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Relacionamento organizacional na plataforma digital: um olhar sobre as organizações de mídia impressa no Facebook1
Bianca Baldoino Bortolucci2 Patrícia Milano Pérsigo3
Universidade Federal de Santa Maria, Frederico Westphalen, Rio Grande do Sul, Brasil.
RESUMO Este artigo trata sobre as transformações necessárias à comunicação organizacional inserida na plataforma digital. Partimos das características da web 2.0 (O`REILLY, 2005), em que os indivíduos assumem diferentes papéis no processo comunicativo, fazendo com que as organizações aí inseridas busquem diferentes formas de relacionamento. Consideramos os veículos de comunicação como organizações que também lançam mão de diversificadas estratégias, como, por exemplo, a sua presença digital, a fim de posicionarem-se on e offline e manterem contato com a sua audiência. Para fins deste trabalho, realizamos observação encoberta não participativa (JHONSON, 2010), analisando as fan pages dos dois maiores jornais em circulação diária no Brasil, em 2013, o Super Notícia e a Folha de S. Paulo. Percebemos que essas organizações mostram-nos um patamar de relacionamento organizacional ainda aquém das possibilidades e apropriações viabilizadas tanto pelos usuários, quanto pela rede social Facebook. PALAVRAS-CHAVE: redes sociais digitais; comunicação organizacional; observação não participante; Super Notícia; Folha de S. Paulo; ABSTRACT This article discusses the changes necessary to insert organizational communication into the digital platform. We start reviewing the Web 2.0 features (O'REILLY, 2005), in which individuals take on different roles in the communication process, leading the involved organizations to seek different forms of relationship. We consider the media as organizations also apply diversified strategies, for example, their digital presence in order to position themselves on and offline and maintain contact with their audience. For the purposes of this study, we conducted covert non-participatory observation (JHONSON, 2010), analyzing the fanpages of the two largest newspapers in daily circulation in Brazil in 2013, the Super Notícia and Folha de São Paulo. We realize that these organizations show us an
1 Trabalho apresentado no GT Comunicação e Organizações do I Simpósio Internacional de Comunicação, realizado de 22 a 24 de agosto de 2016, UFSM, Campus Frederico Westphalen. 2 Acadêmica de Relações Públicas da UFSM/FW, integrante do grupo de Pesquisa EstratO – Estratégias Midiáticas Organizacionais e bolsista FIPE no Projeto de Pesquisa Posicionamento – Presença e Atuação - De Organizações Midiáticas nas Plataformas Digitais. E-mail: [email protected] 3 Doutora e Mestre em Comunicação Midiática/UFSM. Especialista em Marketing e Recursos Humanos/FAMES. Professora Adjunta do Departamento de Ciências da Comunicação, UFSM Campus Frederico Westphalen. Líder do Grupo de Pesquisa EstratO – Estratégias Midiáticas Organizacionais e orientadora do projeto de pesquisa Posicionamento – Presença e Atuação- De Organizações Midiáticas nas Plataformas Digitais, E-mail: [email protected]
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organizational level of relationship still behind the means and appropriations made possible both by users and by the social network Facebook. Keywords: digital networks; organizational communication; covert non-participatory observation; Super Notícia e Folha de S. Paulo;
INTRODUÇÃO
O advento da tecnologia insere-se desde a nossa vida particular até o ambiente
de trabalho, percebemos uma transformação nas formas de apresentação social tanto
de indivíduos, quanto de organizações. A partir do contexto da web 2.0 (O`REILLY,
2005), o jeito de pensar os relacionamentos organizacionais na plataforma digital
modificou-se. Se antes a web tinha um caráter meramente informativo, hoje, a
interação, a socialização de conteúdos e a possibilidade de estabelecimento de redes
são características que demandam diversificadas formas de posicionamento 4
organizacional.
A partir desse panorama, as organizações midiáticas expandem a sua atuação
para além de suas plataformas tradicionais, também para a ambiência digital,
diversificando produtos, forma de entrega e adotando abordagens variadas aos seus
públicos. Nesse cenário, entendemos ser relevante observar os veículos de mídia
impressa, uma vez que eles encerram em si características de organizações: com
produtos, públicos, matéria prima, recursos financeiros, etc.
