revista ação - esportes sem limites - 2ª edição

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Ano 2 – nº 2 – Novembro 2013 DA MENTE Associação promove o pôquer nas mesas de Sertãozinho MILENAR Fazendeiro de São Simão resgata as quadrigas de Ben-Hur ALÉM DOS OLHOS Falta de visão não é limite para atletas do Goalball Projeto de natação em Ribeirão Preto luta para tirar crianças da rua e fazê-las entrar de cabeça na prática de atividades físicas na piscina Mergulho no esporte Mergulho no esporte

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Revista produzida pelos alunos do curso de Jornalismo do Centro Universitário Barão de Mauá em 2013.

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Page 1: Revista Ação - Esportes Sem Limites - 2ª Edição

Ano 2 – nº 2 – Novembro 2013

DA MENTEAssociação promove o pôquer nas mesas de Sertãozinho

MILENARFazendeiro de São Simão resgata as quadrigas de Ben-Hur

ALÉM DOS OLHOSFalta de visão não é limite para atletas do Goalball

Projeto de natação em Ribeirão Preto luta para tirar crianças da ruae fazê-las entrar de cabeça na prática de atividades físicas na piscina

Mergulhono esporteMergulho

no esporte

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Rumo ao bi!EDITORIAL

EXPEDIENTE

Acertamos no alvo. Não no mesmo que a estudante Ingrid França, que você conhecerá nas próximas páginas, acertou. Acertamos ao escolher o debate, no meio acadêmico, sobre es-portes alternativos.

Foi com essa proposta que a primeira edição da revista “Ação – Esportes sem limites” venceu o Expocom (Exposição da Pes-quisa Experimental em Comunicação) Sudeste agora 2013, em Bauru, garantindo vaga para o Nacional, em Manaus, onde con-correu com as representantes das outras quatro regiões do Brasil.

Não vencemos a fase final, mas só o fato de estar entre as cin-co melhores do país já é sinal de orgulho para os estudantes que produzem, com carinho, este material para você. Por enquanto, até a edição 2014 do prêmio, somos a melhor revista universitária do Sudeste. E, com esta edição, vamos buscar o bicampeonato.

Ao embarcamos nessa segunda viagem pelo cenário alterna-tivo do esporte na região de Ribeirão Preto, você poderá conhecer um grupo de pôquer que se reúne quase que secretamente para jogar o carteado. Verá, também, a superação dos deficientes visu-ais que jogam o Goalball. Resgatamos uma velha prática esporti-va, as corridas de bigas, numa fazenda do interior paulista. Para quem não sabe, a modalidade, que estava extinta há mais de um milênio e meio, é aquela retratada nas telas de cinema no clássico “Ben-Hur”, de 1959.

Driblamos alguns preconceitos para chegar ao topo do Sudes-te, assim como as meninas do futebol de Ipuã, que ainda superam desafios. Mas foi gratificante. Principalmente por buscarmos abrir um espaço de discussão sobre este tema na universidade. Espe-ramos continuar em campo, quadra ou arquibancada, nesse ritmo intensivo de preparação e disputa, para que outras conquistas sejam possíveis.

Boa leitura!

Revista AçãoEdição 2 – Novembro 2013Produção Experimental dos alunos do 2º ano do Curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo do Centro Universitário Barão de Mauá – Ribeirão Preto/SP

Coordenação do projeto: Prof. Igor José Siquieri SavenhagoFoto de capa: Daniel ZanettiIlustrações: Gabriela CastilhoProjeto Gráfico / Diagramação: Jefferson Ricardo Orlandi (Jefin) 16. 3041-9710

Pratique cidadania!Após ler toda a revista, repasse este exemplar a outras pessoas. Pequenas atitudes diárias ajudam na conservação do meio ambiente.

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ArtigoÉ campeão!

Cartas na mesaPô, quer jogar?

ArtigoA Copa a preço de ouro

Futebol e futsalToque feminino

Arco e flechaAlvo Certo

Artes marciais mistasA luta vai além

Tabuleiro educativoRainha do xadrez

ArtigoHolofotes para o amador

Esporte para todosEnxergar é um detalhe

Futebol americanoVai encarar?

Esporte milenarOs romanos de São Simão

EnsaioNadando na frente

Vôlei para a terceira idadeAdaptado para a vida

SUMÁRIO

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09 26

14 36

06 25

10 28

18 40

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É campeão!ARTIGO

Bom, quando me convidaram para escrever esse texto, fiquei pensando como seria passar toda a emoção vivida para o papel. Um resumo: inesque-

cível e surreal.Vou contextualizar. Eu, Vinícius Alves de Souza, fui

eleito aluno líder do projeto “Revista Ação – Esportes sem limites” (com o foco em esporte alternativo, o lado B, o que não é divulgado na grande mídia), que concorreu ao Expocom deste ano de 2013. Até então, tudo bem. Ok? Não... seria “ok” se só fosse isso. Além de concor-rer, vencemos a fase regional e ficamos entre as cinco melhores revistas experimentais universitárias do Brasil. Magnífico, emocionante, épico.

Tudo começou com a intenção da sala em ter um jornal-laboratório. Não foi possível. Mudamos para revis-ta. Já com o tema definido, fomos para a produção. Re-solvemos inscrever no congresso. Para isso, era preciso um paper (relatório científico) para explicar e teorizar a revista. Fomos às leituras. Foram muitas. Eu e a Susana, colega de sala, nunca lemos tanta coisa num espaço cur-to de tempo. Creio que duas semanas. Paper feito, após muito debate e rascunhos.

Restou só esperar o resultado dos finalistas. Em junho, a primeira vitória. “Ufa... estamos na final”. As dúvidas começaram a surgir. “E agora? Será que ganha-remos ou não?” Teríamos que ir para Bauru, na Unesp, e apresentar o projeto frente a um professor de outra re-gião e aos outros quatro concorrentes da região Sudeste do país.

Estudo... Estudo... Estudo. Foi assim até o dia 3 de julho, quando, de madrugada, partimos para o congresso. O caminho foi tenso, mesclado com risadas e brincadeiras no carro, entre amigos. A chegada à faculdade, mais tensa ainda. Estava chegando o momento da apresentação.

Éramos os últimos. Deu pra observar os concorren-tes. As esperanças estavam aumentando. Estávamos

focados demais naquilo que nos propusemos a fazer. Era apenas um exemplar, humilde, perto das centenas levadas pelos “colegas” estudantes. Mas deu certo no final. Vencemos.

Apresentação feita, confiança aumentada. Sexta-feira, 5 de julho de 2013, por volta das três e meia da tarde, partimos, novamente, rumo a Bauru. Era tudo ou nada. A volta poderia ser feliz... ou poderia ser em clima de velório. O destino nos proporcionou a primeira opção. Mas não foram só flores.

Nossa categoria foi uma das últimas a serem anun-ciadas durante a cerimônia. Fui ao banheiro umas cinco vezes. Beber água, então, umas dez. “O que fazer se ga-nharmos? O que fazer se não ganharmos?”. Não conse-guia conversar com ninguém. Muito foco e concentração.

Eis que chega o momento mais esperado, para nós, na noite. O mestre de cerimônias anuncia a nossa cate-goria... O tempo pareceu parar. Ouvimos lá no fundo: “O projeto vencedor é... Ação...”. Gritos, histeria, emoção, felicidade. Nem conseguimos escutar o resto do anúncio da nossa vitória.

Reconhecimento e sensação de dever cumprido. Com o título, fomos para a fase nacional em Manaus. Enfrentar revistas das regiões Sul, Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Uma por região. Não trouxemos o título, mas ficamos entre as CINCO MELHORES DO BRASIL. Para nós, uma grande vitória, um indicativo de que não poderí-amos parar. E não paramos. Está aqui a segunda edição.

A mensagem que deixo é que vale a pena o esforço, tanto para nosso crescimento, quanto para essas con-quistas na vida. Viva e curta intensamente cada momen-to. Lute pelos seus ideais e nunca deixe de acreditar. Dê o seu melhor em tudo. O sucesso é consequência.

Vinícius é estudante do 2º ano de Jornalismo do Centro Universitário Barão de Mauá

POR VINÍCIUS ALVES DE SOUZA

Primeira edição da Revista Ação, que venceu o Expocom Sudeste 2013 na categoria revista-laboratório impressa

Acompanhados do professor Igor Savenhago (ao centro), coordenador do projeto, os estudantes (da esq. para dir.) Susana Santos, Vinícius Alves de Souza,

Leonardo Oliveira e Daniel Zanetti foram a Bauru receber o prêmio

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SIDNEY SOUSA

No xadrez, a rainha é a peça mais importante na proteção do rei. Aquela que pode se movimentar em todas as dire-ções para evitar que o jogo acabe. Assim é Maria Brandão,

reconhecida por muitos dos pouco mais de 30 mil moradores de Barrinha, pequeno município da região de Ribeirão Preto, como uma das maiores incentivadoras da formação por meio do ensino aliado ao esporte. O jogo, nesse caso, é o projeto social “Jovens Enxadristas”, que foi apontado pela Secretaria Municipal de Edu-cação como uma das causas do bom desempenho do município no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2007, quando a média obtida foi superior as do estado e do país. E os reis que ela protege não são exatamente os de cima do ta-buleiro, mas jovens sonhadores que buscam dar um xeque-mate nos problemas da vida, muitas vezes causados pelas drogas, e ir bem além de ganhar uma simples partida.

Ação: Como surgiu a ideia do projeto de xadrez?Maria Brandão: Trabalhei alguns anos atrás no Conse-

Maria Brandão não mede esforços para manter, em

Barrinha, a 40 quilômetros de Ribeirão Preto, um projeto

social que contribui para estimular o aprendizado por

meio da prática esportiva e tirar jovens da criminalidade

Divulgação

Rainhado xadrez

TABULEIRO EDUCATIVO

lho Tutelar de Barrinha e percebi, já naquela época, que ti-nha crescido, e muito, a inserção de crianças e adolescentes no uso de drogas. Nesse período, meu filho Evandro come-çou a jogar e estava com 16 anos. Foi aluno do professor Aldo Gardengui, que introduziu o xadrez na Escola Siqueira [EE Prof. Jose Luiz de Siqueira] e em Barrinha como um todo. Porém, o professor Aldo se mudou e o Evandro ficou como voluntário na escola. Aos poucos, o número de en-xadristas aumentou e vieram, também, troféus e medalhas pelas conquistas em torneios estaduais. Quando saí do Conselho Tutelar, comecei a acompanhar alguns alunos em torneios na região. Íamos de circular e cada um custeava sua passagem.

Ação: Qual é o principal objetivo do projeto?Maria: O foco sempre foi tirar as crianças da rua, dando

a eles a chance de aprender algo que só traz benefícios. No início, foi difícil. Eles perdiam e ficavam tristes, mas isso acabou servindo de motivação e fez com que treinassem mais e mais e, com isso, conquistassem medalhas e troféus.

Com troféu dos Jogos Regionais,

Maria (esq.) busca conseguir patrocínios para

manter projetode xadrez

em Barrinha

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Divulgação

Ação: Quais foram as principais dificuldades no começo?Maria: Em 2000, os pais tinham que patrocinar as viagens.

Isso durou vários anos. Só em 2005 a prefeitura começou a nos fornecer ônibus e tal oportunidade fez com que surgissem ainda mais jogadores. A falta de transporte limitava muito a par-ticipação. Com o incentivo, pudemos levar até 80 crianças e adolescentes em torneios. Outra principal dificuldade foi a falta de espaço para que as crianças e os adolescentes treinassem, pois é importante trazer formas de aprimorar as habilidades dos alunos, tanto no esporte quanto na escola.

Ação: Existe alguma restrição para participar do proje-to ou limite de idade?

Maria: Não, é para todos. Não é cobrada taxa de inscrição também. Quanto à idade, eu não diria limites, pois há vários casos particulares e específicos, mas, geralmente, as crianças começam a interagir no xadrez com quatro anos de idade e, com cinco, podem avançar bem.

Ação: Qual a importância do Jovens Enxadristas para Barrinha?

