relações filogenéticas, biogeografia histórica e evolução da
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Erika Sendra Tavares
Relações filogenéticas, biogeografia histórica e evolução da
organização de genes mitocondriais dos psitacídeos
neotropicais (tribo Arini: Psittacidae: Psittaciformes)
São Paulo
2005
ATUALIDADES ORNITOLÓGICAS N.128 – NOVEMBRO/DEZEMBRO DE 2005 – P. 5
Erika Sendra Tavares
Relações filogenéticas, biogeografia histórica e evolução da
organização de genes mitocondriais dos psitacídeos
neotropicais (tribo Arini: Psittacidae: Psittaciformes)
Tese apresentada ao Instituto de Biociênciasda Universidade de São Paulo, para aobtenção de Título de Doutor em Ciências, naÁrea de Biologia/ Genética.
Orientadora: Profa. Dra. Cristina Yumi Miyaki
São Paulo
2005
Tavares, Erika SendraRelações filogenéticas, biogeografia
histórica e evolução da organização de genesmitocondriais dos psitacídeos neotropicais (triboArini: Psittacidae: Psittaciformes)
86 páginas
Tese (Doutorado) - Instituto de Biociênciasda Universidade de São Paulo. Departamento deBiologia.
1. Psitacídeos neotropicais 2. Filogeniamolecular 3. tribo Arini 4. Organização dos genesmitocondriais I. Universidade de São Paulo.Instituto de Biociências. Departamento deGenética e Biologia Evolutiva.
Comissão Julgadora:
__________________________ __________________________Prof. (a) Dr. (a) Prof. (a) Dr. (a)
__________________________ __________________________Prof. (a) Dr. (a) Prof. (a) Dr. (a)
__________________________ Profa. Dra. Cristina Yumi Miyaki
Ao Rafinha, Tião e Ilka, com
muito amor
Strange fascination, fascinating me,
Changes are taking the pace I am going through,
David Bowie (Changes, “Hunk Dory”, 1971)
Agradecimentos
À Dra. Cristina Yumi Miyaki pela orientação com muita dedicação e carinho, pelo incentivo e
encorajamento de sempre e pelo muito que me ensinou.
Ao Dr. Allan Baker pela oportunidade de estágio e orientação em seu laboratório no Royal
Ontario Museum em Toronto, pela empolgação científica contagiante, por todo carinho, apoio pessoal
e pelas várias explicações sobre muitos assuntos.
Ao Sérgio Luiz Pereira pela orientação técnica e sugestões científicas oferecida sempre com
grande disposição e paciência, pelo companheirismo e dicas de sobrevivência em terras distantes.
Ao Renato Gaban-Lima pela ajuda incondicional, discussões e sugestões sobre os
psitacídeos.
À Dra. Anita Wajntal e à Dra. Elizabeth Höfling pelo interesse e sugestões.
À Camila Ribas pelos conselhos prestimosos durante todo o desenvolvimento da tese,
companheirismo e discussões científicas.
À Melina Baumgarten pelas conversas confortantes, incentivo e apoio em muitos momentos.
Ao Rogério Lourenço por obter as seqüências de Graydidascalus e Triclaria como parte do seu
projeto de iniciação científica, que foram utilizadas no terceiro capítulo dessa tese.
Ao Renato Caparroz pelo empréstimo de livros, materiais e por apresentar grandes amigos no
Canadá.
Aos amigos de laboratório Adriana Oliveira-Marques, Celina Yoshihara, Cibele Biondo, Erwin
Grau, Fábio Raposo, Fernando d’Horta, Fernando Nodari, Flávia Presti, Gustavo Cabanne, Gustavo
Ybazeta, Jacqueline Miller, José Patané, Juliana Oliveira, Maryann Burbidge, Mark Pack, Nadia de
Moraes-Barros, Nicola Wade, Oliver Haddrath, Polyana Andrioni, Ricardo Yassaka, Rodrigo Pessoa,
Sarah Nasser, Tania Matsumoto, Tara Paton, entre outros pela troca de experiências e pelos
momentos agradáveis.
Ao Luis Fábio Silveira pela ajuda prestativa no Museu de Zoologia.
À Dra. Marie Anne Van Sluys e Mariana Cabral de Oliveira.do departamento de Botânica por
permitir o uso do sequenciador automático.
À Elisângela Quedas e Silvia Blanco pela grande ajuda com o seqüênciamento automático.
Ao Dr. Carlos Frederico Martins Menck do Instituto de Biociências pelo empréstimo da chave
do programa de computador.
Às amigas Helenice Hirata, Lucilene da Silva, Maria Andrade, por toda ajuda prestativa,
oferecida sempre com muita disposição.
Aos amigos e colegas de instituição no Brasil e no Canadá Adriana (Adri), Andréia Ramirez,
Antônia Cerqueira (Toninha), Bill, Carla D’Angelo, Cláudia Fábris, Cléber Costa, Cibele Masotti,
Cristiane Iughetti, Fátima, Gisele, Ilana Kohl, Mônica Varela, Patrícia Faria, Roseli Zanelato, Silvia
Geurgas entre tantos outros pela convivência e por compartilhar momentos alegres.
Aos professores do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências
(USP), pela ajuda e sugestões.
Aos funcionários do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva e da pós-graduação do
Instituto de Biociências (USP) e do Royal Ontario Museum pelo suporte.
Às pessoas e instituições que cederam o material biológico utilizado nessa tese: African Safari
Zoo, Parque Ecológico do Tietê, UNESP, Zoológico de Sorocaba, Zoológico de Americana, Zoológico
Cyro-Gevaerd, Fundação Crax, Museu Paraense Emílio Goeldi, Field Museum of Natural History e
aviculturistas.
À Fundação de Amparo a Pesquisa no Estado de São Paulo pelo financiamento da pesquisa,
pela concessão da bolsa de doutorado e pelo financiamento do estágio no Royal Ontario Museum.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, ao Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ao Natural Sciences and Engineering Research
Council of Canada e ao National Science Foundation (AToL) pelo financiamento da pesquisa.
À Lynx Edicións pela permissão de uso das figuras do Handbook of the Birds of the World
volume 4.
Ao Rafinha (Rafael Corrêa) pelo grande apoio, participação e incentivo e por ter tornado todos
esses anos extremamente felizes.
Aos meus pais Sebastião Tavares e Ilka Tavares e aos meus sogros Valmir Corrêa e Lúcia
Corrêa por tudo que me ensinaram, pelo amor, dedicação e prontidão em ajudar.
À Maria Inês Ribeiro Salsa pelo grande suporte, por todo carinho e amor.
Aos meus irmãos Katia Tavares, Leonardo Tavares e Tiago Corrêa pelos períodos alegres,
pelo incentivo e por toda ajuda.
À todos os demais membros da minha família e aos meus amigos pelo apoio nos períodos
difíceis e por compartilharem os momentos felizes.
Índice
Resumo 1
Abstract 2
Capítulo 1: Introdução geral 3
Capítulo 2: Relações filogenéticas e biogeografia histórica dos psitacídeos
neotropicais (tribo Arini) com base em seqüências de DNA mitocondrial
e nuclear 28
Capítulo 3: Evolução da organzação dos genes mitocondriais ao redor da região
controladora em psitacídeos Neotropicais 61
Capítulo 4: Considerações finais 83
1
Resumo
Com a finalidade de entender melhor as relações filogenéticas entre os psitacídeos neotropicais
(tribo Arini), foram seqüenciados 6416 pares de bases de genes nuclear (RAG-1) e mitocondriais
(citocromo b, NADH2, ATPase 6, ATPase 8, COIII, DNAr 12S e DNAr 16S) de 29 espécies
pertencentes a 25 dos 30 gêneros reconhecidos atualmente. As análises filogenéticas utilizando os
métodos de máxima verossimilhança e análise bayesiana evidenciaram que, dentre os psitacídeos
neotropicais, o clado formado por Nannopsittaca e Bolborhynchus é grupo irmão de todos os outros
gêneros, que por sua vez são agrupados em dois clados. Esses clados compreendem: um grupo de
papagaios, caturritas, curicas e afins e outro grupo que inclui as araras, marianinhas, tiriba e afins. A
datação molecular utilizando uma calibração geológica (separação da Nova Zelândia há 82-85 milhões
de anos, ma) sugere que os psitacídeos neotropicais compartilharam ancestral comum com um grupo
de psitacídeos Australianos no final do Cretáceo (65 ma), portanto a divergência dessas linhagens
poderia ser atribuída ou intensificada pela separação dos continentes. Os ancestrais dos psitacídeos
neotropicais atuais poderiam estar distribuídos na América do Sul e Antártica ou somente no primeiro
continente. Hipóteses da diversificação no grupo foram levantadas relacionando fatores históricos com
os padrões de cladogênese encontrados.
Seqüências mitocondriais da região controladora e regiões flanqueadoras determinadas para
vários táxons de psitacídeos neotropicais evidenciaram a existência de dois arranjos gênicos.
Nannopsittaca dachilleae, Bolborhynchus lineola, Myiopsitta monachus, Brotogeris chiriri, Ara
ararauna, Anodorhynchus hyacinthinus, Cyanoliseus patagonus, Cyanopsitta spixii, Diopsittaca nobilis,
Enicognathus lepthorhynchus, Guarouba guarouba, Orthopsittaca manilata, Primolius auricollis,
Pyrrhura picta e Rhynchopsitta pachyryncha apresentam a ordem dos genes descrita inicialmente em
Gallus gallus e posteriormente sugerida como o arranjo mais freqüente em aves. Graydidascalus
brachyurus, Pionopsitta pileata, Pionopsitta barrabandi, Triclaria malachitacea, Deroptyus accipitrinus,
Pionites leucogaster e Forpus crassirostris revelaram um rearranjo de genes com duplicação da região
controladora, como descrito inicialmente para psitacídeos neotropicais dos gêneros Amazona e
Pionus. Em Deroptyus e Pionites também foram encontrados pseudogenes exclusivos. Com base no
mapeamento dessas duas organizações gênicas na filogenia proposta para o grupo (manuscrito 1,
anexo) propusemos dois mecanismos para explicar a distribuição da ordem gênica no grupo. No
primeiro, poderia ter ocorrido três eventos de duplicação de genes seguido de três eventos de deleção
que poderiam levar ao arranjo com a duplicação da região controladora. Alternativamente, teria
ocorrido um único evento de duplicação de genes seguido de cinco eventos independentes de deleção
de genes, dois reverteriam para a organização original e três dariam origem à ordem alternativa.
Ambos os cenários assumem convergência e seis eventos envolvendo duplicação ou deleção de
genes.
2
Abstract
To clarify the phylogenetic relationships among the genera of Neotropical parrots we analyzed
6416 base pairs of nuclear (RAG-1) and mitochondrial DNA sequences (cytochrome b, NADH2,
ATPase 6, ATPase 8, COIII, 12S rDNA, and 16S rDNA) from 29 species belonging to 25 out of the 30
genera. Phylogenetic analyses using maximum likelihood and Bayesian methods showed that within
Neotropical parrots, Nannopsittaca and Bolborhynchus form the sister clade to all other genera, which
in turn are grouped in two distinctive clades. These two derived clades partition amazons and their
allies from macaws, conures, and related taxa. Molecular dating with a geological calibration for the
separation of New Zealand (82-85 million years, Myr) suggests that the Neotropical parrots shared a
common ancestor with Australian parrots around the end of the Cretaceous (65 Myr), and thus, their
divergence could be explained by vicariance. The three Neotropical clades may have diverged while
they were in the Antarctica-South America block, or in South America only. Hypothesis of the
diversification in these groups relating historical factors and cladogenesis pattern in were proposed.
Sequences of the mitochondrial control region and flanking genes of Ara ararauna,
Anodorhynchus hyacinthinus, Bolborhynchus lineola, Brotogeris chiriri, Cyanoliseus patagonus,
Cyanopsitta spixii, Diopsittaca nobilis, Enicognathus leptorhynchus, Guarouba guarouba, Myiopsitta
monachus, Nanopsittaca dachilleae, Orthopsittaca manilata, Primolius auricollis, Pyrrhura picta, and
Rhynchopsitta pachiryncha show the same gene arrangement first described in Gallus gallus, (which is
the most common mitochondrial genome arrangement in birds). Sequences of the same region in
Amazona xanthops, Deroptyus accipitrinus, Forpus crassirostris, Graydidascalus brachyurus,
Pionopsitta pileata, Pionopsitta barrabandi, Pionites melanocephala, and Triclaria malachitacea
revealed an arrangement of genes with a duplication of the control region, as previously reported in
Neotropical parrots from the genera Amazona and Pionus. Exclusive pseudogenes occur in Deroptyus
and Pionites. The mapping of these characters in a phylogenetic proposal for the group suggests
ambiguity on the inference of the ancestral states of the clades. Two models were proposed and
compared, considering six events of duplication and deletion of genes.
Capítulo 1
Introdução
Capítulo 1
4
1.1. Apresentação Geral
Na presente tese as relações evolutivas entre psitacídeos neotropicais foram estudadas pela
análise de seqüências de DNA nuclear e mitocondrial. Os resultados foram comparados com
classificações e propostas sistemáticas prévias. Foram realizadas estimativas dos tempos de
divergência entre as linhagens, a partir das quais foram levantadas hipóteses biogeográficas.
Adicionalmente, a evolução da ordem dos genes mitocondriais ao redor da região controladora foi
estudada.
A tese está organizada em capítulos. O presente capítulo 1 é uma introdução geral que
descreve o contexto no qual o trabalho se insere, com ênfase nos organismos estudados e métodos de
análise utilizados. Já nos capítulos 2 e 3 são apresentados os dados obtidos em forma de manuscritos
a serem submetidos para publicação. O último capítulo se refere às considerações finais referentes
aos manuscritos.
1.2. Psitacídeos
1.2.1. Informações sistemáticas e filogenéticas
A ordem Psittaciformes inclui as araras, papagaios, periquitos, maracanãs e cacatuas. A
principal característica compartilhada pelos táxons pertencentes ao grupo é a forma do bico, cuja
maxila superior é curva e envolve a maxila inferior (Smith, 1975; Forshaw, 1989; Sibley e Alquist,
1990). Propostas filogenéticas recentes com base em evidências moleculares e morfológicas (Sibley e
Alquist, 1990; Cooper e Penny, 1997; Cracraft, 2001; Livezey e Zusi, 2001; Mayr e Clarke, 2003;
García-Moreno e col., 2003; Harrison e col., 2004) sugerem que o grupo faz parte das Neoaves de
Neognathae, porém sua posição filogenética em relação às demais ordens de Neoaves ainda não é
bem resolvida (Figura 1.1).
Figura 1.1. Relações filogenéticas entre os grandes grupos de aves (modificado de García-Moreno e
col., 2003).
Capítulo 1
5
Os Psittaciformes são uma das ordens de aves mais abundantes em número de espécies,
incluindo cerca de 350 espécies (distribuídas em 84 gêneros). Ocorrem no neotrópico, região africana,
sul asiática e australiana (Forshaw, 1989, Collar, 1997; Rowley, 1997) (Figura 1.2).
30 gêneros 4 gêneros 50 gêneros
Figura 1.2. Distribuição dos gêneros da ordem Psittaciformes (del Hoyo e col., 1997).
Atualmente são reconhecidas duas famílias na ordem, Cacatuidae (inclui as subfamílias
Calyptohynchinae, Cacatuinae e Nymphicinae) e Psittacidae (Loriinae e Psittacinae) (Forshaw, 1989,
Collar, 1997; Rowley, 1997). No entanto, estudos filogenéticos recentes evidenciaram que a família
Psittacidae como é reconhecida atualmente não é monofilética. Análises filogenéticas do gene nuclear
RAG-1 e de íntrons localizados nos cromossomos sexuais de um grande número de gêneros da ordem
Psittaciformes sugerem que os gêneros Strigops (tribo Strigopini: Psittacinae: Psittacidae) e Nestor
(Nestorini: Psittacinae: Psittacidae) exclusivos da Nova Zelândia são grupo irmão de todos os demais
gêneros de psitacídeos atuais (Barrowclough e col., 2004; de Kloet e de Kloet, 2005), Cacatuidae é o
próximo clado monofilético e é grupo irmão das demais tribos da família Psittacidae (Barrowclough e
col., 2004).
Os psitacídeos neotropicais formam o grupo de espécies mais numeroso da ordem (com cerca
150 espécies) e atualmente inclui 30 gêneros (Collar, 1997). Apresentam uma grande variação de
tamanho, preferência de hábitat, distribuição geográfica e comportamento (Forshaw, 1989). A
Capítulo 1
6
sistemática dos gêneros neotropicais sofreu diversas modificações ao longo do tempo (ex. Salvadori,
1891; Miranda-Ribeiro, 1920; Peters, 1937; Pinto, 1937, 1978; Forshaw, 1989; Sick, 1997; Collar,
1997). Alguns sistematas, com base em morfologia externa, anatomia e comportamento (Salvadori,
1891; Boetticher, 1943, 1959; Verheyen, 1956; Brereton, 1963) distribuíam os gêneros neotropicais em
dois grupos de composição variável, em alguns casos incluindo táxons de outras regiões geográficas
(Tabela 1.1).
Tabela 1.1. Grupos de gêneros de psitacídeos neotropicais (em alguns casos incluindo gêneros
africanos, sublinhados). Os nomes dos gêneros correspondem à Collar (1997), exceto Propyrrhura
para o qual foi adotado Primolius (Penhallurick, 2001).
Autores Grupos
Salvadori(1891)
Pioninae : Amazona, DeroptyusGraydidascalus, HapalopsittacaPionites, Pionus, Pionopsitta,Triclaria, Touit, Poicephalus
Conurinae: Anodorhynchus, Ara, Aratinga,Bolborhynchus, Cyanoliseus, Cyanopsitta,Diopsittaca, Enicognathus, Forpus, Guarouba,Leptosi t taca, Myiopsi t ta, Nandayus,Nannopsittaca, Ognorhynchus, Orthopsittaca,Pr imo l ius , Ps i lops iagon, Pyr rhura ,Rhynchopsitta
Verheyen(1956)
Amazoninae: Amazona, DeroptyusGraydidascalus, Pionites, Pionus,Pionopsitta, Triclaria, Touit.
A r i n a e : Anodorhynchus, Ara, Aratinga,Bolborhynchus, Brotogeris, Cyanoliseus,Cyanopsitta, Diopsittaca, Enicognathus,Forpus, Guarouba, Leptosittaca, Myiopsitta,Nandayus, Nannopsittaca, Ognorhynchus,Orthopsittaca, Primolius, Psilopsiagon,Pyrrhura, Rhynchopsitta
Boetticher(1943, 1959)
Psi t tac in i : Amazona, DeroptyusGraydidascalus, HapalopsittacaPionites, Pionus, Pionopsitta,Tr ic lar ia, Touit , Poicephalus,Psittacus, Coracopsis
Arain i : Anodorhynchus, Ara, Aratinga,Bolborhynchus, Cyanoliseus, Cyanopsitta,Diopsittaca, Enicognathus, Forpus, Guarouba,Leptosi t taca, Myiopsi t ta, Nandayus,Nannopsittaca, Ognorhynchus, Orthopsittaca,Pr imo l ius , Ps i lops iagon, Pyr rhura ,Rhynchopsitta
Brereton(1963)
Forpidae: Forpus, Bolborhynchus,Psilopsiagon
Amazonidae: Anodorhynchus, Ara, Aratinga,Pionites, Pyrrhura, Pionopsitta, Deroptyus,Amazona, Brotogeris, Pionus
Smith (1975)
A r i n i : Amazona, Anodorhynchus, Ara, Aratinga, Bolborhynchus, Brotogeris,Cyanoliseus, Cyanopsitta, Deroptyus, Diopsittaca, Enicognathus, Forpus,Graydidascalus, Guarouba, Hapalopsittaca, Leptosittaca, Myiopsitta, Nandayus,Nannopsittaca, Ognorhynchus, Orthopsittaca, Pionites, Pionopsitta, Pionus, Primolius,Psilopsiagon, Pyrrhura, Rhynchopsitta, Triclaria, Touit
Miyaki e col.(1998)
Cauda curta: Amazona, PionusCauda longa: Anodorhynchus, Ara, AratingaCyanopsit ta, Deroptyus, Diopsit taca,Guarouba, Pyrrhura
de Kloet e deKloet (2005)
Amazona, Forpus,Graydidascalus,Pionus, Triclaria
Myiopsitta,Brotogeris
Anodorhynchus, Ara, Aratinga, Cyanoliseus,Deroptyus, Guarouba, Pionites, Pyrrhura,Rhynchopsitta
Verheyen (1956) agrupou exclusivamente táxons neotropicais nas famílias Amazoninae e
Arinae e sugeriu que esses grupos compartilham características morfológicas (presença de quatro
Capítulo 1
7
vértebras dorsais, uma única carótida dorsal, entre outras) que os distinguem dos psitacídeos das
demais regiões geográficas, mas não sugeriu uma categoria para agrupá-los. Em uma revisão
abrangente da sistemática da ordem Psittaciformes, Smith (1975) agrupou todos os táxons
neotropicais na tribo Arini (família Psittacidae) com base em dois caracteres exclusivos (eclosão dos
filhotes com canal auditivo imperfurado e postura copulatória em uma perna) e outros caracteres
comuns, porém não exclusivos (fórmula carótida do tipo A-2-s, bicos marrons, pretos ou brancos,
sistema de coloração das penas com padrão “Dyck-texture” que inclui cor verde, com azul e/ ou
vermelho) e considerou artificiais os agrupamentos internos até então propostos na tribo (Tabela 1.1).
