retórica, filosofia, democracia
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Retórica, Filosofia, DemocraciaTRANSCRIPT
´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´«A Retórica é uma invenção grega.
Não caiu do céu, mas nasceu e desenvolveu-se num contexto muito
preciso, o das instituições políticas e, particularmente, judiciárias,
de certas cidades gregas»
F. Desbordes, la rhétorique antique, Paris, Hachette, 1996, pp
9 e11
DEFINIÇÃO ATUAL DE RETÓRICA
Começamos por dar uma definição atual de Retórica: «Arte de
bem falar, de mostrar eloquência diante de um público com a
finalidade de obter a sua adesão à nossa causa. Ela inclui a
persuasão e a vontade de agradar: tudo depende (...) da causa, do
que motiva alguém a dirigir-se a outrem. A retórica possui um
carácter argumentativo que está presente desde o início pois
justificamos uma tese com argumentos mas o adversário faz o
mesmo: neste caso, a retórica não se distingue em nada da
argumentação. (...).”. (...). Para os antigos, a retórica englobava
tanto a arte de bem falar - ou eloquência - como o estudo do
discurso ou as técnicas de persuasão até mesmo de manipulação»
Michel Meyer, Questões de Retórica: Linguagem, Razão e Sedução.
Lisboa. Ed.70.1997
ORIGEM ETIMOLÓGICA
Retórica (do latim rhetorica, originado no grego ῥητορικὴ τέχνη
[rhêtorikê], literalmente a «arte/técnica de bem falar», do substantivo
rhêtôr, «orador») é a arte de usar uma linguagem para comunicar de
forma eficaz e persuasiva.
No entanto, a retórica nem sempre teve esta conotação, pois foi
sendo aperfeiçoada ao longo dos tempos. Na parte do nosso trabalho,
1
vamos revisitar os tempos em que os Sofistas, Platão e Aristóteles
viveram, e qual foi o respetivo contributo da civilização clássica e de
outras para esta matéria.
CONTEXTUALIZAÇÃO
A retórica teria nascido no século V a.C., na Sicília, e foi
introduzida em Atenas pelo sofista Górgias, desenvolvendo-se nos
círculos políticos e judiciais da Grécia antiga. Originalmente visava
persuadir uma audiência dos mais diversos assuntos, mas acabou por
tornar-se sinónimo da arte de bem falar, o que opôs os sofistas ao
filósofo Sócrates e seus discípulos. Aristóteles, na obra "Retórica",
lançou as bases para sistematizar o seu estudo, identificando-a como
um dos elementos chave da filosofia, junto com a lógica e a dialética.
A retórica foi uma das três artes liberais ensinadas nas universidades
da Idade Média, constituindo o "trivium", junto com a lógica e a
gramática. Até ao século XIX foi uma parte central da educação
ocidental, preenchendo a necessidade de treinar oradores e
escritores para convencer audiências mediante Argumentos.
A retórica apela à audiência em três frentes: logos, pathos e
ethos. A elaboração do discurso e sua exposição exigem atenção a
cinco dimensões que se complementam (os cinco cânones ou
momentos da retórica): inventio ou invenção, a escolha dos
conteúdos do discurso; dispositio ou disposição, organização dos
conteúdos num todo estruturado; elocutio ou elocução, a expressão
adequada dos conteúdos; memoria, a memorização do discurso e
pronuntiatio ou acção, sobre a declamação do discurso, onde a
modulação da voz e gestos devem estar em consonância com o
conteúdo (este 5º momento nem sempre é considerado).
A retórica é uma ciência (no sentido de um estudo estruturado)
e uma arte (no sentido de uma prática assente numa experiência,
com uma técnica).
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No início, a retórica ocupava-se do discurso político falado, a
oratória, antes de se alargar a textos escritos e, em especial, aos
literários, disciplina hoje chamada "estilística". A oratória é um dos
meios pelos quais se manifesta a retórica, mas não o único. A
retórica, enquanto método de persuasão, pode se manifestar por todo
e qualquer meio de comunicação.
QUAL A RELAÇÃO ENTRE FILOSOFIA DEMOCRACIA E
RETÓRICA?
A Retórica floresceu na antiga Grécia, ligada à Democracia e
em particular à necessidade de preparar os cidadãos para uma
intervenção ativa no governo da cidade.
