sebenta da estrelinha
TRANSCRIPT
Anatomia Patológica
L1 – Adaptação
Introdução Teórica
Resumo: Respostas Celular ao Stress e Estímulos Nocivos
As células normalmente encontram-se confinadas a um estreito espectro de funções e estruturas pelo seu programa genético do metabolismo, diferenciação e especialização. O stress fisiológico e alguns estímulos patológicos podem levar a alterações fisiológicos e morfológicos – adaptação celular. Neste processo novos estados estacionários são alcançados, mas preservando a viabilidade da célula e ao mesmo tempo modelando a sua função de modo a responder ao estímulo. A resposta adaptativa pode consistir em: - Hiperplasia - aumento do número de células; - Hipertrofia - aumento do tamanho individual de cada célula; - Atrofia - diminuição do tamanho e função das células;
Se os limites da resposta adaptativa a um estímulo forem ultrapassados, ou em algumas situações concretas em que a célula é exposta a um agente lesivo ou stress, a sequência de eventos que se seguem termina inevitavelmente em lesão celular. A lesão celular é reversível até um certo ponto, mas se o estímulo persistir ou se for severo o suficiente desde início, a célula atinge um ponto de não retorno e sofre lesão irreversível, o que pode conduzir a morte celular. Adaptação, Lesão Reversível e Morte Celular podem ser consideradas estágios da progressiva imparidade da normal função e estrutura das células. Morte Celular, é o último estádio da lesão celular, revelando-se um dos principais acontecimentos na evolução da doença de qualquer tecido ou órgão. Pode ser consequência
de diversas causas, nomeadamente de isquémia, infecção, toxinas ou reacções imunitárias. Por outro lado, a morte celular revela-se um processo normal e necessário durante a embriogénese, no desenvolvimento dos órgãos, no manter da homeostasia e como alvo principal na terapia contra o cancro. Existem dois padrões principais de morte celular: - Necrose, é um tipo de morte celular que surge normalmente após um stress anormal como é o caso da isquémia ou lesão química, sendo sempre um processo patológico. - Apoptose, ocorre quando a célula morre por activação de um programa interno de suicido altamente regulado. Este processo é indispensável para eliminar as células desnecessárias durante a embriogénese e em diversos processos fisiológicos, como é o caso da atrofia dos tecidos hormono-dependentes a quando da baixa dos seus níveis. Este processo pode ocorrer em casos patológicos, sendo particularmente comum a quando da lesão do DNA. As células expostas a um estímulo crónico ou sub-letal podem não ser lesadas mas apresentar inúmeras alterações intracelulares. A perda do controlo do metabolismo leva a que se acumulem determinadas substâncias intracelularmente, incluindo proteínas, lípidos e glícidos. Em muitos casos o cálcio deposita-se em locais de morte celular, originando calcificações patológicas. No caso do envelhecimento celular sabe-se que existem alterações morfológicas e estruturais características.
Adaptações Celulares do Crescimento e Diferenciação
A célula responde a um aumento dos estímulos internos e externos com hiperplasia e hipertrofia, e à diminuição da quantidade de nutrientes e factores de crescimento com atrofia. Em algumas situações particulares a célula pode alterar o seu tipo celular, num processo denominado metaplasia. Algumas das adaptações são induzidas directamente por factores produzidos pelas células-alvo ou por outras presentes no ambiente, por outro é ainda possível que o sinal desencadeador esteja ao nível da regulação dos receptores de superfície ou das vias de sinalização que lhes estão adjacentes. Outro dos sinais que nos indica adaptação é as alterações na produção de proteínas, o que pode implicar a produção de uma nova proteína ou a produção de uma proteína já existente em maiores quantidades.
Hiperplasia
Consiste no aumento do número de células num órgão ou tecido, o que resulta na maior parte dos casos em aumento do volume desse organismo ou órgão. Apesar de muitas vezes ocorrerem em simultâneo, hiperplasia e hipertrofia, são processos distintos, no entanto podem ser desencadeados pelos mesmos estímulos. A hiperplasia apenas é possível em células que ainda retenham a capacidade de sintetizar DNA, dando possibilidade de que ocorra divisão mitótica. No caso da hipertrofia ocorre aumento das células sem que haja divisão.
Hiperplasia Fisiológica A hiperplasia fisiológica pode ser dividia em: - Hiperplasia Hormonal, que aumenta a capacidade de um tecido quando é necessário (ex. Capacidade de proliferação do epitélio glandular da mama durante a puberdade e a gravidez.); - Hiperplasia Compensatória, que aumenta a massa de uma tecido após remoção ou dano parcial (ex. Capacidade de regeneração do fígado.). Mecanismos de Hiperplasia
A hiperplasia resulta normalmente de um aumento local dos factores de crescimento, de uma maior expressão dos seus receptores, ou da activação preferencial das vias de sinalização intracelular relacionadas. Todas estas alterações conduzem a uma maior produção de factores de crescimento que activam inúmeros genes celulares, incluindo os que codificam factores de crescimento, os seus receptores e factores de regulação celular. No caso da hiperplasia hormonal, as próprias hormonas tomam um papel de factores de crescimento, desencadeando todo este processo. O processo da hiperplasia compensatória não se encontra ainda bem definido, mas sabe-se que envolve não apenas a proliferação das células remanescentes, mas também de novas células derivadas de células estaminais. Foi recentemente descoberto que a medula óssea contém células estaminais capazes de originar diversos tipos de células diferenciadas e especializadas, e em alguns casos células hepáticas. Hiperplasia Patológica Muitas das hiperplasias patológicas resultam de um aumento da estimulação hormonal ou dos factores de crescimento (ex. Hiperplasia do Endométrio, Hiperplasia Benigna da Próstata, etc.). Todos estes processos são anormais, mas continuam controlados, isto é, se a estimulação hormonal for interrompida a hiperplasia regride. Mas sabe-se hoje que estes casos de hiperplasia patológica são propícios a que se desenvolva uma proliferação neoplásica. A hiperplasia é uma importante resposta do tecido conjuntivo a quando da restauração de uma lesão, sendo necessária a proliferação dos fibroblastos e dos vasos sanguíneos. Esta hiperplasia está associada a um aumento da produção de factores de crescimento. Existem ainda casos em que infecções virais, como o caso do papilomavírus, que devido à estimulação dos factores de crescimento podem originar verrugas, um grande número de lesões nas mucosas compostas por massas de epitélio hiperplásico.
Hipertrofia
Refere-se a um aumento no tamanho das células, sem que haja divisão, resultando num aumento do volume do órgão. Este aumento é consigo através do aumento da síntese de componentes estruturais. Como foi dito anteriormente um mesmo estímulo pode originar hiperplasia e hipertrofia, o que no caso dos tecidos sem capacidade de divisão (ex. Miocárdio) se traduz apenas em hipertrofia. O núcleo das células hipertróficas pode ter um maior conteúdo de DNA, o que provavelmente se deve à entrada no ciclo celular, sem que se conclua a divisão mitótica. A hipertrofia pode ser fisiológica ou patológica, resultando de um aumento na estimulação hormonal ou da necessidade funcional desse tecido (ex. Músculo estriado a quando do exercício físico continuado.). No caso particular do miocárdio o principal estímulo é o aumento crónico da carga hemodinâmica, como consequência da hipertensão ou da falência valvular. O aumento das fibras e da síntese proteica é resultado de um equilíbrio entre as necessidades e a capacidade funcional das células estimuladas. Como exemplo da hipertrofia em resposta a estímulos hormonais temos o aumento do útero a quando de uma gravidez, mas que resulta tanto de hipertrofia como de hiperplasia. O mesmo se passa com o aumento da mama a quando da lactação. Sabe-se actualmente que até mesmo o músculo cardíaco e esquelético possuem uma limitada capacidade de proliferação através de precursores, no entanto este tipo de resposta na maior parte das vezes não ocorre, verificando-se apenas a hipertrofia. Mecanismos de Hipertrofia O mecanismo de hipertrofia do miocárdio envolve a activação de inúmeras vias de transdução, resultando na indução de genes, que por sua vez estimulam a síntese de numerosas proteínas celulares. Os genes induzidos incluem:
- Factores de Transcrição (c-fos e c-jus); - Factores de Crescimento (TGF-β, IGF-1 e FGF); - Agentes Vasoactivos (Agonistas α-adernégicos, Endotelina-1 e Angiotensina II). Este factores pode ainda estar envolvidos na transição das proteínas contrácteis do adulto para fetal ou neo-natal. Alguns genes são expressos apenas durante o desenvolvimento precoce e voltam a ser expressos no caso de células hipertróficas, sendo os produtos destes genes indispensáveis para a resposta ao stress por parte destas células. Como exemplo temos a expressão do ANF (Factor Natriurétido Auricular) que durante o desenvolvimento é expresso nos ventrículos e aurículas, sendo durante a vida adulta apenas expresso nas aurículas, e que a quando de estímulos hipertróficos volta a ser expresso nos ventrículos. Os estímulos para a hipertrofia ou para o desencadear da expressão destes genes são: - Estímulos Mecânicos, como o caso da força; - Estímulos Tróficos, nomeadamente factores de crescimento e agentes vasoactivos. No caso concreto da hipertrofia do miocárdio é importante compreender que existe um limite, nomeadamente quando o aumento do tecido não é compensado por um aumento da sua vascularização, o que conduz a um conjunto de alterações degenerativas. Destas alterações destacam-se a lise e perda das fibras contrácteis, a morte, quer por apoptose, quer por necrose, dos miócitos. Estas limitações vasculares impõem uma diminuição da capacidade oxidativa das mitocôndrias, alterações na síntese e degradação proteica, ou alterações no citoesqueleto.
Atrofia
A diminuição no tamanho celular por perda de substancia é conhecido como atrofia. Este tipo de resposta representa uma adaptação, que em último caso pode culminar em morte celular. Quando um número considerável de células sofre este processo, o volume do tecido ou órgão diminui, tornando-se atrófico. Este tipo de fenómenos surgem cedo no desenvolvimento, tendo como exemplo central a involução da notocorda. As causas mais comuns de atrofia são: - Diminuição Funcional, como é o caso da imobilização de um membro a quando da sua fractura, resultando numa diminuição do tamanho e número de fibras musculares; - Perda de Enervação, o normal funcionamento muscular é directamente depende da sua enervação, o que no caso de perda da mesma resulta em rápida atrofia; - Diminuição do Suprimento Sanguíneo, denominando-se isquémia, levando a uma atrofia e perda celular; - Nutrição Inadequada, uma profunda má nutrição proteico-calórica – marasmo (é a desnutrição proteico-calórica do tipo seco, ou seja, é uma desnutrição por falta de calorias e proteínas em um paciente muito magro e desidratado. Esta condição é resultado da fome por escassez de alimento) – está associada ao uso do músculo-esquelético como fonte energética, após outras reservas se terem esgotado. Este processo resulta numa perda muscular considerável, conhecida como caquéxia(é a perda de peso, atrofia muscular, fadiga, fraqueza e perda de apetite por alguém que não está tentando perder peso ou seja uma desnutrição aguda. Pode ser um sinal médico de diversos distúrbios; quando um paciente apresenta caquexia, o médico geralmente considera a possibilidade de cancro, e algumas doenças infecciosas (como tuberculose, SIDA,Leishmaniose Visceral e alguns distúrbios autoimunitários)) - Perda de Estimulação Endócrina, o que se verifica após a menopausa, originando atrofia do endométrio, vagina, epitélio e mama;
- Envelhecimento, este processo está associado à perda celular, particularmente no cérebro e coração; - Pressão, a compreensão de um determinado tecido por um período de tempo considerável pode originar atrofia, o que resulta provavelmente da redução do fluxo sanguíneo nesse tecido. A atrofia resulta de uma perda dos componentes estruturais, no caso das células musculares existe uma diminuição do número de mitocôndrias e de fibras contrácteis, mas também na quantidade de retículo endoplasmático. Caso a atrofia seja prolongada e os estímulos intensos pode conduzir à morte celular, o que se comprova pela partilha de estímulos indutores entre a atrofia e a apoptose. Mecanismos de Atrofia A atrofia resulta de uma alteração no equilíbrio entre a síntese e a degradação de proteínas. Os lisossomas contêm hidrolases ácidas e outras enzimas que degradam proteínas endocitadas oriundas do meio extracelular, presentes na membrana ou no citoplasma. A via ubiquitina-proteossaoma é responsável pela degradação de muitas das proteínas do citosol e do núcleo. Muitas das situações de atrofia são marcadas por um aumento dos vacúolos autofágicos, contendo componentes celulares que a quando da junção com os lisossomas serão degradados. Alguns destes vacúolos podem resistir à digestão, o que origina corpos residuais, como é o caso dos grânulos de lipofuscina – atrofia castanha.
Metaplasia
A metaplasia é um processo reversível que consiste na mudança de um tipo de tecido adulto por outro. Muitas vezes esta alteração representa uma resposta ao stress, na medida em que as novas células podem possuir uma maior capacidade para resistir a determinado estímulo adverso. A metaplasia epitelial mais comum é de colunar para estratificado, que surge muitas vezes no tracto respiratório como resposta à irritação crónica (ex. Fumadores). Por outro lado pode ainda ocorrer esta mesma alteração no caso de cálculos nas vias excretoras das glândulas salivares, pâncreas ou da vesícula biliar, que devido a uma agressão constante o seu epitélio sofrem uma transformação de colunar para estratificado. O défice de vitamina A (Ácido Retinóico) leva a uma metaplasia do epitélio respiratório, transformando-se este em estratificado, mas por outro lado um excesso leva a um bloqueio na queratinização. Esta metaplasia no tracto respiratório traz algumas consequências, nomeadamente a ausência de produção de muco e de cílios que o expulsem. A metaplasia por si só não conduz à transformação maligna, mas sabe-se que se o estímulo for persistente existe uma maior probabilidade dessa transformação ocorrer nesse epitélio. Pode ainda ocorrer uma metaplasia em que o epitélio escamoso passe a colunar, sendo o exemplo mais conhecido o Esófago de Barrett, onde o epitélio estratificado do esófago é transformado em epitélio colunar do tipo intestinal. Esta transformação deve-se à constante agressão da mucosa do esófago pelo refluxo gástrico ácido. Nesta zona de metaplasia do esófago, caso ocorra transformação maligna, são mais comuns as neoplasias do tipo glandular – adenocarcinomas. Existe ainda metaplasia dos tecidos conjuntivos, esta caracteriza-se pela formação de cartilagem, osso ou tecido adiposo em tecidos que normalmente não contêm este tipo de tecidos. Temos como exemplo a Miosite Ossificante, em que, geralmente após uma fractura, forma-se osso no interstício do tecido muscular. Mecanismos de Metaplasia
A metaplasia não resulta de uma alteração no fenótipo das células diferenciadas, mas sim de uma reprogramação das células estaminais existentes nos tecidos, ou de células mesenquimais indiferenciadas. A diferenciação das células estaminais para uma determinada linhagem é determinada por sinais gerados por citocinas, factores de crescimento e componentes da matriz extracelular no ambiente que rodeia a célula. Sabe-se que os BMP (Bone Morphogenetic Proteins) induzem a condrogénese ou a osteogénese em células estaminais, e ao mesmo tempo suprimem a diferenciação em células musculares ou tecido adiposo. Pensa-se que os citostáticos ao induzirem alterações nos padrões de metilação do DNA possam conduzir a transformações de células de um tipo (Fibroblastos) noutro (Músculo ou Cartilagem).
Lâmina A1 Dados Clínicos: Homem, de 26 anos, orquidectomia (ablação de um ou dos dois testículos; também se
diz orquiectomia) inguino-femoral e colocação de prótese escrotal.
Teoria – Patologia do Testículo
Testículos Normais: 4,5cm; 10-14g À excepção da descida incompleta dos testículos (criptorquidia), as anomalias congénitas são raríssimas e incluem ausência de um ou ambos os testículos, fusão dos testículos (sinorquidia) e a formação de quistos relativamente insignificantes dentro do testículo. CRIPTORQUIDIA- A criptorquidia é sinónimo de testículos retidos, sendo encontrada em cerca de 1% dos rapazes se 1 ano de idade. Representa uma ausência completa ou incompleta da descida dos testículos intra-abdominais para o saco escrotal. Geralmente ocorre como uma anomalia isolada, mas pode ser acompanhada de outras malformações do tracto genitourinário como hipospadia (abertura do meato urinário em posição anormal). A descida testicular ocorre em duas fases morfológica e hormonalmente distintas: a primeira, transabdominal, possivelmente controlada pelo factor inibidor mulleriano. A segunda, inguinoescrotal, controlada pela libertação deo peptideo relacionado com o gene da calcitonina que é induzida por androgénios. Embora a descida testicular seja controlada por factores hormonais, a criptorquidia apenas raramente está associada a distúrbios hormonais. É aceite que geralmente os doentes com criptorquidia sofrem um aumento de 5 a 10 vezes do risco de tumor testicular.
Morfologia: A criptorquidia é unilateral na maioria dos casos, mas é bilateral em 25% dos doentes. As alterações histológicas começam desde os 2 anos de idade. Caracterizam-se por uma paragem do desenvolvimento das células germinativas associada a hialinização acentuada e a espessamento da membrana basal dos túbulos espermáticos. Mais tarde, os túbulos aparecem como cordões densos de tecido conjuntivo hialino delineados por membranas basais proeminentes. Há um aumento concomitante do estroma intersticial. Como as células de Leydig são poupadas, elas parecem ser proeminentes. Como seria esperado na atrofia tubular progressiva, o testículo retido tem um tamanho pequeno e consistência firme devido a alterações fibróticas. A deterioração histológica, levando à escassez de células germinativas, também foi observada no testículo contralateral (que desceu ao escroto) em doentes com criptorquidia unilateral, sustentando a origem hormonal para o desenvolvimento desse distúrbio. A orquidopexia (colocação no saco escrotal) não garante a fertilidade. ATROFIA TESTICULAR – A atrofia é a única alteração regressiva importante que afecta o testículo escrotal, e pode ter uma série de causas, como: -estreitamento aterosclerótico progressivo do suprimento sanguíneo numa idade avnaçada; - estágio terminal de uma orquite inflamatória, seja qual for o agente etiológico;
- criptorquidia; - hipopituitarismo; - desnutrição ou caquexia generalizada; - obstrução do efluxo de sémen; - irradiação; - administração prolongada de hormonas sexuais feminininas, como no tratamento de doentes com carcinoma da próstata; - atrofia por exaustão, que pode suceder a estimulação persistente produzida por altos níveis de hormona folículo-estimulante hipofisária. As alterações macro e microscópicas seguem o padrão já descrito para a criptorquidia.
Resolução
1 – Quais são as alterações celulares presentes?
Espessamento e hialinização da membrana basal dos túbulos seminíferos; epitélio germinativo
atrofiado; hiperplasia das células de Leydig.
2 – Há atrofia do epitélio germinativo e há hiperplasia das células de Leydig.
3 – Explique a relação entre as duas alterações presentes.
O espessamento da membrana basal do stúbulos seminíferos, inibe o desenvolvimento das células
germinativas e de Sertoli, havendo diminuição da produção de inibina e como tal elevam-se os níveis de
LH determinando hipertrofia e hiperplasia das células de Leydig.
4 – A localização ectópica deste órgão denomina-se criptorquidismo e associa-se a diminuição da
fertilidade e a seminoma (tumor maligno desenvolvido à custa das células germinativas primitivas, não
diferenciadas, do testícelo ou do ovário).
Lâmina A2 Dados Clínicos: Mulher, 25 anos, hemorragia pós-parto incontrolável.
Teoria – Sangramento Uterino Disfuncional
Durante a vida reprodutiva activa, o endométrio está constantemente envolvido na dinâmica de descamação e recrescimento. É controlado pela elevação e queda dos níveis de hormonas hipofisárias e ovarianas, e esse controlo é exercido pelo momento apropriado de libertação hormonal em quantidades tanto absolutas quanto relativas. As alterações nesse mecanismo de ajuste fino podem resultar no espectro de distúrbios, incluindo atrofia, padrões proliferativos ou secretores anormais e hiperplasia. Sem dúvida alguma, o problema mais comum é a ocorrência de sangramento excessivo durante ou entre os períodos menstruais. As causas do sangramento uterino anormal são numerosas e variam entre mulheres de diferentes grupos etários. Em alguns casos, o sangramento resulta de uma lesão orgânica bem definida, como leiomioma submucoso, pólipo endometrial ou adenocarcinoma; entretanto, o grupo maior é constituído pelo denominado sangramento uterino disfuncional. Esse grupo é definido como a ocorrência de sangramento anormal na presença de um distúrbio funcional, mais do que devido a uma lesão orgânica do endométrio ou do útero. HIPERPLASIA ENDOMETRIAL – constitui outra causa de sangramento anormal, que difere da anovulação típica pelo grau de alterações do epitélio glandular no endométrio. Apresenta relações com o carcinoma do endométrio. A hiperplasia do endométrio está relacionada a um nível anormalmente elevado e prolongado de estimulação estrogénica, com diminuição ou ausência de actividade progestacional. Por conseguinte, a hiperplasia ocorre mais comummente próximo da menopausa ou em associação a anovulação persistente em mulheres mais jovens. As condições que levam à hiperplaisa incluem doença poliquística do ovário (incluindo síndrome de Stein-Leventhal), tumores funcionantes de células da granulosa do ovário, função cortical excessiva (hiperplasia do estroma cervical) e administração prolongada de substâncias estrogénicas (terapia de reposição com estrogénios). Estas são as mesmas influências consideradas de importância patogénica numa percentagem de carcinomas endometriais. Muitas hiperplasias endometriais exibem alteração da diferenciação celular (metaplasia), incluindo a presença de metaplasia escamosa de células ciliadas.
Morfologia: A hiperplasia endometrial exibe um espectro contínuo de alterações na arquitectura glandular, padrão de crescimento epitelial e citologia, com aumento do grau em função da gravidade dessas alterações.
Resolução
1 – O corpo uterino durante a gravidez aumenta cerca de 20 a 30 vezes.
2 – Observe e compare as células musculares lisas do miométrio com as do vaso adjacente e responda:
O aumento do tamanho do órgão é à custa do aumento do tamanho e do número de células, que se
denominam respectivamente hipertrofia e hiperplasia.
Lâmina A3 Dados Clínicos: Homem, 56 anos, antecedentes de estenose aórtica.
Teoria – Hipertrofia Cardíaca
A hipertrofia cardíaca corresponde a uma respost compensatória do miocárdio ao aumento do trabalho mecânico ou a sinais tróficos (p. ex.: hipertiroidismo através da estimulação dos receptores ß-adrenérgicos). Esses estímulos aumentam a velocidade de síntese de proteínas, a quantidade de proteína em cada célula, o tamanho dos miócitos, o número de sarcómeros e mitocôndrias e, consequentemente, a massa e o tamanho do coração. A resposta também é acompanhada de regulação selectiva de vários genes da resposta inicial imediata e formas embrionárias de proteínas contrácteis e outras proteínas. Como os miócitos adultos são incapazes de se dividirem, não pode ocorrer aumento do número dessas células (hiperplasia). O padrão de hipertrofia reflecte a natureza do estímulo. Os ventrículos com sobrecarga de pressão (HTA ou estenose aórtica) desenvolvem hipertrofia por pressão – concêntrica – do ventrículo esquerdo, com aumento da espessura da parede e diâmetro normal ou reduzido da cavidade. Em contraste, os ventrículos com sobrecarga de volume (regurgitação da valva mitral ou aórtica) desenvolvem hipertrofia discêntrica acompanhada de dilatação, com aumento do diâmetro ventricular. Evidentemente, a geometria, a estrutura e a composição (células e matriz extracelular) do ocração hipertrofiado não são normais. A hipertrofia cardíaca constitui, portanto, um ténue equilíbrio entre características adaptativas (incluindo novos sarcómeros) e alterações estruturais, bioquímicas e moleculares potencialmente deletérias (incluindo redução da relação entre capilares e miócitos, aumento do tecido fibroso e síntese de proteínas anormais e, talvez, disfuncionais). Por conseguinte, não é surpreendente que a hipertrofia cardíaca persistente evolua frequentemente para insuficiência cardíaca.
Resolução
1 – O aumento da espessura da parede ventricular é devido à hipertrofia dos miócitos.
2 – Observa-se também aumento do núcleo.
3 – O aumento conjunto do volume celular e do núcleo é um exemplo de hipertrofia.
4 – Identifique qual é o estímulo lesional neste caso clínico?
Estenose aórtica (aumento da pós-carga leva a uma hipertrofia concêntrica).
Lâmina A4 Dados Clínicos: Homem, 58 anos, tumor cervical.
Teoria – Bócio Multinodular
Com o decorrer do tempo, os episódios recorrentes de hiperplasia e invlução combinam-se e produzem aumento mais irregular da tiróide, conhecido como bócio multinodular. Praticamente todos os bócios simples de longa duração se transformam em bócios multinodulares. Podem ser atóxicos ou podem induzir tireotoxicose (bócio multinodular tóxico). Os bócios multinodulares produzem os aumentos mais extremos da tiróide e são mais frequentemente confundidos com comprometimento neoplásico do que com qualquer outra forma de doença tiroideia. Como derivam de bócio simples, ocorrem tanto na forma esporádica como endémica, exibindo a mesma distribuição entre mulheres e homens e, presumivelmente, as mesmas origens; todavia, afectam indivíduos de mais idade, visto que constituem complicações tardias.
Morfologia: os bócios multinodulares são glândulas multilobuladas com aumento assimétrico, cujo peso pode ultrapassar 2000g. O padrão de aumento é muito imprevisível e pode envolver mais um lobo do que o outro, exercendo pressão lateral sobre as estruturas da linha média, como a traqueia e o esófago. Noutros casos, o bócio cresce atrás do esterno e das clavículas, produzindo o denominado bócio intratorácico ou mergulhador. Em corte transversal, são observados nódulos irregulares contendo quantidades variáveis de colóide gelatinoso e acastanhado. Com frequência, ocorrem alterações regressivas, particularmente nas cisões mais antigas, incluindo áreas de hemorragia, fibrose, calcificação e alteração quística. O aspecto microscópico inclui folículos ricos em colóides revestidos por epitélio achatado e inactivo, com áreas de hipertrofia e hiperplasia epitelial folicular.
Resolução
1 – O tumor cervical descrito corresponde à glândula tiróide.
2 – As estruturas dilatadas correspondem a folículos.
3 – O volume das células é uma resposta a um estímulo e corresponde a um exemplo de hipertrofia.
4 – Está presente neste caso algum outro tipo de adaptação celular? Sim
5 – Qual é? Atrofia
Lâmina A5 Dados Clínicos: Homem, 61 anos, antecedentes de esofagite péptica.
Teoria – Esófago de Barret
O esófago de Barret é uma complicação do refluxo gastroesofágico de longa duração, ocorrendo em até 11% dos pacientes com sintomas da doença. No esófago de Barret, em resposta a uma lesão prolongada, a mucosa escamosa distal é substituída por um epitélio cilindrico metaplásico. Os doentes com esófago de Barret têm uma longa história de azia e outros sintomas de refluxo e parecem ter um refluxo mais abundante, além de serem mais frequente e mais prolongados do que na maioria do doentes com refluxo. Não se conhece o motivo pelo qual se desenvolve epitélio cilíndrico nuns doentes com refluxo e noutros não.
Morfologia: visto macroscopicamente ou à endoscopia, aparenta ser uma mucosa vermelha e aveludada localizada entre a mucosa pavimentosa esofágica lisa e a mucosa gástrica rosa-acastanhada clara viçosa. Pode existir na forma de linguetas ou como fragmentos isolados (ilhas) que se estendem a partir da junção gastroesofágica, ou como uma faixa circunferencial ampla que desloca superiormente a junção cilíndrico-pavimentosa. Uma pequena zona da mucosa metaplásica pode estar presente apenas na junção gastro-esofágica (pequeno segmento da mucosa de Barret). Ao exame microscópico, o epitélio pavimentoso esofágico é substituído por um epitélio cilíndrico metaplásico e com glândulas mucosas. A mucosa metaplásica pode conter apenas superfície gástrica e células glandulares secretoras de muco, tornando difícil a distinção clínica de uma hérnia hiatal. O diagnóstico é feito mais rapidamente quando a mucosa cilíndrica possui células caliciformes intestinais. Na avaliação patológica dos doentes com mucosa de Barret, é fundamental a pesquisa de displasia (suposto precursor de malignidade) no epitélio cilíndrico com metaplasia intestinal. A displasia caracteriza-se pela presença de anormalidades citológicas e arquitecturais que se estendem até à superfície luminal do epitélio cilíndrico. Essas anormalidades consistem em núcleos hipercromáticos aumentados, aglomerados e estratificados, e na perda do estroma interposto entre as estruturas glandulares adjacentes. A displasia é classificada como de baixo grau ou de alto grau. A principal distinção consiste na orientação epitelial basal de todos os núcleos, na displasia de baixo grau, versus núcleos que estão sempre alcançando o ápice das células epiteliais, na displasia de alto grau. A displasia de alto grau persistente demanda intervenção clínica.
Resolução
1 - A zona a observar corresponde à transição esófago-gástrica.
2 – A alteração observada denomina-se esófago de Barret que consiste em metaplasia.
3 – A célula característica desta entidade clínico-patológica é a célula caliciforme.
4 – Identifique outro(s) tipo(s) de células presentes, nesta lâmina, e que também fazem parte da
alteração adaptativa: Células caliciformes; (células de Paneth e glândulas mucosas)
Lâmina A6 Dados Clínicos: Mulher, 40 anos, histerectomia por leiomiomas.
Teoria – Metaplasia Epitelal Pavimentosa
Define-se ectrópio como a presença de epitélio endocervical cilindrico evertido no ectocérvix. Apresenta-se como uma grande área avermelhada no ectocérvix em redor do orifício cervical externo. É a região em que ocorre a transformação fisiológica de metaplasia pavimentosa, assim como a transformação anormal na carcinogénese cervical. JUNÇAO PAVIMENTOSA-CILINDRICA - A junção pavimentosa-cilindrica apresenta-se como uma linha bem definida com um degrau, devido à diferença de altura dos epitélios pavimentoso e cilindrico. A localização da junção pavimentosa-cilindrica em relação ao orifício cervical depende de factores como a idade, uso de anticoncepcionais orais e certas condições fisiológicas como gravidez. À nascença, a junção pavimentosa-cilindrica é denominada de junção pavimentosa-cilindrica original, porque representa a junção entre o epitélio cilindrico e o epitélio pavimentoso “original” formada durante a embriogénese e vida intra-uterina. Na infância e perimenarca, a junção pavimentosa-cilindrica original está localizada no, ou muito próxima ao, orifício cervical
externo. Depois da puberdade e durante o período reprodutivo o colo uterino aumenta de tamanho e o canal endocervical alonga-se. Isto leva à eversão do epitélio cilindrico da porção inferior do canal endocervical próximo à ectocérvix. Esta condição é denominada de ectrópio ou ectopia, visível como um ectocérvix de aspecto bem avermelhado.
A acção tampão do muco que recobre as células cilindricas sofre interferência quando o epitélio cilindrico evertido no ectrópio fica exposto ao meio vaginal ácido. Isto leva à destruição e subsequente substituição do epitélio cilindrico pelo epitélio pavimentoso metaplásico recém-formado. O processo metaplásico começa na junção pavimentosa-cilindrica e prossegue centriptamente em direção ao orifício cervical externo ao longo do período reprodutivo até a menopausa. À medida que a mulher passa da idade reprodutiva à menopausa, a localização da nova junção pavimentosa-cilindrica avança progressivamente em direcção ao orifício cervical externo. Nas mulheres na pós-menopausa, a nova junção pavimentosa-cilindrica é, muitas vezes, invisível ao exame visual. A substituição fisiológica do epitélio cilindrico evertido por um epitélio pavimentoso recém-formado é denominada de metaplasia pavimentosa. Usa-se o termo epitélio pavimentoso metaplásico imaturo quando há pouca ou nenhuma estratificação no epitélio metaplásico recém-formado. As células do epitélio pavimentoso metaplásico imaturo não produzem glicogénio e, portanto, não adquirem coloração castanho clara ou preta com a solução de Lugol. Com o avanço do processo, as células metaplásicas pavimentosas imaturas diferenciam-se em epitélio metaplásico estratificado maduro. Vários cistos, denominados de cistos de Naboth (folículos), são vistos no epitélio pavimentoso metaplásico maduro. Os cistos de Naboth são cistos de retenção que se desenvolvem como resultado da oclusão da abertura de criptas endocervicais pelo epitélio pavimentoso metaplásico suprajacente. O epitélio cilindrico encoberto continua a secretar muco que com o tempo fica cheio e distende o cisto. O muco encarcerado confere uma tonalidade branco-marfim.
A metaplasia pavimentosa é um processo irreversível; o epitélio transformado (agora de natureza pavimentosa) não é revertido a epitélio cilindrico. Certos tipos de papilomavírus humano (HPV) podem infectar de modo persistente as células
metaplásicas escamosas basais imaturas e transformá-los em células atípicas com anomalias nucleares e citoplasmáticas. A proliferação e expansão descontrolada dessas células atípicas podem levar à formação de um epitélio displásico anormal que pode regredir ao normal, persistir como displasia ou progredir para neoplasia invasiva após algum tempo.
Resolução
1 – O que é uma histerectomia? O que são leiomiomas?
Remoção do útero e do colo uterino. Neoplasia benigna do músculo liso, pode ocorrer em qualquer
órgão, mas as suas formas mais comuns ocorrem no útero, intestino delgado e esófago.
2 - O fragmento a observar corresponde ao colo do útero. E a zona alterada situa-se na junção cilíndrico-
pavimentosa.
3 – Há a substituição de um epitélio cilíndrico simples por outro de tipo estratificado pavimentoso.
4 – Este processo adaptativo denomina-se metaplasia epitelial pavimentosa.
5 – É capaz de identificar outras alterações neste corte histológico? De que tipo?
Sim. Infiltrado de células inflamatórias.
L2 e L3 – Lesão e Morte Celular
Introdução Teórica
Resumo: Lesão e Morte Celular
A lesão celular surge quando as células estão perante uma situação de stress severa e não possuem a capacidade de se adaptarem a ela, mas pode também derivar de estímulos que são inerentemente causadores de lesão. A lesão pode ser reversível, tornar-se irreversível, e até mesmo culminar com a morte celular. Assim sendo consoante as alterações na células podemos dividir as lesões celulares em: - Lesão Celular Reversível, inicialmente manifesta-se como alterações funcionais e morfológicas, sendo estas reversíveis no caso de o estímulo que as originou cessar. As principais marcas deste tipo de lesão são a diminuição da oxidação fosforilativa, a depleção do ATP e turgescência celular causada pelas alterações iónicas e o influxo de água. - Lesão Irreversível e Morte Celular, com o continuar do dano a lesão torna-se irreversível, o que acontece a partir do momento em que a célula não consegue voltar ao seu estado inicial. Uma das grandes questões discutidas actualmente roda em torno de qual o ponto a partir do qual esta situação acontece. Estudos realizados em tecidos isquémicos mostram-nos que algumas alterações estruturais (ex. Massas amorfas nas mitocôndrias, indicativas de lesão mitocôndrial) e funcionais (ex. Perda da permeabilidade da membrana) são indicativas de que a células sofreu uma lesão irreversível.
Existem dois tipos distintos de morte celular, a apoptose e a necrose. Quando a lesão das membranas é grave, as enzimas lisossomais penetram no citoplasma e digerem os componentes celulares, resultando numa libertação desses mesmos componentes e consequente necrose. Por outro lado, alguns estímulos nocivos, especialmente os que lesam o DNA, induzem a apoptose; esta é caracterizada por dissolução nuclear sem perda da integridade membranar. Enquanto a necrose está sempre associada a uma condição patológica, a apoptose surge
como uma resposta fisiológica em muitos casos, não estando directamente associada a lesão celular.
Causas da Lesão Celular
Privação de Oxigénio
Hipoxia é uma privação no suprimento de oxigénio. Esta privação interfere com a respiração
aeróbia oxidativa, sendo uma causa extremamente importante e comum de lesão e morte
celular.
A hipoxia deve ser distinguida da isquémia; a isquémia define-se como a perda perfusão
sanguínea num tecido, o que se pode dever ao bloqueio do fluxo arterial ou reduzida
drenagem venosa. Embora a isquémia seja a causa mais comum de hipoxia, esta também pode
resultar da falta de oxigenação do sangue (ex. Pneumonia), ou por redução da capacidade de
transporte de oxigénio do sangue (ex. Anemia, Perda de sangue ou Intoxicação por Monóxido
de Carbono). Enquanto a hipoxia apenas reduz a quantidade de oxigénio, na isquémia existe
ainda a diminuição do suprimento de glicose e outros substratos importantes.
Dependendo do grau de hipoxia a célula pode ter uma resposta adaptativa, sofrer lesão ou
mesmo a morte celular. Verifica-se que quando a artéria femoral tem o seu calibre diminuído
os músculos da perda diminuem de tamanho, conduzindo num primeiro momento a atrofia,
mas caso haja uma hipoxia mais acentuada pode originar lesão celular e consequente morte
celular.
Agentes Físicos
Trauma, extremos de temperatura, radiação, choque eléctrico e mudanças bruscas na pressão
atmosférica, todos têm um amplo efeito sobre as células. As consequências da exposição a
estes estímulos podem ir desde a lesão reversível até à morte celular.
Agentes Químicos e Drogas
Substâncias químicas simples como a glicose ou o sal em concentrações hipertónicas podem
causar directamente lesão celular ou desequilibrar a homeostasia electrolítica das células.
Num caso extremo, até mesmo o oxigénio em altas concentrações pode ser extremamente
tóxico. Existem depois os já conhecidos “venenos”, como é o caso do arsénio, cianeto ou sais
de mercúrio; estes possuem a capacidade de destruir um elevado número de células num
curto período de tempo, podendo mesmo conduzir à morte. Depois existe todo um conjunto
de substâncias a que estamos expostos no nosso dia-a-dia, como é o caso dos poluentes
ambientais, insecticidas, álcool e drogas, que podem em algumas situações ser altamente
tóxicos para o nosso organismo.
Agentes Infecciosos
Estes agentes vão desde os vírus às ténias, sendo que pelo meio podemos encontrar bactérias,
fungos e diversos parasitas.
Reacções Imunológicas
Embora o sistema imunitário defenda o corpo contra microrganismos patogénicos, reacções
imunitários também podem originar lesão de células e tecidos. Exemplos incluem reacções
auto-imunes contra os próprios tecidos e reacções alérgicas contra substâncias ambientais em
indivíduos geneticamente susceptíveis.
Defeitos Genéticos
Defeitos genéticos podem resultar em alterações patológicas, tendo como exemplo as
malformações congénitas associadas ao Síndrome de Down ou como a subtil alteração de um
único aminoácido na hemoglobina S dando origem a anemia falciforme. Defeitos genéticos
podem causar lesão celular devido à deficiência de proteínas funcionais, tais como enzimas
originando alterações do metabolismo ou acumulação de proteínas sem conformação
correcta. Variações na composição genética também podem influenciar a susceptibilidade das
células ao dano por produtos químicos e outros agressores ambientais.
Desequilíbrios Nutricionais
Os desequilíbrios nutricionais continuam a ser uma das principais causas de lesão celular.
Deficiências proteico-calóricas causam inúmeras mortes na população menos privilegiada, mas
podem ainda existir deficiências de determinadas vitaminas, originando patologias específicas.
Por outro lado no mundo de hoje existe já em alguns locais um excesso de ingestão calórica,
levando a uma acumulação de lípidos. Este excesso de lípidos favorece a aterosclerose, sendo
que a obesidade é a manifestação mais comum desses excessos.
Mecanismos de Lesão Celular
Os mecanismos bioquímicos responsáveis pela lesão celular são complexos, no entanto existem alguns princípios que são importantes para a maior parte dos tipos de lesão: - A resposta celular ao estímulo prejudicial depende do tipo, da duração e sua intensidade; - As consequências da lesão celular dependem do tipo, estado e capacidade de adaptação da célula em questão; - A lesão celular resulta de alterações funcionais e estruturais em um ou mais componentes essenciais da célula. Sendo que os alvos mais importantes são: mitocôndria, a integridade das membranas, a síntese proteica, o citoesqueleto e o material genético; Em seguida serão discutidos em mais pormenor para um dos mecanismos bioquímicos responsáveis pela lesão celular originada por diferentes estímulos.
Depleção do ATP A depleção do ATP e a diminuição da sua síntese estão frequentemente associadas a hipoxia e lesão por agentes químicos. O ATP é necessário para a maior parte dos processos de síntese e degradação que ocorrem na célula, o que inclui o transporte membranar, a síntese proteica, a lipogénese e as reacções de reciclagem lipídica.
O ATP pode ser produzido de duas formas, sendo que nos mamíferos predomina a vai da fosforilação oxidativa, mas existe também a via da glicólise. A primeira via necessita de oxigénio e tem um rendimento muito superior ao da glicólise, que é utilizada em situações de anaerobiose. Uma depleção de menos 5 a 10% da quantidade normal de ATP pode interferir com muitos dos processos normais da célula: - A actividade das bombas iónicas da membrana dependentes de ATP é reduzida, acumulando-se o sódio intracelularmente e o potássio difundindo-se para o exterior, o que origina turgescência; - O metabolismo energético da célula é alterado, existindo um predomínio da glicólise anaeróbio, o que origina uma menor produção de ATP. Perante esta
situação existe uma rápida depleção do glicogénio celular e um excesso de produção de ácido láctico; surge por isso uma baixo do pH intracelular, o que por sua vez pode condicionar o funcionamento de muitas das enzimas celulares; - Diminuição da bomba de Ca2+, o que conduz a um influxo de cálcio; - Com o prolongar da situação o complexo responsável pela síntese proteica separa-se, os ribossomas dissociam-se do retículo endoplasmático, os polimossomas dissociam-se em monossomas, consequentemente existe uma diminuição da síntese proteica. Por fim existe uma lesão das mitocôndrias e das membranas lisossomais, o que conduz à necrose;
- Em células desprovidas de oxigénio ou glicose, as proteínas podem alterar a sua conformação. Esta alteração activa a unfolded protein response, o que na maior parte dos casos conduz a lesão celular e até mesmo à morte.
Lesão Mitocondrial A lesão celular é acompanhada na maior parte das vezes por alterações morfológicas na mitocôndria. Estas alterações podem surgir como consequência do aumento do Ca2+ intracelular, do stress oxidativo, pela clivagem dos fosfolípidos pela fosfolipase A2 e vias da esfingomielina, e ainda pelos produtos resultantes da clivagem dos lípidos. A lesão da mitocôndria resulta na formação de canais com alta conductância na membrana mitocôndrial interna, sendo este processo reversível nos primeiros estádios. Esta alteração na permeabilidade da membrana interna da mitocôndria condiciona a cadeia transportadora de electrões (CTE), e desse modo a produção de ATP. A lesão mitocôndrial também pode estar associada com libertação de citocromo c no citosol, pois este é um componente central da CTE, e ao mesmo tempo tem a capacidade de induzir a apoptose.
Perda da Homeostasia do Cálcio e Influxo de Cálcio O cálcio é um dos mais importantes marcadores da lesão celular. As concentrações de cálcio no citosol são mantidas em níveis extremamente baixos (< 0,1 mmol), sendo que a maior parte do cálcio se encontra armazenado na mitocôndria e no retículo endoplasmático (RE). A isquémia e alguns tóxicos podem causar um aumento inesperado de cálcio no citosol, aumentando o influxo de cálcio através da membrana e libertando o cálcio armazenado na mitocôndria e RE. Este aumento de Ca2+ induz a activação de enzimas com potencial de provocar a morte celular, nomeadamente ATPases, Fosfolipases, Proteases e Endonucleases. Por outro lado o aumento de cálcio intracelular pode provocar alterações na permeabilidade mitocôndrial, o que induz a apoptose.
Acumulação de Radicais Livres de Oxigénio (Stress Oxidativo) A célula produz energia reduzindo oxigénio molecular a água, o que pode originar moléculas reactivas de oxigénio. Estes radicais livres de oxigénio podem danificar lípidos, proteínas e os ácidos nucleicos. As células possuem sistemas de controlo sobre estes radicais livres, mas no caso de um desequilíbrio pode originar-se stress oxidativo. Sabe-se que estes radicais livres de oxigénio estão envolvidos na lesão induzida por químicos e radiação, isquémia-reperfusão, envelhecimento celular e morte de microrganismos por fagocitose. Os efeitos causados por estes radicais livres de oxigénio podem ser: - Peroxidação dos Lípidos das Membranas; - Modificação Oxidativa de Proteínas; - Lesão no DNA; As células desenvolveram alguns mecanismos para remover estes radicais livres ou para minimizar os seus efeitos: - Anti-Oxidantes, como o exemplo da Vitamina A e E, respectivamente Retinol e Tocoferol; - Ferro e Cobre, ambos possuem a capacidade de catalisar a formação destes radicais; - Enzimas com capacidade de clivar estes radicais originando moléculas mais estáveis: - Catalase, presente nos peroxissomas; - Superóxido Dismutase; - Glutatião Peroxidase.
Defeitos na Permeabilidade da Membrana A perda precoce da permeabilidade da membrana é um sinal evidente de disfunção da membrana plasmática, o que se afirma como um dos principais sinais na maior parte dos tipos de lesão celular. Não apenas a membrana plasmática é afectada, mas também a membrana
mitocôndrial, do retículo endoplasmático e dos lisossomas. A membrana pode ser alterada directamente por estímulos físicos ou químicos, mas pode igualmente ser resultado do influxo de cálcio, e consequente activação das fosfolipases, ou por depleção do ATP. As alterações da permeabilidade da membrana podem derivar de: - Perda dos fosfolípidos da membrana, sendo muitas vezes consequência de uma activação das fosfolipases provocada pelo aumento do Ca2+ intracelular, mas também pela depleção do ATP ou diminuição da síntese de fosfolípidos; - Alterações do Citoesqueleto, podem provocar alterações na fixação da membrana meio intracelular. Estas alterações podem surgir como consequência da activação de proteases, derivada do aumento do influxo de Ca2+, ou ainda como resultado final de uma turgescência celular extrema; - Espécies Reactivas de Oxigénio, podem lesar directamente os constituintes da membrana, mas também outros componentes celulares; - Produtos do Catabolismo Lipídico, como é o caso dos ácidos gordos, acil-carnitina e lisofosfolípidos; estes por sua vez podem funcionar como detergentes, destabilizando as membranas ao interagirem com estas, ou mesmo ao integrarem-se nelas. A lesão da membrana plasmática resulta numa perda do equilíbrio osmótico, com consequente influxo de fluidos e iões, bem como perda de proteínas, enzimas, co-enzimas e ácidos ribonucleicos. A lesão das membranas lisossomais lesa à libertação de enzimas no citosol e activação destas enzimas (RNases, DNases, Proteases, Fosfatases, Glucosidases, etc). A activação destas enzimas conduz à digestão enzimática dos componentes celulares, perda do material genético e reservas energéticas, consequentemente necrose.
Lesão Celular Reversível e Irreversível
As primeiras alterações celulares associadas com as diversas formas de lesão são:
- Diminuição da síntese de ATP;
- Perda da Integridade da Membrana;
- Alterações na Síntese Proteica;
- Alterações do Citoesqueleto;
- Lesão do DNA.
Dentro de determinados valores a célula possui a capacidade de contornar estas alterações e
voltar ao seu estado normal de equilíbrio. Caso este estímulo persista ou a sua intensidade
seja demasiadamente severa entramos no campo da lesão irreversível. Este tipo de lesão
encontra-se associado a:
- Lesão de todas as Membranas Celulares;
- Turgescência dos Lisossomas;
- Vacuolização das Mitocôndrias;
- Redução da Capacidade de Síntese de ATP;
- Influxo de Cálcio;
- Libertação de Cálcio (Mitocôndria e Retículo Endoplasmático);
- Activação das enzimas com capacidade para catalisar as membranas, proteínas, ATP e ácidos
nucleicos;
- Libertação dos metabolitos indispensáveis à síntese de ATP;
- Depleção Intracelular dos Fosfatos de Alta-Energia;
Existem dois fenómenos que contribuem principalmente para a lesão se tornar irreversível:
- Incapacidade para reverter as alterações mitocôndrias (Perda da capacidade de fosforilação
oxidativa e Síntese de ATP);
- Desenvolvimento de profundas alterações na funcionalidade da membrana plasmática.
A ruptura das membranas dos lisossomas conduz à digestão dos componentes celulares e
consequente necrose; ao mesmo tempo é possível que a libertação destas enzimas para o
espaço extracelular possa lesar os tecidos e células adjacentes.
A libertação de enzimas para o espaço extracelular revela-se um útil marcador da lesão celular,
o que sabendo algumas enzimas específicas de algumas células no permite detectar se existe
ou não lesão nesse tecido.
Morfologia da Lesão Celular e Necrose
A lesão celular caracteriza-se por um processo sequencial de alterações bioquímicas e
morfológicas progressivas, culminando com a morte celular. Os estímulos nocivos ou de stress
exercem os seus efeitos primeiramente a nível molecular e bioqúimico, e apenas mais tarde
têm representação funcional e morfológica.
Lesão Reversível
Existem dois padrões de lesão reversível que podem ser distinguidos através do microscópio
óptico:
- Turgescência Celular;
- Alterações Lipídicas.
A turgescência caracteriza-se pela incapacidade de manter a homeostase iónica e de fluidos, o
que resulta da perda das bombas iónicas presentes na membrana plasmática. As alterações
lipídicas surgem quando uma célula é exposta à hipoxia e outras formas de lesão tóxica ou
metabólica. Este último padrão de lesão caracteriza-se pela presença de pequenos ou grandes
vacúolos lipídicos no citoplasma. Este tipo de lesão é característico das células envolvidas ou
dependentes do metabolismo lipídico (ex. Miocárdio e Hepatócitos).
Morfologia - Turgescência Celular
A turgescência celular é uma das primeiras manifestações da maioria dos tipos de lesão
celular. As alterações são difíceis de observar, mas salienta-se a palidez, aumento da tensão
intracelular e do peso total do órgão. Numa análise microscópica é possível verificar a
existência de pequenos vacúolos no citoplasma, sendo uma representação de segmentos
distendidos do retículo endoplasmático. Este padrão não letal é vulgarmente designado por
alteração hidrópica ou degeneração vacuolar. A turgescência celular é reversível.
As alterações ao nível dos componentes celulares incluem:
- Alterações da Membrana Plasmática, salienta-se a distensão, embotamento e distorção das
microvilosidades. Formam-se figuras mielinizantes e perdem os anexos intracelulares;
- Alterações Mitocôndriais, incluem turgescência, rarefacção e presença de pequenos corpos
densos de fosfolípidos;
- Dilatação do Retículo Endoplasmático, destacando-se o desagregar e desagregar dos
polissomas;
- Alterações Nucleares, desintegração dos elementos granulares e fribilares.
Necrose
O termo necrose refere-se a um espectro de alterações morfológicas que se seguem à morte
celular em tecidos vivos, sendo uma consequência da acção enzimática sobre as células que
foram letalmente lesadas.
As células necrosadas são incapazes de manter a integridade das suas membranas, como tal
dá-se um extravasamento do seu conteúdo, o que pode originar inflamação do tecido em
redor.
A aparência das células em necrose é fruto da desnaturação das proteínas e da digestão
enzimática dos componentes celulares, tendo as enzimas origem nos próprios lisossomas das
células lesadas. A digestão pode ser designada autólise (ou citólise é o processo pelo qual uma
célula se autodestrói espontaneamente. É incomum em organismos adultos e normalmente
ocorre em células danificadas ou em tecido com lesão irreversível. Na autólise, uma
instabilidade da membrana lisossómica causada por factores físicos e/ou químicos promove a
ruptura da mesma, levando ao "derrame" enzimático que irá promover a digestão da parte
orgânica da célula e, consequentemente, destruição da mesma), ou pode ser realizada por
leucócitos que migram para este local inflamado. Estes processos demoram horas, e como tal
apenas se torna evidente que ocorreu necrose num enfarte do miocárdio cerca de 4 a 12 horas
após o fenómeno, no entanto cerca de 2 horas após a lesão já é possível detectar no sangue
enzimas e proteínas específicas das células cardíacas.
Morfologia – Necrose
As célula necróticas apresentam aumento da eosinofilia atribuída em parte à perda da normal
basofilia imposta pelo RNA no citoplasma e em parte pelo aumento da ligação da eosina às
proteínas desnaturadas. Estas células apresentam uma aparência vítrea mais homogénea,
como consequência da perda das reservas de glicogénio. Quando as enzimas digerem os
organelos citoplasmáticos, o citoplasma adquire uma aparência vacuolizada e aparentando
“dentadas”. Por fim, é possível que ocorra calcificação das células mortas, podendo estas ser
repostas por massas de fosfolípidos – figuras mielínicas.
- Alterações Nucleares, podem surgir em três padrões distintos. A cariólise, caracterizada por
um desbotar da basofilia normal do núcleo, resulta da acção das DNases. A picnose,
caracterizada pelo condensar da cromatina e pelo aumento da basofilia. A cariorréxis reflecte
um núcleo picnótico em fragmentação. Com o passar do tempo os núcleos das células
necróticas desaparecem.
Seguidamente serão caracterizados os diferentes tipos de necrose:
- Necrose de Coagulação ou Isquémica, caracteriza-se pelo predomínio da desnaturação,
apresentando-se a célula coagulada e com os seus limites mantidos. Os tecidos onde este tipo
de necrose ocorre mantêm uma textura firme. Este aspecto surge porque ao predominar a
desnaturação, também as enzimas são desnaturadas, o que impede que inicialmente os
componentes celulares sejam digeridos. Após algum tempo a migração dos leucócitos traz a
oportunidade de remover e fragmentar estas células necróticas, este processo é possível
devido às enzimas presentes nos lisossomas dos leucócitos. Este tipo de necrose caracteriza-se
por manter a arquitectura do tecido, sendo característica da hipoxia em todos os tecidos, com
excepção das células cerebrais;
- Necrose de Liquefacção, é característica de um foco de infecção bacteriana, ou
ocasionalmente fúngica, o que se deve à estimulação por parte dos microrganismos à
acumulação de células inflamatórias. Ainda não se percebe bem porque, mas no caso de
hipoxia cerebral, o padrão de necrose mais comum é este. Neste tipo de necrose ocorre uma
total digestão das células, transformando o tecido numa massa líquida viscosa. Caso este
processo seja desencadeado por uma inflamação aguda o líquido apresenta uma cor
amarelada e designa-se frequentemente pus.
- Necrose Gangrenosa, não se refere a um tipo específico de necrose, mas sim a um tipo de
necrose que ocorre geralmente nos membros a quando da perda de irrigação. No caso de
existir um processo infeccioso a necrose de coagulação é convertida numa necrose de
liquefacção pela presença de bactérias e leucócitos – gangrena húmida;
- Necrose Caseosa, é um tipo distinto de necrose de coagulação, sendo mais frequentemente
encontrada associada à tuberculose. O centro necrótico surge como centro granular amorfo
composto por fragmentos celulares, sendo este rodeado por um conjunto de células
inflamatórias – reacção de granulação. Este tipo de necrose altera completamente a
arquitectura do tecido ou órgão;
- Necrose Gorda, é mais um termo médico do que um padrão de necrose, sendo caracterizado
por um foco de destruição adiposa. Na maior parte dos casos resulta da libertação de lipases
pancreáticas no parênquima pancreático ou na cavidade peritoneal. A libertação de ácidos
gordos combinada com a deposição de cálcio produz áreas grosseiras de calcificação. É típico
encontrar um depósito basófilo de cálcio rodeado por uma reacção inflamatória.
Exemplos de Lesão Celular e Necrose
Isquémia e Lesão de Hipoxia
Isquémia, ou diminuição do fluxo sanguíneo para um tecido, é a causa mais comum de lesão
celular na medicina clínica. Em contraste com a hipoxia, que no que toca à síntese de ATP pode
continuar a fazê-lo, embora de forma menos eficiente, através da glicólise; na isquémia existe
também um comprometer do fornecimento de substratos para a glicólise, nomeadamente da
glicose. Consequentemente a hipoxia leva a que a energia seja produzida de forma anaeróbica,
deixando ao fim de algum tempo os tecidos isquémicos. Isto acontece quando os potenciais
substratos são esgotados ou quando glicólise é inibida pelo acumular de metabolitos que
normalmente seriam removidos pelo fluxo sanguíneo. Portanto, a isquémia conduz a uma
lesão dos tecidos mais rápida do que a hipoxia.
As principais alterações bioquímicas nas células hipóxicas que levam à lesão celular são
derivadas da diminuição da síntese de ATP, como consequência da reduzida disponibilidade de
oxigénio. A perda de ATP leva à falha de muitos sistemas celulares dependentes desta energia:
- Paralisação dos Transportadores Iónicos, conduzindo a uma turgescência celular, e influxo de
Ca2+, com as suas consequências deletérias;
- Depleção das reservas de glicogénio, histologicamente esta alteração é identificável pela
coloração reduzida com PAS;
- Acumulação de Ácido Láctico, com consequente diminuição do pH intracelular;
- Diminuição da síntese proteica.
As consequências funcionais nesta fase podem ser graves. Por exemplo, o músculo cardíaco
deixa de contrair após de 60 segundos de oclusão coronária. No entanto, a perda de
contractilidade não significa morte celular. No entanto se a hipoxia continua, a depleção de
ATP agrava-se causando nova deterioração, com perda de microvilosidades e formação de
vacúolos. Neste momento, toda a célula e os seus organitos aumentam marcadamente de
tamanho, aparentando estar túrgidos, o que se deve ao com aumento das concentrações de
sódio e cloreto e uma diminuição da concentração de potássio, com consequente entrada de
água para o meio intracelular. Se for restabelecido oxigénio ainda nesta fase, todas estas
alterações são reversíveis.
Se a isquémia persistir é inevitável que surja lesão irreversível e necrose. A lesão irreversível
está associada com uma turgescência muito exuberante da mitocôndria, extensivos danos na
membrana plasmática, e aumento de volume dos lisossomas. O afluxo maciço de cálcio para o
interior da célula pode surgir nesta fase. A morte é principalmente por necrose, mas contribui
também, em alguns casos, a apoptose. O percurso é activado apoptótico provavelmente pela
liberação de moléculas pró-apoptótico que se encontravam aprisionadas nas mitocôndrias. Os
componentes da célula são progressivamente degradados, e não há libertação generalizada de
enzimas celulares para o espaço extracelular. Finalmente, as células mortas podem ser
substituídas por grandes massas de fosfolípidos agrupados na forma de figuras mielínicas.
Estes são então fagocitados por leucócitos e mais tarde degradados em ácidos gordos que
podem sofrer calcificação.
Lesão de Isquémia-Reperfusão
Se a lesão celular é reversível, o restabelecer do fluxo sanguíneo pode conduzir à recuperação.
No entanto, em certas circunstâncias, a restauração do fluxo sanguíneo para alguns tecidos
isquémicos pode paradoxalmente exacerbar e acelerar a lesão. Como resultado, os tecidos
têm sustentar a perda de células, para além das que estão irreversivelmente danificadas no
fim do episódio isquémico. O chamado processo de isquémia-reperfusão é uma lesão
clinicamente importante que pode contribuir significativamente para a lesão no tecido
cerebral e enfarto do miocárdio.
Foram propostos diversos mecanismos para este fenómeno:
- Nova lesão celular pode ser gerada durante a reoxigenação através da formação de radicais
livres de oxigénio pelas células mesenquimais, endoteliais e leucócitos. Podem ser produzidos
aniões superóxidos como consequente da lesão mitocôndrial pela hipoxia ou estes podem ser
produzidos pelas células em redor. As defesas antioxidantes podem ser lesadas pela hipoxia,
favorecendo desta forma o acumular de radicais livres de oxigénio;
- Os radicais livres de oxigénio podem promover um fenómeno de transição da permeabilidade
mitocôndrial, que opõe a recuperação da capacidade da mitocôndria em produzir ATP,
conduzindo à morte celular;
- A lesão isquémica está associada à inflamação, conduzindo à libertação de citocinas e
aumento da expressão de moléculas adesivas pelo endotélio. Estes fenómenos conduzem a
um maior número de células inflamatórias no local, e consequente lesão adicional.
- Recentemente foi proposto que a activação do sistema de complemento pudesse estar
envolvida, levando à deposição da IgM nos tecidos isquémicos. Esta deposição pode originar
inflamação e aumentar a lesão celular.
Lesão Química
Os agentes químicos podem lesar a células através de dois mecanismos principais:
- Algumas substâncias químicas actuam directamente através de uma combinação com um
componente molecular ou organelo celular. Por exemplo, na intoxicação por cloreto de
mercúrio, o mercúrio liga-se aos grupos sulfidrílicos de diferentes proteínas da membrana
celular, causando deste modo a inibição dos transportadores ATP-dependentes e um aumento
da permeabilidade da membrana. Muitos agentes da terapêutica anti-neoplásica também
podem induzir nas células lesão directa, que são genericamente designados por efeitos
citotóxicos. Nesses casos, o maior dano é causado às células que mais usam, absorvem,
excretam, ou concentram os compostos existentes no meio, nomeadamente os agentes
citotóxicos.
- Outros produtos químicos não são intrinsecamente biologicamente activos, mas devem ser
primeiro convertidos para se transformarem em metabolitos tóxicos que, depois actuam sobre
as células-alvo. Esta alteração é geralmente realizada através do citocromo P-450 com função
de oxidase no retículo endoplasmático liso do fígado e outros órgãos. Embora os metabolitos
possam causar danos na membrana celular por lesão directa através da ligação covalente a
proteínas e Lípidos, o mais importante mecanismo de lesão celular envolve a formação de
radicais livres.
Apoptose
A apoptose é uma via de morte celular que é induzida por um programa intracelular regulada
de forma estreita, culminando na activação de enzimas que degradam o DNA nuclear e as
proteínas nucleares e citoplasmáticas. A membrana plasmática permanece integra, no entanto
sofre alterações de modo a que seja alvo de fagocitose. Este tipo de morte celular permite
uma rápida eliminação dos constituintes da célula morta, o que impede que se forme uma
reacção inflamatória no local.
A apoptose difere da necrose, sendo esta caracterizada pela perda de integridade da
membrana celular, pela digestão enzimática da célula e pela frequente reacção inflamatória
associada.
Causas de Apoptose
A apoptose pode ocorrer em diversas situações, tendo como principal função eliminar as
células não necessárias ou potencialmente prejudiciais e aquelas que perderam a sua função.
Apoptose em Situações Fisiológicas
A morte por apoptose é um fenómeno normal que serve para eliminar as células que já não
são necessárias, o que se pode verificar durante o desenvolvimento e na manutenção do
número correcto de células num tecido. A apoptose é um fenómeno importante nas seguintes
situações:
- Destruição celular programada durante a embriogénese, incluindo implantação,
organogénese, involução desenvolvimental e metamorfose;
- Involução Hormono-Dependente no Adulto;
- Delecção celular na proliferação celular de determinadas populações;
- Morte das células que já cumpriram a sua função, como é o caso dos neutrófilos após o seu
papel na inflamação aguda;
- Eliminação dos linfócitos potencialmente lesivos (Auto-Reactivos);
- Morte celular induzida pelas Células T Citotóxicas;
Apoptose em Situações Patológicas
A apoptose é também responsável pela perda de células em inúmeras situações patológicas:
- Morte celular derivada de estímulos lesivos, como exemplo temos a radiação ou substâncias
citotóxicas que lesam o DNA;
- Lesão celular induzidas por determinados vírus;
- Atrofia patológica no parênquima de determinados órgãos após obstrução de um ducto;
- Morte celular em tumores;
- Algumas situações em que a necrose predomina podem ter um componente de apoptose, o
que se verifica muitas vezes pelo facto de a lesão mitocôndrial induzir a apoptose.
Morfologia – Apoptose
As seguintes características indicam-nos que uma célula se encontra num fenómeno de
apoptose, podendo ser mais facilmente visualizadas ao microscópio electrónico:
- Retratação Celular, a célula diminui de tamanho, tornando-se o citoplasma mais denso. Os
organelos, apesar de aparentemente normais, estão como que compactados;
- Condensação da Cromatina, este é um dos traços mais característicos da apoptose. A
cromatina condensa à periferia, junto da membrana nuclear, formando massas densas com
formas e tamanhos diferentes. O núcleo pode fragmentar-se formando dois ou mais
fragmentos;
- Formação de Bolhas Citoplasmáticas e de Corpos Apoptóticos, inicialmente verifica-se a
formação de bolhas citoplasmáticas, culminando na formação de corpo apoptóticos contendo
citoplasma e organelos compactados, podendo ter, ou não, fragmentos nucleares;
- Fagocitose de Células ou Corpos Apoptóticos por Macrófagos, as células em apoptose podem
ser digeridas nos lisossomas, e as células adjacentes migram ou proliferam para preencher o
espaço deixado pelas células que sofreram apoptose.
A membrana plasmática permanece intacta durante este processo, apenas nos estádios finais
passa a ser permeável a alguns solutos que anteriormente não era. Esta é uma das principais
características que distinguem necrose de apoptose.
A apoptose é geralmente um processo limitado, envolvendo uma única célula, ou um número
reduzido de células. É característico observarem-se massas celulares intensamente eosinófilas
com densos fragmentos de cromatina.
A apoptose é um processo que culmina com a formação de corpos apoptóticos e a sua
fagocitose, o que acontece rapidamente, e como tal é um fenómeno que não produz sinais de
inflamação e que dificilmente é observável ao microscópio.
Características Bioquímicas da Apoptose
As células apoptóticas exibem um distinto conjunto de alterações bioquímicas que
acompanham as alterações estruturais já descritas:
- Clivagem Proteica, deriva da activação de membros da família das caspases. Estas enzimas
estão presentes nas células normais, mas inactivas, como pro-enzimas. As caspases quando
activadas clivam muitas das proteínas vitais, como a laminina, quebram o esqueleto nuclear e
o citoesqueleto. Por outro lado as caspases activam DNases, e estas por sua vez degradam o
DNA celular;
- Desagregação do DNA, as células apoptóticas exibem caracteristicamente fragmento s de 50
a 300 kpb de DNA. Existem ainda endonucleases dependentes do Ca2+ e Mg2+ que originam
oligonucleossomas múltiplos de 180 a 200 bp. A clivagem inter-nucleossomal não é
característica da apoptose, podendo também ser observada na necrose;
- Reconhecimento Fagocítico, as células apoptóticas expressam fosfatidil-serina na porção
extra-celular das suas membranas, o que se deve à inversão dos fosfolípidos da membrana –
flip. Em alguns tipos específicos de apoptose é também expressa trombopondina, um
glicoproteína com propriedades adesivas. Estas alterações permitem que as células
apoptóticas sejam reconhecidas pelos macrófagos sem que haja libertação dos componentes
celulares proinflamatótios.
