ruy otahke
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Ruy Ohtake
Filho primogênito da artista plástica, e grande nome do abstracionismo informal
no Brasil, Tomie Ohtake e do agrônomo Alberto Ohtake, é formado arquiteto e
Urbanista pela FAU-USP.
Fez uma arquitetura mais lírica e leve, que expressa o prazer pelas curvas. Já
foi considerado “o mais carioca dos arquitetos paulistas”.
Decidiu estudar arquitetura, assim como seu irmão, por influência do meio em
que vivia, repleto de arte devido à sua mãe. De acordo com ele, os professores
que mais o influenciaram foram: Vilanova Artigas, devido à crítica social na
arquitetura; Lourival Gomes Machado, crítico de arte; Flávio Mota, professor de
história da arte.
Ohtake ainda ressalta, além da qualidade dos professores, a importância do
ambiente universitário, com muita discussão dentro e fora da sala de aula e do
diretório acadêmico.
Ohtake estudo e formou-se arquiteto em um período de efervescência na
arquitetura brasileira, a mudança de capital. Sempre que podia, quando
estudante, visitava o escritório de Oscar Niemeyer, em uma dessas visitas o
conheceu pessoalmente e cada vez mais foi influenciado por seu trabalho. Na
época, o arquiteto era um profissional desvalorizado, a profissão ainda se
firmava no país. Ao formar-se, começou a trabalhar meio período no Centro de
Pesquisas de Estudos de Urbanismo da FAU-USP e o tempo restante em seu
escritório próprio. Seu primeiro projeto foi a garagem para a casa de seu tio.
Em seu período de trabalho viveu a ditadura militar e a crise econômica que o
Brasil passava, mesmo assim fez muitas de suas obras mais significativas em
meio à crise.
O trabalho do arquiteto é movido pela grande quantidade de demanda. Suas
obras, não são somente requisitadas em território nacional, mas também no
exterior. Ohtake tornou-se referência no meio dos arquitetos, e por isso é
regularmente convidado para representar o Brasil em diversas palestras, como,
o XX Congresso da UIA - União Internacional dos Arquitetos, evento realizado
em junho de 1999 na China, ao lado de figuras importantes, como Jean Nouvel
e Tadao Ando. Ruy também assina o projeto arquitetônico da butique de óculos
solares do Brasil, a OPART, localizada na Rua Oscar Freire em São Paulo e
Piauí Multimídia, em Teresina - Piauí.
Principais obras
Aquário Pantanal
O maior aquário de água doce do mundo, com 6,6 milhões de litros de água,
263 espécies e sete mil animais. Este projeto audacioso ressalta o estilo
contemporâneo do arquiteto. Além do ambiente interno, que inclui um túnel de
180 graus, o aquário terá cinco tanques externos, que poderão ser percorridos
a pé ou em um trajeto aquaviário em barco com fundo de vidro.
Monumental, o Complexo Aquário do Pantanal, que Ruy Ohtake está
desenhando para o governo do Mato Grosso do Sul, deverá ser implantado
numa das entradas do principal parque urbano de Campo Grande, o Parque
das Nações Indígenas. Primeiro projeto do arquiteto a ser construído na
cidade, ele é composto por dois volumes conectados e em desnível - o
pavilhão central e o dos aquários -, que têm como cenário um jardim central e
aberto, dedicado à biodiversidade do Pantanal mato-grossense. O pavilhão dos
aquários, que fica em nível rebaixado, terá sua fachada externa embasada por
painéis de vidro transparente a meia altura. Com isso, o visitante desfrutará, ao
longo de todo o percurso, de livre visão do jardim oval, coplanar ao pavimento
e com 70 metros em seu eixo maior.
Além de iluminar naturalmente o túnel dos aquários, esse artifício cumpre a
função didática de visualização simultânea da biodiversidade de que trata o
projeto e promove a integração visual, enfatiza Ohtake.
A arquitetura propõe o contraste de escalas. A entrada será feita através de
uma espécie de cápsula metálica com pé-direito generoso - 14 metros no ponto
mais alto -, cuja identidade resulta do grafismo dos materiais estruturais e de
vedação. Vidro, metal e pórticos em forma de arco configuram o volume de
recepção, que é visualmente marcante mas, como espaço de transição, deverá
ter ocupação rarefeita.
