ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

196
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE ARQUITETURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO YAN GRACO DANTAS CAFEZEIRO OS MUROS ANTIGOS E AS CONTRIBUIÇÕES DOS MÉTODOS DE DIAGNÓSTICO POUCO OU NÃO DESTRUTIVO PARA AVALIAÇÃO FÍSICA E MECÂNICA Salvador 2016

Upload: buinhi

Post on 21-Jan-2019

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE ARQUITETURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISM O

YAN GRACO DANTAS CAFEZEIRO

OS MUROS ANTIGOS E AS CONTRIBUIÇÕES DOS MÉTODOS DE DIAGNÓSTICO POUCO OU NÃO

DESTRUTIVO PARA AVALIAÇÃO FÍSICA E MECÂNICA

Salvador

2016

Page 2: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

YAN GRACO DANTAS CAFEZEIRO

OS MUROS ANTIGOS E AS CONTRIBUIÇÕES DOS MÉTODOS DE DIAGNÓSTICO POUCO OU NÃO

DESTRUTIVO PARA AVALIAÇÃO FÍSICA E MECÂNICA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo (PPG-AU) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Orientador: Prof. Dr. Mário Mendonça de Oliveira

Coorientadora: Prof. Dra. Rosana Muñoz

Salvador

2016

Page 3: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

C129 Cafezeiro, Yan Graco Dantas. Os muros antigos e as contribuições dos métodos de diagnóstico pouco ou não destrutivo para avaliação física e mecânica / Yan Graco Dantas Cafezeiro. 2016.

195 f. : il. Orientador: Prof. Dr. Mário Mendonça de Oliveira. Coorientadora: Profa. Dra. Rosana Muñoz. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Arquitetura, Salvador, 2016.

1. Arquitetura - Muros - Conservação e restauração. I. Oliveira, Mário Mendonça de. II. Muñoz, Rosana. III. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Arquitetura. IV. Título.

CDU: 72.025

Page 4: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br
Page 5: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

AGRADECIMENTOS

Primeiramente, à minha família, por me ter apoiado sempre nos meus caminhos profissionais, incluindo estes estudos de mestrado. E minha gratidão especial ao Prof. Mário Mendonça de Oliveira, meu orientador, e à Profa. Rosana Muñoz, por terem aberto as portas e me acolhido no Núcleo de Tecnologia da Preservação e da Restauração (NTPR) da Universidade Federal da Bahia, lugar onde pude desenvolver meus conhecimentos na apaixonante área da restauração. A todos os meus colegas do NTPR, em particular aos amigos e bolsistas de pesquisa, Francisco Oliveira e Lucas Ribeiro, pela ajuda com todos os aparatos com que precisei lidar; à amiga Ana Cristian Magalhães, pelos conselhos, e às amigas Karina Fadigas e Sílvia d'Affonsêca, que fizeram o possível para que eu pudesse realizar meus ensaios. Ao arquiteto Antônio Calazans e ao Engenheiro/Arquiteto Sérgio Batista, pelo apoio, colocando-se sempre à disposição e liberando suas obras para a execução dos ensaios propostos nesta dissertação. Aos amigos e colegas do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN-BA) e do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC), que sempre aprovaram, auxiliaram e me deram anuência para o desenvolvimento das atividades do mestrado acadêmico. À Profa. Tatiana Dumet, à Profa. Larissa Acatauassú, ao Prof. Arivaldo Amorim e à Profa. Cybèle Santiago, por terem aceitado participar da banca examinadora e pelas recomendações, sempre pertinentes, para o bom desenvolvimento do trabalho. À Solange Fonsêca, pelo excelente trabalho de revisão. Por fim, à minha companheira Milena, por tudo, por estar sempre junto e por ser muito tolerante, mesmo nos piores momentos.

Page 6: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

Il faut pouvoir être maçon avant de devenir architecte.

[É preciso poder ser pedreiro antes de se tornar arquiteto]

(Bernard Forest de Bélidor, 1729).

Page 7: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

CAFEZEIRO, Yan Graco Dantas. Os muros antigos e as contribuições dos métodos de diagnóstico pouco ou não destrutivo para avaliação física e mecânica. 194f. 2016. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2016.

RESUMO

A evolução da Ciência da Restauração de edifícios antigos conjuntamente com o desenvolvimento de técnicas de diagnóstico e avaliação de danos, no decurso do tempo, trouxeram progressos importantes para a determinação do comportamento físico e mecânico dos muros antigos, os quais apresentam certa complexidade devido à sua variada composição. O referido progresso diz respeito ao estudo dos modos de construir e às metodologias que não afetem, de maneira acentuada, a consistência física dos edifícios de valor patrimonial. Isso posto, o objetivo geral desta pesquisa foi compilar dados sobre a arte de murar, ao longo dos anos, bem como analisar e aplicar técnicas de diagnóstico pouco ou não destrutivas em duas alvenarias antigas, localizadas no Centro Histórico de Salvador. Este estudo teve o intuito de avaliar a aplicabilidade das referidas técnicas e o comportamento físico e mecânico de alvenarias antigas. Tais testes são focos das últimas pesquisas internacionais sobre o tema preservação do Patrimônio edificado, no contexto da tecnologia da restauração.

Palavras-chave: Tecnologia da restauração. Técnicas de diagnóstico. Restauração do Patrimônio. Muros antigos.

Page 8: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

CAFEZEIRO, Yan Graco Dantas. Ancient walls and the contributions of nondestructive testing to physical and mechanical assessment. 194f. 2016. Thesis (Master's degree in Architecture and Urban planning) – Federal University of Bahia, Salvador, 2016.

ABSTRACT

Alongside the development of diagnostic techniques and damage assessment, the evolution of ancient building Restoration Science has brought great progress to the determinants of physical and mechanical behavior of ancient walls, which are varied in composition and somewhat complex. Such progress is due to the study of ways of building and the use of methodologies that do not cause great harm to the physical consistency of buildings of heritage interest. Thus, the main purpose of this study is to gather data on the art of wall making, as well as apply Nondestructive Testing (NDT) to two ancient masonries in the Historic Center of Salvador. The intent of the testing is to evaluate the contribution of such methods to the physical and mechanical assessment of traditional walls.The aforementioned tests are the focus of recent international research on built heritage preservation, specifically concerning restoration technology.

Keywords: Restoration technology. Diagnostic techniques. Restoration of built Heritage. Ancient walls.

Page 9: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Esquema da metodologia de trabalho para a presente dissertação.. 25

Figura 2 – Seção de uma forma para construção de muros em taipa de pilão... 29

Figura 3 – Perspectiva da construção de uma parede de taipa de pilão............. 29

Figura 4 – Perspectiva de uma alvenaria mista................................................... 30

Figura 5 – Representação de uma vista de um muro de tijolos cozidos.............. 30

Figura 6 – Modos de edificar paredes segundo os romanos............................... 34

Figura 7 – Perspectiva da forma de murar romana, referência ao Opus

Implectum.............................................................................................................

37

Figura 8 – Forma de murar na região italiana de Piemonte, em vista................. 38

Figura 9 – Forma de murar em alguns pontos do Lazio na Itália, em vista......... 38

Figura 10 – Perspectiva de uma das formas de murar encontrada em Roma.... 39

Figura 11 – Perspectiva de uma das formas de murar encontrada em regiões

setentrionais italianas..........................................................................................

39

Figura 12 – Perspectiva da forma de murar napolitana....................................... 40

Figura 13 – Muro de Edifício à Rua do Maciel, Pelourinho, em Salvador............ 52

Figura 14 – Muro da Capela de Nossa Senhora do Vencimento, localizada no

Recôncavo baiano...............................................................................................

52

Figura 15 – Métodos de elevar paredes de tijolos (não estruturais).................... 57

Figura 16 – Métodos de elevar paredes estruturais de tijolos............................. 58

Figura 17 – Concepção estética das paredes de tijolos...................................... 59

Figura 18 – Modelo do comportamento estático de uma parede de alvenaria.... 85

Figura 19 – Muro da fachada posterior da Capela de Nossa Senhora do

Vencimento.........................................................................................................

89

Figura 20 – Base do muro da fachada posterior da Capela de Nossa Senhora

do Vencimento.....................................................................................................

89

Page 10: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

Figura 21 – Diagrama do fenômeno de esmagamento........................................ 90

Figura 22 – Fendilhamentos e rachaduras provenientes de movimentação

do terreno............................................................................................................

93

Figura 23 – Comportamento de lesões (em vermelho) por diversos tipos de

recalque ou rotação.............................................................................................

95

Figura 24 – Comportamento de lesões (em vermelho) por esforços

adicionais ou perda de coesão............................................................................

95

Figura 25 – Gráfico Tensão/Deformação de materiais elástico-lineares (a)

e elásticos (b).......................................................................................................

98

Figura 26 – Acelerômetro/Geófono disponível no NTPR-UFBA.......................... 107

Figura 27 – Martelo munido de transdutor de força............................................. 107

Figura 28 – Velocímetro disponível no NTPR-UFBA .......................................... 107

Figura 29 – Osciloscópio disponível no NTPR-UFBA.......................................... 107

Figura 30 – Ensaios sônicos por transmissão direta........................................... 108

Figura 31 – Ensaios sônicos por propagação de superfície................................ 108

Figura 32 – Relações para determinação da profundidade de fissuras,

brechas e rachaduras com a utilização do método Sônico..................................

108

Figura 33 – Exemplo de posicionamento dos pontos para execução de ensaios

sônicos..................................................................................................................

109

Figura 34 – Tipo de resultado obtido pelo ensaio sônico..................................... 109

Figura 35 – Ábaco para determinar a resistência à compressão......................... 110

Figura 36 – Ábaco para determinar o módulo de elasticidade............................. 110

Figura 37 – Termocâmera disponível no NTPR na Escola Politécnica(UFBA)... 112

Figura 38 – Imagem obtida através da termocâmera.......................................... 112

Figura 39 – Serra K600 Husqvarna, para corte de parede.................................. 114

Figura 40 – Unidade acionadora da serra de corte.............................................. 114

Figura 41 – Bases de medição desenvolvidas pelo NTPR.................................. 114

Page 11: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

Figura 42 – Bases de medição NOVATEST........................................................ 114

Figura 43 – Deformômetro elaborado pelo NTPR............................................... 115

Figura 44 – Deformômetro NOVATEST............................................................... 115

Figura 45 – Macacos planos retangulares........................................................... 115

Figura 46 – Bomba hidráulica.............................................................................. 115

Figura 47 – Seção mostrando as etapas para execução do ensaio com

macaco plano simples..........................................................................................

117

Figura 48 – Relação entre o corte da serra (circular) e o macaco plano

(retangular)...........................................................................................................

118

Figura 49 – Guia de posicionamento das bases de medição, para

deformômetro NOVATEST...................................................................................

119

Figura 50 – Fiadas de medição para o ensaio de macacos planos duplos.......... 120

Figura 51 – Diversos posicionamentos para as bases de medição...................... 120

Figura 52 – Exemplo de Gráfico esforço/deformação, obtido com o ensaio

de macacos planos ..............................................................................................

121

Figura 53 – Aparelho endoscópio......................................................................... 124

Figura 54 – Tipo de resultado obtido por meio da endoscopia (1)....................... 124

Figura 55 – Tipo de resultado obtido por meio da endoscopia (2)....................... 124

Figura 56 – Igreja do Santíssimo Sacramento da Rua do Passo......................... 126

Figura 57 – Antigo prédio da Companhia Circular de Carris da Bahia................. 126

Figura 58 – Montagem de fotos aéreas mostrando a localização da Igreja: 1 –

Salvador; 2 – Centro Histórico de Salvador; 3 – Bairro do Carmo/Passo............

127

Figura 59 – Plantas publicadas no Inventário de Proteção do Acervo

Cultural da Bahia (IPAC/SIC)...............................................................................

128

Figura 60 – Indicação de rachaduras na fachada nordeste da Igreja, foto

de 1951................................................................................................................

129

Page 12: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

Figura 61 – Indicação de rachaduras internas, em concordância com as

externas, foto de 1951.........................................................................................

129

Figura 62 – Grampeamento das rachaduras externas, foto de 1954.................. 129

Figura 63 – Grampeamento das rachaduras internas, foto de 1954................... 129

Figura 64 – Fissura interna individualizada após o desmonte do retábulo.......... 130

Figura 65 – Rachadura interna individualizada após o desmonte do retábulo.... 130

Figura 66 – Rachadura encontrada após prospecção de fundação.................... 130

Figura 67 – Rachadura da parede da Capela-Mor, no mesmo alinhamento

das patologias anteriores....................................................................................

130

Figura 68 – Posições dos principais danos encontrados na Igreja do Passo

(em vermelho)......................................................................................................

131

Figura 69 – Plantas baixas mostrando os resultados dos ensaios efetuados

com georradar no corredor lateral esquerdo........................................................

132

Figura 70 – Planta baixa com a localização dos ensaios.................................... 133

Figura 71 – Ensaio de transmissão direta em parede de alvenaria mista

– US5...................................................................................................................

134

Figura 72 – Ensaio de transmissão direta em parede de pedra – US4............... 134

Figura 73 – Ábaco de resistência à compressão das alvenarias de pedra

de arenito............................................................................................................

137

Figura 74 – Ábaco do módulo de elasticidade das alvenarias de pedra

de arenito.............................................................................................................

137

Figura 75 – Lesão analisada para E1, T1............................................................ 139

Figura 76 – Maior dimensão do dano em E1,T1.................................................. 139

Figura 77 – Resultado E1, demonstrando a pouca profundidade da lesão......... 140

Figura 78 – Resultado T1, não apresentando variação de temperatura............. 140

Figura 79 – Lesão analisada e sua maior dimensão, para E2, T2....................... 141

Figura 80 – Aplicação da técnica endoscópica na lesão, para E2, T2................ 141

Page 13: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

Figura 81 – Resultado E2, demonstrando a profundidade da lesão.................... 141

Figura 82 – Resultado T2, não apresentando variação de temperatura

da alvenaria..........................................................................................................

141

Figura 83 – Lesão analisada, e sua maior dimensão, para E3, T3...................... 142

Figura 84 – Aplicação da técnica endoscópica na lesão, para E3, T3................ 142

Figura 85 – Resultado E3, demonstrando a profundidade da lesão e

a irregularidade da constituição da argamassa...................................................

143

Figura 86 – Resultado T3, não apresentando variação de temperatura da

Alvenaria..............................................................................................................

143

Figura 87 – Lesão analisada e sua maior dimensão, para E4, T4....................... 144

Figura 88 – Aplicação da técnica endoscópica na lesão..................................... 144

Figura 89 – Resultado E4, demonstrando alto risco estrutural e existência

de conchas na argamassa (setas vermelhas).....................................................

144

Figura 90 – Resultado T4, apresentando variação de temperatura na lesão,

o que determina alta presença de umidade.........................................................

144

Figura 91 – Constituição material da parede lesionada. Alvenaria mista de

pedras e tijolos argamassados............................................................................

145

Figura 92 – Resultado T5 demonstra faixa de umidade causada,

provavelmente por tubulação escondida.............................................................

145

Figura 93 – Maior dimensão da lesão, para o ensaio T5..................................... 146

Figura 94 – Montagem de figuras mostrando a localização do prédio: 1

– Salvador; 2 – Centro Histórico de Salvador; 3 – Bairro da Sé com o prédio

da Companhia marcado em amarelo ..................................................................

148

Figura 95 – Antiga estribaria da Companhia Circular de Carris da Bahia........... 149

Figura 96 – Edifício eclético construído no mesmo local da antiga estribaria..... 149

Figura 97 – Planta do pavimento térreo do antigo prédio da Companhia

Circular de Carris da Bahia, mostrando planta irregular.....................................

149

Page 14: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

Figura 98 – Parede ensaiada na Escola Politécnica da UFBA............................ 150

Figura 99 – Revestimento retirado e guia de corte posicionada.......................... 151

Figura 100 – Pontos fixados na parede ensaiada................................................ 152

Figura 101 – Medição entre os pontos fixados na parede ensaiada................... 152

Figura 102 – Macaco plano inserido na parede ensaiada................................... 153

Figura 103 – Macaco plano conectado à bomba hidráulica e medição do

retorno ao estado inicial.......................................................................................

154

Figura 104 – Localização dos ensaios no antigo prédio da Companhia

Circular de carris da Bahia...................................................................................

157

Figura 105 – Parede proposta para aplicação dos ensaios de macacos

planos....................................................................................................................

157

Figura 106 – Modificação da geometria da parede com abertura de vão............ 157

Figura 107 – Execução de ensaios sônicos para avaliação mecânica

de pedras mais escuras........................................................................................

158

Figura 108 – Execução de ensaios sônicos para avaliação mecânica

de pedras mais claras...........................................................................................

158

Figura 109 – Resultados obtidos por meio do ábaco de resistência à

compressão das pedras........................................................................................

159

Figura 110 – Resultados obtidos por meio do ábaco do módulo

de elasticidade das pedras..................................................................................

159

Figura 111 – Definição da primeira horizontal de corte, marcado

em vermelho.........................................................................................................

161

Figura 112 – Marcação e colagem das bases de medição.................................. 161

Figura 113 – Medição da distância entre bases coladas ao muro........................ 161

Figura 114 – Corte da alvenaria com serra diamantada....................................... 163

Figura 115 – Macaco plano inserido na alvenaria................................................ 163

Figura 116 – Medição das distâncias das bases.................................................. 163

Page 15: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

Figura 117 – Gráfico das pressões obtidas para o retorno da alvenaria a

seu estado inicial, por base de medição...............................................................

163

Figura 118 – Realização do corte superior para inserção do macaco plano........ 164

Figura 119– Dois macacos planos conectados para a realização de ensaio

de compressão monoaxial....................................................................................

164

Figura 120 – Medição preliminar das bases localizadas na porção de

alvenaria entre os macacos planos......................................................................

164

Figura 121 – Fissuras na alvenaria, após aplicação dos macacos planos........... 164

Figura 122 – Gráfico tensão/deformação para B1 e equação da reta

tangente à curva..................................................................................................

166

Figura 123 – Gráfico tensão/deformação para B2 e equação da reta

tangente à curva...................................................................................................

166

Figura 124 – Área da parede ensaiada apresentando variação de

temperatura devido ao corte molhado da serra diamantada...............................

167

Figura 125 – Temperatura da parede em condições normais............................. 167

Page 16: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Resumo nosso mostrando as fórmulas de Rondelet,

interpretadas por Émile Barberot ...................................................................... 48

Quadro 2 – Quantidade de materiais necessários para a construção de uma

braça cúbica de alvenaria ................................................................................. 55

Quadro 3 – Classificação da capacidade mecânica das pedras, de acordo

com sua resistência ........................................................................................... 71

Quadro 4 – Resistência à compressão das argamassas após 90 dias

de produção ....................................................................................................... 80

Quadro 5 – Classificação dos danos em edificações......................................... 92

Quadro 6 – Valores de referência para compressão e elasticidade de

alvenarias .......................................................................................................... 99

Quadro 7 – Coeficientes de melhoramento........................................................ 100

Quadro 8 – Pesos e tensões de esmagamento para diversos tipos de

muros.................................................................................................................. 101

Quadro 9 – Classificação dos danos causados por ensaios destrutivos e

não destrutivos.................................................................................................... 104

Quadro 10 – Parâmetros responsáveis pelo comportamento térmico dos

materiais ............................................................................................................. 111

Quadro 11 – Resultados da aplicação de ensaios sônicos nas paredes da

Igreja do Passo .................................................................................................. 135

Quadro 12 – Valores obtidos com o ensaio com macacos planos simples ....... 163

Quadro 13 – Valores obtidos com o ensaio com macacos planos duplos ......... 165

Quadro 14 – Resultados da aplicação de ensaios com macacos planos

em Bragança ....................................................................................................... 170

Page 17: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

Quadro 15 – Resultados finais da aplicação de macacos planos no antigo

prédio da Companhia Circular de Carris ............................................................. 171

Quadro 16 –Resultados da aplicação dos macacos planos em diversos

tipos de alvenarias ............................................................................................... 171

Page 18: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas

ASTM American Society for Testing and Materials

CEN Comité Européen de Normalisation

IPAC Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia

IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

NBR Norma Brasileira

NTPR Núcleo de Tecnologia da Preservação e da Restauração

PPGAU Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo

RILEM Réunion Internationale des Laboratoires et Experts des Matériaux

UFBA Universidade Federal da Bahia

UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization

Page 19: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................. 21

1.1 JUSTIFICATIVA................................................................................. 21

1.2 OBJETIVOS....................................................................................... 24

1.3 METODOLOGIA................................................................................ 25

2 DA ARTE DE MURAR................................. ..................................... 27

2.1 DEFINIÇÕES GERAIS SOBRE OS MUROS.................................... 27

2.2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A ARTE DE MURAR SEGUNDO OS

ANTIGOS...........................................................................................

31

2.3 CONSIDERAÇÕES SOBRE A ARTE DE MURAR NA BAHIA E NO

BRASIL..............................................................................................

49

3 DAS CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E MECÂNICAS DOS

MUROS.............................................................................................

62

3.1 OS MATERIAIS................................................................................. 62

3.1.1 A pedra...................................... ....................................................... 62

3.1.1.1 Caracterização dos tipos de pedra utilizados na Bahia e no Brasil

colonial...............................................................................................

63

3.1.1.2 Propriedades físicas das pedras mais comuns, utilizadas nas

alvenarias antigas..............................................................................

65

3.1.1.2.1 Granitos............................................................................................. 65

3.1.1.2.2 Arenitos.............................................................................................. 67

3.1.1.2.3 Calcários dolomíticos......................................................................... 68

3.1.1.2.4 Lioz.................................................................................................... 70

3.1.1.3 Generalidades físicas e mecânicas a serem levadas em

consideração para a determinação das características das pedras..

71

3.1.2 Os tijolos................................... ....................................................... 73

3.1.2.1 Os adobes......................................................................................... 75

3.1.2.2 Tijolos ordinários e refratários........................................................... 75

3.1.2.3 Generalidades físicas e mecânicas a serem levadas em

consideração para a determinação das características dos tijolos...

76

3.1.3 As argamassas................................ ................................................ 78

Page 20: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

3.2 O COMPORTAMENTO ESTRUTURAL DOS MUROS ANTIGOS E

SUAS GRANDEZAS FÍSICAS...........................................................

81

3.2.1 Questões básicas: ações, momentos e estabilid ade de um

muro............................................... ...................................................

82

3.2.2 Patologias que afetam a estabilidade da estru tura...................... 86

3.2.2.1 Diminuição da seção do muro........................................................... 88

3.2.2.2 Esmagamento.................................................................................... 89

3.2.2.3 Movimentos de fundações e muros................................................... 91

3.2.3 Grandezas importantes e valores de referência ........................... 96

4 TÉCNICAS DE DIAGNÓSTICO.......................... .............................. 103

4.1 TIPOS DE ENSAIOS......................................................................... 103

4.2 METODOLOGIA DE REALIZAÇÃO DOS ENSAIOS........................ 106

4.2.1 Ensaios sônicos.............................. ................................................ 106

4.2.2 Termografia.................................. .................................................... 111

4.2.3 Ensaio com macacos planos.................... ...................................... 113

4.2.3.1 Normatização..................................................................................... 116

4.2.3.2 Medição do estado de tensão do muro (macacos planos simples)... 116

4.2.3.3 Medição das características de deformabilidade (macacos planos

duplos)...............................................................................................

119

4.2.3.4 Outras considerações com relação ao ensaio de macacos planos... 122

4.2.4 Endoscopia................................... ................................................... 123

5 PRÁTICA: O OBJETO E A APLICAÇÃO DOS ENSAIOS...... ......... 126

5.1 IGREJA DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO DA RUA DO PASSO... 127

5.1.1 Proposta de aplicação das técnicas na Igreja do Passo............. 133

5.1.2 Aplicação dos ensaios na Igreja do Passo..... .............................. 134

5.1.2.1 Ensaios sônicos................................................................................. 134

5.1.2.1.1 Discussão dos resultados para ensaios sônicos............................... 135

5.1.2.2 Ensaios de endoscopia e ensaios térmicos....................................... 137

5.1.2.2.1 Discussão dos resultados para ensaios com endoscópio e

Termografia.......................................................................................

146

Page 21: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

5.2 O ANTIGO PRÉDIO DA COMPANHIA CIRCULAR DE CARRIS DA

BAHIA................................................................................................

147

5.2.1 Testes preliminares com macacos planos....... ............................. 150

5.2.1.1 Procedimento preliminar ao teste...................................................... 151

5.2.1.2 Execução do ensaio com macaco simples........................................ 153

5.2.1.3 Problemas observados na execução do ensaios.............................. 155

5.2.1.5 Resultados......................................................................................... 155

5.2.2 Ensaios pouco destrutivos no antigo prédio da Companhia

Circular de Carris da Bahia........................ .....................................

156

5.2.2.1 Aplicação de inspeção visual e ensaios sônicos para definição

física do muro e avaliação física e mecânica dos componentes

singulares da alvenaria......................................................................

156

5.2.2.2 Aplicação dos macacos planos para definição das características

mecânicas da alvenaria.....................................................................

160

5.3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS EM CONCORDÂNCIA COM

PESQUISAS EUROPEIAS................................................................

167

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................. ................................. 173

REFERÊNCIAS................................................................................. 180

APÊNDICES...................................................................................... 186

APÊNDICE A..................................................................................... 186

APÊNDICE B..................................................................................... 191

ANEXO.............................................................................................. 194

Page 22: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

21

1 INTRODUÇÃO

1.1 JUSTIFICATIVA DA PESQUISA

É sabido que, antes de qualquer intervenção de conservação ou restauro do

patrimônio edificado, é fundamental avaliar o status quo da edificação a ser

recuperada, com a determinação geral dos comportamentos dos elementos

construtivos que compõem o monumento, para a definição dos melhores

procedimentos de reabilitação da construção. Com isso, faz-se necessária a

utilização de novos materiais, com comportamentos similares aos preexistentes,

para serem utilizados na ação de recuperação da obra em questão.

Com o intuito de obter esse diagnóstico, diversos tipos de técnicas destrutivas,

pouco destrutivas e não destrutivas, in situ ou em laboratório, são necessários para

obtenção de dados representativos da situação do edifício. Adquirir essas

informações torna-se um desafio complexo, no caso de alvenarias mistas,

caracterizadas por elevada heterogeneidade e, consequentemente, comportamentos

diferentes sob as mesmas ações. Nessas condições, os edifícios de valor histórico-

cultural exigem métodos de naturezas diferentes para seu diagnóstico, como relata

Cóias:

A caracterização de uma construção para avaliar seu actual estado e prever o seu comportamento é, mormente se ela for antiga, uma tarefa muito complexa, que requer engenheiros experientes e conhecedores desta área, dotados de modernas ferramentas de análise, e um conhecimento adequado das características relevantes do protótipo.1

Muitas vezes, as causas da degradação não estão associadas a um só motivo,

e diversos fatores podem gerar sintomas diferentes no prédio, o que proporciona,

em inúmeras ocasiões, interpretações errôneas dos danos. Portanto, o

reconhecimento e a análise correta dos problemas das edificações antigas

dependem diretamente da confiabilidade das técnicas de diagnóstico.

Sabe-se que os métodos destrutivos, para avaliação de uma estrutura, são

inerentemente limitados, uma vez que o número de corpos de prova retirados deve

1 CÓIAS, V. Inspecções e ensaios na reabilitação de edifícios. 2. ed. Lisboa: IST Press, 2006. p. 9.

Page 23: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

22

ser reduzido e de pequenas dimensões, para não gerar dano maior à parede já

afetada. Além disso, essas amostras podem sofrer avarias durante o processo de

remoção e transporte até o lugar onde serão avaliadas, resultando em dados

inconsistentes. Dessa forma, ensaios pouco destrutivos e não destrutivos têm sido

desenvolvidos, nos últimos anos, para avaliar o comportamento estrutural das

alvenarias. Segundo Buffarini e colaboradores2, entre essas técnicas, podem-se citar

as principais:

1 – georradar; 2 – métodos sônicos; 3 – termografia; 4 – fotogrametria; 5 – análise de dureza superficial; 6 – macacos planos; 7 – análise vibratória mediante uso de acelerômetros; 8 – endoscopia; 9 – controle da evolução do quadro fissurativo.

Entre esses ensaios, destaca-se o uso dos macacos planos (flat jacks), que

vem sendo difundido em toda a Europa, principalmente na Itália e em Portugal, e

que visa avaliar o estado físico e mecânico das alvenarias antigas, já que permite

definir, in situ, o estado de tensão local instalado em determinada parede, bem como

estimar o módulo de elasticidade, o coeficiente de Poisson3 e a capacidade

resistente à compressão.

Nas intervenções de consolidação e de restauro estrutural, é fundamental

conhecer as características mecânicas de deformação e resistência dos materiais

que constituem determinado muro. Dominar os referidos parâmetros antecipa, ao

projetista, uma prévia da resposta da alvenaria em função do estado de solicitação,

dando respaldo à pesquisa sobre a melhor forma de conter o eminente colapso do

2 BUFFARINI,S.; D’ARIA, V.; GIACCHETTI, R. Il consolidamento strutturale degli edifici in cemento armato e muratura. Roma: EPC LIBRI, 2010. 3 Relação entre a deformação transversal e longitudinal.

Page 24: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

23

sistema. Adicionalmente, permite o correto projeto dos elementos consolidantes,

evitando o superdimensionamento ou subdimensionamento das estruturas de

reforço.

Ao contrário dos métodos destrutivos, os ensaios não destrutivos são de

grande importância para a obtenção de resultados qualitativos no diagnóstico,

principalmente no que diz respeito à localização de umidade, falhas e dilatações no

muro. Entre esses métodos, podem-se destacar o ensaio sônico, a endoscopia e a

termografia. Os dois primeiros têm por objetivo avaliar as características físicas da

alvenaria, e o terceiro visa identificar alterações térmicas e umidade na estrutura.

É relevante frisar a importância deste tema para o desenvolvimento de um

diagnóstico pouco invasivo, em relação aos métodos atuais de análise, que seja

menos prejudicial ao patrimônio edificado de nosso país. Faz-se necessária a

aplicação de ensaios menos danosos, com relação àqueles laboratoriais, que

possam dar subsídios ao projetista de conservação e, ao mesmo tempo,

proporcionar a autenticidade material do monumento, em concordância com a

relativamente recente4 “Carta Patrimonial de Nara”, que, em seu artigo 12, diz:

Autenticidade, considerada desta forma e afirmada na Carta de Veneza, aparece como principal fator de atribuição de valores. O entendimento da autenticidade é papel fundamental dos estudos científicos do patrimônio cultural, nos planos de conservação e restauração, tanto quanto nos procedimentos de inscrição utilizados pela Convenção do Patrimônio Mundial e outros inventários de patrimônio cultural.5

Nesse âmbito, enquanto pesquisas europeias inclinam-se para a busca de

informações sobre o estado de conservação dos monumentos de forma mais

segura, com resultados mais fidedignos, o Brasil ainda precisa passar por um

processo de adequação à falta de recursos para se enquadrar no meio das

pesquisas não destrutivas.

Por fim, visto os argumentos supracitados, ressalta-se a relevância desta

pesquisa para a elaboração correta do diagnóstico, fundamentado em técnicas

científicas, para identificar a adequada solução para os edifícios de valor cultural,

minorando a degradação do patrimônio histórico.

4No ano de finalização desta dissertação, a Carta de Nara completará 22 anos. 5UNESCO, ICCROM, ICOMOS. Conferência de Nara. In: CURY, I. (Org.). Cartas Patrimoniais. Brasília: IPHAN, 2004. p.319-328.

Page 25: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

24

A aquisição de diversos equipamentos para o diagnóstico pouco invasivo pelo

Núcleo de Tecnologia da Preservação e da Restauração (NTPR), localizado na

Escola Politécnica e coordenado pelo Prof. Mário Mendonça, é um grande passo

para a evolução das pesquisas deste método de trabalho no Brasil. Nesta esfera,

essa atividade vem-se desenvolvendo com maior ênfase, no referido laboratório,

sendo de extrema importância para a tecnologia da restauração na América Latina.

1.2 OBJETIVOS

O objetivo geral desta pesquisa foi compilar dados sobre a arte de murar, ao

longo dos anos, bem como analisar e aplicar técnicas de diagnóstico pouco ou não

destrutivas em duas alvenarias antigas, localizadas no Centro Histórico de Salvador.

Este estudo teve o intuito de avaliar a aplicabilidade das referidas técnicas e o

comportamento físico e mecânico de alvenarias antigas.Os testes executados foram

os ensaios de macacos planos, os métodos sônicos, a endoscopia e a termografia.

Adicionalmente, foram feitas análises comparativas dos resultados das técnicas

aplicadas com outros estudos histórico-científicos já levados a cabo na história.

Especificamente, os objetivos foram os seguintes:

1 – realizar levantamento bibliográfico e estudo histórico-crítico sobre as

maneiras de murar, ao longo dos anos, no mundo, no Brasil e na Bahia;

2 – definir os materiais constituintes das alvenarias antigas, suas

características físicas e mecânicas e as relações entre as propriedades e

peculiaridades de cada componente das paredes tradicionais;

3 – pesquisar e entender os danos mais comuns concernentes às alvenarias

tradicionais;

4 – identificar e estudar as grandezas físicas e mecânicas que atuam nesses

sistemas estruturais;

5 – entender o emprego e o funcionamento dos equipamentos para o

diagnóstico pouco ou não destrutivo, relatando, a seguir, a metodologia de

aplicação dos aparelhos utilizados na realização dos ensaios e as normas

Page 26: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

25

internacionais que os regem. Adicionalmente, é fundamental o estudo da

relação dos referidos testes com ensaios complementares, não destrutivos;

6 – aplicar as técnicas estudadas, em especial, o teste com macacos planos,

visto sua característica semidestrutiva e seus resultados quantitativos sólidos,

com relação à mecânica de paredes tradicionais, como o valor de tensão,

resistência e módulo de elasticidade;

7 – interpretar os dados passados pelos ensaios para individualizar,

fisicamente, as características dos muros antigos.

1.3 METODOLOGIA

Baseado no objetivo principal e nos específicos supracitados, este trabalho é

desenvolvido em quatro capítulos, além das Considerações Finais. A metodologia de

pesquisa está esquematizada na Figura 1 a seguir.

Figura 1 – Esquema da metodologia de trabalho para a presente dissertação

Fonte: Elaboração do autor (maio 2015).

Inicialmente, procurou-se refletir como historicamente o muro era trabalhado,

desde os escritos de Vitrúvio6, na Antiguidade Clássica, passando pelos

6 Marco Vitrúvio Pollio (Século I a.C.) foi um arquiteto e escritor romano que serviu ao Imperador de Roma nos fins da República e primeiros anos do império latino, a ele dedicando seu tratado. Seu

Page 27: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

26

renascenstistas e pesquisadores franceses e portugueses dos séculos XVIII e XIX,

até a contemporaneidade, com as recomendações da Associação Brasileira de

Normas Técnicas (ABNT). Discutem-se, neste mesmo capítulo, os tipos gerais de

materiais e argamassas utilizados para construção no período colonial no Brasil

mais especificamente na Bahia. A análise dos tratados escritos no decurso da

história foi a base para o entendimento crítico sobre o tema.

No Capítulo 2, apresenta-se a mecânica dos principais elementos construtivos

utilizados para a edificação de muros antigos: as diversas pedras encontradas em

terras baianas e suas resistências; tijolos e elementos ligantes; e a relação desses

materiais ao serem associados para a construção das paredes resistentes.

Nesse mesmo capítulo, são expostas as grandezas atuantes em uma estrutura

antiga e analisada sua influência na mecânica dos muros de monumentos de

interesse cultural, além da identificação de quais parâmetros físicos devem ser

obtidos para o cálculo da consolidação estrutural de alvenarias, que já não se

encontram mais em total integridade.

No Capítulo 3, apresenta-se uma reflexão sobre os ensaios semi e não

destrutivos. Dá-se atenção prioritária ao teste com macacos planos, às normas que

devem ser utilizadas, aos aparelhos a serem empregados e como deve ser

executado o referido teste. Individualiza-se, também, o método de execução dos

ensaios sônicos, da termografia e da endoscopia.

No Capítulo 4, faz-se uma descrição das características físicas dos edifícios

que foram objetos dos testes, indicando os sistemas construtivos, danos e

justificativa da escolha desses exemplares. Apresenta-se, também, a realização dos

ensaios abordados nos capítulos anteriores, demonstrando, por fim, os resultados

do diagnóstico pouco ou não destrutivo. Neste mesmo capítulo, reflete-se sobre os

valores e imagens obtidos, por meio dos referidos ensaios, relacionando esses

parâmetros com as grandezas estudadas nos capítulos anteriores e com testes

efetuados em outras pesquisas europeias.

Finalmente, discute-se a confiabilidade das técnicas de avaliação semi e não

destrutivas utilizadas e seu papel para a consolidação e restauração dos

monumentos antigos.

texto De Architectura foi a base para praticamente todos os tratados de arquitetura que surgiram na história.

Page 28: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

27

2 DA ARTE DE MURAR

O conhecimento das características físicas e mecânicas de uma estrutura

antiga é um trabalho laborioso que, inicialmente, assim como o estudo do

monumento a ser restaurado, exige extensa pesquisa histórica da forma como foi

edificado e das vicissitudes por que passou. Sabe-se, no entanto, que a tecnologia

da construção evoluiu em torno de materiais clássicos da construção, como a terra,

a pedra, a cal, a madeira e, nos últimos séculos, o cimento Portland.

O estudo histórico desses materiais e de como eles foram trabalhados para dar

luz às diversas arquiteturas, durante o desenvolvimento das civilizações, é de

grande importância para o progresso da disciplina da tecnologia da restauração. O

arquiteto Paolo Marconi relata:

Studi di storia delle tecniche di costruzione e manutenzione premoderne ci stanno dando indicazioni utili sull'orientamento che dovrebbero seguire le ricerche analitiche, non solo chimico-fisiche, ma anche di scienza delle costruzione. [...] Così molti strutturisti militanti cominciano a coltivare un'ottica di intervento più partecipe della fisiologia dei monumenti, e meno distruttiva di quelle correnti.7

Nesse contexto, o conhecimento das diversas maneiras em que foram

estruturados os edifícios é o ponto inicial do estudo das técnicas de diagnóstico,

portanto, o presente capítulo tem por objetivo analisar a arte de murar ao longo da

história, na ótica de teóricos antigos e contemporâneos, assim como definir

conceitos importantes sobre esse sistema construtivo.

2.1 DEFINIÇÕES GERAIS SOBRE OS MUROS

É fato que diversas civilizações desenvolveram formas diferentes de edificar

suas casas e seus monumentos. Influenciada pelo ambiente onde se fixava, cada 7 “O estudo da história das técnicas de construção e manutenção pré-modernas estão nos dando indicações úteis sobre as orientações que devem seguir as pesquisas analíticas, não só químico-físicas, mas também de ciência da construção. [...] Assim, muitos estruturalistas militantes começam a cultivar uma ótica de intervenção mais participativa da fisiologia dos monumentos e menos destrutivas que as atuais” (MARCONI, P. Dal piccolo al grande restauro: colore, struttura, architettura. 4. ed. Venezia: Marsilio, 1988. p. 164. Tradução nossa).

Page 29: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

28

sociedade construía e adaptava-se, frequentemente, em concordância com os

materiais disponíveis em sua região.

Apesar do conhecimento histórico sobre as diferentes maneiras de erguer

monumentos ao longo dos tempos, é fato que, de todos os componentes de um

prédio tradicional, a alvenaria, talvez, seja o elemento mais representativo da arte de

edificar e, de certa forma, demonstra-se como denominador comum entre inúmeras

culturas construtivas. Essa similaridade é ainda mais evidente quando se

especificam as numerosas vantagens e aplicações da construção portante, sobre as

quais, certamente, os povos antigos e modernos8 possuíam conhecimento e o

aplicaram amplamente ao longo da história.

Os benefícios desse sistema construtivo são citados por Pereira9, quando

afirma que as alvenarias apresentam algumas vantagens como: "bom

comportamento ao fogo; bom comportamento térmico; bom isolamento acústico;

elevada durabilidade"10. Aliadas às grandes espessuras que possuíam os muros

antigos, essas características eram maximizadas. Adicionalmente, trata-se de um

sistema fácil de ser reproduzido e de simples aprendizagem pelos executores, não

requerendo mão de obra muito especializada.

Outrossim, com os muros portantes, foi possível simplificar o trabalho das

primeiras sociedades, na medida em que determinavam, ao mesmo tempo,

estruturas, tetos e divisórias11. As paredes resistentes contribuem, também, para o

aspecto econômico da obra, visto sua grande durabilidade, e para o aspecto estético

de sua composição, uma vez que podem ser trabalhadas em diversas formas.

Definem-se, então, para esta dissertação, os três principais grupos gerais, com

relação à forma de construção das paredes antigas ou novas, sendo eles:

1 – muros em monobloco; 8 Quando se fala, nesta dissertação, sobre os povos modernos, é importante não confundir com o período da dita arquitetura moderna, que tem seu auge no início do século XX. A Era Moderna em referência começa, historicamente, após a Queda de Constantinopla pelos turcos otomanos, em 1453, e termina com a Revolução Francesa nos fins do século XVIII. Em arquitetura, o início da Era Moderna pode ser chamado de período renascentista, que começa com a construção da cúpula da Basílica de Santa Maria Del Fiore por Filippo Brunelleschi, concluída em 1436. 9 PEREIRA, P. L. S. O comportamento da alvenaria de pedra ao esforço de corte: Relatório técnico. Guimarães, Portugal: Escola de Engenharia da Universidade do Minho, 2003. Disponível em: <www.yumpu.com/pt/document/view/34505199/comportamento-da-alvenaria-de-pedra-ao-esforço-de-corte>. Acesso em: 20 jan. 2014. 10 Id., ibid., p. 6. 11 MÜLLER, W.; VOGEL, G. Atlante di Architettura: dalle origini all’era cristiana. 4.ed. Tradução para o italiano de Enrico Gualini, Hellmut Riedger e Luca Trentini. Milano: Hoelpi, 2009. v.1.

Page 30: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

29

2 – muros de alvenaria

3 – muros construídos com técnicas mistas.

Dentro dos três conjuntos supracitados, podem-se, ainda, destacar duas

diferentes funções desses sistemas construtivos, tais quais:

1 – paredes que compartilham a função portante e de fechamento;

2 – paredes de fechamento, não portantes.

Os muros em monobloco são componentes da edificação que são erguidos por

meio de uma composição com apenas um elemento construtivo básico ou são

moldados e produzidos mediante a inserção de um tipo de material entre formas, as

quais são removidas (ou não), após aplicação da técnica. O supracitado sistema de

construção pode estruturar-se pelo seu peso próprio ou, por vezes, valer-se de

outros suportes para se manter em pé.

