matas, abriram estradas e no presente a figura do

heroi político que por uma ação de bondade realizou obras públicas em prol dos

carentes e nas palavras dos próprios alunos “deu casas para o pobre morar”. A

construção de grande número de casas populares teria possibilitado, então, o

crescimento da região norte de Londrina.

2. Desenvolvimento

A história de uma pessoa, quando conhecida, quando relembrada e narrada

pela mesma, é extremamente importante para construção de sua identidade. É

necessário que o indivíduo conheça suas raízes, de onde surgiu o lugar onde mora,

quem foram os “pioneiros” de tal espaço, e com qual finalidade aquele lugar surgiu.

Tais questionamentos fazem com que as pessoas passem a entender que a

história não está alocada somente em grandes fatos, mas também está em

pequenas coisas, como a criação de um bairro, a mudança de moradores para o

local, os avanços, melhorias, ou mesmo permanências, retrocessos, do lugar em

que vivem. Uma pessoa que não é conhecedora de sua história, não é capaz de

extrapolar ou desconstruir o conhecimento do senso comum, muitas vezes

superficial. Aprender sobre as grandes revoluções, guerras e conquistas mundiais

é algo que é disponibilizado a todos e, portanto, é comum que se conheça tais

histórias. Contudo nem todos conhecem, ou sabem reconhecer que também são

personagens da história. Uma história que se realiza no dia-a-dia, por todos,

independente de classe, sexo, etnia, religião e idade.

É bom lembrar que por isso utilizamos a palavra “pioneiro”, não de forma a

edificar apenas alguns nomes tidos como importantes na História Local. É comum,

mesmo em livros didáticos, que se ressaltem apenas nomes de algumas famílias

da elite como sendo de “pioneiros”. No caso da história da cidade de Londrina,

como que refletindo uma história mais geral, a ideia de “pioneiro” circulante, se

funda em uma identidade central predominante: homem, branco, cristão, e

principalmente, “vencedor”, ou seja, que deu certo no sistema capitalista. Para nós,

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pioneiro, é aquele que chegou antes ou primeiro, sendo de qualquer classe social,

profissão, sexo, etnia e religião.

Somente oportunizando ao aluno construir seu conhecimento histórico, terá

este, condições de extrapolar os limites do conhecimento do senso comum e

perceber que a história não é feita somente por herois ou personalidades de

destaque, mas construída por cidadãos comuns, sujeitos anônimos cujas vozes

podem ser ouvidas através do resgate de documentos históricos até então

desprezados, como por exemplo, seus próprios depoimentos e suas fotografias

pessoais.

2.1. Mudanças Históricas obtidas pela História Oral

No que tange propriamente a história é possível dizer que a partir do século

XX, ocorreu uma renovação historiográfica contestando a ideia de documento

histórico, especialmente a valorização do documento escrito, que até o século XIX

tinha a função de comprovar os fatos históricos estudados. Com a contribuição da

Nova Historia e da Nova Historia Cultural, outros documentos foram considerados

como fontes históricas, entre eles pode se especificar os documentos

iconográficos, fontes orais, testemunhos da História Local, cinema, fotografia e

informática. Isso também mudou a relação com os mesmos que passaram a ter

sentido a partir do que lhes é perguntado e não apenas como um fim em si mesmo.

Segundo Schmidt e Cainelli (2004) a palavra documento implica duas

interpretações: O material utilizado com fins didáticos e documento como fonte, ou

seja, vestígios do passado são passíveis de serem explorados. A renovação do

conceito de documento trouxe também a renovação na relação deste com o

historiador que indaga e problematiza estabelecendo um diálogo com o passado e

o presente.

Nesse sentido, ao utilizar o documento em sala de aula ele não pode ser

meramente ilustrativo do conteúdo, mas ponto de partida para a prática do ensino

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de história. Schmidt e Cainelli (2004) argumentam que são necessárias três etapas

para a utilização do documento:

Identificação: nesta etapa o aluno identificou que tipo de documento era,

quais as informações contidas nele e qual a sua origem;

Explicação do documento: implica em contextualizar e realizar a critica do

documento;

Comentário do documento: introdução com analise dos dados obtidos,

desenvolvimento, e conclusão com as possíveis respostas às questões.

