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Por: José Maria Filho - Jornalista
FA trágica escalada do uso abusivo de agrotóxicos na
agricultura brasileira
Fiscalização frágil no comércio e na aplicação de agrotóxicos e a falta de transparência nas informações aos consumidores acarretam em consequências graves e irreversíveis, que vão desde a contaminação do solo, das águas, das florestas, o desaparecimento e infertilidade de várias espécies de animais e insetos até o aumento de vários tipos de cânceres, apontados em pesquisas pelo INCA – Instituto Nacional do Câncer – e doenças crônicas não transmissíveis. Quais são as prioridades do Brasil num cenário que envolve tanto poder econômico?
Classe I- produto altamente perigoso ao meio ambiente; Classe II – produto muito perigoso ao meio ambiente; Classe III – produto perigoso ao meio ambiente; Classe IV – produto pouco perigoso ao meio ambiente.Fonte: IBAMA, 2013
O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Nos últimos 10 anos, o consumo de venenos agrícolas cresceu 93% no mundo, e 190% no Brasil (Abrasco)
Vendas de agrotóxicos e afins por classe de periculosidade ambiental. Brasil, 2013
Região / UF
NORTENORDESTESUDESTE
SULCENTRO-OESTE
Vendas semdefinição
Vendas Totais
101,67363,82561,47805,51
1.279,101.845,98
4.957,56
101,67363,82561,47805,51
1.279,101.845,98
4.957,56
9.025,0026.665,9966.717,4082.417,57
103.064,5519.553,91
307.444,41
677,912.063,948.883,547.885,838.332,17340,35
28.183,74
13.631,1445.279,99
112,926,84119.179,05159,853,7744.893,75
495.764,55
0,750,800,500,680,804,11
1,00
0,750,800,500,680,804,11
1,00
66,2158,8959,0869,1564,4743,56
62,01
4,974,567,876,625,210,76
5,68
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Vendas de Agrotóxicos e Afins por Classe de Periculosidade Ambiental - 2013
Unidade de medida: toneladas de ingrediente ativo ( IA)
CLASSE I CLASSE II CLASSE III CLASSE IV TOTAISQtde
(ton. IA)Qtde
(ton. IA)Qtde
(ton. IA)Qtde
(ton. IA)Qtde
(ton. IA)Part. (%)
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A trágica escalada do uso abusivo de agrotóxicos na agricultura brasileira
Segundo a Sindveg, o setor de agrotóxicos movimentou US$ 11,45 bilhões no período. Em 2012, foram US$ 9,71 bilhões. Em São Paulo, US$ 1,61 bilhões.
Na clássica obra “O Futuro Roubado”, publicada pela primeira vez nos Estados Unidos em 1997, os pesquisadores americanos Theo Colborn, Dianne Dunanoski e John Peterson Muyers relatam os riscos dos resíduos químicos para o meio ambiente e a saúde humana e descrevem as observações cientificas de vários casos de infertilidade e mortalidade de animais como aves, galinhas e porcos na Costa Oeste americana.
Os pesquisadores citam Rachel Carson, norte-americana autora do livro “Primavera silenciosa”, que, pela primeira vez, em 1962, chamou atenção para os riscos da poluição química. Foi um marco de repercussão planetária para a conscientização ecológica e que desencadeou o movimento das entidades não governamentais nas lutas pela preservação do meio ambiente.
Para Colborn, ir além do câncer era um passo muito importante. “O conceito chave para considerar esse tipo de assalto tóxico é a mensagem química. Não é veneno, não é cancerígeno, mas sim, mensagem química. O processo que desenrola no útero e cria um bebê normal e saudável depende da entrega, ao feto, da mensagem hormonal certa, na hora certa. Os sistemas hormonais não se comportam de acordo com o clássico modelo de dose-de-reação que tem informado nosso pensamento sobre reações biológicas e alterações, conforme os princípios descritos no século XVI por Paracelso, médico suíço, por muitos chamado o pai da toxicologia. O paradigma do câncer também dificulta o reconhecimento dos efeitos da alteração endocrinológica porque relaciona ameaça com doença”.
