revista mundo jovem

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    2015

    Prazer em aprender:escola no castigo

    O que temos em comumcom nossos hermanos?

    Congresso Nacional conservador: at quando?

    Ritmos biolgicos e estilosde vida: como harmonizar?

    um jornal de ideias

    preciso falar. preciso ouvir. preciso que todas as vozes ecoem e que, sobretudo, as vozes se entendam e organizem a palavra e a ao coletiva. preciso dilogo em torno do que gera as desigualdades, e jamais se limitar apenas s compensaes.

    Douglas Belchior, professor na rede pblica de So Paulo e dos cursinhos da Unio de Ncleos de Educao Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora (UNEafro Brasil)

    Fraternidade,o caminho da paz

    Fotografia: Tiago da Silva Greff

    Informaes: p. 3 e contracapa

    AssinaturasMundo Jovem

    2015

  • fevereiro . 2015www.mundojovem.com.brSer Fraterno: um compromisso com paz!

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    LNGUA E LITERATURA

    As sementes que Rubem Alves plantou

    O escritor Rubem Alves nasceu na cidade mineira de Boa

    Esperana. Casualidade ou no, dentre tantas belas frases

    inspiradas, escreveu: Esperana quando, sendo inverno do lado de fora, a despeito dele brilha o sol de vero no lado de dentro.

    Lcia Barcelos,

    escritora, poetisa, integra a Equipe do jornal Mundo Jovem. E-mail: [email protected]

    Rubem Alves foi telogo, educador, tradutor e escritor: autor de livros de Filosofia, Teologia, Psicologia e de histrias infantis. E foi tambm um grande poeta, com uma linguagem que lem-bra os pssaros, cujos trinados so capazes de despertar os sonhos que repousam no recndito da alma de cada um.

    Ao fazer essa comparao do poeta com o pssaro, lembrando tambm do Rubem Alves educador, cabe aqui a transcrio de suas prprias palavras: Escolas que so asas no amam pssaros engaiolados. O que elas amam so pssaros em voo. Existem para dar aos pssaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas no po-dem fazer, porque o voo j nasce dentro dos pssaros. O voo no pode ser ensinado. S pode ser encorajado.

    Essa personalidade multiface-tada tambm muito contribuiu e continuar contribuindo atravs das suas produes literrias, para o enriquecimento da Edu-cao de adultos, jovens e crianas, pois tinha o dom de transformar ideias e palavras em brin-cadeiras divertidas para transmitir informaes. Assim, suas obras tornaram-se interessantes subsdios para professores e educadores de um modo geral.

    Paixo e sensibilidadeRubem Alves afirma que, para alm da did-

    tica, o grande segredo da Educao a paixo do professor. E foi mais longe ainda com o seu jeito mpar de enxergar a profundidade das tem-ticas quando, no seu dizer potico, entendeu que h dois olhos para a educao: o primeiro olho v as coisas da cincia, da vida e do mundo, e o segundo olho v as coisas eternas.

    Ainda a respeito da Educao, Rubem Alves diz que as explicaes conceituais so difceis de aprender, montonas talvez. Ento, ele prefe-

    ria o caminho dos poetas, que o caminho das ima-gens. Uma boa imagem inesquecvel. Por isso, suas crnicas e seus livros so ricos em metforas e pequenas histrias ilustra-tivas que facilitam a com-preenso de suas disserta-es. Suas palestras, para quem teve o privilgio de assisti-las, tambm con-templavam essa agradvel caracterstica.

    Com um esti lo todo prprio de se expressar, Rubem Alves deixa dicas

    valiosas aos educadores no que diz respeito alma humana, no sentido de que atravs da sensibilidade que se consegue perceber e tentar com-preender melhor o que nos rodeia, o contexto do mundo. Outra dica bem importante do autor: tudo isso passa pelo processo da arte de pensar.

    No seu jeito de lidar com as pa-lavras, Rubem Alves aponta para um casulo onde se podem gestar esperan-as. Ele acreditou no poder mgico da palavra e permanecer entre ns, em suas obras, conforme dito por ele: Es-crever o meu jeito de ficar por aqui. Cada texto uma semente....

    Rubem Alves nasceu em 15 de setembro de

    1933 e faleceu em 19 de julho de 2014.

    Para a reunio de professores

    Milho de pipoca que no passa pelo fogo continua milho de pipoca para sempre!Em uma de suas parbolas, Rubem Alves nos compara aos milhos de pipoca. Alguns de ns temos a capacidade de nos transformarmos em flores brancas macias quan-do aquecidos pelo fogo, outros se mantm como pirus, milhos que no estouram na panela. Voc concorda?Um novo ano letivo se anuncia para 2015. E quais so as mudanas que pretendemos ter em nossa escola? O que eu preciso mudar em minha prtica docente? E enquanto grupo de professores? Como poderemos nos permitir mudar para melhor?

    Leia mais: www.releituras.com/rubemalves_pipoca.asp

    No Site do Mundo Jovem

    Documentrio Rubem Alves, o profes-sor de espantos. Com direo de Dul-ce Queiroz. Durao 44 minutos. Pode ser assistido em nosso site, na edio de fevereiro de 2015, por este link: www.mundojovem.com.br/edicoes

    Site oficial do autor:http://rubemalves.com.br

    Sugesto de SiteEnquanto a sociedade feliz no

    chega, que haja pelo menos fragmentos de futuro em que a

    alegria servida como sacramento, para que as crianas aprendam

    que o mundo pode ser diferente. Que a escola, ela mesma, seja um fragmento

    do futuro...Rubem Alves

  • Assine ou renove sua assinatura! Veja como na contracapa desta edio.

    Encartes pedaggicosFormao de Professores O que o Enem? Cincias Humanas e suas

    tecnologias Cincias da Natureza e suas

    tecnologias Linguagens, cdigos e suas

    tecnologias Matemtica e suas tecnologias

    Afro.BrEncarte de Cultura Afro-Brasileira Aes afirmativas Gris e quilombos Educomunicao e negritude Religies de matriz africana Brasilidade negra

    Filosofia Herclito, Bergson e a

    necessidade da mudana Marx, a dialtica e a

    transformao do mundo Nietzsche e potncia do ser Wittgenstein, Paul Ricoeur e a

    filosofia da linguagem Adela Cortina e a tica nas

    profisses

    Sociologia A idade penal Jovem e meio ambiente Jovem, trabalho, famlia e

    formao Jovem e suicdio: um fato social Apatia, inrcia, comodismo do

    jovem?

    Confira o que voc vai ler no Mundo Jovem em 2015!Temas escolhidos a partir de pesquisa com os assinantes

    Educao Metodologias de ensino e

    aprendizagem com adolescentes Mediao de conflitos na escola Educao integral no Brasil Conselho escolar Educao escolar indgena A mercantilizao do Ensino Superior Desvalorizao e desinteresse

    pelo estudo Educao matemtica Msica na escola Protagonismo dos estudantes Outros temas em encartes

    pedaggicos (veja ao lado)

    Filosofia Como a Filosofia ajuda a pensar? Filosofia e libertao De onde surgem as ideias? O que a verdade? Pessoas invisveis nas cidades Antroposofia Categorias estticas Ignorncia X conhecimento Filosofia, religio e cincia tica do discurso Outros temas em encartes

    pedaggicos (veja ao lado)

    Sociologia Efeitos da sociedade da informao Consequncias da Ditadura Militar Sociedade de consumo e

    desenvolvimento Modernidade e sociedade lquida A ideologia (neo)liberal Estado policial e sociedade de controle As razes do fundamentalismo Pierre Bourdieu e as contestaes

    do capitalismo A pena de morte Trabalho, autogesto e autonomia Outros temas em encartes

    pedaggicos (veja ao lado)

    Ecologia Qual rastro deixamos no mundo? Falta de gua nas cidades Biodiversidade Animais de estimao Estrangeiros na Amaznia Ecossistemas brasileiros Direito ambiental Cidades sustentveis Ameaas aos rios Abelhas em extino?

    Projetos Pedaggicos Valores Literatura Meio ambiente Famlia e escola Juventudes Produo escrita Educao para o cooperativismo Gnero e diversidade

    Ensino Religioso Cultura da paz A f e suas obras Quem Deus? O diabo existe? Milagres existem? Religio e poltica Mulheres nas religies A gua nas religies Pastoral da Criana Drogas e comunidades teraputicas

    Sade e Bem-Viver Sade mental Humanizao do parto Sade comunitria Qualidade de vida no trabalho Bem-viver e a sade pblica Medo de qu? Msica e dana Contaminao dos alimentos Vida lenta x estresse Atividades fsicas na escola

    Cincias Naturais Ritmo biolgico Viroses, infeces e epidemias Corantes naturais e artificiais Alimentos orgnicos Produtos de limpeza e higiene Sal e acar Memria e esquecimento Som e excesso de rudo Cincia forense Velocidade e adrenalina

    Diversidade Cultural Sistema Nacional de Cultura Comunidades tradicionais

    pesqueiras Saraus das periferias Povos ciganos e direitos humanos Frevo: patrimnio imaterial da

    humanidade Pontos de cultura Cinema, saber e crena Rdio no Brasil Cultura do Norte Centenrio de Grande Otelo

    Lngua e Literatura Rubem Alves O desafio de ler, escrever e

    interpretar Literatura regional Literatura para jovens Mediao de leitura na escola Livro didtico e a educao Trovas e oralidade Imperialismo lingustico Mauricio de Sousa Lngua estrangeira e msica

    GeografiaTemas relacionados Amrica Latina Brasileiros e latinos: o que temos

    em comum?

    A geografia no Enem As florestas equatoriais Disputas territoriais Tenses sociais e a pobreza no

    mundo A educao na Amrica Latina Manifestaes e protestos Estado, poder e mdias Diversidade tnica e cultural Violaes de direitos humanos

    Histria Como estudar Histria? Histria da formao econmica

    das sociedades Civilizaes asiticas Escravismo Civilizaes amerndias Civilizaes africanas Sistema feudal Sistema moderno-burgus Comunismo Economia e Histria: para onde

    vamos?

    Poltica e Cidadania O novo cenrio poltico brasileiro Plebiscito e referendo popular Cidadania, militncia e mobilizao

    popular Poltica X politicagem Poltica assistencial: compensatria

    ou emancipatria? Cidados de bem? Efeitos da globalizao e FSM Exerccio da cidadania nas

    redes sociais Voto obrigatrio O Brasil em reformas

    Realidade Brasileira Economia brasileira Violncia domstica e

    Lei Maria da Penha Brasil: oportunidade de negcios? Crianas errantes Trabalho infantojuvenil Inflao e deflao Sonegao fiscal O sistema carcerrio Desmilitarizao da polcia Flexibilizao dos direitos

    trabalhistas

    JuventudesDepoimentos de jovens sobre: Estudar no exterior Grmio estudantil Incluso no trabalho Sociedade competitiva Preveno ao alcoolismo Solido na juventude Viver conectado Violncia fsica Intercmbio e voluntariado PROUNI

    Pais e Filhos Relacionamento entre geraes Ciberbullying Parceria famlia e escola A relao entre pais e filhos Violncia psicolgica na famlia Afetividade e acomodao conjugal Amizades e relaes

    no mundo virtual Famlias reconstitudas Alienao parental Redes de proteo infncia

    e adolescncia

    Sexualidade Homossexualidade nas novelas Sexualidade na adolescncia Dia da Mulher: o que comemorar? Projeto de vida a dois Sexualidade infantil e

    pedofilia digital Gravidez e uso de drogas Violncia sexual DSTs virais Liberdade sexual e responsabilidade Estresse profissional e sexualidade

    Novidade: matrias*

    bilngues para desenvolver o espanhol!