Como resultado dessas mudanças, a História Oral foi amplamente difundida

apesar de não se ter um consenso sobre sua utilização. Diante dessas

transformações deu-se visibilidade à História Oral, com um novo olhar de como se

estudar história, possibilitando a aproximação da disciplina com a vivência do aluno

ao se trabalhar com diversos tipos de documentos, como fotografia, cartões,

escrituras, certidões, objetos que revelam o cotidiano dos indivíduos e suas

experiências.

Os autores que defendem esse foco de análise se pautam na importância

deste método na possibilidade do aluno relacionar sua história com a história

coletiva, de permitir a compreensão de que todos somos sujeitos históricos,

portanto, capazes de interferir na sociedade e na capacidade de se tecer relação

da micro-história com extensos mais amplos.

Para Lisboa e Gonçalves (2004), que exploram o potencial da pesquisa

qualitativa, apresentando o método da História Oral em investigações científicas,

esta é importante, pois trabalha com o universos de significados e representações

que permite a compreensão da realidade humana e são eficazes em campos

temáticos onde existem informações organizadas. Portanto, a fonte oral é de

singular contribuição, uma vez que recupera questões a partir da investigação das

relações dos sujeitos na sociedade. Embora, o campo científico seja outro, em

história podemos concordar com as autoras que a História Oral pode se converter

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em metodologia desde que sejam considerados alguns fundamentos

epistemológicos.

Enfim, o método da História Oral se apresenta como uma importante

possibilidade na medida em que permite valorizar a riqueza das experiências

individuais e coletivas, reinterpretar as relações sociais em determinado tempo e

espaço, dando condições aos sujeitos para uma participação social mais

consciente.

Para Schmidt e Cainelli (2004), para utilizar a História Local é preciso

considerar dois aspectos fundamentais: a realidade local não contém em si mesma

sua própria explicação e, portanto, um segundo aspecto, tecer relações com

realidades mais amplas (nacional, latina, ocidental, mundial).

Trabalhar com a História Local, mais precisamente com o crescimento da

zona Norte de Londrina nos permite fazer estas relações, uma vez que ao

aproximar o aluno do olhar que a própria comunidade tem de sua história traz

reflexões sobre outras interpretações desse momento e a necessidade de se

remeter a acontecimentos estaduais e nacionais.

Este movimento de dialogar o passado com o presente mobiliza o aluno na

percepção da realidade, dos vários sujeitos que a compõem a agem, conscientes

ou não, neste universo, e rompe com a ideia de que a história é algo acabado,

pertencente a um passado distante de sua vida cotidiana.

O objetivo é inserir o aluno na história, tomando a própria vida como objeto

de estudo da disciplina. As pessoas comuns, não apenas os “herois” ou líderes, e

toda atividade humana, experiências, realizações, aspirações, maneiras de pensar

e agir, participam da realidade e constituem nesta perspectiva o objeto de estudo

da história.

No processo de ensino-aprendizagem, o aluno deve ser estimulado a

pensar, questionar, investigar, desenvolver o espírito crítico e a capacidade de

interpretação, oportunizando a formação de indivíduos conscientes, autônomos,

dotados de referenciais para realizar opções, capazes de buscar e construir

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conhecimentos, de fazer julgamentos e opções políticas, ou seja, instrumentalizá-lo

para transformação da realidade social, compreendendo que fazemos parte da

história, e que a história é feita por todos nós.

Apoiada nessas premissas e na observação do cotidiano escolar, onde é

possível observar a permanência da construção dos mitos e herois históricos, é

importante se trabalhar com a História Local que proporciona condições para que o

aluno perceba as várias interpretações das relações sociais que se dão a nível

individual e coletivo, colaborando para que o educando possa ele mesmo ser

construtor da história, perceber os sujeitos comuns que agem na sociedade, ter

seus próprios valores, sua própria interpretação da realidade, construindo

significados diversos para essa experiência.

