resenha um cárcere de memórias · degradante de direitos fundamentais – como saúde,...
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Rev.DireitoePráx.,RiodeJaneiro,Vol.10,N.4,2019,p.3126-3133.
DiegoReiseMaluStanchi DO:10.1590/2179-8966/2019/43823|ISSN:2179-8966
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RESENHA
UmcárceredememóriasPIRES,Thula; FREITAS,Felipe (Org.).VozesdoCárcere:EcosdaResistênciaPolítica.RiodeJaneiro:Kitabu,2018.480p.DiegoReis11 Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail:[email protected]:https://orcid.org/0000-0001-6977-7166.MaluStanchi22ConsejoLatinoamericanodeCienciasSociales(CLACSO)eFaculdadeLatino-AmericanadeCiências Sociais (FLACSO), Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail:[email protected]:https://orcid.org/0000-0002-0480-5514.
Resenharecebidaem6/07/2019eaceitaem9/09/2019.
ThisworkislicensedunderaCreativeCommonsAttribution4.0InternationalLicense.
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“Prisãoéumamaneiramuitocaradetornaroshomenspiores.”(SP5–1011)1
“Nãoseifazercompalavrasdifíceis,fizcomoseifalar.”
(SP5–906)recém-publicadoVozesdoCárcere,organizadoporThulaPireseFelipeFreitas,
apareceemummomentonoqualoencarceramentonoBrasil registradados
alarmantes,commaisde700milpessoasprivadasdeliberdadenopaís.E,de
modo especial, o aprisionamento de mulheres, que cresce em escalada vertiginosa2, e
revelaapráticadoencarceramentocomoestratégiaseletivadecontrolesocialedesujeição
criminaldapopulaçãonegraedasclassespobres.
O livro, fruto do projeto institucional Cartas do Cárcere, representa um dos
produtosdapesquisadesenvolvidapelaPontifíciaUniversidadeCatólicadoRiode Janeiro
(PUC-Rio), contemplada pelo edital lançado pela Ouvidoria Nacional dos Sistemas Penais
(ONSP), no âmbito de um projeto firmado entre o Programa das Nações Unidas Para o
Desenvolvimento (PNUD) e o Departamento Penitenciário Nacional/Ministério da Justiça.
Realizadaentreagostode2017ejaneirode2018,apesquisaanalisouascartasescritaspor
pessoasprivadasdeliberdadenoBrasilendereçadasàOuvidoriaedemaisórgãospúblicos.
A equipe do projeto, por meio da leitura, catalogação e classificação de 8.818
cartas de pessoas encarceradas, destacou as narrativas sobre as experiências nas
instituições penais, de modo a identificar as repercussões raciais e de gênero nos seus
percursosindividuaisecoletivos.Olivroevidenciaasreivindicaçõesdaspessoasprivadasde
liberdade e compartilha material substancial à ampliação da disputa por medidas
alternativasderesponsabilizaçãopenal.
OprojetoteveacoordenadoriageraldaProfa.Dra.ThulaRafaeladeOliveiraPires,
compesquisa e sistematização de informações coordenadas por Felipe da Silva Freitas, e
expõe a crueza da realidade do cárcere no Brasil como lugar de violação sistemática dos
1Comafinalidadedepreservaroanonimatoeasegurançadasautorasedosautoresdascartasremetidaspelaspessoas privadas de liberdade, o livroVozes do Cárcere: ecos da resistência políticadesidentifica os escritos,marcandoapenasosestadosdeprocedênciadascartas,numerando-as.2 De acordo com o INFOPENMulheres de 2017, o número demulheres submetidas à privação de liberdadeaumentou656%entreosanos2000e2016,superandoamarcade42milmulheresencarceradasnoBrasil.Éimportantedestacarque,pelomenos,62%dessasmulheressãonegras.
O
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direitos humanos, que escancara “as cumplicidades do ordenamento constitucional
brasileirovigentecomashierarquiasdehumanidadeherdadasdoprojetomodernocolonial
debaseescravista”(FLAUZINA;PIRES,2018,p.20).
A partir das narrativas da violência de Estado, endereçada prioritariamente aos
corpos não brancos, as cartas revelam um sistema que desmitifica a ideia difundida
socialmente sobre a existência de falhas nas instituições penais. As/os protagonistas dos
escritos descrevem práticas que se relacionam à estruturação do cárcere: suas bases
programaticamenteseletivas;osdestinatáriosdacriminalização,apagamentoeextermínio
promovidospeloidealpunitivista;easconsequênciasdeletériasqueimpactamnoscorpos
encarceradosereverberamsobretodososatores imbricadosàsdinâmicasdoscentrosde
detenção.