Na falta de
de p Tf (na ) Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824cm BT 41 0 0 -47405.59 940 Tm /F2.0 1 Tf (de ) Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824 cm BT 41 0038-41 405.59 940 Tm /F2.0 Smithf (cor ) Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18824 cm BT 41 0 0514.83405.59 940 Tm /F2.0 (0 -5rmel(cor ) T ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824cm BT 41 0 06641 1605.59 940 Tm /F2.(fo(inclui ) Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824 cm BT 41 0 0 -416405.89 748Tm /F2.0 aceip Tf (na ) Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824cm BT 41 0087416 405.59 940 Tm /F2.0 eTf (com ) Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824cm BT 41 0 0950.7 405.59 940 Tm /F2.0 to1 Tf (das ) Tj ET Q q 0.240 0 -0.24 18 824 cm BT 41 0 0 -7.61605.59 940 Tm /F2.0 asf (de ) Tj ET 470458276709 Tc q 0.24 0 0 -0.24 18 824 cm BT 41 0 0 -4103689 748Tm /F2.0 classf (a(colora33enternos ) Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824cm BT 41 0 489.144103656748 Tm /F2.0 1 (periorenternos ) Tj ET Q q0.24 0 0 -0.24 18 824 cm BT 41 0 70741 34103656748 Tm /F2.0 (ex.Tabela )Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824 cm BT 41 0 79 0 244103656748 Tm18 824Forshawarrons, ) Tj ET Q q 0.24 0 0 -0.24 18 824 cm BT 41 0 0 -4184103656748 Tm /F2.0 1989;iciais rrons, de na tribo
c o m t ( a ( n t e r n o s ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 1 2 4 2 . 4 9 6 1 1 3 1 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 d n t ‹ o ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 3 0 7 4 4 6 1 1 3 1 5 6 7 4 8 T m 1 8 8 2 4 g 1 T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 1 9 . 1 3 1 1 3 1 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 n u c l e a r t e r n o s B a r r o w c l o u g h T a b e l a
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c o r d e d e d e d e c m B T 4 1 0 0 7 0 0 . 6 6 4 1 2 2 7 5 6 7 ( r m e l ( c o r ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 7 3 1 . 5 2 4 1 2 2 7 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 ( 1 T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 8 0 8 . 9 5 4 1 2 2 7 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 K l o e t T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 1 9 2 1 . 5 4 4 1 2 2 7 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 9 6 1 . 5 5 - 2 2 7 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 1 T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B 4 1 0 2 0 2 4 . 8 4 4 1 2 2 7 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 K l o e t , 1 . 1 ) . ) T j 4 7 6 7 0 9 T c q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 - 4 1 3 2 3 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 2 T 5 ) , m e n c i o n a d ( n t a T e r i o r m 1 T e . a b e l a ) T j E T 0 4 5 8 0 7 4 7 6 7 0 9 T c q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 3 7 0 0 1 9 8 9 7 4 8 T m / F 2 . 0 A s T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 4 3 1 . 6 7 9 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 r ( ( T f 5 › e n t e r n o s ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 6 0 1 1 6 1 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 e v o l u t i v ( n t e r n o e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 7 9 9 . 2 6 3 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 n t r T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 9 0 7 4 1 0 0 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 o s T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B 4 1 0 9 6 4 1 2 4 5 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 g • n e r o s T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 1 2 7 4 1 8 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 1 T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 1 1 8 6 . 6 2 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 p s i t a c ’ d e o s t ‹ o a ( i n t e r n o s ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 1 6 4 6 . 3 3 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 t a m r o n s , c m B T 4 1 0 0 7 1 5 . 2 4 4 1 1 9 5 6 7 ( b T f ( m ‹ o c m B T 4 1 0 0 7 9 5 . 5 6 4 1 1 9 5 6 7 ( e l ( c o r ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 8 0 9 . 0 2 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 c o m r o n s , c m B T 4 1 0 0 8 8 7 . 0 0 - 1 9 5 6 7 ( e T f 5 a r a m r o n s , c m B T 4 1 0 2 0 2 4 . 8 8 4 1 1 9 5 6 7 ( e l ( c o r ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 2 0 3 8 . 3 3 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 a t e r n o e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 2 0 7 4 . 7 8 4 1 1 9 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 s e r 1 . 1 ) . ) T j E T 0 9 7 4 6 2 4 7 6 7 0 9 T c q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B 4 1 0 2 - 4 1 5 1 5 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 m e l h o r t e r n o s ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 3 6 3 . 5 0 7 4 1 5 1 5 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 c o m p r e e n d i d ( n t e r n o e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 6 6 4 1 8 2 1 4 1 5 1 5 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 a t r a v T f ( n t e r n o s ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 8 1 7 . 8 5 7 4 1 5 1 5 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 1 T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 8 8 E T 4 7 4 1 5 1 5 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 e s t u d o s T f ( d e ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 0 4 2 . 2 3 5 1 5 1 5 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 1 T f 2 1 3 o ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 0 1 0 4 . 4 2 4 1 5 1 5 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 f i l o g 1 i a t e r n o s ) T j E T Q q 0 . 2 4 0 0 - 0 . 2 4 1 8 8 2 4 c m B T 4 1 0 1 2 7 6 . 5 3 5 1 5 1 5 5 6 7 4 8 T m / F 2 . 0 m o l e c u l a r . t e r n o s d e d e
d e
d e
d e d e d e
d e
d e d e d e
Capítulo 1
8
Esse conjunto de dados foi ampliado para um total de 3.245 pb com a adição dos genes
mitocondriais citocromo oxidase I e região controladora e um total de 13 espécies de psitacídeos
neotropicais (Tavares, 2001; Tavares e col. 2004), com a finalidade de entender melhor as relações
filogenéticas entre os gêneros pertencentes a um dos grupos obtidos anteriormente (Miyaki e col.,
1998). Entre os resultados obtidos nessas novas análises, Myiopsitta monachus não agrupa com os
demais táxons de cauda longa (Tavares, 2001), algumas espécies de mesmo gênero formam clados
monofiléticos e um agrupamento nunca mencionado entre os gêneros monoespecíficos Guarouba
guarouba e Diopsittaca nobilis foi recuperado (Figura 1.4). No estudo filogenético de íntrons localizado
nos cromossomos sexuais Z e W três grupos de gêneros neotropicais foram recuperados (Tabela 1.1;
de Kloet e de Kloet, 2005), sendo que dois dos mesmos apresentaram composição semelhante aos
grupos obtidos nas análises filogenéticas anteriores (Miyaki e col., 1998; Tavares e col. 2004). No
entanto, as relações entre os grupos e entre os gêneros pertencentes a cada um desses grupos
permaneceram desconhecidas. Adicionalmente, filogenias dos níveis taxonômicos de gênero e espécie
sugeriram a ausência de monofiletismo nos gêneros Aratinga, Amazona e Pionopsitta (Tavares, 2001;
Tavares e col., 2004; Ribas e Miyaki, 2004; Russello e Amato, 2004; Ribas e col., 2005).
a) b)
Figura 1.4. Relações filogenéticas entre gêneros de psitacídeos neotropicais com base em seqüênciasde DNA mitocondrial. a) por máxima verossimilhança com base em 2.332 pb, números correspondemao suporte por “quartet puzzle” (Tavares, 2001); b) por máxima verossimilhança com base em 3.246pb, números correspondem ao suporte por “bootstrap”: máxima parcimônia/ máxima verossimilhança(Tavares e col., 2004).
Capítulo 1
9
1.2.2. Importância da tribo Arini para a biologia evolutiva
O estudo das relações evolutivas entre as linhagens de psitacídeos neotropicais é necessário
para entender vários aspectos evolutivos, já que além de numeroso (inclui cerca de 150 espécies), é
um grupo relativamente heterogêneo. Estão distribuídos por toda a região neotropical, onde
apresentam padrões de exploração de hábitats muito variáveis. Algumas espécies são endêmicas a
regiões muito particulares, como Cyanopsitta spixii em mata ciliar aberta na região de Curaçá e
Guarouba guarouba em floresta de terra firme ao norte do Maranhão e Pará, enquanto outras se
distribuem em amplas áreas, como Ara ararauna que ocorre em buritizais, babaçuais e beira de mata
da América Central ao sul do Brasil e Aratinga leucophthalmus em orlas de mata das Guianas à
Argentina (Collar, 1997; Sick, 1997; Forshaw, 1989). Existe uma grande variação de tamanho,
coloração de plumagem e comportamento entre as linhagens. Por exemplo, as menores espécies,
pertencentes ao gênero Forpus, pesam 25 gramas, enquanto a arara-azul grande, Anodorhynchus
hyacinthinus, pesa cerca de 1500 gramas (Sick, 1997; Forshaw, 1989). Quanto à coloração, algumas
espécies são predominantemente verdes (ex. espécies dos gêneros Amazona, Pionus, Pyrrhura e
Enicognathus), outras são vermelhas (ex. Ara macao e Ara chloroptera), azuis (ex. Anodorhynchus e
Cyanopsitta) ou amarelas (ex. complexo Aratinga solstitiais e Guarouba guarouba). Nidificam em
paredões rochosos (ex. Anodorhynchus leari), ocos (ex. Cyanopsitta, Nandayus), cupinzeiros (ex.
Aratinga aurea) ou constróem ninho de gravetos (exclusivamente Myiopsitta monachus) (Collar, 1997).
Alguns gêneros como Pionopsitta, Aratinga, Pyrrhura, Pionites, Touit, Forpus, Brotogeris e
Amazona incluem espécies e subespécies com distribuições restritas, sendo bons modelos para
estudos de padrões biogeográficos (vide Ribas, 2004; Ribas e Miyaki, 2004; Russello e Amato, 2004;
Ribas e col. 2005). No entanto, a falta de conhecimento das relações entre gêneros, dificulta a escolha
de bons grupos externos. Além disso, alguns gêneros monotípicos, são representantes únicos de
algumas das linhagens atuais que estão seriamente ameaçados de extinção, por exemplo, Cyanopsitta
spixii e Guarouba guarouba, o que torna urgente a necessidade de estudar vários aspectos dessas
espécies, inclusive suas posições filogenéticas, afim de se obter mais informação a respeito dos
mesmos antes que sejam extintos. Muitas espécies de psitacídeos neotropicais são vulneráveis ou
ameaçadas de extinção e o conhecimento de suas relações evolutivas pode auxiliar trabalhos mais
específicos voltados aos planos de conservação e manejo (Collar e col., 1992; Beissinger, 2000;
Owens e Bennet, 2000).
Capítulo 1
10
1.2.3. Biogeografia
Com base na atual distribuição das espécies (Figura 1.2) e no registro fóssil, Glenny (1954)
sugeriu que a ordem Psittaciformes se originou no continente antártico após o limite entre o Cretáceo-
Terciário, a partir do qual as espécies dispersaram para os continentes sul-americano, Austrália e
Nova Zelândia e a colonização africana teria ocorrido por migrações transoceânicas. Também com
base na distribuição dos gêneros atuais, porém assumindo uma idade mais antiga para a origem do
grupo, Cracraft (1973, 2001) sugeriu que a ordem Psittaciformes, entre outras ordens de aves com
distribuição semelhante, possivelmente se originou no antigo continente da Gondwana e que a
separação dos blocos desse grande continente teve uma função importante na diversificação das
primeiras linhagens desses grupos.
Algumas evidências recentes vêm corroborando a hipótese de origem na Gondwana para o
grupo. Estudos de datação molecular sugerem que a diversificação de Neoaves e Galloanserae
(Figura 1.1), ocorreu entre 80-110 milhões de anos (ma; Hedges e col., 1996; Cooper e Peny, 1997;
van Tuinen e Hedges, 2001; Paton e col., 2002). Corroborando essa idéia, foi reanalisado
recentemente um fóssil de ave (Vegavis iaai), posicionado filogeneticamente na ordem Anseriformes e
datado de 66-68 ma, o que sugere que pelo menos a ordem atual Anseriformes já estaria diferenciada
antes do limite entre o Cretácio-Terciário (Clarke e col., 2005). Adicionalmente, os dados recentes de
filogenia molecular de psitacídeos sugerem que os gêneros da Nova Zelândia são grupo irmão dos
demais táxons atuais e o padrão de diversificação dos demais grupos seguindo um padrão coincidente
com a separação dos continentes também reforçam uma possível origem na Gondwana
(Barrowclough, 2004; de Kloet e de Kloet, 2005). Um padrão semelhante é descrito em Passeriformes
(Ericson e col. 2003).
O registro fóssil de Psittaciformes não contribui para elucidar essa e outras questões. O fóssil
mais antigo descrito como psitacídeo é uma mandíbula inferior encontrado na região de Wyoming nos
EUA e data de mais de 65 ma (Stidham, 1998). Apesar disso, a identificação morfológica das
estruturas do fóssil como sendo uma mandíbula de psitacídeo foi fortemente questionada (Dyke e
Mayr, 1999). Outros fósseis de Psittaciformes, porém sem posição filogenética conhecida, foram
descritos na França (sítio arqueológico “La Bouffie”), no período Eoceno superior (por volta de 50 ma).
Devido a diferenças osteológicas em relação aos demais psitacídeos atuais, foram considerados
pertencentes a uma família à parte, Quercypsittidae, atualmente extinta (Chauviré, 1992). Um outro
fóssil de psitacídeo, também encontrado na França, é o Archaeopsittacus verreauxi, datado entre o
Oligoceno Superior e o Mioceno Inferior (Forshaw, 1989). Além destes, existem fósseis de gêneros
Capítulo 1
11
atuais mais recentes que datam dos períodos Terciário (Boles, 1993; Boles, 1998) e Quaternário
(Collar, 1997).
Datações moleculares sugerem que a separação entre o periquito australiano (Melopsittacus
undulatus) e alguns táxons neotropicais ocorreu por volta de 76 ma (Miyaki e col., 1998) o que também
estaria de acordo com a hipótese de que a separação dos continentes teve um papel importante na
diversificação desses grupos. A divergência entre os gêneros de psitacídeos neotropicais foi estimada
entre o Eoceno-Oligoceno e durante o Mioceno (16-27 ma) e foi associada a mudanças ambientais em
consequência de mudanças no nível do mar, orogenia dos Andes e expansão de ambientes de floresta
e de áreas secas (Miyaki e col., 1998; Tavares e col., 2004). Já o intervalo de divergências entre
espécies do mesmo gênero de psitacídeos foi estimado entre 0,5 e 1,3 ma (Tavares e col., 2004; Ribas
e Miyaki, 2004; Ribas e col., 2005).
1.3. Inferências filogenéticas baseadas em seqüências de DNA
1.3.1.Aspectos gerais
Filogenias são baseadas no princípio de que todos os organismos atuais e extintos são
interligados por relações de ancestralidade comum. A principal meta dos estudos filogenéticos é
levantar as hipóteses mais prováveis sobre história evolutiva entre os organismos. Com base no
princípio de ancestralidade comum, a evolução ocorre por processos de ramificação, onde uma
linhagem se divide em duas ou mais, portanto, as hipóteses sobre as relações evolutivas entre os
organismos são ilustradas em gráficos chamados de árvores filogenéticas. O padrão de ramificação de
uma árvore é chamado de topologia (Graur e Li, 2000). Muitas são as aplicações dos estudos
filogenéticos, entre elas, estabelecer sistemas de classificação biológica que refletem a evolução dos
organismos e permitir interpretações de diversos processos evolutivos morfológicos, moleculares e
biogeográficos. Com o desenvolvimento das técnicas moleculares, surgiu a filogenia molecular, ou
seja, o estudo das relações evolutivas entre os organismos pelo uso de marcadores moleculares
(Moritz e Hillis, 1996; Graur e Li, 2000).
Sibley e Alquist (1990) realizaram um dos primeiros trabalhos de maior impacto na área
molecular de aves. Esses autores utilizaram a técnica de hibridação DNA-DNA entre pares de táxons
representantes de praticamente todas as ordens de aves a fim de tentar entender as relações entre
esses grupos. Apesar dos vários resultados significativos que eles obtiveram, problemas
metodológicos e empíricos permaneceram sem solução e muitas das relações ainda não foram
resolvidas (Garcia-Moreno e col., 2003). Recentemente, seqüências de DNA mitocondriais e nucleares
Capítulo 1
12
têm sido muito empregadas em reconstruções filogenéticas em diferentes níveis taxonômicos de aves
(ex. Miyaki e col., 1998, Haddrath e Baker, 2001; Pereira e col., 2002, Paton e col., 2002; Nahum e
col., 2003; Harrison e col., 2004).
1.3.2. Heterogeneidade de taxas de substituição de nucleotídeos e modelagem
O princípio básico das inferências filogenéticas com base em seqüências de DNA, é que a
partir da divergência entre dois táxons, o número de diferenças nas suas seqüências homólogas de
DNA aumentaria proporcionalmente ao longo do tempo. No entanto, a comparação de seqüências
homólogas entre os táxons revelou que cada sítio evolui sob condições muito particulares. Em alguns
casos essas diferenças podem ser associadas a uma pressão seletiva devido à sua função. Por
exemplo, em genes codificadores de proteínas, os sítios correspondentes à terceira posição do códon
estão mais sujeitos à variação do que os correspondentes à primeira e à segunda posição, porque
mutações na terceira posição alteram menos frequentemente o aminoácido correspondente devido à
natureza degenerada do código genético (Graur e Li, 2000; Nei e Kumar, 2000). Essa heterogeneidade
faz com que em alguns conjuntos de dados existam sítios tão conservados que não apresentam
substituições entre táxons distantemente relacionados, enquanto em outros sítios a variação é muito
grande, a ponto de mascarar o sinal filogenético devido à presença de substituições múltiplas mesmo
entre linhagens próximas taxonomicamente. Esse problema é ainda maior nas inferências filogenéticas
entre grupos taxonômicos mais distantemente relacionados (Swofford, 1996; Holder e Lewis, 2003;
Felsenstein, 2004).
Além disso, alguns tipos de substituições entre os sítios ocorrem com maior freqüência do que
outros e as substituições também estão sujeitas à freqüência de bases que ocorre no segmento
estudado. Todos esses fatores mencionados podem interferir nas inferências filogenéticas aumentando
o número de substituições paralelas ou reversões de estado, que não podem ser detectados pela
simples comparação das seqüências dos táxons atuais. No entanto, foram desenvolvidos diversos
modelos evolutivos que descrevem o padrão de substituição de nucleotídeos no DNA em diferentes
conjuntos de dados. Existem diferentes testes e critérios para escolher o modelo evolutivo mais
adequado para um conjunto de dados, como o teste de razão de verossimilhança (“likelihood ratio
test”, Felsenstein, 1988; Posada, 2003) e o critério de informação Akaike (Posada e Crandall, 1998;
Posada, 2003) e, em geral, os valores dos parâmetros são estimados a partir dos dados (Swofford e
col., 1996). Na presente tese, foram empregados os métodos de máxima verossimilhança e análise
Capítulo 1
13
bayesiana (descritos a seguir) que incorporam modelos evolutivos explícitos (Swofford, 1996; Holder e
Lewis, 2003; Felsenstein, 2004) .
1.3.3. Máxima verossimilhança
O método da máxima verossimilhança busca a hipótese filogenética com maior probabilidade
de explicar a distribuição dos estados de caráter nos táxons atuais, com base em um modelo evolutivo
previamente definido e estados de caracteres observados nos terminais da árvore filogenética
(Swofford e col., 1996). Dessa forma, para uma dada hipótese, representada na forma de uma
topologia, a probabilidade para as combinações considerando cada possível ancestral de cada nó
interno devem ser calculadas com base no modelo evolutivo. Por esse método, diversas hipóteses são
testadas pela multiplicação das suas probabilidades para cada caráter, que em estudos moleculares
são cada sítio de DNA.
Por ser um critério de otimização, para se escolher a melhor topologia pela máxima
verossimilhança, em princípio todas as topologias possíveis para explicar a história evolutiva dos
táxons devem ser testadas. No entanto, dependendo do número de táxons na análise, o cálculo da
probabilidade para todas as possíveis topologias pode ser extremamente demorado
computacionalmente. Por causa disso, foram desenvolvidas diferentes estratégias de buscas
heurísticas, que visam encontrar a melhor topologia, sem necessariamente amostrar todas as
topologias possíveis, tornando o método aplicável para grandes conjuntos de dados, apesar de
aumentar o risco de a melhor topologia não ser amostrada (Swofford e col., 1996; Holder e Lewis,
2003; Felsenstein, 2004).
Uma das formas mais utilizadas para avaliar o quanto os dados sustentam cada clado da
melhor topologia obtida por máxima verossimilhança é o “bootstrap” não paramétrico. Pelo “bootstrap”
a matriz de dados originais é re-amostrada com reposição para gerar várias pseudo-réplicas, a partir
das quais a melhor topologia para cada uma é encontrada. Uma topologia consenso dessas árvores é
gerada e o número de vezes que cada clado aparece nessas topologias é representado
probabilisticamente. Dessa forma, esse algoritmo permite availar que partes da topologia são menos
suportadas pelo conjunto de dados (Holder e Lewis, 2003).
1.3.4. Análise Bayesiana
A inferência filogenética por análise bayesiana é baseada no conceito de probabilidade
posterior das hipóteses filogenéticas. A probabilidade posterior de uma topologia pode ser interpretada
Capítulo 1
14
como a sua probabilidade de ser a que representa a verdadeira história evolutiva do grupo de
organismos estudados, portanto por esse método a topologia com a maior probabilidade posterior deve
ser a melhor estimativa da evolução do grupo. Para calcular a probabilidade posterior é usado o
teorema de Bayes que combina a probabilidade a priori da topologia, com sua probabilidade de
explicar a distribuição dos estados de caráter nos táxons atuais com base em um modelo evolutivo
(verossimilhança). A probabilidade a priori de uma topologia é definida como sua probabilidade com
base em dados independentes dos dados que serão usados na análise, por exemplo, pode ser gerada
a partir da taxonomia vigente do grupo (Holder e Lewis, 2003). Diferentemente da verossimilhança,
onde os valores de parâmetro do modelo evolutivo são pré definidos, em um contexto bayesiano, a
escolha da melhor topologia implica em calcular a probabilidade posterior para todas as hipóteses,
assim como sua integração com todas as possíveis combinações de tamanho de ramos e valores dos
parâmetros dos modelos de substituição de nucleotídeos (Huelsenbeck e col., 2001; Holder e Lewis,
2003; Felsenstein, 2004). Mesmo com a utilização de buscas heurísticas, é impossível realizar todo
esse cálculo analiticamente, portanto a aproximação das probabilidades posteriores das topologias é
realizada através da cadeia Markov de Monte Carlo (“Markov chain Monte Carlo”- MCMC)
(Felsenstein, 2004).