Mecanismos de Apoptose
A apoptose é induzida por uma cascata de eventos moleculares que podem iniciar-se em
diversos pontos, mas todas terminam com a activação das caspases. O mecanismo de
apoptose revela-se extremamente importante, o que se comprova pelo facto de a sua
ausência ou o seu excesso serem a causa de muitas patologias, e ainda por ser um mecanismo
conservado em todos os metazoas.
O processo da apoptose pode ser dividido numa fase de iniciação, onde as caspases se tornam
catalíticamente activas, e numa fase de execução, onde estas enzimas actuam de formam a
causaram a morte celular.
O inicio da apoptose encontra-se principalmente associado a duas vias de activação:
- Via Extrínseca, activada através de receptores membranares;
- Via Intrínseca, que está na dependência da mitocôndria, podendo por isso ser designada via
mitocôndrial.
Ambas as vias convergem para um mesmo fim, a activação das caspases, no entanto sabe-se
que em inúmeros pontos existe interligações entre elas.
A Via Extrínseca
Esta via é iniciada pelo ligar de determinadas
substâncias aos receptores de morte celular na
superfície celular de diversas células. Estes receptores
pertencem à família dos receptores do TNF, contendo
um domínio citoplasmático – death domaim - que tem
um papel de extrema importância na transmissão do
sinal pró-apoptótico. Quando um receptor Fas toma
contacto com o seu ligando (FasL) são recrutados 3 ou
mais Fas, os domínios citoplasmáticos destes
receptores agrupam-se e formam um local de ligação
para uma outra proteína, a FADD (Fas-associated detah
domain). Quando esta ligação se dá é activada a
caspase-8, que no caso dos humanos em particular
corresponde à caspase-10. Diversas caspases-8 nas
proximidades são activadas, estas por sua vez irão activar outras caspases e enzimas
responsáveis pela fase de execução da apoptose.
Esta via também pode ser iniciada por uma proteína denominada FLIP, no entanto esta não
possui uma actividade enzimática suficiente para activar as caspases. Sabe-se hoje que alguns
vírus produzem esta proteína de modo a protegerem as células infectadas da apoptose
mediada pelo Fas.
A Via Intrínseca ou Mitocondrial
Esta via de activação resulta do aumento da permeabilidade mitocôndrial e da libertação de
molécula pró-apoptóticas no citoplasma, sem que haja intervenção dos receptores de morte
celular membranares. Os factores de crescimento e outros sinais de sobrevivência estimulam a
produção de proteínas anti-apoptóticas da família do Bcl-2.
As duas principais proteínas desta família com função anti-apoptótica são a Bcl-2 e a Bcl-x.
Estas proteínas encontram-se armazenadas nas membranas mitocôndriais e no citoplasma.
Quando a célula deixa de receber sinais de sobrevivência ou é sujeita a stress estas moléculas
deixam de estar na membrana mitocôndrial e são substituídas por elementos pró-apoptóticos
– Bak, Bax e Bim. Quando a concentração de Bcl-2/Bcl-x diminuem a permeabilidade da
membrana mitocôndrial vai aumentando, este fenómeno leva à libertação de elementos
dantes contidos na mitocôndria com capacidade para activarem as caspases. A principal
proteína envolvida é o citocromo c, este por sua vez liga-se a uma proteína designada de Apaf-
1 e por fim, este complexo activa a caspase-9.
Existem outros factores, como é o caso do AIF (Apoptosis Inducing Factor) que ao ser libertado
liga-se a elemento anti-apoptóticos, bloqueando-os.
Esta via é resultado de um balanço entre os elementos pró-apoptóticos e os elementos anti-
apoptóticos, sendo que os primeiros tentam destabilizar a membrana mitocôndrial de modo a
que sejam libertados os elementos que irão activar as caspases, enquanto os segundos tentam
manter a permeabilidade mitocôndrial.
A Fase de Execução
Esta fase é mediada por uma cascata proteolítica para a qual convergem os diferentes
mecanismos de iniciação. As proteases que medeiam este processo encontram-se altamente
conservadas ao longo das espécies e pertencem à família das caspases.
As caspases incluem mais de 10 proteínas diferentes e podem ser dividias em dois grupos, as
iniciadoras (caspases-8 e caspase-9) e as executoras (caspase-3 e caspase-6).
Tal como outras proteases, as caspases existem na forma de pro-enzimas ou zimogénias e
devem sofrer uma clivagem inicial para serem activadas. Uma característica interessante
destas proteases é o facto de possuírem a capacidade de se auto-clivarem, e não só de serem
clivadas por outras proteases. Após a activação das caspases iniciadores inicia-se um processo
rápido e sequencial de morte celular que é marcado pela activação de outras caspases.
As caspases executoras actuam em diversos componentes celulares, destacam-se os seguintes:
- Citoesqueleto Nuclear;
- Proteínas da Matriz Nuclear;
- Proteínas envolvidas na Transcrição, Replicação do DNA e Reparação do DNA;
- Converte a DNase numa forma activa clivando o seu inibidor, este processo é específico da
caspase-3;
Remoção das Células Mortas
Desde uma fase inicial que as células apoptóticas libertam factores que recrutam macrófagos,
o que facilita em muito a remoção precoce das células sem que estas entrem em necrose e
libertem os seus componentes (o que poderia conduzir a uma inflamação local). As células
apoptóticas ou os seus fragmentos possuem marcadores moleculares na superfície que
facilitam o seu reconhecimento pelas células fagocíticas.
Os macrófagos por sua vez libertam substâncias que se ligam às células apoptóticas, mas não
às normais, e que promovem a sua opsonização, facilitando desta forma a sua fagocitose.
Contrariamente as células normais protegem-se da fagocitose mediada por macrófagos
apresentando à sua superfície moléculas como o CD31.
Este processo de remoção das células em apoptose permite que estas desapareçam quase em
deixar vestígios, o que se certa forma contribui para que virtualmente não haja inflamação.
Exemplos de Apoptose
Os principais sinais que induzem a apoptose são:
- Ausência de Factores de Crescimento;
- Activação dos Receptores de Morte Celular;
- Agentes Lesivos.
Em seguida iremos apresentar alguns dos fenómenos de apoptose mais comuns, sendo que o
maior número de casos verifica-se durante o desenvolvimento embrionário.
Apoptose após Privação de Factores de Crescimento
As células hormono-sensíveis privadas da hormona, linfócitos que não são estimulados por
antigénios e citocinas, e neurónios privados de factor de crescimento morrem por apoptose.
Em todas estas situações, apoptose é desencadeado pela via mitocôndrial e é atribuída à
activação de membros pró-apoptóticos Bcl e diminuição da síntese de Bcl-2 e Bcl-x.
Apoptose Mediada por Lesão do DNA
A exposição das células à radiação ou agentes de quimioterapia induz danos no DNA, e se isto
é demasiado grave para ser reparado desencadeia a morte por apoptose. Quando o DNA está
danificado, a proteína p53 acumula-se nas células. Quando isto acontece é feito uma paragem
no ciclo celular, em G1, para que haja tempo do DNA lesado seja reparado. No entanto, se o
dano for muito grande para ser reparado com êxito, o p53 desencadeia a apoptose, o que se
dá principalmente através da activação das caspases que, e em última instância pode activar
Bax e Bak. Quando p53 é mutado ou ausente (como é em alguns cancros), é incapaz de induzir
apoptose, desta forma as células com DNA danificado sobrevivem. Nestas células, a lesão do
DNA pode resultar em translocações ou mutações que levam à transformação neoplásica.
Apoptose Mediada pelos Linfócitos T Citotóxicos
Os Linfócitos T Citotóxicos (CTLs) reconhecem os antigénios estranhos apresentados na
superfície de células hospedeiras infectadas e células tumorais. Após a activação, os CTLs
secretam perforinas que irão formam poros nas membranas celulares da célula-alvo. Podem
ainda ser secretadas granzinas, estas irão decompor proteínas em resíduos de aspartato e são
capazes de activar as caspases celulares. Desta forma a CTL mata as células-alvo directamente
pela indução da fase de execução da apoptose, sem envolver mitocôndrias ou receptores. Os
CTLs também expressam FasL na sua superfície e podem desta forma induzir a morte das
células-alvo ligando-o aos receptores Fas.
Resposta Subcelular á Lesão
Vamos agora focar na célula como uma só e nas alterações que se verificam nos seus
organelos e citoesqueleto.
Catabolismo Lisossomal
Os lisossomas primários são constituídos por uma membrana contendo diversas enzimas
hidrolíticas, incluindo fosfatases ácidas, glucoronidases, sulfatases, ribonucleases e
colagenases. Estas enzimas são sintetizadas no retículo endoplasmático liso e agrupadas no
complexo de Golgi. Os lisossomas primários fundem-se com vesículas que contêm material
para digerir, formando lisossomas secundários ou fagolisossomas. Existem duas vias de
fagocitose:
- Heterofagocitose, é um processo de digestão
lisossomal dos componentes extracelulares. Estes
componentes entram na célula através de
endocitose, que neste caso particular se
denominada fagocitose, ou que no caso de serem
macromoléculas solúveis se designa pinocitose. Este
tipo de fagocitose é características das grandes
células fagocíticas, nomeadamente os macrófagos e
os neutrófilos.
- Autofagocitose, refere-se à digestão lisossomal de
componentes celulares. Os organelos e porções do
citoplasma são sequestrados em vacúolos autofágicos oriundos do retículo endoplasmático
rugoso. Estes vacúolos fundem-se com elementos do complexo de Golgi ou lisossomas para
originarem autofagolisossomas. Este processo é comum na remoção de componentes
celulares danificados ou durante a remodelação durante a diferenciação celular. A
autofagocitose é característica de células com privação nutricional ou em involução hormonal.
As enzimas presentes nos lisossomas têm a capacidade de degradar grande parte dos
componentes celulares, no entanto aqueles onde permanece material não-digerido formam
corpos residuais. Os grânulos de pigmento de lipofuscina são exemplo dos resíduos de lípidos
peroxidados não digeridos. Alguns pigmentos, como é o caso do carbono ou das tatuagens,
podem persistir por décadas no interior dos macrófagos.
Existem doenças do armazenamento lisossomal hereditárias, sendo estas causadas por
alterações nas enzimas que degradam as diversas macromoléculas, conduzindo à acumulação
de quantidades anormais destes compostos nos lisossomas.
Hipertrofia do Retículo Endoplasmático Liso
O retículo endoplasmático (RE) liso está envolvido no metabolismo de vários químicos, e como
tal as células expostas a esses químicos apresentam uma hipertrofia do mesmo como resposta
adaptativa, podendo esta ter importantes consequências funcionais. Em grande parte dos
casos em que existe tolerância a uma determinada droga deve-se ao aumento do RE liso. É no
RE liso que existem enzimas, como é o caso do citocromo P-450, que modificam os compostos
de modo a torná-los mais solúveis e mais facilmente excretáveis. Durante este processo, que
muitas vezes é composto por oxidações, formam-se radicais livres de oxigénio, este por sua
vez tem um elevado potencial lesivo para a célula.
Este fenómeno de adaptação a um aumento de determinada substância (ex. Barbitúricos) que
conduz a um aumento do RE liso e do número de enzimas faz com que o indivíduo adquira
uma maior capacidade para metabolizar outros compostos (ex. Álcool). No caso concreto do
álcool, um potente indutor do citocromo P-450, existe um aumento ainda maior do número de
enzimas, o que muitas vezes conduz a situações em que a dose de um determinado fármaco
ingerida se torna subterapêutica devido à sua rápida metabolização.
Alterações Mitocôndriais
Como já foi visto anteriormente as alterações mitocôndriais desempenham um papel central
na lesão celular e na apoptose. Sabe-se ainda que alterações no número, tamanho e forma das
mitocôndrias são características de determinadas patologias. Como exemplo temos a
hipertrofia e atrofia celular onde ocorre um aumento e diminuição do número de
mitocôndrias, respectivamente.
A mitocôndria pode atingir proporções gigantescas – megamitocôndria – no caso de pacientes
com síndrome hepático alcoólico ou má nutrição. No caso das miopatias mitocôndriais existe
uma condição hereditária que conduz a um aumento do número de mitocôndrias devido ao
seu funcionamento anormal. Alguns tumores benignos (ex. Glândulas Salivares, Tiróide,
Paratiroideias e Rim) exibem um aumento marcado do número de mitocôndrias, o que lhes
confere uma aparência eosinófila.
Alterações no Citoesqueleto
O citoesqueleto consiste em microtúbulos, filamentos de actina, filamentos de miosina e
muitos outros filamentos intermédios. As alterações do citoesqueleto podem ser causadas
por:
- Alterações da função celular, como a locomoção e o movimento de organelos intracelulares;
- Acumulação intracelular de material fribilar.
Iremos de seguida descrever cada um dos diversos tipos de filamentos:
- Microfilamentos, são compostos por actina, miosina e estão associados a proteínas de
regulação. A sua principal função é permitir as alterações conformacionais dos leucócitos
durante a diapdese e fagocitose;
- Microtúbulos, defeitos podem conduzir a ausência de movimento dos espermatozóides
levando a infertilidade masculina, podem ainda originar estase dos cílios respiratórios
originando acumulação de secreções e incapacidade de expulsar as bactérias. Estes elementos
do citoesqueleto possuem mais uma vez uma enorme importância na diapdese e fagocitose
dos leucócitos. Existem fármacos que bloqueiam os microtúbulos e são utilizados para limitar a
proliferação como agentes anti-tumorais (ex. Alcalóides da Vinca);
- Filamentos Intermédios, possibilitam uma estrutura intracelular flexível e que potencia a
organização do citoplasma e permite à célula resistir às forças aplicadas sobre ela. Os
filamentos intermédios estão divididos em cinco classes:
- Queratina, característicos das células epiteliais;
- Neurofilamentos, presentes nos neurónios;
- Filamentos de Vimentina, abundantes no tecido conjuntivo;
- Filamentos de Desmina, como parte integrante das células musculares;
- Filamentos Gliais, sendo encontrados nos astrócitos.
A principal função do citoesqueleto é mecânica, mantendo a estrutura celular, ajudando nos
processos de migração e divisão celular. No entanto as proteínas do citoesqueleto encontram-
se ligadas a muitos receptores celular, sendo por isso participantes activos na transdução de
sinal.
Lâmina B1 Dados Clínicos: Homem, 63 anos, obeso e fumador, recorre ao SU por dor precordial. Fica internado na
Unidade de Cuidados Intensivos e morre. É feito exame necrópsico.
Teoria – EAM
Ver página 604 do Robbins – Demasiado importante para não ler o original!
Resolução
1 – Qual o tecido apresentado em A? Tecido Muscular Cardíaco
2 – Como denomina este tipo de morte celular? Necrose Coagulativa
3 – Baseado na morfologia, descreva as alterações que ocorreram e caracterizam este tipo de morte
celular. (A, B e C)
Diminuição da basofilia; presença de células inflamatórias; fibras musculares mais afastadas.
4 – Calcule, aproximadamente, quanto tempo decorreu entre o início da morte das células e a morte do
doente. No mínimo 2 dias.
5 – Explique a presença da inflamação. (D)
As células necróticas não são capazes de manter a integridade da membrana e o seu conteúdo é
libertado para o exterior causando inflamação no tecido adjacente.
Lâmina B2 Dados Clínicos: Homem, 69 anos, hemiparésia de instalação súbita e alterações da visão. Tomava
anticoagulantes por fibrilhação auricular.
Teoria – Hemorragia Intracraniana
As hemorragias podem ocorrer em qualquer lugar dentro do SNC. Em alguns casos, são um
fenómeno secundário que ocorre, por exemplo, dentro de enfartes nas zonas limítrofes
arteriais ou em enfartes causados por obstrução vascular apenas parcial ou transitória. As
hemorragias primárias dentro do espaço epidural são tipicamente relacionadas com
traumatismos. Em contraste, as hemorragias dentro do parênquima cerebral e espaço
subaracnoideu são muitas vezes uma manifestação de uma doença vascular cerebral
subjacente, embora os traumatismos também possam causar sangramento nesses locais.
HEMORRAGIA INTRACEREBRAL (INTRAPARENQUIMATOSA) – as hemorragias
intraparenquimatosas espontâneas (não traumáticas) ocorrem mais frequentemente na meia-
idade e idade adulta avançada, com incidência máxima em torno dos 60 anos. A maioria é
causada por ruptura de um pequeno vaso intraparenquimatoso. A HTA é a causa subjacente
mais comum de hemorragia primária do parênquima cerebral. Em alguns casos, a HTA crónica
está associada ao desenvolvimento de diminutos aneurismas, denominados microaneurismas
de Charcot-Bouchard, que podem ser o ponto de ruptura. Além da hipertensão, outros
factores locais e sistémicos podem causar hemorragia não-traumática ou contribuir para a sua
ocorrência, como distúrbios sistémicos da coagulação, cirurgia cardíaca aberta, neoplasias,
angiopatia amilóide, vasculite, aneurismas fusiformes e malformações vasculares.
Morfologia: A hemorragia intraparenquimatosa hipertensiva pode originar-se no putâmen (50
a 60% dos casos), tálamo, ponte, hemisférios cerebelares (raramente) e outras regiões do
cérebro. Quando as hemorragias ocorrem nos núcleos da base e tálamo, são denominados
hemorragias gangliónicas, para distinguir-se das que ocorrem nos lobos dos hemisférios
cerebrais – hemorragias lobares. As hemorragias agudas de ambos os tipos caracterizam-se
por extravasamento de sangue com compressão do parênquima adjacente. As hemorragias
antigas exibem uma área de destruição cavitária do cérebro com uma orla de coloração
acastanhada. Ao exame microscópico, a lesão precoce consiste numa zona central de sangue
coagulado circundada por uma orla de tecido cerebral que mostra alterações neuronais e gliais
anóxicas e edema. No decorrer do tempo, o edema resolve, aparecem macrófagos repletos de
pigmente lipídeo, e observa-se proliferação de astrócitos reactivos na periferia da lesão.
As hemorragias lobares podem surgir no contexto de uma diátese hemorrágica, neoplasias,
abuso de drogas, vasculite infecciosa e não-infecciosa, e angiopatia amilóide (cognofílica).
Resolução
1 – O que é esperado encontrar no encéfalo do doente que morre com os antecedentes clínicos
descritos? (A, B e C)
Necrose do tecido encefálico como consequência de um AVC hemorrágico.
2 – Que tipo de necrose se observa neste contexto, e como se caracteriza, morfologicamente?
Necrose de liquefacção que se caracteriza pela existência de muito espaço entre as células; pigmentos
de hemossiderina; células com aspecto de lesão celular; zonas sem neurónios contendo macrófagos.
3 – Compare o tecido encefálico normal (D), com o tecido lesado (C) e comente.
C tem mais espaço entre as células; hemácias difusas e numerosas; presença de macrófagos e
hemossiderina dentro do citoplasma.
Lâmina B3 Dados Clínicos: Mulher, 48 anos, lesões cutâneas nos braços e região pré-esternal. Têm uma pequena
«crosta» e são pruriginosas.
Teoria – Líquen Plano
Os sinais de apresentação dessa afecção da pele e das mucosas consistem em “pápulas
poligonais pruriginosas e violáceas”. O líquen plano é autolimitado e, em geral, sofre resolução
espontânea dentro de 1 a 2 anos após o seu início, deixando, com frequência, zonas de
hiperpigmentação pós.inflamatória. As lesões orais podem persistir por vários anos. Foi
constatada a ocorrência de degeneração maligna em lesões mucosas e paramucosas crónicas
do líquen plano, embora não se tenha demonstrado qualquer relação patogénica directa.
As lesões cutâneas consistem em pápulas violáceas, pruriginosas e de topo achatado, que
podem coalescer focalmente, formando placas. Essas pápulas são frequentemente realçadas
por ponts ou linhas brancas denominadas estrias de Wickham. Nos indivíduos de pigmentação
escura, as lesões podem adquirir uma cor castanho-escura devido à perda do pigmento
melanina na derme com a destruição da camada de células basais. Tipicamente, são
observadas múltiplas lesões de distribuição simétrica, particularmente nos membros (punhos
e cotovelos), bem como na glande.
A patogénese do líquen plano é desconhecida. É plausível que as lesões sejam causadas por
reacções imunes mediadas por células, secundárias à libertação de antigénios ao nível das
células da camada basal e da junção dermoepidérmica. Dando apoio a esta noção estão os
dados que indicam que os infiltrados primariamente de linfócitos T associados à hiperplasia de
células de Langerhans são característicos da formação e evolução de lesões.
Morfologia: O líquen plano é caracterizado histologicamente por um denso e contínuo
infiltrado de linfócitos ao longo da junção dermoepidérmica. Os linfócitos estão intimamente
associados com os queratinócitos basais, que mostram degeneração, necrose e têm
semelhança em tamanho e em contorno com as células mais maduras do estrato espinhoso
(escamatização). A consequência desta infiltração destrutiva de linfócitos é a redefinição da
configuração levemente ondulada normal da interface dermoepidérmica para um contorno
mais angulado em ziguezague (dentes de serrote). Células basais necróticas, anucleadas,
podem tornar-se incorporadas dentro da derme papilar inflamada, onde são chamadas de
corpos de Civatte ou corpos colóides. Embora característicos do líquen plano, estes corpos
podem ser detectados em qualquer dermatite crónica onde os queratinócitos basais são
lesionados e destruídos. Embora esta relação destrutiva entre os linfócitos e as células
epidérmicas carreguem algumas semelhanças com as do eritema multiforme, o líquen plano
mostra alterações de cronicidade, especialmente hiperplasia epidérmica (ou raramente
atrofia) e espessamento da camada de células granulares e do estrato córneo (hipergranulose
e hiperceratose respectivamente). O líquen plano que afecta preferencialmente o epitélio do
folículo piloso é chamado de líquen planopilar.
Resolução
1 – A foto A representa um retalho de pele seccionado (5 fragmentos). Descreva as alterações
morfológicas relevantes que se observam na junção dermo-epiddérmica. (B).
Junção dermo-epidérmica de contorno angulado (em dentes de serrote).
2 – Caracterize as alterações que se observam na epiderme (A e B).
Infiltração leucocitária; queratinócitos basais necróticos; células basais tornam-se similares às do estrato
espinhoso; células basais anucleadas (corpos de Civatte).
3 – Algumas células epiteliais que se observam na basal da epiderme têm alterações lesionais
características. Descreva-as.
Picnose- núcleo encolhido e basofílico; Cariorrexis – fragmentação do núcleo; e, Cariólise.
Lâmina B5 Dados Clínicos: Homem, 33 anos, caucasiano, com sintomatologia de obstrução intestinal. HIV positivo.
Foi feita ressecção cirúrgica de tumor do intestino.
Teoria – Linfoma de Burkitt
Esta categoria compreende: linfoma de Burkitt africano (endémico), linfoma de Burkitt
esporádico (não-endémico) e um subgrupo de linfomas agressivos que ocorre em indivíduos
infectados por HIV. Os linfomas de Burkitt que ocorrem em cada uma destas circunstâncias são
histologicamente idênticos, mas existem algumas diferenças clínicas, genotípicas e virológicas.
Esta é uma categoria de tumores de células B maduras que expressam IgM de superfície,
cadeias leves ķ ou λ monotípicas, CD19, CD20, CD10 e BCL6, um fenótipo que se assemelha
bastante ao das células B que se multiplicam rapidamente nas zonas escuras dos centros
germinativos normais.
Todas as formas do linfoma de Burkitt estão associadas a translocações do gene c-MYC no
cromossoma 8.
Essencialmente todos os tumores endémicos são infectados de forma latente pelo EBV, que
está também presente em cerca de 25% dos tumores associados a HIV e em 15 a 20% dos
casos esporádicos.
Tanto os casos endémicos como os esporádicos são amplamente encontrados em crianças ou
adultos jovens. A maioria destes tumores manifesta-se em locais extranodais. O linfoma de
Burkitt endémico geralmente apresenta-se como uma massa envolvendo a mandíbula, com
uma particular predileção pelas vísceras abdominais, principalmente rins, ovários e glândulas
supra-renais. Por outro lado, o linfoma de Burkitt esporádico apresenta-se mais
frequentemente como uma massa abdominal envolvendo o íleo, o cego e o peritoneu. O
comprometimento da medula óssea e do sangue periférico é incomum, especialmente em
casos endémicos. O linfoma de Burkitt é bastante agressivo, mas responde bem à
quimioterapia de curta duração e em altas doses. A maioria das crianças e adultos jovens pode
ser curada, mas os resultados são mais limitados em adultos com idade mais elevada.
Morfologia: Os tecidos atingidos são destruídos por um infiltrado difuso de células linfóides de
tamanho médio, contendo núcleos arredondados ou ovais, cromatina grosseira, diversos
nucléolos e uma quantidade moderada de citoplasma levemente basofílico ou anfofílico. O
tamanho do núcleo aproxima-se daquele de macrófagos benignos no interior do tumor. Um
alto índice mitótico é característico, bem como a morte apoptótica das células tumorais,
resultando na presença de numerosos macrófagos com fragmentos nucleares ingeridos nos
tecidos. Estes macrófagos benignos estão distribuídos de forma difusa entre as células
tumorais e têm citoplasma claro e abundante, criando um aspecto de padrão de “céu
estrelado”. Em casos em que ocorre o acometimento da medula óssea, as células tumorais de
aspirados de medula apresentam cromatina nuclear ligeiramente aglomerada, dois a cinco
nucléolos distintos e citoplasma azul-profundo, contendo múltiplos vacúolos citoplasmáticos
claros.
Resolução
1 – Descreva o tipo de lesão que observa na parede intestinal (A), quanto ao modo como envolve o
órgão em que se manifesta.
Este tecido (tumoral) envolve os órgãos em toalha (ou difusa, difícil de distinguir).
2 – Que estrutura do órgão assinala a seta, em B? Glândulas intestinais.
3 – Que células constituem esta proliferação? Este tipo de neoplasia tem sido comparado a um «padrão
de céu estrelado» (C). Qual a explicação para isso?
As células são linfócitos não maduros ou pró-linfócitos. Devido à ocorrência de apoptose, existem
macrófagos que digerem os restos celulares formando à sua volta um espaço claro – padrão de céu
estrelado.
4 – Descreva sucintamente o tipo de alteração celular predominante nas células da neoplasia (D).
As células neoplásicas são uniformes de tamanho normal, com núcleos redondos ou ovais e 3-5
nucléolos. O tamanho nuclear é aproximadamente igual ao dos macrófagos. O citoplasma é basófilo e
há uma elevada taxa apoptótica (cromatina condensada) com fagocitose por macrófagos e muitas
mitoses (cromatina dispersa).
Lâmina B5 Dados Clínicos: Homem, 59 anos, alterações nas provas de função hepática. Ingere bebidas alcoólicas de
forma crónica (+/-100mg/dia).
Teoria – Esteatose
A alteração lipídica ou esteatose refere-se a qualquer acumular anormal de triglicéridos dentro
parênquima celular. É mais frequentemente observada no fígado, uma vez que este é o
principal órgão envolvido no metabolismo de gordura, mas também pode ocorrer no coração,
músculo-esquelético, rim e outros órgãos. Esteatose pode ser causada por toxinas, desnutrição
proteica, diabetes mellitus, obesidade e anóxia. Alcoolismo e diabetes associadas à obesidade
são as causas mais comuns de alterações lipídicas no fígado (ex. Fígado Gordo) nos países
desenvolvidos.
Ácidos gordos livres oriundos tecido adiposo ou
através da ingestão de alimentos são normalmente
transportados para os hepatócitos, aqui são
esterificados a triglicéridos, convertidos em
colesterol ou em fosfolípidos, ou oxidado em
corpos cetónicos. Alguns ácidos gordos são
sintetizados a partir de acetato no hepatócitos
também. A libertação dos triglicéridos dos
hepatócitos requer a formação de complexos com
apoproteínas para formar lipoproteínas, estas são
capazes de entrar na circulação e solubilizar os
lípidos associados. A excessiva acumulação
triglicéridos pode resultar de defeitos em qualquer
etapa da entrada de ácidos gordos até à sua saída através da conjugação com as lipoproteínas.
Esta acumulação traduz-se num fígado gordo após diversas lesões hepáticas. Esta acumulação
pode ser favorecida por substâncias toxinas para os hepatócitos (ex. Álcool) que alteram a
função mitocôndrial e do retículo endoplasmático rugoso e, assim, vão inibir a oxidação dos
ácidos gordos.
Factores como intoxicação por CCl4, desnutrição proteica, diminuição da síntese de
apoproteínas ou a hipoxia inibem a oxidação dos ácidos gordos; por outro lado a fome
aumenta mobilização de ácidos gordos da periférica para os tecidos hepáticos.
O significado das alterações lipídicas depende da causa e a gravidade da acumulação. Quando
ligeira, pode não ter efeito sobre a função celular; com o progredir da severidade as alterações
lipídicas podem prejudicar transitoriamente a função celular, mas nenhum dos processos
celulares vitais é irreversivelmente prejudicado, assim sendo as alterações são reversíveis. Na
forma mais grave, as alterações lipídicas podem preceder a morte celular, e podem
representar o início de uma lesão hepática grave, originando uma doença hepática
denominada Esteatose Hepática Não-Alcoólica.
Morfologia: As alterações lipídicas são frequentemente observadas no fígado e coração. Estas
alterações surgem como vacúolos no interior do parênquima celular. As acumulações
intracelulares de água ou polissacáridos podem igualmente originar vacúolos, sendo por isso
necessárias técnicas especiais para distinguir os diferentes tipos. Para identificar o conteúdo
lipídico é necessário excluir os solventes lipídicos utilizados frequentemente nas preparações
com parafina padrão. É por isso necessário preparar secções congeladas de tecido fresco ou
conservado em formalina; estas secções devem depois ser coradas com Sudão IV ou Óleo
Vermelho-O, dando ambos uma tonalidade alaranjada aos lípidos. O Ácido Periódico de Schiff
(PAS) é utilizado habitualmente para identificar inclusões de glicogénio de forma não
específica.
No fígado alterações lipídicas de grau médio podem não afectar a aparência exterior do órgão.
Com o avançar da situação o órgão torna-se mais volumoso e de aparência amarela, podendo
aumentar de 3 a 6 kg e transformar-se numa massa brilhante amarela, macia e gordurosa. As
alterações primeiramente detectadas são inclusões com membrana – lipossomas – aplicadas
contra o retículo endoplasmático. Estas alterações são mais precocemente detectáveis com
um microscópio verificando-se a presença destes vacúolos no citoplasma em torno do núcleo.
Com a progressão estas inclusões vão aumento, o que obriga o núcleo a deslocar-se para a
periferia.
Quando estas inclusões rebentam podem formar-se Quistos Gordos.
No coração, as alterações lipídicas são encontradas na forma de gotículas, podendo surgir com
dois padrões distintos. Nos casos de hipoxia moderada prolongada, como os que são
originados por uma anemia grave, surgem depósitos intracelulares de gordura. Estes depósitos
criam a aparência de bandas amareladas de miocárdio alternadas com bandas mais escuras,
compostas por miocárdio não envolvido – efeito estriado. O outro padrão de hipoxia é
produzido por uma hipoxia mais severa ou por algumas formas de miocardite (ex. Difteria) e
apresenta-se como um padrão de diversos miócitos afectados sem nenhum padrão
característico.
Resolução
1 - Tente identificar os componentes morfológicos do tecido hepático normal (em A). Quais são esses
componentes? Hepatócitos, células de Kupfer, células endoteliais.
2 – A alteração predominante no fígado denomina-se esteatose que consiste em acumulação de
gotículas lipídicas no citoplasma.
3 – Quais os padrões de lesão celular que observa (B)? Hepatócitos grandes com vacúolos lipídicos que
empurram o núcleo para a periferia.
4 – Observe os vacúolos de tamanhos variados que estão presentes em todo o tecido. Qual será o seu
conteúdo? São gotículas lipídicas com TAG.
5 – Como o poderia provar? Não usando solventes lipofílicos, congelando cortes de tecido fresco ou
fixados por formalina e corando com Sudão IV ou oil-red de ósmio que marcam lipídos.
6 – Qual é a alteração morfológica que espera encontrar se o doente deixar de ingerir bebidas
alcoólicas? Até a fibrose surgir, a degeneração gordurosa é totalmente reversível se houver abstenção
de bebidas.
Lâmina B6 Dados Clínicos: Mulher, 40 anos, nódulo no QSE da mama direita, com características «suspeitas» na
mamografia.
Teoria – Esteatonecrose (Necrose Gordurosa) Mamária
A necrose gordurosa pode apresentar-se como uma massa palpável indolor, espessamento ou
retracção cutânea, densidade mamográfica ou calcificações mamográficas. A maioria das
mulheres terá um histórico de trauma ou cirurgia prévia.
O significado clínico principal da condição é a sua possível confusão com carcinoma mamário
como uma massa palpável ou calcificações mamográficas.
Morfologia: Macroscopicamente, a lesão pode consistir em hemorragia nos estágios iniciais e,
posteriormente, necrose liquefativa central da gordura. Ainda posteriormente, pode aparecer
como um nódulo mal definido de tecido firme branco-acinzentado contendo pequenos focos
de dtritos esbranquiçados semelhantes ao giz ou hemorrágicos. O foco central de células
adiposas necróticas é cercado, inicialmente, por macrófagos e uma infiltração neutrófila
intensa. Então, durante os próximos poucos dias, proliferação fibroblástica progressiva,
vascularização aumentada e infiltração linfocítica e histiocítica isolam o foco.
Subsequentemente, calcificações e hemossiderina modificam a sua aparência e,
eventualmente, o foco é substituído por tecido cicatricial ou é encistado e isolado pelo tecido
colagenoso.
Resolução
1 – “Uma lesão «suspeita» (A) na mamografia nem sempre corresponde a uma neoplasia maligna». Esta
afirmação é verdadeira? Sim.
2 – A lesão que se observa está rodeada por que tipo de tecido? (B e C) Tecido conjuntivo fibroso com
presença de muito colagénio.
3 – Qual o tipo de lesão celular que está na base das alterações que observa? Esteatonecrose em que há
ruptura de adipócitos por traumatismo, alimentação, cirurgia, …
4 – Identifique os vários tipos de células inflamatórias presentes no tecido (C). Macrófagos e neutrófilos
(inicialmente) e depois fibroblastos e linfócitos.
L4 e L5 - Inflamação
Introdução Teórica
Inflamação Aguda e Crónica
Conceitos Gerais da Inflamação
No capítulo passado abordamos diversos estímulos que podem lesar as células, no caso
particular dos tecidos vascularizados, podem desencadear uma resposta local denominada
inflamação. A inflamação é uma reacção complexa como resposta a agentes agressores, como
é o caso de micróbios ou lesão celular, habitualmente a necrose. A inflamação consiste numa
resposta vascular, composta pela migração e activação de leucócitos, e mais tarde numa
resposta sistémica. Uma das principais características do processo de inflamação é a
capacidade reactiva dos vasos sanguíneos, originando um acumular de fluído e leucócitos no
espaço extravascular.
A inflamação encontra-se estreitamente associada ao processo de reparação. A principal
função da inflamação é diluir ou deter os agentes lesivos, permitindo uma série de
acontecimentos que conduzem a uma tentativa de cicatrizar ou reconstruir o tecido destruído.
Este processo de reparação inicia-se logo nas primeiras fases da inflamação, no entanto
apenas é concluído quando o estímulo nocivo for totalmente removido. A reparação pode ser
feita com base na substituição do tecido lesado por células nativas do parênquima do órgão –
regeneração -, por preenchimento com tecido fibroso – cicatrização -, ou mais comummente
por uma combinação de ambos os processos.
A inflamação é essencialmente um processo defensivo, tendo em vista o organismo libertar-se
do estímulo lesivo e das consequências da lesão causada.
A inflamação pode ser dividida em dois componentes:
- Reacção Vascular;
- Reacção Celular.
Existem diversas células e tecidos envolvidos nestas reacções, que vão desde fluidos e
proteínas do plasma, células circulatórias, vasos sanguíneos, a células e constituintes do tecido
conjuntivo.
As células circulatórias incluem:
- Neutrófilos;
- Monócitos;
- Eosinófilos;
- Linfócitos;
- Basófilos;
- Plaquetas.
As células do tecido conjuntivo mais abundantes são os mastócitos, rodeados por vasos
sanguíneos. Existem ainda fibroblastos e macrófagos e linfócitos residentes. A matriz
extracelular consiste em fibras estruturais proteicas (ex. Colagénio e Elastina), glicoproteínas
adesivas (ex. Fibronectina, Laminina, Colagénio Não-Fibrilar e Tenascina) e proteoglicanos. A
membrana basal é um componente especializado da matriz extracelular e consiste num
conjunto de glicoproteínas adesiva e protaeoglicanos.
A inflamação por ser divida em dois padrões:
- Inflamação Aguda, tem um início rápido (segundos ou minutos) e uma duração
relativamente curta, que pode ir até alguns dias. A sua principal característica é a exsudação
de fluído e proteínas plasmáticas – edema – e a migração de leucócitos, predominantemente
neutrófilos;
- Inflamação Crónica, tem uma maior duração e é caracterizada histologicamente pela
presença de macrófagos e linfócitos, proliferação dos vasos sanguíneos, fibrose e necrose
tecidual.
As reacções vascular e celular da inflamação são mediadas por factores químicos derivados das
proteínas plasmáticas ou das células, sendo produzidos perante um estímulo inflamatório. Esta
resposta pode ser aumentado por respostas sequenciais ou combinadas, nomeadamente as
células necróticas têm capacidade de produzir elas mesmo factores pró-inflamatórios.
A inflamação termina quando o agente desencadeador é eliminado e a secreção de agentes
mediadores cessa. Por outro lado existem mecanismos anti-inflamatórios que controlam e
previnem as respostas excessivas, para que deste modo não exista lesão tecidual induzida pela
resposta inflamatória.
Inflamação Aguda
A Inflamação Aguda consiste numa resposta rápida a uma agente agressor e tem como
objectivo conduzir os mediadores da defesa do hospedeiro – leucócitos e proteínas
plasmáticas – ao local da lesão.
A Inflamação Aguda tem três componentes principais:
- Alterações no calibre dos vasos, o que promove um aumento do fluxo sanguíneo local;
- Alterações estruturais na microvasculatura que permite que as proteínas plasmáticas e os
leucócitos abandonem a circulação;
- Migração dos leucócitos para fora da microcirculação, acumulação dos mesmos no local de
lesão e a sua consequente activação para eliminar o agente agressor.
O fenómeno caracterizado pela saída de fluído,
proteínas e células sanguíneas do sistema
vascular para o espaço intersticial ou cavidades
do corpo denomina-se exsudação. Um Exsudado
é um fluído extravascular inflamatório que
contém uma elevada concentração de proteínas,
detritos celulares e com uma pressão oncótica
acima de 1,020. A formação de exsudado
pressupõe uma alteração significativa na
permeabilidade dos vasos locais.
Um Transudado caracteriza-se por um fluído com
baixa concentração de proteínas, sendo a maior parte albumina, e uma pressão oncótica
inferior a 1,020. O transudado resulta essencialmente de um ultra-filtrado do plasma
sanguíneo, sendo consequência de um desequilíbrio entre a pressão hidrostática e a pressão
oncótica nos vasos, sem que haja alterações na permeabilidade vascular.
O Edema define-se pelo excesso de fluído no espaço intersticial ou nas cavidades serosas,
podendo ser constituído por exsudado ou transudado.
O Pús ou Exsudado Purulento consiste num exsudado inflamatório, rico em leucócitos,
maioritariamente neutrófilos, detritos celulares e, em muitos casos, microrganismos.
Estímulos para a Inflamação Aguda
A Reacção Inflamatória Aguda é desencadeada por uma enorme diversidade de estímulos:
- Infecções (Bactérias, Vírus, Parasitas, etc) e Toxinas de Microrganismos;
- Trauma;
- Agentes Físicos e Químicos;
- Necrose Tecidual;
- Corpos Estranhos;
- Reacções Imunitárias.
Cada um destes estímulos tem a capacidade de induzir reacções, que apesar de todas
partilharem uma base idêntica, existem particularidades específicas em cada uma.
Alterações Vasculares
Os dois principais mecanismos de defesa do organismo – leucócitos e anticorpos – são
transportados através do fluxo sanguíneo, e como tal não é admirável que as alterações
vasculares sejam um dos principais componentes da resposta inflamatória. Habitualmente as
proteínas plasmáticas e as células circulantes permanecem dentro dos vasos e movem-se na
direcção do fluxo sanguíneo. Durante a inflamação, os vasos sanguíneos sofrem uma série de
alterações que permitem maximizar o movimento de proteínas e células para o exterior da
circulação, no sentido de chegarem mais próximo do local lesado.
Alterações no Calibre e Fluxo Vascular
Estas alterações surgem cedo, logo após a lesão, e desenvolvem-se a diferentes ritmos
consoante a gravidade da lesão. As alterações ocorrem na seguinte ordem:
- Vasodilatação, é uma das primeiras manifestações da inflamação aguda. A vasodilatação é
feita inicialmente à custa das arteriolas, mas mais tarde envolve a abertura de novos leitos
capilares na área. Este fenómeno causa um aumento do fluxo sanguíneo local, originando calor
e rubor locais. A vasodilatação é induzida por alguns mediadores, nomeadamente a histamina
e o óxido de azoto, actuando estes sobre o músculo liso vascular.
- A vasodilatação é logo seguida por um aumento da
permeabilidade da microvasculatura, originando a
extravasão de fluído proteico para o espaço
intersticial;
- A perda de fluído resulta numa concentração do
volume eritrocitário nos pequenos vasos,
aumentando dessa forma a viscosidade sanguínea, o
que se comprova pela observação de pequenos vasos
dilatados e totalmente preenchidos por eritrócitos –
estase.
- A estase permite que, principalmente os leucócitos,
nomeadamente os neutrófilos, se acumulem-se perto
do endotélio. Os leucócitos aderem ao endotélio e
mais tarde migram através deste para os tecidos
intersticiais.
Aumento da Permeabilidade Vascular
Uma das marcas da inflamação aguda é o aumento da permeabilidade vascular acompanhado
da saída de proteínas para o espaço intersticial – exsudado. A saída de proteínas origina uma
diminuição da pressão oncótica no interior dos vasos e o seu aumento do espaço intersticial.
Em simultâneo ocorre um aumento do fluxo sanguíneo, que por sua vez irá aumentar a
pressão hidrostática nos vasos; desta forma aumenta a saída de fluído dos vasos, conduzindo a
uma situação de edema.
As trocas de fluidos e o aumento da permeabilidade microvascular são dependentes de um
endotélio intacto. Em seguida iremos esclarecer a forma como o endotélio se torna permeável
durante a inflamação:
- Formação de poros no endotélio das vénulas, é o processo mais comum de extravazamento
vascular e é induzido pela histamina, bradicinina, leucotrienos e o neuropéptido P. Esta
reacção é rápida e prolonga-se por um curto período de tempo (15 a 30 minutos) – Resposta
Imediata Transiente. Este tipo de resposta afecta vasos com diâmetros entre os 20 e os 60 μm,
deixando os capilares e as arteríolas de fora. Pensa-se que esta restrição às vénulas deve-se a
uma maior concentração de receptores no seu endotélio, que ao serem estimulados pela
histamina promovem a contracção do endotélio e a separação das suas junções intercelulares;
por outro lado as interleucinas, como é o caso da IL-1, TNF, IFN-γ promovem o aumento da
permeabilidade vascular e ao mesmo tempo uma reorganização do citoesqueleto. Em
contraste com a histamina, as interleucinas iniciam a sua acção mais tarde (4 a 6 horas) e
prolongam-se por mais tempo (24 horas ou mais);
- Lesão directa do endotélio, conduzindo a necrose endotelial e separação das células. Este
efeito é encontrado geralmente nas lesões necrozantes e deve-se à lesão directa do endotélio
por estímulos lesivos (ex. Queimaduras ou Infecções Líticas Bacterianas). Por outro lado, a
adesão dos neutrófilos ao endotélio pode desencadear lesão endotelial. A saída de fluído
inicia-se logo após a lesão e mantém-se até que os vasos sejam trombosados ou reparados –
Reposta Imediata Sustentada. Neste caso todos os vasos são afectados, incluindo vénulas,
capilares e arteriolas. A separação das células endoteliais encontra-se associada à adesão
plaquetar e à trombose;
- Extravasamento Prolongado Tardio, apesar de curioso é um fenómeno que se verifica com
alguma frequência. Caracteriza-se por um aumento da permeabilidade vascular após 2 a 12
horas, podendo estender-se por horas a dias, envolvendo vénulas e capilares. Este tipo de
resposta é característico de lesões térmicas intermédias, radiação de raios-x ou ultravioleta, e
por muitas das toxinas bacterianas. Não se percebe ainda o mecanismo por detrás desta
resposta, no entanto pensa-se que esteja relacionado com a lesão directa do endotélio
(provavelmente por apoptose) e pelo efeito
derivado das citocinas;
- Lesão Endotelial Mediada por Leucócitos, os
leucócitos ao aderirem ao endotélio nas fases
mais precoces da resposta inflamatória pode
libertar radicais livres de oxigénio e enzimas
proteolíticas, levando estas por sua vez a lesão
endotelial. Consequentemente aumenta a
permeabilidade vascular, que no caso da
inflamação aguda, se encontra restrita às
vénulas e aos capilares pulmonares e
glomerulares;
- Aumento da Transcitose através do
citoplasma endotelial. A transcitose ocorre por
um atravessar de canais compostos por
aglomerados interconectados de vesiculas e
vacúolos denominando-se organelo vesico-
vacuolar, estando em grande parte localizado
nas junções intercelulares. Alguns factores,
como é o caso do VEGF, parecem estar
associados ao aumento do número e tamanho
destes complexos. Pensa-se que a histamina e
outros mediadores químicos tenham
igualmente esta capacidade;
- Extravasamento de Novos Vasos, durante a
reparação, as células endoteliais proliferam e
formam novos vasos – angiogénese. Estes
novos vasos antes da maturação das junções
intercelular apresentam uma elevada taxa de
perda de fluido. Este fenómeno é afectado
pelo facto de alguns dos factores que
promovem a angiogénese, nomeadamente o
VEGF, aumentam de igual forma a
permeabilidade vascular. Por outro lado, as células endoteliais no foco de angiogénese
possuem uma expressão aumentada dos receptores vasoactivos, incluindo os da Histamina,
Substância P e VEGF.
Apesar de estes mecanismos serem descritos separadamente, muitos deles podem ocorrer em
simultâneo e estão interligados com frequência.
Na inflamação aguda podemos então distinguir várias vasos no que toca à perda de fluído e ao
aumento da permeabilidade vascular:
- uma resposta imediata transiente nos primeiros 30 minutos, como consequência da
libertação de Histamina e Leucotrienos;
- uma resposta que se inicia após 2 horas e se pode prolongar por cerca de 8 horas, sendo esta
mediada por quininas, produtos do sistema de complemento e outros factores;
- uma resposta prolongada é mais evidente nos casos de lesão directa do endotélio, como
acontece num processo de queimadura.
Resposta Celular: Extravasamento dos Leucócitos e Fagocitose
Uma importante função da resposta inflamatória é a chegada dos leucócitos ao local da lesão e
a sua activação. Os Leucócitos fagocitam os agentes lesivos, destroem as bactérias e outros
microrganismos, possuem ainda uma importante função ao eliminarem o tecido necrótico e
substâncias ou corpos estranhos. Um preço que se paga por esta potente capacidade
defensiva dos leucócitos é que, uma vez activados, eles podem provocar danos e prolongar a
inflamação nos tecidos, uma vez que os produtos derivados dos leucócitos que destroem os
microrganismos também podem lesar os tecidos normais envolventes. Assim sendo a chave
para uma função normal dos leucócitos no seu papel defensivo consiste em assegurar que
estes apenas são recrutados e activados quando necessário.
A sequência de eventos que conduz a saída dos leucócitos do lúmen para os tecidos
envolventes – extravasamento – pode ser dividida nos seguintes eventos:
- No lúmen: marginalização, rolling e adesão ao endotélio. Em condições normais o endotélio
não interfere com a passagem das células sanguíneas, mas durante a inflamação é activado e
passa a aderir aos leucócitos, sendo este passo o primeiro para que os leucócitos possam
abandonar o vaso;
- Transmigração através do endotélio – diapedese;
- Migração nos tecidos intersticiais guiados por estímulos quimiotáticos.
Num fluxo sanguíneo normal os eritrócitos encontram-se concentrados eixo central da coluna
de sangue, estando os leucócitos à periferia, mais juntos das paredes do vaso. Devido a uma
diminuição da velocidade do fluxo sanguíneo logo desde o início da inflamação – estase –, a
hemodinâmica altera-se, e mais leucócitos assumem uma posição à periferia. Esta acumulação
dos leucócitos denomina-as marginalização. Os leucócitos começam por aderir ligeiramente
ao endotélio, continuando a deslocar-se – rolling – e mais tarde aderem firmemente.
Virtualmente o endotélio pode ser completamente recoberto por leucócitos, num fenómeno
designado por pavimentação. Após a adesão firme ao endotélio os leucócitos inserem os seus
pseudopedes entre as junções celulares, comprimindo-se entre as células endoteliais e
passando a assumir uma posição entre a célula e a membrana basal. Após atravessarem a
membrana basal podem escapar para o espaço extravascular.
Adesão Leucocitária e Transmigração
A adesão leucocitária e a transmigração são amplamente reguladas pela ligação de moléculas
complementares de adesão entre as superfícies leucocitária e endotelial, bem como por
mediadores químicos e alguns mediadores quimio-atractivos e citocinas. Este factores actuam
modulando a expressão à superfície ou avidez de tal aderência entre as moléculas. Os
receptores de adesão molecular envolvidos neste processo pertencem a quatro famílias:
- Selectinas, é possível distinguir a E-selectina (CD62E, anteriormente conhecido como ELAM-
1), que se limita ao endotélio, P-selectina (CD62P , anteriormente denominada GMP140 ou
PADGEM), que está presente no endotélio e nas plaquetas, e L-selectina (CD62L,
anteriormente conhecido por diversas designações, incluindo a LAM-1), que se expressa na
maioria dos tipos de leucócitos.;
- Super-família das Imunoglobulinas, incluem duas moléculas de aderência endoteial: ICAM-1
(Intercellular Adhesion Molecule 1) e VCAM-1 (Vascular Cell Adhesion Molecule 1). Ambas
estas moléculas servem como ligantes para as integrinas encontradas em leucócitos;
- Integrinas, são glicoproteínas heterodiméricas transmembranares, expressas em muitos tipos
de células e que se ligam a ligandos em células endoteliais, leucócitos, ou outros componentes
da matriz extracelular. As β2 integrinas LFA-1 e Mac-1 (CD11a/CD18 e CD11b/CD18) ligam-se à
ICAM-1, e as integrinas β1 (tais como a VLA-4) ligam-se à VCAM-1.
- Glicoproteínas Tipo-Municas, tais como o heparano de sulfato, tendo como função servirem
como ligandos para as moléculas de adesão leucocitária, nomeadamente o CD44. Estas
glicoproteínas são encontradas na matriz extracelular e na superfície celular.
O recrutamento de leucócitos para os locais de lesão e infecção é um processo que envolve
diversos passos na adesão de leucócitos circulantes às células endoteliais e sua migração
através do endotélio. As primeiras manifestações consistem na indução de moléculas de
adesão em células endoteliais. Mediadores, como a Histamina, Trombina e Factor Activador
Plaquetário (PAF) estimulam a redistribuição da P-
selectina do seu local de armazenamento em grânulos
intracelulares normais - Corpos de Weibel-Palade - para a superfície da célula. Os macrófagos
residentes nos tecidos, os mastócitos, as células endoteliais em resposta aos agentes lesivas
secretam TNF, IL-1 e Citocinas Quimiotáticas. O TNF e IL-1 actuam nas células endoteliais das
vénulas pós-capilares adjacentes à infecção e induzem a expressão de diversas moléculas
adesivas. Após de 1 a 2 horas, as células endoteliais começam a expressar E-selectina, os
leucócitos expressam na extremidade das suas microvilosidades ligandos glicídicos para a
selectinas, permitindo desta forma a ligação dos leucócitos às selectinas endoteliais. Estas
interacções são de baixa afinidade e com um tempo de dissociação igualmente pequeno,
sendo por isso facilmente perturbadas pelo fluxo sanguíneo. Como resultado, os leucócitos
libertam-se e voltam a vincular-se novamente ao endotélio, iniciando desta forma o rolar ao
longo da superfície endotelial.
O TNF e a IL-1 também podem induzir a expressão endotelial ligandos de integrinas,
principalmente VCAM-1 e ICAM-1. Os leucócitos normalmente expressam estas integrinas em
num estado de baixa afinidade. Entretanto, quimiocinas que foram produzidas no local da
lesão entram no vaso sanguíneo, ligam-se ao heparano de sulfato das células endoteliais, e são
exibidos em concentrações elevadas na superfície endotelial. Estas quimiocinas interferem
com o rolling leucocitário e promovem a sua activação. Uma das consequências da activação
leucocitária é a conversão de VLA-4 e LFA-1 para um estado de alta afinidade. A combinação
da expressão induzida de ligandos das integrinas no endotélio e a activação de integrinas na
superfície dos leucócitos resulta numa adesão firme entre os leucócitos e o endotélio no local
da lesão. Os leucócitos param o seu rolling, o seu citoesqueleto é reorganizado, podendo agora
ser encontrados a cobria a superfície endotelial.
O próximo passo no processo é a migração dos leucócitos através do endotélio, chamada
transmigração ou diapedese. As quimiocinas actuam sobre os leucócitos aderentes e
estimulam-nos a migrar através espaços entre as células do endotélio no sentido da maior
concentração gradiente químico, ou seja, em direcção ao local da lesão ou infecção. A
Diapedese Leucocitária, semelhante a um aumento da permeabilidade vascular, ocorre
predominantemente nas vénulas (excepto nos pulmões, onde também ocorre em capilares).
Após atravessar o endotélio, leucócitos são transitoriamente retidos na sua viagem pela
membrana basal contínua das vénulas, mas para finalizar o processo as células têm de perfurar
a membrana basal, provavelmente através da secreção de colagenases.
Após entrar no espaço extravascular os leucócitos estão aptos a aderir à matriz extracelular em
virtude da ligação entre as integrinas β1 e CD44 com as proteínas da matriz, permitindo que
estes sejam mantidos no local correcto.
O tipo de leucócitos presentes
varia com a idade, com o tipo da
resposta inflamatória e com o
estímulo desencadeador. Na
maioria das formas de
inflamação aguda, predominam
neutrófilos no infiltrado
inflamatório durante os
primeiros 6 a 24 horas e, em seguida, são substituídos pelos monócitos em 24 a 48 horas. O
predomínio dos neutrófilos é justificado pelo facto de que são mais numerosos no sangue,
respondem mais rapidamente às quimiocinas, e possuem a capacidade de aderir mais
firmemente às moléculas que são mais rapidamente induzidas em células endoteliais, como P-
e E-selectinas. Além disso, após entrar tecidos, os neutrófilos têm uma vida curta, sofrendo
apoptose e desaparecendo após 24 a 48 horas, por outro lado os monócitos sobrevivem mais
tempo. Em certas infecções, por exemplo, aquelas em que o agente são Pseudomonas
predominam os neutrófilos ao longo de 2 a 4 dias; em infecções virais, os linfócitos podem ser
os primeiros a chegar; em algumas reacções de hipersensibilidade, os eosinófílos podem ser o
principal tipo celular presente.
Quimiotaxia
Após o extravasamento, os leucócitos migram para os tecidos em direcção ao local da lesão
por um processo denominado quimiotaxia, mais definida simplesmente como locomoção
orientada ao longo de um gradiente químico. Todos os granulócitos, monócitos e, em menor
grau, os linfócitos respondem a estímulos quimiotáticos com diferentes taxas de velocidade.
Tanto as substâncias endógenas como as exógenas podem agir como quimio-atractores. Os
mais comuns são exógenos, nomeadamente os agentes bacterianos. Os quimio-atractores
endógenos incluem:
- Componentes do sistema de complemento, especialmente C5a;
- Os produtos da via da lipoxigenase, principalmente o leucotrieno B4 (LTB4);
- As Citocinas, particularmente as da Família das Quimiocina (ex. IL-8).
A ligação destes agentes a receptores nas células leva à activação das GTPases, estas por sua
vez induzem polimerização da actina, resultando num aumento da quantidade de actina
polimerizada na vanguarda da célula. Um certo número de proteínas reguladoras da actina,
tais como filamina, gelsolina, profilina, e calmodulina, interagem com actina e a miosina no
filopodium para produzir contracção, e consequentemente movimento.
Activação Leucocitária
Microrganismos, detritos de células necróticas, complexos antigénio-anticorpos e citocinas,
incluindo factores quimiotáticos, podem induzir uma série de respostas em leucócitos que
fazem parte das funções defensivas dos leucócitos. A activação resulta de várias vias
sinalizadoras que são accionados em leucócitos, resultando num aumento de Ca2+ citosólico e
na activação de enzimas como a PKC e Fosfolipase A2. As respostas funcionais que são
induzidas em na activação dos leucócitos incluem o seguinte:
- Produção de Metabolitos do Ácido Araquidónico, como resultado da activação da
Fosfolipase A2 pelo aumento intracelular de cálcio e de outros sinais;
- Desgranulação e Secreção de Enzimas Lisossomais e Activação da Explosão Oxidativa;
- Secreção de Citocinas, que complementam e regulam as reacções inflamatórias. Os
Macrófagos activados são a principal fonte de citocinas que estão envolvidas na inflamação,
mas os mastócitos e outros leucócitos também podem contribuir;
- Modelação das Moléculas de Adesão dos Leucócitos, como afirmado anteriormente,
diversas citocinas podem causar o aumento da expressão de moléculas de adesão endotelial e
aumento da afinidade das integrinas leucocitárias, permitindo a adesão firme dos neutrófilos
ao endotélio activado.
Os Leucócitos expressam uma série de receptores à sua superfície que estão envolvidos na sua
activação. Estes receptores incluem os seguintes:
- Toll-like Receptors (TLRs), têm a função de activar os leucócitos em resposta a diferentes
tipos e componentes dos micróbios. Diferentes TLRs desempenham papéis essenciais na
resposta celular ao lipopolissacarídeo bacteriano (LPS ou endotoxina), outros proteoglicanos
bacterianos, e nucleotídeos não-metilados, que são encontrados apenas nas bactérias, bem
como RNA de cadeia dupla, que é produzido apenas por alguns vírus;
- Receptores com Sete Domínio Transmembranares Acoplados à Proteína G, esta classe
reconhece resíduos de péptidos de N-formilmetionina, bem como quimiocinas, produtos de
degradação, como complemento C5a, e mediadores lipídicos da inflamação, incluindo as
plaquetas, factor activador, prostaglandina E, e LTB4. Como todas as proteínas bacterianas e
poucas mamíferas são iniciados por N-formilmetionina, este receptor permite aos neutrófilos
responder às proteínas bacterianas. A ligação dos ligandos, tais como produtos microbianos e
quimiocinas, aos Receptores Acoplados à Proteína G induz migração das células do sangue
através do endotélio e a produção de substâncias microbicida pela activação da explosão
oxidativa;
- Os fagócitos expressam Receptores para Citocinas que são produzidos durante a resposta
imunitária. Uma das mais importantes dessas citocinas é o IFN-γ, que é secretado pelos
Linfócitos Natural Killer (NK) durante a resposta imunitária inata e pelos linfócitos T antigénio-
activados durante respostas imunitárias adaptativas. O IFN-γ é a principal citocina de activação
macrofágica;
- Receptores para Opsoninas, promovem a fagocitose de microrganismos revestidos com
diversas proteínas e emitem sinais que activam os fagócitos. O processo de revestimento de
partículas, como um microrganismo, para destiná-las para a fagocitose é denominado
opsonização, e as substâncias envolvidas no processo designam-se opsoninas. Estas
substâncias incluem anticorpos, proteínas complementares e lectinas. Um dos mais eficientes
sistemas de opsonização de partículas é revestimento das partículas com anticorpos IgG.
Componentes do sistema complemento, especialmente os fragmentos do complemento C3,
são também potentes opsoninas, o que se deve à sua ligação ao microrganismo e fagócitos
expressarem um receptor, chamado de Receptor do Complemento Tipo 1 (CR1), que
reconhece que os fragmentos de C3. Estes fragmentos do Complemento C3 podem ser
actividades tanto pela via clássica do complemento, como pela via alternativa, o que torna o
sistema bastante eficiente.
Fagocitose
A Fagocitose consiste na libertação de enzimas pelos neutrófilos e macrófagos que são
responsáveis por eliminar os agentes prejudiciais e, portanto, constituem dois dos principais
pontos benéficos resultantes do acumular de leucócitos no foco inflamatório. A fagocitose
envolve três etapas distintas, mas interdependentes:
- o reconhecimento e a ligação da partícula a ser ingerida pela leucócitos;
- a sua captura, com consequente formação de um vacúolo fagocitário;
- morte ou degradação do material ingerido material.
Reconhecimento e Ligação
Embora neutrófilos e macrófagos possam capturar bactérias ou impurezas sem ligação a
receptores específicos, o que geralmente ocorre na fagocitose de microrganismos e células
mortas é iniciado pelo reconhecimento das partículas pelos receptores expressos na superfície
leucocitári. Os Receptores de Manose e os Receptores de Varrimento (Scavenger Receptors)
são dois importantes receptores cuja função é a de permitir a vinculação e ingestão dos
microrganismos. O receptor de manose é uma lectina macrofágica que se liga ao resíduo
terminal de manose e fucose das glicoproteínas e glicolípidos. Esses açúcares são
normalmente parte de moléculas encontradas na parede celular microbiana, enquanto nos
mamíferos as glicoproteínas e glicolípidos contêm ácido siálico ou N-acetilgalactosamina como
resíduo terminal. Portanto, o receptor de manose dos macrófagos reconhece microrganismos
e não células do organismo. Os receptores de varrimento foram originalmente definidos como
moléculas que se ligam e mediam a endocitose de partículas de lipoproteína de baixa
densidade oxidada ou acetilada já não podem interagir com o receptor convencional de LDL.
Os receptores de varrimento macrofágicos podem vincular-se a uma variedade de
microrganismos devido às partículas de LDL modificadas. As integrinas presentes na superfície
dos macrófagos, nomeadamente a Mac-1, também podem ligar-se aos microrganismos e
promover a sua fagocitose.
A eficiência da fagocitose é muito maior quando microrganismos estão opsonizados por
proteínas específicas – opsoninas - para a qual os fagócitos expressam receptores de alta
afinidade. Como descrito acima, as principais opsoninas são Anticorpos IgG, o produto do
complemento C3b, e certas lectinas plasmáticas.
Ingestão
A ligação de uma partícula fagocítica aos receptores dos leucócitos desencadeia um processo
de fagocitose activa dessa mesma partícula. Durante a ingestão, extensões do citoplasma –
pseudopodes – dispõem-se em torno da partícula a ser engolida, resultando num completo
envolver das partículas dentro de um fagossoma criado pela membrana plasmática da célula. A
membrana limitante deste vacúolo fagocítico funde-se com a membrana limitante de um
grânulo lisossomal, resultando na descarga do conteúdo do grânulo para o fagolisossoma.
Durante este processo, os neutrófilos e os monócitos tornam-se progressivamente
desgranulados.
O processo de fagocitose é complexo e envolve a integração de muitos receptores iniciadores
com as coordenadas acções de remodelação da membrana e alterações no citoesqueleto. A
fagocitose é dependente da polimerização de filamentos de actina; como tal, não surpreende
que os sinais que desencadeiam a fagocitose são muitas dos mesmos que estão envolvidas na
quimiotaxia.
Morte e Degradação
O último passo para a eliminação dos agentes
infecciosos e das células necróticas é a sua
morte e a sua degradação dentro dos
neutrófilos e macrófagos, que ocorrem mais
eficiente após a activação dos fagocíticos. A
morte dos microrganismos é realizada em
grande parte por mecanismos dependentes de
oxigénio. A fagocitose estimula um salto no
consumo de oxigénio, glicogenólise, aumento
da oxidação da glicose através do shunt hexose-
monofosfato , e a produção de espécies
reactivas de oxigénio (ROS).
A produção de espécies intermédias de oxigénio reactivos deve-se à rápida activação de uma
oxidase - NADPH Oxidase-, que oxida NADPH e, nesse processo, reduz oxigénio a um anião
superóxido. O superóxido é então convertido em peróxido de hidrogénio (H2O2),
principalmente por dismutação espontânea. O peróxido de hidrogénio também pode ser ainda
mais reduzido para o altamente reactivo radical hidroxil (OH). A maioria dos H2O2 é
eventualmente degradado pela catalase em H2O e O2, e alguns são destruídos pela acção do
glutatião oxidase.
Nos neutrófilos em repouso, a NADPH oxidase está localizada na membrana plasmática e no
citoplasma. Em resposta a estímulos de activação, as proteínas citosólicas deslocam-se para a
membrana plasmática ou para a membrana do fagossoma, onde se reúnem e formam um
complexo enzimático funcional. Assim, os ROS são produzidos dentro do lisossoma, onde as
substâncias ingeridas são segregadas, e desta forma os organelos celulares são protegidos
contra os efeitos nocivos dos ROS. O mesmo sistema enzimático gera intermédios reactivos de
nitrogénio, nomeadamente, o Monóxido de Azoto (NO), que também ajuda no processo de
morte dos microrganismos.
O H2O2 gerado pelo sistema NADPH oxidase geralmente não é capaz de matar
microrganismos eficientemente por si só. No entanto, os grânulos azurófilos dos neutrófilos
contêm a enzima mieloperoxidase (MPO), que, na presença de um halogeneto, como Cl-,
converte H2O2 em hipoclorito (HOCl). Este último é um potente agente antimicrobiano que
destrói microrganismos por halogenazação, ou por oxidação de proteínas e lípidos. O sistema
H2O2-MPO-halogeneto é o mais eficiente sistema bactericida em neutrófilos. Os leucócitos
com um déficite na enzima MPO são capazes de matar bactérias (embora mais lentamente do
que as células normais), em virtude da formação de superóxidos, radicais hidroxilo e de
oxigénio.
