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Primeira Turma

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  • Primeira Turma

  • AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL N. 157.183-MA (2012/0052307-6)

    Relator: Ministro Francisco FalcãoAgravante: Maria das Gracas de Castro Duarte MendesAdvogado: Luís Carlos Araújo Saraiva SobrinhoAgravado: Estado do MaranhãoProcurador: R C Menezes Neto e outro(s)

    EMENTA

    Diferença salarial decorrente da conversão dos salários em URV (11,98%). Imposto de renda e contribuição previdenciária. Incidência.

    I - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça fi rmou-se no sentido de que as verbas percebidas por servidores públicos resultantes da diferença apurada na conversão de suas remunerações da URV para o Real têm natureza salarial e, portanto, estão sujeitas à incidência de Imposto de Renda e de Contribuição Previdenciária. Precedentes: RMS n. 27.617-RS, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 3.8.2010; AgRg no REsp n. 1.202.315-MA, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJ de 9.8.2011; AgRg no REsp n. 1.278.624-MA, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 24.2.2012.

    II - Agravo Regimental improvido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Arnaldo Esteves Lima (Presidente), Napoleão Nunes Maia Filho e Benedito Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 28 de agosto de 2012 (data do julgamento).

  • REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    150

    Ministro Francisco Falcão, Relator

    DJe 9.10.2012

    RELATÓRIO

    O Sr. Ministro Francisco Falcão: Trata-se de agravo regimental interposto por Maria das Graças de Castro Duarte Mendes, contra a decisão monocrática de fl s. 590-592.

    Naquela ocasião aduzi que a jurisprudência do STJ é fi rme no sentido de que as verbas percebidas por servidores públicos, resultantes da diferença apurada na conversão de sua remuneração da URV para o Real, têm natureza salarial, por isso que estão sujeitas à incidência de imposto de renda e de contribuição previdenciária (RMS n. 27.617-RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 3.8.2010)

    Sustenta a agravante que o entendimento exarado não se aplica aos magistrados do Tribunal de Justiça do Maranhão, porquanto, em relação a eles, o recebimento dos valores se deu por acordo com o Estado, motivo pelo qual a natureza da quantia recebida é indenizatória. Pugna pela aplicação da Resolução n. 245 do Supremo.

    Em mesa, para julgamento.É o relatório.

    VOTO

    O Sr. Ministro Francisco Falcão (Relator): Não assiste razão à agravante.Conforme consignado na decisão monocrática, a jurisprudência do STJ é

    fi rme no sentido de que as verbas percebidas por servidores públicos, resultantes da diferença apurada na conversão de sua remuneração da URV para o Real, têm natureza salarial, por isso que estão sujeitas à incidência de imposto de renda e de contribuição previdenciária.

    Nesse sentido, verbis:

    Administrativo e Tributário. Mandado de segurança. Imposto de renda e contribuição previdenciária. Remuneração de servidores. Conversão da URV para o Real. Parcela resultante das diferenças apuradas. Natureza salarial. Resolução n. 245-STF. Inaplicabilidade. Assistência judiciária gratuita. Art. 4º da Lei n.

  • Jurisprudência da PRIMEIRA TURMA

    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 151

    1.060/1950. Indeferimento expresso do pedido pelo Tribunal a quo. Presunção juris tantum.

    1. As verbas percebidas por servidores públicos, resultantes da diferença apurada na conversão de sua remuneração da URV para o Real, têm natureza salarial, por isso que estão sujeitas à incidência de imposto de renda e de contribuição previdenciária.

    (Precedentes: EDcl no RMS n. 27.336-RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 17.3.2009, DJe 14.4.2009; RMS n. 27.338-RS, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 3.3.2009, DJe 19.3.2009; AgRg no RMS n. 25.995-RS, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 3.3.2009, DJe 1º.4.2009; RMS n. 28.241-RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 18.12.2008, DJe 18.2.2009; AgRg no RMS n. 27.614-RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 4.12.2008, DJe 13.3.2009).

    2. A Resolução Administrativa n. 245 do Supremo Tribunal Federal é inaplicável in casu, porquanto versa sobre as diferenças da URV referentes, especifi camente, ao abono variável concedido aos magistrados pela Lei n. 9.655/1998, sendo certo o reconhecimento da natureza indenizatória da aludida verba no bojo da mencionada Resolução. (Precedentes: AgRg no RMS n. 27.577-RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 16.12.2008, DJe 11.2.2009; (...)

    (...) (RMS n. 27.617-RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 22.6.2010, DJe de 3.8.2010)

    E ainda nesse sentido:

    Tributário. Imposto de renda. Contribuição previdenciária. Diferença salarial decorrente da conversão da URV (11,98%). Incidência.

    1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça fi rmou-se no sentido de que as verbas percebidas por servidores públicos resultantes da diferença apurada na conversão de suas remunerações da URV para o Real têm natureza salarial e, portanto, estão sujeitas à incidência de Imposto de Renda e de Contribuição Previdenciária.

    2. Agravo Regimental não provido (AgRg no REsp n. 1.235.069-MA, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 24.5.2011, DJe de 30.5.2011).

    Tributário. Agravo regimental no recurso especial. Verbas recebidas em atraso. Diferença da correção da URV. Natureza remuneratória. Incidência de imposto de renda. Precedentes. Agravo não provido.

    1. “Este Tribunal Superior firmou sua jurisprudência no sentido de que os valores recebidos a título de diferenças no cálculo da URV possuem natureza salarial e estão sujeitas ao imposto de renda e à contribuição previdenciária” (RMS n. 27.340-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 30.9.2010).

  • REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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    2. Agravo regimental não provido (AgRg no REsp n. 1.202.315-MA, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe de 9.8.2011).

    Tributário. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Princípio da fungibilidade. Diferenças oriundas da conversão de vencimentos de servidor público em URV. Verba paga em atraso. Natureza remuneratória. Imposto de renda e contribuição previdenciária. Incidência.

    1. (...)

    2. A verba percebida em atraso pelos servidores públicos em razão da diferença de 11,98%, oriunda da conversão de seus vencimentos em URV, possui natureza remuneratória, sendo devida a incidência de Imposto de Renda e de Contribuição Previdenciária sobre ela.

    Precedentes.

    3. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Agravo regimental não provido (EDcl no RMS n. 27.336-RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 17.3.2009, DJe de 14.4.2009).

    Por fim, insta consignar que a Resolução Administrativa n. 245 do Supremo Tribunal Federal é inaplicável ao caso. A mencionada norma faz referência ao abono variável concedido aos magistrados pela Lei n. 9.655/1998, e não à parcela correspondente aos 11,98% em favor dos servidores públicos.

    Confi ra-se:

    Tributário. Imposto de renda. Contribuição previdenciária. Diferença salarial decorrente da conversão da URV (11,98%). Incidência. Resolução n. 245 do STF. Inaplicabilidade.

    1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça fi rmou-se no sentido de que as verbas percebidas por servidores públicos resultantes da diferença apurada na conversão de suas remunerações da URV para o Real têm natureza salarial e, portanto, estão sujeitas à incidência do Imposto de Renda e da Contribuição Previdenciária.

    2. A Resolução Administrativa n. 245 do Supremo Tribunal Federal é inaplicável ao caso. A mencionada norma faz referência ao abono variável concedido aos magistrados pela Lei n. 9.655/1998, e não à parcela correspondente aos 11,98% em favor dos servidores públicos.

    3. Agravo Regimental não provido (AgRg no REsp n. 1.278.624-MA, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 2.2.2012, DJe de 24.2.2012).

    Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.É como voto.

  • Jurisprudência da PRIMEIRA TURMA

    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 153

    RECURSO ESPECIAL N. 952.351-RJ (2007/0113128-6)

    Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia FilhoRecorrente: Petróleo Brasileiro S/A Petrobras e outroAdvogado: Candido Ferreira da Cunha Lobo e outro(s)Recorrido: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro

    EMENTA

    Administrativo. Recurso especial. Ação civil pública sob a imputação de ato de improbidade administrativa. As disposições da Lei n. 8.429/1992 são aplicáveis ao particular que, em tese, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se benefi cie sob qualquer forma direta ou indireta. O Ministério Público possui legitimidade atido para a propositura da ação civil pública por ato de improbidade. Exigência da demonstração da justa causa para o recebimento da petição inicial. Recurso especial provido.

    1. Nos termos do art. 3º da Lei n. 8.429/1992, é considerado sujeito ativo da Lei de Improbidade o particular que, em tese, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se benefi cie sob qualquer forma direta ou indireta.

    2. O Ministério Público tem legitimidade ad causam para a propositura de ação civil pública objetivando o ressarcimento de danos ao erário, decorrentes de atos de improbidade (AgRg no AREsp n. 76.985-MS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJe 18.5.2012).

    3. As ações judiciais fundadas em dispositivos legais insertos no domínio do Direito Sancionador, o ramo do Direito Público que formula os princípios, as normas e as regras de aplicação na atividade estatal punitiva de crimes e de outros ilícitos, devem observar um rito que lhe é peculiar, o qual prevê, tratando-se de ação de imputação de ato de improbidade administrativa, a exigência de que a petição inicial, além das formalidades previstas no art. 282 do CPC, deva ser instruída com documentos ou justifi cação que contenham indícios sufi cientes da existência do ato de improbidade (art. 17, § 6º da Lei n. 8.429/1992), sendo certo que ação temerária, que não convença o

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    Magistrado da existência do ato de improbidade ou da procedência do pedido, deverá ser rejeitada (art. 17, § 8º da Lei n. 8.429/1992).

    4. As ações sancionatórias, como no caso, exigem, além das condições genéricas da ação (legitimidade das partes, o interesse e a possibilidade jurídica do pedido), a presença da justa causa, consubstanciada em elementos sólidos que permitem a constatação da tipicidade da conduta e a viabilidade da acusação.