O algorítmo MCMC gera uma cadeia conceitual no espaço de parâmetros (que são as
topologias possíveis, com todas as combinações de parâmetros do modelo evolutivo) através de uma
seqüência de passos. A partir de uma topologia inicial qualquer do espaço, é gerada uma nova
topologia pela perturbação de alguns parâmetros do modelo evolutivo. Essa nova topologia é aceita ou
não em comparação com a anterior, de acordo com um teste estatístico descrito por Metropolis e col.
(1953). Cada comparação entre topologias corresponde a uma geração da cadeia. Na maior parte das
vezes são aceitas as topologias com maior probabilidade, porém esse procedimento é intercalado pela
escolha de topologias com menor probabilidades em algumas gerações, para favorecer a mudança de
localização no espaço de parâmetros. Repetindo esse processo milhões de vezes, uma grande cadeia
de localizações no espaço de parâmetros é criada. Ao atingir regiões de alta probabilidade posterior,
dificilmente são aceitos movimentos para regiões de probabilidade mais baixa no espaço de
parâmetros. A proporção de vezes que uma topologia é visitada, após a cadeia atingir o equilíbrio, é
uma aproximação válida da sua probabilidade posterior. O mesmo vale para cada valor de parâmetro
do modelo evolutivo e para as diferentes combinações de tamanho de ramo (Holder e Lewis, 2003;
Felsenstein, 2004).
Capítulo 1
15
Em geral, mais de uma topologia e valores de parâmetros apresentam probabilidades altas e
muito próximas, portanto, é obtida uma amostragem de hipóteses mais prováveis ao invés de uma
única topologia. As porções congruentes das várias topologias podem ser sumarizadas em uma
topologia consenso onde a probabilidade posterior aproximada de cada clado pode ser representada e
é uma forma de avaliar seu suporte. Utilizando um número muito grande de gerações, é possível
amostrar as regiões com maior probabilidade do espaço de parâmetros, o que torna o algoritmo bem
acurado (Holder e Lewis, 2003). No entanto, não é possível saber se a MCMC atuou tempo suficiente
para prover estimativas confiáveis das probabilidades posteriores. Uma estratégia recomendada é a
geração independente de várias MCMC, com números altos de gerações para verificar se
independentemente as mesmas hipóteses são recuperadas no equilíbrio de cada uma delas
(Shoemaker e col., 1999; Huelsenbeck e col., 2001; Felsenstein, 2004).
1.4. Mapeamento de caracteres em uma hipótese filogenética
1.4.1. Aspectos gerais
Para entender vários aspectos dos processos evolutivos, não basta conhecer os estados dos
caracteres dos organismos atuais, mas também precisamos saber como eram os estados nos seus
ancestrais. Embora o registro fóssil forneça informações a respeito de várias características físicas e
comportamentais dos organismos ancestrais, em diversos casos, os fósseis não estão disponíveis ou
não estão suficientemente preservados para obter a informação necessária. A fim de preencher essa
lacuna, uma alternativa que vem sendo empregada amplamente é a inferência do estado dos
organismos ancestrais, a partir do mapeamento dos estados de caracteres presentes nos organismos
atuais em uma hipótese filogenética. Vários erros estão associados a esse tipo de análise, entre eles o
da hipótese filogenética e o da reconstrução dos estados ancestrais do caráter. Apesar disso, essa
ferramenta tem se revelado útil nas mais diversas áreas do conhecimento evolutivo, por exemplo, na
reconstrução de receptores de estrógeno ancestrais (Thornton e col., 2003), na inferência de
comportamentos ancestrais de abelhas (Schwarz, e col., 2003) e na identificação de padrões de
dispersão de grupos (Waters e Roy, 2004). As inferências dos estados nos ancestrais podem ser
realizadas pelos métodos de máxima parcimônia ou máxima verossimilhança (Maddison e Maddison,
2004).
Capítulo 1
16
1.4.2. Mapeamento de caracteres por máxima parcimônia
O mapeamento por máxima parcimônia infere os estados ancestrais que minimizam o número
de passos de mudança do caráter na hipótese filogenética a partir da distribuição dos estados nos
organismos atuais. Consideremos um exemplo hipotético, onde um caráter com dois estados, preto (0)
e branco (1) apresentam a mesma probabilidade de sofrer mudança entre os dois estados (modificado
de Ronquist, 2004). A partir de uma dada hipótese filogenética e distribuição dos estados nos terminais
(Figura 1.4), a reconstrução mais parcimoniosa da evolução do caráter sugere dois eventos de
mudança de estado e também que os ancestrais A e B apresentavam o estado de caráter preto,
enquanto os os ancestrais C, D, E e F apresentavam estado ancestral do caráter branco (Figura 1.4a).
A análise por máxima parcimônia permite considerar caracteres não-ordenados, ordenados e pesagem
diferencial nas diferentes mudanças de estado (Maddison e Maddison, 2004; Ronquist, 2004).
1.4.3. Mapeamento de caracteres por máxima verossimillahança
No mapeamento por verossimilhança a probabilidade de mudança entre os estados de caráter
observados nos terminais é estimada. A partir dessas probabilidades e dos comprimentos de ramo da
topologia, em questão, as probabilidades dos estados nos ancestrais são estimadas. Nesse caso,
considerando o mesmo exemplo para explicar o mapeamento por parcimônia e assumindo a mesma
probabilidade de mudança entre os estados preto e branco (0,5), o estado de caráter dos ancestrais A,
B e F não são tidos como certos, mas uma probabilidade é dada para cada estado. Por exemplo, o nó
ancestral C apresenta maior probabilidade de que o estado tenha sido branco. Uma vantagem do
mapeamento por verossimilhança em comparação ao mapeamento por pascimônia é que a
probabilidade de estado em um ancestral não depende dos estados estimados em outros ancestrais
(Figura 1.4b) (Ronquist, 2004).
a) b)
Figura 1.4. Mapeamento de caracteres em uma hipótese filogenética. a) por máxima parcimônia; b) pormáxima verossimilhança, tamanhos de ramo proporcionais à régua, p - probabilidade de mudançaentre os estados (modificado de Ronquist, 2004).
Capítulo 1
17
1.5. Datação molecular
1.5.1. Fundamentos
A hipótese do relógio molecular propõe que os genes e seus produtos evoluem sob uma taxa
constante ao longo do tempo e das linhagens (Zuckerkandl e Pauling, 1965). Essa hipótese recebeu
popularidade imediata por diversas razões. A principal vantagem que a teoria ofereceu foi a
possibilidade de inferir o tempo de divergência entre duas linhagens a partir do número de
substituições entre as suas seqüências de DNA, independentemente de informações fósseis. Isso
rapidamente se tornou uma aplicação comum, sendo propostos vários relógios moleculares universais,
que foram empregados em uma ampla gama de trabalhos buscando entender diversos aspectos
evolutivos e biogeográficos (Bermingham e col., 1992; Doolittle e col., 1996; Hedges e col., 1996;
Wang e col., 1999). Um dos relógios moleculares gerais mais amplamente utilizados foi a taxa de 2%
de substituição de nucleotídeos por milhão de anos para o genoma mitocondrial, proposto inicialmente
para mamíferos (Brown e col., 1979) e estendido para outros grupos de vertebrados, como aves
(Shields e Wilson, 1987) e aplicado em diversos estudos (ex., Klicka e Zink, 1997; Ribas e Miyaki,
2004).
No entanto, apesar do impacto do relógio molecular nos estudos evolutivos, com o acúmulo de
dados gerados ficou evidente a existência de uma heterogeneidade muito maior do que se acreditava
inicialmente nas taxas de substituição entre diferentes linhagens. Como resultado disso, foi proposta a
idéia de relógios moleculares locais. Por essa proposta, se a taxa de substituição for constante entre
grupos taxonomicamente próximos, é possível estimar o tempo de divergência dentre os mesmos
aplicando um ponto de calibração específico para o grupo (Swofford e col., 1996; Fleischer e col.,
1998; Yoder e Yang, 2000).
A fim de verificar se um conjunto de táxons está evoluindo sob uma mesma taxa, duas
estratégias são amplamente utilizadas: o teste de taxa relativa (“relative rate test”; Takezaki e col.,
1995; Margoliash, 1963; Sarich e Wilson, 1967; Graur e Li, 2000) e o teste de razão de
verossimilhança (“likelihood ratio test”; Felsenstein, 1988). O teste de taxa relativa compara
estatisticamente o número de substituições entre cada dois táxons com o número de substituições de
cada uma em relação ao grupo externo mais próximo. Se a diferença no número de substituições em
cada linhagem for estatisticamente diferente ao nível de significância de 5% comparado ao grupo
externo, o teste considera que as linhagens não estão evoluindo sob uma taxa constante (Takezaki e
col., 1995). Pelo teste de razão de verossimilhança, são comparadas por c2 as probabilidades da
topologia estimada sem a hipótese do relógio molecular e da mesma topologia forçando os
Capítulo 1
18
comprimentos dos tamanhos de ramo a apresentarem taxa constante (topologia linearizada). Para
esse teste o número de graus de liberdade é definido pelo número de táxons menos dois. Caso as
topologias apresentem probabilidades significantemente diferentes, a hipótese de taxa constante não é
aceita (Felsenstein, 1988; Posada e Crandall, 1998).
Quando a heterogeneidade de taxas de substituição entre os táxons é identificada, uma das
estratégias utilizadas é a exclusão dos táxons ou dos genes que apresentam desvio significativo em
relação aos demais da análise. A divergência entre os demais pode ser calculada através dos
tamanhos de ramo da topologia linearizada (Takezaki e col., 1995). No entanto, essa estratégia faz uso
ineficiente da informação obtida pelas seqüências de DNA porque em alguns casos, muitos táxons
devem ser excluídos antes de se estimar as datas de divergência (Arbobast e col., 2002). Além disso,
em alguns casos, os testes de identificação de variação de taxa podem ser ineficientes, como por
exemplo, quando a seqüência é curta ou os genes apresentam baixas taxas de substituição. Falha na
detecção de variação de taxas pode levar a um erro sistemático nas estimativas de tempo de
divergência, já que pode superestimar algumas datas (Bromham e Penny, 2003). A fim de evitar esses
problemas, métodos mais recentes de datação molecular, como o “non-parametric rate smoothing”
(nprs; Sanderson, 1997), “penalized likelihood” (PL; Sanderson, 2002) e o método bayesiano (Thorne e
col., 1998, Kishino e col., 2001) acomodam a variação nas taxas de substituição de nucleotídeos entre
as linhagens.
1.5.2. Métodos NPRS e PL
O princípio básico do método NPRS é assumir taxas evolutivas locais para cada nó da topologia
e minimizar a variação entre essas taxas ao longo da topologia pela aplicação de uma penalidade não-
paramétrica. Essa penalidade de mudança abrupta (“roughness penality”) é determinada pelo
quadrado mínimo da diferença entre as taxas dos ramos ancestrais e descendentes e a variância nas
taxas entre os ramos descendentes e a raíz (Sanderson, 1997).
O método PL utiliza o mesmo principio básico que o NPRS, mas utiliza uma aproximação semi
paramétrica para encontrar um valor ótimo de um parâmetro de suavização (“smoothing parameter”),
que pode variar entre dois extremos, para a penalidade de mudança abrupta. Em um extremo, existe o
modelo do relógio molecular, onde as taxas não variam (para o qual o parâmetro de suavização tende
ao infinito), e no outro, existe o modelo saturado, onde cada ramo apresenta uma taxa independente
(para o qual o parâmetro de suavização tende a zero). O teste de validação cruzada (“cross-
validation”) é empregado para encontrar o valor ideal do parâmetro de suavização para o conjunto de
Capítulo 1
19
dados. Por esse método, ramos terminais são independentemente excluídos da topologia. O tamanho
de ramo desse terminal é então estimado com base na taxa dos demais ramos e na penalidade de
mudança abrupta, considerando diversos valores do parâmetro de suavização. Os valores estimados
são então comparados com os valores observados. Esse processo é repetido até que o valor escolhido
para o parâmetro de suavização é aquele que melhor aproxima os valores estimados dos tamanhos de
ramo aos valores observados.
O PL se revelou superior aos métodos que assumem linearização e ao NPRS, porque o teste de
validação cruzada permite avaliar se para um conjunto de dados é melhor assumir um modelo onde as
taxas são constantes ao longo das linhagens (relógio molecular), ou mais variáveis, ou ainda qualquer
categoria intermediária entre esses dois extremos (Sanderson, 2002).
1.5.3. Método bayesiano
O método bayesiano de datação usa um modelo probabilístico para descrever a mudança das
taxas de evolução ao longo dos ramos e utiliza uma cadeia Markov de Monte Carlo para aproximar as
probabilidades posteriores das taxas e dos tempos (Thorne e col., 1998; Kishino e col., 2001). Esse
método, assim como o NPRS e o PL também assume que cada ramo apresenta uma taxa
independente, mas constante ao longo do ramo e existe uma autocorrelação entre as taxas dos
diferentes ramos ao longo do tempo evolutivo. O método parte de uma topologia pré definida e o
intervalo de tempo para pelo menos um dos nós, mas ao contrário dos dois outros métodos (NPRS e
PL), não assume os valores fixos de tamanho de ramo. Os parâmetros para o modelo evolutivo podem
ser estimados para cada partição de dados a partir da topologia e das seqüências. Com base no
modelo evolutivo, na topologia e na matriz de dados, são estimados os tamanhos de ramo e seus
respectivos valores de variância e covariância. Como o cálculo analítico das taxas evolutivas para cada
ramo leva em conta todos os valores dos parâmetros do modelo evolutivo, a variação dos tamanhos de
ramo e a própria incerteza dos tempos de divergência levaria muito tempo computacional, esses
valores são aproximados pela MCMC. Para essa MCMC são definidos como parâmetros iniciais a taxa
de evolução molecular da raiz do grupo interno, a média da data da raiz do grupo interno e seus
respectivos desvios padrões. O resultado final aproxima as estimativas de tempo de divergência das
linhagens e fornece os valores do intervalo de credibilidade de cada nó (Thorne e col., 1998; Kishino e
col., 2001; Thorne e Kishino, 2002).
Capítulo 1
20
1.5.4. Pontos de calibração
Além da heterogeneidade de taxa evolutiva ao longo das linhagens, outra questão amplamente
debatida no emprego da datação molecular envolve a escolha de pontos de calibração adequados.
Com a adoção de relógios moleculares locais, devido à evidente variabilidade nas taxas evolutivas em
diferentes linhagens, a utilização de uma taxa geral se revelou inadequada (Lovette, 2004). Portanto,
para obter estimativas de tempo de divergência mais confiáveis, pontos de calibração específicos
devem ser adotados para cada linhagem (Bromham e Penny, 2003).
Um dos métodos mais confiáveis de calibração é a utilização de evidências fósseis que
sustentem limites para a diversificação entre duas ou mais linhagens incluídas na topologia que se
pretende utilizar para estimar os tempos de divergência. No entanto, mesmo quando há disponibilidade
do fóssil em questão, três principais fontes de erros devem ser consideradas nesse caso: a) erro na
inferência filogenética do grupo em questão; b) erro na identificação e posicionamento filogenético do
fóssil em questão; c) erro na identificação da data do fóssil. Em aves, o registro fóssil é muito
incompleto devido em grande parte à própria natureza dos ossos pneumáticos, que dificultam a
fossilização (Arbobast e col., 2002; Bromham e Penny, 2003; Lovette, 2004).
Uma outra maneira de escolher pontos de calibração é a utilização de eventos geológicos
associados à diversificação de um dos grupos em questão. Por exemplo, a origem de ilhas oceânicas
cujas datas de emergência são conhecidas (Fleischer e col., 1998). Porém, da mesma forma, existem
erros que podem estar associados a essa calibração, como por exemplo: a) a precisão do intervalo de
tempo para a formação da ilha; b) tempo de colonização das populações após a formação de cada
ilha; c) possibilidade de migração entre as ilhas no caso de aves com grande capacidade de dispersão;
d) erro na inferência filogenética do grupo em questão (Bromham e Penny, 2003).
Por causa dos erros que podem estar associados a um particular ponto de calibração e o
aumento do erro da própria estimativa de tempo a medida em que os nós distanciam-se dessa região
da topologia, o ideal é usar uma abordagem múltipla, onde vários pontos de calibração são
empregados (ex. van Tuinen e Hedges, 2001).
Capítulo 1
21
1.6. Objetivos
A presente tese tem por objetivos:
• Inferir as relações filogenéticas entre os gêneros da tribo Arini por meio de dados
moleculares a partir de um grande número de seqüências dos genomas mitocondrial e
nuclear.
• Estimar o tempo de divergência entre as linhagens e comparar essas estimativas com
eventos históricos paleogeográficos descritos para a região neotropical que possam ter
influenciado a diversificação dos psitacídeos neotropicais.
• Determinar a organização dos genes mitocondriais ao redor da região controladora através
do sequenciamento de porções entre o final do gene citocromo b e o início do DNA
ribossomal 12S de representantes das linhagens de psitacídeos neotropicais. A análise
dessas seqüências em conjunto com a filogenia e a datação da divergência entre as
linhagens visa compreender melhor a evolução do genoma mitocondrial no grupo.
Capítulo 1
22
1.7. Referências
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Capítulo 1
27
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Capítulo 2
Relações filogenéticas e biogeografia histórica dos
psitacídeos neotropicais (tribo Arini) com base em
seqüências de DNA mitocondrial e nuclear
Capítulo 2
29
2.1. Introdução
Os psitacídeos neotropicais formam o grupo de espécies mais numeroso da ordem
Psittaciformes (150 das 330 espécies reconhecidas) e inclui 30 gêneros (Collar, 1997, Rowley, 1997).
Apresentam uma grande variação de tamanho, preferência de hábitat, distribuição geográfica e
comportamento (Forshaw, 1989). A sistemática do grupo tem sido discutida há muito tempo. Os
sistematas mais antigos, com base em morfologia externa e anatomia (Salvadori, 1891; Boetticher,
1943, 1959; Verheyen, 1956), e comportamento (Brereton, 1963) distribuíam os gêneros neotropicais
em dois grupos de composição variável, em alguns casos incluindo táxons de outras regiões
geográficas. Verheyen (1956) agrupou exclusivamente táxons neotropicais nas famílias Amazoninae e
Arinae e sugeriu que esses grupos compartilham características morfológicas (presença de quatro
vértebras dorsais, uma única carótida dorsal, entre outras) que os distinguem dos psitacídeos das
demais regiões geográficas, mas não sugeriu uma categoria para agrupá-los. Em uma revisão
abrangente da sistemática da ordem Psitaciformes, Smith (1975) agrupou todos os táxons neotropicais
na tribo Arini (família Psittacidae) com base em dois caracteres exclusivos (eclosão dos filhotes com
canal auditivo imperfurado e postura copulatória em uma perna) e considerou artificial os
agrupamentos internos até então propostos na tribo. Na falta de estudos mais abrangentes, essa
proposta foi aceita em todas as classificações posteriores (por exemplo, Forshaw, 1989; Collar, 1997).
Atualmente, o monofiletismo da tribo Arini vem sendo corroborado por estudos de filogenia molecular
incluindo diversos gêneros representantes da ordem (Barrowclough e col., 2004; de Kloet e de Kloet,
2005).
Em uma análise de 1.771 pares de bases (pb) de genes mitocondriais realizados com
representantes de nove gêneros da tribo Arini dois grupos monofiléticos foram recuperados e referidos
pelos autores como psitacídeos de cauda longa e psitacídeos de cauda curta (Miyaki e col. 1998), o
que estaria de acordo com uma chave de identificação proposta por Sick (1997). Exceto para o
monofiletismo
Capítulo 2
30
2005). Além disso, alguns estudos também apontaram ausência de monofiletismo nos gêneros
neotropicais Aratinga, Amazona e Pionopsitta (Tavares e col., 2004; Ribas e Miyaki, 2004; Russello e
Amato, 2004; Ribas e col., 2005).
Apesar de ser muito questionado, dados moleculares podem ser usados para estimar datas de
divergência entre os táxons (Arbobast e col., 2002). Tendo tais estimativas, pode-se tentar associá-las
a eventos paleogeoclimáticos registrados no período de diversificação das linhagens. Em relação aos
psitacídeos, a data estimada de separação entre o periquito australiano (Melopsittacus undulatus) e
alguns táxons neotropicais por volta de 76 milhões de anos atrás (ma; Miyaki e col., 1998) estaria de
acordo com a hipótese de que a separação dos continentes teve um papel importante na diversificação
desses grupos. Além disso, a divergência entre os gêneros de psitacídeos neotropicais foi estimada
entre o Eoceno-Oligoceno e durante o Mioceno (16-27 ma) e poderia estar associada a mudanças
ambientais em consequência de mudanças no nível do mar, orogenia dos Andes e expansão de
ambientes de floresta e de áreas secas (Miyaki e col., 1998; Tavares e col., 2004). Já o intervalo de
divergências entre espécies do mesmo gênero de psitacídeos foi estimado entre 0,5 e 1,3 ma
(Tavares e col., 2004; Ribas e Miyaki, 2004; Ribas e col., 2005).