É nessa direção que apontam os onze ensaios que compõem o livro. De forma
interseccional,asautoraseosautoresapresentamasmúltiplasferramentasutilizadaspelo
sistemapenalpara subjugaros corposnegros, periféricose femininos:desdea supressão
degradantededireitos fundamentais– comosaúde, alimentação, salubridadee liberdade
deexpressão–aosatosmanifestamenteviolentos,atravésdastorturasesançõesfísicase
psicológicasimpostas.Osrelatospautadosnasnarrativasdocárceredesvelamaprivaçãode
liberdadecomonegaçãodetododireitohumano.Enãoéapenas isso.Elesdemonstrama
construção das instituições penais fundada no aniquilamento e na hierarquização de
humanidades.
O direito humano ao próprio corpo é aquilo que perdemos quando somosescravizadas e/ou presas. A escravidão, assim como o aprisionamento,propiciamo lentoedolorosoprocessodedesagregaçãoentrecorpoecabeça,entrecabeçaeespírito, impingindo,via forçanecropolíticadeEstado(emsuasdiversas presenças e técnicas), clivagens que agem sobre a memória, aidentidade e, assim, sobre a própria condição de humanidade. (CARRASCOSA,2018,p.31-32)
Daí o processo constantededesumanização e a negaçãoda agência depessoas
subalternizadas, submetidas à força necropolítica de Estado e aos efeitos de políticas
públicasqueexpressamafacemaisnefastadoracismo/sexismoinstitucional,doclassismo
edafragilidadedospactosdemocráticosnoBrasilcontemporâneo.Nãoédeespantarque
esse processo culmine na ampliação das vulnerabilidades e iniquidades, que agravam a
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violação da integridade dos sujeitos encarcerados e conferem o caráter racialmente
genocidadossistemaspenais.OEstado,segundoLúciaXavier:
[...] aposta na morte física e social da pessoa condenada pelo crime de “serquemé”,negros.Pois,numpaísquenãoexisteautorizaçãolegalparaamorteou para a supressão de direitos fundamentais, essas ações se circunscrevemnumprojetogenocida [...]; reconheceroprojetogenocidaemcursocompostopor morte e encarceramento, nos obriga a uma revisão do sentido dademocracia e do direito quando tratamos de grupos raciais/étnicos excluídos(XAVIER,2018,p.352-353).
Amortefísicaeamorteemvidaproduzidaspelocárcere–antes,duranteedepois
do período de privação de liberdade – engendram a produção de estereótipos sobre as
pessoaslançadasnazonadonãoser(FANON,2008,p.26).Asinstituiçõespenais,aotecer
restrições sociais diversas às possibilidades de sobrevivência e vida dignas, imprimem,
histórica e compulsoriamente, práticas de violência orquestradas contra as trajetórias de
gruposmarcadospelaestigmatizaçãodacriminalidade:
Atentando para realidade brasileira, a atuação estatal na produção da morteestá inscrita nas diversas vulnerabilidades construídas em torno do segmentonegro. A pauta de extermínio que inundou os discursos do século XIX,principalmentecomaproximidadedaabolição,serárecepcionadanointeriordaRepública dentro dessa nova metodologia. Assim, embalado na cantiga dademocraciaracial,oEstadofoi,pelaprecarizaçãodavidadocontingentenegro,construindo as condições para o descarte do segmento. (FLAUZINA, 2006, p.100)
AntesdesubmetidosaoEstadodeCoisasInconstitucional3dasinstituiçõespenais,
estesgruposjáestãomarcadoscomoalvosdomodusoperandibélicoqueprovocarupturas
jurídicaserevesteosplanejamentosemtornodaSegurançaPública.Osatosexcepcionais
de violência são normalizados em territorialidades racialmente marcadas, promovendo a
ostensividadecomoformadedireitoemnomedepolíticassalvacionistashumanitárias.Em
prol da branquitude e da manutenção de seus privilégios, a população negra é morta,
torturadaeencarceradapelasforçaspoliciaisdoEstadoSoberano,oqueéexplicitadoem
trechodeumadascartasdocárcere:“cadeiaécomprovado:ésomenteparanegro,pobre,
faveladoecabeloduro”(RJ–39).