    * Uma por edio

  • fevereiro . 2015www.mundojovem.com.brSer Fraterno: um compromisso com paz!

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    DOS LEITORES

    Aos leitores

    Educar para a pazPara transformar uma cultura vio-

    lenta preciso ensinar e aprender com base no dilogo, na escuta, na participao e na corresponsabilidade. Trabalhar temas prximos da realidade, desenvolver pessoas humanas com maior equilbrio fsico e emocional, ca-pazes de lidar com todas as dimenses da vida, de forma pacfica, harmnica e feliz compromisso da escola, mas tambm das famlias e de toda a so-ciedade.

    Comecemos o ano escolar nova-mente juntos para reafirmar a paz e a fraternidade em todos os lugares por onde passarmos. Que em 2015 sejamos todos sementes de paz para construirmos um mundo onde o amor diversidade seja combustvel de nos-so dia a dia!

    Como assinar: veja na contracapa desta edio ou entre em contato com nossos atendentes.

    Fone: 0800.515200 (somente telefone fixo)Fax: (51) 3320.3889 / 3320.3902

    Assinaturas: [email protected]

    Redao: [email protected]

    Site: www.mundojovem.com.br

    Av. Ipiranga, 6681 - prdio 33 - CEP: 90619-900

    Porto Alegre - RS - Brasil

    ISSN n1677-1451

    Impresso: EPECAssociado Signis Brasil

    Mundo Jovem uma publicao mensal (fevereiro a novembro) da editora da PUCRS, sob orientao da Faculdade de Teologia: Inscrio 473301, Livro n 14, Cartrio de Registro Especial.

    @mundojovem jmundojovem

    Diretor: Pe. Eduardo da Silva Santos

    Equipe responsvel: Luiz Gambim, Lcia Maria Barcelos, Maria Izabel de Andrade Teixeira, Jorge Alvcio da Silveira Teixeira (MTPS n 11273), ngela Machado Barcelos, Rui Antnio de Souza, Mrcia Oliveira de Oliveira, Jaqueline de Souza Franco, Mrcia Helena Koboldt Cavalcante, Fabiane Costa Cozza, Tiago da Silva Greff, Gabriela Thomaz, Rogrio da Silva Castro.

    Jornalista responsvel (interino): Mrcio Zoratto Gastaldo (MTPS n 12492)

    Diagramao e Finalizao Grfica: Jornal Mundo Jovem

    Acredito que educao a palavra-chave para dizimar a ignorncia que tanto exclui

    os povos de seus direitos fundamentais.

    Maria Jos Pereira SouzaBiritinga, BA

    PalavrasPalavras so sementes:Antes de crescerem para cima,Em busca da luz do sol, do ar livree do cu azul,Devem crescer para baixo,Buscando, no solo mido, frio e escuro,Os nutrientes que as fortalecem.

    Palavras so plantas:Da mesma forma que estasTm suas razes fixas no ventre da terra,Aquelas tm sua fora e autoridadeNo terreno respeitoso da escuta.

    Palavras so crianas:Umas so gestadas no tero da me,Outras, no tero misterioso do silncio.

    Palavras so pssaros:Depois de criarem asas, livres e soltas no ar,Jamais retornam ao ninho abandonado,Ampliando, em espiral, o raio de seus voos.

    Palavras so janelas:De igual maneira que o aproximar-se de umasAbre os horizontes da paisagem,O fato de conhecer o sentido das outrasAprofunda o leque do conhecimento.

    Palavras so guas:Deslizam e murmuram mansas nos vales,Fecundando o cho para o plantio. Precipitam-se e rugem bravias nos rochedos,Revelando suas energias ocultas.

    Palavras so ventos:Aqui uma brisa leve e suaveQue dobra e acaricia as espigas maduras.Ali, um furaco tempestuosoQue tudo varre, devasta e destri.

    Palavras so flores:Ornamentam encontros, salas e festasCom suas formas, perfumes e cores,Mas logo murcham, secam e morrem,Deixando no ambiente a dor de umvazio ou ausncia.

    Pe. Alfredo J. Gonalves, CSE-mail: [email protected]

    VontadesVontade ftil, trivial, banal...

    Afetiva, forte, atrevida,Sensacional!

    Vontade poderosa, melosa, preguiosa!

    Rpida, lenta, duradoura!Gostosa!

    Vontade fraterna, amigvel, familiar,Essencial, perene, elementar,

    De gostar!Vontade de viver mais,

    De sorrir,De curtir,

    De persistir!Vontades? Tenho.

    S no tenho,De desistir!

    Ilda Neta Silva AlmeidaPalmas, TO

    F em ao F, agora preciso.Nas cidades, nos abismosOnde a dor fez sua morada,No exlio de cada estrada.

    Solidariedade para amarSem impor condies, ajudar...Doar-se em imposio,Fazer diferena na multido.

    A quem muito perdeu, serAuxlio, fora, carinho.Gesto que no se retraiMas no amar se refaz.

    Waleska Frota Fortaleza, CE

    Em famliaOs pais possuem opinies diferentes dos filhos,

    mas assim mesmo pais e filhos podem se entender. s vezes, quando estamos em crise, devemos con-tar com os nossos pais (eles querem o nosso bem). Quando camos, as nicas pessoas que ficam por perto de ns so os nossos pais: eles so o nosso brao direito. Valorizem os seus pais enquanto es-to por perto, pois um dia eles no estaro mais por aqui para ajud-los!

    Daniel Barberino, Breno Barradas e Pedro HenriqueMiguel Calmon, BA

    Como est a nossa pegada? Somos ns que alimentamos essa mquina pro-

    dutora de lixo no planeta. Estamos com problemas de norte a sul, do ocidente ao oriente, devido aos des-matamentos, s queimadas e s guerras que atingem todas as espcies de vida. Alimentando esse modo de agir, colheremos enchentes, calor excessivo, falta de gua, maremotos, tufes, furaces, vulces, degelos e por a afora. preciso dar um basta s barbries que estamos vendo e vivenciando desde tempos distantes, para que a humanidade possa viver em harmonia com a natureza, e as nossas crianas possam viver como crianas no Planeta Terra.

    Pedro Gomes MoreiraPorto Alegre, RS

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    Pegada ecolgica:consumo, logo existo?

    A ideia de felicidade acoplada ao consumo,

    o sonho da moda, a fugacidade dos

    produtos e a aparente abundncia trazem

    efeitos a curto, mdio e longo prazos, com

    impacto na sociedade e no ambiente. Qual a marca que estamos deixando no planeta?

    Mirian Fabiane Dickel Strate,

    biloga e professora, Teutnia, RS. E-mail: [email protected]

    Vivemos em uma sociedade pautada pelo consumo, que sus-tenta a economia mundial. Va-lendo-se disso, o capital cria pro-dutos para os diversos pblicos, gostos e bolsos, de modo que, embora milhes de pessoas vi-vam abaixo da linha da pobreza, h parcelas de consumidores que so responsveis por alimentar o ciclo de produo capitalista.

    O que chama ateno a urgncia de se fazer circular os produtos e as formas de vida, os quais rapidamente envelhecem e so substitudos. Isso se traduz em experincias de vida caracte-rizadas por conquistas em curto prazo, modos de ser em cons-tante busca de novas sensaes, com inquietao e insatisfao crescentes.

    Impacto no planetaO consumidor, na sociedade

    atual, est sempre em movimen-to, ligado s mudanas, instigado a abolir a durabilidade e a per-manncia das coisas, ao mesmo tempo em que luta para se re-conhecer atravs dos inmeros bens aparentemente disponveis a todos.

    ECOLOGIA

    1 - Como defino o meu estilo de vida e de consumo? Que impactos ele gera no meio ambiente?

    2 - Quem so os principais depredadores e quem so as principais vtimas dos desequilbrios ocasionados pelo excesso de consumo?

    3 - O que significa ser um cidado responsvel pelo ambiente de todos? Que impactos positivos podemos gerar para o planeta?

    Questes para Debate

    Mas alguma vez voc j pensou na quantidade de recursos natu-rais necessrios para manter o seu estilo de vida? J imaginou avaliar o impacto no planeta das suas opes no dia a dia, daquilo que voc consome e dos resdu-os que voc gera?

    A pegada ecolgica individu-al mede o quanto a presena de cada pessoa no mundo consome dos elementos que compem o nosso espao de vida e existn-cia, com vistas ao atendimento das necessidades que elege para sua vida em sociedade. Como critrio para reconhecimento das condicionantes do nosso estilo de vida, a pegada ecolgica coletiva pode ser comparada com a capacidade da natureza de renovar esses elementos com-ponentes biticos e abiticos do meio ambiente.

    A pegada ecolgica de um pas a rea total requerida para a produo de todas as deman-das de consumo de sua popula-o, incluindo alimentao, ves-turio, educao, sade, cultura, trabalho, moradia, transporte, co-municao, entretenimento etc., as quais implicam explorao da natureza no que diz respeito a matria-prima, energia, gua, ter-

    ras agricultadas, reas urbanizadas

    e, ainda, a bolses de absoro dos resduos gerados por todas as etapas implicadas nesse pro-cesso antrpico geral.

    Portanto, em decorrncia do ato de consumir produtos e ser-vios diariamente, a populao mundial consome componentes ecolgicos do planeta como um todo, de modo que a pegada eco-lgica da humanidade a soma de todas essas reas implicadas, onde quer que elas estejam no planeta. A humanidade necessita hoje de 1,5 planetas para manter seu padro de consumo, colo-cando a biocapacidade planet-ria em grande risco.

    Cidadania ambientalSustentabilidade a palavra

    da vez, entretanto muito mais do que uma palavra da moda. Ser ecologicamente sustentvel uma forma de vida, e a nica maneira de permitir que nosso planeta se recupere para que possamos viver em paz e por muito tempo ainda com os re-cursos naturais que ele tem para fornecer. Alm disso, a cidadania possui estreita ligao com o meio ambiente, a partir do mo-mento em que decidimos apli-

    Quer saber qual pegada eco-lgica est deixando no planeta? Acessa a Calculadora de Pegada Ecolgica em nosso site, na edio de fevereiro de 2015, por este link: www.mundojovem.com.br/edicoes

    No Site do Mundo Jovem

    car sustentabilidade em nossa prpria casa e exigir dos rgos pblicos o cumprimento da le-gislao ambiental.

    Pensar globalmente, agir lo-calmente, conceito que contribui para mudar o comportamento do cidado, introduzir a noo que cada um dos bilhes de seres humanos que habitam o plane-ta deve fazer a sua parte. No vamos salvar o planeta porque recusamos uma sacola plstica, mas, se os sete bilhes de seres humanos que habitam a Terra atualmente a recusarem, sero sete bilhes de sacolas a menos.