Os meios de comunicação, marcados pela atuação jornalística, atuam
perpassados por duas visadas: a ideológica e a econômica (TRAQUINA, 2012) e
buscando atender as suas necessidades organizacionais lançam-se à plataforma digital,
em redes sociais digitais. Segundo Pesquisa de Mídia Brasileira (2015), em torno de
49% dos brasileiros usam internet, estando conectados aproximadamente seis horas
por dia em redes sociais digitais5. Entre as redes sociais mais utilizadas e programas
4 Neste artigo, tomamos Andrews (2011) para compreender o posicionamento organizacional como o elemento que difere as organizações entre si. Sendo, assim, essencial, o planejamento e a adoção de perspectivas de atuação frente o cenário organizacional. 5 É interessante buscar maior clareza em alguns conceitos chave nesta pesquisa. Entendemos rede social como um “agrupamento de usuários/pessoas com origens, finalidades e atuações distintas que, fatalmente, tem algum nível de relação ou interesse mútuo, representada, por exemplo, pelo Facebook” (TELLES, 2010, apud COLNAGO, 2015, p. 8). Na verdade, a diferença entre os conceitos de rede social e mídia social reside no objetivo de cada um, se, por um lado, as redes sociais são sites de relacionamento, as mídias sociais caracterizam-se pela divulgação e compartilhamento de conteúdos.
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de trocas de mensagens (1º + 2º + 3º lugares), estão o Facebook (83%), o Whatsapp
(58%), o Youtube (17%), o Instagram (12%) e o Google+ (8%). Ao realizar uma
breve busca no Facebook, rapidamente podemos identificar a presença dos maiores
jornais diários do Brasil nessa plataforma. Mas quais são os seus objetivos? Como
organizam/planejam as suas publicações? De que maneira ocorre a interação com o
público? Quem é esse público que ali está? Essas são apenas algumas questões que
suscitam nosso interesse e representam nossa motivação na presente investigação
científica. Dessa forma, aqui reside a nossa pergunta de pesquisa: como as
organizações midiáticas – veículos de mídia impressa – estabelecem relacionamentos
no Facebook? Nosso objetivo é refletir sobre as formas de relacionamento dos dois
maiores jornais em circulação diária do Brasil no ano de 2013, no Facebook: Folha de
S. Paulo e Super Notícia6. O percurso metodológico desta investigação adota a
pesquisa bibliográfica (STUMPF, 2012) e a observação encoberta não participante
(JOHNSON, 2010). Realizamos a observação de uma semana de cada jornal e
coletamos os posts com maiores índices de engajamento (curtidas, comentários e
compartilhamentos), após esta etapa, analisamos os contatos ali estabelecidos entre
veículos e os seus públicos. Para embasar nossas discussões teóricas, adotamos
Corrêa (2009), Terra (2009), Traquina (2012), Galindo (2015) e Colnago (2015).
1) A comunicação organizacional no contexto digital
Nossa sociedade está estruturada por meio de diversas organizações. Trocas de
produtos e serviços ocorrem amparadas na atuação e nos processos organizacionais.
Percebemos que, em nosso cotidiano, deparamo-nos com diversas formas de
organizações, como as empresas privadas, as instituições públicas, as organizações
não governamentais, ONGs, entre muitas outras.
Para permanecerem no mercado em que se inserem, elas necessitam colocar
em prática processos de comunicação que traduzam e consolidem relacionamentos
com os seus públicos. Neste sentido, a comunicação organizacional é um tema
Dessa forma, podemos perceber que as mídias sociais operacionalizam-se em sites de redes sociais, de acordo com Colnago (2015) ao citar Telles (2010). 6 Segundo dados da Associação Nacional de Jornais. Disponível em: http://www.anj.org.br/maiores-jornais-do-brasil/ Acesso em: 4 de Agosto de 2016.
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recorrentemente abordado por diversas áreas, desde as ciências administrativas,
passando pela psicologia, pedagogia até as relações públicas. As suas discussões
buscam entender como as empresas ou as instituições colocam em prática os seus
processos comunicacionais; relacionam-se com os seus públicos ou mesmo qual o
tipo de abordagem, conteúdos e imagens, entre outros.