A edificação de paredes em monobloco foi amplamente utilizada pelas

civilizações antigas, ao longo dos séculos, sendo as construções em pedra, o

concreto e os monumentos erguidos em terra os principais representantes deste

grupo. Nesse contexto, destaca-se a técnica da taipa de pilão (Figuras 2 e 3),

sistema largamente utilizado no período colonial, sobretudo nas construções latino-

americanas.

Figura 2 – Seção de uma forma para construção de muros em taipa de pilão

Figura 3 – Perspectiva da construção de uma parede de taipa de pilão

Fonte: Leitão (1896, p.243). Fonte: Leitão (1896, p.243).

Page 31: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

30

Com a evolução das técnicas industriais e o surgimento do cimento Portland,

no primeiro quartel do século XIX, foi possível a criação e execução de divisórias de

concreto ou argamassa, ampliando a miríade de possibilidades de construção de

paredes em monobloco.

Já os muros em alvenaria constituem-se em composições de diversos

elementos construtivos, coesos entre si, formando um sistema homogêneo de

materiais, por vezes, heterogêneos. Na época colonial, eram executados com

pedras naturais, ou tijolos, ou mesmo uma composição destes dois elementos

construtivos. Esses materiais podem ser assentados com ou sem argamassa, em

fiadas regulares ou irregulares, que, conforme o sistema, vai-se estabelecendo e se

sobrepondo, tornam-se mais coesas, devido à atuação do peso próprio do muro.

Dentro dessa segunda categoria, é possível citar as alvenarias de pedra, alvenarias

mistas (Figura 4), as paredes de adobes, tijolos cozidos (Figura 5) ou os mais

recentes blocos perfurados.

Figura 4 – Perspectiva de uma alvenaria mista

Figura 5 – Representação de uma vista de um muro de tijolos cozidos

Fonte: Leitão (1896, p.234). Fonte: Leitão (1896, p.235).

O terceiro grupo diz respeito a muros construídos com técnicas mistas como o

Opus implectum, por exemplo, que se trata de sistema de alvenaria de blocos, em

sua face externa, com diversos tipos de enchimento, os quais podem ser, inclusive,

monoblocos.

Conhecer os três principais modos de edificar paredes é o primeiro passo para

o conhecimento da arte de murar ao longo da história. O método utilizado para

erguer os supracitados sistemas, no decurso do desenvolvimento das civilizações, e

o porquê do emprego dessa técnica de construção de paredes constam dos tratados

Page 32: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

31

de arquitetura e dos relatos deixados pelos antepassados que foram trabalhados a

seguir. Além disso, a própria experiência de análise visual ou laboratórial dos

vestígios arqueológicos é responsável por esse depoimento importante para a

ciência da restauração.

2.2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A ARTE DE MURAR SEGUNDO OS ANTIGOS

Os testemunhos da arte de murar no mundo antigo não são poucos. A divisão

dos ambientes com muros já é representada em planta pela civilização babilônica

desde, aproximadamente, dois mil anos antes de Cristo, enquanto os etruscos, um

milênio depois, utilizavam em larga escala suas espessas paredes para apoiar um

dos elementos construtivos mais importantes da história da arquitetura, o arco e os

sistemas abobadados.

L’arco serve a coprire senza sotegni intermediarie le opere dell’opera muraria. La sua logica costruttiva si lega a una grande forza espressiva, basata sul contrasto tra la chiusura del muro e l’apertura, e sulla chiarezza geometrica della forma a semicerchio. L’architettura ricorre in modo diffuso a murature massicce. Nell’evoluzione di un stile massiccio omogeneo, l’arco e la volta constituiscono gli elementi costruttivi fondamentali.12

Não obstante a importância e o legado da forma de edificar dos antigos

sumérios, babilônicos, egípícios, gregos, entre outros, para o estudo dos muros

antigos, na presente dissertação, faz-se necessária uma análise mais apurada do

desenvolvimento da engenharia romana, a qual teve fortes bases no modo de

construir etrusco e se expandiu como o seu império, deixando raízes profundas na

cultura construtiva ocidental. Como tal, esse modo de construir não poderia deixar

de influenciar a arquitetura portuguesa, a de suas colônias e, posteriormente, o

modo de edificar das ordens religiosas e dos engenheiros militares brasileiros. As

considerações referentes às técnicas de elevar paredes, segundo os antigos, leva a

12 “O arco tem a função de cobrir, sem sustentações intermediárias, as obras em alvenaria mural. A sua lógica construtiva diz respeito à grande força expressiva, baseada no contraste entre as aberturas e os fechamentos dos muros com a clareza geométrica do semicírculo. A arquitetura recorre de modo difuso aos muros maciços. Na evolução de um estilo maciço homogêneo, o arco e a abóboda constituem-se como elementos construtivos fundamentais” (MÜLLER, W.; VOGEL, G. Atlante di Architettura ..., op. cit., p.195. Tradução nossa).

Page 33: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

32

entender os monumentos que serviram de base para o estudo dos métodos

aplicados ao diagnóstico não destrutivo.

Os arquitetos latinos são responsáveis pela evolução acentuada das técnicas

construtivas, através do uso da cal adicionada de material pozolânico13, e,

consequentemente, do desenvolvimento do concreto antigo14. Além disso, os

construtores do Império Romano elevaram a estreita conexão da técnica e da

estética a um nível muito superior aos seus predecessores. Auguste Choisy, em seu

livro L’art de bâtir chez le romains15, publicado em 1873, revela que “le romans

surent apercevoir toutes les resources qu’un moyen d’execution aussi simple pouvait

offrir à l’art”16 e que “jamais, avant l’epoque romaine, on n’avait songé a fonder sur

l’emploi de pareil éléments un systéme de construction monumental”17, criando

assim nova linguagem arquitetônica, que deixou importante legado para a sociedade

ocidental, através dos inúmeros tratados de arquitetura que foram publicados ao

longo da história. O estudo dos textos desses teóricos latinos nos dão respostas até

hoje, que vão desde a concepção do partido arquitetônico até ao comportamento

dos elementos construtivos e dos sistemas estruturais.

Sabe-se que o único ensaio literário de arquitetura da Antiguidade que

sobreviveu até os tempos atuais, é o trabalho De Architectura, de Marco Vitrúvio

Pollio, que serviu de ponto de partida para todos os outros estudos tratadísticos da

arte-mãe surgidos a partir de então. A composição desenvolve-se em dez livros e

revela-se como um manual de construção, sendo a arquitetura elevada ao nível de

ciência multidisciplinar, a qual se apoia em diversas áreas do conhecimento para a

concretização de seu objetivo.

A ciência do arquiteto é ornada de muitas disciplinas e de vários saberes, estando a sua dinâmica presente em todas as obras

13 “Material de origem vulcânica, sua primeira reserva foi encontrada em Pozzuoli, região próxima a Napoli, na Itália. A pozzolana confere hidraulicidade às argamassas [...] esta propriedade propicia sua utilização em locais úmidos ou alagadiços. Por isso, era recomendada pelo mestre romano, e por outros que lhe sucederam, na construção de portos. [...] O material apresenta elevada porosidade, o que favorece a reação entre a pozolana e a cal extinta, com a formação de compostos hidráulicos”(SANTIAGO, C. C. Argamassas tradicionais de cal. Salvador: EDUFBA, 2007, p. 143). 14Tambem chamado de Opus caementicium 15 A arte de construir segundo os romanos (Tradução nossa). 16 “os romanos souberam perceber todos os recursos que um meio de execução tão simples podia oferecer à arte” (CHOISY, A. L’art de bâtir chez les romains. Cópia em fac-símile. Bologna: Forni Editore, 1873. p.12. Tradução nossa). 17 “nunca, antes da época romana, tinham pensado em utilizar tais elementos em um sistema de construção monumental” (Id., ibid., p. 12. Tradução nossa).

Page 34: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

33

oriundas das restantes artes. Nasce da prática e da teoria. A prática consiste na preparação contínua e exercitada da experiência, a qual consegue manualmente a partir da matéria, qualquer que seja a obra de estilo cuja execução se pretende. Por sua vez, a teoria é aquilo que podemos demonstrar explicar as coisas trabalhadas proporcionalmente ao engenho e à racionalidade.18

Em meio a ensinamentos sobre Geometria, Matemática, Anatomia, Medicina,

Ótica, Acústica, Leis, Teologia, Astronomia e Meteorologia, Vitrúvio dedica o

segundo livro do ensaio à descrição dos materiais de construção, dos muros e das

técnicas construtivas. Entre relatos sobre as características, espécies e defeitos de

tijolos, areias, cal, pozolanas e pedras, o arquiteto latino descreve as tipologias

construtivas desenvolvidas pelos romanos. Nesse contexto, revela dois modelos

principais para a construção dos muros na antiguidade latina: o modelo reticulado19

e o modo incerto20, o qual é descrito como “antigo”21 e deselegante, porém mais

seguro.

Sabe-se, no entanto, que tanto a forma reticulada, maneira de construir

paredes por meio de blocos piramidais, quanto a construção em pedras irregulares

e, também, o modo de erguer paredes no Império Romano, em geral, seguiam certa

lógica de construção das alvenarias. Este padrão, chamado de Opus implectum,

amplamente utilizado, constituía-se na preparação de dois paramentos externos das

mais diversas maneiras, que serviam como fôrmas para o enchimento em Opus

caementicium.

A partir desses moldes, é possível citar diversos exemplos de tratamento da

camada externa das paredes, como o Opus quadratum, feito com tijolos em

conformação de paralelepípedo; o Opus mixtum, mistura de pedras irregulares e

tijolos variados, tratando-se da união das tipologias Opus reticulatum e Opus

incertum; Opus testaceum; Opus vitattum; Opus craticium, que se utiliza de

estruturas de madeira para a edificação de paredes; Opus siliceum, tratando-se de

alvenaria de pedras irregulares, sobrepostas sem a utlização de um elemento

ligante; Opus africanum; Opus spicatum; Opus tessellatum; Opus scutulatum, entre

18 POLLIO, V. Tratado de Arquitetura. Tradução, introdução e notas de M. Justino Maciel. São Paulo: Martins, 2007. p.61. 19Opus reticulatum. 20Opus incertum ou Opus antiquum. 21 POLLIO, V. Tratado de Arquitetura, op. cit., p.136.

Page 35: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

34

outras formas de edificar (Figura 6), que proporcionaram, aos arquitetos da época e

da era moderna, uma gama de soluções construtivas.

Figura 6 – Modos de edificar paredes segundo os romanos

Fonte: Elaboração do autor, a partir de Koch (2009, p. 99; 100)22.

Vitrúvio, em seu segundo livro, capítulo oito, também faz referência ao modo de

edificar os muros de acordo com os antigos gregos. Segundo o tratadista, os povos

do mar Egeu e entorno construíam de forma diferente dos romanos: “ordenando as

pedras horizontalmente e dispondo-as de modo alternado em comprimento e

espessura, não fazem enchimentos interiores”23.

No entanto, a influência de Vitrúvio na Antiguidade foi muito limitada. Crê-se

que o interesse no trabalho do arquiteto romano começa a crescer somente em

período pré-carolíngio, o qual é uma provável referência na obra Etymologiae, de

São Isidoro de Sevilha24. Outros manuscritos, como o do Abade Suger25 para a

reconstrução da Igreja de Saint-Denis e os escritos de Villard de Honnecourt26,

22 KOCH, W. Dicionário dos estilos arquitetônicos. Tradução de Neide Luzia de Rezende. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009. 23 POLLIO, V Tratado de Arquitetura, op. cit., p.139. 24 Isidoro de Sevilha (560 d.C. – 636 d.C.). Cartaginês, Teólogo e Arcebispo de Sevilha. Escreveu um compêndio de vinte livros sobre os saberes da Antiguidade clássica, o qual chamou de Etymologiae. Foi canonizado em 1598 pela Igreja Católica. 25 Suger, Abade de Saint-Denis (1081 d.C. – 1151 d.C.). Realizou diversas obras na famosa Basílica de Saint-Denis, entre as quais se destacam a reconstrução da fachada principal e as torres sineiras. Seus escritos sobre o monumento e as intervenções na edificação são uns dos poucos documentos de arquitetura que tiveram luz na Idade Média. 26 Villard de Honnecourt (viveu em torno de 1230 d.C.). Seu famoso Carnet trata das construções de igrejas góticas do século XIII, embora dê mais ênfases às técnicas construtivas da época. Nessa obra, podem se encontrar os desenhos da Catedral de Reims assim como de vários motivos decorativos. Seu famoso tratado é conservado, atualmente, na Biblioteca Nacional da França.

Page 36: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

35

apresentam claras alusões aos textos do tratadista romano. No entanto, as ideias de

Vitrúvio seriam concretamente retomadas com o humanismo do século XV, mais

precisamente, e pioneiramente, pela figura de Leon Battista Alberti27 através do

escrito De Re Aedificatoria28.

O tratado escrito por Alberti, em meados do Quattrocento italiano, deu a base

vitruviana aos teóricos da arquitetura que, ao longo dos anos, vieram a escrever

sobre a arte de construir. Nos dez livros, o escritor florentino29 disserta sobre os

materiais e os métodos construtivos nos tomos de número dois e três, sendo este

último intitulado Delle Opere30. Ao mesmo tempo, revela-se pioneiro ao falar sobre

restauração de monumentos no livro dez, o qual apresenta a premissa: “De diffeti

degli edificii, onde naschino, quali sieno quelli, che si possono corregere, e quai no,

dagli architettori, e quai cose sien quelle, che faccino cattiva ária”31.

Os escritos de Leon Battista Alberti são, sem dúvida, um marco para a história

da teoria da arquitetura e, provavelmente, é o ponto inicial para um dos mais

importantes escritores de arquitetura dos tempos modernos: Andrea Palladio da

Vicenza.

Nos fins do século XVI, na região do Veneto, Itália, os nobres mercadores

marítimos venezianos encontravam a primeira grande crise do comércio da “Perla

dell’Adriático”32, com o desenvolvimento das grandes navegações e, por

consequência, a diminuição do comércio nas rotas para o Oriente, que passavam

pela famosa cidade italiana. Nesse contexto, os ricos negociantes viam, na

agricultura do norte da península, a salvação da pobreza e a manutenção da riqueza

obtida ao longo dos anos no Mar Adriático. Esse cenário e a necessidade de

27 Leon Battista Alberti (1404 d.C. – 1472 d.C.), um dos pioneiros do Humanismo e Renascimento na Itália, escreveu diversos tratados importantes para a arte, entre eles: Della Famiglia, Della Pittura, Della Statua e De Re Aedificatoria. 28 “Da arte de construir” (Tradução nossa). 29 Giorgio Vasari, em sua obra famosa obra Le Vite dei più eccellenti pittori, scultori e architetti, faz referência a Alberti como Architetto Fiorentino, no entanto, outras fontes indicam que o notável teórico nasceu em Gênova, filho de exilados políticos de Florença. 30 Das obras (Tradução nossa). Alberti escreveu De Re Aedificatoria em língua latina, no entanto usamos, nesta dissertação, a tradução de Cosimo Bartoli de 1782, a seguir indicada. 31 “Dos defeitos dos edifícios, de onde nascem e quais são aqueles que são possíveis, ou não, de serem corrigidos pelos arquitetos, e quais fatores fazem mal ao ambiente” (ALBERTI, L. B. Della Architettura – Della Pittura e Della Statua. Cópia em fac-símile. Tradução de Cosimo Bartoli e comentários de Alessandro Pierattini. Roma: Dedalo, 2009. p.247. Tradução nossa). 32 “A Pérola do Adriático” é um dos apelidos da cidade de Veneza, referência ao mar que banha a famosa urbe.

Page 37: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

36

construir villas33 em zonas rurais fazem surgir um importante nome do classicismo

renascentista, Andrea Palladio.

O tratadista dedicou sua vida a cadastrar os monumentos romanos e a

construir casas para os ricos mercadores, que se mudavam da costa marítima para

cidades do interior do Veneto, em especial, Vicenza. No fim da vida, o arquiteto fixa

residência em Veneza e se dedica à arquitetura religiosa.

Um dos maiores legados que Andrea Palladio deixou para a sociedade

ocidental é o seu tratado de arquitetura I Quattro Libri Dell’Architettura34. A referida

obra é profundamente baseada nos livros de Serlio35 e Vignola36, que tinham como

ênfase a representação da prática do construir, com o apoio de xilogravuras e uma

linguagem de fácil compreensão pelos operários, algo que não acontecia, por

exemplo, no De Re aedificatoria, de Leon Battista Alberti.

A facilidade de interpretação do livro de Palladio ocasionou a difusão do modo

de construir romano, em larga escala, sendo a base para muitos tratados posteriores

e o nascimento do palladianismo, corrente muito difundida na Inglaterra, Estados

Unidos37 e Brasil. A importância dos quatro livros é relatada pelo teórico James

Ackerman:

Sparse per tutto Il mondo occidentale vi sono centinaia di migliaia di abitazioni, di edifici pubblici e di chiese dalla facciata simmetrica, con semicolonne sormontate da un frontone, che derivano dai progetti di Andrea Palladio. Fra tutti gli architetti egli è stato Il piu largamente imitato, ed è probabile che, da solo, abbia influito sullo svolgimento dell’architettura inglese e americana piú di tutti gli altri maestri rinascimentali messi insieme.38

33 Palavra italiana para definir casas de campo. 34 Os Quatro Livros da Arquitetura (tradução nossa). Lançados em Veneza, no ano de 1570 d.C. 35Sebastiano Serlio (1475 d.C. – 1574 d.C.). Arquiteto e teórico bolonhês. Seu tratado I Sette Libri dell’Architettura é um dos primeiros tratados a seguir uma linha de manual, sendo uma publicação mais prática que teórica. 36Jacopo Barozzi da Vignola (1507 d.C. – 1573 d.C.). Arquiteto e tratadista italiano, foi um dos maiores representantes da arquitetura jesuítica em Roma. Seu tratado Regola delli cinque ordini d'architettura foi publicado em 1562. 37 Principalmente pelos nomes do Lorde de Burlington (1694 d.C. – 1753 d.C.), no Reino Unido, e Thomas Jefferson (1743 d.C. – 1826 d.C.), na América. 38 “Esparsas por todo o mundo ocidental, existem centenas de milhares de habitações, de edifícios públicos e de igrejas com fachadas simétricas, com semicolunas coroadas por um frontão, que derivam dos projetos de Andrea Palladio. Entre todos os arquitetos, ele foi o mais largamente imitado, e é provável que, sozinho, tenha influenciado no desenvolvimento da arquitetura inglesa e americana mais que todos os outros mestres do Renascimento juntos” (ACKERMAN, J. Palladio. Tradução de G. Scattone. Torino: Einaudi, 1972. p. 3. Tradução nossa).

Page 38: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

37

As imagens incluídas nos livros são de fundamental importância para a

caracterização de forma detalhada, pelo tratadista, de como deveriam ser edificadas

as paredes ao modo dos antigos.

Em seu famoso ensaio, o arquiteto descreve, no primeiro tomo, Capítulo IX, o

qual é intitulado “Delle Maniere De’ Muri”39, os mais diversos tipos de alvenarias,

começando pelo Opus reticulatum, já descrito por Vitrúvio e não mais utilizado no

tempo renascentista, e outras seis maneiras de murar que são utilizadas no período

maneirista. Palladio não dá nomes aos modos de construir, no entanto são bem

expostos e representados pelo arquiteto de acordo com a região em que se

encontram.

O segundo exemplo, além da forma reticulada, demonstra como uma alvenaria

feita de dois paramentos de tijolos (interno e externo) em fiadas regulares,

horizontais e desencontradas, com enchimento de concreto romano (composição de

cal, areia, pedregulhos e/ou entulhos).

Tal estrutura é, de acordo com Palladio, encontrada nas termas de

Diocleciano40 em Roma, provavel referência do Opus implectum (Figura 7).

Figura 7 – Perspectiva da forma de murar romana, referência ao Opus implectum

Fonte: Elaboração do autor a partir de Palladio (2009, p.12).

No terceiro exemplo (Figura 8), revelam-se cunhais de pedra, ou tijolos,

flanqueando uma estrutura híbrida de cimento, ou seixos encontrados nos rios, com

fiadas de blocos a cada dois pés41. Esse modo, segundo o tratadista, é encontrado

na área do Piemonte, no norte da Itália.

39 “Da maneira dos muros” (Tradução nossa). 40 Gaio Aurelio Varelio Dioclesiano (244 d.C. – 311 d.C.), Imperador Romano de 284 d.C. a 305 d.C., foi conhecido pelo constante ataque e perseguição aos cristãos. 41 É importante ressaltar que cada região da Itália, e do mundo, possuía seu próprio sistema de medidas. Na Bahia, era utilizado o palmo português, 22 cm, e o pé português, de 33 cm. Já Andrea

E - Camada de tijolos que ligam os dois lados do muro F - Enchimento em cimento romano

Page 39: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

38

Figura 8 – Forma de murar na região italiana de Piemonte, em vista

Fonte: Elaboração do autor a partir de Palladio (2009, p.12).

O quarto exemplo diz respeito a uma estrutura de pedras irregulares

empilhadas sem critério, sem juntas argamassadas, que são flanqueadas por

cunhais em pedra regulares, em formato retangular. Segundo o arquiteto, era

possível ser encontrado esse modo na região do Lazio, no centro da Itália, mais

especificamente em Palestrina (Figura 9).

Figura 9 – Forma de murar em alguns pontos do Lazio na Itália, em vista

Fonte: Elaboração do autor a partir de Palladio (2009, p.12).

Outro modelo relatado por Palladio é o de composição de fiadas alternadas de

pedras grandes e pequenas, recortadas em forma retangular. Trata-se de forma

semelhante às utilizadas para assentamento de blocos cerâmicos maciços, mas

grandes litos. Os escritos do tratado afirmam que era possível ser encontrado esse

modo no Templo de Augusto, no Foro Romano, em Roma (Figura 10).

Palladio, habitante de Vicenza, utilizava os pés vicentinos como unidade de medida para seu tratado, que é calculado em 35,2 cm, no sistema métrico. Em muitos pontos da península itálica, utilizava-se o pé romano, com 29 cm.

I - Pedras assentadas de maneira empírica

G - Seixos de rios ou cimento romano H - Camada de tijolos ligando os dois lados do muro

Page 40: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

39

Figura 10 – Perspectiva de uma das formas de murar encontrada em Roma

Fonte: Elaboração do autor a partir de Palladio (2009, p.13).

O arquiteto relatava, também, um exemplo em que a estrutura de madeira se

assemelhava muito às fôrmas dos muros de taipa de pilão, construídos em larga

escala no Brasil Colonial. No entanto, o material utilizado para o preenchimento não

era terra e, sim, uma composição mista de argamassa e pedras de diversos tipos.

Neste sentido, trata-se de um modo mais próximo ao concreto.

Essa forma de construir era encontrada, segundo o tratadista, no norte da

Itália, mais especificamente no Lago di Garda (Figura 11).

Figura 11 – Perspectiva da forma de murar encontrada em regiões setentrionais italianas

Fonte: Elaboração do autor a partir de Palladio (2009, p.13).

Por último, é demonstrada, nos Quattro Libri, uma maneira mais refinada da

arte de murar, a qual é possível ser encontrada em Nápoles. Refere-se a

paramentos paralelos com fiadas de pedras grandes e pequenas em formato

retangular que se contraventam com paredes transversais.

K - Camada de pedras assentadas com a face menor voltada para o lado externo L - Camada de pedras assentadas com a face maior voltada para o lado externo

M - Tábuas de madeira N - Parte de dentro do muro, enchido com cimento O - Face da superfície do muro, após retirada das tábuas de madeira

O

N

M

Page 41: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

40

O espaço vazio entre essas paredes que ligam as camadas externas são

preenchidos com seixos e terra (Figura 12). Trata-se de outra referência ao Opus

implectum vitruviano.

Figura 12 – Perspectiva da forma de murar napolitana

Fonte: Elaboração do autor a partir de Palladio (2009, p.13).

Finalizando o Capítulo IX, Andrea Palladio relata:

Queste insomma sono le maniere, delle quali si servirono gli Antichi, e hora si veggono i vestigi: dalle quali si comprende che nei muri di qualunque sorte si siano, debbono farsi alcuni corsi, i quali siano come nervi, che tengano insieme legati l’altre parti, Il che massimamente si osserverà quando si faranno i muri di pietre cotte; accioche per la vecchiezza venendo a calare in parte la struttura di mezzo; non diventino i muri ruinosi [...].42

Em Portugal, apenas um século após a publicação do tratado do autor

vicentino, outros nomes importantes descreveram a arte de murar, como Luís Serrão

Pimentel em seu Método lusitânico de desenhar as fortificações das praças

regulares e irregulares. Trata-se de ensaio que traz a questão da representação

gráfica, das proporções, das medições orçamentárias e do projeto à frente do tema

da execução. Nesse tratado, o engenheiro relata, com apoio de outras bibliografias,

42 “Essas são, em resumo, as maneiras das quais se serviram os antigos e que, agora, é possível ver os vestígios. Destes, compreende-se que nos muros, de qualquer tipo, devem-se fazer algumas juntas, que são como nervuras que mantinham unidas todas as partes, o que se observará quando se farão muros de tijolos; para que mesmo com a queda das estruturas internas, não se tornem muros arruinados” (PALLADIO, A. I quattro libri dell’architettura. [Cópia em fac-simile] 2.ed. Milano: Hoepli, 2009.p.13-14.Tradução nossa).

P - Paramento externo assentado em pedra Q - Muro de pedra assentado na transversal R - Espaço enchido com pedras e terra

Page 42: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

41

de nomes como Antoine de Ville43, a espessura das muralhas de uma fortificação e a

relação desta espessura com a altura.

Nesse contexto, Pimentel revela:

Daremos pois sempre por regra geral onde a cal for boa, e os mais materiaes de pedra, e saibro, ou area, quatro pés de grosso a muralha no alto della, suba muito ou pouco, e a escarpa conforme a altura a que houver de subir, e para saber em que grossura ha de começar na base desde o fundo do fosso, se ajunte a da base da escarpa com a grossura dos 4 pés da muralha, e a somma será a em que ha de começar a parede escarpada.44

Logo após, exemplifica: "em uma muralha com 24 pés de altura45, é necessário

dividir esse valor por cinco, resultando em um valor de 4+4/5 que, somado com os

quatro pés, no alto da parede, como dito na citação anterior, resulta em 8+4/5, que

será o valor na base do fosso"46. O tratadista, depois, descreve como se deve

desenhar a parede de uma fortificação: "Seja pois a regra geral que riscada a

fortificação com a linha ichonografica, ou fundamental, se meta sempre a grossura

da parede de 4 pés desta linha para dentro"47.

O próprio Pimentel admitia, em seu tratado, que esses métodos de

dimensionamento são apenas fruto da experiência, uma forma empírica de calcular

muralhas, a partir da prática e conhecimento da obra, deixando a teoria e a ciência

em segundo plano: "[...] sobre a grossura das muralhas de pedra, e cal fallei

largamente na hercotectonica millitar, apontando os dittos de muitos autores e

discursando sobre a materia. Agora ponho aqui a resolução do que hei visto por

experiência"48.

Não obstante os estudos dos teóricos do renascimento italiano e dos

engenheiros portugueses, do século XVII, sobre a edificação dos muros em época

antiga e moderna, a arte de erguer este sistema construtivo só tem efetivo

desenvolvimento a partir do século XVIII, com o progresso do pensamento científico,

43 Antoine de Ville (datas de nascimento e morte desconhecidas), engenheiro militar e tratadista francês, seu mais importante trabalho é intitulado O governador de praças, sendo um tratado sobre artes militares. Foi traduzido para o português em 1708 a mando do imperador D. João V. 44 Citado como no original (PIMENTEL, L. S. Methodo lusitanico de desenhar as fortificaçoens das Praças Regulares e Irregulares. Versão digitalizada. Lisboa: Antônio Craesbeeck, 1680. p.97). 45 Considerando o valor do pé portugês como 33 cm, tem-se uma altura de 8,58 m. 46 PIMENTEL, L. S. Methodo lusitanico de desenhar as fortificaçoens ..., op. cit., p.97. 47 Id., ibid., p.107. 48 Id., ibid., p.96.

Page 43: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

42

principalmente com os trabalhos do engenheiro francês, nascido na Espanha,

Bernard Forest de Bélidor 49.

O tratado La science des ingénieurs dans la conduite des travaux de

fortification et d'architecture civile50 apresenta, já em seu primeiro capítulo, uma

abordagem diferente daquelas adotadas pelos autores italianos, sendo o

comportamento da edificação e os princípios de equilíbrio a base para o

dimensionamento das estruturas de uma fortificação, destacando que a Matemática

é uma ciência que pode ser amplamente utilizada para aperfeiçoar as artes.

Demonstra, ao longo de seis tomos, diversas resoluções de problemas para a

construção de muros, contrafortes e abóbadas, e a construção desses elementos

com tamanhos suficientes para receber diversos tipos de cargas, desde o peso

próprio até empuxos de terrenos. O conhecimento da edificação, em Bélidor, é

relatado desde as fundações até os detalhes decorativos, com, até mesmo, algumas

noções de urbanismo51.

O autor descreve, em seu primeiro tomo, "De la Theorie de la Maçonnerie"52,

inicialmente, os modos de calcular as formas geométricas mais importantes,

começando pela definição do centro de gravidade de diversas figuras, o qual,

segundo o tratadista, trata-se de uma grandeza importante para a estática das

edificações. Assim, ele relata:

Il y a dans tous les corps pesans, c'est a dire, dans toutes les figures pesantes, un point par lequel cette figure étant suspendue, ou soutenue comme sur la pointe d'un pivot fort aigue, toutes les parties de la figure demeurent en équilibre ou en repos, or ce point est nommé le centre de gravité de la figure.53

49 Bernard Forest de Bélidor (1698 d.C. – 1761 d.C.), engenheiro militar, nasceu na região da Catalunha, na Espanha, foi professor de artilharia na escola de La Fère em Aisne, na França. Fez parte do exército do Rei Luís XV e foi membro da Academia Real de Ciências da França, Inglaterra e Prússia. 50 A ciência dos engenheiros na condução dos trabalhos de fortificação e arquitetura civil (Tradução nossa). 51 Sabe-se que os estudos sobre o urbanismo moderno têm os escritos debutantes em Ildefon Cerdá e Gustavo Giovannoni. A referência ao urbanismo, nesta dissertação, leva em conta as recomendações dos antigos tratadistas, como Vitrúvio, Alberti e, evidentemente, Bélidor, para as cidades e vilas. 52 “Da Teoria da Alvenaria” (In: BÉLIDOR, B. F. La science des ingénieurs dans la conduite des travaux de fortification et d'architecture civile. Versão digitalizada. Paris: l'Image Nôtre-Dame, 1729.v.1, p.1.Tradução nossa). 53 “Existe, em todos os corpos pesados, isto é, em todas as figuras com peso, um ponto pelo qual esta figura está suspensa ou apoiada, como um forte pivô, e nele todas as suas partes permanecem em equilíbrio ou repouso. Esse ponto é denominado o centro de gravidade da figura” (BÉLIDOR, B.F. La science des ingénieurs..., op. cit., v.1, p.6. Tradução nossa).

Page 44: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

43

A partir de variados exemplos geométricos, Bélidor demonstra diversas formas

de dimensionar corretamente um muro. Um dos exemplos iniciais, apresentados no

tratado, diz respeito à determinação da largura de uma parede que, sobre esta,

recebe cargas verticais. Neste caso, o autor transforma o valor da força em uma

medida correspondente em área54: "suposant que la puissance soit équivalente à un

plan de 18 pied quarrés"55; desse montante, o tratadista propõe duplicar essa carga,

e dela retirar a raiz quadrada. O valor encontrado será a espessura de um simples

muro: "Il faut doubler ce nombre pour avoir 36 pieds quarrés, dont la racine qui est 6,

sera l'épaisseur que l'on cherche”56.

Além dos métodos de dimensionamento, o autor revela, também, no terceiro

livro do tratado, a utilização de diversos tipos de materiais para a construção de

alvenarias e suas propriedades, sendo a pedra o primeiro material a ser descrito por

ele.

Nesse contexto, Bélidor revela que as pedras mais duras são as melhores a se

aplicar na construção de uma edificação, principalmente em muros externos,

capazes de possuir maiores resistências aos esforços, à entrada de umidade e aos

raios lunares57, que, segundo o tradadista, são responsáveis por desagregar os

minerais do material de construção. "Les rayons de la lune peuvent dissoudre les

parties moin compactes: en ce cas on pourroit croire que ces rayons son humides"58.

Aquelas pedras que apresentam menos resistência aos referidos problemas

deveriam ser utilizadas para compor as fundações da edificação.

De fato, a água é o principal agente patológico a ser evitado em monumentos

e, atualmente, os estudos de tecnologia do restauro, em grande parte, voltam-se

para evitar a atuação da umidade em um edifício antigo. Com relação aos raios

lunares, Santiago59 afirma que as teorias contemporâneas consideram inadequado

esse tipo de raciocínio empírico, como o demonstrado pelo engenheiro militar. No

54 Para as citações que seguem, Bélidor utiliza o pé francês como unidade de medida, que corresponde a 32,484 cm. O pé quadrado, por sua vez, é igual a 0,1055 m². 55 “Supondo que a força seja equivalente a um plano de 18 pés quadrados” (BÉLIDOR, B.F. La science des ingénieurs..., op. cit., p.14. Tradução nossa). 56 “É necessário duplicar esse número para ter 36 pés quadrados, do qual a raiz é 6, que será a espessura que buscamos” (BÉLIDOR, B.F. La science des ingénieurs..., op. cit., p.14. Tradução nossa). 57 BÉLIDOR, B.F. La science des ingénieurs…, op. cit., v.3, p.2. 58 “Os raios da lua podem dissolver as partes mais compactas: neste caso, poder-se-ia crer que esses raios são úmidos” (BÉLIDOR, B. F. La science des ingénieurs..., v. 3, p.2. Tradução nossa). 59 SANTIAGO, C. C. Argamassas históricas de cal. Salvador: Núcleo de Tecnologia da Preservação e Restauração, 2004. p.26.

Page 45: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

44

entanto, mesmo por observação, os relatos antigos não devem ser descartados, pois

descrevem as experiências dos autores em confronto com o tema da conservação

dos materiais.

As pedreiras, de onde são retirados os materiais construtivos para a edificação,

também são lembradas por Bélidor, considerando que as melhores são aquelas

onde, próximo a elas, existam edifícios antigos, sendo tais monumentos

testemunhos da boa qualidade da pedra adotada. No caso de novas pedreiras, o

tratadista recomenda observar o comportamento dessas composições após

períodos de inverno, analisando sua resistência à intensa umidade e ao gelo e

degelo.

Bélidor, adicionalmente às recomendações sobre os elementos pétreos, alerta

que, para a fabricação de tijolos, outro material fundamental para a construção de

fortificações, é necessário encontrar a terra mais indicada: "il faut qu'elle soit grasse

et forte, de couleur blanchâtre, ou grisâtre, sans qu'ils s'y rencontre des petits

cailloux ni gravier"60, e que os blocos sejam feitos em lugares onde exista a

possibilidade de realizar a sua correta cozedura.

Já para as argamassas de cal, "l'âme de la maçonnerie"61, parafraseando o

tratadista Vicenzo Scamozzi62, é proposto, pelo teórico, para sua composição, a

utilização de pedras duras, pesadas e brancas encontradas "sur les montagnes, ou

dans les rivières"63.

As areias presentes na argamassa, aconselha Bélidor, são de dois tipos: a

primeira, chamada sable de cave, é encontrada em jazidas terrestres, enquanto a

segunda, sable de rivière, pode ser obtida no leito de rios. Deve-se dar preferência,

em uma construção, segundo o autor, a esta última, devido à sua menor quantidade

de argila. Tal questão já é relatada por Vitrúvio, considerando a areia fluvial como

consolidante das argamassas, enquanto este material, se de origem marinha, deve

ser evitado64.

Propõe, o tratadista francês, a possibilidade da adição de material pozolânico

em uma argamassa, a qual é descrita pelo engenheiro francês como "très-bonne

60 “É necessário que seja uma terra rica e forte, de cor esbranquiçada, ou acinzentada, sem a presença de pequenos seixos e cascalhos” (BÉLIDOR, B. F. La science des ingénieurs..., v.3, 1729, p.5. Tradução nossa). 61 “A alma da alvenaria” (Id., loc. cit. Tradução nossa). 62 SANTIAGO, C. C. Argamassas históricas de cal, op. cit., p.67. 63 “Sobre as montanhas ou em rios” (Id., loc. cit. Tradução nossa). 64 POLLIO, V. Tratado de Arquitetura, op. cit., p.125.

Page 46: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

45

pour les bâtiments, et rien au monde ne lie mieux les pierres que le mortier qui en est

fait"65.

Atualmente, com a Ciência da Restauração, entende-se que aditivos em

argamassas podem criar as mais diversas características, assim como se sabe que

a atuação de materiais pozolânicos influenciam nas propriedades hidráulicas do

elemento ligante66.

Bélidor, por fim, descreve, no sexto livro de La science des ingénieurs67, o

modo de construir muralhas, com os materiais supracitados. As paredes seriam

erguidas a dois paramentos externos, por meio de pedras e argamassas de cal de

excelente qualidade, enquanto a parte interna desses muros devem ser enchidos

com entulhos (Opus implectum).

Com relação ao sistema em tijolos, aconselha o mesmo modo de construir,

através de paramentos, no entanto, dava atenção à diminuição da espessura do

muro à medida que esse sistema ia sendo desenvolvido: "recommencera par trois

briques e demie d'eppaisseur, finissant toujours par une demie"68.

Quase um século depois da publicação dos trabalhos de Bernard Forest

Bélidor, um dos mais importantes tratadistas do século XIX, que discorre sobre os

sistemas construtivos em alvenaria, o arquiteto Jean-Baptiste Rondelet69 divulga seu

livro Traité théorique et pratique de l'art de bâtir70, amplamente influenciado pelo

antes citado engenheiro militar, o qual é largamente retomado por diversos autores

importantes como o português João Emílio dos Santos Segurado 71.

Atualmente, o tratado deu apoio a diversos estudos sobre alvenaria antiga nos

séculos XIX e XX, como aquele de João Mascarenhas Matheus72, entre outros

autores portugueses e italianos que se debruçam sobre o tema da crítica histórica

aos modos de edificar.

65 “Muito boa para os edifícios, e nada no mundo liga melhor as pedras que argamassas feitas com este material” (BÉLIDOR, B. F. La science des ingénieurs..., op. cit., v.3, p.11. Tradução nossa). 66 OLIVEIRA, M. M. de. Tecnologia da Conservação e Restauração. 3. ed. Salvador: EDUFBA, 2006. p. 37. 67 BÉLIDOR, B. F. La science des ingénieurs..., op. cit., v.6, p.22. 68 “Recomeçará com três tijolos e meio de espessura, terminando com um meio” (BÉLIDOR, B. F., La science des ingénieurs..., op. cit., v. 6, p.22. Tradução nossa). 69 Jean-Baptiste Rondelet (1743 d.C. – 1829 d.C.), arquiteto e teórico de arquitetura, é descendente direto do famoso médico francês Guillaume Rondelet. Foi responsável pela consolidação do Panteão de Paris e escreveu diversas memórias sobre suas obras. 70 Tratado teórico e prático da arte de edificar (Tradução nossa). 71 SANTOS SEGURADO, J. E. Alvenaria e Cantaria. 2.ed. Lisboa: Bertrand, 1908. 72 MATHEUS, J. M. Técnicas tradicionais de construção de alvenarias: a literatura técnica de 1750 a 1900 e o seu contributo para a conservação de edifícios históricos. Lisboa: Livros Horizonte, 2002.

Page 47: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

46

O maior legado do tratadista francês, para o estudo dos muros tradicionais,

está no quinto livro de seu trabalho, seção terceira, intitulada "Des principes de

mécanique"73, com suas observações empíricas, e na publicação das famosas

Formules de Rondelet74, que são expressões práticas para o dimensionamento de

alvenarias. Explica João Mascarenhas Matheus:

A explicação da popularidade do emprego destas fórmulas baseadas nas estabilidade ao derrube, pode ser encontrada de novo na sua simplicidade e facilidade de cálculo, capazes de resumir de modo expedito a complexidade de um edifício realizado em alvenaria. Estas regras podem e devem ser consideradas como tradicionais, uma vez que foram utilizadas e recomendadas durante quase um século de tratadística.75

Tais descrições determinam a espessura ideal para paredes resistentes, de

acordo com a altura, a carga que recebem, a localização e o modo como serão

construídas. Neste enquadramento racional, uma alvenaria isolada deve ser

calculada de forma diferente daquelas que serão construídas em um sistema de

caixa mural, assim como uma parede externa deve ser prevista de forma diversa

daquelas internas, do mesmo modo que contrafortes e muros em casas ordinárias.

Não é objetivo deste trabalho se delongar, de forma específica, no estudo das

fórmulas, estabelecidas por Rondelet para alvenarias de contenção, visto que o foco

concentra-se, quase totalmente, em ensaios de muros antigos de arquitetura civil e

religiosa. Nesse contexto, o tratadista relata as diversas incógnitas a serem levadas

em consideração, para dimensionamento de alvenarias, como a carga recebida e o

peso dos materiais de construção que formam a parede resistente, no entanto, dava

importância especial a outra variável, a altura do sistema edificado:

Les épaisseurs à donner aux murs et points d'appui, pour leur procurer le degré de stabilité qui leur convient, dépendent non seulement de la charge qu'ils peuvent avoir à soutenir, et de la force des pierres dont il sont formés, mais encore de la proportion de leur base avec leur hauteur.76

73 “Dos princípios de mecânica” (Tradução nossa). 74 “Fórmulas de Rondelet” (Tradução nossa). 75 MATHEUS, J. M. Técnicas tradicionais de construção de alvenarias..., op. cit., p.117. 76 “As espessuras que temos que dar muros e pontos de apoio, para obter o grau de estabilidade que lhes convém, depende, não somente da carga que eles podem sustentar, e da força das pedras do qual eles são formados, mas também da proporção de suas bases com suas alturas” (RONDELET, J. B. Traité théorique et pratique de l'art de bâtir. Versão digitalizada, v.5, Paris: Rondelet, 1812. p.181. Tradução nossa).

Page 48: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

47

A dureza da pedra também é uma variável de extrema importância em muros

de pedra talhada, segundo Rondelet, sendo tabelada pelo arquiteto de acordo com

sua experiência de viagens e visitas a diversas catedrais na França e na Itália. O

autor relata, por exemplo, que um muro em cliquart (pedra encontrada nos arredores

de Paris) com 38 cm de espessura teria a mesma resistência de uma parede

estrutural de calcáreo de Lioz com 43 cm de largura77.

Essa condição não pode ser obedecida no caso de muros de alvenaria mista

ordinária, devendo-se seguir impreterivelmente às fórmulas determinadas por

Rondelet.