    Preservar o meio ambiente preservar a prpria pele, e fragi-lizar o meio ambiente fragilizar a economia, o emprego, a sade. O certo que no existe sada se no houver alterao nos costu-mes predatrios. imprescindvel que os cidados tomem conhe-cimento do seu papel enquanto agentes de conscientizao e responsabilidade ambiental, op-tando pelos produtos de empre-sas comprometidas com o meio ambiente e a qualidade de vida da sociedade. No existe natureza capaz de alimentar um shopping center do tamanho do planeta.

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    JUVENTUDES

    Oportunidade para expandir fronteirasO sonho de expandir as fronteiras do pas j se tornou realidade para mais de 83 mil jovens brasileiros. Nicole Walczak, de 21 anos, foi uma das contempladas pelo Cincia Sem Fronteiras e hoje estuda medicina na Holanda. Do quarto que divide com uma finlandesa, na cidade de Leiden, a estudante conversou com o Mundo Jovem sobre a experincia e os desafios do programa.

    E-mail: [email protected]

    Nicole, fale-nos sobre a sua trajetria at aqui.

    Estudei no colgio da Uni-versidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Misses (URI) com bolsa parcial, porque minha me trabalhava na instituio. Entrei na Universidade Fede-ral de Santa Maria (UFSM), em 2010, atravs de um programa j extinto, que se chamava Progra-ma de Ingresso ao Ensino Supe-rior. Escolhi a medicina porque sempre fui fascinada pelo corpo humano e queria exercer uma profisso em que me sentisse til na vida das pessoas.

    Como a sua rotina de estu-dos na Holanda em comparao ao Brasil?

    No Brasil, a faculdade exige dedicao integral. Aqui, eu estou estudando no segundo ano, e l eu estava no quarto. Mesmo assim, no se compara ao meu segundo ano no Brasil, que foi muito mais pesado em questo de carga horria. O contedo que a gente estuda em um semestre aqui eles estu-dam em um ms e meio. Assim temos mais tempo livre para fazer exerccio fsico, realizar cursos de lnguas, enfim, ter uma qualidade de vida melhor.

    Como est sendo esta expe-rincia no programa at agora?

    Pessoalmente, era tudo o que eu queria: ser mais independen-te e conhecer pessoas diferentes. Em termos acadmicos, foi bem

    estranho no incio, pois eu j tinha visto a maior parte do con-tedo no Brasil e pensei que no precisaria me preocupar, mas fui supermal na prova. Recm tinha chegado, no estava muito adaptada, sem clima para estu-dar, e o contedo foi passado muito rpido. No Brasil, estava acostumada a chegar em casa e retomar o contedo da aula. Mu-dar de ambiente dificultou muito a rotina de estudos.

    Quais so os pontos positi-

    vos do programa e quais devem ser aprimorados?

    Os pontos mais interessan-tes viver uma cultura diferen-te, conhecer gente de todos os cantos, estar dentro do sistema educacional de outro pas e, assim, entender o que pode ser melhorado no sistema brasilei-ro. O conhecimento novo que levado de volta um dos pon-tos mais interessantes e con-tribui para o desenvolvimento do pas. E estudar em uma faculdade de primeiro mundo era uma oportunidade s de quem tinha mais grana. Este programa muda a situao. Eu mesma no estaria aqui se no fosse o Cincia Sem Fronteiras. Mas acho que pode ser um pro-blema o governo no ter muito controle com o aluno aqui.

    Como assim? Em relao

    frequncia do aluno?No. Isso depende de cada

    universidade. Se a faculdade

    cobra presena, voc pode re-provar por isso. A, neste caso, perde a bolsa. O que acontece que no tem nenhuma cobran-a em relao nota.

    Mas o principal desafio mesmo que ele ainda atinge a populao que tem uma condi-o um pouco melhor, porque eu no conheci nenhum bol-sista que tivesse alguma difi-culdade financeira: todos eram de classe mdia. O programa exige curso de lnguas, e aca-bam sendo privilegiados aque-les que podem pagar um cur-sinho particular. Mas, quanto a isso, j vi que este ano, pelo menos na UFSM, comearam a dar curso de lnguas voltado para o Cincia Sem Fronteiras (pouco depois desta entrevista, o MEC aprovou o programa Idioma Sem Fronteiras). Acho que esta questo da contra-partida, do que fazer depois, quando o estudante volta para o pas, tem que ser aprimorada. Falta um pouco esta continui-dade do programa quando se volta para o pas de origem.

    Levando em conta a sua

    rea, a medicina, poderia tra-ar um paralelo entre os dois pases?

    Na Holanda o sistema de sade funciona muito bem. At os 18 anos no preciso pagar nada. Depois disso, adquire--se um seguro de sade, que pago conforme o salrio. Aqueles que recebem um sal-

    rio baixo, podem pedir ajuda ao governo, e servios como Fi-sioterapia e Odontologia so parte. Como a desigualdade so-cial no to grande, a maioria da populao consegue pagar o seguro sade. No Brasil, um sistema assim dificilmente fun-cionaria. 80% dos brasileiros usam o SUS, a maioria porque no tem mesmo como pagar um plano privado. Mas eu ainda acho que o modelo do SUS, na teoria, um dos melhores do mundo. Na prtica, ainda temos muito o que melhorar.

    Entrevista: Nicole Walczak

    www.cienciasemfronteiras.gov.br

    Sugesto de Site

    Cincia Sem Fronteiras

    Cincia Sem Fronteiras um programa que busca promover a consolidao, a expanso e a internacio-nalizao da cincia e tec-nologia, da inovao e da competitividade brasileira por meio do intercmbio e da mobilidade internacional.

    O projeto prev a utili-zao de at 101 mil bol-sas em quatro anos para promover intercmbio, de forma que alunos de gra-duao e ps-graduao faam estgio no exterior com a finalidade de man-ter contato com sistemas educacionais competitivos em relao tecnologia e inovao.

    Arq

    uivo

    pes

    soal

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    EDUCAO

    Desafios pedaggicos da adolescncia

    No passado, a escola era o nico lugar de acesso aos conhecimentos, que l estavam concentrados. Hoje, ela sofre uma crise sem precedentes, pois nem sempre as informaes atualizadas da internet so contempladas na metodologia do professor, muito presa em livros e apostilas.

    O prprio perfil de alguns jovens se torna um desafio, em uma cultura imediatista, de inquietude, contestao e desmotivao. Diante desse quadro, possvel fazer algo na escola para que o processo de ensino e aprendizagem se concretize? Por incrvel que possa parecer, sim, possvel e necessrio fazer algu-mas propostas diferenciadas para que o adolescente tenha prazer em aprender e que frequentar a escola no seja um castigo.

    No sou adepta de receitas prontas, mas penso que, a partir de ideias que deram certo, outros pro-fessores podem, dentro da sua realidade, inovar e ter maior sucesso nessa tarefa. Ento, seguem algumas propostas que, mesmo que paream muito simples, podem fazer a diferena com sua turma.

    1. Escute seus alunos: proporcione espaos de di-logo sempre em suas aulas. Converse quando chegar em sala de aula, trate-os pelos nomes, saiba mais de suas histrias de vida, pergunte suas opinies sempre que haja espao na matria que voc trabalha. Utili-ze as tcnicas de jri simulado, discusso de temas transversais, anlise e apresentao de textos diferen-ciados por grupos. Tudo isso ir estimular a partici-pao e o interesse dos alunos. Estudos diversos com-provam que a aproximao emocional com os alunos diminui a incidncia de casos de violncia na escola e aumenta a motivao para frequentar as aulas.

    2. Use as tecnologias como aliadas da aprendiza-gem: em vez de proibir os celulares, por exemplo, ex-perimente fazer com seus alunos um projeto de fotos e/ou vdeos sobre a matria que esto trabalhando. Proponha mais trabalhos de pesquisa e aproveite para desenvolver as habilidades de anlise e sntese. Atu-almente, as informaes no so mais problema, mas entender as que realmente so cientficas e tm rele-vncia necessita de uma orientao pedaggica que o professor pode dar. Igualmente, abuse das ferramen-tas que voc tem disponveis para que os estudantes aprendam com maior facilidade os contedos a serem desenvolvidos: vdeos, filmes, jogos para computador e experincias prticas sempre so bem-vindas s salas de aula dos adolescentes.

    3. Trabalhe em grupo: a referncia dos adolescen-tes o grupo, e individualizar o trabalho na escola vai na contramo dessa necessidade de pertencimento.

    Sri

    a C

    hris

    t B

    irckCynthia Castiel Menda,

    educadora, psicloga clnica e escolar, mestre em Educao pela PUCRS. Atualmente exerce suas atividades profissionais na Universidade Federal do Rio Grande (FURG), RS. E-mail: [email protected]

    Ensine seus alunos a trabalhar em grupos. Comece com duplas, trios, e coloque, no mximo, cinco componentes em cada um. Faa lista de exerccios como desafios para serem alcanados pelos alunos e outras atividades que podem ser divididas e trabalhadas em partes por cada um dos grupos da sua turma. Lembre que hoje o mercado de trabalho exige que as pessoas saibam compartilhar conhecimentos, pla-nejar aes e execut-las em equipe.

    4. Traga as manifestaes artsticas para sua aula: descubra os talentos dos seus alunos e use-os como aliados da aprendizagem. Vale msica, desenho, po-esia, teatro, dana. Pea que eles criem a partir dos contedos desenvolvidos e se surpreenda com os resultados.

    5. Estabelea regras de convivncia: faa um contrato pedaggico no incio do ano, discutindo direitos e deveres, estabe-lecendo os papis de cada um na sala de aula. Os estudantes devem construir essas regras juntos para que se comprometam com a sua observncia. Relembre o con-trato sempre que necessrio.

    6. Elabore avaliaes significativas e contextualizadas: utilize histrias, figuras e, principalmente, o raciocnio dos estu-dantes nas suas avaliaes. Faa avalia-es diferenciadas: em grupo, individual, oral e escrita. Isso flexibiliza a possibili-dade de o aluno se sair bem e entender a

    importncia do processo avaliativo.O mundo moderno exige da escola

    uma nova proposta do processo de ensino e aprendizagem, com um trabalho mais dinmico e prximo aos alunos. Cabe ao professor sair da posio de queixa e experimentar novos caminhos e oportuni-dades para tornar esse processo prazeroso para ambos os lados.

    Para a reunio de professores

    Que tal dividir os professores em pequenos grupos e aprofundar os aspectos sugeridos pela autora? Seria possvel traar algumas aes a curto e mdio prazo que poderiam ser implementadas em nossa escola, buscando contribuir com a educa-o dos adolescentes. Cada grupo pode sugerir aes e responsveis para que tenhamos resultados efi-cazes, a partir da diviso de tarefas entre professores, gestores e alunos.

    O trabalho em pequenos grupos na sala de aula, de Joan Bonalds. Porto Alegre, Artmed, 2003.Dinmicas em sala de aula: para to-dos nveis de ensino, de Elaine Pereira Daroz, Recife, UFPE, 2012.Prova: um momento privilegiado de estudo, no um acerto de contas, de Vasco Pedro Moretto. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007.

    Sugestes de Leitura

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    Transgeracionalidade uma noo definida como a transmisso de valores, de padres de com-portamentos que passam de gerao a gerao. Em outras palavras, podemos pensar na ideia, tambm popular, vem de bero. O que vem do bero, meta-foricamente falando? So os modos como falamos, como agimos, como vestimos, como vemos o outro. Assim, se um pai cria seu filho de maneira machista, desvalorizando as mulheres da famlia e as de fora, seu filho far isso tambm. Bem, at quanto isso verdade? Nem sempre: o filho poder ser muito di-ferente do pai. O filho de um pai machista no est fadado a ser outro peixe machista. Filho de peixe no peixe. uma pessoa que tomar a me, o pai, os avs como referncia para sua construo, mas ser sempre uma outra pessoa, ser original.

