processos de produÇÃo de imagens na fotografia...

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ANDREI RAFAEL GALKOWSKI PROCESSOS DE PRODUÇÃO DE IMAGENS NA FOTOGRAFIA ARTÍSTICA: UM ESTUDO DE CASO DO TRABALHO SUJEITO/OBJETO Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do título de especialista em Fotografia: Processos de Produção de Imagens, da Universidade Tuiuti do Paraná − UTP. Orientadora: Professora Ms. Ana Emília Jung CURITIBA 2014

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ANDREI RAFAEL GALKOWSKI

PROCESSOS DE PRODUÇÃO DE IMAGENS

NA FOTOGRAFIA ARTÍSTICA: UM ESTUDO DE CASO DO

TRABALHO SUJEITO/OBJETO

Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do título de especialista em Fotografia: Processos de Produção de Imagens, da Universidade Tuiuti do Paraná − UTP. Orientadora: Professora Ms. Ana Emília Jung

CURITIBA

2014

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TERMO DE APROVAÇÃO

ANDREI RAFAEL GALKOWSKI

PROCESSOS DE PRODUÇÃO DE IMAGENS

NA FOTOGRAFIA ARTÍSTICA: UM ESTUDO DE CASO DO

TRABALHO SUJEITO/OBJETO

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de especialista no curso de pós-graduação “Fotografia: Processos de Produção de Imagens”, da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ______________________________ de 2014.

_______________________________________________________________

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: Prof.ª mestre Ana Emília Jung UTP – Universidade Tuiuti do Parana- Campus Curitiba

Prof. ª mestre Maria Cristina Mendes UTP- Universidade Tuiuti do Parana- Campus Curitiba

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pelas condições que me deu para o desenvolvimento deste

trabalho.

Aos meus amigos participantes da pesquisa, os quais foram fonte de

inspiração para a concretização da proposta do ensaio fotográfico.

Aos colegas e aos professores da turma de pós-graduação, que auxiliaram na

construção deste trabalho mediante as inúmeras trocas de informações e

conhecimentos.

À minha família, a qual me apoiou desde o início do curso, especialmente

minha mãe, que me motivou para concluir este trabalho e o curso de pós-graduação.

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RESUMO

As informações aqui situadas referem-se ao desenvolvimento de um portfólio sobre o ensaio fotográfico intitulado “Sujeito/Objeto”, desenvolvido a partir da pesquisa Homem/Objeto que ocorreu no módulo “Processos de Criação”, em abril de 2013, no curso de pós-graduação em Fotografia, na Universidade Tuiuti do Paraná, em Curitiba. Cada participante da pesquisa foi instigado a produzir três fotografias de objetos pessoais que o autorrepresentassem e, a partir delas, elaborar um pequeno texto argumentativo acerca de cada objeto. As fotografias foram enviadas de maneira virtual, através de e-mails e redes sociais. Deste grupo, foram selecionados 12 sujeitos, residentes nas cidades de Joinville, Curitiba e São Bento do Sul, para facilitar as etapas seguintes. O interesse em trabalhar retratos a partir da relação de um grupo de pessoas com seus objetos surgiu de questionamentos a respeito do mundo material e imaterial que os objetos permitem ao sujeito vivenciar. Através de nossas lembranças, criamos um mundo imagético, o qual retrata toda a nossa essência e o seu modo de pensar. Os registros de objetos apontam elementos que auxiliam a demonstrar características do que consumimos, maneiras de pensamentos e representações simbólicas. Diante do ensaio fotográfico, o assunto foi a construção de um autorretrato por meio de fotografias de objetos pessoais e a tecnologia empregada na elaboração de tais imagens, utilizada de maneira diferenciada por cada participante. O espaço/tempo que compõe as coordenadas de situação consistiu no tempo dado para a produção das imagens, que resultaram em um produto final, as fotografias.

Palavras-chave: Retrato. Fotografia. Processos de Criação.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