O contexto mercadológico contemporâneo é de constantes transformações,
mudanças nas rotinas produtivas, perfil e segmentação dos públicos, novas exigências
em relação aos produtos e serviços oferecidos. Quando tratamos de organizações
midiáticas e, principalmente, as de mídia impressa, percebemos que ao mesmo tempo
em que a tecnologia colabora para agilizar a apuração do fato, também possibilita
novas formas de consumo e circulação da notícia. Nesse patamar, as organizações são
levadas a adotar diversificadas estratégias como forma de sustentar o seu papel de
mediadoras/curadoras desse produto “notícia”, tão volátil, perecível.
Ao inserirem-se na plataforma digital, compartilham dos contornos e das
peculiaridades da web 2.0 (O`REILLY, 2005), termo que se popularizou a partir do
ano de 2004. A expressão ‘2.0’ vem para marcar a segunda geração da plataforma
digital até então conhecida, marcada, agora, por ser de comunidade e serviços. As
mudanças vieram na percepção de seus usuários e organizadores, ela transformou-se
em um ambiente de interação, com uma dinâmica de maior colaboração.
A partir de números crescentes de acesso à internet e, até mesmo, a
popularização do computador, percebemos que a apropriação dessas ferramentas
pelos indivíduos provocava novas e diferentes experiências. Com isso, houve o
advento de mídias sociais, que podem ser entendidas como os blogs, os quadros de
mensagens, os podcasts e as redes sociais digitais: desde a mais abrangente até a
destinada a públicos mais específicos (TERRA, 2011).
Já as mídias sociais podem ser entendidas de diversas maneiras, mas as
definições trazem o indivíduo como o centro do comando, decidindo o que consumir,
divulgando a sua maneira de pensar, as opiniões e os valores sobre um determinado
assunto (CIPRIANI, 2011).
O formato de conversação e não monólogo; procura facilitar a discussão bidirecional e evitar a moderação e a censura; tem como protagonistas as
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pessoas e não as empresas ou marcas, isto é, quem controla sua interação com as corporações são os próprios usuários; tem como principais valores a honestidade e a transparência; e privilegia a distribuição em vez da centralização, uma vez que tem diversos interlocutores que tornam a informação heterogênea e rica (TERRA, 2010, p. 7).
Os indivíduos deixam de ser meros receptores do processo comunicativo e
passam a ter uma maior autonomia, tanto de produzir os seus próprios conteúdos,
quanto de fazer recircular/resignificar o que recebem.
Partindo de uma proposta de possibilitar a interação entre pessoas, entendemos
por interação a troca mútua de informações, o diálogo, sendo relevante, no processo
da interação, a mudança de comportamento entre os envolvidos. A interação atual
possibilitada pelas redes sociais traz indivíduos autônomos e mais ativos no processo
comunicacional, o que representa um desafio para as organizações inseridas nesse
meio, pois encontra-se dispersa a possibilidade de previsão do comportamento dos
usuários (TERRA, 2009).
Para as organizações, o comunicar-se é essencial, as redes sociais
possibilitaram contato com diferentes tipos de públicos, o que sempre foi uma
preocupação e, ao mesmo tempo, um desejo. Assim, entendemos necessário estar
nesse ambiente digital-social e tirar o melhor que ele pode proporcionar (TERRA
2009). “Estamos diante de um espaço relacional e os sujeitos sociais interagem em
condições de tempo, de velocidade e de visibilidade diferenciados” (GALINDO,
2015, p. 60).
Assim, as redes sociais e de, forma mais geral, a web proporcionam às
organizações um potencial de visibilidade no qual elas próprias podem auto-
gerenciar-se. É a própria corporação quem decide onde e como quer estar presente. O
contato com os públicos não mais depende apenas dos meios de comunicação de
massa, unidirecionais e assimétricos (BUENO, 2015).
Abre-se a possibilidade de inserção na plataforma digital, mas somente estar
presente, não é o bastante. Os indivíduos que formam as redes sociais digitais exigem
postura diferenciada do que estava sendo feito até o momento em termos de
comunicação organizacional. Os processos comunicativos das organizações aí
inseridas precisam contemplar também a fluidez dos papéis de produtor/enunciador e
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receptor/consumidor de conteúdos. Além disso, destacamos a necessidade de
relacionamento.