Maria: É um projeto sociocultural. Até 2012, 15 crianças e adolescentes, de 12 a 18 anos, davam aulas e recebiam uma bol-

sa no valor de R$ 100,00. Com esse valor, os professores mirins compravam seus jogos de peça, tabuleiro e até mesmo custeavam gastos pessoais em viagens. Eles também contavam com profes-sores que os orientavam para que pudessem ensinar outras crian-ças. Esses professores eram adultos mais experientes, como meu outro filho, Renan Alves Brandão, Emanuel Valentim dos Santos, Caique Ribeiro da Rocha e Rafael Nakamura da Silva.

Ação: O projeto já foi, inclusive, premiado...Maria: Sim. Como as crianças são de várias escolas muni-

cipais e estaduais, várias já receberam premiações, principal-mente a EMEF Darvy Mascaro, EMEF Antonio Duarte Nogueira e EE Prof. Jose Luiz de Siqueira. A Darvy Mascaro tem dois títulos estaduais de equipes masculinas. A Siqueira tem vários títulos estaduais com equipes masculinas e femininas. Já Barri-nha tem títulos nos Jogos Regionais. Nos anos de 2008, 2009, 2010 e 2012 foi campeã e, em 2011, ficou com o vice-campe-onato. Também ficou em primeiro lugar nos Jogos Abertos do Interior em Santos, em 2010, e Bauru, em 2012. Além dos tor-neios por equipe, a cidade já revelou vários talentos individuais, que conseguiram títulos, como o Pan Americano Escolar U19, o Campeonato Brasileiro Escolar do 1º ano, o Paulista sub-16 e os Jogos Escolares Infantis.

Barrinha se destaca na modalidade, com a conquista de

quatro títulos nos Jogos Regionais e dois nos Abertos do Interior

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Ação: Você já pensou em parar com o projeto?Maria: Até cheguei a cogitar isso, numa época em que vi

as crianças ficarem sem espaço para treinar e a decepção nos olhos do meu filho caçula, que também precisou parar. Em vez de progredir, regredimos. Mas pensei bem e vi que não podia jogar fora tantos anos de luta. Resolvi tentar conseguir patro-cínio por outros caminhos, através de uma ONG, mas, por en-quanto, não tive sucesso. Estou tentando, primeiro, apoio para quem já estava no projeto. Por isso, não podemos pensar, no momento, em aumentar o número de participantes.

Ação: Como o projeto beneficia os participantes? Maria: Para participar do Jovens Enxadristas e receber a bol-

sa, os jovens deveriam ter notas na escola e bom comportamen-to. Esse, pra mim, era o fator mais importante. Eu era obrigada a retirar qualquer um deles que tivesse problemas disciplinares

Projeto Jovens Enxadristas forma jovens jogadores com a proposta de tirá-lo das ruas e livrá-los do contato com as drogas

Maria Brandão destaca que a concessão de bolsa em troca de notas

boas nas escolas era um dos pontos mais importantes do projeto

na escola, pois, do contrário, daria mal exemplo para os outros. Nesses 13 anos de xadrez, perdi alguns garotos, por causa do envolvimento com as drogas. Mas fico feliz hoje em saber que muitos estão fazendo faculdade, outros bem empregados. Al-guns até já saíram da faculdade e continuam com o xadrez. Bar-rinha tem hoje muitos talentos que foram desenvolvidos com aju-da dos meus filhos, que não deixaram o projeto parar e fizeram sucessores. Ninguém consegue chegar a um bom nível de jogo sozinho, sem ajuda. Por isso, digo que cada semente plantada na cidade tem as mãos e o cérebro dos meus filhos, principalmente do Evandro, pois foi ele quem incentivou o mais novo.

Fotos: Divulgação

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A Copa a preço de ouro

Desde a confirmação do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014, o país vive uma expectativa de encarar as problemáticas, até então, escondidas

na Caixa de Pandora.Tendo em vista os gastos direcionados aos Jogos

Pan-Americanos de 2007, cuja estimativa de recursos financeiros a serem utilizados era de quatrocentos mi-lhões e saltou para mais de quatro bilhões de reais, o temor é que os números da Copa também atinjam valo-res exorbitantes.

Essa questão envolvendo a parte financeira de um dos maiores eventos esportivos do planeta vem sendo observada atentamente pelos mais variados veículos de comunicação do país. Isso ocorre porque, para se atingir os padrões exigidos pela FIFA (Federação Internacional de Futebol), o governo deverá dispor de inúmeros recur-sos com infraestrutura, hipótese severamente refutada nas primeiras negociações para a realização da Copa.

A partir desse fato, surge automaticamente um ques-tionamento: será que esses investimentos não deveriam ser aplicados nas mais diversas instituições falidas do Brasil, como saúde, educação e segurança? A questão parece ser trivial. No entanto, merece uma reflexão mi-nuciosa.

É evidente que um evento dessa magnitude trará inúmeros benefícios para o Brasil, tais como estimular a economia, turismo, melhorar e desenvolver a infraestru-tura e promover o contato cultural entre povos de diferen-tes partes do mundo. Porém, mesmo com tantos pontos positivos, não se pode ficar ludibriado apenas com essas perspectivas e deixar de lado os problemas que envol-vem os bastidores ocultos da realização de uma Copa do Mundo (desvio de verbas públicas, corrupção, utili-zação dos feitos das seleções para discursos de cunho eleitoral).

Para exemplificar essa situação, um dos problemas está diretamente ligado à construção dos estádios que farão parte da rota das partidas. Para começar, houve um veto que impediu a reforma do estádio do Morumbi e possibilitou a construção do “Itaquerão” (com dinheiro público, ao invés de repassar os gastos para o clube de

futebol que será seu proprietário, o Corinthians). Depois, vem a construção de estádios em locais que não terão utilidade efetiva posteriormente à Copa, como é o caso de cidades como Brasília, Cuiabá e Manaus, que não têm times representativos no cenário futebolístico nacional.

Há, ainda, questões impostas pela FIFA que são ca-pazes de gerar muita polêmica para os nossos governan-tes, como a proibição de bebidas alcóolicas nos estádios e a meia-entrada para idosos e estudantes.

Por fim, todo esse quadro de características revela a cautela que os preparativos para 2014 precisam ter. Só assim, a paixão pelo futebol não cegará a sociedade e os custos do evento não sairão a preço de ouro para o Brasil.

Giovani é estudante do 2º ano de Jornalismo do Centro Universitário Barão de Mauá

POR GIOVANI VIDAL

ARTIGO

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SUSANA SANTOS

Começa a partida. São três atletas vendados de cada lado e uma bola murcha de basquete, envolta por saquinhos plásticos, sendo lançada e defendida pelas equipes. Foi

assim que nasceu o Goalball em Ribeirão Preto. Mais precisa-mente na quadra da Escola Estadual Cid de Oliveira Leite, no Jardim Paulista.

Professora de Educação Física do “Cid” e voluntária nas horas vagas, Silvia Helena Piantino Silveira começou em 1991 o trabalho com estudantes portadores de deficiência visual. Durante dez anos, acompanhou o crescimento dos alunos e o aumento da necessidade de levar a eles novas atividades, para além de pular bola, correr e brincar de bambolê.

Com objetivo de fazer a transição entre a prática de ativida-des motoras e o esporte, a professora foi a Campinas conhe-cer os esportes adaptados. “Quando me formei, não existia a disciplina Educação Física Adaptada. Então, eu não sabia que existia uma cordinha para a corrida, não conhecia o Goalball e também não sabia como era, na natação, a virada pra uma

Se a visão falta, ouvir o barulhode uma bola pode apontar

o caminho. O projeto voluntárioque se transformou em referência

nacional do esporte adaptadoforma atletas para os quais

grandes obstáculos parecem ser mínimos quando pisam em quadra

Enxergar é um detalhe

ESPORTE PARA TODOS

pessoa com deficiência visual.” Ela lembra que, 12 anos atrás, havia apenas um livro de um

professor do Rio Grande do Sul e pesquisas na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) estavam em fase inicial. As modalidades específicas para portadores de necessidades es-peciais ainda engatinhavam no Brasil.

Da quadra do Cid para a Adevirp A Associação dos Deficientes Visuais de Ribeirão Preto

(Adevirp) foi fundada em 1998. Surgiu com o objetivo de incluir pessoas com necessidades especiais na sociedade. A sede, doada pelo governo de São Paulo em 2006, fica na avenida Le-ais Paulista. Lá, os mais de 150 usuários atendidos têm acesso não só ao esporte. Participam, também, de aulas de informá-tica, terapia ocupacional, educação musical, oficinas culturais, alfabetização em Braille, entre outras atividades.

No início, a fundadora e atual presidente, a professora Mar-lene Taveira Cintra, contava apenas com o apoio da comuni-dade e das famílias das crianças atendidas. A sede funcionava no apartamento dela e todos os funcionários eram voluntários.

Daniel Zanetti

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Fotos: Daniel Zanetti

Esporte foi trazido de Campinas para a sede da Adevirp, em Ribeirão Preto, e

rapidamente conquistou adeptos

Jogadores se posicionam em

quadra de forma a evitar que a

bola arremessada pelos adversários

ultrapasse as balizas azuis

Marlene explica que, na instituição, o esporte é voltado, prioritariamente, para a saúde e o bem-estar, tendo em vista a grande dificuldade que os portadores de deficiências visu-ais encontram para se locomover e praticar atividades físicas. Mesmo assim, as equipes esportivas de lá, como a de Go-alball, que migrou do “Cid” para a Adevirp, têm conseguido grandes resultados. “O bonito mesmo é que nós não nasce-mos com o intuito de formar atletas. Aqui, o esporte é como a música e outros projetos pedagógicos. É um braço da institui-ção, mas é feito com tamanho compromisso dos educadores e responsabilidade dos usuários que, como consequência, já fomos campeões brasileiros e também já sediamos finais de campeonato.”

A bola Antes, porém, de desenvolver o esporte na Adevirp, ain-

da utilizando a quadra do “Cid”, Silvia trouxe de sua viagem a Campinas algumas modalidades em esportes adaptados a Ribeirão, entre elas o atletismo e o Goalball. Este último requer a utilização de uma bola que produza barulho, para que os jo-gadores possam saber onde ela está e defender suas traves.

A bola oficial para prática da modalidade é fabricada ape-nas na Alemanha e chega ao Brasil pelo valor de, aproximada-mente, R$ 500,00. Como não havia condições financeiras para adquiri-la, surgiu a ideia de adaptar uma de basquete murcha, colocando-a dentro de várias sacolinhas de supermercado para produzir o barulho que guia os atletas.

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Daniel Zanetti

A bola oficial, que no Goalball é arremessada com as mãos, custa cerca de R$ 500,00; antes, alunos adaptavam uma de basquete murcha

Em 2002, um ano após a formação, a equipe da entida-de foi convidada para participar de um campeonato em São Carlos. Foi lá que houve o primeiro contato com a bola oficial. Alguns dos que participaram daquela competição, como Suelen e Cristiano, contam que levaram “muitas boladas na cara”. Mas a experiência valeu a pena. Ambos já tiveram várias conquistas desde então.

Saindo do improviso

Com a participação nesse primeiro torneio, o esporte da

Adevirp ganhou mais visibilidade e apoio. Uma amiga da pro-fessora Silvia, Mariana Jábali, impressionada com o trabalho, doou a eles a primeira bola oficial do projeto. A Associação Mulher Unimed de Ribeirão Preto (Amurp), que já apoiava a iniciativa desde 1999, também passou a dar mais respaldo, se disponibilizando a pagar um professor de Educação Física e também os uniformes para os atletas do Goalball.

Em apenas uma década, a modalidade saiu do amadoris-mo. Além de ganhar competições e sediar eventos, a Adevirp forma atletas que chegam a representar o país em competições internacionais.

No Brasil, existem 60 equipes oficiais e cerca de 800 atle-tas. Destes, anualmente, apenas seis são convocados para representar a seleção brasileira de Goalball. Entre os atuais da entidade, Cristiano, o mesmo que participou do encontro com a bola oficial em São Carlos, já teve esse privilégio.

Outras conquistas Mas não é só no Goalball que a entidade se destaca. Em

setembro de 2013, atletas da Adevirp/Amurp disputaram a 2ª Etapa Nacional do Circuito Loterias Caixa de Halterofilismo, Atletismo e Natação, que reuniu os melhores competidores do país.

Cristiane Silva Ganime conquistou ouro na prova de 50 metros livres da natação. Marcos Antônio Lopes alcançou a segunda maior marca do Brasil no arremesso de peso e trouxe a prata para casa.