IMAGEM 1 − “DIEGO VELÁSQUEZ, AS MENINAS, 1656” ...................................... 16

FRAME 1 – DOCUMENTÁRIO “LIXO EXTRAORDINÁRIO” ..................................... 17

IMAGEM2- “JACQUES- LOUIS DAVID, A MORTE DE MARAT, 1793” .. ..................17

FRAME 2 – DOCUMENTÁRIO “LIXO EXTRAORDINÁRIO” ..................................... 18

FRAME 3 – DOCUMENTÁRIO “LIXO EXTRAORDINÁRIO” ..................................... 18

IMAGEM 3 – “DIANE ARBUS, JOVEM FAMÍLIA DO BROOKLYN, 1966” ................ 20

IMAGEM 4 – “JOEL-PETER WITKIN, LEDA, 1986” .................................................... 21

FIGURA 1 − ESTUDO LEITURA/CRIAÇÃO DA IMAGEM ........................................ 24

FIGURA 2 − REGISTRO FOTOGRÁFICO PERTENCENTE À PESQUISA

HOMEM/OBJETOS ................................................................................................... 25

FIGURA 3 − REGISTRO FOTOGRÁFICO PERTENCENTE À PESQUISA

HOMEM/OBJETOS ................................................................................................... 26

FIGURA 4 − LAYOUT DAS MONTAGENS FOTOGRÁFICAS .................................. 27

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 7

2 FOTOGRAFIA: REGISTRO, CONSTRUÇÃO, FICÇÃO E REALIDADE ................ 9

3 A LINGUAGEM DO RETRATO: ENTRE A REPRESENTAÇÃO E A ARTE ....... 14

4 PROCESSOS DE CRIAÇÃO ................................................................................ 24

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 29

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 30

APÊNDICE ENSAIO FOTOGRÁFICO SUJEITO/OBJETO ...................................... 32

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1 INTRODUÇÃO

Através das lembranças, o homem cria um mundo imagético, que por sua

vez retrata toda a sua essência e o seu modo de pensar. Os registros de objetos

apontam elementos que auxiliam o sujeito a demonstrar características do que

consome, maneiras de pensamentos e representações simbólicas.

Conforme Kubrusly (2006), a fotografia cria um registro de caráter histórico do

momento, um instante que jamais poderá ser produzido novamente e que, de acordo

com autor Enio Leite (2012), aponta considerações sobre épocas, costumes e

tradições, as quais ficam eternizadas no instante fotografado.

A pesquisa Homem/Objetos foi articulada virtualmente por meio de e-mails e

redes sociais e partiu das linguagens do retrato e do autorretrato. Os participantes

utilizaram a linguagem fotográfica para produzir autorretratos, tendo como

referenciais os seus objetos. Cada participante produziu três fotografias e

posteriormente elaborou um pequeno texto justificando a escolha de cada objeto.

A partir das fotografias produzidas pelos participantes, buscou-se produzir

retratos deles com seus devidos objetos em um segundo momento. O interesse em

trabalhar retratos a partir da relação de um grupo de pessoas com seus objetos

surgiu de questionamentos a respeito do mundo material e imaterial que os objetos

permitem ao sujeito vivenciar.

Pode-se apontar que, através do percurso dos gêneros retrato e autorretrato

ao longo da história da arte, informações importantes sobre períodos, técnicas e

poéticas de diferentes artistas são encontradas.

No primeiro capítulo, optou-se por explanar informações referentes à posição

de diferentes autores – sendo eles Boris Kossoy, Roland Barthes, Kubrusly e Susan

Sontag − sobre o universo da fotografia e sua representação da realidade.

Na sequência, são abordadas informações acerca do universo do retrato e do

autorretrato, levando em conta o seu percurso histórico, definições, usos e

significados na atualidade.

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Em seguida, são apresentados o método de trabalho, como a pesquisa

ocorreu e o resultado final de todo o processo, que culminou no ensaio fotográfico

intitulado “Sujeito/Objeto”.

Por fim, as considerações finais deste trabalho abordarão o entrelaçamento

das informações contidas nos três capítulos e reflexões a respeito de como a

fotografia é vista atualmente.

Apesar de todas as transformações ocorridas na arte ao longo da história, o

gênero retrato persistiu. Ainda hoje, é apresentado de diversas maneiras e técnicas

por muitos artistas. Em nossa contemporaneidade, os retratos são produzidos

através de diversas possibilidades e, anos após sua produção, servem como registro

do passado. Um passado que apresenta aspectos sutis e particularidades de um

tempo e de uma cultura.

Os artistas contemporâneos produzem retratos por meio de vídeos,

fotografias, moldes do corpo. Propostas nas quais estabelecem a

autorrepresentação como ideia central.

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2 FOTOGRAFIA: REGISTRO, CONSTRUÇÃO, FICÇÃO E REALIDADE

Os equipamentos fotográficos produzidos atualmente são dotados de

inúmeras funcionalidades de fácil manuseio, que exigem o mínimo conhecimento de

técnicas e do mundo da fotografia. Por conta disso, as pessoas passam a fotografar

boa parte das ocasiões em modo automático, sem pensar que a fotografia é uma

linguagem artística e merecedora de aprofundamento teórico e prático.

Quanto ao surgimento da fotografia, o autor Boris Kossoy, em seu livro

“Fotografia e História”, aponta que

Com a Revolução Industrial verifica-se um enorme desenvolvimento das ciências: surge, naquele processo de transformação econômica, social e cultural, uma série de invenções que viriam a influir decisivamente nos rumos da história moderna. A fotografia, uma das invenções que ocorre naquele contexto, teria papel fundamental enquanto possibilidade inovadora de informação e conhecimento, instrumento de apoio à pesquisa nos diferentes campos da ciência e também como forma de expressão artística. (KOSSOY, 2012, p. 27)

Pode-se afirmar que a fotografia possibilitou aos pintores representar o

mundo de maneira livre e estilizada, pois não havia mais necessidade da

representação verossimilhante, pois a fotografia passou a ter essa função.

As imagens do cotidiano possibilitam o levantamento de questionamentos

sobre diferentes aspectos da sociedade. A imagem carrega consigo aspectos sutis e

apresenta particularidades de uma cultura, que na maioria das vezes passam a ser

importantes anos após sua produção, como forma de registro do passado.