A morte de bactérias também pode ocorrer por mecanismos independentes de oxigénio,
através da acção de substâncias presentes nos grânulos dos leucócitos granules. Estes incluem
a Proteína Bactericida de Permeabilidade Crescente (BPI), causando a activação da
fosfolipase, degradação de fosfolípidos, e o aumento da permeabilidade da membrana externa
dos microrganismos; a Lisosima, que hidrolisa o ácido-N-acetil-glucosamina murâmico
encontrado no glicopéptido da parede celular de todas as bactérias; a Lactoferrina, uma
proteína de ligação ao ferro presente nos grânulos específicos; a Proteína Básica Principal,
uma proteína catiónica dos eosinófilos, tendo uma actividade bactericida limitada, mas sendo
citotóxico para muitos parasitas; e as Defensinas, grânulos peptídicos catiónicos ricos em
arginina que são citotóxicos para grande parte dos microrganismos (e algumas células de
mamífero). Além disso, os grânulos dos neutrófilos contêm muitas enzimas, como a elastase,
que também contribuem para eliminar os microrganismos.
Após a sua morte, as hidrolases ácidas, que são normalmente armazenadas em lisossomas,
degradam os microrganismos dentro fagolisossomas. O pH do fagolisossomas desce para entre
4 e 5 após a fagocitose, sendo este o pH óptimo para a acção destas enzimas.
Libertação dos Produtos Leucocitários e Lesão Tecidual Induzida pelos Leucócitos
Durante a activação e fagocitose, existe libertação de produtos microbicidas e outros
produtos, não só dentro do fagolisossoma mas também para o espaço extracelular. As mais
importantes destas substâncias em neutrófilos e macrófagos são as enzimas lisossomais ,
presentes nos grânulos; ROS e os produtos do metabolismo do ácido araquidónico, incluindo
as prostaglandinas e os leucotrienos. Estes produtos são capazes de causar lesão endotelial e
dano tecidual e podem, por isso, amplificar os efeitos prejudiciais do agente lesivo inicial.
Assim, se persistente e descontrolada, a resposta dos leucócitos em si torna-se o infractor, e
lesão tecidual dependente dos leucócitos subjacente a muitas doenças humanas agudas.
A regulação lisossomal da secreção de proteínas é uma peculiaridade dos leucócitos e outras
células hematopoiéticas. A libertação pode ocorrer se o vacúolo fagocítico permanecer
transitoriamente aberto para o exterior antes do encerramento completo do fagolisossoma -
regurgitação. Se as células são expostas a materiais potencialmente indigeríveis, tais como
complexos imunitários depositados sobre uma superfície plana imóvel (ex. Membrana Basal
Glomerular), a ligação de leucócitos a esses complexos imunitários desencadeia a activação
leucocitária, mas estes complexos imunitários não podem ser fagocitados e as enzimas
lisossomais são libertados para o meio – fagocitose frustrada. A libertação de produtos
citotóxicos ocorre após a fagocitose de substâncias potencialmente membranolíticas, tais
como cristais de ácido úrico, que danificam a membrana do fagolisossoma. Além disso, há
alguns indícios de que certas proteínas em grânulos, em especial os grânulos específicos dos
neutrófilos, podem ser directamente secretado por exocitose.
Após a fagocitose, os neutrófilos rapidamente sofrem morte celular por apoptose e são
ingeridos pelos macrófagos.
Defeitos na Função Leucocitária
É evidente que leucócitos desempenham um papel central na defesa do organismo. Não
surpreende, portanto, que defeitos na função leucocitária, tanto genéticos como adquiridos,
conduzam a uma maior vulnerabilidade às infecções. Defeitos de praticamente todas as fases
da função leucocitária foram identificados. Estes incluem os seguintes:
- Defeitos na Aderência, a anomalias genéticas nas moléculas de adesão - LAD tipos 1 e 2. A
LDA 1 é caracterizada por infecções bacterianas recorrentes e insuficiência na cicatrização. LAD
2 é clinicamente mais leve do que ADA 1, mas é também caracterizada por infecções
bacterianas recorrentes;
- Defeitos na Função do Fagolisossoma, um destes defeitos origina o Síndrome de Chediak-
Higashi, uma condição autossómica recessiva caracterizada por neutropénia4, desgranulação
defeituosa, e atraso na morte dos microrganismos. Os neutrófilos têm grânulos gigantes que
podem ser facilmente observados em esfregaços de sangue periférico, e que se pensa
resultarem da fusão aberrante dos organelos. Nesta síndrome há uma reduzida transferência
das enzimas lisossomais para os vacúolos fagocíticos nos fagócitos - causando susceptibilidade
às infecções -, e anormalidades nos melanócitos - originando albinismo -, células do sistema
nervoso e plaquetas – podendo surgir alterações da coagulação. A secreção de proteínas dos
grânulos citotóxicos por células T também é afectada, sendo responsável por parte da
imunodeficiência observada nesta patologia;
- Defeitos na Actividade Microbicida, a importância dos mecanismos bactericidas oxigénio-
dependente é demonstrada pela existência de um grupo de doenças congénitas com
alterações na capacidade de matar bactérias denominada Doença Granulomatosa Crónica,
que tornam indivíduos susceptíveis a infecções bacterianas recorrentes. A doença
granulomatosa crónica resulta de defeitos herdados nos genes que codificam os vários
componentes da NADPH oxidase, o que gera superóxido em excesso;
- Clinicamente, a causa mais frequente de defeitos leucocitários é a supressão da medula
óssea, levando à diminuição da produção de leucócitos. Isto é observado após terapias para o
cancro - radioterapia e quimioterapia - e quando o espaço da medula espaço comprometido
por metástases de um tumor.
Embora tenhamos enfatizado o papel dos leucócitos recrutados a partir da corrente sanguínea
na resposta inflamatória aguda, células residentes em tecidos têm também importantes
funções no início da inflamação aguda. O mais importante destes dois tipos de células nos
tecidos são os mastócitos e macrófagos. Os mastócitos reagem ao trauma físico, degradando
os produtos do complemento, produtos microbianos e neuropéptidos. As células libertam
histamina, leucotrienos, enzimas, e várias citocinas, todos os quais contribuem para a
inflamação. Os macrófagos reconhecem os produtos microbianos e secretam a maior parte das
citocinas importantes na inflamação aguda. Estas células estão estacionadas em tecidos para
reconhecerem rapidamente a estímulos potencialmente prejudiciais e iniciarem a reacção de
defesa.
Finalização da Resposta Inflamatória Aguda
É previsível que este poderoso sistema de defesa do hospedeiro, com a sua capacidade
intrínseca de provocar dano tecidual, necessite de um controlo rigoroso, para minimizar os
danos. Em parte, a inflamação diminui simplesmente porque os mediadores da inflamação
têm semi-vida curta, são degradados após a sua libertação, e são produzidos em pulsos
rápidos, apenas enquanto o estímulo persistir. Além disso, com o desenvolver da resposta
inflamatória, o processo desencadeia uma série de sinais que servem para parar activamente a
reacção inflamatória. Estes mecanismos activos incluem a conversação na produção de
leucotrienos pró-inflamatórias para lipoxinas anti-inflamatórias a partir de ácido araquidónico;
a libertação de uma citocina anti-inflamatória - Transforming Growth Factor-β (TGF-β) - a partir
de macrófagos e outras células, e impulsos neuronais – descarga colinérgica -, que inibem a
produção de TNF em macrófagos.
Existem ainda muitos outros mecanismos que ainda não foram claramente estudados, no
entanto pensa-se que estes estudos possam conduzir ao desenvolver de novas substâncias
com um elevado potencial anti-inflamatório.
Mediadores Químicos da Inflamação
Após os acontecimentos descritos na inflamação aguda, podemos agora voltar para a
discussão dos mediadores químicos que são responsáveis pelos acontecimentos em questão.
Muitos mediadores têm sido identificados, no entanto a forma como funcionam de maneira
coordenada ainda não é plenamente compreendida.
Os mediadores são originários quer a partir de plasma ou de células. Os derivados do plasma
estão geralmente presentes no plasma em formas precursoras que devem ser activadas,
geralmente por uma série de clivagens proteolíticas, para adquirirem as suas propriedades
biológicas. Os mediadores derivados de células são normalmente sequestrados em grânulos
intracelulares que precisam de ser secretados (ex. Histamina nos mastócitos granulados) ou
são sintetizadas de novo (ex. Prostaglandinas e Citocinas), em resposta a um estímulo. As
principais fontes são celulares as plaquetas, os neutrófilos, os monócitos, os macrófagos e os
mastócitos, mas as células mesenquimais (endotélio, músculo liso, fibroblastos) e a maioria
dos epitélios podem também ser induzidos a desenvolver alguns destes mediadores.
A produção de mediadores activa é desencadeada por produtos microbianos ou por ligação a
proteínas, tais como as proteínas do complemento, sistema da quinina, e ao sistema de
coagulação, que são activados por na presença de microrganismos e tecidos danificados.
A maioria dos mediadores desempenhar suas actividades biológicas inicialmente pela ligação a
receptores específicos nas células-alvo, no entanto, alguns têm uma via directa de actividade
enzimática (ex. Proteases Lisossomais) ou criar lesão oxidativa (ex. Espécies Reactivas de
Oxigénio e Nitrogénio).
Um mediador pode estimular a liberação de outros mediadores pelas próprias células-alvo.
Estes mediadores secundários podem ser idênticos ou semelhantes aos dos primeiros
mediadores, mas também podem ter actividades opostas. Porem fornecer mecanismos de
amplificação, ou em certos casos contrariando-o mediador inicial acção, no sentido de regular
a reacção desencadeada.
Os mediadores podem actuar sobre um ou alguns tipos de células-alvo, têm diversos
objectivos, ou podem mesmo ter efeitos diferentes em diferentes tipos de células. Uma vez
activada e libertada a partir da célula, a maioria desses mediadores têm um tempo de semi-
vida curto; rapidamente vão decaindo ou são inactivadas por enzimas. Podem ainda ser
recolhidos ou inibidos.
Concluindo, existe um sistema de barreiras e contrapesos na regulação das acções dos
mediadores. Este facto tem actualmente muita relevância porque se saber que a maioria dos
mediadores têm o potencial de causar efeitos nocivos.
Aminas Vasoactivas
As duas aminas, histamina e serotonina, são especialmente importantes porque estas já se
encontram presentes e armazenadas nas células e são, portanto, entre os primeiros
mediadores a serem libertados durante a inflamação.
Histamina
Histamina encontra-se amplamente distribuída nos tecidos, a fonte mais rica são os mastócitos
que estão normalmente presentes no tecido conjuntivo adjacente aos vasos sanguíneos. Pode
ainda ser encontrada nos basófilos e plaquetas sanguíneas. A histamina está presente nos
grânulos dos mastócitos e é libertada pela desgranulação dos mastócitos em resposta a uma
variedade de estímulos:
- Lesão Física, tais como trauma, frio ou calor;
- Reacções Imunitárias, envolvendo a ligação de anticorpos aos mastócitos;
- Fragmentos do Complemento, designados anafilatoxinas (ex. C3a e C5a);
- Proteínas Libertadoras de Histamina, sendo proteínas derivadas de leucócitos;
- Neuropéptidos (ex. Substância P);
- Citocinas (ex. IL-1, IL-8).
Em humanos, a histamina provoca a dilatação das arteríolas e aumenta a permeabilidade das
vénulas, no entanto provoca vasoconstrição nas grandes artérias. Este é considerado o
principal mediador da fase transitória imediata do aumento da permeabilidade vascular,
originando lacunas vénulares. Actua principalmente sobre a microcirculação através de ligação
a receptores H1 nas células endoteliais.
Serotonina
A serotonina (5-hidroxitriptamina) é um mediador pré-formado vasoactivo com acções
semelhantes às da histamina. Encontra-se presente nas plaquetas e em células
enterocromafins; bem como em mastócitos nos roedores, mas não os seres humanos.
A liberação de serotonina (e histamina) das plaquetas é estimulada quando estas são
agregadas após o contacto com colagénio, trombina, adenosina difosfato (ADP) e complexos
antigénio-anticorpo. Agregação plaquetária e a desagregação também são estimuladas por
Factores Ativação Plaquetária (PAF) derivada de mastócitos durante reacções mediadas por
IgE. Desta forma, a reacção de libertação plaquetária resulta num aumento da permeabilidade
durante as reacções imunológicas, sabendo já que os PAF têm um elevado potencial
inflamatório.
Proteínas Plasmáticas
Uma variedade de fenómenos na resposta inflamatória é mediada por proteínas plasmáticas
que pertencem a três sistemas interligados:
- Complementar;
- Quinina;
- Sistema de Coagulação.
Sistema do Complemento
O sistema complemento consiste de 20 proteínas e os seus produtos de clivagem, que são
encontrados em maior concentração no plasma. Este sistema funciona tanto na imunidade
inata, como na adaptativa para defesa contra agentes microbianos. O processo de activação do
complemento, resulta num número de componentes complementares que são sintetizados e
que causam um aumento da permeabilidade vascular, quimiotaxia e opsonização.
As proteínas do complemento estão presentes no plasma, na sua forma inactiva, sendo
numerados de C1 até C9. Muitas dessas proteínas são activadas para se transformarem em
enzimas proteolíticas que degradam outras proteínas do complemento, formando assim uma
enorme cascata capaz de amplificar o fenómeno. O passo crítico na elaboração das funções
biológicas do complemento é a activação do terceiro, e mais abundante, componente – C3. A
clivagem do C3 pode ocorrer por uma das três vias:
- Via Clássica, que é desencadeada pela fixação de C1 aos anticorpos (IgG e IgM), quando
combinados com um antigénio;
- Via Alternativa, que pode ser desencadeada por moléculas da superfície microbiana (ex.
Endotoxina ou LPS), polissacarídeos complexos, venenos, e outras substâncias, na ausência de
anticorpos;
- Via da Lectina, no qual a lectina de ligação à manose liga-se a carboidratos nos
microrganismos, activando directamente C1.
Qualquer uma destas vias leva à formação de uma enzima denominada C3 Convertase, que
divide C3 em dois fragmentos funcionalmente distintos - C3a e C3b. C3a e C3b são libertados e
ligam-se covalentemente à célula ou molécula onde o complemento foi activado. Em seguida,
o C3b liga-se a fragmentos anteriormente gerados para formar a C5 Convertase, esta vai clivar
a C5 para se formar C5a. O C5b liga-se aos componentes C6 a C9, culminando na formação do
Complexo de Ataque Membranar , sendo este composto por múltiplas moléculas de C9.
As funções biológicas do sistema do complemento podem ser classificadas em duas categorias
gerais:
- Lise celular por intermédio do MAC;
- Efeitos de proteolíticos dos fragmentos do complemento.
Os Factores Derivados do Complemento podem mediar uma variedade de fenómenos no
contexto da inflamação aguda:
- Fenómenos Vasculares, C3a e C5a, e, em menor grau, C4a que estimula a libertação de
histamina pelos mastócitos e, assim, aumenta a permeabilidade vascular e causa
vasodilatação. Estes componentes são chamados de anafilatoxinas porque têm efeitos
semelhantes aos dos mastócitos mediadores que estão envolvidos na reacção chamada
anafilaxia. O componente C5a também activa a via das lipoxigenases em neutrófilos e
monócitos promovendo o metabolismo do ácido araquidónico, causando libertação de
mediadores inflamatórios;
- Aderência Leucocitária, integrando a quimiotaxia e activação. C5a é um potente agente
quimiotáticos para os neutrófilos, monócitos, eosinófilos e basófilos;
- Fagocitose, o C3b e o produto resultante da sua clivagem - iC3b-, quando fixados à parede
celular bacteriana, agem como opsoninas e favorecem a sua fagocitose por neutrófilos e
macrófagos, o que é facilitado pela presença de receptores na superfície celular que se ligam a
esses fragmentos.
Entre os componentes do complemento, C3 e C5 são os mais importantes mediadores
inflamatórios. Para além dos mecanismos já discutidos, C3 e C5 podem ser activados por
diversas enzimas proteolíticas presentes no exsudado inflamatório. É importante salientar a
plasmina e as enzimas lisossomais libertadas a partir de neutrófilos.
A activação do complemento é rigorosamente controlada por proteínas associadas a células ou
circulantes. A presença destes inibidores nas membranas das células do organismo protegem-
nas contra reacções inadequadas durante a reacção inflamatória contra os microrganismos.
Sistema da Quinina
O Sistema da Quinina gera péptidos vasoactivos a partir de proteínas plasmáticas,
denominando-se quininogénese, pela acção de proteases específicas designadas kallikreins. A
activação do sistema da quinina resulta na libertação de bradicininas vasoactivas. A
Bradicinina aumenta a permeabilidade vascular e provoca contracção do músculo liso,
dilatação dos vasos sanguíneos, e dor quando injectada na pele. Estes efeitos são semelhantes
aos de histamina. Esta reacção é desencadeada pela activação do factor HAGEMAN (Factor XII)
em contacto com a carga negativa nas superfícies, tais como o colagénio e membranas basais.
Um fragmento do factor XII (Activador Pré-Kallikrein ou Factor XIIa) é produzido, este converte
a Pré-Kallikrein no plasma numa forma proteolítica activa, a enzima Kallikrein. Esta última
enzima irá clivar uma glicoproteína precursora de alto peso molecular existente no plasma –
quininogene -, para produzir bradicinina. A quininogene também actua como um catalisador
ou co-factor na activação do Factor de HAGEMAN. A acção da bradicinina é de vida curta, pois
é rapidamente inactivada por uma enzima denominada quininase. Qualquer quinina
remanescente é inactivada durante passagem do plasma através do pulmão pela enzima
conversora da angiotensina. Kallikrein em si é um potente factor de activação do Factor de
HAGEMAN, permitindo a amplificação auto-catalítica do estímulo inicial. A Kallikrein tem
propriedades quimiotáticas, e também converte directamente o C5 no seu produto
quimiotáctico, o fragmento C5a.
O Sistema de Coagulação
O sistema de coagulação e a inflamação são processos intimamente ligados. O sistema de
coagulação está dividido em duas vias que convergem, culminando na activação da trombina e
na formação de fibrina. A via intrínseca coagulação consiste numa série de proteínas
plasmáticas que podem ser activadas pelo Factor HAGEMAN (Factor XII), uma proteína
sintetizada pelo fígado que circula numa forma inactiva até que contacte com colagénio ou
uma membrana basal, podendo ainda ser activado por plaquetas. O Factor XII após este
fenómeno, sofre uma mudança conformacional, transformando-se no factor XIIa, expondo o
seu centro activo contendo serina que posteriormente pode decompor outros substratos e
activar uma grande variedade de mediadores.
A Protease da Trombina permite a principal ligação entre o sistema de coagulação e a
inflamação. A activação do sistema de coagulação resulta na activação da trombina (Factor IIa)
a partir do precursor protrombina (Factor II). A Trombina é a enzima que cliva o fibrinogénio
solúvel circulante para gerar um coágulo de fibrina insolúvel. Esta protease possui receptores
próprios, que no caso de serem intensamente activas originam a mobilização de P-selectina, a
produção de quimiocinas e expressão de moléculas de adesão endotelial para as integrinas
leucocitárias; indução da ciclooxigenase-2 e da produção de prostaglandinas, PAF e produção
de óxido nítrico, bem como alterações na forma do endotélio. O conjunto destes fenómenos
permitem um elo de ligação entre o sistema de coagulação e a inflamação.
Ao mesmo tempo que o Factor XIIa induz coagulação, pode também activar o sistema
fibrinolítico. Esta cascata contrabalança a coagulação, clivando a fibrina, e desta forma
solubilizando o coágulo de fibrina. Este sistema contribui para os fenómenos de inflamação
vascular através de diversos mecanismos. O Activador Plasminogénico, libertado a partir do
endotélio, leucócitos e outros tecidos, cliva o plasminogénio, uma proteína plasmática que se
liga ao coágulo de fibrina para gerar plasmina, uma protease multifuncional. A Plasmina é
importante na lise de coágulos de fibrina, mas no contexto de inflamação também cliva C3
para produzir os fragmentos de C3, e que ao degradar a fibrina forma produtos da divisão da
fibrina, estes por sua vez parecem ter propriedades importantes na indução da
permeabilidade. A plasmina também pode activar o factor de HAGEMAN, este por sua vez
pode accionar múltiplas cascatas, ampliando desta forma a resposta inflamatória.
Após esta exposição é possível retirar algumas conclusões:
- Bradicinina, C3a e C5a - como mediadores do aumento da permeabilidade vascular; C5a -
como o mediador da quimiotaxia;
- Trombina – com efeitos sobre o endotélio e muitos outros tipos celulares.
Sabe-se ainda que C3a e C5a podem ser gerados por vários tipos de reacções:
- Reacções Imunológicas, envolvendo anticorpos e o Sistema do Complemento (Via Clássica);
- Activação da Via Alternativa ou Via da Lectina por microorganismos, na ausência de
anticorpos;
- Agentes não directamente relacionados com a resposta imunitário, como a plasmina,
kallikrein, e algumas serina-proteases encontradas nos tecidos normais.
- Factor de HAGEMAN Activado inicia quatro sistemas envolvidos na resposta inflamatória:
- O Sistema da Quinina, que produz quininas vasoactivas;
- O Sistema de Coagulação, que induz a formação de trombina, fibrinopéptideos e factor X,
todos estes com propriedades inflamatórias;
- O Sistema Fibrinolítico, que produz plasmina e degrada fibrina;
- O Sistema do Complemento, que produz anafilatoxinas. Alguns dos produtos desta via,
especialmente a kallikrein pode, por feedback, activar o factor HAGEMAN, resultando numa
profunda amplificação dos efeitos do estímulo inicial.
É importante compreender que a inflamação aguda, através da activação ou lesão do
endotélio pode desencadear coagulação e induzir a formação de trombos. Por outro lado, a
cascata de coagulação induz inflamação, principalmente através da acção da trombina.
Metabolitos do Ácido Araquidónico: Leucotrienos, Prostangladinas e Lipoxinas
Quando as células são activadas por estímulos diversos, a sua membrana lipídica é
rapidamente remodelada para gerar compostos biologicamente activo, este por sua vez
servem como mediadores lipídicos, intra ou extracelular, com capacidade afectar uma grande
variedade de processos biológicos, incluindo a inflamação e hemostasia. Estes mediadores
lipídicos, são consideradas como autocoides, ou hormonas de curto alcance que são formados
rapidamente, exercendo os seus efeitos localmente, e sofrendo uma decadência espontânea
ou sendo destruídos enzimaticamente.
O Ácido Araquidónico (AA) é um ácido gordo polinsaturado, que não surge livre na célula, mas
normalmente é esterificado na membrana fosfolipídica É libertado a partir dos fosfolípidos
membranares por acção de fosfolipase (ex. Fosfolipase A2), estas por sua vez podem ser
activadas por processos mecânicos, químicos, físicos ou por outros mediadores (ex. C5a). Os
sinais bioquímicos envolvidos na activação da fosfolipase A2 incluem um aumento do Ca2+
citoplasmático e a activação de diversas cinases em resposta a estímulos extremos. Os
metabolitos do AA, podem ser designados eicosanoides, sendo sintetizados por duas
principais classes de enzimas:
- Ciclooxigenases, produzindo prostaglandinas e tromboxanos;
- Lipoxigenases, originado leucotrienos e lipoxinas.
Os Eicosanoides ligam a receptores em muitos tipos de células e podem mediar praticamente
todas as etapas da inflamação. Podem ser encontrados em exsudados inflamatórios, bem
como a sua síntese é aumentada nos locais de inflamação. Este facto é corroborado pelo
diminuição da inflamação a quando da administração de agentes que bloqueiam a
ciclooxigenase ou a lipoxigenase.
A Via da Ciclooxigenase, iniciada por duas diferentes enzimas - constitutivamente expressa a
COX-1 e indutível a enzima COX-2 -, levando à produção de prostaglandinas. As
Prostaglandinas mais importantes na inflamação são PGE2, PGD2, PGF2α, PGI2 (Prostaciclina),
e TXA2 (Tromboxano A2), cada uma das quais é obtido pela acção de uma enzima específica
sobre um intermediário da via. Algumas destas enzimas têm distribuição restrita a um tecido:
- Plaquetas contêm a enzima tromboxano sintetase e, portanto, o principal produto nestas
células é o TXA2. O TXA2, é um potente agente de agregação plaquetária e vasoconstritor, é
por si instável e rapidamente convertido na sua forma inactiva TXB2;
- Endotélio Vascular, que carece de tromboxano sintetase, mas possui prostaciclina sintetase,
levando à formação de prostaciclina (PGI2) e do seu produto final estável PGF1α. A
prostaciclina é um vasodilatador, um potente inibidor da agregação plaquetária, e também
potencializa acentuadamente o aumento da permeabilidade e os efeitos quimiotáticos de
outros mediadores.
O desequilíbrio entre prostaciclina/tromboxano tem sido apontado como um dos eventos
iniciais na formação de trombos nas coronárias e vasos sanguíneos cerebrais.
As Prostaglandinas também estão envolvidas na patogénese da dor e febre na inflamação. A
PGE2 é hiperalgésica, na medida em que torna a pele hipersensível a estímulos dolorosos,
provocando um aumento acentuado da dor produzida pela injecção intradérmica de pequenas
concentrações de histamina e bradicinina. Está ainda envolvida na febre induzida por citocinas
durante infecções. A PGD2 é o principal metabolito na Via Ciclooxigenase nos mastócitos; por
outro lado PGE2 e PGF2α, que são mais amplamente distribuídas, provocam vasodilatação e
um aumento da permeabilidade das vénulas pós-capilares, potencializando, assim, a formação
de edema.
Na Via das Lipoxigenases, os primeiros produtos são gerados por três diferentes lipoxigenases,
que estão presentes em apenas alguns tipos de células. A 5-
Lipoxigenase (5-LO) é a enzima predominante nos
neutrófilos. O principal produto, 5-HETE, que é
quimiotáticos para neutrófilos, é convertido numa família
de compostos denominados colectivamente leucotrienos. O
LTB4 é um potente agente quimiotáticos e activador de
neutrófilos em respostas funcionais, tais como a agregação
e adesão de leucócitos ao endotélio vénular, geração de
radicais livres de oxigénio, e libertação de enzimas
lisossomais. Os leucotrienos contendo cisteinil - C4, D4 e E4
(LTC4, LTD4 e LTE4) - causam intensa vasoconstrição, broncoespasmo, e aumento da
permeabilidade vascular. O derrame vascular, como acontece com histamina, é restrito às
vénulas. Os leucotrienos são mais potentes do que histamina no aumento da permeabilidade
vascular e na indução de broncoespasmo. Os leucotrienos medeiam as suas acções através da
ligação aos receptores CysLT1 e CysLT2, que desempenham um papel importante na
patogénese da asma brônquica.
As Lipoxinas são uma recente adição à família de produtos bioactivos gerados a partir de AA, e
os mecanismos transcelulares de biossíntese são fundamentais para a sua produção. Os
leucócitos, principalmente neutrófilos, produzem compostos intermédios na síntese de
lipoxinas, e estes são convertidos a lipoxinas por plaquetas ao interagirem com os leucócitos.
As lipoxinas A4 e B4 - LXA4, LXB4 - são sintetizados pela acção das 12-lipoxigenase plaquetária
sobre LTA4 derivado dos neutrófilos. O contacto célula-célula aumenta o metabolismo
transcelular, o bloqueio da adesão celular inibe produção de lipoxinas. As principais acções das
lipoxinas consistem em inibir o recrutamento dos leucócitos e dos componentes celulares da
inflamação. Existe uma relação inversa entre a quantidade de lipoxinas e leucotrienos
formadas, sugerindo que as lipoxinas podem ser reguladores endógenos da acção dos
leucotrienos e pode, portanto, desempenhar um papel na resolução da inflamação.
Uma nova classe de mediadores derivados do ácido araquidónico – Resolvinas - foram
identificadas em animais experimentais tratados com aspirina. Estes mediadores inibem o
recrutamento leucocitário e a sua activação, em parte através da inibição da produção de
citocinas. Assim, a actividade anti-inflamatória da aspirina provavelmente é atribuível à sua
capacidade de inibir a ciclooxigenase e, talvez, por estimular a produção de resolvinas.
A Terapêutica Anti-inflamatória pode ser direccionada a muitos alvos nesta longa cascata da
biossíntese dos eicosanoides:
- Inibidores da Ciclooxigenase, incluem aspirina e outros fármacos anti-inflamatórios não-
esteroides (AINEs), tais como indometacina;
- Inibidores da Lipoxigenase, a 5-lipoxigenase não é afectada pela AINEs, e muitos dos novos
inibidores da enzima esta via têm sido desenvolvidos. Agentes farmacológicos que inibem a
produção de leucotrienos ou dos receptores (CysLT1 e CysLT2) foram encontrados útil no
tratamento da asma;
- Inibidores de Largo Espectro, incluem glicocorticóides. Estes poderosos agentes anti-
inflamatórios podem actuar por regularem a expressão de genes-alvo específicos, incluindo
genes que codificam a enzima COX-2, fosfolipase A2, citocinas (tais como a IL-1 e TNF), e óxido
nítrico sintetase (iNOS)
Outra abordagem para manipular respostas inflamatórias tem sido a de modificar a ingestão
dietética e do conteúdo de lípidos, aumentando o consumo de peixe. A base para esta
abordagem é que os ácidos gordos presentes na gordura do peixe servem como substratos
pobres para a conversão de metabolitos activos tanto pela via da ciclooxigenase como pela via
da lipoxigenase.
Factor de Activação Plaquetária (PAF)
O PAF é outro mediador derivado dos fosfolípidos. O PAF medeia os seus efeitos através de um
único receptor, e os seus efeitos são regulados por uma família de acetil-hidrolases
inactivadoras do PAF. Uma variedade de tipos celulares, incluindo plaquetas, basófilos e
mastócitos, neutrófilos, monócitos e macrófagos, células endoteliais, podem sintetizar PAF, em
todos este mediador é secretado numa forma conjugado às células. Além de activar as
plaquetas, o PAF provoca vasoconstrição e broncoconstrição, e em concentrações
extremamente baixas pode provocar vasodilatação e aumento da permeabilidade vénular com
uma potência de 100 a 10.000 vezes maior do que a histamina. O PAF também provoca
aumento da adesão leucocitária ao endotélio, quimiotaxia, desgranulação, e a explosão
oxidativa. Assim, o PAF pode originar a maior parte das características principais da
inflamação. O PAF também estimula a síntese de outros mediadores, particularmente
eicosanoides, por leucócitos e outras células.
Citocinas e Quimiocinas
As Citocinas são proteínas produzidas por diversos tipos de células, principalmente linfócitos e
macrófagos activados, mas também pelo endotélio, epitélio, e células de outros tecidos, que
modulam as funções de outros tipos celulares. Conhecidas por estarem envolvidas na resposta
imunológica celular, estes produtos têm efeitos adicionais que desempenham papéis
importantes na inflamação aguda e crónica.
Factor de Necrose Tumoral e Interleucina-1
O TNF e IL-1, são duas das principais citocinas que medeiam a inflamação. Elas são produzidas
principalmente por macrófagos activados. A citocina semelhante ao TNF, denominada
linfotoxina, é produzida por linfócitos T activados, e a IL-1 pode ser produzida por muitos
outros tipos celulares também. A secreção de TNF e IL-1 pode ser estimulada pela endotoxina
e outros produtos microbianos, complexos imunitários, lesão corporal, e uma variedade de
estímulos inflamatórios. As suas acções mais importantes na inflamação são os seus efeitos
sobre o endotélio, leucócitos e fibroblastos, bem como a indução de reacções sistémicas de
fase aguda. No endotélio influenciam principalmente ao nível da transcrição génica,
conduzindo à activação endotelial. Em particular, induzem a síntese de moléculas adesão
endotelial e mediadores químicos, incluindo outras citocinas, quimiocinas e factores de
crescimento, eicosanoides, e óxido nítrico (NO). Está ainda responsável pela indução da
produção de enzimas associadas com remodelação da matriz, e por aumentar a
trombogenicidade na superfície do endotélio.
A IL-1 e TNF (assim como a IL-6) induzem a resposta sistémica de fase aguda associada à
infecção ou lesão. As características destas respostas sistémicas incluem febre, perda de
apetite, sono de ondas lentas, a aumento dos neutrófilos em circulação, a libertação de
corticotropina e corticosteróides e, em particular no que diz respeito ao TNF, os efeitos
hemodinâmicos do choque séptico, hipotensão, diminuição da resistência vascular, aumento
da frequência cardíaca, e diminuição do pH sanguíneo. O TNF regula ainda a massa corporal,
promovendo a mobilização lípidos e proteínas, bem como a produção de supressores do
apetite. A produção de TNF contribui para caquexia, um estado patológico caracterizado pela
perda de peso e anorexia, que acompanha algumas infecções e doenças neoplásicas.
Quimiocinas
As Quimiocinas são uma família de pequenas proteínas que actuam principalmente como
quimioatractivos para leucócitos específicos. Existem diversos tipos de quimiocinas, sendo
estas classificadas em quatro grandes grupos, de acordo com a disposição dos resíduos de
cisteína conservados:
- Quimiocinas C-X-C (α-Quimiocinas), têm um aminoácido que separa os dois primeiros
resíduos de cisteína conservados. As quimiocinas CXC actuam principalmente em neutrófilos
(ex. IL-8). É secretada principalmente por macrófagos e células endoteliais activadas. Os seus
principais indutores são produtos microbianos e outras citocinas, principalmente IL-1 e TNF;
- Quimiocinas C-C (β-Quimiocinas), têm os dois primeiros resíduos conservados cisteína
adjacentes. Incluem Proteínas Quimioatractiva Monocitária (MCP-1), Eotaxina e Proteína
Inflamatória Macrofágica-1α (MIP-1α). Geralmente atraem monócitos, eosinófilos, basófilos e
linfócitos, mas não neutrófilos. Embora a maioria das quimiocinas nesta classe tenham
sobreposição das propriedades, a eotaxina recruta selectivamente eosinófilos;
- Quimiocinas C (γ-Quimiocinas), nestas moléculas faltam dois - o primeiro e o terceiro - dos
quatro resíduos de cisteína conservados. As quimiocinas C (ex. Limfotactina) são relativamente
específicas para linfócitos;
- Quimiocinas CX3C, contêm três aminoácidos entre as duas cisteínas. O único membro
conhecido desta classe é designado fractalcina. Esta quimiocina existe em duas formas: a
vinculada à superfície celular pode ser induzida em células endoteliais por citocinas
inflamatórias e promove uma forte adesão de monócitos e células T; e uma forma solúvel,
derivada por proteólise da proteína vinculada à membrana, tendo uma potente actividade
quimioatractiva para a mesma célula.
Os Receptores das Quimiocinas, designados CXCR ou CCR consoante a quimiocina, geralmente
apresentam sobreposição na especificidade do ligante, e geralmente os leucócitos expressam
mais de um tipo destes receptores. Alguns destes receptores (CXCR-4, CCR-5) agem como co-
receptores para a glicoproteína do invólucro do vírus da imunodeficiência humana (VIH-1) e
são, portanto, envolvidos na entrada do vírus nas células.
As quimiocinas estimulam o recrutamento de leucócitos na inflamação e controlam a migração
de células normais através de várias quimiocinas teciduais. Algumas são produzidas
transitoriamente em resposta a estímulos inflamatórios e promovem o recrutamento de
leucócitos para os sítios de inflamação; outras quimiocinas são produzidas constitutivamente
em tecidos e em função da organogénese para organizar os diferentes tipos de células em
diferentes regiões anatómicas dos tecidos. Em ambas as situações, as quimiocinas podem
estar presentes em concentrações elevadas associadas aos proteoglicanos na superfície das
células endoteliais e na matriz extracelular.
Óxido Nítrico (NO)
O NO, um mediador da inflamação pleotrópico, foi descoberto como um factor libertado a
partir de células endoteliais que causou vasodilatação por relaxamento do músculo liso
vascular e, portanto, foi chamado Factor Relaxante Derivado do Endotélio. O NO solúvel é um
gás que é produzido não só por células endoteliais, mas também por macrófagos e alguns
neurónios no cérebro. O NO funciona de forma parácrina sobre células-alvo através da indução
de GMPc, que, por sua vez, desencadeia uma série de eventos intracelulares que conduzem a
uma resposta, tais como a flexibilização das células musculares lisas vasculares. Visto que a
semi-vida in vivo do NO é de apenas alguns segundos, o gás só actua sobre as células nas
proximidades de onde é produzido.
O NO é sintetizado a partir de L-arginina pela enzima Óxido Nítrico Sintetase (NOS); existem
três tipos diferentes de NOS:
- Endotelial (eNOS);
- Neuronal (nNOS)
- Inductível (iNOS).
Estas diferentes isoformas da enzima apresentam dois padrões de expressão: eNOS e nNOS
são constitutivamente expressas em níveis baixos e podem ser activadas rapidamente por um
aumento dos iões cálcio no citoplasma; por outro lado o iNOS, apenas é produzido quando os
macrófagos e outras células são activados por citocinas (ex. TNF e IFN-γ) ou outros agentes.
O NO desempenha um papel importante nos componentes vasculares e celulares da resposta
inflamatória. O NO é um potente vasodilatador, como consequência das suas acções no
músculo liso vascular. Além disso, reduz a agregação e adesão plaquetária, inibindo várias
funcionalidades de mastócitos induzidas durante a inflamação; e serve como um regulador
endógeno do recrutamento leucocitário. Assim, a produção de NO endógeno é um mecanismo
compensatório que reduz a resposta inflamatória, o que se comprova pela diminuição do
recrutamento leucocitário na presença de NO. Alterações na produção endotelial de NO
ocorrem na aterosclerose, diabetes e hipertensão arterial.
O NO e os seus derivados são microbicidas, e por isso é também um mediador de defesa
contra infecções no organismo. Evidências apoiando a importância desta actividade
antimicrobiana de NO incluem o seguinte:
- Espécies de Nitrogénio Reactivo derivadas do NO possuem actividade antimicrobiana;
- Interacções entre NO e os ROS, levam à formação de múltiplos metabolitos antimicrobianos;
- A produção de NO é aumentada durante as respostas à infecção;
- A Inactivação Genética de iNOS melhora replicação de microrganismos em modelos animais
experimentais;
- Altos níveis de NO produzidos por uma variedade de células parecem contribuir para limitar a
reprodução de bactérias, helmintas, protozoários e vírus, bem como de como células tumorais.
Constituintes Lisossomais dos Leucócitos
Os neutrófilos e monócitos contêm grânulos lisossomais, que, quando libertados, podem
contribuir para a resposta inflamatória. Os neutrófilos têm dois tipos principais de grânulo:
- Os menores, mais específicos ou secundários, contêm grânulos de lisosima, colagenase,
gelatinase, lactoferrina, activador do plasminogénio, histaminase, e fosfatase alcalina;
- Os maiores, azurófilos ou primários, contêm grânulos de mieloperoxidase, factores
bactericida (ex. Lisozima e defensinas), hidrolases ácidas, e uma variedade de proteases
neutras (ex. elastase, catepsina G, colagenases inespecíficas e proteinase 3).
Os dois tipos de grânulos podem ser esvaziados em vacúolos fagocitários que ser formam em
torno do material fagocitado, ou o conteúdo do grânulo pode ser libertado para o espaço
extracelular. Os grânulos específicos são secretados extracelularmente mais facilmente e por
concentrações mais baixas de agonistas, ao passo que a libertação potencialmente mais
destrutiva dos grânulos azurófilos e do seu conteúdo ocorre principalmente para fagossoma e
requer altos níveis de agonistas para ser liberado extracelularmente.
Devido aos efeitos destrutivos das enzimas lisossomais, o infiltrado leucocitário inicial, se não
for controlado, poderá potenciar novos aumentos na permeabilidade vascular e dano tecidual.
Estas proteases nocivas, porém, são mantidas inactivas por um sistema de anti-proteases no
soro e tecidos fluidos. O primeiro destes é α1-antitripsina, sendo o principal inibidor da
elastase neutrofílica. Uma deficiência destes inibidores pode conduzir a uma acção das
proteases leucocitárias; a α2-macroglobulina é outra das antiproteases encontradas no soro e
várias secreções.
Radicais Livres Derivados do Oxigénio
Radicais Livres Derivados do Oxigénio podem ser libertados extracelularmente de leucócitos
após a exposição a microrganismos, quimiocinas, e complexos imunitários, ou após a
fagocitose. A sua produção está dependente da activação do Sistema Oxidativo NADPH.
Anião Superóxido (O2.), Peróxido de Hidrogénio (H2O2), e o Radical Hidroxil (OH) são as
principais espécies produzidas dentro da célula, sendo que estes metabolitos podem
combinar-se com o NO para formar outros Metabolitos de Nitrogénio Reactivos. A libertação
extracelulares de baixos níveis destes potentes mediadores pode aumentar a expressão de
quimiocinas (ex. IL-8), citocinas, moléculas adesão leucocitária e endotelial, amplificando a
cascata inflamatória que desencadeou a resposta. A função fisiológica destes metabolitos
reacticos de oxigénio é destruir os microrganismos fagocitados. Em níveis mais elevados, a
libertação destes potentes mediadores pode ser prejudicial para o organismo. Este
mediadores estão implicados nas seguintes respostas:
- Lesão Celular Endotelial, como consequência do aumento da permeabilidade vascular. Os
neutrófilos aderentes, quando activados, não apenas produzem as suas próprias espécies
tóxicas, mas também estimulam a oxidação da xantina nas células endoteliais, levando, assim,
à síntese de mais superóxido;
- Inactivação de Antiproteases, tais como a α1-antitripsina. Isto leva à actividade proteolítica
por unanimidade, com o aumento da destruição da matriz extracelular. Nesta situação existe
lesão para outros tipos de células, nomeadamente células parenquimatosas e glóbulos
vermelhos.
O plasma, os tecidos fluidos e as células do organismo possuem mecanismos antioxidantes que
as protegem contra estes derivados de radicais de oxigénio potencialmente nocivos. Estes
antioxidantes incluem:
- Ceruplasmina, uma proteína sérica contendo cobre;
- Transferrina, fracção livre de ferro no soro;
- Enzima Superóxido Dismutase, que se encontra ou que pode ser activada num grande
número de tipos celulares;
- Enzima Catalase, que catalisa o H2O2;
- Glutatião Peroxidase, outro poderoso destoxificador do H2O2.
Assim, a influência dos radicais livres de oxigénio, proveniente de qualquer reacção
inflamatória depende do equilíbrio entre a produção e a inactivação destes metabolitos por
células e tecidos.
Neuropéptidos
Os Neuropéptídos, semelhantes às aminas vasoactivas e aos eicosanoides discutidos
anteriormente, desempenham um papel na iniciação e propagação de uma resposta
inflamatória. Os pequenos péptidos, tais como a substância P e a neuroquinina A, pertencem a
uma família tachiquinina de neuropéptidos produzidos no sistema nervoso central e periférico.
As fibras nervosas contendo substância P são proeminentes nos pulmões e tracto
gastrointestinal. A substância P tem muitas funções biológicas, incluindo a transmissão de
sinais da dor, regulação da pressão arterial, estimulação da secreção de células endócrinas, e
aumento da permeabilidade vascular. Os neurónios sensitivos parecem produzir outras
moléculas pró-inflamatórias, estas permitem ligar os sensores de perigo perante determinados
estímulos para que se desenvolvam resposta de protecção no organismo.
Outros Mediadores
Os mediadores acima descritos são responsáveis por reacções inflamatórias na presença de
microrganismos, toxinas, e muitos outros tipos de lesão, mas não podem explicar algumas
situações específicas de inflamação. Estudos recentes estão a fornecer pistas sobre os
mecanismos de inflamação frequentemente encontrada em duas patologias:
- Resposta à Hipoxia, possuindo uma enorme potencialidade de em causar lesão celular e
necrose. A hipóxia por si só, é também um indutor da resposta inflamatória. Esta resposta é
mediada em grande parte por uma proteína chamada Factor Induzido pela Hipóxia 1α, que é
produzido pelas células privadas de oxigénio e activa vários genes implicados na inflamação,
incluindo o VEGF, que aumenta a permeabilidade vascular;
- Resposta a Células Necróticas, apesar de ter sido conhecido por muitos anos que as células
necróticas provocam reacções inflamatórias, que servem para eliminar essas células, a base
molecular dessa reacção tem sido em grande parte desconhecida. Um dos participantes pode
ser o ácido úrico, que é um produto de degradação do DNA, e cristaliza quando presentes em
concentrações suficientemente altas em tecidos extracelulares. Os cristais de ácido úricos
estimulam a inflamação e subsequentemente a resposta imunitária. Esta acção pró-
inflamatória do ácido úrico é a base da doença gota, em que quantidades excessivas de ácido
úrico são produzidas e cristais depositados em articulações e outros tecidos.
Resultados da Inflamação Aguda
Embora as alterações hemodinâmicas, da permeabilidade e dos leucócitos tenham sido
descritas sequencialmente e podem ser iniciadas nesta ordem, todos estes fenómenos
poderão ser simultâneos na evolução da reacção à lesão. Como seria de esperar, muitas
variáveis podem alterar esse processo básico, incluindo a natureza e a intensidade da lesão, o
local e tecidos afectados, bem como a capacidade de resposta do organismo. Em geral,
contudo, a inflamação aguda pode ter um de três resultados:
- Resolução Completa. Num mundo perfeito, todas as reacções inflamatórias, depois de terem
conseguido neutralizar e eliminar os efeitos prejudiciais do estímulo, deveriam terminar com a
restauração do sítio de inflamação aguda à sua conformação normal. Isto é denominado de
resolução e é o resultado normal quando a lesão é limitada ou de curta duração, ou quando
tenha existido pouca destruição tecidual e as células danificadas parenquimatosa podem
regenerar. A resolução envolve neutralização ou decadência espontânea do mediadores
químicos, com posterior retorno ao normal da permeabilidade vascular, cessação do infiltrado
leucocitário, morte dos neutrófilos e, finalmente, remoção de fluidos do edema e proteínas,
leucócitos, agentes estranhos, e fragmentos necróticos do do local. Os linfáticos e fagócitos
desempenham um papel importante nestes eventos;
- Substituição por Tecido conjuntivo (Fibrose). Isto ocorre após uma substancial destruição
tecidual, quando a lesão inflamatória envolve tecidos que são incapazes de regenerar, ou
quando existe uma abundante exsudação de fibrina. Quando existe exsudado fibrinoso nos
tecidos ou cavidades serosas (ex. Pleura e Peritoneu), este não pode ser devidamente
removido, então o tecido conjuntivo cresce na área de exsudato, convertendo-o numa massa
de tecido fibroso, um processo também designado de organização. Em muitas infecções
piogénicas pode formar-se um intenso infiltrado neutrofílico e ocorrer liquefação dos tecidos,
levando à formação pus. O tecido destruído é reabsorvido e, eventualmente, substituído por
fibrose.
- Progressão da Resposta para a Inflamação Crónica. Este desfecho pode seguir a Inflamação
Aguda, no entanto é possível identificar este padrão desde o início. A transição de Aguda para
Crónica ocorre quando a resposta inflamatória aguda não pode ser resolvida, quer devido à
persistência do agente lesivo ou por algumas interferências com o processo normal de
cicatrização. Por exemplo, a infecção bacteriana do pulmão pode começar como um foco de
inflamação aguda (pneumonia), mas a sua incapacidade para resolver pode levar a uma
extensa destruição tecidual e à formação de uma cavidade em que a inflamação persiste,
conduzindo eventualmente a um abcesso pulmonar crónico. Outro exemplo de inflamação
crónica com um estímulo persistente é a úlcera péptica do estômago ou duodeno. Úlceras
pépticas podem persistir por meses ou anos e, como discutido abaixo, manifestam-se por
ambas as reacções inflamatórias agudas e crónicas.
Padrões Morfológicos da Inflamação Aguda
Embora todas as reacções inflamatórias agudas sejam caracterizadas por alterações vasculares
e infiltração leucocitária, a gravidade da reacção, a sua causa específica, e nomeadamente o
tecido e local envolvidos introduzem variações morfológicas nos padrões básicos. Vários tipos
de inflamação são reconhecidos, que variam na sua morfologia e correlações clínicas.
Inflamação Serosa
A Inflamação Serosa é marcada pelo
derramamento de um líquido que pode ser
proveniente do plasma ou da secreção de células
do mesotélio do peritoneu, pleura e pericárdico -
Derrame. As lesões na pele resultantes de uma
queimadura ou infecção viral apresentam uma
grande acumulação de fluido seroso, quer dentro
ou imediatamente abaixo da epiderme da pele.
Inflamação Fibrosa
Com lesões mais graves e a consequente maior
permeabilidade vascular, grandes moléculas,
como o fibrinogénio passam a barreira
vascular, sendo a fibrina formada e depositada
no espaço extracelular. Um exsudato fibrinoso
surge quando as fugas vasculares são grandes o
suficiente ou se houver um estímulo pró-
coagulante no interstício (ex. Células
Neoplásicas). Um exsudato fibrinoso é
característico da inflamação no revestimento das cavidades corporais, tais como as meninges,
pericárdio e pleura. Histologicamente, a fibrina aparece como uma malha de fios eosinofílico
ou, por vezes, como um coágulo amorfo. Os exsudato fibrinoso podem ser removidos por
fibrinólise e a limpeza dos detritos por outros macrófagos. O processo de resolução pode
restaurar a estrutura normal dos tecidos, mas quando a fibrina não é removida, pode
estimular o recrutamento de fibroblastos e vasos sanguíneos e, assim, levar à cicatrização. A
conversão do exsudato fibrinoso a tecido cicatricial – organização - dentro da cavidade do
pericárdico leva a um espessamento opaco fibroso do pericárdio e do epicárdio na área de
exsudação, ou, mais frequentemente, para o desenvolvimento do tecido fibroso pode ser
obliterado o espaço pericárdico.
Inflamação Supurativa ou Purulenta
A Inflamação Supurativa ou
Purulenta é caracterizada pela
produção de grandes
quantidades de pus ou
exsudato amigdaliano
composto de neutrófilos,
células necróticas e fluícdo do
edema. Certas bactérias (ex.
Estafilococos) produzem esta supuração localizada e, portanto, são referidas como bactérias
piogénica - produtora de pus. Os abscessos são colecções localizadas de tecido inflamatório
purulento causado por supuração profunda num tecido, órgão, ou espaço confinado. Os
abscessos têm uma região central que surge como uma massa de leucócitos e tecidos
necróticos. Habitualmente existe uma zona de conservada de neutrófilos em torno deste foco
necrótico, e fora desta região parenquimatosa e surge dilatação vascular e proliferação
fibroblástica, indicando o início da reparação. Com o passar do tempo, o abscesso pode tornar-
se encapsulado e, em última instância substituído por tecido conjuntivo.
No caso do pús estar contido dentro de uma cavidade, por exemplo vesícula biliar, denomina-
se empiema.
Úlceras
Uma úlcera é um local de defeito, ou escavação, da superfície de um órgão ou tecido que é
produzido pela perda do tecido necrótico inflamatório. A ulceração pode ocorrer apenas
quando há necrose tecidual e a consequente inflamação existem numa ou perto de uma
superfície. São mais frequentemente encontradas em:
- Necrose Inflamatória da Mucosa da Boca, Estômago, Intestinos, ou Aparelho Geniturinário;
- Por via subcutânea através inflamação das extremidades inferiores, em pessoas idosas que
têm perturbações circulatórias que predispõem à extensa necrose.
A ulceração tem como principal exemplo a úlcera péptica do estômago ou duodeno, no qual
coexistem inflamação aguda e crónica. Durante a fase aguda, há um intenso infiltrado
polimorfonuclear e dilatação vascular nas margens do defeito. Com a cronicidade, as margens
e base da úlcera desenvolvem proliferação fibroblástica, cicatrizes, e acumulam-se linfócitos,
macrófagos e plasmócitos.
Resumo da Inflamação Aguda
Agora que temos descrito os componentes, mediadores e manifestações patológicas da
resposta inflamatória aguda, é útil resumir a sequência de eventos numa resposta típica deste
tipo. Quando um organismo encontra agentes prejudiciais, tais como um microrganismo
infeccioso ou células mortas, os fagócitos que residem em todos os tecidos tentar livrar-se
destes agentes. Ao mesmo tempo, os fagócitos e outras células hospedeiras reagem à
presença da substância estranha ou anormal ao libertarem citocinas, lípidos mensageiros, e
diversos outros mediadores da inflamação. Alguns desses mediadores actuam em células
endoteliais na vizinhança e promovem o efluxo de plasma e o recrutamento de leucócitos
circulantes para o sítio onde está localizado o agente agressor. Os leucócitos recrutados são
activados pelo agente prejudicial e por mediadores produzidos localmente, por sua vez os
leucócitos activados tentam remover o agente agressor por fagocitose. Quando o agente
prejudicial é eliminado e os mecanismo anti-inflamatórios são activados, o processo termina e
o organismo retorna a um estado normal de saúde. Se o agente prejudicial não poder ser
rapidamente eliminado, esta situação pode evoluir para uma inflamação crónica. As diferentes
componentes da resposta inflamatória são mediadas por sinais diferentes e têm funções
distintas. Os fenómenos vasculares da inflamação aguda são caracterizadas pelo aumento do
fluxo sanguíneo para a área lesada, resultantes principalmente da dilatação arteriolar e
abertura dos leitos capilares induzida por mediadores como a histamina. O aumento da
permeabilidade vascular resulta no acumular de um fluido extravascular rico em proteínas -
exsudato. Proteínas plasmáticas abandonam os vasos, mais comummente através de um
aumento do espaço entre as junções entre as células endoteliais das vénulas. A vermelhidão
(rubor), calor, e edema (tumor) da inflamação aguda são causadas pelo aumento do fluxo
sanguíneo e edema. Os leucócitos circulantes, inicialmente predominantemente neutrófilos,
aderem ao endotélio através de moléculas de aderência, transmigram através do endotélio, e
migram para o local da lesão sob a influência de agentes quimiotáticos. Os leucócitos que são
activados pelo agente agressor e por mediadores endógenos podem libertar metabolitos
tóxicos e proteases extracelularmente, causando lesão tecidual. Devido à lesão e, em parte
como resultado da liberação de prostaglandinas, neuropeptídeos e citocinas, um dos sintomas
locais é a dor.
Inflamação Crónica
Embora seja difícil de definir com precisão, a inflamação crónica é considerada como uma
inflamação da duração prolongada - semanas ou meses - em que inflamação a activa,
destruição tecidual, e tentativas de reparação ocorrem simultaneamente. Embora possa
continuar a inflamação aguda, como descrito anteriormente, a inflamação crónica
frequentemente começa insidiosamente, com uma baixa intensidade, latente, muitas vezes
assintomática. Este último tipo de inflamação crónica é a causa da lesão tecidual em algumas
dos doenças humanas mais comuns e incapacitantes, tais como a artrite reumatóide,
aterosclerose, tuberculose e doenças pulmonares crónicas.
Causas da Inflamação Crónica
Inflamação crónica surge nas seguintes definições:
- Infecções Persistentes por Alguns Microorganismos, como o bacilo da tuberculose,
Treponema pallidum, e de certos vírus, fungos e parasitas. Estes organismos são de baixa
virulência e evocam uma reacção imunitário denominada de hipersensibilidade tardia. A
resposta inflamatória, por vezes assume um padrão específico designado Reacção
Granulomatosa;
- Exposição Prolongada a Agentes Potencialmente Tóxicos, podendo ser de natureza
endógena ou exógena. Um exemplo de um agente exógeno são as partículas de sílica, um
material não degradável que, quando inalado por longos períodos, resulta numa doença
denominada Silicose Pulmonar Inflamatória. A Aterosclerose pensa-se que seja um processo
inflamatório crónico da parede arterial induzida, pelo menos em parte, por componentes
lipídicos plasmáticos tóxicos endógenos;
- Autoimunidade, sob certas condições, podem desenvolver-se reacções imunitários contra
tecidos do próprio indivíduo, levando a doenças auto-imunes. Nestas doenças, que evocam
uma reacção auto-imunitária perpetuam uma resposta crónica que resulta em lesão tecidual e
inflamação. As reacções imunitárias desempenham um papel importante em várias doenças
inflamatórias crónicas comuns, tais como artrite reumatóide e lúpus eritematoso.
Padrões Morfológicos
Em contraste com inflamação aguda, que se manifesta por alterações vasculares, edema e
infiltrado predominantemente neutrofílico, a Inflamação Crónica é caracterizada por:
- Infiltração de Células Mononucleares, que incluem macrófagos, linfócitos e células
plasmáticas;
- Destruição Tecidual, induzida pela persistência do agente agressor ou pelas células
inflamatórias;
- Tentativas de Cicatrização dos tecidos por substituição de tecidos danificados, realizado pela
proliferação de pequenos vasos sanguíneos (angiogénese) e, em particular, por fibrose.
Infiltrado de Células Mononucleados
Os macrófagos são o principal participante celular na inflamação crónica; são um componente
do sistema fagócito mononuclear, que pode algumas vezes denominar-se sistema
reticuloendotelial, consiste em células estreitamente relacionadas com origem na medula
óssea, incluindo os monócitos sanguíneos e os macrófagos teciduais ou residentes. Estes
últimos encontram-se difusamente espalhados no tecido conjuntivo ou localizados em órgãos
como o fígado - Células de Kupffer -, no baço e gânglios linfáticos e pulmão - Macrófagos
Alveolares. A partir do sangue, os monócitos migram para diversos tecidos e diferenciam-se
em macrófagos. A semi-vida dos monócitos no sangue é de cerca de 1 dia, enquanto o ciclo de
vida dos macrófagos nos tecidos é de vários meses ou anos.
Os monócitos começam a migrar para tecidos extravasculares muito cedo na inflamação
aguda, e no prazo de 48 horas podem constituir o principal tipo celular. O extravasamento de
monócitos é regido pelos mesmos factores que estão envolvidos na migração dos neutrófilos,
ou seja, a adesão a moléculas e mediadores químicos com propriedades quimiotáticas e de
activação. Quando o monócito atinge o tecido extravascular, ele sofre uma grande
transformação numa célula fagocítica especializada, os macrófagos. Os macrófagos podem ser
activadas por uma variedade de estímulos, incluindo citocinas (ex. IFN-γ) secretado pelos
linfócitos T sensibilizados e por células NK, endotoxinas bacterianas, e outros mediadores
químicos. A sua activação resulta no aumento tamanho celular, aumento dos níveis de enzimas
lisossomais, metabolismo mais activo, e uma maior capacidade de fagocitose e de matar os
microrganismos ingeridos. Os macrófagos activados secretam uma grande variedade de
produtos biologicamente activos que, se a secreção não for controlada, resultará na lesão
tecidual e fibrose características da inflamação crónica.
Na inflamação curta ou aguda, se o agente agressor é eliminado, os macrófagos
eventualmente desaparecem. Na inflamação crónica, a acumulação de macrófagos persiste,
devido à permanência do agressor, e é mediada por mecanismos diferentes:
- Recrutamento de Monócitos a partir da Circulação, o que resulta da expressão de moléculas
de adesão e factores quimiotáticos. A maioria dos macrófagos presentes num foco de
inflamação crónica são recrutados dos monócitos circulantes. O processo de recrutamento
monócito é fundamentalmente semelhante ao recrutamento de neutrófilos, descrito
anteriormente. Os estímulos quimiotáticos para os monócitos incluem quimiocinas produzidas
por macrófagos activados, linfócitos e outros tipos de células (ex. MCP-1); C5a; factores de
crescimento, como factor de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), factor de
crescimento e transformando-α (TGF-α), a partir de fragmentos da ruptura de colagénio e
fibronectina; e fibrinopéptido. Cada um deles pode desempenhar um papel sob determinadas
circunstâncias, por exemplo, as quimiocinas são importantes estímulos para a acumulação de
macrófagos e reacções imunitárias de hipersensibilidade tardia;
- Proliferação Local dos Macrófagos após a sua migração a partir da circulação sanguínea.
Apesar de ser um evento incomum, a proliferação dos macrófagos agora é conhecida como
uma ocorrência de destaque em algumas lesões inflamatórias crónicas, tais como placas
ateromatosas;
- Imobilização dos Macrófagos no Sítio de Inflamação, algumas citocinas e lípidos oxidados
podem causar a sua imobilização.
Os produtos dos macrófagos activados servem para eliminar os agentes prejudiciais, tais como
microganismos e dar início ao processo de reparação, e são responsáveis por grande parte da
lesão tecidual na inflamação crónica. Alguns desses produtos são tóxicos para os
microrganismos e células do organismo ou matriz extracelular (ex. Proteases); alguns causam
influxo de outros tipos de celulares (ex. Citocinas e Factores Quimiotáticos) e outros ainda
causar a proliferação de fibroblastos, deposição colagénio e angiogénese (ex. Factores de
Crescimento). Este impressionante arsenal de mediadores faz dos macrófagos poderosos
aliados na defesa do corpo contra invasores indesejados, mas as mesmas armas também
podem induzir considerável destruição tecidual quando macrófagos são activados
inadequadamente. Assim, a destruição tecidual é uma das características da inflamação
crónica.
Outras Células na Inflamação Crónica
Outros tipos celulares presentes na inflamação crónica incluem linfócitos, plasmócitos,
eosinófilos e mastócitos:
- Os Linfócitos são mobilizados em ambas as respostas imunitárias, a mediada por anticorpos e
a celular, e até mesmo na inflamação não imunitária. Diferentes tipos de linfócitos estimulados
por antigénios usam várias moléculas de adesão e quimiocinas para migrarem para os locais da
inflamação. As citocinas dos macrófagos activados, principalmente o TNF, IL-1 e quimiocinas,
promovem o recrutamento leucocitário, estabelecendo o palco para a persistência da resposta
inflamatória;
- Linfócitos e Macrófagos interagem de uma forma bidirecional, sendo que estas reacções
desempenham um papel importante na inflamação crónica. Os macrófagos apresentam
antigénios às células T, e produzem moléculas na membrana – co-estimuladores - e citocinas
(ex. IL-12) que estimulam a resposta das células T. Linfócitos T activados produzem citocinas, e
uma destas, o IFN-γ, é um importante activador de macrófagos. As Células Plasmáticas ou
Plasmócitos parecem desenvolver-se a partir de linfócitos B activados e produzem anticorpos
dirigidos contra qualquer antigénio presente na inflamação local ou contra componentes
alterados do tecido. Em algumas reacções inflamatórias crónicas fortes, a acumulação de
linfócitos, células apresentadoras de antigénios, células plasmáticas, o tecido pode assumir as
características morfológicas dos órgãos linfóides, particularmente dos gânglios linfáticos,
inclusive contendo centros germinais bem definidos. Este padrão de organogénese linfóide é
frequentemente visto na sinovial de pacientes com artrite reumatóide de com uma evolução
longa;
- Os Eosinófilos são abundantes nas reacções imunitárias mediadas por IgE e, em infecções
parasitárias. O recrutamento de eosinófilos envolve o extravasamento de sangue e a sua
migração para tecidos por processos semelhantes aos de outros leucócitos. Uma das
quimiocinas que é especialmente importante para o seu recrutamento é eotaxina. Os
eosinófilos têm grânulos que contêm proteína básica principal, uma proteína altamente
catiónica que é tóxica para parasitas, mas também causa a lise das células epiteliais em
mamíferos. Podem, assim, ser benéficos para controlar infecções parasitárias, mas também
contribuem para o dano em tecidos;
- Os Mastócitos são amplamente distribuídos nos tecidos conjuntivos e em participar em
ambas as reacções inflamatórias, agudas e crónicas. Os mastócitos expressam na sua superfície
o receptor que se liga à porção Fc dos anticorpos IgE (FcεRI). Nas reacções agudas, os
anticorpos IgE vinculados às células pelos receptores Fc, promovem a desgranulação e
libertação de mediadores, como a histamina e produtos de oxidação do AA. Este tipo de
resposta ocorre durante reacções anafiláticas aos alimentos, venenos, ou drogas, muitas vezes
com resultados catastróficos. Quando devidamente regulada, esta resposta pode beneficiar
em muito o hospedeiro. Os mastócitos também estão presentes nas reacções inflamatórias
crónicas, e podem produzir citocinas que contribuem para a fibrose.
Embora os Neutrófilos sejam característicos de inflamação aguda, muitas formas de
inflamação crónica, que perduram durante meses, continuam a apresentar um grande número
de neutrófilos, induzida por microrganismos persistentes ou por mediadores produzidos pelos
macrófagos e linfócitos T. Na infecção crónica bacteriana óssea – osteomielite-, um exsudato
neutrofílico pode persistir por muitos meses. Os neutrófilos são igualmente importantes na
lesão crónica dos pulmões induzida pelo tabagismo e outros estímulos irritantes.
Inflamação Granulomatosa
A Inflamação Granulomatosa é um padrão distinto de reacção inflamatória crónica
caracterizada por acumulações focais de macrófagos activados, que frequentemente
desenvolvem uma aparência epitelial – Células Epitelióides. Este padrão é encontrado num
número limitado de condições mediadas imunologicamente, infecciosas e algumas não
infecciosas. A tuberculose surge como o protótipo das doenças granulomatosas, como a
sarcoidose, linfogranuloma inguinal, lepra, brucelose, sífilis e algumas infecções micóticas. O
reconhecimento do padrão granulomatoso numa biópsia é importante devido ao número
limitado de possíveis doenças que causam, e deste modo ser mais dirigido o significado dos
possíveis diagnósticos associados com as lesões.
Um Granuloma é um foco de inflamação crónica que consiste numa agregação microscópica
de macrófagos que se transformam em células epitelióides cercada por um colar de leucócitos
mononucleares, principalmente linfócitos e, ocasionalmente, células plasmáticas. Na habitual
H&E as secções coradas de tecido, apresentam células epitelióides com um citoplasma rosa
pálido com limites celulares não definidos, muitas vezes aparentando fusão com outras células
do mesmo tipo. O núcleo é menos denso do que o de um linfócito, é oval ou alongada, e pode
apresentar dobramento da membrana nuclear. Granulomas mais antigos podem desenvolver
em torno de si um aro de fibroblastos e tecido conjuntivo. Frequentemente, as células
epitelióides fundem-se para formar células gigantes na periferia ou, por vezes, no centro dos
granulomas. Estas Células Gigantes pode alcançar diâmetros de 40 a 50 μm. São
caracterizadas por uma grande massa de citoplasma contendo 20 ou mais pequenos núcleos
organizados quer perifericamente – Células Gigantes do Tipo Langhans - ou aleatoriamente
Células Gigantes de Corpo Estranho. Não se conhece qualquer diferença funcional entre estes
dois tipos de células gigantes, mas é importante conhecer estas diferenças morfológicas, visto
que estão presentes em condições diferentes.