O que surge hoje é a necessidade de substituir a cultura do “impressionar” por uma nova cultura de relacionamento do consumidor com a mídia, ou seja, a da “expressão”. Sem dúvida, o consumidor está tendendo a valorizar sua capacidade de expressão, afinal, vem ocupando o centro do processo. E não está apenas assistindo ou consumindo as mídias, mas articulando entre seus pares, e compartilhando entre si seus diversos conteúdos (GALINDO, 2015, p.61).
Dessa forma, entendemos ser necessário elaborar estratégias direcionadas para
as redes sociais e não somente adaptar conteúdos das mídias tradicionais para essa
ambiência. Esse contexto mostra-nos que estão “diminuindo as distâncias entre os
interlocutores, potencializando cada voz e, consequentemente, contribuindo para um
processo comunicacional mais horizontalizado” (GONÇALVES E SILVA, 2015, p.
69).
Além disso, o poder de replicação das mensagens e a velocidade com que elas
espalham-se podem representar tanto um forte aliado na propagação do discurso
organizacional, mas também, caso ocorra mau uso dessas ferramentas de
comunicação e interação, ter um efeito negativo. Outra dificuldade enfrentada no
processo comunicacional é o profissional inadequado, acostumados com uma
comunicação fechada, muitas vezes com respostas arrogantes e secas ou até mesmo
pela ausência de contato com seu público (BUENO, 2015). Por conta disso, é
fundamental conhecer esse novo território, preparar conteúdos planejados a partir das
características e da gramática das redes sociais, dos contornos da plataforma digital.
Desse modo, saber usar esse meio de forma estratégica é um desafio na
contemporaneidade.
Reconhecer, então, a ambiência digital como outra comunicação de mão dupla
e mais horizontal é um diferencial, ‘saber falar e saber ouvir’ é uma necessidade
(BUENO, 2015). O diálogo é a peça chave desse canal. A maioria das vezes, o
principal objetivo das redes sociais, que é o relacionamento, acaba não sendo
efetivado. As organizações usam esse local de interação somente para divulgar
informações, assim como nas mídias tradicionais. Percebemos que
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no contexto das organizações, a comunicação com os diversos públicos sempre foi uma preocupação, e as tentativas de aproximação eram feitas de forma muitoconvencional pelos instrumentos de comunicação interna ou externa e por meio da mídia. Hoje não se pode mais pensar a comunicação organizacional sem considerar o fenômeno das redes digitais (GONÇALVES E SILVA, 2015, p. 70).
A contribuição dos autores auxilia no sentido de tornar clara a necessidade da
comunicação organizacional acompanhar esse momento em que os seus públicos
inserem-se em ambientes on e offline. Segundo (TERRA, 2009), o usuário que opina,
debate, acaba por influenciar outros usuários a pensar de forma similar. Assim, torna-
se usuário ativo e influenciador. Ou, como denominado pela autora; usuário mídia.
A Internet funciona nos dias de hoje como uma vitrine virtual de exposição institucional. Em face disso, é quase impossível não encontrarmos as grandes corporações na Web. Os três poderes institucionalizados – executivo, legislativo e judiciário – somados à imprensa (o quarto poder) ganham com a internet um quinto elemento. O quinto poder é o internauta, o usuário de internet que ganhou voz, que faz barulho, gera boca-a-boca, que ao mesmo tempo em que pressiona organizações, participa e colabora com conteúdos, informações, opiniões (TERRA, 2009, p. 1).
A partir desse cenário, percebemos a dimensão da transformação não só nas
plataformas, as quais viabilizam diferentes formas de comunicação, mas também nos
usos e nas apropriações feitos pelos usuários inseridos nessa ambiência.
2) Relacionamento organizacional no site de rede social Facebook
A presença das organizações nas redes sociais digitais na contemporaneidade
passa a ser uma forma de oferta de produtos/serviços e encontro com os públicos.
Dessa maneira, configura-se como uma necessidade o fato de adaptar-se à ambiência
digital. Com intervenção marcante dos internautas e a velocidade com que os
conteúdos circulam, passa-se a exigir posturas diferenciadas das organizações e, cada
dia, mais atuais e inovadoras como caminho para um posicionamento organizacional
estratégico.