A Democracia ateniense, devido ao espírito de competição
política e judiciária exigia uma preparação intelectual muito
completa dos cidadãos. Este facto influenciou decisivamente o
desenvolvimento da educação.
"Rector" era a palavra grega que significava "orador", o político.
No início esta não passava de um conjunto de técnicas de bem falar e
de persuasão para serem usadas nas discussões públicas. A sua
criação é atribuída a Córax e Tísis (V a.C.), tendo sido desenvolvida
pelos sofistas que a ensinaram como verdadeiros mestres.
Os sofistas adquiriram durante o século V a.C., grande prestígio
como professores de Retórica. O termo grego sofista designa homem
hábil ou sábio em qualquer assunto, significa mestre da sabedoria.
Eram professores que ensinavam por todas as partes da Grécia.
Numa época em que a democracia grega exigia a confrontação
pública dos cidadãos para resolverem os seus problemas comerciais e
jurídicos, os sofistas ensinavam, em troca de uma remuneração, a
persuasão e a retórica. Vindos de toda a parte do mundo grego, os
sofistas (mestres de sabedoria), dedicam-se a fazer conferências e a
dar aulas nas várias cidades-estado, sem se fixarem em nenhuma.
3
Atenas é todavia a cidade onde mais afluem, onde no século V a. C.
adquirem um enorme prestígio. Aproveitam as ocasiões em que
existe grandes aglomerações de cidadãos, para exibirem os seus
dotes retóricos e saber, ensinando nomeadamente a arte da retórica.
O seu ensino é, portanto, itinerante, mas também remunerado.
Entre estes destacam-se Górgias e Protágoras. Os sofistas
adquiriram durante o século V a.C., grande prestígio como
professores de Retórica. A Retórica era antes de mais o discurso do
Poder ou dos que aspiravam a exercê-lo. "O orador, escreve Chaim
Perelman, educava os seus discípulos para a vida ativa na cidade:
propunha-se formar homens políticos ponderados, capazes de
intervir de forma eficaz tanto nas deliberações políticas como numa
acção judicial, aptos, se necessário, a exaltar os ideais e as
aspirações que deviam inspirar e orientar a acção do povo.". O
discurso retórico visava a acção, por isso se propõe persuadir,
convencer os que escutam da justeza das posições do orador. Este
primado da acção leva a maioria dos sofistas, a desprezarem o
conhecimento daquilo que discutiam, contentando-se com simples
opiniões, concentrado a sua atenção nas técnicas de persuasão.
A partir de Platão (429-347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.),
sofista passa a designar aquele que usa argumentos aparentemente
válidos para enganar os outros – sofismas – e, consequentemente,
passa a ter uma conotação pejorativa.
Todavia, convém realçar a indubitável contributo positivo dos
sofistas (entre os quais Protágoras, Crítias, Hípias e Górgias) para o
desenvolvimento do ensino em geral e do pensamento filosófico em
particular:
Os sofistas promoveram a viragem, na história da filosofia,
dos temas ligados à Natureza (aos quais se dedicaram os filósofos
pré-socráticos) para o tema do Homem (antropologia) e com eles
levantaram-se as primeiras questões da filosofia da linguagem. 4
Contribuíram para a fundação da Paideia, fonte da formação
e cultura ocidentais.
Inauguraram o estatuto social de profissional do saber:
ensinavam de terra em terra diversas matérias (da gramática às
matemáticas), cobrando honorários, motivo pela qual foram
fortemente criticados.
Impulsionaram o ensino da retórica, nomeadamente da areté
política: ela constitui a base da preparação dos jovens para a vida
pública e política. Os sofistas ensinam a argumentar ,a discursar, a
persuadir e convencer, por forma a que os jovens possam cumprir
as exigências da cidadania e enveredar pela carreira política.
A METODOLOGIA E O CONTRIBUTO DOS SOFISTAS
A metodologia mais utilizada pelos sofistas é a Antilogia.
Acreditavam ser possível defender dois argumentos contraditórios e
incentivavam os seus alunos a defenderem o mais fraco. A retórica
foi um instrumento de poder na democracia ateniense e, desde
muito cedo, os sofistas reconheceram que mais importante do que
um conteúdo de um discurso é o uso que se faz das palavras, de
forma a convencer os ouvintes.