No presente trabalho foram estudadas as relações filogenéticas da maioria dos gêneros da
tribo Arini, incluindo representantes de diferentes linhagens de gêneros não-monofiléticos. Foi utilizado
um grande conjunto de seqüências de DNA nuclear e mitocondrial totalizando 6.461 pb. A informação
filogenética de alguns caracteres morfológicos, comportamentais e genético também foi analisada com
base na filogenia obtida. Além disso, o tempo de divergência entre as linhagens de psitacídeos
neotropicais foi estimado por métodos que levam em conta a taxa de variação nas substituições de
nucleotídeos entre as linhagens e hipóteses biogeográficas sobre a diversificação do grupo foram
propostas com base nesses resultados.
2.2. Material e Métodos
2.2.1. Amostragem
Foram obtidas amostras de 29 espécies representantes de 25 dos 30 gêneros da tribo Arini
(Tabela 2.1). Como estudos filogenéticos anteriores sugerem a ausência de monofiletismo dos gêneros
Aratinga, Amazona e Pionopsitta (Tavares e col., 2004; Ribas e Miyaki, 2004; Russello e Amato, 2004;
Ribas e col., 2005), foram amostrados dois ou três táxons de cada um desses gêneros, representando
as diferentes linhagens apontadas por esses trabalhos.
Capítulo 2
31
Tabela 2.1. Táxons amostrados. Razão entre comprimento da asa e comprimento da cauda,
espécimen analisado e estados da forma da cauda, narinas e anel perioftálmico.
Espécies Amostraa asa/
caudab
Voucher
MZUSPc
Forma
caudad Narinasf Anel
perioftálmicog
Amazona farinosa 3683 1,9 6731 A E N
Amazona xanthops 1876 2,6 4330 A E N
Anodorhynchus hyacinthinus 5281 0,8 32290 C C N
Ara ararauna 13 0,8 13992 C E N
Aratinga aurea
Aratinga leucophthalmus
Aratinga solstitialis
346
2090
2042
1,2
1,2
1,1
14893
10653
6490
C
C
C
E
E
E
N
N
N
Bolborhynchus lineola 4393 1,9 13080 C E C
Brotogeris chiriri 5486 1,3 74601 C E N
Cacatua goffini 4582 - - - - -
Cyanoliseus patagonus 4967 1,0 2272 C E C
Cyanopsitta spixii 409 0,8 76154 C E N
Deroptyus accipitrinus 395 1,4 44059 A E N
Diopsittaca nobilis 973 1,2 15897 C E N
Enicognathus leptorhynchus 5173 1,2 21754 C C C
Forpus crassirostris 501 2,1 39569 A E C
Graydidascalus brachyurus 1624 2,9 22573 A E C
Guarouba guarouba 69 1,4 43982 C E N
Melopsittacus undulatus 4999 - - - - -
Myiopsitta monachus 2821 1,1 2277 C C C
Nandayus nenday 143 1,2 13083 C E N
Nanopsittaca dachilleae 5495 2,3 - Ae Ee Ce
Orthopsittaca manilata 1852 1,1 38318 C E N
Pionites leucogaster 2377 2,1 12226 C E N
Pionopsitta pileata
Pionopsitta barrabandi
3467
389693
2,1
2,4
69441
3501
A
A
E
E
N
N
Pionus maximiliani 1219 2,2 14015 A E N
Primolius auricollis 1742 1,1 44077 C E N
Pyrrhura leucotis 3921 1,0 34495 C E N
Rynchopsitta pachyryncha 5237 1,6 - Ce Ce Ne
Triclaria malachitacea 415 1,4 28102 A E Na Registro na coleção do Laboratório de Genética e Evolução Molecular de Aves (LGEMA),Universidade de São Paulo, exceto 389693 registrado no Field Museum of Natural History;b Razãoobtida a partir de espécimens machos, (Forshaw, 1989);c Museu de Zoologia da Universidade de SãoPaulo; d A- arredondada, C – acuneada; e Dados obtidos de literatura (Salvadori, 1890; Forshaw, 1989;Collar, 1997); f E - expostas, C- cobertas por penas; g N- nu e evidente, C- coberto por penas.
Capítulo 2
32
Para compor o grupo externo mais próximo foram selecionados os psitacídeos australianos
Melopsittacus undulatus (tribo Platycercini) e Cacatua goffini (família Cacatuidae) e o psitacídeo da
Nova Zelândia Strigos habroptilus (tribo Strigopini, família Psittacidae, NC_005931; Harrison e col.,
2004). Falco peregrinus (NC_000878; Mindell e col., 1998; AY461399, Griffiths e col., 2004), Aburria
aburri (AF165466, AY143680, AY140740, AY140768, AY165454, AF165442; Pereira e col., 2002) e
Gallus gallus (X52392, Desjardins e Morais, 1990; AF143730, Groth e Barrowclough, 1999) foram
selecionados como grupos externos mais distantes para enraizar a topologia. A classificação dos
psitacídeos adotada nesse trabalho segue Collar (1997), exceto por Propyrrhura, para o qual adotamos
Primolius de acordo com Penhallurick (2001).
2.2.2. Extração de DNA e sequenciamento
O DNA foi extraído a partir de tecido sangüíneo em solução contendo 0,1% de SDS, Tris-HCl
100mM (pH 8.0), EDTA 10 mM e 10 mg/mL de proteinase K mantido a 55oC por aproximadamente 4
horas. O DNA foi purificado por procedimento padrão com fenol: clorofórmio: álcool isoamílico (Bruford
e col., 1992). A amplificação dos segmentos de DNA foi realizada por “Polymerase Chain Reaction”
(PCR) em 25 µL de reação com solução tampão 1x (Tris-HCl 10 mM pH 8,3, KCl 50 mM, MgCl2
2,5mM, gelatina a 0,01%, 160 µg/ mL de BSA), 2 µM de cada dNTP, 1µM de cada “primer”, 1 U de Taq
polimerase (Pharmacia) e 25-50 ng de DNA. As condições da reação de PCR foram: desnaturação
inicial a 95ºC por 5 minutos (min.), seguido de 30 ciclos de 95oC por 60 segundos (seg.), 50oC por 25
seg., 72oC por 80 seg., e uma extensão final de 72oC por 7 min. Os segmentos amplificados foram
purificados por corte de banda do gel de agarose e centrifugação através de uma ponteira com filtro.
As seqüências foram obtidas nos seqüenciadores automáticos Li-Cor 4200 bi-direcional e ABI3100 de
acordo com protocolo sugerido pelos fabricantes. Foram obtidas as seqüências de DNA do gene
nuclear RAG-1, e dos genes mitocondriais citocromo b, NADH2, ATPase 6, ATPase 8, COIII, DNAr
12S e DNAr 16S. Os “primers” usados foram R1 (5’- GACAAACATCATCTCAGGAAGAAGAT -3’), R11
(5’- GGACCAGTAGATGATGAAACTCCT -3’), R13 (5’- TCTGAATGGAAATTCAAGATGTT -3’), R14
(5’- TTCCTGTGGATACTCCAGCA -3’), R17 (5’- CCCTCCTGCTGGTATCCTTGCTT -3’), R18 (5’-
GATGCTGCCTCGGTCGGCCACCTTT -3’), R19 (5’- GTCACTGGGAGGCAGATCTTCCA -3’), R21 (5’-
GGATCTTTGAGGAAGTAAAGCCCAA -3’), R20 (5’- CCATCTATAATTCCCACTTCTGT -3’), R22 (5’-
GAATGTTCTCAGGATGCCTCCCAT -3’), R24 (5’- GCCTCTACTGTCTCTTTGGACAT -3’) e R2B (5’-
GAGGTATATAGCCAGTGATGCTT -3’) para o RAG-1 (Groth e Barrowclough, 1999); b1 (5’- CCATCC
ACCATCTCAGGATGATGAAA - 3’), b52 (5’- GNAAATCYCACCCNCTWCTHAAAAT -3’) e b6 (5’- GTC
Capítulo 2
33
TTCAGTTTTGGTTTACAAGAC -3’) para o citocromo b (Kocher e col., 1989); MetL (5’- AAGCTATCG
GGCCCATACCCG –3’), ND2H (5’- CCTTGAAGCACTTCTGGGAATCAGA -3’), ND2-54H (5’- GGG
GTGGTGAGATTTTGCGA- 3’) e ASNH (5’- GATCRAGGCCCATCTGTCTAG -3’) para o NADH2; LysL
(5’- CAGCACTAGCCTTTTAAGCT -3’), COIIIRH (5’- ATTATTCCGTATCGNAGNCCYTTTTG -3’), A5
(5’- TAGGAGTGTGCTTGGTGTGCCATT- 3’) e ATP6L (5’- AAAYATYTAATGGCACACCAAGC- 3’)
para os genes ATPase 6, ATPase 8 e COIII; L1537 (5’- AATCTTGTGCCAGCCACCGCGG -3’) e
12Send (5’- GTGCACCTTCCGGTACACTTACC -3’) para o DNAr 12S; 16Sa (5’- AAGCCWANCGAG
CYGGGTGATAGCTGG -3’), 16Sb (5’- CATAGATAGAAACCGACCTGG -3’), 16Sc (5’- TTCTTCAAG
GTCGCCCCAACC -3’) e 16Se (5’- GCACGGTTAGGATACCGCGGCCG -3’) para o RNAr 16S (Oliver
Haddrath, comunicação pessoal). As seqüências de DNA foram depositadas no GenBank com os
números de acesso: DQ143281-DQ143297 para citocromo b; DQ143298-DQ143324 para NADH2;
DQ143250-DQ143280 para os genes ATPase 6, ATPase 8 e COIII; DQ143208-DQ143228 para 12S
rDNA; e DQ143229-DQ143249 para o 16S rDNA. Foram obtidas do GenBank as seqüências de
citocromo b para Diopsittaca nobilis (AF370769, Tavares e col., 2004), Pionopsitta barrabandi,
Pionopsitta pileata e Triclaria malachitacea (AY669424, AY669437 e AY669439; Ribas e col., 2005) e
de NADH2 para Amazona farinosa (AY194461; Eberhard e Bermingham, 2004), Pionopsitta
barrabandi, Pionopsitta pileata e Triclaria malachitacea (AY669468, AY669481 e AY669486; Ribas e
col., 2005).
2.2.3. Análise das seqüências de DNA
As ambigüidades nas fitas complementares de DNA foram verificadas com o Sequencher 4.1.2
(GeneCodes Corp., Ann Arbor, Michigan). O alinhamento dos genes foi verificado visualmente no
MacClade 4.0 (Maddison e Maddison, 2000). As lacunas de alinhamento, as regiões com alinhamento
ambíguo e as regiões de sobreposição entre as ATPases 8 e 6, e a ATPase 6 e o COIII foram
excluídas da matriz de dados. A composição de bases, as taxas de transição e transversão e a
distância genética entre seqüências de nucleotídeos foram calculadas no PAUP* 4.0b10 (Swofford,
2002). O grau de saturação das seqüências foi avaliado para cada gene pela relação entre o número
de transições e o número de transversões pelas distâncias par a par corrigidas entre os táxons.
Diferenças de composição de base entre táxons não são corrigidos pela maior parte dos
métodos de reconstrução filogenética e topologias inadequadas podem ser escolhidas quando as
diferenças de composição são expressivas (Penny e col., 1990; Lockhart e col., 1994; Foster e Hickey,
1999; Chang e Champbell, 2000; Haddrath e Baker, 2001; Paton e col., 2002). Por isso, os sítios
Capítulo 2
34
variáveis de cada gene foram avaliados quanto ao desvio de composição de bases usando o
Treepuzzle 5.0 (Schmidt e col., 2002). Nessa análise, os sítios invariáveis foram excluídos já que
podem mascarar a detecção de desvio composicional entre os táxons (Foster e Hickey, 1990). A
pressão de mutação simétrica direcional atuando nos genes que codificam para proteínas foi estimada
com o programa DMP 2.0 (Jermin e col., 1996).
2.2.4. Análises filogenéticas
O modelo mais adequado para cada partição de dados foi selecionado pelo teste de razão de
verossimilhança (“hierarchical likelihood ratio tests”- LRT) implementado no Modeltest 3.6 (Posada e
Crandall, 1998). As análises bayesianas foram realizadas no MrBayes 3.0 (Ronquist e Huelsenbeck,
2003), utilizando a amostragem pela “Markov Chain Monte Carlo” (MCMC), inicialmente para cada
gene em separado, para a partição nuclear, para a partição mitocondrial e para a matriz total
concatenada, para verificar se as diferentes partições suportam resultados incongruentes e para
verificar se a adoção de modelos independentes para cada partição é mais adequada. A análise
bayesiana final foi realizada para a matriz combinada dos genes, assumindo diferentes modelos e
respectivos parâmetros para cada gene considerado. Foram executadas quatro buscas independentes,
cada uma com 2 milhões de gerações, uma cadeia fria e quatro quentes, uma topologia amostrada a
cada 1000 gerações e o descarte (“burnin”) determinado pela convergência nos valores de
verossimilhança das topologias. As probabilidades posteriores dos ramos foram computadas para
todas as análises bayesianas descartando-se as topologias amostradas antes da convergência dos
valores de verossimilhança na cadeia de Marcov. O modelo evolutivo e seus respectivos parâmetros
estimados por LRT no Modeltest 3.6 (Posada e Crandall, 1998) foram usados como estimativas iniciais
na busca por máxima verossimilhança (MV) realizada no PAUP* 4.0 b10 (Swofford, 2002), por busca
heurística a partir de 5 árvores iniciais geradas por adição aleatória de táxons (“stepwise addition”) e
algoritmo “tree bisection and reconnection” (TBR) para gerar diferentes topologias. O suporte dos nós
da busca por MV foi estimado por “bootstrap” não paramétrico (Effron, 1979; Felsenstein, 1985) com
100 réplicas, cada uma iniciada por uma topologia gerada por adição aleatória de táxons no programa
PAUP* 4.0b10 (Swofford, 2002), usando o mesmo modelo e valores de parâmetros assumidos na
busca por MV.
Adicionalmente, foi realizada uma busca por MV utilizando um modelo não-homogêneo de
substituição de nucleotídeos no programa NHML 3.0 (Galtier e Gouy, 1998), utilizando a correção para
taxa de substituição entre os sítios HKY+G (Hasegawa e col., 1985). Devido ao grande número de
Capítulo 2
35
terminais (n=32), o tempo computacional para realização de uma busca mais abrangente seria muito
grande, portanto os nós que apresentaram valores de “bootstrap” superiores a 90% na busca por MV
foram fixados.
2.2.5. Comparação das diferentes topologias
Para comparar as topologias obtidas pelos diferentes métodos foi utilizado o teste
aproximadamente não enviesado (AU, “approximately unbiased”; Shimodaira, 2002) implementado no
programa CONSEL (Shimodaira e Hasegawa, 2001). O teste AU utiliza uma técnica de “bootstrap”
multi-escalonado, na qual vários conjuntos de réplicas da matriz de dados inicial são gerados, podendo
ter alteração no tamanho da matriz. O número de vezes que a hipótese é suportada pelas réplicas é
calculado para cada conjunto de dados para obter valores de “bootstrap” a partir das matrizes de
tamanho variável (Shimodaira, 2002).
2.2.6. Mapeamento de caracteres morfológicos, comportamentais e genético na filogenia
molecular
Oito caracteres que foram utilizados para agrupar ou diagnosticar gêneros de psitacídeos
neotropicais em classificações (Salvadori, 1891; Brereton e Immelmann, 1961; Forshaw, 1989), que
foram considerados em estudos sistemáticos (Smith, 1975), ou que foram apontados como exclusivos
de um grupo (Miyaki e col., 1997) foram mapeados na topologia consenso da análise bayesiana no
programa Mesquite 1.05 (Maddison e Maddison, 2004), para avaliar a informação filogenética dos
mesmos. O mapeamento foi realizado por verossimilhança assumindo a mesma probabilidade de
mudança entre os estados. Os caracteres e seus respectivos estados são: 1) o tamanho da cauda
(Salvadori, 1891); como a definição original desse estado não é clara e envolvia a forma da cauda
também, separamos o tamanho e a forma da cauda e redefinimos os estados do tamanho da seguinte
forma: longa (razão entre comprimento da asa e comprimento da cauda menor que 1,7) ou curta
(razão entre comprimento da asa e comprimento da cauda maior do que 1,8); 2) forma da cauda
(Salvadori, 1891, redefinido como caracter independente do tamanho da cauda no presente trabalho):
acuneada (penas gradualmente maiores das bordas em direção ao centro), ou arredondada (todas as
penas com aproximadamente o mesmo tamanho) (Salvadori, 1891); 3) dimorfismo sexual aparente:
presente ou ausente (Smith, 1975); 4) íris bi-colorida: presente ou ausente (Smith, 1975); 5) coçar a
cabeça com o pé: colocando a perna diretamente para frente por baixo da asa, ou passando o pé
indiretamente sobre a asa (Brereton e Immelmann, 1961); 6) narinas: expostas ou não expostas
Capítulo 2
36
(Salvadori, 1891); 7) anel perioftálmico: nu e evidente, ou coberto por penas (Forshaw, 1989); 8)
minissatélites ligados ao cromossomo W: presente ou ausente (Miyaki e col., 1997). A inferência dos
estados ancestrais não foi realizada para o caráter 8, já que o mesmo não foi estudado para alguns
dos táxons considerados na presente hipótese filogenética. Os comprimentos da cauda e da asa foram
obtidos de Forshaw (1989). Os estados para forma da cauda, narinas e anel perioftálmico foram
obtidos da literatura (Salvadori, 1891; Forshaw, 1989) e confirmados em peles de museu (Tabela 2.1).
2.2.7. Tempos de divergência
A hipótese de existência de relógio molecular entre as linhagens de psitacídeos neotropicais
foi testada através do teste de razão de verossimilhança (LRT, “likelihood ratio test”; Posada e
Crandall, 1998) comparando os valores de verossimilhança, da topologia assumindo e não assumindo
o relógio molecular (valores obtidos no PAUP* 4.0b10; Swofford, 2002). Para verificar se as diferenças
nos valores de MV nas diferentes situações é significativa, foi utilizado o teste c2, onde o número de
grau de liberdade foi definido como o número de táxons menos 2. As estimativas dos tempos de
divergência foram obtidas pelos métodos “penalized likelihood” (PL; Sanderson, 2002) e bayesiano
(Thorne e col., 1998; Kishino e col., 2001), que não pressupõem a existência de taxa de evolução
constante ao longo das linhagens. O PL está implementado no programa r8s 1.5 (Sanderson, 2003) e
assume um modelo paramétrico que permite a existência de diferentes taxas de substituição em cada
ramo e uma penalidade não paramétrica (“roughness penality”) que aumenta o custo da taxa de
mudança se as taxas variarem de forma abrupta entre os ramos (Sanderson, 2002). Antes de estimar
os tempos de divergência, uma análise de validação cruzada (Sanderson, 2002) foi realizada no r8s
1.5 (Sanderson, 2003) para determinar o melhor valor do parâmetro de suavização (“smoothing”) para
a penalidade. Os tamanhos de ramo usados foram da topologia obtida pela análise bayesiana,
computada apenas com os genes mitocondriais, pois a seqüência de RAG-1 para Strigops não está
disponível. A estimativa de tempo de divergência por inferência bayesiana foi realizada no multidivtime
(pacote multidistribute, http:// statgen.ncsu.edu/thorne/multidivtime.html), que usa um modelo
probabilístico para descrever as mudanças de taxa de evolução ao longo do tempo e usa a
aproximação MCMC para obter as distribuições posteriores das taxas e tempos (Thorne e col., 1998;
Kishino e col., 2001). Esse método permite que cada gene seja analisado com um modelo evolutivo
independente (Thorne e Kishino, 2002). Inicialmente o programa baseml no pacote PAML 2.0 (Yang,
1997) foi usado para obter as taxas de transição/ transversão, valores dos parâmetros de substituição
pelo modelo evolutivo HKY85g (Hasegawa e col., 1985), e valores do parâmetro a para distribuição
Capítulo 2
37
gama de cada gene. Esses dados foram convertidos pelo paml2modelinf do pacote multidistribute para
um formato reconhecido pelo estbranches do pacote multidistribute, que estima os tamanhos de ramo
e seus respectivos valores de variância-covariância. Análises de MCMC foram realizadas no
multidivtime para aproximar os valores de distribuição posterior das taxas de substituição e tempos de
divergência. Os parâmetros iniciais da distribuição a priori foram 9,0 e 0,2 para rttm (média a priori da
data da raiz do grupo interno) e rttmsd (desvio padrão da rttm), respectivamente e 0,094 para rtrate
(média a priori da distribuição da taxa de evolução molecular na raiz do grupo interno, aqui estimada
pelo valor da mediana dos tamanhos de ramo de cada terminal até a raiz sobre o valor da rttm) e
rtratesd (desvio padrão da rtrate). Um grande valor de desvio padrão (rttmsd e rtrates) foi escolhido
para permitir que os genes apresentem uma grande variação nas taxas ao longo do tempo, já que a
informação das taxas a priori é desconhecida (Thorne e Kishino, 2002). Várias simulações foram
realizadas para verificar a convergência do algoritmo MCMC comparando os valores de distribuição
posterior dos tempos de divergência, tamanho de ramo e proporção de mudanças das diferentes
corridas. Esse método aceita amostragem incompleta dos táxons para os diferentes genes, por isso
RAG-1 foi incluído na análise mesmo sem a seqüência de Strigops habroptilus.
Diversos estudos independentes de datação molecular em linhagens de aves apontam a
origem de várias ordens de Neoaves
Capítulo 2
38
2.3. Resultados
2.3.1. Análise das seqüências
As amplificações para cada gene resultaram em segmentos de bandas únicas em gel de
agarose, de tamanhos entre 800 a 1.300 pares de bases (pb), que são maiores que a maioria das
possíveis cópias de genes mitocondriais incorporados no núcleo encontrados no genoma de Gallus
gallus (Pereira e Baker, 2004). Além disso, a análise das seqüências codificadoras de proteínas não
indicou códons de parada de leitura dentro dos genes, ou mutações que alterassem o código de leitura
dos aminoácidos. Dada a baixa ocorrência de NUMTs em aves, é improvável que pseudogenes foram
amplificados nesse estudo.