3 Essa expressão foi utilizada pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro na Arguição de Descumprimento dePreceito Fundamental 347, MC–DF, com a finalidade de reconhecer o caráter sistemático, contínuo egeneralizadodaviolaçãodosdireitosfundamentaisdaspessoasencarceradas.
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As denúncias tornam-se, então, estratégia de expressão contra articulações
políticas opressoras ao mobilizar a experiência do cárcere também como forma de
resistência à realidadeprisional. ComVozes do Cárcere são abertas fendas no interior do
dispositivocarcerário,quepermitementreverosubsolodadiscursividadepunitivistaeque
colocamemtensãooepicentrodasegregação.
As cartas evidenciam, em seu processo de escritura, gesto que merece ser
destacado: a prática discursiva, simultaneamente registro, reflexão e recordação,
materializa-se como escrita do testemunho de sujeitos políticos, cujo fluxo é dirigido ao
leitor/leitora potencial como memória de um presente intolerável, às vezes
tipograficamente marcado por caixa alta, como gritos de socorro diante da violência de
Estado.
Aenunciaçãoemprimeirapessoaeasestratégiasdesingularizaçãodasnarrativas
biográficasnãoprescindem,porém,dasvocalizaçõespolifônicasqueatravessamascartas,
ora como denúncia de grupos e “queixa” das opressões transversalizadas, ora como
confissão,oracomolugaremqueas“palavrasencarceradas”–premidasentreacensurae
anecessidadedecomunicação–tensionam-secomosilêncioecomainvisibilizaçãoaque
sãosubmetidasaspessoasprivadasdeliberdade.
Talvez,porisso,atônicadosilênciosejatãorecorrentenascartas,comoconflito
permanenteentreaafoniaeojorrodiscursivoqueesbarranasparcascondiçõesmateriais
queelasnãodeixamdeexpor:“Obs:perdãoporescreveraosdoutorescomcanetavermelha
(falta de educação) porém estou no castigo e foi o material que consegui arrumar
desfazendo me de uma semana de café da manhã” (DPR – 5); ou, ainda, “A petição foi
escrita em papel higiênico, pois houve a proibição da entrada de canetas e cadernos no
intuitodedificultarsocorro”(DMG–1);e,atémesmo,pelaobstaculizaçãodecertascartas,
censuradas pelas administrações prisionais, em evidente descompasso com os tratados
internacionaisquelegislamsobreoexercíciododireitofundamentalàcomunicação:
Todopresoestaráautorizadoaencaminhar,semcensuraquantoaoconteúdo,petição ou reclamação sobre seu tratamento à administração penitenciáriacentral e à autoridade judicial, ou a qualquer outra autoridade competente,incluídasasautoridadescomcompetênciasrevisionaisourecursais.(REGRASDEMANDELA,56,3)
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As performances da liberdade prefiguradas pelas cartas, como exercícios de
escrita, escuta e verbalização, apontam para as ressonâncias da luta pela efetivação dos
direitos humanos em contraposição aos limites do Estado Democrático de Direito.
Sobretudo no interior das instituições penais, onde “o dilema entre recuperar e punir
dissolve-se,emverdade,naconstataçãodequeosistema[penitenciário]constituiaparelho
exemplarmente punitivo e funciona exclusivamente como depósito de corpos ementes”
(FISCHER;ADORNO,1987,p.78).
A relevânciado livroestáemapresentarao leitor/leitoraacruezadasnarrativas
através de suas fontes primárias, com a reprodução dos fac-símiles como elementos
centrais, sempretender dar conta oumediar realidades que só podem ser integralmente
enunciadas pelas vocalizações dos próprios sujeitos imbricados nos processos. Nessa
estrutura,ostextosensaísticosdesdobram,apartirdemúltiplasperspectivas,reflexõesque
partemdasproposiçõesdaspessoassubmetidasàprivaçãodeliberdadeequereafirmam“a
existênciadesujeitoscujacapacidadedepotêncianãofoiaprisionada”(WERNECK,2018,p.
9).
A prisão constitui realidade violenta, expressão de um sistema dejustiça desigual e opressivo, que funciona como retroalimentador;serve apenas para reforçar valores negativos, proporcionandoproteção ilusória. Quantomais graves são as penas e asmedidasimpostasaosdelinquentes,maioraprobabilidadedereincidência.Osistema será, portanto, mais eficiente se evitar tanto quantopossível,mandar os condenados para a prisão, nos crimes poucograves e se, nos crimes graves, evitar o encarceramentodemasiadamentelongo.(SP6–112)
OsecosdasVozesdoCárcereressoamaresistênciapolíticaaocolocaremxequeo
próprioSistemadeJustiçaCriminaldenossotempo:cartas-bombanocoraçãodopresente.