Existem dois tipos de granulomas, que diferem na sua patogénese. Os Granulomas de Corpo
Estranho são desencadeados por corpos estranhos inertes. Normalmente os granulomas de
corpo estranho formam-se quando materiais como talco, suturas, ou outras fibras são grandes
o suficiente para evitar a fagocitose por um único macrófago e não induzem qualquer resposta
inflamatória ou imunológica específica. As células epitelióides e células gigantes são dispostas
na superfície e englobam o corpo estranho. O material estranho pode ser identificado no
centro do granuloma, principalmente se visto com luz polarizada, no qual ele aparece
refringente.
Os Granulomas Imunitários são causados por partículas insolúveis, tipicamente
microrganismos, que são capazes de induzir uma resposta imunológica mediada por células.
Este tipo de resposta imunitário não produz necessariamente granulomas, mas fá-lo quando o
agente é dificilmente degradável. Nestas respostas, os macrófagos englobam o material
estranho, processam-no e promovem a sua apresentação aos linfócitos T, levando-os a
tornarem-se activados. A resposta das células T produz citocinas (ex. IL-2), que activam outras
células T, perpetuando a resposta, e o IFN-γ, que é importante para activar macrófagos e
promover sua transformação em células epitelióides e células gigantes multinucleadas.
O protótipo do granuloma imunitário é causada pelo bacilo da tuberculose. Nesta doença, o
granuloma é referido como um tubérculo e é classicamente caracterizada pela presença de
necrose caseosa central. Em contrapartida, a necrose caseosa é rara em outras doenças
granulomatosas. Os padrões morfológicos nas diversas doenças granulomatosas podem ser
suficientemente diferentes para permitir razoavelmente o diagnóstico preciso por um
patologista experiente, no entanto, há tantas apresentações atípicas que é sempre necessário
identificar o agente etiológico específico, por coloração, por métodos de cultura, por técnicas
moleculares e por estudos serológicos. Na sarcoidose, o agente etiológico é desconhecido,
fazendo-se o diagnóstico por exclusão.
Efeitos Sistémicos da Inflamação
As alterações sistémicas associadas com a inflamação, especialmente em pacientes que
tenham infecções, são colectivamente designadas por Resposta de Fase Aguda, ou a Síndrome
da Resposta Inflamatória Sistémica (SRIS). Estas mudanças são as reacções às citocinas cuja
produção é estimulada por produtos como o LPS bacteriano e por outros estímulos
inflamatórios. A resposta de fase aguda consiste em várias alterações clínicas e patológicas:
- Febre, caracterizada por uma elevação da temperatura corporal, geralmente de 1 ° a 4 ° C, é
uma das manifestação mais proeminentes da resposta de fase aguda, sobretudo quando a
inflamação está associada à infecção. A febre é produzida em resposta aos chamados
pirogéneos, substâncias que agem por estimulação da síntese de prostaglandina nas células
vasculares e perivasculares do hipotálamo. Os produtos bacterianos, como o LPS, estimulam a
libertação de citocinas leucocitárias como a IL-1 e TNF que aumentam as enzimas que
convertem o AA em prostaglandinas. No hipotálamo, as prostaglandinas, especialmente a
PGE2, estimulam a produção de neurotransmissores como o AMPc, que permitem repor a o
ponto de referência da temperatura a um nível superior. Os AINEs, incluindo a aspirina,
reduzem a febre através da inibição da ciclooxigenase e, portanto, bloqueando a síntese de
prostaglandinas. O motivo da febre é desconhecido, no entanto uma das hipóteses é que a
febre pode induzir proteínas de choque térmico que realçam as respostas dos aos antigénios
microbianos;
- As Proteínas de Fase Aguda são proteínas plasmáticas, principalmente sintetizada no fígado,
cujas concentrações plasmáticas podem aumentar várias centenas de vezes como parte da
resposta ao estímulo inflamatório. Três dos mais conhecidos exemplos dessas proteínas são a
Proteína C Reativa (PCR ), Fibrinogénio e Proteína Amilóide Sérica A (SAA). A síntese destas
moléculas pelos hepatócitos é supra-regulada por citocinas, especialmente a IL-6 e a IL-1 ou
TNF. Muitas das proteínas de fase aguda, como a PCR e SAA, ligam-se às paredes celulares
microbianas, e podem actuar como opsoninas e fixar o complemento. Estas proteínas também
podem ligar-se à cromatina, possivelmente ajudando na limpeza dos núcleos celulares
necróticos. Durante a resposta de fase aguda, uma proteína amilóide sérica substitui
Apolipoproteína A, uma componente das partículas de lipoproteína de alta densidade. Este
fenómeno pode alterar a orientação das lipoproteínas de alta densidade das células de fígado
para macrófagos, que podem utilizar estas partículas como uma fonte de energia. O aumento
do fibrinogénio forma pilhas de eritrócitos que os sedimentam mais rapidamente que os
eritrócitos individuais. Esta é a base para a medição da velocidade de hemossedimentação
(VHS) como um teste simples para a resposta inflamatória sistémica, causada por qualquer
estímulo, incluindo o LPS. As proteínas de fase aguda têm efeitos benéficos durante a
inflamação aguda, mas, como veremos mais adiante, se prolongada podem originar
amiloidoses secundárias no contexto da inflamação crónica. Os elevados níveis séricos de PCR
são agora usados como um marcador de risco aumentado para enfarto do miocárdio em
pacientes com doença arterial coronária. Acredita-se que a inflamação em torno das placas
ateroscleróticas nas artérias coronárias podem predispor à trombose e enfarte subsequente,
sendo que a PCR é produzida durante este processo de inflamação. Nesta base, agentes anti-
inflamatórios estão sendo testados em pacientes para reduzir o risco de enfarte do miocárdio;
- A Leucocitose é uma característica comum das reacções inflamatórias, principalmente as
provocadas por infecção bacteriana. Os leucócitos normalmente sobem a 15.000 ou 20.000
células/μl, mas às vezes ela pode chegar a níveis extremamente elevados de 40.000 a 100.000
células/μl. Estas elevações extremas são referidos como reacções leucemóides porque são
semelhantes às obtidas na contagem de células brancas na leucemia. A leucocitose ocorre
inicialmente como consequência da libertação acelerada de células da medula óssea da
reserva, causada por citocinas, incluindo IL-1 e TNF. Encontra-se então associada a um
aumento do número de neutrófilos imaturos no sangue. A infecção prolongada também induz
a proliferação de precursores na medula óssea, causada pelo aumento da produção de Factor
Estimulante de Colónia (QCA). Assim, a produção de leucócitos na medula óssea é aumentada
para compensar a perda dessas células na reacção inflamatória. A Neutrofilia refere-se a um
aumento de neutrófilos no sangue, sendo que a maioria das infecções bacterianas induzem
neutrofilia. Infecções virais como a mononucleose infecciosa, papeira, rubéola, produzem uma
leucocitose por um aumento absoluto do número de linfócitos – Linfocitose. Num outro grupo
de patologias, que inclui a asma brônquica, febre do feno, e infecções parasitárias, verifica-se
um aumento absoluto do número de eosinófilos, originando uma Eosinofilia. Certas infecções -
Febre Tifóide e Infecções Virais, Riquétsias e alguns Protozoários - estão associados a uma
diminuição do número de glóbulos brancos circulantes - Leucopenia.
Outras manifestações da resposta de fase aguda resposta incluem o aumento da frequência
cardíaca e da pressão arterial, a diminuição da sudorese, principalmente devido ao
redirecionamento do fluxo sanguíneo cutâneo para profundidade dos leitos vasculares, para
minimizar a perda de calor através da pele; calafrios, arrepios, anorexia, sonolência e mal
estar, provavelmente por causa das ações das citocinas sobre as células cerebrais. Em
infecções bacterianas graves – Sepsis -, as grandes quantidades de microrganismos e LPS no
sangue estimulam a produção de quantidades enormes de várias citocinas, nomeadamente
TNF e IL-1. Níveis elevados de TNF causam coagulação intravascular disseminada (DIC). A
Trombose Simultânea resulta de duas reacções: o LPS e o TNF induzem a expressão de Factor
Tecidual (FT) nas células endoteliais, o que inicia a coagulação, os mesmos agentes inibem os
mecanismos de anticoagulação naturais, diminuindo a expressão do Factor Tecidual Inibidor
da Via (TFPI) e Trombodulina Endotelial. As citocinas podem causar lesão hepática e
insuficiência hepática, resultando numa falha do manter dos níveis normais de glicemia devido
a uma falta de neoglicogénese a partir do glicogénio armazenado. A superprodução de NO por
miócitos cardíacos activados por citocinas e células musculares lisas vasculares leva à
insuficiência cardíaca e à perda da pressão de perfusão, respectivamente, resultando num
choque hemodinâmico. A tríade clínica de DIC, hipoglicemia, insuficiência cardiovascular é
descrita como choque séptico.
Os pulmões e fígado são especialmente susceptíveis a danos por neutrófilos. A lesão pulmonar
na resposta inflamatória sistémica, vulgarmente denominada de Síndrome do Dificuldade
Respiratória do Adulto (SARA), é consequência da lesão endotelial mediada pelos neutrófilos
que permite que o fluido escape do sangue para o espaço aéreo. O rim e o fígado estão
frequentemente afectados nesta situação, podendo mesmo conduzir a quadros graves e
consequentemente a morte do indivíduo.
Consequência da Ausência ou Excesso na Inflamação
É útil para resumir o quadro clínico e patológico das consequências da inflamação, quer por
ausência, quer por ecesso.
Diminuição da Resposta Inflamatória, que conduz normalmente a um aumento da
susceptibilidade às infecções e atraso na cicatrização de feridas e lesão tecidual. A
susceptibilidade a infecções reflecte o papel fundamental da resposta inflamatória do
hospedeiro na defesa, e é a razão pela qual esta resposta é um componente central dos
mecanismos de defesa que os imunologistas denominam Imunidade Inata. O atraso na
reparação deve-se ao facto de que a resposta inflamatória é essencial para limpar os tecidos
danificados e os detritos, o que proporciona o impulso necessário para começar o processo de
reparo.
Por outro lado, um Excesso da Resposta Inflamatória é a base de muitas categorias de
doenças humanas. Está bem estabelecido que as alergias, em que os indivíduos não regulam as
respostas imunitários contra antigénios ambientais comuns, e as doenças auto-imunitários, em
que respostas imunitários são normalmente contra os auto-antigénios; sendo doenças em que
a causa fundamental da lesão tecidual é a inflamação. Porém, estudos recentes estão a
apontar para um importante papel da inflamação numa ampla variedade de doenças humanas
que não são principalmente desequilíbrios do sistema imunitário. Estas incluem o cancro, a
aterosclerose e as doenças isquémicas do coração, bem como algumas doenças
neurodegenerativas (ex. Doença de Alzheimer). Além disso, a fibrose e inflamação prolongada
que a acompanha são responsáveis por grande parte da patologia crónica em muitas doenças
infecciosas, metabólicas e outras doenças.
Renovação e Reparação Tecidual: Regeneração, Cicatrização e Fibrose
A capacidade do corpo de substituir células mortas ou danificadas, bem como para reparar
tecidos após a inflamação é fundamental para a nossa sobrevivência. Quando os agentes
prejudiciais lesam células e tecidos, o hospedeiro responde por definição como uma série de
eventos que servem para eliminar estes agentes, conter os danos, bem como preparar as
células sobreviventes para a replicação. A reparação do dano tecidual causado pela ressecção
cirúrgica, feridas, e diversos tipos de lesões crónicas pode ser amplamente dividida em dois
processos: Regeneração e Cicatrização. A regeneração resulta na restituição das perdas de
tecido; a cicatrização tenta restaurar as estruturas originais mas envolve a deposição de
colagénio e a formação de cicatriz.
Definições
A Regeneração refere-se ao crescimento das células e tecidos para substituir as estruturas
perdidas, tais como o crescimento de um membro amputado em anfíbios. Nos mamíferos, os
órgãos e todos os tecidos complexos raramente regeneram após a cura, este termo é
geralmente aplicado a processos tais como o crescimento hepático e renal após,
respectivamente, a hepatectomia parcial e nefrectomia unilateral. Estes processos consistem
num crescimento compensatório, em vez de verdadeira regeneração.
A Reparação é geralmente num tecido resposta a:
- Uma ferida;
- Processos Inflamatórios nos Órgãos Internos;
- Células Necróticas em Órgãos incapazes de regenerar.
Nesta definição ampla de reparação, deve-se incluir também outros padrões, tais como a
aterosclerose, considerada como uma tentativa de curar a lesão da parede arterial. A
reparação consiste em proporções variáveis de dois processos distintos: regeneração, e na
deposição de tecido fibroso, ou formação de cicatriz. As feridas superficiais, tais como uma
ferida cutânea que apenas danificou o epitélio, pode curar por regeneração epitelial. Feridas
cutâneas incisionais e excisionais levam a danos que atingem a derme, como tal a sua
reparação é feita através da formação de uma cicatriz de colagénio. A cicatrização ocorre
também no miocárdio após um enfarte, como tal o tecido original não é reconstituído e é
substituída por colagénio. Algumas situações inflamatórias da pleura, peritoneu e pericárdio
podem muitas vezes ser resolvidas através da formação de cicatriz, com a criação de
aderências entre as camadas visceral e parietal destes tecidos. Lesões persistentes e
inflamação crónica podem igualmente levar à cicatrização em órgãos internos, como ocorre no
estômago úlceras causadas por infecção crónica com Helicobacter pylori. Uma extensa fibrose
também está presente na cirrose do fígado e em algumas formas doença pulmonar induzida
pelo carvão ou pela sílica.
A regeneração dos tecidos intactos exige um molde; em contrapartida, a reparação com
formação de cicatriz ocorre quando a matriz extracelular é danificada, causando alterações na
arquitectura do tecido. A estrutura da matriz extracelular é essencial para a cicatrização de
feridas, porque fornece o quadro para a migração celular e permite manter a polaridade
correcta das célula para a re-montagem de estruturas com multicamadas. Além disso, as
células do MEC (ex. Fibroblastos, Macrófagos, etc) são a fonte de agentes que são críticos para
a reparação tecidual.
Os processos de reparação são críticos para a manutenção normal da estrutura, função e
sobrevivência do organismo. A cicatrização de feridas cutâneas e várias outras situações
mencionadas acima são apenas os exemplos mais comuns de processos de reparação. No
entanto, em tecidos saudáveis, a reparação, sob a forma de regeneração e cicatrização, ocorre
depois de praticamente qualquer estímulo que provoque a destruição tecidual.
Controlo Normal da Proliferação e Crescimento Tecidual
Nos tecidos adultos, o tamanho das populações de células é determinado pela taxa de
proliferação celular, diferenciação e morte por apoptose. A apoptose é um processo fisiológico
necessários para homeostase tecidual, mas também pode ser induzida por uma variedade de
estímulos patológicos. O impacto da diferenciação depende das circunstâncias em que ocorre.
Os miócitos e os neurónios são considerados células terminalmente diferenciadas, isto é, estão
numa fase final de diferenciação e não são capazes de se replicar. Em alguns tecidos adultos,
tais como fígado e rim, células diferenciadas são normalmente quiescentes mas são capazes de
multiplicar-se quando necessário. Em tecidos proliferativos como a medula óssea e epitélios os
da pele e intestino, as células são terminalmente diferenciadas, de curta duração, e incapazes
de replicação, mas elas podem ser substituídas por novas células resultantes de células
estaminais. Assim, nesses tecidos, há um equilíbrio homeostático entre a proliferação de
células estaminais, a sua diferenciação e morte de células diferenciadas e já maturadas.
A Proliferação Celular pode ser estimulada por condições fisiológicas e patológicas. A
proliferação das células endometriais sob estimulação dos estrogénios durante o ciclo
menstrual e a replicação de células da glândula tiróide por estimulação da TSH que aumenta
durante a gravidez são exemplos de proliferação fisiológica. Muitas condições patológicas, tais
como feridas, morte celular, alterações mecânicas também estimulam a proliferação celular.
Estímulos fisiológicos podem tornar-se excessivo, criando condições patológicas, como é
exemplo da hiperplasia nodular prostática resultante da estimulação excessiva. A proliferação
celular é largamente controlada por sinais - solúvel ou contacto-dependente - a partir do
microambiente que pode estimular ou inibir a proliferação celular. Um excesso de
estimuladores ou uma deficiência de inibidores leva ao crescimento e, no caso do cancro, este
torna-se descontrolado. Embora o crescimento acelerado possa ser conseguido através de
uma redução do tempo do ciclo celular, o mecanismo mais importante de crescimento é a
conversão das células em repouso ou quiescentes a células proliferativas, fazendo as células
entrar no ciclo celular.
Actividade Proliferativa dos Tecidos
O ciclo celular consiste nas fases G1 (Pré-Síntese), S (Síntese do DNA), G2 (Pré-Mitose), e M
(Mitose). As células quiescentes estão num estado fisiológico denominado G0. Os tecidos
podem ser composto principalmente por células quiescentes em G0, mas os tecidos mais
complexos contêm uma combinação de células que se estão dividindo continuamente, outras
terminalmente diferenciadas, as células estaminais, e por fim células quiescentes, que
ocasionalmente entram no ciclo celular.
Os tecidos do corpo são divididos em três grupos, com base na sua actividade proliferativa:
- Tecidos Continuamente em Divisão ou Tecidos Lábeis, as suas células proliferam por toda a
vida, substituindo aquelas que são destruídos. Estes tecidos incluem a superfície dos epitélios,
o revestimento da mucosa de todos os ductos excretores das glândulas do organismo, o
epitélio colunar do tracto gastrointestinal e útero, o epitélio de transição do tracto urinário, e
as células da medula óssea e tecidos hematopoiéticos. Na maioria desses tecidos as células
maduras são derivados de células estaminais, que têm uma capacidade ilimitada de proliferar
e cujos descendentes podem sofrer diversas correntes de diferenciação;
- Tecidos Quiescentes ou Estáveis, estes tecidos têm normalmente um baixo nível de
replicação, no entanto, as células deste tecidos podem sofrer uma rápida divisão em resposta
a estímulos e são, portanto, capazes de reconstituir o tecido de origem. Pensa-se que se
encontrem na fase G0 do ciclo celular, mas que podem ser estimulada a entrar G1. Nesta
categoria estão as células do parênquima hepático, renal e pancreático, as células
mesenquimais (ex. Fibroblastos e Músculo Liso), células endoteliais vasculares, bem como
linfócitos e outros leucócitos. A capacidade de regeneração de células estáveis tem como
exemplo paradigmático a capacidade de regeneração do fígado após hepatectomia parcial e
após lesão aguda química;
- Tecidos Não-Diviseis ou Permanentes, estes tecidos contêm células que abandonaram o
ciclo celular e como tal não podem sofrer divisões mitótica na período pós-divisão. A este
grupo pertencem neurónios e as células musculares esqueléticas e cardíacas. Se os neurónios
no sistema nervoso central são destruídos, o tecido é geralmente substituída pela proliferação
dos elementos de suporte do sistema nervoso central - Células da Glia. No entanto, estudos
recentes mostram que a neurogénese de células estaminais adultas podem ocorrer no
cérebro. Embora as células maduras do músculo esquelético, não possam replicar-se, o
músculo esquelético tem alguma capacidade regenerativa, através da diferenciação das células
satélites que estão ligados às bainhas do endomísio.
Células Estaminais
O entusiasmo com a investigação sobre células estaminais resulta da esperança de que um dia
possam ser usadas para reparar danos nos tecidos humanos, incluindo o coração, cérebro e
músculo esquelético.
As células estaminais são caracterizadas pela sua capacidade de auto-renovação, bem como
pela replicação assimétrica. A Replicação Assimétrica descreve uma propriedade especial das
células estaminais, ou seja, em cada divisão celular, uma das células mantém a sua capacidade
de auto-renovação, enquanto a outra entra num processo de diferenciação e é convertida a
uma célula madura, formação um população não-divisível. Assim, dentro de um grupo de
células estaminais, algumas auto replicam-se e outras diferenciam-se. As células estaminais
foram primeiramente identificadas como células pluripotentes de embriões, e estas foram
chamados de células estaminais embrionárias. É agora claro que as células estaminais estão
presentes em muitos tecidos de animais adultos e contribuiem para a manutenção da
homeostase tecidual. É importante salientar que estas células de modo a minimizarem os
erros genéticos mantêm no seu genoma sempre uma dupla cadeira de DNA que contenham
uma cadeia original, ou seja, a célula que permanece com estaminal contém sempre pelo
menos um cadeia original de DNA.
Embora o desenvolvimento de marcadores específicos para reconhecer as células estaminais
seja um desafio permanente, uma série de novas observações têm revolucionado a
investigação em células estaminais. Entre estas contam-se:
- A identificação de células estaminais e os seus nichos em diversos tecidos, incluindo o
cérebro, o qual tem sido considerado um órgão sem capacidade de divisão;
- O reconhecimento de que as células estaminais a partir de vários tecidos, especialmente a
partir da medula óssea, têm uma ampla plasticidade de desenvolvimento;
- A constatação de que algumas células presentes em tecidos de seres humanos e morganhos
podem ser semelhantes às células estaminais embrionárias.
Células Estaminais Embrionárias (ES)
Os embriões contêm células estaminais embrionárias (ES) ou seja, células pluripotentes, que
podem dar origem a todos os tecidos do corpo humano. As células ES podem ser mantidas em
cultura de células indiferenciadas como linhas ou ser induzidas a diferenciarem em diversas
linhagens. A pluripotência das células ES pode estar relacionada com a expressão de factores
de transcrição únicos nestas células, como a proteína recentemente denominada homeobox.
Estudos recentes também implicam a via de sinalização Wnt-β-catenin na manutenção da
pluripotência.
As técnicas para a manipulação genética de células ES têm-se expandido enormemente no
âmbito de produzir anomalias genéticas que são específicas para um único tecido e
"deficiências genéticas condicionais", isto é, deficiências de um gene quem pode ser ligada e
desligada em animais adultos. Morganhos knockout tornaram-se amplamente utilizados como
modelos experimentais para o estudo de doenças humanas e fornecem informações essenciais
sobre a função genética in vivo.
As células ES poderão, no futuro, ser utilizados para repovoar órgão danificados. Alguns destes
feitos já foram conseguidos, nomeadamente a repovoção de pâncreas com células produtoras
de insulina, embora a eficácia desses procedimentos nas doenças humanas ainda não seja
conhecida, existe ainda um intenso debate sobre as questões éticas associadas a este tipo de
terapia, que é conhecida como clonagem terapêutica.
Células Estaminais Adultas
Demonstrou-se que em muitos tecidos de
animais adultos contêm reservatórios de células
estaminais, denominando-se células estaminais
adultas. Comparadas com as células ES, que são
pluripotentes, as células estaminais adultas têm
uma capacidade de diferenciação mais restrita e
geralmente são específicas para uma linhagem.
No entanto, a investigação sobre células
estaminais revelou que as células estaminais da medula óssea possuem com amplo potencial
diferenciação e, que talvez, possam existir noutros tecidos. As células estaminais fora da
medula óssea são referidas genericamente como Células Estaminais Teciduais.
As células estaminais estão localizados em locais denominados nichos, sendo diferentes entre
os vários tecidos. Por exemplo, no trato gastrointestinal, estão localizadas no istmo do das
glândulas e na base das criptas do cólon e estômago.
Em virtude da fácil acessibilidade à medula óssea e da necessidade de substituir células
hematopoéticas em muitas situações clínicas, tem havido grande interesse em estudar as
células estaminais da medula óssea. É hoje reconhecido que a medula óssea contém células
estaminais hematopoiéticas (HSCs), bem como células do estroma capazes de se diferenciarem
em diversas linhagens. As HSCs podem gerar todas as células do sangue e podem ainda
reconstituir a medula óssea após a destruição causada por doença ou irradiação. As células
estromais da medula óssea, dependendo do tecido
ambiente, podem gerar condrócitos, osteoblastos,
adipócitos, mioblastos, e precursores de células
endoteliais. Uma observação importante sobre as HSCs
é que elas podem ser capazes de dar origem a
neurónios, hepatócitos, e outros tipos celulares.
Uma alteração na diferenciação de células estaminais a
partir de um tipo de célula para outra é chamado
Transdiferenciação, bem como a multiplicidade de
opções diferenciação de células estaminais é conhecido
como Plasticidade Desenvolvimental.
Além disso, embora as HSC possam ser capazes de substituir células de tecidos danificados,
elas não parecem desempenhar um papel na manutenção destes tecidos sob condições
fisiológicas - Estado Estacionário. É também possível que a principal contribuição das células
derivadas de medula óssea para a reparação de não-tecidos hematopoiéticos não seja a
formação de células para estes tecidos. Em vez disso, as células estaminais podem produzir
factores de crescimento e as citocinas que actuam sobre as células do tecido, promovendo a
reparação da lesão de reparação e a replicação celular.
A medula óssea adulta também abriga uma população heterogénea de células estaminais, que
parece ter amplas capacidade de desenvolvimento. Estas células, denominadas Células
Progenitoras Adultas Multipotentes, ou MAPCs, foram isoladas da medula óssea de humanos
após o nascimento e roedores. Elas proliferam em cultura sem senescência, e podem
diferenciar-se em nos tipos celulares da mesoderme, endoderme e neuroectodeme.
Curiosamente, as MAPCs não estão confinados a medula óssea, têm sido isoladas no músculos,
cérebro e pele, e, à semelhança das MAPCs da medula óssea, podem ser induzidas a
diferenciarem-se em endotélio, neurónios, hepatócitos e outros tipos celulares. As MAPCs
isoladas a partir da medula óssea, músculo e cérebro têm expressão génica muito
semelhantes, sugerindo que podem ter uma origem comum. Foi proposto que MAPCs
constituem uma população de célula s estaminais derivadas, ou intimamente relacionadas, das
Células Estaminais Embrionárias. Se este ponto de vista é correto, o que tem sido referido
como transdiferenciação e plasticidade das células estaminais em tecidos adultos pode
realmente representar o processo de diferenciação das Células Estaminais Embrionárias
Multipotentes. Não se sabe se um único tipo de células estaminais adultas da medula óssea é
capaz de gerar todos as linhagens, ou se, alternactivamente, existem vários tipos de células
estaminais na medula óssea, cada grupo confinado a uma linhagem celular.
Papel das Células Estaminais na Homeostasia
Além de células da medula óssea que podem migrar para diversos tecidos após a lesão, as
células estaminais adultas residem permanentemente na maioria dos órgãos. Estas células
podem gerar as células dos órgãos em que residem. No entanto, a sua diferenciação é
comprometida quando são transplantadas para um tecido diferente.
- Fígado, depois de muitos anos de debate, é hoje reconhecido que o fígado contém células
estaminais nos canais de Hering. As células localizadas neste nicho podem dar origem a uma
população de células precursoras conhecidas como células ovais, sendo estas progenitores
bipotentes, capazes de se diferenciarem-se em hepatócitos e células biliares. Em contraste
com as células estaminais nos tecidos em proliferação, as células estaminais hepáticas
funcionam como um compartimento secundário de reserva activado somente quando a
proliferação dos hepatócitos é bloqueada. Nos processos de crescimento hepático, como é o
caso da regeneração hepática após hepatectomia, e no crescimento após a maioria dos tipos
de lesão aguda necrozante, os hepatócitos replicam-se facilmente por si só, sem que células
estaminais sejam activada. Por outro lado, a proliferação das células ovais e a sua
diferenciação são predominantes no fígado de pacientes que recuperam de uma insuficiência
hepática fulminante, na carcinogénese hepática, e em alguns casos de hepatite crónica e
cirrose hepática avançada; nestas situações em que a proliferação dos hepatócitos pode ser
lento ou bloqueada, predomina a diferenciação das células ovais;
- Cérebro, este é o protótipo de um tecidos não-proliferativo em mamíferos. No entanto,
actualmente este dogma é dado como incorrecto, o que se comprova pelo facto de a
neurogénese ocorrer em algumas áreas do cérebro adulto. As células estaminais neuronais
foram identificadas em duas áreas do cérebro adulto do roedor: o bulbo olfactivo e a
cirvunvolução dentada do hipocampo. O Filamento Intermédio Nestina pode ser usado como
um marcador para identificar estas células por métodos histoquímicos. Em algumas espécies
de aves, em particular nos Canários, em que neurogénese no cérebro adulto foi descrita pela
primeira vez, a neurogénese no centro vocal é necessária para a capacidade do pássaro de
cantar. Existe agora a prova de que recentemente neurónios do hipocampo marcados em
mamíferos são funcionalmente integrados nos circuitos. No entanto, continua a ser um enigma
até que ponto a neurogénese no cérebro adulto aumenta o “poder cerebral” ou melhora a as
nossas capacidades;
- Músculo Esquelético e Cardíaco, em contraste com hepatócitos, os miócitos do músculo
esquelético não se dividem, mesmo após a lesão. O crescimento e regeneração do músculo
esquelético lesado ocorre por replicação células satélites. Estas células, localizam-se abaixo da
lâmina basal do miócito, constituem uma reserva de recrutamento de células que podem gerar
miócitos diferenciados após a lesão. Estas células colocadas em ambientes diferentes, podem
ser osteogénicas e adipogénicas. As células estaminais não foram encontrados no músculo
cardíaco, embora tenha sido proposto que o coração possa conter células do tipo progenitor.
- Renovação do Tecido Epitelial, a auto-renovação dos epitélios contem células estaminais,
sendo células altamente proliferativas que constituem um compartimento de amplificação, e
células em diferentes estádios de diferenciação. As células terminalmente diferenciadas não se
dividem e são continuamente perdida na superfície externa do epitélio. Após a lesão, a auto-
renovação dos epitélios completa as seguintes três estratégias:
- Aumento do número de células estaminais através da divisão activa;
- Aumento do número de replicações da células do compartimento de amplificação;
- Diminuir o tempo do celular ciclo para a replicação.
A chave para estes processos é a regulação da proliferação celular, que é mantido sob rigoroso
controle fisiológico. A proliferação celular geralmente é iniciada pela acção de factores de
crescimento.
Factores de Crescimento
Existe um grande número de factores de crescimento polipeptídicos, alguns dos quais actuam
em vários tipos celulares, e outros têm alvos celulares restritos. Além de estimularem a
proliferação celular, os factores de crescimento também podem ter efeitos sobre a locomoção,
contractilidade, diferenciação e angiogénese celular, actividades que podem ser tão
importantes como o seu crescimento.
Os principais factores de crescimento são:
- Factor de Crescimento Epidérmico (EGF) e o Transforming Growth Factor-α (TGF-α), estes
dois elementos pertencem à família EGF e compartilham um receptor comum. O EGF foi
descoberto devido à sua capacidade de causar erupção dentária precoce e abertura da
pálpebra em morganhos recém-nascidos. O EGF é mitogénico para uma grande variedade de
células epiteliais, hepatócitos e fibroblastos. Este factor encontra-se amplamente distribuído
nos tecidos, fluidos e secreções, tais como suor, saliva, urina e conteúdo intestinal. Na
cicatrização de feridas na pele, o EGF é produzido pelos queratinócitos, macrófagos e outras
células inflamatórias que migram para a área. O TGF-α foi inicialmente extraído de células de
sarcomas transformados por vírus e está envolvido na proliferação celular epitelial em
embriões e adultos, bem como na transformação maligna das células normais. O TGF-α tem
homologia com FEG, liga-se ao EGFR, e produz a maior parte das actividades biológicas da EGF;
- Factor de Crescimento do Hepatócito (HGF). O HGF foi originalmente isolado de plaquetas e
soro. Estudos posteriores demonstraram que é idêntico a um factor de crescimento
identificado anteriormente conhecido como Scatter Factor.. Tem efeitos mitogénicos na
maioria das células epiteliais, incluindo hepatócitos e células do epitélio biliar no fígado, bem
como células epiteliais do pulmão, mama, pele, e outros tecidos. Além dos seus efeitos
mitogénicos, o HGF age como um morfogene em células embrionárias durante
desenvolvimento e promove a dispersão e migração celular. Este factor é produzido por
fibroblastos, células endoteliais e células hepáticas não pertencentes ao parênquima. O
receptor de HGF é o produto do proto-oncogene c-MET, que se encontra frequentemente
sobreexpressado em tumores humanos. A sinalização via HGF é necessária para a
sobrevivência durante o desenvolvimento embrionário, o que ficou demonstrado com a
letalidade de ratos knockout para o gene c-MET;
- Factor de Crescimento Endotelial Vascular (VEGF), pertence a uma família de péptidos que
incluem o VEGF-A, VEGF-B, VEGF-C, VEGF-D, e o Factor de Crescimento Placentário. O VEGF é
um potente indutor da formação dos vasos sanguíneos no início do desenvolvimento –
Vasculogénese - e tem um papel central no crescimento de novos vasos sanguíneos –
Angiogénese - em adultos. Promove a angiogénese em tumores, inflamação crónica, e
cicatrização de feridas. VEGF-B liga-se exclusivamente à VEGFR-1, não se encontra associado à
vasculogénese ou à angiogénese, mas pensa-se que possa desempenhar um papel na
manutenção da função miocárdica;
- Factor de Crescimento Derivado das Plaquetas (PDGF), pertence a uma família de proteínas
estreitamente relacionadas entre si, mas cada uma delas constituída por duas cadeias
designadas A e B. Todas as três isoformas de PDGF (AA, AB e BB) são secretadas e são
biologicamente activas. As isoformas de PDGF exercem os seus efeitos através da ligação a
dois receptores da superfície celular, designada PDGFR α e β, que têm diferentes
especificidades. O PDGF é armazenado em grânulos-α plaquetários e é libertado durante a
activação plaquetária. Também podem ser produzidos por um conjunto de outras células,
incluindo macrófagos activados, células endoteliais, células musculares lisas, e muitas células
tumorais. O PDGF provoca a migração e proliferação de fibroblastos, células musculares lisas,
monócitos e, como demonstrado por defeitos nessas funções em morganhos deficientes em
um ou ambos as cadeia B do PDGF, também participa na activação de células hepáticas
estreladas nos primeiros passos da fibrose hepática;
- Factor de Crescimento dos Fibroblastos (FGF), esta família de factores de crescimento
contem mais de 10 membros, dos quais uns possuem propriedade ácidas e outros básicas.
Quando libertados, os FGFs associam-se ao sulfato de heparano na MEC, que pode servir como
um reservatório para armazenar estes factores de forma inactiva. Existe um grande número de
funções que são atribuídas ao FGFs, incluindo as seguintes:
- Formação de Novos Vasos Sanguíneos (Angiogénese): o FGF-2, em particular, tem a
capacidade de induzir os passos necessários para a formação novos vasos sanguíneos tanto in
vivo e in vitro;
- Reparação: os FGFs participam na migração dos macrófagos, fibroblastos, e células
endoteliais em tecidos danificados, bem como na migração do epitélio para formar novas
camadas de epiderme;
- Desenvolvimento: os FGFs desempenham um papel no desenvolvimento do músculo
esquelético e na maturação pulmonar;
- Hematopoiese: os FGFs têm sido implicados na diferenciação de linhagens específicas de
células sanguíneas e no desenvolvimento do estroma da medula óssea.
- TGF-β e Factores de Crescimento Relacionados, o TGF-β pertence a uma família de
polipeptídeos homólogos que inclui três isoformas TGF-β (TGF-β1, TGF-β2, TGF-β3) e factores
com ampla funções, tais como Proteínas Morfogenéticas Ósseas (BMPs), activinas, inibinas , e
Substância Inibitória Mullariana . O TGF-β é uma proteína homodimérica produzida por uma
grande variedade de diferentes tipos celulares, incluindo plaquetas, células endoteliais,
linfócitos e macrófagos. Este factores são sintetizadas como precursores de proteínas, que são
secretadas e então proteoliticamente clivados para produzirem o factor de crescimento
biologicamente activo e um segundo componente latente. O TGF-β tem efeitos múltiplos e
muitas vezes opostos, dependendo do tecido e do tipo de lesão. Agentes que têm vários
efeitos são designados pleiotrópicos, podemos então salientar os seguintes efeitos:
- O TGF-β é um inibidor do crescimento para a maioria dos tipos de células epiteliais e para os
leucócitos. Este factor bloqueia o ciclo celular através do aumento da expressão de inibidores
do ciclo celular. A perda dos Receptores do TGF-β ocorre frequentemente em tumores
humanos, proporcionando uma vantagem proliferativa às células tumorais;
- Os efeitos do TGF-β em células mesenquimais dependem da concentração e das condições de
cultura, que, na maior parte dos casos estimula a proliferação de fibroblastos e de células
musculares lisas;
- TGF-β é um potente agente que estimula a quimiotaxia de fibroblastos, aumentando a
produção de colagénio, fibronectina e proteoglicanos. Inibe ainda a degradação do colagénio
diminuindo as proteases da matriz e aumentando o inibidor a actividade do inibidor das
proteases. O TGF-β está envolvido no desenvolvimento de fibrose, numa variedade de
condições inflamatórias crónicas, em especial os pulmões, rins e fígado;
- OTGF-β tem um forte efeito anti-inflamatório. O que se pensa estar associado a uma
abundante proliferação linfocitária, presumivelmente devido à desregulação da proliferação
de células T e activação macrofágica, na ausência deste factor.
- Citocinas, têm funções importantes como mediadores da inflamação e resposta imunitário.
Algumas destas proteínas podem ser colocadas no grupo dos factores de crescimento, porque
possuem acções que promovem o crescimento.
Mecanismos de Sinalização no Crescimento Celular
Todos os factores de crescimento actuam através da ligação a receptores específicos, que
produzem sinais para as células-alvo. Estes sinais têm dois efeitos gerais:
- Estimulam a transcrição de muitos genes que
estavam silenciados nas células em repouso;
- Vários destes genes regulam a entrada das células
no ciclo celular e da sua passagem pelas diferentes
fases do ciclo celular.
A proliferação celular é um processo regulado
firmemente que envolve um grande número de
moléculas e caminhos interligados. O primeiro
evento que desencadeia a proliferação celular é,
geralmente, a ligação de uma molécula
sinalizadora, o ligante, ao receptor de uma célula
específica.
Com base na fonte do ligante e na localização de
seus receptores na própria célula, adjacente, ou
distantes, distinguimos três modos de sinalização:
- Autócrina, as células respondem às moléculas
sinalizadoras que elas próprias secretam, criando
assim um ciclo autócrino. Diversos factores de
crescimento e as citocinas polipeptídicas agem
desta forma. A regulação autócrina do crescimento
desempenha um papel importante na regeneração hepática, na proliferação de linfócitos
antigénio-estimulados, bem como o crescimento de alguns tumores. Os tumores
frequentemente produzem um excesso de factores de crescimento e dos seus receptores,
estimulando dessa forma a sua própria proliferação autócrina através de um circuito fechado;
- Parácrina, um tipo de célula produz o ligante, este por sua vez actua nas células adjacente
que expressam o receptor adequado. As células que respondem estão estreitamente próximas
das células produtoras do ligante e são geralmente de um tipo diferente. A estimulação
parácrina é comum na reparação do tecido de cicatrização de feridas, em que um factor
produzido por um tipo de células (ex. Macrófagos) tem o seu efeito sobre o crescimento
células adjacentes (ex. Fibroblasto). A sinalização parácrina é igualmente necessária para a
replicação dos hepatócitos durante a regeneração hepática. Um tipo especial de sinalização
parácrina - justácrina - ocorre quando a molécula sinalizadores está ancorada na membrana
celular e liga-se a um receptor na membrana plasmática de outra célula. Neste tipo de
sinalização, a interacção receptor-ligando é dependente e promove a adesão célula-célula;
- Endócrina, as hormonas são sintetizados por células de órgãos endócrinos e agem sobre
células-alvo distantes do seu local de síntese, sendo geralmente transportados pelo sangue. Os
factores de crescimento também podem circular e agir em locais distantes, como é o caso do
HGF. Várias citocinas, tais como aquelas associadas com a inflamação sistémica, também
actuar como agentes endócrinos.
Revisão sobre os Receptores dos Factores de Crescimento e as Vias de Sinalização
A ligação de um ligante ao seu receptor desencadeia uma série de acontecimentos, através
dos quais os sinais extracelulares são transduzidos na célula e modulam as alterações na
expressão génica. Uma forma comum de ligante-receptor interacção envolve a dimerização ou
trimerização das moléculas do receptor; uma molécula única do receptor também pode
converter sinais, mas normalmente fá-lo após recrutamento e anexando proteínas
adaptadoras citoplasmáticas. Os receptores localizam-se geralmente na superfície da célula
alvo, mas também pode ser encontrado no citoplasma ou núcleo. Um receptor proteico tem
um carácter vinculativo específico para ligantes particulares, sendo que os resultados da
formação do complexo receptor-ligante podem desencadear respostas celulares específicas ou
múltiplas.
Em seguida iremos resumir as principais características dos principais tipos de receptores:
- Receptores com Actividade Tirosina Quinase Intrínseca, os ligantes para receptores com
actividade tirosina quinase incluem os factores de crescimento, como EGF, TGF-α, HGF, PDGF,
VEGF, FGF, ligando c-KIT, e insulina. Os receptores pertencentes a esta família tem um domínio
extracelular, uma região transmembranar e uma cauda citoplasmática que possui actividade
tirosina quinase intrínseca. A ligação do ligante induz a dimerização do receptor, fosforilação
da tirosina e activação do receptor tirosina quinase. A cinase já activa tem capacidade para
fosforilizar e, assim, activar, muitas das moléculas efectoras. Os resíduos fosforilados no
receptor também servem como local de ligação para as moléculas adaptadoras que se ligam às
moléculas efectoras. As moléculas efectoras incluem a fosfolipase Cγ (PLCγ) e PI-3 quinase. A
PLCγ catalisa a degradação fosfolípidos inositol da membrana em dois produtos-inositol
trifosfato (IP3), este permite aumentar a concentração de mais uma importante molécula
efectora, o cálcio, e o diacilglicerol. Estes irão activar a proteína quinase serina-treonina
quinase C (PKC), que, por sua vez, activa vários factores de transcrição. A PI-3 quinase
fosforiliza fosfolipídos da membrana, gerando produtos que activam a quinase Akt. A Akt está
envolvida na proliferação celular e na inibição da apoptose, sendo um intermediário-chave na
transdução do sinal da insulina pela via mediada pela PI-3K55. Como mencionado acima, os
resíduos fosforilados no receptor também funcionam como locais de ligação para as proteínas
adaptadoras que são capazes de se ligar outras proteínas efectoras. Uma dessas proteínas é o
adaptador GRB-2, que se liga a uma GTP-SOS. A SOS actua sobre a proteína RAS e catalisa a
formação de RAS-GTP, o que desencadeia a a actividade mitogénica da cascara da MAP
Quinase. Esta cascata vai estimular a síntese e fosforilação de factores de transcrição, tais
como o FOS e JUN. Este factores por sua vez irão estimular a produção de factores de
crescimento, receptores destes factores de crescimento, e as proteínas que controlam
directamente a entrada das células no ciclo celular;
- Receptores sem Actividade Tirosina Quinase Intrínseca que Recrutam Quinases, os ligantes
para estes receptores incluem várias citocinas, como a interleucina-2 (IL-2), IL-3, e outras
interleucinas, interferons α, β e γ; eritropoetina, factor estimulante de colónias de
granulócitos; secreção da hormona do crescimento e prolactina. Esses receptores transmitem
sinais extracelulares ao núcleo pela activação de proteínas membros da família JAK (Janus
cinase).O JAK liga-se a receptores citoplasmáticos e activa factores de transcrição
denominados STATS, os quais se dirigem para o núcleo e vão activar a transcrição de
determinado genes. Os Receptores de Citocinas também pode produzir o seu efeito através de
outras vias, tais como a via MAP Quinase;
- Receptores Acopolados à Proteína G com Sete Domínios Transmembranares, estes
receptores foram assim denominados porque contêm sete domínios transmembranares de α-
hélice. Estes receptores constituem a maior família de receptores da membrana plasmática e
transmitem os sinais para a célula através Proteínas Triméricas Acopuladas ao GTP. Um grande
número de ligantes transmitem o sinal através deste tipo de receptor, incluem a vasopressina,
serotonina, histamina, adrenalina e noradrenalina, calcitonina, glucagonina, hormona
paratireóideia, corticotrofina, rodopsina, e um número enorme de fármacos. A ligação do
ligante induz alterações na conformação do receptor, causando a sua activação e permitindo
sua interacção com as diversas Proteínas-G. A activação da proteínas-G ocorre pela troca do
GDP, presente na proteína inactiva, pelo GTP, na proteína activa. Como segundos mensageiros
desta via de transdução de sinal temos o cálcio e o cAMP. Os sinais de cálcio, que são
geralmente oscilatórios, têm uma multiplicidade de objectivos, incluindo alterações no
citoesqueleto, bombas de cloreto-potássio, tais como enzimas calpaína, proteínas e cálcio-
vinculativas, como calmodulin. O cAMP activa um conjunto de metas mais restritas que
incluem a proteína quinase A e os canais iónicos dependentes do cAMP, tendo uma
importante função na visão e olfacto;
- Receptores das Hormonas Esteroides, os ligantes para estes receptores difundem-se através
da membrana celular e ligam-se a receptores localizados no núcleo, ou com menor frequência
no citoplasma. Os receptores desta família são factores de transcrição que se ligam um ligante
e activam a transcrição. O Receptor dos Estrogénios são importante no cancro da mama,
estando localizada no citoplasma. Além das hormonas esteróides, outros ligantes que ligam a
estes receptores incluem a hormona tireóideia, a vitamina D e os retinóides. Um grupo de
receptores pertencentes a esta família são denominados Receptores da Actividade
Proliferativa do Peroxissoma (PPARs), estes estão envolvidos numa ampla gama de respostas
que incluem diferenciação celular e adipogénese.
Factores de Transcrição
Muitos dos sistemas de transdução do sinal utilizados pelos factores de crescimento permitem
a transferência de informação para o núcleo e desta forma modular a transcrição génica
através da actividade dos factores de transcrição. Entre os factores de transcrição que regulam
a proliferação celular encontramos produtos de vários genes que promovem o crescimento,
como o c-MYC e c-JUN, e de genes inibidores do ciclo celular, como o p53. Os Factpres de
Transcrição têm um design modular e contêm domínios de ligação ao DNA e de regulação
transcricional. O domínio de ligação ao DNA permite a ligação a pequenas sequências de DNA,
que pode ser único para um determinado alvo ou o alvo pode estar presente em muitos genes.
Em geral, os eventos celulares que exigem respostas rápidas, não dependem da nova síntese
de factores de transcrição, mas dependem de modificações pós-transducionais que causam a
transcrição de factores activação e a migração para o núcleo. Estas alterações incluem
heterodimerização, fosforilação dos factores disponíveis, e libertação dos inibidores para
permitir a migração para o núcleo.
Ciclo Celular e a Regulação da Replicação Celular
Houve uma explosão de conhecimentos
sobre os eventos moleculares envolvidos
na proliferação celular. Em parte, esta
tem sido impulsionada pela descoberta de genes celulares, chamados proto-oncogenes, que
estão directamente envolvidos na regulação da proliferação celular normal e defeitos nestes
genes pode convertê-los em oncogenes, que contribuem para o crescimento do cancro.
A replicação das células geralmente é estimulada por factores de crescimento ou de
sinalização a partir de componentes da MEC através das integrinas. Para alcançar a replicação
do DNA e a divisão, a célula passa por uma sequência de eventos altamente controlados
conhecidos como o ciclo celular. Cada fase do ciclo celular está dependente da activação
correcta e conclusão da anterior. O ciclo vai parar no local em que um gene essencial para uma
determinada função é deficiente. Devido à sua extrema importância no processo de reparação
e de regeneração, o ciclo celular é estreitamente controlado, estes controlos incluem tanto
activadores e inibidores , bem como mecanismos de verificação.
Para entrar no ciclo, as células quiescentes primeiro devem passar pela transição da G0 ao G1,
o primeiro passo decisão, que funciona como uma porta de entrada para o ciclo celular. Esta
transição envolve a activação transcricional de um grande conjunto de genes, incluindo
diversos proto-oncogenes e genes necessários para síntese proteíca e tradução no ribossoma.
As células podem entrar G1 quer de G0 – células quiescente - ou após a conclusão da mitose –
células continuamente em replicação. As células que entraram G1 avançam através do ciclo e
chegam a uma fase crítica na transição G1/S, denominada como um ponto de restrição, um
passo limitante para a replicação. Ao passar este ponto de restrição, as células normais
tornam-se irreversivelmente comprometidas com a replicação do seu DNA. A progressão
através do ciclo celular e, em particular, a transição G1/S, é estreitamente regulada por
proteínas denominadas ciclinas e enzimas associadas designadas quinases dependentes das
ciclinas - CDKs. As CDKs adquirem a sua actividade catalítica através da sua ligação e formando
complexos com as ciclinas. As CDKs activas nestes complexos conduzem o ciclo celular por
fosforilarem proteínas que são críticas para as transições do ciclo celular. Uma destas
proteínas susceptíveis é o Retinoblastoma (RB), que normalmente impede a replicação das
células, formando um complexo inactivo com o factor de transcrição - E2F. A frosforilação da
RB liberta-lo, permitindo que o E2F se torne activo e estimule a transcrição de genes cujos
produtos conduzem a célula através do ciclo. Existem inúmeros factores de crescimento que
estimulam a produção de ciclinas, e consequentemente a proliferação celular.
A actividade dos complexos Ciclina-CDK é estreitamente regulada por inibidores, que são
convenientemente designados Inibidores da CDK. Alguns dos factores de crescimento
interrompem a produção destes inibidores, no entanto no ciclo celular estão incluídos
mecanismos de vigilância que visam, essencialmente, a detecção de danos no DNA e
cromossomas. O momentos em que se fazem estas verificações são referidos como
checkpoints, e que asseguram que as células com DNA ou cromossomas danificados não
concluam a replicação. O checkpoint G1/S verifica a integridade do DNA antes da replicação,
enquanto que o checkpoint G2/M faz verificações após a replicação do DNA e assegura que a
célula pode seguramente entrar em mitose. A activação destes checkpoints promove atrasos
na activação do ciclo celular e desencadeia mecanismos de reparação do DNA; se os danos do
DNA forem demasiadamente graves para serem reparados, as células são eliminadas por
apoptose, principalmente através de mecanismos dependentes do p53. As alterações nestes
checkpoints permitem a replicação de células com DNA com quebras nas cadeias e
anormalidades cromossómicas que podem provocar alterações teciduais e neoplasias.
Mecanismos de Regeneração Tecidual
Anfíbios como a salamandra podem regenerar a sua cauda, membros, cristalino, retina,
maxilares e ainda uma grande porção do coração. Esta notável capacidade regenerativa tem
sido atribuída a dois factores principais:
- A capacidade das células quiescentes tais como os miócitos para reentrarem no ciclo celular;
- A eficiente diferenciação das células estaminais na área da lesão.
Esta capacidades de regeneração dos tecidos e órgãos inteiros foram perdidas nos mamíferos.
A maioria dos processos que são referidos como regeneração em mamíferos órgãos são
efectivamente processos de crescimento compensatório que envolvem a hipertrofia e
hiperplasia das células. Estes processos são capazes de restaurar a capacidade funcional de um
órgão sem ter sido necessário reconstituir a sua anatomia original. A insuficiência da
verdadeira regeneração em mamíferos tem sido atribuída à rápida resposta de
fibroproliferação e à formação de cicatriz após a lesão.
Nesta secção, optámos regeneração hepática para ilustrar os mecanismos de hiperplasia
compensatória, porque este processo tem sido estudado em pormenor e tem importantes
aspectos clínicos e biológicos. Outros órgãos, incluindo rins, pâncreas, glândulas supra-renais,
tireóide, e os pulmões de animais muito jovens, também são capazes de crescimento
compensatório, apesar de exibi-lo de forma menos demarcada do que o fígado. É importante
referir que a regeneração do fígado após hepatectomia parcial implica a replicação das células
maduras sem a participação de células estaminais.
Regeneração Hepática
Em roedores, a remoção de aproximadamente 70% do fígado - hepatectomia parcial - desperta
um crescimento conhecido como regeneração hepática. A parte do fígado, que após
hepatectomia parcial, permanece intacta constitui um "mini-fígado" que se expande
rapidamente e alcança a massa inicial do fígado em 10 a 14 dias. O crescimento ocorre pelo
alargamento dos lobos que se mantêm após a operação, um processo conhecido como
crescimento compensatório. Assim, o ponto final da regeneração hepática está no restaurar da
função inicial e não da forma inicial.
Quase todos os hepatócitos se dividem durante a regeneração hepática após hepatectomia
parcial. Visto que são células quiescentes, demoram várias horas para entrar no ciclo celular,
através do progredir em G1, e atingir a fase S, onde ocorre a replicação do DNA. A onda de
replicação dos hepatócitos é sincronizada e é seguida pela replicação síncrona de células não
parenquimatosas (ex. Células de Kupffer, Células Endoteliais e Células Estreladas).
A proliferação dos hepatócitos na regeneração hepática é desencadeada pelo conjunto das
acções de citocinas e factores do crescimento. Existe uma excepção, a actividade autócrina do
TGF-α, a replicação dos hepatócitos é estritamente dependente dos efeitos parácrinos dos
factores de crescimento e citocinas produzidas pelas células hepáticas não parenquimatosas.
Existem dois pontos principais de restrição na replicação dos hepatócitos:
- A transição G0/G1, levando células quiescentes a entrar no ciclo celular;
- A transição G1/S, necessária para a passagem através do último ponto de restrição em G1.
A expressão génica na regeneração hepática prossegue por fases, começando com o início
imediato dos genes precoces, correspondendo a uma resposta transitória equivalente à
transição G0/G1. Após o início imediato dos genes precoces, vários genes são activados
sequencialmente. A progressão de G1 para S começa com a formação do complexo Ciclina D-
CDK4 e fosforilação de um componente da Família de Proteínas do RB. Isto é seguido pela
activação do complexo Ciclina E-CDK2, após a qual a replicação se torna autónoma.
As citocinas IL-6 e TNF estão implicados na transição G0/G1 e os factores de crescimento HGF
e TGF-α estão envolvidos na progressão do ciclo celular, depois de as células atingirem G1.
Tem sido demonstrado que TNF fornece um sinal para o priming das células remanescentes
sendo este sinal necessário para o pleno efeito mitogénico dos factores de crescimento.
Inibidores do crescimento, como o TGF-β e as activinas, podem estar envolvidos na cessação
da replicação dos hepatócito, mas não existe ainda uma clara compreensão do seu modo de
acção.
Matriz Extracelular e Intercações Célula-Matriz
A MEC é secretada localmente e forma uma rede no espaço circundante das células, sendo
responsável por uma percentagem significativa do volume de qualquer tecido. A MEC
desempenha diversas funções:
- As proteínas da matriz sequestram água que fornece turgescência aos tecidos moles e
minerais que dão rigidez aos tecidos esqueléticos;
- Funcionam como um reservatório para os factores de crescimento que controlam a
proliferação celular;
- É importante para as interacções célula-a-célula;
- Proporciona um substrato para as células aderirem, migrarem e proliferarem, modulando
directamente a forma e função da célula.
- A síntese e degradação da MEC acompanha a morfogénese, cicatrização e processos de
fibrose crónica, bem como a invasão tumoral e metastização.
Existem três grupos de macromoléculas, que estão muitas vezes fisicamente associadas,
constituindo a MEC:
- Proteínas Fibrilares Estruturais, tais como os colagénios e a elastina;
- Um grupo vasto de Glicoproteínas Adesivas;
- Proteoglicanos e Ácido Hialurónico.
Estas são as macromoléculas presentes na superfície celular e junções intercelulares, podendo
apresentar-se em duas organizações: Matriz Intersticial e Membrana Basal (BM).
A Matriz Intersticial está presente nos espaços entre as células epiteliais, endoteliais e células
musculares lisas e no tecido conjuntivo. É constituída por colagénio fibrilar e não-fibrilar,
elastina, fibronectina, proteoglicanos, hialuronato e outros componentes.
As Membranas Basais são produzidas por células epiteliais e mesenquimatosas, estando
intimamente associadas com a superfície celular. Consistem numa rede de colagénio amorfo e
não-fibrilar colagénio – predomínio do tipo IV -, laminina, heparano de sulfato, proteoglicanos,
e outras glicoproteinas.
Colagénio
O Colagénio é a proteína mais comum nos
animais, proporcionando a estrutura
extracelular de todos os organismos
multicelulares. Sem colagénio um ser
humano seria reduzido a um amontoado de
células, interligadas por alguns neurónios.
Os colagénios são compostos por uma tripla
hélice de três cadeias polipeptídicas α,
possuindo uma sequência repetida de Gly-
XY. Actualmente conhecem-se 27 diferentes tipos de colagénios codificados por 41 genes
dispersos em pelo menos 14 cromossomas. Os tipos I, II, III e V, e XI são intersticiais ou
fibrilares, sendo os mais abundantes. O tipo IV é não-fibrilar, sendo o principal componente do
BM, juntamente com a laminina.
O colagénio fribilar é sintetizado a partir do pró-colagénio, derivado de uma molécula
precursora – pré-pró-colagénio -, que é transcrita a partir dos genes do colagénio. Após a
hidroxilação dos resíduos de lisina e prolina, e a glicolização da lisina, três cadeias de pró-
colagénio alinham-se para formar a tripla hélice. O pró-colagénio é secretado a partir da
celular e clivado por proteases para formar a unidade básica das fibrilas. A formação de
colagénio fibrilar está associada com a oxidação de resíduos específicos de lisina e hidrolisina
pela enzima extracelular lisil-oxidase. Este processo resulta num cross-linking entre as cadeias
de moléculas adjacentes, dando a estabilidade característica da matriz de colagénio. Este
cross-linking é o principal factor que determina a força e resistência do colagénio. A vitamina C
é necessária para a hidroxilação do pró-colagénio, uma exigência que explica a insuficiência da
cicatrização de feridas no Escorbuto.
Defeitos genéticos na produção de colagénio causam algumas síndromes herdadas, incluindo
as diversas formas de Ehlers-Danlos e Osteogénese Imperfeita.
Elastina, Fibrilina e Fibras Elásticas
Tecidos, como os vasos sanguíneos, pele, útero e pulmão, exigem elasticidade para a sua
função. Embora a tracção seja fornecida pela família de proteínas do colagénio, a capacidade
desses tecidos para retrair é fornecida pelo fibras elásticas. Estas fibras elásticas podem esticar
até várias vezes o seu comprimento e depois regressar ao seu tamanho original após a
liberação da tensão. Morfologicamente, as fibras elásticas são compostas por um núcleo
central feito de elastina, rodeado por uma rede de microfibrilas periférica. Quantidades
substanciais de elastina são encontradas nas paredes de grandes vasos sanguíneos, como a
aorta, e no útero, pele e ligamentos. A rede periférica microfibrillar que rodeia o núcleo é
composta em grande parte por fibrilina, uma glicoproteína secretada, que se associa, consigo
própria ou com outros componentes da MEC. As microfibrilas servem como andaimes para a
deposição de elastina e para a organização de fibras elásticas. Os defeitos herdados da fibrilina
resultam na formação de fibras elásticas anormais originado o bastante comum Síndrome de
Marfan, caracterizado por alterações no sistema cardiovascular - Dissecção Aórtica - e do
esqueleto.
Proteínas de Adesão Celular
As Proteínas de Adesão Celular, também chamadas de CAMs, podem ser classificadas em
quatro grandes famílias:
- Família das Imunoglobulinas CAMs;
- Caderinas;
- Integrinas;
- Selectinas.
Estas proteínas estão localizadas na membrana celular, onde elas funcionam como receptores,
ou são armazenadas no citoplasma. Como receptores, as CAMs podem ligar-se a moléculas
semelhantes ou diferentes em outras células, permitindo a interacção entre as mesmas células
– Interacção Homotípica - ou diferentes tipos de células – Interacção Heterotípica. As
Caderinas são geralmente envolvidos em intreacções hometípicas cálcio-dependente,
enquanto a Família das Imunoglobulinas CAMs participam em ambos os tipos de interações
células-a-célula. As Integrinas têm um especificidade mais ampla e são responsáveis por
muitos dos eventos que envolvam adesão celular.
As Integrinas ligam-se tanto à matriz, como a proteínas, nomeadamente a fibronectina e
laminina, mediando a adesividade entre as células e a MEC, bem como a proteínas adesivas
em outras células, originando contacto de célula para célula.
A Fibronectina é uma grande proteína que se liga a muitas moléculas, como o colagénio,
fibrina, proteoglicanos, e receptores da superfície celular. O mRNA da fibronectina tem duas
formas, mediadas por splicing, dando origem uma forma tecidual e outra plasmática. A forma
tecidual origina agregados fibrilares nos locais de cicatrização. A forma plasmática liga-se à
fibrina, formando o coágulo sanguíneo provisório que preenche o espaço criado por uma
ferida, e serve como um substrato para deposição MEC.
A Laminina é a glicoproteína mais abundante na membrana basal e tem um carácter
vinculativo para dois domínios: MEC e receptores da superfície celular. Na BM, polímeros de
laminina e de colagénio tipo IV formam redes estritamente vinculada.
As Caderinas e as Integrinas ligam a superfície da célula com o citoesqueleto através da sua
ligação à actina e aos filamentos intermediários. Estas ligações, especialmente para as
integrinas, fornecem um mecanismo para a transmissão da força mecânica e a activação de
vias intracelulares de transdução sinal que respondem a essas forças. As proteínas do
citoesqueletos que se agrupam com integrinas nos complexos de adesão focal celular incluem
a talina, a vinculina e a paxilina.
Caderinas, o nome é derivado do termo "proteína de aderência cálcio-dependente." Esta
família inclui cerca de 90 membros, que, como mencionado, participam na interacção entre as
células do mesmo tipo. Estas interacções ligam a membrana plasmática de células adjacentes,
formando dois tipos de estruturas:
- Zonula Adherens, pequenos focos de junção localizados próximos à superfície apical das
células epiteliais;
- Desmossomas, mais fortes e mais amplos, estão presentes em epiteliais e células musculares.
A ligação das Caderinas com o citoesqueleto ocorre através de duas classes de catenins. A β-
catenina liga caderinas com ligações α-catenina, que, por sua vez, conectam-se com a actina,
completando assim a conexão com o citoesqueleto. As interações célula-a-célula mediadas por
caderinas e cateninas desempenham um papel importante na regulação do motilidade celular,
proliferação e diferenciação, bem como para a inibição da proliferação celular que ocorre
quando as células normais cultivadas estão em contacto umas com as outras – Inibição de
Contacto.
A β-catenina livre podem agir independentemente das Caderinas, funcionando como um
regulador dos factores de transcrição nucleares na sinalização Wnt.
Para além das quatro famílias de proteínas de aderência descritas, algumas outras moléculas
de aderência secretadas podem ser mencionada devido ao seu potencial papel nos processos
patológicos:
- SPARC (Proteína Secretada Ácida e Rica em Cisteína), também conhecida como Osteonectina,
contribui para remodelação tecidual em resposta a ferimentos, e funciona como um inibidor
da angiogénese;
- A Trombospondina, uma família de grandes proteínas multifuncionais, algumas das quais,
semelhantes ao SPARC, também inibem a angiogénese;
- A Osteopontina, que regula a calcificação, e também pode funcionar como um mediador da
migração leucocitário, servindo como um ligante para o Receptor do CD44;
- A Família da Tenacina, que é constituída por grandes proteínas multiméricas envolvidas na
morfogénese e na adesão celular.
Proteoglicanos e Ácido Hialurónico
Os Proteoglicanos e Ácido Hialurónico, perfazem o terceiro tipo de componente na MEC, além
das proteínas estruturais fibrilares e as proteínas de adesão celular.
Os Proteoglicanos são composto por um núcleo proteico ligada a um ou mais polissacarídeos
denominados glicosaminoglicanos - GAGs. Estes compostos são longos polímeros de repetição
de dissacáridos específicos em que um, ou ambos, contêm um resíduo de sulfato. Alguns dos
mais comuns são o Sulfato de Heparina, o Sulfato de Condroitina, e o Sulfato de Dermatano.
Estes compostos têm diversos papéis na regulação da estrutura do tecido e da sua
permeabilidade. Os proteoglicanos também pode ser parte integrante da membrana e, através
da sua ligação a outras proteínas ou a factores de crescimento dos fibroblastos, actuam como
moduladores do crescimento celular e diferenciação.
O Ácido Hialurónico (HA) é um polissacarídeo da família dos GAGs encontrado na MEC de
muitos tecidos. É uma enorme molécula que consiste de muitas repetições de um simples
dissacárido. Esta molécula tem uma extrema capacidade de ser ligar à água, formando um gel
viscoso hidratado que dá aos tecidos a capacidade de resistir à compressão por forças. O HA
permite a resiliência e lubrificação em muitos tipos de tecido conjuntivo, nomeadamente na
cartilagem das articulações. O HA também é encontrado na matriz de migração e proliferação
celular, onde inibe a adesão célula-a-célula e facilita a motilidade celular. O CD44, uma
glicoproteína de superfície, expressa por leucócitos, liga-se ao HA; através desta ligação, as
células T podem ser retidas nos tecidos, e permanecem vinculadas ao endotélio nos locais de
inflamação.
Reparação por Cicatrização, Formação de Cicatriz e Fibrose
Como vimos, a regeneração envolve a reposição de componentes idênticos aos tecidos
removidos ou mortos. Em contrapartida, a reparação é uma resposta fibroproliferativa que
“remenda” o tecido e não o recupera. É um fenómeno complexo, mas ordenado que envolvem
um determinado número de processos:
- A indução de um processo inflamatório em resposta à lesão inicial, com a remoção do tecido
morto e danificado;
- Proliferação e migração de células parenquimatosas e do tecido conjuntivo;
- Formação de novos vasos sanguíneos – angiogénese - e tecido de granulação;
- Síntese de proteínas da MEC e deposição de colagénio;
- Remodelação tecidual;
- Contracção da Cicatriz;
- Aquisição da Resistência.