A presença digital, bem como a perenidade das organizações nas redes sociais,
exige estratégias específicas, para tanto é fundamental a quebra de antigos
paradigmas. Corrêa (2009) destaca a criatividade, a inovação e a flexibilidade por
parte dos profissionais de comunicação corporativa como a melhor forma de
responder a todos os agentes inseridos ou perpassados na ambiência digital.
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A partir do referencial teórico apresentado, refletimos aqui sobre a presença
das organizações de mídia no Facebook. De acordo com McQuail (2013), as
organizações midiáticas são “organizações híbridas”, uma vez que não podemos situá-
las claramente nem como uma indústria de bens/serviços, nem como uma indústria de
tecnologia. “A organização do jornal está engajada em fazer um produto e fornecer
um serviço” (MCQUAIL, 2013, p. 280). Para tal proposição, torna-se essencial, até
mesmo uma questão de sobrevivência, que essa organização estabeleça
relacionamentos diversos com a sociedade. Assim, é relevante que compreendamos a
organização midiática como um espaço de forças e disputas não só internamente, mas
também com diversas instituições sociais.
Uma vez inseridas na plataforma digital, com a disponibilização de seus
produtos 24 horas por dia, essas organizações encontram-se em meio a uma gama de
informações. Vindas de diversas fontes e em variados formatos, elas acirram, ainda
mais, o cenário de competição entre mídias, independente se pertencentes a
conglomerados midiáticos, mídias independentes ou blogues de profissionais diversos
que, pelo prazer de escrever, emitem as suas opiniões acerca de fatos e
acontecimentos do espaço público. A oferta de produtos informativos, nesse
ambiente, é grande e diversificada, podendo atender a todo tipo de público. O
diferencial estará, entre outras questões, na credibilidade da informação. Dessa forma,
[...] questões como as liberdades essenciais de divulgação e as diretrizes éticas para muitas atividades profissionais são estabelecidas pelas “regras do jogo” da sociedade específica. Isto implica, por exemplo, que as relações entre organizações de mídia e seus ambientes operacionais sejam regidas não apenas pela lei, por forças de mercado ou pelo poder político, mas também por diretrizes e obrigações sociais e culturais não escritas (MCQUAIL, 2013, p. 264).
A presença de uma organização midiática em uma dada sociedade estará
constantemente marcada pela perspectiva do interesse público, mas também pelas
questões e configurações de mercado. No caso da mídia impressa, são recorrentes as
notícias abordando o declínio7 das publicações nesse formato, a queda na circulação
7 “Circulação das revistas em queda” (Disponível em: <http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/circulacao_das_revistas_em_queda>. Acesso em: 10 out. 2014); “Circulação dos jornais gaúchos segue em queda” (Disponível em: <http://www.coletiva.net/noticias/2014/09/circulacao-de-jornais-gauchos-segue-em-queda/>. Acesso
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de jornais ou a diminuição no número de assinaturas. Esses aspectos denotam não
somente um impacto econômico nas organizações, mas, ao mesmo tempo, uma
transformação no comportamento e nos hábitos da audiência dessas mídias, exigindo
ações da organização para que se mantenham presentes no mercado.
Este artigo está vinculado aos estudos do Projeto de Pesquisa intitulado
“Posicionamento - presença e atuação - de organizações midiáticas na plataforma
digital”. Levando em conta tal proposta, aqui, delimitamos a pesquisa aos dois
maiores jornais impressos do Brasil em circulação8, Super Notícia e Folha de S.
Paulo. Dados de 2013 apontam que, em primeiro lugar, está o Super Notícia, jornal
mineiro, com sede em Belo Horizonte, com uma média de 302.472 exemplares
diários. E, em segundo lugar, está a Folha de S. Paulo (FSP), de São Paulo, com
circulação média diária 294.811 exemplares³. Podemos conferir, no quadro abaixo, a
evolução dos números de circulação desses jornais de 2013 a 2015. RANKING DE CIRCULAÇÃO (ANJ, 2013)
1º Super Notícia Média de exemplares: 302.372 mil 2º Folha de São Paulo Média de exemplares: 294.811 mil
RANKING DE CIRCULAÇÃO (ANJ, 2014) 1° Folha de São Paulo Média de exemplares: 351.745 mil
3° Super Notícia Média de exemplares: 318.067 mil RANKING DE CIRCULAÇÃO (ANJ, 2015)
1º Super Notícia Média de exemplares: 220. 971 mil 3º Folha de São Paulo Média de exemplares: 175.441 mil
Quadro 1: Evolução de circulação dos jornais impressos analisados Fonte: autoria própria, com base na Associação Nacional de Jornais.