As seqüências concatenadas totalizaram 6.416 pb de comprimento, sendo 2.703 pb de DNA
nuclear e 3.713 pb de DNA mitocondrial (DNAmt). Substituições acumularam de modo proporcional às
distâncias corrigidas nas matrizes dos genes RAG-1, DNAr 12S e DNAr 16S. Ocorre saturação em
genes mitocondriais nas comparações entre psitacídeos e grupos externos de outras ordens de aves e
nas transições dos genes codificadores mitocondriais entre os psitacídeos.
A média entre as distâncias par a par não corrigidas (distância-p) calculadas separadamente
para cada região, sugere que RAG-1 apresenta a taxa de evolução mais lenta (distância-p entre
psitacídeos neotropicais entre 0,04-4%), o que é esperado para um éxon de um gene nuclear
codificador de proteína. Entre os genes mitocondriais, os genes que apresentaram taxa de evolução
mais lenta foram os DNAr 12S (457 pb) e DNAr 16S (518 pb), nos quais a variação foi em torno de 1,1
a 9,2%; seguido dos genes codificadores de proteínas citocromo oxidase III (191 pb) e citocromo b
(888 pb), os quais variaram entre 3,1 a 16,3%; e NADH 2 (892 pb), com variação entre 5 a 20%. Os
genes cujas taxas de substituição foram mais rápidas dentre os estudados são a ATPase 6 (673 pb) e
a ATPase 8 (92 pb), cuja variação foi de 4,3 a 26,1%. As taxas de transição e transversão para os
táxons do grupo interno foram 3,15, 4,33 e 4,26 para o RAG-1, os genes mitocondriais e ambos
concatenados, respectivamente.
A composição de bases de RAG-1 de psitacídeos neotropicais foi: A=31,6-31,9; C=19,7-20,2;
T=24,4-24,9 e G=23,5-23,8. Para a matriz de genes mitocondriais combinados a composição de bases
foi: A=29,8-32,5; C=31,2-34,6; T=21,2-24,5 e G=12,3-14,2. Esses valores estão de acordo com as
porcentagens encontradas para genes nucleares e mitocondriais de outras aves.
Dentre os genes mitocondriais codificadores de proteínas foi detectado um desvio significativo
(p < 0,05) na composição de bases da terceira posição do códon em 14 táxons incluídos na análise
Capítulo 2
40
Tabela 2.2. Pressão de mutação direcional simétrica (mD) para os genes mitocondriais codificadores de
proteínas. mD < 0,5 e mD > 0,5 representam maior quantidade de A+T e maior quantidade de G+C,
respectivamente. Os valores representam as % de GC observada na seqüência total (Pobs), nos sítios
não sinônimos (Pnon), nos sinônimos (Psin) e na terceira posição do códon (P3). Táxons que
apresentam variação na composição de bases estão representados em negrito.
Táxon mD Pobs Pnon Psin P3
Ara a 0,519 0,460 0,412 0,534 0,474
Primolius 0,523 0,460 0,410 0,537 0,479
Orthopsittaca 0,540 0,472 0,418 0,554 0,489
Cyanopsitta 0,539 0,466 0,409 0,553 0,491
Nandayus 0,508 0,452 0,406 0,524 0,463
Aratinga solstitialis b 0,502 0,447 0,402 0,517 0,459
Aratinga leucophthalmus 0,533 0,467 0,414 0,548 0,493
Aratinga aurea 0,525 0,460 0,408 0,540 0,475
Guarouba 0,519 0,454 0,400 0,535 0,467
Diopsittaca 0,522 0, 458 0,406 0,537 0,470
Cyanoliseus b 0,502 0,448 0,403 0,517 0,462
Anodorhynchus c 0,529 0,462 0,408 0,543 0,479
Enicognathus 0,541 0,468 0,410 0,559 0,489
Rhynchopsitta a, b 0,485 0,444 0,406 0,500 0,435
Pyrrhura a 0,572** 0,481 0,413 0,585 0,523
Deroptyus 0,556** 0,473 0,410 0,570 0,501
Pionites 0,563*** 0,475 0,409 0,577 0,513
Forpus d 0,514 0,455 0,406 0,529 0,458
Graydidascalus a 0,540 0,465 0,407 0,555 0,487
Amazona xanthops 0,535 0,467 0,412 0,549 0,480
Amazona b 0,563*** 0,474 0,406 0,576 0,512
Pionus 0,551** 0,473 0,413 0,565 0,491
Pionopsitta barrabandi 0,519 0,457 0,407 0,534 0,478
Triclaria b 0,520 0,460 0,412 0,535 0,466
Pionopsitta pileata 0,528 0,463 0,411 0,543 0,479
Myiopsitta a 0,470** 0,434 0,402 0,483 0,417
Brotogeris b 0,565*** 0,475 0,408 0,578 0,513
Bolborhynchus 0,541 0,469 0,412 0,555 0,486
Nannopsittaca 0,537 0,466 0,411 0,551 0,477
Cacatua e 0,540 0,470 0,414 0,555 0,486
Melopsittacus d 0,511 0,455 0,409 0,526 0,457
Falco 0,500 0,454 0,415 0,515 0,455a ATP 6, b citocromo b, c ATP 8, d NADH2, e COIII, * p < 0.05, **p < 0.01, *** p < 0.001.
Capítulo 2
41
A análise bayesiana das regiões nuclear e mitocondrial concatenadas, assumindo cada gene
como uma partição independente, resultou em uma topologia consenso muito parecida com a obtida
apenas com os genes mitocondriais. Em ambas as topologias três grandes clados foram recuperados
dentre os psitacídeos da região neotropical (Figura 2.2): clado A – periquitos pequenos (Bolborhynchus
e Nannopsittaca), clado B- papagaios, caturritas, curicas e afins (Amazona, Pionus, Graydidascalus,
Pionopsitta, Triclaria, Myiopsitta e Brotogeris) e clado C – araras, marianinhas, tiribas e afins (Ara,
Primolius, Orthopsittaca, Cyanopsitta, Diopsittaca, Guarouba, Nandayus, Aratinga, Anodorhynchus,
Cyanoliseus, Enicognathus, Rhynchopsitta, Pyrrhura, Deroptyus, Pionites e Forpus). A única diferença
foi observada nas relações entre Ara, Primolius e Orthopsittaca. Os primeiros dois gêneros parecem
ser mais proximamente relacionados na matriz combinada, enquanto considerando apenas a partição
de DNAmt, Ara e Orthopsittaca aparecem como grupos irmãos e Primolius agrupa com esse clado. No
entanto, como esperado, o suporte dos nós aumenta significantemente com a inclusão de RAG-1.
A busca por MV recuperou uma topologia muito semelhante à topologia consenso obtida a
partir da análise bayesiana (Figura 2.2), diferindo somente na posição de Pyrrhura que ficou como
grupo irmão de um clado que inclui Rhynchopsitta, Enicognathus, Cyanolyseus, Anodorhynchus,
Guarouba, Diopsittaca, Aratinga, Nandayus, Cyanopsitta, Orthopsittaca, Primolius e Ara e as relações
entre Enicognathus, Rhynchopsitta, Cyanoliseus e Pyrrhura. Ambos “bootstrap” e probabilidades
posteriores apresentaram suporte alto para a maioria dos clados.
No entanto, alguns nós com baixos valores de suporte por “bootstrap” nas análises de MV
apresentam altos valores de probabilidade posterior na análise bayesiana. Por exemplo, o clado que
une Forpus às demais linhagens do grupos das araras, marianinhas e afins apresenta suporte por
“bootstrap” de 61% e probabilidade posterior de 100%. Análises de MV homogênea e não-homogênea
recuperaram a mesma árvore, apenas diferindo nas relações entre Primolius, Ara e Orthopsittaca. No
entanto, as diferenças nas topologias obtidas pelos três métodos não são significativas ao nível 5% de
acordo com o teste AU.
Capítulo 2
42
a) b)
Figura 2.1. Reconstrução filogenética por análise bayesiana de psitacídeos neotropicais com base em: a) 2703 pb do gene nuclear RAG-1; b) 3713 pb dosgenes mitocondriais; táxons com desvio significativo na composição de bases dos genes codificadores mitocondriais estão sublinhados. As probabilidadesposteriores estão indicadas nos nós.
Capítulo 2
43
Figura 2.2. Reconstrução filogenética por análise bayesiana de psitacídeos neotropicais com base em6416 pares de bases de seqüências de DNA nuclear e mitocondrial. Os números nos nós correspondemaos valores de porcentagem de “bootstrap” de MV acima de 50 % e aos valores de probabilidade posteriordos nós na análise bayesiana, respectivamente. Clados: A- pequenos periquitos; B- papagaios, caturritascuricas e afins; C- araras, marianinhas, tiribas e afins. Ilustrações dos psitacídeos de del Hoyo ecolaboradores (1997).
Capítulo 2
44
2.3.3. Mapeamento de caracteres morfológicos, comportamentais e genético na filogenia molecular
Os caracteres morfológicos e comportamentais selecionados apresentam homoplasia quando
mapeados na hipótese filogenética apresentada no presente trabalho (Tabela 2.1; Figura 2.3). A cauda
curta presente nos táxons do clado A, em muitos do clado B e em Forpus e Pionites do clado C, e a cauda
longa presente em Myiopsitta, Brotogeris e Triclaria (clado B) e em muitos táxons do clado C, são
convergentes quando mapeadas na filogenia molecular (Figura 2.3a). A forma arredondada da cauda
(presente em Deroptyus e Pionites) e o dimorfismo sexual (presente em Pionopsitta, Triclaria e Forpus)
provavelmente surgiram independentemente por paralelismo em mais de uma linhagem (Figuras 2.3b e
2.3c). A inferência para o estado ancestral da íris bi-colorida é ambígua e ambos estados ocorrem em
diferentes grupos ao longo da topologia, de forma que esse caráter por si só apresenta pouco valor
sistemático (Figura 2.3d). O estado comportamental de coçar a cabeça passando o pé indiretamente sobre
a asa parece ter surgido em paralelo em Bolborhynchus, Pionopsitta pileata e Forpus (Figura 2.3e). O
estado aparentemente derivado das narinas cobertas por penas surgiu convergentemente, uma vez no
clado B e várias vezes independentemente no clado C (Figura 2.3f). O mapeamento sugere que o anel
perioftálmico nu parece ser o estado ancestral do caráter nos clados, mas o estado coberto por penas
parece ter surgido em paralelo nos três principais clados (Figura 2.3g).
Os minissatélites ligados ao cromossomo W estão presentes nos táxons do grupo das araras,
marianinhas e afins com exceção dos táxons mais basais Pionites, Deroptyus e Pyrrhura e estão ausentes
nos táxons estudados no grupo dos papagaios e afins (Figura 2.3h). No entanto, o estado desse caracter
não é conhecido no grupo mais basal (clado A), em dois táxons do grupo de papagaios e afins (clado B) e
quatro táxons do grupo das araras, marianinhas e afins (clado C).
Capítulo 2
45
a) b)
b) d)
Figura 2.3. Mapeamento dos caracteres morfológicos, comportamentais e genéticos na hipótesefilogenética obtida no presente trabalho: a) comprimento da cauda; b) forma da cauda; c) dimorfismosexual aparente; d) íris bi-colorida; e) posição da perna ao coçar a cabeça; f) narinas; g) anel perioftálmico;e h) minissatélites ligados ao cromossomo W. Os círculos coloridos nos nós representam a probabilidadedo estado ancestral (Figuras a-g). Os círculos coloridos nos terminais representam os estados do caráternos táxons atuais.
Capítulo 2
46
e) f)
g) h)
Figura 2.3. continuação.
Capítulo 2
48
Tabela 2.3. Tempos de divergência estimado entre as linhagens de psitacídeos neotropicais (em milhões
de anos, ma). Dados obtidos com o método PL (com nó 1 fixado em 82 e 85 ma) e os respectivos
intervalos de confiança (IC); e com o método bayesiano e os respectivos intervalos de credibilidade (ICr).
Os nós estão indicados na figura 2.4.
PL PL bayesiano
Nó Data IC 95% Data IC 95% Data ICr 95%
1 82 fixado 85 fixado 82,9 (82,0; 84,6)
2 69,8 (66,9; 72,3) 72,3 (69,3; 75,0) 67,6 (60,4; 74,8)
3 62,1 (59,0; 65,1) 64,3 (60,8; 68,5) 59,0 (51,5; 66,8)
4 52,6 (49,3; 59,0) 54,5 (51,0; 57,8) 49,7 (42,5; 57,3)
5 20,3 (17,7; 23,2) 21,0 (18,1; 24,0) 18,4 (13,4; 24,2)
6 50,9 (47,7; 54,1) 52,7 (49,3; 56,0) 48,3 (41,2; 55,9)
7 49,4 (16,2; 52,7) 51,2 (47,7; 54,6) 46,1 (39,0; 53,8)
8 36,7 (33,3; 40,0) 37,9 (34,5; 41,4) 32,5 (25,5; 40,2)
9 40,1 (36,7; 43,6) 41,5 (36,8; 45,1) 39,2 (32,2; 46,6)
10 37,4 (34,0; 40,9) 38,7 (35,2; 42,3) 36,2 (29,7; 43,4)
11 35,7 (32,4; 39,2) 37,0 (33,4; 40,6) 33,2 (26,8; 40,2)
12 28,9 (25,4; 32,4) 29,9 (26,3; 33,6) 24,9 (19,4; 31,1)
13 24,9 (21,6; 28,4) 25,8 (22,4; 29,4) 22,4 (17,0; 28,7)
14 19,7 (16,8; 22,9) 20,4 (17,4; 24,2) 16,6 (11,7; 22,1)
15 48,3 (45,1; 51,6) 50,0 (46,6; 53,4) 46,2 (39,0; 53,8)
16 30,4 (27,6; 33,3) 31,4 (28,6; 34,5) 28,2 (22,5; 34,8)
17 23,1 (20,1; 26,1) 23,9 (20,0; 27,0) 22,3 (16,6; 28,7)
18 25,4 (22,7; 28,3) 26,3 (23,5; 29,3) 25,2 (20,0; 31,2)
19 25,1 (22,4; 28,1) 26,0 (23,1; 29,1) 23,4 (18,1; 29,6)
20 23,3 (20,9; 26,7) 24,1 (21,7; 26,9) 23,4 (19,0; 29,2)
21 22,1 (19,8; 24,6) 22,8 (21,0; 25,6) 22,1 (17,3; 27,5)
22 20,2 (17,9; 22,6) 20,9 (18,7; 23,3) 20,6 (16,1; 25,7)
23 9,4 (7,7; 11,3) 9,7 (7,9; 11,8) 8,9 (6,1; 12,3)
24 18,7 (16,7; 21,1) 19,4 (17,3; 21,8) 19,9 (15,5; 24,9)
25 16,2 (14,3; 18,4) 16,7 (14,7; 19,0) 18,3 (13,9; 23,2)
26 17,8 (15,9; 20,1) 18,4 (16,3; 20,7) 19,0 (14,8; 24,0)
27 4,9 (4,2; 5,8) 5,1 (4,3; 6,0) 5,5 (3,6; 7,7)
28 16,3 (14,4; 18,4) 16,7 (14,9; 19,0) 17,2 (13,0; 22,0)
29 13,9 (12,1; 15,9) 14,4 (12,5; 18,6) 15,0 (11,2; 19,5)
30 12,8 (11,1; 14,8) 13,3 (11,4; 15,3) 13,6 (9,9; 18,0)
Capítulo 2
49
Figura 2.4. Cronograma mostrando os tempos de divergência entre linhagens de psitacídeos estimadospelo método bayesiano. As letras correspondem aos nós indicados na tabela 2.3 e seus respectivosintervalos de credibilidade estão indicados pelas barras horizontais. As barras verticais indicam eventospaleogeoclimáticos registrados nos respectivos períodos. A- pequenos periquitos; B- papagaios, caturritas,curicas e afins; C- araras, marianinhas, tiribas e afins.
Capítulo 2
50
Os resultados sugerem que essa estratégia melhorou a resolução da topologia e aumentou o
suporte dos ramos, como foi sugerido em outros trabalhos (Poe e Swofford, 1999; Haddrath e Baker, 2001;
Slowinski, 2001; Paton e col., 2002). Além disso, a combinação de partições nuclear e mitocondrial, que
oferecem resolução em diferentes partes da topologia, resultou em uma topologia mais robusta, como
sugerido em uma filogenia de gêneros de cracídeos (Pereira e col., 2002).
A presente análise apontou três grandes clados dentre os psitacídeos neotropicais: pequenos
periquitos dos gêneros Nannopsittaca e Bolborhynchus (clado A); papagaios, caturritas, curicas e afins dos
gêneros Amazona, Pionus, Graydidascalus, Pionopsitta, Triclaria, Myiopsitta e Brotogeris (clado B) e
araras, marianinhas, tiricas e afins dos gêneros Ara, Primolius, Orthopsittaca, Cyanopsitta, Diopsittaca,
Guarouba, Nandayus, Aratinga, Anodorhynchus, Cyanoliseus, Enicognathus, Rhynchopsitta, Pyrrhura,
Deroptyus, Pionites e Forpus (clado C). Apenas cinco gêneros não puderam ser incluídos, pois o DNA
extraído de pele dos gêneros Touit e Ognorhynchus não resultaram em amplificações de boa qualidade e
as amostras dos gêneros Hapalopsittaca, Leptosittaca e Psilopsiagon não estavam disponíveis.
Embora os clados B e C são semelhantes aos obtidos em estudos filogenéticos anteriores
empregando amostragem de táxons mais incompleta (Miyaki e col., 1998, Tavares e col., 2004, de Kloet e
de Kloet, 2005), os resultados apresentados no presente trabalho sugerem que os pequenos periquitos são
grupo irmão de todos os demais táxons. Adicionalmente, a ausência de monofiletismo de Aratinga,
Amazona e Pionopsitta, apontada em estudos anteriores, foi corroborada no presente estudo (Tavares e
col., 2004; Ribas e Miyaki, 2004; Russello e Amato, 2004; Ottens-Wainright e col., 2004; Ribas e col.,
2005).
Em comparação com propostas de classificação mais antigas, que assumiam agrupamentos entre
gêneros de psitacídeos neotropicais, incluindo ou não táxons de outras regiões geográficas, nossos
resultados não sustentam a proposta de classificação de Brereton (1963) que agrupa na família Forpidae
Bolborhynchus, Nannopsittaca, Forpus e Psilopsiagon, porque na presente reconstrução, Forpus agrupa
com táxons do clado C, que por sua vez agrupam com o clado B. Os clados B e C apresentam algumas
similaridades e diferenças com os grupos Pioninae/ Conurinae (Salvadori, 1891) e Amazoninae/ Arinae
(Verheyen, 1956). Os grupos Pioninae (Salvadori, 1891) e Amazoninae (Verheyen, 1956) possuem
composição semelhante e ambos incluem os táxons do clado dos papagaios e afins (clado B) com exceção
de Myiopsitta e Brotogeris. Além disso, tais grupos incluem os táxons Pionites, Deroptyus (incluídos no
clado C), Touit e Hapalopsittaca (não amostrados no presente trabalho). Pioninae (Salvadori, 1891)
também inclui o gênero africano Poicephalus. Conurinae (Salvadori, 1891) e Arinae (Verheyen, 1956)
também são grupos de composição semelhante e ambos incluem os táxons do clado C, exceto Deroptyus
Capítulo 2
51
e Pionites. Além disso, Conurinae (Salvadori, 1891) e Arinae (Verheyen, 1956) incluem Nannopsittaca,
Bolborhynchus (pertencentes ao clado A no presente trabalho), Psilopsiagon, Leptossitaca e
Ognorhynchus (não amostrados no presente trabalho). Smith (1975) considerou que as sugestões de
grupos de gêneros neotropicais propostos nas classificações anteriores (Salvadori 1890; Verheyeyen,
1956; Brereton, 1963) não refletiam a evolução do grupo, e por falta de evidências, preferiu não aceitar
agrupamentos dentre os gêneros da tribo Arini. Um dos argumentos citados pelo autor (Smith, 1975) foi o
fato de Deroptyus e Pionites (família Pioninae e Amazoninae) apresentarem similaridades em
comportamento com Pyrrhura e Aratinga (família Conurinae e Arinae). Apesar de tais similaridades
comportamentais não terem sido detalhadamente descritas e comparadas com os demais táxons, na
presente reconstrução filogenética, Deroptyus e Piontes pertencem ao clado C, o qual inclui Pyrrhura e
Aratinga. O clado fomado por Deroptyus e Pionites, proposto no presente trabalho, está de acordo com
observações de campo que sugerem que ambos os gêneros apresentam o canto “keeya” e compartilham
aspectos no comportamento reprodutivo (McLoughlin e Burton, 1976), porém, esses caracteres ainda não
foram estudados por uma abordagem cladística.
2.4.2. Mapeamento de caracteres morfológicos, comportamentais e genéticos na hipótese
filogenética
Nenhum dos caracteres morfológicos mapeados na hipótese filogenética proposta no presente
trabalho apresentou estados exclusivos para um único grupo. O tamanho e a forma da cauda foram os
principais caracteres adotados para definir grupos de gêneros dentre os psitacídeos neotropicais em
classificações mais antigas (Salvadori, 1890; Verheyen, 1990). Propostas mais recentes (Smith, 1975;
Forshaw, 1989; Collar, 1997) não consideram os agrupamentos com base nesses caracteres. No entanto,
a importância do tamanho e forma da cauda foram levantados novamente em um estudo molecular, onde a
variação dos estados de caráter da cauda concordaram com as relações filogenéticas inferidas com base
em táxons de nove gêneros amostrados (Miyaki e col., 1998). Quando esses caracteres foram mapeados
na presente hipótese filogenética, que possui uma amostragem mais completa de táxons, eles
apresentaram convergência (Figura 2.3a e 2.3b). Dessa forma, o uso desses caracteres na diagnose de
grupos monofiléticos dentre os psitacídeos neotropicais deve ser descontinuado.