[...] não são o resultado de modelações matemáticas baseadas na resistência de um material de produção. Limitam-se a traduzir as proporções de espessura mínima e de altura observadas nas paredes de um grande número de edifícios exemplares que apresentavam, à data da formulação dos ditos algorítimos, um bom comportamento estático.78

Os desenhos apresentados pelo referido tratadista não apresentam uma

didática de fácil compreensão, sendo suas expressões matemáticas localizadas

esparsamente por todo o trabalho e seus desenhos, situados em pranchas anexas,

de difícil compreensão.

Embora o entendimento do documento seja laborioso, estudiosos que vieram

após Rondelet trataram de resumir essas fórmulas, como é o caso do arquiteto

frânces Émile Barberot79. A interpretação das expressões, pelo referido teórico, é

relatada no Quadro 1 a seguir.

77 Rondelet utiliza a unidade pouce, ou polegada, para a determinação dos valores de medida em seu trabalho. Na presente dissertação, essa definição foi convertida em centímetros (RONDELET, J. B. Traité théorique et pratique..., op. cit., v 5, p.182). 78 MATHEUS, J. M. Técnicas tradicionais de construção de alvenarias..., op. cit., p.118. 79 BARBEROT, E. Tratado práctico de edificación. 2. ed. Tradução Lino Álvarez Valdéz. Barcelona: Ed. Gustavo Gili, 1927. p.43.

Page 49: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

48

Quadro 1 – Resumo mostrando as fórmulas de Rondelet, intepretadas por Émile Barberot

FÓRMULAS DE RONDELET

Legenda

e = espessura do muro

H = altura total (m) n = número de pav.

l = comprimento da parede (m)

L = largura do edifício (m)

EXPRESSÕES DE DIMENSIONAMENTO

TIPO DE PAREDE EXPRESSÃO

Muro simples isolado

Muro de fachada (duplo)

Muro de fachada (simples)

Muros divisórios

Muros que suportam telhados

Fonte: Elaboração do autor a partir de Barberot (1927, p.43).

O estudo dos trabalhos dos engenheiros e arquitetos franceses faz-se

necessário pois, assim como os construtores portugueses, que se apoiaram em

obras como a de Antoine de Ville, outros téoricos da construção, inclusive os

brasileiros, voltaram seus estudos para o legado dos tratadistas europeus. No

entanto, antes dos supracitados relatos, a técnica era aplicada sem tanta

cientificidade. Portanto, faz-se necessário voltar um pouco na linha do tempo desta

dissertação, sendo importante retomar o gênero de pensamento do início da Era

Moderna, para entender o desenvolvimento da arte de murar em terras brasileiras.

Setenta anos antes da publicação do tratado de Andrea Palladio da Vicenza,

no século XVI, o novo mundo passava por constantes descobertas, resultado do

desenvolvimento das grandes rotas de navegações e, em especial, das missões

portuguesas e espanholas. Nesse período, é encontrada, provavelmente por

acaso80, a área onde, futuramente, viria a se desenvolver a Nação Brasil.

80 Ou não, alguns teóricos afirmam que Pedro Álvares Cabral, dito "Descobridor do Brasil", tinha em mente o caminho a seguir para a descoberta de novas terras.

Page 50: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

49

As considerações sobre o pensamento do modo de edificar na principal colônia

lusitana das Américas, depois, Reino Unido de Portugal, Império e República, são

expostas a seguir.

2.3 CONSIDERAÇÕES SOBRE A ARTE DE MURAR NA BAHIA E NO BRASIL

Os edifícios construídos em terras lusitanas, na América do Sul, onde o

colonizador português semeou sua cultura, tinham a necessidade de se adaptar às

mais diversas funções e ao clima quente e úmido dos trópicos. Além disso, “Portugal

não era um país rico e a Fazenda Real abria seus cofres muito parcimoniosamente

para investimentos na América”81, tornando a missão edificatória uma verdadeira

arte. Nesse contexto, desenvolveram-se fortificações, igrejas e grandes palácios

pelas mãos dos engenheiros militares e das ordens religiosas.

Devido a essas circunstâncias, na Bahia, é possível encontrar os mais diversos

tipos de muros, e a cidade que representa, em maior escala, essa miscelânea de

estilos é Salvador. Apesar de o território brasileiro ter sido encontrado no ano de

1500, as missões edificantes começam apenas cinco décadas depois com a

fundação da primeira Capital do futuro país.

A primeira Capital do Brasil é erguida no ano de 1549 pelo Governador Geral

Tomé de Souza82 que, obedecendo ao Rei D. João III de Portugal, constrói uma

cidade fortaleza acrópole, em posição de supremacia sobre a Baía de Todos-os-

Santos. O Regimento do monarca lusitano, que guia o primeiro administrador da

cidade, define como deveriam ser construídos os primeiros muros da urbe, como

relatado em CEAB-UFBA:

Finalmente, há instruções relativas aos recursos materiais, procedendo com prudência, à vista do desconhecimento real da situação local, quanto à existência ou não dos materiais de construção indispensáveis para um empreendimento de tal monta, naquela época. Por isso mesmo, deixa ao critério do mestre de obras da cidade, a responsabilidade de opção, em função das condições existentes. Por conseguinte, há uma enumeração de forma decrescente, na preferência do emprego dos materiais, a saber: a) Pedra aparelhada;

81 OLIVEIRA, M. M. de. As fortalezas e a defesa de Salvador. Brasília, DF: IPHAN/Programa Monumenta, 2008. p. 16. (Coleção Roteiros do Patrimônio). 82 Tomé de Souza (1503 d.C. – 1579 d.C.), militar português, foi Governador Geral do Brasil de 1549 a 1553.

Page 51: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

50

b) Pedra e cal; c) Pedra e barro, ou taipais; d) Madeira. Condicionando-se, porém, o uso dos materiais à satisfação deu uma condição imperiosa: como melhor poder ser de maneira que seja forte.83

As obras de construção da defesa da Cabeça do Brasil84 ficaram a cargo do

Mestre Luiz Dias, especialista em fortificações, o qual, em face dos materiais

disponíveis, utilizou a terra como o principal meio para construir as primeiras

muralhas de Salvador, erguendo altos muros de taipa de pilão, sem utilização da cal.

Nessas circunstâncias, visto a excessiva umidade e quantidade de chuvas de

que a cidade é alvo durante o ano, os muros de taipas vieram a se desmanchar

muito rapidamente. Os projetos vinham direto de Portugal, pelo Engenheiro Militar

Miguel Arruda, elevado pelo próprio Rei D. João III a mestre das obras dos muros e

das fortificações do Reino, Lugares d'Além e Índia. O Mestre Luiz Dias comunicava-

se com o engenheiro maior por meio de cartas e assim pôde revelar o cotidiano da

construção dos muros da cidade.

É importante relatar que as primeiras casas construídas na Colônia são, como

as muralhas, de barro, com cobertura de palha, embora, em raros momentos, tenha

sido possível utilizar a pedra nativa ou importar de Lisboa pedras nobres como o lioz

português. Tempos depois, já com o modo produtivo açucareiro em alto rendimento,

esse material lusitano foi utilizado em abundância na Basílica da Conceição da

Praia e na Igreja dos Jesuítas, assim como para a edificação de diversos palácios e

solares nobres.

Em concordância com essas características construtivas, é de notar o amplo

papel dos engenheiros militares na construção de prédios em Salvador. Alguns

desses personagens tinham como escola os modos de edificar da escola

holandesa85 e, nesse contexto, utilizavam muito a terra na construção de

fortificações, principalmente para evitar o ricochete de projéteis.

O uso e a difusão da pedra e da cal, a partir do século XVII, tem relação direta

com a atuação desses personagens da história da primeira Capital do Brasil. Oliveira

relata que “[...] a elevação dos muros que deveriam sustentar os terraplenos das

83 CEAB-UFBA. Evolução Física de Salvador: Edição especial. Salvador: Palloti, 1998. p.24-25. 84 OLIVEIRA, M. M. de. As fortificações portuguesas de Salvador quando Cabeça do Brasil. Salvador: Omar G., 2004. 85 Id., ibid., p.160.

Page 52: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

51

fortificações baianas foi motivo de polêmicas, principalmente no que se refere ao

material de construção”86. Nesse conflito, encontravam-se os engenheiros militares

divididos, pois havia os que defendiam o uso da pedra e da cal, enquanto os oficiais

de origem alentejana, em geral, preferiam a construção em terra.

No entanto, a partir do século XVII, Salvador firmou-se como grande potência

econômica, visto o cultivo da cana-de-açúcar e o desenvolvimento do transporte e

ligação com as cidades do Recôncavo Baiano, como Cachoeira, Maragojipe, Santo

Amaro e São Francisco do Conde. Seus modos construtivos tornaram-se mais

refinados e, assim, foi possível a edificação de monumentos mais sólidos e

estruturalmente mais seguros. Assim, técnicas mais antigas foram perdendo espaço:

A taipa de pilão, esta bastante utilizada no início da colonização, desapareceu rapidamente, dando lugar a estruturas mais resistentes; o pau a pique, ainda adotado em áreas onde predomina a autoconstrução; e as alvenarias de adobe, de pedra e de tijolo, ou mesmo a combinação destes [...] as paredes podiam ser empregadas com propósito de vedação, separando o interior do exterior ou definindo ambientes internos de uma construção. Também podiam exercer função estrutural, ocupando-se quase que totalmente da sustentação do edifício, uma situação que pode ser ilustrada por grande parte das construções do século XVII e XVIII.87

O desenvolvimento da arte de murar acabou, também, por trazer nova mão de

obra para a Colônia e, consequentemente, por fazer prosperar o modo edificatório.

Segundo Caparó88, a progressão da demanda construtiva fez surgir "[...] a

necessidade de se contar com mão de obra especializada para os diferentes tipos

de trabalho, principalmente, na etapa de acabamento, e em cada uma das fases que

refere esse material". Tratava-se da construção de alvenarias através de processos

empíricos, em uma associação de diversos elementos resistentes à compressão,

mediante uma forma imbricada, e que possuíam equilíbrio através de tensões de

atrito entre pedras, argamassas e outros elementos, fomentadas pela força da

gravidade.

86 OLIVEIRA, M. M. de. As fortificações portuguesas de Salvador..., op. cit., p.160. 87 BAHIA. Governo do Estado. Salvador e a Baía de Todos os Santos. Edição Trilíngue. Organização de Eugênio D’Avilla Lins e Mariely Cabral de Santana. Sevilla: Consejería de Obras Públicas y Vivienda, 2012. p.85; 86. 88 CAPARÓ, E. F. Os arenitos de cimentação calcífera dos antigos edifícios em Salvador: origens. 1997, 158f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo)-Universidade Federal da Bahia, Salvador, 1997. p.30.

Page 53: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

52

As construções em alvenaria mista, de pedra e tijolos assentados com

argamassa de cal, serão, ao longo de três séculos, hegemônicas em todo o Estado

da Bahia, principalmente com a utilização de granitos ou gnaisses, abundantes em

toda a costa; arenitos, pertencentes às regiões da Preguiça e Monserrat (em

Salvador); e calcário dolomítico em Boipeba (região litorânea do Baixo-sul da Bahia).

As Figuras 13 e 14, por exemplo, são dois modelos de muros construídos em duas

regiões diversas no Estado, demonstrando certo consenso geral no processo de

edificação de monumentos na região de Salvador e do Recôncavo.

Figura 13 – Muro de Edifício à Rua do Maciel, Pelourinho, em Salvador

Figura 14 – Muro da Capela de Nossa Senhora do Vencimento, localizada no Recôncavo baiano

Fonte: Acervo do autor (dez. 2014).

Fonte: Acervo do autor (jul. 2014).

Voltando as vistas para os estudos sobre o modo de edificar no Brasil, como

um todo, é importante expor a importância do tratado Compêndio de architectura

civil e hydraulica, de Pedro Bellegarde89, Engenheiro Militar, que, no século XIX,

inspirou diversos arquitetos e engenheiros militares, que atuavam durante o Período

do Império (e República) brasileiro, no modo de construir, e ainda foi de grande

importância para a formação acadêmica desses profissionais.

89 Pedro de Alcântara Bellegarde (1807 d.C. – 1864 d.C.), engenheiro militar, nasceu em plena Nau de Nossa Senhora da Conceição (ou Nau Príncipe Real) que trazia a Corte Real Portuguesa para o Brasil, inclusive o Príncipe Regente Dom João VI, em fuga das invasões napoleônicas. Foi professor da Escola Militar do Rio de Janeiro e da Escola de Arquitetos Medidores e importante incentivador da pesquisa, sendo responsável pelo Observatório Nacional e fundador do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

Page 54: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

53

Seu tratado é, provavelmente, o primeiro documento, de tal cunho, escrito e

publicado no Brasil. Destaca-se dos escritos do supracitado professor, para esta

pesquisa, o capítulo "Formação das Construções"90, no qual o autor cita diversos

sistemas construtivos e descreve, de forma distinta ao exposto anteriormente pela

presente dissertação, quais são os modos de murar. Nesta parte do manual, o

engenheiro militar, com relação à arte de edificar, retrata os muros em cantaria, as

alvenarias e as taipas. Bellegarde envolve-se, também, na orientação para a

execução de outros elementos construtivos como emboços, madeiramentos,

ferragens e fundações.

A construção em cantaria é, de acordo com o tradista, formada por pedras mais

ou menos regulares, que, com sua sobreposição, formam o maciço. Recomenda o

uso de argamassas para a boa coesão entre as peças, principalmente ao levar em

conta os empuxos horizontais, apesar de afirmar que as pedras bem talhadas e

geometricamente bem assentadas, sem argamasssa, apresentam boas condições

estruturais.

Bellegarde, dissertando sobre as várias formas de obter uma relevante coesão

entre os diversos elementos construtivos, afirma que "[...] he essencial que as

pedras sejão bem faceadas e desempenadas, de modo que se assentem iguais

humas sobre outras”91. Nesse contexto, o tratadista relata, também, a importância do

uso de ferramentas de desenho e a geometria descritiva para o corte meticuloso das

pedras singulares92, detalhando que "[...] os angulos dos diedros ou sólidos devem

aproximar-se, tanto quanto for possível, de serem rectos.”93, com a intenção de obter

os melhores elementos em cantaria e, consequentemente, melhor comportamento

murário.

O autor ainda expõe, de forma detalhada, o melhor modo de edificar tais muros

de pedra talhada:

Collocada a pedra sobre a argamassa se apruma e nivela, e depois por meio da percussão de maços se obriga a expellir a argamassa superabundante, e encostar o mais possível huma na outra; assim

90 BELLEGARDE, P. A. Compêndio de architectura civil e hydraulica. Versão digitalizada, Rio de Janeiro, 1848. p.32. Todas as citações do autor, nesta dissertação, foram transcritas exatamente como o texto original. 91 BELLEGARDE, P. A. Compêndio de architectura civil e hydraulica, op. cit., p.34. 92 Trata-se da aplicação da Estereotomia, ciência que concerne à geometrização dos materiais de construção civil. 93 BELLEGARDE, P. A. Compêndio de architectura civil e hydraulica, op. cit., p.36.

Page 55: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

54

sucessivamente, e por camadas ou fiadas se vão collocando, tendo sempre cuidado de molhar os leitos das pedras com água, quando as argamassas são calcáreas. As juntas verticaes são argamassadas do mesmo modo, ou com espátulas appropriadas.94

As construções em cantaria, como relatado anteriormente nesta dissertação,

têm lugar na primeira Capital do Brasil, em geral, em prédios nobres e eclesiásticos,

ou na formação de cunhais e pilares em palácios da alta sociedade colonial. Para

esta pesquisa, interessam, com maior intensidade, os escritos do tratadista sobre os

muros ordinários construídos com pedras e tijolos, argamassados ou apenas blocos

assentados com um elemento ligante.

Com relação às paredes de alvenaria, Bellegarde pormenoriza a importância

física e mecânica dos elementos ligantes, quando o muro não apresenta elementos

pétreos meticulosamente cortados para um maciço resistente. Explana, também,

que, devido à falta de argamassas, os muros de pedras secas não possuem

vantagens, no que diz respeito às suas condições mecânicas. Destaca-se, nesse

sentido, o cálculo, descrito pelo autor, da relação adequada entre os elementos

ligantes e a pedra com relação ao volume de alvenaria: "[...] calcula-se o volume da

alvenaria como composto por 3/4 de pedra e 1/4 de argamassa, e às vezes mais”95.

Os tijolos, relata o tratadista, são os elementos necessários à amarração do muro,

assim como pedras que devem atravessar toda a parede, fazendo a ligação entre o

paramento interno e externo (perpianhos). Bellegarde descreve a forma de construir

tais paredes:

As pedras devem ser bem assentadas e batidas para apoiarem em outras pedras, servindo a argamassa somente a encher os vãos das pedras: por isso se deve empregar pedra de differentes tamanhos para encher com as menores os intervallos das maiores, formando o que chamão os práticos Creação, pondo de espaço a espaço, pedras de toda a grossura da parede para atracar a construcção.96

O autor considera que a diminuição da quantidade de barro e o aumento da

proporção de cal e areia sejam fundamentais para uma boa alvenaria, embora, como

será visto no próximo capítulo desta dissertação, essa recomendação não seja uma

regra.

94 BELLEGARDE, P. A. Compêndio de architectura civil e hydraulica, op. cit., p.32. 95 Id., ibid., p.41. 96 Id., loc. cit..

Page 56: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

55

Outrossim, a correta proporção entre a altura e a largura de uma estrutura de

alvenaria é levada em consideração para a edificação de um muro estável e com

boas características de resistência. O tratadista relata que paredes com menos de

dois palmos de grossura não serão conservadas por muito tempo, e que a solidez,

no que diz respeito à espesssura do elemento construtivo, para paredes de casas

ordinárias, vai depender do atendimento da seguinte regra: "Tome-se 1/25 da altura

da parede e somme-se 1,5 palmos, e ter-se-há a grossura da parede na base"97.

Muitas vezes, o tamanho da estrutura de alvenaria poderia diminuir sua seção

em sua parte mais alta, embora, em muitos casos, esses muros permaneçam com a

mesma espessura ou com grossura pouco reduzida.

Por fim, é exposta, no Quadro 2 abaixo, a quantidade de materiais por braça

cúbica98 de alvenaria, para a construção de paredes mistas.

Quadro 2 – Quantidade de materiais necessários para a uma braça cúbica de alvenaria

MATERIAL QUANTIDADE (m³)

Pedra 20

Barro 3

Areia 2

Cal 1

Fonte: Elaboração do autor, a partir de Bellegarde (1848, p.42).

Os tratados sobre a tecnologia da edificação, concebidos por engenheiros

como Pedro de Alcântara Bellegarde, retratam, cientificamente, uma prática que

tinha cunho empírico no início dos tempos coloniais. É muito provável que os

escritos do supracitado tratadista sejam frutos do estudo dos textos e aulas de

Bélidor e de engenheiros portugueses.

É sabido que, até a eclosão do pensamento iluminista, do desenvolvimento das

teorias positivistas e racionais e da criação do cimento Portland, no século XIX, as

alvenarias portantes demonstravam grandes espessuras e composição maciça,

97 BELLEGARDE, P. A. Compêndio de architectura civil e hydraulica, op. cit., p.43. 98 Uma braça equivale a, aproximadamente, 2,20 m. A braça cúbica é uma das unidades de medida utilizada pelo colonizador português para a construção no Brasil. Equivale a mil palmos cúbicos, portanto, em torno de 10,648 m³ no sistema métrico.

Page 57: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

56

baseada no peso próprio, para resistir aos esforços de compressão e aos empuxos

das pesadas coberturas abobadadas, que, geralmente, tinham a mesma constituição

do próprio muro.

As bases do pensamento racionalista disseminavam, em sua grande maioria, a

edificação com lógica estrutural, utilizando menor quantidade de materiais, em

contraste com o modo empírico de edificação das paredes estruturais. Com a

chegada da industrialização e dos novos elementos construtivos, fazia-se necessária

a construção de prédios mais rapidamente. A velocidade e a necessidade de edificar

acabou por tornar inviável o modo construtivo antigo e deu aval para a chegada do

movimento moderno com a consolidação do concreto armado e das estruturas

metálicas.

Não obstante o desenvolvimento de novas formas de edificar durante o século

XX, o período do novecentos trouxe à luz outros importantes trabalhos sobre

paredes resistentes, que foram bem distribuídos no Brasil, dentre os quais

destacam-se os livros publicados por João Emílio do Santos Segurado, em especial,

Alvenaria e Cantaria99.

Nesse trabalho, o autor destaca a execução de diversos tipos de muros, no

entanto, de maneira geral, relata que a geometria das pedras é fundamental para a

aderência de uma boa parede, expondo que, "[...] para executar a alvenaria começa-

se por escolher as pedras que melhor prestem pela sua forma a preencher os

espaços deixados pelas anteriormente dispostas, assentando-as em cheio sobre

argamassa"100.

Santos Segurado dispõe, também, questões práticas da construção de

alvenarias de pedras argamassadas aparelhadas ou desordenadas; ou de pedras

secas, mencionando:

Um metro cúbico de pedra seca exige 1,1 m³ de pedra de alvenaria. O metro cúbico de parêde de alvenaria ordinária precisa 1,2 m³ de pedra se sua espessura é inferior a 0,4 m; sendo superior é suficiente 1,1 m³. A argamassa necessária para a sua execução é 0,4 m³, seja qual for seu traço, geralmente 2:5, 1:2, 1:3 e 1:4. A alvenaria aparelhada necessita, por metro cúbico, de 1,3 m³ de pedra e 0,3 m³ de argamassa ordinária.101

99 SANTOS SEGURADO, J. E. Alvenaria e Cantaria, op. cit. 100 Id., ibid., p.64. 101 Id., ibid., p.65.

Page 58: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

57

Sobre os muros construídos com tijolos, Santos Segurado discorre sobre as

generalidades do sistema construtivo, relatando as dimensões mais comuns dos

blocos: 0,23 x 0,11 x 0,07m, além da necessidade de "matar a junta"102 de

argamassa ao assentar os elementos construtivos para edificar tal alvenaria,

procedimento utilizado até hoje. Adicionalmente, descreve inúmeros métodos de

assentar tijolos e decorar paredes com tais blocos.

São eles dependentes da altura da composição (pavimentos mais altos

necessitam de paredes mais espessas) e da sua função (divisória ou estrutural),

sendo descritos pela forma que são dispostos em duas fiadas diferentes (Figuras 15

e 16).

Figura 15 – Métodos de elevar paredes de tijolos (não estruturais)

Fonte: Elaboração do autor a partir de Santos Segurado (1908, p.68-69).

Esses modos, descritos pela Figura 15, distinguem-se em:

1– tijolo de cutelo;

2 – pano de meia vez tijolo;

3 – parede de uma vez tijolo, que é utilizado, geralmente, em paredes de

tabique ou divisórias internas.

102 SANTOS SEGURADO, J. E. Alvenaria e Cantaria, op. cit., p.67.

Page 59: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

58

Figura 16 – Métodos de elevar paredes estruturais de tijolos

Fonte: Elaboração do autor a partir de Santos Segurado (1908, p.74; 76).

Já os métodos descritos pela Figura 16 são aqueles em que as composições

podem atuar, com função estrutural, na edificação de um monumento, e, ao mesmo

tempo, funcionar como paredes divisórias, de fachada, contrafortes, entre outras

funções. São eles:

1 – paredes de vez e meia;

2 – paredes de duas vezes tijolo.

O autor também relata a possibilidade da construção de paredes com

espessura superior a duas vezes de tijolos, no entanto, não se delonga, visto que

“[...] entre nós não se emprega de ordinário o tijolo para paredes muito grossas:

neste caso faz-se alvenaria mixta: exteriormente tijolo envolvendo alvenaria

ordinária"103.

Santos Segurado entra em questões sobre cálculo de estruturas, espessuras e

estabilidade de paredes novas e antigas, recorrendo aos estudos do antes citado

Jean-Baptiste Rondelet e suas fórmulas, além de outros autores do século XIX,

103 SANTOS SEGURADO, J. E. Alvenaria e Cantaria, op. cit., p.67.

Page 60: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

59

como o engenheiro mecânico Ferdinand Redtenbacher104. Relata, outrossim, em

tabela, o peso a resistência e a carga de segurança contra esmagamento de cada

tipo de alvenaria.

Estudos contemporâneos sobre a construção de alvenarias de tijolos, ao longo

do século XIX, dão ênfase, também, ao resultado estético em que esses blocos são

assentados, tratanto-se de uma nova interpretação dos antigos modelos construtivos

romanos. Santos Segurado já revelava essa preocupação com a disposição desses

elementos construtivos em vista (Figuras 15 e 16), e muitos outros pesquisadores

como Demanet105, em seu Cours de construction106, e o próprio Rondelet,

amplamente citado nesta dissertação.

Rocha107 faz um resumo geral sobre a concepção estética dos "Aparelhos" da

alvenaria de tijolo (Figura 17).

Figura 17 – Concepção estética das paredes de tijolos

Fonte: Elaboração do autor a partir de Rocha (2012, p.164).

104 Ferdinand Redtenbacher(1809 d.C. – 1863 d.C.), engenheiro mecânico, formou-se na Escola de Viena de Engenharia e foi professor de Mecânica, Matemática e Geometria na Universidade de Karlsruhe e no Instituto Tecnológico de Zurich. É considerado um dos fundadores da Engenharia Mecância na Alemanha. 105 DEMANET, A. Cours de construction. Bruxelles: Societé Typographique Belge, 1847. 106 Curso de construção (Tradução nossa). 107 ROCHA, I. Tijolo por tijolo: construindo alvenarias no Vale do Paraíba. 2012, 310f. Tese (Doutorado em Arquitetura) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

JUNTA ALTERNADA

ESPINHA

FLAMEN-

GO

COMPRIDO

OU LARGO

PERPIANHO

INGLÊS APARELHOS EM

DIAGONAL

Page 61: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

60

Embora a utilização da alvenaria estrutural tenha perdido força, ao longo dos

anos, ainda existem normas brasileiras e internacionais que regulamentam a

construção delas. Evidentemente, não se trata mais dos grandes muros espessos de

pedra e tijolos argamassados, mas da utilização de blocos de concreto

contemporâneos, furados e armados, assentados com argamassa cimentícia.

Segundo Tauil e Nese108, é possível executar diversos tipos de alvenaria

estrutural, entre elas:

1 – alvenaria não armada: não recebe o enchimento com graute109, e com

reforços de armaduras apenas por razões construtivas (vergas, contravergas,

para evitar o aparecimento de fissuras);

2 – alvenaria armada ou parcialmente armada: apresenta armadura passiva

(fios, barras e telas de aço) por razões estruturais, e os blocos e as juntas são,

posteriormente, preenchidos com graute;

3 – alvenaria protendida: apresenta armadura pré-tensionada e é pouco

utilizada por ser um sistema muito dispendioso.

O uso desse tipo de sistema construtivo, atualmente, tem como principal

vantagem a diminuição do custo de obra, a racionalidade na construção e a

facilidade de conciliação com os demais projetos complementares, em relação às

construções em vigas e pilares de concreto armado, além de reduzir a margem de

erro possível para o projeto, visto seu modo altamente racional.

O estudo dos sistemas construtivos deu subsídios aos arquitetos e engenheiros

antigos para a construção de grande monumentos ao longo da história. Atualmente,

é ainda possível erguer prédios com base nos modos de edificar testemunhados

pelas antigas civilizações, o que não significa que esses edifícios sejam menos

resistentes, pelo contrário, a história demonstrou que a técnica tradicional apresenta

durabilidade, que os fez perdurar durante séculos.

Conhecer essas técnicas, além de dar subsídios para o projeto

contemporâneo, tanto de arquitetura quanto de engenharia, permite a melhor

108 TAUIL, C. A.; NESE, F. J. M. Alvenaria estrutural. São Paulo: PINI, 2010. 109 Concreto executado com agregados muito finos, fluido e com baixa retração.

Page 62: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

61

utilização dos métodos de diagnóstico, que, aliado aos conhecimentos da fisica do

comportamento mural, fornecem dados importantes para o trabalho do restaurador,

tanto de monumentos tradicionais, quanto modernos e atuais.

Neste sentido, faz-se necessário, para complementar o estudo deste capítulo,

entender cada material singular e o desempenho estrutural desses muros, para o

conhecimento crítico-histórico do comportamentamento físico e mecânico das

alvenarias antigas, como será visto a seguir.

Page 63: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

62

3 DAS CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E MECÂNICAS DOS MUROS

Conhecer as propriedades mecânicas fundamentais da alvenaria e as

grandezas de cálculo que atuam em um muro foi de grande importância para

posterior análise dos ensaios estudados nesta dissertação, visto que, através

desses parâmetros, é possível comparar diversas pesquisas realizadas em

alvenarias antigas e propor consolidações ou métodos conservativos.

Portanto, a seguir, descrevem-se as análises gerais teóricas sobre as

características físicas e mecânicas dos elementos que constituem os muros

tradicionais de pedra e argamassas antigas; tijolos e adobes; ou, também, paredes

resistentes compostas de pedras e tijolos, assentados com argamassas antigas, ou

mesmo sem. Adicionalmente, foi necessário analisar as patologias que são

responsáveis pela degradação e ruína das paredes históricas que afetam

diretamente a elaboração do método de estabilização, fortalecimento ou

recomposição.

3.1 OS MATERIAIS

Sabe-se que cada elemento construtivo singular apresenta comportamento

particular, dependendo de suas características físicas, químicas e mecânicas. No

entanto, ao unir materiais que atuam de forma diversa, a exemplo do que ocorre em

uma alvenaria, é possível fomentar reações diferentes daquelas mostradas pelos

materiais em seu estado natural. Não obstante as dificuldades de prever o

comportamento de um muro, o conhecimento dos elementos individuais da parede é

de importância fundamental para a análise do comportamento estrutural das

edificações.

3.1.1 A pedra

De acordo com os tratadistas dos séculos XIX e XX, como Bellegarde110, os

muros antigos possuíam cerca de 3/4 de seu volume total composto por pedras. Isso

posto, nos itens a seguir, são caracterizados os parâmetros físicos e mecânicos dos

110 BELLEGARDE, P.A. Compêndio de architectura civil e hydraulica., op. cit.

Page 64: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

63

principais elementos líticos encontrados nas construções coloniais, para posterior

análise através de ensaios não destrutivos.

3.1.1.1 Caracterização dos tipos de pedra utilizados na Bahia e no Brasil colonial

A origem dos textos científicos sobre as pedras naturais e suas propriedades é,

provavelmente, encontrada na Antiguidade clássica, mais precisamente no século IV

antes de Cristo111. O uso desses materiais líticos por egípcios, gregos, romanos,

entre outros povos, era comum nos templos mais importantes dessas civilizações,

sendo considerados elementos construtivos de excelência.

Sabe-se, no entanto, que, durante o período medieval112 e de expansão

mercantilista113, as construções militares, civis e religiosas, nas colônias, eram

condicionadas, de maneira geral, pelos materiais disponíveis na área onde se

edificava. Em concordância com isso, esse aspecto não foi diferente no caso da

primeira Capital do Brasil, embora, como já relatado no Capítulo 1, os engenheiros

militares, principais construtores, não aprovassem, de maneira geral, as pedras

locais, acreditando nas propriedades dos materiais construtivos vindos de Portugal.

Não obstante, esses mesmos engenheiros não tinham como evitar a construção

com líticos locais, visto sua abundância e, também, o racionamento de recursos

econômicos, muito escassos em terras brasileiras.

Geralmente, as pedras utilizadas para a construção de simples alvenarias na

Bahia eram magmáticas, como no caso dos granitos; metamórficas, a exemplo dos

gnaisses; sedimentares de cimentação calcária, como no caso dos arenitos; ou

calcárias dolomíticas. Em raros casos, é possível encontrar materiais líticos

provenientes da Itália, em especial, os mármores de Carrara e Verona, utilizados, na

sua grande maioria, em elementos artísticos móveis e/ou integrados, ou elementos

arquitetônicos característicos, como soleiras e cercaduras.

111 OLIVEIRA, M. M. de. Pedra: arquitetura e restauração. Comunicação apresentada ao WORKSHOP DO PROJETO PRONEX-MINOMAT "DOS MINERAIS AOS NOVOS MATERIAIS", 2., 2011, Belém, Universidade Federal do Pará. p.2. Cópia digitalizada cedida pelo autor. 112 Período que vai do século V ao século XV, foi caracterizado não apenas pelo poder da Igreja Católica, mas também pela grande descentralização política. Nessa época, quase não existiam rotas comerciais, e conseguir materiais estrangeiros era uma tarefa muito difícil. 113 Do século XVI ao século XVIII.

Page 65: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

64

Já em outras cidades do Brasil, os monumentos eram erguidos com diferentes

tipos de pedras. Em Minas Gerais, por exemplo, é famoso o uso da pedra-sabão

para a composição de cantarias e esculturas dos monumentos de Ouro Preto e das

diversas cidades vizinhas. As grandes obras-primas de um dos maiores nomes da

arte no Brasil, Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, são frutos do trabalho sobre

esse material.

Caparó relata:

Em, Olinda, por exemplo, os trabalhos de cantaria apresentaram duas fases diferenciadas: uma em que se empregou só o calcário e, outra tanto o arenito quanto o calcário simultâneamente. Já em Minas, as pedras utilizadas foram as talcosas, serpentinitas, esteatitas, estas conhecidas popularmente como pedras sabão ou pedras de panela. Em outras localidades como Ouro Preto, usaram-se os itacolomitos e, posteriormente, as talcosas.114

De maneira geral, o tamanho e as características mecânicas do material pétreo

eram variáveis, a depender da região de onde costumavam ser retiradas. Como

visto no capítulo anterior, Bernard Forest de Bélidor aconselha o uso de pedreiras

próximas a monumentos antigos; já Rondelet prefere o cliquart parisiense ao lioz da

Península Ibérica, sendo alvenarias constituídas desse material menos espessas,

visto sua boa resistência e comportamento mecânico.

Na Bahia, por exemplo, existem diferenças de vigor e desempenho dos

elementos líticos disponíveis em terras relativamente vizinhas. Enquanto o calcário

encontrado em regiões do Recôncavo baiano apresenta, em muitos casos,

características argilosas e menos resistentes, os dolomíticos retirados no Baixo-Sul,

em Boipeba, são mais duros. Relata Oliveira115:

A pedra bruta para a construção era abundante, embora reconheçamos que fosse de mais difícil extração em virtude de serem rochas eruptivas duras. Temos também observado que os nossos antigos construtores das fortalezas valeram-se, igualmente, de pedras soltas encontradas nas vizinhanças.

E continua:

Muitas rochas de construção foram trazidas do Recôncavo, como se pode depreender da documentação da época. No enrocamento do

114 CAPARÓ, E. F. Os arenitos de cimentação calcífera dos antigos edifícios em Salvador:.., op. cit., p.37. 115 OLIVEIRA, M. M. de. As fortificações portuguesas de Salvador quando Cabeça do Brasil, op. cit., p.153.

Page 66: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

65

Forte de S. Marcelo, foram encontradas rochas calcárias que vieram de Portugal, como lastros de navios, outras são arenitos locais e outras, rochas graníticas que vieram, provavelmente, do Recôncavo.116

Esses materiais pétreos podiam ser trabalhados ou não, a depender dos

recursos e das necessidades do construtor e era comum utilizar as pedras de melhor

qualidade formal nas molduras dos vãos, enquanto as pedras mais grosseiras, não

talhadas e encontradas avulsamente, eram adotadas nas alvenarias, onde se

encontrariam escondidas pelas argamassas de revestimento. Em alguns edifícios

nobres, a pedra vinha talhada diretamente de Portugal e montada na colônia

brasileira, como ocorreu, por exemplo, na Basílica da Conceição da Praia, em

Salvador.

Nessa esfera, para esta dissertação, com vistas à análise do comportamento

físico e estrutural dos muros antigos, foi necessário avaliar as pedras mais comuns

encontradas nas alvenarias tradicionais, entender a estrutura da rocha e o que as

bibliografias dizem sobre as resistências e propriedades dos elementos líticos.

3.1.1.2 Propriedades físicas das pedras mais comuns, utilizadas nas alvenarias

antigas

Os diversos tipos de pedra possuem características específicas, que

dependem diretamente da composição dos variados minerais que as estruturam.

Assim, o estudo dessas particularidades foi concentrado nos quatro principais

materiais pétreos encontrados nas paredes resistentes da primeira Capital do Brasil:

granitos; arenitos; calcários dolomíticos; e o lioz, no caso de muros de pedra

talhada.

3.1.1.2.1 Granitos

Os granitos, que podem ser encontrados em toda a costa baiana, são rochas

endógenas (magmáticas), formadas mediante o gradual esfriamento do magma,

116 OLIVEIRA, M. M. de. As fortificações portuguesas de Salvador quando Cabeça do Brasil, op. cit., p.153.

Page 67: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

66

apresentando estrutura granular compacta e cristais de grandes dimensões117. Yates

expõe suas principais características:

Granites are coarse-grained acidie rocks and consist mainly of quartz, mica and feldspars. Their porosity is usually very low and this, together with their mineral composition, makes them very resistant to weathering [...] The wide range of colours and appearances, combined with strength and hardness, means that granite is commonly used in buildings and elsewhere […].118

A coloração dessa pedra vai depender da variação dos minerais constituintes

do elemento lítico119. À beira-mar, em Salvador, é possível encontrar, também, em

grande escala, pedras metamórficas derivadas do granito, chamadas gnaisse ou

gneiss.

Em solo soteropolitano, de maneira geral, demonstram-se com uma coloração

escura, muito próxima ao preto ou cinza, o que indica grande presença de micas e

biotitas (maioria), piroxênios e anfibólios120. Quanto maior a presença de mica, maior

a dureza e, por consequência, maior a resistência e menor a trabalhabilidade.

Existe uma grande variedade de rochas denominadas granitos. Alguns destes

podem ter, por exemplo, cor amarelada, sendo menos duros. Outras variedades,

além dos gnaisses, são os micaxistos, sienitos e foiaítos.

De maneira geral, esse material lítico tem características mecânicas próximas

para cada tipo, resistindo bem aos esforços de compressão em todas as direções121.

A densidade de duas espécies desta classe de pedras, de Leixões, Portugal, é

descrita por Santos Segurado122:

– Granito brando: 24,58 kN/m³;

117 BOERI, A. Pietre naturali nelle costruzioni: requisiti – criteri progetualli – applicazione – prestazioni. 5.ed. Milano: Hoepli, 2000. p.12. 118 “Granitos são rochas ácidas, de granulação grossa, e consistem, em sua maior parte, de quartzo, mica e feldspato. Sua porosidade é muito baixa e isso, junto com sua composição mineral, torna-os muito resistentes às intempéries [...]. A grande gama de cores e aparências, combinadas com a resistência e a dureza, faz que o granito seja comumente usado em edifícios e em outros diversos locais” (YATES, T. Natural building stone. In: DORAN, D.; CATHER, B. Construction Materials: reference book. 2.ed. New York: Routledge, 2014. p.202. Tradução nossa). 119 Alguns autores, como Tom Yates, relatam que os minerais principais do granito são o quartzo, feldspato e a mica, embora existam, também, piroxênios e anfibólios. 120 SANTOS, A. M. A. Exposição ocupacional a poeiras em marmorarias: tamanhos de partículas característicos. 2005, 376f. Tese (Doutorado em Engenharia Metalúrgica e Minas) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005. p.12. 121 SANTOS SEGURADO, J. E. Materiais de construção. 4. ed. Lisboa: Ed. Bertrand, 1940. p.12. 122 Id., ibid., p.4.

Page 68: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

67

– Granito regular: 24,90 kN/m³;

– Granito duro: 25,28 kN/m³.

Seu peso específico aparente, segundo a NBR 6120123, é de 28 kN/m³, apesar

de outros autores afirmarem que esse parâmetro varia de 25 kN/m³ a 29 kN/m³, e

sua resistência à compressão está, geralmente, entre 60 e 180 MPa. Já o módulo de

elasticidade médio e o coeficiente de Poisson, segundo estudos de Stowe124, são da

ordem de 68000 MPa e 0,22, respectivamente.

3.1.1.2.2 Arenitos

O arenito, na Bahia, é uma pedra sedimentar de cimentação calcária e,

outrossim, é, provavelmente, o lito mais utilizado para a construção de alvenarias

tradicionais na costa portuguesa das Américas, visto a abundância desse material

pétreo.

Yates relata a formação desta pedra:

Sandstones were formed by fragmentation of earlier rocks such as gnaisses and igneous rocks. The particles of parent rock were transported mainly by the action of water and deposited in layers on the floor of seas and lakes, althought transportation could also occur by other mechanisms such as wind action and glaciers […] the finer particles would be carried further than coarsed ones, and the longer the sediment took to be deposited the more well sorted will be […] Once the sediment has been laid down it can be bound together by a number of different cements.125

Arenitos apresentam, em suas generalidades, quartzo, sílica, mica e feldspato

como minerais fundamentais, embora sua concepção vá depender das diversas

123 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6120: Cargas para cálculos de estruturas de edificações. Rio de Janeiro,1980. p.2. 124 STOWE, R. L. Strength and deformation properties of granite, basalt, limestone and tuff at various loading rates. Versão digitalizada. Vicksbourg: U.S. Army Corp. of Engineers, 1969. p.59. 125 “Arenitos foram formados pela fragmentação de rochas elementares como gnaisses e rochas ígneas. As partículas da rocha-mãe foram transportadas, de maneira geral, pela ação da água e depositadas no fundo de mares e lagos, embora o transporte pudesse ocorrer, também, por outros mecanismos, como ventos e geleiras [...] as partículas mais finas seriam levadas mais longe que as mais grossas, e quanto mais tempo a sedimentação demorasse, mais diversificada seria [...]. Uma vez que a sedimentação tenha sido assentada, ela pode ser unida através de diversos tipos de cimentos” (YATES, T. Natural building stone, op. cit., p.202. Tradução nossa).

Page 69: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

68

rochas mães que deram origem ao material lítico. Dentre as sandstones126, existem,

por exemplo, as beachrocks127, que enquadram os arenitos da costa baiana, entre

os quais, nesse contexto, segundo estudos de Caparó, "há uma predominância de

grãos de quartzo, em quantidade superior a 90%"128.

Também é importante relatar que, entre os diversos tipos de cimentação que

podem unir os sedimentos de um arenito, podem-se citar:

1 – sílicática; 2 – calcífera; 3 – ferrífera; 4 – argilífera.

Segundo a NBR 6120129, o peso específico aparente dos arenitos é de 26

kN/m³, sendo os mais leves entre as pedras analisadas nesta dissertação, e a

resistência, de acordo com Caparó130, varia de 44 MPa a 57 MPa, em amostras

secas, e de 33 MPa a 42 MPa, no caso de corpos de prova úmidos131. Estudos de

Vallejo e colaboradores132 revelam que o módulo de elasticidade do arenito pode

ficar entre 2942 MPa e 59820 MPa. Ademais, seu coeficiente de Poisson tem grande

oscilação, entre 0,1 e 0,4.

3.1.1.2.3 Calcários dolomíticos

Outros materiais líticos utilizados para edificação de monumentos na Bahia são

os calcários dolomíticos, os quais, visualmente, podem ser confundidos, por um

leigo, com o arenito, embora possuam comportamento diversos do primeiros.