Segundo informações de seus websites9, iniciando pelo Super Notícia, o jornal
começou a ser publicado em 10 de junho de 2002 na capital mineira, o seu público
alvo é a classe C e D, sendo vendido por um preço considerado popular, R$0,25
centavos em Belo Horizonte e R$0,50 centavos fora da capital. Em 2006, ocupava a
sétima posição do ranking dos 10 maiores jornais do Brasil, em 2015, já havia subido
em 10 out. 2014); “Existe uma crise nos impressos? Nada a declarar, respondem os jornais” (Disponível em: <http://apublica.org/2013/06/existe-uma-crise-nos-impressos-nada-declarar-respondem-os-jornais/> Acesso em: 10 out. 2014.); “Abril encerra atividades da revista Bravo” (Disponível em: <http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/abril-encerra-atividades-da-revista-bravo>. Acesso em: 10 out. 2014). 8 Conforme dados da ANJ do ano de 2014. 9 Disponível em: <http://www.otempo.com.br/super-noticia/> Acesso em: 15 de agosto de 2016.
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para a terceira colocação. O jornal faz parte do grupo SADA10, que possui mais outros
seis jornais. A fan page do Super Notícia no Facebook possui 10.401 mil curtidas, o
jornal também está presente no Twitter 2.300 e no Instagram com 153 seguidores.
O jornal Folha de S. Paulo foi criado no ano de 1921, primeiramente, como
“Folha da Noite”, mais adiante, em 1925, foi criada a “Folha da Manhã”, uma edição
matutina do “Folha da Noite” e, após 24 anos, foi fundado a “Folha da Tarde”. Em
1960, a junção dos três títulos deu origem ao que conhecemos atualmente, a Folha de
São Paulo. Com o seu caráter inovador, nos anos 60, foi o primeiro jornal em
impressão offset em cores e também foi o primeiro veículo de comunicação a oferecer
conteúdo online a seus leitores. Atualmente, a fan page no Facebook conta com mais
de 5.500.000 curtidas. O jornal também está presente em outras redes sociais, como
por exemplo o Twitter com 4,6 milhões e o Instagram com 444 K seguidores.
2.1 A coleta de dados
Após delimitarmos nosso corpus de pesquisa nesses dois jornais, adotamos
aleatoriamente uma semana (10 de Julho a 17 de Julho de 2016) para realizar a
observação encoberta não participativa (JHONSON, 2010). Essa técnica “representa a
situação em que a função do pesquisador é apenas observar, mas os sujeitos sob
observação não sabem que estão sendo estudados” (JHONSON, 2010, p.63). Nosso
objetivo foi acompanhar as formas de relacionamento e interação dos jornais com os
seus públicos. Portanto, nessa semana de coleta de dados, inicialmente, monitoramos
todas as publicações dos dois jornais. Justificamos essa etapa a partir das reflexões
teóricas, uma vez que se a plataforma digital permite processos de comunicação sem
limite de espaço ou tempo, entendemos que seria interessante fazer a coleta inicial de
todo o conteúdo produzido pelas organizações de mídia para, posteriormente, analisar
o conteúdo relevante ao nosso objetivo.
Num segundo momento, observamos quais os posts que geravam maior
número de engajamento. Entendemos engajamento, neste artigo, como a situação em
que a pessoa “interagiu de alguma forma, curtindo, compartilhando ou comentando
posts. Quem se engaja não apenas se limita a visualizar o conteúdo, mas opina a 10 Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/> Acesso em: 15 de agosto de 2016.