Para entender o Goalball

O jogo é disputado num espaço com as mesmas di-mensões da quadra de vôlei. No fundo de cada lado, lo-calizam-se duas balizas, que abrangem toda a largura da quadra. Os três atletas de cada equipe ficam restritos a uma área de três metros à frente da baliza que defendem. Não há contato com os oponentes.

Os jogadores arremessam a bola para o outro lado, buscando que ela ultrapasse o fundo da quadra adversá-ria, entrando nas balizas. É necessário que a bola toque linhas determinadas, para garantir que ela chegue ao gol adversário junto ao chão.

A bola de Goalball é especialmente desenvolvida para esse esporte. Pesando um quilo e 250 gramas, possui, na parte interna, um guizo, permitindo que os atletas se locali-zem pela audição. Todo praticante deve, obrigatoriamente, utilizar venda durante as partidas, de modo que aqueles que tenham visão parcial não obtenham nenhum tipo de vantagem.

Fonte: urece.org.br, site especializado

em esportes para deficientes visuais

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O Goalball nasceu em 1946, na Alemanha, com a missão de ressocia-lizar ex-combatentes que haviam per-dido a visão, ou parte dela, durante a Segunda Guerra Mundial. O esporte foi criado pelos professores Hanz Loren-zen e Sepp Reindle, exclusivamente para a prática de atletas cegos e por-tadores de visão subnormal. Em 1976, em Toronto, no Canadá, o Goalball teve

Um pouco de história

O time da Adevirp

Suelen, 23 anos. Jogadora de Goalball há dez, conta que já viajou para todo o Brasil disputando campeonatos pela Adevirp.

Maria Eliene, 21. Pratica Goalball há três e foi convocada para a Seleção Feminina pela primeira vez neste ano de 2013.

Manoel, 27. Já jogou Goalball e, há um ano, faz parte da equipe de atletismo. Em setembro de 2013, disputou o campeonato regional em Campinas e ganhou duas medalhas, uma de prata e uma de ouro.

Ricardo, 36. Praticante de atletismo e natação. Gosta de praticar o esporte principalmente para manter a saúde, mas não deixa de competir.

Carlos Eduardo Quaquio. Professor de Educação Física na Adevirp desde 2008. Foi aluno da professora Sílvia e se interessou tanto pelos esportes adaptados que uma parte de sua pós-graduação foi voltada a esse assunto. Hoje, trabalha com Educação Física infantil adaptada e Goalball masculino e feminino.

Cristiano, 25. Jogador desde os 14, já participou de campeonatos regionais, nacionais e internacionais. Defendeu a camisa da Seleção Brasileira de Goalball em 2007, 2008 e 2012.

Irinelma, 18. Está desde os 12 anos na Adevirp e pratica Goalball há quatro.

Jessica, 21. Pratica atletismo, há seis meses.

Iesley, 18. Pratica atletismo e nata-ção. Está na Adevirp há mais de cinco anos. Já participou de campeonatos de xadrez.

Professora Sílvia. Atual coordenadora de esportes da Adevirp. Professora da disciplina Educação Física Adaptada nos cursos de Educação Física do Centro Universitário Moura Lacerda e da Universidade Paulista (Unip). Já participou de três campeonatos mundiais como árbitra de Goalballda Confederação Brasileirade Desportos.

sua primeira participação nos Jogos Pa-raolímpicos.

Atualmente, o esporte é praticado em mais de 120 países. Em 2002, o Rio de Janeiro realizou o VII Campeonato Mundial de Goalball. Em 2003, a equipe feminina brasileira conquistou a medalha de prata no Mundial do Canadá. Com este resultado, garantiu vaga para os Jogos Paraolímpicos de Atenas, disputados no ano seguinte. Foi

a primeira vez que o Brasil foi representa-do nesta modalidade.

Em 2008, a equipe masculina tam-bém fez sua estreia paraolímpica e, já na edição seguinte, em Londres-2012, ganhou a medalha de prata, confirman-do o crescimento do esporte no Brasil.

Fonte: urece.org.br, site especializado em

esportes para deficientes visuais

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VINÍCIUS ALVES

A voz é calma. Doce, suave. A garota parece tímida, mas em poucos minutos com a reportagem da Ação, vai se soltando. Quem olha pela primeira vez nem imagina que

a estudante Ingrid Caroline França, de 14 anos, acumula títulos e mais títulos com apenas um ano de competições no tiro com arco, ou arco e flecha, prática do famoso herói dos cinemas Robin Hood.

Ela disputa campeonatos na categoria infantil, com distân-cias de 15, 20, 30 e 40 metros do alvo. Treina com o irmão, também estudante, Arthur Felipe França, 16 anos. Os dois começaram a praticar o tiro com arco após uma viagem para Brotas, a 170 quilômetros de Ribeirão Preto, com um grupo de escoteiros de Sertãozinho, cidade vizinha a Ribeirão.

Os pais, que eram os coordenadores da excursão, resol-veram, na volta, levar a turma para uma aula gratuita na aca-demia da AABB (Associação Atlética do Banco do Brasil), sob responsabilidade do goiano Ronaldo Nacaxe, pentacampeão brasileiro da modalidade na categoria máster. Apenas Arthur e

Foi numa brincadeira de escoteiros que uma jovem de Sertãozinho acertou na mosca.

Escolheu, quase que por acaso, um esporte que a fez conquistar diversos títulos logo no primeiro

ano de carreira, inclusive uma prata em competição mundial. E, com o apoio da família e

do irmão, que a acompanha nos treinos, sonha com os Jogos Olímpicos de 2020, no Japão

Vinícius Alves

Alvocerto

ARCO E FLECHA

Ingrid perseveraram nos treinos. O desempenho melhorou e, aos poucos, eles foram con-

quistando resultados qualificatórios para os principais cam-peonatos do país. Hoje, são membros da Federação Paulista de Arco e Flecha (FPAF) e da Confederação Brasileira de Tiro com Arco (CBTARCO). As competições são feitas por clubes e academias, não por cidade. Porém, o resultado maior é o individual.

Ingrid é medalha de bronze na Copa Brasil, prata no Brasi-leiro, ouro no Field (competição que simula a caça de animais), ouro no Paulista e Brasileiro Indoor e prata no Mundial, tendo esta última conquista sido revelada no dia em que a reportagem esteve na academia. Entenda: o título não sai durante uma com-petição específica. É preciso enviar um formulário com o desem-penho anual para ser analisado por juízes do ranking mundial.

Como os treinos são apenas nas manhãs de sábado, a jo-vem promessa do esporte no Brasil diz que os estudos não a impedem de conquistar mais medalhas. “Isso [tiro com arco] já é uma diversão pra mim. Aqui, me distraio do dia a dia e da escola. Começo bem meu final de semana”.

Page 15: Revista Ação - Esportes Sem Limites - 2ª Edição

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até hoje, com anos de profissionalismo, não consegue um bom desempenho sob pressão. Imagine quem está começando”.

Início de tudoA caminhada de Nacaxe para chegar aonde chegou come-

çou em 1985, quando comprou seu primeiro arco. Segundo ele, na época, eram poucos os praticantes do então arco e flecha. Tudo que aprendeu foi na brincadeira e na raça. “Pra mim, eu era o máximo”.

O professor se mudou para Ribeirão Preto em 1990. Fi-cou no interior de São Paulo até 1995. Em 1999, conheceu um grupo de tiros em Brasília, onde foi morar. Os praticantes tinham experiência internacional. “Lá que me profissionalizei e vi que não sabia nada de tiro com arco”. Começou a competir e ganhar alguns campeonatos estaduais. Mais tarde, já estava vinculado às federações.

Teve, ao longo dos anos na categoria adulta, bons resultados, como um quarto lugar no campeonato brasileiro. Mas foi no máster que se consagrou. Em 2007, veio a primeira medalha de ouro no nacional. Feito que se repetiu em 2008, 2010, 2011 e 2012. Nesse último, conquistou também o vice-campeonato das Américas.

Há cinco anos, é professor de tiro com arco. Começou dan-do aulas em casa. Entrou em contato com a Associação Atlética do Banco do Brasil (AABB) e conseguiu o espaço do clube para treinamentos. Mas, por motivos de segurança, preferiu treinar num local fechado, na academia.

Todos os seus alunos são federados e disputam torneios representando a AABB. São arqueiros de todas as idades. “No tiro com arco, se você inicia um atleta com 15, 16 anos, ele che-ga aos 50 com alto nível. Basta treinar constantemente como em qualquer esporte”.

DisciplinaO tiro com arco, segundo Nacaxe, exige muito dos prati-

cantes. O trabalho para iniciar um atleta é bem lento. É preciso ter paciência. No começo, o treino é com distâncias curtas e poucos movimentos. Devagar, se vai ganhando técnica, mira e concentração. O ponto chave do esporte.

O professor explica que, se o atleta não estiver 100% con-centrado na atividade, tende a ter resultados ruins. O tempo entre perceber a mira e atirar é muito curto. Um décimo de segundo, aproximadamente. “Tem que trabalhar muito isso. Sai quase que inconsciente. É muito treino. É quase um instinto do arqueiro. Você tem que atirar assim que perceber. Se perder a primeira mira, a segunda ainda salva, mas não sairá da mesma forma. Na terceira, geralmente, o atleta já está desconcentrado.”

A grande potência dessa prática, atualmente, é a Coreia do Sul. Lá, as crianças aprendem a atirar desde cedo, já nas esco-las. “É como se fosse o futebol deles”, diz Nacaxe. Ele acredita que esse desempenho venha da disciplina dos asiáticos. “Disci-plina e arco e flecha caminham juntos. É um esporte que exige postura e foco”.

Segundo o pentacampeão brasileiro, qualquer interferência pode tirar a concentração de um arqueiro. Em uma competi-

Rumo a TóquioEla diz que sempre que sobra um tempinho está com o arco

nas mãos em casa, para treinar o posicionamento correto da coluna e a força nos músculos. Chegou até a fazer fisioterapia, para evitar muitas lesões.

Tanta dedicação se explica por uma meta a ser alcançada: os Jogos Olímpicos de 2020, em Tóquio, no Japão. “Potencial para isso ela tem. Poderia até chegar em 2016 no Rio de Janei-ro, mas pela idade que terá, é muito difícil conseguir os índices. Daqui seis anos, já estará em uma época boa. É só treinar mui-to”, diz o professor, Ronaldo Nacaxe.

“Não consigo nem imaginar. Vou ficar muito nervoso, an-sioso, assim como a mãe dela. O coração vai apertar”, afirma o pai, Ernesto França, 39 anos. “Claro que vou ficar muito feliz, mas na hora vou me concentrar, como faço sempre”, declara a atleta, já projetando um futuro promissor.

ApoioO irmão mais velho, Arthur Felipe França, que treina com

ela, é medalha de bronze no Field, categoria cadete (com a dis-tância de 30, 50, 60, 70 metros do alvo). Além do pai, Ernesto, a mãe, Andrea, está presente em todos os treinos e torneios. Algumas vezes, na ausência do professor, são eles os técnicos nas competições. É só os filhos viajarem para uma disputa e lá vão eles atrás. “Sempre fizemos tudo junto. Não é agora que vamos nos separar deles”, conta Ernesto.

E os pais já fizeram muitas loucuras por esses arqueiros. Viajaram 11 horas num carro compacto, de Sertãozinho ao Rio de Janeiro, para garantir que os garotos pudessem competir. “A realização dos filhos é a nossa realização”, conclui o pai coruja.

Tanto para Ingrid quanto para Arthur, ter a mãe e o pai por perto traz uma força a mais. “Me dá segurança”, diz o menino. “Eu prefiro assim. Sei onde vou poder me apoiar”, completa ela.

O professor Nacaxe acredita que a presença familiar é importante para o desenvolvimento da criança ou adolescente como atleta. “Se ele consegue suportar a pressão de ser visto pelo pai e pela mãe, ele supera qualquer outra pressão”. Mas alerta que existem limites para essa interferência. “Um aluno foi muito mal na competição porque o pai cobrava muito o resul-tado positivo dele. Muitas vezes, não é assim. Tem atleta que

- Esse esporte cansa a mente e o corpo. Segundo o pro-fessor Nacaxe, são queimadas quase 300 calorias por hora.

