política iii - tocqueville
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Brenda Rolemberg de Lima
Nº USP: 6855697
Noturno – 19/05/2015
POLÍTICA III – TOCQUEVILLE
QUESTÃO 1
Alexis de Tocqueville, em sua obra, A Democracia na América, sustenta que o
desenvolvimento das condições de igualdade existentes na sociedade democrática, com
a dissolução da ordem do Antigo Regime, seria, de certo modo, ambígua. Ao passo que
os homens se tornam mais semelhantes e iguais, mais “doces” e humanos se tornariam
os modos públicos, sendo, com isso, capazes, como nunca antes, de penetrar profunda e
habitualmente nos círculos de interesses privados. 1
Uma vez que seriam medíocres as fortunas e os desejos, a forma como o
soberano encontra para manter poder se daria por meio de uma dose de teatro e ocasião.
Apenas muito raramente, em momentos de efervescência e perigos, governos
democráticos lançariam mão da violência e crueldade para obter controle social. 2
A opressão sobre os povos democráticos, segundo Tocqueville, em nada se
pareceria com o que já se havia precedido no mundo, e, assim, imagina sob quais
formas o despotismo se desenharia neste universo. Nesta análise, outra característica das
condições de igualdade nas sociedades que se faz importante é o individualismo
presente em suas populações. Esta disposição de se furtar de obrigações externas ao
âmbito de interesse próprio do indivíduo seria característica dessa “multidão” de
homens semelhantes e iguais que perseguiriam “pequenos e vulgares prazeres”.3
Os indivíduos de tal sociedade estariam retirados em uma pequena sociedade
composta por seus familiares e amigos, não enxergando ou sentindo o resto de seus
concidadãos – existiriam apenas em si mesmos e para si mesmos.4 Por meio do
individualismo se secariam as virtudes públicas e, sobre estes indivíduos atomizados,
1 TOCQUEVILLE, A. A Democracia na América. São Paulo: Martins Fontes, 2005. P. 388.2 Idem. P. 389.3 Idem. P. 388.4 Idem. P. 389.
erguer-se-ia um imenso poder tutelar, representado na figura do Estado. A este, caberia,
sozinho, o dever de assegurar o proveito e zelar pela sorte dos indivíduos. O indivíduo,
por sua vez, aceita que o prendam, vez que enxergaria o próprio povo – e não um
homem ou uma classe – como aquele que segura a porta da cadeia.
Para Tocqueville, seria a própria igualdade que teria preparado os homens para
suportar o peso desse poder sobre eles e até mesmo considera-lo um benefício. Esta
“servidão regrada” estaria diretamente relacionada às paixões antagônicas apresentadas
pelos indivíduos da sociedade democrática, que seriam a necessidade de serem
conduzidos e a vontade de permanecerem livres.5 Como tentariam satisfazer, a um só
tempo, os dois desejos, combinariam a centralização com a soberania do povo,
produzindo, de tal maneira, o “despotismo doce”.
Esta figura, no entanto, seria infinitamente preferível àquela eu concentra os
poderes e os deposita nas mãos de um homem ou de um corpo responsável, como no
caso da aristocracia. Isto porque, quando o soberano é vigiado de perto ou então eletivo
haveria, para o cidadão a possibilidade de imaginar que, ao obedecê-lo, estaria se
submetendo a si mesmo.6
O círculo de independência individual em uma sociedade democrática, contudo,
não seria tão largo quanto o existente em uma aristocracia.7 Isso ocorreria especialmente
porque, nos tempos aristocráticos, o soberano era obrigado a dividir o trabalho
administrativo com os membros da aristocracia, não governando sozinho, o que
contribuía parar assegurar a liberdade dos particulares.8
Ao contrário da sociedade democrática, onde os homens são naturalmente
isolados, na aristocracia os homens estariam constante e intimamente ligados a seus
concidadãos. Há, ainda, em relação ao regime aristocrático, uma inexistência de
estratificação social rígida, certa igualdade de oportunidades e uma aspiração material
legítima de conforto que se estenderia a todos. Na sociedade democrática, o indivíduo
seria mais limitado, mas poderia contar com a solidariedade dos demais, e a imprensa
seria um instrumento importante para tanto – algo que não estaria presente nas
sociedades aristocráticas.9
5 Idem. P. 390.6 Idem. P. 391.7 Idem. P. 396.8 Idem. P. 396.9 Idem. P. 398.
QUESTÃO 2
É possível dizer que, na visão de Tocqueville, o problema da sociedade
democrática residiria na dificuldade em despertar, no homem individualista, a
preocupação com o exercício da liberdade – seja no sentido da liberdade dos antigos,
como no dos modernos – e perseguir uma certa forma de virtude pública que fosse
diferente, todavia, do homo politicus do humanismo cívico, para o qual o envolvimento
na vida pública é a própria essência para o viver bem.
Seria até mesmo difícil conceber, nesse sentido, de que modo homens que
renunciaram por completo o hábito de dirigir a si mesmos, distanciados da vida pública,
seriam capazes de executar uma boa escolha quanto aos que os devessem conduzi-los.10
Há, por trás desta visão, uma preocupação de Tocqueville com a tirania da maioria e
com a tirania de opinião e com qual seria um novo tipo de despotismo afim a tal modelo
– o que ele vai chamar de “despotismo doce” no capítulo 6.
Sobre um povo em condições de igualdade seria ainda mais fácil de se
estabelecer um governo absoluto e despótico, que não somente oprimiria os homens,
como roubaria deles diversos dos principais atributos da sociedade.11 O remédio para
esse mal estaria em encontrar poderes intermediários, de forma a garantir maior
segurança à liberdade dos particulares, sem redução da igualdade. A ideia seria que, ao
invés de se confiar todos os poderes administrativos ao soberano, corpos secundários
compostos temporariamente por cidadãos ficassem encarregados por parte de tais
poderes.12
Assim, os remédios para as ideias anárquicas que poderiam prosperar, mais do
que em qualquer outro lugar, na sociedade democrática, que é terreno fértil para a
ocorrência de revoluções, teriam por base a fixação de limites extensos para o poder
social, limites estes, entretanto, visíveis e imóveis.13 Haveria que se conferir aos
particulares certos direitos e garantir-lhes o gozo destes, bem como conservar para o
10 Idem. P. 392.11 Idem. P. 395.12 Idem. PP. 396-397.13 Idem. P. 402.
indivíduo “o pouco de independência, de força, de originalidade que lhe restam” e, por
fim, reerguer este indivíduo ao lado da sociedade, sustentando-o em face dela.14
Há uma preocupação permanente com a preservação da liberdade dos homens,
que, em tempos democráticos, seriam naturalmente propensos para o gosto por
independência. A igualdade deveria conduzir à liberdade, e não à servidão. Esta seria o
destino final da anarquia que as condições de igualdade entre os homens fariam surgir.
Os perigos trazidos pela igualdade seriam menos previsíveis, mas possíveis de se
superar.15
14 Idem. P. 402.15 Idem. P. 403.