Nesse sentido resgatar a memória da comunidade possibilita o aluno

perceber as transformações ocorridas no seu próprio bairro como um conjunto de

fatores em oposição à ideia de que alguns líderes políticos ou pessoas de destaque

foram responsáveis pela expansão territorial, econômica e habitacional da cidade.

É necessário observar que uma imagem fotográfica tem múltiplas intenções

e não fala por si mesma, é preciso acrescentar informações, textos, para melhor

compreender o contexto histórico de produção da imagem, além disto, recordar que

embora o registro fotográfico retrate algo que aconteceu, está carregado de valores

culturais, intenções, sendo uma leitura da realidade. Por esta razão os professores

devem auxiliar os alunos a contextualizarem a imagem ao processo histórico em

que foi produzida por meio de perguntas (ABUD, 2008).

De maneira semelhante, a entrevista não pode ser despida de seu caráter

subjetivo, pois a narrativa não se constitui na descrição exata dos fatos, mas

expressa uma perspectiva sobre aquele momento, carregada pelas experiências

individuais que se confundem com as coletivas (FERREIRA E GROSSI, 2002).

Desta forma, torna-se um desafio para o pesquisador identificar

representações e analisar além do relato tal como apresentado pelo sujeito, mas

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levantar hipótese sobre os acontecimentos narrados e a maneira como são

experenciados pelo narrador (FERREIRA; GROSSI, 2002).

Sendo assim, o papel do professor é fundamental na produção do

conhecimento escolar, auxiliando na realização da pesquisa prévia com seus

alunos e na condução do processo. Enfim, as etapas necessárias para a utilização

de fotografias como fonte histórica são a exposição do tema, alguma leitura prévia,

a pesquisa, conclusão e apresentação dos dados obtidos pelos alunos e a última

etapa caracterizado por um produto final. No caso da pesquisa em questão foi uma

exposição de fotografias de diversos momentos da história do bairro, desde sua

criação até hoje contexto explicativos sobre as mudanças e suas possíveis causas.

Por meio desse processo investigativo junto à memória da comunidade, a

coleta e análise dos dados obtidos, o aluno vai construindo sua consciência

histórica e identificando o processo pelo qual o conhecimento histórico é produzido,

podendo ele mesmo reelaborar esse significados tornando a história próxima de

sua vivencia.

2.2. A proposta implementada: construindo história e conhecimento histórico

O intuito desse projeto foi despertar as vozes dos cidadãos comuns que

compõe o Conjunto Habitacional Milton Gavetti, para que pudessem contar a sua

história, como eles viram acontecer a trajetória histórica que possibilitaram

mudanças no Conjunto desde sua fundação, em 1976 até o ano de 2011. Para que

isso acontecesse foram necessários instrumentos de pesquisa além de

documentos escritos, como fotografias, coleta de reportagens do Jornal Folha de

Londrina, e entrevistas com os moradores mais idosos do Milton Gavetti. Foi

enfocado o fato de que o surgimento do conjunto não foi nada mais do que uma

manobra política e econômica, de deslocar a população de baixa renda para a área

periférica da cidade, que em sua criação não possuíam infraestrutura alguma e

eram afastadas dos centros de consumo.

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Por ser um trabalho de História Local, foi considerado o meio em que os

alunos vivem e suas experiências para que fosse possível mostrar a eles que a

noção de pertencimento á história torna a compreensão de cada um sobre si

mesmo como sujeito histórico concreto, tornando-os capaz de atuar e transformar a

sociedade em que vivem.

Com tal percepção, o aluno passou a perceber como as mudanças que

ocorreram no bairro em que mora, estavam diretamente ou indiretamente ligadas

as transformações que concomitantemente aconteciam em âmbito regional e

nacional. Além disso, reconheceu que sujeitos comuns, assim como eles, tiveram

experiências que afetaram a sociedade da qual fazem parte.