Ainda segundo ele, os riscos dos resíduos químicos para o meio ambiente e consequentemente para a saúde humana, para aqueles que tomam conhecimento pela primeira vez, parecem avassaladores. “Sentimentos de medo e de desamparo não são incomuns. O problema apresentado é, de fato, assustador. Ninguém deveria subestimar sua seriedade e a magnitude que essa ameaça representa para a saúde e o bem-estar humano. O conhecimento deve ser a principal defesa pessoal”.
Esse foi o tema da Audiência Pública organizada pelos Ministério Públicos Federal e do Estado de São Paulo e Defensorias Públicas da União e do Estado de São Paulo nos dias 29 e 30 de agosto de 2016, que contou com o apoio da Faculdade de Saúde Pública da USP, na capital paulista.
Durante dois dias, pesquisadores, autoridades e membros da sociedade civil debateram os danos do uso abusivo de agrotóxicos permitido e proibido em muitos países da Europa e nos Estados Unidos e que são utilizados na agricultura brasileira, à luz do dia, causando sérios danos à saúde humana e ao meio ambiente. Discutiram-se, também, as reações da sociedade por uma agricultura livre de veneno, que resgate a saúde do solo, dos mananciais, do ar e proporcione alimentos com vitalidade positiva, com energia vital para a manutenção da saúde universal.
Plateia no autidório da Fac. de Saúde Pública da USP e à direita o Defensor Público de SP Dr. Marcelo NovaesFotos: Cred. Ana Maria M. de Lima
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Por: José Maria Filho - Jornalista
Mesa de abertura
Mesa de abertura da audiência pública – Agrotóxicos na FSPUSP- Cred. Ana Maria M. de Lima
Presentes na mesa de abertura estiveram: Fátima Aparecida de Souza Borghi (procuradora de justiça federal do Ministério Público Federal); Nara de Souza Rivitti (Defensoria Pública da União); Patrícia Helen de Carvalho Rondó (professora do Departamento de Nutrição e vice-diretora da Faculdade de Saúde Pública da USP); Ana Gabriela Oliveira Paula (Ministério Público do Estado de São Paulo); Lucia Helena Rangel (professora de Antropologia da PUC-SP e pesquisadora do Conselho Indigenista Missionário-CIMI); Sandra Magali Fihlie (médica sanitarista e diretora do Conselho de Secretários Municipais do Estado de São Paulo – Cosems-SP) e Alderon Costa (ouvidor-geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo).
Em sua fala, a Dra. Sandra Magali Fihlie pediu mais investimento em saúde pública, priorizando atendimento aos idosos e crianças, e alertou para o aumento de casos de câncer na população. Já a professora Lucia Helena Rangel destacou o extermínio e genocídio da população indígena, causado pela contaminação de terras indígenas, pois pessoas com pouco ou nada de conhecimento têm feito uso de produtos que contaminam os alimentos consumidos por populações indígenas.
Os participantes da mesa de abertura foram unânimes em relatar que as questões que envolvem os agrotóxicos estão relacionadas com a saúde da população mais fragilizada, em primeiro lugar os trabalhadores rurais, que manipulam nem sempre de forma adequada estes produtos; as populações indígenas; e os consumidores urbanos. Também destacaram os graves problemas ambientais causados pelo uso demasiado de agrotóxicos. Outra questão bastante debatida foi a pulverização aérea na agricultura e, mais recentemente, a pulverização para combate ao mosquito da dengue nos centros urbanos, medida esta autorizada pelo governo federal e que, de acordo com os pesquisadores presentes, seria um erro absurdo. Outros temas discutidos foram segurança alimentar, produção de transgênicos, políticas públicas em saúde e atuação da comunidade acadêmica com o desenvolvimento de pesquisas. Pediu-se, também, especial atenção para o fato de que o Brasil não respeita o Princípio da Precaução.
O primeiro painel do dia – “Informações em Saúde, Consumo e Exposição no Estado de SP, Brasil e Mundo” – apresentou as diversas formas de contaminação dos agrotóxicos, seja no solo, no alimento ou na água. Este último foi destaque da pesquisadora prof.ª Dr.a Sonia Corna Hess, da Universidade Federal de Santa Catarina.