Os minissatélites ligados ao cromossomo W podem ser informativos, uma vez que podem estar
presentes em um sub-clado do clado C, excluindo os táxons mais basais Forpus, Deroptyus, Pionites e
Pyrrhura (Figura 2.3h). No entanto, como o caracter não foi estudado para alguns dos táxons pertencentes
à tribo Arini, qualquer conclusão pode ser prematura.
Capítulo 2
53
florestas tropicais na América do Sul (Burnham e Johnson, 2004; Rull, 1999; Jaramillo e Dilcher, 2000; Wilf
e col., 2003). Além disso, muitas das linhagens atuais desse clado estão associadas com ambientes
florestais. Portanto, os papagaios e afins podem ter evoluído exclusivamente na América do Sul,
associados a esses ambientes.
No início do Oligoceno, uma expansão de áreas abertas e savanas pode ter acontecido na
América dos Sul. As evidências dessa aridificação são o registro de diversificação de plantas de ambientes
secos nesse período (Pennington e col., 2004) e o registro fóssil animal com uma fauna de mamíferos
dominada por herbívoros hipsodontes, que em geral são associados a ambientes de savana (Flynn e
Wyss, 1997). A aridificação da América do Sul foi atribuída ao soerguimento da porção central dos Andes,
que impediu a passagem das correntes úmidas do Pacífico para o interior do continente (Hooghiemstra e
van der Hammer, 1998). Possivelmente, a grande diversificação (entre 22-34 ma) do grupo das araras,
maracanãs e afins (clado C), ocorreu em resposta a essa diversificação de ambientes secos, uma vez que
muitas linhagens atuais desse grupo ocupam ambientes com características semelhantes.
Apesar de não haver evidências a partir dos dados apresentados aqui, ou a partir de outras fontes,
membros dos clados dos pequenos periquitos (clado A) e do clado das araras, maracanãs e afins (clado C)
poderiam estar ocupando o sul da América do Sul e não dispersaram para a porção norte do continente até
o Oligoceno, devido à presença de um mar transcontinental formado no sul da Argentina e do Chile
(Romero, 1986; Smith e col., 1994), que poderia ter atuado como uma barreira para a sua dispersão.
Alternativamente, os ancestrais desses dois grupos poderiam ser remanescentes de linhagens que
inicialmente ocorriam na Antártica e que teriam sido impulsionados para a América do Sul, à medida que a
Antártica migrou mais para o sul e se tornou um continente incrustrado por gelo (Shevenall e col., 2004;
Dingle e Lavelle, 1998). Uma redução drástica do nível do mar aconteceu em conseqüência da formação
da calota polar Antártica, o que poderia ter facilitado a invasão da América do Sul, como foi sugerido para
alguns grupos de mamíferos (Flynn e Wyss, 1997). Um padrão muito semelhante de cladogênese
diferenciada entre dois grupos também foi descrito para Passeriformes neotropicais suboscines (Ericson e
col., 2003). A família Furnariidae apresenta uma filogenia bem resolvida, enquanto os internós em
Tyrannidae são muito curtos, indicando indicando uma rápida radiação (Ericson e col., 2003).
Apesar de não ter sido possível incluir amostras de psitacídeos africanos no presente estudo, a
sua posição filogenética não afeta a interpretação biogeográfica da evolução dos psitacídeos neotropicais.
Estudos anteriores sugeriram que os psitacídeos africanos não são monofiléticos e podem ter invadido a
África duas vezes, uma via sudoeste da Ásia e outra, via América do Sul (de Kloet, de Kloet, 2005). O
grupo que teria dispersado para a África a partir da América do Sul seria grupo irmão dos psitacídeos
Capítulo 2
54
neotropicais (Barrowclough e col., 2004; de Kloet, de Kloet, 2005). Como estimamos a separação de um
gênero do clado australasiático (Melopsittacus undulatus) dos neotropicais entre 51-66 ma e primeira
cladogênese dentre os neotropicais entre 42-57 ma (Tabela 2.3), a invasão da África pelas linhagens da
América do Sul pode ter ocorrido entre 42-66 ma, período no qual a África já se encontrava isolada do
supercontinente formado pela Antártica-Austrália-América do Sul. Além disso, reforçaria a hipótese de que
linhagens dos psitacídeos encontravam-se distribuídos ao longo do supercontinente, antes da primeira
diversificação do grupo neotropical.
As estimativas de tempo de divergência entre psitacídeos neotropicais realizadas anteriormente
empregavam métodos que não levam em conta a taxa de variação entre as linhagens. Por exemplo, Miyaki
e colaboradores (1998) e Tavares e colaboradores (2004) utilizaram o método de linearização de árvore
(Takezaki e col., 1995), que avalia a presença de táxons que evoluem sob uma taxa significantemente
diferente da média da amostra sendo estudada e exclui esses táxons da análise. A calibração utilizada
para o relógio molecular nesses estudos foi a separação entre Galliformes e Anseriformes dos demais
neognatos, estimada em 100 ma. Tavares e colaboradores (2004) também empregaram a taxa padrão
estimada para o genoma mitocondrial de aves, de 2% de substituição de nucleotídeos/ ma. O mesmo
processo foi utilizado para estimar tempos de divergência entre espécies de psitacídeos, porém aplicando
taxas de 1,6-2,0% de substituição de nucleotídeos/ ma (Ribas e Miyaki, 2004; Ribas e col., 2005). Em
geral, essas estimativas resultaram em tempos de divergência mais recentes do que os tempos estimados
no presente estudo. Acreditamos que a aproximação realizada no presente trabalho é mais adequada do
que as realizadas anteriormente (Miyaki e col., 1998; Tavares e col., 2004) porque não assume a hipótese
de existência de um relógio molecular estrito, permitindo haver variação de taxa ao longo das linhagens.
Além disso, incorpora na análise a incerteza nos tamanhos de ramo e tempos estimados e foi realizada
com base em uma hipótese filogenética cujos nós são melhor resolvidos. A utilização de um ponto de
calibração geológico independente (a separação da Nova Zelândia dos demais continentes da Gondwana)
permite que as taxas sejam estimadas a partir dos dados, ao invés de assumir taxas estimadas a partir de
outras linhagens de aves (Lovette, 2004).
Capítulo 2
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2.5. Referências
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Capítulo 3
Evolução da organização dos genes mitocondriais ao
redor da região controladora em psitacídeos
neotropicais (tribo Arini)
Capítulo 3
62
3.1. Introdução
A maioria dos genomas mitocondriais de vertebrados inclui 22 genes para RNA transportadores
(RNAt), 13 genes codificadores de proteínas, dois genes para RNA ribossomal (RNAr) e uma região não
codificadora (região controladora, RC) e inicialmente se acreditava que a organização desses genes
(Figura 3.1a) era extremamente conservada (Quinn, 1997; Boore, 1999). No entanto, o aumento do
número de genomas sequenciados revelou variações dessa organização em várias linhagens de
vertebrados, principalmente envolvendo RNAt, como por exemplo, em marsupiais, cobras cegas, rãs e
lagartos (Pääbo e col., 1991; Kumazawa e Nishida, 1995; Macey e col., 1997; Saccone e col, 1999; Boore
e col., 1995; Boore, 1999). O primeiro genoma mitocondrial de uma ave a ser completamente sequenciado
(Gallus gallus; Desjardins e Morais, 1990) revelou um arranjo único dentre os vertebrados (Figura 3.1b).
Com o aumento no número de seqüências determinadas, esse arranjo de genes (aqui denominado
“comum”) foi evidenciado ser muito freqüente em aves (Marshall e Baker, 1997; Mindell e col. 1998; Härlid
e col., 1998; Haddrath e Baker 2001; Paton e col., 2002; Slake e col., 2003). No entanto, um outro arranjo
gênico (aqui denominado “alternativo”; Figura 3.1c) foi descrito em alguns táxons (Mindell e col., 1998;
Bensch e Härlid, 2000).
Mecanismos distintos podem explicar diferentes processos de rearranjo gênico. Por exemplo, em
insetos Hymenoptera alguns rearranjos de genes são melhor explicados por recombinação (Dowton e col.,
2003), para vários rearranjos em vertebrados foi proposto um mecanismo de duplicação e deleção
aleatória de genes (Moritz e col., 1986, 1987; Macey e col. 1997; Holt e col., 1997). Posteriormente, para
dois gêneros de Diplopoda foi proposto um mecanismo de duplicação e deleção não aleatória de genes
(Lavrov e col., 2002).
O mecanismo pelo qual a organização dos genes comum em aves sugiu a partir da ordem típica
em vertebrados não foi eluciado, mas dois modelos foram propostos. O arranjo comum em aves (Figura
3.1b), poderia ter surgido a partir do arranjo de genes comum em vertebrados (Figura 3.1a) pelo
mecanismo de RNAt atuando como primer ilícito na recombinação, onde o RNAtGlu ou o RNAtPro ligaria-se
na origem da replicação da molécula e não seria isolado na nova fita de DNA sintetizada no processo,
junto com os genes adjacentes. O segmento NADH6/ RNAtGlu ou o citocromo b/ RNAtThr/ RNAtPro, seria
incorporado no próximo ciclo de replicação em uma posição diferente (Desjardins e Morais, 1990).
Capítulo 3
63
Figura 3.1. Ordem dos genes ao redor da região controladora (fora de escala). a) ordem comum emvertebrados (Boore, 1999) ; b) ordem comum em aves (Desjardins e Morais, 1990); c) ordem alternativa emaves (Mindell e col. 1998); d) ordem nos gêneros de psitacídeos Amazona e Pionus (Eberhard e col.,2001); e e) possível ordem nos gêneros de psitacídeos Deroptyus e Pionites. Os “primers” usados paraamplificação estão indicados nos mapas da ordem gênica correspondente. Os segmentos numeradoscorrespondem a regiões amplificadas nos táxons indicados na Tabela 2.1. NADH5- nicotinamida adeninadinucleotídeo desidrogenase subunidade 5; NADH6- nicotinamida adenina dinucleotídeo desidrogenasesubunidade 6; GLU- RNAtGlu; cit. b – citocromo b, THR- RNAtThr, PRO- RNAtPro, RC – região controladora;nc – região não codificadora, PHE - RNAtPhe, nc- região não-codificadora; ψ ND6- pseudo NADH6, ψ GLU-pseudo RNAt Glu; ψ PRO- pseudo RNAtPro.
Alternativamente, pelo modelo de duplicação e perda subseqüente de genes, o segmento NADH6/
RNAtGlu/ citocromo b/ RNAtThr/ RNAtPro da ordem típica em vertebrados seria duplicado durante a
replicação, por formação de estrutura secundária na nova fita sintetizada durante o processo, ou por erro
de pareamento no início ou final da replicação. Essa duplicação seria então incorporada na molécula por
um novo ciclo de replicação. A deleção de um segmento NADH6/ RNAtGlu entre os genes NADH5 e
Capítulo 3
64
citocromo b e um segmento de citocromo b/ RNAtThr/ RNAtPro antes da RC geraria a ordem comum em
aves (Figura 3.1b; Desjardins e Morais, 1990; Quinn, 1997).
A organização alternativa em aves (Figura 3.1c) poderia ter se originado a partir da organização
mais comum de aves pela duplicação em tandem do segmento RNAtPro/ NADH6/ tRNAGlu/ RC, seguido de
perdas subsequentes de uma das cópias dos genes tRNAPro/ NADH6/ e RNAtGlu e, na maioria dos casos,
da RC ou parte da mesma (Mindell e col., 1998; Boore e col., 1999; Bensch e Härlid, 2000). A presença de
uma região não codificadora que apresenta grande similaridade com a RC (Figura 3.1c), sugere que esse
evento deve ser relativamente recente, reforçando a hipótese de que essa organização de genes em aves
teria origem a partir de eventos de duplicação e subsequente perda de segmentos duplicados (Mindell e
col., 1998; Bensch e Härlid, 2000). Essa idéia foi ainda mais reforçada com a caracterização dessa mesma
região em psitacídeos neotropicais dos gêneros Amazona e Pionus (Eberhard e col., 2001). Esses táxons
também apresentam a ordem alternativa em aves, mas nesse caso, ambas as RC sequenciadas
apresentam as regiões conservadas como os blocos F, D, C e CBS-1, e antes da primeira RC, apresentam
pseudogenes que são similares às seqüências de RNAtGlu e NADH6 (Figura 3.1d).
Assumir que organização alternativa se originou a partir de um único evento de rearranjo de genes
implicaria em aceitar a existência de um grupo monofilético de aves formado por Falconiformes, Cuculidae
(Cuculiformes), Picidae (Piciformes) e Suboscines (Passeriformes), excluindo desse grupo outras famílias
dessas mesmas ordens como Musophagidae (Cuculiformes), Bucerotidae (Piciformes) e Oscines
(Passeriformes), o que estaria em desacordo com reconstruções filogenéticas bem sustentadas obtidas
com dados morfológicos e moleculares diversos (Mindell e col., 1998). Assim, foi proposto que o arranjo
gênico alternativo (Figuras 3.1c e 3.1d) se originou por vários eventos em linhagens independentes
(Mindell e col., 1998). A princípio, acreditou-se que a ordem gênica poderia ser um caráter diagnóstico em
níveis taxonômicos como subordens ou famílias, por exemplo, para as subordens Oscines (ordem comum)
e Suboscines de Passeriformes (Mindell e col., 1998). No entanto, dados mais recentes evidenciaram a
existência do arranjo alternativo em várias espécies gênero Phylloscopus (Oscines), sugerindo que esses
eventos também acontecem em níveis taxonômicos mais baixos e portanto, a validade do carácter para
inferência filogenética é questionável (Bensch e Härlid, 2000). Em Phylloscopus a similaridade entre a RC
e a região não-codificadora de cada espécie é menor que a similaridade das RC entre espécies próximas,
o que corrobora a hipótese de ter ocorrido um único evento de rearranjo gênico em um ancestral comum
do grupo (Bensch e Härlid, 2000). A similaridade entre ambas as RC do mesmo táxon em espécies e
subespécies do gênero Amazona e no táxon Pionus chalcopterus, em geral, foi maior do que entre as
regiões homólogas de táxons diferentes, com exceção de três subespécies de Amazona ochrocephala.
Capítulo 3
65
Nesse caso, também foi sugerido que houve um único evento de rearranjo gênico no ancestral desses
grupos, porém, as RCs de cada táxon estariam evoluindo em concerto (Eberhard e col., 2001).
No presente trabalho, determinamos a ordem dos genes mitocondriais em diversos gêneros de
psitacídeos neotropicais e evidenciamos a convergência desse caráter no grupo. Propomos modelos para
explicar a origem dos eventos independentes e testamos essas hipóteses através de elementos exclusivos
identificados nas seqüências de cada linhagem. Com base em uma estimativa de tempo de divergência
entre as linhagens, estimamos períodos de tempo nos quais teriam acontecido eventos de duplicação e
perda de genes ao longo das linhagens estudadas.
3.2. Material e métodos
3.2.1. Amostragem e sequenciamento
Foram estudados 34 indivíduos de 25 dos 30 gêneros de psitacídeos neotropicais (Tabela 3.1).
Amostras de DNA foram extraídas a partir de sangue por digestão padrão com proteinase K e purificadas
com fenol: clorofórmio: álcool isoamílico na proporção 25:24:1 (Bruford e col., 1992).
Os “primers” utilizados nas amplificações e sequenciamento foram: CBL15637 (5’-AACCTCCTA
GGAGACCCAGAAAACTTC-3’; Miyaki e col., 1998), LThr (5’-TGGTCTTGTAAACCAAAAGA-3’; Eberhard e
col., 2001), H16065 (5’-AACTGCAGTCATCTCCGGTTTACAAGAC-3’; Kornegay e col. 1993), Tpro16150
(5’-ATCACCAACTCCCAAAGCTGG -3’, presente trabalho), ND6H16252 (5’-TTRTGAYTGTTTGTTGT -3’,
presente trabalho), ND6L16384 (5’-CACCYCACCCYCAAACAA -3’, presente trabalho), ND6L 852 (5’- CCA
TAAAGAGTACTAGCGACA C-3’, presente trabalho), ND6H16522 (5’-GGGATGTTGGTGGTTTTTGT-3’,
presente trabalho), LGlu (5’-GCCCTGAAAARCCATCGTTG-3’; Eberhard e col., 2001), HgluRev (5’-GCG
TTCTTATAGTTGAGATACC-3’; Eberhard e col., 2001), CRL380 (5’-GCCCATAAYTGGCCCGGGAACTT-
3’; Tavares e col. 2004), CRL456 (5’- CACGAGAGATCAYCAACCCGGTGT-3’, Tavares e col., 2004),
CR522Rb (5’-TGGCCCTGACYTAGGAACCAG-3’; Eberhard e col., 2001), CRL827 (5’-TCATTTTMRCAC
TGATGCACTTG-3’; Tavares e col. 2004), CRH1028 (5’- AGGTGTAAAACAAAGTGCATCAGGGT-3’;
Tavares e col. 2004), Hphe1248 (5’-TCTTGGCAKCTTCAGTACCATGCTTT-3’, Eberhard, com. pess.),
12SH1357 (5’-GCGGATACTTGCATGTATATG-3’, presente trabalho).
Capítulo 3
66
Tabela 3.1. Táxons analisados, número de registro, segmentos amplificados de acordo com a numeração
correspondente indicada na Figura 3.1.
Espécie LGEMAa Segmentos amplificados
Amazona xanthops 1876 7
Anodorhynchus hyacinthinus 114 1, 3, 4, 5, 6
Anodorhynchus hyacinthinus 117 1, 3, 4, 5, 6
Ara ararauna 13 1, 3, 4, 5, 6
Aratinga aurea 346 3
Aratinga leucophthalmus 2090 3
Aratinga solstitialis 2042 3
Bolborhynchus lineola 4393 3
Brotogeris chiriri 5486 3
Cyanolyseus patagonus 1837 3
Cyanopsitta spixii 409 3, 4, 5
Cyanopsitta spixii 498 2, 3, 4, 5
Deroptyus accipitrinus 395 14, 15
Deroptyus accipitrinus 396 14, 15
Diopsittaca nobilis 973 2, 3, 4, 5
Diopsittaca nobilis 1126 2, 3, 4, 5
Enicognathus leptorhynchus 5173 3
Forpus crassirostris 501 7, 13
Guarouba guarouba 4 2, 3, 4, 5
Guarouba guarouba 69 2, 3, 4, 5
Graydidascalus brachyurus 1623 7, 9, 10, 11, 12
Graydidascalus brachyurus 1624 7, 9, 10, 11, 12
Myiopsitta monachus 1737 1, 3, 4
Nandayus nenday 143 1, 3, 4
Nannopsittaca dachileae 5495 3
Orthopsittaca manilata 2383 3
Pionites leucogaster 2377 15, 16
Pionopsitta barrabandi 5006 7, 8, 13
Pionopsitta pileata 3467 7, 13
Primolius auricollis 2345 3
Pyrrhura picta 397 3
Rhynchopsitta pachyryncha 5237 3
Triclaria malachitacea 415 7, 8, 12, 13
Triclaria malachitacea 416 7, 8, 12, 13a Registro na coleção do Laboratório de Genética e Evolução Molecular de Aves (LGEMA), Universidade de
São Paulo.
Capítulo 3
67
A primeira amplificação realizada para cada táxon foi entre os “primers” LThr e CR522Rb
(segmentos 3, 7 e 15 da Figura 3.1; Tabela 3.1). A seqüência obtida a partir do segmento amplificado por
esse conjunto de “primers” é diagnóstica da organização gênica em psitacídeos (Figura 3.1). Foram
amplificados segmentos adicionais para vários táxons, em geral com sobreposição, sempre levando em
conta a sua organização gênica (Figura 3.1; Tabela 3.1).
As amplificações foram realizadas em 10 µL, com tampão 1x (Pharmacia ou Biotools), 2 µM de de
cada dNTP, 1µM de cada “primer”, 0,5 U de Taq polimerase (Pharmacia) e 20-50 ng de DNA, ou
alternativamente, em 25 µL, com tampão 1x (Biotools), 2 µM de cada dNTP, 1µM de cada “primer”, 1 U de
Taq polimerase (Pharmacia) e 25-50 ng de DNA. As condições da reação de PCR foram: desnaturação
inicial a 95ºC por 5 minutos (min.), seguido de 30 ciclos de 95oC por 60 segundos (seg.), 50-54oC por 25
seg. e 65oC por 40 – 80 seg., e uma extensão final de 65oC por 5 min. Uma alíquota (2 µL) dos produtos foi
aplicada em gel de agarose para verificar a qualidade e tamanho dos produtos.
Os produtos de PCR foram purificados com exonuclease I (5 U, USB) e fosfatase alcalina de
camarão (0,5 U, USB). Alternativamente, a banda foi recuperada de gel de agarose e o produto foi isolado
por centrifugação do fragmento de gel em ponteira com filtro. A reação de sequenciamento foi preparada
com Big Dye Terminator (Perkin Elmer) de acordo com protocolo sugerido pelo fabricante. As seqüências
foram obtidas em sequenciadores automáticos (ABI 377 ou ABI 3100, Applied Biosystems).
3.2.2. Alinhamento e análise das seqüências
Ambiguidades entre fitas complementares e regiões de sobreposição foram verificadas e corrigidas
usando os programas Sequence Navigator (Applied Biosystems) e Sequencher 4.1.2 (GeneCodes Corp.).