De acordo com Barthes (2012), em seu livro “A Câmara Clara”, o que a

fotografia reproduz só ocorre uma vez, repetindo de maneira mecânica o que nunca

mais poderá repetir-se existencialmente. Uma fotografia sempre traz consigo o

referente. A fotografia pode ser objeto de três intenções: fazer, suportar, olhar. O

operator é o fotógrafo, o spectator é o público, e aquele que é fotografado é o alvo

(referente). Tecnicamente a fotografia está no cruzamento de dois processos

diferentes: o processo de ordem química (luz sobre certas substâncias) e o processo

de ordem física (formação da imagem através do dispositivo).

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É possível o acesso ao passado devido à tecnologia, a qual possibilitou ao

homem a criação da fotografia, a fim de documentar, com o passar do tempo, fatos

ligados ao seu cotidiano.

Conforme Kubrusly (2006), fotografar é o ato de paralisar o fluir de uma

imagem existente, ou seja, não é um processo automático e mecânico de obtenção

e reprodução dessa imagem. A imagem fotográfica causa ilusão com a sensação de

poder suspender o fluxo do tempo, representado com exatidão a realidade. Na

fotografia, todos os seres ficam resumidos a um instante, e a melhor imagem é

aquela que expressa de maneira eficiente uma ideia, e não necessariamente a que

contém muitas informações verbalizáveis.

De acordo com Susan Sontag (2004), as fotos fornecem testemunhos, algo

de que ouvimos falar, mas de que duvidamos, parece comprovado quando vemos

uma foto. Uma foto pode ser equivalente a uma prova de que determinado fato

aconteceu. A fotografia tornou-se um hobby e, como forma de arte de massa, não é

praticada pela maioria das pessoas como uma arte. Acima de tudo, é um rito social,

é por meio das fotografias que uma família pode construir uma crônica visual de si

mesma.

Segundo Boris Kossoy (2009), em seu livro “Realidades e Ficções na Trama

Fotográfica”, a fotografia é vista pelo senso comum como um testemunho da

verdade, com o qual registramos aspectos selecionados do real, como de fato se

parecem ganhando credibilidade. A linguagem da fotografia possui uma realidade

distinta, a qual não condiz necessariamente com a realidade que a envolveu. Trata-

se de uma segunda realidade – é a realidade da representação, do documento.

A realidade é denominada como exterior e interior, composta da primeira e

segunda realidade. A primeira realidade, segundo Kossoy, diz respeito à história do

assunto, independente da representação

É também a realidade das ações técnicas levadas a efeito pelo fotógrafo, diante do tema/fatos que ocorrem ao longo do seu processo de criação e que culminam com a gravação da aparência do assunto sobre um componente fotossensível e o devido processamento da imagem, em determinado espaço e tempo. São esses fatos fotográficos diretamente conectados ao real. (KOSSOY, 2009, p. 37)

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O fotógrafo e pesquisador afirma que toda imagem contém em si uma

história (realidade interior), complexa, abrangente, invisível fotograficamente e

inacessível fisicamente, se confundindo com a primeira realidade que a originou. A

segunda realidade (assunto representado) está contida nos limites bidimensionais,

sendo imutável e não importando qual seja o sistema no qual esta imagem se

encontre gravada. É conhecida também como a realidade fotográfica do documento,

em que se referencia um passado inacessível. Todas as imagens fotográficas,

independente do aparelho fotográfico utilizado na época, serão sempre uma

segunda realidade. A linguagem da fotografia abrange uma transposição de

realidades, realidade visual do assunto selecionado (primeira realidade) para a

realidade da representação (segunda realidade).

Os elementos constitutivos incorporados à imagem fotográfica e às suas

coordenadas de situação tornam possível a imagem fotográfica. O assunto é o

objeto de registro, a tecnologia viabiliza tecnicamente o registro, e o fotógrafo a

idealiza através do processo cultural/estético/técnico. Estas ações acontecem em

locais precisos, épocas que configuram assim um espaço/tempo específico e suas

coordenadas de situação. As coordenadas de situação estão configuradas da

seguinte maneira: assunto/fotógrafo/tecnologia são os elementos constitutivos;

espaço/tempo constituem as coordenadas de situação e, por fim, a fotografia é o

produto final. A imagem fotográfica contém em si o registro selecionado do real, que

engloba um recorte espacial (assunto), congelado no momento de seu

acontecimento (interrupção temporal), presentes em todas as fotografias.

A imagem fotográfica, segundo Kossoy (2009), analógica ou digital, é sempre

um documento/representação. Tais imagens fornecem provas, indícios e são

testemunhos que apontam evidências sobre determinadas situações e fatos.

No passado, a montagem de negativos permitia o controle de cada parte da

cena de maneira isolada, tornando possível eliminar o indesejável.

A fotomontagem se tornou uma ameaça para a fotografia no sentido de sua

valorização, pois, para muitos fotógrafos, era necessário existir a cena diante da

câmera para que a imagem pudesse existir. De acordo com Leite (2012), do ano

1854 a 1910, a fotografia ainda não continha uma linguagem própria, o movimento

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pictorialismo tinha a intenção de aproximar a fotografia da pintura, os fotógrafos

passaram a retocar, pintar as fotos e riscar negativos, a fim de obter inúmeros

efeitos possíveis.