A escola em que este trabalho foi desenvolvido foi a Escola Estadual

Monsenhor Josemariá Escrivá, situada na região norte de Londrina, no bairro

Pacaembu II. A escola atende alunos do 6º ao 9º ano do ensino fundamental, todos

em sua maioria moradores do Conjunto Habitacional Milton Gavetti, e Farid Libos.

Os alunos que foram sujeitos do projeto tinham por volta de 12 a 14 anos e

estavam na 7ª serie/ 8º ano.

Até o ano de 2002 a escola estava localizada no conjunto Milton Gavetti, na

Rua Augusto Balalai, nº 33, e funcionava juntamente com a Escola Municipal Nair

Auzi Cordeiro, no prédio da prefeitura de Londrina. Em 2002 a escola passou a

residir no conjunto Pacaembu II, no entanto a maioria de seus alunos são

moradores do Milton Gavetti, e o restante dos alunos moradores dos bairros

vizinhos.

A pretensão do estudo da História Local realizou-se por meio de entrevistas

com antigos moradores da comunidade onde a escola iniciou suas atividades. Foi

proporcionado ao aluno uma base de pesquisa, por meio de análise do material

coletado entre a comunidade, composta de fotografias e de entrevistas.

Os objetivos específicos que eram desejados pela realização do projeto

eram identificar o conhecimento prévio do aluno sobre o crescimento e

desenvolvimento da cidade de Londrina, pesquisar sobre a história da comunidade

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e sobre o que seria História Local, compreender como os historiadores escrevem a

historia através do procedimento da história oral, e utilizar documentos históricos

em sala de aula.

O procedimento inicial foi socializar o projeto para os alunos e pais através

de reunião em período noturno, afim de que compreendessem as ações,

equipamentos e deslocamentos necessários para viabilizar a execução do mesmo

e obtivemos a autorização dos pais ou responsáveis.

Em seguida, trabalhamos conceitos históricos, orientações e condutas a

serem consideradas na realização das entrevistas, bem como o tratamento dado a

mesma. Após esta etapa, distribuímos para todos os alunos da escola, no período

matutino e vespertino, breve questão a fim de localizar os primeiros moradores do

bairro.

Em posse do retorno das questões selecionamos os moradores por tempo

de moradia e localização no bairro. Selecionamos onze moradores em diferentes

ruas do bairro para a entrevista, e separamos os grupos de trabalho. É importante

ressaltar que nem todos os alunos realizaram a entrevista, mas todos participaram

em alguma etapa do processo.

As entrevistas foram realizadas com pessoas na faixa dos sessenta e

setenta anos de idade, apenas dois moradores tinham idade aproximada de

quarenta anos, os quais se mudaram com seus pais para o bairro ainda pequenos.

Dos onze entrevistados, oito eram mulheres e três eram homens. Todos eram

antigos moradores do bairro e os que não se mudaram no ano do inicio do

Conjunto Habitacional, o fizeram no decorrer dos anos seguintes (1977 e1978) e

viveram as mesmas dificuldades.

Todos foram unânimes em dizer que a maior dificuldade encontrada foi a

falta de asfalto, pois a linha férrea “corta” o bairro ao meio e nos dias chuvosos os

moradores da parte sul tinham que caminhar com sacolinhas nos pés até a parte

mais alta do Conjunto Habitacional com um par de sapatos sobressalentes para

trabalhar, tal era a lama que se formava e impedia a chegada do transporte coletivo

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nos demais pontos de ônibus ou tinham que optar por transportes nos bairros

vizinhos.

Só havia um coletivo que realizava o percurso do bairro ao centro e levava

50 minutos para realizar o trajeto de ida e volta, o que forçava os moradores a

conhecer com precisão os horários de paradas nos pontos do bairro. Quando não

havia o transtorno da chuva era o pó que invadia as residências.

O acesso ao centro era igualmente difícil, pois entre o bairro e a BR-369 era

um matagal alternado com plantações de café e algumas chácaras esparsas.

Somente depois desse trecho o ônibus trafegava em ruas asfaltadas e

pouquíssimos moradores possuíam automóvel.