    5. In casu, o douto Magistrado a quo, apesar de ter analisado e afastado cada uma das preliminares arguídas pelos réus em consonância com a orientação jurisprudencial desta Corte, deixou de demonstrar a existência de indícios da prática do ato ímprobo e de autoria do ilícito, ou seja, a justa causa para a propositura da presente ação civil pública por ato de improbidade administrativa.

    6. Recurso Especial provido para determinar o retorno dos autos à instância de origem a fi m de que o Magistrado a quo avalie a presença da justa causa ao emitir o juízo de admissibilidade da petição inicial da presente ação civil pública de improbidade administrativa.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial para determinar o retorno dos autos à instância de origem a fi m de que o Magistrado a quo avalie a presença da justa causa ao emitir o juízo de admissibilidade da petição inicial da presente ação civil pública de improbidade administrativa, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

    Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Teori Albino Zavascki e Arnaldo Esteves Lima (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Ausente, justifi cadamente, o Sr. Ministro Ari Pargendler.Brasília (DF), 4 de outubro de 2012 (data do julgamento).Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Relator

    DJe 22.10.2012

  • Jurisprudência da PRIMEIRA TURMA

    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 155

    RELATÓRIO

    O Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho: 1. Trata-se de Recurso Especial interposto por Petróleo Brasileiro S/A Petrobras e outro com fundamento na alínea a do art. 105, III da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado:

    Agravo Regimental. Artigo 557 do CPC. Agravo de Instrumento. Ação Civil Pública. Decisão interlocutória proferida pela Douta Juíza Singular que recebeu a petição inicial e determinou a citação dos Réus. Inconformismo. Decisão monocrática desta Relatora negando seguimento ao recurso manifestamente improcedente e em confronto com a jurisprudência dominante do STJ e do TJER. Nova insatisfação dos Agravantes. Entendimento desta Relatora quanto à rejeição das preliminates arguidas pelos Agravantes, consubstanciadas na ilegitimidade ativa e passiva, inépcia da petição inicial e inadequação da via eleita. As disposições da Lei n. 8.429/1992, na forma do seu artigo 3o., são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se benefi cie sob qualquer forma direta ou indireta. A legitimidade ativa do Parquet para a propositura da ação civil pública que visa proteger o patrimônio público e a moralidade administrativa decorre de previsão constitucional. Artigo 129, inciso III da CRFB. A petição inicial da aludida ação civil pública está em perfeita consonância com a previsão do artigo 282 do CPC. A ação civil pública é a via processual adequada para a proteção do patrimônio público, dos princípios constitucionais de administração pública e para a repressão de atos de improbidade administrativa. Precedente do STJ. O meritum causae deve ser objeto da apreciação do Juízo singular após o exaurimento da instrução processual, não sendo apropriada a realização da sua análise nessa fase em que os réus sequer apresentaram suas contestações. Precedentes do TJERJ. Inexistência de argumentos hábeis a infi rmar a decisão monocrática proferida por esta Relatora. Desprovimento do Agravo Interno (fl s. 213).

    2. Em seu apelo especial, sustentam os recorrentes que o acórdão recorrido violou os arts. 2º, 3º, 12, 16 e 17, § 8º da Lei n. 8.429/1992 e 282 e 286 do CPC, sob os seguintes fundamentos: (a) não possuem legitimidade para fi gurar no pólo passivo da demanda, uma vez que não causaram qualquer prejuízo ao erário, tendo cumprido apenas cláusula de Termo de Compromisso, fi rmando Convênio que o MP pretende ver declarado nulo, tendo efetivado o repasse das verbas estipuladas para a fundação indicada pelo Estado do Rio de Janeiro, tudo conforme de observa em análise dos instrumentos acostados aos autos (fl s. 232); (b) a Petrobrás, pessoa jurídica de direito privado, não pode fi gurar no polo passivo da ação de

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    improbidade; (c) deve ser declarada a inépcia da inicial, em razão do pedido genérico e indeterminado, que não correlaciona os fatos com a demanda; (d) ilegitimidade ativa do Ministério Público estadual para propor ação civil pública que não esteja em consonância com seus objetivos traçados pela Constituição Federal, como no caso; (e) inadequação da via eleita, já que a reparação de danos ao erário por atos de improbidade não se enquadra nos casos expressamente previstos na legislação em vigor; e (f ) quanto ao mérito, aduz a desnecessidade de instauração de procedimento licitatório para fi rmar convênio.

    3. Com as contrarrazões de fl s. 297-307 e admitido o recurso pelo Tribunal a quo, subiram os autos para esta Corte Superior.

    4. É o relatório.

    VOTO

    O Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho (Relator): 1. Dessume-se dos autos que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro ingressou com Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa em face do Estado do Rio de Janeiro, André Gustavo Pereira Correa da Silva, Fundação João Daudt de Oliveira, Armando Daudt de Oliveira Filho, Petróleo Brasileiro S/A e Kuniyuki Terabe, com fundamento nos arts. 10, V e VIII da Lei n. 8.429/1992, por suposta irregularidade nas obras do “Piscinão de São Gonçalo”.

    2. Ressalte-se, inicialmente, que as ações judiciais calcadas em dispositivos legais insertos no domínio do Direito Sancionador, ramo do Direito Público que formula os princípios, as normas e as regras de aplicação na atividade estatal punitiva de crimes e outros delitos, devem observar um procedimento que lhe é peculiar, como é o caso da ação de improbidade administrativa, que deve seguir rito próprio, previsto na Lei n. 8.429/1992, que a sujeita a condições específi cas que não se exigem para os demais processos cíveis.

    3. Cite-se, a propósito, a exigência prevista na Lei n. 8.429/1992 de que a petição inicial, além das formalidades previstas no art. 282 do CPC, deva ser instruída com documentos ou justifi cação que contenham indícios sufi cientes da existência do ato de improbidade (art. 17, § 6º), sendo certo que A ação temerária, que não convença o Magistrado da existência do ato de improbidade ou da procedência do pedido, deverá ser rejeitada (art. 17, § 8º).

    4. Além disso, a Lei de Improbidade Administrativa impõe a necessidade de prévia ouvida do acionado para que apresente manifestação por escrito antes

  • Jurisprudência da PRIMEIRA TURMA

    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 157

    de o Juiz decidir pelo recebimento ou não da petição inicial (art. 17, § 7º), marcando o encerramento da fase preliminar.

    5. Tal fase preliminar se justifi ca diante da preocupação do legislador de impedir o abusivo direito de acionar, que causam ao acionado graves consequências de ordem moral e jurídica. Conforme bem observado pelo Professor MAURO ROBERTO GOMES DE MATTOS, ao citar as ponderações realizadas por Adilson Abreu Dallari, em sua monografi a sobre Limitações à atuação do Ministério Público na Ação Civil Pública, é um constrangimento, de qualquer maneira, para qualquer pessoa, ser processado. Uma autoridade pública, quando é processada, tem um desgaste muito maior que qualquer cidadão, porque o simples fato de ser processado tem grande repercussão política na pessoa. Esse risco, bastante concreto, desestimula gente decente, honesta, correta, a ousar trabalhar na Administração Pública (O Limite da Improbidade Administrativa, Comentários à Lei 8.429/92, Rio de Janeiro, Forense, 2010, p. 553).

    6. Não se há de perder de vista que em todos os ramos do Direito Sancionador devem ser sempre respeitadas as garantias que cercam o exercício do jus puniendi estatal, culturalmente consagradas no Processo Penal moderno, que agasalha a regra constitucional do devido processo legal que, uma vez desrespeitada, produz inevitavelmente a nulidade do processo em que ocorreu. Corroborando com esse entendimento, cumpre novamente trazer à baila a lição do douto Professor MAURO ROBERTO GOMES DE MATTOS:

    O prévio juízo de admissibilidade da ação regularmente instruída segue o ritual do contraditório, no melhor estilo democrático processual, em que o autor e réu possuem a liberdade de expor suas razões da maneira mais cristalina possível, para que o magistrado possua elementos sólidos para que, em uma cognição sumária, não exauriente, possa aferir se a ação de improbidade administrativa possui elementos sólidos ou não passa de criação intelectual do seu subscritor, sem viabilidade jurídica concreta.

    (...).

    Caso seja descumprida a presente determinação legal estatuída pelo § 7º do art. 17 da Lei n. 8.429/1992, não resta dúvida de que será violado o devido processo legal, estabelecido no art. 5º, LV da CF.

    Recebida a ação, após o oferecimento das razões preliminares do réu, existirá a possibilidade de ultrapassar-se a admissibilidade da lide para a posteriori serem determinadas as medidas de urgência.

    A notifi cação prévia dos requeridos, como condição que antecede à citação, é necessária, e a sua inobservância gera nulidade (ob. cit., p. 558-560).

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    7. De fato, o sistema de garantias não deve ser fl exibilizado em favor de interesses administrativos, ainda que possam ser reconhecidos e proclamados como da mais alta relevância, porquanto sobre eles avultam os princípios e as normas postas na Carta Magna; também é preciso lembrar que o Poder Público se submete à jurisdição, ou seja, também deve reverência às garantias processuais, não podendo promover a defesa dos seus interesses, senão dentro das demarcações do processo.

    8. In casu, após a apresentação de defesa prévia, o Magistrado de 1º grau, afastando as preliminares suscitadas, recebeu a inicial da ação civil pública e determinou a citação de todos os réus.

    9. Registre-se, inicialmente, que não merece prosperar a irresignação dos recorrentes quanto às preliminares arguídas, conforme se passa a demonstrar.

    10. Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva, o art. 3º da Lei n. 8.429/1992 dispõe que também é considerado sujeito ativo da Lei de Improbidade o particular que, em tese, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se benefi cie sob qualquer forma direta ou indireta.