126 Arenitos (Tradução nossa). 127 Arenitos de praia (Tradução nossa). 128 CAPARÓ, E. F. Os arenitos de cimentação calcífera dos antigos edifícios em Salvador:.., op. cit., p.37. 129 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6120, op. cit. 130 CAPARÓ, E. F. Os arenitos de cimentação calcífera dos antigos edifícios em Salvador:.., op. cit., p. 127. 131 As dimensões dos corpos de prova eram de aproximadamente 7x7x7 cm (CAPARÓ, E. F. Os arenitos de cimentação calcífera dos antigos edifícios em Salvador:.., op. cit., p.127). 132 VALLEJO, L. I. G.; FERRER, M.; ORTUÑO, L.; OTEO, C. Ingeniería Geologica. Madrid: Prentice Hall, 2002.

Page 70: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

69

Os últimos estudos sobre essas pedras, em Salvador, relatam que se tratam de

rochas carbonáticas nas variedades de cálcio e magnésio133, CaMg(CO3)2, com a

presença de argilominerais expansivos como a ilita134, no caso daquelas

encontradas no litoral baiano.

Apresentam, por vezes, elementos fósseis em sua composição. São calcários

com elevada porosidade e pouca resistência aos agentes atmosféricos. Dessa

maneira, é possível examinar relatos do início do século, que condenam a utilização

dos calcários na parte externa da edificação:

[...] deterioram-se facilmente em contacto com a água carregada de ácido carbónico e por isso essas pedras não se devem empregar em construções à superfície das águas, porque tendo estas sempre em dissolução o anidrido carbónico. [...] não deve ser prescrito na construção de abóbadas ou paredes exteriores onde estejam submetidas à acção das chuvas, visto estas terem em dissolução o ácido cabónico do ar. Deve reservar-se estes calcáreos para a alvenaria.135

Por outro lado, a utilização dessas pedras em paredes resistentes, protegidas

da ação da água, como supracitado por Santos Segurado, pode, em teoria, trazer

boas características mecânicas à alvenaria, tendo em vista a sua capacidade

elástica, embora isso dependa de diversos outros fatores, como, por exemplo, da

dureza do elemento pétreo e de sua resistência à compressão.

Um exemplo clássico da utilização desses materiais líticos em monumentos

baianos é encontrado no pilares do claustro de um dos mais importantes prédios

soteropolitanos: a Igreja e Convento de São Francisco. Em ensaio realizado na

Universidade Federal da Bahia, com corpos de provas cúbicos, e em condições

normais, a pedra retirada do monumento franciscano apresentou uma resistência

mecânica de 76 MPa.

A NBR 6120136 descreve que o peso específico aparente dos calcários é de 28

kN/m³, e as pesquisas de Vallejo e colaboradores137 indicam que o módulo de

elasticidade dessas pedras varia de 3922 MPa a 50001 MPa. O coeficiente de

Poisson oscila de 0,29 a 0,34.

133 OLIVEIRA, M. M. de. Pedra: arquitetura e restauração, op. cit., p.7. 134 Id., loc. cit. 135 SANTOS SEGURADO, J. E. Materiais de construção, op. cit., p. 13. 136 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6120, op. cit. 137 VALLEJO et al. Ingeniería Geologica, op. cit.

Page 71: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

70

3.1.1.2.4 Lioz

O lioz é uma rocha calcária não natural do Brasil, chamada pelos antigos

construtores de "Pedra do Reino"138, pois se tratava de um elemento construtivo

vindo do Reino de Portugal. Durante as viagens transatlânticas, em período colonial,

o lioz era utilizado como lastro que assegurava a estabilidade das embarcações139.

As pedreiras desse material são encontradas, em sua grande maioria, no

entorno de Lisboa e, como relatado anteriormente, foi trazido pelos portugueses,

durante a colonização, para a edificação de prédios religiosos importantes ou

adornar casarões e solares dos nobres da primeira Capital brasileira. Suas

características físicas são citadas por Santos Segurado:

A pedra de lioz é um calcáreo branco, compacto, por vezes venado de côr rosa; recebe bem o pulido, ficando então com a côr branca suja ou amarelada, de aspecto desagradável. É a transição do mármore para o calcáreo comum. Emprega-se em estatuaria, no estado fosco, bem como em arquitectura, escultura e mobiliário. Aproveita-se como pedra de cantaria.140

Essa pedra era considerada altamente valiosa e, na maioria dos exemplos,

quando trabalhada em cantaria, possuía funções estéticas. Embora não existam

relatos da utilização do referido lito compondo alvenarias mistas internamente,

revestidas com argamassas, é possível encontrar esse elemento pétreo exercendo

papel estrutural, como na caso da antiga Igreja dos Jesuítas em Salvador.

Seu peso específico aparente, sendo uma pedra calcária, segundo a NBR

6120141, é igual ao dos dolomitos e dos granitos (28 kN/m³). Apesar de vários

autores considerarem o calcário de lioz menos resistente que uma pedra de gnaisse,

estudos executados no Mosteiro dos Jerônimos, em Portugal, por exemplo, mostram

que esse material lítico pode resistir até mesmo a tensões de 99 MPa, em corpos de

prova retirados do monumento lisboeta142. Vallejo e colaboradores relatam que o

138 BURY, J. Arquitetura e arte colonial no Brasil. Organização de Myriam Andrade Ribeiro. Brasília: IPHAN/MONUMENTA, 2006. p.183. 139 MARTINS, M. M. Do mar ao ultramar: a transmigração do lioz português para São Luis do Maranhão. Revista de História da Arte e Arqueologia, Campinas, n. 19, p. 101-105, jun. 2013. 140 SANTOS SEGURADO, J. E. Materiais de construção, p. 53-54. 141 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6120, op. cit. 142 ROQUE, J. C. A Metodologia Integrada para avaliação e mitigação da vulnerabilidade sísmica das construções históricas em alvenaria: a Igreja dos Jerónimos como Caso de Estudo. 2009. 231 f. Tese (Doutorado em Engenharia Civil)-Universidade do Minho, Portugal, 2009. p.112.

Page 72: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

71

módulo de elasticidade do lioz oscila de 14099 MPa a 88259 MPa, com o coeficiente

de Poisson ficando entre 0,12 e 0,33.

3.1.1.3 Generalidades físicas e mecânicas a serem levadas em consideração para a

determinação das características das pedras

A classificação da capacidade mecânica de diversos tipos de pedra é relatada

no Quadro 3, a seguir, com base em Attewell e Farmer143:

Quadro 3 – Classificação da capacidade mecânica das pedras, de acordo com sua resistência

Classificação Resistência à compressão (MPa)

Tipo de pedra

Muito fraca 10 - 20 Sedimentar pouco compacta

Fraca 20 - 40 Sedimentar com cimentação fraca

Exemplo: arenito

Razoável 40 - 80

Sedimentar com cimentação forte ou ígneas pouco compactas.

Exemplos: arenito, granito e calcário dolomítico

Forte 80 - 160

Rochas ígneas densas ou metamórficas

Exemplos: granito, gneiss e lioz

Muito forte 160 - 320

Quartzos e rochas ígneas muito densas

Exemplo: granito

Fonte: Elaboração do autor a partir de Attewell e Farmer (1976).

Apesar da referida qualificação, existem diversos fatores que influenciam no

comportamento físico e mecânico da pedra. Alguns desses pontos são relacionados

à natureza do material (os minerais, sua morfologia cristalina e sua porosidade,

como já relatado) e outros dizem respeito à localização da pedreira ou da forma

como o elemento pétreo foi retirado da rocha original. Os materiais líticos extraidos

com a utilização de explosivos possuem menor resistência em relação àqueles

143 ATTEWELL, P. B.; FARMER, I. W. Principles of engineering geology. London: Chapman and Hall, 1976.

Page 73: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

72

obtidos com fio diamantado, por exemplo, considerando o dano à estrutura interna

da pedra.

Nem todas as referidas características podem ser avaliadas para o diagnóstico

do material lítico, no entanto, existem outros parâmetros fundamentais, capazes de

ser classificados através de ensaios destrutivos (maioria) e não destrutivos, que

serão vistos em capítulos posteriores. Os testes não realizados in loco, com

equipamentos especiais de laboratório, não entraram no escopo desta dissertação,

no entanto, o conhecimento das possibilidades desses diagnósticos é importante

para sanar qualquer dúvida que venha a surgir na individualização da composição

de uma alvenaria antiga.

Entre inúmeros ensaios, destacam-se, segundo Oliveira144:

1 – Ensaio de mineralogia petrográfica com microscópio petrográfico,

microscópio eletrônico de sonda ou microssonda ou difratometria de Raios X;

2 – Análise do material de base com a utilização de HCL na superfície da

pedra: efervescência forte trata-se de rocha carbonática; efervescência fraca

demonstra probabilidade de calcários dolomiticos; material lítico sem

apresentar efervescência revela rochas como granitos (gnaisses);

3 – Prova mecânica de superfície para avaliar a dureza da pedra, através do

uso do esclerômetro de Martens;

4 – Prova de resistência ao uso e desgaste com jateamentos ou utilizando o

tribômetro de Amsler e abrasímetros;

5 – Caracterização da porosidade do material lítico, por meio do porosímetro a

gás e a mercúrio.

Complementarmente, é pertinente relatar que, de maneira geral, é de extrema

importância ter em conta que o material lítico ideal deve possuir boa resistência à

compressão, necessária para garantir o comportamento estático da edificação;

144 OLIVEIRA, M. M. de. Tecnologia da Conservação e Restauração, op. cit., p. 84; 85; 86.

Page 74: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

73

resistência a intempéries; impermeabilidade à água; boa aderência às argamassas,

utilizadas como ligantes; e bom comportamento ante o desgaste145.

Todos esses atributos podem ser caracterizados com os ensaios supracitados,

no entanto, ainda existem alguns questionamentos sobre o comportamento global

desse material na estrutura:

1 – As particularidades de cada pedra realmente influenciam na resistência de

uma alvenaria?

2 – Materiais líticos pouco resistentes determinam um muro antigo com

comportamento mecânico ruim ou pouco vigoroso?

Faz-se necessário, antes de qualquer conclusão, analisar os outros

componentes que formam as tradicionais paredes resistentes. Isso posto, como

antes relatado, sabe-se que existem alvenarias que não são somente constituídas

por pedras e argamassas, apresentando tijolos em sua composição, ou são

formadas exclusivamente por este material. Este último elemento construtivo é o

próximo a ser analisado.

3.1.2 Os tijolos

A tradição do uso da terra nas construções surge nos primórdios das

civilizações e, atualmente, ainda é um componente construtivo muito utilizado nas

edificações, com a aplicação dos mais diversos tipos de tijolos e telhas, pela sua

grande quantidade e disponibilidade na natureza.

Quando executado como tijolos, determinando elementos de vedação ou

estruturas nos monumentos novos e antigos, esse material de construção possui

três formas gerais de produção, segundo Santos Segurado146:

1 – Tijolos crus ou adobes;

2 – Tijolos ordinários;

145 BOERI, A. Pietre naturali nelle costruzioni..., op. cit. 146 SANTOS SEGURADO, J. E. Materiais de construção, op. cit., p. 93.

Page 75: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

74

3 – Tijolos refratários.

Entre essas denominações, é possível ainda subdividir as categorias em

diversas outras subcategorias, de acordo com as características físicas desses

elementos construtivos, como citado por Rocha147:

a – Tijolo inteiro: maciço de arestas vivas;

b – Meio-tijolo: com metade da espessura do tijolo inteiro;

c – Meio-tijolo especial: quadrados, começaram a ser utilizados no século XX;

d – Tijolo violeta: mesmas dimensões do tijolo inteiro, com metade da largura;

e – Tijolo de terço: como o tijolo inteiro, mas com um terço da largura;

f – Tijoleira: quadrado ou retangular, menos espesso, utilizado para pisos.

A matéria-prima principal dos referidos blocos é a argila, a qual tem

composição variável, a depender do local onde se encontra. Ainda é possível

distinguir os tijolos quanto a sua forma sendo:

1 – Maciços;

2 – Perfurados.

Os tijlos cerâmicos maciços são elementos construtivos muito resistentes à

compressão, podendo ter diversas medidas, a depender do molde utilizado para sua

execução. São, também, mais pesados que os tijolos perfurados, os quais

apresentam em torno de 75% de sua área composta de vazios.

As principais vantagens do uso deste material com furos são a diminuição do

peso próprio por metro cúbico de parede; o isolamento térmico que eles são

capazes de produzir; e um melhor travamento entre os elementos construtivos, visto

a possibilidade de penetração das argamassas.

147 ROCHA, I. Tijolo por tijolo..., op. cit., p. 147; 148.

Page 76: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

75

3.1.2.1 Adobes

Os adobes são elementos construtivos moldados manual ou mecanicamente e

secos ao sol. Por vezes, esse material de construção recebe adição de cal ou se

apresenta misturado a outros elementos. Ao mesmo tempo, os tijolos produzidos

dessa forma mostram pouca resistência à ação da água, não servindo, de maneira

geral, para a composição de alicerces148, mas apenas para paredes sobre

fundações de alvenaria de pedra149. Exemplos desse esquema construtivo podem

ser encontrados, com maior facilidade, em Rio de Contas (na Bahia) e em edifícios

no Estado de Minas Gerais, onde, por vezes, as fundações pétreas demonstram-se

aparentes.

A utilização do adobe é muito frequente nas construções ancestrais, tendo

origem já em época mesopotâmica, sendo, mais tarde, desenvolvida pela civilização

egípcia. Destaca-se o uso desses tijolos durante a Antiguidade, na edificação de

mastabas a partir da 4a dinastia dos povos do rio Nilo, como destaca Cole:

O adobe, mistura de barro e palha adaptada a climas áridos e já utilizada pelos mesopotâmicos em escala monumental para a construção de zigurates (antigos templos escalonados), era o material básico de construção no Egito. O uso do adobe permitia a aplicação de técnicas cotidianas à arquitetura de grande porte.150

Na Cidade do Salvador, esse elemento construtivo foi utilizado, com grande

frequência, nas casas populares urbanas151. Sua utilização ocorreu em período

posterior à fundação da primeira Capital do Brasil, considerando a comum edificação

de muros de terra crua (taipa) nos primórdios da colonização.

3.1.2.2 Tijolos ordinários e refratários

Já outros tipos de tijolos, os ordinários e refratários, são secos ao sol e, depois,

cozidos, para lhes dar dureza e resistência necessárias. Os primeiros podem

148 Embora seja possível encontrar exemplos do uso do adobe em fundação em zonas desérticas, como no Peru. 149 ROCHA, I. Tijolo por tijolo..., op. cit. 150 COLE, E. História ilustrada da arquitetura. Tradução de Lívia ChedeAlmendary, São Paulo: Publifolha, 2011, p. 13. 151 OLIVEIRA, M. M. de. O uso da terra na construção da antiga capital da América Portuguesa: uma memória. In: ASSOCIAÇÃO CENTRO DA TERRA (Org.). Arquitectura de Terra em Portugal. Lisboa: Ed. Argumentum, 2005. p. 86-91.

Page 77: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

76

apresentar-se com terra comum com adição de cal e apresentam cor vermelha; e os

segundos são feitos com argila quase pura, tendo a propriedade de resistirem a

altas temperaturas, sendo empregados exclusivamente em fornos e fornalhas152.

Os engenheiros militares, grandes responsáveis pelas construções nas

colônias portuguesas do Novo Mundo, acreditavam que o melhor material a ser

utilizado para edificação de paredes nos fortes seriam os tijolos cozidos, visto sua

elevada resistência e sua capacidade de não estilhaçar quando golpeados por

projéteis.153 Esses elementos construtivos podiam possuir diversas formas, como já

relatado por Rocha154.

3.1.2.3 Generalidades físicas e mecânicas a serem levadas em consideração para a

determinação das características dos tijolos

Em alvenarias mistas, formadas por pedras e tijolos argamassados, não eram

utilizados os blocos perfurados, uma vez que sua confecção se dava por máquinas

que vieram a surgir apenas no século XIX. A utilização de tijolos maciços era

hegemônica, sendo esse material de construção, de maneira geral, assentado de

forma esparsa em meio a pedras irregulares ligadas através de certo tipo de

argamassa, ou, então, formando cunhais e sendo responsável pela amarração de

alvenarias ortogonais, bem como atuando para o bom imbricamento e coesão das

paredes resistentes.

Embora apresentem diversas qualidades, os tijolos perfurados apresentam

baixa resistência à compressão, sendo de difícil utilização em alvenarias estruturais,

as quais devem possuir boas características mecânicas para evitar o esmagamento

de seus componentes. Esses blocos são amplamente utilizados nas construções

contemporâneas como elemento de vedação, no entanto, como visto no capítulo

anterior, podem ser utilizados para a edificação de alvenarias estruturais, desde que

reforçados e em concordância com outros materiais como vergalhões e grautes.

É recomendável, de acordo com pesquisas italianas, que os ensaios de

resistência à compressão dos tijolos, através de prensas hidráulicas, sejam

152 SANTOS SEGURADO, J. E. Materiais de construção, op. cit., p. 94. 153 OLIVEIRA, M. M. de. As fortificações portuguesas de Salvador quando Cabeça do Brasil, op. cit., p. 152. 154 ROCHA, I. Tijolo por tijolo..., op. cit.

Page 78: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

77

executados em um corpo de prova com três unidades, unidas por um elemento

ligante, de forma semelhante à prevista pela NBR 6460155.

Essa determinação ocorre em virtude de a possibilidade do teste em blocos

singulares apresentar limites de ruptura diferentes dos que ocorrem realmente em

alvenarias antigas. O sistema de corpos de provas, adotado para a realização desse

teste, é chamado Tripletta156. Portanto, em pesquisas atuais europeias, é difícil

encontrar relatos sobre o simples comportamento dos tijolos, pois o ensaio

supracitado é de fácil execução e mais fidedigno para relatar a resistência de uma

composição de blocos assentados com argamassa. Em concomitância, autores

como Antonucci157 relatam que a resistência do simples elemento construtivo é

bastante variada, dependendo das seguintes características:

1 – resistência à compressão e tração em regime monoaxial e pluriaxial;

2 – módulo de elasticidade;

3 – rugosidade;

4 – absorção de água;

5 – resistência ao gelo e degelo e aos agentes químicos;

6 – variação de volume pelo efeito da umidade e temperatura;

7 – forma;

8 – distribuição dos furos, em certos casos.

Além das características citadas acima, é possível que os tijolos possam

apresentar decréscimo de sua resistência com a presença de outros minerais em

155ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6460: Tijolo maciço cerâmico para alvenaria: verificação da resistência à compressão. Rio de Janeiro,1983. 156 Expressão italiana para denominar um conjunto de três elementos. 157 ANTONUCCI, R. Restauro e recupero degli edifici a struttura muraria: analisi e interventi sul "costruito storico". 4.ed. San Marino: Maggioli, 2012. p.201.

Page 79: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

78

sua composição, como, por exemplo, o quartzo158, o que torna a pesquisa do

comportamento de um simples bloco complexa, ainda mais quando levamos em

conta a qualidade de fabricação do produto.

Antonucci ainda explana:

Valutare le caracteristiche elasto-meccaniche della muratura in base a quelle dei suoi componenti dev'essere fatto con prudenza. Infatti, non è tuttora chiaro il meccanismo coinvolto nella deformazione e nel colasso di un prisma di mattoni data la complessità del fenomeno di interazione fra la malta, il mattone, la direzione e la grandezza della forza applicata, relativamente alla geometria del campione.159

A NBR 7170160 determina duas resistências básicas, às quais os tijolos

maciços cerâmicos devem atender para compor uma alvenaria com bom

comportamento mecânico:

1 – 1,5 MPa, para blocos comuns;

2 – 2,5 MPa, para tijolos especiais.

Já a NBR 6120 designa o valor de 18 kN/m³ como peso específico aparente

para esses elementos construtivos.

3.1.3 As argamassas

As argamassas, "almas das alvenarias", como romantizado pelos tratadistas

Vincenzo Scamozzi e Bélidor, utilizadas como ligantes dos elementos estruturais e

como acabamento das paredes, na Bahia, possuíam diversos traços. Argila161, cal e

158 SANTOS, L. C. A. N. A arqueologia da arquitetura e a produção de tijolo na Bahia do Século XVI ao Século XIX. 2012, 433f. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo)-Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2012. p.373. 159 “Avaliar as características mecânicas de um muro com base nas características de seus componentes deve ser feito com prudência. De fato, ainda não é totalmente claro o mecanismo que envolve a deformação e o colapso de um prisma de tijolo, dada a complexidade do fenômeno de interação entre argamassa e tijolo, a direção e a grandeza da força aplicada em relação com a geometria do corpo de prova” (ANTONUCCI, R. Restauro e recupero degli edifici a struttura muraria..., op. cit., p. 201. Tradução nossa). 160 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7170: Cargas Tijolo maciço cerâmico para alvenaria. Rio de Janeiro, 1983. 161 As argamassas compostas por solo são chamadas de “argamassas bastardas” (SANTIAGO, C. C. Argamassas tradicionais de cal, op. cit., p. 27).

Page 80: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

79

areia misturavam-se na composição desses elementos construtivos162, embora o

material principal fosse geralmente a cal aérea. Pode-se afirmar, de acordo com

Oliveira163, que, na maioria das construções do século XVI até o início do século XX,

as proporções entre o aglomerante e o agregado estão entre 1:2 e 1:4, confirmando

as relações preconizadas pelos antigos tratadistas como Vitrúvio e Leon Battista

Alberti.

É importante relatar, também, o papel do solo na mistura das argamassas dos

monumentos na Bahia. Inicialmente refutado por diversos teóricos da área da

tecnologia, para recomposição, o material, segundo Santiago164, a depender do

traço adotado, pode até aumentar a resistência à compressão das argamassas.

Tal dado é de importância fundamental para a pesquisa, visto que

pesquisadores como Martins165 relatam que algumas teorias admitem que a

capacidade resistente da alvenaria, à compressão ou ao corte, é controlada pelas

propriedades das argamassas166.

Nesse contexto, a caracterização das argamassas é ponto chave para análise

dos muros antigos, no entanto, a melhor e mais completa forma de determinar a

natureza desses ligantes ainda é o ensaio laboratorial – destrutivo.

Influenciam, também, no comportamento físico e mecânico da argamassa,

segundo Antonucci167:

1 – resistência ao esforço pluriaxial;

2 – módulo de elasticidade;

3 – aderência;

4 – trabalhabilidade e plasticidade;

162 BAHIA. Governo do Estado. Salvador e a Baía de Todos os Santos, op. cit., p. 89. 163 OLIVEIRA, M. M. de. Argamassas e restauro de edifícios. In: SEMINÁRIO TIRADENTES: CONSERVAÇÃO E PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO, 2003, Tiradentes, MG. Anais... Tiradentes, 2003. p.3. Texto disponibilizado pelo autor. 164 SANTIAGO, C. C. Argamassas tradicionais de cal, op. cit., p.30. 165 MARTINS, L. M. S. Desenvolvimento de ferramenta de cálculo para uma avaliação expedita de estruturas de alvenaria antiga de pedra. 2011. 158f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção e Reabilitação)-Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Viseu/Instituto Politécnico, Viseu, Portugal, 2011. 166 Id., ibid.. 167 ANTONUCCI, R. Restauro e recupero degli edifici a struttura muraria..., op. cit., p.201.

Page 81: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

80

5– capacidade de absorção de água.

Além das supracitadas características, as argamassas vão depender

diretamente da sua fabricação, do tipo de aglomerante utilizado, bem como da

dosagem correta, já relatada pelos antigos tratadistas.

O Quadro 4 é resultado do trabalho de Magalhães168, em seu estudo sobre

ligantes antigos, no qual a pesquisadora relata diversos ensaios sobre a resistência

das argamassas de cal e de cimento, após 90 dias de produção, pelo método das

argamassas regulares.

Quadro 4 – Resistência à compressão das argamassas após 90 dias de produção

Argamassa Resistência

(MPa)

Cal aérea (1:3) 2,0

Cimento e areia (1:4) 2,5

Cal aérea, pozolana e areia (1:2:5) 1,9

Cal hidráulica e areia (1:3) 3,8

Cal com aditivo hidrófugo e areia 1,0

Fonte: Elaboração do autor a partir de Magalhães (2013, p.122).

Os valores acima, no entanto, não representam verdades absolutas, pois

alguns desses elementos ligantes podem possuir variações, as quais podem

aumentar ou diminuir a resistência à compressão do elemento construtivo em

questão. No mesmo estudo, Magalhães169 registra que foram retiradas, e ensaiadas

em laboratório, amostras de diversos monumentos, variando os valores entre 0,8

MPa e 7,1 MPa.

Outro trabalho sobre argamassas tradicionais, experimentado por Veiga170, traz

valores parecidos de força do elemento ligante: entre 0,6 MPa e 6,9 MPa. A autora,

ao mesmo tempo, revela que a medida ideal para a resistência à compressão da

argamassa está entre 0,6 MPa e 2,5 MPa, no caso de revestimentos. Em 168 MAGALHÃES, A. C. A. Degradação de revestimentos de paredes de edifícios antigos: metodologia de diagnóstico. 2013. 161f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo)-Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013. p.122. 169 MAGALHÃES, A. C. A. Degradação de revestimentos de paredes de edifícios antigos..., op. cit. 170 VEIGA, M. R. As argamassas na conservação. In: JORNADA DE ENGENHARIA CIVIL DA UNIVERSIDADE DE AVEIRO: AVALIAÇÃO E REABILITAÇÃO DAS CONSTRUÇÕES EXISTENTES, 1., 2003, Aveiro, Portugal. Anais... Lisboa: LNEC, 2003. Disponível em: <mestrado-reabilitacao.fa.utl. pt/disciplinas/jbastos/Rveiga2CONF-UA-RV.pdf>. Acesso em: 22 jan. 2016

Page 82: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

81

concordância com esse dado, supõe-se que, em caráter estrutural, a resistência da

argamassa deve ser próxima a 2,5 MPa.

3.2 O COMPORTAMENTO ESTRUTURAL DOS MUROS ANTIGOS E SUAS

GRANDEZAS FÍSICAS

A estrutura de uma edificação tem, como objetivo principal, receber as cargas

que incidem sobre o prédio e transferi-las ao solo, com o intuito de manter a

construção em pé. Durante os séculos, como exposto no Capítulo 1, a sociedade

reinventou seus modos de edificar com o estudo de como levar as grandes cargas

recebidas pelos pesados monumentos até o chão.

A evolução dos sistemas estruturais procurou, a cada século, tornar a

construção mais esbelta, sendo esta questão bem exposta ao se notar o grande

avanço da composição das pesadas e robustas construções bizantinas e românicas,

da Alta Idade Média, com as elevadíssimas catedrais francesas com seus arcos

botantes.

As construções góticas são alvo, no século XIX, de estudo por um dos

pioneiros e maiores nomes da história da arquitetura e da tecnologia da restauração:

Eugène Emmanuel Viollet-le-Duc171. O estudo racionalista do famoso arquiteto

francês, o "arauto da modernidade"172, muito influenciou os arquitetos do estilo

internacional, que, já no século XX, inúmeras vezes viam a concepção arquitetônica

como resultado da composição estrutural. Esses estudos são responsáveis pela

evolução da arte de edificar, para a criação de edifícios mais resistentes e mais

ecônomicos, necessidades da vida contemporânea.

Não obstante, a falta de entendimento dos conceitos básicos sobre estruturas

antigas pelos arquitetos modernos não esclarecidos, em concordância com a

necessidade de restaurar e reutilizar monumentos, causou diversos danos às

construções tradicionais.

171 Eugène Emmanuel Viollet-le-Duc (1814 d.C. – 1879 d.C.), arquiteto, teórico da arquitetura, restaurador, professor. Foi responsável pela restauração da Catedral de Paris (Notre-Dame) com Jean-Baptiste-Antoine Lassus; Chefe do Bureau des Monuments Historiques e membro da Commission des Monuments Historiques; seus trabalhos Dictionnaire raisonné de l'architecture française e Entretiens sur l'architecture são verdadeiros clássicos do restauro e da história da arquitetura. 172 OLIVEIRA, M. M.; SANTIAGO, C. C. Viollet-le-Duc e o restauro de Notre-Dame. Salvador: EDUFBA, 2014.

Page 83: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

82

Na Itália, por exemplo, lajes de concreto substituíram os antigos solai in

legno173, em cidades onde a incidência de terremotos era (e ainda é) frequente.

Essa intervenção não previa o comportamento rígido de uma lâmina do referido

material atuando no muro antigo, de desempenho elástico, no caso de uma

solicitação horizontal proveniente do abalo sísmico. O "martelamento"174 causado

por esse elemento novo, dada sua falta de concordância com a parede resistente,

acarretou a ruína de diversos prédios, principalmente na região da Umbria e

Abruzzo.

Nesse contexto, a sapiência dos conceitos físicos fundamentais, que apoiaram

as pesquisas de Viollet-le-Duc e da engenharia da última centena de anos, e as

relações entre causa e efeito das solicitações estruturais são fundamentais para a

evolução da arte de edificar e substanciais para a pesquisa sobre alvenarias antigas,

pois, através desses parâmetros, é possível entender as ações que incidem sobre

uma estrutura e, assim, propor a melhor forma de tratá-las.

3.2.1 Questões básicas: ações, momentos e estabilid ade de um muro

As ações que atuam em uma estrutura são divididas entre estáticas e

dinâmicas, podendo possuir diversas origens e diversas formas de atuação. As

supracitadas solicitações estáticas175 são, segundo Croci176, divididas entre diretas e

indiretas.

As ações dinâmicas são aquelas produzidas por terremotos, ventos, máquinas,

explosões, empuxos horizontais, entre outras. Esse tipo de solicitação, antigamente,

era raramente levado em consideração para análise de paredes tradicionais. Apesar

de o Brasil localizar-se em zona não sísmica, é importante avaliar, por exemplo, a

ação de correntes de ar, do tráfego de veículos e de sons de alta intensidade, que

causam vibrações nas estruturas históricas.

Complementarmente, o comportamento mecânico de uma alvenaria, além das

características dos materiais empregados, depende da forma e da dimensão das

173 Pisos em madeira (tradução nossa). Estrutura em barrotes de madeira com tabuados. 174 BACCO, V. Meccanismi di collasso per effetto di solai di copertura spingenti. Rivista Gazzetta dei Solai, Roma, n. 59, p. 1-7, luglio 2009. Disponível em: <http://www.solaioinlaterizio.it/ sol/newsletter/ n058/news_1.pdf>, Acesso em: 16 set. 2015. 175 Ações permanentes nos edifícios. 176 CROCI, G. Conservazione e restauro strutturale dei beni architettonici. Torino: UTET Libreria, 2001. p. 95.

Page 84: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

83

construções, do tipo de ligação entre os componentes da estrutura e dos defeitos

gerais dos muros e do local onde foi construído o edifício.

Afetam, também, o desempenho da parede, ações antrópicas, as quais são

citadas por Croci177:

1 – movimentações do solo, que causam desconexão entre os elementos

ligantes dos componentes do muro;

2 – aumento das aberturas de uma parede, causando lesões, deformações, e

efeitos de esmagamento;

3 – remoção de paredes internas do edifício, afetando o comportamento do

sistema da estrutura geral;

4 – adição de novo arco ou pilar no conjunto;

5 – ampliação de gabarito;

6 – escavação de galerias, demolições de edifícios vizinhos, construção de

prédios adjacentes.

Croci, em suma, revela que qualquer tipo de modificação na estrutura e no

entorno do sistema pode alterar as ações das forças aplicadas em um muro. Sendo

assim, a análise e a execução de ensaios diagnósticos podem sofrer mudanças nos

resultados de acordo com a condição estrutural da alvenaria escolhida. No caso de

um dos monumentos de estudo definido, como será visto mais adiante, é possível

perceber danos graves nas alvenarias de sustentação.

Além das ações estáticas e dinâmicas que atuam em uma parede resistente, é

importante que o restaurador indague como se dá, fisicamente, a estabilidade de um

muro antigo. A prática em laboratório, através de ensaios destrutivos e a experiência

na determinação do estado de conservação de arquiteturas antigas, aliadas aos

estudos da engenharia da consolidação estrutural, permitiram individualizar as

principais características dos muros tradicionais.

177 CROCI, G. Conservazione e restauro strutturale dei beni architettonici, op. cit., p. 95 (Tradução nossa).

Page 85: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

84

Desse modo, sabe-se que as paredes resistentes possuem grande resistência

à compressão e pouquíssima resistência à tração, portanto, qualquer carga vertical é

bem recebida pelo muro, enquanto os esforços horizontais podem causar sérios

danos à alvenaria ou monobloco. Segundo Appleton178, a grande espessura desse

sistema construtivo justifica-se por razões de natureza estrutural e mecânica:

Na verdade, as alvenarias que constituem estas paredes não apresentam resistência à tracção e, pelo contrário, resistem razoavelmente a esforços de compressão e menos a esforços de corte. Assim, a largura, aparentemente excessiva das paredes, justifica-se por razões de efeitos somativos: uma parede larga é pesada e, portanto, a compressão daí resultante funciona como uma força estabilizadora.179

Além do supracitado benefício, a ampla largura dessas paredes resistentes

influencia na diminuição da esbeltez da estrutura, ou seja, interfere na probabilidade

de inclinação e curvatura de um muro, evitando sua instabilidade fundamental.

Trata-se do aumento do núcleo central que, do ponto de vista da resistência dos

materiais, "[...] aumenta a capacidade da parede a suportar forças de derrubamento,

sem que se corra o risco de se instalarem nas secções tensões de tração, às quais

estaria necessariamente associada a fendilhação do material"180.

A Figura 18 demonstra, através de um esquema de forças, a importância da

espessura de uma parede resistente para sua estabilidade. Sabe-se que a

solicitação do peso próprio de uma alvenaria (P) está diretamente aplicada em seu

centro de gravidade, que, no caso de uma parede com seção próxima a um

retângulo, pode ser encontrada no ponto de intersecção entre as diagonais desse

segmento.

178 APPLETON, J. Reabilitação de edifícios antigos: patologias e tecnologias de intervenção. 2.ed. Alfragide: Edições Orion, 2011. 179 Id., ibid., p.20. 180 Id., loc. cit.

Page 86: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

85

Figura 18 – Modelo do comportamento estático de uma parede de alvenaria

Fonte: Appleton (2011, p.20).

É admitido, no entanto, que a solicitação seja aplicada fora do centro de

gravidade. Isso tem relação, muitas vezes, ao desaprumo do elemento estrutural,

tendo em vista a existência de uma força horizontal (H). A solicitação (H), a qual

pode ser resultado de diversas ações, desde o efeito de ventos até o empuxo de

coberturas, gera um momento (M), responsável pela derrubada do muro. O espaço

admitido (e) para aplicação do peso próprio fora do centro de gravidade, então, será

diretamente proporcional ao momento (M) e inversamente proporcional ao peso

próprio (P) da parede resistente: M/P. Esse resultado deve ser menor que um sexto

da largura do elemento estrutural (a), visto que um valor maior que o referido

resultaria na aplicação do peso próprio fora do terço médio da base da parede

resistente, causando a queda do muro.

A função da grande largura das alvenarias estruturais está relacionada

diretamente à relação descrita no parágrafo anterior. Quanto maior a espessura,

maior é o terço médio da base. Oliveira181 estuda esse problema ao descrever a

verificação do empuxo de arcos, abóbodas e cúpulas: "Para se verificar a ação do

empuxo sobre as paredes de apoio e a condição de estabilidade do sistema

estrutural deve-se encontrar o baricentro do maciço onde se apóia o arco ou 181 OLIVEIRA, M. M. de. Tecnologia da Conservação e Restauração, op. cit.

e = M/P < a/6

Page 87: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

86

abóboda [...]"182 e, adicionalmente, "[...] encontrar as resultantes destas forças

concorrentes, que não deverá passar fora do terço médio da base, sob pena de

termos um sistema instável"183.

Sabendo-se, então, o princípio de estabilidade das paredes estruturais, faz-se

necessário entender os resultados das diversas ações que fomentam a instabilidade

do sistema estrutural. Essas consequências são as denominadas patologias. O

entendimento delas é substancial para o relatório do estado de conservação e

projeto de diagnóstico estrutural.

3.2.2 Patologias que afetam a estabilidade da estru tura

Saber reconhecer os problemas que estão relacionados ao surgimento de

patologias em muros antigos é de fundamental importância para avaliação física e

mecânica de paredes resistentes, visto que o diagnóstico do estado de conservação

desses elementos estruturais deve dar opções para a consolidação dos muros

antigos.

É importante levar em consideração que o próprio peso da edificação, sem a

influência de fatores externos, pode causar patologias em um monumento antigo.

Todo prédio pode sofrer com a ação do tempo, como ocorre nos organismos vivos,

e, consequentemente, ter complicações decorrentes da fadiga estrutural.

Portanto, faz-se necessário avaliar, inicialmente, se os problemas sofridos pela

construção são relacionados ao relaxamento da estrutura, considerando o efeito do

tempo, ou de fatores externos. Retomando a palavra do tratadista Jean Baptiste

Rondelet:

Tous les effects qui tendent à détruire les edifices, proviennent de la pesanteur, laquelle agit en raison des obstacles qu'elle éprouve. Lorsque des corps pesants son posés immédiatement les uns sur les autres, le resultat de leur effort est un simple pression susceptible de produire le tassement ou l'écrasement de parties qui les soutiennent.184

182 OLIVEIRA, M. M. de. Tecnologia da Conservação e Restauração, op. cit., p.201. 183 Id.. loc. cit. 184 “Todos os efeitos que tendem a destruir os edifícios provêm da gravidade, a qual age em razão dos obstáculos que ela encontra. Quando os corpos pesados são colocados imediatamente uns sobre os outros, o resultado dos seus esforços é uma simples pressão suscetível a produzir sua compressão ou esmagamento das partes que os sustentam” (RONDELET, J. B. Traité théorique et pratique de l'art de bâtir, op. cit., p.72. Tradução nossa).

Page 88: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

87

Com relação às razões degradantes, de caráter externo, existem diversos

autores que separam os danos aos elementos estruturais em diversas categorias.

Munõz185, por exemplo, segue o exemplo de Russo186 em seu Lesiones de los

edificios187, e divide as lesões dos muros em seis grupos, de acordo com as causas

dos danos: lesões de acomodação ou adaptação; lesões por recalque ou

assentamento; lesões por esmagamento; lesões por rotação; lesões por

escorregamento e lesões decorrentes de fenômenos endógenos.

Nesse âmbito, para esta dissertação e para um entendimento sucinto dessas

patologias, com vistas à aplicação de inspeção visual e ensaios não destrutivos,

essas anomalias foram agrupadas em três segmentos básicos. É importante levar

em consideração que os danos mais frequentes, em alvenarias antigas, são aqueles

relacionados a:

1 – diminuição da seção do muro;

2 – esmagamento;

3 – movimentos de fundações e muros.

O primeiro grupo supracitado diz respeito a lesões superficiais que, no decurso

do tempo, podem diminuir a seção do elemento estrutural, causando a debilidade do

muro. O segundo e terceiro segmentos concernem às patologias que podem

ocasionar, diretamente, o colapso da estrutura mural.

Além dos grupos descritos acima, existem outras diversas causas patológicas

que podem estar relacionadas aos três grupos supracitados, mas não estão

diretamente ligadas ao dimensionamento do elemento estrutural nem ao sistema e

podem avançar o estado de desgaste físico e mecânico da parede resistente. Trata-

se de lesões decorrentes da presença de água, degradação biológica, ataque de

agentes climatéricos188 e vibrações. Embora seja de extrema relevância o estudo

desses atores de degradação, o conhecimento dos fenômenos citados no parágrafo 185 MUÑOZ, R. Acidentes e desastres em um trecho da falha de Salvador: um estudo na busca da preservação dos edifícios de interesse cultural. 2009. 376 f. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo)-Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2009. v. 1, p. 109. 186 RUSSO, C. Lesiones de los edificios. Barcelona: Salvat Editore, 1934. 187 Lesões dos edifícios (Tradução nossa). 188 APPLETON, J. Reabilitação de edifícios antigos..., op. cit., p. 103.

Page 89: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

88

anterior é de maior interesse para este trabalho e são descritos a seguir. Croci

destaca a importância dessa pesquisa:

Un esame dei differenti tipi di dissesto è molto importante perché la distribuzione delle deformazioni, delle lesioni, ecc. è legata al comportamento strutturale e alle azioni che l'hannno prodotta. L'esame dei dissesti e la conoscenza dei fenomeni corrispondenti è quindi un elemento fondamentale per una buona diagnostica.189

3.2.2.1 Diminuição da seção do muro

Segundo Pinho190, o fenômeno da desagregação é uma patologia muito usual

em paredes resistentes de edifícios antigos, sendo resultado da ação de agentes

atmosféricos, como a alternância de frio e de calor, chuva e ventos. O

envelhecimento do monumento ou o agravamento de outras anomalias, como, por

exemplo, fissuração, rachaduras ou esmagamentos, podem tornar o edifício mais

sensível a essa patologia.

Esse fenômeno é mais comum no nível do solo, onde ações de vandalismo,

choques e o ataque biológico são mais propícios. O constante contato da parte baixa

da parede resistente com a água, em períodos chuvosos, proporciona uma

maximização das referidas degradações.

As Figuras 19 e 20 são da Capela de Nossa Senhora do Vencimento,

localizada no Recôncavo baiano, e ilustram esse tipo de dano. A desagregação

demonstrada é fruto, primeiramente, da evolução de rachaduras na parte posterior

do monumento e da lixiviação da fachada pela ação da água, causando a perda de

material de revestimento e diminuição da seção estrutural.

189 “Um exame dos diferentes tipos de patologias é muito importante porque a distribuição das deformações e das lesões é ligada ao comportamento estrutural e às ações que os produziram. O exame das patologias e o conhecimento dos fenômenos correspondentes são elementos fundamentais para um bom diagnóstico” (CROCI, G. Conservazione e restauro strutturale dei beni architettonici, op. cit., p. 115. Tradução nossa). 190 PINHO, F. F. S. Soluções construtivas de paredes de edifícios antigos em Portugal. In: REPAR 2000: ENCONTRO NACIONAL SOBRE CONSERVAÇÃO E REABILITAÇÃO DE ESTRUTURAS, 2000, Lisboa. Anais... Lisboa: LNEC, 2000. p.137.

Page 90: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

89

Figura 19 – Muro da fachada posterior da Capela de Nossa Senhora do Vencimento

Figura 20 – Base do muro da fachada posterior da Capela de Nosa Senhora do Vencimento

Fonte: Acervo do autor (dez. 2014). Fonte: Acervo do autor (dez. 2014).

Na base da parede resistente, é possível perceber grande fragmentação,

provavelmente fruto, além da presumível movimentação do terreno, do ataque

biológico (ação de animais, desenvolvimento de vegetais superiores e manifestação

de microorganismos) e da lavagem da parte mais baixa do muro pelas águas

pluviais respingadas.