    Laos familiaresOcorre que, mesmo sendo uma pessoa inco-

    mum, diferente de nossos pais, em famlia vivencia-mos um pouco de tudo: valores, segredos, crenas, lealdades invisveis, preferncias por algum, mitos, enfim, laos de vrios tipos; s vezes, ns difceis de serem desfeitos ou compreendidos. Herdamos no somente traos biolgicos, mas tambm os traos ou laos da famlia. So heranas que, algumas ve-zes, tornamos negativas em nosso processo de viver.

    Temos que pensar, ento, o que uma famlia. Neste breve texto, vou tom-la como um grupo de pessoas com laos afetivos que tm uma histria de vida. Ou seja, tm uma dinmica que pode ser vista

    PAIS E FILHOS

    Famlia e transgeracionalidade

    O que herdamos de nossos parentes?

    Filhos e filhas so sempre pensados s sombras de seus pais. Por isso,

    ouvimos as metforas Filho de peixe, peixinho , que ultrapassam

    geraes, por muitas dcadas. Os ditados populares, na verdade,

    expem o tema: a famlia e os (des)caminhos da transgeracionalidade.

    O que isso significa?

    Marta Bellini,

    doutora em psicologia social, docente na Universidade Estadual de Maring, PR.

    E-mail: [email protected]

    pelas histrias que nos contam os avs ou que ns contamos a filhos e filhas. Mudamos de lugar porque imigramos, buscamos novas chances de emprego; muitas vezes um pai abandona sua fa-mlia, uma me cria seus filhos sozinha. Um casamento se desfaz, outro se refaz. O padro de permanncia nesse movimento de instabilidade so os laos de amor, de afeio. Ns sabemos que pertencemos a algum grupo e que, a, temos acolhimento.

    Rituais de passagemO nosso movimento com a famlia

    est no tempo, na nossa histria, e tambm a nossa experincia sensorial, intelectual, espiritual do mundo. Boas ou ms, as experincias, no fundo, so sempre aqueles rituais de passagem para nos tornarmos humanos. Pensando em Walter Benjamin, a infncia o pas das descobertas. Descobertas das ruas, dos brinquedos, dos cheiros, das cores, das aventuras, dos destinos familiares desconhecidos. Herdamos isso, e no pouco. Adultos, vamos repetir essas histrias com nossas famlias; no caso, uma representao recriada. E, assim, repassamos aos descendentes a histria cultural e pessoal dos antepassados. Rimos, choramos e perpetuamos as his-trias de nossos parentes.

    Entretanto muitos de ns detemo--nos nas amarraes da vida em famlia. Uma me que foi abandonada pelos parentes e pelo marido, e que jamais

    esqueceu seu sofrimento, capaz de manter o dio e a desesperana nas geraes futuras. Uma filha aos 50 anos ainda poder chorar a preferncia da irm mais velha; um filho de 40 anos se droga para falar aquilo que no disse ao seu pai aos seis anos de idade.

    Tambm ficamos em volta das do-enas da tradio da famlia. Muitas vezes, tomamos, inconscientemente, esse legado psicolgico dos desafetos e no nos desatamos dele porque so amparos defensivos para nossa vida. Nesse senti-do, sem saber, somos mantidos pelo dio aos pais, a ns mesmos e aos outros.

    Conhecer as tramas da transgera-cionalidade importa para desvelar a tes-situra das dores, dos sofrimentos e sair dos psiquismos da famlia. possvel. Nesses casos, possvel sair da zona de estacamento e da exausto, para cons-tituir outras experincias que tambm sero passadas adiante.

    A criana, o brinquedo e a educao, de Walter Benjamin. So Paulo: Editora Summus, 1984.Transgeracionalidade, um olhar sistmico, de Clariana Palmieri Brando Alba. Disponvel em: http://bit.ly/transgeracionalA fora do legado transgeracional numa famlia, de Maria Emlia Sousa Almeida. Revista Psicologia: Teoria e Prtica, 2008. Disponvel em: http://bit.ly/legado-transgeracional

    Sugestes de Leitura

    Com base na leitura do artigo e das experincias vividas por voc em sua

    famlia, redija um texto dissertativo--argumentativo, em norma culta, sobre o

    tema As tramas da transgeracionalidade na formao de valores. Selecione e organize de forma clara os argumentos para defen-der seus pontos de vista. Voc tem cerca de uma hora para elaborar a redao.

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    SEXUALIDADE

    De tempos para c, a presena de personagens homossexuais em novelas tornou-se comum no Brasil. Apesar disso, as representaes dos personagens no heterossexuais apontam para uma perigosa relao entre os discursos miditicos e o imaginrio social formulado por tais atuaes.

    Jlio Csar Sanches,

    jornalista, mestrando em Comunicao na Universidade Federal Fluminense (UFF), Niteri, RJ. E-mail: [email protected]

    Pesquisadores da rea dos estudos de gnero indicam uma forte presena do fenmeno de heterossexualizao de perso-nagens que no so heteros-sexuais. Desse modo, segundo os tericos, o modelo de repre-sentao de personagens no heterossexuais estaria cami-nhando para a consolidao de uma imagem classificada como heteronormativa.

    Entendendo que a hetero-normatividade se sustenta na aplicao de vivncias heteros-sexuais como uma norma a ser seguida, identificamos que as representaes de personagens no heterossexuais nas teleno-velas brasileiras esto completa-mente alinhadas com o universo heteronormativo. Nas narrativas dos ltimos anos, toda e qual-quer situao em que as homos-sexualidades so representadas trazem baila esse teor.

    Controle dos corposA aceitao desses persona-

    gens no heterossexuais se d pela via da identificao de nor-malidade desses sujeitos, seja pela adoo de crianas, pelo casamento, pela constituio de famlia ou pela esttica aceit-vel (com indumentria e gestos regulados). Os personagens vo se enquadrando cada vez mais em um circuito que apaga as di-ferenas entre ser heterossexual e ser homossexual.

    De modo geral, as homos-sexualidades representadas nas telenovelas brasileiras eviden-ciam um horizonte de controle dos corpos no heterossexu-ais. Para serem aceitos pela audincia e inclusos em um

    A homossexualidade nas telenovelas

    Rep

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    o:

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    e G

    lobo

    de

    Tele

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    ordenamento social, os perso-nagens homossexuais replicam os valores de uma sociedade em que a heterossexualidade a norma. Alm disso, eles submetem-se ao apagamento de toda esttica no heterossexual. Sem afetaes, os homossexuais representados fingem ser pes-soas comuns realidade de uma sociedade que est disposta a ver na TV apenas o modelo de sexualidade heteronormativa.

    O conflito gerado pela pos-svel exibio de um beijo gay, por exemplo, desenvolveu um levante das alas mais conserva-doras da sociedade brasileira. Alguns personagens tpicos da poltica nacional, assim como l-deres religiosos extremistas, ini-ciaram uma verdadeira batalha contra a veiculao de uma ima-gem de afeto entre pessoas do mesmo sexo na telenovela Amor vida. Em certa medida, esse um dos aspectos que evidenciam as disputas que acontecem em torno dessas representaes.

    Homofobia disfaradaCaso estejam alinhados com

    a moralidade hegemnica da sociedade, os personagens ho-mossexuais podem ser aceitos. Entretanto essa aceitao/inclu-

    so revela o quanto perversa a forma como as homossexu-alidades so representadas na teledramaturgia. H uma ntida manipulao das foras sociais atuando diretamente nessas representaes, ditando exata-mente os limites morais aceitos pela maioria dos expectadores. Ampliando essa questo, po-demos considerar que existe uma homofobia pulsando nesse processo de visibilidade dos personagens homossexuais nas novelas brasileiras.

    Compreendendo que a hete-ronormatividade est presente nas telenovelas, a indagao que devemos fazer a partir de

    agora a seguinte: de que modo essas representaes de perso-nagens no heterossexuais na TV brasileira dialogam com a sociedade? E que caractersticas das homossexualidades esto sendo violadas pela heteronor-matividade reiterada nessas representaes?

    Partindo desses questiona-mentos, poderemos identificar um cenrio perigoso e cruel para aqueles sujeitos cuja se-xualidade no bem vista em nossa sociedade. Talvez essas perguntas nos ajudem a perce-ber por que o Brasil um dos pases mais homofbicos do mundo.

    Da violncia simblica das telas para a violncia corporal das ruas, existe um conjunto de poderes controlando os corpos, as sexualidades e decidindo quem pode viver e como deve viver.

    Reunio de professores

    Currculo escolar e sexualidade

    Entender heterossexuali-dade, bissexualidade e de-mais questes de gnero fundamental em nossa for-mao como professoras(es). Alm da compreenso bio-lgica ou cultural, estudar esse tema nos orienta ga-rantia dos direitos humanos e superao de todas as formas de preconceito.

    Aps ler o texto e assistir ao vdeo indicado, debata com os professores, bus-cando compreender: o que pensamos sobre as diferen-as de gnero? Quais so os preconceitos que temos? Em nossa escola, em que momentos reafirmamos a heteronormatividade? Em quais atividades podemos promover a diversidade de gnero no currculo?

    Sugestes de Leitura

    Um corpo estranho: ensaio sobre sexualidade e Teoria Queer, de Guacira Lopes Louro. Autntica Editora, 2004.Documentos de identidade: uma introduo s teorias do currculo, de Tomaz Tadeu da Silva. Belo Horizonte: Autntica Editora, 2010.

    Sugesto de Vdeo

    Web aula produzida para a disciplina de Teorias de Currculo, ministrada por Shirley Sales, da UFMG: http://youtu.be/-e9cyqjVbjA

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    A sociedade da informao, traz no seu bojo histrico o

    contnuo processo de rupturas e

    mudanas, passando a adotar tcnicas especficas para

    transmitir contedos que reconfigurem

    novas formas de convivncias sociais.

    A universalizao do ca-pitalismo, como modo de pro-duo e processo civilizatrio, adquire outros impulsos, com base em novas tecnologias e no uso excessivo da mdia e de seus dispositivos. Isso faz da informao e da mdia elementos importantssimos na elaborao e na ressignificao de novas subjetividades do nosso tempo e, consequentemente, de notveis mudanas sociais, culturais, po-lticas e econmicas.

    Indstria culturalTheodor Adorno e Max

    Horkheim notificam que a cul-tura um dos elementos deter-minantes para o uso do capita-lismo. No af de cada vez mais resultados de mais-valia, h a massificao da cultura, fazendo com que passe a existir o prin-cpio da convivncia miditica para, a partir de ento, alimentar o sistema.

    Ainda segundo os autores, a indstria cultural, por meio do processo reprodutivo, tenta tor-nar todos os ouvintes iguais ao

    SOCIOLOGIA

    A informao, a mdia e as novas subjetividades

    sujeit-los, autoritariamente, aos idnticos programas de vrios canais. E, ao fazer isso, esquema-tiza um mecanismo de padroni-zao para uma homogeneidade entre os sujeitos para agrad-los, mas tambm para control-los. O capitalismo impe, dessa forma, seu prprio ritmo frentico, le-vando o indivduo, geralmente, a deixar de pensar e refletir sobre o sistema ideolgico que lhe imposto. Faz, ento, com que os valores sociais e a felicidade se-jam influenciados e condiciona-dos por essa cultura que atrofia a capacidade de ser espontneo, deixando de ser soberano em suas escolhas.