Uma abertura de formato orgânico no piso permitirá que os equipamentos de
circulação vertical conduzam ao andar inferior, ao espaço focal do projeto, que,
de certa forma, tem ambiência intimista. Sua cobertura é abobadada; a
iluminação natural virá das aberturas baixas da fachada externa, enquanto a
face interna é envolta por aquários de fechamento curvo e dimensões variadas,
formando um caminho pontuado pelos desenhos dos volumes preenchidos
com água e vidro projetados por Ohtake. “O complexo terá marcante vocação
turística, didática e de lazer”, conclui o arquiteto.
Brasília Shopping and Towers
Este edifício está inserido no contexto arquitetônico de Brasília. As duas torres
e arco, que estão conectadas com os andares superiores. O empreendimento é
composto por 19 pavimentos, duas torres e cada uma delas contam com 14
andares e 336 salas comercias e escritórios.
Hotel Unique
O hotel Unique é referência mundial por sua originalidade e design instigante.
Está próximo dos lugares mais badalados da cidade, como a Av. Paulista, o
Parque Ibirapuera, a Av. Faria Lima, os shoppings Iguatemi e próximo do
aeroporto de Congonhas. Composto por 6 pavimentos, totalizando 96
apartamentos, seus diferencial está na forte característica urbana, traço
singular de São Paulo.
Ao definir a forma, como um longo arco invertido (quase 100 m de
comprimento) com 2 empenas laterais de concreto, procuramos caracterizar
como um conceito de hotel-urbano.
O acesso do hotel é pelo grande espaço vazado do lado direito e o acesso ao
Centro de Eventos é, simetricamente, pelo grande vazado do lado esquerdo.
Esses dois espaços vazados, que começam com 25 m de altura, e descem em
curva, constituem um forte elemento dessa característica urbana da obra.
As janelas circulares, de 1,80 m de diâmetro, permitiu uma composição
dinâmica na fachada, acentuada pelo revestimento em placas de cobre pré-
oxidadas em três tons de verde.
No térreo, com pé direito duplo e curvo, localizam-se a recepção, bar e área de
apoio, onde foi projetada toda uma parede de vidro transparente com muita
suavidade, possibilitando uma “conversa” entre o lobby do hotel e a rua da
cidade.
O restaurante, na cobertura, com a necessária leveza, obtida com detalhes de
vidro e respectiva estrutura metálica, tem uma vista privilegiada para a cidade
de São Paulo.
O centro de eventos, no 1º subsolo, constituído de salões modulados,
totalizando área para 1.500 pessoas. E 3 subsolos completam o edifício, para
estacionamento e área de infraestrutura.
O espaço interno acompanha o desenho externo: os corredores dos
apartamentos são curvos, buscando a luz natural das janelas circulares.
Os apartamentos de ponta tem uma característica inusitada: o piso sobe em
curva, resgatando o desenho da fachada, até encostar no forro, provocando um
espaço totalmente diferenciado.
Embaixada do Brasil em Tóquio
Com uma fachada curva e verticalizada, a Embaixada que representa o Brasil
no Japão, ganha características únicas. O prédio tem cinco pavimentos, e está
localizado em uma rua bem estreita, o que dá ao empreendimento uma
característica ainda mais excitante, além das cores fortes que representa a
cultura brasileira.
Residência, Valinhos, SP
Autor consagrado de projetos de variadas escalas e programas, como o Hotel
Unique e o Instituto Tomie Ohtake, ambos em São Paulo, o arquiteto Ruy
Ohtake é seletivo quando desenha casas.
“Projeto em média duas residências por ano”, ele relata, “para não perder a
familiaridade com o espaço doméstico.”
A criação zelosa ganha ares de requinte austero nesta residência localizada
em condomínio fechado em Valinhos, na Região Metropolitana de Campinas.
Com um volume único e regular de concreto, o projeto se alimenta de
contrapontos imediatos: a forma geral é contínua e aparentemente linear, mas
as dimensões e curvaturas acentuadas das vigas frontais de travamento
sugerem, ao contrário, tridimensionalidade rebuscada.