- As flechas são feitas de acordo com a potência do arco e do arqueiro. Uma flecha de 30 gramas pode ter uma ener-gia cinética que resulte em um peso de dois quilogramas ao chegar ao alvo. A velocidade média dela também é alta. Varia de 250 a 300 quilômetros por hora numa competição com arcos normais. Já com os arcos olímpicos, as flechas alcançam de 190 a 210 quilômetros por hora.

Curioso...

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Ingrid França, de 14 anos, pretendia chegar já nas Olimpíadas de 2016, no Rio da Janeiro, mas terá muito pouca idade e dificuldade para conseguir os índices

Vinícius Alvesção, os atletas ficam lado a lado (cerca de 80 cm de distância um do outro) na chamada linha de tiro. O arco tem um dispo-sitivo que faz barulho ao indicar que a flecha pode ser lança-da. “Se o arqueiro não está concentrado, o barulho do ‘vizinho’ pode fazer com que ele perca o foco”, explica. A regra diz que, se algum ruído vindo de um dos competidores for causado de forma proposital, ele será eliminado das competições.

Como exemplo de concentração para os atletas, Nacaxe escolhe o pênalti do futebol ou o arremesso de basquete. Para ele, cada tiro equivale a esses dois momentos. A tensão e o foco devem ser constantes para não acontecer perda de pon-tos. “Ninguém espera o erro. O ideal é sempre acertar. Mas a virtude de um bom atleta é saber superar as falhas”.

Uma facilidade citada pelo professor é que só o tiro com arco pode dar o feedback instantâneo da ação do arqueiro. “Não é como o futebol ou alguns outros esportes em que você só se avalia depois”. Ele ainda fala que, nessa modalidade, o atleta já entra na competição sabendo o máximo de pontos que pode conseguir. Nacaxe desenvolveu um modelo de treinos que ajuda nisso.

Por exemplo: se a regra diz que a pontuação máxima do campeonato é 600 e o atleta tem seis chances para conseguir o topo, é preciso acertar todas as flechas no centro. Em vez de se preocupar com o ganho, é preciso se preocupar com as perdas, segundo esse método de Nacaxe. “O 600 ele já tem. É preciso controlar o que ele vai perder para não se afastar muito dessa pontuação. O máximo das Olimpíadas é 720 e o recorde é 699. É mais fácil eu me preocupar em controlar esses 21 restantes do que os mais de seiscentos conquistados”.

TecnologiaO professor se diz muito procurado por fãs do esporte e que

sempre sonharam em praticar. Muito por influência do filme Ro-bin Hood. “Eles acham que é fácil igual lá [no filme]. Tirar uma flecha e atirar, e outra, outra e outra na mesma rapidez. Não é assim. O filme fantasia muito.” Segundo ele, nesses casos, quando os treinos apertam, muita gente para. Calcula que, de cada dez, uma pessoa continua treinando.

Os tempos mudaram desde a época de Robin Hood. Hoje, para a avaliação do desempenho de cada atleta, são desen-volvidos aplicativos para celular que monitoram e colocam em gráficos as evoluções do arqueiro.

O empresário Alysson Meyerhof Rodrigues, de 37 anos, é um dos adeptos dessa nova tecnologia. A maioria dos dispositi-vos no celular dele é voltada para o tiro com arco. “É muito bom esse monitoramento e dinâmico também. Eu acabo a minha série de tiros e posso compartilhar com o meu treinador onde quer que ele esteja”.

Rodrigues é de Araraquara e, a cada quinze dias, aos sába-dos, há mais de um ano, viaja 87 quilômetros até Ribeirão Preto, local dos treinos. No começo, queria um esporte pelo qual elimi-nasse a tensão do trabalho, numa empresa de peças para usinas.

Revela ser um “perna de pau” para o futebol e baixinho para o vôlei e basquete. Por isso, pesquisou e encontrou o tiro com

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O professor Ronaldo Nacaxe se mudou para Ribeirão Preto em 1990, mas foi em Brasília, após

conhecer um grupo de tiros, que ele se tornou atleta profissional

Vinícius Alvesarco. “Aí, animei. Era muito sedentário e achava que não exigia tanto esforço físico. Engano meu. Mas gosto muito de treinar e competir. Valeu a pena”.

Restrito no BrasilA Confederação Brasileira de Tiro com Arco (CBTARCO)

conta com cerca de 700 atletas registrados. No estado de São Paulo, são 200. Rodrigues acredita que esse baixo número se deve ao fato de o esporte ser muito caro no país.

O Brasil não produz os equipamentos necessários para a prática da modalidade. Os arqueiros devem buscar fora, prin-cipalmente nos EUA, os materiais de melhor qualidade para a disputa de um campeonato. Em média, cada atleta gasta perto de R$ 5 mil para ter o kit individual. Isso sem contar a mensali-dade da academia para os treinos.

Em 2016, a cidade do Rio de Janeiro será sede dos Jogos Olímpicos. O tiro com arco é uma das modalidades a serem dis-putadas. Cada país tem direito a seis vagas. A média do Brasil, por Olimpíadas, é de mandar dois ou três arqueiros. Como será país-sede nos próximos Jogos, todas as vagas serão preenchi-das de forma obrigatória. “Isso pode alavancar o esporte por aqui”, acredita Nacaxe.

Primeira vezConfesso que nunca havia tido uma flecha profissional nas

mãos. Arco, então, esquece. Após a entrevista com o professor Nacaxe e os outros atletas da academia, fui convidado a expe-rimentar a sensação de atirar. A distância não era tão grande. Mas para um iniciante como eu, parecia.

A primeira dificuldade foi o posicionamento da flecha. A bendita não encaixava na cordinha de jeito nenhum. Com a aju-da do técnico, tudo feito. Segunda dificuldade: alinhamento de braços e pernas para a postura correta. Feito isso, só restava atirar.

Ouvi com atenção as instruções dos irmãos e de Nacaxe e mirei. Para a surpresa e espanto de todos, acertei a pontuação máxima: dez. Ainda por cima, na região bem próxima ao centro, que, num critério de desempate, poderia me render uma vitória. Registrei o momento para meu arquivo pessoal.

Sorte de principiante? Talvez. Na segunda tentativa, ainda empolgado com a largada anterior, consegui um oito. Bom tam-bém. Dos vinte pontos possíveis, tinha dezoito na conta. No ter-ceiro tiro, desconcentrei. Nem no alvo acertei. O que valeu foi a experiência de, pela primeira vez, sem treinamento nenhum, conquistar a pontuação máxima. Será que levo jeito para isso?

“O objetivo do arqueiro é acertar mais no centro possível e sustentar esse desempenho. Isso faz com que o atleta mante-nha maior consistência e pontuação nos treinos e campeona-tos. Muita gente começa assim como você e segue bem pela carreira”, explica Nacaxe.

Um desses exemplos é o do jogador de basquete Oscar Schmidt. Ele foi desafiado pelo pentacampeão brasileiro de tiro com arco numa brincadeira para um programa esportivo da te-levisão. Oscar aceitou e venceu. Nacaxe “tirou o pé”, claro, mas para mostrar que é possível acertar a mira se treinar bem.

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LEONARDO RUIZ

Conhecidas como carruagens dos deuses, as quadrigas, carros ou carroças conduzidas por quatro cavalos lado a lado, foram inventadas pelos assírios, povo de guerrei-

ros rudes e camponeses, com o intuito de utilizá-las na guerra. Com o tempo, elas foram sendo incorporadas por vários outros povos, tendo sua popularização na Roma antiga, mais especifi-camente no Coliseu e no Circo Máximo, palcos das mais gran-diosas corridas de carruagens da antiguidade. Esses espetácu-los reuniam multidões de espectadores e eram assistidas por todas as classes sociais, da plebe ao Imperador.

Em torno do ano 400 d.C, porém, as corridas de quadrigas romanas foram extintas. O esporte foi esquecido e as arenas, monumentos de outrora, envelheceram e passaram a dividir espaço com outras tantas atrações turísticas. Mas foi num dos locais mais improváveis da terra, no município de São Simão, a 285 quilômetros de São Paulo, 1600 anos depois, que esses jogos ressurgiram, trazendo emoções e histórias vividas por nossos antepassados.

A Fazenda Estrela D’Oeste, no interior paulista, se esforça para manter antigas

corridas de quadrigas. A prática foi extinta no século IV d.C., mas ganhou as telas do

cinema com Ben-Hur, rendendo 11 estatuetas do Oscar e inspirando Luiz Augusto Mei

Alves de Oliveira a dar um destino seguro aos cavalos de sua propriedade

Divulgação/Estrela D’Oeste

Os romanos de São Simão

ESPORTE MILENAR

Fazenda Estrela D’OesteNa década de 90, o proprietário da Fazenda Estrela D’Oes-

te, Luiz Augusto Mei Alves de Oliveira, tinha um número exces-sivo de cavalos na propriedade. Precisava de uma justificativa para mantê-los. Do contrário, eles teriam que ser cortados. “Enquanto pensava em como resolver esse problema, acabei assistindo o filme Ben-Hur e, logo que vi a cena das corridas, pensei que aquela seria a solução ideal para o número de ca-valos da fazenda”.

O drama épico bíblico de 1959, ganhador de 11 estatuetas do Oscar, conta a vida de um judeu de grande influência (Ju-dah Ben-Hur), que é traído por seu amigo (Messala) romano e escravizado. Ele luta pela liberdade e volta para se vingar. Com o desenrolar da trama, que dura cerca de três horas, Ben-Hur acaba participando de uma corrida de quadrigas. A cena, cheia de detalhes e audaciosa, levou 94 dias para ser gravada e con-tou com cerca de oito mil figurantes. Somente a construção da arena da corrida para o filme custou um milhão de dólares.

Com essas imagens fixadas na mente, Oliveira começou a construir os protótipos dos primeiros carros. As bigas, rédeas e

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Leonardo Ruiz

arreios foram todas confeccionadas com base nos equipamen-tos utilizados nas filmagens.

Com os pensamentos firmes e as peças prontas, deu iní-cio à construção da arena, já que, até então, as corridas eram feitas no meio dos canaviais. Atualmente, ela possui aproxima-damente 30 mil metros quadrados (305 de comprimento por 106 de largura), sendo que a faixa de correr, ao redor de um canteiro, tem 50 metros de largura. A arena, específica para esta categoria, utiliza as retas para abrir velocidade. Por isso, tem curvas apenas nas extremidades.

A pista conta, ainda, com proteção de pneus em suas cabe-ceiras, para garantir que, caso algum conjunto se choque com a cerca que a delimita, o praticante não se machuque nem saia dela, o que significa proteção, também, para cavalos e espec-tadores.

Em 2001, com a arena concluída, vieram os treinos, mas, como era um esporte já inexistente, havia centenas de anos, dependia de um detalhe: não havia praticantes vivos. Por isso, as técnicas foram ensinadas aos empregados da fazenda.

Resolvida a questão, era preciso divulgar: outdoors, panfle-tagens e anúncios em revistas. Pouco tempo depois, as corri-das ganharam fãs ao redor do globo. Surgiram as competições. “Por essa ser a única arena no mundo que pratica essa arte, as pessoas vêm e ficam impressionadas com o que veem”, diz

Oliveira, proprietário da Estrela D’Oeste. Estrategicamente ou não, a arena é montada a algumas centenas de metros morro acima da propriedade. Assim, é possível ver, ao longe, as qua-drigas saindo dos estábulos e subindo as estreitas estradas de terra rumo à pista. A emoção já começa logo ali.

O esporteAs corridas são reproduzidas também com base nas prá-

ticas romanas, mas sempre buscando preservar a integridade física dos participantes. Podem participar pessoas de ambos os sexos, com idades entre 18 e 70 anos.

Oliveira explica que os treinamentos são gratuitos, feitos de forma gradativa, principalmente quando cavalos e ginetes são iniciantes. “São três sessões por semana com duração de 30 minutos cada, por um período de quatro meses. Desde o início, o aluno já trabalha com as rédeas nas mãos e um ginete experiente ao lado para dar-lhe orientação e segurança”. Du-rante os treinos, segundo ele, os cavalos utilizam apenas 30% da força deles.