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respeito11”. Assim, é a partir do engajamento que as organizações em geral podem
estabelecer verdadeiros relacionamentos. Para facilitar a análise das fan pages dos
dois jornais, realizamos o cálculo da média12 de engajamento gerada a partir de seus
posts na semana de observação. A fan page do jornal Super Notícia obteve um baixo número de postagens
durante a semana analisada. No dia 10 de Julho (domingo), o jornal publicou apenas
quatro vezes, sendo que o máximo de curtidas atingiu 12 e o número mínimo foi uma,
com nenhum comentário e nenhum compartilhamento das publicações. No dia 11 de
Julho (segunda-feira), o jornal apresentou um número mais baixo de publicações,
apenas três, com oito curtidas como o máximo e três curtidas como o mínimo, além
de nenhum comentário e compartilhamento. Até o fim da semana analisada, não
houve mais publicação do jornal no Facebook.
DOMINGO (10 DE JULHO) M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS
0 4,25 0 SEGUNDA (11 DE JULHO)
M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS 0 6 0
Quadro 2: Engajamento gerado na fan page Super Notícia. Fonte: autoria própria.
Já a fan page do jornal Folha de S. Paulo obteve um número maior de
postagens durante a semana analisada. Para uma melhor organização, foi elaborado o
quadro (3) a seguir com a média de compartilhamentos, comentários e curtidas de
cada dia.
DOMINGO (10 DE JULHO) M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS
144,76 120,46 936,23 SEGUNDA (11 DE JULHO)
M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS 179,60 89,80 608,36
TERÇA (12 DE JULHO) M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS
144,767 120,464 936,232 11 Disponível em: < http://trends.rmacomunicacao.com.br/visibilidade-engajamento-e-reputacao-como-definir-as-metricas-que-interessam-para-a-sua-marca-nas-redes-sociais> Acesso em 08 de agosto de 2016. 12 Como forma de chegar a um número médio de curtidas, comentários e compartilhamentos realizamos o seguinte cálculo: somamos as curtidas, comentários e compartilhamentos de todas as publicações do dia e depois dividimos pela quantidade de publicações do dia.
12
QUARTA (13 DE JULHO) M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS
112,37 110,22 1.003,98 QUINTA (14 DE JULHO)
M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS 150,05 93,78 1.042,29
SEXTA (15 DE JULHO) M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS
453,46 208,98 1.674,63 SÁBADO (16 DE JULHO)
M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS 126,54 287,78 955,80
DOMINGO (17 DE JULHO) M. COMPARTILHAMENTOS M. CURTIDAS M. COMENTÁRIOS
123,188 177,37 907,06 Quadro 3: Engajamento gerado na fan page Folha de S.Paulo. Fonte: autoria própria.
A partir dos dados coletados, confrontamos com o referencial teórico trazido e
buscamos responder o nosso objetivo de pesquisa, refletir sobre as formas de
relacionamento dos dois maiores jornais em circulação diária do Brasil no ano de
2013, no Facebook: Super Notícia e Folha de S. Paulo.
2.2 Análise dos dados
De imediato, já podemos observar uma diferença de postura entre os dois
veículos de mídia impressa no site de rede social Facebook. Enquanto a FSP mantém
posts diários marcando presença constante frente ao seu público, o Super Notícia já
não tem tanta preocupação com a presença digital. Além disso, atentamos não
somente para os números de compartilhamentos, curtidas e comentários, mas
analisamos se ocorriam interações/diálogos dos jornais com os seus
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Figura 1: Interação do jornal com leitor no Facebook, 2016. Fonte: Fan page FSP.
Neste sentido, identificamos que apenas a Folha de S. Paulo apresentou algum
tipo de interação com o público. No dia 11 de Julho (segunda-feira), o jornal
respondeu a um usuário, conforme figura (1) ao lado. Da mesma forma, no dia 12 de
Julho (terça-feira), o jornal também respondeu a um usuário, com linguagem
descontraída. A partir desses dois posts, percebemos que a organização midiática em
questão pratica a interação com o seu público com base em conteúdo mais vinculados
ao entretenimento; música na figura 1 e culinária/programa de TV em outros posts.