Neste sentido, a verdade dos discursos é a verdade que serve
o homem concreto. É a verdade relativa.
É de Protágoras a frase que coloca o homem no meio das
preocupações: "o homem é a medida de todas as coisas". Esta frase
quer dizer que não há um mundo objetivo desvinculado dos sujeitos
que conhecem o mundo. Se num dado momento, para um indivíduo,
o tempo está quente, o tempo está quente; mas, se para um outro
está frio, o tempo está frio. Disso se conclui que não uma
objetividade a respeito do tempo. Deste modo, a ‘ verdade sobre o
tempo é relativa a cada sujeito. Isso é chamado de relativismo.
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Afirmam saber de tudo. «Hípias Menor» de Platão, é o melhor
exemplo deste saber enciclopédico. Tudo o que leva consigo é obra
das suas mãos, desde o anel que cinzelara ao manto que tecera,
aos poemas que escreveu e que transporta. É esta educação
completa que pretendem transmitir aos jovens, preparando-os para
ocuparem altos cargos na cidade (Polis).
Apesar da diversidade dos métodos de educação e saberes
dos sofistas, estes podem ser agrupados nos seguintes tipos
fundamentais:
Cultura - Os sofistas defendem abertamente o valor
formativo da cultura (Padeia), que não se resume à soma de
noções, nem tão pouco ao processo da sua aquisição. A sua
educação visa a formação do homem como um ser concreto,
membro de um povo e parte de um dado ambiente social. A
educação torna-se a segunda natureza do homem. Deste modo, os
sofistas afastam-se da tradição aristocrática, ligada à afirmação de
fatores inatos. Os sofistas manifestam frequentemente uma visão
otimista do homem, segundo a qual este possui uma inclinação
natural para o bem. Protágoras foi um defensor desta posição.
Cultura Geral- Este ensino compreendia o estudo da
Aritmética, Geometria, Astronomia e Música. Estas matérias
remontavam a um modelo de educação pitagórico, vindo a
constituir mais tarde, na Idade Média, o célebre Quadrivium das
sete Artes Liberais.
Formação Política -Este ensino orientava-se para uma visão
mais prática, procurando corresponder às exigências estritas da
atividade política. Constava das seguintes disciplinas: Gramática,
Dialética e Retórica. A arte da Dialética, transforma-se numa arte de
manipulação de ideias, através da qual o orador procura defender
uma dada posição, mesmo que a mesma seja a pior de todas. A
retórica era a arte de persuadir, independentemente das razões 6
adotadas. Levado até ao exagero, este tipo de ensino, desacreditará
os sofistas na Antiguidade Clássica.
Convenção. Partindo de uma conceção relativista do
conhecimento, negam igualmente a universalidade da Verdade.
Esta não passa para alguns sofistas de uma convenção.
"Pois que tais coisas parecem justas e belas a cada cidade, são-no
também para ela, enquanto creia em tais". Platão, Teeteto, 167
"Afirmo que o justo não é mais do que o útil ao mais forte..., isto é,
em todos os Estados o justo é sempre... aquilo que convém ao
governo constituído." Platão, República, 338
Esta posição traduz-se em muitos sofistas na afirmação do direito
do mais forte em governar os mais fracos (cfr. Platão, Górgias, 482-
484).
Outros ainda, partindo da ideia da Lei como convenção, sustentam
que esta provoca desigualdades entre os homens, iguais por
natureza:
"Ó, homens aqui presentes! Creio-vos a todos unidos parentes e
concidadãos, não por lei, porque o semelhante é por natureza
parente do seu semelhante. A lei, como tirana dos homens, em
muitas coisas emprega a violência contra a natureza". Discurso de
Hípias, em Platão, Protágora,337.
Antifonte de Atenas (sofista) , formulando uma antinomia entre
natureza e lei humana, proclamou a igualdade entre os bárbaros e
os gregos (Helenos), sendo mesmo crível que tenha defendido a
igualdade entre cidadãos e escravos.
"Parece a alguns que... somente por lei (convenção) seria um
escravo e o outro livre, mas por natureza não haveria
absolutamente diferença de sorte. Por isso não seria justo, pois é
obra da violência". Aristóteles, Política, I, 3,1253.7
Relativismo- Constatando a influência dos fatores sociais na
formação dos homens e na modelação dos seus comportamentos, a
existência de uma pluralidade de culturas e modos de pensar, os
sofistas acabam por defender a relatividade de todo o
conhecimento e dos valores, negando a sua universalidade.