Os arranjos e seqüências foram comparados com as seqüências homólogas dos genomas mitocondriais
completos de galinha (Gallus gallus; GenBank NC_001323; Desjardins e Morais, 1990) e de um psitacídeo
da Nova Zelândia (Strigops habropptilus; NC_005931; Harrison e col., 2004), com a seqüência de 4709 pb
entre o final do citocromo b e início do RNAr 12S do psitacídeo neotropical Amazona farinosa (GenBank
AF338821; Eberhard e col., 2001) e duas seqüências de tamanhos 735 e 574 pb correspondentes
respectivamente aos segmentos 7 e 13 (Figura 3.1) do psitacídeo neotropical Pionus chalcopterus
(AF338317 e AF338318; Eberhard e col., 2001).
As seqüências obtidas das extremidades 3’ do citocromo b foram comparadas com as seqüências
praticamente completas do gene descritas em trabalhos anteriores e obtidas a partir da amplificação de
segmentos diferentes (Figura 3.2; U70761, U70763, U70764, U70766, AY286205, AY286206, AY286209,
AF370769 e AF370778; Miyaki e col. 1998; Tavares e col., 2004; Tavares e col. in prep.). As seqüências
Capítulo 3
68
obtidas da porção 5’ da região controladora foram comparadas, ou complementadas com seqüências
obtidas em trabalhos anteriores (Figuras 3.2 e 3.3; AF430809, AF430810, AF430811, AF430813,
AF430814, AF430816, AF430817, AF430818, AF430822, AF430825, AF430826, AF430828, AF430830,
AF430833, AF430836, AF430837 e AY208250; Tavares e col., 2004; Ribas e Miyaki, 2004). Alinhamentos
automáticos foram gerados no Clustal X 1.81 (Thompson, 1997) e corrigidos manualmente no MacClade
4.0 (Maddison e Maddison, 2000). O alinhamento das seqüências de DNA de genes codificadores de
proteínas foi confirmado com a seqüência de aminoácidos correspondente, simulada no MacClade 4.0
(Maddison e Maddison, 2000). Composição de bases, valores de distância e demais dados estatísticos
foram obtidos nos programas PAUP* 4.0 (Swofford e col., 2002) e MEGA 2.1 (Kumar e col., 2001). A
simulação da estrutura secundária dos RNAt foi realizada no tRNAscan-SE (Lowe e Eddy, 1997). A
caracterização da região controladora (RC), foi realizada por comparação com outras seqüências de RC de
aves (Desjardins e Morais, 1989; Mindell e col., 1998; Marshall e Baker, 1999; Eberhard e col., 2001;
Delport e col., 2002). O início dos domínios foi definido pela posição dos blocos conservados (Sbisà e col.,
1997; Marshaw e Baker, 1999) como definido por Pereira e col. (2004).
3.2.3. Mapeamento de hipóteses
Os diferentes estados de organização gênica em aves (comum ou alternativa) foram mapeados em
uma proposta filogenética das relações entre os gêneros de psitacídeos neotropicais (topologia com
tamanho de ramos, Tavares e col., in prep.) no programa Mesquite 1.05 (Maddison e Maddison, 2004)
utilizando o método de Máxima Verossimilhança. A partir da organização alternativa com duplicação da RC
(Figura 3.1d) é possível recuperar a organização comum dos genes em aves (Figura 3.1b), caso os
pseudogenes e a RC 1 sejam deletados, e a partir da ordem comum é possível resultar na ordem
alternativa por duplicação e deleção posterior de genes, portanto, consideramos que a mudança entre
esses dois estados (ordem comum e ordem alternativa) possui a mesma probabilidade.
3.3. Resultados
Apesar de o DNA ter sido extraído a partir de sangue, tecido relativamente pobre em mitocôndrias,
acreditamos que as seqüências são de origem mitocondrial com base nos seguintes resultados: (1) alguns
dos segmentos amplificados são maiores que o tamanho da maioria das possíveis cópias de genes
mitocondriais incorporados no genoma nuclear de Gallus gallus e na maioria dos genomas de vertebrados
sequenciados até o momento (Pereira e Baker, 2004); (2) os segmentos com sobreposição parcial
amplificados com diferentes combinações de “primers” são congruentes; (3) as seqüências dos genes
Capítulo 3
69
codificadores não apresentam códons de parada inesperados ou alteração no quadro de leitura e
alinharam com as correspondentes dos mesmos indivíduos amplificadas previamente com diferente
combinação de primers (Miyaki e col. 1998, Tavares e col., 2004, Tavares e col., in prep.); e (4) a
simulação da estrutura secundária dos DNAt sugere que os mesmos devem ser funcionais.
As seqüências obtidas no presente trabalho (números de acesso em processo de submissão ao
GenBank), assim como o conjunto analisado incluindo seqüências de trabalhos anteriores estão
representados nas figuras 3.2 e 3.3. A amplificação com o par de primers CBL15637 e ND6H16522
resultou em mais de uma banda (de aproximadamente 600 e 900 pb) para os táxons Diopsittaca nobilis,
Guarouba guarouba e Cyanopsitta spixii. Portanto, para esses táxons, os “primers” CBL15637 e CR522Rb
foram usados para obter cerca de 2 kb de produto. As amplificações com os “primers” Lthr16064 e
CR522Rb em amostras de Amazona xanthops e Graydidascalus brachyurus, sempre resultou em
seqüências ambíguas e ilegíveis, portanto, não foi possível comparar essa região com as homólogas nos
demais grupos. No entanto, em ambos os táxons o segmento amplificado de 700 pb entre esses “primers”
possui tamanho incompatível com a ordem comum, cujo tamanho esperado seria em torno de 1300 pb, já
que inclui todo o gene NADH6 e uma porção de 500 pb da RC, sugerindo que esses táxons apresentam a
ordem alternativa (Figura 3.1d). Além disso, outras seqüências de Graydidascalus brachyurus foram
obtidas (Figuras 3.1 e 3.3), confimando a existência da ordem de genes alternativa nesse táxon.
Em casos onde mais de um indivíduo da mesma espécie foi seqüenciado, a variação encontrada
entre os indivíduos da mesma espécie foi menor do que aquela encontrada na comparação entre gêneros.
Portanto, nas análises subseqüentes, foi utilizada a seqüência consenso para cada gênero, exceto para
Aratinga, cujas espécies amostradas são representantes de linhagens independentes (Tavares e col.,
2004; Ribas e Miyaki, 2004).
Os resultados obtidos sugerem que os táxons que apresentam a organização comum dos genes ao
redor da região controladora são: Anodorhynchus hyacinthinus, Ara ararauna, Aratinga aurea, Aratinga
leucophthalmus, Aratinga solstitialis, Bolborhynchus lineola, Brotogeris chiriri, Cyanoliseus patagonus,
Cyanopsitta spixii, Diopsittaca nobilis, Enicognathus leptorhynchus, Guarouba guarouba, Myiopsitta
monachus, Nandayus nenday, Nannopsittaca dachileae, Orthopsittaca manilata, Primolius auricollis,
Pyrrhura picta e Rhynchopsitta pachyryncha (Figuras 3.1b e 3.2). Os táxons que apresentam a
organização alternativa dos genes ao redor da região controladora são: Amazona xanthops, Deroptyus
accipitrinus, Forpus crassirostris, Graydidascalus brachyurus, Pionites leucogaster, Pionopsitta barrabandi,
Pionopsitta pileata e Triclaria malachitacea (Figuras 3.1d, 3.1e e 3.3).
Capítulo 3
70
Figura 3.2. Seqüências obtidas (representadas por linhas e seus tamanhos) para cada táxon de psitacídeoneotropical com a ordem comum em aves e seqüências de trabalhos anteriores (em cinza; número deacesso no GenBank e tamanho abaixo dos segmentos; Miyaki e col., 1998; Tavares e col. 2004; Ribas eMiyaki, 2004). As posições dos “primers” usados nas reações de sequenciamento estão representadas nomapa.
Figura 3.3. Seqüências obtidas (representadas por linhas e seus tamanhos) para cada táxon de psitacídeoneotropical com a ordem alternativa em aves, seqüências obtidas de outro trabalho (em cinza; número deacesso no GenBank e tamanho abaixo do segmento; Tavares e col. 2004). a) mapa da ordem alternativade Amazona e Pionus (Eberhard e col. 2001); b) mapa da ordem alternativa de Deroptyus e Pionites. Aposição dos “primers” usados nas reações de sequenciamento estão representadas nos mapas.
Capítulo 3
71
Não foram identificados pseudogenes nas seqüências dos táxons que apresentam a organização
comum dos genes. Para esses táxons, em geral a seqüência obtida inclui parte do RNAtThr, o RNAtPro, o
gene NADH6, o RNAtGlu e parte da RC. Para nove indivíduos foi obtida a seqüência entre o final do
citocromo b e o início do RNAr 12S (Figura 3.2). Para a maioria dos táxons estudados que apresentam a
organização alternativa foram obtidas as seqüências do início da RC 1 e da RC 2, além do RNAt e de
psedogenes anteriores à porção 5’ da RC 1. Deroptyus accipitrinus e Pionites leucogaster apresentam um
pseudogene com cerca de 65 pb cuja seqüência se assemelha muito a do tRNAPro e uma outra porção com
230 e 264 pb, respectivamente, que apresenta alguma similaridade com NADH6 (Figuras 3.3b e 3.4),
sugerindo que podem apresentar a organização dos genes semelhante à ordem alternativa (Figura 3.1e).
Pionopsitta pileata, Pionopsitta barrabandi e Triclaria malachitacea apresentam um pseudogene que varia
de 40 a 92 pb cuja seqüência se assemelha a parte do NADH6 e uma outra porção entre 59 a 64 pb que
se assemelha ao RNAtGlu (Figuras 3.3a e 3.5) e ambos são correspondentes aos pseudogenes descritos
em espécies de Amazona e Pionus (Eberhard e col. 2001). Forpus crassirostris apresenta pseudogenes
desses mesmos genes com 68 e 43 pb, respectivamente (Figura 3.3a e 3.5).
Pseudo RNAt Pro
Deroptyus TCAGAAAAAGAGGACTAAACCTCTATCACCAACTCCCAAAGCTGGCATTTTACATTAAACTATTCTCTPionites CCAGAAAAAGAGGACCAAACCTC---CACCAACCCCCCAAAC-AACACCCCACATTAACCCCCCCCCCA.farinosa TCAGAAAAAGAGGACTAAACCTCCATCACCAGCTCCCAAAGCTGGCGTTTTAAATTAAACTATTTCCT
Pseudo NADH6
Deroptyus ------------------------GCC-CACAAACAACCCCAACAAGACCCCCGTCTCCCACAGCCCCAGCACAACAGACAAAGCCAACPionites CCAACAGCAAACAACCYTTAAAATGCACCTCACAATGCACCAACCTTCTCCCRTTCAATAAGTAGAGGAATAAAGGCTATAGAGAGGAA
Deroptyus AACAGCCCCTACTCAGCATAACAGTAA-AAAGGGG-GGGAGGGGG-GAAGGGGAAAAAGAAAACACCCCACCAACTG---CACTAAGACPionites GATGTGTCGGGGGGAGGAGGTAGGGGG-AAAGGAA--GGTGGGGAAGGGGGGAAGAAAAAACAAACCCTACCAACAGTAACACTAAAGT
Deroptyus CAACCCAAATAAACCGCCACAAAACCAACCT-CAAACCTCCACCCTACC-AATCCCGATTCAACTCCCTAATAAGCCACCACTCA----Pionites TAACCCTTAAAAAC-ACCACACAACCAACCT-TAGACCCTTACTCAACT-AATCATAAACCCACGGCCTAAAACCTCTATCCTCCCCTA
Figura 3.4. Seqüência do pseudo RNAtpro, comparada com a seqüência funcional de RNAt Pro em Amazonafarinosa (Eberhard e col. 2001), e do pseudo NADH6 antes da RC 1 de Deroptyus accipitrinus e Pionitesleucogaster. Regiões de maior homologia entre os táxons estão indicadas em negrito.
Capítulo 3
72
Pseudo NADH6
Amazona ---CCCACCCAAAAACCCTCACCCTACAACCAATGAAGCCCCCAACACAACAACACCA-------------AGGCGCAAAForpus -AAC----CCAAAATTTCCCCAATAAACAACAGTAAACCCTAATTAC-AAATAAAACAC----------------CCAAAP.barrabandi TACCACCAACCCCCAAAA-CCACCCCAACCACCCC-ATTAAACCCACAAAGCACCCCA----------CAACACCAAAACP.pileata CACC------AGAAAGCT-AACCCCCAACAACACCCCATCAGCCCACCTAAAGCAAT------------------ACAAAPionus TCTCACCCCAAACTCCCCACCACAATAAGCAAGCCTAAACACAACAACACCACCAAATATTAACCCACCCCAAAAGCAAAtriclaria TCCC----GCTAAAAACACCACCC------------------------------------------------GACACAAA
Amazona ATAGGCCATAAGForpus --AGGCCATAGAP.barrabandi AAAGGCCATAAGP.pileata ACAGGCCATAAGPionus ATAGGCCATAAGtriclaria ACAGGCCATAAG
Pseudo RNAt Glu
Amazona TTTCTCAGATCAAA--CCATCCAAAGCTTATGGCCTATTAACCGCCTC--AGCACATCAACCA-TAAForpus GTCC-CACCCAGA-C---CCCCTCACTCTATGGCCTAAAAGTCCACTC-------------------P.barrabandi CCTC-TACCCAAAAA-TCATCAAAGGCTTATGGCCAAAAAAGC-CAACCCAGCATTTAAACCA-C--P.pileata TCCC-CACTCAAAAA-TGACTGGGGACTTATGGCCTACAAACCACCACTATGTACTTCAACCA-TACPionus CTTT-CAGAGTCGCGTCTGTCCAAAGCTTATGGCCTAAACCATACCTA-GTGTACCTACCATAATAATriclaria CTTC-TACCC--AAA-CTATCTAAAGCTTATGGCCTA-AAACTTCC-CTTAGTACTCTTAACA-TGG
Figura 3.5. Seqüência de pseudogenes dos táxons Amazona farinosa (Eberhard e col. 2001), Forpuscrassirostris, Pionopsitta barrabandi, Pionopsitta pileata, Pionus chalcopteris (Eberhard e col. 2001) eTriclaria malachitacea. Regiões de maior homologia entre os táxons estão indicadas em negrito.
3.3.1. Mapeamento de hipóteses
O mapeamento das ordens gênicas de psitacídeos neotropicais em uma hipótese filogenética
(Tavares e col., in prep.) sugere que há ambiguidade quanto ao estado ancestral de alguns grupos (Figura
3.6a). A partir desse resultado e dos pseudogenes presentes nos grupos, dois modelos de evolução foram
levantados:
a) Duplicações independentes do segmento dos genes RNAtPro/ NADH6/ RNAtGlu/ RC teriam ocorrido
nas linhagens ancestrais dos clados B, D e F. Essas duplicações seriam seguidas de deleções dos
genes RNAtPro/ parte do NADH6 e do RNAtGlu nos clados B e D. No clado F teria ocorrido a
deleção parcial dos genes RNAt Pro/ NADH6 e total do gene RNAt Glu. Esse modelo presupõe a
existência de pelo menos seis eventos, sendo três de duplicação de genes e três de deleções de
genes (Figura 3.6b).
b) Um único evento de duplicação gênica teria ocorrido no ancestral dos clados B, C, D, E e F e cinco
eventos de deleção de genes, sendo dois eventos convergentes. Nos clados C e E, a deleção
levaria à organização comum em aves e nos clados C e D, a deleção resultaria em pseudogenes
de RNAtGlu e NADH6. Um evento distinto de deleção de genes resultaria no padrão descrito em
Pionites e Deroptyus (Figura 3.6c).
Capítulo 3
73
a)
b) c)
Figura 3.6. a) Mapeamento dos estados da ordem gênica na inferência filogenética de Tavares e col. (inprep.); b) modelo considerando três eventos independentes de duplicação; c) modelo considerando umevento de duplicação. O período estimado para os eventos estão representados em milhões de anos, ma.
Capítulo 3
74
3.3.2. Caracterização dos genes
Foram obtidas seqüências completas de NADH6 de Anodorhynchus , Ara, Aratinga
leucophthalmus, Aratinga solstitialis, Bolborhynchus, Brotogeris, Cyanolyseus, Cyanopsitta, Diopsittaca,
Enicognathus, Graydidascalus, Guarouba, Nannopsittaca, Orthopsittaca, Primolius e Rhynchopsitta.
Seqüências parciais do mesmo gene (incompletas na porção 3’) foram obtidas de Aratinga aurea,
Myiopsitta, Nandayus e Pyrrhura. Quando comparadas com as as seqüências homólogas de Amazona
farinosa, Pionus chalcopteris (Eberhard e col., 2001), Strigops habroptilus (Harrison e col., 2004) e Gallus
gallus (Desjardins e Morais, 1990), verificamos uma variação no códon de parada, sendo esse TAA em
Gal lus e Orthopsittaca, AGG em Bolborhynchus, Brotogeris e Nannopsittaca, e TAG nos demais
psitacídeos comparados. As lacunas de alinhamento ocorrem em trincas, de forma que não foi identificada
alteração no quadro de leitura em nenhum táxon. O alinhamento dessas seqüências sugere que em
relação à Gallus gallus, o número a menos de trincas é de: uma em Amazona farinosa, duas nos gêneros
Strigops, Bolborhynchus, Nannopsittaca e Graydidascalus, três nos gêneros Anodorhynchus, Ara, Aratinga,
Cyanopsitta, Cyanoliseus, Diopsittaca, Enicognathus, Guarouba, Nandayus, Orthopsittaca, Primolius,
Pyrrhura e Rhynchopsitta, e seis nos gêneros Brotogeris e Myiopsitta.
Foram obtidas as seqüências completas da RC para Anodorhynchus , Ara , Cyanopsitta,
Diopsittaca, Graydidascalus (RC2) e Guarouba, e as seqüências parciais da RC, RC1 e RC2 para os
demais táxons (Figuras 3.2 e 3.3). Essas seqüências foram alinhadas com a RC1 e RC2 de Amazona
farinosa e Pionus chalcopterus (Eberhard e col., 2001). Em alguns trechos do primeiro domínio ocorre
grande variabilidade entre gêneros menos relacionados taxonomicamente, o que torna o alinhamento
bastante incerto, principalmente nas comparações com os táxons Bolborhynchus, Nannopsittaca,
Myiopsitta, Brotogeris e Forpus em relação aos demais e entre si. Apesar disso, para a maioria das
seqüências comparadas foi identificado o “goose hairpin”, uma região repetitiva de composição C7TAC7,
exceto em Amazona farinosa e Deroptyus accipitrinus cuja composição é C8TAC7 (Eberhard e col., 2001) e
ATC3TAC7, respectivamente. O “goose hairpin” só não é presente no RC2 do táxon Graydidascalus
brachyurus (seqüência dessa porção na RC1 não disponível). Comparações de distância-p sugerem que,
em geral, nos táxons onde ocorrem duas cópias da RC (RC1 e RC2), elas são mais semelhantes entre si
do que as cópias homólogas de táxons distintos, com exceção de Pionopsitta barrabandi. Como esperado,
o segundo domínio é mais conservado, sendo possível identificar os blocos F, E, D e C para a maioria dos
táxons compadados e também o “bird box” e o CSB-1 para os táxons que apresentavam a RC completa
(Figura 3.7).