Integraram o painel a prof.ª Dr.ª Sonia Corina Hess (Universidade. Federal de Santa Catarina) e do prof. Dr. Paulo Saldiva (Diretor do IEA-USP), Dr. Jefferson Beneluz Pires de Freitas (prof. do Departamento
Respeito ao Princípio da Precaução
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A trágica escalada do uso abusivo de agrotóxicos na agricultura brasileira
de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo) e a Dr.a Evangelina Vormitag (médica e diretora presidente do Instituto de Saúde e Sustentabilidade). Foi realizada mediação conjunta de Leilane Coelho Andre (vice-diretora do Departamento de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais) e Nara de Souza Rivitti (Defensoria Pública da União).
A prof.ª Dr.a Sonia Corina Hess traçou um panorama do uso do Paraquate no Brasil e no mundo, e, em suas palavras, “o Brasil virou a lixeira do mundo” – referindo-se ao fato de que produtos banidos no mundo inteiro são utilizados em terras brasileiras e já provocaram prejuízos à saúde da população e ao meio ambiente. Ela alertou para o uso de inseticidas domésticos, muitos fabricados pelas mesmas multinacionais que detêm o monopólio na produção de agrotóxicos no mundo.
Outra fala de destaque foi a do prof. Dr. Paulo Saldiva, da USP, que pediu misericórdia para as vítimas e foi enfático ao mencionar não serem necessários mais estudos, mas uma atuação do poder público em relação aos doentes.
Do segundo painel, com o tema “Geografia da pulverização aérea e dimensionamento dos impactos à saúde e ao meio ambiente”, participaram: Dr. Gabriel Lino de Paula Pires (promotor de justiça do Estado de SP, do Grupo de Atuação Especial da defesa do Meio Ambiente – GAEMA – Núcleo do Pontal do Paranapanema); prof.ª Dr.ª Ada Pontes de Aguiar (médica e pesquisadora do Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde da Universidade Federal do Ceará); e prof. Dr. Wanderlei Antonio Pignatti (Universidade Federal do Mato Grosso), com mediação da procuradora de justiça federal Fátima Aparecida de Souza Borghi.
Nesse painel, o destaque foi para o trabalho do GAEMA na fiscalização do uso de agrotóxicos e a constatação de que os usuários finais não respeitam as orientações dos fabricantes e realizam a aplicação em condições climáticas desfavoráveis, aumentando o espalhamento do produto e a contaminação do meio ambiente, tendo também consequências na saúde dos aplicadores e familiares. A prof.ª Dr.ª Ada Pontes de Aguiar apresentou a evidência do aumento de câncer entre a população de comunidades pobres onde o agrotóxico é utilizado e alertou para dificuldade na “compensação financeira e tratamento“ das vítimas, pois os médicos aparentemente não estão preparados para relacionar as doenças ao uso desses produtos. O prof. Dr. Wanderlei Antonio Pignatti mostrou a evidência do aumento de uso de agrotóxicos em municípios do Estado de São Paulo e a contaminação das pessoas e do meio ambiente.
Audiência Pública Agrotóxicos/São Paulo - Sonia Corina HessFonte: http://portal.anvisa.gov.br/registros-e-autorizacoes/agrotoxicos/produtos/reavaliacao-de-agrotoxicos. Acesso em agosto de 2016.
Ingrediente Ativo
AcefatoCihexatina
EndossulfamForato
FosmeteLactofemLindano*
MetamidofósMonocrotofos*
Parationa metílicaPentaclorofenol*
ProclorazTriclofrom
RDC 10/2008RDC 10/2008RDC 10/2008RDC 10/2008RDC 10/2008RDC 10/2008
RDC 14A/2006RDC 10/2008
RDC 135/2002RDC 10/2008
RDC 124A/2006RDC 44/2013RDC 10/2008
RDC 42/2013RDC 34/2009RDC 28/2010RDC 12/2015RDC 36/ 2010RDC 92/2016
RDC 165/2006RDC 01/2011
RDC 215/2006RDC 56/2015
RDC 164/2006RDC 60/2016RDC 37/2010
Mantido com restições no registoProibidoProibidoProibido
Mantido com restições no registoMantido sem restições no registo
ProibidoProibidoProibidoProibidoProibidoProibidoProibido
Decisão
Reavaliação de ingredientes ativos de agrotóxicos finalizadas pela Anvisa desde 2006.