    11. Em relação à alegação de ilegitimidade ativa do Ministério Público Estadual, bem como da impossibilidade de se pleitear a reparação de danos ao erário por atos de improbidade por Ação Civil Pública, o STJ já fi rmou o entendimento de que o Ministério Público tem legitimidade ad causam para a propositura de ação civil pública objetivando o ressarcimento de danos ao erário, decorrentes de atos de improbidade (AgRg no AREsp n. 76.985-MS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJe 18.5.2012). No mesmo sentido, citem-se:

    Administrativo. Improbidade. Art. 11 da Lei n. 8.429/1992. Ministério Público. Legitimidade. Notifi cação. Defesa prévia. Dispensa. Ausência de prejuízo. Acórdão proferido com base em vasto exame de material probatório. Súmula n. 7-STJ. Hipótese que admite confi guração de ato de improbidade. Violação do art. 535 do CPC. Ausência. Penalidades aplicadas. Correto juízo de proporcionalidade. Não conhecimento do recurso pela alínea c.

    (...).

    Ministério Público possui legitimidade para ajuizar Ação Civil Pública com o intuito de combater a prática da improbidade administrativa. Condutas ímprobas podem ser deduzidas em juízo por meio de Ação Civil Pública, não havendo incompatibilidade, mas perfeita harmonia, entre a Lei n. 7.347/1985 e a Lei n. 8.429/1992, respeitados os requisitos específi cos desta última. Precedentes do STJ.

    (...). (REsp n. 1.233.629-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 14.9.2011).

  • Jurisprudência da PRIMEIRA TURMA

    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 159

    Administrativo e Processual Civil. Agravo regimental no agravo de instrumento. Mandado de segurança. Inquérito civil instaurado pelo Ministério Público para o fi m de apurar a prática de ato de improbidade administrativa por parte de magistrado. Possibilidade. Súmula n. 83 do STJ. Artigos 9º, 10º e 11 da Lei n. 8.429/1992 não prequestionados, bem como os artigos 29 a 45 da LC n. 35/1979. Súmula n. 211 do STJ. Alegação de violação a artigos de lei sem a devida fundamentação. Súmula n. 284 do STF. Ausência de violação do art. 535 do CPC.

    (...).

    2. Outrossim, é pacífi co o entendimento jurisprudencial do STJ, no sentido de que o Ministério Público Estadual tem legitimidade para o ajuizamento da ação civil pública por ato de improbidade administrativa e a instauração do respectivo inquérito civil, mesmo que em face de magistrado. A esse respeito: REsp n. 783.823-GO, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 26.5.2008; REsp n. 861.566-GO, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 23.4.2008; REsp n. 695.718-SP, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ 12.9.2005.

    (...). (AgRg no Ag n. 1.338.058-MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 8.4.2011).

    12. Ocorre que, apesar de ter analisado e afastado cada uma das preliminares arguídas pelos réus em consonância com a orientação jurisprudencial desta Corte, o douto Magistrado deixou de demonstrar a existência de indícios da prática do ato ímprobo e de autoria do ilícito, ou seja, a justa causa para a propositura da presente ação civil pública por ato de improbidade administrativa.

    13. Com efeito, as ações sancionatórias, como no caso, exigem, além das condições genéricas da ação (legitimidade das partes, o interesse e a possibilidade jurídica do pedido), a presença da justa causa, consubstanciada em elementos sólidos, que permitem a constatação da tipicidade da conduta e a viabilidade da acusação.

    14. Por oportuno, vale transcrever as ilações da douta Ministra Maria Th ereza de Assis Moura acerca da justa causa no âmbito penal:

    A posição mais avençada da doutrina, e que também encontra algum respaldo na jurisprudência, admite que a justa causa diga respeito também a questões de fato, e sendo assim, vincula o recebimento da denúncia ou queixa à prova da existência material de conduta típica, na hipótese, e de indícios de que o acusado seja seu autor; ambas devem decorrer dos elementos de informação, colhidos na fase investigatória, de maneira a servir de base à acusação formulada.

    Prova induvidosa da ocorrência de um fato delituoso, na hipótese, e prova ou indícios de autoria, apurados em inquérito policial ou nas peças de informação

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    que acompanham a acusação: é neste binômio que, para esta postura, consiste o fundamento tido com indispensável para acusação, sem o qual inexiste justa causa para a instauração do processo criminal (Justa Causa para a Ação Penal, São Paulo, RT, 2001, p. 241).

    15. Alinhando-se à orientação de que a noção de justa causa como condicionante da denúncia criminal também deve se fazer presente no juízo de admissibilidade da petição inicial de improbidade administrativa, o ilustre Ministro Cesar Asfor Rocha, com propriedade, pondera que:

    Devo referir que alguns autores entendem, mas sem razão, ao meu ver, que a justa causa estaria encampada pela possibilidade jurídica, ou pelo interesse, de sorte que, mesmo respeitando essa posição (que tem os seus fundamentos explicitados com argúcia), sigo a orientação que afi rma que a justa causa - nas ações sancionatórias - constitui um requisito autônomo e distinto daqueles outros três, ou seja, nas ações sancionatórias há um quarto elemento circunstanciador da sua promoção.

    Rememoro que a noção de justa causa - conforme as várias teorias jurídicas a seu respeito - nasceu no domínio do Direito Processual Penal moderno, como condicionante da denúncia criminal, fi gurando como uma exigência que não pode ser contornada, e cuja ausência enseja um dos mais graves defeitos da promoção judicial penal - a inépcia da denúncia apresentada pelo Ministério Público - cuja rejeição se impõe ao Juiz que a analise e, se assim não o fi zer, abre-se a oportunidade para a obtenção de ordem de Habeas Corpus, para impedir (ou trancar) o trâmite daquela promoção inepta, por falta de justa causa.

    Pois essa exigência (da justa causa) e esse cortejo de efeitos também se fazem presentes na análise da inicial da ação por ato de improbidade administrativa (e de todas as ações sancionadoras), que deverá trazer no seu contexto a demonstração da seriedade e da consistência da promoção, mostrando - não apenas com esforço narrativo, mas com elementos materiais seguros e confi áveis - a materialidade do ilícito que se aponta e indicando, também com dados sufi cientes, seguros e sérios, quem seja o seu praticante; pode-se afi rmar que sem essa demonstração objetiva, não estará satisfeita a exigência da justa causa (Breves Refl exões Críticas sobre a Ação de Improbidade Administrativa, Ribeirão Preto, Migalhas, 2012, p. 28).

    16. Diante dessas considerações, dou provimento ao Recurso Especial para determinar o retorno dos autos à instância de origem a fi m de que o Magistrado a quo avalie a presença da justa causa ao emitir o juízo de admissibilidade da petição inicial da presente ação civil pública de improbidade administrativa. É como voto.

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    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 161

    RECURSO ESPECIAL N. 1.151.030-RS (2009/0145375-2)

    Relator: Ministro Francisco FalcãoRecorrente: Clebismar Cougo de Oliveira e outroAdvogado: Lúcio Fernandes Furtado e outro(s)Recorrido: Fazenda NacionalProcurador: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional

    EMENTA

    Tributário. Recurso especial. Tributo sujeito a lançamento por homologação. Repetição de indébito. Ação ajuizada após a vigência da LC n. 118/2005 (9.6.2005). Prescrição quinquenal. Decisão do STF no RE n. 566.621-RS, pelo regime da repercussão geral. Entendimento adotado pela Primeira Seção desta Corte. Matéria também submetida ao rito do art. 543-C do CPC (recursos repetitivos). REsp n. 1.269.570-MG. Juízo de retratação. Art. 543-B, § 3º, do CPC. Recurso especial improvido.

    I - O Superior Tribunal de Justiça, no REsp n. 1.002.032-SP, Relator Ministro Luiz Fux, DJe de 18.12.2009, julgado pelo regime do artigo 543-C do CPC (recursos repetitivos), havia fi rmado compreensão de que o prazo prescricional de 5 anos para a repetição de indébito de tributos sujeitos a lançamento por homologação, trazido pela LC n. 118/2005, somente incidiria sobre os pagamentos indevidos ocorridos a partir da entrada em vigor da referida lei, ou seja, 9.6.2005.

    II - O Plenário do Excelso Supremo Tribunal Federal, contudo, ao julgar o RE n. 566.621-RS, Relatora Ministra Ellen Gracie, DJe de 11.10.2011, submetido ao rito do artigo 543-B do CPC (repercussão geral), assentou o entendimento de que, apesar de ser indevida a retroatividade do prazo de prescrição quinquenal para o pedido de compensação ou repetição de indébito relativo a tributo lançado por homologação, a aplicação do novo prazo de 5 anos é válida tão-somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9 de junho de 2005, ainda que estas ações digam respeito a recolhimentos indevidos realizados antes da vigência da LC

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    n. 118/2005. E, por outro lado, às ações intentadas antes da referido referido marco aplica-se a Tese dos “cinco mais cinco”, consoante a antiga orientação do STJ.

    III - A Primeira Seção do STJ, na assentada do dia 24.8.2011, deliberou pela imediata adoção do entendimento do STF. Entendimento consolidado ainda no REsp n. 1.269.570-MG, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 4.6.2012, submetido ao rito dos recursos repetitivos.

    IV - In casu, tendo sido a ação ajuizada em 11.12.2007, aplica-se o prazo quinquenal, encontrando-se, pois, prescrita a ação, eis que a parcela pleiteada foi recolhida em 17.10.2000.

    V - Imperioso o juízo de retratação a que alude o § 3º do artigo 543-C do CPC, para negar provimento ao recurso especial.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Arnaldo Esteves Lima (Presidente), Napoleão Nunes Maia Filho e Benedito Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 7 de agosto de 2012 (data do julgamento).Ministro Francisco Falcão, Relator

    DJe 9.10.2012

    RELATÓRIO

    O Sr. Ministro Francisco Falcão: Trata-se de recurso especial interposto por Clebismar Cougo de Oliveira e outro ao qual foi dado provimento para declarar o direito à repetição do indébito de tributos sujeitos a lançamento por homologação conforme a Tese dos “cinco mais cinco”, fi rmada nesta Corte Superior no EREsp n. 644.736-PE, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 16.4.2007.