Esse fato mostra que talvez o Facebook, para a FSP, ainda não se consigura
como objetivo de posicionamento estratégico, tendo em vista que mesmo as
interações destacadas não apresentam uma frequência definida. Assim como
assinalado na coleta de dados, a figura 2 mostra a total falta de interação do jornal
Super Notícia. Além disso, em sua fan page, é bastante comum a replicação de
conteúdo de outro jornal impresso do mesmo grupo, o Jornal O Tempo13 (figura 2).
Outra questão que pode ser levantada a partir da observação dos dois jornais refere-se
13 Disponível em: <http://www.otempo.com.br> Acesso em: 15 de agosto de 2016.
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ao interesse público e ao interesse do público. Para Traquina (2012), o polo
ideológico do jornalismo, do noticiar fatos que ocorrem no espaço público de
interesse público, está perpassado pelo econômico, das notícias como mercadoria,
marcadas constantemente pelo interesse do público.
Figura 2: Postagem do Super Notícia replicando conteúdo do O Tempo, 2016 Fonte: Fan page, Super Notícia
Expresso em outros termos, informações e/ou curiosidades sobre celebridades
interessam ao público nem tanto como potencial de atuação cidadã, mas como forma
de diversão, tendo em vista que, normalmente, os conteúdos nessas notícias partem da
ordem da vida privada de indivíduos, como o exemplo da figura 2. Nesse cenário, o
Super Notícia e a Folha de S. Paulo aproximam-se, já que conteúdo ou a chamada de
suas postagens carrega esse caráter de interesse do público. Ainda assim, frente ao
volume de publicações da FSP, percebemos que o veículo utiliza a rede social de
forma instrumental, o que pode levar-nos a considerar que o jornal não conta com um
planejamento de posicionamento estratégico para a ambiência digital.
Neste sentido, questionamo-nos mais uma vez, sendo a web 2.0 uma
ambiência marcada pelo caráter social, de produção, circulação e reelaboração dos
conteúdos, quais os entraves ainda existentes na atuação dessas organizações
midiáticas a tal ponto de não se apropriarem da lógica da socialização dos conteúdos
pelos próprios usuários? Este fato poderia contribuir para uma ampliação do público
dos veículos de comunicação. Ademais, as características de instantaneidade,
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simultaneidade e globalidade também colaborariam na ampliação dos momentos de
contato com diferentes usuários da rede.
Sob outra perspectiva, observamos que, nas redes sociais digitais, por vezes,
os usuários tecem críticas às organizações, muito por entenderem oeio como
possibilidade de serem ouvidos, de relacionarem-se e mostrarem as suas insatisfações,
buscam ter as suas demandas atendidas. Muito além de contatos fugazes, o fácil
acesso às redes sociais digitais mostra às organizações um campo fértil com
possibilidades de estabelecer relacionamentos. Neste sentido, a FSP possui uma fan
page específica para atendimento ao usuário – Folha Atende - (figura 3), porém, como
podemos ver, o jornal não dialoga com o seu público ali presente, além de ter um
canal desatualizado (última postagem de 17/10/2014). Assim, temos a situação de
usuário-mídia (TERRA, 2009), em que o indivíduo manifesta a sua opinião e, nesse
caso, não recomenda o produto (FSP).
Figura 3: post do Folha Atende, 2016.
Fonte: fan page Folha de S. Paulo.
Neste aspecto, entendemos que o usuário pode atuar na propagação das suas
experiências e, consequentemente, contribuir para a boa imagem da organização. O
contrário também pode ocorrer, quando o indivíduo, por meio de seus depoimentos,
alerta outros possíveis consumidores sobre problemas de toda ordem.
Tendo em vista os aspectos observados neste artigo, verificamos que o
potencial presente nas redes sociais ainda é pouco explorado, as ações efetivadas
pelas empresas e instituições limitam-se apenas à divulgação de informações, fazendo
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uma comunicação de mão única e distante das possibilidades de interação que esse
meio possibilita. Assim, o nosso olhar sobre o relacionamento dessas organizações de
mídia impressa na plataforma digital mostra-nos um patamar ainda aquém das
possibilidades e apropriações viabilizadas tanto pelos usuários, quanto pela rede
social Facebook. Esse cenário dá-nos indícios de uma replicabilidade da lógica da
mídia de massa na ambiência digital, que observa de forma míope os contornos da
web 2.0.
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