Protágoras dizia que o homem é a medida de todas as coisas
o que significa que o que parece a cada um também o é para ele
com certeza". Aristóteles. Met.XI, 6,1062.
Partindo deste princípio, acabam por afirmar a identidade
entre o verdadeiro e o falso. "Sobre cada argumento podem-se
adiantar dois discursos em perfeita antítese entre si", Fragmento.
de Protágoras, em Diógenes de Laércio, IX, 50.
"Se todas as opiniões e todas as aparências são verdadeiras,
conclui-se necessariamente que cada uma é verdadeira e falsa ao
mesmo tempo. Visto que, frequentemente, surgem, entre os
homens, opiniões contrárias, e cremos que se engana quem não
pensa como nós, é obvio que existe e não existe ao mesmo tempo a
mesma coisa. Admitindo isto, deve-se também admitir que todas as
opiniões são verdadeiras. (...)
Se as coisas são como afirma Protágoras, será verdade o que
quer que se diga". Aristóteles. Met.IV,5,1009.
A POSIÇÃO DE SÓCRATES E PLATÃO
Foi sobretudo contra este ensino que se opuseram Sócrates e
Platão. Ambos sustentaram que a Retórica era a negação da própria
Filosofia. Platão, no Górgias e no Fedro, estabelece uma distinção
clara entre um discurso argumentativo dos sofistas que através da
persuasão procura a manipulação dos cidadãos, e o discurso
argumentativo dos filósofos que procuram atingir a verdade através
do diálogo, pois só esta importa.
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A retórica dos sofistas é, deste modo, fortemente criticada por
Sócrates e Platão e, por isso, é preterida relativamente à dialética.
Para estes filósofos, a dialética é sinónimo de filosofia, o método
mais eficaz de aproximação entre as ideias particulares e as ideias
universais ou puras; é a técnica de perguntar, responder e refutar.
Eles consideram que é apenas através do diálogo, que o filósofo
deve procurar atingir o verdadeiro conhecimento, partindo do
mundo sensível e chegando ao mundo das ideias. Pela
decomposição e investigação racional de um conceito chega-se a
uma síntese, que também deve ser examinada, num processo
infinito que busca a verdade.
Em contraposição à retórica dos Sofistas, a Filosofia, pelo
contrário, surge como um discurso que apela à razão não á emoção.
Esta é aliás a condição primeira para que a Verdade possa ser
comunicada. Não se trata de convencer ninguém, mas de comunicar
ou demonstrar algo que se pressupõe já adquirido - a Verdade de que
o filósofo é detentor.
O CONTRIBUTO DE ARISTÓTELES
Aristóteles, procurou um meio caminho entre Platão e o
Sofistas, encarando a Retórica como um arte que visava descobrir os
meios de persuasão possíveis para os vários argumentos. O seu
objetivo é o de obter uma comunicação mais eficaz para o Saber que
é pressuposto como adquirido.
Aristóteles foi o primeiro filósofo a expor uma teoria da
argumentação, nos Tópicos e na Retórica, procurando um meio
caminho entre Platão e o Sofistas, encarando a Retórica como um
arte que visava descobrir os meios de persuasão possíveis para os
vários argumentos. O seu objetivo é o de obter uma comunicação
mais eficaz para o Saber que é pressuposto como adquirido. A
retórica, torna-se numa arte de falar de modo a persuadir e a
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convencer diversos auditórios de que uma dada opinião é preferível
à sua rival.
BIOGRAFIA BREVE
Aristóteles nasceu em Estagira, no norte da Grécia, em 384
a.C., e morreu na ilha de Eboea em 322 a.C. Aluno de Platão na
Academia, fundador de sua própria escola - o Liceu - e tutor de
Alexandre, o Grande, Aristóteles foi a primeira pessoa a dar
importância ao estudo sistemático das diversas disciplinas das
artes e ciências que surgiam como entidades separadas pela
primeira vez no século IV a.C., inclusive no que diz respeito à
definição dos conceitos básicos e das relações entre cada uma.