Resolução da Diretoria Colegiada
Início Término
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No terceiro painel – “Governança, conhecimento e estratégias públicas de ação” – ocorreram as apresentações da prof.ª Dr.ª Marcia Sarpa de Campos Melo (Unidade Técnica da exposição ocupacional, Ambiental e Câncer do INCA), da Dr.ª Thaís Cavendish (gerente do Departamento de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Contaminantes Químicos do Ministério da Saúde) e de representantes da Secretaria de Estado da Saúde e Coordenadoria de Defesa Agropecuária da Secretaria de Estado da Agricultura, com mediação do defensor público do Estado de SP, Marcelo Carneiro Novaes.
Nesse painel, as informações importantes ocorreram pela admissão do aumento do índice de câncer na população dos trabalhos realizados pelo INCA, Ministério da Saúde, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e da Coordenadoria de Defesa Agropecuária da Secretaria de Estado da Agricultura, ocorrendo uma divergência nas informações de atuação em saúde e fiscalização de alimentos no Estado de São Paulo.
Houve um alerta para a situação de que o Brasil não utiliza os valores da Organização Mundial de Saúde e IARC para prevenção de contaminação da água, alimentos e proteção à saúde humana. Outro alerta foi dado pela representante da Secretaria de Estado da Saúde em relação ao preenchimento inadequado dos documentos utilizados como instrumentos de notificação de intoxicação; a representante do Ministério da Saúde alertou para o parecer emitido à presidência recomendando a não utilização de aeronaves para pulverização em cidades.
Agrotóxicos e câncerFonte: Prof.ª Drª Marcia Sarpa de Campos Melo-INCA
Diretrizes de VSPEA SINAN - Intoxicações por AgrotóxicosFonte: SINAN, 2016
BarueriBotucatuCampinasCatanduvaFernandópolisGuarulhosJundiaíMaríliaMauáRibeirão PretoRio ClaroSão Bernardo do CampoSão João da Boa VistaSão José do Rio PretoSão José dos CamposSão PauloSuzanoTaubaté
Municípios SP 2011 2012 2013 2014 2015 Total
29282736278631604232291927870
1804030
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A trágica escalada do uso abusivo de agrotóxicos na agricultura brasileira
A coordenadoria do estado da Agricultura apresentou dados que evidenciam a contaminação de alimentos por agrotóxicos, e houve destaque para a ação de monitorização resultante do atendimento à solicitação da Defensoria Pública em Santo André, ocorrendo parceria do Instituto de Botânica, Companhia de Abastecimento de Alimentos de Santo André e da Secretaria de Agricultura.
Sob coordenação da Dr.a Fátima Borghini foi fundado o Fórum Paulista Contra o Agrotóxico, que será formalizado em um próximo evento nas dependências do Ministério Público Federal em São Paulo. Ela alertou para necessidade de inserção da temática dos transgênicos e movimentação da sociedade contra o uso de aeronaves para aplicação de inseticidas no combate à dengue e disponibilizou o e-mail: [email protected] para ampla participação da sociedade.
A população se manifestou, alertando para a necessidade de participação social junto aos parlamentares, mais medidas protetivas à biodiversidade, banimento da capina química, verificação da influência negativa da política na atuação dos serviços públicos como impedimento de ações protetivas ao meio ambiente e saúde e melhoria no monitoramento do uso de todas as substâncias químicas.
Para mais informações sobre o tema, acesse o link da Escola de Defensoria Pública do Estado de São Paulo e veja as apresentações na íntegra da Audiência Pública – Agrotóxicos, dos dias 29 e 30 de agosto de 2016:
http://www.defensoria.sp.def.br/dpesp/Default.aspx?idPagina=6024
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