Essas vozes dissonantes, descontínuas e dissidentes emergem como acontecimentos
políticos, em resposta à violência continuamente silenciada no interior e no entorno das
instituiçõespenais.Daíarelevânciadapublicaçãodestelivronaconjunturaatual,quandoas
medidas governamentais apresentam o hiperencarceramento, a seletividade e a
verticalização dos institutos penais como a solução final para toda questão de segurança
pública.
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ReferênciasbibliográficasBRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Regras de Mandela: Regras Mínimas das NaçõesUnidas para o Tratamento de Presos/Conselho Nacional de Justiça, Departamento deMonitoramentoeFiscalizaçãodoSistemaCarcerárioedoSistemadeExecuçãodeMedidasSocioeducativas,ConselhoNacionaldeJustiça.1ª.Ed.Brasília:ConselhoNacionaldeJustiça,2016. Disponível em:http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/05/39ae8bd2085fdbc4a1b02fa6e3944ba2.pdfAcessoem:05jul.2019.BRASIL. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN Mulheres. 2ª.Edição. Brasília: Ministério da Justiça e Segurança Pública/Departamento PenitenciárioNacional, 2017. Disponível em: http://depen.gov.br/DEPEN/depen/sisdepen/infopen-mulheres/infopenmulheres_arte_07-03-18.pdf.Acessoem:05jul.2019.CARRASCOSA, Denise. Direito Humano. In: PIRES, Thula; FREITAS, Felipe (Org.). Vozes doCárcere:EcosdaResistênciaPolítica.RiodeJaneiro:Kitabu,2018.FISCHER,RosaMaria;ADORNO,Sérgio.“Políticaspenitenciárias,umfracasso?”In:LuaNova,vol.3,nº.4,p.70-79,1987.FANON,Frantz.Pelenegra,máscarasbrancas.Trad.RenatodaSilveira.Salvador:EDUFBA,2008.FLAUZINA, Ana Luiza Pinheiro; PIRES, Thula. Apresentação – Vozes do Cárcere: entreencruzilhadas da justiça e os caminhos da resistência política. In: PIRES, Thula; FREITAS,Felipe(Org.).VozesdoCárcere:EcosdaResistênciaPolítica.RiodeJaneiro:Kitabu,2018.FLAUZINA, Ana Luiza Pinheiro. Corpo Negro Caído no Chão:O Sistema Penal e o ProjetoGenocidadoEstadoBrasileiro.DissertaçãodemestradoemDireito.Brasília:FaculdadedeDireitodaUnB,2006.PIRES, Thula; FREITAS, Felipe (Org.).VozesdoCárcere: EcosdaResistênciaPolítica.RiodeJaneiro:Kitabu,2018.WERNECK, Jurema. Prefácio – Cartas para quem? In: PIRES, Thula; FREITAS, Felipe (Org.).VozesdoCárcere:EcosdaResistênciaPolítica.RiodeJaneiro:Kitabu,2018.
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XAVIER,Lúcia.“Ascartasnãomentemjamais”:quandoodireitohumanoàsaúdeénegado.In:PIRES,Thula;FREITAS,Felipe(Org.).VozesdoCárcere:EcosdaResistênciaPolítica.RiodeJaneiro:Kitabu,2018.
SobreosautoresDiegodosSantosReisPós-Doutorando na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Doutor emFilosofiapeloProgramadePós-Graduação emFilosofiadaUniversidadeFederaldoRiode Janeiro (UFRJ), com estágio doutoral no Institut d’Études Politiques deParis/SciencesPo.Mestre e Licenciado pelamesma instituição. Professor SubstitutodaUniversidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail:[email protected]:https://orcid.org/0000-0001-6977-7166.MaluStanchiEspecializanda emPolíticas Públicase Justiça deGêneropeloConsejoLatinoamericanode Ciencias Sociales (CLACSO) e pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais(FLACSOBrasil). Graduanda emDireito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio deJaneiro (PUC-RJ). E-mail:[email protected]:https://orcid.org/0000-0002-0480-5514. Osautorescontribuíramigualmenteparaaredaçãodaresenha.