A RETÓRICADE ARISTÓTELES NOCONTEXTO GREGO.
Quando Aristóteles entrou para a Academia Platónica, foi
incumbido de dar uma parte das aulas, o curso de Retórica. Sendo
a Retórica — curso que ele dava — a ciência teorética que
investiga a arte da persuasão, ele foi um dos primeiros a fazer
dela uma especulação teórica. Até então a Retórica era apenas
transmitida como técnica, como prática, e alguns demoravam a
vida inteira para dominar esta arte, que era a chave das ambições
políticas. Aristóteles domina-a prontamente e começa a especular
teoricamente. Isto consiste em perguntar: "Porque é que o
argumento persuasivo é persuasivo?" e mesmo: "Porque é que um
argumento logicamente fraco ou absurdo convence as pessoas, e
outro que é razoável não as convence?".
Aristóteles começa por examinar a Retórica, exatamente
como Sócrates havia feito. Sócrates via que os oradores, políticos,
conseguiam persuadir as pessoas às vezes de coisas
perfeitamente absurdas. Sócrates limitou-se a demonstrar que
essas ideias eram absurdas, por mais persuasivas que
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parecessem. Aristóteles dá, na juventude, um contributo
pertinente na explicação da matéria em análise. Começa a
investigar as causas dessa caracter persuasivo, e formula a
ciência da Retórica como uma verdadeira Psicologia da
Comunicação. Ora, conhecendo por um lado a técnica, e já tendo,
por outro, algumas ideias científicas sobre o fenómeno da
persuasão, Aristóteles não sabia apenas produzir argumentos
persuasivos, mas também conhecia os princípios teóricos em que
se baseava a persuasão dos adversários. Isto significa que, com
vinte e poucos anos, ele tinha-se tornado uma espécie de terror
dos retóricos, pois desmontava todos os argumentos deles com
muita facilidade. Aristóteles sintetizou, muito jovem, os dois
papéis que mais tarde seriam denominados retor e retórico: o
praticante da arte, o homem que escreve ou fala bem e o cientista
que estuda e formula a teoria da Retórica.
A RETÓRICA DE ARISTÓTELES…
Com Aristóteles, a Retórica torna-se uma disciplina muito
importante de entre outras. Ele foi o primeiro filósofo a expor uma
teoria da argumentação, nos Tópicos e na Retórica, procurando
uma síntese entre Platão e os Sofistas, encarando a Retórica como
uma arte que visava descobrir os meios de persuasão possíveis
para os vários argumentos. Assim, esta pode ser deliberativa, se o
auditório tiver que julgar uma ação futura; judicial, se o auditório
tiver que julgar uma ação passada; e, epidítica se o auditório não
tiver que julgar acções passadas nem futuras.
O seu objetivo é o de obter uma comunicação mais eficaz para
o Saber que é pressuposto como adquirido. A retórica, torna-se
numa arte de falar de modo a persuadir e a convencer diversos
auditórios de que uma dada opinião é preferível à sua rival. É
neste contexto que surge o contexto de recepção: conjunto de
opiniões, valores e juízos que um auditório partilha e que serão
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fundamentais na recepção do argumento, determinando a sua
aceitação, a sua rejeição ou o seu grau de adesão.
Sendo baseada em critérios dialéticos, esta retórica torna-se a
técnica de argumentação do verosímil, uma vez que as teses
colocam-se como discutíveis no seio dos debates públicos.
Qualquer um, pode apresentar contra-argumentos à tese do
orador, que é forçado a apresentar novos argumentos a fim de a
manter credível.
Outra característica da retórica de Aristóteles e também muito
importante, é a de que nela se pode distinguir três domínios:
retórica, moral e verdade e que o bom ou mau uso da retórica, ou
seja, o uso da arte do bem falar para defender argumentos
verdadeiros ou falsos, depende única e exclusivamente da ética
de quem assim procede, isto é, da prioridade de valores morais
que cada um vai estabelecendo ao longo da sua vida. Quer dizer
que a retórica em si, não é boa nem má, o seu uso é que a torna
boa ou má. Portanto, é uma ilusão pensar que a má retórica não
tem sentido; se o homem é livre de se exprimir, são as suas
intenções que determinarão o tipo de uso que fará da palavra.