Da mesma forma, se o predomínio do concreto aparente nas superfícies
internas e externas dissimula os limites da casa, acentuando a sensação de
horizontalidade ou de fundo infinito, é vertical o elemento articulador e de
destaque nos interiores: uma grandiosa rampa circular e escalonada que,
deslocada de qualquer eixo simétrico, está constituída por concreto, vidro e
madeira.
“O essencial é pesar a proporção”, define Ohtake, dando pistas de que há mais
do que a despretensiosa simplicidade com que ele apresenta o projeto. O
arquiteto se refere em particular à esbelteza estrutural do concreto, presente
tanto na pouca espessura da casca hermética que conforma a edificação
quanto nos modestos 20 centímetros dos seus dois únicos pilares, alinhados
com a fachada frontal.
O volume da casa é gerado por uma espécie de fita ou casca contínua de
concreto que, com seu traçado cônico, arremata o vértice em bico do terreno
com acentuado aclive. Essa forma regular e arredondada, aliada à estratégica
implantação no terço posterior e mais elevada do lote, define o ponto focal para
onde se volta a edificação: a bela área frontal e externa de lazer ao ar livre.
O projeto prescinde de recursos para a intermediação de ambientes internos e
externos. Não há pátios, volumes inter-relacionados, reentrâncias ou beirais
sobressalentes, apenas a relação estanque dentro/fora que as vigas esculturais
da fachada fazem questão de enfatizar.
Nesse sentido, o ponto alto do projeto é mesmo o domínio privado, doméstico,
ou seja, a grandiosidade do ambiente interno. No térreo, a grande sala de estar
é interrompida em alguns pontos por paredes ou balcões coloridos desenhados
por Ohtake - que há tempos transita com desenvoltura nas escalas
arquitetônica e do objeto -, embora prevaleça em primeiro plano a visualização
da parede exterior contínua, de concreto aparente.
Prepara-se a cena, portanto, para a profusão de curvas da rampa escalonada
localizada num canto posterior da sala. Sua proporção grandiosa é valorizada
pela luz zenital proveniente do teto circular de vidro, assim como pelo desenho
sinuoso da abertura que interliga visualmente os dois andares.
Residência Tomie Ohtake
Originalmente, o terreno ocupado pela casa era estreito e comprido, com um
amplo pátio lateral ao final, formando um “L”. A casa ocupa completamente a
área linear do terreno. A partir de uma série de vigas transversais a cada 1
metro e 20 centímetros apoiadas nas paredes laterais, que criam um ambiente
único, sem obstáculos, se distribui livremente os ambientes da residência. O
acesso principal se dá lateralmente ao acesso de veículos, através de um
corredor ligeiramente elevado em relação ao nível da garagem. Ambos são
completamente abertos à rua; não existem portões que delimitem a fachada.
Mas são protegidos pela mesma laje e seu sistema de vigas transversais de
concreto aparente.
As portas de acesso à casa estão recuadas em relação ao limite do terreno.
Pelo lado da garagem uma porta de tamanho usual leva à área de serviço. Já o
corredor principal chega a uma larga porta de vidro e painéis de cores
elementais que leva a um vestíbulo de recepção, antes de chegar aos salões
de jantar e estar.
O ambiente dos salões é caracterizado pelas paredes de concreto aparente
pintados de azul, amarelo, vermelho ou branco, que delimitam a copa e a
cozinha, e, do lado oposto, os dormitórios; pelas estantes e mobiliários fixos em
concreto aparente natural; e pela mesa curva ao centro do estar, que numa de
suas extremidades recebe um nicho rebaixado para a lareira, cuja chaminé se
apresenta como um volume quadrado que desce a partir da laje, abarcando a
lareira, porém distanciado dela.
Em sequência aos salões, num percurso fluido desde o vestíbulo, localiza-se o
atelier da artista seguido do dormitório principal, na extremidade do terreno.
São separados do estar e jantar por um volume de dormitórios e por um
desnível descendente. Tais dormitórios formam o único volume da residência
que se desprega das paredes perimetrais, solto ao meio dos salões, criando
uma separação para o atelier. Alberga dois dormitórios mínimos, explicitamente
concebidos para o justo ato de dormir, intercalados por um banheiro comum,
também utilizado socialmente.