    A Era DigitalJohn Thompson traz tona a

    necessidade de conhecer a efic-cia do poder simblico e os im-pactos que os indivduos venham a ter mediante institucionaliza-es e consagraes simblicas de valores efmeros criados pela comunicao da mdia.

    Para tal interpelao, o autor recorre ao contexto social do s-culo 19, quando a comunicao e a interao se davam face a face, e existia maior conservao de valores, crenas e a presena entre os pares. J na moderni-dade miditica as categorias de tempo e espao so reconfigu-

    radas de modo que as questes cronolgica e espacial no so mais barreiras para a interao entre pessoas. Elas passam a viver sob o signo da teleimagem, onde tudo instantneo.

    Cria-se, assim, um instante sem passado e sem futuro, um agora meditico, muitas vezes, experincia local do indivduo. Atravs da teleimagem mesclam--se a cultura e a ideologia de forma aparentemente inofensiva, porm sempre com um fim nico: impor uma cultura dominante por dispositivos simblicos.

    Isso pode ser mais bem en-tendido por meio da leitura da Sociedade do Espetculo, obra de Guy Debord, na dcada de 1960, que aponta para uma so-ciedade imagtica. Para Debord, os indivduos abdicam da dura realidade dos acontecimentos da vida, passando a viver movidos pelas aparncias e pelo consumo permanente, dado o poder hip-ntico causado pelas imagens, as quais, em alguns graus, con-seguem deixar a pessoa passiva e aberta aceitao dos valores impostos pelo capitalismo. Os indivduos integram-se e intera-gem por meio da comunicao imagtica: se no houve regis-tro imagtico ao pblico, ento no real ou no aconteceu. Entretanto muitos indivduos

    Claudionor Pereira de Lima,

    socilogo e professor, So Paulo, SP. E-mail: [email protected]

    no esto atentos que a mdia geralmente utiliza de suas infor-maes de forma manipuladora, mesmo quando o que veiculado (parcial ou inteiro) tenha no cunho um peso de verdade.

    As questes trazidas por es-ses autores revelam que estamos diante de uma sociedade de ex-cessos de estmulos, causados pela tecnologia a servio do ca-pitalismo, onde o virtual passa a ocupar o lugar do real. inegvel que o monoplio da informao e da mdia passa a ser desenha-do sobre os pressupostos da excluso social, de tal forma que os excludos so cada vez mais excludos, e os privilegiados, mais privilegiados. E todos consentem com a dominao que uma cate-goria exerce sobre as outras.

    Sociedade do Espetculohttp://youtu.be/A4FAJsFqHe0

    Alm do Cidado Kanehttp://youtu.be/049U7TjOjSA

    Um dia na vida deEduardo Coutinho http://youtu.be/j9vYJ74JGzg

    Sugestes de Filmes

    Mame no FaceZeca Baleiro

    Mame, eu fiz o disco do anoE at mesmo CaetanoParece que aprovouMame, eu sigo na minha rotaVeja s o Nelson MottaDisse que o disco showS falta que a Folha de So PauloComece a incens-loDizer que eu sou o cara (...)

    Zeca Baleiro satiriza a fora da mdia para consolidar o su-cesso dos artistas. O que voc pensa sobre isso? Cite alguns exemplos de influncias cultu-rais que acontecem conosco.

    Veja o clipe da msica por este link: http://youtu.be/vs4IlPVX3cY

    Mafalda tira em quadrinhos desenhada pelo cartunista argentino Quino entre 1964 e 1973 uma menina preocupada com a humanidade, a paz mundial e tambm com a indstria cultural. A partir da tira acima, discuta: a televiso pode ampliar nossa ignorncia diante da vida? Quais programas contribuem para nos tornar alienados ou para abrir nossos olhos?M

    AFA

    LDA

    QUINO. Toda Mafalda. So Paulo: Martins Fontes, 2013, p. 372

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    Como a Filosofia ajuda a pensar?

    Desde sua origem, a Filosofia possibilita ao ser humano o despertar da conscincia para compreender sua realidade. As explicaes dadas pelos mitos passaram a no ser suficientes, surgindo a necessidade de um pensar fundamentado na razo.

    FILOSOFIA

    Isabel Cristina Costa Freire,

    professora de Filosofia da Educao Bsica e do Ensino Superior, especialista em Docncia do Ensino Superior, Superviso e Orientao, So Lus, MA. E-mail: [email protected]

    O despertar dessa conscincia vem desde o homem primitivo, que no primeiro momento encontrou-se numa anlise intuitiva e, gradativa-mente, foi passando a naturalista, com os primeiros pensadores na busca pelo elemento constitutivo em carter contemplativo. J o perodo clssico eviden-cia o ser humano procurando fundamentos para as suas inquietaes sobre sua prpria essncia.

    Neste cenrio, relembremos Scrates (469-399 a.C.) e seus ensinamentos pelo dilogo, utilizando o mtodo de ironia (formulaes de perguntas) e mai-utica (parturiente de ideias) numa forma humilde de reconhecimento da ignorncia como busca cons-tante da verdade. Esse mtodo faz pensar que no devemos ficar presos a ideias prontas e acabadas.

    O encanto do pensarEm Plato (427-347 a.C.), vamos encontrar o

    seguinte esclarecimento: a Filosofia um saber que se d por meio do intelecto, e prprio dos filsofos que conseguem libertar a alma do crcere corpreo para a compreenso do eterno e imutvel. E Aristteles (384-322 a.C.) ressalta: pela admira-o, os homens (...) so levados a filosofar, ficando primeiramente maravilhados pelos problemas. A propsito, os pensamentos dos clssicos Plato e Aristteles foram aproveitados pelos filsofos e telogos cristos do perodo medieval, traando o domnio da cincia humana nos traos divinos, em que o ato do conhecer est no interior humano.

    J na Modernidade, os filsofos encontraram--se emancipados da autoridade divina, rejeitando a tradio. Mas buscaram compreender as mudanas dessa poca em vrias situaes. Podemos apontar alguns filsofos, entre eles Descartes, na discusso do it, destacando a primeira intuio diante da ideia clara e distinta numa reconstruo do saber. Kant, com sua filosofia crtica, tentou a sntese compre-ensiva desse perodo. No seu pensamento referente Filosofia, evidencia que , pois, um sistema de todo conhecimento filosfico, e assim existe a possibilidade de aprender a filosofar exercitando o talento da razo, que direciona ao refletir, analisar e fazer crticas a esses sistemas.

    Marx nos faz refletir sobre a transformao da realidade, natural realidade social na conjugao da teoria e prxis com o intuito de desenvolver uma reflexo contextual. Por outro lado, o perodo

    ps-moderno marcado pela reao s linhas anteriores, objetivando pensar na demisso da Filosofia na funo prpria e secular da metafsica. Outra caracterstica que coloca a pensar na Filosofia como desconstruo, para a construo de conceitos, numa articula-o ao pensar dos espritos livres.

    Filosofia e educaoPara Saviani (1980), a tarefa da Fi-

    losofia na educao de uma reflexo radical, rigorosa e de conjunto sobre os problemas que a realidade educacional apresenta. Por certo, o ser humano tem que ser o filsofo reflexivo, buscando elementos que se encontram na raiz d determinado problema, compreendendo os reais motivos num certo rigor, saindo das iluses do senso comum, pautando--se numa viso totalizante da realidade.

    Diante do exposto, surge a necessi-dade de analisarmos a ressignificao da Filosofia na contemporaneidade. Wonsovicz (2005) ressalta que a Filo-sofia na escola, dentro de uma didtica filosfica que comea com crianas e continua com adolescentes e jovens, um saber sobre o homem e a realidade, sobre o mundo para compreend-lo e transform-lo. Essa transformao possvel quando se estabelece a cons-cincia ativa da realidade, interferindo com o pensar, deixando sua marca de melhoria com suas aes sbias, tendo a conscincia de si, do outro e do mundo.

    Portanto o pensar proposto pela Filo-sofia dinmico, pois leva a uma postura de investigao, compreenso, tomada de deciso frente a argumentos criteriosos, desenvolvendo as habilidades de racioc-nio, contextualizando socioculturalmente seus conhecimentos. Alm disso, por pensar de modo totalizante, se articula com outras reas de conhecimento.

    Textos bsicos de Filosofia, de Danilo Mar-condes. Rio de Janeiro: Zahar, 2012.Educao: do senso comum conscincia filosfica, de Demerval Saviani. So Paulo: Cortez, 1980.Programa Educar para o pensar: filosofia com crianas, adolescentes e jovens. v. 3, de Silvio Wonsovicz. Florianpolis: Sophos, 2005.

    Sugestes de Leitura

    1 - Por que o pensar importante em nossas vidas?

    2 - Pesquise mais sobre o mtodo filosfico de Scrates, partindo da realidade e formulando perguntas que ajudem a pensar o contexto que vivemos.

    3 - Como o pensar pode se tornar um encanto e no um peso? E como pode se tornar um instrumento de transformao da realidade?

    Questes para Debate

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    ENSINO RELIGIOSO

    A paz que eu quero:com justia e igualdade!

    Entrevista: Douglas Belchior

    Arq

    uivo

    pes

    soalBuscar incessantemente a paz. Dizer, gritar, viver a paz tarefa e

    misso de todos e de cada um de ns. assim que construmos a Cultura da Paz, o nico e efetivo antdoto cultura da violncia, to presente em nossa sociedade. Nesse sentido, construir relaes mais fraternas e solidrias, especialmente com as pessoas que mais precisam de cuidado e ateno, caminho possvel e urgente para que chegue a paz to sonhada. Conversamos sobre esse tema com Douglas Belchior, professor da rede pblica de So Paulo e dos cursinhos populares da UNEafro Brasil, que nos desafia a falar e expressar as violncias sofridas, para super-las em busca da paz.

    E-mail: [email protected]

    Como voc avalia o contexto atual no Brasil?Os desafios so imensos, pois, assim como

    outrora, o pas continua dominado por alguns setores, como o caso do agronegcio, do setor bancrio, dos meios de comunicao nas mos de meia dzia de famlias, da especula-o imobiliria, dos interesses das megacorporaes internacionais. O capital continua fortalecido. O Brasil um grande campo de consumo, o que muito bom para os grandes empresrios. O Brasil um grande produtor agrcola, mas essa riqueza e essas terras esto nas mos dos mesmos latifundirios de sempre e dos novos latifundirios a partir do agronegcio. Ento, a estrutura no mudou. A desigualdade hoje est ofuscada por um perodo em que a economia melhorou, em que h uma condio de emprego um pouco melhor, mas isso em mdio e longo prazo no nos oferece expectativas positivas. Ns precisamos, ento, dialogar com essa realidade em que parece no haver conflito, no haver grandes problemas sociais, mas sabemos que isso pode trazer resulta-dos ruins e conflituosos.

    Nosso modo de viver agressivo e violento? Como a violncia se manifesta em nosso cotidiano?