Em suma, e tal como afirma Aristóteles: “A retórica não é
meramente uma arte de persuasão, mas antes uma faculdade de
descobrir especulativamente o que, caso a caso, pode servir para
persuadir”. A retórica de Aristóteles apresenta-se como retórica de
raciocínio, por oposição a uma retórica das paixões.
RETÓRICA E DIALÉTICA
Para Aristóteles, a retórica e a dialética são duas disciplinas
limítrofes. Ambas partem do verosímil e nenhuma depende da
ciência (objetividade da demonstração). Segundo o filósofo:
«A retórica é a outra face da dialética; pois ambas se ocupam
de questões mais ou menos ligadas ao conhecimento comum e 12
não correspondem a nenhuma ciência em particular. De facto,
todas as pessoas de alguma maneira participam de uma e de
outra, pois todas elas tentam em certa medida questionar e
sustentar um argumento, defender-se ou acusar".
No entanto, distinguem-se no modo como se empregam. A
retórica preocupa-se com a persuasão, enquanto a dialética se
preocupa em produzir conhecimentos gerais.
Aristóteles define a dialética como a lógica do provável, do
processo racional que não pode ser demonstrado. "Provável é o
que parece aceitável a todos, ou à maioria, ou aos mais
conhecidos e ilustres", diz o filósofo.
CURIOSIDADES
A RETÓRICA DE ARISTÓTELES:
Retórica é um texto de Aristóteles. É composto por três livros (I:
1354a - 1377b, II: 1377b - 1403a, III: 1403a - 1420a) e não
existem dúvidas acerca da autenticidade da obra.
OBJETIVOS DA OBRA:
O objetivo de Aristóteles com sua Retórica é dar um
tratamento eminentemente filosófico ao tema em oposição ao
tratamento descuidado que os retores e sofistas daquele tempo
davam ao tema. De modo mais específico, muitos acreditam que a
reflexão aristotélica sobre o tema foi uma resposta à conceção
retórica de Isócrates de Atenas. Ao contrário de Platão, que no
diálogo Górgias condena a retórica e no diálogo Fedro subordina a
retórica à filosofia, a investigação aristotélica acerca da retórica —
mesmo que eminentemente filosófica — procura conferir
autonomia para a técnica retórica, desvinculando-a da vigilância
da filosofia (coisa que Platão discordava por considerar a retórica
eticamente perigosa).
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RESUMO DA OBRA:
No livro I, Aristóteles analisa e fundamenta os três géneros
retóricos: o deliberativo (que procura persuadir ou dissuadir), o
judiciário (que acusa ou defende) e o epidítico (que elogia ou
censura). Além disso, argumentos em favor da utilidade da
retórica são apresentados bem como uma análise da natureza da
prova retórica que é o entimema, um silogismo derivado;
No livro II, o plano emocional é analisado em sua relação com
a recepção do discurso retórico. Uma série de elementos, como a
ira, amizade, confiança, vergonha e seus contrários são
analisados, bem como o carácter dos homens (por ex: o carácter
dos jovens, o carácter dos ricos). Neste livro, também volta-se a
analisar as formas de argumentação, são apresentados uma série
de tópicos argumentativos, o uso de máximas na argumentação e
o uso dos entimemas;
No livro III, o estilo e a composição do discurso retórico são
analisados. Além de elementos como clareza, correção gramatical
e ritmo, o uso da metáfora e as partes que compõem um discurso
também estão presentes neste livro.
Com esta obra, Aristóteles lança as bases da retórica ocidental.
Teoricamente, a evolução da retórica ao longo dos séculos
representou muito mais um aperfeiçoamento da reflexão
aristotélica sobre o tema do que construções verdadeiramente
originais.
É neste quadro definido por Aristóteles que a Retórica irá
evoluir, confinando-se à uma arte de compor discursos que
primavam pela sua organização e beleza (estética), desvalorizando-
se a dimensão argumentativa cultivada pelos sofistas.
Esta arte conheceu um grande desenvolvimento na época
helenística.
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A RETÓRICA NA CULTURA ROMANA
Em Roma, Cícero (político e brilhante orador, do séc. I a. C),
sistematizou os fundamentos da retórica, em duas obras
fundamentais De Oratore e Orator. Cícero considerou-a uma
verdadeira ciência, cujo exercício exige uma enorme cultura. O
objetivo do orador era provar, agradar e comover. A retórica divide-
se então em várias, culminando neste período com Quintiliano (séc.I
d.C), cuja única obra que chegou até nós se chama justamente
Institutio Oratória. A Retórica torna-se durante o Império Romano
em Oratória, ou seja, na arte de falar bem.