    Tal decisum restou preservado em sede de agravo regimental pela Primeira Turma desta Corte, em ementa vazada nos seguintes termos:

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    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 163

    Tributo sujeito a lançamento por homologação. Prazo prescricional. Tese dos “cinco mais cinco”. LC n. 118/2005. Aplicação retroativa. Impossibilidade. Análise de dispositivos constitucionais. Inviabilidade.

    I - “Sobre a prescrição da ação de repetição de indébito tributário de tributos sujeitos a lançamento por homologação, a jurisprudência do STJ (1ª Seção) assentou o entendimento de que, no regime anterior ao do art. 3º da LC n. 118/2005, o prazo de cinco anos, previsto no art. 168 do CTN, tem início, não na data do recolhimento do tributo indevido, e sim na data da homologação - expressa ou tácita - do lançamento. Assim, não havendo homologação expressa, o prazo para a repetição do indébito acaba sendo de dez anos a contar do fato gerador.

    A norma do art. 3º da LC n. 118/2005, que estabelece como termo inicial do prazo prescricional, nesses casos, a data do pagamento indevido, não tem efi cácia retroativa. É que a Corte Especial, ao apreciar Incidente de Inconstitucionalidade no EREsp n. 644.736-PE, sessão de 6.6.2007, declarou inconstitucional a expressão “observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional”, constante do art. 4º, segunda parte, da referida Lei Complementar.” (REsp n. 886.181-SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 16.8.2007).

    II - A análise de suposta violação a dispositivos constitucionais é de competência exclusiva do Pretório Excelso, conforme prevê o artigo 102, inciso III, da Carta Magna, pela via do recurso extraordinário, sendo defeso a esta colenda Corte fazê-lo, ainda que para fi ns de prequestionamento.

    III - Agravo regimental improvido.

    Contra este acórdão a Fazenda Nacional interpôs recurso extraordinário fulcrado no artigo 102, inciso III, alínea b, da Constituição Federal, no qual se defendeu a constitucionalidade do artigo 4° da LC n. 118/2005, alegando-se, após a preliminar de repercussão geral, que tal dispositivo não fere os princípios constitucionais da autonomia e independência dos poderes e da segurança jurídica, previstos nos arts. 2º e 5º, XXXVI, da CF/1988, respectivamente.

    O recurso extraordinário foi sobrestado para aguardar o julgamento do RE n. 566.621-RS, nos termos do art. 543-B do CPC.

    Concluído o julgamento e transitado em julgado o RE n. 566.621-RS, voltam os autos a esta relatoria para análise de possível juízo de retratação (art. 543-B, § 3º, do CPC).

    Em mesa para julgamento.É o relatório.

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    VOTO

    O Sr. Ministro Francisco Falcão (Relator): Senhor Presidente, a decisão desta Egrégia Turma deve ser reconsiderada, nos termos do § 3º do artigo 543-B do CPC.

    A Colenda Primeira Seção, no julgamento do REsp n. 1.002.932-SP, DJe de 18.12.2009, Relator Ministro Luiz Fux, pela sistemática dos recursos repetitivos (artigo 543-C do CPC), havia pacifi cado o entendimento de que, nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, o prazo prescricional previsto no artigo 168 do CTN para se pleitear a compensação ou a restituição do crédito tributário somente se operava quando decorridos cinco anos da ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais cinco anos, contados a partir da homologação tácita e, não, da data do recolhimento do tributo devido, a denominada Tese dos “cinco mais cinco”.

    Entretanto a Lei Complementar n. 118, de 9.2.2005, em seu artigo 3º, trouxe novo disciplinamento para as ações que visem à restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação, estabelecendo prazo prescricional de cinco anos, com termo inicial na data do pagamento antecipado.

    Tal regime, por certo, somente pode ter efi cácia prospectiva, incidindo sobre situações que venham a ocorrer a partir de sua vigência, prevista para 120 dias após a publicação do diploma legal, ou seja, 9 de junho de 2005.

    Este entendimento restou consagrado quando do julgamento da AI nos EREsp n. 644.736-PE, DJ 27.8.2007, onde foi declarada a inconstitucionalidade da expressão “observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional”, constante do artigo 4º, segunda parte, da referida LC n. 118/2005.

    Entendeu-se também que, por se tratar a aludida lei complementar de norma que veio a reduzir o prazo prescricional, conferindo-lhe um alcance diferente daquele dado pela jurisprudência do STJ (Tese dos “cinco mais cinco”), seria necessário que se observasse, na aplicação da nova legislação, a regra de direito intertemporal, a fi m de que sejam resguardados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, preceitos consagrados pela Carta Magna, conforme os fundamentos exarados no EREsp n. 644.736-PE, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 27.8.2007, verbis:

    Tratando-se de norma que reduz prazo de prescrição, cumpre observar, na sua aplicação, a regra clássica de direito intertemporal, afi rmada na doutrina e

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    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 165

    na jurisprudência em situações dessa natureza: o termo inicial do novo prazo será o da data da vigência da lei que o estabelece, salvo se a prescrição (ou, se for o caso, a decadência), iniciada na vigência da lei antiga, vier a se completar, segundo a lei antiga, em menos tempo. São precedentes do STF nesse sentido:

    Prescrição Extintiva. Lei nova que lhe reduz prazo. Aplica-se à prescrição em curso, mas contando-se o novo prazo a partir da nova lei. Só se aplicará a lei antiga, se o seu prazo se consumar antes que se complete o prazo maior da lei nova, contado da vigência desta, pois seria absurdo que, visando a lei nova reduzir o prazo, chegasse a resultado oposto, de ampliá-lo (RE n. 37.223, Min. Luiz Gallotti, julgado em 10.7.1958).

    Ação Rescisória. Decadência. Direito Intertemporal. Se o restante do prazo de decadência fi xado na lei anterior for superior ao novo prazo estabelecido pela lei nova, despreza-se o período já transcorrido, para levar-se em conta, exclusivamente, o prazo da lei nova, a partir do início da sua vigência (AR n. 905-DF, Min. Moreira Alves, DJ de 28.4.1978).

    No mesmo sentido: RE n. 93.110-RJ, Min. Xavier de Albuquerque, julgado em 5.11.1980; AR n. 1.025-6-PR, Min. Xavier de Albuquerque, DJ de 13.3.1981.

    É o que se colhe, também, de abalizada doutrina, como, v.g., a de Pontes de Miranda (Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 1998, Tomo VI, p. 359), Barbosa Moreira (Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 1976, volume V, p. 205-207) e Galeno Lacerda, este com a seguinte e didática lição sobre situação análoga (redução do prazo da ação rescisória, operada pelo CPC de 1973):

    A mais notável redução de prazo operada pelo Código vigente incidiu sobre o de propositura da ação rescisória. O velho e mal situado prazo de cinco anos prescrito pelo Código Civil (art. 178, § 10, VIII) foi diminuído drasticamente para dois anos (art. 495). Surge, aqui, interessante problema de direito transitório, quanto à situação dos prazos em curso pelo direito anterior. A regra para os prazos diminuídos é inversa da vigorante para os dilatados. Nestes, como vimos, soma-se o período da lei antiga ao saldo, ampliado, pela lei nova. Quando se trata de redução, porém, não se podem misturar períodos regidos por leis diferentes: ou se conta o prazo, todo ele pela lei antiga, ou todo, pela regra nova, a partir, porém, da vigência desta. Qual o critério para identifi car, no caso concreto, a orientação a seguir? A resposta é simples. Basta que se verifi que qual o saldo a fl uir pela lei antiga. Se for inferior à totalidade do prazo da nova lei, continua-se a contar dito saldo pela regra antiga. Se superior, despreza-se o período já decorrido, para computar-se, exclusivamente, o prazo da lei nova, na sua totalidade, a partir da entrada em vigor desta. Assim, por exemplo, no que concerne à ação rescisória, se já decorreram quatro anos pela lei antiga, só ela é que há

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    de vigorar: o saldo de um ano, porque menor ao prazo do novo preceito construa a fl uir, mesmo sob a vigência deste. Se, porém, passou-se, apenas, um ano sob o direito revogado, o saldo de quatro, quando da entrada em vigor da regra nova, é superior ao prazo por esta determinado. Por este motivo, a norma de aplicação imediata exige que o cômputo se proceda, exclusivamente, pela lei nova, a partir, evidentemente, de sua entrada em vigor, isto é, os dois anos deverão contar-se a partir de 1º de janeiro de 1974. O termo inicial não poderia ser, nesta hipótese, o do trânsito em julgado da sentença, operado sob lei antiga, porque haveria, então, condenável retroatividade (O Novo Direito Processual Civil e os Feitos Pendentes, Forense, 1974, pp. 100-101).

    Câmara Leal tem pensamento semelhante:

    Estabelecendo a nova lei um prazo mais curto de prescrição, esse começará a correr da data da nova lei, salvo se a prescrição iniciada na vigência da lei antiga viesse a se completar em menos tempo, segundo essa lei, que, nesse caso, continuaria a regê-la, relativamente ao prazo (Da Prescrição e da Decadência, Forense, 1978, p. 90). (g.n.) (EREsp n. 644.736-PE, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 16.4.2007).

    Aplicando-se tais regras de direito intertemporal à questão da prescrição, passou-se a entender que a aplicação da lei nova que estabelece prazo prescricional menor, in casu, a Lei Complementar n. 118/2005, estaria reservada aos fatos geradores ocorridos após a sua vigência, devendo entretanto ser observado qual o período que resta a fl uir pela regra dos “cinco mais cinco”, a partir de 9 de junho de 2005:

    a) se o restante do prazo for inferior aos cinco anos estipulados pela nova lei, continua-se a contar dito saldo pela lei antiga; ou

    b) se o restante do prazo for superior, despreza-se o período já decorrido, para computar-se, exclusivamente, o prazo da lei nova, na sua totalidade.

    Ocorre que o egrégio STF, no julgamento do RE n. 566.621-RS, concluído em 4.8.2011, submetido ao regime da repercussão geral (artigo 543-B do CPC), afastou parcialmente a jurisprudência do STJ, para fi xar que a LC n. 118/2005 tem aplicação apenas aos processos ajuizados a partir da sua entrada em vigor (9.6.2005), ainda que tais ações se refi ram a recolhimentos indevidos realizados antes da sua vigência.

