quem guarda sempre tem: o cuidado com as sementes crioulas em poço cumprido
DESCRIPTION
Os saberes da lida com a terra são formados como uma colcha de retalhos. Em Poço Cumprido, região de Vitória da Conquista, a cultura de armazenar sementes é uma prática passada de pai pra filho, e vem sendo aperfeiçoada pela comunidade. Além de quase todas as casas terem seu estoque familiar, Poço Cumprido já está caminhando para fazer seu banco de sementes comunitário.TRANSCRIPT
Quem guarda sempre tem:
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Ano 9 • nº 2041
Fevereiro/2015
Vitória da Conquista
Os saberes da lida com a terra são formados como uma colcha de retalhos, vários pedacinhos de informações
e conhecimentos são passados de geração a geração, partilhando as experiências. Em Poço Cumprido, região de
Vitória da Conquista, a cultura de armazenar sementes é uma prática passada de pai pra filho, e vem sendo
aperfeiçoada pela comunidade. Além de quase todas as casas terem seu estoque familiar, Poço Cumprido já está
caminhando para fazer seu banco de sementes comunitário.
Seu Manoel Alves e dona Edineide guardam sementes desde o início do casamento, há cerca de 30 anos. Mas
os dois aprenderam essa prática muito tempo antes, ainda na casa de
seus pais. Antes eles guardavam apenas para garantir sementes para
o plantio na época adequada, e hoje sabem que é preciso também
preservar a qualidade. “A semente de mercado não foram adaptadas
à nossa terra, mas mesmo que nós plantemos as sementes não dá
bem, por isso, nós tem de guardar a nossa na nossa casa de semente”,
conta Manoel. Dona Edineide, que cuida das hortaliças da família
contou que sempre, depois da primeira colheita, ela separa as
sementes que serão usadas nas próximas plantações. O casal cultiva
hoje além de milho e feijão, a alface, couve, coentro, cebolinha,
mostrando assim, que fazendo o armazenamento de sementes é possível ter fartura em qualquer época do ano.
Outra família que igualmente tem o hábito de guardar as sementes é a de Dona Maria e seu Manoel, conhecido
como Manél. O casal tem essa prática há mais de 25 anos, e contam
que aprenderam com seus pais. No começo guardavam em
tambores de zinco. Mas movido pela paixão pela terra, o casal
continuou na busca pelo conhecimento e, a partir de visitas,
intercâmbios e encontros, hoje sabem que para produzir sementes
de qualidade, a plantação deve ser feita sem o uso de agrotóxicos e
armazenada de forma correta, por isso, após secarem as sementes,
as guardam em garrafas pet.
Seu Manél tem conhecimento que a semente crioula, além
de carregar a história do povo, também deve ser usada para
O cuidado com as sementes crioulas em Poço Cumprido
Estoque de sementes de capim
Dona Maria e seu Manoel, sementes crioulas de feijão e milho
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Bahia
Seu Manél tem conhecimento que a semente crioula, além de carregar a história do povo, também
deve ser usada para fortalecer a produção da comunidade. Tanto que, partilha suas sementes, seus
conhecimentos com os vizinhos, amigos e demais agricultores. Ele lembra: “Tinha pessoas que guardava as
sementes para no tempo de estiagem vender mais caro. E nóis guardava pra que se outra família precisasse,
usava as que tinha e depois era só repor a mesma quantidade pra gente”.
Prova que a cultura de guardar sementes na comunidade de Poço Cumprido já é uma tradição, é seu
Jesuíno, 78 anos. O morador mais velho da comunidade, ao lado de
Dona Maria, aprendeu ainda quando pequeno, com seu pai, a
estocar sementes, especialmente o milho e feijão. Para assegurar a
continuidade dessa prática seu Jesuíno ensinou todas as suas oito
filhas a estocarem as sementes crioulas. Seu Jesuíno prefere as
sementes da própria terra, do que as comprada no mercado, pois,
segundo ele, “antes fiado a pilão que comprado a tostão”.
Para fortalecer a produção de sementes crioulas, a
comunidade Poço Cumprido se prepara para construir o banco de
sementes comunitário, comumente conhecido como casa das
sementes. O banco de semente é o local para guardar e armazenar as
sementes crioulas, um espaço de troca de sementes entre as famílias
do local. Assim será possível aumentar a variedade de culturas
produzidas e garantir o estoque para a plantação do ano seguinte e
que as sementes melhor adaptados à região semiárida.
A semente Crioula é vida e carrega a história do povo, garante a diversidade do sertão. Sertão que
caminha, cada vez mais, para ser repleto de gente que cultiva e estoca as sementes com amor. E que, com sua
conversa brejeira e seus ensinamentos, transmitidos de geração a geração encantam a todos e nos ensina o
que é ter qualidade de vida!
Realização Apoio
D. Maria e seu Jesuíno, sementes de feijão
Gabiraba A pequena Caroline e as sementes de feijãoVaranda da casa de D. Maria e Seu Jesuino