A comunicação era outro aspecto complicado não havia linhas telefônicas,

só dois orelhões em locais diferentes, com dois pontos de revenda de fichas

telefônicas (na época não se fazia uso de cartão telefônico).

Todos relataram que faziam suas compras em supermercados ou armazéns

do centro da cidade ou dos bairros dos quais migraram, pois aqui não havia

comércio. O primeiro instalado foi o “Maior minimercado”, que permanece até hoje

com o mesmo nome, mas que na época possuía poucas opções de mercadoria.

Era comum transitar pelas ruas peixeiros, verdureiros, leiteiros e padeiros

em carroças, peruas ou ambulantes com aves colocadas em paus-de-arara. Como

alternativa muitos moradores possuíam hortas no quintal e trocavam hortaliças

entre si.

As casas eram todas iguais, brancas, diferenciando-se apenas por uma faixa

central colorida e separadas por balaustras. Acima da linha férrea havia casas com

dois ou três quartos, sala, cozinha, e banheiro. Abaixo da linha férrea as casas

eram sem repartição, com um grande cômodo com banheiro, que os moradores

foram adaptando conforme suas necessidades. Os que possuíam alguma

economia já foram fazendo reformas, aumentando cômodos, fechando as áreas de

serviço ou calçando seus quintais.

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O bairro não contava com rede de esgoto e nos primeiros meses sem

energia elétrica, também não havia áreas de lazer, igrejas ou escolas. Aos poucos

a população foi se mobilizando e criando alternativas. As missas eram realizadas

no “Centro Comunitário” onde aconteciam as quermesses, bingos, “brincadeiras

dançantes”, pois ainda eram incomuns as danceterias e as poucas que haviam

eram frequentadas pelos jovens da elite.

Posteriormente, foi construída a Paróquia São Sebastião que exercia função

religiosa e de entretenimento para a população local e a praça construída

acompanhando toda extremidade do Conjunto Habitacional, denominada pelo

prefeito da época, “Rua da Alegria”.

A inauguração da praça foi fato marcante na história do bairro, pois contou

com a presença do então Presidente da República, João Batista Figueiredo, último

presidente militar. Seu discurso reproduzido na íntegra pelo Jornal Folha de

Londrina reflete bem esse período de transição entre a ditadura e a

redemocratização. Os entrevistados relataram que mal se podia caminhar nas ruas,

dada a quantidade de pessoas que se aglomeravam, entre elas um grande número

de policiais e autoridade políticas da região, além da equipe da reportagem do

Jornal citado acima, que cobriu a visita do presidente nos diversos locais pelo

município.

Apesar das dificuldades apresentadas, os entrevistados relembraram com

saudosismo as relações que se estabeleceram entre os vizinhos. Eles se ajudavam

mutuamente e os vínculos iam se tornando tão fortes como uma grande família,

sendo comuns as festas de final de ano ocorrer com várias famílias em conjunto,

da mesma rua ou ruas próximas, com amigo secreto, serenatas e coisas afins.

Outra lembrança era a tranquilidade, com a segurança dos filhos que brincavam

nas ruas e pouco se ouvia falar de problemas com drogas e assaltos.

Com o passar dos anos as ruas foram pavimentadas, o isolamento entre os

bairros e o centro, cedeu espaço para novos bairros e vias de acesso, várias

igrejas estabeleceram pontos de reunião, foi construído uma Escola Municipal, que

mais tarde cedeu o prédio para a Escola Estadual, possibilitando o ensino de 5ª a

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8ª série no mesmo local. Muitos moradores deslocaram-se para outras regiões ou

cidades modificando o perfil descrito.

Hoje poucos moradores se conhecem, as relações são superficiais e

convivem com os problemas característicos das grandes cidades, como falta de

segurança, tráfico de drogas, individualismo, etc.