    Vale a pena conferir, a propósito, o teor do Informativo n. 585 do STF, de 3 a 7 de maio de 2010, noticiando o voto proferido pela relatora, eminente Ministra Ellen Gracie, que orientou o acórdão:

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    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 167

    Prazo para Repetição ou Compensação de Indébito Tributário e Art. 4º da LC n. 118/2005

    O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto pela União contra decisão do TRF da 4ª Região que reputara inconstitucional o art. 4º da Lei Complementar n. 118/2005 na parte em que determinaria a aplicação retroativa do novo prazo para repetição ou compensação do indébito tributário [LC n. 118/2005: “Art. 3º Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida Lei. Art. 4º Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional.”; CTN: “Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito: I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;”]. A Min. Ellen Gracie, relatora, reconhecendo a inconstitucionalidade do art. 4º, segunda parte, da LC n. 118/2005, por violação ao princípio da segurança jurídica, nos seus conteúdos de proteção da confi ança e de acesso à Justiça, com suporte implícito e expresso nos artigos 1º e 5º, XXXV, da CF, e considerando válida a aplicação do novo prazo de 5 anos tão-somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9.6.2005, desproveu o recurso. Asseverou, inicialmente, que a Lei Complementar n. 118/2005, não obstante expressamente se autoproclamar interpretativa, não seria uma lei materialmente interpretativa, mas constituiria lei nova, haja vista que a interpretação por ela imposta implicara redução do prazo de 10 anos - jurisprudencialmente fi xado pelo STJ para repetição ou compensação de indébito tributário, e contados do fato gerador quando se tratasse de tributo sujeito a lançamento por homologação - para 5 anos, estando sujeita, assim, ao controle judicial.

    Em seguida, reputou que a retroatividade determinada pela lei em questão não seria válida. Afirmou que a alteração de prazos não ofenderia direito adquirido, por inexistir direito adquirido a regime jurídico, conforme reiterada jurisprudência da Corte. Em razão disso, não haveria como se advogar suposto direito de quem pagou indevidamente um tributo a poder buscar ressarcimento no prazo estabelecido pelo CTN por ocasião do indébito. Ressaltou, contudo, que a redução de prazo não poderia retroagir para fulminar, de imediato, pretensões que ainda poderiam ser deduzidas no prazo vigente quando da modifi cação legislativa. Ou seja, não se poderia entender que o legislador pudesse determinar que pretensões já ajuizadas ou por ajuizar estivessem submetidas, de imediato, ao prazo reduzido, sem qualquer regra de transição, sob pena de ofensa a conteúdos do princípio da segurança jurídica. Explicou que, se, de um lado, não haveria dúvida de que a proteção das situações jurídicas consolidadas em ato jurídico perfeito, direito adquirido ou coisa julgada constituiria imperativo de segurança

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    jurídica, concretizando o valor inerente a tal princípio, de outro, também seria certo que teria este abrangência maior e que implicaria resguardo da certeza do direito, da estabilidade das situações jurídicas, da confi ança no tráfego jurídico e do acesso à Justiça. Assim, o julgamento de preliminar de prescrição relativamente a ações já ajuizadas, tendo como referência novo prazo reduzido por lei posterior, sem qualquer regra de transição, atentaria, indiscutivelmente, contra, ao menos, dois desses conteúdos, quais sejam: a confi ança no tráfego jurídico e o acesso à Justiça. Frisou que, estando um direito sujeito a exercício em determinado prazo, seja mediante requerimento administrativo ou, se necessário, ajuizamento de ação judicial, haver-se-ia de reconhecer efi cácia à iniciativa tempestiva tomada pelo seu titular nesse sentido, pois tal restaria resguardado pela proteção à confi ança. De igual modo, não seria possível fulminar, de imediato, prazos então em curso, sob pena de patente e direta violação à garantia de acesso ao Judiciário.

    Considerou, diante do reconhecimento da inconstitucionalidade, que o novo prazo só poderia ser validamente aplicado após o decurso da vacatio legis de 120 dias. Reportou-se ao Enunciado da Súmula n. 445 do STF [“A Lei n. 2.437, de 7.3.1955, que reduz prazo prescricional, é aplicável às prescrições em curso na data de sua vigência (1º.1.1956), salvo quanto aos processos então pendentes”], e relembrou que, nos precedentes que lhe deram origem, a Corte entendera que, tendo havido uma vacatio legis alargada, de 10 meses entre a publicação da lei e a vigência do novo prazo, tal fato teria dado oportunidade aos interessados para ajuizarem suas ações, interrompendo os prazos prescricionais em curso, sendo certo que, a partir da vigência, em 1º.1.1956, o novo prazo seria aplicável a qualquer caso ainda não ajuizado. Tal solução deveria ser a mesma para o presente caso, a despeito da existência do art. 2.028 do Código Civil - CC, haja vista que este seria regra interna daquela codifi cação, limitando-se a resolver os confl itos no tempo relativos às reduções de prazos impostas pelo novo CC de 2002 relativamente aos prazos maiores constantes do CC de 1916. Registrou que o legislador, ao aprovar a LC n. 118/2005 não teria pretendido aderir à regra de transição do art. 2.028 do CC. Somente se tivesse estabelecido o novo prazo para repetição e compensação de tributos sem determinar sua aplicação retroativa, quedando silente no ponto, é que seria permitida a aplicação do art. 2.028 do CC por analogia. Afi rmou que, ainda que a vacatio legis estabelecida pela LC n. 118/2005 fosse menor do que a prevista na Lei n. 2.437/1955, objeto da Súmula n. 445, ter-se-ia de levar em conta a facilidade de acesso, nos dias de hoje, à informação quanto às inovações legislativas e repercussões, sobretudo, via internet. Por fi m, citou a LC n. 95/1998 que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, nos termos do art. 59 da CF, cujo art. 8º prevê que a lei deve contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula “entra em vigor na data de sua publicação” para as leis de pequena repercussão. Concluiu que o art. 4º da LC n. 118/2005, na parte que em estabeleceu vacatio legis alargada de 120 dias teria cumprido com essa função, concedendo prazo sufi ciente para que os contribuintes tomassem conhecimento do novo prazo e pudessem agir, ajuizando ações necessárias à tutela dos seus direitos. Assim, vencida a vacatio legis de 120 dias, seria válida

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    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 169

    a aplicação do prazo de 5 anos às ações ajuizadas a partir de então, restando inconstitucional apenas sua aplicação às ações ajuizadas anteriormente a essa data. No caso concreto, reputou correta a aplicação, pelo tribunal de origem, do prazo de 10 anos anteriormente vigente, por ter sido a ação ajuizada antes da vigência da LC n. 118/2005.

    Os Ministros Ricardo Lewandowski, Ayres Britto, Celso de Mello e Cezar Peluso acompanharam a relatora, tendo o Min. Celso de Mello dissentido apenas num ponto, qual seja, o de que o art. 3º da LC n. 118/2005 só seria aplicável não às ações ajuizadas posteriormente ao término do período de vacatio legis, mas, na verdade, aos próprios fatos ocorridos após esse momento. Em divergência, o Min. Marco Aurélio deu provimento ao recurso, no que foi acompanhado pelos Ministros Dias Toff oli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Entendeu que o art. 3º não inovou, mas repetiu rigorosamente o que contido no Código Tributário Nacional. Afi rmou se tratar de dispositivo meramente interpretativo, que buscou redirecionar a jurisprudência equivocada do STJ. O Min. Dias Toff oli, por sua vez, acrescentou não vislumbrar na lei atentado contra o direito adquirido, o ato jurídico perfeito, ou a coisa julgada. Observou que a lei pode retroagir, respeitando esses princípios. Em seguida, o julgamento foi suspenso para aguardar-se o voto do Min. Eros Grau. (STF, RE n. 566.621-RS, Relator Ministro Ellen Gracie, 5.5.2010).

    Portanto, o STF ratifi cou o posicionamento do STJ, no sentido de ser indevida a aplicação retroativa do prazo prescricional quinquenal para o pedido de repetição do indébito relativo a tributo lançado por homologação. Entretanto, em relação ao termo e ao critério para aplicação da novel legislação, o Excelso Pretório entendeu válida a aplicação do novo prazo de 5 anos tão-somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9.6.2005, e não aos pagamentos indevidamente realizados antes do início de vigência da LC n. 118/2005, como o STJ vinha entendendo.

    E, nesse passo, tem-se que a Primeira Seção deliberou, na sessão do dia 24.8.2011, pela imediata aplicação da jurisprudência do egrégio STF, seguindo, nesse mesmo sentido, os seguintes precedentes:

    Processual Civil e Tributário. Repetição de indébito. Tributo sujeito a lançamento por homologação. Prescrição. LC n. 118/2005. Inconstitucionalidade da aplicação retroativa. Aplicação apenas às demandas ajuizadas após a sua entrada em vigor. Compensação. Tributos de diferentes espécies. Sucessivos regimes de compensação. Aplicação retroativa ou exame da causa à luz do direito superveniente. Inviabilidade. Matéria decidida pela 1ª Seção, no REsp n. 1.137.738-SP, sob o regime do art. 543-C do CPC. Recurso especial parcialmente provido. (REsp n. 853.881-SP, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 26.10.2011 - g.n.).

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    Processual Civil. Tributário. Fator Acidentário de Prevenção (FAP). Caráter sancionador. Violação do art. 3º do CTN. Tese não analisada. Falta de prequestionamento. Súmula n. 211-STJ. Não-alegação de violação do artigo 535 do CPC. Recurso especial fundamentado na alínea c. Não indicação do dispositivo legal ao qual foi dada interpretação divergente. Fundamentação defi ciente. Súmula n. 284-STF. Prescrição. LC n. 118/2005. Novel entendimento do STF. Repercussão geral. Aplicação do prazo prescricional de 5 anos somente às ações ajuizadas a partir de 9.6.2005. (...)