O urbanista e o trabalho social em Heliópolis
Ruy afirma que encontra em Heliópolis uma solidariedade que nunca tinha
vista. O arquiteto de mais de 50 anos de carreira, é autor do projeto de
habitação social, que conta com investimento federal e municipal, “Os
Redondinhos”. Essa construção proporcionou aos moradores da região lares
dignos com parques coloridos e de formas ousadas. As obras e as
modificações no local são de encher os olhos. A relação de Ruy com Heliópolis
surgiu de um mal entendido. O arquiteto foi entrevistado por uma revista, na
discursão Ruy mencionou que achava gritante a diferença entre um bairro com
recurso e uma comunidade carente, ele comparou os bairros do Morumbi com
Heliópolis, terras distintas. O periódico de má fé publicou que o arquiteto
achava a região feia, por conta disso, lideranças do local entraram em contato
para esclarecer o comentário e perguntar como o renomado Ruy Ohtake
poderia ajudá-los para balancear essa diferença, o relacionamento deu seu
primeiro passo. Do mal entendido surgiu uma grande oportunidade. O projeto
social de Ruy Ohtake em Heliópolis começou em 2003, a convite de um dos
líderes comunitários do bairro. O trabalho iniciou-se com intervenções
cromáticas, pinturas de três ruas escolhidas pelos próprios moradores. A partir
deste momento, as portas começaram a se abrir e com o auxílio de um banco
foi instalado uma modesta biblioteca na região. Ruy propôs que a localização
do centro de leitura fosse escolhida pelos habitantes, e assim aconteceu.
Biblioteca de Heliópolis, projeto do arquiteto Ruy Ohtake, o acervo atinge toda a população da região
Ohtake quebrou o paradigma de que habitações ou bairros bonitos são apenas
realidades de pessoas com maior poder aquisitivo, Heliópolis ganha nova cara.
Com essa primeira reforma realizada, o arquiteto tornou-se conhecido pela
região de Heliópolis, e alguns anos mais tarde foi lembrando por um dos
membros da Unas - União de Núcleos Associações e Sociedades de
Moradores de Heliópolis e São João Clímaco, para ajudar quando a prefeitura
estudava a construção de três creches. As escolinhas de jardim de infância
foram edificadas com projetos arquitetônicos e padrões da prefeitura. Ruy
ajudou a posicioná-las nas proximidades de duas escolas municipais. Depois
dessa intervenção, nasceu o projeto polo educativo e cultural, uma realização
do arquiteto. Sete prédios, pintados com diversas cores, e redondos
distribuídos em uma área de 35 mil m², em que é proibido à entrada de carros,
no local não há muros. Entre as edificações, um campo verde utilizado pela
comunidade como parque nos finais de semana.
Projeto Cor. Pintura das casas da comunidade de Heliópolis realizada em parceria com os moradores.
Redondinho de Heliópolis
Um complexo residencial para habitação de interesse social, possui de 29
edifícios. Os “redondinhos” tem quatro andares, são adaptados para portadores
de deficiência, contam com espaço de convivência, lixeiras seletivas e
playground.
A piscina vai ser redonda ou quadrada? Mal acabara de conhecer o arquiteto
Ruy Ohtake, a adolescente disparou a pergunta. “O que você prefere?”, ele
devolveu. “Quadrada”, retrucou a garota. “Porque é maior.” Na clara manhã de
uma segunda-feira do final de novembro, o arquiteto estava mais uma vez em
Heliópolis, que já foi a maior favela de São Paulo e que, graças a intervenções
do poder público nas quais Ohtake é também personagem, caminha para se
integrar à cidade formal.
Embora não tão distante do escritório (e da moradia) de Ohtake, na região dos
Jardins, Heliópolis escancara as contradições da cidade: opulência e miséria,
solidariedade e indiferença.
Existe um caminho em que essas oposições se aproximam e, com a habilidade
de seu ofício, Ohtake se propôs a trilhá-lo, ainda que o trajeto, assim como a
conformação do aglomerado urbano, nem sempre seja claro e muitas vezes
desemboque em desvios e becos.