A análise da história da fotografia aponta que o pictorialismo foi o primeiro

movimento artístico dentro da fotografia, os temas eram voltados para retratos,

paisagens, nus, beleza não sensual e intimidade familiar. Ainda,

[...] o marco inicial do movimento que ficou conhecido como pictorialismo também foi marcado pela publicação dos estudos de Ferdinand Hurter e Vero C. Driffield, que pela primeira vez colocavam em bases científicas os comportamentos das emulsões fotográficas, estabelecendo os fundamentos da sensitometria (ciência que trata da relação entre a quantidade de energia recebida por um material sensível e a quantidade de prata depositada após a revelação). (KUBRUSLY, 2006, p. 92)

Conforme Fabris (2011), os pictorialistas usavam a raspagem de negativos e

a goma bicromatada para corrigir o dispositivo fotográfico, com o intuito de evocar

sentimentos no espectador. Esses artistas usavam uma linguagem própria, que

tornava a imagem semelhante a uma pintura, através do uso de tons sombrios,

texturas granuladas, efeitos de decoração e falta de perspectiva.

[...] é provável que uma das primeiras fotomontagens seja “Cinema sintético da pintura”, realizada por Hausmann, em 1918. Trata-se de um autorretrato do artista, no qual foram isolados a boca, escancarada em primeiro plano, encimada por um olho entreaberto e ladeada por outro olho dotado de um monóculo. (FABRIS, 2011. p. 129)

É possível apontar que, nos dias de hoje, a fotomontagem e a manipulação

de imagens são utilizadas para diversos fins artísticos, permitindo ao homem refletir

a respeito de inúmeros fatores ligados ao mundo que o cerca. Uma fotomontagem

pode ser produzida de maneira virtual (programas de edição de imagens) ou

artesanal, por meio de recortes, colagens e técnicas alternativas para a revelação de

fotografias.

Para Colker (2009), o aspecto mais importante da linguagem fotográfica é

pontuar a identidade de coisas e pessoas. A fotografia deixou de ser apenas uma

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curiosidade quando a empresa Kodak criou câmeras fotográficas com filmes, fato

que auxiliou a massificação do uso da fotografia. Pois, até então, só as pessoas com

muito dinheiro podiam pagar por retratos, os quais eram elaborados por pintores.

Após a popularização da fotografia, ocorreu uma transformação radical na maneira

como o ser humano é identificado, enquanto a pintura cria imagens, a fotografia

passa a ser o real. A fotografia nos evidencia aspectos sutis que são inerentes ao

objeto, independentemente de quem possa vir a olhá-lo. Os artistas de vanguarda

compreendiam que a câmera fotográfica era a materialização de uma ideologia. Em

pouco tempo, o homem passou a ser identificado mediante imagens em

passaportes, carteiras de identidade, filmes e jornais.

O potencial de mimese, segundo Fernandes Junior (2012), distingue a

fotografia de outras manifestações artísticas. Portanto, a fotografia é uma linguagem

artística merecedora de estudo e aprofundamento teórico/prático, pois constitui

códigos verbais e visuais difíceis de serem assimilados por pessoas e fotógrafos que

não possuem conhecimento acerca do universo teórico da referida linguagem.

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3 A LINGUAGEM DO RETRATO: ENTRE A REPRESENTAÇÃO E A ARTE

Desde a Pré-História, o ser humano tenta representar-se. O homem rupestre

apropriou-se de esquemas corporais simplificados para documentar, mediante o

desenho e a pintura, a sua trajetória pelo mundo e suas descobertas.

Segundo Bueno (2008), no Egito Antigo, encontramos de maneira

evidenciada o gênero retrato, próximo do que conhecemos atualmente. A lei da

frontalidade era formadas por figuras, cujas composições continham partes em perfil

(cabeças e pés) e representações de partes frontais (olhos, braços e pernas vistos

por inteiro). Na Grécia Antiga, o retrato é visto como demonstração de ostentação,

em suportes diferenciados, tais como moedas e bustos.

Na Idade Média, de acordo com Canton (2011), o artista Giotto di Bondone foi

um dos primeiros a pintar sua própria imagem em uma obra de arte, no caso, “O

juízo final”, representando algo novo e que nenhum artista costumava fazer. Por isso

pode-se afirmar que esta obra é um dos primeiros autorretratos da história da arte,

produzido no Pré- Renascimento.

No Renascimento, os retratos eram destinados à classe burguesa e

elaborados por pintores que buscavam representar as pessoas dentro de um padrão

estabelecido pelos gregos antigos. O homem era representado através dos

termos/conceitos equilíbrio, beleza e serenidade.

O surgimento da pintura em cavalete e da pintura a óleo, durante o período

renascentista, auxiliou o homem a produzir retratos que até então eram produzidos

por meio do uso de têmperas e afrescos.

É possível sustentar que um dos retratos mais famosos do Renascimento é a

obra “Monalisa”, pintada pelo artista Leonardo da Vinci. A modelo do retrato,

conforme Canton (2011), chamava-se Madonna Lisa di Antonio Maria Gherardini, e

estima-se que o artista levou cerca de três anos para entregar o quadro (1503 −

1506).

O ideal da valorização do homem, durante o Renascimento, ocasionou a

popularização do gênero retrato, o qual passou a ser utilizado em larga escala por

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diversos artistas, para representar tanto figuras ligadas a fatos bíblicos quanto

pessoas contemporâneas.