3.2.2.2 Esmagamento

O esmagamento, em estruturas antigas, é uma patologia extremamente

perigosa, podendo causar o colapso de um monumento. De acordo com Croci191, tal

ação ocorre quando os esforços de compressão, em uma parede resistente, chegam

a valores próximos aos parâmetros de resistência dos materiais componentes do

muro combinados. Esse fenômeno pode estar relacionado, também, à fadiga ou

deterioração das argamassas que compõem a estrutura. À medida que esse

fenômeno se desenvolve, é possível verificar o aparecimento de fissuras na mesma

direção da solicitação e, usualmente, distribuídas uniformemente na base da parede.

A Figura 21 demonstra um caso de esmagamento pontual. Nessa situação,

onde não haja esforços horizontais, esses danos terão, na maioria das vezes,

também comportamento vertical, que parte do ponto de sobrepeso, na situação de

191 CROCI, G. Conservazione e restauro strutturale dei beni architettonici, op. cit., p. 116.

Page 91: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

90

cargas pontuais, até o solo, seguindo as linhas isostáticas de mínimo da parede.

Esse fenômeno ocorre, principalmente, em zonas de contato lateral, entre vigas de

madeira e a alvenaria.

Figura 21 – Vistas (A e B) e Seção (C) do fenômeno de esmagamento

Fonte: Elaboração do autor a partir de Oliveira (2006, p.170).

O princípio das lesões verticais dadas por esmagamento ocorre, no caso de

paredes argamassadas, pela diferença de elasticidade do ligante, em relação aos

outros materiais que fazem parte do muro (pedras, tijolos, ou uma composição dos

dois primeiros). A expansão veloz da argamassa, em relação a pedras e tijolos, é

responsável por uma solicitação de tração horizontal interna dos elementos

construtivos combinados, causando a rachadura desses materiais, não resistentes a

esse tipo de esforço. As lesões sempre serão perpendiculares às tensões.

Além das consequências já relatadas, existe outro distinto fenômeno que

ocorre através do esforço de esmagamento: é possível que o muro expulse material

da porção central de sua secção, causando um abaulamento da parede resistente

em sua parte mediana.

Appleton192 explica que se trata de um caso relacionado à deficiência de

construção, quando a alvenaria não apresenta blocos grandes, que atravessem toda

a secção do muro (perpianhos), sendo um problema diretamente relacionado à

heterogeneidade dos elementos constituintes do sistema estrutural.

192 APPLETON, J. Reabilitação de edifícios antigos..., op. cit., p.109.

A

B

C

Page 92: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

91

Fisicamente, o esmagamento diz respeito à ação exarcebada de uma força de

compressão, causando um forte Efeito Poisson193, grandeza que será vista mais

adiante nesta dissertação e que tem relação direta com a razão tensão/deformação.

Adicionalmente, no que concerne ao comportamento físico do muro, esse

acontecimento pode verificar-se junto à ocorrência de flambagem da estrutura

tradicional, estando a flambagem diretamente ligada à altura da parede resistente e

sua relação com a espessura. Segundo Oliveira194, isso ocorre quando a altura do

muro, que sofre esta solicitação excessiva, é maior quinze vezes que a menor

dimensão da seção.

Outrossim, relata Muñoz195, é possível interpretar o acontecimento do

esmagamento ao golpear a alvenaria com um martelo e ouvir um som de "vazio":

"Em 90% dos casos, percebe-se a desagregação das argamassas ao contato, pois

se pulverizam facilmente entre os dedos"196.

3.2.2.3 Movimentos de fundações e muros

De maneira geral, as causas do aparecimento de lesões em uma estrutura

antiga, conforme relata Oliveira197, dizem respeito aos movimentos de fundação,

deslocamento do terreno e/ou rotação dos muros em elevação por diversos tipos de

empuxo como, por exemplo, a força de arcos, abóbodas, terreno e solicitações

decorrentes de problemas nas coberturas. Esses problemas podem estar

relacionados, também, a condições particulares, como, por exemplo, a falta de arco

de descarga em um vão, ou a má qualidade de uma construção. Muñoz198, a partir

de Razini e Negro199, classifica os danos em uma estrutura, incluindo sua descrição

e a espessura aproximada das fendilhações.

193 Trata-se do efeito de expansão horizontal, de um material, após o recebimento de uma carga vertical. 194 OLIVEIRA, M. M. de. Tecnologia da Conservação e Restauração, op. cit.,p.170. 195 MUÑOZ, R. Acidentes e desastres em um trecho da falha de Salvador..., op. cit. 196 Id., ibid., p.123. 197 OLIVEIRA, M. M. de. Tecnologia da Conservação e Restauração, op. cit., p.163. 198 MUÑOZ, R. Acidentes e desastres em um trecho da falha de Salvador..., op. cit., p.102. 199 RANZINI, S. M. T.; NEGRO Jr., A. Obras de contenção: tipos, métodos construtivos, dificuldades executivas. In: HACHICH, W.; FALCONI, F. F.; SAES, J. L.; FROTA, R. G. Q.; CARVALHO, C. S.; NIYAMA, S. Fundações: teoria e prática. São Paulo: PINI, 1998. p.497-515.

Page 93: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

92

O Quadro 5 é uma adaptação dos dados fornecidos pelos referidos autores,

relacionando a dimensão das trincas com o tipo de lesão que pode ocorrer em uma

parede resistente.

Quadro 5 – Classificação dos danos em edificações

Classe do dano Descrição do dano Espessura da trinc a (mm)

Denominação

Desprezível Trincas capilares. < 0,1 Craquelê

Muito pequeno Trincas na alvenaria externa de fácil reparo.

< 1,0 Craquelê e fissuras

Pequeno Trincas externas visíveis e sujeitas à infiltração.

< 5,0 Fissuras e trincas

Moderado O fechamento das trincas requer significativo

preenchimento. Pode ser necessária a substituição

de pequenas áreas de alvenaria.

5,0 a 15,0 Trincas e rachaduras

Severo Necessidade de reparos envolvendo remoção de

trechos de parede, principalmente sobre

portas e janelas. Paredes fora do prumo e utilidades interrompidas.

15,0 a 25,0 Fendas e rachaduras

Muito severo Reparos significativos envolvendo reconstrução parcial ou total. Paredes requerem escoramento. Perigo de instabilidade.

>25,0 Brechas e Fendas

Fonte: Elaboração do autor a partir de Muñoz (2009, p.102).

As menores lesões existentes são aquelas superficiais, as quais apresentam

dimensões menores que 0,1 mm. Essa deteriorização que é conhecida como

"craquelê", que afeta, em grande parte, os revestimentos. As lesões estão

diretamente ligadas à expansão do material invólucro ou à divergência de

comportamento entre a base e a sua cobertura, não estando relacionadas a

problemas estruturais. Os danos apresentam maior significância, para um muro

antigo, quando se trata de trincas. Muitos autores tratam o termo como fendilhações

de maneira geral, desde lesões pequenas até grandes rachaduras. Para esta

dissertação, no entanto, é utilizado o termo fissuras para aquelas lesões de menor

Page 94: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

93

influência para o colapso da estrutura, que são menores que 0,5 mm de espessura,

as quais são diferentes de rachaduras que apresentam maior dimensão e largura.

De acordo com Pinho200, esses fenômenos são muito recorrentes quando perto

das aberturas de portas e janelas, zonas mais frágeis da construção, pois são áreas

de grande convergência de forças. Do mesmo modo, essa patologia pode ser

encontrada com facilidade em paredes resistentes, sem elementos de ligação entre

elas, e as quais não se comportam como uma caixa estrutural conexa, com

movimentação uniforme. Appleton relata:

As aberturas para portas e janelas são naturalmente pontos fracos destes elementos, já que no seu contorno, e especialmente nos cantos, ocorrem concentrações de tensões que estão na origem do início e progressão do fenômeno de fendilhação. Esta é uma realidade bem conhecida e que sempre levou a que cuidassem com especial atenção os pormenores construtivos nestas zonas.201

Portanto, antes de qualquer projeto de restauração, é importante avaliar se a

intervenção prevê novas aberturas no muro tradicional, podendo a proposta

promover sérios danos ao monumento. A Figura 22 demonstra alguns exemplos de

trincas e fendilhações causadas pela próximidade do prédio a árvores de grande

porte (A), recalques do terreno (B) e umidade do terreno (C.1 e C.2).

Figura 22 – Fendilhamentos e rachaduras provenientes de movimentação do terreno

Fonte: Elaboração do autor a partir de Cóias (2006, p.3).

200 PINHO, F. F. S. Soluções construtivas de paredes de edifícios antigos em Portugal,op. cit., p.138. 201 APPLETON, J. Reabilitação de edifícios antigos..., op. cit.,p.109.

A B

C.1 C.2

Page 95: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

94

As rachaduras, fendas e brechas são lesões bem mais perigosas, para muros

antigos e novos, podendo causar o colapso estrutural rapidamente, fomentando o

estudo urgente para a consolidação da alvenaria ou do tratamento da causa dos

danos que estão assolando o prédio.

Além das patologias descritas anteriormente (desagregação, esmagamento,

fendilhamento), que podem se agravar para dar espaço a novas lesões mais graves,

Oliveira202 relata os seis movimentos deformantes que se constituem em matrizes

para o aparecimento dessas fissuras e rachaduras problemáticas para as paredes

tradicionais, são eles:

1 – um vertical, relacionado ao recalque do terreno ou retração das

argamassas;

2 – dois horizontais, causados por empuxos laterais gerados pelo cedimento,

afastamentos ou aproximação dos apoios;

3 – três de rotação, que dizem respeito, em sua grande maioria, a

movimentações do solo.

Existem, além do mais, fissuras e rachaduras formadas pela má qualidade da

edificação, como já relatado anteriormente. Não é do interesse desta dissertação

delongar-se sobre elas, no entanto, é importante explicar que patologias estruturais

procedem de acordo com certa lógica mecânica e que o conhecimento do

andamento do dano é essencial para um diagnóstico apurado do muro.

As Figuras 23 e 24 apresentam comportamentos de diversas lesões

ocasionadas pelos casos supracitados.

202 OLIVEIRA, M. M. de. Tecnologia da Conservação e Restauração, op. cit., p.166.

Page 96: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

95

Figura 23 – Comportamento de lesões (em vermelho) por diversos tipos de recalque ou rotação

Fonte: Elaboração do autor a partir de Di Stefano (1990) e Oliveira (2006).

Figura 24 – Comportamento de lesões (em vermelho) por esforços adicionais ou perda de coesão

Fonte: Elaboração do autor a partir de Di Stefano (1990) e Oliveira (2006).

Por fim, Buffarini, D’Aria e Giacchetti afirmam que é de extrema importância a

documentação de todos os danos que se apresentam em um monumento, além de

suas inter-relações no sistema estrutural:

L'analisi delle lesioni, eventualmente riscontrate, dovrà riguardare sia le strutture verticali che quelle orizzontali con l'ausilio, [...] di rilievi del quadro fessurativo e di adeguata documentazione fotográfica.203

203 “A análise das lesões, eventualmente encontradas, deverá dizer respeito tanto às estruturas verticais como às horizontais, com o auxílio [...] dos cadastros do quadro de fissuras e de adequada

Page 97: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

96

Entender o comportamento dessas patologias pode ser uma tarefa complexa

para o restaurador, por isso, além de identificar os danos em um muro antigo, é

preciso que o arquiteto/engenheiro conheça as ações que estão atuando em uma

parede resistente, sendo este um caminho essencial para o entendimento dos

problemas correntes. A base para qualquer estudo de consolidação de estruturas

patrimoniais fundamenta-se na utilização de parâmetros, vistos a seguir.

3.2.3 Grandezas importantes e valores de referência

O Eurocode204, normatização desenvolvida pelo Comité Européen de

Normalisation205 (CEN) destaca, no Capítulo 8, “Eurocode 8”, os quatro parâmetros

mecânicos fundamentais para o estudo de alvenarias antigas, sendo eles relatados

por Cóias206:

1 – resistência à compressão;

2 – resistência ao corte;

3 – resistência à flexão;

4 – relações tensões/extensões207.

Nesse contexto, Buffarini, D’Aria e Giacchetti208 desenvolvem a questão da

avaliação dos supracitados parâmetros, fundamentais para a concepção da

avaliação estrutural de alvenarias, tanto antigas quanto novas. O trabalho de

pesquisa dos autores define que esses critérios deverão ser obtidos por ensaios in

situ ou em laboratório e constituem-se em cinco incógnitas importantes. No entanto,

é importante citar seis destas indispensáveis grandezas:

documentação fotográfica” (BUFFARINI, S.; D’ARIA, V.; GIACCHETTI, R. Il consolidamento strutturale degli edifici in cemento armato e muratura, op. cit., p. 15. Tradução nossa). 204 Eurocódigo (Tradução nossa). 205 Comissão Europeia de Normatização (Tradução nossa). 206 CÓIAS, V. A reabilitação estrutural em edifícios antigos. 2. ed. Lisboa: Ed. Argumentum, 2007. p. 128. 207 Módulo de elasticidade e coeficiente de Poisson. 208 BUFFARINI, S.; D’ARIA, V.; GIACCHETTI, R. Il consolidamento strutturale degli edifici in cemento armato e muratura, op. cit., p.48.

Page 98: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

97

1 – a resistência média à compressão do muro, sinalizada pelo símbolo fm, que

é o valor admitido de tensão para que uma parede estrutural mantenha sua

integridade, sem o aparecimento de qualquer dano de esmagamento ou

fissuração. A unidade de medida desta grandeza, adotada para facilitar a

relação com os dados obtidos pelos ensaios possíveis, é N/mm² ou MPa;

2 – a resistência média ao corte do muro, adotando o símbolo tm, trata-se de

uma grandeza importante em áreas sísmicas, visto que as forças horizontais

que atuam durante um terremoto são responsáveis pelo aparecimento de

reação de forças de corte em alvenarias, causando fissuras ou rachaduras a

45°, pricipalmente em paredes de tijolos com juntas de argamassa bem

definidas. Apesar de citada por Buffarini, D’Aria e Giacchetti, não é de interesse

desta dissertação o aprofundamento teórico sobre o tema, visto a raridade de

abalos sísmicos na Bahia.

Assim como a resistência média de compressão do muro, este parâmetro

apresenta N/mm², ou MPa, como unidade de medida;

3 – o valor médio do módulo de elasticidade209, indicado pela letra E, o qual é

uma propriedade mecânica característica de cada material210 e pode ser

modificado com a composição de diversos elementos construtivos, como

ocorre com os muros antigos.

Esses materiais e compostos singulares podem ter suas características

definidas através do comportamento do seu gráfico de tensão/deformação

(Figura 25), que, por sua vez, é derivado da fundamental lei211 estabelecida,

em 1678, por Robert Hooke212, que deu nome à fórmula. Desse modo, a tensão

(σ) é diretamente proporcional ao produto do módulo de elasticidade (E) e da

deformação (ε):

209 Também chamado de constante de proporcionalidade, por representar a proporção entre tensão e deformação; ou, pode ser determinado como Módulo de Young. 210 ASSAN, A. E. Resistência dos Materiais. São Paulo: Unicamp, 2010. v.1. 211 Id., ibid., p.244. 212 Robert Hooke (1635 d.C. – 1703 d.C.), cientista e professor inglês; principal ajudante do arquiteto Cristopher Wren, responsável pelo projeto da Catedral de St. Paul de Londres, após o grande incêndio; foi o motivador do desenvolvimento de diversos instrumentos importantes para a ciência como barômetros, higrômetros, medidores de chuva e anemômetros.

Page 99: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

98

σ = Εε (1)

Figura 25 – Gráfico tensão/deformação de materiais elástico-lineares (a) e elásticos (b)

Fonte: Assan (2010, p. 244).

Uma vez que a deformação é adimensional (m/m), o referido

parâmetro tem a mesma unidade que a tensão (força/área). Para estar em

concordância com os ensaios descritos posteriormente, foi medido em N/mm²,

ou MPa;

1 – o coeficiente de Poisson, denominado pelo símbolo v, não é relatado por

Buffarini, D’Aria e Giacchetti, no entanto, é importante de citar nesta

dissertação. Trata-se da relação entre a deformação transversal e longitudinal

sendo, portanto, adimensional;

2 – o valor médio do módulo de elasticidade tangencial (ou módulo de rigidez à

torção), sinalizado pela letra G, o qual pode ser obtido por meio de ensaios que

levem em conta a resistência média de corte, descrito anteriormente. O módulo

de elasticidade tangencial é medido em kN/mm², no entanto, o estudo desse

parâmetro não foi aprofundado nesta dissertação, considerando sua relação

direta com a resistência média de corte;

3 – o peso específico médio, adotando o símbolo γ, é uma grandeza tabelada

no Brasil pela NBR 6120/1980. Trata-se de norma importante para o pré-

Page 100: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

99

dimensionamento de lajes, vigas e pilares em prédios novos, de concreto

armado. Sua unidade é kN/m³.

Adicionalmente, são indicados, pelos supracitados autores, valores de

referência para diversos tipos de muros, que devem ser levados em consideração

após a aplicação dos ensaios para obtenção dos parâmetros anteriores.

O Quadro 6 diz respeito somente aos valores de compressão e módulo de

elasticidade, uma vez que são os únicos critérios que podem ser obtidos através dos

equipamentos disponíveis e, também, os parâmetros mais importantes a se avaliar,

tendo em conta a relação direta dessas grandezas com a solicitação da estrutura e

sua deformabilidade.

Quadro 6 – Valores de referência para compressão e elasticidade de alvenarias

Tipologia Mural fm (MPa) E (MPa)

Muros em pedras de diversos tamanhos e desordenadas ou Alvenaria mista

Min – 1,00 Máx – 1,80

Min – 690 Máx – 1050

Muros em pedra irregular com espessura limitada e enchimento interno

Min – 2,00 Máx – 3,00

Min – 1020 Máx – 1440

Muros em pedra talhada desordenada Min – 2,60 Máx – 3,80

Min – 1500 Máx – 1980

Muros em blocos de cantaria esquadrejada Min – 6,00 Máx – 8,00

Min – 2400 Máx – 3200

Muros de tijolos plenos assentados com argamassa Min – 2,40 Máx – 4,00

Min – 1200 Máx – 1800

Fonte: Elaboração do autor a partir de Buffarini, D’Aria e Giachetti (2010, p 48).

Tais valores de referência tratam de alvenarias com características frágeis, no

que diz respeito a argamassas de pouca qualidade, muros não consolidados, pouca

ligação entre os elementos que fazem parte da estrutura, entre outros. No caso de

muros com certa qualidade de materiais e coesão, existem coeficientes

multiplicadores que podem ser utilizados para melhorar os parâmetros do Quadro 6,

de acordo com os seguintes critérios:

1 – argamassa de boa qualidade;

Page 101: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

100

2 – presença de rejuntes e ligações entre os elementos da alvenaria; presença

de elementos de ligações transversais entre os dois lados da parede;

3 – núcleo amplo;

4 – presença de consolidação anterior.

Com tais informações, foi possível elaborar novo quadro com os coeficientes

que devem ser aplicados nos supracitados casos (Quadro 7).

Quadro 7 – Coeficientes de melhoramento

Tipologia Mural Argamassa Presença de rejuntes

Ligação entre paramentos

Núcleo amplo

Consolidação anterior

Muros em pedras de diversos

tamanhos e desordenadas ou Alvenaria

mista

1,5 - 1,5 0,9 2

Muros em pedra irregular com

espessura limitada e

enchimento interno

1,4 1,2 1,5 0,8 1,7

Muros em pedra talhada

desordenada

1,3 - 1,3 0,8 1,5

Muros em blocos de cantaria

quadradas

1,2 1,2 1,2 0,7 1,2

Muros de tijolos plenos

assentados com argamassa

1,5 1,5 1,3 0,7 1,5

Fonte: Elaboração do autor a partir de Buffarini, D’Aria e Giacchetti (2010, p.50).

Outra informação importante, relativa ao peso de muros antigos, está em João

Emílio do Santos Segurado, que também relata, em seu livro Alvenaria e Cantaria,

anteriormente citado, valores da solicitação que atua em paredes resistentes e sua

Page 102: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

101

carga de segurança (valor admitido para o sobrepeso que o muro recebe, que é

igual a 1/10 da tensão de esmagamento).

O autor observa que, para utilizar os valores descritos, é importante levar em

conta o seguinte:

A argamassa ordinária é formada de 1 de cal para 3 de areia; A carga que uma parede ou um pilar podem suportar diminui com a altura, quando esta exceder 15 a 20 vezes a largura da base, apenas se deve tomar 0,25 a 0,50 dos números apresentados; A carga de segurança à tração é cerca de 1/10 dos números que apresentamos.213

As informações contidas no Quadro 8, a seguir, dizem respeito ao peso de

nove tipos de paredes resistentes, no entanto, para esta dissertação, é importante

relevar, com mais atenção, os dados a partir do item 5 até o item 8. Trata-se das

paredes resistentes mais comuns encontradas no Brasil do século XVII ao século

XIX. Adicionalmente, por meio dos valores da carga de segurança, foi possível

estimar a tensão de esmagamento.

Quadro 8 – Pesos e tensões de esmagamento para diversos tipos de muros

Tipo de alvenaria Peso

(kgf/m³)

Tensão de esmagamento

(MPa)

1. Cantaria de pedra muito dura e argamassa ordinária. 2500 a 2700 29 a 58

2. Cantaria de pedra dura e argamassa ordinária. 2300 a 2500 14 a 29

3. Cantaria de pedra semidura e argamassa ordinária. 2200 a 2300 9,8 a 14

4. Cantaria de pedra macia e argamassa ordinária. 2000 a 2200 7,84 a 9,8

5. Alvenaria de pedra e argamassa ordinária. 2000 a 2200 9,8 a 19

6. Alvenaria mista e argamassa ordinária. 1700 a 2000 4,9 a 9,8

7. Tijolo ordinário e argamassa ordinária. 1700 a 1800 5,88 a 7,84

8. Tijolo duro e argamassa ordinária. 1800 a 2000 7,84 a 9,8

9. Tijolo extra duro e argamassa de cimento. 2000 a 2200 9,8 a 14

Fonte: Elaboração do autor a partir de Santos Segurado (1908, p.113).

213 SANTOS SEGURADO, J. E. Alvenaria e Cantaria, op. cit., p.113.

Page 103: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

102

A partir das referidas informações, é possível identificar se as características

físicas e mecânicas dos muros antigos, obtidas através de ensaios não destrutivos,

de caráter quantitativo, estão de acordo com os índices admitidos, ou seja, não

apresentam instabilidade ou possibilidade de dano. Assim, uma parede resistente,

que apresenta parâmetros muito diferentes aos relatados pelos citados

pesquisadores, é passível de consolidação estrutural, sendo os dados já relatados

pelas anteriores pesquisas, pontos base para o cálculo.

Outrossim, através dessas referências, é possível avaliar o dimensionamento

da estrutura adequada de consolidação, com vistas a melhorar as qualidades

mecânicas das alvenarias em questão. Por exemplo: qualquer alvenaria sofrendo

esmagamento pelo seu subdimensionamento ou sobrepeso (ocasionado por

diversos motivos), ao ser ensaiada pelo teste com macacos planos simples (ensaio

que será explicado posteriormente), apresentará uma solicitação superior àquela a

que a parede pode resistir normalmente. Esse valor obtido será, então, a base de

cálculo para o reforço da estrutura.

Considerando a importância da relação teoria-prática para a Ciência da

Restauração, faz-se necessário relacionar tudo já explicitado nesta dissertação com

os testes principais para a avaliação das características físicas e mecânicas das

alvenarias antigas. Esses metódos, pouco ou não destrutivos, são vistos no Capítulo

4.

Page 104: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

103

4 TÉCNICAS DE DIAGNÓSTICO

A pesquisa e a revisão das recomendações e normas para o desenvolvimento

de ensaios, aliadas ao estudo histórico do monumento e ao funcionamento dos

instrumentos, são etapas iniciais, e fundamentais, para a boa execução de testes

diagnósticos em edifícios antigos e novos. Foi necessário, portanto, definir, antes da

análise dos ensaios escolhidos para esta dissertação, alguns conceitos básicos com

relação aos tipos de avaliações que podem ser executados em uma edificação.

4.1 TIPOS DE ENSAIOS

Os testes diagnósticos podem ser divididos de diversas formas, embora sejam,

geralmente, classificados em dois diferentes grupos: técnicas não destrutivas e

técnicas destrutivas. Essa divisão diz respeito ao nível de dano causado ao edifício

com a preparação e execução da técnica. Dentro desses dois grupos, ainda é

possível fazer outra diferenciação no que diz respeito aos dados que esses ensaios

podem oferecer (qualitativos ou quantitativos, globais ou pontuais, diretos ou

indiretos). As técnicas destrutivas, geralmente, são aquelas que dão resultados

quantitativos ao diagnóstico de uma edificação, tratando-se da retirada de elementos

materiais de um edifício para a análise em laboratório. Nas palavras de Binda e

colaboradores:

Servono a definire la composizione delle malte e degli intonaci originali e le caracteristiche chimiche, fisiche e mecchaniche di pietre, mattoni, legni e metalli impiegati nella costruzione esistente. Sono utili in fase diagnostica per verificare l’entità del danno sopratutto riguardante la superficie esterna degli elementi murari o lignei, ma anche per predire la durabilità dei materiali da riparazione e/o dei trattamenti.214

214 “Servem para definir a composição das argamassas e dos rebocos originais, bem como as características químicas, físicas e mecânicas das pedras, tijolos, madeiras e metais empregados na construção existente. São úteis em fase de diagnóstico para verificar a extensão do dano, sobretudo no que diz respeito à superfície externa dos elementos murais ou lígneos, mas, também, para fazer um prognóstico da durabilidade dos materiais para reparações e/ou tratamentos” (BINDA, L.; SAISI, A.; ZANZI, L.; BARONIO, G. Tecniche di indagine e progetto delle indagini per la diagnostica strutturale. In: PESENTI, S. Il progetto di conservazione: linee metodologiche per le analisi preliminari, l'intervento, il controllo di efficacia. Rapporti di ricerca. Politecnico di Milano/Dipartimento di Conservazione e Storia dell'Architettura. Firenze: Alinea, 2001. p.104. Tradução nossa).

Page 105: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

104

É importante mencionar que os pontos de retirada dos corpos de prova devem

ser atenciosamente estudados, para a extração dos elementos mais representativos

da estrutura material da edificação. Além disso, é preciso que essa amostra não

tenha sido fisicamente alterada durante o transporte e/ou extração e, ainda, não

sofrer grandes modificações de temperatura e umidade, que possam ter gerado

resultados não fidedignos. Dentro dessa categoria, é possível citar diversos ensaios,

sendo os principais: compressão monoaxial; tração indireta; dureza superficial;

absorção d’água; presença de sais solúveis; difratometria a Raios X; e gelo215 e

degelo216. O Quadro 9 foi elaborado a partir dos estudos de Cóias217, o qual faz uma

descrição da classificação dos danos de um ensaio e das medidas de reparação,

bem como das construções aceitáveis para a realização do processo diagnóstico.

Quadro 9 – Classificação dos danos causados por ensaios destrutivos e não destrutivos

Classificação do dano

Descrição Danos Medidas de reparação

Construções em que é aceitável

Irrelevante Exemplos:

(Ensaios sônicos, Termocâmera,

Georradar)

Visíveis apenas se procurados, não visíveis

em distância normal.

Marca de martelo, riscos, manchas

d’água.

Nenhuma ou limpeza.

Todas.

Ligeiro Exemplos:

(Endoscopia, Acelerômetros, penetrômeros)

Visíveis de perto, mas, normalmente

imperceptíveis.

Furos de pequeno diâmetro, danos

de penetrômetros.

Reparação com

argamassa da mesma cor e

características mecânicas

Todas, exceto em edifícios

classificados em zonas perto dos

utentes.

Médio

Exemplo: (Ensaio com

macacos planos)

Óbvios mas sem relevância estrutural ou

para durabilidade a curto prazo

Remoção de material de juntas,

remoção de unidades de

alvenaria ou de corpos de prova

de pequeno diâmetro.

Substituição da unidade ou reparação com

argamassa expansiva, de mesma cor e

características mecânicas.

Todas, exceto em edifícios

classificados em zonas perto dos

utentes.

Significativo (Grandes ensaios

em laboratório)

Muito óbvios. Podem exigir medidas de segurança se

não forem reparados.

Remoção de pequenas áreas

de alvenaria, corpos de prova

de grande diâmetro.

Reconstrução com materiais idênticos ou

costura sobre o dano.

Temporariamente em edifícios recentes e estruturas

classificadas não acessíveis.

Sério (Grandes ensaios

em laboratório)

Muito óbvios. Exigem medidas de segurança se não forem reparados (por exemplo, escoramentos,

barreiras).

Extensas áreas de alvenaria

removidas ou realização de

ensaios pesados.

Reconstrução com materiais

similares.

Aceitável apenas se impedido o acesso

ao público.

Fonte: Elaboração do autor a partir de Cóias (2006, p.9).

215 No caso de monumentos localizados em locais mais frios, o fenômeno do gelo e degelo é de grande agressividade aos edifícios antigos, ainda mais atuando em áreas com grande concentração de sais solúveis. 216 BINDA et al. Tecniche di indagine e progetto delle indagini..., op. cit., p. 06. 217 CÓIAS, V. Inspecções e ensaios na reabilitação de edifícios, op. cit., p. 8.

Page 106: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

105

As técnicas não destrutivas possuem essa designação por se tratar de ensaios

que pouco, ou completamente, não causam danos ao edifício. Algumas referêcias

mencionam esses testes como “ensaios reduzidamente destrutivos”218.

A maioria dos diagnósticos não invasivos fornece resultados qualitativos ao

diagnóstico da edificação, podendo ser utilizada para caracterizar particularidades

do muro que são desconhecidas visivelmente e impossíveis de se individualizar com

ensaios destrutivos, como vazios, defeitos internos ou probemas característicos da

seção do muro, como falta de coesão material.

A exemplo: para determinar o estado de conservação e a morfologia de um

muro de pedra ou alvenaria, é imprescíndivel conhecer, além da história daqueles

que construíram edificações naquele período, a quantidade de paramentos de uma

parede, presença de umidade e o tipo de ligante entre os materiais do sistema

construtivo219, os quais podem ser obtidos com tais ensaios.

Os métodos de teste menos intrusivos podem ser utilizados em qualquer fase

da restauração de um monumento histórico, desde a preparação da intervenção de

reabilitação até após a completa obra de requalificação, com técnicas de

monitoragem avançadas, como ocorre, atualmente, com o Coliseu de Roma, em

constante análise sísmica.

Entre as técnicas pouco destrutivas e não destrutivas para a determinação do

comportamento físico e mecânico de alvenarias antigas, foram selecionadas quatro

provas de estudo, as quais apresentam maior relevância para o escopo da análise

de um muro antigo, e cujos instrumentos para execução do diagnóstico estão

disponíveis na Universidade Federal da Bahia. São elas:

1 – ensaio sônico (qualitativa e quantitativa);

2 – termografia (qualitativa);

3 – ensaio com macacos planos (quantitativa);

4 – endoscopia (qualitativa).

218 CÓIAS, V. Inspecções e ensaios na reabilitação de edifícios, op. cit., p.8. 219 BINDA et al. Tecniche di indagine e progetto delle indagini..., op. cit., p.98.

Page 107: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

106

Outras técnicas de grande importância para o diagnóstico não destrutivo são as

análises de vibração com o uso de acelerômetros, georradares e penetrômetros.

Embora fundamentais, não fazem parte da análise desta dissertação, por se tratar

da avaliação do comportamento dinâmico (e não mecânico, no caso de

acelerômetros) das alvenarias e pela complexidade do estudo dos resultados (no

caso de georradares). No entanto, esses ensaios podem ser consultados no

Apêndice deste trabalho.

4.2 METODOLOGIA DE REALIZAÇÃO DOS ENSAIOS

A metodologia de aplicação dos testes que determinam características físicas e

mecânicas de muros antigos é apresentada a seguir, ao mesmo tempo em que são

expostos os principais instrumentos para execução dos ensaios não destrutivos,

incluídos no escopo deste estudo, e os resultados que podem ser obtidos pelos

referidos diagnósticos.

4.2.1 Ensaios Sônicos

É um dos primeiros ensaios não destrutivos estudados pela ciência da

restauração. É sabido que as ondas mecânicas propagam-se mais rapidamente em

meios materiais mais compactos e que suas velocidades no ar possuem menor

valor, com relação aos diversos componentes de uma alvenaria antiga, como pedra,

tijolos e argamassas. Ademais, a rapidez de impulso, que ultrapassa um muro

estrutural, depende diretamente da elasticidade e da resistência do material

componente dessa parede (quanto maior é a resistência do material, mais veloz será

o impulso)220.

O ensaio sônico consiste, então, em medir o tempo empregado por uma onda a

baixa frequência, gerada por uma solicitação mecânica de um martelo instrumentado

ou outro instrumento de impulso, para ultrapassar um determinado material e ser

recebida pelos transdutores. Esse equipamento é responsável por transferir os

dados recebidos para um osciloscópio, ou velocímetro, o qual indica os valores da

velocidade de oscilação.

220 TASSIOS, T. P.; MAMILLAN, M. Valutazione strutturale dei monumenti antichi. Apresentação de Carlo Cestelli Guidi, Roma: Kappa, 1985. p.9.

Page 108: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

107

Materiais utilizados:

1 – dois transdutores, que podem ser geófonos ou acelerômetros (Figura 26);

2 – um martelo munido de transdutor de força (Figura 27);

3 – velocímetro (Figura 28) ou osciloscópio (Figura 29)

Figura 26 – Acelerômetro/geófono disponível no NTPR-UFBA

Figura 27 – Martelo munido de transdutor de força

Fonte: Acervo do autor (ago.2015).

Fonte: Binda et al.(2009, p. 4).

Figura 28 – Velocímetro disponível no NTPR-UFBA

Figura 29 – Osciloscópio disponível no NTPR-UFBA

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015). Fonte: Acervo do autor (mai.

2016).

Os testes sônicos são regidos pela recomendação europeia RILEM NTD1221 e

podem ser executados de duas maneiras, que devem ser analisadas a depender do

escopo do trabalho. É certo que, por vezes, não é possível dispor os geófonos na

221 TASSIOS, T. P.; MAMILLAN, M. Valutazione strutturale dei monumenti antichi, op. cit., p.19.

Page 109: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

108

posição exigida para o ensaio desejado, no entanto, existem outras técnicas

capazes de fornecer resultados semelhantes neste caso, como o georradar.

O primeiro tipo de ensaio é chamado de trasmissão direta (Figura 30), quando

os transdutores são posicionados em faces opostas do elemento avaliado. Nessa

posição, o escopo é a caracterização da constituição física do muro. O segundo tipo

de ensaio é denominado de propagação em superfície (Figuras 31 e 32), para a

determinação da profundidade de fissuras, brechas e rachaduras.

Figura 30 – Ensaios sônicos por transmissão direta

Figura 31 – Ensaios sônicos por propagação de superfície

Fonte: Elaboração do autor a partir de Tassios e Mamillan (1985, p.21).

Fonte: Elaboração do autor a partir de Tassios e Mamillan (1985, p.21).

A Figura 31 é um exemplo de aplicação da técnica e demonstra o cálculo da

profundidade de uma lesão a partir dos métodos sônicos. Para a execução correta

do teste, são necessárias duas avaliações entre o acelerômetro recebedor (B) e o

transmissor (A e A’ ).

Figura 32 – Relações para determinação da profundidade de fissuras, brechas e rachaduras com a utilização do método sônico

Fonte: Tassios e Mamillan (1985, p.21).

Page 110: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

109

Durante a primeira verificação, deve-se dispor os aparelhos a uma distância

(L), a qual, obrigatoriamente, tem, em seu ponto médio, a posição da fenda

analisada. Obtido o valor do período de onda (tc ), realiza-se outro teste, com a

mesma separação (L) entre os acelerômetros, desta vez, em uma área sem danos

na alvenaria. Adquire-se o valor do período (tL ) para encontrar o valor aproximado

da profundidade do dano (C), através da seguinte expressão, exposta por Tassios e

Mamillan222:

(3)

No caso do teste através de transmissão direta, é importante, antes de iniciar o

ensaio, marcar no muro uma grelha com diversos pontos, nos eixos horizontal e

vertical, a qual será de ajuda para a representação em gráfico do ensaio, e, ainda,

deve possuir uma escala de velocidade em m/s, para facilitar a interpretação dos

resutados. Obviamente, pelo outro lado da parede resistente, é necessário que

outros pontos sejam fixados, na mesma altura e no mesmo posicionamento dos

anteriores. Essas guias são, obrigatoriamente, os pontos de aplicação da onda

através do martelo, munido de transdutor de força, próprio para o ensaio (Figuras 33

e 34).

Figura 33 – Exemplo de posicionamento dos pontos para execução de ensaios sônicos

Figura 34 – Tipo de resultado obtido pelo ensaio sônico

Fonte: Binda, Anzani e Cantini (2009, p. 7).

Fonte: Cóias (2009, p.8).

222 TASSIOS, T. P.; MAMILLAN, M. Valutazione strutturale dei monumenti antichi, op. cit., p.21.

Page 111: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

110

Outra utilidade dos ensaios sônicos é poder estimar a resistência à

compressão das alvenaria antigas, a densidade e o módulo de elasticidade, por

meio de ábaco determinado por experimentações em laboratório223, levando em

conta que, como citado anteriormente, quanto maior for a velocidade de propagação,

maior é a resistência do material (Figuras 35 e 36).

Figura 35 – Ábaco para determinar a resistência à compressão

Figura 36 – Ábaco para determinar o módulo de elasticidade

Fonte: Tassios e Mamillan (1985, p.24).

Fonte: Tassios e Mamillan (985, p.23).

O parâmetro de elasticidade pode ser determinado, também, pela seguinte

expressão:

E = p.Vm² [(1+v).(1-v)/(1-v)] (3)

Sendo necessário obter a velocidade de impulso máximo (Vm), por meio do

velocímetro, o coeficiente de Poisson (v) e a densidade do material (p), grandezas

tabeladas.

223 TASSIOS, T. P.; MAMILLAN, M. Valutazione strutturale dei monumenti antichi, op. cit., p.23-25.

Page 112: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

111

Considerando que essa técnica dá resultados significativos com relação à

constituição da alvenaria, podendo avaliar a presença de áreas vazias no muro, sua

realização é de grande importância, pois esses testes podem ajudar, também, na

aplicação e injeção de outros materiais consolidantes, individuando a mudança das

características físicas do muro.

4.2.2 Termografia

Problemas nas paredes estruturais podem ser visualmente encontrados com a

retirada dos revestimentos para avaliação. No entanto, nem sempre é possível

realizar a remoção dos rebocos e, muitas vezes, esta situação intrusiva pode causar

danos ao monumento. Nessas condições, a técnica termográfica consiste na

medição, por meio de uma câmera, da radiação infravermelha emitida pela

superfície de um objeto. Esse calor, que pode ser visto na tela do aparelho, é

emitido mesmo pelos elementos que se encontram escondidos pelos rebocos.

É sabido que os materiais irradiam calor e que vários elementos construtivos

que entram na composição das estruturas (pedra, tijolos, argamassas, concreto,

madeira, metal) reagem de forma diferente às solicitações térmicas vindas do

exterior, pela disparidade do calor específico e condutibilidade térmica de cada

elemento construtivo. Essa diferença é relatada por Cóias224 no Quadro 10, a seguir.

Quadro 10 – Parâmetros responsáveis pelo comportamento térmico dos materiais

Material Peso específico (Kg/m³)

Condutibilidade térmica

(Kcal/h.m. oC)

Calor específico (W/m.oC)

Granito 2600 1,65 0,67

Arenito 2500 1,60 0,79

Calcário 2500 1,2 0,71

Tijolo 2000 0,50 0,92

Reboco comum 1800 0,55 0,75

Madeira 900 0,15 1,48

Fonte: Elaboração do autor a partir de Cóias (2006, p.331).

Trata-se de um método de diagnóstico por imagem do tipo qualitativo, sem

contato com a alvenaria que se quer avaliar. Por meio deste ensaio, é possível

224 CÓIAS, V. Inspecções e ensaios na reabilitação de edifícios, op. cit., p. 331.

Page 113: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

112

indentificar cavidades, diferentes materiais constitutivos, variação de espessuras,

heterogeneidade do tecido mural e diversos pontos térmicos.

Sousa225 expõe diversas utilidades da técnica:

Caracterização de materiais, avaliação de estruturas em betão, influência das propriedades do betão, estudo de estruturas em alvenaria, detecção de inclusões metálicas em placas de gesso e respectivos parâmetros térmicos, detecção de defeitos no isolamento térmico de edifícios, avaliação de placas de isolamento revestidas com reboco e com poliestireno expandido, análise de estruturas históricas em alvenaria, determinação da resistência térmica em edifícios históricos, análise térmica de uma solução composta de tijolo e poliestireno expandido.226

Segundo Buffarini, D’Aria e Giachetti227, são necessários os seguintes

aparelhos para a realização do teste:

1 – termocâmera (Figura 37); 2 – computador para recepção de imagens (Figura 38).

Figura 37 – Termocâmera disponível no NTPR, na Escola Politécnica (UFBA)

Figura 38 – Imagem obtida através da termocâmera

Fonte: Acervo do autor (dez. 2013).

Fonte: Acervo do autor (dez. 2013).

225 SOUSA, L. Aplicação de termografia no estudo do isolamento térmico de edifícios. 2010, 101 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica)–Universidade de Aveiro, Portugal, 2010. Disponível em: < http://ria.ua.pt/bitstream/10773/3650/1/240593.pdf>. Acesso em: 21 jan. 2014. 226 Id., ibid., p.44. 227 BUFFARINI, S.; D’ARIA, V.; GIACCHETTI, R. Il consolidamento strutturale degli edifici in cemento armato e muratura, op. cit.

Page 114: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

113

Em alguns países frios, faz-se necessário o aquecimento do elemento

estrutural a ser avaliado, por meio de refletores e projetores de luz com certa

potência, para fomentar o processo de irradiação do calor dos materiais constituintes

da alvenaria e facilitar o recebimento das informações pela ferramenta de aquisição

dos dados.

A execução do ensaio exige somente o uso da termocâmera, a qual pode

reportar os dados através de videos ou imagens digitais. Apesar da facilidade de

obtenção dessas imagens, os dados recebidos podem apresentar relativa

dificuldade de interpretação.

Aliada aos ensaios sônicos, descritos anteriormente neste trabalho, a

termografia pode dar um panorama quase total da constituição física de um muro,

faltando, somente, a análise endoscópica, que será vista em tópicos posteriores

nesta dissertação. Uma outra questão importante, que pode ser avaliada com a

ferramenta, é a relação da temperatura com a deformação das alvenarias, além de

permitir observar se existe uma diferença de comportamento entre paredes mais

frias e muros mais quentes.