    6. A jurisprudência do STJ alberga a tese de que o prazo prescricional na repetição de indébito de cinco anos defi nido na Lei Complementar n. 118/2005 somente incidirá sobre os pagamentos indevidos ocorridos a partir da entrada em vigor da referida lei, ou seja, 9.6.2005. Vide o REsp n. 1.002.032-SP, julgado pelo regime dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC).

    7. Este entendimento restou superado quando, sob o regime de Repercussão Geral, o Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária realizada em 4.8.2011, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 566.621-RS (DJe 18.8.2011), pacifi cou a tese de que o prazo prescricional de cinco anos defi nido na Lei Complementar n. 118/2005 incidirá sobre as ações de repetição de indébito ajuizadas a partir da entrada em vigor da nova lei (9.6.2005), ainda que estas ações digam respeito a recolhimentos indevidos realizados antes da sua vigência.

    Recurso especial não conhecido. (REsp n. 1.274.551-RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 20.10.2011).

    Tributário. Embargos de declaração no agravo regimental no agravo em recurso especial. Contribuição social. Tributo sujeito a lançamento por homologação. Prescrição. Artigo 4º da LC n. 118/2005. RE n. 566.621-RS. Repercussão geral. Prazo prescricional quinquenal. Ações ajuizadas após a vigência da LC n. 118/2005. Direito intertemporal. Ação ajuizada em data posterior.

    1. Os embargos de declaração são cabíveis quando a decisão padece de omissão, contradição ou obscuridade, consoante dispõe o art. 535 do CPC, bem como para sanar a ocorrência de erro material.

    2. Os embargos aclaratórios não se prestam a adaptar o entendimento do acórdão embargado à posterior mudança jurisprudencial.

    Excepciona-se essa regra na hipótese do julgamento de recursos submetidos ao rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil, haja vista o escopo desses precedentes objetivos, concernentes à uniformização na interpretação da legislação federal. Nesse sentido: EDcl no AgRg no REsp n. 1.167.079-PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 4.3.2011; EDcl na AR n. 3.701-BA, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 4.5.2011; e EDcl nos EDcl nos EDcl nos EDcl no REsp n. 790.318-RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 25.5.2010.

  • Jurisprudência da PRIMEIRA TURMA

    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 171

    3. Pelas mesmas razões, estende-se esse entendimento aos processos julgados sob o regime do artigo 543-B do Código de Processo Civil.

    4. O Supremo Tribunal Federal, ao reconhecer a repercussão geral da matéria no RE n. 566.621-RS, proclamou que o prazo prescricional de cinco anos, previsto na Lei Complementar n. 118/2005, somente se aplica às ações ajuizadas após 9.6.2005.

    5. Na espécie, a ação de repetição de indébito foi ajuizada em 13.1.2010, data posterior à vigência da LC n. 118/2005, sendo aplicável, portanto, o prazo prescricional de cinco anos.

    6. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para reconhecer a prescrição das parcelas anteriores ao quinquênio do ajuizamento da ação. (EDcl no AgRg no AREsp n. 8.122-RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 30.9.2011).

    Por fi m, tal entendimento restou confi rmado ainda no REsp n. 1.269.570-MG, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 4.6.2012, submetido ao rito dos recursos repetitivos, superando expressamente o anterior representativo de controvérsia sobre a matéria, o REsp n. 1.002.932-SP. A conclusão do referido julgado restou vazado nos seguintes termos, litteris:

    Constitucional. Tributário. Recurso especial representativo da controvérsia (art. 543-C, do CPC). Lei interpretativa. Prazo de prescrição para a repetição de indébito nos tributos sujeitos a lançamento por homologação. Art. 3º, da LC n. 118/2005. Posicionamento do STF. Alteração da jurisprudência do STJ. Superado entendimento fi rmado anteriormente também em sede de recurso representativo da controvérsia.

    1. O acórdão proveniente da Corte Especial na AI nos EREsp n. 644.736-PE, Relator o Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 27.8.2007, e o recurso representativo da controvérsia REsp n. 1.002.932-SP, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 25.11.2009, fi rmaram o entendimento no sentido de que o art. 3º da LC n. 118/2005 somente pode ter efi cácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência. Sendo assim, a jurisprudência deste STJ passou a considerar que, relativamente aos pagamentos efetuados a partir de 9.6.2005, o prazo para a repetição do indébito é de cinco anos a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior.

    2. No entanto, o mesmo tema recebeu julgamento pelo STF no RE n. 566.621-RS, Plenário, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 4.8.2011, onde foi fi xado marco para a aplicação do regime novo de prazo prescricional levando-se em consideração a data do ajuizamento da ação (e não mais a data do pagamento) em confronto com a data da vigência da lei nova (9.6.2005).

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    3. Tendo a jurisprudência deste STJ sido construída em interpretação de princípios constitucionais, urge inclinar-se esta Casa ao decidido pela Corte Suprema competente para dar a palavra fi nal em temas de tal jaez, notadamente em havendo julgamento de mérito em repercussão geral (arts. 543-A e 543-B, do CPC). Desse modo, para as ações ajuizadas a partir de 9.6.2005, aplica-se o art. 3º, da Lei Complementar n. 118/2005, contando-se o prazo prescricional dos tributos sujeitos a lançamento por homologação em cinco anos a partir do pagamento antecipado de que trata o art. 150, § 1º, do CTN.

    4. Superado o recurso representativo da controvérsia REsp n. 1.002.932-SP, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 25.11.2009.

    5. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n. 08/2008. (REsp n. 1.269.570-MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 23.5.2012, DJe 4.6.2012).

    In casu, tendo a presente ação ordinária sido ajuizada em 11 de dezembro de 2007, deve o prazo prescricional incidir na forma do artigo 3º da LC n. 118/2005, encontrando-se, pois, prescrita a ação, eis que a parcela pleiteada foi recolhida em 17 de outubro de 2000, como decidido no acórdão regional.

    Ante todo o exposto, mostra-se imperioso o juízo de retratação a que alude o § 3º do artigo 543-C do CPC, para negar provimento ao recurso especial.

    É como voto.

    RECURSO ESPECIAL N. 1.308.628-RS (2011/0020537-8)

    Relator: Ministro Benedito GonçalvesRecorrente: Cápsula Cinematográfi ca LtdaAdvogado: Rafael Pandolfo e outro(s)Recorrido: Município de Porto AlegreProcurador: Rogerio Quijano Gomes Ferreira e outro(s)

    EMENTA

    Tributário. Recurso especial. ISS. LC n. 116/2003. Produção de fi tas e fi lmes sob encomenda. Não incidência, em face de veto do

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    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 173

    item 13.01 da lista que previa a tributação desse serviço. Interpretação extensiva para enquadramento como atividade de cinematografi a, prevista no item 13.03. Impossibilidade. Atividades que, embora relacionadas, não correspondem à mesma obrigação de fazer.

    1. Recurso especial que discute a incidência do ISS sobre a atividade de produção de fi lmes realizados sob encomenda à luz da LC n. 116/2003. O acórdão recorrido, embora tenha afastado a incidência do tributo em face do item 13.01 (que previa expressamente tal atividade, mas foi vetado pela Presidência da República), manteve a tributação, mediante interpretação extensiva, com base no conceito de cinematografi a, atividade prevista no item 13.03.

    2. A partir da vigência da Lei Complementar n. 116/2003, em face de veto presidencial em relação ao item 13.01, não mais existe previsão legal que ampare a incidência do ISS sobre a atividade de produção, gravação e distribuição de fi lmes, seja destinada ao comércio em geral ou ao atendimento de encomenda específi ca de terceiro, até mesmo porque o item vetado não fazia tal distinção.

    3. Ademais, não é possível, para fi ns de tributação, enquadrar a atividade em questão em hipótese diversa, de cinematografi a, pois:

    i) “Existindo veto presidencial quanto à inclusão de serviço na Lista de Serviços Anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968, com redação da Lei Complementar n. 56/1987, é vedada a utilização da interpretação extensiva” (REsp n. 1.027.267-ES, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 29.4.2009);

    ii) Historicamente, a cinematografi a já estava contida na lista anexa ao DL n. 406/1968 (item 65) e nem por isso justifi cava a incidência do tributo sobre a gravação (produção) e distribuição de fi lmes, que estava amparada em hipótese autônoma (item 63);

    iii) a atividade de cinematografi a não equivale à produção de fi lmes. A produção cinematográfi ca é uma atividade mais ampla que compreende, entre outras, o planejamento do fi lme a ser produzido, a contratação de elenco, a locação de espaços para fi lmagem e, é claro, a própria cinematografi a.

    4. Afasta-se, portanto, a incidência do ISS sobre a atividade exercida pela empresa recorrente.

    5. Recurso especial provido.

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    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Arnaldo Esteves Lima (Presidente) e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Ausente, justifi cadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.Brasília (DF), 26 de junho de 2012 (data do julgamento).Ministro Benedito Gonçalves, Relator

    DJe 2.8.2012

    RELATÓRIO

    O Sr. Ministro Benedito Gonçalves: Trata-se de recurso especial interposto por Cápsula Cinematográfi ca Ltda., com fulcro no art. 105, inciso III, alíneas a e c, da Constituição da República, acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado (fl . 545):

    Apelação cível. Tributário. Ação declaratória c.c. repetição de indébito. Produção de fi lmes. Cinematografi a. ISS. Incidência.

    Se a produção de fi lmes, vinhentas, VTs e audiovisuais é feita sob encomenda para usuários determinados, o enquadramento se dá pelo item 13.03 da lista anexa à LC n. 116/2003, o que prevê expressamente a cinematografi a, e não pelo 13.01 (vetado). Possibilidade de interpretação extensiva aos subitens da lista anexa à LC n. 116/2003.