Nem todos estes eventos ocorrem em todos as reacções de reparação. O processo de
reparação é influenciado por muitos factores, incluindo:
- O ambiente tecidual e a extensão da lesão;
- A intensidade e duração do estímulo;
- Condições que inibem a reparação, tais como a presença de corpos estranhos ou o
suprimento sanguíneo inadequado;
- Várias doenças que inibem a reparação (ex. Diabetes), bem como o tratamento com
esteróides.
O objectivo do processo de reparação é restaurar o tecido para o seu estado original. A
reacção inflamatória posto em marcha pelo estímulo lesivo, elimina o estímulo nocivo, remove
tecido lesionado, e inicia a deposição de componentes da MEC na área de lesão. Alguns
tecidos podem ser completamente reconstituído após a lesão, tais como na reparação do osso
após uma fractura ou a regeneração do epitélio da superfície cutânea numa ferida. Para
tecidos que são incapazes de regeneração, a reparação é realizada pela deposição de tecido
conjuntivo, produzindo uma cicatriz. Este termo é mais frequentemente utilizado na ligação à
cicatrização de feridas na pele, mas também é utilizado para descrever a substituição de
células parenquimatosas por tecido conjuntivo, como no coração após em enfarte do
miocárdio.
Se a lesão persistir, a inflamação torna-se crónica, sendo que a lesão tecidual e a reparação
podem ocorrer simultaneamente. A deposição de tecido conjuntivo nestas condições é
normalmente referida como fibrose. No sentido mais lato, o termo fibrose aplica-se a qualquer
deposição anormal de tecido conjuntivo, independentemente das causas.
A reparação começa no início da inflamação, às vezes, tão precoce que se 24 horas após a
lesão, a resolução não ocorrer, fibroblastos e células endoteliais vasculares proliferativas
começam a formar um tipo especializado de tecido que é a pedra angular da reparação,
denominando-se Tecido de Granulação. O termo deriva da sua cor-de-rosa, suave, e da
aparência granular da superfície das feridas, mas são as características histológicas que lhe
conferem esta designação: a formação de novos pequenos vasos sanguíneos – angiogénese - e
pela proliferação de fibroblastos. Estes novos vasos são frágeis, permitindo a passagem das
proteínas e glóbulos vermelhos para o espaço extravascular. Assim, o novo tecido de
granulação é frequentemente edemaciado.
Angiogénese
Os vasos sanguíneos são formados durante o desenvolvimento embrionário por
Vasculogénese, na qual uma rede vascular primitiva é estabelecida a partir de células
endoteliais precursoras - Angioblastos. O processo de formação dos vasos sanguíneos no
adultos é conhecido como Angiogénese ou Neovascularização e, tem sido pensado como
dependente da extensão e ramificação de vasos sanguíneos adjacentes. No entanto, trabalhos
recentes têm demonstrado que a angiogénese pode ocorrer também por recrutamento de
células progenitoras endoteliais (EPCs) a partir da medula óssea. A angiogénese é fundamental
para a inflamação crónica e fibrose, para o crescimento tumoral e para a vascularização de
tecidos isquémicos. Por isso, grandes esforços foram feitos para compreender os mecanismos
de angiogénese e explorar os potenciais efeitos terapêuticos dos agentes que são pró-
angiogénicos e anti-angiogénicos.
Angiogénese a partir de Precursores Endoteliais
A formação do sistema hematopoético e vascular está intimamente ligado durante o
desenvolvimento embrionário. Os dois sistemas compartilham a célula precursora, o
Hemangioblasto, que pode gerar células estaminais hematopoiéticas e angioblastos, as células
que dão origem ao sistema vascular. Os angioblastos proliferam, migram para locais
periféricos, e diferenciam-se em células endoteliais que formam artérias, veias, e linfáticos;
também podem gerar perícito e células musculares lisas da parede dos vasos. Já foi
estabelecido que células do tipo angioblasto designadas EPCs são armazenadas na medula
óssea dos organismos adultos, podendo ser recrutadas para os tecidos e dar início à
angiogénese. As EPCs participam na substituição de perda de células endoteliais, na re-
endotelização de implantes vasculares, lesões isquémicas e em neovascularização de órgãos,
feridas cutâneas, e tumores. Foi proposto que o número de EPCs circulantes pode influenciar a
função vascular e determinar o risco de doença cardiovascular.
Angiogénese a partir de Vasos Pré-Existentes
Neste tipo de angiogénese, há vasodilatação e aumento da permeabilidade dos vasos
existentes, a degradação da MEC, e a migração das células endoteliais. As principais etapas
são:
- Vasodilatação em resposta ao NO e aumento da permeabilidade dos vasos pré-existentes,
induzida pelo VEGF;
- Degradação proteolítica da BM do vaso-mãe por metaloproteinases e ruptura do contacto
célula-a-célula entre as células endoteliais do vaso pelo Activador Plasminogénio;
- Migração de células endoteliais em direcção ao estímulo angiogénico;
- Proliferação de células endoteliais, apenas atrás da onda de células que migram;
- Maturação das células endoteliais, o que inclui a inibição do crescimento e remodelação em
tubos capilares;
- Recrutamento de células peri-endoteliais (ex. Perícitos e Células Musculares Lisas) para
suportar os tubos endoteliais e formar vasos maduros.
Factores de Crescimento e Receptores Envolvidos na Angiogénese
Muitos factores de crescimento apresentam actividade angiogénica, mas a maioria das
evidências aponta para um papel especial do VEGF e das Angiopoietinas na vasculogénese
embrionárias e na angiogénese adulta. Como mencionado anteriormente, o VEGF é secretado
por muitas das células mesenquimais e estromais, mas VEGFR-2, um receptor tirosina quinase
que é o mais importante na angiogénese, encontra-se em grande parte restrito às células
endoteliais e aos seus precursores. Na angiogénese envolvendo os precursores das células
endoteliais, o VEGF, agindo através VEGFR-2, estimula a mobilização de precursores das
células endoteliais da medula óssea e aumenta a proliferação e diferenciação destas células no
local da angiogénese. Na angiogénese a partir de vasos pré-existentes, o VEGF estimula a
proliferação e a motilidade de células endoteliais, iniciando, assim, a formação de novos
capilares. A proliferação, diferenciação e migração das células endoteliais pode ser igualmente
reforçada pelo FGF-2.
A estabilização exige o recrutamento de perícito e de células musculares lisas, bem como a
deposição de proteínas da MEC. As Angiopoietinas 1 e 2, o PDGF e o TGF-β participam no
processo de estabilização:
- Ang1 interage com um receptor em células endoteliais designado Tie2 para recrutar as
células peri-endoteliais;
- PDGF participa no recrutamento de células musculares lisas;
- TGF-β estabiliza os vasos neoformados através do reforço da produção de proteínas da MEC:.
- A Interacção Ang1/Tie2 medeia a maturação dos vasos desde simples tubos endoteliais, até
às estruturas vasculares endoteliais mais elaborada, contribui ainda para manter quiescência;
- Ang2, em contrapartida, também interagindo com Tie2, tem o efeito oposto, faz com que se
tornem mais receptivos à estimulação por factores de crescimento, tais como VEGF ou, na
ausência de VEGF, mais sensíveis aos inibidores da angiogénese.
Apesar da diversidade de factores que podem participar em várias etapas na angiogénese,
VEGF surge como o mais importante factor de crescimento nos tecidos adultos submetidos a
angiogénese fisiológica (ex. Proliferação do Endométrio), bem como na angiogénese
patológica da inflamação crónica, cicatrização de feridas, tumores, e retinopatia diabética.
Proteínas da Matriz Extra-Celular como Reguladores da Angiogénese
Um componente-chave da angiogénese é a motilidade e a migração dirigida de células
endoteliais, necessárias para a formação de novos vasos sanguíneos. Estes processos são
controlados por várias classes de proteínas, incluindo:
- Integrinas, especialmente αvβ3, que é crítica para a formação e manutenção de vasos
sanguíneos neoformados;
- Proteínas Matricelulares, incluindo a Trombospondina-1, SPARC, e Tenascina C, que
destabilizam as interacções célula-matriz e, portanto, promovem a angiogénese;
- Proteinases, como o Activador Plasminogénio e as Metaloproteinases da Matriz, que são
importantes no remodelamento tecidual durante a invasão endotelial. Além disso, estas
proteinases decompõem as proteínas extracelulares, libertando factores de crescimento como
VEGF e FGF-2 que estimulam angiogénese, e que anteriormente estavam vinculados aos
componentes da MEC. As proteinases também podem libertar inibidores, tais como
endostatina, um pequeno fragmento de colagénio que inibe a proliferação endotelial e
angiogénese.
A expressão da Integrina αVβ3 nas células endoteliais é estimulada pela hipóxia. Esta integrina
tem múltiplos efeitos sobre a angiogénese: ela interage directamente com as
metaloproteinases (ex. MMP-2), liga-se e regula a actividade do VEGFR-2, e medeia a adesão
aos componentes da MEC, tais como a fibronectina, a trombospondina e a osteopontina.
Formação de Cicatriz
Os factores de crescimento e as citocinas libertadas no local da lesão induzem a proliferação
fibroblástica, a migração para o tecido de granulação de novos vasos sanguíneos e a perda da
estrutura da MEC no local. Discutimos três processos que participam na formação de uma
cicatriz:
- Migração e proliferação de fibroblastos para o local da lesão;
- Deposição da MEC;
- Remodelação Tecidual.
Migração e Proliferação dos Fibroblastos
O Tecido de Granulação contém numerosos vasos sanguíneos neoformados, sabendo já que o
VEGF promove a angiogénese, mas também é responsável por um acentuado aumento da
permeabilidade vascular. Este último fenómeno conduz a exsudação e deposição de proteínas
plasmáticas, como o fibrinogénio e fibronectina plasmática, na MEC, desenvolvendo-se
estroma provisória para que os fibroblastos e as células endoteliais de desenvolvam. A
migração de fibroblastos para o local da lesão e a sua consequente proliferação são
desencadeadas por vários factores de crescimento, incluindo o TGF-β, o PDGF, o EGF, o FGF, e
as Citocinas IL-1 e TNF. As fontes destes factores de crescimento e citocinas incluem as
plaquetas, as células inflamatórias, bem como o endotélio activado. Os macrófagos são
importantes constituintes celulares do tecido de granulação, limpando os detritos
extracelulares, a fibrina, e outros materiais estranhos no local da reparação. Estas células
também sintetizam TGF-β, PDGF e FGF e, portanto, promovem a migração de fibroblastos e a
sua proliferação. Se os estímulos quimiotáticos adequados estiverem presentes, mastócitos,
eosinófilos, e linfócitos podem também acumular-se. Cada uma destas células pode contribuir
directa ou indirectamente para a migração e proliferação de fibroblastos. Entre os factores
envolvidos no crescimento da fibrose inflamatória, o TGF-β parece ser o mais importante,
devido à multiplicidade de efeitos associados que favorecem a deposição de tecido fibroso. O
TGF-β é produzido pela maioria das células no tecido de granulação e provoca a migração e
proliferação de fibroblastos, aumentando a síntese de colagénio e fibronectina, e por outro
conduz à diminuição da degradação da MEC pelas metaloproteinases. O TGF-β é também
quimiotático para os monócitos e provoca a angiogénese in vivo, possivelmente por induzir o
afluxo de macrófagos. A expressão TGF-β encontra-se aumentada em tecidos num grande
número de doenças crónicas fibróticas, quer em humanos, quer em animais experimentais.
Deposição da Matriz Extra-celular e Formação de Cicatriz
Com a progressão da reparação, o número de células endoteliais e fibroblastos que proliferam
diminui. Os fibroblastos progressivamente depositam quantidades aumentadas de MEC. Os
colagénios fibrilares formam uma parte importante do tecido de reparação e formam os locais
mais importantes para o desenvolvimento da resistência nas cicatrizes.
Muitos dos mesmos factores que regulam o crescimento fibroblástico também estimulam a
síntese de MEC. Por exemplo, a síntese de colagénio é reforçada por vários factores, incluindo
factores de crescimento (PDGF, FGF e TGF-β) e citocinas (IL-1 e IL-13), que são secretadas por
leucócitos e fibroblastos na cicatrização feridas. A acumulação da rede de colagénio, no
entanto, depende não só do aumento da síntese de colagénio, mas também na diminuição da
sua degradação. Finalmente, a estrutura do tecido de granulação é convertida numa cicatriz
composta por fibroblastos de forma fusiforme, colagénio denso, fragmentos de tecido elástico,
MEC e outros componentes. Como a cicatriz amadurece, a regressão vascular continua,
acabando por transformar o ricamente vascularizado tecido de granulação numa cicatriz pálida
e avascular.
Remodelação Tecidual
A substituição do tecido de granulação por uma cicatriz envolve transições na composição do
MEC. Alguns dos factores de crescimento que estimulam síntese de colagénio e outras
moléculas do tecido conjuntivo também podem modular a síntese e activação de
metaloproteinases, enzimas que degradam estes componentes MEC. O equilíbrio entre síntese
e degradação da MEC resulta na remodelação da estrutura do tecido conjuntivo, que
caracteriza a inflamação crónica e a reparação.
A degradação do colagénio e outras proteínas da MEC é coordenado pela Família das
Metaloproteinases da Matriz (MMPs), que são dependentes de iões zinco para a sua
actividade. As MMPs incluem as Colagenases Intersticial (MMP-1, 2 e 3), que decompõem o
colagénio fibrilar tipo I, II e III; Gelatinases (MMP-2 e 9), que degradam o colagénio amorfo,
bem como a Fibronectina; Estromolisinas (MMP - 3, 10 e 11), que actuam numa variedade de
componentes da MEC, incluindo proteoglicanos, laminina, fibronectina, colagénios amorfos.
As MMPs são sintetizadas como pró-péptidos que requerem clivagem proteolítica para a
activação. São produzidas por vários tipos de células, nomeadamente fibroblastos,
macrófagos, neutrófilos, células sinoviais, e algumas células epiteliais. A sua secreção é
induzida por certos estímulos, incluindo os factores de crescimento (PDGF e FGF), citocinas (IL-
1 e TNF), fagocitose, stress físico, sendo inibida pelo TGF-β e esteróides.
As Colagenases decompõem o colagénio sob condições fisiológicas, cortando a hélice tripla em
dois fragmentos desiguais, que em seguida são susceptíveis à digestão por outras proteinases.
Como seria de esperar, actividade colagenolítica é regulada, as colagenases são sintetizadas
como precursores latentes – pró-colagenase - que é activada por substâncias químicas, tais
como os radicais livres produzidos durante a explosão oxidativa dos leucócitos e proteinases
(ex. Plasmina). Uma vez formada, as colagenases activas são rapidamente inibidaaspor uma
família de inibidores específicos de metaloproteinases teciduais (TIMPs), que são produzidos
por células mesenquimais, evitando, assim, uma acção incontrolada destas proteases.
Uma grande e importante família de enzimas relacionadas com as MMPs é designada ADAM
(Disintegrin and Metaloproteinases-Domain Family). As ADAMS são ancoradas à membrana
plasmática e, através da sua actividade proteolítica, decompõem e libertam domínios
extracelulares de proteínas da superfície celular, como é o caso do precursor do TNF-α e TGF.
Cicatrização de um Corte Cutâneo
Apesar de a maioria das lesões da pele curarem de forma eficiente, o produto final pode não
ser funcionalmente perfeito. É importante salientar que anexos cutâneos não regeneram, e há
ainda um tecido cicatricial no local da em que existiria um tecido de colagénio mecanicamente
funcional. Nas feridas muito superficiais, o epitélio é reconstituído e pode haver a formação de
uma pequena cicatriz. Contrastando com a cicatrização de feridas em adultos, as feridas
cutâneas fetais curam sem a formação de cicatriz. Estas feridas mostram pouco inflamação e
praticamente nenhuma fibrose, provavelmente devido à expressão de isoformas de TGF-β,
que são menos fibrogénicas do que o TGF-β1.
A cicatrização cutânea é geralmente dividido em
três fases:
- Inflamação (Precoce e Tardia);
- Tecido de Granulação e Re-Epitelialização;
- Contração da Ferida, Deposição da MEC e
Remodelação.
Estas fases sobrepõem-se, e a sua separação é algo
arbitrário. No entanto, elas ajudam a compreender
a sequência de eventos na cicatrização de feridas.
Como já foi indicado, a cicatrização fibroproliferativa é uma resposta que é mediada por
factores de crescimento e as citocinas.
As lesões cutâneas são classicamente descritas como cicatrização por intenção primária ou
secundária. Como será discutido mais adiante, esta distinção baseia-se na natureza da ferida e
não do próprio processo de cicatrização.
Cicatrização de Primeira Intenção
A situação menos complicada de reparação é a cicatrização num ambiente limpo, desinfectado
de uma incisão cirúrgica com aproximação por suturas. Esta cicatrização é referida como União
Primária ou Cicatrização de Primeira Intenção.
A incisão causa a morte de um número limitado de células epiteliais e do tecido conjuntivo,
bem como perturbações na continuidade da membrana basal epitelial. O estreito espaço
incisional imediatamente é preenchido por sangue coagulado contendo fibrina e células
sanguíneas; a desidratação da superfície do coágulo forma a conhecida crosta que cobre a
ferida.
O processo de cicatrização segue uma série de passos sequenciais:
- Dentro de 24 horas, os neutrófilos aparecem nas margens da incisão, avançando para o
coágulo de fibrina;
- De 24 a 48 horas, precursores de células epiteliais movem-se dos bordos da ferida ao longo
das margens cortadas da derme, depositando os componentes da membrana basal ao longo
do seu movimento. Estas células fundem-se na linha média abaixo da superfície acidentada,
produzindo uma contínua, mas fina camada epitelial que fecha a ferida;
- Por volta do 3º dia, os neutrófilos têm sido amplamente substituídos por macrófagos. O
Tecido de Granulação progressivamente invade o espaço de incisão. As fibras colagénias já
estão presentes na margem da incisão, mas inicialmente encontram-se orientados
verticalmente e não horizontalmente, formando uma ponte sobre a incisão. A proliferação
celular epitelial espessa a camada epidérmica;
- Por volta do 5º dia, o espaço incisional é preenchido por tecido de granulação. A
neovascularização é máxima. As fibrilhas de colagénio tornam-se mais abundantes e começam
a formar uma ponte sobre a incisão. A epiderme recupera sua espessura normal, e a
diferenciação das células superficiais produz uma maturidade estrutural epidérmica, já com
uma superfície de queratinização.
- Durante a 2ª semana, há um acumular continuado de colagénio e proliferação de
fibroblastos. O infiltrado leucocitário, edema e aumento da vascularização acabam por
desaparecer. Neste momento, o longo processo de branqueamento começa, derivado da
maior acumulação de colagénio no interior da cicatriz incisional, acompanhada da regressão
dos canais vasculares;
- Até ao final do 1º mês, a cicatriz é composta por tecido celular desprovido de infiltrado
inflamatório, estando agora coberto por epiderme intacta. Os anexos dérmicos que foram
destruídos na linha da incisão são permanentemente perdidas. A resistência à ruptura
aumenta, mas pode levar meses para que o local da ferida obtenha a sua máxima força.
Cicatrização de Segunda Intenção
Quando há uma maior perda de células e tecidos, o processo de reparação é mais complexo. A
regeneração de células parenquimatosas não pode restaurar completamente a arquitectura
original e, portanto, o tecido de granulação cresce abundantemente a partir da margem para
concluir a reparação. Esta forma de resolução é referida como União Secundária ou
Cicatrização por Segunda Intenção.
A Cicatrização Secundária varia da primária em vários aspectos:
- Inevitavelmente, grandes defeitos teciduais geram um maior coágulo de fibrina que enche o
espaço;
- Os detritos necróticos e o exsudato devem ser removidos;
- A reacção inflamatória é mais intensa;
- Uma maior quantidade de tecido de granulação é formado;
Talvez a característica que mais claramente distingue a cicatrização primária da secundário é o
fenómeno de Contracção da Ferida, que ocorre em feridas com grande superfície. Os grandes
defeitos na pele de um coelho são reduzidos em cerca de 6 semanas, a 5% a 10% do seu
tamanho original, principalmente pela contracção.
Os passos iniciais da contracção da ferida envolvem a formação de uma rede de fibroblastos
contendo actina nas margens da ferida. A contracção permanente da ferida requerem a acção
de fibroblastos alterados, passando a designar-se miofibroblastos, cujas características são
idênticas à ultra-estrutura das células do músculo liso. A contracção destas células no local da
ferida diminui o espaço entre os bordos da ferida cutânea. Para terminar forma-se uma
quantidade substancial de tecido cicatricional e dá-se o adelgaçamento da epiderme
adjacente.
Resistência da Cicatriz
Quando as suturas são removidas, geralmente no final da primeira semana, a resistência da
ferida é de aproximadamente 10% do que a da pele intacta, mas a força aumenta rapidamente
durante as próximas 4 semanas. Esta taxa de aumento diminui aproximadamente no 3º mês
após a primeira incisão, e atinge um platô perto dos 70% a 80% da força de tracção da pele
intacta, uma condição que pode persistir para toda vida. A recuperação da ruptura resulta do
excesso de síntese de colagénio, e numa diminuição da sua degradação durante os 2 primeiros
meses, e mais tarde a partir de modificações estruturais das fibras colagénias.
Factores Locais e Sistémicos que Influenciam a Cicatrização
Os Factores Sistémicos que influenciam a cicatrização incluem os seguintes:
- A Nutrição tem profundos efeitos sobre a cicatrização de feridas. Deficiência protéica, por
exemplo, e particularmente vitamina C, inibe a síntese de colagénio e atrasa a cicatrização;
- O Estado Metabólico pode alterar cicatrização. A diabetes mellitus, por exemplo, está
associada a um atraso na reparação, como consequência da microangiopatia que é uma
característica frequente nesta doença
- Estado Circulatório pode modular a cicatrização. O suprimento sanguíneo inadequado,
habitualmente causado por arteriosclerose ou aletrações venosas que atrasam a drenagem
venosa, também podem prejudicar a cicatrização;
- Hormonas, como os glicocorticóides, têm efeitos anti-inflamatórios bem documentados que
influenciam diversos componentes da inflamação. Estes agentes também podem inibir a
síntese de colagénio;
Os Factores Locais que influenciam a cicatrização incluem os seguintes:
- A infecção é a mais importante causa de atraso na cicatrização, pois origina uma lesão
tecidual e inflamação persistentes;
- Factores Mecânicos, tais como o movimento das feridas, pode atrasar a reparação, através da
compressão dos vasos sanguíneos e da separação das margens da ferida;
- Corpos Estranhos, como suturas desnecessárias ou fragmentos de aço, vidro, ou mesmo osso,
constituem obstáculos à resolução.
- Tamanho, localização e tipo de lesão influenciam a cicatrização. Ferimentos em áreas
ricamente vascularizados, como o rosto, curam mais rapidamente do que aqueles em áreas
pobremente vascularizada, como o pé. Pequenos ferimentos incisionais curam mais
rapidamente e com menos formação cicatriz do que grandes feridas excisionais ou feridas
causadas por trauma.
Complicações do Processo de Cicatrização da Pele
Complicações na cicatrização de feridas podem surgir a partir de anormalidades em qualquer
um dos componentes básicos do processo de reparação. Estas aberrações podem ser
agrupadas em três categorias gerais:
- Deficiente Formação da Cicatriz;
- Formação excessiva dos componentes de reparação;
- Formação de Contracturas.
A Formação Inadequada de tecido de granulação ou
estrutura alterada de uma cicatriz podem levar a dois
tipos de complicações: deiscência da ferida e ulceração.
As deiscências ou rupturas de uma ferida são mais comum após uma cirurgia abdominal e
devem-se ao aumento da pressão abdominal. Este stress mecânico sobre a ferida abdominal
pode ser gerado por vômitos, tosse, ou íleo.
Os ferimentos podem ulceram devido à vascularização inadequada durante a cicatrização. Por
exemplo, feridas nas extremidades inferiores em indivíduos com doença aterosclerótica
vascular periférica tipicamente ulceram. Feridas que não saram também formam áreas
desprovidas de sensação, estas úlceras neuropáticas são ocasionalmente observados em
pacientes com neuropatia periférica diabética.
A Formação Excessiva dos componentes do processo de reparação também pode complicar a
cicatrização. As aberrações de crescimento podem ocorrer mesmo em casos que inicialmente
começam com uma normal cicatrização. O acumular de quantidades excessivas de colagénio
pode dar origem a uma Cicatriz Hipertrófica, se o tecido cicatricial cresce para além das
fronteiras da ferida original e não regride, designa-se um Quelóide. A formação de quelóides
parece ser uma predisposição individual, e por razões desconhecidas esta alteração é algo
mais comum em Africano-Americanos.
Outro desvio na cicatrização de feridas é a formação de quantidades excessivas de tecido de
granulação, que ultrapassa superiormente o nível da pele circundante - Granulação
Exuberante.
Finalmente, apesar de muito raro, algumas cicatrizes incisionais ou lesões traumáticas podem
ser seguidas por uma proliferação exuberante de fibroblastos o e de outros elementos do
tecido conjuntivo, que possam, de facto, reaparecer após excisão - Desmoides ou Fibromatose
Agressiva. Estas lesões encontram-se no interface entre proliferações benignas e malignas.
A contracção do tamanho de uma ferida é uma parte importante do processo de cicatrização
normal. Um exagero deste processo é denominado de Contractura, originando deformidades
da ferida e dos tecidos circundantes. Contracturas são particularmente propensas a
desenvolverem-se nas palmas das mãos, plantas dos pés e face anterior do tórax. As
Contracturas são frequentemente observadas após queimaduras graves e podem
comprometer o movimento das articulações.
Fibrose
Os mecanismos subjacentes à formação de uma cicatriz incluem a proliferação celular,
interacções célula-célula, interacções célula-matriz e deposição da MEC. Este mecanismos são
semelhantes aos que ocorrem na fibrose associada a doenças inflamatórias crónicas, como a
artrite reumatóide, fibrose pulmonar, e cirrose hepática. Em contraste com a cicatrização
ordenada, estas doenças estão associadas com a persistência do estímulo inicial para a fibrose
ou para o desenvolver de reacções imunitários e auto-imunitários. Nestas reacções, a
interacção linfócitos-monócitos sustentam a síntese e a secreção de factores de crescimento e
citocinas fibrogénicas, enzimas proteolíticas, e outras moléculas biologicamente activas. A
degradação do colagénio por colagenases é importante na remodelação da cicatrização normal
de feridas.
Na cirrose hepática causada pelo alcoolismo crónico ou infecção com o vírus da hepatite B ou
C, as células estreladas hepáticas activadas, iniciando a produção de colagénio. A deposição de
colagénio no parênquima hepático e as alterações na estrutura dos sinusóides causados pela
deposição de componentes da MEC, alteraram de forma drástica a estrutura e função
hepática, conduzindo à cirrose hepática.
A Fibrose é uma característica marcante da doença pulmonar intersticial crónica, conhecida
como pneumoconiose, causada pela inalação de poeiras minerais. Nestas condições, que
geralmente são a consequência da inalação de carvão, amianto ou de sílica, os macrófagos
desempenham um papel importante na fibrogénese. Estas células são activadas pelas
partículas minerais e secretam citocinas e factores de crescimento que promovem a fibrose. A
fibrose é mais marcada nos casos em que se deve a inalação de sílica.
Uma causa comum de fibrose é a radiação ionizante aplicada sobre um órgão, utilizado para
tratamento do cancro.
Na pancreatite crónica, repetidos surtos de inflamação aguda pancreática levam à perda de
células acinares pancreáticas e substituição por tecido fibroso.
Lâmina C1 Dados Clínicos: Rapaz, 14 anos, com dor localizada no epigastro e com posterior localização na fossa
ilíaca direita, febre e náuseas.
Teoria – Apendicite Aguda
A inflamação do apêndice está associada à obstrução em 50 a 80% dos casos, geralmente por
causa de um fecalito e, menos comummente, por um cálculo biliar, tumor ou uma bola de
vermes (enterobius vermicularis). A secreção continuada de fluido mucinosonas vísceras
obstruídas provavelmente leva a crescente aumento da pressão intraluminal, o que causa
colapso final da drenagem venosa. A lesão isquémica, então, favorece a proliferação
bacteriana acrescida de edema e exsudato inflamatórios, o que atrapalha ainda mais o
suprimento sanguíneo. Não obstante, uma minoria significativa de apêndices inflamados não
mostra obstrução do lúmen, e a patogénese da sua inflamação permanece desconhecida.
Morfologia: Nos estágios mais precoces, somente um exsudato neutrofílico pode ser
encontrado através da mucosa, submucosa e muscular. Os vasos subserosos são
congestionados e frequentemente existe modesto infiltrado neutrofílico perivascular. A
reacção inflamatória transforma a serosa brilhante normal numa membrana vermelha, opaca
e granular; esta transformação significa apendicite aguda incipiente para o cirurgião. Num
estágio posterior, um exsudato neutrofílico importante gera uma reacção fibrinopurulenta
sobre a serosa. Conforme o processo inflamatório evolui, ocorre formação de abcesso dentro
da parede, junto com ulcerações e focos de necrose supurativa na mucosa. Este estado
constitui a apendicite supurada aguda. Um compromisso posterior do apêndice leva a grandes
áreas de ulceração verde-hemorrágica da mucosa e de necrose gangrenosa negro-esverdeada
através da parede, estendendo-se à serosa, criando uma apendicite gangrenosa aguda, a qual
complica rapidamente com ruptura e peritonite supurada.
O critério histológico para o diagnóstico da apendicite aguda é o infiltrado neutrofílico da
camada muscular. Geralmente, neutrófilos e ulcerações também existem dentro da mucosa.
Como a drenagem de um exsudato em direcção ao apêndice, a partie de uma infecção do
tracto alimentar, também pode causar infiltrado neutrofílico mucoso, a evidência de
inflamação da parede muscular é um requisito para o diagnóstico.
Resolução
1 – Identifica o órgão. Justifica enumerando quais os aspectos histológicos que corroboram a tua
afirmação.
Apêndice cecal. Apresenta as mesmas camadas comuns ao intestino (mucosa, submucosa, muscular e
serosa) e a sua mucosa é semelhante à do cólon, com a diferença de não ter microvilosidades, ter
criptas tubulares rectas e apresentar grande quantidade de tecido linfóide na mucosa e submucosa,
formand uma camada inteira de folículos germinativos. Nos idosos, diferentemente do que se observa
na figura, o apêndice torna-se mais fibroso e/ou obliterado.
2 – Quais são as alterações patológicas presentes?
Exsudato de neutrófilos na mucosa, submucosa e muscular (exsudato transmural), a erosão do epitélio,
o ingurgitamento dos vasos e algumas áreas necrosadas, a obstrução do lúmen por um exsudato
purulento e hialino (a parte eosinófila no lúmen pode ser também resultado da descamação e ulceração
do epitélio). Na serosa (mesoapêndice) também existem alguns neutrófilos, mas em menor quantidade.
3 – Qual ou quais são as camadas mais afectadas? A mucosa e a submucosa
4 – A presença de infiltrado neutrofílico na camada muscular permite diagnosticar uma apendicite
aguda.
5 – Qual é a etiologia e complicações mais frequentes deste quadro clínico? Porquê?
Em 50 a 80% dos casos é devida à obstrução por fecalito (maioritariamente sementes) ou, mais
raramente, cálculo bilar, tumores ou bola de vermes (enteroius vermicularis), desencadeando um
aumento da secreção mucosa pelas glândulas do tubo obstruído, aumentando a pressão intraluminal e
contribuindo para o colapso da drenagem venosa. A isquémia favorece a proliferação bacteriana e a
acumulação de exsudato inflamatório e edema. As complicações mais frequentes são a perfuração do
apêndice e a peritonite. Também pode haver pileflebite com trombose da drenagem venosa portal,
abcesso hepático e bacteriémia. Evolução para necrose; peritonite do tipo purulento (do tipo
bacteriano) caso a necrose seja transmural.
Lâmina C2 Dados Clínicos: Homem obeso com episódios recorrentes de dores no hipocôndrio direito
acompanhados por vómitos. Na ecografia abdominal são identificadas várias formações nodulares
localizadas no hipocôndrio direito.
Teoria – Colecistite Crónica
A colecistite crónica pode ser uma sequela de ataques reptidos de colecistite aguda branda a
grave, mas em muitas oportunidades ela desenvolve-se na ausência aprente de ataques
antecedentes. Como se associa a collitíase em mais de 90% dos casos, as populações de
doentes são as mesmas que dessa última condição (sexo feminino, 25 a 30% a partir dos 80
anos). A evolução da colecistite crónica é obscura, pelo facto de não estar claro que cálculos
biliares desempenhem um papel directo na iniciação da inflamação ou no desenvolvimento da
dor, particularmente porque a colecistite acalculosa crónica exibe sintomas e histologia
semelhantes às da forma calculosa. Sem dúvida, a supersaturação da bílis predispõe a ambas,
a inflamação crónica e, na maioria dos casos, a formação de cálculos. Microorganismos,
usualmente E.coli e enterococos, podem ser cultivadosna bílis em cerca de um terço dos casos.
Diferentemente da colecistite calculosa aguda, a obstrução da saída da vesícula não é um
requisito. Não obstante, os sintomas de colecistite crónica calculosa são semelhantes aos da
forma aguda e variam entre cólica biliar e dor indolente no quadrante superior direito e
desconforto epigástrico. Uma vez que a maioria das vesículas biliares que são removidas em
cirurgia electiva para cálculos biliares exibem características de colecistite crónica, deve
concluir-se que os sintomas biliares muitas vezes emergem após a coexistência, durante longo
prazo, de cálculos biliares e inflamação de baixo grau.
Morfologia: As alterações morfológicas na colecistite crónica são extremamente variáveis e, às
vezes, mínimas. A serosa geralmente é lisa e brilhante, mas pode estar sem brilho por causa de
fibrose subserosa. Aderências fibrosas densas podem restar como sequelas de inflamação
aguda preexistente. Em cortes, a parede está variavelmente espessada, poucas vezes mais que
três vezes o normal. A parede tem uma aparência branco-acinzentada opaca e pode ser menos
flexível que o normal. No caso não-complicado, o lúmen contém bílis mucóide razoavelmente
clara, amarelo-esverdeada, e em geral, cálculos. A própria mucosa costuma estar preservada.
Ao exame histológico, o grau de inflamação é variável. Nos casos mais brandos, apenas
linfócitos esparsos, células plasmáticas e macrófagos são encontrados na mucosa e no tecido
fibroso subseroso. Nos casos mais desenvolvidos, há acentuada fibrose subepitelial e
subserosa, acompanhada de infiltração de células mononucleares. Proliferação reactiva da
mucosa e fusão das pregas mucosas podem dar origem a criptas sepultadas de epitélio dentro
da parede da vesícula. Recessos do epitélio mucoso através da parede (seios de Rokitansky-
Aschoff) podem ser muito proeminentes. A sobreposição de alterações inflamatórias agudas
significa exacerbação de uma vesícula biliar cronicamente lesada anterirmente.
Em casos raros, calcificação distrófica extensa dentro da parede vesicular pode induzir uma
vesícula de porcelana, notável por uma incidência acentuadamente aumentada de cancro
associada. A colecistite xantogranulomatosa é também uma condição rara na qual a vesícula
está contraída, nodular e cronicamente inflamada com focos de necrose e hemorragia.
Abundantes macrófagos atulhados de lipidos estão misturados a uma resposta exuberante de
tecido fibroso, resultando numa parede maciçamente espessada. Cálculos em geral estão
presentes. Essa condição rara pode ser confundida macroscopicamente com um neoplasma
maligno. Finalmente, uma vesícula biliar atrófica, cronicamente obstruída pode conter
somente secreções claras, uma condição conhecida como hidropisia da vesícula biliar.
Resolução
1 – Identifique o órgão. Que processo indicam as alterações do órgão?
Vesícula biliar. Colecistite crónica.
2 – O seu diagnóstico baseia-se nas seguintes alterações histológicas predominantes.
Existência de infiltrado de mononucleares, fibrose e espessamento da muscular.
3 – Como se denomina a formação observada em B. Seios de Rokitansky-Aschoff.
4 – Qual é o mecanismo/alteração responsável pelos achados postos em evidência em D e E.
As condições observadas são figuras pseudo-geométricas (cristais) rodeadas de células gigantes. Chama-
se colesterolose, fenómeno não directamente associado à formação de cálculos e que deriva do
colesterol que entra no lúmen da vesícula para troca livre, sendo depois esterificado, facto este que é
exacerbado quando a produção hepática de colesterol está aumentada, acumulando-se estes na lâmina
própria da vesícula biliar e condicionando uma reacção inflamatória de corpo estranho, produzindo um
padrão que é observável na mucosa (vesícula em morango), marcado por pequenos pontos amarelos.
Também pode ser devido à proliferação reactiva da mucosa e fusão de suas pregas, que podem dar
origem a estas criptas intraparietais.
5 – Quais as complicações associadas a este quadro clínico-patológico.
Superinfecção bacteriana com colangite ou sepsis (colecistite crónica agudizada), perfuração da vesícula
e abcesso local ou peritonite difusa, abcessos murais ou intraluminais, empiema, fístula bilioentérica
(colecistoentérica), neoplasia, agravamento com descompensação cardíaca, pulmonar, renal e hepática.
6 – Enumere os factores de risco para esta condição (presente e ausentes nesta história).
Presente – obesidade; Ausentes – sexo feminino, anticoncepcionais e gravidez, demografia (Europa
Norte, América do Norte e Sul, Nativos Americanos e México-americanos), idade avançada, redução
rápida de peso, estase da vesícula biliar, erros inatos do metabolismo dos ácidos biliares e síndromes de
hiperlipidémia.
Lâmina C3 Dados Clínicos: Mulher, 35 anos, astenia, febrícula e dificuldade respiratória há 6 meses.
Teoria – Sarcoidose
A sarcoidose é uma doença sistémica de causa desconhecida, caracterizada por granulomas
não-caseosos em muitos tecidos e órgãos. Apresenta-se em muitos padrões clínicos, porém a
linfadenopatia hilar bilateral ou o envolvimento pulmonar são visíveis nas radiografias de tórax
de 90% dos casos. Como outras doenças, incluindo as infecções micobacterianas e fúngicas e a
beriliose, podem produzir também granulomas não-caseosos (duros), o diagnóstico histológico
da sarcoidose é feito por exclusão.
Apesar de a etiologia da sarcoidose permanecer desconhecida, várias linhas de evidências
sugerem que esta seja uma doença de regulação imune desordenada em indivíduos
geneticamente predispostos a certos agentes ambientais. Existem várias anormalidades
imunológicas no meio local dos granulomas sarcóides que sugerem o desenvolvimento de uma
resposta mediada por células para um antigénio não-identificado. O processo é dirigido pelas
células T helper CD4+.
MORFOLOGIA: Histologicamente, todos os tecidos envolvidos demonstram os clássicos
granulomas não-caseosos, cada um composto de um agregado de células epitelióides
firmemente agrupadas, geralmente com células gigantes tipo Langhans ou tipo corpo
estranho. A necrose central é incomum. Com a cronicidade, os granulomas podem tornar-se
encapsulados dentro de bordos fibrosos e eventualmente podem ser substituídos por
cicatrizes fibrosas hialinas. Duas outras características microscópicas estão presentes nos
granulomas: 1) concreções laminadas compostas de cálcio e proteínas conhecidas como
corpos de Schaumann e 2) inclusões estreladas conhecidas como corpos asteróides
encontrados dentro de células gigantes presentes em aproximadamente 60% dos granulomas.
Apesar de característicos, esses achados microscópicos não são patognomónicos de sarcoidose
porque os asteróides e os corpos de Schaumann podem ser encontrados noutras doenças
granulomatosas (p. ex. tuberculose). O envolvimento patológico de virtualmente todos os
órgãos do corpo é citado uma vez ou outra.
Resolução
1 – Qual é o ógão que está a observar? Trata-se de um gânglio linfático com granulomas e células
gigantes rodeadas por linfócitos.
2 – Identifique a alteração histológica presente. Como se denomina a estrutura histológica que permite
o diagnóstico?
A alteração histológica presente é uma inflamação crónica. A estrutura histológica que permite o
diagnóstico é o granuloma, composto por linfócitos e histiócitos (citoplasma maior e mais eosinófilo).
3 – A presença das células identificáveis em C permite-lhe um diagnóstico etiológico?
Não, a simples presença de células gigantes não faz o diagnóstico etiológico.
4 – Classifica este processo patológico como linfadenite granulomatosa crónica (invasão de seios
subcorticais por inflamação).
5 – Quais são as causas mais frequentes para este tipo de lesão? Infecção por micobactérias e reacções
de corpo estranho.
6 – No presente caso, qual é o diagnóstico mais provável? Justifique. Sarcoidose porque os granulomas
são muito numerosos e sem evidência de necrose caseosa. [DD: Faz-se o teste com Ziel-Nilson
(coloração ácido-resistente, com azul de metileno, fuscina e álcool-ácido) para descartar a tuberculose.
Num Z-N negativo, na presença de pouca necrose (como é o caso), recorre-se à história clínica para
descartar a beriliose]
Lâmina C4 Dados Clínicos: Homem, 55 anos, fumador, com quadro de febre, tosse e expectoração purulenta desde
há 3 semanas. Recorreu ao médico assistente e na auscultação pulmonar foi detectada uma diminuição
do murmúrio vesicular à esquerda.
Teoria – Pneumonia Aguda
As pneumonias adquiridas na comunidade podem ser bacterianas ou virais. Geralmente, a
infecção bacteriana acompanha uma infecção viral do trato respiratório superior. A invasão
bacteriana do parênquima pulmonar faz com que os alvéolos fiquem repletos de exsudato
inflamatório, causando uma consolidação (“solidificação”) do tecido pulmonar. Variáveis como
o agente etiológico específico (S.pneumoniae, H.influenzae, M.catarrhalis, S. aureus,
K.pneumoniae, P.aeruginosa, L.pneumophila), a reacção do hospedeiro e a extensão do
envolvimento, determinam a forma precisa da pneumonia. Condições predisponentes incluem
os extremos das idades, doenças crónicas (ICC, DPOC, diabetes), deficiências imunes
congénitas ou adquiridas e diminuição ou ausência de função esplénica.
MORFOLOGIA: A pneumonia bacteriana apresenta dois padrões macroscópicos de distribuição
anatómica: broncopneumonia lobar e pneumonia lobar. A consolidação esparsa do pulmão é a
característica dominante da broncopneumonia. A pneumonia lobar é uma infecção bacteriana
aguda que resulta numa consolidação fibrino-supurativa de uma grande porção de um lobo ou
de todo um lobo. Essas categorizações anatómicas, mas ainda clássicas, em geral são de difícil
aplicação nos casos individuais porque os padrões se sobrepõem. O envolvimento esparso
pode tornar-se confluente, produzindo uma consolidação lobar virtualmente total; em
contraste, a terapia antibiótica para efectiva para qualquer forma de pneumonia pode limitar o
envolvimento para uma consolidação subtotal. Além disso, os mesmos organismos podem
produzir broncopneumonia num doente, enquanto que num indivíduo mais vulnerável pode
ocorrer um envolvimento lobar completo. Do ponto de vista clínico, o mais importante é a
identificação do agente causal e a determinação da extensão da doença.
Na pneumonia lobar, quatro estágios de resposta inflamatória são classicamente descritos:
congestão, hepatização vermelha, hepatização cinzenta e resolução. No primeiro estágio da
congestão, o pulmão está pesado, pastoso e vermelho. Esse estágio caracteriza-se pelo
ingurgitamento vascular, líquido intra-alveolar com poucos neutrófilos, em geral com a
presença de numerosas bactérias. O estágio de hepatização vermelha que se segue é
caracterizado por uma maciça exsudação confluente com hemácias (congestão), neutrófilos e
fibrina preenchendo os espaços alveolares. No exame macroscópico, o lobo aparece
distintamente vermelho, firme e não-areado, com uma consistência semelhante à do fiado, daí
o termo hepatização. O estágio da hepatização cinzenta segue-se com a desintegração
progressiva das hemácias e a persistência de um exsudato fibrino-supurativo, gerando a
aparência macroscópica de uma superfície seca, de coloração marrom-acinzentada. Na fase
final de resolução, o exsudato consolidado dentro dos espaços alveolares sofre digestão
enzimática para produzir restos granulares semilíquidos que são reabsorvidos, ingeridos por
macrófagos, expectorados ou organizados por fibroblastos que crescem na direcção destes
detritos. A reacção fibrinosa pleural para a infecção subjacente, em geral presente nos estágios
iniciais se a consolidação se estende até à superfície (pleurite), pode paresentar uma resolução
semelhante. Na maioria das vezes, ela sofre organização, deixando um espessamento fibroso
ou adesões permanentes.
Focos de brocopneumonia são áreas consolidadas de inflamação supurativa aguda. A
consolidação pode ser esparsa através de um lobo, mas geralmente é multilobar e
frequentemente bilateral e basal por causa da tendência de as secreções gravitarem para os
lobos inferiores. As lesões bem desenvolvidas em geral têm de 3 a 4cm de diâmetro, são
levemente elevadas, secas, granulares, de coloração cinza-avermelhado para o amarelo e mal
delimitadas nas margens. Histologicamente, a reacção muitas vezes desencadeia um exsudato
supurativo rico em neutrófilos que preenche os brônquios, bronquíolos e espaços alveolares
adjacentes.
Complicações da pneumonia incluem:
- destruição tecidual e necrose, causando a formção de abcesso (particularmente comum com
os pneumococos do tipo 3 ou infecções por Klebsiella);
- disseminação da infecção para a cavidade pleural, causando uma reacção fibrino-supurativa
intrapleural conhecida como empiema;
- organização do exsudato, que pode converter uma porção do pulmão em tecido sólido;
- disseminação bacteriémica para válvulas cardíacas, pericárdio, cérebro, rins, baço ou
articulações, causando abcessos metastáticos, endocardite, meningite ou artrite supurativa.
Resolução
1 – Identifica o órgão. Pulmão
2 – Quais são as células características desta lesão? Neutrófilos como células inflamatórias presentes em
maior quantidade [característicos de pnemonia aguda; no caso de uma pneumonia crónica tratar-se-iam
de células gigantes multinucleadas que não é o caso].
3 – Esta lesão evolui em várias fases. Descreva como será o aspecto macroscópico desta lesão e como se
denominaria.
Fase de hepatização cinzenta porque tem aparência volumosa e cinzenta. Ainda se observam as paredes
dos alvéolos. [não tenho bem a certeza]
4 – Quais são os agentes etiológicos mais frequentes? Streptococos Pneumoniae, Hamophilus
Influenzae, Moroxela Catarrhalis, Staphylococos Aureus, Klebsiella Pneumoniae, Pseudomonas
Aeruginosa, Legionella Pneumophila.
5 – Qual é a evolução mais provável desta lesão? Organização do exsudado (parte do pulmão fica
sólido); pode ocorrer formação de cicatriz nalgumas zonas (em que já houve destruição dos septos
interalveolares)
Lâmina C5 Dados Clínicos: Mulher, 40 anos, com palpitações e hipersudação esporádicas desde há um ano.
Actualmente, tem bócio de aparecimento recente.
Teoria – Tiroidite de Hashimoto
A tiroidite de Hashimoto (ou tiroidite linfocítica cróica) é a causa mais comum de
hipotiroidismo em áreas do mundo onde os níveis de iodo são adequados. Ela é caracterizada
pela insuficiência tiroideia gradual devido à destruição auto-imune da glândula. A tiroidite de
Hashimoto é uma doença auto-imune na qual o sistema imune reage contra vários antigénios
tiorideus. A sua principal característica é a redução progressiva das células epiteliais da tiróide
(tirócitos), que são gradulamente substituídas por um infiltrado de células mononucleares e
fibrose. Vários mecanismos imunológicos podem contribuir para a fibrose. A sensibilização das
células T auxiliares CD4+ auto-reactivas aos antigénios tiroideus parece ser o evento
desencadeante. Os mecanismos efectores da morte dos tirócitos incluem os seguintes: morte
celular mediada pelas células T citotóxicas; morte celular mediada por citocinas; e, ligação de
anticorpos antitiroideus (anticorpos contra o receptor de TSH, antitiroglobulina e anticorpos
antiperoxidade tiroideia) seguida de citotoxicidade mediada por célula dependente de
anticorpo (ADCC).
MORFOLOGIA: A tiróide geralmente apresenta um aumento difuso do seu tamanho, mas em
alguns casos pode ver-se um aumento mais localizado. A cápsula está intacta e a glândula
encontra-se bem demarcada a partir das estruturas que a cercam. A superfície de corte é
pálida, bege-amarelada, firme e algo nodular. O exame microscópico revela um extenso
infiltrado inflamatório mononuclear do parênquima contendo linfócitos pequenos,
plasmócitos e centros germinativos bem desenvolvidos. Os folículos tiroideus estão atróficos e,
em várias áreas, revestidos por células epiteliais, que podem ser diferenciadas pela presença
de um citoplasma eosinofílico, granular, abundante, sendo chamadas de células de Hurthle.
Essa é uma resposta metaplásica do epitélio cubóide, normalmente baixo, à lesão persistente.
Na punção aspirativa com agulha fina, a presença das células de Hurthle, juntamente com uma
população heterogénea de linfócitos, é característica da tiroidite de Hashimoto. Na tiroidite de
Hashimoto “clássica”, o tecido conjuntivo intersticial está aumentado e pode ser abundante.
Uma variante fibrosa é caracterizada por uma grande atrofia dos folículos tiroideus e uma
fibrose densa “semelhante a quelóide”, com a presença de bandas largas de colagéneo
rodeando o tecido tiroideu residual. Ao contrário da tiroidite de Reidel, a fibrose não
ultrapassa a cápsula da glândula. O parênquima tiroideu remanescente demonstra
características de uma tiroidite linfocítica crónica.
Resolução
1 – Identifica o órgão. Tiróide
2 – Refere quais são as principais alterações presentes.
Há rebentamento dos folículos tiroideus e atrofia, formação de folículos linfóides (inflamação crónica),
células gigantes e desaparecimento do colóide.
3 – Como se denominam as estruturas identificadas pelas setas vermelhas? Folículos linfóides com
centros germinativos.
4 – Proponha uma explicação baseada nos aspectos morfológicos que justifiquem a sintomatologia
“palpitações e hipersudação”.
Dado que existe uma situação de inflamação crónica da glândula tiroideia com desaparecimento do
colóide, a tiróide torna-se mais volumosa e dolorosa e liberta para o sangue uma grande quantidade de
hormonas que tinha armazenadas (não há um verdadeiro aumento da produção). Como as hormonas
tiroideias aumentam o metabolismo, isso vai conduzir a um aumento da contracção cardíaca –
palpitações e a um aumento da produção de suor pelas glândulas sudoriparas. Além disso, o
hipertiroidismo secundário leva à activação do SNS.
5 – Quais as complicações desta patologia? Linfomas; Carcinomas (Papilar da Tiroideia); Hipotiroidismo.
Lâmina C6 Dados Clínicos: Mulher, 35 anos, após o diagnóstico de melanoma maligno é submetida a terapêutica de
alargamento de excisão cirúrgica prévia de melanoma maligno.
Teoria
(ver introdução teórica sobre Cicatrização)
Resolução
1 – Nesta pele pode identificar a reparação do epitélio por regeneração e do tecido conjuntivo da derme
por cicatrização.
2 – Qual a fase de reparação presente nestas imagens? Quais são as células mais importantes nesta
fase? Porquê?
É uma fase recente porque ainda se vêem macrófagos. Pode dizer-se que se iniciou a deposição de
colagénio. As células mais importantes são fibroblastos e macrófagos.
3 – As células assinaladas com a seta vermelha denominam-se por macrófagos e tem funções de
reparação para que ocorra a cicatrização.
4 – A seta azul assinala uma formação intra-citoplasmática. Qual a sua natureza? Corresponde a um
ponto de sutura que se tornou conteúdo de uma célula gigante.
5 – O que é um quelóide? É o diagnóstico apropriado para esta lesão?
O quelóide é uma lesão tumoral secundária a traumatismo, resultante de uma formação excessiva de
componentes do processo de reparação, excedendo a área da lesão. No início, geralmente tem cor
rósea ou avermelhada adquirindo, mais tarde, cor semelhante à pele normal ou escurecida. A região
anterior do tórax e os ombros são localização frequente de quelóides. Difere das cicatrizes hipertróficas,
nas quais o tecido cicatricial aumentado não excede a localização do traumatismo e tende a se reduzir
com o passar do tempo. Não pode ser diagnóstico desta situação porque estamos perante uma
cicatrização normal. Neste caso, não houve perda de epitélio, sendo que os bordos da lesão coadaptam-
se.
Lâmina C7 Dados Clínicos: Homem, 45 anos, com epigastralgias recorrentes e hematemese súbita e abundante.
Recorre ao SU onde é efectuada gastrectomia parcial.
Teoria – Úlcera péptica
As úlceras pépticas são lesões crónicas, geralmente solitárias, que ocorrem em qualquer local
do trato gastrointestinal que esteja exposto à acção agressiva dos sucos pépticos ácidos, sendo
mais frequentes no estômago e duodeno. São definidas histologicamente como aberturas na
mucosa do trato alimentar que se estendem através da muscular da mucosa em direcção à
submucosa ou mais profundamente. São produzidas por desequilíbrios entre os mecanismos
de defesa da mucosa gastroduodenal e as forças lesivas, particularmente do ácido gástrico e
da pepsina.
A infecção por H.pylori é um importante factor na patogénese da úlcera péptica. Ocorre em
praticamente todos os doentes com úlceras duodenais e em cerca de 70% daqueles com
úlceras gástricas.
Outros eventos podem agir isoladamente ou em conjunto com H. pylori na promoção da
úlcera péptica. A hiperacidez gástrica, quando existe, pode ser fortemente ulcerativa e pode
surgir por aumento do número de células parietais, por aumento da sensibilidade aos
estímulos secretores, por aumento da secreção ácida basal ou por impedimento da inibição
dos mecanismos estimulatórios, como a libertação de gastrina. O uso crónico de AINE’s
suprime a síntese mucosa de prostaglandina; a aspirina também é um agente irritante directo.
O fumo do tabaco bloqueia o fluxo sanguíneo mucoso e a recuperação da mucosa. Outros
factores, embora não confirmados, parecem também contribuir para o desenvolvimento de
úlceras pépticas como: álcool, corticoesteróides, personalidade e stress psicológico, …
MORFOLOGIA: Independentemente do local em que ocorram, as úlceras pépticas crónicas têm
uma macroscopia típica facilmente reconhecível e diagnosticável. Pequenas lesões (<0,3cm)
são, provavelmente, erosões superficiais, enquanto que as maiores que 0,6cm são
provavelmente úlceras. Como as úlceras carcinomatosas podem ser menores que 4cm de
diâmetro e podem estar localizadas em qualquer região do estômago, o tamanho e a
localização não diferenciam uma úlcera benigna de uma maligna.
A úlcera péptica clássica é redonda ou ovalada, bem delimitada e tem paredes lisas. As
margens ficam ao mesmo nível da mucosa adjacente ou são discretamente elevadas. Margens
sobrelevadas são raras na úlcera benigna mas são características da lesão maligna. A
profundidade destas úlceras varia desde lesões superficiais envolvendo somente a mucosa e a
muscular da mucosa, até úlceras profundamente escavadas, com base na muscular própria.
Quando toda a parede é perfurada, a base da úlcera pode ser o pâncreas aderente, a gordura
omental ou o fígado. Pode ocorrer perfuração livre para dentro da cavidade peritoneal.
A base da úlcera péptica é lisa e limpa, devido à digestão péptica de qualquer exsudato
produzido. Nalgumas úlceras, vasos sanguíneos com trombos (fontes de graves hemorragias)
são evidentes na base. A cicatrização pode envolver toda a espessura do estômago; o
enrugamento da mucosa adjacente cria pregas mucosas que se irradiam a partir da cratera
como os raios de uma roda. A mucosa gástrica que circunda uma úlcera gástrica é um pouco
edemaciada e avermelhada, devido à gastrite que geralemente está presente.
A aparência histológica varia de uma necrose activa, passando por uma inflamação crónica
com cicatrização até à cura. Nas úlceras activas, com necrose em andamento, quatro áreas são
demonstráveis:
- a base e as margens têm uma delegada camada superficial de restos fibrinóides necróticos
não-visíveis a olho-nu;
- abaixo desta camada, existe uma zona de infiltrado inflamatório inespecífico, com
predomínio de neutrófilos;
- nas úlceras mais profundas, especialmente na base da úlcera, existe um tecido de granulação
activo, infiltrado com leucócitos mononucleares;
- e, restos de tecido de granulação, numa cicatriz colagénea ou fibrosa mais sólida.
As paredes dos vasos dentro da área cicatricial são tipicamente espessados pela inflamação
circunjacente e estão ocasionalemtne trombosados.
Resolução
1 – Identifica o órgão. Estômago. Como se denomina esta lesão? Úlcera Péptica.
2 – Qual é a patogénese desta lesão?
Ocorre quando os mecanismos de defesa estão desregulados em relação aos mecanismos lesivos
(necrose da parede gástrica induzida por acção ácida seguido de resposta inflamatória aguda,
organização, granulação, formação tecidular e cicatrização e fibrose).
3 – Descreva as características morfológicas (A, B, C e D).
Quanto à lâmina A podemos dividi-la em 4 zonas: “toalha” necrótica; infiltrado inflamatório agudo;
tecido de granulação vascular; e, tecido de granulação fibroso. Em B, detecta-se a presença de uma
camada eosinófila contendo restos fibrinóides necróticos. Em C, identifica-se uma área de infiltrado
inflamatório não especifico com neutrófilos predominantes e fibrina que corresponde a uma área de
infiltrado inflamatório agudo. Em D, verifica-se uma cicatriz fibrosa (tecido de granulação fibroso) com
cicatriz colagénica ou mais sólida, sendo chamada de úlcera calosa quando se apresenta com um
exsudado inflamatório crónico com fibrose.
4 – Em E está representado um dos factores etiológicos mais frequentes (coloração por Giemsa e
microscopia electrónica). Qual é o agente? Helicobacter pylori
5 – Quais são as complicações que podem resultar da sua presença crónica neste órgão? Hemorragia
(quando ocorre necrose da parede de uma artéria); perfuração; obstrução por edema ou cicatrização;
neoplasias epiteliais (adenocarcinoma) ou linfóides (linfoma de MALT, que evolui para linfoma difuso de
grandes células).
L6 – Alterações Vasculares
Introdução Teórica A saúde das células e órgãos depende fundamentalmente de uma circulação ininterrupta para levar o oxigénio e nutrientes necessários, bem como para remover os resíduos originados. A homeostase normal dos fluidos engloba a manutenção da integridade da parede dos vasos, bem como da pressão intravascular e osmolaridade dentro de certos limites fisiológicos. Alterações vasculares no volume, pressão, ou de teor em proteínas, bem como alterações na função endotelial, todos estes afectam a circulação de água através da parde dos vasos. A normal homeostase dos fluídos inclui ainda o também manter do sangue, como um líquido, até que no caso lesão seja necessária a formação de um coágulo. Por outro lado a incapacidade de formar um coágulo após a lesão vascular resulta em hemorragia; sangramento local pode comprometer a perfusão regional, enquanto uma hemorragia mais extensa pode resultar em hipotensão e morte. Algumas das falhas na homeostase dos fluídos reflectem uma patologia primária no leito vascular ou no sistema de coagulação; outras podem representar uma manifestação secundária de outro processo patológico.
Edema
Aproximadamente 60% da massa corporal magra é a água, dois terços da água é intracelular, e o restante encontra-se no espaço extracelular, principalmente como fluido intersticial. O termo Edema significa aumento do líquido nos espaços intersticiais dos tecidos. Além disso, dependendo do local, colecções líquidas nas diferentes cavidades corporais adquirem diversas designações hidrotórax, hidropericárdio e hidroperitoneu, sendo o último mais frequentemente denominado por ascite. Anasarca é um grave e generalizado edema com
demarcado inchaço do tecido subcutâneo. Em geral, a oposição da pressão hidrostática vascular e da pressão plasmática oncótica são os principais factores que regem o movimento de fluidos entre os espaços vascular e intersticial. Normalmente, a saída de fluido para o interstício a partir do final da microcirculação arteriolar é quase equilibrada por influxo no final venular; um pequeno excesso de fluido intersticial é drenado pelos linfáticos. Qualquer aumento da pressão capilar ou diminuição da pressão oncótica pode resultar num aumento do líquido intersticial. Como o líquido extravascular se acumula, o aumento da pressão hidrostática nos tecidos e a pressão oncótica podem eventualmente atingir um novo equilíbrio, e a água reentrar para as vénulas. Qualquer excesso de fluido intersticial é normalmente removido pela drenagem linfática, finalmente retornando para a corrente sanguínea através do canal torácico, como seria de esperar, a obstrução linfática também irá prejudicar a drenagem do fluído, resultando em edema. Finalmente, uma retenção de sódio primária, na doença renal, originando de igual modo edema nos tecidos. Aumento da Pressão Hidrostática
Aumentos locais na pressão hidrostática podem resultar de efluxo derivado da insuficiência venosa. O aumento generalizado da pressão venosa, resultando em edema sistémico, ocorre mais frequentemente na insuficiência cardíaca congestiva, onde a função cardíaca do ventrículo direito se encontra comprometida. Embora o aumentado da pressão venosa hidrostática seja importante, a patogénese do edema cardíaco é mais complexa. A insuficiência cardíaca congestiva está associada com redução do débito cardíaco e, portanto, reduzida perfusão renal. Hipoperfusão renal, por sua vez, acciona o eixo renina-angiotensina-aldosterona, induzindo retenção de sódio e água pelos rins - Aldosteronismo Secundário. Este processo é concebido para aumentar o volume intravascular e assim melhorar o débito cardíaco, através da lei Frank-Starling, originando o restabelecer da perfusão renal. Se o coração não pode aumentar o débito cardíaco, porém, o excesso de líquido resulta apenas em aumento da carga da pressão venosa e, eventualmente edema. Redução da Pressão Oncótica Plasmática A redução da pressão oncótica plasmática pode resultar da perda excessiva ou síntese reduzida de albumina, ou outras proteínas do soro responsáveis pela manutenção da pressão oncótica. Uma importante causa de perda de albumina é o Síndrome Nefrótico, caracterizado por uma perda da parede capilar glomerular e edema generalizado. A síntese diminuída de albumina surge num contexto de patologia hepática difusa (ex. Cirrose) ou como consequência da desnutrição protéica. Em cada caso, a reduzida pressão oncótica plasmática leva a uma passagem de fluido para o espaço intersticial e um consequente diminuição do volume plasmático. É previsível que com a redução do volume intravascular, consequente hipoperfusão renal e hiperaldosteronismo secundário surja neste cenário. O sódio e a água retidos não conseguem corrigir o volume plasmático deficitário, o que se justifica pelo facto de o principal defeito ser a baixa de proteínas séricas. Tal como acontece com a insuficiência cardíaca congestiva, o edema precipitado pela hipoproteinemia é agravado pela retenção de sal e líquidos. Obstrução Linfática A interrupção da drenagem linfática e consequente linfedema é geralmente localizado, podendo resultar da obstrução inflamatória ou neoplásica. O exemplo clássico de obstrução linfática de causa inflamatória centra-se nos diversos tipos de filaríase, sendo consequência da infecção parasitária. Nestes casos de filaríase, o caso mais complexo e com uma apresentação mais floreada denomina-se elefantíase. No carcinoma da mama, infiltração e obstrução dos linfáticos podem causar edema superficial da pele sobrejacente, dando origem à aparência de peau d'orange. Retenção de Sódio e Água A retenção de sódio e água são claramente factores contributivos em várias formas de edema, porém, a retenção de sal pode também ser uma causa primária de edema. O aumento de sal, com o consequente co-transporte de água, provoca o aumento da pressão hidrostática e diminuição da pressão oncótica vascular. A retenção de sódio e água podem ocorrer com qualquer redução aguda da função renal, incluindo glomerulonefrite e insuficiência renal aguda. Morfologia - Edema O Edema é mais facilmente reconhecido grosseiramente; microscopicamente o edema geralmente manifesta apenas como uma subtil turgescência das células, com transparência e separação dos elementos da matriz extracelular. Embora qualquer órgão ou tecido do corpo possa desenvolver edema, é mais frequentemente encontrado nos tecidos subcutâneos, pulmões e cérebro. O edema grave e generalizado é denominado anasarca.
O Edema Subcutâneo pode ter diferentes distribuições dependendo da causa. Pode ser difuso, ou pode ser relativamente mais visível nos locais de maior pressão hidrostática. Neste último caso, a distribuição do edema é normalmente influenciada pela gravidade e é considerada dependente. Os edemas dependentes de partes do corpo (ex. Membro Inferior) são uma característica proeminente da insuficiência cardíaca congestiva, especialmente do ventrículo direito. O Edema como resultado de uma disfunção renal ou síndrome nefrótico é geralmente mais grave do que o edema cardíaco e afecta todas as partes do corpo de forma igual. Pode, no entanto, manifestar-se inicialmente nos tecidos com uma matriz de tecido conjuntivo laxo, tais como as pálpebras; O edema periorbital é um achado característico da doença renal grave. O Edema Pulmonar é um problema clínico comum, normalmente mais visto na definição de insuficiência ventricular esquerda, mas também ocorre em Insuficiência Renal, Síndrome de Dificuldade Respiratório Aguda, Infecções Pulmonares e Reacções de Hipersensibilidade. Os pulmões apresentam duas a três vezes o seu peso normal, e o seu seccionamento revela um fluído sanguionolento, representando uma mistura de ar, fluido, e extravasamento de glóbulos vermelhos. O Edema Cerebral pode ser localizada (ex. Abscesso ou Neoplasia), ou pode ser generalizada (ex. Encefalite, Crises Hipertensivas, ou Obstrução ao Fluxo Venoso). O trauma pode resultar em edema local ou generalizado, dependendo da natureza e extensão da lesão. No edema generalizado, o cérebro incha na sua totalidade, apresentando sulcos estreitados e circunvuloções distendidas, são ainda visíveis sinais de achatamento inflexível contra o crânio.