Os moradores sentiram-se honrados, em poder contribuir para divulgar a

História Local e serem ouvidos com tanta atenção por adolescentes que

normalmente não valorizam o conhecimento dos mesmos. Podemos mesmo dizer

que pela narrativa, os depoentes passaram a se autovalorizar como construtores

da História. Alguns despertaram o desejo de procurar alternativas para

revitalização da praça que antes era local de encontro das famílias, brincadeiras

para as crianças e realização de “disputadas esportivas” promovidas pela Igreja

Católica e hoje está abandonada ou, muitas vezes, frequentada por traficantes e

usuários de droga. O que pode, certamente, ser visto como uma conscientização a

partir da rememoração, ou seja, a partir das narrativas, moradores deram sentido à

sua História, e compreenderam que poderiam intervir coletivamente na realidade

do bairro para melhorá-la.

Para os alunos foi uma experiência única, através da qual se sentiram

construtores do conhecimento histórico e surpresos por desconhecerem tantos

fatos ligados à história do bairro a que pertencem. Admiraram-se diante das fotos

antigas disputando, entre eles, quem identificaria a região do bairro projetada nas

imagens. Muitos não sabiam sequer que a escola em que estudam já havia

funcionado em dualidade administrativa com a Escola Municipal e a construção do

prédio atual se deveu, em grande parte, a mobilização da comunidade. Este fato

colaborou para percepção de como nossas ações podem alterar a história.

Com as entrevistas gravadas e a posse das cartas de cessão, passamos

para a transcrição resumida das entrevistas. Paralelamente, trabalhamos a análise

das fotografias e das reportagens coletadas no Jornal Folha de Londrina. A partir

da problematização das fontes históricas utilizadas, começamos a estabelecer as

diversas visões da história e considerar a importância de todos os personagens

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como sujeito da história, que tecem relações, partilham experiências e transformam

sua própria realidade.

Os alunos fizeram um relato oral sobre sua própria aprendizagem, e então

passamos a ultima etapa que foi a confecção de molduras para o material coletado

e a organização da exposição, para a qual foram confeccionadas camisetas com a

inscrição “Milton Gavetti: Memórias”.

As entrevistas e as fotos mostraram uma história para além da “tradicional”,

ou seja, não foram apenas datas, nomes e fatos que foram destacados, mas sim,

as experiências, as vivências dos depoentes, a vida do cotidiano que, de pequenas

práticas e ações, vão formando uma história muito mais enriquecida que aquela

que em geral vemos nos livros didáticos. Distanciaríamos-nos do propósito deste

artigo tecer mais considerações sobre as entrevistas, mas podemos dizer que elas

revelaram a história, as emoções em contar e ouvir esta história, lembranças de

tempos idos em que se namorava diferente, se vestia diferente, se comia diferente,

se casava diferente, se estudava diferente, etc.

3. Considerações Finais

Estudar a História Local através de entrevistas e fotografias demonstrou ser

extremamente valioso historicamente ao se resgatar a memória individual

atrelando-a a memória coletiva. A partir de relação destas foi possível aos alunos

estabelecerem conexões com contextos mais amplos, como a História Regional e a

História Nacional.

Durante o processo de implementação do projeto os alunos passaram a

valorizar a memória de pessoas idosas e o conhecimento acumulado pela vivência

de cada um. Ao mesmo tempo, como já dissemos, estas pessoas, sujeitos da

pesquisa realizada pelos alunos, também se sentiram valorizadas, porque

perceberam que tinham uma história importante para narrar (e materiais como as

fotos, como “prova” de uma história) e que esta história era de interesse de uma

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geração bem mais nova. Algo que pode ser destacado como ponto fulcral na

proposta deste Projeto, foi a interação entre gerações tão diferentes, que

resultaram na construção do conhecimento histórico, os depoentes, pela narrativa

histórica instigada pelas perguntas e os alunos, pelo reconhecimento da história

“viva”, dinâmica, obtida pelo testemunho.