Já os torneios são executados com até nove carros em cada bateria, sendo que o vencedor leva para casa um troféu e um prêmio em dinheiro. O ritual na arena consiste numa volta de apresentação, que é seguida da largada. Ao todo, são sete voltas no circuito oval, em sentido anti-horário, perfazendo três

Propriedade conta com 12 quadrigas e 54 cavalos mestiços, variando entre inglês com árabe e com mangalarga

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Luiz Augusto Mei Alves de Oliveira, proprietário da fazenda, teve a ideia das quadrigas porque não sabia o que fazer com o grande número de cavalos que tinha no local

Carroças, de alumínio, são produzidas na fazenda e possuem

desenhos feitos em latão

Fotos: Leonardo Ruiz

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quilômetros de percurso, cobertos em cerca de quatro minutos e meio. A velocidade alcançada durante as corridas chega a 60 km/h. “Muitas pessoas reclamam do pouco tempo de duração dos espetáculos. Mas, paras realizar mais provas numa mesma tarde, teríamos que ter cerca de 150 cavalos”. A propriedade conta com 12 quadrigas e 54 animais, mestiços de inglês com árabe ou com mangalarga.

De acordo com Oliveira, todos os equipamentos utilizados são produzidos internamente. Os carros, por exemplo, são fei-tos de alumínio, para que sejam leves e resistentes. O acaba-mento é com estofado especial, sendo que as laterais contam com desenhos personalizados feitos em latão. Já as rédeas podem ser de couro ou de tecido, revestidas em vaqueta na altura das argolas.

CuidadosO morador da fazenda Thiago Nascimento Annes é um dos

ginetes mais experientes da Estrela D’Oeste. Ganhador de vá-rios torneios, afirma que se dá muito bem com o esporte, devido a suas características “extraordinárias”. “É um orgulho ter as rédeas na mão e comandar quatro cavalos juntos. A adrenalina vai a mil”. Segundo ele, antes de sair competindo, é preciso de muito treino para conseguir conduzir a quadriga corretamente. “Os comandos têm que ser fortes e firmes. É preciso usar tanto as rédeas quanto a voz. Além disso, é importante também ter um bom molejo no joelho e chamar os cavalos pelos nomes”.

Ciclone, Moleza, Chavante, Bolero, Maravilha, Saddam, Episódio, Guerreiro, Caboclo, Fada, Sossego e Marília são alguns dos cavalos da propriedade. Eles recebem tratamento especial para as provas. Seis homens se encarregam, direta-mente, do tratamento dos animais. Ferrageamento, preparo de crina e rabo, arraçoamento, suplementação alimentar com orientação nutricional profissional, controle parasitário, além de exercícios de manobra e de força estão entre as atividades realizadas.

Segundo Annes, cada cavalo é treinado especialmente com sua equipe e em uma de quatro posições (lado esquerdo e direi-to, de fora e da lança). “Se eu mudar um cavalo de posição, ele vai estranhar e isso influenciará no desempenho final do time”.

Os alunos José Luiz da Silva e Luís Fernando iniciaram os treinamentos em agosto deste ano e já garantem ser fãs desse esporte. “Logo que mudei para a fazenda, comecei a me inte-ressar pela prática. Minha intenção é seguir em frente para, no futuro, começar a ganhar os torneios”, conta Luís Fernando.

Outro adepto dessa tradição é Ângelo Rodrigues dos Reis, morador de Cravinhos, SP. Ele conta que pratica todos os do-mingos para conseguir, um dia, alcançar o lugar mais alto do pódio. “Já ganhei troféus de segundo e terceiro lugares, mas nunca primeiro”.

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Regras de segurança das corridas de quadrigas:

1. Nenhum ginete deve correr exatamente atrás, próximo demais ou na mesma trajetória do carro a sua frente;

2. Os ginetes devem olhar para trás no mínimo duas vezes em cada reta do circuito oval, no início e próxi-mo ao final de cada uma delas. Isso acontece para que ele se certifique da posição dos demais carros em relação ao seu. Caso haja um carro correndo atrás do seu, muito próxi-mo durante a trajetória da reta, e o carro de trás não tirou do alinhamen-to da sua traseira, o ginete da fren-te tira o seu carro da frente, pois o carro de trás pode estar com algum problema.

As quadrigas, rédeas e arreios foram todas produzidas com base nos

equipamentos utilizados no filme Ben-Hur

Leonardo Ruiz

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FuturoApesar de toda a sensação de novi-

dade deste esporte, o número de adep-tos tem caído a cada ano. Para Oliveira, proprietário da Estrela D’Oeste, a falta de uma divulgação apropriada e o fato de que a grande parte do país é dominada por outros esportes são os principais mo-tivos dessa baixa receptividade. “Temos uma arena muito grande, que só terá o máximo de emoção quando utilizada em sua capacidade máxima. Dessa forma, precisamos nos focar em formar novos ginetes, para poder recriar esses senti-mentos milenares”.

Ele ainda acredita que a falta de pa-trocínio e apoio por parte das prefeituras locais é fator decisivo para influenciar o futuro da prática. Se depender de Oliveira, a arena de São Simão deixará de ser a única do mundo, já que a intenção dele é expandir a corrida de quadrigas para ou-tros estados. “Pretendo levar alguns cava-los e equipamentos e montar uma arena no Piauí para realizar essas corridas”.

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LEONARDO SANTOS

São metalúrgicos, analistas de informática, empresários, profissionais liberais, aposentados. Todos homens. Eles se reúnem toda terça-feira, num salão onde era o anti-

go Bar do Lipo, em Sertãozinho, a 15 quilômetros de Ribeirão Preto, para jogar pôquer. Fazem parte da Associação Amigos do Pôker.

Os jogadores são distribuídos em cinco mesas enormes, num ambiente com luzes fracas. O local conta com um peque-no balcão, onde são servidas as bebidas, principalmente cerve-jas, de diversas marcas e tipos.

O balcão fica ao lado do caixa, onde são compradas as fichas apostadas durante as rodadas. Os praticantes respeitam a Lei Antifumo. Toda vez que alguém for fumar, tem que se retirar para uma área aberta, nos fundos do lugar, onde também

Pô, quer

CARTAS NA MESA

foram feitas as entrevistas para esta reportagem, já que no sa-lão principal o barulho é grande.

Ainda no salão, há uma televisão conectada ao site da Bwin, empresa europeia de apostas, que disponibiliza um software usado para definir as rodadas, chamadas pelos competidores de blind. As partidas que se iniciam às 20h geralmente costu-mam terminar no dia seguinte, por volta das cinco da manhã.

O analista de informática Bento Rodrigues pratica pôquer há dois anos. Ele conheceu o jogo no Clube Literário da cida-de, onde o grupo se reunia antes. Décimo quinto colocado no ranking anual divulgado pelos Amigos do Pôker, mesmo sem participar de alguns torneios, é considerado um dos jogadores que mais se dedicam à análise do que acontece na mesa. Ele conta que a atenção tem que ser redobrada. “Eu jogo se me sinto bem no dia, para dar mais atenção ao jogo, fazer o cálculo das jogadas. Se tive um dia puxado no trabalho, nem venho.”.

Em Sertãozinho, o jogo, que já é considerado esporte da mente, por trabalhar muito com matemática e raciocínio rápido, ainda é visto justamente dessa forma: apenas como um jogo.

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Os cálculos a que Bento se refere são o outs, que é a possiblidade de fa-zer uma mão vencedora, e o pot odds, que é quando o jogador avalia se é viável fazer uma aposta em determinada roda-da, como explica o metalúrgico Willian Castro, vigésimo primeiro colocado no ranking, que também está há dois anos jogando com o grupo, mas que conhece o esporte há nove anos. “Quem sabe fa-zer cálculos, vem para ganhar. O resto é para brincar.”

Esses, que só vão por brincadeira, são a maioria dos associados. Chama-dos na gíria dos competidores de “ba-raião”, os azarões apostam inteiramente na sorte, coisa que Rodrigues não confia. “Sorte é 30%. O resto é habilidade.”.

Além das operações matemáticas, os jogadores têm de ficar atentos nos tells, que são a fisionomia e a conversa dos adversários. Elas podem indicar se estão blefando. “Eu olho para perna do cara. Se ela estiver batendo, indica que está nervoso, e pode ser que não tenha uma mão tão boa”, diz Rodrigues.

Esporte da menteEm 2010, a Associação Internacional

de Esportes da Mente (IMSA) aceitou a filiação da Federação Internacional de Pôquer (IFP), reconhecendo o jogo. A entidade também conta, como esporte, o xadrez, o jogo de damas, o bridge, que, como o pôquer, é uma disputa de cartas, e o Jogo Go, prática japonesa em que as peças ficam sobre um tabuleiro, em cru-zamentos de linhas.

A IMSA realiza a cada quatro anos, no mesmo período e cidade das Olim-píadas de Verão, os Jogos Mundiais de Esportes da Mente. A primeira edição foi em 2008 em Pequim, na China, e a segunda em Londres, Reino Unido. Mas o pôquer não participou, pois existe um Campeonato Mundial, organizado pela IFP, que foi realizado em 2011, também na capital inglesa, e que teve a Alema-nha como campeã. O Brasil, represen-tado pela Confederação Brasileira de Texas Hold’em (CBTH), foi vice.

Fotos: Leonardo Santos

Geralmente, os jogadores de pôquer de Sertãozinho não gostam de aparecer, para não serem reconhecidos como apostadores

Cartas na mesa: para vencer,

é possível usar probabilidade

e análise combinatória; jogo

está sendo estudado em disciplina da

Unicamp

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PopularidadeO pôquer é considerado o jogo de

cartas mais popular do planeta. E essa fama é tão grande que a modalidade é estudada pelas principais instituições de ensino do mundo, como Harvard e o MIT, que tem um curso dedicado apenas para o estudo das técnicas do esporte.

Em 2013, baseado nisso, a Univer-sidade Estadual de Campinas (Unicamp) abriu uma nova disciplina optativa, dedi-cada ao estudo do jogo, a mais procu-rada pelos estudantes. Em agosto deste ano, havia 130 alunos estudando suas

táticas, mesmo tendo aberto inscrições para apenas 60. Nenhuma outra discipli-na tinha esse número de inscritos.

Entre os professores, está o campeão da série mundial de pôquer em 2011, An-dré Akkari. O curso, que tem o nome de Tópicos Especiais em Ciências do Espor-te – Fundamentos do Pôquer, é ministrado na Faculdade de Ciências Aplicadas, em Limeira (SP). Porém, não são usados ba-ralhos nas salas de aula, apenas vídeos e imagens de estratégias, com a finalidade de levar situações do jogo para discus-sões sobre decisões da vida real.

O professor de matemática Nilsson Ferreira dos Santos (assim, com dois ss mesmo!) acredita que as operações que mais se usam nos esportes da mente são a probabilidade e a análise combinatória. E que esses jogos são bons para a cabeça. “Temos que treinar o nosso cérebro. Atividades assim são bons indicadores”. Rodrigues concorda. Ele fala que, desde que começou no esporte, ficou mais atento aos números.

O professor gosta de usar com seus alunos do Ensino Fundamental jogos de tabuleiro. “Enriquecem o conhecimento e mostram que a ma-temática pode ser divertida”. Mas não aplica o pôquer como um de seus mé-todos. Utiliza os quadrados mágicos, jogo da velha e Número em Ação.

Realmente, o ambiente do pôquer não é favorável à presença de crian-ças, pelo menos não na associação de Sertãozinho. Além de o local ter características de boemia, a maioria dos competidores está lá para apos-tar. Tanto que, das 80 pessoas regis-tradas no ranking geral do torneio, só duas aceitaram conceder entrevistas. As outras apenas conversaram, mas não autorizaram registrar suas opini-ões, para não ficarem reconhecidos como apostadores de jogos de azar.

Em alguns momentos, quando o repórter se preparava para fazer foto-grafias do salão, a fim de ilustrar a ma-téria, era questionado sobre o porquê daquilo. Mesmo com as explicações, as imagens não eram autorizadas.

Alguns jogadores até brincavam, achavam legal a realização de uma co-bertura sobre o esporte. Mesmo assim, preferiam se resguardar no anonima-to. Até quem aparece em fotografias no site do grupo, como Vagner Pinto, primeiro colocado no ranking geral dos Amigos, e que foi chamado para jogar uma competição em Las Vegas (EUA), o Maracanã do pôquer, não quis papo.