A conversa da adolescente com o arquiteto não foi numa sala de aulas, mas ao
ar livre, na alameda do polo cultural e educativo de Heliópolis, que, além da
piscina, vai ganhar quadra esportiva, biblioteca comunitária e a torre da
Cidadania.
Ela começou depois que a gestora do braço cultural do complexo, Arlete
Persoli, identificou Ohtake e apresentou-o às estudantes, informando que ele
era o autor da escola técnica e do centro cultural que fazem parte do conjunto.
Ohtake definiu também as áreas onde deveriam ser implantadas as creches e
deu ao local antes ocupado por depósito da subprefeitura a configuração de um
parque urbano que, para o arquiteto, não encontra similar na cidade e, de certa
forma, concretiza a retórica do trabalho que vem fazendo junto à comunidade.
João Figueiras Lima, Lelé.
Nascido no Rio de Janeiro em janeiro de 1932, cuja obra é especialmente
conhecida pelo seu trabalho como arquiteto junto a Rede Sarah de hospitais.
Formou-se arquiteto pela UFRJ em 1955 e recebeu influência de Oscar
Niemeyer e Nauro Esteves, se para Brasília ainda recém-formado, em 1957,
ano em que foi iniciada a implantação do plano piloto de Lucio Costa, onde
também colaborou com Niemeyer, trabalhou na UNB entre 62 e 65. A
necessidade de racionalização na construção de Brasília, despertou em Lelé o
interesse na tecnologia de racionalização do uso do concreto armado, levando-
o ao leste europeu para conhecer as tecnologias de construções pré-fabricadas
aplicadas em países como União Soviética, Tchecoslováquia e Polônia, em
meados da década de 1960.
A obra arquitetônica de Lelé caracteriza-se especialmente pela busca da
racionalização e da industrialização da arquitetura. Durante sua trajetória
chegou a propor métodos e processos de pré-fabricação de elementos
construtivos inéditos no país, sendo inclusive dono de uma fábrica de pré-
fabricados (a qual não mais existe). A forma como a argamassa armada, em
especial, e o aço foram explorados em sua obra também é fato revelador de tal
preocupação.
Atualmente Lelé atua como diretor do Centro de Tecnologia da Rede Sarah
(CTRS), onde desenvolve os projetos e a execução dos novos hospitais da
rede. Trabalhando para a CTRS, também desenvolveu projetos de mobiliário
hospitalar, entre os quais destaca-se uma cama-maca móvel utilizada bastante
pelos hospitais da rede.
O que eu achamos mais impressionante na obra dele, é que ele pensa
sustentabilidade e conforto ambiental a mais de 50 anos, coisa que só agora
com aquecimento global e essas mudanças climáticas que as pessoas
realmente tem levado a sério, além do uso de pré-moldados e de argamassa
armado, sistema que ele ajudou a aprimorar, e que tem um desperdício
mínimo, além de permitir com que a fase de construção seja rápida e respeite
os prazos.
Lelé também pensa os espaços como um todo, não só com relação a
arquitetura, mas também com relação a mobila e decoração. Ele pensa, desde
a maca que será utilizada pelo paciente no hospital até na espessura da viga
que sustenta o prédio. E ainda produz os materiais envolvidos nos dois
processos.
Principais obras
Projeto do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia.
O projeto do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região da Bahia é o primeiro
de João Filgueiras Lima (Lelé) à frente do Instituto Brasileiro de Tecnologia do
Hábitat (IBTH). Ele simboliza, portanto, uma nova fase na carreira do arquiteto,
que há cerca de um ano se desligou profissionalmente do Centro de
Tecnologia da Rede Sarah (CTRS), do qual foi fundador e onde atuou por duas
décadas. “Os hospitais têm custo alto de manutenção. Não é viável construir
mais unidades da Rede Sarah”, observa Lelé.
A nova sede do TRT é um complexo constituído por oito edificações, a serem
implantadas em terreno densamente arborizado e cuja topografia, na forma de
vale, tem desnível da ordem de 30 metros em relação à cota da via
circundante. Essas características marcantes motivaram a adoção do partido
arquitetônico definido pela mínima intervenção no lote.