O retrato torna-se não somente a simples representação de um modelo e seu nível social, mas sim uma forma de explorar sua alma mediante experimentações pictóricas. Apesar de nacionalidades diversificadas ou de tradições, o retrato é um gênero presente em todas as regiões. (BUENO, 2008, p. 15)

Posteriormente ao Renascimento, diversos artistas pictóricos, entre eles Jan

Van Eyck, Rubéns e Rembrandt , continuaram trabalhando com o gênero retrato, de

maneira naturalista em alguns momentos.

A partir do Modernismo, o homem passa a experimentar diferentes técnicas,

suportes/linguagens, objetivando assim expressar o que sente, bem como a maneira

de ver o mundo que o cerca. Com isto, a linguagem do retrato se populariza ainda

mais, tanto nas linguagens plásticas quanto na linguagem fotográfica, por conta do

surgimento de novos aparelhos fotográficos e do avanço da tecnologia.

Conforme Bueno (2008), o autorretrato é uma maneira de registro cujo

modelo torna-se simultaneamente o artista. A linguagem do autorretrato acompanha

sempre o ser humano em sua necessidade de registrar-se. A exemplo de

Rembrandt, diversos artistas produziram autorretratos pelo menos uma centena de

vezes.

A combinação de um retrato com um autorretrato pode ser vista na obra “As

meninas”, pintada por Velásquez.

A tela mostra Margarida Teresa (filha dos reis da Espanha), rodeada por outras meninas, funcionários, uma anã e um cachorro. Ela foi pintada pelo espanhol Diego Velásquez (1599-1660), que a terminou em 1656 e deu a ela o título de “As meninas”. O próprio Velásquez aparece pintando a grande tela, com pincéis e paleta na mão. Refletidas no pequeno espelho estão as imagens dos pais de Margarida, o rei Filipe IV e a rainha. (CANTON, 2011, p. 22)

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É notável que o artista inovou na produção desta pintura, pois colocou em

uma única obra um retrato e um autorretrato, seguindo o exemplo de Giotto di

Bondone.

IMAGEM 1 − “DIEGO VELÁSQUEZ, AS MENINAS, 1656”

Dentre os inúmeros artistas que trabalham com a questão dos retratos na

contemporaneidade, podemos destacar o artista brasileiro Vik Muniz, cujo trabalho é

reconhecido mundialmente.

De acordo com informações contidas no documentário “Lixo Extraordinário”, o

artista Vik Muniz utiliza materiais diversos (perecíveis ou não) para executar suas

obras, fazendo com que o retrato ultrapasse os limites do espectador, a obra não

corresponde somente a si, mas a qualquer um, quebrando o paradigma de que

autorretrato é vinculado somente a questões da intimidade do retratista. O artista

incorpora em seu processo fotográfico objetos do cotidiano utilizando materiais

considerados incomuns, como areia, diamantes, açúcar, fio, cordão, chocolate, entre

outros.

No documentário, podemos ter acesso a informações do projeto, que foi

elaborado pelo artista com um grupo de catadores de lixo e gerou a produção de

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releituras de diferentes obras de arte, confeccionadas com materiais alternativos. A

primeira etapa do documentário consiste na produção das fotografias.

FRAME 1 – DOCUMENTÁRIO “LIXO EXTRAORDINÁRIO”

A imagem acima referencia o quadro produzido pelo pintor francês Jacques-

Louis David, que retratou em grande estilo, o revolucionário Jean-Paul Marat, seu

amigo pessoal, no instante de sua morte.

IMAGEM 2- “JACQUES- LOUIS DAVID, A MORTE DE MARAT, 1793”

De acordo com as informações contidas no site perigrinacultural´s, Marat foi

assassinado por Charlotte Corday, dentro da banheira em que permanecia boa parte

do tempo por conta de uma doença de pele que o afligia.

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A elaboração de releituras de diferentes obras artísticas, foi realizado a partir

de fotografias projetadas no chão, como é possível ver pelo frame abaixo.

FRAME 2 – DOCUMENTÁRIO “LIXO EXTRAORDINÁRIO”

Posteriormente, partes das imagens foram preenchidas com os materiais

alternativos encontrados no lixão.

FRAME 3 – DOCUMENTÁRIO “LIXO EXTRAORDINÁRIO”

A etapa seguinte tratou da elaboração de registros fotográficos das releituras

realizadas e da venda de algumas obras em um leilão de obras de arte. O dinheiro

adquirido com a venda dos retratos, cerca de 50 mil dólares, foi destinado para a

cooperativa dos catadores de lixo do Jardim Gramacho, bairro da cidade de Duque

de Caxias /RJ.

As obras do artista Vik Muniz são registradas através da linguagem

fotográfica, já que possuem em sua composição o efêmero.

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Nos dias de hoje, dentre centenas de milhares de séries fotográficas

produzidas todos os dias, segundo Entler (2013), temas como pacientes terminais,

obesidade, mutilação, feminismo, violência sexual, sobreviventes de catástrofes,

entre outros são corriqueiros. As redes sociais contribuem para que tais séries sejam

vistas por milhares de pessoas de maneira virtual, ganhando assim grande

repercussão.