Matemática na cabeça,mas pensamento ainda

é de jogo de azar

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guns jogos de equipes profissionais, em que “Luans” e “Márcios Araújos” da vida fazem alguns se perguntarem como conseguiram ser profissionais e a gente não. Em contrapartida, o amador nos oferece pérolas, craques que não tiveram espaço nos campos profissionais, mas tratam finamente a bola nos gramados alternativos, com o diferencial de que, neles, se joga pelo amor ao futebol e pela disputa, não pela grana, como a gente vê nos dias de hoje na TV. Como exemplo, Leandro Damião, atacan-te do Santos, que jogou no amador de São Paulo por al-guns anos e, aos 21, foi descoberto. Pulou as categorias de base direto para o profissional. Mas, convenhamos, o menino tem talento.

Isso mostra que devemos pregar mais respeito e en-grandecer o nosso futebol amador, que – só para reafir-mar aos que ainda têm preconceitos – não é um simples jogo de solteiros contra casados.

Laion é jornalista em Ribeirão Preto/SP

Holofotes para o amador

O que o subconsciente revela quando estamos fa-lando de futebol amador? Talvez um belo de um quebra-canelas e lances bizarros daqueles que

passam no Bola Murcha do Fantástico. Pode ser, porém, algo bem mais interessante do que isso.

Quem frequenta, para jogar ou assistir aos campeo-natos amadores de verdade, sabe, muito bem, diferenci-á-los de uma pelada no final de semana com os amigos. Estamos falando de torneios, alguns com ilustre presen-ça de ex-jogadores.

Há um pouco mais de glamour em alguns campeona-tos amadores, como o do Clube de Regatas, em Ribeirão Preto, que tem até espaço no caderno de esportes do Jor-nal A Cidade, o maior e mais tradicional da região. Mas não podemos deixar de lado os certames mais humildes e menos badalados, como os de bairro, que podem ser jogados na terra e, ainda assim, dão um bom “caldo”.

Tratando em âmbito mais amplo, o futebol amador, muitas vezes, é mais interessante de se ver do que al-

LAION TREVIZANI

ARTIGO

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ALISSON SANTOS

Santana dos Olhos D’Água era o antigo nome de Ipuã, ci-dade pequena e simples, mas muito hospitaleira do inte-rior do estado de São Paulo. Mesmo com a mudança da

denominação, em 1949, o significado continuou ligado à água. Ipuã, em tupi-guarani, quer dizer “água que brota da terra”. No entanto, esta terra, para seus moradores, não é valiosa ape-nas por isso. Também por dela nascerem grandes talentos do esporte.

Um exemplo, no futebol, é o ex-zagueiro Maxwell Cove, hoje com 56 anos. Revelado pelo Santana Futebol Clube, o jogador teve momentos marcantes quando passou por gran-des equipes dos anos 80, como Palmeiras, América do Rio e Cruzeiro. Craques da Seleção Brasileira também já estiveram pelos gramados santanenses: Raí (Botafogo-SP, São Paulo e Seleção Brasileira), Mauricinho (Comercial-SP e Vasco da Gama), Edson (Corinthians e Seleção), Rondineli (Flamengo) e Luis Antônio (Cruzeiro).

A Associação Santana Futebol Clube está em atividade des-

Os gramados de Ipuã, na região de Ribeirão Preto, que serviram de palco para

que craques do futebol brasileiro pudessem mostrar um pouco de seu futebol no passado,

hoje são frequentados por meninas que mostram que o esporte pode ser jogado

com mais charme, elegância, delicadeza e – por que não? – muita habilidade

Alisson Santos

Toque feminino

FUTEBOL E FUTSAL

de 2 de fevereiro de 1946. Criada por empresários apaixonados por esportes, o clube jamais teve fins lucrativos. Após 40 anos de fundação, tornou-se uma Organização Não Governamental (ONG), que trabalha em prol de atividades esportivas, desen-volvendo um trabalho social com crianças e adolescentes.

Quem chega à associação pode se surpreender ao notar que, numa terra ligada, historicamente, ao futebol masculino, quem se destaca, atualmente, são as meninas. Elas comandam o esporte em Ipuã. Com uma equipe de 20 atletas, as jovens garotas vêm conquistando inúmeros troféus e medalhas. O títu-lo considerado mais importante foi o vice-campeonato Estadual da Secretaria de Esporte e Lazer de São Paulo, em 2012.

Os principais nomes do time são Ariane Santos e Laine Castro Oliveira, ambas com 17 anos. Quem as vê fora das qua-tro linhas, não imagina a garra demonstrada em campo. Achar que mulher tem medo de jogadas mais duras é ledo engano. Sem deixar o jeito carinhoso e a beleza feminina de lado, elas entram em fortes divididas, como qualquer homem.

A capitã Ariane diz ser muito mais feliz depois que o futebol entrou em sua vida. A maior alegria é ver os pais orgulhosos

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treinadora, Andresa Nascimento. A ideia surgiu quando ela per-cebeu que poderia aproveitar mais do potencial das meninas. A proposta foi prontamente aceita por todas. Após o primeiro treino, porém, as dúvidas surgiram. As atletas não esperavam que existissem tantas diferenças de um esporte para o outro, principalmente no esquema tático. A adaptação ocorre dia após dia.

Formada em Educação Física, Andresa está na associação há três anos. Quando entrou, organizava práticas voltadas ape-nas ao atletismo. Mas foi só o treinador de futebol sair que ela assumiu o comando. O que era para ser só um “quebra-galho” acabou dando certo. E como.

a cada partida vencida, uma nova conquista de título ou, sim-plesmente, pelos gols feitos. Mas os holofotes são algo com os quais ela ainda não se acostumou. As fotos estampadas em jor-nais da região a deixam um pouco tímida. Mas o acanhamento para por aí. Em campo, ela vira uma fera.

No Brasil, a primeira partida de futebol feminino foi realiza-da entre senhoras catarinenses contra as tremembeenses, em 1921. E o primeiro time da modalidade foi o Araguari Atlético Clube, de Minas Gerais, que iniciou suas atividades em 1958. A explosão do esporte no país, porém, foi na década de 80. Em 1982, por exemplo, a equipe carioca do Radar conquistou respeito já no seu primeiro ano de existência, quando venceu o Women’s Cup of Spain, principal campeonato do planeta de futebol feminino na época, derrotando seleções da Espanha, Portugal e França.

O título do Radar, time criado na praia do Leblon, impul-sionou o nascimento de novas agremiações. Em 1987, a CBF já havia cadastrado duas mil novas equipes e mais de 40 mil jogadoras. No ano seguinte, o Rio de Janeiro organizou seu primeiro campeonato estadual e formou a primeira Seleção Brasileira, que conquistou o terceiro lugar num inédito Mundial realizado na China.

Futsal Os gramados não foram suficientes para conter a vontade

e a paixão pelo esporte que as mulheres têm. Em vários outros lugares, há uma migração de atletas do futebol para o futsal. Com as meninas de Ipuã, não foi diferente. Além dos trabalhos em campo, a Santana Futebol Clube promove atividades, pa-ralelas, na quadra.

A iniciativa foi tomada pela coordenadora da associação e

Jogadoras ouvem atentamente às instruções para entrar em campo: elas participam de um

trabalho social na associação

Laine Castro Oliveira e Ariane Santos (dir.), ambas com 17 anos, estão entre as destaques da equipe

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Fotos: Alisson Santos

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GIOVANI MENDONÇA

Força, disposição e muito preparo físico. Essas são apenas algumas das exigências para a prática do futebol america-no. Ribeirão Preto tem um representante nacional nesse

esporte: o Botafogo Challengers. O time, que surgiu em mea-dos de 2007, foi denominado inicialmente como RP Challen-gers. A iniciativa partiu de dois amigos, que praticavam por la-zer e resolveram valer-se do poder de comunicação da internet para atrair novos adeptos ao jogo. Na época, a rede social mais popular era o Orkut, na qual foi criada a comunidade “Futebol Americano RP”. Dessa maneira, foi possível aproximar pessoas interessadas e montar uma equipe.

Mais tarde, os atletas conseguiram o apoio da Prefeitura de Ribeirão Preto e conquistaram um espaço para realização dos treinos: o conjunto poliesportivo da Cava do Bosque. Para que o time estivesse completo, faltava a escolha do mascote. Foi adotado um dos maiores mamíferos do reino animal, o ri-noceronte, que reúne algumas das características valorizadas na modalidade. A força do bicho representaria a capacidade

Eles são fortes, grandalhões e um tanto desengonçados, mas se engana quem acha que isso

não combina com agilidade. Pela internet, os fundadores do Botafogo Challengers, de Ribeirão Preto,

atraíram, rapidamente, gente interessada num esporte pouco praticado no Brasil: o futebol americano.

E a quem não acreditava que essa jogada daria certo, a equipe respondeu em campo com dedicação... e títulos

Divulgação/Assessoria Botafogo Challengers

Vaiencarar?

FUTEBOL AMERICANO

O mascote do Botafogo Challengers destaca o rinoceronte, animal conhecido pela sua força e capacidade de enfrentar desafios

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Divulgação/Assessoria Botafogo Challengers

de enfrentar desafios – Challengers, em inglês, significa desafiadores.

A equipe ribeirão-pretana começou a participar de amistosos em 2009 e, no mesmo ano, se sagrou campeã do II Desafio do Triângulo Mineiro. Três anos depois, fechou uma parceria com o Botafogo Futebol Clube. Dessa fusão, nasceu o Botafogo Challengers. Aquele ano, 2012, acabou sendo, aliás, um dos melhores para o grupo, que conquistou o vice-campeonato paulista e a classifi-cação, pela primeira vez, aos playoffs do Campeonato Brasileiro. “Não há como negar que hoje somos vistos de manei-ra diferente, mais profissional, e com um espaço publicitário bem mais valorizado. Isso se deve ao nosso resultado dentro de campo e à parceria com o Botafogo Futebol Clube”, afirma Elias Rafael da Silva, presidente do Challengers.

O esporteO futebol americano é uma prática de

contato praticado em equipe. Suas origens estão diretamente relacionadas ao rúgbi (conhecido como uma variação do futebol). O objetivo é avançar com uma bola em formato oval até o território da equipe rival. Habilidades como velocidade, agilidade, capacidade tática e, principalmente, força bruta são importantes para que alguém es-teja capacitado a encarar o esporte.

A partida, com duração de 60 minu-tos, divididos em quatro tempos, consiste de uma série de jogadas curtas e indivi-duais, em que 22 jogadores, sendo 11 de cada lado, possuem, de antemão, uma tarefa atribuída para a próxima jogada. Vence a equipe que marcar o maior nú-mero de pontos. Para que isso ocorra, o principal lance ocorre quando um dos jo-gadores de um time consegue entrar na área ao fundo do campo adversário (end-zone) com a posse da bola (touchdown), o que atribui seis pontos no placar. Com isso, o autor da façanha ainda ganha o direito de um pontapé livre ao gol, o que garante um ponto extra.

Trazendo a modalidade para a rea-lidade brasileira, a primeira transmissão televisiva do futebol americano ocorreu em 1969, pela extinta TV Tupi. Depois disso, voltou aos palcos do cenário na-

Lance da partida contra o Corinthians: 2012 foi um dos melhores anos para o Challengers, que conquistou o vice-paulista e foi aos playoffs do Brasileiro

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Em dois ângulos diferentes, a vibração dos jogadores do Challengers após vitória sobre o São Caetano Cougars

Ele não joga no Challengers. Mas pratica o esporte por hobby. O estudan-te de medicina Vinícius Leme Caram, que começou a praticar o esporte em 2005 numa viagem aos Estados, falou um pouco com a reportagem sobre o esporte no Brasil.

Qual costuma ser sua função em campo?

Geralmente, prefiro jogar na defesa. Acho que tenho mais força do que a agilida-de necessária pra estar na linha de ataque.

O que despertou seu interesse e qual foi seu primeiro contato com o futebol americano?

Desde pequeno, ficava curioso com os filmes em que aparecia o futebol americano. Acho que é por esse motivo que tenho o filme “Duelo de Titãs” como um dos meus favoritos. Mesmo tratan-do de questões mais profundas, como o racismo, o filme está intimamente li-gado ao esporte.

“Trabalhar em equipe”

Que fundamentos e/ou ensina-mentos o esporte trouxe para sua vida pessoal?