A proposta de ocupação é pontual: o extenso programa foi setorizado em
prédio estanques, dispersos pela área de implantação. Trata-se de edifícios
com, em média, oito pavimentos, quatro deles abaixo e quatro acima da cota
pública envoltória, o que permitiu a criação de caminhos suspensos para
interligar as construções.
Essas passarelas fechadas e envidraçadas somam cerca de 200 metros
lineares de trajeto, de modo a enfatizar a grande escala da intervenção (são
130 mil metros quadrados construídos). A linearidade do percurso, em
contraste com a volumetria circular das edificações, reforça a distinção que o
projeto estabelece entre o ambiente natural e o construído.
Os prédios do tribunal foram planejados com estrutura metálica, cujos apoios
estarão restritos aos núcleos de circulação vertical, a fim de minimizar as
movimentações de terra. Nesse sentido, a maior intervenção ocorre nas bordas
do lote, onde serão criados quatro pavimentos de garagem e estacionamento
descoberto através de corte escalonado de 13 metros de altura.
O terreno da nova sede do tribunal fica próximo do hospital da Rede Sarah de
Salvador.
A equipe do projeto do TRT inclui ainda Beatriz Secco (paisagismo), Audium
(acústica e sonorização), Roberto Vitorino (estrutura), Porthos Moreira Gontijo
(elétrica), Kouzo Nishiguti (hidráulica) e George Raulino (ar condicionado).
Hospital Rede Sarah, Rio de Janeiro.
Esta unidade da Rede Sarah está localizada nas imediações do Centro de
Reabilitação Infantil, também projetado por Lelé e inaugurado em 2002, no qual
a arquitetura tira partido da vista e de condições climáticas favoráveis, relativas
à lagoa de Jacarepaguá.
No novo hospital, contudo, prescinde-se da água como entorno imediato e a
interface com a cidade - sobretudo com a movimentada avenida das Américas -
é mais próxima. Essa é a razão pela qual Lelé potencializou a interiorização -
característica das unidades da rede -, não só através dos recursos de
implantação, como também do engenho com que concebe a totalidade dos
elementos arquitetônicos. Na edificação em Jacarepaguá, a passagem do
ambiente externo para os interiores é gradual, feita através de camadas
sequenciais de coberturas e vazios, que resguardam a privacidade e o conforto
ambiental interno sem criar barreira rígida ao entorno.
Os tetos das unidades de internação, por exemplo, são constituídos por
esquadria metálica e aletas móveis de policarbonato que, ao serem abertas,
possibilitam a iluminação e a ventilação naturais do ambiente. Também a
grande cobertura interna e curva do passeio central da ala de internações tem
mecanismo retrátil de abertura.
Predominam a tipologia linear e a volumetria de grandes galpões, embora
pontualmente a arquitetura revele o volume esférico do auditório e estrutura em
balanço do solário.
É interessante pensar a arquitetura de Lelé inserida na cidade, no sentido da
permanência ao longo do tempo. Pois ela se presume perene neste projeto, no
necessário isolamento que o hospital conquista em relação ao entorno
imediato, dado o tipo de coesão entre a edificação, o paisagismo e o desenho
urbano. Em outros termos, mesmo quando a taxa de ocupação é significativa
em relação à área disponível para a implantação, Lelé e equipe são bem-
sucedidos na tarefa de criar uma unidade autônoma na cidade. As fotos aéreas
são representativas dessa observação. Elas evidenciam não apenas os recuos
ajardinados e o sutil aclive do lote em direção à área central do complexo
hospitalar, como também o papel decisivo que tem o espelho d’água linear, de
grande dimensão, em conjunto com a setorização longitudinal arquitetônica.
Pois a clínica de reabilitação desenhada por Lelé se revela esporádica e
controladamente ao exterior, na forma de passarelas pontuais, extensos jardins
e passeios entre as edificações, ou enquanto aberturas caracterizadas pelo
funcionamento controlado, retrátil, inseridas em certos trechos das coberturas.
O auditório, um volume semiesférico e inclinado, é pontuado verticalmente por
uma cúpula metálica que, por meio da automatização, abre-se em gomos a fim
de propiciar a entrada da luz natural no espaço interno. Um recurso já utilizado
anteriormente na Rede Sarah, mas que neste caso, devido à excentricidade do
cume semicircular, coloca o foco no palco.