    A histria de formao do Brasil, desde a inva-so europeia, relaciona violncia e resistncia. a histria do genocdio indgena, do genocdio negro continuado, como ainda hoje vemos. Ao mesmo tempo tambm a histria da resistncia desses povos a toda opresso. Essa memria, a da violn-

    cia e a da resistncia, nos acompanha, uma vez que diante da violncia, muitas vezes, a mesma violncia aparece como nica opo de defesa. Esse caldo de cultura influenciou na formao dos

    valores da sociedade, na conformao de valores religiosos, chegando at a base familiar, mas a vio-lncia sempre foi instru-mento de ao e prtica dos grupos que se manti-veram no poder. E no se trata apenas de violncia convencional, fsica. Falo de todas as formas de vio-lncia, todas as formas de se oprimir e impor von-tades a partir da coero, do poder econmico, da violncia de gnero ou

    da heteronormatividade e, principal-mente, no caso brasileiro, do racismo.

    O que leva a sociedade a ser violen-ta? Que fatores promovem a cultura da violncia?

    Como j disse, somos fruto de uma cultura de violncia, de uma cultura penal. De nossos 514 anos de histria ps-invaso, 388 anos foram sob a gide de um sistema de escravido, onde o uso da violncia era pressuposto fun-damental. Aps a abolio, vivemos dois perodos de ditaduras, momentos em que mais uma vez a opinio coletiva foi

    drasticamente influenciada por valores que justificam a violncia a partir de determinados padres morais.

    Nos curtos perodos de democracia, como o que vivemos hoje, o Estado ins-titucionalizou a violncia e, com o uso do aparato de mdia, reafirma valores penais muito mais prximos da vingan-a do que da justia. De maneira que muito difcil, mesmo para os pequenos conflitos sociais, imaginar solues que no passem pela ideia de penalizao, no lugar de reeducao.

    Uma sociedade que elege o consumo como ponto mximo da vida, mas que ao mesmo tempo no proporciona opor-tunidades iguais para se alcanar tais desejos, cria o ambiente de disputa desi-gual, de opresso pela chegada ao resul-tado e, consequentemente, de violncias.

    Como promover a cultura da paz nos espaos onde vivemos?

    Como nos lembra a cano do Rappa, Paz sem voz no paz. medo!. pre-ciso falar. preciso ouvir. preciso que todas as vozes ecoem e que, sobretudo, as vozes se entendam e organizem a pa-lavra e a ao coletiva. preciso dilogo em torno do que gera as desigualdades, e jamais se limitar apenas s compensa-es. preciso tratar e amenizar a dor, mas necessrio curar a doena. A orga-nizao e a prtica da educao popular so estratgias importantssimas para essa tarefa.

    Como nos lembra a cano, Paz sem

    voz no paz. medo! preciso

    falar. preciso ouvir. preciso

    que todas as vozes ecoem e que,

    sobretudo, as vozes se entendam e

    organizem a palavra e a ao coletiva.

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    Como as instituies, especialmen-te as religies, podem contribuir na promoo de uma cultura da paz?

    Religies mobilizam o povo, es-pecialmente o povo mais frgil, mais dolorido pelas injustias do mundo. Independente da deno-minao e da origem de f, todas elas so expresso da cultura e da crena do povo. Tanto poder colocado a servio do interes-se coletivo sempre traz vitrias e faz avanar direitos sociais. Vive-mos um momento rico desse exemplo, como as posies progressis-tas do Papa Francisco. Quando a Igreja se dedica, em sua prtica e em seu discurso, s cau-sas populares, est se colocando a servio da paz, que acreditamos ser o mais saboroso fruto da justia.

    Que aes e iniciativas esto acon-tecendo no meio juvenil como formas de canalizar a agressividade e promo-ver a paz?

    Em todo pas surgem, a cada momento, novos grupos e espaos de discusso sobre como construir um mundo melhor para se viver: saraus, cursinhos populares, grupos de discusso, grupos teatrais e de danas, posses de hip-hop, fluxos de funk. Aqueles que se dedicam luta por justia social precisam vivenciar esses espaos. A importncia da educao, o respeito diversidade tnico-racial, religiosa e cultural, o combate ao racismo e violncia do Estado, a preocupao com o meio ambiente, o papel fundamental das mulheres na dinmica social e seu di-reito ao corpo e vida, a importncia da participao poltica, todos esses so temas que mobilizam a juventude e que, quando provocados dentro do contexto, propiciam ambientes em que as potencialidades e a energia (e no agressividade) se transformam em aes propositivas e mobilizaes importantes para a sociedade.

    Como a escola pode educar alunos e professores para uma cultura da paz?

    Antes de qualquer coisa, a escola um ambiente de convvio coletivo

    de pessoas que vivem o mundo e so influenciadas por ele. De maneira que o contexto social que cerca a escola e no qual esto inseridos estudantes, professores e funcionrios uma das chaves para compreender seu

    funcionamento. Antes ainda, a escola um aparelho do Estado, e no s o prdio e a es-trutura, mas a proposta didtico-pedaggica e a poltica educacional so elementos funda-mentais para a prtica de qualquer projeto.

    Infelizmente, no h por parte do Estado brasileiro polticas p-blicas suficientes para

    que todas as escolas pblicas sejam espaos qualificados de educao, de reflexo, de fomento da diversi-dade, do respeito s diferenas e, consequentemente, de uma Cultura de Paz. As iniciativas quase sempre dependem de aes individuais e/ou de grupos que, por sua conta, as promovem. Da uma vez mais a im-portncia da mobilizao popular, no sentido de cobrar que os poucos avanos conquistados em forma de leis e direitos se efetivem na prtica.

    Nesse sentido, as lutas polticas, como as manifestaes dos jovens, em junho de 2013, so importantes?

    As mobilizaes de junho abri-ram uma brecha para recuperarmos o valor da poltica, como busca da felicidade coletiva. Ento penso que a juventude brasileira, como da prpria natureza da juventude, de contestao, percebe o seu ambien-te, percebe que h problemas e se volta contra esse poder estabelecido. Porm ns corremos o risco dessa energia revolucionria prpria da ju-ventude ser capitalizada com valores conservadores. Ento ns precisa-mos aproveitar esse momento em que a populao est mais sensvel ao debate poltico e usar as estruturas, tanto da Igreja como da sociedade, para organizar as pessoas do ponto de vista das lutas progressistas, de avano das causas populares, de resistncia e luta por dignidade do povo que sempre foi excludo, como os indgenas e negros.

    O contexto social que cerca a

    escola e no qual esto inseridos

    estudantes, professores e

    funcionrios uma das chaves para

    compreender seu funcionamento.

    Na sociedade brasileira, a Igreja Catlica e ou-tras igrejas crists tm um papel muito importante, de demarcao de espao, um papel poltico em determinados momentos e um papel de agregao social.

    No se pode falar que as igrejas como um todo sempre tiveram um papel em favor da justia, mas nos dias de hoje elas tm muito a dizer para a so-ciedade, no sentido de alertar para valores que so cristos, e ao mesmo tempo so valores da demo-cracia, como a justia social e a solidariedade.

    Principalmente a Igreja Catlica, que sempre foi oficial e dominante, mas tambm outras igrejas crists esto tendo uma oportunidade de ganhar novas adeses, inclusive de quem j est presente na prpria igreja. Transformar a religio tambm numa questo de pertencimento, de escolha, no apenas de cultura de transmisso intergeracional da religio.

    O que para muitas pessoas pode causar pre-ocupao pode fortalecer uma igreja, ela ter essa possibilidade de viver num contexto de diversidade religiosa. E tambm esto chamadas a entender o que se entende realmente por ecumenismo. diferente ter um ecumenismo onde h um polo dominante to evidente, e ter um dilogo religioso onde existem vrios polos. Esse o desafio do mo-mento atual: construir um dilogo religioso, com uma perspectiva ecumnica, a partir dos valores das igrejas com vrios centros, e no apenas um centro que prope as regras e os termos do que sempre se chamou de ecumenismo, e hoje procuramos chamar de dilogo inter-religioso.

    A ao e o compromisso so muito impor-tantes. Se diz que o jovem o grande porta-voz das mudanas na sociedade. Uma pessoa que sai da proteo da famlia e comea a crescer passa a experimentar, a construir sua identidade, tem uma chance de se ligar no mundo, de crescer, de olhar em torno. Quem trabalha com a juventude tem a ideia de que a juventude muito propcia partici-pao. Porm no se pode colocar tudo nas costas dos jovens, porque eles refletem a sociedade, que tem pouco grau de participao. Mas a juventude tem essa fora e possibilidade que no se encontra em outras faixas etrias. A juventude o espelho re-trovisor, pois o que acontece na sociedade acontece na juventude. Embora eu acredite que podemos ter uma viso mais promissora da juventude, por conta deste ciclo que ela vive.

    Regina Novaes, antroploga, Rio de Janeiro, RJ. E-mail: [email protected]

    Religies e a luta por justia social

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    Malala: jovem, mulher e educadora para a paz

    Diante de tantas absurdas violncias

    que nos ltimos tempos vemos

    no noticirio internacional,

    compreensvel que o mundo inteiro tenha se maravilhado com

    a notcia de que o Prmio Nobel da

    Paz foi concedido a duas pessoas, sendo

    uma delas a jovem paquistanesa de 16

    anos, Malala Yousafzai.

    ESPECIAL

    O mrito de Malala a luta incessante contra o trabalho infantil, a violncia de gnero e tudo que constitui obstculo educao, sobretudo para as mulheres. Ao pronunciar-se imprensa internacional sobre o prmio, abriu o peito e os lbios com segurana e, ao mesmo tempo, com o frescor da idade na delicada voz. E disse a frase memorvel: Uma criana, um professor, um livro e uma caneta podem mudar o mundo. Educa-o a soluo.

    Maria Clara Lucchetti Bingemer,

    professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio, RJ.

    E-mail: [email protected]

    Que ningum se iluda, porm. A histria de Malala no foi uma tranquilidade, como a de muitas jovens de 16 anos nos dias de hoje. Vivendo em um pas violento e dividi-do, onde movimentos polticos usam a fora para ate-morizar e oprimir, desde cedo se rebelou contra esse estado de coisas e viu o conflito transferir--se para sua vida pessoal.

    Coragem e ousadiaDesde os 13 anos, Malala

    atua como ativista em favor do direito educao das mulheres, especialmente quelas que o re-gime talib probe de ir escola. Comeou a ter visibilidade e notoriedade escrevendo em um blog da BBC (canal internacional de notcias) sob pseudnimo, de-nunciando a violncia do regime. Junto com o pai, participou de um documentrio intitulado Perda de aulas: a morte da educao da mulher. Pretendia chamar a aten-o da opinio pblica sobre as dificuldades que enfrentavam as mulheres para poder ir aula nas zonas ocupadas pelo talib. Ma-lala defende o que considera um direito das mulheres: educar-se.

    A violncia armada do talib no esperou para desfechar-se so-bre ela. Em 2012, foi vtima de um atenta-do quando voltava da escola, desafiando a norma estabelecida. No nibus que a levava

    para casa, recebeu um tiro na cabea. Foi internada em estado grave, correndo risco de no sobreviver.

    Aos que lhe perguntaram como reagiria a seus agressores, o que faria se a atacassem de novo, sua resposta surpreendeu o mundo: No se deve lutar com crueldade e violncia, mas com dilogo, paz e educao.