Acho que a principal coisa que aprendi, como em todo esporte, é a questão de sa-ber trabalhar em equipe. Praticamente tudo que envolve nosso cotidiano, como traba-lho, faculdade, família, faz com que tenha-mos de conviver com pessoas diferentes.

O futebol americano demanda um grande investimento pra ser pratica-do? Os equipamentos são facilmente encontrados no mercado?

Nos Estados Unidos, é tudo facilmente encontrado pra que se possa jogar. Já no Brasil, o mercado começa a trazer alguns produtos. Mas, em último caso, pode-se comprar equipamentos pela internet.

Este esporte está ligado diretamen-te à utilização da força bruta nas joga-das. Você considera um esporte muito violento?

Realmente, existem jogadas bem

duras, mas a brutalidade do jogo fica restrita ao campo. Todas as pessoas que conheço que praticam o futebol americano são muito pacatas.

Você pretende praticar mais seria-mente ou apenas por lazer mesmo?

Aqui, no Brasil fica mais difícil para praticar. No entanto, sempre que estou nos EUA, pratico regularmente com meus amigos. Mas nada profissional, é claro!

O que falta para que o futebol americano se torne mais popular no Brasil?

Superar a paixão nacional pelo nosso futebol é praticamente impos-sível. Mas, quem sabe, se houvesse alguma espécie de torneio televisio-nado pelas redes abertas, acho que aumentaria o interesse das pessoas. Como só os canais fechados de TV fazem esse tipo de transmissão, fica mais complicado.

Fotos: Divulgação/Assessoria Botafogo Challengers

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cional na década de 90 e segue até hoje, com exibição em canais de TV fechados. Os primeiros adeptos eram de grupos

isolados em poucas cidades. No entanto, a prática atrai cada vez mais pessoas, in-clusive com o apoio das redes sociais, o

que tem gerado um crescimento expres-sivo dos times no Brasil e de entidades organizadoras de competições.

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Fotos: Divulgação/Assessoria Botafogo Challengers

Origens do futebol americano estão ligadas ao rúgbi,

que, por sua vez, é uma variação do

futebol comum

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FERNANDA LAURENTI

Na piscina, agitação, sorrisos e brincadeiras. Entre um aquecimento e outro, a turma entra em clima de treino. Depois, é só ouvir os comandos da professora para a

aula começar. Costas, peito, borboleta, livre e medley... Todos os estilos são praticados à exaustão.

Em Ribeirão Preto, a natação é levada a sério, por profis-sionais engajados e que atendem gratuitamente os interessa-dos na atividade. Os recursos para o funcionamento do proje-to, chamado de “Nadando na Frente”, são provenientes da lei estadual de incentivo ao esporte, que entrou em vigor em 21 de agosto de 2008 e possibilita às empresas reverter parte do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) a programas de apoio ao esporte.

Para as famílias, saber que os filhos estão na piscina repre-senta benefícios. Um deles é tirá-los das ruas. Outra é oferecer uma prática esportiva a jovens da periferia de Ribeirão Preto, que, geralmente, não têm acesso a atividades físicas.

Em visita à Cava do Bosque, uma das instituições que atendem participantes do “Nadando na Frente” a reportagem da revista Ação é recebida por Paula Toffani, a atual professora,

Daniel Zanetti

Nadando na frente

ENSAIO

e pelos estagiários Daniel e Evair. Ela, que já participou de três Copas do Mundo de Natação pelo Brasil, conta que o projeto atende, atualmente, mais de 500 jovens, que não têm gasto algum e ainda recebem maiôs, sungas, tocas e óculos.

Podem participar crianças e adolescentes de sete a 17 anos, em turmas de até 20 alunos. Cada aula tem duração de 45 minutos, quando são desenvolvidas várias técnicas de nado, com variações de exercícios visando a um aprendizado mais completo. Tudo sem perder a oportunidade de ter momentos de descontração.

A maioria dos alunos com quem a reportagem conversou diz que o engajamento da professora contribui para manter o interesse deles. Afirmam que Paula é atenciosa, está sempre procurando envolvê-los nas atividades e se mostra disposta a ensinar, estimulando a busca por melhores resultados nas competições. Gabriel Sanches Ferrari, de 15 anos, e Fabri-cio Mendes Santos, de 11, dois dos destaques do projeto, sonham seguir os passos da professora e fazer carreira na modalidade.

Além da Cava do Bosque, o projeto funciona, também, no Centro de Jornada Ampliada (CEJA), localizado na Vila Virginia, e no Clube dos Comerciários, no Parque São Sebastião.

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Fotos: Daniel Zanetti

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Fotos: Daniel Zanetti

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Fotos: Daniel Zanetti

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JANAÍNA PASTORI

Alcançar alto desempenho profissional e conseguir bons patrocínios. Esses têm sido os principais desafios de homens e mulheres que se arriscam no MMA, um dos

esportes que têm mais aparecido na mídia especializada nos últimos anos. A realidade da TV, porém, é bem diferente para quem decide se aventurar na prática.

Dois lutadores renomados, Chris Wilson e Duda Yankovich, tiveram caminhos distintos, mas com obstáculos parecidos. O primeiro passou por várias fases de vida até conseguir sobrevi-ver apenas da modalidade. Já a segunda veio do boxe e apro-veitou a experiência para ingressar no MMA. Tanto um quanto outro lembram que existem dificuldades. Apesar delas, passar pelo esporte amador é importante, a prova de fogo para que haja um período de adaptação.

Antes de conferir o bate-papo com eles, porém, é preciso conhecer um pouco da história desse esporte que arrebata multi-dões por onde passa. O MMA (mixed martial arts ou artes marciais mistas) saiu do formato marginalizado conhecido como “vale-tudo”

Para quem começa a praticar MMA, o adversário não é apenas o outro

combatente. Segundo dois nomes de destaque na atualidade, Chris Wilson e

Duda Yankovich, as dificuldades, na fase amadora, vão desde arranjar dinheiro para

transporte, alimentação e hospedagem até a manutenção de extrema disciplina nos treinos

Divulgação

A lutavai além

ARTES MARCIAIS MISTAS

para os holofotes da mídia de todo o mundo, atraindo atletas e espectadores de vários cantos do planeta. Estima-se que o esporte movimente cerca de 400 milhões de dólares por ano.

O UFC (Ultimate Fighting Championship), responsável pe-los principais eventos da modalidade, teve, recentemente, a marca avaliada pela revista americana “Fortune” em mais de US$ 1 bilhão de dólares. Os números de audiência também impressionam: cerca de 700 mil espectadores por edição.

Os primeiros traços do esporte datam do ano de 648 a. C.. Mesclando boxe com luta olímpica, o “pankration” surgiu na 33ª edição dos Jogos Olímpicos da Antiguidade. Tudo era permiti-do, exceto enfiar dedos nos olhos, atacar a região genital, arra-nhar e morder o adversário. O combate chegava ao fim quando um dos competidores levantava o dedo em sinal de desistência.

Mas as antecessoras diretas das artes marciais mistas da forma como as conhecemos têm raízes no Brasil. Elas foram forjadas pela família Gracie, que promoveu um elo entre o jiu-jitsu antigo e o moderno. O novo jiu-jitsu é uma mescla de vá-rios tipos de luta e os combates entre seus praticantes ficaram, então, conhecidos como “vale tudo”.

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O primeiro UFC, realizado nos Estados Unidos em 1993, seguia as mesmas regras do “pankration” na Grécia Antiga. Cada competidor enfrentava, no mínimo, três adversários por noite. Em 2001, donos de cassinos em Las Vegas compraram o evento e fizeram dele o fenômeno de audiência que é hoje. Entre as principais alterações, estão a divisão dos atletas em categorias de peso, obrigatoriedade de acompanhamento mé-dico, definição de faltas que podem levar à desclassificação do atleta e, principalmente, a restrição para que cada competidor lute apenas uma vez por edição.

Crescimento e falta de patrocínioCom todos os holofotes voltados para o esporte, a procura

nas academias cresceu muito, virando febre em todo o Brasil. Alguns fogem da prática profissional e procuram apenas pelos benefícios físicos. Outros almejam um contrato milionário com o UFC, dedicando-se intensamente aos treinamentos.

O treino para o MMA é pesado. Propicia um excelente condi-

cionamento físico, mas exige alimentação rigidamente equilibrada e muita disciplina. Afinal, os combates exibidos na TV são o resulta-do de um trabalho de bastidores, em que os praticantes enfatizam, também, a base teórica da modalidade, que destaca a importância do respeito ao próximo, principalmente ao adversário.

O que muitos não sabem é a principal dificuldade enfrenta-da pelos atletas profissionais: a falta de patrocínio. Geralmente, o apoio começa com amigos e empresas pequenas, que ofere-cem um par de luvas ou suplemento em troca da exposição da marca. O que gera a falsa impressão de apoio.

Quem luta em busca do profissionalismo está acostumado a inicialmente arcar com os gastos de transporte, alimentação e hospedagem. A maioria dos patrocinadores prefere investir no evento do que no atleta.

Sobre isso, a reportagem foi conversar com o norte-ameri-cano e veterano no esporte, Chris Wilson. O ex-lutador do UFC continua, profissionalmente, no MMA e tem uma academia em Ribeirão Preto, interior paulista.

Fotos: Arquivo Pessoal

Para crescer na modalidade, atletas precisam se cercar

de gente que saiba direcioná-los

corretamente

Chris Wilson afirma que

atletas enfrentam falta de

patrocínios, baixa renda e incertezas

sobre o futuro

Duda recomenda trabalhar com calma, mas com muita persistência e treino para que a evolução ocorra dia após dia

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Ação: Há quanto tempo você luta MMA?Wilson: Sou profissional de MMA há 12 anos. Ação: Você tem outra profissão ou se dedica exclusiva-

mente ao esporte? Dá aula em alguma academia?Wilson: Já passei algumas fases diferentes. No começo,

trabalhava e treinava. Depois, trabalhava dando aulas, treinava e trabalhava em um outro emprego. Mais tarde, vivi apenas de lutas. Agora, voltei a trabalhar como professor e também minis-tro aulas na minha academia e treino para lutar. É muito corrido.

Ação: O MMA é uma das competições esportivas que

mais crescem no Brasil atualmente. Quais as maiores difi-culdades que você encontrou no inicio da sua carreira? E para os jovens que estão entrando agora, quais as maiores dificuldades que eles passam? Como é o caminho do MMA amador até o profissional e o UFC, em especial?

Wilson: Acho que as dificuldades sempre são e serão se-melhantes. O atleta, uma vez que se dedica e decide se sacri-ficar para atingir seus objetivos, enfrenta falta de patrocínios, renda baixa para sustentar a família e incerteza sobre seu fu-turo. Mesmo com o crescimento do esporte, estas dificuldades permanecem, mas cada atleta encara e resolve essas questões de forma diferente. Acredito que o caminho certo torna o atleta mais experiente e confiante sem tantos riscos e lesões. E os atletas devem, sim, lutar como amadores. Apesar da necessi-dade e desejo de ganhar dinheiro, uma vez que você se torna profissional não tem volta. Como amador, você cresce como lutador e gerencia suas lutas para o crescimento. Você precisa de experiência. Daí pra frente, precisa de alguém que saiba te direcionar corretamente. A melhor luta é sempre aquela que você vencerá se lutar bem, corre risco se lutar mais ou menos e perde se lutar mal. Esse adversário será diferente em cada momento da sua carreira até que você chegue num nível onde não importa quem você enfrenta. Você estará pronto. A esse ponto, muitas vezes, não é dada a devida importância. Ou por-que empresários não entendem ou porque lutadores têm muito ego, ou muitas outras razões. Esse assunto é muito complexo, mas acho que isso pode dar uma ideia.

MulheresE quem acha que este é um esporte exclusivo para homens

está enganado. Cada vez mais mulheres, influenciadas pelos seus maridos, irmãos e amigos, procuram as academias e, nem por isso, perdem a feminilidade. Pelo contrário. Elas se produ-zem ainda mais para provar que, mesmo praticando um esporte “de homem”, continuam sendo mulheres, mães e esposas. En-tre os exemplos, está a sérvia-brasileira e campeã mundial de boxe Duda Yankovich. Ela também nos contou, em entrevista, como começou no esporte e deu dicas aos iniciantes.