Os diferentes personagens retratados apontam discussões bastante

significativas, pois, de acordo com Entler (2013), em muitas ocasiões, o ser humano

insiste em não compreender o que tais personagens e temas retratam e,

culturalmente, tem o hábito de julgar que os assuntos retratados não passam de

ficção, ou seja, não fazem parte do cotidiano. Inúmeros fotógrafos do século XX

souberam retratar o estranho, o feio, fatos e personagens mostrados em nome da

ciência, do espetáculo ou, ainda, de uma combinação dessas coisas e de maneira

plausível. A linguagem da fotografia buscou mostrar aquilo que o olhar costumava

evitar e que, exatamente por isso, passou a desejar.

Por outro lado, atualmente uma noção de arte fotográfica se estabelece.

Conforme Entler (2013), reivindica-se para a imagem uma força que está menos nas

coisas que se colocam diante da câmera e mais nos modos peculiares de mostrá-

las. Entre as inúmeras possibilidades de ensaios fotográficos que abordam tais

personagens, podemos destacar o trabalho da artista Diane Arbus, que, em plenos

anos 1960, decidiu retratar pessoas julgadas pela sociedade como feias, marginais,

deficientes, casais improváveis, mostrados pela artista com o intuito de inserir tais

personagens na sociedade.

Não se trata apenas de um estilo, de um modo de fotografar, mas de um modo de se inserir na diversidade humana. Não há em suas imagens pena, constrangimento, comoção, estranhamento ou desejo de chocar. O que surpreende é exatamente ver numa condição de normalidade esses sujeitos que supostamente exigiriam do olhar uma abordagem tão atípica quanto eles. (ENTLER, 2013

1)

1 Referência sem paginação.

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Por conta do objetivo de não estranhamento, de acordo com Entler (2013), o

que vale ser destacado é justamente a condição de normalidade presente em suas

fotografias e a busca de inserir tais personagens na sociedade que os discrimina e

os olha com estranheza.

IMAGEM 3 – “DIANE ARBUS, JOVEM FAMÍLIA DO BROOKLYN, 1966”

Outro fotógrafo retratista a ser lembrado é Joel-Peter Witkin, que, nos anos

1980, retratou pessoas mutiladas, doentes terminais e cadáveres, com o objetivo de

reconstruir mitos e obras famosas da história da arte.

Segundo Entler (2013), o fotógrafo Witkin tinha como propósito retratar o

personagem numa perspectiva erudita, em que a imagem demonstra um circo de

aberrações, deslocando os personagens para um palco onde se encenam histórias

idealizadas em um tipo de padrão.

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IMAGEM 4 – “JOEL-PETER WITKIN, LEDA, 1986”

O retrato carrega a certeza de que a imagem congelada no papel nos

apresenta um momento que jamais será revivido no sentido literal.

A fotografia também é o registro de um acontecimento, qualquer que seja ele. As imagens, e em particular o retrato, parecem cumprir um ritual de visualidade, de importância e de desaparição que tende a se repetir conforme é notável nesse inventário que venho realizando nas últimas décadas. É interessante constatar que o ciclo se repete, mas o diversificado conjunto reunido e sistematizado reflete tanto a história da fotografia como a história social da cultura. (FERNANDES JR, 2012

2) s/p

Segundo Barthes (2012), a fotografia transformava o homem em objeto; para

fazer os primeiros retratos fotográficos, era necessário submeter-se a longas poses.

O fotorretrato é um campo em que quatro imaginários se cruzam: diante da máquina

fotográfica, sou, ao mesmo tempo, aquele que creio que sou, aquele que desejo ser,

aquele que o fotógrafo pensa que eu sou e aquele de que ele se serve para mostrar

sua arte.

Conforme Kubrusly (2006), a produção de um retrato envolve

particularidades, tais como paralisar uma imagem já existente, sendo ainda que

posar é se expor e lidar com características de nós mesmos que muitas vezes não

aceitamos e não aprovamos.

2 Referência sem paginação.

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Diante de um bombardeio de ensaios fotográficos atuais que visam retratar o

polêmico, o fotógrafo pode correr o risco de retratar o banal e o corriqueiro em nosso

cotidiano. Segundo Entler (2013), o sentido de retratar pessoas com determinadas

histórias e de tal jeito podem fazer com que tais assuntos sejam transformados em

apenas “um tipo” e, quando isso ocorre, as imagens chegam a nós interpretadas

antes mesmo de serem por nós vistas.

Fernandes Junior (2006) afirma que, para refletirmos acerca da produção

contemporânea fotográfica e dos processos de produção que envolvem a criação de

imagens, devemos mergulhar no mundo da imagem, porque nada substitui a

experiência de ver.

Ver, comparar, elaborar conexões, estabelecer relações. Olhar para uma imagem e explorar suas potencialidades narrativas. A eliminação das fronteiras entre as diferentes formas de expressão, produção e circulação de imagens no mundo contemporâneo torna cada vez mais difícil a tarefa de catalogar as manifestações das artes visuais, particularmente a fotografia (FERNANDES JR, 2006, p. 10)

Pode-se perceber que as definições acerca da arte estão cada vez mais

complexas, atualmente o artista contemporâneo busca em seu processo criativo a

migração para o campo da linguagem expandida. Em um único trabalho artístico

contemporâneo, por exemplo, é comum o uso de diferentes técnicas e linguagens,

que constituem assim o uso da linguagem expandida.