    Mais ainda: preocupada em abrir o corao e a mente de seus agressores, disse que seu objetivo era mostrar como seria importante que eles tivessem o direito e a possibilidade de dar educao aos filhos deles. Sua esperana era que entendessem que este era o motivo de seus protestos e sua atuao poltica.

    O Prmio Nobel da Paz , portanto, mais do que justo re-conhecimento da estatura moral dessa menina, essa jovem mulher que engrandece a humanidade. Tomara que todos possamos

    aprender com ela nesse sen-tido, muito sintonizada com o grande Papa Paulo VI , que a paz s pode ser fruto da justia e da educao.

    Siga em frente, Malala. Te acompanhamos com carinho e admirao. E que Deus a proteja!

    A praa do povo como o cu do condor

    O trecho do poema O povo ao poder, de Castro Alves, inspira nossa atividade. Leve os estudantes a uma praa e organize-os em roda, de forma confortvel. A seguir, pea que leiam o texto sobre Malala e busque saber as opi-nies dos jovens sobre ela e a luta por direitos iguais entre homens e mulheres. Algumas questes sugeridas:

    1 - Por que Malala um exemplo de vida?

    2 - A coragem de Malala pode nos inspirar a sermos jovens mais solidrios que lutam por um mundo melhor? De que forma?

    3 - Como so as relaes entre homens e mulheres em nosso pas?

    Atividade

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    rchi

    ve

    Sugestes de Leitura

    Eu sou Malala: a histria da garota que defendeu o direito educao e foi baleada pelo Talib, de Malala Yousafzai e Christina Lamb. Companhia das Letras.Malala: a menina mais corajosa do mundo, de Viviane Mazza. Agir.

    Sugesto de Site

    Fundao Malala Yousafzai:www.malala.org.br

    No site do Mundo Jovem

    Assista ao discurso que Malala Yousafzai proferiu

    durante conferncia na ONU. Pode ser acessado em nosso site, na edio de fevereiro de 2015, por este link: www.mundojovem.com.br/edicoes

    A praa! A praa do povo como o cu do condor. o antro onde a liberdade

    cria guias em seu calor!Castro Alves

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    DIVERSIDADE CULTURAL

    No Sistema Nacional de Cultura (SNC), a promoo das polticas culturais desenvolvida de forma sistmica e compartilhada entre os entes federados, como em outros sistemas de articulao de polticas pblicas, a exemplo do SUS.

    Joo Pontes,

    diretor de Cidadania e Diversidade Cultural da Secretaria de Cultura do Rio Grande do Sul, cientista social e mestrando em Sociologia (UFRGS). E-mail: [email protected]

    Nos ltimos anos, o governo brasileiro passou a reconhecer que o acesso aos meios de criao, produo, circulao, fruio, formao, memria, pesquisa, informao e comunicao de bens e servios culturais um direito social bsico, como determinam a Constituio Federal e inmeras con-venes internacionais, como a da Unesco.

    Como contraparte ao direito dos cidados e das cidads, o papel do Estado no de fazer ou levar cultura, mas justamente o de garantir as condies de acesso a esses meios, reconhecendo a pluralidade de culturas e potencializando a criao e a amplia-o de redes colaborativas e de compartilhamento entre essas diferentes culturas.

    Autonomia Acima de tudo, no compete ao Estado deter-

    minar o que deve ou no ser produzido no campo da cultura: pelo contrrio, as polticas culturais no Brasil vm sendo marcadas pela garantia e pela promoo da autonomia. Com liberdade de criao e expresso, as polticas culturais colaboram com a construo de sujeitos sociais autnomos, com capacidades de reflexo, crtica, criatividade e alte-ridade.

    Ao potencializar principalmente os processos de criao, produo e formao, opera-se a desco-lonizao da cultura: descolonizao dos fluxos in-ternacionais unilaterais (e a hegemonia das culturas norte-americanas e europeias, inclusive fortalecen-do uma cultura de integrao desde o Sul mundial, de uma Amrica Latina unida e soberana), dos fluxos nacionais (centrados no eixo Rio-So Paulo), desco-lonizao do corpo e da mente, descolonizao por parte de poucos(as) sobre outros(as). Todos e todas so seres culturais, so sujeitos e sujeitas da histria.

    As polticas culturais passaram a ser vistas em sua tridimensionalidade: cidad (tendo em vista que se trata de um direito social bsico), esttica (como potencializadora de processos simblicos) e econ-mica (na medida em que lidam com o mundo do tra-balho, com a mobilizao de recursos, a movimenta-o de cadeias produtivas, a gerao de renda etc.).

    Viso sistmica A estrutura institucional vem se organizando

    de acordo com as diferentes necessidades sociais, buscando dialogar com as inmeras singularidades que compem o campo da produo cultural. Assim

    1 - Por que devemos encarar tambm a cultura como um direito da cidadania?

    2 - Por que h a necessidade de uma descolonizao da cultura?

    3 - Como reconhecer, valorizar e promover a diversidade cultural brasileira? Como fazer isso na escola?

    Questes para Debate

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    entendem-se as polticas culturais de forma sistmica: envolvendo um conjun-to de atores e instituies (a sociedade, os entes federativos e os trs poderes), com atribuies e direitos singulares, em uma rede articulada, orientada por planos que estruturam diretrizes e de-safios democrticos e participativos, e criam fundos interligados entre os entes federativos (governo federal, estadual e municipal).

    possvel considerar que as polti-cas culturais esto no extremo oposto s polticas de sade. O SNC, nas pa-lavras da ex-ministra Marta Suplicy, a certido de nascimento das polticas culturais e data pouco mais de um ano de aprovao pelo Congresso. A maioria de estados e municpios sequer contam com os seus planos; e o acesso aos bens e servios culturais est longe de ser reconhecido como direito pela maioria da populao.

    Diante disso, temos trs grandes desafios: a construo da conscincia dos direitos (cidadania cultural); a cons-truo de desenhos institucionais que compreendam os diferentes nveis de necessidades e demandas socioculturais, esferas de participao e atribuies es-tatais (a criao e o detalhamento/apro-fundamento dos sistemas de cultura); e, para depois, a sua plena efetivao.

    Por fim, o processo de garantia dos direitos culturais passa pela ampliao do oramento (o Fundo Nacional de

    Cultura); democratizao da gesto (com participao popular, a exemplo dos colegiados setoriais, das conferncias, do Conselho Nacional de Polticas Cul-turais, da Comisso Nacional de Pontos de Cultura etc.); e um planejamento que ultrapassa as gestes governamentais, indicando diagnsticos, desafios, di-retrizes e metas para o projeto de pas que queremos nos prximos 10 anos (o Plano Nacional de Cultura). Estes ele-mentos so os pilares de estruturao do Sistema Nacional de Cultura.

    Cidadania cultural e diversidade

    Ministrio da Cultura / Sistema Nacional de Cultura: www.cultura.gov.br/snc

    Sugesto de Site

    Conhea mais sobre o Sistema Nacional de Cultura: http://bit.ly/painel-SNC

    Sugesto de Vdeo

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    GEOGRAFIA

    Vitor Taveira,

    jornalista e mestre em Estudos Latino-Americanos, diretor da Expedio Abya Yala e integrante da Casa Amrica Latina Liberdade e Solidariedade (Calles) e do programa de rdio Soy Loco Por Ti, de Bogot, Colmbia. E-mail: [email protected]

    1 - Que barreiras ainda impedem a unidade latino-americana?

    2 - Que importncia e valor tem a diversidade de culturas na Amrica Latina?

    3 - Como, em nossas escolas, promover a cultura e a identidade latino-americana?

    Questes para Debate

    Quem somos, Amrica Latina?

    Convidaram-me a escrever sobre a identidade latino-americana. Estou seguro de que, se h uma barreira que nos impede de nos relacionarmos e identificarmos com o resto do continente, no o idioma. Tanto que, se sigo escrevendo em espanhol, me entenders, certo, leitor? Ento, continuemos assim.

    Pois bem, a histria que venho contar comea em 1492, quando uns navios imensos cruzaram o Oceano Atlntico e aqui desembarcaram Cristvo Colombo e os primeiros colonizadores. NO! No, no, no: mentira. No a que iniciamos. A his-tria da Amrica Latina comea muito antes dos europeus, pois aqui j existia vida, cultura, histria e civilizao, ou melhor, tudo isto no plural. Existia uma enorme quantidade de culturas originrias des-te continente, que o heri cubano Jos Mart preferia chamar Nossa Amrica, que o povo Kuna nomeia Abya Yala, terra madura em sua lngua prpria.

    Tempero culturals culturas que aqui j estavam, somou-se a

    europeia, acompanhada de um processo colonial repleto de violncias fsicas e simblicas contra as que aqui viviam ( importante recordar). Isso sem falar da grande quantidade de pessoas trazidas da frica, o que foi uma das maiores brutalidades e vergonhas da humanidade: a escravido massiva e o comrcio internacional de pessoas. Porm a contribuio europeia , sim, muito grande e va-liosa nossa cultura, pois chegaram tambm no s colonizadores espanhis, portugueses, ingleses, franceses e holandeses, mas tambm, posterior-mente, imigrantes alemes, italianos, suos, entre tantos outros. Tambm migraram para c chineses, japoneses, rabes, colocando ainda mais tempero em nossa sopa cultural.

    Em meio a esta mescla de tantas influncias, como falar de identidade latino-americana? Melhor nem falarmos dela. Melhor pensarmos plural, nas identidades latino-americanas. Existem muitas semelhanas, porm tambm profundas diferenas entre pases e mesmo entre regies dentro de um mesmo Estado nacional. Porm o processo poltico e social dos ltimos anos levanta um potente e pos-svel caminho: a unidade na diversidade. A hetero-geneidade no tem que ser um problema, pelo con-trrio, deve ser uma virtude, pois , possivelmente, a maior riqueza que temos.

    Latino-irmosSim, somos diversos, porm tambm podemos

    e devemos estar unidos. No um tema somente cultural, porm tambm histrico e poltico. Temos

    um passado comum de explorao e dores, todavia no sanados, um presen-te de transformaes e um futuro por construir. Podemos eleger estar juntos ou separados. O colonialismo, o impe-rialismo, o capitalismo e, possivelmente, outros ismos se beneficiaram da estra-tgia de dividir para dominar e, muitas vezes, nos olhamos como inimigos e competidores, no como irmos ou cooperadores, como poderia ser. Como escreveu Ferreira Gullar em seu poema chamado Ns, latino-americanos, so-mos irmos no porque seja o mesmo sangue que no corpo levamos: o que o mesmo o modo como o derramamos.

    Olhar com mais ateno nossos vizinhos latino-americanos e aprender deles , ento, um ato poltico amoroso. Deixar-se penetrar pelos acordes da guitarra de Silvio Rodrguez, admirar-se com as pinturas de Oswaldo Guayasa-mn, enamorar-se da voz de Chavela Vargas, encontrar nossa forte ternura nos poemas de Mario Benedetti, viajar na mgica realista dos contos de Ga-briel Garca Mrquez, entender nossa realidade nos filmes de Fernando So-lanas ou perder-se nos livros de Mario Vargas Llosa. Isso, para recordar apenas algumas estrelas de nossa constelao latino-americana, notveis ondas de sensibilidade no mar de afetos que o nosso continente.