    Atividade de cinematografia que não se resume à mera reprodução de fi lmes, na medida em que engloba o conjunto de atividades relacionadas com a produção de fi lmes cinematográfi cos, com a indústria cinematográfi ca, com a criação de material documental, educacional ou de entretenimento, na forma de produtos de cunho semicomercial ou fundamentalmente comercial, enfi m, envolve todas as funções relacionadas ao audiovisual.

    Negado provimento.

    Rejeitados os aclaratórios (fl . 561).Nas razões do recurso especial (fls. 592-610), a empresa, além de

    divergência jurisprudencial, aponta violação dos arts. 535, II, do CPC; 9º, I, 108,

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    § 1º, e 110 do CTN. No mérito, alega, em resumo, que o item da lista anexa à LC n. 116/2003 relativo à produção de fi lmes (13.01) foi vetado e, por isso, essa atividade não poderia se tributada pelo ISS, nem por analogia à hipótese prevista no item 13.03, que trata de “Fotografi a e cinematografi a, inclusive revelação, ampliação, cópia, reprodução, trucagem e congêneres”.

    Contrarrazões às fl s. 629-638, pelas quais o Município de Porto Alegre defende que: a) a pretensão recursal esbarra no óbice da Súmula n. 7-STJ; b) o enquadramento da atividade da autora no item 13.03 da lista de serviços anexa à LC n. 116/2003 foi defi nido com base em prova pericial.

    Da decisão a quo que inadmitiu o apelo nobre, a empresa contribuinte interpôs agravo, ao qual dei provimento para determinar a sua autuação como recurso especial (fl . 716).

    É o relatório.

    VOTO

    O Sr. Ministro Benedito Gonçalves (Relator): Conforme relatado, discute-se neste recurso especial se a atividade de produção de fi lmes sob encomenda está sujeita à incidência do Imposto Sobre Serviços - (ISS), em conformidade com a Lista Anexa à Lei Complementar n. 116/2003.

    O Tribunal de origem entendeu que a atividade desenvolvida pela recorrente, à luz de uma interpretação extensiva, pode ser enquadrada no conceito de cinematografi a, previsto no item 13.03 da lista anexa. Confi ra-se (fl s. 548-551):

    Feitas tais considerações a adentrando no ponto nevrálgico da controvérsia, a atividade não se enquadra unicamente no item 13.01, como defende a autora. Obviamente se fosse o único item a embasar a incidência do imposto, a atividade da autora não estaria sujeito ao ISS, tendo em vista que tal previsão foi vetada.

    Ocorre que sua atividade não pode ser enquadrada unicamente no item 13.01, até porque o veto pela Presidência da República foi motivado pelo fato de que a produção cinematográfica em escala está sob o manto da incidência do ICMS, conforme entendimento do STF. Vale dizer, o item 13.01 abrange produção de fi lmes para o comércio.

    Já a produção de fi lmes levada a efeito pela contribuinte é feita sob encomenda para usuários determinados, o que afastaria seu enquadramento do item 13.01.

    A atividade da autora, atestada pela prova pericial (fl s. 423, quesito 01) é a produção de audiovisual, vinhetas, VTs, comerciais, vídeos e fi lmes para usuários específi cos.

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    De fato, não comportaria enquadramento no item 13, tampouco no subitem 17.06, com referiu a sentença. No primeiro porque não se admite identifi cação das atividades prestadas com os “gêneros” da lista anexa, mas sim dos subitens específi cos e, no segundo, porque o item abrange serviços de publicidade, o que é diferente da atividade realizada pela autora. Nesse ponto procede sua argumentação.

    Porém, razão não lhe assiste quando pretende afastar seu enquadramento no item 13.03. É que, a meu ver, considerando, como dito, que a autora atua na produção de audiovisual, vinhetas, VTs, comerciais, vídeos e fi lmes para usuários específi cos, o enquadramento ocorre pelo item 13.03 da lista anexa à LC n. 116/2003, na medida em que desenvolvida a atividade de cinematografi a.

    Ao contrário do que refere a autora, a cinematografi a não é mera exibição de fi lmes ou somente isso. Na verdade, o conceito abrange a atividade de cinema como um todo, inclusive a atividade por ela realizada.

    Cinematografi a é a atividade que engloba (Houaiss) “o conjunto de princípios, processos e técnicas utilizados para captar e projetar nula tela imagens estáticas sequenciais (fotogramas) obtidas com uma câmera especial, dando a impressão ao espectador de estarem em movimento (...). Realização de obras cujo suporte físico é o fi lme de cinema e cujo objeto é a expressão artística de subjetividade humana, ou a criação de material documental, educacional ou de entretenimento, na forma de produtos de cunho semicomercial ou fundamentalmente comercial. (...) Conjunto de atividades relacionadas com a produção de fi lmes cinematográfi cos; indústria cinematógráfi ca”.

    É “o processo de fi lmar e expor imagens” (Caldas Aulete), é o “conjunto de métodos e processos empregados pra registrar e projetar fotografi camente cenas animadas ou em movimento” (Aurélio).

    Em inglês, por exemplo, o vocábulo equivalente, cinematography, é defi nida como “The art or tecnique od movie photography, including both the shooting and development of the fi lm”, ou seja, a arte ou técnica de fi lmagem, incluíndo a captação e o desenvolvimento do fi lme.

    No artigo Princípios da Cinematografi a, de Filipe Salles, disponível na internet, no sítio http://www.mnemocine.art.br, consta: “O termo cinematografi a em de “cinematógrafo”, aparelho desenvolvido pelos irmãos Auguste e Luis Lumière na França, para projeção de imagens em movimento, e que coincidentemente ficou conhecido como cinema. O termo é usado nos EUA como sinônimo de ‘fotografi a para cinema’, uma vez que a cinematografi a subentende a captação de uma imagem cinematográfica, cuja técnica é de responsabilidade da equipe de fotografia. Entretanto, o termo aqui no Brasil tende a ser mais amplo, envolvendo todas as funções do cinema”.

    Logo, não há como alegar que a atividade desempenhada pela autora não se enquadra na cinematografi a, por ser este conceito a mera reprodução, como defende a autora. Ao contrário, cinematografia é muito mais abrangente de que mera reprodução de fi lmes, como visto alhures.

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    Ademais, como já referido, os subitens da lista anexa à LC n. 116/2003 são interpretados de forma extensiva, de maneira que a cinematografi a não pode ser restringida, como pretende a autora.

    De fato, a atividade, quando desenvolvida sob encomenda para usuários específi cos, como é o caso dos autos, conforme esclareceu a perícia, pode (e deve) ser enquadrada no item 13.03 e, via de conseqüência, está sujeita ao ISS.

    Assim, devido o imposto, improcede suas alegações, de maneira que a sentença merece manutenção na sua conclusão, prejudicadas as questões atinentes ao prazo de repetição e aplicação do art. 166 do CTN.

    Tendo em vista que os itens 13.01 e 13.03 da lista anexa à LC n. 116/2003 foram efetivamente interpretados pela Corte de origem, tenho por prequestionada a tese jurídica relativa à incidência do ISS sobre a atividade de produção de fi lmes sobre encomenda.

    Lado outro, o conhecimento do presente apelo nobre não encontra óbice na Súmula n. 7-STJ, uma vez que a atividade desenvolvida pela empresa, concernente à “produção de audiovisual, vinhetas, VTs, comerciais, vídeos e fi lmes para usuários específi cos”, foi, com base em prova pericial, precisamente delineada pelo acórdão recorrido, não sendo necessário a reexame desse fato para apreciar o mérito da pretensão recursal.

    Aliás, as razões de decidir do acórdão recorrido fundaram-se, basicamente, no conceito semântico de cinematografi a para fi ns de enquadramento, por extensão, da atividade exercida pela contribuinte para fi ns da incidência do ISS.

    Passo, doravante, a análise do mérito da insurgência.Na vigência do Decreto-Lei n. 406/1968, a atividade em comento estava

    disciplinada no item 63 da lista anexa, o qual dispunha sobre “gravação e distribuição de fi lmes e ‘video-tapes’”.

    Em torno da aplicação dessa hipótese normativa, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos RREE n. 179.560-SP, 194.705-SP e 196.856-SP, fi rmou o entendimento de que a atividade de gravação e distribuição de fi lmes destinadas ao comércio em geral está sujeita ao ICMS, remanescendo à tributação do ISS a gravação de fi lmes, aqui também entendida a produção, por encomenda.

    O entendimento da Suprema Corte foi devidamente prestigiado pelo Superior Tribunal Justiça, que restringiu a edição da Súmula n. 135-STJ (“O ICMS não incide na gravação e distribuição de fi lmes e videotapes.”) apenas à venda de fi ta de fi lmes produzidas sobre encomenda. A esse respeito: REsp

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    n. 1.019.453-RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 11.3.2008; AgRg no REsp n. 307.163-SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJ 14.8.2007; REsp n. 472.984-SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 30.6.2004.

    Com o advento da Lei Complementar n. 116/2003, essa atividade veio a ser disciplinada no item 13.01, nos seguintes termos: “Produção, gravação, edição, legendagem e distribuição de fi lmes, video-tapes, discos, fi tas cassete, compact disc, digital video disc e congêneres” (grifos adicionados).

    Esse item, entretanto, veio a ser vetado pela Presidência da República, notadamente em razão da jurisprudência do STF acima referida. Eis os motivos do veto:

    O item 13.01 da mesma Lista de serviços mencionada no item anterior coloca no campo da incidência do imposto gravação e distribuição de fi lmes. Ocorre que o STF, no julgamento dos RREE n. 179.560-SP, 194-705-SP e 196.856-SP, cujo relator foi o Ministro Ilmar Galvão, decidiu que é legítima a incidência do ICMS sobre a comercialização de fi lmes para videocassete, porquanto, nessa hipótese, a operação se quantifi ca como de circulação de mercadoria. Como consequência dessa decisão foram reformados acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que consideraram a operação de gravação de videotaipes sujeita tão-somente ao ISS. Deve-se esclarecer que, na espécie, tratava-se de empresas que se dedicam à comercialização de fi tas por elas próprias gravadas, com a fi nalidade de entrega ao comércio em geral, operação que se distingue da hipótese de prestação individualizada do serviço de gravação de fi lmes com o fornecimento de mercadorias, isto é, quando feita por solicitação de outrem ou por encomenda, prevalecendo, nesse caso a incidência do ISS.