Através do uso dessa linguagem, segundo Fernandes Junior (2006), o artista

rompe com as barreiras impostas por uma única linguagem, ou seja, uma pintura

abstrata, por exemplo, pode ser vista em uma fotografia, quando trabalhada a

questão da velocidade do obturador e a abertura do diafragma.

Da mesma maneira que percebemos o ir além, o ultrapassar de todos os limites, a contaminação das técnicas, o hibridismo dos suportes, verificamos o quanto é difícil e impreciso articular uma nomenclatura para a produção contemporânea. (FERNANDES JR, 2006, p. 10)

De acordo com Fernandes Junior (2006), assim denominamos que a

produção contemporânea está livre das amarras da fotografia convencional, em que

o artista visa dar ênfase ao processo de criação e aos procedimentos adotados, para

justificar que a linguagem contemporânea fotográfica também se expandiu.

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4 PROCESSOS DE CRIAÇÃO

A pesquisa Homem/Objetos contou com a colaboração de 26 participantes de

diversos lugares do Brasil. Cada um foi instigado a produzir três fotografias de

objetos pessoais que os autorrepresentassem e, a partir delas, elaborar um pequeno

texto argumentativo sobre cada item. As fotografias foram enviadas de maneira

virtual através de e-mails e redes sociais. Deste grupo, optou-se em trabalhar com

12 sujeitos, residentes nas cidades de Joinville, Curitiba e São Bento do Sul, para

facilitar as etapas seguintes.

A segunda etapa da pesquisa consistiu na produção de retratos dos participantes

selecionados da pesquisa, com seus devidos objetos, a qual ocorreu entre fevereiro

e julho de 2014.

A última parte visou o tratamento e edição das imagens, com o objetivo de criar

um layout apropriado para retratar as fases da pesquisa.

Vale ressaltar que a segunda e terceira etapa desta pesquisa foram elaboradas

pelo proponente da pesquisa: Andrei Rafael Galkowski.

Um dos fundamentos para a realização da pesquisa partiu do estudo sobre

leitura/criação de um trabalho ou imagem proposto por Ana Emilia Jung, durante o

módulo “Processos de Criação” do curso de pós-graduação em Fotografia da

Universidade Tuiuti, o qual parte do seguinte pressuposto:

Para uma imagem ou obra ser lida e classificada corretamente, segundo o

estudo, deve-se identificar o tipo da linguagem, quais são os elementos

constituintes, o assunto e quais são as questões que tal imagem apresenta.

Na criação, a investigação desses elementos é feita de maneira inversa, ou

seja, parte-se das questões que tal obra ou imagem possam abordar para seguir à

definição do assunto, dos elementos constituintes e de qual linguagem se trata.

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FIGURA 1 − ESTUDO LEITURA/CRIAÇÃO DA IMAGEM

Segundo o tema tratado no módulo “Processos de Criação” (2013), o termo

lead vem do Jornalismo e representa onde, quando, por quê e como tal imagem ou

trabalho artístico foi produzido. O assunto possui um tema concreto, isto é,

representa de maneira literal aquilo que foi proposto enquanto a questão pode ser

subjetiva.

No caso do ensaio fotográfico aqui proposto, a criação partiu dos seguintes

passos: a questão − autorretratos representados por meio de registros de objetos

pessoais dos participantes da pesquisa; o assunto − autorretratos; elementos

constituintes – variados, pois cada participante pôde escolher diferentes objetos

pessoais e equipamentos fotográficos, que pudessem retratar características

pessoais ou fatos ligados ao seu passado e cotidiano. O texto complementar

produzido por cada participante responde a questões pertinentes à escolha de tais

objetos.

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FIGURA 2 − REGISTRO FOTOGRÁFICO PERTENCENTE À PESQUISA

HOMEM/OBJETOS

A fotografia realizada pela participante e o texto justificativo exemplificam os

motivos da escolha de tais objetos:

Acredito sim que as pessoas e seus objetos se relacionam. No meu caso, as três escolhas que fiz mostram fortes traços da minha personalidade, de quem eu sou e a o que dou valor. O porta-lápis mostra que adoro material escolar. Mas não é só isso: estes lápis não são novos, há lápis ali do tempo do jardim de infância. Quando eu ganhava uma caixa de lápis de cor nova, pegava os velhos, separava-os por cores e tamanhos e escolhia quais ficariam comigo e quais eu doaria (no caso, os menores). Há muita nostalgia, cada lápis tem uma história. [...] Sobre o suporte dos lápis, escolhi um copo de plástico roxo. Gosto de inovar: não é um porta-lápis, é um copo, mas não está na cozinha, está no meu quarto. A respeito do ralador/suporte para brincos, também são várias histórias e significados. Minha mãe viu a ideia e me mostrou. Outra forma de inovar. Um objeto que serve para uma coisa na posição de outra. Parece que os buraquinhos foram feitos certinhos para o encaixe dos brincos. Aliás, brincos hippies eu gosto (NEUMANN, 2013

3)

A etapa seguinte da pesquisa visou a produção de retratos dos participantes

com seus devidos objetos pessoais, assim como a imagem abaixo:

3 Referência sem paginação por se tratar de um texto obtido por e-mail.

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FIGURA 3 − REGISTRO FOTOGRÁFICO PERTENCENTE À PESQUISA

HOMEM/OBJETOS

.