Hiperémia e Congestão
Os termos Hiperémia e Congestão ambos indicam um aumento local do volume de sangue em determinado tecido. A hiperémia é um processo activo resultante do influxo aumentado devido à dilatação arteriolar, como no músculo esquelético durante o exercício ou em locais de inflamação. O tecido apresenta-se avermelhado devido ao ingurgitamento de vasos com sangue oxigenado. O congestionamento é um processo passivo resultante da imparidade do efluxo de um tecido. Pode ocorrer sistemicamente, como na insuficiência cardíaca, ou pode ser local, resultante de uma obstrução venosa isolada. O tecido tem uma cor vermelho-azulado – cianose -, especialmente nos congestionamentos mais graves que levam ao acumular de hemoglobina desoxigenada nos tecidos afectados. A congestão e edema comummente ocorrem juntos, principalmente no leito capilar onde congestionamentos podem resultar em edema devido ao aumento da transudação de líquido. No congestionamento prolongado, denominado congestão passiva crónica, o imobilismo do sangue mal oxigenado também provoca hipóxia crónica, o que pode resultar em morte ou degeneração de células parenquimatosas. A ruptura capilar nestes locais de congestionamento crónico pode também causar pequenos focos de hemorragia; repartição e fagocitose dos restos de glóbulos vermelhos pode eventualmente resultar em pequenos aglomerados de macrófagos preenchidos por hemossiderina. Morfologia - Congestão
O corte de superfícies hiperémiadas ou de tecidos congestionados são hemorrágicos e húmido. Microscopicamente, a Congestão Pulmonar
Aguda é caracterizada por capilares alveolares ingurgitados com sangue, pois pode estar associada ao edema septal alveolar e/ou hemorragias focais intra-alveolar. Na Congestão Pulmonar Crónica, os septos estão espessados e fibróticos, os espaços alveolares podem conter numerosos macrófagos carregados de hemossiderina. Na Congestão Hepática Aguda, a veia central e os sinusóides estão distendidos devido ao sangue, e podendo mesmo existir degeneração dos hepatócitos centrais; os hepatócitos periportais, são melhor oxigenados devido à sua proximidade com as arteríolas hepáticas, estando expostos a menos hipóxia e apenas desenvolvem alterações gordas. Na Congestão Passiva Crónica do Fígado, as regiões centrais dos lóbulos hepáticos são grosseiramente vermelho-acastanhado e levemente deprimidas, devido à acentuada perda de células, e são acentuados em redor das zonas de congestão hepática - Fígado em Noz-Moscada. Microscopicamente, há evidências de necrose centrolobular com perda de hepatócitos e hemorragia, incluindo macrófagos carregados de hemossiderina. Nos casos mais graves, na congestão hepática prolongada, pode até ser grosseiramente evidente fibrose hepática. Porque a porção central do lóbulo hepático é a última a receber sangue, a necrose centrolobular também pode ocorrer quando há diminuição do fluxo sanguíneo hepático, não existindo a necessidade de congestão hepática anterior.
Hemorragia
Hemorragia geralmente indica extravasamento de sangue devido à ruptura de um vaso. A ruptura de uma grande artéria ou veia é quase sempre devido a lesão vascular, incluindo trauma, aterosclerose, causas inflamatórias ou erosão neoplásica da parede do vaso. A Hemorragia pode-se manifestar numa variedade de padrões, dependendo do tamanho, forma e local de sangramento: - A Hemorragia pode ser externa ou pode ser fechada dentro de um tecido; a acumulação de sangue num tecido é referida como um hematoma. Os Hematomas podem ser relactivamente insignificantes (ex. Contusão), ou podem ser suficientemente grandes para serem fatais (ex.
Enorme Hematoma Retroperitoneal). - Hemorragias na pele, membranas mucosas, ou superfícies serosas com 1 a 2 mm são indicadas como Petéquias e são normalmente associadas o aumento local da pressão intravascular, baixa plaquetas – trombocitopenia-, defeitos na função plaquetária – uremia -, ou défice dos factores de coagulação. As petéquias encontram muitas vezes associadas a doenças por Meningococos. - Hemorragias ligeiramente maiores (≥ 3 mm) são
designadas Púrpuras. Estas podem ser associados com muitas das mesmas doenças que causam petéquias e também podem surgir como consequência de trauma, inflamação vascular ou aumento da fragilidade vascular; - Hematomas Subcutâneos maiores (> 1 a 2 cm) são denominados Equimoses e são caracteristicamente visto após o trauma, mas podem ser agravadas por qualquer uma das referidas condições. Os eritrócitos nestes locais hemorragias são degradados e fagocitaram por macrófagos, a hemoglobina (Vermelha e Azul) é então enzimáticamente convertida em bilirrubina (Azul-Esverdeada) e, eventualmente, em hemossiderina (Castanho-Dourado), representando o a característica mudança de cor de um hematoma. Grandes acumulações de sangue nas cavidades do corpo são designados consoante a cavidade de: hemotórax, hemopericárdio, hemoperitoneu, ou hemartrose. Nos doentes com extensa hemorragia ocasionalmente desenvolve-se icterícia devido à destruição maciça de eritrócitos e libertação sistémica de bilirrubina.
Hemostase e Trombose
A Hemostasia normal é o resultado de um conjunto de processos que bem regulados realizam duas funções importantes: - Mantêm o sangue fluido, livre de coágulos nos vasos normais; - Estar preparados para induzir uma resposta hemostática rápida e localizada no local de lesão vascular. O estado patológico oposto ao da hemostasia é a Trombose, que pode ser considerado como uma activação inapropriada dos processos normais hemostáticos, tais como a formação de um coágulo num vaso ileso de lesão ou oclusão trombótica de um vaso após uma lesão de pequenas dimensões. Tanto a hemostasia, como a trombose são reguladas por três componentes principais: a parede vascular, as plaquetas e a cascata de coagulação. Hemostase Normal Após a lesão inicial, há um breve período de vasoconstrição arteriolar, em grande parte atribuível a mecanismos reflexos neurogénicos e pela secreção aumentada de factores locais, tais como a endotelina. O efeito é transitório, porém, e a hemorragia aumentaria se as plaquetas e o sistema de coagulação não fossem activados. A Lesão Endotelial expõe a Matriz Extracelular Sub-Endotelial altamente trombogénica, permitindo que as plaquetas adiram e se tornem activas, ou seja, sofram uma alteração na sua forma e libertem os seus grânulos secretores. Minutos após estes fenómenos, os produtos secretados recrutam plaquetas adicionais – agregação - para formar um tampão hemostático, este processo denomina-se de Hemostase Primária. O Factor Tecidual, um factor pró-coagulante vinculado à membrana sintetizado pelo endotélio, também é exposto no local da lesão. Este factor actua em conjunto com os factores secretados pelas plaquetas para activar a cascata de coagulação, culminando com a activação da trombina. Por sua vez, a trombina converte o fibrinogénio solúvel circulante em fibrina insolúvel, resultando na deposição local de fibrina. A trombina também induz um maior recrutamento plaquetário e consequente libertação de grânulos. Esta sequência – Hemostase Secundária - demora mais tempo do que a formação do tampão plaquetário inicial. Os agregados polimerizados de fibrina e plaquetas formam um tampão sólido e permanente para evitar qualquer nova hemorragia. Nesta fase, os mecanismos contra-reguladores (ex. Activador do Plasminogénio Tecidular ou t-PA), são activados para limitar o tampão hemostático.
Endotélio As células endoteliais modulam severa e frequentemente os aspectos da hemostasia normal. Por um lado, o fluxo normal do sangue é mantido pelas propriedades endoteliais anti-plaquetárias, anticoagulantes e fibrinolíticas. Por outro lado, após a lesão ou activação, o endotélio passa a exibir várias actividades pró-coagulantes. O endotélio pode ser activado por agentes infecciosos, factores hemodinâmicos, mediadores plasmáticos e, mais significativamente, por citocinas. O equilíbrio crítico entre as actividades endoteliais anti-trombóticas e pró-trombóticas determina se a formação de trombos, propagação, ou dissolução ocorre. Propriedades Anti-Trombóticas Na maioria das circunstâncias, as células endoteliais mantêm um ambiente propício para a liquidez do fluxo sanguíneo por mecanismos que bloqueiam a adesão e agregação plaquetária, interferindo com a cascata de coagulação, e promovendo activamente a lise dos coágulos: - Efeitos Anti-Plaquetários, o endotélio intacto impede que as plaquetas e os factores de coagulação plasmáticos entrem em contacto com a altamente trombogénica MEC Subendotelial. As plaquetas não-activadas não aderem ao endotélio, uma propriedade intrínseca da membrana plasmática endotelial. Além disso, mesmo que as plaquetas sejam activadas após lesão focal do endotélio, são impedidas de aderirem ao endotélio em redor pela Protaciclina Endotelial – PGI2 – e pelo óxido nítrico - NO. Ambos os mediadores são potentes vasodilatadores e inibidores da agregação plaquetária. As células endoteliais também exprimem adenosina difosfatase, que degrada o ADP e, assim, contribui para a inibição da agregação plaquetária; - Efeitos Anti-Coagulantes, estes efeitos são mediados por moléculas do tipo-hepatina associadas à membrana e pela trombomodulina, um receptor específico da trombina. As moléculas do tipo-hepatina actuam indirectamente, são co-factores que interagem com a anti-trombina III para inactivar a trombina - factor Xa - e vários outros factores de coagulação. A trombomodulina também actua indirectamente, ligando-se à trombina, convertendo-a de pró-coagulante a anti-coagulante, sendo capaz de activar a proteína C. A proteína C activada, por sua vez, inibe a coagulação por clivagem proteolítica dos factores Va e VIIIa. Este processo exige a presença de proteína S, sintetizada pelo endotélio, como um co-factor. O endotélio é
também uma importante fonte para de Factor Tecidual Inibidor da Via, uma molécula da superfície celular que complexa e inibe a activação dos factores VIIa e Xa; - Efeitos Fibrinolíticos, as células endoteliais sintetizam um Activador Tecidual do Plasminogénio - t-PA -, promovendo a actividade fibrinolítica para remover os depósitos de fibrina das superfícies endoteliais. Propriedades Pró-Trombóticas Embora o endotélio normalmente limite a coagulação sanguínea, também pode tornar-se pró-trombótico, com actividades que afectam as plaquetas, as proteínas de coagulação e do sistema fibrinolítico. - Efeitos Plaquetários, a lesão endotelial leva à aderência de plaquetas subjacentes à matriz extracelular, o que é facilitado pela produção de Factor Endotelial de Von Willebrand (vWF), um co-factor essencial para a ligação das plaquetas colagénio e a outras surperfícies. Deve notar-se que é um dos produtos normais do endotélio, não sendo especificamente sintetizado após lesão endotelial; - Efeitos Pró-Coagulantes, as células endoteliais também são induzidas pela endotoxina bacteriana ou por citocinas a sintetizarem o Factor Tecidual, que, como veremos, activa a Cascata Extrínseca da Coagulação. Por ligação com os Factores IXa e Xa activados, as células endoteliais aumentam ainda mais as actividades catalíticas destes factores coagulação; - Efeitos Anti-Fibrinolíticos, também as células endoteliais secretam inibidores do Factor Activador do Plasminogénio – PAIS-, estes inibem a fibrinólise. Em resumo, as células endoteliais intactas permitem principalmente inibir a adesão plaquetária e coagulação sanguínea. As lesões ou activação de células endoteliais, porém, resultam num fenótipo pró-coagulante que aumenta a formação local de coágulos.
Plaquetas As plaquetas desempenham um papel central em condições normais de hemostase. As plaquetas contêm dois tipos específicos de grânulos: - Grânulos α - expressam a molécula de adesão P-selectina nas suas membranas e contêm Fibrinogénio, Fibronectina, Factores V e VIII, Factor Plaquetário IV, Factor de Crescimento Plaquetário e TGF-β ; - Grânulos δ ou Densos- contêm Nucleótidos Adenosina (ADP e ATP), Cálcio Ionizado, Histamina, Serotonina e Adrenalina:
Após a lesão vascular, as plaquetas entram em contacto com os componentes da MEC que normalmente estão sequestrados sob um endotélio intacto; estes incluem o colagénio, proteoglicanos, fibronectina, e outras glicoproteínas adesivas. Em contacto com a MEC, as plaquetas sofrer três reacções: - Alterações da Aderência e Forma; - Secreção ou Reacção de Libertação; - Agregação. A Adesão Plaquetária à matriz extracelular é mediada em grande parte através de interacções com vWF, que funciona como uma ponte entre os receptores de superfície plaquetários e o colagénio exposto. As deficiências genéticas do vWF - Doença de Von Willebrand - ou do Receptor da Glicoproteína Ib (GPIB) – Sindrome de Bernard-Soulier - resultam em defeitos na adesão plaquetária e distúrbios hemorrágicos. A Secreção ou Reacção de Libertação do conteúdo de ambos os tipos grânulo ocorre logo após a adesão. O processo é iniciado pela ligação dos agonistas aos receptores de superfície plaquetários seguida da fosforilação de proteínas intracelulares em cascata. A liberação do conteúdo dos grânulos δ é especialmente importante porque o cálcio é necessário para a cascata de coagulação, e o ADP é um potente mediador da agregação plaquetário. O ADP também aumenta ainda mais a ADP libertação por outras plaquetas. Por fim, a activação plaquetária leva á expressão de complexos fosfolipídicos na superfície plaquetária, que fornecem locais de ligação e nucleação para o cálcio e factores de coagulação importantes na Activação da Via Intrínseca da Coagulação.
A Agregação Plaquetária segue-se à aderência e à secreção. Além do ADP, o Tromboxano A2 (TXA2), com efeitos vasoconstritores, é igualmente secretado pelas plaquetas, sendo também um importante estímulo para a agregação plaquetária. O ADP e TXA2 originam uma reacção auto-catalítica, culminando com a ampliação da acumulação plaquetária, permitindo a formação do Tampão Hemostático Primário. Esta agregação primária é reversível, mas com a activação da Cascata de Coagulação, a trombina é sintetizada. Esta liga-se a um Receptor da Superfície Plaquetária e, juntamente com o ADP e o TXA2, causam mais
agregação. A este processo segue-se a Contracção Plaquetária, criando uma massa de plaquetas irreversivelmente fundida - Metamorfose Viscosa - que constituiu o Tampão Hemostático Secundário. Ao mesmo tempo, a trombina converte o fibrinogénio em fibrina, dentro e sobre o tampão plaquetário, permitindo a cimentação das plaquetas no local. A trombina desempenha desta forma um papel central na formação de trombos, e, como tal, é um importante alvo terapêutico para a modulação do processo trombótico. O fibrinogénio não clivado é também um importante co-factor na agregação plaquetária. A activação das plaquetas pelo ADP induz uma mudança conformacional da superfície plaquetária para que os receptores GPIIb-IIIa possam vincular-se ao fibrinogénio. O fibrinogénio vai então ligar diversas plaquetas para formar grandes agregados. A importância destas interacções é demonstrada pela hemorragia observada em pacientes com alterações congénitas dos receptores GPIIb-IIIa – Trombastenia de Glanzmann. Vale a pena salientar que a Prostaciclina ou PGI2 é um potente vasodilatador e inibe a agregação plaquetária, enquanto o TXA2 é um potente vasoconstritor e activa a agregação
plaquetária. A interacção da PGI2 e TXA2 requintadamente equilibrada constitui um mecanismo para modular a função plaquetária humana: no estado normal, ela impede agregação plaquetária intravascular, mas depois da lesão endotelial, favorece a formação de tampões hemostáticos. Tanto os eritrócitos, como os leucócitos também são encontrados nos Tampões Hemostáticos; leucócitos aderem às plaquetas através da Molécula de Adesão P-Selectina e ao endotélio usando um grande número de receptores de adesão, que contribuem para a resposta inflamatória que acompanha trombose. A trombina também estimula directamente a adesão dos neutrófilos e monócitos, gerando fragmento de fibrina quimiotáticos que são originados a partir da clivagem do fibrinogénio. A série de eventos que ocorrem com as plaquetas pode ser resumida da seguinte forma: - As plaquetas aderem à MEC em locais de lesão endotelial, tornando-se activas; - Durante a activação, as plaquetas secretam os produtos dos seus grânulos e sintetizam TXA2; - As Plaquetas também expõem complexos fosfolipídicos que são importantes para a Via Intrínseca da Coagulação; - Endotélio Lesado ou Activado expõem o Factor Tecidual, este por sua vez desencadeia a Via Extrínseca da Coagulação; - A Libertação de ADP estimula a formação de um Tampão Hemostático Primário, sendo este eventualmente convertido, através do ADP, Trombina e TXA2, para um maior e definitivo – Tampão Secundário; - A Deposição de Fibrina e Âncoras estabilizam o agregado plaquetário. Cascata de Coagulação A Cascata de Coagulação constitui o terceiro componente do processo hemostático e é um importante contribuinte para a trombose. Esta cascata consiste essencialmente numa série de conversões enzimáticas, transformando pró-enzimas inactivas em enzimas activas, culminando na formação de trombina. A trombina converte então o precursor solúvel do fibrinogénio plasmático numa proteína fibrosa insolúvel, a fibrina. Cada reacção na via resulta da montagem de um complexo composto de uma enzima (Factor de Coagulação Activado), um substrato (Forma Pró-Enzimática do Factor de Coagulação), e um co-factor (Acelerador da Reacção). Tradicionalmente, a coagulação foi dividida numa Via Extrínseca e noutra Intrínseca, convergindo no ponto onde o Factor X é activado. A via intrínseca in vitro pode ser iniciada pela activação do Factor de HAGEMAN (Factor XII), enquanto a via extrínseca é activada pela Factor Tecidual. No entanto, esta divisão é principalmente um artefacto dos ensaios in vitro, existem, na realidade, diversas interconexões entre as duas vias. Além de catalisar os passos finais da cascata de coagulação, a trombina exerce também uma grande variedade de efeitos sobre a vascularização e inflamação local, participando ainda activamente no limitar da extensão do processo hemostático. A maioria destes efeitos é
induzida através da ligação a uma família de Receptores Activados por Proteases (PARs). O mecanismo de activação deste receptor extracelular envolve a clivagem final do receptor através da actividade proteolítica da trombina. Assim, a interacção da trombina e do seu receptor é essencialmente um processo catalítico, o que explica a impressionante potência de um relativo pequeno número de moléculas de trombina activada para obter efeitos finais. Uma vez activada, a cascata de coagulação deve ser restrita ao local da lesão vascular para impedir a coagulação de toda a árvore vascular. Além de restringir o factor de activação, a coagulação também é regulada por três tipos de anti-coagulantes naturais: - Anti-Trombinas (ex. Anti-Trombina III), inibem a actividade da trombina e outros factores serina-proteases IXa, Xa, XIa e XIIa. A Anti-Trombina III é activada pela sua ligação às moléculas do tipo-heparina nas células endoteliais, daí a utilidade clínica da administração de heparina para minimizar os fenómenos trombóticos; - Proteínas C e S, duas proteínas dependentes da vitamina K, sendo caracterizadas pela sua capacidade de inactivar os Factores Va e VIIIa; - Factor Tecidual Inibidor da Via, é uma proteína secretada pela endotélio, formando complexos com o Factor Xa e o Factor Tecidual-VIIa, inactivando-os rapidamente para limitar a coagulação. Além de induzir coagulação, activação da cascata da coagulação também define um movimento da cascata fibrinolítica, esta irá limitar o tamanho final do coágulo. Esta acção deve-se principalmente à síntese de plasmina. A Plasmina é derivada da degradação enzimática do seu precursor inactivo, o plasminogénio. Esta molécula decompõe a fibrina e interfere com a sua polimerização. Os produtos resultantes da clivagem da fibrina – FSPs -também podem agir como Anti-Coagulantes fracos. Qualquer plasmina livre forma rapidamente complexos com o α2-inibidor da plasmina, sendo inactivado.
Células endoteliais ainda modulam o equilíbrio coagulação/anti-coagulação, libertando Inibidores do Activador do Plasminogénio (PAIS); a fibrinólise deste blocos pela inibição da ligação do t-PA à fibrina, conferem um efeito global pró-coagulante. A concentração dos PAIS encontra-se aumentada na presença trombina, bem como de algumas citocinas e provavelmente desempenham um papel no desenrolar da trombose intravascular que acompanha as inflamações graves.
Trombose
Patogénese Existem três factores principais que predispõem à formação de trombos - Tríade Virchow: - Lesão Endotelial; - Estase ou Turbulência do Fluxo Sanguíneo; - Hipercoagulabilidade Sanguínea.
Lesão Endotelial Este é talvez um dos factores dominantes, sendo que, por si só pode levar à trombose. É particularmente importante para a formação de trombos que ocorrem no coração ou na circulação arterial, quando a presença de volumes sanguíneos elevados possam impedir a coagulação, impedindo adesão plaquetária ou diluindo os factores de coagulação. Assim, a formação de trombos dentro das cavidades cardíacas, juntamente com as placas ateroscleróticas ulceradas nas artérias, ou em locais de lesão vascular traumática ou inflamatória, são em grande devido à lesão endotelial. A perda física do endotélio leva à exposição dos componentes da MEC sub-endoteliais, promovendo a adesão plaquetária e a libertação de Factor Tecidual, conduzindo ao esgotamento local de PGI2 e PAs. No entanto, é importante salientar que não é necessário lesão ou perturbação física do endotélio para que se desenvolva trombose, qualquer perturbação no equilíbrio dinâmico do efeitos pró e anta-trombóticos do endotélio pode influenciar eventos locais coagulação. A disfunção endotelial, apesar de não existir perda celular, pode ocorrer devido ao stress hemodinâmico na hipertensão arterial, fluxo turbulento juntamente com insuficiência valvular, ou na presença de endotoxina bacteriana. Alterações no Normal Fluxo Sanguíneo A turbulência contribui para a trombose arterial e cardíaca por causar lesão ou disfunção endotelial, bem como através da formação de contra-correntes locais e zonas de estase; sendo que a estase se apresenta como um importante factor no desenvolvimento da trombose venosa. O fluxo sanguíneo normal é laminar, de tal modo que as plaquetas localizam-se centralmente no lumén vascular, estando por isso separadas do endotélio por uma zona de movimento lento e claro do plasma. A Estase e a Turbulência, por conseguinte, perturbam o fluxo laminar e conduzem as plaquetas ao contacto com o endotélio, evitam a diluição dos factores de coagulação, retardam o fluxo dos factores inibidores de coagulação e permitir a acumulação de trombos, por fim, promovem a activação das células endoteliais, predispondo à trombose local e à adesão leucócitárias. A turbulência e a estase claramente contribuem para a trombose num grande número de situações clínicas. As placas ateroscleróticas ulceradas não só expõem a MEC sub-endotelial, mas também são fontes de turbulência; enfartes do miocárdio não só estão associados a lesão endotelial, mas também originam regiões do miocárdio não-contrácteis, adicionando um elemento de estase na formação de trombos murais; a estenose da valva mitral resulta numa dilatação da aurícula esquerda, que em conjunto com fibrilação auricular, origina um local de profunda estase e uma localização privilegiada para a formação de trombos. Hipercoagulabilidade A Hipercoagulabilidade contribui para estados trombóticos com menor frequência, mas é, contudo, um componente importante na equação. É vagamente definido como qualquer alteração na cascata de coagulação que predispõe à trombose. As causas de hipercoagulabilidade podem ser alterações primárias/genéticas e secundária/adquiridas. Nas causas de hipercoagulabilidade herdada, as mutações no gene do FaCtor V e no gene da Pró-Trombina são as mais comuns. Cerca de 2% a 15% dos caucasianos possuem uma mutação específica no factor V, que conduz a uma resistência à inactivação do factor V mediada pela proteína C, promovendo a coagulação. A mudança de um único nucleotídeo na região 3'-UTR no gene da pró-trombina gene é bastante comum - 1% a 2% da população -, estando associada a elevados níveis de pró-trombina e um risco de trombose superior em quase três vezes. Níveis elevados homocisteína contribuem para a trombose venosa e arterial, bem como para o desenvolvimento da aterosclerose. Este efeito deve-se provavelmente devido à inibição da Anti-Trombina III e a Trombomodulina Endotelial.
Embora individualmente estas alterações hereditárias sejam pouco frequentes, colectivamente são significativas, por duas razões. Primeiro, as mutações subjacentes a estas trombofilias herdadas podem ser co-herdado, e o efeito de ter duas mutações sobre o risco de trombose é muito mais do que o risco aditivo. Em segundo lugar, as pessoas com essas mutações têm um risco muito maior do que indivíduos normais de desenvolver trombose venosa quando adquiridas causas de hipercoagulabilidade, como a gravidez. A hipercoagulabilidade herdada é definida por pacientes com idade inferior a 50 anos que se apresentam com trombose na ausência de qualquer predisposição adquirida. Ao contrário destas doenças hereditárias pouco comuns, a patogénese dos distúrbios trombóticos adquiridos são muito mais frequente numa série de cenários clínicos, no entanto caracterizam-se por serem mais complexos e multifactoriais. Em algumas situações factores como a estase ou lesão vascular podem ser os factores mais importante, noutros casos (ex. contraceptivos orais e o estado hiperestrogénico da gravidez) a hipercoagulabilidade pode ser parcialmente causada pelo aumento da síntese hepática de muitos factores de coagulação e da reduzida síntese de anti-trombina III. Entre as causas de distúrbios trombóticos adquiridos, a Síndrome de Trombocitopenia Induzida por Heparina [ocorre em cerca de 5% da população, esta síndrome ocorre quando a administração de heparina não fraccionada induz a formação de anticorpos que se ligam a complexos moleculares de heparina e ao factor plaquetário. Este anticorpo também pode ligar-se a complexos similares presentes nas superfícies endotelial e plaquetária, resultando n ativação plaquetária, lesão endotelial, e um estado pró-trombótico] e a Síndrome do Anticorpo Anti-Fosfolípidos [esta caracteriza-se por altos títulos de anticorpos circulantes dirigidos contra fosfolípidos aniónicos (ex. cardiolipina e pró-trombina). Os pacientes com anticorpos anti-cardiolipina têm também um falso-positivo no teste sorológico para sífilis. In vitro estes anticorpos interferem com a organização dos complexos fosfolipídicos e, assim, inibem a coagulação. No entanto, in vivo, os anticorpos induzem um estado de hipercoagulabilidade] merecem uma atenção especial. Morfologia - Trombose Os trombos podem formar-se em qualquer parte do sistema cardiovascular: dentro das cavidades cardíacas, nas cúspides valvares, ou em artérias, veias ou capilares. Têm um tamanho e forma variável, dependendo do local de origem e as circunstâncias que levaram ao seu desenvolvimento. Os Trombos Arteriais ou Cardíacos geralmente formam-se num local de lesão endotelial (ex. placas ateroscleróticas) ou turbulência; Os Trombos Venoso caracteristicamente surgem em locais de estase. A propagação da cauda do trombo, que se dá no sentido do fluxo sanguíneo, pode não estar bem fixa e, em particular nas veias, é propensa à fragmentação, e consequente criação de um êmbolo. Os Trombos Arteriais, quando formados no coração ou aorta, os trombos podem ter grosseiramente uma aparência laminar - Linhas de Zahn; estes são produzidos por camadas alternadas de plaquetas e fibrina (cor clara) misturados com algumas camadas mais escuras contendo mais glóbulos vermelhos (cor escura). Linhas de Zahn são significativos apenas na medida em que implica uma trombose no local do fluxo sanguíneo, em veias ou nas pequenas artérias, as lâminas não são tipicamente tão evidente, e, na verdade, um trombo formado no fluxo de sangue venoso normalmente assemelha-se a sangue coagulado. No entanto, uma avaliação cuidadosa revela geralmente uma aparência irregular, com lâminas mal-definidas. Quando surgem nas cavidades cardíacas ou no lúmen da aorta, costumam aderir à parede da estrutura subjacente e são denominados trombos murais. A contracção miocárdica anormal (ex.arritmias, cardiomiopatia dilatada, ou enfarte do miocárdio) leva a trombos murais cardíacos, enquanto a placa aterosclerótica ulcerada e dilatação aneurismática da aorta são os precursores à formação de trombos. Arteriopatias Oclusivas são geralmente devido a trombos, os sítios mais comuns, em ordem decrescente, são coronárias, cerebral e artérias femoral. O trombo é geralmente sobreposto a
uma placa aterosclerótica, embora outras formas de lesão vascular (ex. vasculite e traumatismos) podem estar envolvidos. Os trombos são tipicamente firmemente aderentes à parede arterial e ao corte apresentam-se de cor cinza-branca e friáveis, composto por um emaranhado de plaquetas, fibrina, hemácias e leucócitos. A Trombose Venosa, ou Flebotrombose, é quase invariavelmente oclusiva.A flebotrombose mais frequentemente afecta as veias dos membros inferiores (90% dos casos). Com menos frequência, podem desenvolver trombos venosos nos membros superiores, plexo peri-prostático, ou do ovário e nas veias peri-uterinas; em circunstâncias especiais, podem ser encontrados nos seios durais, na veia porta, ou as veias hepáticas. Na autópsia, post-mortem coágulos podem ser confundidos com trombos venosos. Em circunstâncias especiais, podem formar-se trombos nas válvulas cardíacas. As infecções bacterianas ou fúngicas por via sanguínea podem criar um ponto de apoio, levando a danos na válvula e ao desenvolvimento de grandes massas trombóticas, ou vegetações. Vegetações estéreis também podem desenvolver-se em válvulas não infectadas, originando estados de hipercoagulabilidade em alguns pacientes - Endocardite Trombótica Não-Bacteriana. Destino do Trombo Se um paciente sobrevive aos efeitos imediatos de uma obstrução vascular trombótica, os trombos podem sofrer um de quatro eventos: - Propagação, o trombo pode acumular mais plaquetas e fibrina, que acabará por conduzir a uma obstrução do vaso; - Embolização, trombos mais pequenos podem libertar-se e deslocar-se para outros locais; - Dissolução, podem ser removidos pela actividade fibrinolítica; - Organização e Recanalização, podem provocar inflamação e fibrose – organização - e podem, eventualmente, tornar-se recanalizados, isto é, pode restabelecer-se o fluxo vascular, ou podem ser incorporados na parede vascular, tornando-a mais espessa.
Quanto à dissolução, a activação da via fibrinolítica pode levar a uma rápida diminuição e até mesmo total lise do trombo recente. No caso dos trombos mais antigos, a polimerização da fibrina torna o trombo substancialmente mais resistentes à proteólise, e a lise é ineficaz. Isto é importante porque terapêutica fibrinolítica com infusões de agentes, tais como t-PA são susceptíveis de ser eficaz apenas para um curto período de tempo após a formação dos trombos.
Os trombos mais antigos tendem a tornar-se organizado. Com o tempo, canais capilares são formados, podendo anastomosar-se para criar um efeito de condutas de um trombo para o outro, e deste modo re-estabelecer, em certa medida, a continuidade do lúmen original. Embora os canais possam não conseguir restaurar fluxo significativo para muitos dos vasos obstruídos, tal recanalização do trombo pode potencialmente convertê-lo numa massa vascularizada de tecido conjuntivo. Com o tempo e contracção das células mesenquimais, o tecido pode ser incorporado como um edema sub-endotelial da parede do vaso, finalmente, apenas um nódulo fibroso pode continuar a marcar o local original do trombo. Ocasionalmente, em vez de se organizar, o centro de um trombo sofre digestão enzimática, presumivelmente como um resultado da libertação de enzimas lisossomais de leucócitos e plaquetas aprisionados. Isto é particularmente provável nos grandes trombos dentro de dilatações aneurismáticas ou as cavidades cardíacas. Se a colonização bacteriana ocorre, por exemplo um trombo degradado é um meio ideal, resultando, por exemplo, no chamado aneurisma micótico. Correlações Clínicas Os trombos são significativos porque provocam obstrução das artérias e veias, sendo possíveis fontes de êmbolos. O significado de cada um depende de onde o trombo ocorre. Assim, embora possa causar congestão venosa e edema nos leitos vasculares distais a uma obstrução, uma consequência grave é a sua embolização para os pulmões, causando a morte. Inversamente, apesar de trombo arterial poder embolizar, o seu papel na obstrução vascular em sítios críticos é muito mais importante.
Coagulação Intravascular Disseminada (DIC)
Uma variedade de doenças, variando de complicações obstétricas a uma avançada malignidade, podem ser complicações da DIC, caracterizando-se pelo súbito ou insidioso aparecimento generalizados de trombos de fibrina na microcirculação. Embora estes trombos normalmente não sejam visíveis em numa inspecção geral, são facilmente perceptíveis microscopicamente e podem causar insuficiência circulatória difusa, especialmente no cérebro, pulmões, coração e rins. Com o desenvolvimento dos múltiplos trombos, existe um rápido de plaquetas e proteínas da cascata de coagulação; ao mesmo tempo, os mecanismos fibrinolíticos activados, e como resultado um transtorno inicialmente trombótico pode evoluir para um grave distúrbio hemorrágico. Deve ressaltar-se que a DIC não é uma doença primária, mas sim uma complicação potencial de qualquer condição associada a uma activação generalizada da trombina.
Embolismo
Um êmbolo é uma massa intravasculares sólida, líquida ou gasosa que é transportada pelo sangue para um local distante do seu ponto de origem. Quase todos os êmbolos representam uma parte de um trombo, daí o termo frequentemente utilizado tromboembolismo. Salvo especificação em contrário, uma embolia deve ser considerada como sendo de origem trombótica. Inevitavelmente, os êmbolos chegam a vasos pequenos demais para permitir a sua passagem, resultando numa total ou parcial oclusão vascular. As potenciais consequências de tais eventos tromboembólicos são a necrose isquémica do tecido distal, conhecida como enfarte. Dependendo do local de origem, os êmbolos podem apresentar-se em qualquer parte da árvore vascular, os resultados clínicos são melhor compreendidos a partir da perspectiva de se apresentar na embolia pulmonar ou da circulação sistémica.
Tromboembolismo Pulmonar
Embolia pulmonar tem uma incidência de 20 a 25 por 100.000 pacientes hospitalizados. Embora a taxa de embolia pulmonar fatal tenha diminuído de 6% para 2% ao longo do último quarto de século, a embolia pulmonar ainda causa cerca de 200.000 mortes por ano nos Estados Unidos. Em mais de 95% dos casos, a embolia venosa profunda provêm de trombos nas veias da perna acima do nível do joelho. Estes êmbolos transportados através de canais progressivamente maiores e, geralmente, passam pelo lado direito do coração atingindo a vasculatura pulmonar. Dependendo do tamanho do êmbolo, que pode obstruir a principal artéria pulmonar, tendo impacto em toda a sua bifurcação, ou obstruir as arteríolas. Frequentemente, existem múltiplos êmbolos, talvez sequencialmente ou como uma chuva de pequenos êmbolos a
partir de uma única grande massa, em geral, o paciente que teve uma embolia pulmonar tem um alto risco de recorrência. Raramente, um êmbolo pode passar através de um defeito interatrial ou interventricular para ganhar acesso à circulação sistémica - Embolia Paradoxal. A maior parte das embolias pulmonares (60% a 80%) são clinicamente silenciosas, o que se deve ao reduzido tamanho dos êmbolos. Com o tempo, eles são submetidos a organização e incorporados na parede vascular. A morte súbita, insuficiência cardíaca direita - cor pulmonale -, ou colapso cardiovascular ocorre quando 60% ou mais da circulação pulmonar é obstruída com êmbolos. A obstrução das pequenas e médias artérias pode resultar numa hemorragia pulmonar, mas não costuma causar enfartes pulmonares devido ao fluxo sanguíneo duplo para a área da circulação brônquica. No caso de existir enfarte pulmonar, este geralmente apresenta uma morfologia trinagular de vértice orientado para a periferia. Múltiplos êmbolos ao longo do tempo podem causar hipertensão pulmonar com insuficiência cardíaca direita.
Tromboembolismo Sistémico
Tromboembolismo sistémico refere-se a um êmbolo a viajar dentro da circulação arterial. A maioria (80%) surge a partir de trombos murais intracardíacos, dois terços das quais são associados a enfartes da parede ventricular esquerda e outro quarto com dilatações e fibrilhação auricular esquerda. Os restantes são originários de aneurismas da aorta, trombos sobre placas arterioscleróticas ulceradas, ou fragmentação de uma vegetação valvular, com uma pequena fracção devido à embolia paradoxal, sendo que 10% a 15% das embolias sistémicas são de origem desconhecida. Em contraste com a embolia venosa, que tende a afectar principalmente em no pulmão, os êmbolos arterial podem viajar para uma ampla variedade de locais, o ponto de detenção depende da fonte e do volume do fluxo sanguíneo através dos tecidos a jusante. Os principais locais são as extremidades inferiores (75%) e no cérebro (10%), com o intestino, rins, baço, e extremidades superiores envolvidas em menor grau. As consequências da embolia sistémica dependem da extensão da garantia do suprimento vascular no tecido afectado, a vulnerabilidade do tecido à isquémia e, o calibre do vaso ocluído, em geral, os êmbolos arteriais causam enfarte dos tecidos jusante do vaso obstruídos.
Embolismo Gordo
Glóbulos microscópicos de gordura podem ser encontrados na circulação após fracturas de ossos longos ou, raramente, no trauma dos tecidos moles e queimaduras. Provavelmente, a gordura é libertada pela lesão da medula ou tecido adiposo e entra na circulação por ruptura das sinusóides ou de vénulas. Embora a embolia gordurosa traumática ocorra em cerca de 90%
dos indivíduos com graves lesões ósseas, menos de 10% desses pacientes apresentam quaisquer achados clínicos. A síndrome da embolia gorda é caracterizada por insuficiência pulmonar, sintomas neurológicos, anemia e trombocitopenia. Os sintomas geralmente começam 1 a 3 dias após a lesão, com início súbito de taquipneia, dispneia e taquicardia. Os sintomas neurológicos incluem irritabilidade e agitação, com progressão para delírio e coma. Os doentes podem apresentar-se com trombocitopenia, presumivelmente causados por plaquetas aderindo aos êmbolos gordura; a anemia pode resultar, como consequência da agregação eritrocitária e consequente hemólise. Uma erupção cutânea difusa com petéquias é observada em 20% a 50% dos casos e é útil no estabelecimento de um diagnóstico. Nas suas formas mais exuberante é uma síndrome fatal em até 10% dos casos.
Embolismo Gasoso
Bolhas de gás no interior da circulação podem obstruir o fluxo vascular quase tão facilmente como as massas trombóticas. O ar podem entrar na circulação durante procedimentos obstétricos ou como consequência de uma lesão da parede torácica. Geralmente, em quantidade superior a 100 cc surgem manifestações clínicas. As bolhas actuam como obstáculos físicos e podem coalescer para formar massas espumosas suficientemente grandes para ocluírem os grandes vasos. Uma forma particular de embolia gasosa, denominada de Síndrome da Descompressão, ocorre quando os indivíduos são expostos a mudanças bruscas na pressão atmosférica. Mergulhadores, trabalhadores de construção submarina, e os indivíduos em aviões em rápida ascensão estão todos em risco. Quando o ar é inalado em alta pressão, há aumento da quantidade de gás, principalmente nitrogénio, tornam-se dissolvidos no sangue e tecidos. Se o mergulhador então sobe demasiado rapidamente, o nitrogénio nos tecidos expande-se e as bolhas em solução no sangue parar formarem êmbolos gasosos. Os êmbolos gasosos podem induzir isquémia focal numa série de tecidos, incluindo o cérebro e o coração. Nos pulmões, edema, hemorragia e enfisema ou atelectasias focais podem aparecer, levando à angústia respiratória. O tratamento de embolia gasosa exige a colocação do indivíduo numa câmara de compressão, forçando as bolhas de gás a estarem de novo em solução. Posteriormente a lenta descompressão teoricamente permite a progressiva reabsorção e exalação dos gases para que as bolhas obstrutivas não se re-formem. A persistência de êmbolos gasosos leva a múltiplos focos de necrose isquémica, os sítios mais comuns são a cabeça do fémur, a tíbia, e os úmeros.
Embolismos de Líquido Amniótico
Embolia de líquido amniótico é uma complicação grave, mas felizmente incomum do trabalho de parto e durante o período pós-parto imediato (1 em cada 50.000 partos). Tem uma taxa de mortalidade de 20% para 40%, e tal como outras complicações obstétricas, a embolia de líquido amniótico tornou-se uma importante causa de mortalidade materna. O início é súbito e grave caracterizando-se por dispneia, cianose e choque hipotensivo, seguido de convulsões e coma. Se o paciente sobrevive à crise inicial, surge edema pulmonar geralmente, juntamente com a DIC em 50% dos indivíduos, devido à libertação de substâncias trombogénicas provenientes líquido amniótico. A causa subjacente é a infusão de líquido amniótico ou de tecidos fetais na circulação materna através de uma lesão na placenta ou ruptura da membrana das veias uterinas.
Enfarte
Um enfarte é uma área de necrose isquémica causada pela oclusão quer do suprimento arterial ou da drenagem venosa num determinado tecido. Nos Estados Unidos, mais de metade de todas as mortes são causadas por doenças cardiovasculares, bem como a maioria dos quais são atribuíveis aos enfartes miocárdico ou cerebral. O Enfarte Pulmonar é uma complicação comum, o enfarte intestinal é frequentemente fatal, a isquémica e necrose das extremidades – gangrena - é um grave problema na população diabética. Quase 99% de todos os enfartes resultam de eventos trombóticos ou embólicos, e quase todos como resultado da oclusão arterial. Ocasionalmente, o enfarte pode também ser causado por outros mecanismos locais, tais como vasoespasmo, expansão de um ateroma, devido à hemorragia dentro de uma placa, ou compressão extrínseca de um vaso. Outras causas incluem a torção dos vasos (ex. na torção testicular ou volvo intestinal), compressão do suprimento sanguíneo por edema ou pelo encarceramento de uma hérnia, ou a ruptura traumática do fornecimento de sangue. Embora a trombose venosa possa causar enfarte, é mais frequentemente apenas induz obstrução e congestão venosa. Enfartes causados por trombose venosa são mais prováveis em órgãos com um único canal de efluxo venoso, tais como os testículos e ovários.
Aneurismas
Um aneurisma é uma dilatação anormal localizada de um vaso sanguíneo ou a parede do coração. Quando o aneurisma é delimitado por componentes da parede arterial ou na parede atenuada do coração, ele é chamado de aneurisma verdadeiro. Estes aneurismas têm na maior parte dos casos uma origem aterosclerótica, sifilítica, congénita ou aneurisma do ventrículo esquerdo que pode seguir-se a um enfarte do miocárdio. Em contraste, um falso aneurisma ou pseudo-aneurisma é uma falha na parede vascular levando a um hematoma extravascular que livremente se comunica com o espaço intravascular, algumas vezes designado hematoma pulsante. O aneurisma mais comum é uma falsa ruptura pós-enfarte do miocárdio que foi contido por uma adesão pericárdica, ou por anastomose com uma artéria próxima. A dissecção arterial ocorre quando o sangue entra na parede da artéria, como um hematoma dissecante entre as suas camadas. A dissecção pode, mas não sempre, surge em artérias com aneurisma prévio. Os aneurismas e dissecções mais importantes são os que envolvem a aorta. O verdadeiro e falso aneurisma, bem como a dissecção, podem romper, originando uma hemorragia extensa. As duas causas mais importantes de aneurismas da aorta são aterosclerose e degeneração cística da média dos vasos arteriais. No entanto, qualquer vaso pode ser afectado por uma grande variedade de doenças que enfraquecem a parede, incluindo trauma, defeitos congénitos, infecções (ex. Aneurisma Micótico) vasculites.
Para fins descritivos, os aneurismas podem ser classificadas pela sua forma macroscópico e tamanho: - Aneurismas Saculares, são essencialmente esférica, envolvendo apenas uma parte da parede do vaso, e variam em tamanho de 5 a 20 cm de diâmetro, muitas vezes, parcial ou totalmente preenchido por um trombo; - Aneurismas Fusiformes, envolvendo um segmento de comprimento, o seu diâmetro vai até 20 cm e o seu comprimento é variável. Alguns podem envolver todo as porções ascendente e transversal do arco aórtico, enquanto outros podem envolver amplos segmentos da aorta abdominal ou até mesmo a ilíacas. No entanto, estas formas não são específicos para qualquer doença ou manifestações clínicas.
Lâmina D1 Dados Clínicos: Mulher, 76 anos, hipertensa. Dor torácica súbita em pontada com síncope. Faleceu 4 horas após entrada na Urgência.
Teoria – Dissecção Aórtica
A dissecção aórtica é uma doença catastrófica, caracterizada pela dissecção do snague entre os
planos laminares da média e ao longo deles, formando um canal preenchido por sangue no
interior da parede da aorta. Este canal rompe-se frequentemente, provocando hemorragia
maciça.Ao contrário dos aneurismas ateroscleróticos e sifílicos, a dissecção aórtica não está
obrigatoriamente associada a dilatação acentuada da aorta.
Adissecção aórtica ocorre principalemente em dois grupos de doentes: masi de 90% das
dissecções ocorrem em homens com idades entre 40 e 60 anos, que apresentaram HTA
anterior. O segundo grupo principal de doentes, geralmente mais jovens, possui uma
anormalidade localizada ou sistémica do tecido conjuntivo que afecta a aorta (p. ex. Síndrome
de Marfan). A dissecção pode também ser iatrogénica, como uma complicação do cateterismo
arterial. Raramente, por razões desconhecidas, a dissecção da aorta ou de seus ramos,
incluindo as artérias coronárias, ocorre durante ou após a gravidez. A ocorrência de dissecção
não é comum diante de aterosclerose significativa ou de outra causa de de fibrose medial,
como a sífilis.
Independentemente da etiologia subjacente, o estímulo que induz a laceração da intima e a
hemorragia aórtica intramural é desconhecido na maioria dos casos. Ainda assim, uma vez que
a laceração tenha ocorrido, a pressão arterial sistémica elevada promove a progressão do
hematoma medial. Terapias anti-hipertensivas agressivas são com frequência eficientes em
limitar uma dissecção em desenvolvimento.
MORFOLOGIA: Na dissecção espontânea, ocorre laceração da íntima, presumivelmente a
origem, atingindo a média da aorta ascendente sem contudo ultrapassá-la. Isto ocorre a cerca
de 10cm da valva aórtica. Estas lacerações são tipicamente transversas ou oblíquas, com 1 a
5cm de comprimento, possuindo bordos agudos e recortados. A dissecção pode estender-se
ao longo da aorta no sentido proximal em direcção ao coração, assim como no sentido distal,
algumas vezes chegando a alcançar as artérias ilíacas ou femorais. O hematoma dissecante
propaga-se de modo característico ao longo dos planos laminares da aorta, geralemente entre
o terço mediano e o terço externo. Frequentemente rompe-se provocando hemorragia
maciça. Nalguns casos, o sangue rompe novamente para dentro do lúmen da aorta,
produzindo uma laceração secundária ou distal na íntima e um novo canal vascular no interior
da média da parede aórtica (para produzir “aorta de duplo lúmen”, com um falso lúmen). Com
o passar do tempo, o falso lúmen pode tornar-se endotelizada (“dissecção crónica”).
Patologias morfologicamente detectáveis da parede da aorta não estão sempre presentes nas
dissecções. A lesão preexistente mais frequente, que pode ser histologicamente detectada, é a
degeneração da média, frequentemente denominada degeneração medial quística. A
degeneração medial caracteriza-se por fragmentação e separação dos elementos elásticos e
fibromusculares da túnica média por pequenos espaços semelhantes a fendas, onde o tecido
elástico normal foi perdido; estas áreas são preenchidas por matriz extracelular amorfa de
tecido conjuntivo e assemelham-se a quistos, embora não sejam quistos verdadeitos.
Finalmente, pode haver perda da lâmina elástica em grandes proporções. Assim, a
terminologia “necrose medial quistica”, como a degeneração medial é frequentemente
chamada, não é correcta, uma vez que nem necrose nem quistos estão presentes. Não há
inflamação. A degeneração medial da aorta frequentemente acompanha a síndrome de
Marfan.
Doentes com dissecção resultante de HTA possuem alterações variáveis inespecíficas na
histologia da parede da aorta, variando desde fragmentação branda do tecido elástico (mais
comum) até degeneração proeminente da média.
Resolução
1 – Qual o órgão envolvido em [A]? Aorta.
2 – Que lesão está identificada pela pinça na figura [A]. Laceração da íntima da aorta.
3 – O que observa nas fotos [B] e [C]? Hematoma Intramural na Aorta – Dissecção da Aorta: o sangue circula entre a média e a adventícia o que leva ao estreitamento do lúmen.
4 – A doente morreu por “tamponamento cardíaco por hemopericárdio”. Explique a razão. O hematoma intramural pode romper a adventícia e originar uma hemorragia para o interior do saco pericárdico e assim levar ao tamponamento cardíaco, ou seja, aumenta a pressão no coração que conduz a em enchimento incompleto dos ventrículos e, por isso, dá-se um bombeamento insuficiente, que pode levar ao choque e à morte.
Lâmina D2 Dados Clínicos: Toxicodependente, com 26 anos. Internado por dor lombar súbita. Falecimento ao 12º dia por complicações de endocardite infecciosa.
Teoria – Glomerulonefrite Proliferativa Aguda (Pós-estreptocócica, pós-infecciosa)
Este grupo de doenças glomerulares caracteriza-se anatomicamente por alterações
inflamatórias nos glomérulos e, clinicamente, por síndrome nefítica, caracterizada por
hematúria de origem glomerular, oligúria, HTA, edema e proteinúria.
Como o nome indica, este grupo de doenças caracteriza-se por proliferação difusa de células
glomerulares, associada à penetração de leucócitos. Estas lesões são tipicamente causadas por
imunocomplexos.
MORFOLOGIA: O clássico quadro diagnóstico é o de glomérulos aumentados e hipercelulares.
A hipercelularidade é causada por: infiltração por leucócitos, tanto neutrófilos quanto
monócitos; proliferação de células endoteliais e mesangiais; e em casos severos por formação
de crescentes. A proliferação e infiltração de leucócitos são difusas, isto é, envolvendo todos
os lóbulos de todos os gomérulos. Há também tumefação de células endoteliais e combinação
de proliferação, tumefacção e infiltração leucocitária que oblitera os lúmens capilares. Pode
haver edema intersticial e inflamação, e os túbulos frequentemente contêm cilindros
hemáticos.
À microscopia por imunofluorescência, há depósitos granulares de IgM, IgG e C3 no mesângio
e ao longo da membrana basal. Embora universalmente presentes, são frequentemente focais
e esparsos. Ao microscópio electrónico, visualizam-se, caracteristicamente, depósitos
discretos, amorfos e electrodensos, no lado epitelial da membrana, presumivelmente
representando os complexos antigénio-anticorpo na superfície celular epitelial. Depósitos
subendoteliais e intramembranosos também são comummente vistos, e depósitos mesangiais
podem estar presentes. Não raramente, detecta-se tumefacção de células endoteliais e
mesangiais.
Resolução
1 – Qual o órgão envolvido em [A]? Rim – enfarte renal
2 – Compare as figuras [B] e [C]. O que terá acontecido? Em C visualizamos hialinização e esclerose glomerular e em B uma zona hiperémica que a rodeia. O que aconteceu foi uma obliteração do lúmen dos capilares por edema e células inflamatórias, consequência da glomerulonefrite pós-infecciosa.
3 – Quais as complicações possíveis de uma endocardite infecciosa? Ruptura e disfunção valvular, sopros (devido a lesões do lado esquerdo ou condição anterior cardíaca do doente), êmbolos sépticos, sépsis, glomerulonefrite mediada por imunocomplexos (hematúria, albuminúria e falência renal), petéquias, hemorragias subungueais (faixas vermelhas lineares ou em forma de eixo de vela), lesões eritematosas ou hemorrágicas indolores nas regiões palmares e plantares (lesões de Janeway), nódulos subcutâneos na polpa dos dedos (de Osler), hemorragias retinianas (manchas de Janeway).
4 – O facto de ser toxicodependente é relevante neste contexto? O facto de ser toxicodependente pode indicar a utilização de seringas. Se as agulhas forem mal esterilizadas, o contacto com o lúmen endovenoso aumenta o risco de infecção.
Lâmina D3 Dados Clínicos: Homem saudável de 68 anos. Encontrado morto pela hospedeira de bordo à chegada a Lisboa depois de um voo sem escala de Maputo.
Teoria – Tromboembolismo Pulmonar
Coágulos de sangue que ocluem as grandes artérias pulmonares são quase sempre de origem
embólica.
A embolia pulmonar é uma complicação principalmente de doentes que já sofrem de algum
distúrbio subjacente, como uma doença cardíaca ou cancro; que ficaram imobilizados por dias
ou semanas; ou que sofreram fracturas do quadril, estando estes últimos em maior risco.
Estados hipercoaguláveis, sejam primários (p. ex., factor V de Leiden, protrombina 20210 A,
hiperhomocisteinemia e síndrome antifosfolipído) ou secundários (p. ex., obesidade, cirurgia
recente, cancro, uso de contraceptivos orais, gestação) são factores de risco frequentes. O uso
de linhas venosas centrais de demora pode ser um ninho para trombose atrial direita, que
pode ser uma fonte de embolia pulmonar.
A resposta patológica e o significado clínico de embolia pulmonar dependem da extensão da
obstrução do fluxo sanguíneo arterial, do tamanho do vaso ocluído, do número de êmbolos, do
estado geral do sistema cardiovascular e da libertação de factores vasoativos, como o
tromboxano A2 pelas plaquetas que se acumulam no local do trombo. A embolia resulta em
duas consequências fisiopatológicas principais: comprometimento respiratório, devido ao
segmento não- perfundido, apesar de ventilado, e o comprometimento hemodinâmico, devido
à maior resistência do fluxo sanguíneo pulmonar gerada pela obstrução embólica. Este último
leva à hipertensão pulmonar e pode causar uma insuficiência cardíaca direita.
MORFOLOGIA: As consequências morfológicas da oclusão embólica das artérias pulmonares
dependem do tamanho da massa embólica e do estado geral da circulação. Grandes êmbolos
podem ficar presos na artéria pulmonar principal ou nos seus principais ramos, ou alojarem-se
na bifurcação como um êmbolo em sela. A morte súbita ocorre devido, em grande parte, ao
bloqueio do fluxo de sangue através dos pulmões. A morte também pode ser causada por uma
insuficiência aguda do lado direito do coração (cor pulmonale agudo). Êmbolos menores
podem-se deslocar até vasos mais periféricos, onde podem causar enfartes. Em pacientes com
uma função cardiovascular adequada, o suprimento da artéria brônquica em geral pode
manter o parênquima pulmonar a despeito da obstrução do sistema pulmonar arterial. Sob
estas circunstâncias, podem ocorrer hemorragias, mas não se observa um enfarte do
parênquima pulmonar subjacente. Somente acerca de 10% dos êmbolos realmente causam
enfarte. Apesar de a arquitectura pulmonar subjacente poder ficar obscurecida pela sufusão
de sangue, as hemorragias são distinguidas pela preservação da arquitectura pulmonar; nesses
casos, a reabsorção do sangue permite a reconstrução da arquitectura pré-existente.
A embolia pulmonar geralmente causa enfarte somente quando a circulação já é inadequada,
como em pacientes com doenças cardíacas ou pulmonares. Por esse motivo, os enfartes
pulmonares tendem a ser incomuns no jovem. Cerca de três quartos de todos os enfartes
afectam os lobos inferiores, e em mais de metade ocorrem lesões múltiplas. Elas variam em
tamanho, desde lesões que mal são visíveis a olho nu até o envolvimento maciço de grandes
partes de todo um lobo. Caracteristicamente, elas estendem-se até à periferia da substância
pulmonar como uma cunha que apresenta seu ápice direcionado para o hilo do pulmão. Em
muitos casos, um vaso ocluído pode ser identificado próximo ao ápice do enfarte.
O enfarte pulmonar classicamente é hemorrágico e aparece como uma área vermelho-azulada
elevada nos estágios iniciais. Em geral, a superfície pleural aposta é coberta por um exsudato
fibrinoso. As células vermelhas começam a sofrer lise em 48 horas, e o enfarte torna-se mais
pálido e eventualmente vermelho-marrom conforme a hemosiderina é produzida. Com o
passar do tempo, a reposição fibrosa inicia-se nas margens, na forma de uma zona periférica
branco-acinzentada, e eventualmente converte o enfarte numa cicatriz contraída.
Histologicamente, a característica do enfarte pulmonar agudo é a necrose isquêmica da
substância pulmonar dentro da área de hemorragia, afectando paredes alveolares,
bronquíolos evasos. Se alterado por uma exsudação neutrofílica mais intensa e uma reacção
inflamatória mais aguda. Essas lesões são denominadas enfartes sépticos e algumas
convertem-se em absessos.
Resolução
1 – Qual o órgão envolvido? O que observa nas fotos [A] e o que indica a seta em [B]? Pulmão, a seta indica um trombo que oclui um vaso, trata-se, portanto, de um tromoboembolismo pulmonar.
2 – O que observa no lúmen dos vasos em [C]? Em C (microtrombo de fibrina) o vaso está obstruído por um material eosinofílico constituído por GV e plaquetas. Existe uma pequena reacção inflamatória com alguns neutrófilos a circundar o material.
3 – Por vezes estas situações não são logo fatais. Nesse caso o órgão em causa teria zonas de aspecto hemorrágico. Porquê? Antes da morte, podem existir evidências de enfarte hemorrágico, devido a necrose isquémica de coagulação por oclusão do suprimento arterial ou da drenagem venosa. Os enfartes hemorrágicos (vermelhos) ocorrem em tecidos laxos que permitem que os elementos sanguíneos se acumulem nas suas malhas de fibras. Nesse caso, depois de algum tempo, ver-se-ia hemossiderina devida à hemólise dos GV.
Lâmina D4 Dados Clínicos: Homem, 63 anos, fumador com estenose aórtica. História pregressa de angor. Morte súbita quando fazia “jogging” no Parque das Nações.
Teoria – Aterosclerose
A aterosclerose é caracterizada por lesões na intima denominadas ateromas ou placas
ateromatosas ou fibrogordurosas, que invadem e obstruem o lúmen vascular e enfraquecem a
média subjacente. Estas placas podem provocar sérias complicações. A presentando uma
distribuição mundial, a contribuição da aterosclerose para uma séria morbidade e mortalidade
no Ocidente é de longe maior do que a de qualquer outra doença – é responsável por
aproximadamente metade de todas as mortes.
A doença aterosclerótica sintomática acomete mais frequentemente as artérias que irrigam o
coração, o cérebro, os rins e as extremidades inferiores. EAM, enfarte cerebral (AVC),
aneurismas da aorta e doença vascular periférica (gangrena das pernas) são as principais
consequências da aterosclerose. A aterosclerose também oferece riscos por ter outras
consequências relacionadas com a perfusão arterial reduzida de modo crónico ou agudo, como
oclusão mesentérica, morte súbita cardíaca, doença cardíaca isquémica crónica e
encefalopatia isquémica.
Nas artérias pequenas, os ateromas podem obstruir os lúmens, comprometendo o fluxo
sanguíneo dos órgãos mais distantes e resultando em lesão isquémica. As placas podem
romper-se e precipitar-se, formando trombos que aumentam a obstrução do fluxo sanguíneo.
MORFOLOGIA: O processo-chave na aterosclerose é o espessamento da íntima e a acumulação
de lípidos. Um ateroma ou placa ateromatosa consiste numa lesão focal elevada que tem início
na íntima, apresentando um centro lipídico grumoso pouco consistente, amarelo
(principalmente colesterol e esteres de colesterol), coberto por uma cápsula fibrosa firme e
branca. Também denominadas placas fibrosas, fibrogordurosas, lípidicas ou fibrolipídicas, as
placas ateromatosas são brancas ou branco-amareladas, e invadem o lúmen das artérias.
Podem variar em diâmetro de 0,3 a 1,5 cm, algumas vezes fundindo-se para formar massas de
grande tamanho. As lesões ateroscleróticas geralmente envolvem apenas parte da
circunferência da parede arterial (lesões “excêntricas”), e são focais e variáveis ao longo do
vaso. Inicialmente focais e de distribuição esparsa, as lesões ateroscleróticas se tornam cada
vez mais numerosas e difusas conforme a doença progride.
Na distribuição característica das placas ateroscleróticas em humanos, a aorta abdominal é
em geral muito mais comprometida do que a aorta torácica, e as lesões tendem a ser muito
mais proeminentes ao redor das origens (óstios) dos ramos principais. Em ordem decrescente
(após a aorta abdominal inferior), os vasos mais intensamente acometidos são as artérias
poplíteas, as carótidas internas e os vasos do polígono de Willis. Os vasos das extremidades
superiores em geral não são atingidos, assim como as artérias mesentéricas e renais,
excetuando-se os seus óstios. Ainda assim, em cada caso, a gravidade da aterosclerose numa
artéria não serve de indicação de gravidade em outra. Num mesmo indivíduo, e mesmo numa
mesma artéria, podem coexistir lesões em diferentes estágios.
As placas ateroscleróticas possuem três principais componentes: (1) células, inluindo as CML,
macrófagos e demais leucócitos; (2) MEC, incluindo colágeno, fibras elásticas e proteoglicanos;
e (3) lípidos intracelulares e extracelulares. Estes componentes ocorrem em proporções e
configurações variadas em diferentes lesões. Tipicamente, a cápsula fibrosa superficial é
composta por CML e uma MEC relativamente densa. Abaixo e ao lado da cápsula (o ”ombro”),
está uma área celular composta por macrófagos, CML e linfócitos T. Na região profunda em
relação à cápsula fibrosa está localizado um núcleo necrótico, contendo uma massa
desordenada de lípidos (principalmente colesterol e esteres de colesterol), fendas de
colesterol, restos de células mortas, células espumosas, fibrina, trombos de organização
variada e outras proteínas plasmáticas. As células espumosas são células grandes repletas de
lípidos que derivam predominantemente de monócitos plasmáticos (macrófagos teciduais),
mas CML também podem absorver lípidos e transformar-se em células espumosas. Por fim,
principalmente ao redor da periferia das lesões, há geralmente evidências de
neovascularização (vasos sanguineos pequenos em proliferação). Ateromas típicos contêm
uma quantidade relativamente abundante de lípidos. Ainda assim, muitas das chamadas placas
fibrosas são compostas principalmente por CML e tecido fibroso.
As placas continuam a transformar-se e progressivamente expandem-se através de morte e
degeneração celular, síntese e degradação (remodelamento) da MEC e organização de
trombos. Além disso, os ateromas também sofrem calcificações frequentes. Pacientes com
calcificação coronariana avançada parecem ter um risco elevado de eventos coronarianos.
A lesão avançada da aterosclerose representa risco de desenvolver as seguintes alterações
patológicas de importância clínica:
- A ruptura focal, ulceração ou erosão da superfície luminal das placas ateromatosas podem
resultar na expressão de substâncias altamente trombogênicas, que induzem a formação de
trombas ou a liberação de fragmentos na corrente sanguinea, produzindo microêmbolos
compostos por componentes da lesão (êmbolos de colesterol ou ateroêmbolos);
- A hemorragia nas placas, principalmente nas artérias coronárias, pode ser provocada pela
ruptura da cápsula fibrosa ou dos capilares de paredes finas que vascularizam a placa. Um
hematoma contido pode expandir a placa ou provocar a sua ruptura;
- A trombose superposta, a mais temida complicação da aterosclerose, geralmente ocorre em
lesões rompidas (aquelas com ruptura, ulceração, erosão ou hemorragia), e pode obstruir o
lúmen parcial ou completamente. Os trombos podem ser incorporados na placa da íntima,
aumentando o seu tamanho;
- A dilatação aneurismática pode resultar da atrofia induzida por aterosclerose da média
subjacente, havendo perda de tecido elástico e resultando em fraqueza e ruptura em
potencial.
Resolução
1 – Qual o órgão envolvido? O que observa nas fotos [A] e [B]? Coração. Observa-se um coração com hipertrofia do tecido muscular cardíaco e tecido cicatricial.
2 – Como explica o aspecto dos núcleos em [C]? Trata-se de hipertrofia nuclear e hipercromasia devido a hiperplasia e maior produção de proteínas do citoesqueleto, o que implica maior actividade de transcrição génica.
3 – Que alterações observa em [D] e [E]? Observa-se uma artéria coronária com placa de ateroma (agulhas de colesterol, foam cells, …). Lúmen muito estreito. Estenose de 90% do lúmen e calcificação que forma buracos depois do corte.
4 – De que terá morrido o doente? Justifique a sua hipótese. A figura B retrata tecido denso hipovascular colagenoso (substituindo o tecido muscular cardíaco). Corresponde a microenfartes sucessivos que levaram a uma grande extensão das lesões e a alteração do aparelho cardionector, uma possível oclusão da artéria coronária pode ter levado a arritmia, angor, cansaço súbito e morte.
Lâmina D5 Dados Clínicos: Mulher, 57 anos, obesa. Edema e congestão do membro inferior esquerdo 3 dias após cirurgia de prótese total da anca desse lado.
Teoria – Trombose Venosa Profunda
As veias profundas da perna respondem por mais de 90% dos casos de tromboflebite e
flebotrombose, duas designações para inflamação e trombose venosa. Insuficiência cardíaca,
neoplasia, gestação, obesidade, estados pós-operatórios e repouso acamado ou imobilização
prolongados são as predisposições clínicas mais importantes. Síndromes genéticas de
hipercoagulabilidade também podem ser associadas com a trombose venosa.
Em pacientes com cancro, particularmente adenocarcinomas do pâncreas, cólon ou pulmão, a
hipercoagulabilidade ocorre como uma síndrome paraneoplásica. As tromboses venosas
resultantes tendem a aparecer num local e logo desaparecer, sendo seguidas por tromboses
de outras veias, dando origem à chamada tromboflebite migratória (sinal de Trousseau). O
plexo venoso periprostático nos homens e as veias pélvicas nas mulheres são locais adicionais,
assim como as veias de grande calibre do crânio e os seios durais, quando estes canais se
tornam inflamados por infecções bacterianas das meninges, ouvidos médios ou mastóides. De
modo semelhante, infecções na cavidade abdominal, como peritonite, apendicite aguda,
salpingite aguda e absessos pélvicos, podem levar a inflamação e trombose da veia porta.