4.2.3 Ensaio com macacos planos

O ensaio com macacos planos é uma técnica que surgiu nos fins dos anos 70,

aplicada ao estudo do comportamento mecânico de maciços rochosos228, e sua

primeira utilização, no âmbito estrutural, aconteceu em Milão, em 1979, na pesquisa

sobre a restauração do Palácio da Razão. Esse teste foi adaptado para aplicação

em muros antigos pelo engenheiro Pier Paolo Rossi durante os trabalhos de

reestruturação do monumento.

Segundo Buffarini, D’Aria e Giacchetti229, para a realização dos ensaios com

macacos planos, são necessários os seguintes equipamentos:

1 – Guia metálica para corte de alvenaria, que é opcional, embora altamente

indicada para a realização correta do talho na parede resistente;

228 LOURENÇO, P.; GREGORCZYK, P. A Review on Flat-Jack Testing. Guimarães, Portugal: Universidade do Minho/Departamento de Engenharia Civil, 2000. 229 BUFFARINI; S.; D’ARIA, V.; GIACCHETTI, R. Il consolidamento strutturale degli edifici in cemento armato e muratura, op. cit.

Page 115: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

114

2 – Serra diamantada, adequada ao corte de muros antigos, que deve ser

ligada a um motor trifásico (Figuras 39 e 40);

3 – Ao menos três bases de medição, a serem coladas no muro. Em pesquisas

preliminares, foram utilizadas bases desenvolvidas pela equipe do Núcleo de

Tecnologia da Preservação e Restauração (Figura 41), em concordância com

os aparelhos disponíveis, até a obtenção das ferramentas próprias para o teste

(Figura 42).

Figura 39 – Serra K600 Husqvarna, para corte de parede

Figura 40 – Unidade acionadora da serra de corte

Fonte: Acervo do autor (dez. 2013). Fonte: Acervo do autor (dez.

2013).

Figura 41 – Bases de medição desenvolvidas pelo NTPR

Figura 42 – Bases de medição NOVATEST

Fonte: Acervo do autor (nov. 2015). Fonte: Acervo do autor (nov. 2015).

Page 116: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

115

4 – Deformômetro de tipo mecânico, removível, com sensibilidade igual a um

milésimo de milímetro (0.000 mm), que pode ser substituído por um

instrumento eletrônico de mesma sensibilidade. Inicialmente, para este

trabalho, foi utilizado um deformômetro elaborado pelo Núcleo de Tecnologia

da Preservação e Restauração (Figura 43), até a obtenção do aparelho

corretamente normatizado (Figura 44);

5 – Um ou dois macacos planos retângulares ou semicirculares para inserção

na alvenaria antiga (Figura 45);

6 – Bomba hidráulica com um ou dois manômetros (Figura 46).

Figura 43 – Deformômetro elaborado pela equipe do NTPR

Figura 44 – Deformômetro NOVATEST

Fonte: Acervo do autor (nov. 2015). Fonte: Acervo do autor (nov. 2015).

Figura 45 – Macaco planos retangulares Figura 46 – Bomba hidráulica

Fonte: Acervo do autor (dez. 2013). Fonte: Acervo do autor (dez. 2013).

Page 117: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

116

4.2.3.1 Normatização

O teste possui, somente, a norma americana ASTM D 4729 como reguladora,

porém, segundo Binda, Anzani e Cantini230, grupos internacionais de pesquisa da

tecnologia dos materiais criaram recomendações ao ensaio, as quais são baseadas

no documento estadunidense. Isso ocorreu tendo em vista a necessidade de

incrementar a referida norma com novas informações e facilitar o acesso dos

pesquisadores a estes dados.

As recomendações europeias da RILEM (Réunion Internationale des

Laboratoires et Experts des Materiaux231) denominadas RILEM MDT.D.4232

(macacos planos simples) e RILEM MDT.D.5233 (macacos planos duplos) são

exemplos deste trabalho de popularização do ensaio com macacos planos e são,

também, os documentos mais completos sobre o tema.

Para esta pesquisa, as metodologias dos testes relatados no próximos itens

têm fundamentação teórica baseada nas recomendações do referido grupo de

pesquisa europeu, considerando a dificuldade do acesso à ASTM D 4729.

Adicionalmente, buscou-se a adaptação das normas aos equipamentos disponíveis

no NTPR.

4.2.3.2 Medição do estado de tensão do muro (macaco plano simples)

Essa medição baseia-se no fato de que um corte feito em um sólido solicitado

anula as tensões que agem sobre a face desse maciço. Esse relaxamento do corpo,

após o talho, provoca o fechamento parcial do corte que pode ser medido através de

dois pontos simétricos em relação à abertura, com um aparelho de alta precisão

(deformômetro). Naturalmente, é necessário medir a distância relativa entre os

pontos antes da primeira execução de corte. Um macaco hidráulico é inserido na

abertura. 230 BINDA, L.; ANZANI, A.; CANTINI, L. Flat-Jack Test: a slightly destructive technique for the diagnosis of brick and stone masonry structures. International Journal for Restoration of Buildings and Monuments, Zurich, p. 449-472, 1999. 231 Reunião Internacional dos Laboratórios e Experts dos Materiais (Tradução nossa). 232 RILEM. Recommendation MDT.D.4: In-situ stress tests based on the flat jack. Matériaux et constructions, v.37, p.491-496, ago.2004. Disponível em: <http://www.rilem.org/images/publis/ 1619.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2015. 233 RILEM. Recommendation MDT.D.5: In-situ stress tests based on the flat jack. Matériaux et constructions, v.37, p.497-501, ago.2004. Disponível em: <http://www.rilem.org/images/publis/ 1620.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2015.

Page 118: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

117

Esse macaco receberá pressão até conseguir anular o deslocamento do muro,

resultado da ação de corte. Esse ensaio pode ser considerado pouco destrutivo, pois

a argamassa cortada pode ser compensada, e as bases de medição são facilmente

removíveis.

A execução do ensaio está ilustrada na Figura 47.

Figura 47 – Seção mostrando as etapas para execução do ensaio com macaco plano simples

Fonte: Elaboração do autor (2014).

Nas estruturas em alvenaria de tijolo, o corte para a inserção da ferramenta

pode ser feito com relativa facilidade na argamassa, através de uma serra ou broca.

Se a alvenaria for muito irregular, o talho pode ser feito diretamente na pedra, ou, se

possível, entre as pedras, para a execução correta do teste.

Segundo Binda, Anzani e Cantini234, o valor do estado de esforço é calculado

segundo a norma ASTM D 4729 – 04 e leva em consideração que a pressão dentro

do macaco é igual à tensão presente na alvenaria.

O valor encontrado de pressão (tensão), lido no manômetro, deve ser corrigido

de acordo com dois coeficientes: Ka, que é a relação entre a superfície do macaco 234 BINDA, L.; ANZANI, A.; CANTINI, L. Flat-Jack Test..., op. cit.

Bomba

hidráulica

Page 119: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

118

Am e a superfície de corte At; e Km , que leva em conta a rigidez do macaco plano.

Este último coeficiente Km é indicado no certificado de calibragem do equipamento,

mas também pode ser dado dividindo-se a força total de compressão pela área

nominal (delimitada pelo perímetro) do macaco e a pressão aplicada.

O valor da tensão média do muro, no ponto de corte, é então calculado pela

relação:

σ = pKmKa (em N/cm²) (4)

Onde p = pressão lida no manômetro da bomba hidráulica.

As dimensões de corte são variáveis em função dos elementos que constituem

o muro. Para alvenaria de tijolo, são adotados macacos de 400 x 200 mm e 240 x

120 mm. A espessura varia de 3 a 10 mm.

No caso de muros irregulares, pode ser necessário incrementar a profundidade

do corte para que o volume de material ensaiado seja maior. Neste caso, são

utilizados macacos de forma semioval, que apresentam uma superfície muito

superior à dos retangulares. No entanto, para esta pesquisa, foram utilizados

macacos planos retangulares, disponíveis no NTPR.

No caso de macacos planos retangulares, é necessário realizar um estudo de

corte, devido à incompatibilidade da serra circular com a geometria do aparelho

(Figura 48).

Figura 48 – Relação entre o corte da serra (circular) e o macaco plano (retangular)

Fonte: Elaboração do autor e da equipe do NTPR (2015).

Área do rasgo = 0,1089 m²

Área da placa = 0,080 m²

Ka = 0,745

0,48

0,04 0,27

Cotas em metros

Page 120: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

119

A avaliação de convergência das bases de medição é feita à medida que a

pressão aumenta, por meio de um extensômetro mecânico (deformômetro) que

mede a variação de comprimento de uma série de três bases coladas na superfície

do muro.

A distância das bases da extremidade para a base central é de L/4, sendo L o

comprimento do macaco plano, conforme determinado na RILEM235. Ou, então,

pode-se posicionar os pontos de acordo com uma guia própria (Figura 49),

desenvolvida para as dimensões do deformômetro utilizado para a medição em

questão.

Figura 49 – Guia de posicionamento das bases de medição, para deformômetro NOVATEST

Fonte: Acervo do autor (nov. 2015).

4.2.3.3 Determinação das características de deformabilidade (macacos planos

duplos)

A determinação das características de deformabilidade requer o uso de dois

macacos planos paralelos, colocados sobre a mesma vertical, a uma distância

mínima de uma vez e meia a maior dimensão do macaco plano236. Essa área

delimitada entre os macacos é uma porção significativa de muro que sofrerá um

ensaio de compressão monoaxial.

Diversas bases de medição instaladas na superfície compreendida entre os

dois planos permitem obter um quadro completo do comportamento de deformação

tanto axial quanto transversal. São recomendadas quatro fiadas verticais e uma 235 RILEM. Recommendation MDT.D.4, op. cit. 236 RILEM. Recommendation MDT.D.5, op. cit.

Page 121: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

120

horizontal237 (Figura 50), embora seja possível utilizar mais bases de medição

(Figura 51), respeitando a distância máxima entre eles.

Efetuando uma prova cíclica, com retorno ao zero após atingir um limite

determinado, e incrementando gradualmente o nível de solicitação, pode-se atingir o

estado máximo de ruptura ou identificar a resistência à compressão através da

análise do gráfico tensão/deformação e/ou pressão/deformação.

Figura 50 – Fiadas de medição para o ensaio de macacos planos duplos

Figura 51 – Diversos posicionamentos das bases de medição para os ensaios de macacos planos duplos

Fonte: Elaboração do autor, a partir de Binda, Anzani e Cantini (2004).

Fonte: Elaboração do autor a partir de Tassios e Mamillan (1985, p.62).

No eixo positivo do referido gráfico, são marcadas as medidas das fiadas das

bases verticais de medição, enquanto, no eixo negativo, são determinadas as

medidas das bases horizontais de medição, para o caso da determinação do

módulo de elasticidade tangencial e coeficiente de Poisson (Figura 52).

237 RILEM. Recommendation MDT.D.5, op. cit.

Page 122: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

121

Figura 52 – Exemplo de gráfico tensão/deformação, obtido com o ensaio de macacos planos

Fonte: Elaboração do autor a partir de Buffarini, D’Aria e Giacchetti (2010, p.164).

Como relatado anteriormente, faz-se o cálculo da deformabilidade aplicando

uma carga cíclica (carga e descarga) com intensidade crescente. A pressão

efetivamente aplicada em uma alvenaria é calculada seguindo uma relação:

σ = pKmKa’ (MPa) (5)

Onde Ka’ é a relação entre a área dos macacos e o valor médio das duas

áreas de corte.

O cálculo do módulo de elasticidade será efetuado no intervalo linear

previsível, que, no gráfico de tensão-deformação, representa o primeiro setor,

elástico, antes do escoamento do material. Este parâmetro é, também, o coeficiente

angular da reta tangente à curva de tensão/deformação:

E = (∆σ/∆εy) (6)

O coeficiente de Poisson, outro dado que pode ser obtido, é a relação entre a

deformação transversal e a longitudinal:

v = (∆εx/∆εy) (7)

Deformação vertical Deformação horizontal

Page 123: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

122

Essa relação estará, também, no intervalo linear previsível, como explicado

anteriormente.

4.2.3.4 Outras considerações com relação ao ensaio de macacos planos

É importante relatar que os dados fornecidos, quando o ensaio é executado de

forma correta e os aparelhos apresentam a devida calibração, são confiáveis, visto

que as características de deformação são medidas em corpos de prova de grandes

proporções e in situ, nas condições reais da estrutura.

A instrumentação é simples, mas a instalação pode ser demorada. São

necessárias uma rede elétrica trifásica para a execução do corte na alvenaria e

instalações hidráulicas para a realização do corte com a serra diamantada, no intuito

de evitar o superaquecimento do sistema. Além disso, é preciso uma equipe muito

bem treinada e multidisciplinar, com engenheiros, arquitetos, eletricistas e pedreiros

(para retirada e recomposição de reboco), que guiarão a execução do ensaio.

Com relação aos recursos para a obtenção desses equipamentos, grupos de

pesquisa localizados em países fora da União Europeia apresentam dificuldades de

importação dos aparatos, sendo sua aquisição onerosa. Ademais, em alguns testes,

o macaco plano pode ser perdido completamente dentro da parede, levando-se em

conta a grande pressão que pode incidir sobre o aparelho. Este macaco plano

também pode sair do ensaio completamente danificado. Por outro lado, ensaiar um

muro de grandes dimensões em laboratório, com proporções análogas àquelas

testadas com o macaco plano, mostra-se muito trabalhoso e, igualmente

dispendioso, além de não apresentar as características reais do ambiente em que se

encontra a estrutura, podendo gerar dados não aproveitáveis.

Ainda em relação à confiabilidade da técnica, Buffarini, D’Aria e Giacchetti 238

destacam dois pontos:

1 – A diferença de tensão determinada pelos macacos e o valor efetivo de

medição de uma prova de compressão monoaxial em laboratório resulta não

superior a 5%;

238 BUFFARINI S.; D’ARIA, V.; GIACCHETTI, R. Il consolidamento strutturale degli edifici in cemento armato e muratura, op. cit.

Page 124: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

123

2 – A relação entre o valor de deformação dado pelos macacos e aquele

determinado pela prova direta de compressão é praticamente igual.

No relatório final, para cada teste com macacos planos, deverão constar os

seguintes dados239:

1 – Descrições do terreno, tipo de alvenaria, condições ambientais, tipo de

argamassa;

2 – Data de construção do edifício;

3 – Posição de cada prova com os macacos planos e o deslocamento dos

pontos após o corte;

4 – Pressão necessária para retornar a alvenaria ao seu estado de tensão

inicial, solicitação da alvenaria e módulo de elasticidade e, se necessário,

módulo de elasticidade tangencial (em área sísmica);

5 – Valores de calibração;

6 – Data do teste;

7 – Referência às recomendações utilizadas.

4.2.4 Endoscopia

Para o referido ensaio, são necessários apenas um endoscópio munido de

lanterna em sua ponta (Figura 53) e um computador para receber as imagens

captadas pelo aparelho. Trata-se de um teste não destrutivo, com a função de

identificar a condição física da alvenaria.

239 BINDA, L.; ANZANI, A.; CANTINI, L. Flat-Jack Test..., op. cit.

Page 125: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

124

Figura 53 – Aparelho endoscópio

Fonte: Acervo do autor (dez. 2013).

Assim como no ensaio sônico, por meio desse tipo de diagnóstico é possível

detectar áreas vazias no muro, presença de materiais não coesos, consolidações

anteriores, áreas não compactas na alvenaria, bem como a existência de diversos

outros elementos não visíveis dentro da parede resistente.

Sendo um ensaio qualitativo, a leitura dos resultados desse tipo de técnica

depende diretamente da interpretação do pesquisador. Em muitos casos, essa

análise é laboriosa (Figuras 54 e 55).

Figura 54 – Tipo de resultado obtido por meio da endoscopia (1)

Figura 55 – Tipo de resultado obtido por meio da endoscopia (2)

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Acervo do autor (maio 2016).

A endoscopia é uma técnica de inspeção visual mediante a utilização de um

aparelho de fácil obtenção e manuseio. A relação deste ensaio com outras técnicas

de diagnóstico, como os macacos planos, proporciona a obtenção de imagens que

podem determinar o estado físico dos materiais de uma estrutura antiga. Nesse

Page 126: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

125

contexto, ao se cortar a parede por meio de serra diamantada, antes dos

supracitados ensaios de compressão, pode-se utilizar a endoscopia para avaliar

essa constituição estrutural.

Page 127: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

126

5 PRÁTICA: OBJETOS DE ESTUDO E APLICAÇÃO DOS ENSAI OS

O critério de escolha dos edifícios que seriam avaliados na pesquisa teve como

base as determinações de Croci240, que estabelece a importância da verificação

física e mecânica de estruturas danificadas para posterior consolidação. Neste

âmbito, a Igreja do Santíssimo Sacramento da Rua do Passo (Figura 56) foi o

primeiro monumento a ser eleito para ser avaliado, considerando as diversas lesões

que apresenta.

Além disso, o referido edifício encontra-se em obras, o que facilitou seu

acesso, antes impossibilitado pelo estado de arruinamento da igreja. As instalações

de canteiro também foram fundamentais para a aplicação dos ensaios.

Outra alvenaria avaliada foi a do antigo prédio da Companhia Circular de Carris

da Bahia (Figura 57). A escolha desse monumento deu-se, a princípio, por

apresentar todas as condições para execução dos ensaios com macacos planos,

graças à infraestrutura de obra.

Além disso, apesar de se apresentar com tipologia eclética, o prédio ainda

possui altas paredes espessas, em seu pavimento enterrado, provavelmente

remanescentes de antiga estrebaria, construída no local, presumivelmente no século

XIX.

Figura 56 – Igreja do Santíssimo Sacramento da Rua do Passo

Figura 57 – Antigo prédio da Companhia Circular de Carris da Bahia

Fonte: Acervo do autor (jan. 2015). Fonte: Acervo do autor (dez. 2015).

240 CROCI, G. Conservazione e restauro strutturale dei beni architettonici, op. cit.

Page 128: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

127

5.1 A IGREJA DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO DA RUA DO PASSO

A Igreja do Santíssimo Sacramento do Passo241 localiza-se na antiga Rua do

Passo, atual Rua Ribeiro dos Santos, no topo da encosta que caracteriza a divisão

da urbe em Cidade Alta e Baixa e zona inicial de expansão242 da primeira Capital do

Brasil. Trata-se de um dos mais famosos exemplares da arquitetura barroca-rococó

na Bahia e compõe a ambiência do Centro Histórico de Salvador, Patrimônio da

Humanidade pela UNESCO, sendo conhecida pela sua escadaria monumental que

liga a Rua do Passo (cota mais alta) à Ladeira do Carmo (cota mais baixa).

A localização do monumento é demonstrada na Figura 58.

Figura 58 – Montagem de fotos aéreas mostrando a localização da igreja: 1 – Salvador; 2 – Centro Histórico de Salvador; 3 – Bairro do Carmo/Passo

Fonte: Elaboração do autor a partir de base cartográfica do Google (2016).

O edifício, construído por irmandades locais no século XVII, foi concebido com

nave única e corredores laterais dotados de tribunas e sacristia transversal, tal como

as igrejas matrizes da época, seguindo as tipologias da matriz de São Bartolomeu

241 Muitos referem-se à Igreja como do “Paço”. Há referências dessa grafia, inclusive, em alguns azulejos internos da edificação. No entanto, no Inventário de Proteção ao Acervo Cultural da Bahia, a supracitada edificação está referida como Igreja do Santíssimo Sacramento da Rua do Passo. 242 BAHIA. Governo do Estado. Inventário de proteção do acervo cultural da Bahia. Organização de Paulo Ormindo de Azevedo e Vivian Lene. 3. ed. Salvador: Secretaria da Indústria e Comercio, 1997. p.39.

1 2 3 IGREJA DO PASSO

Page 129: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

128

de Maragojipe, da Catedral Basílica de Salvador, de Nossa Senhora do Boqueirão,

da Santa Casa de Misericórdia, dentre outras.

Sua planta baixa é exposta na Figura 59.

Figura 59 – Plantas publicadas no Inventário de Proteção do Acervo Cultural da Bahia (IPAC-SIC)

Fonte: Bahia (1997, p.39).

Foi aproveitado o declive do terreno, já que o edifício se localiza próximo à

encosta, para a construção de ossuário, sacristia e consistório em uma mesma

prumada243. Assim como em várias construções da época, o sistema estrutural

consiste de alvenaria mista de pedra argamassada e tijolos, com 70 cm de

espessura, em média, além de possuir contenções em pedra de granito, visto o

desnível da rua com relação ao ossuário, localizado abaixo da sacristia. O

monumento possui, também, paredes em cantaria, no caso dos peitoris das

fachadas externas.

As paredes que constituem a nave do monumento têm cerca de quatorze

metros de altura, enquanto as alvenarias externas possuem em torno de dez metros

de elevação. As alvenarias mistas das torres são as mais altas, com valores de

altura próximos aos 25 m, no entanto, não demonstram estar danificadas.

Desde as décadas de 50 e 60, a igreja é alvo de intervenções do IPHAN e do

IPAC, tendo em vista a queda de parte da cobertura, do baldaquino do retábulo-mor

e do aparecimento de diversas fissuras e rachaduras, que surgiram ao longo dos

anos, na parte posterior da edificação, evidenciando provável rotação dos muros da

243 BAHIA. Governo do Estado. Salvador e a Baía de Todos os Santos, op. cit., p.231.

N

Page 130: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

129

igreja (Figuras 60 e 61). Apesar dos constantes problemas, não há registros de

intervenções no monumento entre as décadas de 1970 e 1990 244.

Figura 60 – Indicação de rachaduras na fachada nordeste da igreja, foto de 1951

Figura 61 – Indicação de rachaduras internas, em concordância com as externas, foto de 1951

Fonte: Arquivo Central do IPHAN no Rio de Janeiro.

Fonte: Arquivo Central do IPHAN no Rio de Janeiro.

Devido à iminência da queda da fachada voltada para a Baía de Todos-os-

Santos, foram executadas algumas ações de consolidação, em meados do século

XX, como a construção de uma pequena contenção no talude e o grampeamento

das rachaduras (Figuras 62 e 63), procedimento, em geral, inócuo para estes casos.

Figura 62 – Grampeamento das rachaduras externas, foto de 1954

Figura 63 – Grampeamento das rachaduras internas, foto de 1954

Fonte: Arquivo Central do IPHAN no Rio de Janeiro.

Fonte: Arquivo Central do IPHAN no Rio de Janeiro.

244 BAHIA.. Governo do Estado. Inventário de proteção do acervo cultural da Bahia, op. cit., p. 40.

Page 131: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

130

Apesar das referidas intervenções, os resultados foram inexpressivos, e novas

patologias, em áreas próximas àquelas consolidadas (Figuras 64, 65, 66 e 67),

foram observadas, no intervalo de tempo entre essa intervenção e a que está

ocorrendo agora, no século XXI. Tal problema é ainda explicitado pela quebra de

soleiras e peitoris em pedra, além de colapso de pontos da cimalha e dos arcos de

descarga dos vãos.

Figura 64 – Fissura interna individualizada após o desmonte do retábulo

Figura 65 – Rachadura interna individualizada após o desmonte do retábulo

Fonte: Acervo do autor (jan. 2015).

Fonte: Acervo do autor (jan. 2015).

Figura 66 – Rachadura encontrada após prospecção de fundação

Figura 67 – Rachadura na parede da Capela-Mor

Fonte: Acervo do autor (jan. 2015). Fonte: Acervo do autor

(jan. 2015).

Page 132: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

131

Com o trabalho de inspeção das fundações (Figura 66), pôde-se observar

grande presença de umidade, existente na cota mais baixa da alvenaria de pedra,

indicando vazamento de tubulação ou infiltração de água, provavelmente devido às

condições precárias dos passeios laterais e posteriores, onde todas as águas

pluviais provenientes do telhado escoam diretamente sobre o piso. Outrossim, a

cobertura toda não possui calhas, proporcionando que o grande volume de água,

durante as chuvas, seja escoado diretamente no terreno.

A localização dos danos no edifício é mostrada na Figura 68.

Figura 68 – Posições dos principais danos encontrados na Igreja do Passo (em vermelho)

Fonte: Acervo do autor (abr. 2016).

A Igreja do Passo foi contemplada, no ano de 2014, com os recursos do

Programa de Aceleração do Crescimento das Cidades Históricas para sua

restauração integral e, assim, a sua consolidação é tema de debate entre os

especialistas envolvidos.

Nesse contexto, é importante relatar a questão da instabilidade da encosta do

Centro Histórico de Salvador, a qual é objeto de estudo de muitos pesquisadores

como, por exemplo, Muñoz245, destacando-se os corriqueiros deslizes que ocorrem

na escarpa.

Isso posto, destaca-se, atualmente, a continuação da evolução das rachaduras

devido a um possível movimento e assentamento na parte posterior da Igreja do

245 MUÑOZ, R. Acidentes e desastres em um trecho da falha de Salvador..., op. cit.

LEGENDA:

1 - Lesão vertical do piso ao teto

2 - Lesão vertical do piso ao teto, inclusive fundação

3 - Lesão inclinada, do piso ao teto, inclusive fundação

1 2

3 4

5

6 7 N

LEGENDA:

4 - Lesão vertical e inclinada, do teto até a padieira do vão

5 - Lesão vertical na seção intermediária da parede

6 - Ruptura total da pedra de soleira do vão

7 - Lesão vertical, do piso até a superfície superior do muro.

0 5 10 15 20 m

Page 133: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

132

Passo, causado por recalque do terreno, ou galeria subterrânea, o que, segundo

estudos dos professores Luiz Edmundo Prado de Campos (Universidade Federal da

Bahia) e Minos Trocoli (Concreta), deve ser analisado mais aprofundadamente para

posterior consolidação.

Uma vez que a maior incidência de danos está concentrada no corredor lateral

esquerdo do monumento, foram realizados ensaios de penetração do solo e de

georradar, pela empresa CDC Engenharia, para individualizar provável vazio sob o

referido corredor, onde se encontra a maior parte das rachaduras.

A resposta do referido ensaio confirmou grande presença de umidade e

material argiloso (Figura 69), os quais, juntamente com a movimentação da encosta,

podem ser fatores que desencadeiam lesões nesta parte da edificação. As análises

não destrutivas, nesse contexto, expõem a situação física e mecânica dos materiais

nessas condições de instabilidade.

Figura 69 – Plantas baixas mostrando os resultados dos ensaios efetuados com Georradar no corredor lateral esquerdo

Fonte: Acervo do autor (jan. 2015).

De 0 a 1,00 m de profundidade De 1,00 a 2,00 m de profundidade

De 2,00 a 3,00 m de profundidade

Page 134: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

133

5.1.1 Proposta de aplicação das técnicas na Igreja do Passo

A restauração da Igreja do Santíssimo Sacramento da Rua do Passo é uma

intervenção de grande importância para a valorização do patrimônio, não só

brasileiro, mas também mundial, visto sua inserção em área protegida pela Unesco.

Manter uma igreja de tal importância artística fechada durante duas décadas

representa a constante deterioração da cultura baiana e brasileira, no âmbito do

patrimônio edificado.

É de fundamental necessidade que a obra de restauração traga de volta a

dignidade do monumento e, para isso, faz-se necessária a aplicação dos testes

estudados (ensaios sônicos, endoscopia e termografia) para a avaliação física dessa

estrutura e a verificação da segurança global dos muros lesionados. Levando em

consideração as afirmações de Croci246, o qual acredita que as áreas lesionadas são

aquelas que apresentam mais variações de comportamento, conforme explicitado no

Capítulo 2 da presente dissertação, demonstra-se, na Figura 70, a localização dos

ensaios.

Figura 70 – Planta baixa com a localização dos ensaios

Fonte: Elaboração do autor a partir de BAHIA (1997, p. 39).

246 CROCI, G. Conservazione e restauro strutturale dei beni architettonici, op. cit.

US2

US3

US4

E4, T4

US5

E1, T1

E2, T2 US1 LEGENDA

Ensaios:

E – Endoscopia

T – Térmico

US – Ultrassom

E3, T3

MAIOR PARTE DAS LESÕES

Ponto de aplicação dos ensaios

0 5 10 15 20 m

US6, T5

Page 135: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

134

5.1.2 Aplicação dos ensaios na Igreja do Passo

Marcados os pontos de aplicação das técnicas, foram executados diversos

testes de termografia, ensaios sônicos e endoscopia, em paredes internas e

externas desses ambientes, conforme a possibilidade de aplicação do ensaio. Por

exemplo, testes com ultrassom, por transmissão direta, só foram realizados em

áreas onde o acesso ao espaço externo era possível, bem como ensaios com

endoscópio só foram aplicados em brechas que permitiam a passagem do aparelho.

5.1.2.1 Ensaios sônicos

Dada a impossibilidade de utilização do martelo instrumentado247 para a

propagação de ondas por impulso, os ensaios foram realizados com dois geófonos

(um emissor e outro receptor) ultrasônicos, gel condutor e um velocímetro. Utilizou-

se a transmissão direta como método base de aplicação para estabelecer a

resistência dos materiais, conforme determinado por Tassios e Mamillan248.

Foram realizados testes em dois tipos de muros: alvenaria mista – US1, US5 e

US6 (Figura 71) e em parede de pedra de arenito – US2, US3 e US4 (Figura 72).

Figura 71 – Ensaio de transmissão direta em parede de alvenaria mista – US5

Figura 72 – Ensaio de transmissão direta em parede de pedra – US4

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015). Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

247 Até a finalização desta dissertação, o martelo instrumentado requisitado à Fundação de Apoio à Pesquisa não havia sido disponibilizado, o que dificultou o desenvolvimento do trabalho. 248 TASSIOS, T. P.; MAMILLAN, M. Valutazione strutturale dei monumenti antichi, op. cit.

Page 136: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

135

Os resultados, obtidos após os cinco ensaios ultrassônicos supracitados, foram

os seguintes, conforme discriminado no Quadro 11:

Quadro 11 – Resultados da aplicação de ensaios sônicos nas paredes da Igreja do Passo

Ensaio Espessura da

parede

(cm)

Altura da parede

(m)

Constituição material Velocidade de

onda

(m/s)

US1 74,1 8,99

Alvenaria mista de pedra (arenito) e tijolos

argamassados

-*

US2 21,5 1,02

Alvenaria de pedra de arenito

2.500

US3 22,8 1,02

Alvenaria de pedra de arenito

3.125

US4 22,3 1,02

Alvenaria de pedra de arenito

1.111

US5 70,2 8,99

Alvenaria mista de pedra (arenito) e tijolos

argamassados

-*

US6 89,9 4,49

Alvenaria mista de pedra (arenito) e tijolos

argamassados

-*

Média (m/s) 2.245,33 Coeficiente de variação 37%

*Overflow. Trata-se de resultado dado pelo osciloscópio, quando o pulso de onda do emissor não consegue atingir o geófono receptor.

Fonte: Elaboração do autor (2016).

5.1.2.1.1 Discussão dos resultados para ensaios sônicos

A natureza dos ensaios com ultrassom é quantitativa e qualitativa. Mediante o

uso dos geófonos ultrassônicos, o intuito deste ensaio, inicialmente, era

Page 137: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

136

determinação da consistência física da parede e de sua resistência à compressão e

módulo de elasticidade, a partir da utilização do ábaco de Tassios e Mamillan249.

Foi visto, no entanto, que, em alvenarias mistas, não é possível obter os

parâmetros de velocidade de onda, com o uso de tais instrumentos, já que o

velocímetro apresentou, como resultado, nos testes US1, US5 e US6, overflow. Isso

significa que essas oscilações ultrassônicas se dissiparam nos materiais da

alvenaria mista, ou não tiveram o comprimento de onda suficiente para atingir o

geófono recebedor.

O intuito, inicialmente, era a elaboração do mapa físico do muro, conforme

determinado por Cóias250, no entanto, todas as tentativas de emissão, na mesma

parede, obtiveram overflow, inviabilizando a montagem do referido gráfico. De fato, a

presença do martelo instrumentado para esse tipo de ensaio é primordial, como já

relatavam Buffarini, D’Aria e Giacchetti251, dada a possibilidade de adequar a

frequência da onda correta para cada tipo de alvenaria. A Física ensina que pulsos

com frequências mais longas atingem maiores profundidades. Por outro lado, foi

possível encontrar a resistência da pedra da construção, que, de certa forma, é um

sistema mais homogêneo que a parede mista.

Percebe-se certa correspondência de valores de recepção dos geófonos

nessas pedras, sendo dois desses resultados na faixa dos 3.000 m/s. Não obstante,

o valor acentuado do coeficiente de variação indica disperção dos parâmetros de

resistência. Ao descartar o resultado de menor grandeza (US4), tem-se um

coeficiente de variação próximo a 15%, portanto aceitável, caso os materiais tenham

características físicas e mecânicas semelhantes.

Os dados obtidos foram analisados segundo o ábaco de Tassios e Mamillan252

(Figuras 73 e 74), já relatado no Capítulo 3. A resistência à compressão obtida,

segundo o ábaco apresentado nas Figuras 73 e 74, ficou compreendida no intervalo

de 10 a 20 MPa, o que se pode observar como resultado aquém do esperado para

pedras de arenito, por exemplo, ou mesmo calcáreos dolomíticos, conforme

249 TASSIOS, T. P.; MAMILLAN, M. Valutazione strutturale dei monumenti antichi, op. cit., p.24. 250 CÓIAS, V. Inspecções e ensaios na reabilitação de edifícios, op. cit., p.8. 251 BUFFARINI, S.; D’ARIA, V.; GIACCHETTI, R. Il consolidamento strutturale degli edifici in cemento armato e muratura, op. cit., p.85. 252 TASSIOS, T. P.; MAMILLAN, M. Valutazione strutturale dei monumenti antichi, op. cit., p.24.

Page 138: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

137

discutido no Capítulo 2 e por Attewell e Farmer253, os quais determinam que valores

razoáveis de resistência estão acima de 40 MPa.

Figura 73 – Ábaco de resistência à compressão das alvenarias de pedra de arenito

Figura 74 – Ábaco do módulo de elasticidade das alvenarias de pedra de arenito

Fonte: Elaboração do autor a partir de Tassios e Mamillan (1985, p.24).

Fonte: Elaboração do autor a partir de Tassios e Mamillan (1985, p.23).

Para o Ensaio US4, por exemplo, não é possível obter a resistência com o

gráfico, pelo valor obtido ser bastante inferior. Existe, então, a possibilidade das

alvenarias no monumento apresentarem defeitos pela pouca capacidade mecânica

desses arenitos, se foram utilizadas para a composição dos muros do edifício.

5.1.2.2 Ensaios de endoscopia e ensaios térmicos

Para esses ensaios, a metodologia de teste procurou, por meio dos danos

encontrados no monumento, definir se a composição física dos muros do edifício

permanece em bom estado de conservação, se existem outros tipos de argamassas,

ou pedras que fazem parte da estrutura da parede, irregularidades geométricas, ou

253 ATTEWELL, P. B.; FARMER, I. W. Principles of engineering geology, op. cit.

US2

US3 US2

US3

Page 139: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

138

grandes diferenças de temperaturas entre as lesões, os revestimentos, e a própria

composição da alvenaria, relatando, assim, a presença de umidade como provável

fator de degradação.

Primeiramente, foram feitos o cadastro da parede e a análise dos desenhos do

monumento, já existentes, para avaliar sua altura, comprimento e espessura. Assim,

foi possível determinar o peso deste elemento construtivo por meio das informações

de autores como Santos Segurado. Nas paredes com sistema estrutural aparente,

foi possível determinar sua constituição física visualmente e medir as dimensões de

seus materiais. As alvenarias rebocadas passaram por prospecções para verificar

suas características.

Após o estudo preliminar, anteriormente descrito, foi medida a dimensão da

lesão para, depois, adentra-lá com o endoscópio, com o cuidado de marcar o quanto

deste penetrou a alvenaria. A inspeção visual foi utilizada como ensaio qualitativo,

responsável pela análise inicial e crítica da estrutura antiga, e procurou dialogar

diretamente com a aplicação dos aparelhos e as informações relatadas nos

capítulos anteriores. Reitera-se que se trata de ensaios visuais, de difícil

interpretação, os quais dependem, diretamente, da leitura do indivíduo que está

realizando o teste, e de seus conhecimentos sobre materiais, tecnologia da

restauração e história da edificação estudada. Por fim, foram avaliadas a

temperatura da alvenaria e a existência de diversas temperaturas na parede. Os

ensaios termográficos foram efetuados às 9:00 da manhã, em paredes que não

recebiam radiação solar, no entanto, para esta pesquisa, interessa somente a

diferença de temperatura entre os materiais, não importando a magnitude dos

valores obtidos. Nesse âmbito, foram obtidos os seguintes resultados:

1– Ensaios E1, T1, conforme Figura 70

– Espessura da parede: 20 cm;

– Altura da Parede: 4,06 m;

– Constituição do material: tijolos inteiros254 cozidos, ou pedaços de tijolos

cozidos, ligados com argamassa de cal, assentados em fiadas paralelas e

irregulares de forma próxima ao aparelho inglês (Figura 75);

254 ROCHA, I. Tijolo por tijolo..., op. cit.

Page 140: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

139

– Provavel causa do dano: recalque255 ou escorregamento por umidade no

terreno;

– Dimensões médias dos tijolos (estimados): 23 x 9 x 5 cm, dimensões

próximas às estudadas por Santos Segurado256, conforme citado na Capítulo 2;

– Dimensões médias das juntas de argamassa: 6cm;

– Dimensão da maior abertura da lesão: 5 cm – Fenda (Figura 76);

– Peso estimado da parede257 (altura x espessura x comprimento x peso

relatado no Quadro 8) = 4,06 x 0,20 x 1,60 = 1,30 m³ x 1800 Kgf/m³ = 2340 kgf

ou 22,95 kN.;

– Profundidade aproximada de entrada do endoscópio = 15 cm (Figura 77);

– Profundidade estimada da lesão = 20 cm;

– Temperatura da parede: 28,5oC / Umidade = Não. A termocâmera demonstra

temperatura constante na alvenaria (Figura 78).

Figura 75 – Lesão analisada para E1, T1

Figura 76 – Maior dimensão do dano em E1,T1

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

255 DI STEFANO, R. Il consolidamento strutturale nel restauro architettonico, op. cit. 256 SANTOS SEGURADO, J. E. Alvenaria e Cantaria, op. cit., p. 67. 257 Todas as estimativas desenvolvidas neste trabalho, para o peso das paredes, foram baseadas no estudo de SANTOS SEGURADO, J. E. Alvenaria e Cantaria, op. cit., p. 113.

Page 141: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

140

Figura 77 – Resultado E1, demonstrando a pouca profundidade da lesão

Figura 78 – Resultado T1, não apresentando variação de temperatura

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015). Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Observa-se que se trata de parede erguida em tijolos, provavelmente após a

construção do monumento, para a criação de antigo nicho. O ensaio com

endoscópio (Figura 77) revela a presença da antiga alvenaria de pedra

argamassada escondida na parte posterior da parede. É possível que a seção

original da parede estrutural tenha-se perdido, causando provável instabilidade do

sistema.

2 – Ensaios E2, T2, conforme Figura 70

– Espessura da parede: 70 cm;

– Altura da parede: 8,99 cm;

– Constituição do material: alvenaria mista de pedra (arenito) e tijolos

argamassados;

– Provável causa do dano: recalque 258 ou escorregamento por umidade no

terreno;

– Dimensionamento da maior abertura da lesão: 6,47 mm – trinca (Figura 79);

258 DI STEFANO, R. Il consolidamento strutturale nel restauro architettonico, op. cit.

Page 142: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

141

– Profundidade estimada da lesão: não superior à espessura da parede.

Percebeu-se, através de inspeção endoscópica (Figuras 80 e 81), o relativo

fechamento da lesão à medida que o aparelho foi sendo inserido na alvenaria;

– Temperatura da parede: 30,2oC / Umidade: Não. (Figura 82);

– Profundidade de entrada do endoscópio: 4 cm;

– Peso estimado da parede (altura x espessura x comprimento x peso relatado

no Quadro 8): 8,99 x 0,70 x 5,00 = 31,465 m³ x 2000 Kgf/m³ = 62930 Kgf

ou 617 kN.

Figura 79 – Lesão analisada e sua maior dimensão, para E2, T2

Figura 80 – Aplicação da técnica endoscópica na lesão, para E2, T2

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Figura 81 – Resultado E2, demonstrando a profundidade da lesão

Figura 82 – Resultado T2, não apresentando variação de temperatura da alvenaria

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015). Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Page 143: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

142

3 – Ensaios E3, T3, conforme Figura 70

– Espessura da parede: 90 cm;

– Altura da parede: 2,65 m;

– Constituição do material: alvenaria mista de pedra (arenito) e tijolos

argamassados, assentados parte com argamassa de cal e parte com ligante

cimentício;

– Provável causa do dano: recalque, materiais com comportamentos diversos;

– Dimensionamento da maior abertura da lesão: 16,33 mm, fenda (Figura 83);

– Profundidade estimada da lesão: pouco profunda. Não foi possível adentrar

totalmente na lesão com o aparelho endoscópio (Figuras 84 e 85);

– Temperatura da parede: 29,7 oC / Umidade: sim (Figura 86);

– Profundidade de entrada do endoscópio: 2 cm;

– Peso estimado da parede (altura x espessura x comprimento x peso relatado

no Quadro 8) = 2,65 x 0,9 x 1,7 = 4,05 m³ x 2000 Kgf/m³ = 8100 Kgf ou 79,5

kN.

Figura 83 – Lesão analisada, em sua maior dimensão, para E3, T3

Figura 84 – Aplicação da técnica endoscópica na lesão, para E3, T3

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Page 144: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

143

Figura 85 – Resultado E3, demonstrando a profundidade da lesão e a irregularidade da constituição da argamassa

Figura 86 – Resultado T3, não apresentando variação de temperatura da alvenaria

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

4 – Ensaios E4, T4, conforme Figura 70

– Espessura da parede: 40 cm;

– Altura da parede: 4,60 m;

– Constituição do material: tijolos cozidos ligados com argamassa de cal e de

cimento;

– Provável causa do dano: recalque, empuxo do terreno, empuxo de raízes de

vegetais superiores;

– Dimensão da maior abertura da lesão: 24 mm - fenda (Figura 87);

– Profundidade de entrada do endoscópio: 40 cm (Figura 88);

– Profundidade estimada da lesão: 40 cm, visto a fácil passagem do

endoscópio e grande espaço vazio (Figura 89);

– Temperatura da parede: 27,6 oC / Umidade: sim (Figura 90);

Page 145: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

144

– Peso estimado da parede (altura x espessura x comprimento x peso relatado

no Quadro 8): 4,60 x 0,4 x 8,00 = 14,72 m³ x 1800 Kgf/m³ = 26496 Kgf, ou

259 kN.

Figura 87 – Lesão analisada, em sua maior dimensão, para E4, T4

Figura 88 – Aplicação da técnica endoscópica na lesão

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

Figura 89 – Resultado E4, demonstrando alto risco estrutural e a existência de conchas na argamassa (setas vermelhas)

Figura 90 – Resultado T4, apresentando variação de temperatura na lesão, o que determina alta presença de umidade

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015.