Os retratos elaborados tiveram como fundo o próprio chão, afim de padronizar as

imagens, objetivando assim um diálogo entre os reratos produzidos.

A fase posterior consistiu no tratamento das imagens selecionadas e na criação

do layout da arte final. Optou-se por trabalhar o layout dos retratos da seguinte

forma:

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FIGURA 4 − LAYOUT DAS MONTAGENS FOTOGRÁFICAS

Através da leitura da imagem acima, verifica-se que o plano de

expressão/linguagem foi o retrato colorido; o lead representa de maneira simbólica

fatos ligados ao passado da participante em questão e uma condição de seu

presente, ou seja, não saber tocar o instrumento musical adquirido; o assunto −

autorretrato por meio de objetos pessoais; a questão − como representar um

autorretrato através de objetos pessoais.

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Analisando a pesquisa como um todo, nota-se que a primeira parte, a qual

tratou da produção das fotografias pelos participantes, retratou a primeira realidade

abordada por Kossoy, que contém ações técnicas diante do tema e que culminaram

na produção de tais imagens, diante de uma proposta preestabelecida.

A segunda etapa da pesquisa abordou a produção de retratos dos

participantes com seus devidos objetos. Nesse caso, pode-se apontar que as

imagens finais produzidas e editadas com seus respectivos textos, elaborados pelos

participantes, apresentam a segunda realidade. Pois se trata do assunto

representado, contido nos limites bidimensionais da imagem e que apresenta uma

imagem de registro do que foi realizado.

As imagens finais geraram uma transposição de realidades, realidade visual do

assunto selecionado (primeira realidade) para a realidade da representação

(segunda realidade).

Diante do ensaio fotográfico, o assunto foi a construção de um autorretrato por

meio de fotografias de objetos pessoais e a tecnologia empregada na elaboração de

tais imagens, utilizada de maneira diferenciada por cada participante. O

espaço/tempo que compõe as coordenadas de situação consistiu no tempo dado

para a produção das imagens, que resultaram em um produto final, as fotografias.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No ensaio fotográfico Sujeito/Objeto, o tema central das fotografias foi

apresentar a relação dos sujeitos com os seus objetos pessoais, levando em conta o

simbolismo que cada objeto tem na vida ou cotidiano de cada participante.

O processo criativo dos participantes foi apresentado diante de um tema

predeterminado, ou seja, produzir fotografias passíveis de uma autorrepresentação,

situação em que cada participante elaborou seus registros fotográficos a partir de

suas disponibilidades de materiais, como celulares e máquinas digitais fotográficas.

O ensaio fotográfico aqui proposto, bem como o seu embasamento teórico,

evidenciaram a importância da linguagem fotográfica e seus processos de produção

da imagem, sugerindo assim a busca pelo conhecimento referente ao processo de

criação artística em nossa contemporaneidade.

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REFERÊNCIAS

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CANTON, Katia. Pintura Aventura. São Paulo: Farol Literário, 2011.

COLKER, Flavio. Retrato, Fotografia e Identidade. 2009. Disponível em <http://olhave.com.br/blog/wp-content/uploads/2009/12/Retrato-Fotografia-e-Identidade.pdf>. Acesso em: 08 ago. 2014.

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FABRIS, Annateresa. O desafio do olhar: fotografia e artes visuais no período das vanguardas históricas. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011, v.1.

FERNANDES JR, Rubens. Colecionador de olhares desaparecidos [parte 3]. 2012. Disponível em <http//:icônica.com.br/site/colecionador-de-olhares-desaparecidos-iii/>. Acesso em: 05 ago. 2014.

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FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta: ensaios para uma filosofia da fotografia. Rio de Janeiro: Sinergia Relume Dumará, 2009.

KOSSOY, Boris. Realidades e Ficções na Trama Fotográfica. 4. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009.

______. Fotografia & História. 4. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2012.

KUBRUSLY, Cláudio A. O que é fotografia. 4. ed. São Paulo: Brasilense, 2006.

LEITE, Enio. Fotografia Digital: aprendendo a fotografar com qualidade. 2. ed. Santa Cruz do Rio Pardo, SP: Viena, 2012.

LIXO EXTRAORDINÁRIO. Direção: Lucy Walker. Duque de Caxias. O2 Filmes, 2010. Internet (99min). Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=61eudaWtWb8>. Acesso em: 08 ago. 2014.

MÓDULO PROCESSOS DE CRIAÇÃO, 2013, Curitiba. Resumos... Curitiba: Universidade Tuiuti do Paraná, 2013.

NEUMANN, Virginia de Mello. E-mail de 20 abr. 2013.

SONTAG, Susan. Sobre Fotografia. Tradução: Rubens Figueiredo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO. Acervo Digital da Unesp. Disponível em <http:// acervodigital.unesp.br/handle/123456789/63>. Acesso em: 01 ago. 2014.

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APÊNDICE-

ENSAIO FOTOGRÁFICO SUJEITO/OBJETO