    Assim, conclui-se que a partir da vigência da Lei Complementar n. 116/2003 não mais existe previsão legal que ampare a incidência do ISS sobre a atividade de produção, gravação e distribuição de fi lmes, seja destinada ao comércio em geral ou ao atendimento de encomenda específi ca de terceiro, até porque o item vetado, a despeito da motivação da Presidência da República, não fazia tal distinção.

    No caso concreto, tendo em vista que, conforme já assentado, a atividade principal da contribuinte é a de “produção de audiovisual, vinhetas, VTs, comerciais, vídeos e fi lmes para usuários específi cos”, tenho que ela não está sujeita à incidência do ISS.

    Nessa mesma linha de pensamento, tenho que não deve prevalecer a fundamentação do acórdão recorrido de que a atividade da contribuinte,

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    mediante interpretação extensiva, pode ser enquadrada no conceito de cinematografi a contido no item 13.03 da lista anexa.

    Primeiro porque, logicamente, não é possível aplicar interpretação extensiva para alcançar atividade específi ca que foi expressamente excluída da lista anexa em face de veto presidencial. A respeito, mostra-se pertinente o precedente indicado pela recorrente, assim ementado. Veja-se:

    Tributário. Processo Civil. ISS. Parque de diversões. Item vetado. Impossibilidade. Princípio da congruência. Questão surgida no julgamento da apelação. Não-oposição de embargos de declaração. Ausência de prequestionamento.

    1. Surgida a questão federal no julgamento do apelo, cumpre à parte interessada provocar o Tribunal local, por intermédio de embargos de declaração, para ver prequestionada a tese recursal. Precedentes.

    2. Existindo veto presidencial quanto à inclusão de serviço na Lista de Serviços Anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968, com redação da Lei Complementar n. 56/1987, é vedada a utilização da interpretação extensiva.

    3. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, provido (REsp n. 1.027.267-ES, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 29.4.2009).

    Segundo, historicamente, a cinematografi a já estava contida na lista anexa ao DL n. 406/1968 (item 65) e nem por isso justifi cava a incidência do tributo sobre a produção, gravação e distribuição de fi lmes, que, como visto, estava amparada no item 63.

    Terceiro, a atividade de cinematografi a não equivale à produção de fi lmes, mas, certamente, a mais importante de suas etapas.

    Com efeito, conforme o primeiro signifi cado estampado pelo Dicionário Houaiss da língua portuguesa, cinematografi a é “o conjunto de princípios, processos e técnicas utilizadas para captar e projetar numa tela imagens estáticas sequenciais (fotogramas) obtidas com uma câmera especial, dando a impressão ao espectador de estarem em movimento”.

    Já a produção cinematográfi ca é uma atividade mais ampla que compreende, entre outras, o planejamento do fi lme a ser produzido, a contratação de elenco, a locação de espaços para fi lmagem, e, é claro, a própria cinematografi a. É o que se depreende do conceito de produção de cinema contido na Enciclopédia Mirador Universal, in verbis:

    12.6.1. Produção: compreende todas as providências relativas à realização dos fi lmes, assumindo características particulares em cada centro industrial na

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    medida em que divergem as atribuições do produtor. Estas são bem mais amplas, por exemplo, no esquema norte-americano de Hollywood, onde a produção se inicia já na seleção dos argumentos a serem desenvolvidos em roteiros de fi lmes, onde a linha da produção é antecipadamente planejada.

    12.6.2. Na chamada produção independente é o diretor que, com freqüência, assume esses encargos iniciais. Ao procurar um fi nanciador e um administrador da produção, já tem idéias precisas a respeito do trabalho a ser feito. Eventualmente, pode, inclusive, apresentar o cálculo do orçamento aproximado, caso em que as atividades da produção só principiam com os trabalhos concretos de pesquisa sobre os locais de fi lmagem, a contratação de técnicos e demais providências iniciais de organização dos trabalhos propriamente ditos.

    12.6.3 Independentemente das peculiaridades de cada centro de produção, esta sempre comporta o levantamento das locações, a verifi cação das exigências de fi lmagem em estúdio, o plano de trabalho para as fi lmagens, a contratação do pessoal necessário à realização, a aquisição de material, enfim, todas as providências concernentes à viabilidade da filmagem; a seguir, a realização propriamente dita se consubstancia nas tomadas de cena e sua articulação pela montagem, a partir do roteiro, compreendendo os trabalhos de laboratório. Cabem, ainda, à produção as particularidades técnicas ao acabamento do produto a ser industrializado, bem como a preparação de cópias masters e também alguns recursos publicitários em torno da mercadoria que será oferecida ao público.

    O item 13.03 permite, ao meu ver, a cobrança do ISS sobre os valores que o cineasta aufere para atuar na produção de determinado fi lme. Não se confundem, portanto, as receitas obtidas pelo produtor e pelo diretor de fi lmes.

    Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, para afastar a incidência do ISS sobre a atividade exercida pela autora e determinar o retorno dos autos para que o Tribunal de origem aprecie as demais questões deduzidas na apelação, relativas à repetição do indébito.

    É como voto.

    RECURSO ESPECIAL N. 1.315.092-RJ (2011/0223435-9)

    Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia FilhoRelator para o acórdão: Ministro Teori Albino ZavasckiRecorrente: Fidelis Augusto Medeiros Rangel

  • Jurisprudência da PRIMEIRA TURMA

    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 181

    Advogado: Felipe Moreira dos Santos Ferreira e outro(s)Recorrido: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro

    EMENTA

    Processual Civil e Administrativo. Improbidade administrativa. Medida cautelar de indisponibilidade de bens. Previsão constitucional (art. 37, § 4º) periculum in mora presumido. Fumus boni iuris: indispensabilidade.

    1. A indisponibilidade de bens é medida que, por força do art. 37, § 4º da Constituição, decorre automaticamente do ato de improbidade. Daí o acertado entendimento do STJ no sentido de que, para a decretação de tal medida, nos termos do art. 7º da Lei n. 8.429/1992, dispensa-se a demonstração do risco de dano (periculum in mora), que é presumido pela norma, bastando ao demandante deixar evidenciada a relevância do direito (fumus boni iuris) relativamente à confi guração do ato de improbidade e à sua autoria (REsp n. 1.203.133-MT, 2ª T., Min. Castro Meira, DJe de 28.10.2010; REsp n. 1.135.548-PR, 2ª T., Min. Eliana Calmon, DJe de 22.6.2010; REsp n. 1.115.452-MA, 2ª T., Min. Herman Benjamin, DJe de 20.4.2010; MC n. 9.675-RS, 2ª T., Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 3.8.2011; EDcl no REsp n. 1.211.986-MT, 2ª T., Min. Herman Benjamin, DJe de 9.6.2011; e EDcl no REsp n. 1.205.119-MT, 2ª T., Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 8.2.2011; AgRg no REsp n. 1.256.287-MT, 2ª T, Min. Humberto Martins, DJe de 21.9.2011; e REsp n. 1.244.028-RS, 2ª T, Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 2.9.2011).

    2. No caso concreto, o acórdão recorrido afi rmou a presença do requisito de fumus boni iuris com base em elementos fáticos da causa, cujo reexame não se comporta no âmbito de devolutividade próprio do recurso especial (Súmula n. 7-STJ).

    3. Recurso especial desprovido, divergindo do relator.

    ACÓRDÃO

    Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo o

  • REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    182

    julgamento, por maioria, vencido o Sr. Ministro Relator, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto-vista do Sr. Ministro Teori Albino Zavascki. Votaram com o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki (voto-vista) os Srs. Ministros Francisco Falcão e Arnaldo Esteves Lima.

    Não participou do julgamento o Sr. Ministro Benedito Gonçalves (RISTJ, art. 162, § 2º, primeira parte).

    Brasília (DF), 5 de junho de 2012 (data do julgamento).Ministro Teori Albino Zavascki, Relator para o acórdão

    DJe 14.6.2012

    VOTO-VISTA

    O Sr. Ministro Teori Albino Zavascki: 1. Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que, em agravo de instrumento de decisão que determinou a indisponibilidade de bens do ora recorrente nos autos da ação civil pública, decidiu que deve ser mantida a medida de constrição, pois a decisão impugnada apresentou dados afi rmativos da confi guração de irregularidades em contrato de prestação de serviços de manutenção e limpeza dos banheiros das praias do centro da cidade. O aresto foi assim ementado:

    Direito Processual Civil. Ação civil pública. Improbidade administrativa. Decisão agravada que determina a indisponibilidade dos bens de agentes políticos do Município de Rio das Ostras. Inconformismo do agravante sob a alegação de ausência de comprovação de risco de dilapidação de seu patrimônio pessoal. Decisão mantida. Existência de relatório do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro no sentido de superfaturamento de serviços de limpeza do município, e, de parecer técnico no mesmo sentido. Incidência da Súmula n. 59 deste Tribunal de Justiça. Recurso conhecido. Provimento negado. (fl . 366)

    Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fl s. 380-383). Nas razões do recurso especial (fl s. 386-396), o recorrente aponta violação aos arts. 7º e 16 da Lei n. 8.429/1992, asseverando a impossibilidade de aplicação da medida de indisponibilidade de bens, pois não se encontram presentes os requisitos essenciais do fumus boni iuris e do periculum in mora hábeis a configurar a necessidade de decretação da constrição patrimonial. Aduz, ainda, que (I) “na decisão que decretou a indisponibilidade, corroborada pelo

  • Jurisprudência da PRIMEIRA TURMA

    RSTJ, a. 24, (228): 147-204, outubro/dezembro 2012 183

    acórdão recorrido, jamais foi sequer mencionada qual seria a circunstância pela qual o recorrente estaria dilapidando os seus bens, colocando em risco futura execução em seu desfavor” (fl . 3