Fonte: Acervo do autor (ago. 2015).

1– Ensaio T5, conforme Figura 70

– Espessura da parede: 90 cm;

– Altura da parede: 4,49 m;

área com variação de

temperatura

Page 146: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

145

– Constituição do material: alvenaria mista de pedra (arenito) e tijolos

argamassados (20 x 7 x 4 cm, em média) (Figura 91);

– Provável causa do dano: expulsão de material por instalação escondida na

parede;

– Temperatura da parede: 26 oC / Umidade: sim, é possível perceber faixa

vertical úmida próxima à lesão, demonstrando provável tubulação escondida.

(Figura 92);

– Dimensão da maior abertura da lesão: 3,57 mm, fissura (Figura 93);

– Profundidade de entrada do endoscópio: não foi possível penetrar o

endoscópio;

– Profundidade estimada da lesão: provavelmente superficial;

– Peso estimado da parede (altura x espessura x comprimento x peso relatado

no Quadro 8): 4,49 x 0,9 x 9,35 = 37,78 m³ x 1800 Kgf/m³ = 68004 Kgf, ou

667 kN.

Figura 91 – Constituição material da parede lesionada. Alvenaria mista de pedras e tijolos argamassados

Figura 92 – Resultado T5 demonstra faixa de umidade causada, provavavelmente, por tubulação escondida

Fonte: Acervo do autor (maio 2016)

Fonte: Acervo do autor (jul. 2016)

Page 147: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

146

Figura 93 – Maior dimensão da lesão, para o ensaio T5

Fonte: Acervo do autor (mai. 2016)

5.1.2.2.1 Discussão dos resultados para ensaios com endoscópio e termografia

A segunda natureza dos ensaios é de tipo qualitativo, baseados na inspeção

com endoscópio e termocâmera. Os testes elencados nessa categoria foram

responsáveis por determinar alguns questionamentos sobre os aspectos físicos dos

danos nos muros do monumento.

Primeiramente, a capacidade do endoscópio em penetrar as fendas já mostra o

quanto foi lesionada a parede resistente. A imagem obtida com aparelho pôde

revelar a profundidade de algumas dessas trincas e, ainda, foi possível perceber as

diversas características das argamassas, grande parte de cal com a presença de

conchas marinhas. Adicionalmente, o ensaio E1 revelou parede de alvenaria mista,

escondida atrás do muro lesionado.

Em outro caso, E3, percebe-se a mistura entre argamassas de cal com

argamassas de cimento, podendo esse fator ser consolidação anterior, influenciando

a expansividade do ligante de assentamento, através da cristalização de sais de

sulfato259 e, consequentemente, causando danos.

259Alguns autores já relatavam o problema em outros monumentos: “A presença de sulfatos, sais bastante expansivos durante o processo de cristalização, está provavelmente associada à contaminação do material e às intervenções de cimento existentes,fatos que podem estar causando a degradação das argamassas” (OLIVEIRA, M. M. de; MUÑOZ, R.; MAGALHÃES, A. C. A. Capela de Santana do Miradouro: proposta de estabilização estrutural. Relatório técnico. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 2013. p. 25).

Page 148: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

147

Além disso, através dos ensaios termográficos, como em T3 e T4, identificou-

se a presença de umidade na parede. Em T3, a presença de material úmido na

padieira pode estar causando o cedimento da alvenaria, enquanto, em T4, a

evidente mancha de umidade (azul escuro), pode determinar dano causado por

presença de vegetação, ou mesmo empuxo do terreno molhado. O ensaio T5, em

concordância, a partir dos resultados expostos, demonstra dano causado,

provavelmente, por instalação hidráulica próxima, causando expulsão do material.

Assim, para T5, é possivel descartar, inicialmente, a hipótese de dano causado por

rotação.

Os ensaios qualitativos foram importantes para a criação de novo raciocínio

sobre a origem das lesões na Igreja do Santíssimo Sacramento da Rua do Passo.

Neste monumento, nem todo dano tem gênese somente na rotação dos muros ou na

movimentação da encosta, como inicialmente pensado, mas em fatores físicos do

ambiente em que se encontra a parede resistente.

Através dos estudos de Santos Segurado, pôde-se, também, revelar o peso da

parede resistente. No entanto, sabe-se que esse parâmetro é, de certa forma,

genérico, pois irá depender de diversos outros fatores para sua identificação.

Nesses casos, faz-se necesária a aplicação dos macacos planos, abordados a

seguir.

5.2 O ANTIGO PRÉDIO DA COMPANHIA CIRCULAR DE CARRIS DA BAHIA

Localizado em posição privilegiada no Centro Histórico de Salvador, o antigo

prédio da Companhia Circular de Carris da Bahia encontra-se no entorno de um dos

monumentos mais importante da Capital: a Catedral Basílica (Figura 94).

Page 149: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

148

Figura 94 – Montagem de figuras mostrando a localização do prédio: 1 – Salvador; 2 – Centro Histórico de Salvador; 3 – Bairro da Sé, com o prédio da Companhia marcado em amarelo

Fonte: Elaboração do autor a partir de base cartográfica do Google (2016).

A história desse prédio tem relação direta com a modernização dos ascensores

urbanos e da mobilidade de Salvador pela Companhia Circular de Carris da Bahia,

empresa que chega à Capital no fim do século XIX.

Inicialmente, servia de estribaria e casa de máquinas (Figura 95) para o recém-

construído Chariot260, antigo plano inclinado Isabel, porém, no início do século XX, é

demolida a construção original para a criação do atual edifício eclético (Figura 96),

com função administrativa.

260 SAMPAIO, C. N. 50 anos de urbanização: Salvador da Bahia no século XIX. Rio de Janeiro: Versal, 2005. p. 208.

CATEDRAL

ANTIGO PRÉDIO DA COMPANHIA CIRCULAR DE

CARRIS DA BAHIA

3 2 1

Page 150: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

149

Figura 95 – Antiga estribaria da Companhia Circular de Carris da Bahia

Figura 96 – Edifício eclético construído no mesmo local

Fonte: Sampaio (2005, p. 210). Fonte: Acervo do autor (jan. 2014).

Com o fim dos bondes e a incorporação da Companhia Circular de Carris da

Bahia à Prefeitura de Salvador, no início da década de 60, o prédio é cedido pelo

município a diversas instituições, ao longo do tempo. Nos últimos anos, o edifício foi

utilizado como batalhão da Polícia Militar e, desde 2014, sofre intervenções do

Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para ser transformado em Museu.

Seu sistema construtivo é variado, apresentando alvenarias mistas (estrutura) e

de tijolos furados (fechamento), pilares e lajes de concreto armado, pilares de tijolos

maciços e vigas metálicas. Essa diversidade de estruturas pode ser explicada pela

constante modificação de uso do prédio no decurso dos anos. Trata-se de

monumento com três pavimentos de gabarito: subsolo, térreo e primeiro pavimento,

disposto em planta irregular, como mostrado na Figura 97.

Figura 97 – Planta do pavimento térreo do antigo prédio da Companhia Circular de Carris da Bahia, mostrando planta irregular

Fonte: Acervo do autor (2016).

N

Page 151: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

150

Atualmente, o edifício encontra-se em obra, como relatado anteriormente, e

esse foi um dos fatores para a escolha da edificação para o ensaio com macacos

planos. Outros prédios pensados para este teste não possuiam a rede elétrica

trifásica, necessária para aplicação da técnica.

5.2.1 Testes preliminares com macacos planos

Considerando a escassez de testes com macacos planos no Brasil, foram

realizados ensaios preliminares na Universidade Federal da Bahia, com o intuito de

familiarizar a equipe com os novos equipamentos.

Nessa esfera, o processo relatado a seguir teve grande importância para

indicar o correto método de aplicação da técnica. Por meio da avaliação crítica do

ensaio, foi possível desenvolver a metodologia de aplicação prática dos macacos

planos.

Os aparelhos disponíveis no Núcleo de Tecnologia da Preservação e da

Restauração (NTPR-UFBA) foram testados em uma parede de tijolos de 28 cm de

espessura, assentados com argamassa de cimento, no andar térreo da Escola

Politécnica da Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde foi possível obter toda

infraestrutura para a execução do ensaio com macacos planos, tal como sistema

trifásico e fornecimento de água. A Figura 98, a seguir, mostra o aspecto físico da

parede ensaiada.

Figura 98 – Parede ensaiada na Escola Politécnica da UFBA

Fonte: Acervo do autor (jul. 2014).

Page 152: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

151

5.2.1.1 Procedimento preliminar ao teste

A primeira parte da prova diz respeito às marcações necessárias para a

organização do corte e aplicação das bases de medição que deram suporte ao

desenvolvimento do teste. A sequência das etapas foi a seguinte:

1 – Foi realizada a retirada do revestimento, sendo necessário, desenhar uma

linha horizontal sobre o rejunte da alvenaria a uma distância vertical do solo

entre 60 e 80 cm. Adicionalmente, foi colocada uma guia horizontal, sobre a

área de ensaio, para apoio da serra de corte (Figura 99);

Figura 99 – Revestimento retirado e guia de corte posicionada

Fonte: Acervo do autor (jul. 2014).

2 – foram desenhados pequenos círculos de marcação, para avaliação do

deslocamento descendente da alvenaria após o corte. Esses pontos forma

posicionados de forma a apresentar um intervalo de distância horizontal de 15

cm, localizados acima e abaixo do macaco plano, com três fiadas de marcação;

3 – o conjunto resultante foi uma linha horizontal com seis pontos a seu redor.

A distância vertical entre os dois pares de pontos obedeceu o máximo de 24

cm e o mínimo de 12 cm, seguindo a recomendação RILEM261 que determina a

distância dessas bases entre 30% e 60% da largura do macaco plano. Outros

261 RILEM. Recommendation MDT. D. 4, op. cit.

Page 153: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

152

três pontos foram fixados acima do conjunto para a aplicação do ensaio com

macacos planos duplos;

4 – sobre os círculos desenhados, pequenas peças de metal foram fixadas

para serem utilizadas como as bases de medição (Figura 100). Foi medida a

distância entre elas com um deformômetro, acoplado a um relógio comparador

(Figura 101).

Figura 100 – Pontos fixados na parede ensaiada

Figura 101 – Medição entre os pontos fixados na parede ensaiada

Fonte: Acervo do autor (jul. 2014). Fonte: Acervo do autor (jul. 2014).

A segunda parte do procedimento foi a aplicação do corte na alvenaria, através

de serra diamantada. Nesse contexto, seguiram-se os seguintes passos:

1 – foi ligada a alimentadora da serra à rede elétrica do local;

2 – a alimentadora foi conectada, com uma mangueira, a uma torneira de água

corrente para resfriamento do motor hidráulico e do disco da serra. A atuação

da água fria é importante para que a lâmina da cortadora não aqueça demais,

funcionando também como corte molhado, o que, de certa forma, facilita o talho

no muro;

3 – foram feitas as conexões necessárias com as mangueiras apropriadas

entre a alimentadora e a cortadora. Ligou-se a alimentadora;

Page 154: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

153

4 – realizou-se, então, o rasgo no local marcado na etapa anterior, entre as

bases de medições metálicas já fixadas sobre a alvenaria, utilizando a guia

para corte.

5.2.1.2 Execução do ensaio com macaco simples

Após o corte, a alvenaria pode sofrer um rápido movimento de descida, prestes

a fechar o rasgo. Em algumas alvenarias, essa deformação pode ser tão grande que

o espaço gerado pelo corte tende a não permitir a entrada do instrumento de

medição.

Nesse contexto, foi necessário que o macaco plano fosse inserido quase

momentaneamente, após a execução do rasgo, seguindo os seguintes

procedimentos:

1 – um operador precisou estar pronto para colocar o macaco plano no rasgo,

logo após o outro terminar o corte. Após o talho, foi necessário que se

interrompessem a alimentadora e o fornecimento de água corrente;

2 – inseriu-se o macaco plano (Figura 102); e fez-se, então, a segunda

medição entre as bases acopladas ao muro;

Figura 102 – Macaco plano inserido na parede ensaiada

Fonte: Acervo do autor (jul. 2014).

Page 155: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

154

3 – foram conectadas as mangueiras, entre a bomba hidráulica e o macaco

plano;

4 – foi bombeado o óleo, presente na bomba hidráulica, para o macaco plano,

bem como foram observadas pequenas variações na marcação do manômetro;

isso significa que o instrumento estava recebendo óleo e começando a se

expandir.

5 – aumentou-se a pressão no macaco, gradativamente, até valores fixos. O

primeiro deles foi de 25% do máximo que o aparelho suporta, verificando-se o

deslocamento de cada base de medição, até o retorno ao estado inicial (Figura

103);

Figura 103 – Macaco plano conectado à bomba hidráulica e medição do retorno ao estado inicial

Fonte: Acervo do autor (jul. 2014).

6 – foi reduzida a pressão no aparelho para zero, e não se retirou o macaco

dentro da alvenaria, assim como se manteve a conexão das mangueiras.

Dessa forma, o primeiro teste foi finalizado.

5.2.1.3 Execução do ensaio com macacos duplos

Por fim, foi realizado o ensaio com macacos planos duplos. O procedimento

para fazer um segundo rasgo na alvenaria é similar ao utilizado para apenas um

Page 156: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

155

macaco plano, sendo o novo talho feito acima do primeiro, no mesmo alinhamento

vertical, respeitando um máximo de 60 cm de distância entre as placas. Esse espaço

entre os equipamentos é recomendado pela RILEM262: 150% do valor da largura do

macaco.

Após a realização do rasgo superior, o segundo macaco plano foi

imediatamente inserido na alvenaria e a pressão aumentada até o aparecimento de

pequenas fissuras. Pode-se, também, ouvir estalos da alvenaria, assegurando que o

ensaio e o sistema chegaram ao limite.

5.2.1.4 Problemas observados na execução dos ensaios

Durante a realização do teste, foram observados os seguintes problemas, a

serem resolvidos para a execução do ensaio no antigo prédio da Companhia

Circular de Carris da Bahia:

1 – devido à pequena altura da alvenaria e à dificuldade de realizar as diversas

leituras no deformômetro, não foi possível desenvolver o procedimento correto

para a determinação do módulo de elasticidade;

2 – houve grande dificuldade na retirada dos macacos planos, causando danos

à alvenaria.

5.2.1.5 Resultados

O valor de pressão obtido para o retorno do macaco simples ao seu estado

inicial foi de 1,5 bar. Baseando-se nas fórmulas expostas no Capítulo 3 desta

dissertação, e utilizando a expresssão dada pelo fabricante GLOTZ: Km = 0,92 +

p(0,07/100), foi possível aplicar os valores à expressão fundamental σ = pKmKa;

assim, foi encontrado o valor de 0,093 MPa como a solicitação de compressão que a

alvenaria estava recebendo no ponto do corte.

O ensaio com os macacos planos duplos permitiu o acréscimo de pressão até

uma grandeza de 3,5 bar. Utilizando as relações supracitadas, foi possível

individualizar a tensão máxima suportada pela alvenaria: 0,240MPa.

262 RILEM. Recommendation MDT. D. 5, op. cit.

Page 157: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

156

Não serão discutidos, neste momento, os valores obtidos no ensaio preliminar,

visto que esse teste foi realizado como exercício para execução do ensaio nas

alvenarias mistas do antigo prédio da Companhia Circular de Carris da Bahia.

Adicionalmente, o deformômetro utilizado, elaborado pela equipe do NTPR, não era

preciso como o NOVATEST, próprio para o ensaio.

5.2.2 Ensaios pouco destrutivos no antigo prédio da Companhia Circular de

Carris da Bahia

Os ensaios realizados no antigo prédio da Companhia Circular de Carris da

Bahia seguiram as mesmas metodologias aplicadas na Igreja do Santíssimo

Sacramento da Rua do Passo. No entanto, não foram aplicados ensaios de

endoscopia, tendo em vista a inexistência de rachaduras. O objetivo principal deste

ensaio foi identificar as contribuições do ensaio com macacos planos, em

concordância com os ensaios sônicos, para avaliação física e mecânica da parede

estrutural.

5.2.2.1 Aplicação de inspeção visual e ensaios sônicos para definição física do

muro e avaliação física e mecânica dos componentes singulares da alvenaria

Localizada no subsolo do prédio (Figura 104), a parede ensaiada apresenta

características mistas, com pedras claras (prováveis arenitos), escuras (prováveis

granitos ou gnaisses), assentadas com argamassa de cal. Esse elemento estrutural

não apresenta danos, mas foi aberta uma passagem para movimentação dos

materiais (Figura 105), modificando a geometria da estrutura (Figura 106) e

disposição das linhas isostáticas. Para essa parede, foram previstos ensaios

sônicos, termográficos e de macacos planos.

A referida alvenaria é, também, a mais alta da estrutura, em torno de 10

metros, bem como a mais antiga, provavelmente do século XVII ou XVIII, e espessa

(52 cm). Apesar do referido porte, a partir do pavimento térreo o sistema estrutural

modifica-se em parede de tijolos plenos e meios-tijolos especiais263, assentados com

argamassa de cimento, com dois paramentos e área vazia interna, o que pode

263 ROCHA, I. Tijolo por tijolo...., op. cit., p. 147;148.

Page 158: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

157

atenuar seu peso. Trata-se de sistema estrutural muito comum no início do século

XX, quando foi construído o prédio.

Figura 104 – Localização dos ensaios no antigo prédio da Companhia Circular de Carris da Bahia

Fonte: Elaboração do autor (2016).

Figura 105 – Parede proposta para aplicação dos ensaios de macacos planos

Figura 106 – Modificação da geometria da parede com abertura de vão

Fonte: Acervo do autor (dez. 2015).

Fonte: Acervo do autor (dez. 2015).

Avaliada a parede por meio de inspeção visual, como suprarrelatado, verificou-

se o dimensionamento da estrutura, retomando as Fórmulas de Rondelet264. Uma

vez que não diz respeito a um muro isolado, nem divisório ou de suporte de telhado,

264 BARBEROT, E. Tratado Práctico de Edificación, op. cit., p. 43.

Parede ensaiada

Parte removida da parede

US, T

US, T MP

LEGENDA

Ensaios:

T – Térmico

US – Ultrassom

MP – Macacos planos

Page 159: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

158

a expressão para determinação da espessura da alvenaria deverá seguir a teoria

dos muros espessos de fachada:

e = l /46 + h/46 (8)

Assim:

e = 13,54/46 + 10/46 = 0,47m < 0,52 m – dimensionamento correto, acima do esperado pela formula de Rondelet.

Após a análise física do sistema estrutural, procurou-se avaliar as qualidades

mecânicas das pedras que constituem a alvenaria. Para isso, utilizou-se o ensaio

sônico, por meio de transmissão direta, como instrumento de obtenção da

resistência à compressão e módulo de elasticidade dos elementos líticos (Figuras

107 e 108).

Figura 107 – Execução de ensaios sônicos para avaliação mecânica de pedras mais escuras

Figura 108 – Execução de ensaios sônicos para avaliação mecânica de pedras mais claras

Fonte: Acervo do autor (maio 2016). Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Como esperado, pedras negras como granitos ou gnaisses geraram alta

velocidade de onda (máximo de 4400 m/s), enquanto os litos mais claros (calcários

ou arenitos) compreenderam resultados abaixo do esperado (máximo de 3600 m/s).

Comparando os valores obtidos com o ábaco de Tássios e Mamillan (Figuras 109 e

110), verifica-se que os elementos pétreos escuros encontram-se, conforme

Page 160: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

159

determinado por Attewell e Farmer265, na faixa de resistência fraca e razoável (30 a

80 MPa), média de 51,13 MPa, desvio padrão de 19,59 MPa e coeficiente de

variação de 38%. As pedras claras permaneceram no campo dos elementos fracos e

muito fracos (0 a 30 MPa), com média de resistência igual a 13,50 MPa, desvio

padrão de 7,16 MPa e coeficiente de variação de 53%. Percebe-se que há grande

oscilação na resistência desses litos, o que pode indicar que o monumento foi

construído com materiais diversos, trazidos de variados locais.

Figura 109 – Resultados obtidos por meio do ábaco de resistência à compressão das pedras

Figura 110 – Resultados obtidos por meio do ábaco do módulo de elasticidade das pedras

Fonte: Elaboração do autor a partir de Tassios e Mamillan (1985, p.24).

Fonte: Elaboração do autor a partir de Tassios e Mamillan (1985, p.23).

O módulo de elasticidade das pedras escuras variou de 18000 MPa a 30000

MPa, média de 22800 MPa, desvio padrão de 3,65 MPa, com coeficiente de

variação irrisório, encontrando-se entre os valores estimados por Vallejo e

colaboradores266 e Stowe267, para granitos(1700 a 68000 MPa). Já os litos mais

265 ATTEWELL, P. B.; FARMER, I. W. Principles of engineering geology, op. cit. 266 VALLEJO et al. Ingeniería Geologica, op. cit. 267

STOWE, R. L. Strength and deformation properties of granite, basalt, limestone..., op. cit.

Pedras escuras

Pedras claras

Pedras escuras

Pedras claras

Page 161: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

160

claros tiveram oscilação de 8000 a 18000 MPa de módulo, média de 12600 MPa,

desvio padrão de 3,16 MPa e coeficiente de variação abaixo de 0.

5.2.2.2 Aplicação dos macacos planos para definição das características mecânicas

da alvenaria

Definidas as resistências das pedras e a constituição da alvenaria, foi aplicado

o ensaio com macacos planos. Os testes seguiram os mesmos procedimentos

relatados no processo preliminar de pesquisa, conforme executados na Escola

Politécnica da UFBA. No entanto, a aplicação dos ensaios em alvenaria mista é

diferente. Devido à grande heterogeneidade da parede e a poucas juntas de

argamassa, bem como o pouco alcance do deformômetro (de 25,5 a 26,5 cm), as

marcações foram feitas de acordo com a capacidade da superfície em receber as

bases de medição.

Portanto, não foi possível seguir precisamente a simetria e distâncias definidas

na norma reguladora (RILEM). Não obstante, todos os pontos estabelecidos e a

localização dos cortes estão rigorosamente dentro dos valores máximos e mínimos

da referida recomendação.

Inicialmente, procurou-se a melhor posição para a realização dos dois talhos

para a execução do teste. Neste âmbito, foram encontradas duas juntas mistas de

argamassa possíveis para corte, com tijolos e pequenas pedras (Figura 111), a uma

distância de 56 cm entre elas, obedencendo o máximo de 60 cm definido por norma.

Estabelecidas as marcações horizontais que seriam abertas, foram definidos os

posicionamentos das primeiras bases de medição (Figura 112), em três fiadas (B1,

B2 e B3), dispostas simetricamente ao primeiro talho, respeitando o campo de

execução do deformômetro e a melhor superfície de contato. Mediu-se, então, o

afastamento entre elas (Figura 113).

Page 162: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

161

Figura 111 – Definição da primeira horizontal de corte, marcado em vermelho

Fonte: Elaboração do autor (maio 2016).

Figura 112 – Marcação e colagem das bases de medição

Figura 113 – Medição da distância entre bases coladas ao muro

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Novos pontos foram colados ao muro, no mesmo alinhamento vertical das

primeiras fiadas de ensaio, para a medição do teste com macacos duplos (B1', B2' e

B3'). A distância entre eles foi a mesma dos anteriores, sempre seguindo a melhor

condição da superfície para fixação dessas guias. Foram posicionados, também,

entre as referidas bases de medição, pontos em uma linha horizontal (H1) para

cálculo do módulo de Poisson. Dessa maneira, com as fiadas instaladas e

devidamente anotadas as distâncias entre elas, realizou-se o primeiro corte na

alvenaria, na linha horizontal mais baixa (Figura 114), inseriu-se o primeiro macaco

plano (Figura 115) e foram medidos os novos afastamentos das bases (Figura 116).

Page 163: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

162

Figura 114 – Corte da alvenaria com serra diamantada

Figura 115 – Macaco plano inserido na alvenaria

Figura 116 – Medição das distâncias das bases

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Foram conectadas, então, as mangueiras de óleo ao macaco plano, para

realizar o enchimento por meio de bomba hidráulica, com o intuito de retomar as

medidas iniciais das fiadas, obtidas antes do corte com a serra diamantada. Assim,

incrementou-se a pressão do macaco e foram realizadas medições a cada 0,5 bar

até o retorno da alvenaria ao seu estado inicial. Os resultados do primeiro teste

foram relatados na Figura 117, a qual apresenta os valores de pressão, em bar,

obtidos no momento em que cada base (B1, B2 e B3) retornou ao seu estado

original de posicionamento.

Figura 117 – Gráfico das pressões obtidas para o retorno da alvenaria ao seu estado inicial, por base de medição

Fonte: Elaboração do autor (2016).

Page 164: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

163

No Quadro 12, complementar à Figura 117, foram dispostas sete colunas com

dados sobre o teste: uma seção que demonstra as variações de leituras no

manômetro para cada acréscimo de pressão (primeira coluna da esquerda para

direita); três seções (colunas do meio) que indicam a leitura no deformômetro para

cada mudança de pressão, nas três bases de medição (B1, B2 e B3); três seções

(últimas colunas da esquerda para a direita) que apresentam o posicionamento das

bases de medição para cada acréscimo de pressão, em relação ao estado inicial de

B1, B2 e B3, calculado pela variação das deformações lidas no deformômetro. As

últimas linhas demonstram os resultados da tensão (já corrigida em MPa), seu

desvio padrão e a média na porção ensaiada determinada pelas bases de medição.

Percebe-se, que o coeficiente de variação obtido foi relativamente alto (39%),

para tensões em uma porção muito pequena da parede ensaiada.

Quadro 12 – Valores obtidos com o ensaio com macacos planos simples

ENSAIO COM MACACOS PLANOS SIMPLES Leitura no manômetro

(bar) Leitura no deformômetro (mm) Deformação (mm)

B1 B2 B3 B1 B2 B3

0,1 (antes do corte) -8,117 -2,621 -5,482 0 0 0

0,1 (depois do corte) -7,891 -1,532 -5,239 -0,226 -1,089 -0,243

0,6 -7,999 -2,184 -5,528 -0,118 -0,437 +0,046

1,1 -8,372 -2,392 -5,539 +0,255 -0,229 +0,057

1,6 -8,634 -2,893 -5,591 +0,517 +0,272 +0,109 Resultados

Tensão corrigida (MPa) = Km x P x Ka Km = 0,92 + p(0,07/100) - Glotz P = pressões da Fig. 117 em MPa Ka = 0,745 (ver p. 117)

Resultado B1 = 0,92 x 0,08 x 0,745 = 0,055 Desvio padrão = 0,024

Resultado B2 = 0,92 x 0,13 x 0,745 = 0,089 Tensão Média = 0,062 Resultado B3 = 0,92 x 0,06 x 0,745 = 0,041 Coeficiente de variação = 39%

Fonte: Elaboração do autor (2016).

Finalizado o teste com macacos planos simples, foi realizado um novo corte

(Figura 118), acima do primeiro, e inseriu-se outro macaco plano para a realização

do ensaio de compressão monoaxial da parede (Figura 119).

A pressão no macaco inferior foi reduzida e realizou-se nova medição da

distância entre as bases (Figura 120), desta vez, aquelas que se encontravam na

porção de alvenaria entre os aparelhos.

Page 165: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

164

Figura 118 – Realização do corte superior para inserção do macaco plano

Figura 119 – Dois macacos planos conectados para a realização de ensaio de compressão monoaxial

Figura 120 – Medição preliminar das bases localizadas na porção de alvenaria entre os macacos

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

O início do teste com macacos duplos deu-se com o aumento da pressão nos

dois pratos, realizando-se, no intervalo de 0,5 bar, a medição das distâncias dos

pontos marcados entre os aparelhos.

O ensaio, no caso de alvenarias mistas, termina ao se notar a resistência da

parede ao aumento de pressão na bomba, ou a presença de fissuras na alvenaria

(Figura 121) que, neste caso, ocorreram a 2,4 bar de pressão.

Figura 121 – Fissuras na alvenaria, após aplicação dos macacos planos

Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

Page 166: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

165

Os resultados da experimentação com macacos planos duplos são relatados

no Quadro 13. Na primeira coluna, da esquerda para a direita, são mostradas as

pressões obtidas até o estado de ruptura do muro, sendo seu valor máximo 2,4 bar.

As colunas 3, 4 e 5 representam os valores lidos no deformômetro a cada aumento

de pressão, para casa base de medição, inclusive a fiada horizontal H1. Não foi

medida a base B3, vistou que houve a queda da guia durante ensaio.

As colunas 5, 6 e 7 são resultados dos cálculos da diferença entre os valores

final e inicial, de uma faixa de pressão para outra, lidos no derformômetro, para obter

a deformação real. Por exemplo: a deformação obtida, para a base B1', entre a

pressão 0,1 e 0,9 será o valor final -3,331 - (-3,795), que será 0,464 mm. A coluna 8

representa as pressões identificadas no manômetro, já corrigidas, de acordo com os

coeficientes do fabricante dos aparelhos.

Por último, a coluna 9 traz os valores acumulados de deformação, relativos à

área ensaiada. Exemplo: a deformação real da base B1', após o primeiro acréscimo

de pressão, é 0,464 mm. Com relação à porção de área ensaiada, será 0,464/560

mm (distância entre macacos planos). Com o acréscimo sucessivo tem-se: (0,464 +

0,158)/560 mm, e assim por diante. Esses valores resultaram no gráfico

tensão/deformação.

Quadro 13 – Valores obtidos com o ensaio com macacos planos duplos

ENSAIO COM MACACOS PLANOS DUPLOS Leitura no

manômetro (bar) Leitura no deformômetro

(mm) Deformação (mm) 1 2 3 4 5 6 7

B1' B2' H1 B1' B2' H1'

0,1 -3,795 -3,732 1,072 0 0 0

0,9 -3,331 -3,661 1,107 0,464 0,071 0,035

1,4 -3,173 -3,593 1,148 0,158 0,068 0,041

1,9 -2,999 -3,531 1,177 0,174 0,062 0,029

2,4 - Ruptura -2,577 -3,379 1,201 0,422 0,152 0,024

Tensão corrigida = 0,92 x P x 0,745 Deformação relativa acumulada (mm/mm)

8 9

0,615 0,00082857 0,00012679 -

0,957 0,00111071 0,00024821 -

1,299 0,00142143 0,00035893 -

1,641 0,002175 0,00063036 0,00023036

Fonte: Elaboração do autor (2016).

Page 167: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

166

As Figuras 122 e 123, a seguir, são gráficos tensão/deformação gerados pelo

Software Excel com os dados do Quadro 13.

Figura 122 – Gráfico tensão/deformação para B1 e equação da reta tangente à curva

Figura 123 – Gráfico tensão/deformação para B2 e equação da reta tangente à curva

Fonte: Elaboração do autor, a partir do Software Excel (2016).

Fonte: Elaboração do autor, a partir do Software Excel (2016).

Desse modo, os módulos de elasticidade (coeficientes angulares das retas

tangentes às curvas de tensão/deformação) resultaram em 736,2 MPa, para B1', e

2001,0 MPa, para B2'. Foram encontrados, também, dois coeficientes de Poisson,

sendo 0,105 para B1' e 0,365 para B2', que são a relação final entre a deformação

relativa acumulatada de H1 e a deformação final de B1' e B2'. Adicionalmente e no

contexto do estudo dos ensaios não destrutivos, testes com a câmera termográfica,

realizados após a execução dos macacos planos, mostraram que a parede

ensaiada, ao tornar-se úmida, devido ao corte molhado da serra diamantada, ficou

com quase 2 oC de temperatura a menos que as da alvenaria do edifício (Figuras

124 e 125).

Page 168: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

167

Figura 124 – Área da parede ensaiada apresentando variação de temperatura devido ao corte molhado da serra diamantada

Figura 125 – Temperatura da parede em condições normais

Fonte: Acervo do autor (maio 2016). Fonte: Acervo do autor (maio 2016).

5.3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS EM CONCORDÂNCIA COM PESQUISAS

EUROPEIAS

No intuito de complementar a avaliação das metodologias dos ensaios, bem

como dos resultados obtidos a partir da aplicação dos testes na Igreja do Passo e no

antigo prédio da Companhia Circular de Carris, é importante comparar as

experimentações com as pesquisas que estão na vanguarda dos estudos sobre o

tema.

As pesquisas sobre diagnósticos não destrutivos, nos Estados Unidos e na

Europa, datam de fins da década de 80 e início da década de 90. A norma ASTM

(americana), principal documento regulador do teste com macacos planos, foi criada

em 1999 e tornou-se a base para todas as outras definições operativas desses

ensaios. De maneira geral, a execução de testes que causam poucos danos à

consistência material da estrutura, nas referidas regiões, está ligada à restauração

estrutural de edifícios, tanto de valor patrimonial quanto em novos sistemas de

suporte.

Assim, como determinado nos ensaios aplicados nos dois monumentos

estudados nesta dissertação, a maioria das pesquisas não destrutivas executadas

na Europa está focada no diagnóstico das áreas lesionadas de uma parede, ou

mesmo de outros elemenos móveis ou integrados danificados.

Page 169: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

168

Um exemplo da aplicação de técnicas que pouco influenciam a consistência

material de alvenarias antigas é o diagnóstico da Igreja de Santa Maria em Oristano,

na Itália, realizado por Concu e De Nicolo268. Tendo em vista a presença de diversas

fissuras na fachada do monumento, buscou-se a execução de diagnósticos não

destrutivos, de forma qualitativas e quantitativas, para avaliação estrutural do edifício

em questão269.

Os autores utilizaram os ensaios sônicos para avaliar, inicialmente, a qualidade

da pedra que constitui a fachada da Igreja de Santa Maria. Foram investigadas as

resistências dos elementos pétreos por meio do valor de velocidade obtido com os

ensaios: “Sonic tests and endoscopy pointed out that stone quality decreases from

bottom to top and towards the inner layers of the masonry”270. Dessa maneira, houve

grande variação de resistência: de 37,6 (topo) a 253, 9 MPa (base), e essa gama vai

de pedras fracas a muito fortes, de acordo com a escala de Attewell e Farmer271, o

que pode justificar a maior quantidade de fissuras nas cimalhas do monumento.

Outra função dos ensaios sônicos, neste estudo, foi a avaliação, conjuntamente

com a endoscopia, de vazios e áreas não consistentes na alvenaria. Relatam os

autores sobre as técnicas aplicadas no muro estudado:

Endoscopy highlighted that masonry non-homogeneities consist mostly of irregular stones and sporadically of potting compost, and sonic test didn't detect any meaningful void or macro cavity that has to be assumed as relevant discontinuity in masonry fabric.272

Nessa esfera, o estudo de Concu e De Nicolo, com relação às tecnicas não

destrutivas, é semelhante aos diagnósticos efetivados na Igreja do Passo e no

antigo prédio da Companhia Circular de Carris da Bahia, nos âmbitos quantitativo

(resistência das pedras) e parte qualitativo. Como relatado anteriormente, no estudo

268 CONCU, G.; DE NICOLO, B. Non-destructive methods as a tool in the assesment of monumental buildings condition. In: BREBBIA, C. (Org.). Structural studies, repairs and maintenance of heritage Architecture. Southampton: WIT Press, 2009. v. 9, p.349. 269 Id., ibid., p.349. 270 “Ensaios sônicos e endoscopia enfatizam que a qualidade das pedras diminuía da base para o topo e em direção às camadas mais internas da alvenaria” (Id., ibid., p. 357. Tradução nossa). 271 ATTEWELL, P. B.; FARMER, I. W. Principles of engineering geology, op. cit. 272 “A endoscopia destacou que áreas não homogêneas na alvenaria são constituídas, na maioria das vezes, de pedras irregulares e, esporadicamente, compostos cerâmicos, e os ensaios sônicos não detectaram nenhum vazio importante ou macro cavidade que tivesse que ser considerada como descontinuidade relevante no sistema mural” (CONCU, G.; DE NICOLO, B. Non-destructive methods as a tool in the assesment of monumental buildings condition, op. cit., p.349. Tradução nossa).

Page 170: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

169

do presente trabalho, não foi possível avaliar a presença de vazios na alvenaria,

considerando a impossibilidade do uso do martelo instrumentado.

Em Portugal, são frequentes as pesquisas sobre macacos planos, aplicados a

alvenarias antigas. Vicente e colaboradores273, acadêmicos portugueses, revelam a

execução dos testes em monumentos na Baixa de Coimbra, no país lusitano.

Nesses diagnósticos, sempre foram executados ensaios simples e duplos.

Para a excução dos referidos ensaios, foram utilizados macacos planos

semirretangulares (400 x 100 mm)274, diferente dos aparelhos que foram

empregados nos testes no antigo batalhão, que eram retangulares (400 x 200 mm).

Por outro lado, a definição da disposição das bases de medição, no caso das

alvenarias mistas em Coimbra, seguiu o mesmo princípio dos ensaios realizados por

esta pesquisa, obedecendo o máximo definido pela RILEM, mas dispondo as guias

em concordância com a morfologia do muro. O mesmo ocorre com a distância entre

os macacos planos, para aplicação do teste de compressão, seguindo o extremo de

60 cm275.

Lourenço e Roque276 também relatam o método de diagnóstico com macacos

planos em alvenarias de Bragança, Portugal. A pesquisa dos referidos acadêmicos

entra em concordância com a presente dissertação em alguns pontos, como, por

exemplo a medição das bases a cada 0,5 bar.

Por outro lado, percebe-se que os pesquisadores utilizaram artifícios para

tornar o ensaio mais preciso, como a melhor determinação da área de contato entre

o macaco e a parede. Na presente dissertação, porém, foi proposto o método

geométrico, analisando a relação entre a área de corte e a geometria dos aparelhos.

Lourenço e Roque relatam:

273 VICENTE, R.; SILVA, J. A. R. M. da.; VARUM, H.; RODRIGUES, H.; JULIO, E. Caracterização mecânica de paredes de alvenaria em construções antigas: ensaios com macacos planos. Revista Internacional Construlink, Lisboa; v. 7, n. 9, p. 57-69. Disponível em: <http://www.civil.ist.utl.pt/ ~cristina/RREst/Aulas_Apresentacoes/07_Bibliografia/inspeccao%20(inspection)/IJ_16.pdf>. Acesso em: 10 maio 2016. 274 VICENTE et al. Caracterização mecânica de paredes de alvenaria em construções antigas..., op. cit., p.60. 275 VICENTE et al. Caracterização mecânica de paredes de alvenaria em construções antigas..., op. cit.,p.62. 276 LOURENÇO, P. B.; ROQUE J. C. A. Caracterização mecânica de paredes antigas de alvenaria: um caso de estudo no Centro Histórico de Bragança. Revista do Departamento de Engenharia Civil da Universidade do Minho, n. 17, p.31-42, maio 2003.

Page 171: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

170

Para facilitar a determinação da razão (Ka) entre a área de contacto do macaco plano e a área da ranhura, foi interposto, entre os macacos e as chapas metálicas de protecção, papel químico envolto em folhas de papel branco.277

Os resultados da aplicação dos macacos planos em Bragança são relatados no

Quadro 14 a seguir.

Quadro 14 – Resultados da aplicação de ensaios com macacos planos em Bragança

Localização Tensão prevista

(MPa)

Tensão média

(MPa)

Tensão de rotura

(MPa)

Módulo de

elasticidade

(GPa)

Janela 1 0,12 0,13 0,70 – 0,80 0,30 – 0,60

Janela 2 0,12 0,13 0,80 – 1,00 1,50 – 2,20

Janela 3 0,07 0,09 0,40 – 0,50 0,50 – 0,75

Janela 4 0,07 - - -

Valores médios 0,7 1,0

Fonte: Elaboração do autor a partir de Lourenço e Roque (2003, p.41).

Destaca-se, também, nesse mesmo artigo, a aplicação de ensaios de

endoscopia, antes dos referidos testes com macacos planos, para avaliação do

melhor ponto a ser desenvolvido o diagnóstico278.

Analisando os resultados de tensão instalada, tensão de ruptura e módulo de

elasticidade, obtidos com testes no antigo prédio da Companhia Circular de Carris, e

comparando com os estudos de Lourenço e Roque279 e outros autores, é possível

perceber valores próximos, para testes em alvenarias mistas. Os valores obtidos

com macacos planos, nos testes realizados pela presente dissertação são relatados

no Quadro 15.

277 Id., ibid., p.39. 278 LOURENÇO, P. B.; ROQUE J. C. A. Caracterização mecânica de paredes antigas de alvenaria..., op. cit., p.36. 279 Id., ibid.

Page 172: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

171

Quadro 15 – Resultados finais da aplicação de macacos planos no antigo prédio da Companhia Circular de Carris.

Base de medição Tensão instalada

(MPa)

Tensão de ruptura

(MPa)

Modulo de elasticidade

(GPa)

B1 0,055 1,641 0,736

B2 0,089 1,641 2,001

B3 0,041 - -

Fonte: Elaboração do autor (2016).

Diversos ensaios, efetuados por Vicente e colaboradores280, mostram a

dificuldade de se encontrar uma alvenaria com carga de ruptura maior que 2 MPa.

Pesquisas de Simões e colaboradores281 relatam, também, a magnitude das

resistências e módulos de elasticidade para diversos tipos de alvenarias de pedra. O

Quadro 16 foi elaborado por meio do estudo dos referidos autores:

Quadro 16 - Resultados da aplicação dos macacos planos em diversos tipos de alvenarias

Tipo de alvenaria Tensão de ruptura (MPa)

Módulo de elasticidade (GPa)

Alvenaria de pedra calcária argamassada com cal

0,76 0,144 - 2,670

Alvenaria de pedra calcária argamassada com cal e argila

0,93 - 1,05 0,210 - 0,380

Alvenaria de pedras irregulares argamassada com cal

0,60 - 0,90 0,690 - 1,050

Alvenaria de pedra com enchimento interno (opus implectum)

1,10 - 1,55 1,020 - 1,440

Fonte: Elaboração do autor a partir de Simões et al. (2012, p.4)

Ao mesmo tempo, sabe-se que as argamassas e pedras, em geral, apresentam

resistência superior a esses valores. O questionamento principal é: por que existe

esta grande queda de carga? Provavelmente, como indicam alguns autores, as

capacidades resistentes e elásticas das alvenarias estruturais têm mais relação com

as propriedades das argamassas do que com as características mecânicas das

280 VICENTE et al. Caracterização mecânica de paredes de alvenaria em construções antigas..., op. cit. 281 SIMÕES, A.; GAGO, A.; BENTO, R.; LOPES, M. Flat-jack tests on old masonry buildings. In: 15TH INTERNATIONAL CONFERENCE ON EXPERIMENTAL MECHANICS, 2012, Porto. Anais... Porto: Universidade do Porto, 2012. Disponível em: < http://www.civi.ist.utl.pt/ ~rbento/tmp/SEVERES/ICEM2012_3056.pdf>. Acesso em: 01 jun. 2016.

Page 173: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

172

pedras. Muros com ligantes menos resistentes apresentarão menos capacidade de

conservação e tolerância aos esforços.