A VIA SEGUIDA DURANTE A IDADE MÉDIA E NO
RENASCIMENTO
Durante a Idade Média, a argumentação adquiriu enorme
divulgação, nomeadamente entre os clérigos, ocupando um lugar
central na educação (fazia parte do Trivium).
RETÓRICA NA IDADE MODERNA
Na Idade Moderna, a retórica continuou a desfrutar ainda de
algum prestígio nos países católicos, recorde-se a este respeito o
notável orador que foi Padre António Vieira. A tendência do tempo
era todavia outra. A Retórica como arte argumentativa começou a
ser completamente desacreditada. Descartes reafirma o primado
das evidências sobre os argumentos verosímeis. Na mesma linha,
se desenvolve o discurso científico. Não se trata de convencer
ninguém, mas de demonstrar com "factos", "dados", "provas" a
Verdade (única e irrefutável).
A REABILITAÇÂO DA RETÓRICA COMO TEORIA DA
ARGUMENTAÇÂO NO SÉCULO XX
No século XX a Retórica volta a ser retomada, em consequência
da generalização das teses relativistas e o descrédito das ideologias.
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A "Verdade" que os filósofos afirmavam, não pode ser mais admitida
como um ponto de partida para qualquer discussão. Antes de a poder
afirmar o que quer que seja como verdadeiro, o filósofo deve procurar
a adesão de um dado auditório para as suas posições. Todas as
filosofias não passam de opiniões plausíveis que devem ser
continuamente demonstradas através de argumentos também eles
meramente plausíveis. Neste sentido, toda a filosofia é um espaço
sempre em aberto e susceptível de continuas revisões.
A REDESCOBERTA DO VALOR FILOSÓFICO DA RETÓRICA
ANTIGA
O CONTRIBUTO DE CHAIM PERELMAN
A IMPORTÂNCIA DA RETÓRICA PARA O PENSAMENTO
CONTEMPORÂNEO
Perelman toma partido no debate secular que opôs a Filosofia
à retórica.
Filósofos racionalistas como Platão, Descartes e Kant,
opuseram a procura da verdade, tarefa atribuída à Filosofia, às
técnicas dos retóricos e dos sofistas. Estes eram acusados de
admitirem opiniões variadas e enganadoras.
No entender de Perelman para se poder assegurar que as
teses defendidas pelos filósofos não são meras opiniões incertas e
falaciosas mas verdades indiscutíveis, é preciso que elas beneficiem
de um fundamento sólido e indiscutível, de uma intuição evidente
que garanta a verdade do que é percebido como evidente.
Uma argumentação nunca é capaz de proporcionar a
evidência e não está em questão argumentar contra o que é
evidente, a menos que a evidência seja contestada. É o que já tinha
notado Aristóteles, que reconhece ser indispensável recorrer aos
raciocínios dialéticos quando os primeiros princípios de uma ciência
que normalmente se impõem por si mesmos são contestados. 16
Todos os que creem poder determinar a verdade
independentemente da argumentação menosprezam a retórica que
se refere a opiniões. Mas se não admitirmos a possibilidade de
fundamentar as teses filosóficas com base em intuições evidentes
então será necessário recorrer a técnicas argumentativas para as
defender. A nova retórica, torna-se um instrumento indispensável á
filosofia isto porque a argumentação é essencialmente diálogo,
comunicação e discussão.
No entanto convém sublinhar que as estratégias
argumentativas parecem estar nitidamente secundarizadas, face às
técnicas de persuasão usadas pelos novos meios de comunicação
de massas, como a publicidade ou a televisão.
http://www.notapositiva.com/trab_estudantes/trab_estudantes/filosofia/filosofia_trabalhos/retoricaaristotelica.htm
http://afilosofia.no.sapo.pt/11filosret.htm#sintese
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ret%C3%B3rica#Os_Sofistas
Filosofia 11º Ano, Razão e Diálogo, páginas 130 a 146, Porto Editora, J.
Neves Vicente
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