Um aspecto importante a se destacar foi a dificuldade de encontrar

fotografias no acervo familiar que retratassem o bairro na década de 70 e 80, pois

poucos moradores possuíam máquina fotográfica, e esta por sua vez nem sempre

estava provida de filme. Portanto, foi pequeno o número de fotos coletadas que

possibilitassem a análise de permanências e transformações ocorridas no bairro,

embora essa necessidade tenha sido sanada com imagens adquiridas no acervo

do Jornal Folha de Londrina. Na fase inicial, quando trabalhamos com sondagem

de conhecimento histórico prévio e conceitos históricos, poucos alunos

demonstraram interesse. A partir das tarefas que envolviam atividades mais

práticas que o interesse foi despertado na turma como um todo e após a análise de

algumas reportagens realizadas pelo Jornal Folha de Londrina entre as décadas de

70 e 90.

Consideramos nosso objetivo inicial plenamente atingido, pois ao final do

trabalho os alunos compreendiam-se como sujeitos históricos e conseguiram

entender como se constrói o conhecimento histórico. Além disto, passaram a

analisar mais criteriosamente a imagem de heroi construída pela comunidade

acerca do prefeito em cuja gestão foram entregues as casas populares do Conjunto

Habitacional Milton Gavetti. O ex-prefeito utiliza-se a até hoje o discurso de

campanha política de que foi ele quem construiu as casas na região, desta forma

construindo uma imagem bastante arraigada. Com nosso projeto, foi possível que

os alunos desconstruíssem este discurso e/ou esta imagem, já que as verbas para

a construção das casas foram provenientes do Governo Federal.

Foi perceptível a diferença que se operou: as discussões sobre questões do

bairro que envolviam, mesmo que indiretamente, política, eram tumultuadas e

polêmicas. Antes mesmo do final da implementação as discussões deixaram de

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pautar-se no senso comum e basearam-se nas informações e dados obtidos

através das fontes históricas utilizadas no projeto.

Outro dado relevante foi a exposição aberta à comunidade, de conclusão do

projeto que ocorreu na escola. Nas paredes foram afixados cartazes com

fragmentos de entrevistas, fatos do bairro, reportagens de jornais e exposição oral

de três alunas, respectivamente com informações do contexto brasileiro na década

de 70, dados do bairro e conclusão de aprendizagem através do projeto para a

turma.

Além dos alunos tivemos a participação de breve palestra do Senhor Nelson

Gavetti, irmão do engenheiro Milton Gavetti que deu nome ao bairro. A exposição

foi noticiada pelos jornais: Folha Norte, com exemplar semanal, e pela Folha de

Londrina.

A repercussão do trabalho para os alunos e para a comunidade foi tão boa,

que nos dias subsequentes pessoas nos procuraram para averiguar a possibilidade

de visitação posterior à exposição, para conhecerem mais sobre a história do

bairro.

Como profissional da educação, me senti profundamente satisfeita ao

constatar o interesse de alunos que não gostavam da disciplina e observar a

construção do conhecimento histórico realizada por eles, instigando-me a aplicação

de projetos similares com outras turmas.

4. Referências

ABUD, Kátia Maria et al. Fotografia e Ensino de História. In: Ensino de História.

São Paulo: Cengage Learning, 2008.

CASARIL, Carlos Casemiro. A expansão físico-territorial da cidade de Londrina e

seu processo de verticalização: 1950-2000. Geografia, v. 18, n. 1, jan./jun, p.65-94,

2009.

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FERREIRA, Amauri Carlos; GROSSI, Yonne de Souza. A narrativa na trama da

subjetividade: perspectiva e desafios. Economia & Gestão. Belo Horizonte. v. 2, n.

3, p. 120-134, jan/jun/2002

GONÇALVES, Rita de Cássia e LISBOA, Tereza Kleba. Sobre o método da

História Oral em sua modalidade trajetórias de vida. Revista Katál, v. 10 n. esp. p.

83-92, 2007.

PARANÁ, Governo. Secretaria de Estado da Educação. Departamento da

Educação básica. Diretrizes Curriculares da Educação Básica. História, 2010.

SCHMIDT, Maria Auxiliadora; CAINELLI, Marlene. Ensinar História. São Paulo:

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