Capítulo 3
75
Bloco F Bloco E
Nannopsittaca GGGCTACTCACGAGAAATCATCTACCCG Nannopsittaca CACGACTAGCTTCAGGATCATP.pileata rc1 GGGCTACTCACGTGAAACCATCTACCCG P.pileata rc2 CGTTCCTAGCTTCAGGTCCTTP.pileata rc2 GGGCTACTCACGTGAAACCATCTACCCG P.pileata rc2 CGTTCCTAGCTTCAGGTCCTTTriclaria rc1 GGGCTACTCACGTGAAACCATCTACCCG Triclaria rc1 CGTTCCTAGCTTCAAGTCCTTTriclaria rc2 GGGCTACTCACGTGAAACCATCTACCCG Triclaria rc2 CGTTCCTAGCTTCAAGTCCTTP.barrabandi rc1 GGGCYACTCACGTGAAACCATCTACCCG P.barrabandi rc1 CATGACTAGGTTCAGGCCCTTP.barrabandi rc2 GGACTTCTCACGAGAAATCAGCAACCTG Graydidascalus rc2 CGTTACTAGTTTCAGGCCCATGraydidascalus rc2 TTACATCTCACGAGAAATCACCAACCCG A.farinosa rc2 CGTTCCTAGCTTCAGGTCCATA.farinosa rc2 GGTCATCTCACGTGAAATCATCTACCCG Pionus rc1 CACGCCCAGCGTCAGGTCCATPionus rc1 GGGCTACTCACGTGAAATCATCAACCCG Pionus rc2 CACGCCCAGCGTCAGGTCCATPionus rc2 GGGCTACTCACGTGAAATCATCAACCCG Myiopsitta CGTTACTAGCTTCAGGATCATMyiopsitta GAACCACTCACGAGAAACCATCAACCCG Brotogeris TGCTACTAGCGTCAGGAGCATBrotogeris GGGCAACTCACGAGAAATCACCTACCCC Forpus rc1 CATTCCTAGCTTCAGGTCCATForpus rc1 GGGCAACTCACGTGAAACCATCTACCCG Anodorhynchus CCTTCCCAGCGTCAGGTCCATEnicognathus TGGCTACTC------------------- Guarouba CCTTCCCAGCGTCAGGTCCATCyanolyseus TGGTTACTCGCGAGAGATCA-------- Diopsittaca CCTTCCCAGCGTCAGGTCCATAnodorhynchus TGACTACTCACGAGAGATCACCAACCCG A.aurea CCCTCCCAGCGTCAGGTCCATGuarouba TGACAACTCACGAGAGATCATCAACCCG Cyanopsitta CCTTCCCAGCGTCAGGTCCATDiopsittaca TGACTACTCACGAGAGATCATCAACCCG Orthopsittaca TCTTCCCAGCGTCAGGTCCATA.solstitialis TGGCTACTCACGAGAGATCACCAATCCG Ara CGTTCCCAGCGTCAGGTCCATA.aurea TGACTACTCACGAGAGATCATCAACCCG Primolius TATTCCCAGCGTCAGGTCCATCyanopsitta TGACTACTCACGAGAGATCACCAACCCG Nandayus CGTTCCCAGCGTCAGGTCCATOrthopsittaca TGGCTACTCACGAGAGATCATCAACCCG Pyrrhura CGTTCCTAGCGTCAGGTCCTTAra TGGCTACTCACGAGAGATCATCAACCCG Pionites rc2 CGTTCCTAGCGTCAAGTCCATPrimolius TGACTACTCACGAGAGATCATCAACCCGNandayus TGACTACTCACGAGAGATCATCAACCCGRhynchopsitta TGGCAACTCT------------------Pyrrhura TGACTACTCACGAGAGATCATCAACCCGDeroptyus TGGCTTCTCACGAGAAATCAGCAACCCAPionites rc1 TGGCTATTCGCGAGAAATCAGCA-CC--Pionites rc2 TGTCTATTCGCGAGAAATCAGCAACCGG
Bloco D Bloco C
Nannopsittaca CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Nannopsittaca CCTTCACAGAGCCATCTCTGCTAGTCTGP.pileata rc1 CCTCTGGTTC--------------- P.pileata rc2 TCACA-GAGTCATCTGGTTCGCTAATATP.pileata rc2 CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Triclaria rc1 TCACA-GAGTCATCTGGTTCGCTATTTGTriclaria rc1 CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Triclaria rc2 TCACA-GAGTCATCTGGTTCGCTATTTGTriclaria rc2 CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Graydidascalus rc2 TCACA-GAGACA--TTTCTCGTGGTTTGP.barrabandi rc1 CCTCTAG------------------ A.farinosa rc2 TCACT-GAGTCATCTGGTTCGCTATTTGGraydidascalus rc2 CATTTGGTTAGTAGGTCAGGGACAT Anodorhynchus CTATC-GGGTCATCTGGTTCGCTATCCTA.farinosa rc2 CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Guarouba CCATC-TGGCCATCTGGTTCGCTATTTGMyiopsitta CCTCTGGTTCCTAGATTA------- Diopsittaca CCATC-TGGCCATCTGGTTCGCTATTTGBrotogeris CCTCTGGTTCCTAGG---------- A.aurea CTATC-AAGCCATCTGGTTCGCTATATGForpus rc1 CCTCTGGT----------------- Cyanopsitta CTATC-TGGCCATCTGGTTCGCTATTTGAnodorhynchus CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Ara CCATC-TGGTCATATGGTTCGCTATTATGuarouba CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Primolius CCATC-TGGCCATATGGTTCGCTATTTGDiopsittaca CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Nandayus CCATC-TGGCCATCTGGTTCGCTATTTGA.aurea CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Pyrrhura TCACA-GAGTCATCTGGTTCGCTATTTACyanopsitta CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Pionites rc2 TCACA-GAGTCATCTGGTTCGCTATTTGOrthopsittaca CCTCTGGTTCCTAGGTCAGGG----Ara CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAC Bloco de AvesPrimolius CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACATNandayus CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Graydidascalus rc2 CACTAATGTACTCCAPyrrhura CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT A.farinosa rc2 CACTGATGCACTTTGPionites rc2 CCTCTGGTTCCTCGGTCAGGCACAT Anodorhynchus CCCTGATGCACTTTG Guarouba CCCTGATGCACTTTG Diopsittaca CCCTGATGCACTTTG Cyanopsitta CCCTGATGCACTTTG Ara CCCTGATGCACTTTG
Figura 3.7. Blocos conservados no segundo domínio da região controladora. A ordem dos táxonscorresponde à ordem dos clados da Figura 3.6. Como não foi possível obter seqüências completas paratodos os blocos de todos os táxons, o sinal “-“ representa o final da seqüência.
Capítulo 3
76
A alta variabilidade apresentada no terceiro domínio dos táxons com a RC completa, inviabilizou o
alinhamento dessa região entre grupos menos relacionados taxonomicamente, como entre representantes
do clado B e do clado E (Figura 3.6). Nessa região os táxons Amazona e Triclaria do clado B compartilham
um bloco formado por TA2CA3CA4CA3CA3CCACA3CA3 que não é presente em Graydidascalus brachyurus.
Os táxons Anodorhynchus hyacinthinus, Ara ararauna, Cyanopsitta spixii, Diopsittaca nobilis e Guarouba
guarouba compartilham similaridades nessa região, apesar de não apresentarem regiões repetitivas.
3.4. Discussão
As organizações gênicas ao redor da região controladora descritas para os gêneros de psitacídeos
neotropicais sugere que durante a evolução do grupo, ocorreram convergências ao longo das linhagens, já
que táxons de clados diferentes apresentam a mesma organização (Figura 3.6). Apesar de eventos de
rearranjo dos genes serem considerados pouco freqüentes e únicos em algumas linhagens animais (Boore
e Brown, 1998; Morrison e col., 2001), a convergência múltipla na organização dos genes mitocondriais ao
redor da região controladora foi evidenciada anteriormente em aves (Mindell e col., 1998; Bensch e Härlid,
2000).
O mecanismo de duplicação e posterior deleção de genes duplicados (Moritz e col., 1986, 1987;
Macey e col., 1997; Holt e col., 1997) é o que melhor explica a mudança da ordem comum para a ordem
gênica descrita dentre os grupos de aves, porque a mudança de ordem aconteceu entre genes fisicamente
próximos, além disso foram encontradas regiões duplicadas e pseudogenes em Falco peregrinus (Mindell
e col. 1998), Phylloscopus (Bensch e Härlid, 2000), Amazona e Pionus (Eberhard e col., 2001) que
apresentam a organização alternativa. Assumindo esse mecanismo, duas possíveis maneiras para explicar
as diferentes organizações gênicas nos psitacídeos neotropicais foram testadas. Em ambas, consideramos
que o ancestral dos psitacídeos neotropicais apresentava a organização comum dos genes em aves,
porque não existe nenhuma evidência que sugere o contrário.
Se a ordem alternativa fosse o estado ancestral, isso implicaria na necessidade de haver mais
eventos de mudança de ordem gênica no grupo, já que os representantes da linhagem de psitacídeos
neotropicais que se separou inicialmente das demais linhagens (Bolborhynchus e Nannopsittaca)
apresentam a organização comum. Além disso, Strigops habroptilus, representante atual do primeiro clado
da ordem Psittaciformes a se separar dos demais (Barrowclough e col. 2004; de Kloet e de Kloet, 2005)
também apresenta a organização comum em aves. Finalmente, a inferência dos estados ancestrais por
Capítulo 3
77
máxima verossimilhança sugere maior probabilidade do ancestral dos neotropicais de apresentar a
organização comum (Figura 3.4a).
A princípio, as duas hipóteses consideradas são igualmente prováveis para explicar a evolução do
caráter no grupo, no entanto, o modelo que assume três eventos independentes de duplicação de genes e
deleção posterior de cópias duplicadas (Figura 3.4b) parece mais provável, já que nenhuma das linhagens
de psitacídeos neotropicais que apresentam a organização comum dos genes em aves apresenta vestígio
de genes duplicados, como acontece nas três linhagens que apresentam a organização alternativa. Como
os eventos de perda de genes em todas as linhagens teriam acontecido em períodos próximos
considerando o modelo apresentado na Figura 3.6c, seria esperado encontrar resquícios de genes
duplicados nas linhagens C e E. Hipoteticamente, é possível imaginar a reversão para a ordem comum de
aves a partir de uma duplicação de genes, ou mesmo a partir de uma ordem alternativa onde as duas
cópias da RC são potencialmente funcionais, como ocorre em Amazona e Pionus (Eberhard e col. 2001).
No entanto, até o momento não foi descrito em nenhum dos grupos de aves que apresentam a ordem de
genes comum (ex. Desjardins e Morais, 1990; Boore, 1999) vestígios de genes duplicados, como acontece
em alguns táxons que apresentam a ordem alternativa, portanto, não existe nenhuma evidência mais
concreta em psitacídeos ou mesmo em aves sugerindo que a ordem comum pode ser revertida a partir de
um processo de duplicação, ou mesmo a partir da ordem alternativa. De qualquer forma, o modelo não
pode ser desconsiderado.
Forpus e táxons da linhagem de papagaios, curicas e afins (clado C), apresentam pseudogenes
com alguma similaridade com as regiões de NADH6 e RNAtGlu. O interessante é que os pseudogenes
encontrados em ambos os clados apresentam alguma similaridade, o que tornou possível seu alinhamento.
No entanto, em ambos os modelos considerados, a deleção de genes nos dois grupos teria ocorrido
independentemente, ou seja por convergência. Alternativamente, poderiamos considerar um cenário onde
esses táxons compartilhassem um único evento de deleção. Isso sugeriria que a posição filogenética
desses grupos seria um pouco diferente da proposta filogenética que estamos considerando (Tavares e
col., in prep.). O suporte de “bootstrap” das análises de máxima verossimilhança dos ramos que definem a
posição filogenética de Forpus no clado que inclui as araras, marianinhas e afins não é muito alto, apesar
de a probabilidade posterior da análise bayesiana ser relativamente elevada (Tavares e col., in prep.). No
entanto, um cenário alternativo onde Forpus seria grupo irmão dos táxons da linhagem B (Figura 3.6) não
foi recuperado por nenhum dos métodos de inferência filogenética testados (Tavares e col, in prep.),
sustentando a possibilidade de convergência nos eventos de deleção de genes. Isso poderia indicar que
Capítulo 3
78
um mecanismo de deleção não aleatória dos genes duplicados poderia atuar em aves, como proposto
inicialmente para artrópodes dos gêneros Narceus e Thyropygus (Lavrov e col., 2002). Apesar de tal
mecanismo não ter sido testado em aves, a deleção não aleatória dos genes duplicados poderia explicar a
convergência para a ordem alternativa em várias linhagens independentes de aves (Mindell e col., 1998,
Bensch e Härlid, 2000, Eberhard e col., 2001) a partir de uma duplicação hipotética que poderia levar a
outros arranjos gênicos nunca descritos, como por exemplo o posicionamento do gene NADH6 entre o
RNAtThr e RNAtPro.
Seria esperado supor que, se o rearranjo gênico ocorreu em uma linhagem ancestral comum entre
alguns táxons, cada uma de suas regiões controladoras deveria apresentar mais similaridade com as
regiões controladoras homólogas das demais linhagens (cópias ortólogas) do que com a segunda RC
presente no mesmo táxon (cópias parálogas). Nesse sentido, se assumirmos um único evento de
duplicação e deleção na linhagem ancestral comum aos táxons do clado B, as RC 1 desses gêneros
deveriam ser mais próximas entre si, do que as RC 1 e RC 2 de cada um desses grupos. No entanto, isso
não acontece, as RC parálogas são mais próximas entre si. O mesmo acontece no clado F. Apesar de não
ter sido obtida seqüência da segunda RC para Deroptyus, a distância entre RC 1 desse táxon e de Pionites
é maior do que a distância entre RCs de Pionites. A princípio, isso sugere que em cada táxon dessa
linhagem aconteceu um único evento de duplicação de genes, seguido de um único evento de deleção de
genes. Entretando, isso não acontece apenas ao nível genérico. Entre espécies do gênero Amazona isso
também foi descrito (Eberhard e col., 2001). Portando, a existência de eventos independentes para cada
um desses casos, seria pouco provável. RCs duplicadas e que apresentam baixa taxa de divergência entre
as cópias também foram descritas em pepinos do mar (Arndt e Smith, 1998), cobras (Kumazawa e col.,
1998) e outros grupos (Black e Roehrdanz, 1998; Campbell e Barker, 1999; Kumazawa e col., 1995).
Eberhard e col. (2001) levantaram três hipóteses pelas quais um ou mais mecanismos de conversão
gênica poderiam estar atuando nas RCs parálogas, de forma a mantê-las semelhantes: 1) um mecanismo
de conversão gênica envolvendo apenas as porções convergentes; 2) um mecanismo de conversão gênica
envolvendo a região controladora inteira com evolução extremamente rápida das porções não- funcionais;
e 3) seleção paralela para manter a funcionalidade de ambas as regiões. Nenhuma das hipóteses por si só
explica os dados obtidos e os elementos para descartar qualquer uma delas são insuficientes. Portanto,
seria interessante comparar a seqüência completa das regiões parálogas de cada táxon a fim de melhor
entender o mecanismo que melhor explicaria os eventos de convergência de RC nos psitacídeos
neotropicais. As regiões comuns presentes no terceiro domínio da RC de Amazona e Triclaria poderiam
Capítulo 3
79
estar presentes no ancestral do clado que une esses grupos e ter sido perdido em Graydidascalus, já que
esse clado estaria mais relacionado taxonomicamente a Amazona do que a Triclaria.
Os dados apresentados aqui contribuem para o melhor entendimento da evolução do genoma
mitocondrial em aves. Os resultados obtidos são compatíveis com o modelo de mudança da ordem
comum em aves para a ordem alternativa por duplicação seguida de deleção de genes. Além disso, os
dados sugerem que vários eventos de rearranjo gênico podem ter ocorrido entre táxons filogeneticamente
próximos e que de algum modo pode haver convergência na maneira como os genes duplicados são
perdidos em aves, o que torna ainda mais discutível o conteúdo filogenético desse caráter para estudar a
evolução de aves. Algum mecanismo de evolução em concerto também parece operar entre as regiões
controladoras, como foi sugerido inicialmente para Amazona e Pionus (Eberhard e col., 2001).
3.5. Referências
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Capítulo 4
Considerações finais
Capítulo 4
84
A presente tese se insere no contexto da biologia evolutiva que busca inferir a história da evolução
e elucidar seus mecanismos. A filogenia tem por objetivo entender as relações de parentesco entre os
organismos pelo princípio da ancestralidade comum. O estudo dessas relações fornece subsídios gerais
para interpretar vários outros aspectos das da evolução, por exemplo, como ocorrem as modificações
fisiológicas, ecológicas, etológicas, morfológias, moleculares, dentre outras. Além disso, com base nas
filogenias, pode-se inferir o tempo de divergência entre as linhagens e levantar ou testar hipóteses
biogeográficas. Na presente tese, vários aspectos da biologia evolutiva dos psitacídeos neotropicais foram
estudados. Inicialmente foi realizada uma filogenia abrangente dos gêneros do grupo com base em 6.461
pb de seqüências de DNA nuclear e mitocondrial. Essa análise recuperou:
• Um clado de pequenos periquitos (Bolborhynchus e Nannopsittaca) como grupo irmão dos demais
psitacídeos neotropicais, que por sua vez se dividem em dois grupos, um formado por papagaios,
caturritas, curicas e afins (Amazona, Pionus, Graydidascalus, Pionopsitta, Triclaria, Myiopsitta e
Brotogeris) e outro formado por araras, marianinhas, tiribas e afins (Ara, Primolius, Orthopsittaca,
Cyanopsitta, Diopsittaca , Guarouba , Nandayus , Aratinga , Anodorhynchus, Cyanoliseus,
Enicognathus, Rhynchopsitta, Pyrrhura, Deroptyus, Pionites e Forpus).
• No clado que inclui papagaios, caturritas, curicas e afins as relações internas são bem resolvidas,
enquanto no clado formado por araras, marianinhas tiribas e afins, a maior parte das relações
foram bem resolvidas, mas algumas relações permanecem pouco suportadas ou não resolvidas,
padrão possivelmente decorrente de uma rápida radiação que se reflete nos curtos tamanhos de
ramo entre essas linhagens nas topologias obtidas.
• Os resultados descritos na presente tese aumentou muito o conhecimento das relações
sistemáticas e filogenéticas ao nível de gêneros dentre os psitacídeos da tribo Arini
A história da evolução de alguns caracteres morfológicos, comportamental e genético foi estudada
pelo mapeamento dos estados atuais na inferência filogenética proposta. O resultado dessas análises,
sugere que:
• Os caracteres morfológicos, (comprimento da cauda, forma da cauda, dimorfismo sexual aparente,
íris bi-colorida, narinas expostas e anel perioftalmico nu) e comportamental (posição da perna ao
coçar a cabeça) apresentaram convergência e portanto, não podem isoladamente ser usados para
a diagnose dos clados obtidos na presente inferência filogenética.
• O caráter genético (minissatélites ligados ao cromossomo sexual W) pode apresentar sinal
filogenético, mas ainda não foi estudado para todos os táxons incluídos na inferência filogenética
proposta nessa tese, portanto essa conclusão seria prematura.
Capítulo 4
85
Foram realizadas estimativas dos tempos de divergência dos clados obtidos na inferência
filogenética. As divergências foram comparadas com fatores históricos que poderiam ter influenciado na
diversificação dos grupos:
• O ancestral dos psitacídeos neotropicais se separou do ancestral australasiático entre 51-67
milhões de anos (ma), portanto a separação da Austrália e Antártica possivelmente teve um papel
importante na separação ou isolamento desses grupos.
• As linhagens mais antigas de psitacídeos neotropicais se diversificaram no início do Eoceno (entre
42-57 ma), período no qual a América do Sul e a Antártica eram conectadas.
• Padrões de cladogênese bem distintos foram observados em dois grandes clados de psitacídeos
neotropicais. Os gêneros de papagaios e afins diversificaram de forma contínua de 12-54 ma, com
a maioria dos eventos acontecendo entre 20-46 ma. No entanto, no clado das araras e afins, uma
linhagem que deu origem ao atual gênero Forpus divergiu das demais entre 39-54 ma, isso foi
seguido de um período de cerca de 20 ma onde não é registrada diversificação no clado das
araras e afins, até que entre 4-34 ma ocorreu cladogênese de forma expressiva em uma das
linhagens.
• Os papagaios e afins podem ter evoluído associados a ambientes florestais na América do Sul, já
que a cladogênese do grupo coincide com a reposição de flora e o aumento da distribuição das
florestas tropicais dessa região. Além disso, muitas das linhagens atuais desse clado ocorrem
nesses ambientes.
• A grande diversificação (entre 22-34 ma) do grupo das araras, maracanãs e afins, pode ter
ocorrido em resposta a uma grande diversificação de ambientes secos ocorrida no Mioceno, uma
vez que muitas linhagens atuais desse grupo ocupam ambientes com características semelhantes.
A falta de registro de diversificação antes desse período poderia ser explicada por uma extinção
das linhagens que teriam se diversificado.
• Outras possibilidades envolvem a existência de uma barreira isolando membros dos clados dos
pequenos periquitos e do clado das araras, maracanãs e afins e após a barreira ter desaparecido,
houve uma dispersão do grupo para ambientes antes pouco explorados. Duas possíveis barreiras
seriam: um mar transcontinental formado no sul da Argentina e do Chile durante o Oligoceno; ou
algumas linhagens poderiam estar evoluindo na Antártica e teriam sido impulsionados para a
América do Sul, à medida que a Antártica migrou mais para o sul e se tornou um continente
incrustrado por gelo.
Capítulo 4
86
A organização dos genes mitocondriais ao redor da região controladora foi determinada para a
maioria dos gêneros de psitacídeos neotropicais. Esses resultados associados a outros obtidos em
trabalhos anteriores foram mapeados na inferência filogenética e alguns aspectos da evolução desse
caráter no grupo estudados estão apresentados a seguir:
• Apresentam a ordem de genes comum de aves táxons do clado de pequenos periquitos
(Bolborhynchus e Nannopsittaca), as primeiras linhagens a se diferenciar no grupo dos papagaios
e afins (Myiopsitta e Brotogeris) e espécies do clado das araras e afins (Ara, Primolius,
Orthopsittaca, Cyanopsitta, Diops i t t aca , Guarouba, Nandayus, Aratinga, Anodorhynchus,
Cyanoliseus, Enicognathus, Rhynchopsitta e Pyrrhura).
• A ordem de genes alternativa está presente na maior parte dos representantes do clado dos
papagaios e afins (Pionopsitta, Graydidascalus,Triclaria, Amazona e Pionus) e em três gêneros do
clado das araras e afins (Deroptyus, Pionites e Forpus).
• O mapeamento sugere convergência na mudança de ordem dos genes e a inferência dos estados
desse caráter em alguns ancestrais foi ambígua, sugerindo mais de uma possibilidade para
explicar a origem desses eventos. Duas hipóteses foram levantadas:
1. A primeira hipótese assume seis eventos independentes, sendo três de duplicação, seguido de três
de deleção de genes, que teriam ocorrido após 54 ma, entre 32-54 ma e após 29 ma,
respectivamente, levando três linhagens a apresentar a ordem alternativa.
2. A segunda hipótese, assume um único evento de duplicação (entre 41-56 ma) seguido de cinco
eventos independentes de deleção posterior de genes, sendo que dois reverteriam para a ordem
comum em aves (entre 26-54 ma e 20-35 ma) e três dariam origem à ordem alternativa (após 54
ma, entre 32-54 ma e após 29 ma).
• Como não dispomos de elementos para identificar se duplicações ou deleções de genes são mais
prováveis de acontecer, não pudemos concluir qual o mecanismo mais provável para explicar os
diferentes arranjos nessa linhagem.
• A presença de pseudogenes que representam resquícios dos eventos de duplicação somente nos
táxons que apresentam o arranjo alternativo, não favorece nenhuma das hipóteses, mas evidencia
elementos exclusivos de alguns clados e outros convergentes.
• Sugerimos que a mudança de ordem gênica em Aves poderia envolver um mecanismo de
duplicação e deleção não aleatória dos genes duplicados, modelo que foi proposto para explicar
alteração de ordem gênica em Diplopoda.
ATUALIDADES ORNITOLÓGICAS N.128 – NOVEMBRO/DEZEMBRO DE 2005 – P. 5