Trombos nas pernas podem algumas vezes produzir sinais ou sintomas nos estágios iniciais,
podendo ser também assintomáticos. De facto, manifestações locais, incluindo edema distal à
veia oclusa, cianose acentuada, dilatação de veias superficiais, calor, sensibilidade, rubor,
inchaço e dor podem estar ausentes num paciente acamado. Em alguns casos, no entanto, a
dor pode ser induzida pressionando-se as veias afectadas, comprimindo os músculos da
panturrilha ou forçando a dorsoflexão do pé (sinal de Homan).
A embolia pulmonar é uma sequela clínica comum e grave da trombose de veias profundas da
perna. A contracção dos músculos ao redor tende a “ordenhar” os conteúdos frouxos dos seus
pontos de fixação na parede venosa. Não é incomum a primeira manifestação de
tromboflebite ser o desenvolvimento de um episódio de embolia; em doentes muito doentes,
a embolia pulmonar representa o golpe final.
Uma variante especial da flebotrombose primária é a plegmasia alba dolens (perna branca
dolorosa), referindo-se à trombose venosa ileofemoral que ocorre em grávidas antes ou após o
parto. Postula-se que o trombo (predisposto por estase provocada pela pressão do útero
gravídico e o estado de hipercoagulabilidade durante a gestação inicia a flebite, e a resposta
inflamatória perivenosa induz o bloqueio linfático com inchaços dolorosos.
MORFOLOGIA (TROMBOSE): Os trombos podem formar-se em qualquer parte do sistema
cardiovascular: dentro das cavidades cardíacas, nas cúspides valvares, ou em artérias, veias ou
capilares. Têm um tamanho e forma variável, dependendo do local de origem e as
circunstâncias que levaram ao seu desenvolvimento. Os Trombos Arteriais ou Cardíacos
geralmente formam-se num local de lesão endotelial (ex. placas ateroscleróticas) ou
turbulência; Os Trombos Venosos caracteristicamente surgem em locais de estase. A
propagação da cauda do trombo, que se dá no sentido do fluxo sanguíneo, pode não estar
bem fixa e, em particular nas veias, é propensa à fragmentação, e consequente criação de um
êmbolo.
Os Trombos Arteriais, quando formados no coração ou aorta, os trombos podem ter
grosseiramente uma aparência laminar - Linhas de Zahn; estes são produzidos por camadas
alternadas de plaquetas e fibrina (cor clara) misturados com algumas camadas mais escuras
contendo mais glóbulos vermelhos (cor escura). Linhas de Zahn são significativos apenas na
medida em que implica uma trombose no local do fluxo sanguíneo, em veias ou nas pequenas
artérias, as lâminas não são tipicamente tão evidente, e, na verdade, um trombo formado no
fluxo de sangue venoso normalmente assemelha-se a sangue coagulado. No entanto, uma
avaliação cuidadosa revela geralmente uma aparência irregular, com lâminas mal-definidas.
Quando surgem nas cavidades cardíacas ou no lúmen da aorta, costumam aderir à parede da
estrutura subjacente e são denominados trombos murais. A contracção miocárdica anormal
(ex.arritmias, cardiomiopatia dilatada, ou enfarte do miocárdio) leva a trombos murais
cardíacos, enquanto a placa aterosclerótica ulcerada e dilatação aneurismática da aorta são os
precursores à formação de trombos.
Arteriopatias Oclusivas são geralmente devido a trombos, os sítios mais comuns, em ordem
decrescente, são coronárias, cerebral e artérias femoral. O trombo é geralmente sobreposto a
uma placa aterosclerótica, embora outras formas de lesão vascular (ex. vasculite e
traumatismos) podem estar envolvidos. Os trombos são tipicamente firmemente aderentes à
parede arterial e ao corte apresentam-se de cor cinza-branca e friáveis, composto por um
emaranhado de plaquetas, fibrina, hemácias e leucócitos.
A Trombose Venosa, ou Flebotrombose, é quase invariavelmente oclusiva.A flebotrombose
mais frequentemente afecta as veias dos membros inferiores (90% dos casos). Com menos
frequência, podem desenvolver trombos venosos nos membros superiores, plexo peri-
prostático, ou do ovário e nas veias peri-uterinas; em circunstâncias especiais, podem ser
encontrados nos seios durais, na veia porta, ou as veias hepáticas. Na autópsia, post-mortem
coágulos podem ser confundidos com trombos venosos.
Em circunstâncias especiais, podem formar-se trombos nas válvulas cardíacas. As infecções
bacterianas ou fúngicas por via sanguínea podem criar um ponto de apoio, levando a danos na
válvula e ao desenvolvimento de grandes massas trombóticas, ou vegetações. Vegetações
estéreis também podem desenvolver-se em válvulas não infectadas, originando estados de
hipercoagulabilidade em alguns pacientes - Endocardite Trombótica Não-Bacteriana.
Resolução
1 – Qual a estrutura envolvida em [A]? Descreva os aspectos morfológicos em [B]. Trata-se de uma veia com tromboflebite como se pode verificar pela presença em B de um exsudado inflamatório agudo e de um trombo vermelho (com muitos GV e plaquetas).
2 – Porque ficou a doente com edema do membro inferior? Explica a razão. O trombo causa uma oclusão do lúmen da veia levando a um aumento da pressão hidrostática a montante e, com isso, provocando a saída de líquido para o interstício e desencadeando o edema.
3 – Qual a relação com a cirurgia de prótese total da anca? A cirurgia, além da lesão tecidual subjacente, implica uma recuperação em repouso que leva a estase sanguínea. Tudo isto contribui para alterações hemodinâmicas como a hipercoagulabilidade que, sendo um dos três factores da tríade de Virchow contribui para a formação do trombo (que neste caso é superficial pois tem tecido cutâneo, mas normalmente é profundo). 4 – Qual o risco que esta situação coloca à doente? Pode embolizar e levar a tromboembolismo pulmonar e, consequentemente, à morte.
Lâmina D6 Dados Clínicos: Rapaz, 14 anos, saudável. Aparecimento de dor escrotal que se foi acentuando e que motivou ida à urgência 5 horas depois.
Teoria – Torção do Cordão Espermático
A torção do cordão espermático pode cortar a drenagem venosa e o suprimento arterial para o
testículo. Geralmente, entretanto, as artérias de paredes espessas permanecem patentes, de
modo que ocorre ingurgitamento vascular intenso e enfarte venoso. Há dois tipos de torção
vascular. A torsão neonatal ocorre na fase intrauterina ou logo após o nascimento. Não
apresenta qualquer defeito anatómico associado para justificar a sua ocorrência. A torção no
adulto é tipicamente vista na adolescência, apresentando-se com o início abrupto de dor
testicular. Em contraste com a torção neonatal, a torção adulta resulta de um defeito
anatómico bilateral no qual o testículo apresenta mobilidade aumentada, gerando o que é
chamado de anormalidade em badalo de sino. Frequentemente ocorre sem qualquer lesão
desencadeadora; dor súbita anunciando a torção pode ocorrer mesmo durante o sono. A
torção é uma das poucas emergências urológicas. Se o testículo for explorado cirurgicamente e
reposicionado 6 horas após a ocorrência da torção, há uma boa chance de o testículo
permanecer viável. Para prevenir a catastrófica ocorrência de uma torção subsequente no
testículo contralateral, o testículo não afectado pela torção é fixado cirurgicamente ao escroto
(orquipexia).
MORFOLOGIA: Dependendo da duração do processo, as alterações morfológicas variam desde
congestão intensa até extravasamento disseminado de sangue para o tecido intersticial e
epidídimo. Finalmente, ocorre enfarte hemorrágico de todo o testículo. Nos estágios
avançados, o testículo é marcadamente aumentado e converte-se praticamente numa bolsa
de tecido macio, necrótico e hemorrágico.
Resolução
1 – Que estruturas estão presentes em [A]? Testículo.
2 – Qual a explicação para a cor em [B]? A cor vermelha deve-se ao sangue que se acumulou no testículo (devido ao suprimento venoso cortado, enfarte venoso e ingurgitamento vascular intenso). A consistência relativamente laxa permite a infiltração de sangue nos tecidos e enfarte vermelho, com acumulação de GV e plaquetas e de produtos da degradação dos GV (hemossiderina).
3 – Consegue identificar os diferentes componentes histológicos na lâmina [C]? 4- Qual a fisiopatologia subjacente aos achados macro e microscópicos.
L7 – Doenças Multissistémicas
Introdução Teórica
Acumulações Intracelulares
Uma das manifestações mais comuns de alterações metabólicas celular é a acumulação de
diversas substâncias intracelularmente. Estas acumulações podem ser sub-divididas em:
- Acumulação de constituintes celulares normais (ex. Água, Lípidos, Proteínas e Glícidos);
- Acumulação de constituintes não-celulares (ex. Compostos Minerais ou Agentes Infecciosos).
Estas acumulações podem ser transitórias ou
permanentes, podendo ser inofensivas para as
células-alvo, mas na maior parte dos casos são
extremamente agressivas. Este excesso de
substância pode ter origem na produção
exagerada por parte da célula, ou a célula pode
funcionar como um simples armazém de um
produto produzido em excesso noutro local como
consequência de um processo patológico.
Existem três fenómenos principais que tentam
explicar as causas da acumulação intracelular de
substâncias:
- Quantidades normais de substância são
produzidas ou pode mesmo existir um excesso de
produção, no entanto a taxa de metabolismo não
é suficiente para a remover;
- Uma substância endógena normal ou anormal
acumula-se porque existem defeitos genéticos ou
adquiridos no metabolismo, acondicionamento,
transporte ou secreção dessa substância;
- Uma substância exógena anormal é depositada e
acumulada porque as células não possuem
maquinaria enzimática para degradar a substância
nem transportá-la para outro local.
É importante referir que a natureza e origem das acumulações intracelulares é manter as
reservas necessárias a cada células individualmente. No entanto na presença de desequilíbrio
sistémico a situação pode descontrolar-se, desta forma a acumulação é progressiva e pode
chegar a níveis que chegam a lesar a célula, pode-se mesmo dar o extrema de as células
morrerem e consequentemente a morte do indivíduo.
Lípidos
A maior parte das classes de lípidos podem acumular-se nas células:
- Triglicéridos;
- Colesterol/Ésteres de Colesterol;
- Fosfolípidos.
Os fosfolípidos são o principal componente das figuras de mielina observadas nas células
necrosadas. No caso de complexo glicido-lipídicos se formarem resultam normalmente de
doenças do armazenamento lisossomal.
Colesterol e Ésteres de Colesterol
O metabolismo celular do colesterol é estreitamente regulado, de tal forma que a maior parte
das células utiliza-o na síntese das suas membranas sem que haja acumulação intracelular
deste composto.
A acumulação manifesta-se por vacúolos intracelulares, sendo um fenómeno comum em
diversos processos patológicos:
- Aterosclerose, nas placas ateroscleróticas, as células musculares lisas e os macrófagos da
túnica íntima dos grandes vasos são preenchidas por vacúolos, estando a maior parte deles
preenchidos por colesterol ou ésteres de colesterol. Algumas destas células adquirem uma
aparência esponjosa – células esponjosas – acumulando-se na camada íntima das artérias
originando os ateromas amarelados de aglomerados de colesterol;
- Xantomas, as acumulações intracelulares de colesterol nos macrófagos são igualmente
características das hiperlipidémias hereditárias. Agrupados de células esponjosas são
encontrados no tecido conjuntivo sub-epitelial da pela e nos tendões – xantomas;
- Inflamação e Necrose, macrófagos de aparência esponjosa são frequentemente observados
em locais de lesão ou inflamação, o que deriva da fagocitose do colesterol presente nas
membranas das células lesadas. Fosfolípidos e figuras de mielina são igualmente encontradas
nestas condições;
Proteínas
A acumulação intracelular de proteínas surge habitualmente como vacúolos arredondados,
gotículas eosinófilas ou agregados no citoplasma. Em algumas patologias particulares, como é
o caso da amiloidose, as proteínas alteradas depositam-se inicialmente no espaço extracelular.
Existem diversas causas para a acumulação de proteínas:
- Reabsorção nos túbulos contornados proximais do rim;
- Produção excessiva de uma proteína normalmente excretada;
- Defeito no processamento proteico:
- Defeitos intracelulares no transporte e secreção proteica;
- Stress do Retículo Endoplasmático induzido por proteínas sem configuração ou com uma
configuração errada;
- Agregação anómala de determinadas proteínas.
Amiloidose
Resulta da acumulação extracelular de agregados proteicos, originando uma substância
amorfa, homogénea e eosinófila. Ao depositar-se nos tecidos torna-os mais espessos e rígidos,
diminuindo a sua elasticidade e função.
Estes agregados tornam-se insolúveis, de forma irreversível, dado que adquirem uma
conformação quaternária anormal de forma espontânea.
Quando observada ao microscópio podem ser visíveis por coloração com o Vermelho do Congo
e apresentam cor birrefringente verde à luz polarizada.
A substância amilóide pode ser:
- Amiloide AL, ou de cadeia leve, que caracteristicamente origina-se pela proliferação de
linfócitos B que originam plasmócitos produtores de cadeias leves de imunoglobulinas, sendo
estas precursores do amilóide;
- Amiloide AA, ou associada ao amilóide, que devido à activação de macrófagos, que produzem
IL-6 e IL-1, dá-se uma activação das células hepáticas que irão produzir estas proteínas
anómalas;
- Amiloide Aβ, que deriva da clivagem do Percurso Glicoproteico Transmembranar APP, e que
se depositam nos casos de Doença de Alzheimer no parênquima cerebral em torno dos vasos
sanguíneos.
A amiloidose pode ser localizada ou sistémica, ou seja, afectar vários órgãos. Um dos casos
mais típicos de amiloidose localizada dá-se ao nível da língua, ou é possível distinguir as
impressões dentárias por aumento do volume da língua e consequente pressão contra as
arcadas dentárias.
Esta patologia pode ser primária, derivada da proliferação de linfócitos B, ou pode ser
secundária, como consequência de uma inflamação.
Os órgãos mais frequentemente afectados são o fígado, baço e rim.
Existe um tipo amiloidose hereditária, descrita pelo Professor Corino, e designada de
Amiloidose do Tipo Português. Esta caracteriza-se por uma acumulação ao nível dos membros,
originando uma atrofia neuropática, que afecta os componentes sensitivo e motor.
Alterações Hialinas
O termo hialina refere-se habitualmente a alterações intracelulares ou no espaço extracelular
que os tornam homogéneos, vítreos e de aspecto rosado quando coradas com H&E.
As acumulações intracelulares de proteínas são o exemplo mais característico de alterações
hialinas. No que toca a acumulações extracelular é mais difícil encontrar exemplos, no entanto
o colagénio de um tecido fibroso correspondente a uma cicatriz, é o exemplo mais comum.
Nos casos de hipertensão prolongada e de diabetes mellitus, as paredes das arteriolas,
especialmente as do rim, tornam-se hialinizadas devido ao extravasamento das proteínas
plasmáticas e a sua deposição na membrana basal.
Glicogénio
O excesso intracelular de depósitos de glicogénio é associado a alterações do metabolismo da
glicose ou glicogénio. Na diabetes mellitus mal controlada, o principal exemplo do
metabolismo anormal glicose, o glicogénio acumula-se no epitélio dos túbulos renais, miócitos
e células β das ilhotas de Langerhans do pâncreas. Glicogénio também se acumula num grupo
de doenças estreitamente relacionadas com as doenças genéticas, sendo na generalidade
referidas como doenças do armazenamento do glicogénio, glicogenoses. Nestas doenças,
defeitos enzimáticos na síntese ou degradação do glicogénio resultam armazenamento de
enormes quantidades deste substrato, com consequente lesão secundária e morte celular.
Pigmentos
Pigmentos são substâncias coloridas que podem ser exógenos, provenientes do exterior do
corpo, ou endógenos, sintetizados no próprio organismo.
- Pigmentos Exógenos, o pigmento exógeno mais comum é o carbono (ex. Poeira de Carvão),
um poluente atmosférico omnipresente na vida urbana. Quando inalado, é fagocitado pelos
macrófagos alveolares e transportado através de canais linfáticos para os gânglios linfáticos
regionais da árvore traqueo-brônquica. Agregados deste pigmento podem escurecer os
gânglios linfáticos que drenam a zona e parênquima pulmonar exposto – Antracose. Elevadas
quantidades destas acumulações podem induzir um enfisema ou uma reacção fibroblástica
que pode conduzir a uma grave doença pulmonar chamada Pneumoconiose dos Trabalhadores
do Carvão. As tatuagens são outro exemplo de pigmentação exógena localizada. Sabe-se que
os pigmentos não originam com frequência uma reacção inflamatória;
- Pigmentos Endógenos, inclui pigmentos como a lipofuscina, melanina, e alguns derivados da
hemoglobina.
- A Lipofuscina, ou pigmento do envelhecimento, é um pigmento intracelular, insolúvel,
granular, castanho-amarelado, que se acumula numa enorme variedade de tecidos
(especialmente o coração, fígado e cérebro), como um consequência da idade ou atrofia. A
lipofuscina deriva de complexos lipídicos e proteicos que derivam peroxidação por ROS
(Radicais Livres de Oxigénio) de Lípidos poliinsaturados das membranas subcelulares. Não é
prejudicial para a célula, mas é importante como um marcador de lesão por radicais-livres no
passado. O pigmento castanho, quando presentes em grandes quantidades, transmite uma
aparência própria ao tecido, denominando-se atrofia castanha. Através de microscopia
electrónica, o pigmento é observado como grânulos peri-nucleares electro-densos;
- A Melanina é um pigmento endógeno, castanho-escuro, produzido nos melanócitos na
sequência da oxidação da tirosina catalisada pela tirosinase a dihidroxifenilanina. É sintetizada
exclusivamente pelos melanócitos localizados na epiderme e age como um escudo contra a
radiação ultravioleta. Embora melanócitos sejam a única fonte de melanina, os queratinóticos
adjacentes na pele podem acumular o pigmento (ex. Sardas). No caso da melanina, existem
diversas patologias que podem cursar com hipopigmentação, que pode ser localizada e
limitada (ex. Vitíligo) ou generalizada (ex. Albinismo), ou hiperpigmentação;
- A Hemosiderina é um pigmento derivado da hemoglobina, tem uma aparência granular e
uma cor ouro-amarelo a castanho; este pigmento acumula-se nos tecidos quando existe um
excesso local ou sistémico de ferro. O ferro é normalmente armazenado dentro de células, em
associação com a proteína apoferritina, formando micelas de ferritina. A hemossiderina é um
pigmento que representa grandes agregados de ferritina, sendo facilmente visualizados por
microscopia de luz ou electrónica. O ferro pode ser inequivocamente identificado pela reacção
histoquímicas de azul prussiano. Embora a acumulação de hemossiderina seja geralmente
patológica, pequenas quantidades deste pigmento são normalmente encontradas em
fagócitos mononucleares da medula óssea, baço e fígado, onde há uma extensa destruição de
eritrócitos. O excesso local ferro e, consequentemente, de hemossiderina, podem ser
resultado de hemorragia. Após a lise das hemácias no local da hemorragia, os restos de
glóbulos vermelhos são fagocitados pelos macrófagos, a hemoglobina é então degradada em
lisossomas, com consequente acumulação de ferro, e conversão do grupo heme em
hemossiderina. A gama de cores através do qual passa a equimose reflecte estas
transformações: o original vermelho e azul da hemoglobina é transformado em vários tons de
verde-azul pela formação local de biliverdina e bilirrubina; a partir do grupo heme, o ferro da
hemoglobina é convertido em hemossiderina, originando uma tonalidade de castanho-
amarelado. Sempre que haja excesso de ferro sistémico, a hemossiderina deposita-se em
vários órgãos e tecidos - Hemossiderose.
A Hemossiderose ocorre por definição como consequência de:
- Aumento da absorção de ferro na dieta;
- Insuficiência de ferro;
- Anemia hemolítica;
- Transfusões Sanguíneas.(os glóbulos vermelhos transfundidos exógenos constituem uma
carga de ferro).
Na maioria dos casos de hemossiderose sistémica, o pigmento de ferro não danifica as células
parenquimatosas ou o funcionamento do órgão. No entanto, acumulações mais extensas de
ferro são vistas na Hemocromatose Hereditária, que neste caso originam lesão tecidual,
incluindo fibrose hepática, insuficiência cardíaca e diabetes mellitus.
Calcificações Patológicas
As calcificações são um processo comum, característico de uma grande variedade de estados
patológicos, sendo caracterizado pela deposição anormal de sais de cálcio, juntamente com
pequenas quantidades de ferro, magnésio e outros minerais. Quando a deposição ocorre em
tecidos mortos ou em necrose, é denominada Calcificação Distrófica, ocorrendo na ausência
de alterações do metabolismo do cálcio (ou seja, com níveis séricos normais de cálcio). Em
contraste, a deposição de sais de cálcio em tecidos normais, é conhecido como Calcificação
Metastática e quase sempre reflecte alguma perturbação no metabolismo do cálcio (ex.
Hipercalcémia). É importante salientar que enquanto a hipercalcémia não é uma condição
prévia para calcificação distrófica, este estado pode agravá-la.
Calcificação Distrófica
A Calcificação Distrófica é encontrada em áreas de necrose de qualquer tipo. É quase
inevitável a sua presença nos ateromas avançados de aterosclerose ou associada á lesão da
túnica íntima na aorta e grandes artérias. Embora a calcificação distrófica possa ser um achado
acidental pode indicar a existência de lesão celular no passado, que pode também ser uma
causa de disfunção orgânica. Por exemplo, calcificação pode desenvolver no envelhecimento
ou lesão de válvulas cardíacas, resultando em válvulas severamente comprometidas no que
toca ao seu movimento. Calcificação distrófica das válvulas da aorta é uma importante causa
de estenose aórtica no idoso.
Patogénese
A patogénese da calcificação distrófica envolve o início (ou nucleação) e a propagação, sendo
que ambas podem ser intra ou extracelular; o produto final é a formação de cristais de fosfato
de cálcio. A iniciação em locais extracelulares ocorre em vesículas vinculadas à membrana com
cerca de 200 nm de diâmetro. Em condições normais estas vesículas nas cartilagens e ossos
são conhecidos como vesículas de matriz, e no caso de calcificação patológica são
provenientes de células degeneradas. Pensa-se que o cálcio é inicialmente concentrado nestas
vesículas devido à sua afinidade para a membrana de fosfolípidos, enquanto os fosfatos se
acumulam como resultado da acção de fosfatases vinculadas á membrana. O início da
calcificação intracelular ocorre na mitocôndria de células mortas ou em necrose que perderam
a sua capacidade de regulação do cálcio intracelular. Após o início em qualquer local,
propagação deste fenómeno termina com a formação de cristais. Esta formação de cristais é
dependente da concentração de Ca2+ e PO4- nos espaços extracelulares, a presença de
inibidores minerais, bem como do grau de colagenização, sendo que este último factor
aumenta a taxa de crescimento do cristal.
Calcificação Metastática
A Calcificação Metastática pode ocorrer nos tecidos normais, sempre que haja hipercalcémia.
As quatro principais causas de hipercalcémia são:
- Aumento da secreção da Hormona Paratiroideia (PTH), quer devido a tumores primários da
paratiróide ou a produção de PTH relacionada com proteínas de outros tumores malignos.
- Destruição do osso, devido aos efeitos da aceleração turnover ósseo (ex. Doença de Paget),
imobilização, ou tumores (ex. Catabolismo ósseo aumentado associado ao mieloma múltiplo,
leucemia, ou metástases ósseas difusas);
- Desequilíbrios relacionados com uso de vitamina D, incluindo intoxicação por Vitamina D e
Sarcoidose;
- Insuficiência renal, em que existe a retenção de fosfato, originando hiperparatiroidismo
secundário.
Lâmina E1 Dados Clínicos: Homem, 55 anos, internado de urgência por hematemeses. Durante o internamento foi-lhe proposto um transplante hepático.
Teoria – Hemocromatose
A hemocromatose é caracterizada pela acumulação excessiva de ferro no corpo, a maior parte
do qual é depositado em órgãos parenquimatosos, como o fígado e o pâncreas. Uma vez que
os humanos não possuem uma via excretora importante para o ferro, a hemocromatose
resulta de um defeito genético que causa absorção excessiva de ferro ou como uma
consequência da admininstração parentérica de ferro (geralmente na forma de transfusões). A
hemocromatose hereditária é um distúrbio herdado recessivo homozigótico. As formas
adquiridas de hemocromatose com fontes conhecidas do excesso de ferro são chamadas de
hemocromatoses secundárias.
MORFOLOGIA: As alterações morfológicas da hemocromatose hereditária são caracterizadas
principalmente por:
- deposição de hemossiderina nos seguintes órgãos (em ordem decrescente de gravidade):
fígado, pâncreas, miocárdio, hipófise, glândula suprarrenal, glândula tiróide e paratiróides,
articulações e pele (detectada pela reacção histológica do azul-da-prússia ou por análise de
absorção atómica do tecido);
- cirrose;
- fibrose pancreática.
No fígado, o ferro torna-se evidente, primeiro, sob a forma de grânulos amarelo-ouro de
hemossiderina no citoplasma dos hepatócitos periportais, os quais coram de azul com a
coloração do azul-da-prússia. Com carga de ferro cada vez maior, há comprometimento
progressivo do resto do lóbulo, juntamente com pigmentação do epitélio dos ductos biliares e
células de Kupffer. O ferro é uma hepatotoxina directa, e a ausência de inflamação é
característica. Nessa fase, o fígado é tipicamente ligeiramente maior do que o normal, denso e
castanho-chocolate. Os septos fibrosos desenvolvem-se lentamente, levando em última
análise a um padrão de cirrose micronodular num fígado intensamente pigmentado.
A determinação bioquímica da concentração de ferro hepático em tecido não-fixado constitui
o padrão para a quantificação do conteúdo hepático de ferro. Em indivíduos normais, o
conteúdo de ferro do tecido hepático não-fixado é menos de 1000µg por grama de peso seco
de fígado. Os doentes adultos com hemocromatose hereditária exibem acima de 10000 µg;
concentrações acima de 22000µg são associadas ao desenvolvimento de fibrose e cirrose.
O pâncreas torna-se intensamente pigmentado, tem fibrose intersticial difusa e pode exibir
alguma atrofia parenquimatosa. A hemossiderina é encontrada nas células acinares e das
ilhotas, e ás vezes no estroma fibroso intersticial. Muitas vezes o coração está aumentado e
tem grânulos de hemossiderina dentro das fibras miocárdicas, produzindo uma notável
coloração castanha no miocárdio. Uma delicada fibrose intersticial pode aparecer. Embora a
pigmentação da pele seja parcialmente atribuível à deposição de hemossiderina nos
macrófagos e fibroblastos dérmicos, a maior parte da pigmentação resulta da produção
aumentada de melanina na epiderme. A combinação desses pigmentos confere uma cor cinza-
ardósia característica à pele. Com deposição de hemossiderina nos revestimentos sinoviais
articulares, pode desenvolver-se uma sinovite aguda. A deposição excessiva de pirofosfato de
cálcio danifica a cartilagem articular, produzindo uma poliartrite incapacitante chmada
psudogota. Os testículos podem estar pequenos e atróficos, mas não costumam estar
pigmentados de modo significativo. Admite-se que a atrofia seja secundária a um transtorno
no eixo hipotalâmico-hipofisário.
Resolução
1 – Identifique o órgão. Quais são as principais alterações presente? Fígado. Esteatose (macro e microvesicular com padrão de transformação focal esteatósica e não com padrão difuso que é o mais normal), hemocromatose e cirrose (faixas de fibrose; fígado micronodular).
2 – Identifique a alteração presente em B, C, D e E. Identifique as células. Em B, faixas de fibrose e micronódulos, em C, pigmentos de hemossiderina no citoplasma dos hepatócitos. Em D, esteatose e, por fim, em E, pigmentos de hemossiderina dispersos no citolpasma com arquitectura hepática alterada.
3 – Se quisesse confirmar o seu diagnóstico como o faria? Coloração de azul da Prússia, coloração de Perls ou por análise de absorção atómica do tecido. 4 – Qual seria o aspecto macroscópico deste órgão? O fígado pode estar aumentado (hepatomegália) com cor castanho-chocolate. 5 – Como denomina a alteração presente em D?
Lâmina E2 Dados clínicos: Homem, 65 anos, obeso e diabético há mais de 20 anos. Morreu no hospital com uma pneumonia.
Teoria – Glomerulosclerose Diabética
A Diabetes Mellitus é uma causa importante de morbidade e mortalidade renal e a nefropatia
diabética é uma das principais causas de insuficiência renal. Na maioria dos casos, as lesõs
mais comuns envolvem os glomérulos e estão associadas clinicamente a três síndromes
principais: proteinúria não-nefrótica, síndrome nefrótica e insuficiência renal crónica.
Entretanto, a diabtes também afecta as arteríolas, causando esclerose arteriolar hialinizante;
aumenta a susceptibilidade ao desenvolvimento de pielonefrite e particularmente necrose
papilar e causa diversas lesões tubulares. O termo “nefropatia diabética” aplica-se ao
conglomerado de lesões que frequentemente ocorrem concomitantemente no rim diabético.
As alterações morfológicas nos glomérulos incluem espessamento da membrana basal
glomerular, esclerose mesangial difusa e glomerulosclerose nodular, sendo idênticas na
diabetes tipo 1 e 2. Em suma, dois processos podem participar das lesões glomerulares
diabéticas plenamente desenvolvidas: um defeito metabólico, possivelmente ligado a
produtos avançados da glicosilação (AGEs), que é responsável pela MBG espessada e matriz
mesangial aumantada que ocorrem nos doentes; e efeitos hemodinâmicos, associados à
hipertrofia glomerular, que também contribui para o desenvolvimento de glomerulosclerose.
MORFOLOGIA:
ESPESSAMENTO DA MEMBRANA BASAL CAPILAR. Ocorre em praticamente todos os diabéticos
e de forma generalizada, independentemente da presença de proteinúria, e é parte da
microangiopatia diabética. Espessamento puro da membrana basal pode ser detectado apenas
à ME. Estudos morfométricos cuidadosos demonstram que esse espessamento se inicia
apenas dois anos após o inicio da diabetes tipo 1, e após cinco anos já ocorre um aumento de
30%. O espessamento ocntinua progressivamente, sendo geralmente concomitante ao
alargamento mesangial. Simultaneamente, há espessamento das membranas basais tubulares.
ESCLEROSE MESANGIAL DIFUSA. Esta lesão consiste no aumento difuso da matriz mesangial e
pode ocasionar proliferação leve de células mesangiais precocemente no proceeso patológico,
mas a proliferação celular não é uma parte proeminente desta lesão. O aumento mesangial
está tipicamente associado ao espessamento geral da MBG. As deposições na matriz são PAS-
positivas. À medida que a doença progride, a expansão de áreas mesangiais pode estender-se
a configurações nodulares. Demonstrou-se que a expansão progressiva do mesângio apresenta
uma boa correlação com medidas de dterioração da função renal, como a proteinúria
crescente.
GLOMERULOSCLEROSE NODULAR. Esta entidade também é conhecida como
glomerulosclerose intercapilar ou doença de Kimmelstiel-Wilson. As lesões glomerulares
tomam a forma de nódulos de matriz ovóides ou esféricos, frequentemente laminados,
situados na periferia do glomérulo, PAS-positivos. Jazem no centro mesangial dos lóbulos
glomerulares e podem ser cercados por alças capilares periféricas evidentes ou alças
acentuadamente dilatadas. Os nódulos frequentemente exibem características de
mesangiólise com desgaste da interface mesângio/lúmen capilar, interrupção de sítios em que
os capilares estão ancorados aos eixos mesangiais e formação resultante de microaneurismas
capilares à medida que os capilares não contidos se distendem para fora como resultado de
pressões e fluxos intracapilares. Geralmente, nem todos os túbulos no glomérulo individual
são envolvidos por lesões nodulares, mas mesmo lóbulos e glomérulos não envolvidos
demonstram esclerose mesangial difusa acentuada. À medida que a doença avança, os
nódulos individuais crescem e podem finalmente comprimir e englobar os capilares,
obliterando o tufo glomerular. Estas lesões nodulares são frequentemente acompanhadas por
acumulações proeminentes de material hialino nas alças capilares. Como consequência das
lesõe glomerulares e arteriolares, o rim sofre isquémia, desenvolve atrofia e fibrose intersticial
e geralmente ocorre uma contracção geral do seu tamanho.
Glomerulosclerose nodular e esclerose mesangial difusa são lesões fundamentalmente
semelhantes do mesângio. A lesão nodular, entretanto, é altamente, mas não completamente,
específica para diabetes, desde que se tome o cuidado de excluir a glomerulonefrite
membranoproliferativa (lobular), a glomerulopatia associada à deposição de imunoglobulinas
de cadeias leves e monoclonais, amiloidose e algumas raras entidades, que podem ter uma
aparência semelhante. Aproximadamente 15 a 30% dos doentes com diabetes de longo prazo
desenvolvem glomerulosclerose nodular, na maioria das vezes associada à insuficiência renal.
Resolução
1 – Na autópsia foram recolhidos vários órgãos para estudo. Identifique este órgão. Rim.
2 – Há alterações em várias estruturas. Quais? Glomérulo, pequenas arteríolas e capilares.
3 - Descreva-as. MB tubular glomerular e dos capilares espessadas (PAS+), esclerose mesangial difusa (aumento da matriz mesangial devido ao espessamento da MBC), arteriosclerose hialina na arteríola aferente e glomerulosclerose difusa.
4 – No estudo de microscopia electrónica quais seriam as alterações mais frequentemente observadas? Aumento da matriz mesangial sobre o lúmen dos capilares glomerulares; MBG e cápsula de Bowman bem delineadas e espessadas, a formar nódulos primariamente e só depois a adquirir aspecto difuso.
5 – Que outras alterações patológicas podem ocorrer, neste órgão, em doentes diabéticos? Pielonefrite.
Lâmina E3 Dados Clínicos: Mulher, 65 anos, diagnóstico de mieloma múltiplo, há 10 meses.
Teoria – Complicações Renais de Mieloma Múltiplo
Tumores malignos não-renais, particularmente aqueles de origem hematopoiética, afectam os
rins de diversas formas. Os envolvimentos mais comuns são tubulo-intersticiais, causados por
complicações do tumor (hipercalcemia, hiperuricémia, obstrução de ureteres) ou terapia
(irradiação, hiperuricémia , quimioterapia, infecções em doentes imunossuprimidos). À medida
que a sobrvida de doentes com neoplasias malignas aumenta, também o fazem as
complicações renais. O envolvimento renal é muitas vezes uma manifestação de mau
prognóstico do mieloma múltiplo e, por vezes, domina o quadro clínico destes doentes.
Diversos factores contribuem para o dano renal:
- proteinúria de Bence-Jones e nefropatia por cilindros. A principal causa de disfunção renal
está relacionada à proteinúria de Bence-Jones (de cadeias leves), porque a insuficiência renal
se correlaciona bem com a presença e quantidade dessa proteinúria e é incomum na sua
ausência. Dois mecanismos parecem ser responsáveispela toxixidade renal das proteínas de
Bence Jones. Primeiro, algumas cadeias leves podem ter diferentes potenciais nefrotóxicos.
Segundo, as proteínas de Bence Jones combinam-se com a glicoproteína urinária (proteína de
Tamm-Horsfall) sob condições ácidas para formar grandes cilindros tubulares,
histologicamente distintos, que obstruem os lúmens tubulares e também induzem uma
reacção inflamatória característica ao redor dos cilindros (nefropatia por cilindros);
- amiloidose, formada por acumulação de cadeias leves com uma predisposição para formar
fibrilas amilóides, que ocorrem em 6 a 24% dos doentes com mieloma;
- doença da deposição de cadeias leves. Em alguns doentes, cadeias leves depositam-se nas
membranas basais glomerulares e mesângio em formas não-fibrilares, causando uma
glomerulopatia, ou em mebranas basais tubulares, oque pode causar nefrite tubulointersticial;
- hipercalcémia e hiperuricémia, frequentemente presentes nestes doentes.
MORFOLOGIA: As alterações tubulointersticiais no mieloma múltiplo são bastante
características. Os cilindros tubulares de Bence-Jones são vistos como massas amorfas azuis ou
rosadas, às vezes cocentricamente laminadas, frequentemente com uma aparência fracturada,
preenchendo e distendendo os lúmens capilares. Alguns dos cilindros são rodeados por células
gigantes multinucleadas que são derivadas de fagócitos mononucleares. O tecido intersticial
adjacente geralmente demonstra uma resposta inflamatória inespecífica e fibrose.
Ocasionalemente, os cilindros deslocam-se por erosão do stubulos para o interstício, onde
provocam uma reacção inflamatória granulomatosa. As características histológicas da
amiloidose, doença por deposição de cadeias leves e nefrocalcinose e infecção também
podem estar presentes.
Resolução
1 – Qual o órgão? Rim
2 – Descreva as alterações presentes, identificando quais as estruturas mais afectadas. As estruturas mais afectadas são o glomérulo e os vasos visualizando-se depósitos extracelulares de amilóide com completa substituição dos glomérulos por este, infiltrado mononuclear, algumas células multinucleares.
3 – No diagnóstico histológico desta alteração é importante efectuar a sua confirmação por outros métodos complementares de histoquímica. Qual é a coloração mais usada? Vermeho do Congo
4 – Como confirmaria esta positividade? Amilóide fica vermelho rosado com luz polarizada à bi-refrigência verde-amarela que se deve às dobras ß-cruzadas entre as fibras.
Lâmina E4 Dados Clínicos: Homem, 55 anos, com história de episódios dolorosos na 1ª articulação metatarso-falângica acompanhados de calor, rubor e dor com agravamento nocturno.
Teoria – Gota
A gota é o ponto terminal comum de um grupo de distúrbios que produzem hiperuricémia. Ela
é marcada por ataques transitórios de artrite aguda iniciados pela cristalização dos uratos
dentro e ao redor das articulações, eventualmente levando a uma artrite gotosa crónica e à
deposição de massas de uratos nas articulações e em outros sítios, criando tofos. Os tofos
consistem em grandes agregados de cristais de urato cercados por reacção inflamatória. A
maioria dos doentes, mas nem todos, com gota crónica também desenvolve neuropatia por
urato.
MORFOLOGIA: As alterações morfológicas distintivas da gota são a artrite aguda, a artrite
tofácea crónica, tofos em diversos locais, e, algumas vezes, nefropatia gotosa.
Aartrite aguda caracteriza-se por um denso infiltrado neutrofílico que permeia a sinovial e o
líquido sinovial. Os cristais de urato monossódico frequentemente são encontrados no
citoplasma dos neutrófilos e estão dispostos em pequenos grumos na sinovial. Eles são longos,
esguios, com o formato de agulha, não sendo birrefringentes. A sinovial está edemaciada e
congestionada, além de conter linfócitos, plasmócitos e macrófagos dispersos. Quando o
episódio da cristalização regride e os cristais são ressolubilizados, o ataque agudo remite.
Artrite tofácea crónica evolui a partir da precipitação repetitiva de cristais de urato durante
ataques agudos. Os uratos podem incrustar fortemente as superfícies articulares e formar
depósitos visíveis na sinovial. A sinovial fica hiperplástica, fibrótica e espessada pelas células
inflamatórias, formando um pannus que destrói a cartilagem subjacente. Nos casos graves, a
condição progride para uma anquilose fibrosa ou óssea, resultando numa perda completa da
função articular.
Tofos são as marcas patognomónicas da gota. Eles são formados por grandes agregações de
cristais de urato circundados por uma intensa reacção inflamatória de macrófagos, linfócitos e
células gigantes tipo corpo estranho, que podem ter englobado completa ou parcialmente
massas de cristais. Os tofos podem aparecer na cartilagem articular das articulações e nos
ligamentos periarticulares, tendões e tecidos moles, incluindo o olecrânio, tendões de Aquiles
e lóbulos das orelhas. Menos frequentemente, podem ocorrer nos rins, cartilagens nasais, pele
das pontas dos dedos, regiões palmares, e qualquer outra parte do corpo. Os tofos superficiais
podem gerar grandes ulcerações na pele sobrejacente.
Nefropatia gotosa refere-se ao distúrbio renal associado à deposição de cristais de urato
monossódico no interstício da medula renal, algumas vezes formando tofos, precipitações
intratubulares ou cristais de ácido úrico livres e a produção de cálculos renais de ácido úrico.
As complicações secundárias, como a pielonefrite, podem ocorrer, particularmente, quando os
uratos induzem alguma obstrução urinária.
Resolução
1 – Identifique onde se localiza a lesão [A]. Dentro e em redor da articulação (cartilagens, ligamentos, tendões e tecidos moles).
2 – Descreva os principais aspectos histológicos. Deposição de cristais de urato que formam massas (tofos gotosos), rodeados por fibroblastos reactivos, células mononucleares e células gigantes multinucleadas.
3 – Qual é o seu diagnóstico? Gota
4 – Justifique a presença das células assinaladas em E e F. Devido a inflamação provocada por deposição do material endógeno.
Lâmina E5 Dados Clínicos: Homem, 73 anos, fumador desde os 15 anos de idade.
Teoria – Pneumoconiose
O termo “pneumoconiose” foi originalmente cunhado para descrever uma reacção pulmonar
não-neoplástica à inalação de peiras minerais encontradas no ambiente de trabalho.
Actualmente, o termo inclui doenças induzidas por partículas orgânicas e inorgânicas e por
fumos e vapores químicos.
Apesar de as pneumoconioses resultarem de exposições ocupacionais bem definidas a agentes
específicos encontrados no ar, as partículas da poluição aérea também apresentam efeitos
deletérios sobre a população geral, em especial em áreas urbanas.
Pneumoconiose dos Trabalhadores com Carvão (PTC). As medidas de redução da poeira nas
minas de carvão ao redor do globo reduziram drasticamente a incidência de doença induzida
pela poeira do carvão. O espectro dos achados pulmonares em trabalhadores do carvão é
amplo, variando da antracose assintomática à pneumoconiose simples dos trabalhadores do
carvão (PTC) com pouca ou nenhuma disfunção pulmonar até à PTC complicada, ou fibrose
maciça progressiva (FMP), na qual a função pulmonar está comprometida.
MORFOLOGIA: Antracose é a lesão pulmonar induzida pelo carbono mais inócua em mineiros
de carvão e é comummente observada em todos os habitantes urbanos e tabagistas. O
pigmento de carbono inalado é englobado por macrófagos alveolares ou intersticiais, que se
acumulam no tecido conjuntivo ao longo dos linfáticos, incluindo os linfáticos pleurais, ou no
tecido linfóide organizado ao longo dos brônquios ou do hilo pulmonar. Na autópsia, faixas
lineares e agregados de pigmento antracótico prontamente identificam os linfáticos
pulmonares e marcam os nódulos linfáticos pulmonares.
A PTC simples caracteriza-se pelas máculas de carvão e os nódulos de carvão, que são um
pouco maiores. A mácula de carvão consiste em macrófagos carregados de carvão; o nódulo
também contém pequenas quantidades de uma delicada rede de fibras colagenosas. Apesar
de essas lesões serem dispersas por todo o pulmão, os lobos superiores e as zonas superiores
dos lobos inferiores são envolvidos de forma mais intensa. Elas localizam-se numa região
primariamente adjacente aos bronquíolos respiratórios, o local de acumulação inicial da
poeira. No curso esperado, ocorre dilatação dos alvéolos adjacentes, uma condição que
algumas vezes é denominada enfisema centrolobular.
A PTC complicada (FMP) ocorre num cenário de FTC simples e em geral requer muitos anos
para que se desenvolva. Ela caracteriza-se por cicatrizes intensamente escurecidas, com mais
de 2cm, algumas vezes chegando aos 10cm. Elas em geral são múltiplas. Microscopicamente,
as lesões consistem em colagénio denso e pigmentos. O centro da lesão quase sempre é
necrótico, provavelmente o resultado de uma isquémia local.
Resolução
1 – Onde se localiza o pigmento? Nos pulmões; ao longo das estruturas broncoalveolares, tecido conjuntivo dos septos interalveolares, ao longo da rede de vasos linfáticos e abaixo da pleura.
2 – Descreva-o. Pigmento negro, grosseiro, intracelular (dentro de macrófagos) ou extracelular.
3 – Qual é a origem? Carvão do fumo do tabaco. O pigmento induz fibrose e inflamação e tipicamente vai instalar-se nos feixes vásculo-nervosos, levando a fibrose da pleura, inflamação da serosa e aderência da pleura.
4 – Qual é a outra alteração do parênquima pulmonar? Enfisema antrolobular paracinar. Quando atingem um determinado tamanho passam a designar-se bolhas de enfisema sendo que, a sua ruptura pode levar a um pneumotórax.
5 – Como a relaciona com os dados clínicos? Hábitos tabágicos durante anos, acumulando-se o pigmento de carbono nos macrófagos alveolares e interstício que o fagocitam e migram para os gânglios linfáticos (incluindo pleurais) e tecido linfático organizado ao longo dos bronquíolos e hilo pulmonar.
Lâmina E6 Dados Clínicos: Mulher, 50 anos, obstipação crónica.
Teoria – Pseudomelanose Cólica
Acumulação de um pigmento na mucosa do cólon, que quando observado por colonoscopia
tem um aspecto castanho. Este pigmento não é lesivo, é apenas um marcador de lesão celular.
No corte histológico, é possível observar macrófagos na lâmina própria que têm um pigmento
castanho granular (com PAS cora de vermelho). Inicialmente pensou-se que este pigmento era
melanose, um derivado da melanina (daí o nome de Pseudomelanose cólica) mas depois
chegou-se à conclusão que era lipofuscina (na verdade não é só lipofuscina, mas esta é o
constituinte predominante).
A presença deste pigmento está associada sobretudo ao uso de laxantes que conduzem a
lesões nas células e à deposição do pigmento na mucosa.
Resolução
1 – Identifique qual é a alteração neste órgão? Pseudomelanose cólica
2 – Qual é a estrutura/camada do órgão afectada? A lâmina própria da mucosa do cólon.
3 – A alteração é intra ou extracelular? Intracelular.
4 – Se é intracelular, identifique a(s) célula(s). Macrófagos.
5 – Que coloração histoquímica poderá utilizar para identificar esta alteração? PAS diastase
6 – Qual é o mecanismo etiopatogénico desta alteração? Por uso continuado de laxantes que provoca um aumento do turnover das células da mucosa do cólon, aumentando o número de células em apoptose e os detritos celulares resultantes que são fagocitados pelos macrófagos.
L8 e L9 – Neoplasias
Introdução Teórica No ano 2000, havia 10 milhões de novos casos de cancro e de 6 milhões de mortes por cancro
no mundo. No entanto, segundo a American Cancer Society, estima-se que o cancro causou
cerca de 556.000 mortes em 2003, correspondendo a 1500 mortes por cancro por dia,
representando cerca de 23% de todas as mortes no EUA. No entanto existem descobertas
promissoras, que nos permite que uma maior percentagem de cancros seja curada ou detida
nos dias de hoje.
Definições
Neoplasia significa literalmente o processo de "novo crescimento", e um novo crescimento é
chamado de uma neoplasia. O termo tumor foi originalmente aplicado ao inchaço causado
pela inflamação. As neoplasias também pode induzir inchaços, mas esse fenómeno está
habitualmente associado a processos arrastados.
A Oncologia é o estudo dos tumores ou neoplasias. Cancro é o termo comum para todos os
tumores malignos. Embora as antigas origens deste termo sejam um pouco incertas,
provavelmente deriva do latim para o caranguejo, o cancro, presumivelmente porque um
cancro "adere a qualquer parte que se aproveita sob uma forma obstinada como o
caranguejo."
O oncologista britânico Willis definiu neoplasia da seguinte forma: "Uma neoplasia é uma
massa anormal de tecido, o crescimento do que excede e é descoordenada com a dos tecidos
normais e persiste na mesma maneira excessiva após a cessação do estímulo que evocou a
mudança. "
Sabemos que a persistência de tumores, mesmo após a retirada do estímulo desencadeante,
resulta de alterações genéticas hereditárias que são passadas para a descendência das células
tumorais. Estas alterações genéticas permitem a proliferação excessiva e não regulamentada,
que se torna autónoma, embora geralmente os tumores continuem a depender do hospedeiro
para sua nutrição e suprimento sanguíneo. Como vamos discutir mais tarde, toda a população
de células dentro de um tumor se origina a partir de uma única célula que tenha sofrido uma
alteração genética e, portanto, os tumores são constituidos por células clonais.
Nomenclatura
Todos os tumores, benignos e malignos, tem dois componentes básicos:
- Proliferam as células neoplásicas, que constituem o seu parênquima;
- Proliferação do estroma de suporte constituído por tecido conjuntivo e vasos sanguíneos.
Embora as células parenquimatosas representem a proliferação de vanguarda, ou seja, da
neoplasia propriamente dita, indo por isso determinar o seu comportamento e consequências
patológicas, o crescimento e evolução das neoplasias encontra-se dependente do seu estroma.
A proliferação do estroma e consequente suprimento sanguíneo adequado é necessário, bem
como o tecido conjuntivo fornece a estrutura para a proliferação do parênquima. Além disso,
existe toda uma comunicação entre as células tumorais e do estroma que parece influenciar
directamente o crescimento de tumores. Em alguns tumores, o estroma de suporte é escasso
e, portanto, a neoplasia apresenta uma superfície lisa e de consistência normal. Por vezes, as
células parenquimatosas estimulam a formação de uma abundante de colagénio, referido
como desmoplasia. Alguns tumores, por exemplo, alguns cancros da mama são de
consistência pétrea e contornos irregulares. A nomenclatura dos tumores é feita com base no
seu componente parenquimatoso.
Tumores Benignos
Em geral, tumores benignos são designados pelo sufixo -oma anexando-o ao nome da célula
de origem. Tumores de células mesenquimais geralmente seguem esta regra. Por exemplo, um
tumor benigno decorrente de células fibroblásticas é denominado fibroma, um tumor
cartilagínio é um condroma, e um diagnóstico de tumor de osteoblastos é um osteoma.
Em contrapartida, a nomenclatura dos tumores epiteliais benignos é mais complexa, sendo as
classificações diversas, algumas com base nas células de origem, outras na arquitectura
microscópica, e outros ainda nos seus padrões macroscópicos.
Adenoma é o termo aplicado a uma neoplasia epitelial benigna que apresenta padrões
glandulares, bem como para tumores derivados de glândulas, mas não necessariamente
reproduzindo um padrão glandular.
Neoplasias epiteliais benignas que originem projecções da superfície epitelial, quer sejam
visíveis macroscópicamente, quer microscópicamente, são referidos como papilomas.
Aqueles que fazem grandes massas quísticas, como no ovário, são referidos como
cistadenomas.
Alguns tumores produzem padrões papilares que surgem em espaços quísticos e são
designados de cistadenomas papilíferos.
Quando uma neoplasia, benigna ou maligna, produz macroscopicamente uma projeção acima
da superfície mucosa, por exemplo, para o lúmen gástrico ou cólico, é denominado um pólipo.
O termo pólipo preferencialmente é restricto a tumores benignos.
Tumores Malignos
A nomenclatura dos tumores malignos basicamente segue o mesmo esquema utilizado para
neoplasias benignas, com algumas adições. Tumores malignos que surgem no tecido
mesenquimatoso são normalmente denominados sarcomas, porque apresentam pouco
estroma de tecido conjuntivo e por isso são carnosos.
Neoplasias malignas com origem nas células epiteliais, provenientes de qualquer uma das três
camadas germinativas, são designados carcinomas.
Os carcinomas podem ser ainda mais qualificado:
- crescimento com padrão glandular é designado um adenocarcinoma;
- produtor de células com aparência escamosa, em qualquer epitélio do corpo é denominado
carcinoma pavimento-celular.
É prática comum especificar, quando possível, o órgão de origem. Não raro, porém, um cancro
composto por células indiferenciadas do tecido de origem desconhecida, deve ser designado
simplesmente como um tumor maligno pouco diferenciados ou indiferenciados.
Frequentemente, a diferenciação divergente de uma única linhagem celular parenquimatosas
num tecido origina
os chamados
tumores mistos. O
melhor exemplo
disto é o tumor
misto de origem na
glândula salivar.
Estes tumores
epiteliais contêm
componentes
dispersos num
estroma mixóide
que, às vezes,
contém ilhas de
cartilagem ou
mesmo osso. Todos
estes elementos,
acredita-se, surgem
a partir de células
epiteliais e
mioepiteliais com
origem na glândula
salivar, assim, a
designação destas
neoplasias é mais
frequentemente
adenoma
pleomórfico.
Teratomas, em contrapartida, são compostos de uma variedade de tipos de células
parenquimatosas representativas de mais do que uma camada germinativa, normalmente
todas as três. Estes tumores surgem a partir de células totipotentes e, portanto, são
encontradas principalmente nas gónadas; podem ainda surgir, apesar de raramente, em
células primitivas sequestradas noutros locais. Estas células totipotentes diferenciam-se ao
longo de diversas linhas germinais, produzindo tecidos que podem ser identificados, por
exemplo, como pele, músculo, gordura, epitélio intestinal, e mesmo estruturas dentáriana. Um
padrão é particularmente comum visto no Teratoma Quístico do Ovário, que se diferencia
principalmente de modo a originar um tumor quístico revestido por pele repleta de cabelo,
glândulas sebáceas e estruturas dentárias.
Durante gerações, carcinomas de melanócitos foram chamados melanomas, embora a
designação correcta seja melanocarcinomas; do mesmo modo, carcinomas de origem
testicular são teimosamente designados seminomas, e hepatocarcinomas são frequentemente
denominados de hepatomas.
A nomenclatura dos tumores é importante porque denominações específicas têm implicações
clínicas específicas, mesmo entre os tumores resultantes do mesmo tecido.
Biologia do Crescimento Tumoral
A história natural da maioria dos tumores malignos podem ser divididos em quatro fases:
- Alteração maligna na célula alvo, referida como transformação;
- Crescimento das células transformadas;
- Invasão local;
- Metástases distantes.
Na grande maioria dos casos, um tumor benigno pode ser distinguido de um tumor maligno
com grande confiança em função da morfologia, por vezes, no entanto, uma neoplasia desafia
a categorização. Algumas características anatómicas podem sugerir inocência, enquanto
outros apontam em direção potencial cancerígeno. Em última análise, o diagnóstico
morfológico não pode predizer o comportamento biológico ou curso clínico de uma neoplasia
com certeza absoluta. No entanto, não é a regra, em geral, existem critérios morfológicos
pelos quais os tumores benignos e malignos podem ser diferenciados, bem como o
comportamento dos tumores pode ser previsto.
Diferenciação e Anaplasia
Diferenciação refere-se às células neoplásicas que se assemelham a células normais, tanto
morfologicamente, como funcionalmente; a ausência de diferenciação é denominada
anaplasia.
Tumores bem diferenciados são compostos por células semelhantes a células normais
maduras do tecido de origem da neoplasia. Os tumores pouco diferenciados têm células
primitivas de aspecto indiferenciadas, constituindo células não diferenciadas. Na maior parte
dos casos os tumores benignos são bem diferenciados; num tumor benigno do músculo liso –
leiomioma - tão estreitamente semelhante à célula normal que pode ser impossível
reconhecê-lo como um tumor por exame microscópico das células individuais. Só a massa
dessas células num nódulo divulga a natureza da lesão neoplásica.
As neoplasias malignas, em contraste, vão desde padrões bem diferenciados para
indiferenciados. A falta de diferenciação, ou anaplasia, é considerada um marco de
transformação maligna. Anaplasia implica uma reversão de um elevado nível de diferenciação
para um nível inferior. Na realidade, as neoplasias não sofrem este processo de regressão,
surgem geralmente a partir de células estaminais que estão presentes nos tecidos
especializados.
A falta de diferenciação, ou anaplasia, é marcado por uma série de alterações morfológicas:
- Pleomorfismo, tanto as células como os núcleos caracteristicamente exibem variação no
tamanho e forma;
- Morfologia Nuclear Anormal, caracteristicamente os núcleos contêm uma abundância de
DNA e são extremamente corados de forma escura - hipercromáticos. Os núcleos são
desproporcionalmente grande para a célula, e a relação núcleo-citoplasma pode chegar a 1:1
em vez do normal 1:4 ou 1:6. A forma nuclear é muito variável, apresentando-se a cromatina
muitas vezes agregada e distribuída ao longo da membrana nuclear. Grandes nucléolos estão
geralmente presentes nesses núcleos;
- Mitoses, em comparação com tumores benignos e algumas neoplasias malignas bem
diferenciadas, os tumores indiferenciados geralmente possuem um grande número de
mitoses, reflectindo a maior actividade proliferativa das células parenquimatosas. A presença
de mitoses, no entanto, não indica necessariamente que um tumor é maligno ou de que o
tecido seja neoplásico. Uma característica morfológica das mitores na neoplasia maligna é o
caractér atípico, bizarro, originam uma célula tripolar, quadripolar, ou multipolar;
- Perda da Polaridade, para além das anormalidades citológicas, a orientação das células
anaplásicas encontra-se nitidamente perturbada;
- Outras mudanças, outra característica é a formação de de células gigantes, algumas possuem
apenas um único núcleo polimórfico enorme e outras com dois ou mais núcleos. Estas células
gigantes não devem ser confundidas com as células inflamatórias de langhans ou células
gigantes de corpo estranho, que são derivadas de macrófagos e contêm muitos núcleos
pequenos de aparência normal. No cancro de células gigantes, os núcleos são hipercromáticos
e grandes em relação à célula. O crescente número de células tumorais exige um suprimento
sanguíneo, muitas vezes o estroma vascular é escasso e, em muitos tumores anaplásicos,
grandes áreas centrais sofrem necrose isquémica.
A displasia é encontrada principalmente em epitélios, e é caracterizada por um conjunto de
mudanças que incluem uma perda de uniformidade das células individuais, bem como uma
perda na sua arquitectura espacial. As células displásicas também apresentam um considerável
pleomorfismo e muitas vezes contêm núcleos hipercromáticos que são anormalmente grandes
para o tamanho da célula. O número de mitoses é mais abundante do que o habitual, embora
quase sempre obedeçam a padrões normais. A arquitectura do tecido pode ser desordenado,
no entanto estas alterações estão confinadas a uma camada no interior do epitélio. Quando as
mudanças displásicas se tornam mais evidentes e envolvem toda a espessura do epitélio, mas
a lesão permanece confinado ao tecido normal, é considerado um estádio pré-cancerigeno e é
referido como carcinoma in situ. Uma vez que a células tumorais avancem além do limites
normais, o tumor é dito como invasivo. Estas alterações são frequente em fumadores de longa
data e no Esófago de Barrett, caracterizando-se por uma displasia epitelial, acompanhada de
metaplasia, que antecede frequentemente o aparecimento de cancro. No entanto, a displasia
não tem de obrigatoriamente progredir para cancro. Alterações ligeiras a moderadas que não
impliquem mudanças de toda a espessura do epitélio podem ser reversíveis, e com a remoção
do estímulo desencadeador, o epitélio pode voltar ao normal.
Nos casos em que os tumores se encontram bem diferenciados geralmente originam os
productos normais das células que lhes deram origem; como exemplo temos um tumor nas
células de um glândula endócrina, indo originar um aumento dos níveis da hormona, podendo
desta forma ser monitorizado o desenvolver do tumor. Em alguns casos, novas funções podem
emergir. Alguns tumores podem produzir proteínas fetais, que não normalmente produzidas
por células do adulto. Existem ainda casos em que tumores de origem não endócrina
produzem hormonas, sendo que esta produção tomada a designação de ectópica.
Taxas de Crescimento
Uma questão fundamental em biologia tumoral é a compreensão dos factores que influenciam
as taxas de crescimento de tumores e o papel destes factores nos resultados clínicos e
respostas terapêuticas
Quanto tempo leva para produzir uma massa tumoral que origine manifestações clínicas?
Este cálculo é simples sendo que a célula original tem aproximadamente 10 μm de diâmetro, a
população deve ser duplicada pelo menos 30 vezes para produzir cerca 109 células (pesando
aproximadamente 1 g), que é a menor massa clinicamente detectável. Em contraste, ao fim de
10 ciclos estas células originam um tumor contendo 1012 células (pesando aproximadamente
1 kg), que é normalmente o máximo de tamanho compatível com a vida. Estas estimativas são
mínimas, com base no pressuposto de que todos os descendentes da célula transformada
manter a capacidade de se dividir e que não há perda de células durante este processo.
A taxa de crescimento de um tumor é determinada por três factores principais:
- o tempo de duplicação das células tumorais;
- a fracção de células tumorais que estão no pool replicativa;
- a taxa na qual as células são perdidas e aprisionadas no processo de crescimento.
Porque o controlo do ciclo celular se encontra ausente nestas células, as células tumorais
podem entrar mais facilmente no ciclo e sem as habituais restrições. A divisão nas células
tumorais não implica que o ciclo celular seja completado mais rapidamente, ou seja o ciclo
celular não ocorre mais rapidamente do que as células normais. Na realidade, o tempo do total
do ciclo celular é para muitos tumores igual ou maior do que a de células normais
correspondentes.
A proporção de células do tumor no seio da população que estão na pool proliferativa é
referida como a fração de crescimento. Estudos clínicos e experimentais sugerem que,
durante o início a grande maioria das células se transformaram na pool proliferativa. Com o
avançar do crescimento tumoral, as células deixam a pool proliferativa em números cada vez
maiores devido à ausência de adesão, à falta de nutrientes, ou apoptose, através da
diferenciação e pela reversão para G0. A maioria das células no centro do cancro permanece
nas fases G0 ou G1. Assim, até ao momento um tumor é clinicamente detectável, a maioria
das células não estão na pool replicativa. Mesmo em alguns tumores de rápido crescimento, a
fracção de crescimento é de apenas cerca de 20% ou menos.
Vários ensinamentos conceptuais e práticos importantes podem ser retirados a partir de
estudos da cinética das células tumorais:
- Tumores de crescimento rápido podem ter uma alta rotatividade de células, o que implica
que ambas as taxas de proliferação e apoptose são elevadas. Obviamente, para que o tumor
cresça, a taxa de proliferação deverá ultrapassar a da apoptose;
- A fracção de crescimento das células tumorais tem um profundo efeito sobre a sua
suscetibilidade à quimioterapia. Porque a maioria dos agentes anticancerígenos agem em
células que estão no ciclo, não é difícil imaginar que um tumor que contém 5% de todas as
células na pool replicativa terá um crescimento lento, mas será relactivamente refratário ao
tratamento com drogas que actuam durante a divisão celular. Uma estratégia utilizada no
tratamento de tumores com uma baixa fracção de crescimento consiste em alterar os estado
G0 das células; o que pode ser conseguido por destruição do tumor com cirurgia ou
radioterapia. As células sobreviventes tendem a entrar no ciclo celular e, portanto, tornam-se
sensíveis à quimioterapia.
Em geral, a taxa de crescimento de tumores correlaciona-se com seu nível de diferenciação e,
portanto, os tumores mais malignos crescem mais rapidamente do que as lesões benignas.
Existem, no entanto, muitas excepções há esta banalização. A taxa de crescimento das lesões
benigna, bem como dos tumores malignos pode não ser constante ao longo do tempo.
Factores como a estimulação hormonal, a adequação do suprimento sanguíneo, e influências
desconhecidas podem afectar seu crescimento. Por exemplo, o crescimento de miomas
uterinos pode mudar ao longo do tempo devido a variações hormonais. Durante a gravidez,
leiomiomas frequentemente entram em crescimento. Essas mudanças reflectem a resposta
das células tumorais para níveis circulantes de hormonas esteróides, especialmente os
estrogénios.
Células Estaminais e Linhagens Celulares Cancerígenas
Um tumor clinicamente detectável contém uma população heterogénea de células, que teve
origem no crescimento clonal da descendência de uma única célula. No entanto, tem sido
difícil identificar as células estaminais cancerígenas, isto é, as células dentro de um tumor que
tem a capacidade de iniciar e sustentar o tumor. Estas conclusões têm implicações
importantes para o tratamento do cancro que visem a eliminação da proliferação de células.
Aparentemente, as células estaminais do cancro, similares aos seus homólogos normais, têm
uma baixa taxa de replicação. Se este for o caso, as terapias para o cancro que podem
eficientemente matar as células com elevadas taxas de divisão, vão permitir que as células
estaminais permaneçam, deixando no local células capazes de gerar o tumor. Nestas
circunstâncias, certos tumores podem facilmente re-surgir após tratamento.
Invasão Local
Quase todos os tumores benignos crescem como massas expansivas que permanecem
localizada no seu local de origem e não têm a capacidade de infiltração, invasão, ou
metastatizam para locais distantes. Porque ao crescerem e expandirem-se lentamente, levam
a que se desenvolvam uma faixa de tecido compacto, às vezes denominado de cápsula fibrosa,
que os separa do tecido hospedeiro. Esta cápsula é derivada em grande parte do estroma do
tecido nativo, como resultado da atrofia das células parenquimatosas sob a pressão de
expansão do tumor. Esse encapsulamento não impede o crescimento tumoral, mas mantém o
tumor benigno como uma discreta, facilmente palpável, e facilmente deslocável massa que
pode ser cirurgicamente removido. Embora um plano bem definido de clivagem exista mais
em torno de tumores benignos, em alguns, é inexistente. Assim, os hemangiomas são muitas
vezes não encapsulado e pode parecer que penetram os tecidos adjacentes ao seu local de
origem.
O crescimento dos cancros é acompanhado pela progressiva infiltração, invasão e destruição
do tecido circundante. Em geral, os tumores malignos são mal delimitados, e um plano de
clivagem bem definido está ausente.
A maioria dos tumores malignos é invasivo e pode, obviamente, penetrar através da parede do
cólon ou de útero, por exemplo. Estes tumores não reconhecem as fronteiras anatómicas
normais. Esta capacidade invasiva torna a sua ressecção cirúrgica difícil, e mesmo se o tumor
aparenta estar bem circunscrito, é necessário eliminar uma considerável margem de tecido
aparentemente normal adjacente ao tumor infiltrativo. Próximo ao desenvolvimento de
metástases, a invasividade é o mais fiável característica que diferencia as lesões malignas de
benignas. Temos observado anteriormente que alguns cancros parecem evoluir a partir de
uma pré-fase referida como carcinoma in situ. Isto frequentemente ocorre em tumores de
pele, mama, e alguns outros sitios, sendo melhor ilustrado pelo carcinoma do colo uterino. Os
tumores epiteliais in situ exibem as características citológicas de malignidade, sem invasão da
membrana basal. Estas lesões podem ser consideradas um passo inicial de um tumor invasivo,
que com o tempo, vai penetrar além da membrana basal e invadir o estroma subepitelial.