Hospital Sarah Kubitschek - Fortaleza, CE.
Motivado pela vontade de melhor compreender as variáveis de conforto
ambiental e sua integração com o projeto arquitetônico, o arquiteto e urbanista
Jorge Isaac Perén focou seu mestrado no projeto do hospital Sarah Kubitschek
de Fortaleza, concebido pelo arquiteto João Filgueiras Lima (Lelé). Para Isaac
Perén, as obras de Lelé evidenciam as melhores soluções bioclimáticas para
favorecer a ventilação e a iluminação naturais.
“A preocupação constante com o conforto ambiental e a economia de energia
são características de suas obras: escolas, centros de vivência, elementos para
infra-urbana, mobiliário urbano e hospitais”. Apesar de Lelé ter um conjunto de
obras voltadas para a arquitetura bioclimática, Perén optou por projetos de
hospitais pela sua complexidade. “O arquiteto que consegue soluções
bioclimáticas em hospitais conseguirá em qualquer outra edificação”, afirma. As
soluções arquitetônicas para esse tipo de projeto estão subordinadas às
características climáticas do local. “Por isso, a orientação, forma do edifício e
as características de seus componentes - geometria e orientação de janelas,
aberturas, cobertura e paredes - respondem à direção dos ventos e à posição
do sol”, observa Perén.
O hospital da rede Sarah em Fortaleza foi construído sobre um terreno cuja
topografia, natureza do solo e nível do lençol freático favoreceram a execução
da obra. Uma grande área arborizada, abundante em espécies locais, ocupa
mais de 1/3 do terreno. Um bloco vertical abriga apartamentos e enfermarias.
“Embora a disposição horizontal seja a ideal para projetos de hospitais, pois
possibilita o acesso direto dos pacientes aos jardins adjacentes às áreas de
tratamento e internação, no Sarah Fortaleza o arquiteto optou por verticalizar
parte do programa para preservar a grande área arborizada do terreno”, afirma
Perén.
Ventilação
Para o pesquisador, a setorização do hospital Sarah Kubitschek Fortaleza
ilustra bem esses aspectos. O programa foi organizado de maneira a aproveitar
os ventos provenientes do sudeste. Da mesma forma, as galerias de
ventilação, no subsolo, foram orientadas para captar os ventos dominantes. E
os sheds funcionam como sucção do ar quente. O bloco vertical (enfermarias e
internação) foi localizado na parte posterior do terreno para não barrar as
correntes de ar e permitir, assim, a ventilação natural dos ambientes flexíveis.
Os ambientes com ar-condicionado estão localizados na parte posterior ou na
lateral do edifício, dando assim uma localização mais privilegiada para os
ambientes ventilados naturalmente. Para atender aos princípios da ventilação
natural foram desenvolvidos dois sistemas, que podem operar
simultaneamente: o de convecção e o de ventilação cruzada. No modo por
convecção, o ar frio é injetado através das galerias de ventilação do subsolo e
extraído pelos sheds, com as aberturas a favor dos ventos dominantes, dando
o efeito de sucção.
Merece atenção especial, devido ao funcionamento das galerias de ventilação.
Já o sistema de ventilação cruzada ocorre através de dois sheds, com
aberturas voltadas em sentido oposto. A eficiência desse sistema poderá ser
eventualmente aumentada com o emprego de equipamento mecânico de
exaustão ou insuflamento, localizado na abertura do shed.
Outro dado da pesquisa de Perén é que, no hospital de Fortaleza, a grande
cobertura em arco está formada por vigas de metal apoiadas nos pilares
periféricos da área de fisioterapia. Lâminas de metal, apoiadas às vigas,
permitem a ventilação dos ambientes e funcionam como brises, protegendo o
jardim interno da radiação direta do sol e da chuva. A cobertura em arco foi
concebida com brises móveis, que deveriam mudar sua inclinação conforme a
passagem do sol. Mas essa ideia não foi executada e a inclinação dos brises é
fixa.