    Uma pessoa que viaja sabe o quanto mais bonito sonhar juntos e sentir

    soprar o vento das utopias. Dizia o sbio msico e trovador argentino Facundo Cabral: uma bomba faz mais rudo que uma carcia. Porm, para cada bomba que destri, existem mil carcias que constroem a vida. Estou seguro de que voc se identifica com isso. certo que existe um ou uma latino-americana den-tro de voc. Pode ser que esteja dormin-do: desperta-o. J!

    A descoberta da Amrica (que ainda no houve), de Eduardo Galeano. Editora da UFRGS.Canto geral, de Pablo Neruda. Bertrand Brasil.Todas las Sangres, Jos Mara Arguedas. Editorial Horizonte.A colonialidade do saber: eurocentrismo e cincias sociais, organizado por Edgar-do Lander. Clacso Livros.

    Sugestes de Leitura

    Eu tenho tantos irmosQue no os posso contarE uma noiva muito lindaQue se chama liberdadeAtahualpa Yupanqui

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    GEOGRAFA

    A m me invitaron a escribir sobre la identidad latinoamericana. Estoy seguro que de haber una barrera que nos impide relacionar e identificarnos con el resto del continente, no es el idioma. Tanto que si sigo escribiendo en espaol, me entenders, no es cierto lector? Entonces, continuemos as.

    Vitor Taveira,

    periodista y maestro en Estudios de Latinoamericanos, director de la Expedicin Abya Yala y miembro de la Casa Amrica Latina Liberdade e Solidariedade (Calles) y del programa de radio Soy Loco Por Ti. E-mail: [email protected]

    Pues bien, la historia que vengo a contar comienza en 1492, cuando unos navos in-mensos cruzaron el Ocano Atlntico y desembarcaron aqu Cristbal Coln y los primeros colonizadores. NO! No, no, no, es mentira. No es ah que ini-ciamos. La historia de Amrica Latina comienza mucho antes de los europeos, pues aqu ya haba vida, cultura, historia y civilizacin. Lo mejor, todo esto en plural. Exista una enorme cantidad de culturas originarias en este continente que el hroe cubano Jos Mart prefera lla-mar Nuestra Amrica y que el pueblo Kuna nombra Abya Yala, tierra madura en su lengua propia.

    Condimento culturalA las que ya estaban, se

    sum la llegada de la cultura europea, acompaada de un proceso colonial repleto de vio-lencia fsica y simblica contra

    las que aqu vivan, es impor-tante recordar. Esto sin hablar de la gran cantidad de personas tradas desde frica en lo que fue una de las ms grandes brutalidades y vergenzas de la humanidad: la esclavitud masiva y el comercio internacional de personas. Pero la contribucin europea es s muy grande y valiosa a nuestra cultura pues llegaron no slo colonizadores espaoles, portugueses, ingle-ses, franceses y holandeses pero tambin posteriormente inmigrantes alemanes, italianos, suizos, entre tantos otros. Tam-bin migraron para ac chinos, japoneses, rabes, poniendo an ms salsa y sabor en nues-tra olla intercultural.

    En medio a esta mezcla de tantas influencias, cmo hablar de identidad latinoamericana? Mejor ni hablemos de ella. Mejor pensemos plural, en las iden-tidades latinoamericanas. Hay muchas similitudes, pero tambi-n profundas diferencias entre pases y mismo entre regiones dentro de un mismo Estado nacional. Pero el proceso pol-tico y social de los ltimos aos levanta un potente y posible ca-mino: la unidad en la diversidad. La heterogeneidad no tiene que

    ser un problema, ms bien debe ser una virtud, pues es quizs la mayor riqueza de tenemos.

    Latino-hermanosS, somos diversos, pero

    tambin podemos y debemos estar unidos. No es un tema so-lamente cultural. Pero tambin histrico y poltico. Tenemos un pasado comn de explo-tacin y dolores todava no sanados, un presente de cam-bios y un futuro por construir. Podemos elegir estar juntos o separados. El colonialismo, el imperialismo, el capitalismo y quizs otros ismos se be-neficiaron de la estrategia de dividir para conquistar y mu-chas veces nos miramos como enemigos y competidores, no como hermanos o cooperado-res como pudramos ser. Como ha escrito Ferreira Gullar en su poema llamado Ns, latino--americanos, somos hermanos no porque seja o mesmo san-gue que no corpo levamos: o que o mesmo o modo como o derramamos.

    Mirar con ms atencin a nuestros vecinos y aprender de ellos es, entonces, un acto pol-tico amoroso. Dejarse penetrar por los acordes de la guitarra de

    Silvio Rodrguez, admirarse por las pinturas de Oswaldo Guaya-samn, enamorarse de la voz de Chavela Vargas, encontrar nuestra valiente ternura en los poemas de Mario Benedetti, via-jar en la mgica realista de los cuentos de Gabriel Garca Mr-quez, entender nuestra realidad por las pelculas de Fernando Solanas o perderse en los libros de Mario Vargas Llosa. Esto para recordar apenas algunas estrellas de nuestra constela-cin latinoamericana, notables ondas de sensibilidad en el mar de afectos que es nuestro con-tinente.

    Una persona que viaja sabe lo tan ms bonito que es soar juntos y sentir soplar el viento de las utopas. Deca el sabio msico y trovador argentino Facundo Cabral: Una bomba hace ms ruido que una ca-ricia. Pero para cada bomba que destruye, hay mil caricias que construyen la vida. Estoy seguro que te identificas con esto. Es cierto que existe un o una latinoamericana dentro de ti. Puede ser que est dormido. Despirtalo. YA!

    Quines somos, Amrica Latina?

    Batalha das guas (Tambin la lluvia), de Icar BolhanPachamama - O Filme, de Eryk RochaMachuca, de Andrs WoodAo sul da fronteira (South of border), de Oliver Stone

    Sugesto de Filmes

    Sugestes de Msicas

    Latinoamrica, de Calle 13Cancin con Todos, de Mercedes SosaCinco Siglos Igual, de Leon GiecoSoy Loco Por Ti, Amrica, de Caetano Veloso

    Yo tengo tantos hermanosQue no los puedo contarY una novia muy hermosaQue se llama libertad Atahualpa Yupanqui

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    HISTRIA

    Um olhar sobre o saber histrico

    O ensino de Histria est, quase sempre, condicionado a uma concepo ou corrente historiogrfica. Isso quer dizer que o conhecimento histrico e o ensino da matria se modificaram ao longo dos tempos.

    Maria de Lourdes Abrantes Sarmento,

    graduanda do curso de Histria da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), PB. E-mail: [email protected]

    Antes de constituir-se como disciplina escolar, a Histria se confundia com a histria bblica e dos deuses. Por isso, da Idade Mdia at o sculo 17 evidenciou-se uma Histria ancorada na religio. Embora a histria j fosse ensinada pelos jesutas desde o sculo 17, foi somente no sculo 18 que ela ganhou contornos delimitados como conhecimento objetiva-mente elaborado e teoricamen-te fundamentado.

    A partir da fundao do Colgio Pedro II e do Insti-tuto Histrico e Geogrfico Brasileiro (IHGB), em 1838, a Histria, enquanto contedo de ensino especfico, passou a ser difundida no Brasil. O IHGB surgiu como o centro pensante, elaborando um parmetro de histria nacional oficial, e o Colgio Pedro II foi o executor desses parmetros, influen-ciados pelo positivismo e pelo catolicismo.

    Nessa perspectiva, cabia a tais instituies elaborar uma identidade nacional, visto

    que naquela poca o Brasil enfrentava um momento deli-cado, marcado por instabili-dade social e poltica (crise da Independncia). Fazia-se ne-cessrio induzir o povo a co-laborar com a estrutura social e poltica vigente. O objetivo dessa disciplina era despertar o patriotismo necessrio para a emergncia de uma identida-de nacional.

    Nacionalismo e seus herisNo perodo republicano, foi

    legado educao o status de redentora da nao. Por conse-guinte, buscou-se, a partir do ensino de Histria, fortalecer o esprito nacionalista neces-srio para a sedimentao da identidade nacional, abrin-do espao para as discus-ses concernentes a questes educacionais. Destacou-se a proposta do pedagogo Jos Verssimo, o qual acreditava que, para o projeto poltico da Repblica consolidar-se, era preciso um sistema educacio-nal abrangente e perpetuador de um patriotismo e de um pertencimento nacional. Ao ensino de Histria cabia prio-rizar o estudo dos feitos e da biografia dos grandes cidados

    brasileiros. Assim, na I Confe-rncia Nacional de Educao, em 1927, discutiram-se os ca-minhos para se construir uma identidade nacional comum, a partir do ensino de Histria, da moral e do civismo.

    Apesar dos diversos es-foros feitos pelo governo republicano, no se conse-guiu construir uma educao sistemtica e universalizante. Esse projeto s foi alcanado no governo de Getlio Vargas, quando houve a consolidao de uma memria nacional e patritica, contemplando o culto aos heris e a nfase nas tradies nacionais nas aulas de Histria.

    Histria e ditaduraDurante todo o regime mi-

    litar brasileiro (1964-1985), a disciplina foi usada como mecanismo de manipulao social e controle da ordem social vigente. Sua misso era neutralizar qualquer tipo de crtica ao Estado.

    No perodo da ditadura militar, a Histria, como dis-ciplina escolar autnoma, foi diluda e passou a coexistir com a Geografia sob a intitu-lao de Estudos Sociais. No

    era inteno formar um aluno crtico e reflexivo, e sim um aluno submisso e passivo ao autoritarismo do Estado.

    Com a redemocratizao poltica, o ensino de Histria passou a ser pensado para instruir o aluno a criticar toda forma de represso e autorita-rismo. Partindo desse pressu-posto, infere-se que, a partir de 1980, o ensino de Histria to-mou novas direes. Passou a ser uma arma contra o autori-tarismo e qualquer tentativa de censura gerando, portanto, um cidado em consonncia com o contexto da poca.

    Enquanto disciplina esco-lar no Brasil, a Histria, desde sua gnese, foi usada como justificao do poder da ordem dominante, como propagadora de uma determinada ideolo-gia. Por isso, nossa tarefa batalhar por uma Histria que leve os estudantes a compre-ender o contexto em que es-to inseridos, permitindo que ultrapassem as barreiras da dominao.

    Arq

    uivo

    MJ

    O ensino de Histria: reviso ur-gente, de Conceio Cabrini. So Paulo: Brasiliense, 2004.Histria na sala de aula: conceitos, prticas e propostas, organizado por Leandro Karnal. So Paulo: Contexto, 2010.

    Sugestes de Leitura

    Tempo, Revista Digital de Histria da UFF: www.historia.uff.br/tempoRede social voltada para o ensino da histria: www.cafehistoria.ning.com

    Sugestes de Sites

    Atividade

    Histria coisa de fofoqueiro?

    Por que aprender sobre tanta gente morta se estamos vivos? Estudar histria influencia nossas escolhas? Essas e outras dvidas esto presentes na cabea dos jovens. Ento, que tal aproveitar o comeo do ano e debater sobre a importncia de estudar Histria?Pode-se assistir ao vdeo indi-cado e responder essas e outras perguntas junto com os estu-dantes. Alm de refletir, pode-remos colher dicas de interesse dos jovens ao longo