Metástases
Metástases são implantes tumorais descontínuos com
o tumor primário. As metástases marcam
inequivocamente as neoplasias como malignas,
porque as neoplasias benignas não metastisam. A
capacidade de invasão dos tumores permite que estes
penetrem nos vasos sanguíneos e linfáticos e se
disseminem por todo o organismo. Com poucas
excepções, todos os cancros podem metastatizam. As
principais excepções são a maioria das neoplasias malignas de células gliais no sistema nervoso
central – gliomas-, e carcinomas basocelulares da pele. Ambos são formas de neoplasia
localmente invasiva, mas raramente metastatizam à distância. É então evidente que as
propriedades de invasão e metástase são independentes, no entanto ao nível molecular,
invasão e metástases representam um continuum de alterações.
Em geral, os tumores mais agressivo e mais rápido crescimento, têm uma maior probabilidade
de virem a metastatizar ou de já possuírem metástases.
Aproximadamente 30% dos pacientes recém-diagnosticados com tumores sólidos (excluindo
cancros da pele que não sejam melanomas) apresentam-se já com metástases. A propagação
metastática reduz fortemente a possibilidade de cura, portanto, nenhuma conquista consegue
conferir maior benefício aos pacientes do que métodos para bloquear a propagação às
distância.
Vias de Disseminação
A disseminação dos tumores pode ocorrer através de uma das três vias:
- Invasão directa de cavidades ou superfícies corporais;
- Disseminação linfática;
- Disseminação hematogénica.
Embora o transplante directo de células tumorais, como, por exemplo, em instrumentos
cirúrgicos, possa teoricamente ocorrer, é raro e não vamos por isso discutir este processo
artificial.
Invasão Directa de Cavidades ou Superfícies Corporais
Na maioria das vezes está em causa a cavidade peritoneal, mas qualquer outra cavidade -
pleural, pericárdica, subaracnóidea, etc. Esta característica é particularmente comum nos
carcinomas originados nos ovários, originando uma superfície peritoneal revestida com uma
espessa camada de tecido tumoral. Surpreendentemente, as células tumorais podem
permanecer confinadas à superfície do revestimento das vísceras abdominais sem penetrar na
nos órgãos em questão.
Disseminação Linfática Esta é a via mais comum para a disseminação inicial de carcinomas, mas os sarcomas também podem utilizar esta via. Os tumores não contêm linfáticos funcionais, mas os vasos linfáticos localizados nas margens do tumor são, aparentemente, suficientes para que a disseminação linfática se dê. A ênfase dada à disseminação linfática para carcinomas e disseminação hematogénica de sarcomas é enganosa, porque, em última instância, existem numerosas interligações entre os sistemas vasculares e linfático. O padrão de envolvimento ganglionar segue as linhas naturais de drenagem linfática. É devido a este facto que carcinomas da mama normalmente surgem na parte superior dos quadrantes exteriores, sendo geralmente os gânglios axilares os primeiros a serem afectados.. Tumores do quadrante interno disseminam através de gânglios linfáticos para o interior do peito, ao longo da cadeia da artéria mamária interna. Posteriormente, os gânglios infraclavicular e supraclavicular podem estar envolvidos. No entanto, o cancro da mama é hoje considerado uma doença sistémica, mesmo no momento da detecção, sendo tratamento dirigido a ambos os locais de possível disseminação o e à erradicação das micrometastases sistémicas ocultas. Os carcinomas de pulmão decorrentes das vias respiratórias principais metastatizam primeiro para os gânglios traqueo-brônquicos, peri-hilares e mediastínicos. No cancro da mama, a determinação do envolvimento dos gânglios linfáticos axilares é muito importante para avaliar a futura evolução da doença e para a selecção das estratégias terapêuticas adequadas. Normalmente, a disseminação linfática dos tumores da mama é avaliada pela realização de uma linfadenectomia axilar; uma vez que este procedimento está associado a grande morbilidade cirúrgica, a técnica de biópsia do gânglio sentinela é frequentemente utilizada. O gânglio sentinela é definido como o primeiro gânglio de um conjunto de gânglios que drena aquela região que recebe o fluxo do tumor primário. Este procedimento pode ser feito pela injecção de corantes ou rádio-marcadores, mas a combinação dessas técnicas proporciona a melhores resultados. Esta técnica também tem sido utilizada para detectar a propagação de melanomas, tumores do cólon e outros tumores.
Em muitos casos, os gânglios regionais servem como obstáculos a uma maior disseminação eficaz do tumor, pelo menos por um tempo. As células podem ser retidas dentro do gânglio, podem vir a ser destruídas por uma resposta imunitário específica originando alterações na morfologia do gânglio. Assim, o aumento dos gânglios pode ser causado quer pela difusão e crescimento das células cancerosas ou pela reacção hiperplásica. Portanto, o aumento ganglionar na proximidade de um tumor não significa necessariamente disseminação da lesão primária. Disseminação Hematogénica Disseminação hematogénica é típica de sarcomas, mas também é vista em carcinomas. As artérias, com as suas paredes mais espessas, são mais dificilmente penetradas do que as veias. A disseminação arterial pode ocorrer, no entanto, é mais comum as células tumorais passarem pelos capilares pulmonares, ou através shunts arteriovenosos pulmonares, ou no caso de metástases pulmonares que podem dar origem a êmbolos tumorais. Compreensivelmente, o fígado e os pulmões são os orgãos mais frequentemente envolvidos secundariamente na disseminação hematogénica. Toda a drenagem da área portal flui para o fígado, e todas as áreas drenadas pelas veias cava fluiem para os pulmões. Tumores na proximidade da coluna vertebral, muitas vezes embolizam através do plexo paravertebral, sendo por isso frequentes as metástases vertebrais de carcinomas da tiróide e da próstata. Determinados tumores têm uma propensão para a invasão das veias, nomeadamente os carcinoma de células renais que frequentemente invadem os ramos da veia renal e, em seguida, progridem até à veia cava inferior, atingindo por vezes o lado direito do coração.
Epidemiologia
Porque o cancro é uma alteração do crescimento celular e do seu comportamento, a sua causa final tem de ser definida no nível celular e subcelular. Estudo dos padrões de cancro em populações podem contribuir substancialmente para o conhecimento sobre as origens do cancro. Por exemplo, o conceito de que produtos químicos podem causar cancro surgiu da das observações de Sir Percival Pott, que relacionou o aumento da incidência de cancro escrotal nos limpa chaminés com a exposição crónica à fuligem. Assim, os principais insights sobre a causa do câncer podem ser obtidos por estudos epidemiológicos que relacionam nomeadamente influências ambientais, hereditárias, e culturais com a ocorrência de neoplasias malignas. Além disso, certas doenças associadas com um risco aumentado de desenvolver cancro podem fornecer informações sobre a patogénese da doença maligna. Incidência do Cancro
Os tumores mais comuns nos homens são próstata, pulmão e cancro colorretal. Nas mulheres, os cancros da mama, pulmão e cólon e recto são os mais frequentes. Os cancros do pulmão, mama feminina, próstata e cólon/recto constituem mais de 50% dos cancros diagnosticados e mortes por cancro nos E.U.A. Ao longo dos últimos 50 a nos, a taxa global de idade-ajustada de mortes por cancro em homens aumentou significativamente, enquanto que diminuiu ligeiramente em mulheres. O aumento nos homens pode ser largamente atribuído ao cancro do pulmão. A melhoria nas mulheres é principalmente imputável a uma diminuição
significativa na mortalidade por cancro do útero, estômago, fígado, e muito em especial, ao carcinoma do colo do útero, uma das formas mais comuns de neoplasia maligna em mulheres. Preocupante é o aumento alarmante de mortes de carcinoma do pulmão, em ambos os sexos. Nas mulheres, os carcinomas da mama ocorrem cerca de 2,5 vezes mais frequentemente do que os do pulmão. Devido à grande diferença nas taxas de cura destes dois cancros, o de pulmão tornou-se a principal causa de morte por cancro em mulheres. O declínio no número de mortes causadas por cancro uterino, incluindo o cervical, está provavelmente relacionado com diagnóstico precoce e maior cura possível graças ao Esfregaço Papanicolaou. Factores Ambientais e Geográficos Notáveis diferenças podem ser encontradas na incidência e mortalidade de formas específicas de cancro ao redor do mundo. Por exemplo, a taxa de mortalidade por carcinoma gástrico tanto nos homens como nas mulheres é de sete a oito vezes mais elevada no Japão do que nos Estados Unidos. Em contraste, a taxa de mortalidade de carcinoma do pulmão é um pouco mais de duas vezes maior nos Estados Unidos do que no Japão, e é ainda mais elevada na Bélgica do que nos Estados Unidos. Mortes por cancro da pele, principalmente causadas por melanomas, são seis vezes mais frequentes na Nova Zelândia do que na Islândia, o que se deve provavelmente a diferenças na exposição solar. Estima-se que o sobrepeso e a obesidade possam representar aproximadamente 14% das mortes por cancro em homens e 20% em mulheres. O abuso de álcool isoladamente aumenta o risco de carcinomas da orofaringe (excluindo os lábios), laringe e esófago, e, através da cirrose alcoólica, o carcinoma do fígado. Fumar, sobretudo cigarros, tem sido implicado no cancro da boca, faringe, laringe, esófago, pâncreas e bexiga, mas mais importante ainda, é responsável por cerca de 90% das mortes por cancro do pulmão. O tabagismo tem sido designado como o mais importante factor ambiental que contribui para a morte prematura nos Estados Unidos. O risco de cancro do colo do útero está associado à idade da primeira relação sexual e do número de parceiros sexuais. Estas associações apontam para um possível papel causal para transmissão de infecções virais ao nível cervical. Idade A idade tem uma influência importante sobre a probabilidade de se ter cancro. A maioria dos carcinomas ocorrem nos últimos anos de vida (≥ 55 anos). O cancro é a principal causa de morte entre mulheres com idade entre 40 a 79 e entre os homens com idade entre 60 e 79. Cada faixa etária tem sua própria predilecção para certas formas de cancro. Aqui, o notável aumento da mortalidade por cancro no grupo etário de 60 a 79 anos devem ser anotadas. O declínio das mortes no grupo etário > 80 reflecte o menor número de indivíduos que atingem essa idade. Esta tendência é esperada mudar na próxima década, com o número de indivíduos com essa idade na população a aumentar. Também a se notar é que as crianças com menos de 15 anos não são poupados. O cancro representa pouco mais de 10% das mortes neste grupo nos Estados Unidos, sendo que a leucemia aguda e as neoplasias do sistema nervoso central, são responsáveis por cerca de 60% dessas mortes. As neoplasias mais comuns na infância incluem neuroblastoma, Uumor Wilms, retinoblastoma, leucemia aguda, e rabdomiosarcomas. Predisposição Genética Evidências actuais indicam que, para um grande número de tipos de cancro, incluindo as formas mais comuns, existem não só influências ambientais, mas também predisposições hereditárias. Por exemplo, o cancro do pulmão é, na maioria dos casos claramente relacionado com tabagismo, mas a mortalidade por cancro do pulmão tem mostrado ser quatro vezes
maior entre os familiares não-fumadores de pacientes com cancro de pulmão do que entre os pacientes não-fumadores parentes de individuo sem cancro. Apesar da baixa freqüência, o reconhecimento de predisposição hereditária para o cancro teve um grande impacto na compreensão da patogénese do mesmo. Além disso, os genes que são associados causalmente com cancros que têm uma forte componente hereditária geralmente são também envolvidos nas formas mais comuns, mas esporádicas, do mesmo tumor. Sindromes Hereditárias Autossómicas Dominantes de Cancro A mutação é herdada geralmente ocorrendo uma mutação pontual num único alelo de um gene supressor tumoral. O defeito no segundo alelo ocorre em células somáticas, geralmente como uma consequência da supressão ou recombinação num cromossoma. Na infância o retinoblastoma é o exemplo mais marcante nesta categoria, aproximadamente 40% dos retinoblastomas são herdados. Os portadores de uma mutação do gene supressor tumoral RB têm um risco aumentado em 10000 vezes de desenvolver retinoblastoma, geralmente bilateral. Existe ainda um forte aumento do risco de desenvolvimento de um segundo cancro, especialmente o sarcoma osteogénico. A polipose adenomatosa familiar é outro distúrbio hereditário extraordinariamente marcado por um elevado risco de cancro. Os indivíduos que herdam a mutação autossómica dominante da polipose adenomatosa coli (APC) no gene supressor tumoral têm ao nascimento ou pouco depois inúmeros adenomas polipóides no cólon e, em praticamente 100% dos casos estão destinados a desenvolver um carcinoma do cólon por volta dos 50 anos de idade. Outros cancros autossómicos dominantes incluem o Síndrome Li-Fraumeni, resultante de mutações na linha germinal do gene p53, a Neoplasia Endócrina Múltipla Tipo 1 e 2 (MEN-1 e MEN-2), e Cancro Hereditário Não-poliposo (HNPCC), uma condição causada pela inactivação de um gene reparador. Como em outras condições autossómica dominante, tanto a penetrância incompleta como a expressividade variável podem ocorrer. Síndromes de Defeitos na Reparação do DNA Existe um grupo de condições predisponentes ao cancro que é colectivamente caracterizada por defeitos na reparação do DNA e consequente instabilidade do mesmo. Estas condições geralmente têm um padrão autossómico recessivo. Incluídos neste grupo estão o Xeroderma Pigmentoso, Telangectasia-Atáxica e o Síndrome de Bloom, todos eles condições raras e caracterizados por instabilidade genética resultante de defeitos nos genes de reparação do DNA. Neste grupo podemos incluir a HNPCC, no entanto este é autossómico dominante, sendo o cancro mais comum nestas síndromes, aumentando a susceptibilidade para o cancro no cólon e também em alguns outros órgãos tais como o intestino delgado, endométrio e ovário.
Cancros Familiares
Além da susceptibilidade nos síndromes hereditários de cancro, o cancro pode ocorrer com maior frequência em certas famílias sem um padrão bem definido de transmissão. Praticamente todos os tipos comuns de cancro que ocorrem esporadicamente também foram relatados em formas familiares. As características que caracterizam estas formas de cancro incluem a idade de início precoce, tumores que surgem em dois ou mais parentes próximos do caso índice e, por vezes, tumores múltiplos ou bilaterais. O padrão de transmissão familiar do cancro não é claro. Em geral, os irmãos têm um risco relativo entre dois e três (duas a três vezes maior do que indivíduos independentes). É provável que a susceptibilidade ao cancro familiar possa depender de vários alelos de baixa penetrância, cada um contribuindo com apenas um pequeno aumento no risco de
desenvolvimento tumoral. Foi estimado que 10% a 20% dos pacientes com cancro da mama ou do ovário tem um parente de primeiro ou segundo grau com um desses tumores. Embora dois genes de susceptibilidade ao cancro da mama, denominados BRCA1 e BRCA2, tenham sido identificados, as mutações nestes genes ocorre em não mais de 3% dos cancros da mama. Assim, mutações no gene BRCA1 e BRCA2 podem não contribuir para a grande proporção de cancros da mama familiares. Alterações em outros genes, provavelmente de baixa penetrância, parecem ser necessária para o desenvolvimento desses tumores.
Condições de Predisposição Não-Hereditária
Há uma associação bem definida entre certas formas de hiperplasia endometrial e carcinoma endometrial e entre displasia cervical e carcinoma cervical. A mucosa brônquica metaplásia e displásica dos fumadores habituais são considerados antecedentes do carcinoma broncogénico. Cerca de 80% dos hepatocarcinomas surgem em fígados cirróticos, os quais são caracterizados por uma regeneração parenquimatosa activa.
Inflamação Crónica e o Cancro Esta condição é exemplificada pelo aumento do risco de cancro em pacientes afectados por uma variedade de doenças inflamatórias crónicas do tracto gastro-intestinal. Os mecanismos precisos que ligam a inflamação e o desenvolver de cancro não foram ainda estabelecidos. As reacções crónicas podem levar à produção de citocinas que estimulam o crescimento das células transformadas. Em alguns casos, a inflamação crónica pode aumentar o pool células estaminais nos sujeitos, estando estas mais sujeitas à incidência de mutagénicos. Curiosamente, a inflamação crónica pode também directamente promover instabilidade genómica nas células através da produção de espécies reactivas de oxigénio (ROS), o que predispõe à transformação maligna. Seja qual for o mecanismo preciso, essa ligação pode ter implicações práticas. Por exemplo, a expressão da enzima Ciclooxigenase-2 (COX-2), que converte ácido araquidónico em prostaglandinas, é induzida por estímulos inflamatórios e encontra-se aumentada em tumores do cólon e de outros. O desenvolvimento de inibidores de COX-2 para tratamento do cancro é uma área de investigação activa e promissora.
Condições Pré-Cancerígenas Esta designação é um pouco correcta, porque na grande maioria destas lesões não se desenvolve uma neoplasia maligna. No entanto, o termo persiste porque chama a atenção para o risco aumentado. Algumas formas de neoplasia benigna também constituem condições pré-cancerígenas. Apesar de alguns riscos poderem ser inerente, uma grande experiência acumulada indica que a maioria das neoplasias benignas não se tornam malignas. A generalização é impossível, porque cada tipo de tumor benigno está associado a um determinado nível de risco variando de quase nunca a frequente.
Bases Moleculares do Cancro
Esta é uma área onde as descobertas continuam a multiplicar-se, dia a dia que passa, o que torna difícil seleccionar quais os conhecimentos mais importantes e relevantes. A lesão não letal está na base da carcinogénese, as quais podem ser adquiridas através da acção de agentes ambientais, tais como produtos químicos, radiações ou vírus, ou por outro lado, poderão ser herdadas. O termo "ambiental", utilizado neste contexto, envolve qualquer defeito adquirido causado por agentes exógenos ou endógenos derivado de produtos do
metabolismo celular. No entanto nem todas as mutações são induzidas por factores ambientais, algumas podem ser espontâneas e estocásticas.
Um tumor é formado pela expansão clonal de uma única célula precursora que tenha onde tenha ocorrido o dano genético, ou seja, os tumores são monoclonais. As principais classes de genes que são alvo de mutação no cancro são: - Proto-oncogenes – Promotores do Crescimento Celular; - Genes Supressores de Tumores; - Genes Reguladores da Apoptose; - Genes Envolvidos na Reparação do DNA. Os alelos mutantes de proto-oncogenes são considerados dominantes porque só por si podem transformar uma célula normal em tumoral. Em contraste, os genes supressores de tumores são considerados recessivos, pois é preciso que ambos os alelos estejam mutados para que haja transformação fenotípica,
no entanto nesta classe existem excepções. No caso dos genes que regulam a apoptose podemos encontrar ambas as condições. No caso dos genes envolvidos na reparação do DNA estes podem ter uma acção directa alterando a proliferação celular, ou indirectamente condicionar a capacidade dos organismos para inibir o crescimento ou regular a apoptose, por lesão nestas classes de genes. Alelos mutantes de proto-oncogenes são consideradas dominantes porque transformar células apesar da presença de uma contrapartida normal. Em contraste, ambos alelos normais dos genes supressores tumorais devem ser danificado para que ocorra a transformação, para esta família de genes é por vezes referido como oncogenes recessivos. No entanto, existem excepções a esta regra, e alguns genes supressores tumorais supressores perder sua actividade quando um único alelo é perdido ou inactivado. Esta perda de função de um gene recessivo de danos causados por um único alelo é chamado haploinsuficiencia. Os genes que regulam apoptose podem ser dominante, tal como são os proto-oncogenes, ou podem comportar-se como genes supressores tumorais. Nestes casos uma mutação num gene reparador pode predispor a mutação no genoma e consequente transformação neoplásica – fenótipo mutador. Com algumas excepções, ambos os alelos do gene reparador devem estar alterados para que haja esta condição. A carcinogénese é um processo, tanto a nível fenotípico como genético com múltiplos patamares. Uma neoplasia maligna fenotípicamente tem vários atributos, tais como o crescimento excessivo, invasividade local, bem como a capacidade de formar metástases distantes. Estas características são adquiridas de forma faseada, num fenómeno denominado progressão tumoral. Ao nível molecular, a progressão deve-se ao acumular de lesões no genoma, o que, em alguns casos, é favorecido por defeito na reparação do DNA.
Alterações Essenciais para a Transformação Maligna
Cada um dos genes envolvidos no cancro tem uma função específica, a desregulação dos quais contribui para a origem ou progressão da doença maligna. É tradicional para descrever os genes que causam neoplasias, com base na sua presumível função: - Auto-suficiência nos Sinais de Crescimento, os tumores têm a capacidade de proliferar sem estímulos externos, geralmente como consequência da activação de um oncogene;
- Insensibilidade aos Sinais Inibitórios do Crescimento, os tumores podem não responder às moléculas que inibem a proliferação de células normais, como TGF-β, e inibidores directos da ciclina dependente de quinases; - Evasão da Apoptose, os tumores podem ser resistentes à morte celular programada, como consequência da inactivação do gene p53 ou outras alterações; - Defeitos na Reparação do DNA, os tumores podem falhar na reparação das lesões no DNA resultante de agentes cancerígenos ou de uma proliferação celular desregulada; - Potencial Replicativo Limitado, as células tumorais têm uma capacidade proliferativa ilimitada proliferativa, associada à manutenção do comprimento do telómero e função da telomerase; - Angiogénese Mantida, os tumores não são capazes de crescer sem formação de um suprimento vascular, o qual é induzido por vários factores, sendo o mais importante o Factor de Crescimento Endotelial Vascular – VEGF; - Capacidade de Invadir e Metastatizar, as metástases tumorais são a causa da grande maioria das mortes por cancro e dependem de processos que são intrínsecos à célula ou são iniciados por sinais a partir do tecido ambiente.
Ciclo Celular Normal
As células que não se encontram em divisão estão na fase G0 do ciclo celular e precisam ser recrutados para a fase G1 e para além dela, a fim de se dar a replicação. A evolução ordenada das células através das várias fases do ciclo celular é orquestrada por ciclinas e CDKs – Cinases Dependents de Ciclinas -, e pelos seus
inibidores. As CDKs conduzem o ciclo celular por fosforilização das proteínas-alvo críticas que são exigidas para a progressão das células para a próxima fase do ciclo celular. As CDKs são expressas constitutivamente durante o ciclo celular, mas numa forma inactiva. Estas são activadas por fosforilação após vinculação à família de proteínas designadas ciclinas.Em contraste com as CDKs, as ciclinas são sintetizadas durante fases específicas do ciclo celular, e sua função é activar as CDKs. Após a conclusão desta tarefa, os níveis de ciclina sofre um declínio rápido. Mais de 15 ciclinas foram identificadas, no entanto as Ciclinas D, E, A, B são as que aparecem sequencialmente durante o ciclo celular e se ligam a uma ou mais CDKs. Ciclina D e Fosforilação do RB A Ciclina D é a primeira ciclina a aumentar no ciclo celular, aparece em meados de G1, mas já não é detectável na fase S. Durante a fase G1 do ciclo celular, a ciclina D liga-se a e activa a CDK4, formando o complexo Ciclina D-CDK4. Este complexo tem um papel fundamental no ciclo celular por fosforilar a Proteína do Retinoblastoma. A fosforilação do RB é um botão liga-
desliga para o ciclo celular. No seu estado hipofosforilado, o RB impede que as células se repliquem por inactivar o complexo com o Factor de Tanscrição E2F. A fosforilação do RB dissocia o complexo e retira a inibição sobre a actividade do E2F. Assim a fosforilação do RB elimina a principal barreira à progressão do ciclo celular e promove a replicação celular. Para que este controlo seja possível o RB recruta descetilase de histonas, uma enzima que provoca a compactação da cromatina e a inibição da transcrição. Quando este mecanismo é inibido pela fosforilação do RB são transcritos genes referentes a proteínas fundamentais para a transição para a fase S, nomeadamente: Ciclina E, DNA Polimerases, Timidina Cinase, Dihidrofolato Redutase, entre outros. Durante a fase M, os grupos de fosfatos são removidos do RB pelas fosfatases celulares, e desta forma regressa ao estado hipofosforulado do RB. Progressão do Ciclo Celular no Ponto de Restrição G1/S
A progressão entre a fase G1 para S envolve a formação de um complexo activo entre a Ciclina E e CDK2. O E2F activo aumenta a transcrição de Ciclina E e das polimerases necessárias para a replicação do DNA, estimulando, assim, síntese do DNA. A próxima decisão no ciclo celular é o ponto de transição G2/M. Esta transição é iniciada pelo E2F e mediado pela transcrição da Ciclina A, que vai formar o complexo Ciclina A-CDK2 , este por sua vez regula os eventos no pró-fase mitótica. O principal mediador que assegura a propulsão do ciclo celular além da pró-fase é o complexo Ciclina B-CDK1, que é activado por uma proteína fosfatase - CDC25 - e que começa a acumular-se no núcleo, no início pró-fase. A activação do complexo Ciclina B-CDK1 provoca a ruptura do invólucro nuclear e inicia a mitose. Complexos de CDKs com as Ciclinas A e B regulam alguns dos eventos
críticos na transição G2/M, tais como a diminuição da estabilidade dos microtúbulos, a separação dos centrosomas, e a condensação dos cromossomas. Sair da mitose requer a inactivação do complexo Ciclina B-CDK1. A actividade dos complexos Ciclina-CDK, é estreitamente regulada por inibidores, denominados Inibidores das CDK. Existem duas classes principais de inibidores das CDK: a família Cip/Kip e a INK4/ARF. A família Cip/Kip tem três componentes - p21, p27 e p57 - que ligam-se e inactivam os complexos formados entre ciclinas e CDKs. Activação transcricional do p21 está sob o controle de p53, um gene supressor tumoral que está mutado numa grande proporção dos cancros humanos. O principal papel do p53 no ciclo celular é o de vigiar, desencadeando checkpoint que abrandam ou param a progressão do ciclo celular em células lesadas, chegando mesmo a causar a apoptose em lesões irreversíveis. A família INK4a/ARF codifica duas proteínas, p16INK4a e p14ARF, que bloqueiam o ciclo celular e agem como supressores de tumores. O p16INK4a concorre com ciclina D para ligação a CDK4 e inibe a capacidade do complexo Ciclina D-CDK4 complexo para fosforilar RB, provocando assim a detenção do ciclo celular em G1. O gene do INK4a codifica um segundo produto, o p14ARF, que actua sobre o p53. Checkpoints do Ciclo Celular
O ciclo celular tem os seus próprios controlos internos, denominados checkpoints. Existem dois checkpoints principais, um na transição G1/S e outro em G2/M. A fase S é o ponto de não retorno no ciclo celular, e antes de uma célula fazer o compromisso final para se replicar, o checkpoint G1/S faz o controlo das lesões no DNA. Se as lesões estiverem presentes, a maquinaria e os mecanismos de reparação do postos em movimento. O atraso na progressão do ciclo celular, prevê o tempo necessário para o reparo do DNA, se o dano não é reparado, a via apoptótica é activada. Assim, o checkpoint G1/S impede a replicação de células que têm defeitos no DNA, o que seria perpetuado como mutações cromossómicas ou interrupções na génese da célula. O checkpoint G2/M controla a replicação do DNA e verifica se a célula pode iniciar com segurança a mitose e a separação das cromátides irmãs. Esta verificação é particularmente importante nas células expostas à radiação ionizante. Os defeitos neste checkpoint podem dar origem a anomalias cromossómicas. Para funcionar correctamente, os checkpoints do ciclo celular exigem sensores de lesão no DNA, transdutores de sinal, e efectores moleculares. Os sensores e transdutores de lesões do DNA parecem ser semelhantes para o G1/S e G2/M. A detenção do ciclo celular em G2/M envolve tanto mecanismos dependentes do p53 como independente.
Sinais de Crescimento Auto-Suficientes: Oncogenes
Os genes que promovem o crescimento celular em células neoplásicas autónomas denominados oncogenes, e os seus homólogos celulares normais são designados proto-oncogenes. Os proto-oncogenes são os reguladores fisiológicos da proliferação e diferenciação celular. Os oncogenes são caracterizados pela capacidade de promover o crescimento celular na ausência de sinais mitogénicos normal. A sua produção nas células transformadas torna-se constitutiva, ou seja, não dependente de factores de crescimento ou outros sinais externos. Sob condições fisiológicas, a proliferação celular pode ser facilmente resumida através das seguintes etapas: - A ligação de um factor de crescimento ao seu receptor específico geralmente localizados sobre a membrana celular; - A activação transitória e limitada do receptor do factor de crescimento que, por sua vez, activa várias proteínas transductores de sinal;
- Transmissão do sinal através do citosol para o núcleo através de segundos mensageiros ou pela activação directa de moléculas que activam a transcrição; - Indução e activação de factores nucleares que regulamentam o início da transcrição do DNA; - A entrada e a progressão da célula no ciclo celular, resultando na divisão celular. Porto-oncogenes, Oncogenes, e Oncoproteínas Uma das primeiras sequências oncogénica no cancro foi detectado numa forma mutante do proto-oncogene RAS. Um grande número de proto-oncogenes foram identificados durante os últimos 20 anos, a maioria dos quais não têm uma contrapartida viral. Os porto-oncogenes podem ter múltiplas funções, no entanto todos participam em funções celulares relacionadas com o crescimento e proliferação. As proteínas codificadas por porto-oncogenes podem funcionar como factores de crescimento ligantes ou receptores, transdutores de sinal ou factores de transcrição. As oncoproteínas codificadas por oncogenes geralmente servem funções similares à dos seus homólogos normais, no entanto, porque são constitutivamente expressa, as oncoproteínas dotam a célula com capacidade de crescimento auto-suficiente. Para resumir, os porto-oncogenes podem ser convertido em oncogenes celulares - c-oncs - que estão envolvidos no desenvolvimento tumoral. Factores de Crescimento Muitas células neoplásicas podem desenvolver crescimento auto-suficiente, adquirindo a capacidade de sintetizar os mesmos factores de crescimento aos quais são responsivas. O proto-oncogene sis, que codifica a cadeia de β do PDGF, encontra-se sobreexpressa em muitos tumores, especialmente nos astrocitomas e osteosarcomas de baixo grau. Além disso, parece que os mesmos tumores também expressam receptores para PDGF e são, portanto, responsivas à estimulação autócrina. Embora autócrino este loop é considerado como um elemento importante na patogénese de vários tumores, na maioria dos casos, o gene do factor de crescimento em si não se encontra alterado ou mutado. Mais frequentemente, os produtos de outros oncogenes como o ras causam superexpressão dos genes do factor de crescimento, forçando assim as células a secretar grandes quantidades de factores de crescimento como, por exemplo, TGF-α. Este factor está relacionado com o crescimento do Factor de Crescimento Epidérmico - EGF - e induz a proliferação pela sua ligação ao receptor EGF. O TGF-α é frequentemente detectado em carcinomas, como os astrocitomas que expressam elevados níveis de receptores EGF. Apesar de esta condição ser encontrada num grande número de tumores, o aumento da produção do factor de crescimento, por si só não é suficiente para a transformação neoplásica. A proliferação celular de forma aumentada, com toda a probabilidade, contribui para o fenótipo maligno, aumentando o risco de mutações espontâneas ou induzidas na população celular. Receptores para Factores de Crescimento Vários oncogenes que codificam receptores do factor de crescimento foram encontrados. Para entender como estas mutações afectam a função desses receptores, convém recordar que vários receptores de factores de crescimento são proteínas transmembranar com um domínio externo ligando-obrigatório e um domínio citoplasmático tirosina quinase. Nas formas normais desses receptores, a quinase é transitoriamente activada pela ligação específica dos factores de crescimento, seguindo-se rapidamente uma dimerização do receptor e fosforilação de vários substratos que são parte da cascata de sinalização. A oncogénese associada a estas alterações envolve a constitutiva dimerização e activação sem carácter vinculativo para o factor de crescimento. Assim, os receptores mutantes emitem sinais mitogénicos de forma contínua para a célula. Estas alterações podem ser originadas por alterações na estrutura do receptor, o que conduz a uma activação sem estímulo precedente, no entanto é muito mais comum a superexpressão
das formas normais destes receptores. Em formas esporádicas de carcinomas papilares da tireóide, o c-MET encontra superexpessado em quase todos os casos. Nesses tumores, o aumento da expressão do c-MET não é causado por uma mutação genética, mas como consequência de uma maior transcrição do gene. Proteínas Transductoras de Sinal A maioria destas proteínas estão estrategicamente localizadas no folheto interno da membrana plasmática, onde recebem sinais provenientes do exterior da célula e transmitem-nos ao núcleo da célula. O melhor e mais bem estudado exemplo de uma oncoproteínas transductora de sinal é a RAS pertencente à família das Proteínas Acopladas ao GTP. Oncoproteína RAS Estas proteínas foram descobertos como sendo produtos de oncogenes virais. Vários estudos indicam que as RAS desempenham um papel importante na mitogénese induzida por factores de crescimento. As RAS activadas atuam sobre o percursor da MAP Cinase, recrutando a proteína citosólica RAF-1. As MAP Cinases activadas são alvo dos factores de transcrição nucleares e, assim, promovem a mitogénese. Além das RAS, outros membros da Cascata de Sinalização RAS (RAS/RAF/MERK/ERK) também poderão ser alterados em células cancerígenas. Factores de Transcrição A transdução de sinal gera precursores transcricionais reguladores que entram no núcleo e actuam sobre determinados genes. Estes genes orquestram as células, ordenando a entrada e progressão através do ciclo celular, levando à replicação do DNA e à divisão celular. Muitas destas proteínas ligam-se ao DNA em sítios específicos a partir dos quais eles podem activar ou inibir a transcrição de genes adjacentes. Não surpreende, portanto, que mutações que afectam estes genes estejam associadas a transformação maligna. Uma série de oncoproteínas, incluindo os produtos da MYC, MYB, o JUN família, e FOS oncogenes, é encontrado no núcleo das células transformadas. Destes, o MYC é mais frequentemente envolvidos em tumores. Oncogene MYC No seu estado normal é expresso em praticamente todas as células eucarióticas e pertencem aos genes de resposta precoce, que são rapidamente induzidas quando células quiescentes recebem um sinal de fractura. No entanto, o leque de actividades atribuídas ao MYC é muito amplo e inclui a acetilação de histonas, redução da adesão celular e aumento da motilidade celular, aumento da síntese protéica e diminuição da actividade catabólica. Em contraste com a expressão de MYC regulada durante o período normal de proliferação celular, a persistência de expressão e, em alguns casos superexpressão, da proteína MYC são habitualmente encontrados em tumores. Isto pode levar a uma sustentada transcrição de genes alvo críticos e posterior transformação neoplásica. A desregulação da expressão de MYC resultante da translocação do gene ocorre no Linfoma de Burkitt linfoma, um tumor de células B. Ciclinas e CDKs Com base na nossa anterior discussão das funções normais das ciclinas e CDKs na célula no controlo do ciclo celular, é fácil compreender que desregulação da actividade destas proteínas podem favorecer a proliferação celular. Na verdade, incidentes que afectam a expressão da Ciclina D ou CDK4 parecem ser um evento comum na transformação neoplásica.
Insensibilidade aos Sinais Inibidores do Crescimento: Genes Supressores de
Tumores
O crescimento das células tem de ser controlado por muitos sinais externos para manter um estado estável - homeostase. Uma falha na inibição do crescimento é uma das alterações fundamentais no processo de carcinogénese. As proteínas que se aplicam limitações à proliferação celular são produtos de genes supressores tumorais. A perda de função destes genes é um evento chave em muitos, possivelmente todos, os tumores humanos. Retinoblastoma como um Paradigma para a Hipótese Two-Hit da Oncogénese As mutações necessárias para produzir retinoblastoma envolvem o gene RB, localizado no cromossoma 13q14. Em alguns casos, a lesão genético é
suficientemente grande para ser visível sob a forma de uma supressão de 13q14. Ambos os alelos normais da RB locus devem ser inactivados para que se desenvolva retinoblastoma. Nos casos familiares, as crianças nascem com um alelo normal e outro mutado. Estes indivíduos perdem o alelo intacto devido a alguma mutação somática. Nos casos esporádicos, ambos os alelos normais do RB são perdidos. O resultado final é o mesmo: uma célula da retina que perdeu as duas cópias normais do gene RB dá origem ao cancro. Indivíduos com retinoblastoma familiar possuem um grande aumento no risco de desenvolvimento de osteossarcoma e alguns outros sarcomas do tecido conjuntivo. Além disso, a inactivação do locus do RB foi observada em vários outros tumores, incluindo o adenocarcinoma da mama, o carcinoma de pequenas células do pulmão e carcinoma da bexiga. As proteínas de produtos de genes supressores tumorais estão envolvidas no controlo do ciclo celular, na regulação da apoptose, e em muitas outras actividades críticas para a sobrevivência e crescimento da célula. p53: Guardião do Genoma Um pouco mais de 50% dos tumores humanos contêm mutações neste gene. A perda homozigótica da actividade do gene p53 pode ocorrer em praticamente todo o tipo de cancros, incluindo os carcinomas do pulmão, cólon, mama, sendo estas as três principais causas de morte por cancro. Na maior parte dos casos a mutação afecta ambos os alelos do gene, sendo que esta ocorre nas células somáticas, sendo que num número mais reduzido de casos é possível que o indivíduo herde um alelo já mutado. Nestes casos estamos perante as Síndrome de Li-Fraumeni, em que os portadores têm uma 25 vezes maior probabilidade de desenvolver um tumor maligno, após os 50 anos do que a população em geral. Em contraste com os doentes que herdam um alelo mutante RB, o espectro de tumores que se desenvolvem em pacientes com a síndrome de Li-Fraumeni é bastante variado, os tipos mais comuns de tumores são sarcomas, cancro de mama, leucemia, tumores cerebrais e carcinomas do córtex da supra-renal. Em comparação com tumores esporádicos, os que afectam os pacientes com a síndrome de Li-Fraumeni podem ocorrer numa idade mais jovem, e um dado indivíduo pode desenvolver múltiplos tumores primários. É actualmente evidente que o p53 funciona como um “viligante molecular", que impede a propagação de células geneticamente danificadas. O p53 liga-se normalmente ao DNA, controlando a transcirção dos diversos genes, sendo que a maior parte das mutações ocorrem
no seu domínio de ligação ao DNA. O p53 mutante que não se liga ao DNA, produz uma proteína defeituosa que bloqueia a actividade normal da proteína. Além de mutações somáticas e herdadas, as funções do p53 podem ser inativadas por outros mecanismos. Tal como acontece com RB, a transformação de várias proteínas do DNA víral, incluindo a proteína E6 do HPV, pode ligar-se e promover a degradação do p53. Outro mecanismo de neutralização do p53 é através do MDM2, uma proteína que normalmente inibe a função do p53, causando a sua degradação. O MDM2 é encontrado em níveis aumentados em 33% dos sarcomas humanos e em 50% das leucemias, causando perda funcional de p53 nestes tumores. As principais actividades funcionais da proteína p53 são o bloqueio do ciclo celualr e início de apoptose em resposta aos danos do DNA. Via do APC/β-Catenina No caso do gene APC, todos os indivíduos que nasceram com um alelo mutante irão desenvolver milhares de pólipos adenomatosos no cólon durante a sua adolescência ou por volta dos 20 anos - Polipose Adenomatosa Familiar. Quase sempre, um ou mais destes pólipos sofre transformação maligna, dando origem ao cancro. Tal como com outros genes supressores tumorais, ambas as cópias do gene APC devem ser perdidas para que se dê desenvolvimento tumoral. Uma importante função da proteína APC é o de diminuir a expressão da β-catenina. Na ausência de sinalização WNT o APC causa a degradação de β-catenina, impedindo a sua acumulação no citoplasma. Fá-lo através da formação de um complexo macromolecular com β-catenina, o que resulta na degradação da β-catenina. A inactivação do gene APC perturba o complexa e aumenta os níveis celulares de β-catenina, que, por sua vez, são translocados para o núcleo. Assim, com a perda do APC, a célula comporta-se como se ela estivesse sob contínua acção da sinalização WNT. No núcleo da célula, a β-catenina forma um complexo com o TCF, um factor de transcrição que regula a proliferação celular, aumentando a transcrição do C-MYC, Ciclina D1, e de outros genes.
Evasão à Apoptose
Assim como o crescimento celular é regulado por genes que promovem e inibem a divisão celular, a sobrevivência da célula é condicionada de igual forma por genes que promovem e inibem a apoptose. Portanto, o acumular de células neoplásicas pode ocorrer não apenas pela activação de oncogenes ou inactivação de genes supressores tumorais, mas também por
mutações nos genes que regulam apoptose. A grande família de genes que regulam apoptose foi identificada em ambas a células normais e neoplásicas. Nesta secção iremos discutir o papel do BCL-2 na protecção de células tumorais da apoptose. O BCL-2 protege as células da apoptose pela via mitocondrial. Pelo menos dois outros genes associados ao cancro também estão intimamente relacionados com a apoptose: p53 e MYC. Os mecanismos moleculares de morte celular induzida por estes dois intersecção a via do BCL-2. Conforme discutido anteriormente, o p53 aumenta a transcrição de genes pró-apoptóticos, tais como BAX. A falta de actividade p53, causada por mutações no gene p53 ou alterações em INK4a e MDM2, diminui transcrição do gene pró-apoptótico BAX, reduzindo a actividade apoptótica e a resposta à quimioterapia. O BID, outro membro pró-apoptótico da família BCL-2, também é regulado pelo p53 e poderia aumentar a morte celular em resposta à quimioterapia. O MYC e BCL-2 podem colaborar na carcinogénese, o MYC desencadeia a proliferação, e o BCL-2 impede a morte celular, mesmo que os factores de crescimento sejam limitados. Este é um dos muitos exemplos em que dois ou mais genes em cooperação dão origem a um tumor. É também de salientar que as células normais exigem permanentemente sinais de sobrevivência, como, por exemplo, a sinalização através da via PI-3 quinase/AKT, o que impede a actividade da máquina apoptótica. A falta destes sinais pode causar apoptose, uma condição conhecida como morte por negligência. A expressão de AKT em células tumorais é frequentemente aumentada como consequência de mutações no AKT ou mutações inactivadoras no gene supressor tumoral PTEN. Essas alterações aumentam a resistência da célula tumoral à morte por apoptose.
Reparação dos Defeitos no DNA e Instabilidade Genómica nas Células Cancerigenas
Os humanos literalmente encontram-se mergulhados num mar de agentes cancerígenos. Apesar de a exposição ocorrer naturalmente a estes agentes prejudiciais para o DNA, tais como a radiação ionizante, a luz solar, alimentos e stress oxidativo, raramente se origina uma neoplasia no contacto único com estes agentes. Este facto resulta da capacidade natural das células repararem as lesões no DNA, e desta forma evitarem as mutações nos genes que regulam o crescimento celular e a apoptose. Além dos agentes ambientais, o DNA das células normais está susceptível a alterações resultantes de erros que ocorrem espontaneamente durante a replicação do DNA. Existem situações em que os indivíduo herdam mutações nos genes responsáveis pela reparação do DNA, o que origina situações de transformação neoplásica facilitada – sindromes de instabilidade genómica. O que se pode provar pelo facto de serem encontradas alterações nos mecanismos de reparação do DNA em tumores humanos esporádicos. Os genes de reparação do DNA por si só não são oncogénicos, mas a sua mutação permite outras mutações em outros genes durante o processo normal da divisão celular. Um dos exemplos mais comuns destes sindromes é o Sindrome do Carcinona Hereditário Não-Polipoide, que se caracteriza por um tumor do cólon familiar que resulta de uma mutação no gene APC, originando tumores precoces em indivíduos portadores desta mutação. Outro dos exemplos é o Xeroderma Pigmentoso, que mais uma vez resulta de mutações herdados nos genes responsáveis pela reparação do DNA, tendo estes indivíduos um risco aumentado de desenvolver carcinoma da pele quando em contacto do a radiação UV. Os genes BRCA-1 e BRCA-2, apesar da sua função não estar completamente definida, sabe-se que as proteínas resultantes destes genes se encontram no núcleo, e pensa-se que estejam envolvidas na regulação da transcrição. Pensa-se que estes genes estejam envolvidos na reparação por recombinação homóloga, tendo um importante papel ao nível do checkpoint G1/S, particularmente na reparação de quebras na cadeia duplas do DNA. Devido a estas funções acima descritas, pensa-se que a mutação neste gene possa ser um condição para o aumento do risco de desenvolver carcinoma da mama e do ovário.
Limitação do Potencial Replicativo: Telomerase
Após um determinado número de divisões, as células normais tornam-se presas num estado terminal em que não ocorrem mais divisões, conhecido como senescência replicativa. Em cada divisão celular há o encurtamento de estruturas especializadas, denominadas telómeros, nas extremidades do cromossomas. Quando os telómeros são encurtados para além de um certo ponto, a perda de função do telómero leva à activação de um ciclo de controlo dependente do p53, provocando um bloqueio na proliferação ou a apoptose. Nas células das linhas germinativas o encurtamento do telómero é impedido pela actividade da enzima telomerase, explicando, assim, a capacidade destas células de se auto-replicar extensivamente. Esta enzima encontra-se ausente da maioria das células somáticas e, portanto, estas sofrem uma perda progressiva dos seus telómeros. Nesta linha de raciocínio é fácil compreender que as células tumorais têm que encontrar uma forma de prevenir encurtamento dos telómeros, sendo que o mecanismo que realiza esta função é a reactivação da actividade da telomerase. Na verdade, a actividade da telomerase foi detectada em mais de 90% dos tumores humanos.
Desenvolvimento Sustentado da Angiogénese
Os tumores estimulam o crescimento de vasos sanguíneos, num processo denominado angiogénese, de forma a que o fornecimento de nutrientes ao tumor seja garantido. Mesmo com as alterações genéticas normais, um tumor apenas consegue aumentar cerca de 1 a 2 mm se não forem criados novos vasos, o que pode indicar que a distância máxima a um vaso seja essa. A neovascularização tem um duplo efeito sobre o crescimento tumoral: - Fornecimento de nutrientes e oxigénio; - Células Endoteliais Recém-Formados estimulam o crescimento das células tumorais adjacentes através da libertação de factores de crescimento. A angiogénese é um requisito não só para o crescimento tumoral, mas também para a formação de metástases, sem acesso à vascularização, as células tumorais não podem disseminar-se com facilidade para outros locais do organismo. Diversos estudos indicam que os tumores produzem factores que são capazes de desencadear toda a série de eventos envolvidos na formação de novos. No entanto, os vasos sanguíneos dos tumores diferem da vasculatura normal por serem tortuosos e irregulares. O principal factor que se pensa estar envolvido é o VEGF. Estes factores podem ser derivados das próprias células tumorais ou por células inflamatórias que infiltram o tumor. As células tumorais não apenas produzem factores angiogénicos, mas também induzem a produção de moléculas anti-angiogénese. O crescimento tumoral é, assim, controlado pelo equilíbrio entre factores angiogénicos e aqueles que inibem a angiogénese. Endostatina, um factor anti-angiogénese, está a ser testado pelos seus efeitos sobre os tumores. Foram ainda realizadas experiências para testar os efeitos antitumoral de anticorpos para VEGF e VEGF-R2, e de pequenas moléculas que inibem sinal transdução através VEGF-R2.
Invasão e Metástase
Invasão e metástase são características biológicas dos tumores malignos, sendo estas as principais causas de morbilidade e mortalidade associados aos tumores. Para que as células tumorais se soltem de uma massa primária, se introduzam nos vasos linfáticos ou sanguíneos, e deêm origem a um crescimento secundário num local distante , devem passar por uma série de eventos. Cada um destes eventos nesta sequência está sujeito a uma multiplicidade de influências, portanto, em qualquer ponto desta a célula pode não sobreviver. Estudos em animais revelaram que, embora milhões de células sejam libertadas na circulação por dia a partir de um tumor primário, apenas algumas metástases são produzidas. A
justificação para esta situação pensa-se estar no facto de que apenas certo sub-clones das células tumorais possuem a combinação certa de genes para completar todos os passos envolvidos na metastização. Uma hipótese alternativa é que a metástase é o resultado de múltiplas alterações que se verificam em muitas, talvez a maioria, das células de um tumor primário. Essas alterações dão ao tumor uma predisposição geral para a metástase. Esta predisposição pode envolver não apenas propriedades intrínsecas às células tumorais, mas também as características do estroma, tais como os componentes do estroma , a presença de infiltrado de células inflamatórias, e a angiogénese. Para efeitos da presente discussão, a cascata metastática será dividida em duas fases: - Invasão da Matriz Extracelular; - Disseminação e Homing Vascular das Células Tumorais. Invasão da Matriz Extracelular A organização estrutural e função dos tecidos normais é, em grande medida determinada pela interacção entre as células e a matriz extracelular (MEC) . Os tecidos são organizados em compartimentos separados uns dos outros por dois tipos de MEC: - Membrana Basal; - Tecido Intersticial. Embora organizado de maneira diferente, cada um desses componentes da MEC é composta por colagénios, glicoproteínas e proteoglicanos. As células tumorais interagem com a MEC em diversas fases da cascata metastática. A primeira transgreção do carcinoma tem subjacente atravessar a membrana basal, em seguida, atravessar o tecido intersticial, e, finalmente, ter acesso á corrente sanguínea por penetrar na membrana basal vascular. Este ciclo é repetido, mas de forma inversa, quando o êmbolo de células tumorais invade uma nova localização num local distante. A invasão do MEC é um processo activo que pode ser dividido em várias etapas: - Perda de Adesão entre as Células Tumorais; - Ligação aos Componentes da MEC; - Degradação da MEC; - Migração das Células Tumorais. As células normais são ordenadamente colados umas em relação ás outras por intermédio de moléculas de adesão, sendo a família das caderinas a mais importante, salientando o papel da E-Caderina ao nível dos epitélios. Em vários tumores epiteliais, incluindo os adenocarcinomas do cólon e de mama, há uma diminuição da expressão de E-Caderina, o que reduz a capacidade das células para aderirem umas às outras e facilita a sua separação do tumor primário e o seu avanço para os tecidos circundantes. Para penetrar na MEC envolvente, as células tumorais necessitam de primeiro aderir aos componentes da MEC. As células epiteliais de um tumor são separadas do estroma por uma membrana basal. Assim, para as células tumorais penetrarem na membrana basal, a membrana deve ser degradada e remodelada. Este processo leva a que componentes da membrana basal enviem sinais positivos e negativos para o crescimento das células tumorais, o que irá desempenhar um papel importante na regulação da angiogénese. Além disso, parece haver uma correlação entre a densidade de receptores laminina e a capacidade de invasão nos cancros da mama e do cólon. A invasão da MEC não é meramente passiva devido à pressão do crescimento, mas exige degradação enzimática activa dos componentes da MEC. Estas células tumorais secretam enzimas proteolíticas por si só ou induzem as células hospedeiras a secretarem proteases Embora o efeito mais óbvio seja a destruição da matriz para criar um caminho para a invasão de células tumorais, a clivagem dos produtos dos componentes da matriz, derivados de colagénio e proteoglicanos, têm também actividades promotoras do crescimento, angiogénese, e acção quimiotática.
Disseminação e Homing Vascular das Células Tumorais
Uma vez na circulação, as células tumorais são particularmente vulneráveis à destruição pelo sistema imunitário. Enquanto estiverem em circulação, as células tumorais tendem a agregar-se em pequenas massas. Isto é favorecido pela aderência homóloga entre as células tumorais, bem como pela adesão heteróloga entre células tumorais e células do sangue, particularmente as plaquetas. A formação de agregados plaquetários-tumorais pode aumentar a sobrevivência de células tumorais e a sua capacidade de se implantarem. A fixação e o extravasamento de êmbolos tumorais em sítios distantes envolvem a adesão ao endotélio, seguido da saída através da membrana basal. Envolvidas nestes processos estão as moléculas adesão e as enzimas proteolíticas, discutidas anteriormente. É de particular interesse referir a molécula CD44, que se encontra expressa em linfócitos T normais e é utilizado por essas células para migrarem para locais específicos de tecido linfóide. No novo locas, as células tumorais precisam de proliferar, desenvolver um suprimento vascular, e evitar a imunidade local. O local onde as células tumorais migratórias se vão estabelecer depende das características do tumor primário que lhes deu origem. Por exemplo, preferencialmente o carcinoma da próstata mestastiza para o osso, o carcinoma broncogénico tendem a envolver as supra-renais e no cérebro, e neuroblastomas, disseminam-se para o fígado e os ossos. Este tropismo para determinados orgãos parece estar relacionado com os seguintes mecanismos: - No momento em que houve ligação á MEC e ao endotélio no local de origem as células tumorais podem ter moléculas de adesão que são expressas preferencialmente sobre as células endoteliais dos órgãos-alvo; - A presença de determinadas quimicionas têm um papel importante nesta determinação. Algumas células tumorais expressão receptores para determinadas quimiocinas que são expressas preferencialmente em alguns locais; - Por outro lado alguns locais podem não constituir um ambiente favorável para a fixação daquele tumor, quer seja por ausência de factores promotores do seu crescimento, quer por presença de factores imunitários.
Agentes Carcinogénicos e a sua Interação com as Células
Um grande número de agentes causam lesões genéticas e induzir transformação neoplásica de células: - Agentes Químicos, ao longo dos tempos, centenas de substâncias químicas têm sido indicadas como possuindo capacidade para transformar células in vitro e em animais a serem cancerígenas. Alguns produtos industriais, como os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, ou alguns medicamentos são actualmente indicados como os principais agentes indutores de neoplasias actualmente. Muitos dos agentes químicos actuam através da lesão celular, indo actuar como promotores, não sendo directamente cancerígenos, mas ao aumentarem a proliferação celular, aumentam igualmente a probabilidade de existir uma mutação que leva à transformação neoplásica. Por outro lado é possível que através de determinadas interacções sejam lesadas genes envolvidos na regulação do crescimento celular ou da apoptose, tornando as células passíveis de se transformarem em células tumorais. Existem substâncias que têm uma acção directa, no entanto outras necessitam de sofrer metabolização in vivo para se tornarem activas. Existe ainda uma balanço entre a metabolização do agente no sentido de este perder a sua actividade ou de permanecer activo, sendo que a maior parte destes compostos são metabolizados pelo citocromo P-450, sendo este altamente polimórfico, é possível justificar as diferentes susceptibilidades a estes agentes entres os indivíduos;
- Radiação, as radiações UV ou ionizantes podem transformar in vitro ou in vivo praticamente todas as células dos animais e humanos. É fácil compreender que a exposição à luz Solar é indutor do cancro da pele, ou que a exposição ás radiações oriundas de uma central nuclear são tidas como causa para diversas neoplasias. A carcinogénese associada aos raios UV é atribuída à formação de dímeros pirimidina no DNA, sendo estas lesões reparadas pela excisão de nucleótidos, o que com elevados níveis de exposição se torna limitado, levando a que um grande número de alterações no DNA permaneçam divisão após divisão. Estas mutações no DNA podem mais uma vez afectar oncogenes ou genes supressores de tumores, condicionando um estado pró-cancerígeno. Em humanos, há uma hierarquia de vulnerabilidade dos diferentes tecidos ao cancro induzido pela radiação. As mais frequentes as leucemias, o cancro da tiróide em jovens; no patamar intermédio temos o cancro da mama, pulmão e das gândulas salivares; e por fim, a pele, os ossos e o tubo digestivo que se apresentam como relativamente resistentes á capacidade da radiação induzir transformação neoplásica. - Vírus Oncogénicos e outros Microrganismos, existem diversos agentes que se encontram associados a um aumento de determinados tumores. Um dos casos mais bem estudas é a associação entre o Helicobacter pylori e os tumores gástricos. Existem ainda os vírus do HPV, o EBV, HBV e o HCV que têm sido frequentemente associados com algumas formas de cancro, respectivamente, carcinoma do colo do útero, linfoma Burkitt e carcinoma hepato-celular. Apesar desta forte associação não existem indícios de que estes agentes sejam por si só indutores da transformação, o que se sabe é que sua actividade, quer seja pela lesão constante das células, quer seja pela inclusão do seu genoma nas células hospedeiras, existe um estímulo constante para que haja proliferação celular, aumentando o risco de transformação maligna, o que muitas vezes se deve à inibição dos sistemas de controlo de erros durante a transcrição. Por outro lado existe até hoje um vírus que se sabe ser directamente indutor da carcinogénese, o HTLV-1, dando origem a um linfoma ou leucemia de células T no adulto.
Defesa Contra Tumores e Imunidade Tumoral
Foi Paul Ehrlich que propôs que o reconhecimento imunitário autólogo de células tumorais possa ser um mecanismo positivo capaz de eliminar os tumores. No entanto o facto de os tumores ocorrerem em indivíduos imunocompetentes indica-nos que existe imperfeições no sistema imunitário a este nível. Antigénios Tumorais As primeiras tentativas de purificar e caracterizar antigénios tumorais foram baseados na produção de anticorpos monoclonais específicos para células tumorais e definindo os antigénios que estes anticorpos reconheciam. A transformação neoplásica, como discutido anteriormente, resulta de alterações genéticas, algumas das quais podem resultar na expressão de antigénios da superfície celular que são vistas como estranhas pelo sistema imunitário. Podendo estas proteínas ser apresentadas pela própria célula – MHC I – ou por outras células apresentadores de antigénios que fagocitaram restos de células tumorais mortas – MHC II. Uma vez que estas proteínas alteradas não estão presentes em células normais, não induzem auto-tolerância. Estes antigénios são extremamente diversos, porque o que induziu a transformação tumoral é aleatório, o que nos leva a uma situação em que qualquer gene pode estar alterado, e em locais diferentes, sendo depois apresentado pelo MHC I. Outras das hipóteses é que um aumento da expressão de determinadas proteínas normais em células tumorais seja encarado como um antigénio tumoral, o que se deve a um aumento inesperado da quantidade desse antigénio. Nesta linha podemos ainda ter antigénios tumorais nos casos em que determinadas células expressam
genes que normalmente não são expressos naquele tecido, ou que apenas o eram durante o desenvolvimento embrionário. Por fim, em muitos dos tumores as glicoproteínas de superfície encontram-se alteradas, o que permite reconhecer essas células como estranhas, funcionando como um antigénio tumoral. Por outro lado, é possível que a infecção por determinados vírus oncogénicos seja reconhecido pelo sistema imunitário, sendo a células eliminada. Mecanismos Efectores Anti-Tumorais Embora tanto a imunidade humoral como a celular tenham demonstrado ter actividade antitumoral, o principal mecanismo que combate o tumor é a imunidade celular através das células T CD8+ CTLs. Estas células, juntamente com as NK, ao reconhecerem os antigénios tumorais podem matar as células tumorais por mecanismos semelhantes aos utilizados para matar eliminar os microrganismos, por exemplo, a produção de espécies reactivas de oxigénio A produção de anticorpos direccionada para os antigénios tumorais pode eliminar estas células através da activação do sistema de complemento ou por fagocitose ou morte mediada por anticorpos, nomeadamente pelos macrófagos e NK. No entanto, apesar de esta actividade estar demonstrada in vitro, pensa-se que a sua efectividade seja reduzida in vivo.
Características Clínicas dos Tumores
As neoplasias são essencialmente parasitas. Todos os tumores, mesmo os benignos, podem causar morbilidade e mortalidade. Embora a avaliação clínica possa sugerir a benignidade ou malignidade da massa, a única forma inequívoca é a excisão da mesma e a sua análise pela anatomia patológica Em seguida iremos falar de:
- Efeitos de um Tumor no Hospedeiro; - Classificação e Estadiamento Clínico do Cancro. Efeitos do Tumor no Hospedeiro Ambos os tipos de neoplasias, maligna ou benigna, podem causar problemas, devido a: - Localização e impacto sobre as estruturas adjacentes; - Actividade funcional, por exemplo a produção de hormonas; - Hemorragia e infecções secundárias, quando ulceram através das superfícies adjacentes; - Início de sintomas agudos causados por uma ruptura ou enfarte. Não só o tumor primário tem a capacidade de induzir estas alterações, qualquer metástase tem o mesmo potencial para as produzir. Em alguns casos o cancro pode ser responsável por caquexia ou síndromes paraneoplásicas. Localização e Produção de Hormonas A localização do adenoma pituitário, embora seja um tumor benigno e, possivelmente, não produtor hormonas, o seu crescimento expansivo pode destruir as restantes células da hipófise e, consequentemente, levar a uma endocrinopatia grave. No cancro do intestino, tanto as lesões benignas, com as malignas, podem causar obstrução à medida que o seu tamanho aumenta. As neoplasias de glândulas endócrinas podem produzir manifestações pela síntese de hormonas. Essa actividade funcional é mais típica de tumores benignos do que de cancro, que por ser suficientemente indiferenciado pode ter perdido essa capacidade. Caquexia Os indivíduos com cancro frequentemente sofrem uma perda progressiva de gordura corporal, bem como de massa corporal magra, acompanhada de profunda fraqueza, anorexia e anemia. A sua etiologia é desconhecida, mas pensa-se que seja como consequência das necessidades nutricionais do tumor. Actualmente existem evidências de que este estado resulta também de factores solúveis e citocinas produzidas pelo tumor e pelo hospedeiro em resposta á sua presença. Síndromes Paraneoplásicas Os sintomas complexos em indivíduos com cancro, cuja origem não pode ser facilmente explicada, quer pelo local ou disseminação distante do tumor ou pela síntese de hormonas, são denominadas como Sindromes Paraneoplásicas. Estas manifestações ocorrem em cerca de 10% dos pacientes com doença maligna. Apesar da sua relativa infrequência, as síndromes paraneoplásicas são importantes porque podem representar a única ou a mais evidente manifestação de uma neoplasia oculta, ou nos pacientes com neoplasias já diagnosticada podem indicar agravamento do seu estado geral, ou podem mesmo imitar doença metastática, tornam a terapêutica sujeita a erro. As endocrinopatias são frequentemente encontradas nas sindromes paraneoplásicas, sendo a Síndrome de Cushing a mais comum, em que aproximadamente 50% dos pacientes com esta síndrome apresentam carcinoma do pulmão, principalmente os de pequenas células. É causada pela produção excessiva de corticotropina ou de péptidos tipo-corticotropina. A hipercalcemia é provavelmente a mais comum de todas as síndrome paraneoplásica. Existem dois processos em questão envolvidos nestas alterações: - Osteólise induzida pelo cancro, se o tumor primário for no osso, como o mieloma múltiplo, ou metastático para o osso de qualquer lesão primária; - Produção de substâncias calcémicas por neoplasisas localizadas fora do território ósseo. Talvez o mais importante esteja relacionada a hormona paratireóide - rPTH. As síndromes paraneoplásicas neuromiopáticas tomam diversas formas, tais como neuropatias periféricas, degeneração cerebelar cortical, uma polimiopatia semelhante à polimiosite,
síndrome miasténica semelhante à miastenia gravis. A causa dessas síndromes é mal compreendida. Em alguns casos, os anticorpos, presumivelmente contra as células tumorais reagem de forma cruzada com células neuronais. Várias manifestações vasculares e hematológicas podem aparecer em associação com uma variedade de formas de cancro. Como as tromboflebites migratórias - Síndrome de Trousseau - podem ser encontradas em associação mais frequentemente com os carcinomas do pâncreas ou pulmão. A coagulação intravascular disseminada aguda é mais comumente associado com leucemia promielocítica aguda e adenocarcinoma da próstata.
Classificação dos Tumores
Estes sistemas de classificação foram desenvolvidos para expressar, pelo menos em termos semi-quantitativos, o nível de diferenciação, ou grau, e a extensão da disseminação de um cancro no doente, ou a fase, como os parâmetros da gravidade clínica da doença. A classificação de um tumor é baseada no grau de diferenciação das células tumorais e no número de mitoses dentro do tumor como presumível correlação entre a neoplasia e a sua agressividade. Assim, os tumores são classificados como grau I a IV com o aumento da anaplasia [um termo usado para descrever o processo de desdiferenciação de células altamente diferenciadas em células pouco diferenciadas. É um processo característico de neoplasias malignas]. Os critérios para os diferentes graus variam de acordo com cada tipo de
neoplasia e, portanto, não são detalhadas aqui, mas todas as tentativas, no essencial, para avaliar em que medida as células tumorais lembram ou não lembram seus homólogos normais. Embora a gradação histológica seja útil, a correlação histológica entre a aparência e comportamento biológico encontra-se muito longe de ser perfeita. Devido a esta limitação e para evitar falsas quantificações, é prática comum para caracterizar uma neoplasia em especial termos descritivos, por exemplo, bem diferenciado, adenocarcinoma do estômago secretor de mucinas, ou altamente indiferenciados, tumor maligno retro-peritoneal, provavelmente sarcoma. Em geral, com algumas excepções, como sarcomas dos tecidos moles, a classificação de cancros revelou-se de menor valor do que tem estadiamento clínico. O estadiamento do cancro é baseado no tamanho da lesão primária, o seu grau de disseminação para gânglios linfáticos regionais, bem como a presença ou ausência de metástases por via sanguínea. Dois grandes sistemas de estadiamento estão actualmente em uso, um desenvolvido pela União Internacional Contra o Câncer (UICC) eo outro pela American Joint Committee (AJC). A UICC emprega um sistema de classificação chamado o TNM: - T, para o tumor primário; - N, gânglios linfáticos regionais; - M, metástases. O estadiamento TNM varia para cada tipo de cancro, mas existem princípios gerais. Com a crescente dimensão, a lesão primária é caracterizada como T1 a T4, T0 é adicionado para indicar uma lesão no local. N0 significaria o não envolvimento de gânglios linfáticos, enquanto N1 a N3 denotam o envolvimento de um maior número e variedade de gânglios. M0 significa sem metástases distantes, enquanto o M1 ou por vezes M2 indica a presença de metástases por via sanguínea e um parecer sobre a sua quantidade. A AJC emprega uma nomenclatura um pouco diferente e divide todos os cancros em estádios de 0 a IV, incorporando dentro de cada uma destas etapas, o tamanho da lesão primária, bem como a presença de metástases distantes e disseminação ganglionar. O estadiamento da doença neoplásica tem assumido grande importância na escolha da melhor forma de terapia para o paciente. Não é demais repetir que o estadiamento tem provado ser de maior valor clínico além classificação. Em alguns casos, como no caso do cancro pulmonar, o estadiamento tem sido muitas vezes auxiliado por técnicas de imagem, como a tomografia de emissão de positrões – PET.