Concluindo, foi visto que as metodologias de estudo das pesquisas europeias

foram semelhantes às aplicadas nesta dissertação, no entanto, é preciso evoluir as

práticas do ensaio com macacos planos, que apresentam muitas peculiaridades na

sua aplicação, como já relatado por Vicente e colaboradores282 e Lourenço e

Roque283, tendo em vista a individualidade de cada alvenaria e a diferença entre

diversos equipamentos para execução da técnica. Isto posto, existe a necessidade

de atualização das recomendações existentes, tornando o procedimento mais rígido,

para que o estudo da aplicação da técnica, em diversos tipos de alvenaria, possa

fomentar estudos comparativos mais claros.

282 SIMÕES, A.; GAGO, A.; BENTO, R.; LOPES, M. Flat-jack tests on old masonry buildings, op. cit. 283 LOURENÇO, P. B.; ROQUE J. C. A. Caracterização mecânica de paredes antigas de alvenaria..., op. cit.

Page 174: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

173

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ciência da restauração é uma área de extrema relevância no que tange à

proteção da cultura, seja ela nacional ou internacional, para usufruto das gerações

posteriores. A intervenção restaurativa torna-se ainda mais necessária quando, na

contemporaneidade, percebe-se uma caminhada da sociedade mundial para uma

unificação cultural, fomentada pela globalização de alta velocidade, a qual

desmaterializa fronteiras e objetos e guia os cidadãos em favor de uma língua

comum. O que será da cultura nos próximos duzentos anos? Não se sabe e não se

saberá. No entanto, enquanto nossos monumentos e centros históricos estiverem de

pé e contando sua história, é provável que nossa afirmação como povo e sociedade

permaneça protegida.

O papel do diagnóstico da arquitetura e das estruturas antigas diz respeito,

portanto, a um trabalho primordial para a cultura da sociedade, envolvendo uma

grande sapiência da história da arquitetura e de como os velhos tratadistas

pensavam para edificar seus imponentes monumentos, os quais sobrevivem até os

tempos contemporâneos. Este trabalho tange, também, a ligação desses

conhecimentos históricos com as novas técnicas de tratamento destas estruturas.

Isso posto, foram discutidas as considerações dos mais importantes tratadistas

itálianos para a cultura ocidental: Vitrúvio, Leon Battista Alberti e Andrea Palladio, os

quais descrevem os diversos modos de construir muros nas regiões da península

apenina284, área de grande desenvolvimento durante o renascimento artístico, nos

séculos XV e XVI, e que são a base de todo pensamento ocidental sobre a arte de

edificar.

São relatados, também, os depoimentos de tratadistas franceses dos períodos

barroco e neoclássico, como Bernard Forest de Bélidor e Jean Baptiste Rondelet, os

quais tratam o modo de murar como uma verdadeira ciência, elevando a

complexidade da análise de erigir essas estruturas, descrevendo os melhores

materiais, como se devem produzir esses elementos construtivos e como

dimensionar uma parede resistente, para que esta possua a estabilidade necessária,

com a finalidade de manter o prédio erguido por milhares de anos. Por outro lado, os

284 Trata-se de um dos apelidos da Itália, pela presença, na região, da cordilheira apenina, que se estende por quase 1000 km dentro do território italiano.

Page 175: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

174

estudos do engenheiro militar e do arquiteto supracitados apresentam expressões

de dimensionamento que foram guiadas por observações empíricas e conhecimento

de canteiro de obras, as quais não possuíam embasamento sobre o quantitativo

mecânico ou matemático do comportamento de estruturas murais. Essas pesquisas,

no entanto, eram fortemente apoiadas em técnicas de desenho geométrico.

Os estudiosos dos séculos XIX e do início do século XX, como Pedro

D'Alcantara Bellegarde e João Emílio dos Santos Segurado, reúnem as pesquisas

dos tratadistas passados e revelam as proporções corretas de materiais para a

construção de muros estruturais, baseados em estudos de monumentos antigos,

além de compreenderem a importância do entendimento empírico e experimental

para o dimensionamento de paredes resistentes.

Este domínio da história das construções dá subsídios ao diagnóstico do

restaurador contemporâneo, no sentido de que, ao se deparar com a estrutura

deteriorada, o profissional possa, por vezes, nem utilizar instrumentos de medição

ou retirar corpos de prova, podendo, apenas por inspeção visual, identificar o

problema. Outrossim, os velhos tratadistas ensinam que a experiência é

importantíssima para guiar os trabalhos de restauração que, em alguns casos,

podem não encontrar solução somente na ciência, mas na prática de canteiro.

É importante relatar que se soma ao conhecimento da supracitada ciência

histórica, para avaliação física e mecânica de um muro antigo, a compreensão da

geografia circundante ao prédio, da qual os construtores se valeram para a obtenção

do material necessário à edificação dessas obras, além do conhecimento do

comportamento singular de cada pedra, argamassa ou tijolo utilizado.

Adicionalmente, o entendimento das patologias que incidem sobre o

monumento, em concordância com os pontos relatados anteriormente, dá subsídios

às inspeções visuais dos sistemas estruturais deteriorados, trabalho fundamental

antes do projeto diagnóstico. Faz-se necessária a avaliação de qualquer tipo de

dano na alvenaria e sua causa, como esmagamentos, desagregações e rotações,

que podem afetar a determinação do comportamento físico e mecânico do sistema

construtivo.

Ademais, para o estudo de consolidação estrutural dos edifícios tradicionais, é

necessário o conhecimento dos agentes físicos atuantes em um sistema antigo para

a determinação do comportamento físico e mecânico de uma parede resistente,

Page 176: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

175

forma pela qual as construções antigas mantinham-se erguidas, antes do surgimento

do concreto armado feito com cimento Portland.

Neste sentido, conhecer a geometria do edifício a ser estudado e, também, a

forma do muro antigo que compõe o monumento, torna-se imprescindível para a

determinação de sua estabilidade, sendo, em alguns casos, a excentricidade de uma

alvenaria, bem como sua irregularidade geométrica, um grande problema estrutural.

O reconhecimento do centro de gravidade da parede resistente é fundamental, já

relatava Bélidor, pois se trata do ponto onde atuam as forças do sistema construtivo.

A composição dessas forças deve incidir, obrigatoriamente, no intervalo denominado

"terço médio da base", para se manter em equilíbrio mecânico (ver item 3.2.1, nesta

dissertação). Essa determinação é ponto chave, por exemplo, ao calcular e

dimensionar tirantes e escoramentos para estabilizar uma parede antiga.

Os supracitados conhecimentos são substanciais, pois podem, por exemplo,

tornar o diagnóstico o menos destrutivo possível, evitando, até mesmo, ensaios

quantitativos e qualitativos da composição do muro. Não obstante, é importante que

o restaurador tenha profundo conhecimento dos parâmetros antes estudados. Nessa

esfera, este método, analítico, deve ser utilizado unicamente em duas ocasiões:

1 – quando não é possível acessar completamente a estrutura, algo muito

comum em conjuntos urbanos com várias estratificações históricas, a qual

pode ter recebido adições posteriores que, em diversos casos, são de valor

patrimonial, sendo impossível a demolição desses elementos;

2 – quando a estrutura a ser avaliada apresenta tamanha debilidade que

qualquer incisão de retirada de material, por mais leve que seja, ou ensaio não

destrutivo, possa degradar a estrutura com grande valor patrimonial.

Por muitos anos, na ciência da restauração, os ensaios laboratoriais guiaram

as intervenções em estruturas antigas e, sem dúvida, ainda são testes fundamentais

não só para a elaboração de novos materiais compatíveis com os antigos para o

restauro, como também para a compreensão de certas patologias. Por outro lado, a

evolução da tecnologia, aliada à pesquisa sobre estruturas históricas, permitiu a

elaboração de mecanismos de testes que respeitam, quase integralmente, a

essência da matéria e, teoricamente, fornecem dados mais fidedignos ao

Page 177: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

176

diagnóstico. Nesta dissertação, foram avaliados alguns instrumentos importantes

para esse tipo de investigação.

Teste com ensaios sônicos são uns dos primeiros ensaios não destrutivos

estudados na ciência da restauração, sendo altamente utilizados em análises de

argamassas e em muitos monumentos importantes, como o Parthenon de Atenas.

Atualmente, com o desenvolvimento da técnica e a evolução dos diversos tipos de

ondas obtidas pelo ensaio, continua possuindo papel fundamental no diagnóstico

físico de alvenarias.

É, também, o ensaio com resultados mais fáceis de interpretação, pois

dependem de dados de velocidade de onda, os quais são mais objetivos que

imagens, evitando interpretação errônea dos dados. Por outro lado, assim como os

testes com acelerômetros de vibração, que determinam o comportamento dinâmico

de uma estrutura, depende de configurações específicas e correta calibração. Outro

problema com relação ao ensaio é a falta do controle de qualidade periódico desses

instrumentos, o que pode ser um grande empecilho para aplicação da técnica, tendo

em conta a não confiabilidade dos resultados.

Isso posto, exige, por vezes, a necessidade de consultoria de profissional

especializado para regulagem dos aparelhos. Além do referido problema, foi visto,

nesta dissertação, que ensaios ultrassônicos, à primeira tentativa, não são capazes

de dar informações sobre alvenarias mistas muito espessas, apenas em paredes de

pedra simples. Por outro lado, a regulação da frequência de onda pode ser usada

para obtenção de maiores profundidades, sendo imprescindível o uso de martelos

instrumentados para o ensaio.

As termocâmeras e os endoscópios permitem testes rápidos, de fácil execução,

e relatam dados qualitativamente importantes para o diagnóstico do patrimônio

edificado. No entanto, não influenciam, diretamente, o cálculo estrutural, apesar de

revelar elementos não visíveis nos muros e prováveis indícios de consolidações

anteriores.

A endoscopia, em um dos casos estudados nesta dissertação, pôde

demonstrar o perigo das fendas na alvenaria do monumento, dada a profundidade

desses danos e as características visuais da argamassa. Já a termografia pôde

revelar que as lesões não possuíam uma temperatura diferente da alvenaria geral,

portanto não estando relacionadas à umidade.

Page 178: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

177

Os ensaios com macacos planos, teoricamente, podem ser a base do

desenvolvimento de técnicas de consolidação do patrimônio brasileiro. Os dados

obtidos com a aplicação do ensaio são cruciais para o cálculo de novas estruturas,

adaptadas aos muros antigos, bem como a reconsolidação da alvenaria. A definição

do módulo de elasticidade e da resistência à compressão de uma parede resistente

são fundamentais para o dimensionamento desses elementos consolidantes.

Apesar da importância da técnica, é necessário relatar diversos problemas

relativos à aplicação do ensaio:

1 – é extremamente difícil encontrar pontos elétricos trisfásicos para a serra

de corte, bem como a rede elétrica adequada, fazendo-se necessário o

pagamento de um eletricista ou a compra/aluguel de gerador trifásico. Isso

revela dificuldades de realização do teste em monumentos arruinados, ou em

lugares onde as redes elétrica e hidráulica não chegam;

2 – através da intensa tentativa de realização de testes pelo Núcleo de

Tecnologia da Preservação e da Restauração, foi possível perceber a

dificuldade de execução do ensaio com equipes pequenas, visto o grande peso

e tamanho dos equipamentos e, também, a necessidade de retirada de reboco

das paredes, para execução do experimento. É essencial uma equipe de, ao

menos, seis pessoas (coordenador, dois ajudantes para manuseio das

máquinas, eletricista, pedreiro e ajudante de pedreiro). Ademais, os

pesquisadores devem possuir um meio de transporte espaçoso para a

movimentação das máquinas, caso contrário, será preciso contratar um carreto

para deslocamento do equipamento;

3 – dificuldade de manutenção dos aparelhos, os quais apresentam

funcionamento específico, bem como a necessidade de utilização de óleos e

ferramentas especiais;

4 – Faz-se necessário estudo mais apurado sobre a aplicação precisa da

técnica, principalmente em alvenarias mistas, com superfície irregular. É

imprescindível que o teste seja aplicado com maior frequência, no intuito de

aperfeiçoar a técnica.

Page 179: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

178

Por fim, é importante enumerar e retomar as seguintes questões para a

continuação da pesquisa:

1 – o estudo da execução de ensaios pouco ou não destrutivos para avaliação

do comportamento físico e mecânico de alvenarias antigas é um dos

direcionamentos das pesquisas internacionais sobre a ciência da restauração.

O intuito da procura por este tema é a busca por um diagnóstico que menos

influencie na perda material do monumento e dê resultados mais confiáveis

sobre a real situação da estrutura;

2 – a aplicação de técnicas que pouco afetam a estrutura mural de edifícios

antigos, bem como seus revestimentos, demanda a obtenção de aparelhos de

diagnóstico caros, como aqueles analisados nesta dissertação. No Brasil, os

recursos disponíveis nas universidades tornam o trabalho, com tais

equipamentos, mais difícil, sendo esse tipo de pesquisa mais bem aproveitada

em países mais desenvolvidos;

3 – para a execução dos supracitados ensaios, faz-se necessário um estudo

multidisciplinar sobre o tema. É preciso que, durante os trabalhos de pesquisa,

diversos profissionais da área de arquitetura, engenharia civil e técnicos de

diversas especialidades se empenhem para o cumprimento dos testes. Além

disso, pesquisadores devem ficar atentos à calibração dos instrumentos e

aparelhos, responsáveis pela obtenção dos dados;

4 – apesar dos problemas já relatados, os laboratórios de pesquisas devem

investir no tema, visto a importância de evoluir a ciência da restauração, em

prol da conservação máxima da autenticidade dos monumentos, em

concordância com as práticas internacionais sobre o tema da preservação do

patrimônio edificado;

5 – não há dúvida de que, quanto mais instrumentos disponíveis para o

diagnóstico não destrutivo de estruturas antigas e quanto maior for a

informação histórica sobre o prédio avaliado, maiores serão as possibilidades

de conhecimento dos problemas do edifício, facilitando o trabalho de

Page 180: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

179

verificação estrutural e consequente consolidação. Portanto, a ciência da

restauração, através de métodos não invasivos, reafirma-se como estudo

crítico, físico, matemático e de experimentação, sendo necessário o diálogo

entre as diversas técnicas estudadas, para determinação fidedigna do

comportamento físico e mecânico de muros antigos.

Espera-se que, por meio das informações deste trabalho, futuros restauradores

e pesquisadores possam consolidar o conhecimento integrado entre a história da

construção, resistência dos materiais, mecânica das estruturas e ciência da

restauração, no que tange à utilização correta dos ensaios e aparelhos e sua relação

com os problemas que as estruturas antigas sofrem.

A expectativa é que os dados teóricos aqui apresentados sejam base para

novos ensaios não destrutivos, os quais poderão ser descritos em relatório

comparativo e que darão base para futuras restaurações de monumentos com (ou

sem) valor patrimonial. Além disso, reforça-se a necessidade da inclusão desses

ensaios na rotina de diagnósticos dos diversos monumentos, para fomentar,

também, a multidisciplinaridade da ciência da restauração.

Page 181: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

180

REFERÊNCIAS

ACKERMAN, J. Palladio. Tradução de G. Scattone. Torino: Einaudi, 1972.

ALBERTI, L. B. Della Architettura – Della Pittura e Della Statua. Cópia em Fac-simile, Tradução de Cosimo Bartoli e comentários de Alessandro Pierattini. Roma: Dedalo, 2009.

ANNAN, A. P. Electromagnetic principles of Ground Penetration Radar. In: JOL, H. M. Ground Penetration Radar: theory and applications. Oxford: Elslvier, 2009. p.4-40.

ANTONUCCI, R. Restauro e recupero degli edifici a struttura muraria: analisi e interventi sul "costruito storico". 4. ed. San Marino: Maggioli, 2012.

APPLETON, J. Reabilitação de edifícios antigos: patologias e tecnologias de intervenção. 2. ed. Alfragide, Portugal: Edições Orion, 2011.

ASSAN, A. E. Resistência dos materiais. São Paulo: Unicamp, 2010. v.1.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6120: Cargas para cálculos de estruturas de edificações. Rio de Janeiro,1980.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6460: Tijolo maciço cerâmico para alvenaria - verificação da resistência à compressão. Rio de Janeiro, 1983 a.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7170: Tijolo maciço cerâmico para alvenaria. Rio de Janeiro,1983 b.

ATTEWELL, P. B.; FARMER, I. W. Principles of engineering geology. London: Chapman and Hall, 1976.

BACCO, V. Meccanismi di collasso per effetto di solai di copertura spingenti. Rivista Gazzetta dei Solai, Roma, n. 59, p.1-7, jul. 2009. Disponível em: < http://www. solaioinlaterizio.it/sol/newsletter/n058/news_1.pdf>. Acesso em: 16 set. 2015.

BAHIA. Governo do Estado. Inventário de proteção do acervo cultural da Bahia. Organização de Paulo Ormindo de Azevedo e Vivian Lene. 3.ed. Salvador: Secretaria da Indústria e Comércio, 1997.

BAHIA. Governo do Estado. Salvador e a Baía de Todos os Santos. Edição trilíngue. Organização de Eugênio D’Avilla Lins e Mariely Cabral de Santana. Sevilla: Consejería de Obras Públicas y Vivienda, 2012.

BARBEROT, E. Tratado práctico de edificación. 2.ed. Trad. Lino Álvarez Valdéz. Barcelona: Ed. Gustavo Gili, 1927.

BELLEGARDE, P. A. Compêndio de architectura civil e hydraulica. Versão digitalizada. Rio de Janeiro, 1848.

BÉLIDOR, B. F. La science des ingénieurs dans la conduite des travaux de fortification et d'architecture civile. Versão digitalizada. Paris: l'Image Nôtre-Dame. 1729. v.1.

BÉLIDOR, B. F. La science des ingénieurs dans la conduite des travaux de fortification et d'architecture civile. Versão digitalizada. Paris: l'Image Nôtre-Dame, 1729. v.3.

Page 182: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

181

BÉLIDOR, B. F. La science des ingénieurs dans la conduite des travaux de fortification et d'architecture civile. Versão digitalizada. Paris: l'Image Nôtre-Dame, 1729. v.6.

BINDA, L.; ANZANI, A.; CANTINI, L. Flat-Jack Test: a slightly destructive technique for the diagnosis of brick and stone masonry structures. International Journal for Restoration of Buildings and Monuments, Zurich, p. 449-472, 1999.

BINDA, L.; SAISI, A.; ZANZI, L.; BARONIO, G. Indagine soniche: metodi di prova ed esempi pratici. Milano: Politecnico di Milano/Dipartimento di Ingegneria Strutturale, 2009 [Notas de aula].

BINDA, L.; SAISI, A.; ZANZI, L.; BARONIO, G. Tecniche di indagine e progetto delle indagini per la diagnostica strutturale. In: PESENTI, S. Il progetto di conservazione: linee metodologiche per le analisi preliminari, l'intervento, il controllo di efficacia. Rapporti di ricerca. Politecnico di Milano/Dipartimento di Conservazione e Storia dell'Architettura; Firenze: Alinea, 2001. p.97-139.

BINDA, L.; ZANZI, L.; LUALDI, M.; CONDOLEO, P. The use of georadar to assess damage to a masonry Bell Tower in Cremona, Italy. Revista Science Direct, NDT & E International, Oxford, n. 38, p. 171-179, 2005. Disponível em: <https://www. researchgate.net/publication/222431434_The_use_of_georadar_to_assess_damage_to_a_masonry_Bell_Tower_in_Cremona_Italy>. Acesso em: 11 jan. 2015.

BOERI, A. Pietre naturali nelle costruzioni: requisiti – criteri progetualli – applicazione – prestazioni. 5. ed. Milano: Hoepli, 2000.

BRANDI, C. Teoria da Restauração. Tradução de Beatriz Mugayar Kühl. Cotia, São Paulo: Ateliê, 2004.

BUFFARINI, S.; D’ARIA, V.; GIACCHETTI, R. Il consolidamento strutturale degli edifici in cemento armato e muratura. Roma: EPC LIBRI, 2010.

BURY, J. Arquitetura e arte colonial no Brasil. Organização de Myriam Andrade Ribeiro. Brasilia: IPHAN/MONUMENTA, 2006.

CAPARÓ, E. F. Os arenitos de cimentação calcífera dos antigos edifícios em Salvador: origens. 1997. 158f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 1997.

CENTRO DE ESTUDOS DE VARQUITETURA NA BAHIA(CEAB)/Universidade Fderal da Bahia(UFBA). Evolução Física de Salvador: Edição especial. Salvador: Palloti, 1998.

CHOISY, A. L’art de bâtir chez les romains. Cópia em Fac-símile. Bologna: Forni Editore, 1873.

COELHO FILHO, L. W. A fortaleza de Salvador na Bahia de Todos os Santos, Salvador: KBR, 2004.

CÓIAS, V. A reabilitação estrutural em edifícios antigos. 2.ed. Lisboa: Ed. Argumentum, 2007.

CÓIAS, V. Inspecções e ensaios na reabilitação de edifícios. 2.ed. Lisboa: IST Press, 2006.

Page 183: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

182

COLE, E. História ilustrada da arquitetura. Tradução de Lívia Chede Almendary. São Paulo: Publifolha, 2011.

CONCU, G.; DE NICOLO, B. Non-destructive methods as a tool in the assesment of monumental buildings condition. In: BREBBIA, C. (Org.). Structural studies: repairs and maintenance of heritage Architecture. Southampton: WIT PRESS, 2009. v.9.

CROCI, G. Conservazione e restauro strutturale dei beni architettonici. Torino: UTET libreria, 2001.

DEMANET, A. Cours de construction. Bruxelles: Societé Typographique Belge, 1847.

DIN 4150-3. Structural vibration: effects of vibration on structures. [Norma alemã]. Alemanha, 1999.

DI STEFANO, R. Il consolidamento strutturale nel restauro architettonico. Napoli: Edizioni scientifiche italiane, 1990.

KOCH, W. Dicionário dos estilos arquitetônicos. Tradução de Neide Luzia de Rezende. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

LEITÃO, L. A. Curso elementar de construções. Versão digitalizada. Lisboa: Imprensa Nacional, 1896.

LOURENÇO, P.; GREGORCZYK, P. A review on Flat-Jack Testing. Guimarães, Portugal: Universidade do Minho/Departamento de Engenharia Civil, 2000.

LOURENÇO, P. B.; ROQUE J. C. A. Caracterização mecânica de paredes antigas de alvenaria: um caso de estudo no Centro Histórico de Bragança. Revista do Departamento de Engenharia Civil da Universidade do Minho, n. 17, p. 31-42, maio 2003.

MAGALHÃES, A. C. A. Degradação de revestimentos de paredes de edifícios antigos: metodologia de diagnóstico. 2013. 161f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013.

MARCONI, P. Dal piccolo al grande restauro: colore, struttura, architettura. 4.ed. Venezia: Marsilio, 1988.

MARTINS, L. M. S. Desenvolvimento de ferramenta de cálculo para uma avaliação expedita de estruturas de alvenaria antiga de pedra. 2011. 158f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção e Reabilitação) - Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Viseu, Instituto Politécnico de Viseu, Portugal, 2011.

MARTINS, M. M. Do mar ao ultramar: a transmigração do lioz português para São Luís do Maranhão. Revista de História da Arte e Arqueologia, Campinas, n.19, p. 101-105, jun. 2013.

MATHEUS, J. M. Técnicas tradicionais de construção de alvenarias: a literatura técnica de 1750 a 1900 e o seu contributo para a conservação de edifícios históricos. Lisboa: Livros Horizonte, 2002.

MÜLLER, W.; VOGEL, G. Atlante di Architettura: dalle origini all’era cristiana. 4. ed. Tradução para o italiano de Enrico Gualini, Hellmut Riedger e Luca Trentini. Milano: Hoelpi, 2009. v.1.

MUÑOZ, R. Acidentes e desastres em um trecho da falha de Salvador: um estudo na busca da preservação dos edifícios de interesse cultural. 2009, 376f. Tese

Page 184: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

183

(Doutorado em Arquitetura e Urbanismo)-Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2009. v.1.

OLIVEIRA, M. M. de. Argamassas e restauro de edifícios. In: SEMINÁRIO TIRADENTES: CONSERVAÇÃO E PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO, 2003, Tiradentes, MG. Anais... Tiradentes, 2003. Texto disponibilizado pelo autor.

OLIVEIRA, M. M. de. As fortalezas e a defesa de Salvador. Brasília, DF: IPHAN/Programa Monumenta, 2008 (Coleção Roteiros do Patrimônio).

OLIVEIRA, M. M. de. As fortificações portuguesas de Salvador quando Cabeça do Brasil. Salvador: Omar G., 2004.

OLIVEIRA, M. M. de. Capela de Santana do Miradouro: proposta de estabilização estrutural. Relatório técnico. Salvador: Núcleo de Tecnologia da Preservação e Restauração, 2013.

OLIVEIRA, M. M. de. O uso da terra na construção da antiga Capital da América Portuguesa: uma memória. In: ASSOCIAÇÃO CENTRO DA TERRA (Org.). Arquitectura de Terra em Portugal. Lisboa: Ed. Argumentum, 2005. p.86-91.

OLIVEIRA, M. M. de. Pedra: arquitetura e restauração. Comunicação apresentada ao WORKSHOP DO PROJETO PRONEX-MINOMAT "DOS MINERAIS AOS NOVOS MATERIAIS", 2., 2011, Belém, Universidade Federal do Pará. Cópia digitalizada cedida pelo autor.

OLIVEIRA, M. M. de. Tecnologia da Conservação e Restauração. 3. ed. Salvador: EDUFBA, 2006.

OLIVEIRA, M. M.; SANTIAGO, C. C. Viollet-le-Duc e o restauro de Notre-Dame. Salvador: EDUFBA, 2014.

PALLADIO, A. I quattro libri dell’architettura. Cópia em fac-simile. 2.ed. Milano: Hoepli, 2009

PEREIRA, P. L. S. O comportamento da alvenaria de pedra ao esforço de corte. Relatório técnico. Guimarães, Portugal: Escola de Engenharia da Universidade do Minho, 2003. Disponível em: < www.yumpu.com/pt/document/view/34505199/ comportamento-da-alvenaria-de-pedra-ao-esforao-de-corte >. Acesso em: 20 jan. 2014.

PIMENTEL, L. S. Methodo lusitanico de desenhar as fortificaçoens das Praças Regulares e Irregulares. Versão digitalizada. Lisboa: Antônio Craesbeeck, 1680.

PINHEIRO, E. P. Intervenções na freguesia da Sé 1850-1920. In: INSTITUTO GEOGRÁFICO E HISTÓRICO DA BAHIA. A urbanização de Salvador em três tempos: Colônia, Império e República. Salvador: Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, 2011.v.1.

PINHO, F. F. S. Soluções construtivas de paredes de edifícios antigos em Portugal. In: REPAR 2000: ENCONTRO NACIONAL SOBRE CONSERVAÇÃO E REABILITAÇÃO DE ESTRUTURAS, 2000, Lisboa. Anais... Lisboa: LNEC, 2000. p.137-142.

POLLIO, V. Tratado de Arquitetura. Tradução, introdução e notas de M. Justino Maciel. São Paulo: Martins, 2007.

Page 185: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

184

RANZINI, S. M. T.; NEGRO Jr., A. Obras de contenção: tipos, métodos construtivos, dificuldades executivas. In: HACHICH, W.; FALCONI, F. F.; SAES, J. L.; FROTA, R. G. Q.; CARVALHO, C. S.; NIYAMA, S. Fundações: teoria e prática. São Paulo: PINI, 1998.

RILEM. Recommendation MDT. D. 4: In-situ stress tests based on the flat jack. Matériaux et constructions, n.37, p.491-496, ago. 2004. Disponível em: <http://www.rilem.org/images/publis/1619.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2015.

RILEM. Recommendation MDT. D. 5: In-situ stress tests based on the flat jack. Matériaux et constructions, v. 37, p. 497-501, ago. 2004. Disponível em: <http://www.rilem.org/images/publis/1620.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2015.

ROCHA, I. Tijolo por tijolo: construindo alvenarias no Vale do Paraíba. 2012. 310f. Tese (Doutorado em Arquitetura) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

RONDELET, J. B. Traité théorique et pratique de l'art de bâtir. Versão digitalizada. Paris: Rondelet, 1812. v.5.

ROQUE, J. C. A metodologia integrada para avaliação e mitigação da vulnerabilidade sísmica das construções históricas em alvenaria: a Igreja dos Jerónimos como caso de estudo. 2009. 231f. Tese (Doutorado em Engenharia Civil) - Universidade do Minho, Portugal, 2009.

RUSSO, C. Lesiones de los edificios. Barcelona: Salvat Editore, 1934.

SAMPAIO, C. N. 50 anos de urbanização: Salvador da Bahia no século XIX. Rio de Janeiro: Versal, 2005.

SANTIAGO, C. C. Argamassas históricas de cal. Salvador: Núcleo de Tecnologia da Preservação e Restauração, 2004.

SANTIAGO, C. C. Argamassas tradicionais de cal. Salvador: EDUFBA, 2007.

SANTOS, A. M. A. Exposição ocupacional a poeiras em marmorarias: tamanhos de partículas característicos. 2005. 376f. Tese (Doutorado em Engenharia Metalúrgica e Minas) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005.

SANTOS, L. C. A. N. A arqueologia da arquitetura e a produção de tijolo na Bahia do século XVI ao século XIX. 2012. 433 f. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2012.

SANTOS SEGURADO, J. E. Alvenaria e Cantaria. 2.ed. Lisboa: Ed. Bertrand, 1908.

SANTOS SEGURADO, J. E. Materiais de construção. 4.ed. Lisboa: Ed. Bertrand, 1940.

SIMÕES, A.; GAGO, A.; BENTO, R.; LOPES, M. Flat-jack tests on old masonry buildings. In: 15TH INTERNATIONAL CONFERENCE ON EXPERIMENTAL MECHANICS, 2012, Porto. Anais... Porto: Universidade do Porto, 2012. Disponível em: < http://www.civil.ist.utl.pt/~rbento/tmp/SEVERES/ICEM2012_3056.pdf>. Acesso em: 01 jun. 2016.

SOUSA, L. Aplicação de termografia no estudo do isolamento térmico de edifícios. 2010. 101f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica)– Universidade de Aveiro, Portugal, 2010. Disponível em: < http://ria.ua.pt/bitstream/10773/3650/ 1/240593.pdf >. Acesso em: 21 jan. 2014.

Page 186: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

185

STOWE, R. L. Strength and deformation properties of granite, basalt, limestone and tuff at various loading rates. Versão digitalizada. Vicksbourg: U.S. Army Corp. of Engineers, 1969.

TASSIOS, T. P.; MAMILLAN, M. Valutazione strutturale dei monumenti antichi. Apresentação de Carlo Cestelli Guidi.Roma: Kappa, 1985.

TAUIL, C. A.; NESE, F. J. M. Alvenaria estrutural. São Paulo: PINI, 2010.

UNESCO, ICCROM, ICOMOS. Conferência de Nara. In: CURY, I. (Org.). Cartas Patrimoniais. Brasília: IPHAN, 2004. p.319-328.

VALLEJO, L. I. G.; FERRER, M.; ORTUÑO, L.; OTEO, C. Ingeniería Geologica. Madrid: Prentice Hall, 2002.

VEIGA, M. R. As argamassas na conservação. In: JORNADA DE ENGENHARIA CIVIL DA UNIVERSIDADE DE AVEIRO: AVALIAÇÃO E REABILITAÇÃO DAS CONSTRUÇÕES EXISTENTES, 1., 2003, Aveiro, Portugal. Anais... Lisboa: LNEC, 2003. Disponível em: < mestrado-reabilitacao.fa.utl.pt/disciplinas/jbastos/Rveiga2 CONF-UA-RV.pdf >. Acesso em: 11 abr. 2016.

VICENTE, R.; SILVA, J. A. R. M. da.; VARUM, H.; RODRIGUES, H.; JULIO, E. Caracterização mecânica de paredes de alvenaria em construções antigas: ensaios com macacos planos. Revista Internacional Construlink, Lisboa; v. 7, n. 9, p. 57-69. Disponível em: < http://www.civil.ist.utl.pt/~cristina/RREst/Aulas Apresentacoes/07 _Bibliografia/inspeccao%20(inspection)/IJ_16.pdf>. Acesso em: 10 maio 2016.

VILHENA, L. S. A Bahia no século XVIII. Salvador: Itapuã, 1969. v.2.

YATES, T. Natural building stone. In: DORAN, D.; CATHER, B. Construction Materials: Reference book. 2nd ed. New York: Routledge, 2014.

Page 187: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

186

APÊNDICES

Page 188: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

187

APÊNDICE A

OUTROS ENSAIOS NÃO DESTRUTIVOS

Existem diversos outros ensaios não destrutivos que são importantes para o

diagnóstico estrutural das alvenarias antigas, mas que, não diretamente, estão

ligados à determinação da composição física e mecânica das paredes resistentes,

ou não são ferramentas principais para esse escopo. Os principais, e mais

importantes, são os acelerômetros e os georradares.

1 – Acelerômetros e decibelímetros

O uso de acelerômetros e decibelímetros são usados como técnicas

quantitativas que dão dados importantes com relação ao comportamento dinâmico

de uma estrutura. No Brasil, a atuação desse fenômeno em estruturas ainda não

apresenta normas específicas que tratem do tema, embora seja assunto

fundamental para a proteção do patrimônio edificado. A técnica da medição de

vibrações concerne ao uso de acelerômetros (Figuras A e B), fixados a uma

estrutura, para a obtenção da movimentação dinâmica do referido sistema nos três

eixos fundamentais da geometria (X,Y,Z). A resultante desses componentes dá o

resultado a ser avaliado em concordância com norma reguladora, a DIN 4150,

documento técnico que limita os parâmetros máximos de vibração para os mais

diversos tipos de estruturas.

Figura A – Acelerômetro triaxial Figura B – Acelerômetros monoaxais e

símícos

Fonte: Acervo do autor (fev. 2013).

Fonte: Acervo do autor (fev. 2013).

Page 189: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

188

Esse tipo de ensaio revela-se essencial em áreas urbanas, onde o volume de

som pode afetar a integridade de um edifício, como no caso do Carnaval de

Salvador, ou em locais de proximidade com zonas férreas, de trânsito de metrôs, e

de grande trafégo de veículos.

Estudos realizados pelo NTPR revelam que os principais problemas das

vibrações estão relacionados aos seus efeitos secundários, propiciando a

maximização das patologias já existentes, principalmente craquelês, fissuras,

rachaduras e brechas.

Essa questão já é explicitada na regulamentação DIN 4150. Tais danos, como

relatado em capítulos anteriores, são as informações para o restaurador avaliar se

uma alvenaria estrutural pode estar próxima ao colapso, especialmente em prédios

antigos, tornando o ensaio com acelerômetros de essencial importância para a

conservação do patrimônio edificado.

2 – Georradares

Outra técnica que se vem desenvolvendo, nos últimos anos, é a utilização de

georradares (Figuras C e D) ou GPR (Ground Penetration Radar), ensaio qualitativo,

que pode ser utilizado para a deteminação da qualidade física dos muros. Assim

como os ensaios sônicos, trata-se de um teste baseado na transmissão e

recebimento de impulsos eletromagnéticos.

Diferentemente dos métodos de recepção com geófonos, essas ondas

apresentam frequência de rádio285, que são recebidas mediante a antena do

georradar e transmitidas, posteriormente, a um computador.

285 ANNAN, A. P. Electromagnetic principles of Ground Penetration Radar. In: JOL, H. M. Ground Penetration Radar: theory and applications. Oxford: Elslvier, 2009. p.4-40.

Page 190: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

189

Figura C – Georradar do Departamento de Engenharia Estrutural do Politécnico de Milão

Figura D – Aplicação do georradar em parede do Departamento de Engenharia Estrutural do Politécnico de Milão

Fonte: Acervo do autor (jun. 2011). Fonte: Acervo do autor (jun. 2011).

Não é o método mais indicado para o escopo da avaliação física de alvenarias

antigas, pois se trata de ferramenta projetada para a visualização de distâncias

superiores àquelas determinadas pelas espessuras de muros. Alguns aparelhos

georradares atingem em torno de 4 metros de alcance de resposta. Normalmente,

para o trabalho com estruturas verticais, utiliza-se o ensaio sônico, enquanto o

supracitado aparelho é empregado, com mais valia, no intuito de avaliar elementos

em camadas inferiores do solo.

Por outro lado, os georradares podem dar soluções para a verificação de

estruturas de difícil acesso dos aparelhos sônicos, como no caso de fundações,

sítios arqueológicos, minas, entre outros pontos, onde o receptor das ondas emitidas

pelos geófonos não pode ser instalado para a execução do ensaio. Enquanto os

métodos sônicos possuem parâmetros baseados na velocidade de recepção dos

equipamentos, os georradares, assim como as termocâmeras, dão, como produto,

imagens que, muitas vezes, exigem estudos aprofundados para leitura e

compreensão. Como relatado por alguns autores:

In fact, when using NDT (sonic, georadar, thermovision) to detect hidden damage, voids or inclusions, one of the greatest difficulties is the interpretation of results, even when accurately presented. […] Who has asked for their application, has to accept the interpretation given by NDT experts, who frequently are not experts in materials and construction techniques applied in the past.286

286 “De fato, quando se usam as técnicas não destrutivas (ensaios sônicos, georradar, termocâmera) para detectar danos escondidos, vazios ou inclusões, uma das maiores dificuldades está na

Page 191: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

190

Essa dificuldade é percebida ao analisar os resultados obtidos pela aplicação

do Georradar, explicitado nas duas figuras anteriores (Figura E).

Figura E – Resultado da aplicação do georradar

Fonte: Acervo do autor (jun. 2011).

3 – Ensaios complementares

Além dos ensaios com acelerômetros e georradares, podem-se citar os

seguintes ensaios, como pouco ou não destrutivos, para uma melhor determinação

das características da estrutura:

• radiografia;

• magnetoscopia;

• shearografia;

• ensaio de dureza superficial com penetrômetros;

• datação por radiocarbono;

• Elipsometria;

• Holografia;

• Laser Scan.

interpretação dos resultados, mesmo quando apresentados acuradamente. [...] Quem requisitou a aplicação do ensaio precisa aceitar a interpretação dada pelos peritos em técnicas não destrutivas, que frequentemente não são experts em materiais e técnicas construtivas antigas” (BINDA, L.; ZANZI, L.; LUALDI, M.; CONDOLEO, P. The use of georadar to assess damage to a masonry Bell Tower in Cremona, Italy. Science Direct, NDT & E International, Oxford, n.38, p.171-179, 2005. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/222431434_The_use_of_georadar_to_assess_damage_to_a_masonry_Bell_Tower_in_Cremona_Italy>. Acesso em: 11 jan. 2015. Tradução nossa).

Page 192: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

191

APÊNDICE B

MANUTENÇÃO DA SERRA DIAMANTADA E SEU MOTOR

Levando em consideração a grande quantidade de tempo decorrido entre a

primeira aplicação da técnica (Escola Politécnica) e a analisada, foram necessários

alguns serviços de manuteção da serra diamantada e do motor que dão suporte à

execução dos ensaios, para o prosseguimento da presente pesquisa.

Em concordância com um dos objetivos específicos desta dissertação, que

pretende entender o funcionamento das ferramentas utilizadas para a realização dos

ensaios não destrutivos, faz-se necessário, neste contexto, apontar os cuidados que

devem ser levados em conta, em face desses aparatos:

1 – controlar semestralmente o nível e aspecto do óleo do motor (Figura A). A

má qualidade do fluido lubrificante pode impedir o funcionamento da serra.

Figura A – Nível de óleo, mostrando aparência turva, necessitando troca

Fonte: Acervo do autor (dez. 2015).

2 – Manter o óleo com aparência límpida (Figura B). Faz-se necessário, ao

menos uma vez a cada três semestres, retirar todo óleo interno (Figura C) e

realizar a limpeza dentro do aparelho, bem como repor o compartimento com

fluido novo de tipo 68;

Page 193: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

192

Figura B – Nível de óleo, mostrando aparência límpida, após troca

Figura C – Retirada do óleo interno do motor. A capacidade da máquina é de 20 litros

Fonte: Acervo do autor (maio 2015).

Fonte: Acervo do autor (abr. 2015).

3 – Controlar o desgaste dos rolamentos da serra. Esses elementos

apresentam veios e saliências que travam a lâmina e a fazem girar, após

receber óleo. É importante relatar que apenas dois desses mecanismos se

desgastam (a máquina apresenta quatro), um superior e um inferior, fazendo-

se necessário o constante revezamento dos roletes.

Quando esses rolamentos encontram-se desgastados, existe a possibilidade

de a lâmina sair do eixo e danificar o aparelho. Para a realização dos ensaios,

foi substituído um dos componentes desgastados por outro novo (Figuras D e

E).

Figura D – Rolamento desgastado pela falta de revezamento entre os mecanismos

Figura E – Rolamento novo, trocado de posição para garantir sua conservação

Fonte: Acervo do autor (abr. 2016). Fonte: Acervo do autor (abr. 2016).

Page 194: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

193

4 – Realizar a regulagem dos roletes, antes de cada ensaio. É fundamental

destravar a tampa do aparelho e verificar, por meio da rotação manual da

lâmina, se os quatro mecanismos estão girando livremente (Figura F), caso

contrário, é preciso apertar o ajuste.

Na situação em que a serra estiver apresentando resistência ao giro, faz-se

necessário folgar os parafusos de regulagem. No momento do ensaio, se

houver qualquer erro de ajuste, a serra não girará, permanecendo travada;

Figura F – Avaliação da rotação dos roletes. É imprescindível que a serra mantenha-se em posição vertical para que todos os quatro roletes sejam verificados

Fonte: Acervo do autor (abr. 2016).

Obedecendo aos supracitados pontos, e com os aparelhos calibrados pelo

autor e equipe do NTPR, o ensaio com macacos planos pôde ser realizado no prédio

da Companhia Circular de Carris.

Parafuso de regulagem

Parafuso de regulagem

Tampa

Page 195: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

194

ANEXO

Page 196: ppgau.ufba.br... ppgau.ufba.br

195

GUIA DE CONVERSÃO DE UNIDADES DE MEDIDAS

Medida (em português, espanhol, italiano e latim,

respectivamente)

PORTUGAL ESPANHA ITÁLIA ROMA

em metros em metros em metros em metros

Palmo, palmo, palmo,

palmus

0,22 0,21 0,23 -

Pé, pie, piede, pes 0,33 0,28 0,296 0,290

Cúbito, covado, codo, cubito 0,66 0,418 0,44 0,435

Vara, vara, ..., vara 1,10 0,8359 - -

Passo, paso, passo, passus 1,65 0,65 1,48 1,450

Cana, cana, canna, canna 3,96 1,67 2,32 -

Braça, braza, braccio,

brachia

2,20 1,67 0,58 -

Estádio, estadio, stadio,

stadium

206,25 201,20 185,00 181,25

Milha, milla, miglio, miliarium 2200 1375 - 1450

Fonte: Elaboração do autor a partir de Coelho Filho (2004).