Ação: Como surgiu seu interesse pela luta?Duda: Por curiosidade, eu fui treinar caratê com uma ami-

ga e me apaixonei pela luta. Eu também sempre gostei de ver

mulheres fortes e adorava os gibis com garotas guerreiras, gla-diadoras. Acho que tudo começou aí.

Ação: E como foi a sua entrada no MMA? Teve dificul-

dades? Foram as mesmas que os atletas amadores pas-sam hoje nesse esporte?

Duda: Eu não passei pelo amador devido a minha carreira no boxe e experiência em outras lutas. Mas acho que é muito importante passar pelo amador, para se adaptar e ganhar expe-riência, segurança... Agora, a verdade é que é difícil lutar sem receber dinheiro, pois é necessário ter apoio para treinar e se preparar. Esta é a maior dificuldade. O investimento só entra depois que você mostra os resultados. É difícil obter um patro-cinador quando se está começando e isso leva muitos talentos a desistirem antes do tempo.

Ação: Você acha que rola algum tipo de preconceito,

pelo MMA ser considerado por muitos um esporte para ho-mens e violento?

Duda: O MMA é considerado masculino e violento pelos ignorantes. Hoje, se você assistir a uma luta de mulheres, prati-camente não vê diferença em técnica, garra, resistência e von-tade de vencer. As mulheres merecem seu lugar. O preconceito existe, mas cada vez menos.

Arquivo Pessoal

Duda se apaixonou pelo caratê, em treino com uma amiga, e ainda gostava de gibis de guerreiras e gladiadoras

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Para aqueles que se interessam em ser um profissional do MMA, é necessário, segundo os entrevistados:

- Domínio de várias artes marciais, como boxe, jiu-jitsu,

wrestling, judô, muay thai, etc;- Muito treino: de 30 a 50 horas semanais; - Alimentação balanceada;- Físico: cuidar do corpo é fundamental;- Vontade de vencer: pensar positivo sempre. Reunindo todos esses pontos, é a experiência que co-

meça a contar. A dica é começar a lutar regionalmente, até conseguir a inscrição em eventos de MMA nacionais ou in-ternacionais, que permitem, de forma menos difícil, o pulo para o UFC.

E aí, quem topa o desafio?

Thiago Gomes dos Santos (foto), de 20 anos, luta MMA – categoria peso leve (até 70 kg) – e jiu-jitsu há um ano e meio. Começou a se interessar vendo lutas pela televisão e resolveu, no início, treinar apenas por diversão. Mas, aos poucos, foi participando de eventos na academia, até que foi convidado por um organizador de torneios da região para um combate externo.

Com o convite aceito, a maior dificuldade a ser enfren-tada a partir de agora é a batalha por patrocínios. Diz que eles são difíceis, como previram Duda e Wilson. E também porque precisa manter outro emprego para pagar as despe-sas domésticas.

Santos conta que já foi até a Prefeitura de Ribeirão Pre-to para pedir uma passagem de ônibus para o Rio de Janei-ro, onde treinaria numa das principais academias do país por uma semana. Acredita que, se conseguisse demonstrar o que sabe por lá, poderiam aparecer novas chances. Mas a prefeitura alega não ter verba.

Mesmo com a negativa, ele não desiste. Tem esperança de que alguém goste do seu desempenho e abra as portas, para que possa ter mais oportunidades no mundo do MMA.

Principais requisitos

Ribeirão-pretano busca apoio

Ação: Qual seria sua dica para quem tem o sonho de ser um(a) lutador(a) profissional? Principalmente para as mulheres?

Duda: É necessário muito trabalho, muito treino. O ca-minho é longo, mas vale a pena, só isso que posso dizer. Trabalhar com calma, para que possa evoluir dia após dia. O resultado virá. É claro que é difícil ter suporte no começo

e tem que estar preparado para isso, não esperar muito, infelizmente... Mas, no final, vale a pena cada esforço, pois, fora do resultado bom no esporte, levamos uma satisfação pelo que conseguimos. Lidamos com esforço, disciplina e dedicação todo dia, ultrapassamos nossos limites, e isso fica para a vida toda, não apenas para o esporte.

Arquivo Pessoal

Divulgação

Disciplina e dedicação levaram Anderson Silva a ser um dos principais nomes do UFC na atualidade

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JÉSSICA BRITO

Quem assiste a alguns lances de uma partida de vôlei adaptado para idosos pode estranhar os movimentos em quadra. Em vez de saques a mais de 100 quilôme-

tros por hora ou de defesas cinematográficas, os jogadores seguram a bola. E os passes são mais lentos. Um observador mais atento, de um jogo inteiro, percebe, no entanto, que isso não tira a emoção da prática. E, principalmente, dos atletas. Ainda mais se considerarmos que, na batalha da vida, eles já são bem mais experientes. E usam o esporte não apenas como uma forma de impor a derrota ao adversário, mas como uma luta pela saúde. Neste caso, todos saem vencedores.

Os artistas que entram em quadra para esse esporte che-gam a ter mais de 80 anos. Vitalidade acompanhada pela ale-gria de viver. Em Brodowski, interior paulista, a 20 quilômetros de Ribeirão Preto, o vôlei adaptado existe há 13 anos. Surgiu quando o Departamento Municipal de Esportes era comandado por Valdir Benetti, que conta, com entusiasmo, como a história começou. “Brodowski estava crescendo e algumas modalida-

Oferecida há treze anospara moradoras de Brodowski,

na região de Ribeirão Preto,modalidade busca não apenas

a obtenção de resultados expressivos em competições,

mas qualidade de vida esocialização por meio do esporte

Divulgação/JORI

Adaptado para a vida

VÔLEI PARA A TERCEIRA IDADE

des esportivas surgindo, mas apenas para jovens. Pensamos que não poderíamos deixar de lado aqueles que, com amor e dedicação, ajudaram a nossa cidade a se tornar um ambiente agradável. Foi então que tivemos a ideia de começar algo vol-tado à terceira idade”.

A primeira prática oferecida foi a ginástica, cujas aulas eram bem frequentadas. Com a aceitação da população, veio o vôlei, mas com uma dificuldade: o número de jogadoras era pequeno. “Insistimos e, meses depois, estávamos com 13 atletas”, lem-bra Benetti. “Não foi nada fácil. Elas treinavam apenas um dia por semana. Por causa do interesse, conseguimos ampliar para dois dias. Sabíamos que elas precisavam do nosso apoio para treinar, pois existem vários fatores, como consultas médicas, indisposição, problemas familiares, entre outros, que dividem a atenção com a prática esportiva”. Dificuldades estruturais tam-bém apareceram, como falta de verba e de materiais. “A gente se virava com podia”.

Para o ex-dirigente, porém, o esforço para montar o time é recompensado com o sorriso estampado no rosto das atletas, que têm todas acima de 50 anos. Senhoras que, mesmo com

Abertura dos Jogos Regionais do Idoso (JORI) de 2012: competição movimenta a prática esportiva na terceira idade

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Divulgação/JORI

problemas típicos da idade, conseguem se desligar do mundo lá fora e focar nos treinos, como a fiel praticante Lúcia Gon-çalves da Silva Carnevale, professora aposentada de 69 anos. Nascida e moradora em Brodowski, ela jogava vôlei quando jo-vem. Mas, por causa dos afazeres domésticos e dos filhos, teve de abrir mão. Quando ficou sabendo que estava sendo formado um grupo de esporte adaptado, não pensou duas vezes. “Agora com a vida mais tranquila, posso me dedicar mais do que quan-do era jovem. Criei uma afinidade muito grande com o time”.

Lúcia conta como é a rotina das competições e a relação com as “meninas”, o jeito carinhoso com que ela chama as outras participantes do grupo. “Apesar de os treinos serem gratuitos, temos que comprar os uniformes e pagar o transpor-te para os campeonatos em outras cidades. Agora, quando o jogo é aqui em Brodowski, combinamos, eu e as ‘meninas’, de fornecer almoço para o outro time, ou até mesmo um café da tarde. Então, acertamos quem pode ir e cada uma leva algum alimento, pratos, copos, talheres”.

Para Lúcia, a prática esportiva é fundamental para a quali-dade de vida. “Dores, na minha idade, são normais, mas sinto que estou chegando aos 70 anos mais disposta do que mui-ta menina de 25. O fato de não ficar depressiva já me ajuda demais. Acho que depressão é a falta de atividade física, é a mente mandando no corpo. Participo do vôlei, da ginástica e tenho ânimo para ir até em baile da terceira idade”.

Qualidade de vidaEssa proximidade entre as jogadoras fez com que o time se

tornasse uma família. Que lamenta e joga pela lembrança de três das primeiras praticantes, que já faleceram. O cuidado e a amizade que uma atleta tem com a outra vão muito além dos encontros que ocorrem na quadra coberta do Ginásio Municipal de Esportes, o Centro de Lazer do Trabalhador Vicente Quér-cia, durante a preparação para as competições. Permanecem nas atividades simples do dia a dia, como uma conversa no portão ou auxílio num momento de dificuldade.

A atual treinadora do time é Karine Guidolin Silva, de 35 anos. Ela trabalha há sete com a terceira idade, mas começou com o vôlei neste ano. Formada em Educação Física, busca co-locar em prática todos os conceitos que aprendeu na carreira, mas de uma forma bem moderada. “Temos todo um preparo, para não extrapolar o limite de cada uma. Deixo sempre bem claro que elas se exercitem só até onde conseguem. Não pos-so exigir muito. O treino é à tarde, algumas moram longe e já chegam cansadas”.

A aula começa com alongamentos de membros superiores, depois inferiores e tronco, seguidos de aquecimento com ou sem bola. Após essa etapa, elas seguem para o treino, em qua-dra, que termina com alongamento final. “Acredito que o meu trabalho influencia muito na vida dessas mulheres”, afirma a treinadora, que explica a importância da atividade física nes-sa fase da vida. Segundo ela, uma das principais causas de incapacidade em idosos é a queda, que geralmente acontece por anormalidades no equilíbrio, fraqueza muscular, desordens

visuais, consumo exagerado de medicamentos e doenças car-diovasculares, problemas que podem ser reduzidos com a prá-tica esportiva.

Todo ano, a equipe de Brodowski participa dos JORI (Jogos Regionais do Idoso), disputados sempre no mês de agosto e que em 2013 serão realizados em Franca, a 100 quilômetros de Ribeirão Preto. Para participar, os atletas precisam ter mais de 60 anos e podem escolher até três modalidades para com-petir. Na próxima edição, além do vôlei, Lúcia estará no jogo de damas e na dança, esta última também oferecida nas au-las de Karine. “Estamos treinando a coreografia”. Apesar das dificuldades enfrentadas pelos idosos, a professora diz que é possível encará-los, com a ajuda do esporte. “Mesmo com as barreiras no caminho e a saudade das companheiras de time que se foram, é preciso resistir”.

Os treinos do time de vôlei adaptado são realizados no Gi-násio de Esportes toda terça e quinta-feiras, das 13h30 às 15h. São abertos ao público com mais de 50 anos.

Em relação ao vôlei tradicional, o esporte para a terceira idade não tem manchete, ataque e líbero. O esquema de jogo é o 6 x 0, em que todos os seis jogadores precisam pas-sar pela rede. Em vez de toque, eles devem segurar a bola e passar para um companheiro. Três atletas podem segurá-la antes de jogar para o lado adversário. A mesma pessoa não pode segurar por duas vezes consecutivas. Os tradicionais 25 pontos tornam-se 15 na modalidade adaptada.

Outra mudança é que todos os jogadores devem partici-par de alguma rodada até o final do set. Não se pode saltar nem fazer ameaças ao adversário. Na categoria feminina, as jogadoras podem andar um metro dentro da quadra para sacar.

Regras são diferentes

Nos JORI, vôlei adaptado para a terceira idade ajuda a colocar em prática o que foi aprendido dos treinos durante o ano

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CONTORCIONISMOPara vencer no esporte, como na vida, é preci-so muita dedicação. Às vezes, ficar de pernas para a ar, se retorcer toda. É isso o que faz essa atleta flagrada pelas lentes do estudante de jor-nalismo Daniel Zanetti. Uma prova de que, para que os resultados apareçam, em alguns casos é necessário ver o mundo pelo avesso, entrar no jogo até de ponta-cabeça. Vale tudo para fazer o esporte amador triunfar. Um esforço e tanto!

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