Memorial Darcy Ribeiro, Brasília
Na inauguração do Memorial Darcy Ribeiro, no último mês de dezembro, o
então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva brincou com uma das
mais exuberantes características da irrequieta personalidade do antropólogo.
“Parecia que ia faltar Brasil para tantas ideias de Darcy”, observou. “Brasil não
vai faltar, ele que faz falta”, acrescentou. Não poderia, portanto, ter partido de
outra pessoa, senão do próprio Ribeiro, a intenção de construir um local para
guardar seu acervo no campus da Universidade de Brasília, da qual foi um dos
idealizadores.
Conta a história que, internado no Hospital Sarah Kubitschek de Brasília para
tratar de um câncer, em 1996, Ribeiro reforçou ao amigo Lelé, por meio de
teleconferência, o desejo expresso anteriormente de que o arquiteto projetasse
uma casa para abrigar os livros e o acervo do antropólogo, bem como de sua
primeira companheira, Berta Ribeiro.
Lelé recorda-se ainda que a ideia do memorial começara a florescer em uma
conversa entre ambos em 1995, quando Ribeiro fugiu do tratamento no
Hospital Samaritano, no Rio de Janeiro, para refugiar-se em sua casa em
Maricá (onde o arquiteto era um dos poucos a ser recebido).
Com o agravamento da doença, a urgência se acelerou. Ribeiro não queria que
a construção parecesse vetusta; pelo contrário, desejava que combinasse
arrojo e beleza, inovação e simplicidade.
Uma semana depois da videoconferência, Lelé mostrou-lhe pessoalmente o
primeiro esboço do edifício, ao qual o próprio homenageado, emérito
apelidador (é dele a alcunha de Sambódromo dada ao local de desfile das
escolas de samba), deu o nome extraoficial de Beijódromo, já que pretendia
que seu memorial fosse também um local de afetos.
Nos desenhos e na maquete, o programa proposto por Ribeiro consolidara-se
numa mistura heterogênea - mas nem por isso menos bela – de oca e disco
voador. Para que a execução do projeto se completasse passaram-se, porém,
14 anos.
Lelé concebeu para o centro cultural e de pesquisa um edifício circular de dois
pavimentos com 31,60 metros de diâmetro e cobertura de 37 metros, em cujo
centro existe um espaço igualmente circular ajardinado, com 13 metros de
diâmetro e pé-direito duplo. O térreo está apoiado no solo.
O pavimento superior possui laje de concreto armado sustentada por 32 vigas
radiais metálicas engastadas a pilaretes também metálicos, posicionados na
periferia da construção e, no centro, em um anel interno que distribui a carga
para oito pilares metálicos tubulares.
Para a estrutura da cobertura, o arquiteto empregou 32 vigas radiais apoiadas
externamente nas vigas do piso superior e internamente em um anel metálico
com três metros de diâmetro.
A cobertura é de telhas dobradas em chapas pré-pintadas de aço galvanizado
e, no trecho correspondente ao jardim interno, de chapas de policarbonato
alveolar. No interior do prédio, lâminas de aço pré-pintado funcionam como
brises na área vedada com policarbonato, permitindo aproveitar a luz natural na
maior parte do dia.
Envolto por um lago, o memorial tem acesso por uma ponte coberta por
marquise metálica. Na parte posterior da construção circular fica o teatro,
anexo que aproveita a formação em talude constituída pela terra retirada na
escavação para o círculo de água.
Um sistema de vaporização resultante da passagem do ar introduzido no
prédio por meio de nebulização mecânica da água do lago proporciona conforto
ambiental em todo o conjunto.
Salas de aulas, galeria para exposição, cineclube, gabinetes de pesquisa,
centro de documentação, café, livraria e anfiteatro estão reunidos no memorial.
Ele abriga, além do acervo de Darcy e Berta, a biblioteca do antropólogo, com
cerca de 30 mil volumes.
O espaço pode acolher apresentações artísticas, lançamento de livros e
exposições. O memorial fica entre o Instituto Central de Ciências (que Ribeiro
apelidou de Minhocão) e a reitoria. Resultado de um convênio entre o
Ministério da Cultura e a Fundação Darcy Ribeiro, teve investimento de 8,5
milhões de reais.