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PLANEJAMENTO E GESTÃO AMBIENTAL EM OBRAS
PORTUÁRIAS: ESTUDO DE CASO DO TERMINAL MARÍTIMO
DE PASSAGEIROS, FORTALEZA/CE
Otávio Augusto de Oliveira Lima Barra (a), Fábio Perdigão Vasconcelos(b),
Francisco Edmar de Sousa Silva(c), Adely Pereira Silveira(d), Airton Mota Bastos(e)
(a) Programa de Pós-Graduação em Geografia – ProPGeo/Universidade Estadual do Ceará – UECE,
[email protected] (b) Professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia – ProPGeo/Universidade Estadual do Ceará
– UECE, [email protected] (c) Professor do curso de Geografia /Universidade Regional do Cariri – URCA,
[email protected] (d) Programa de Pós-Graduação em Geografia – ProPGeo/Universidade Estadual do Ceará – UECE,
[email protected] (e) Secretaria do Meio Ambiente – SEMA/CE, Programa de Pós-Graduação em Geografia –
ProPGeo/Universidade Estadual do Ceará – UECE, [email protected]
Eixo: Zonas costeiras: processos, vulnerabilidades e gestão
Resumo
Obras portuárias podem causar alterações na configuração natural dos litorais onde estão
inseridas. Devido a isso, a legislação ambiental vigente exige a elaboração de Estudos de Impacto
Ambiental (EIA) e seus respectivos Relatórios de Impacto Ambiental (RIMA) quando
equipamentos desse porte são erguidos. Este trabalho tem como objetivo avaliar a eficiência do
Plano Básico Ambiental (PBA), documento integrante do processo de licenciamento e elaborado
para operacionalizar os mecanismos de controle ambiental contido no EIA de uma grande obra
costeira denominada de Terminal Marítimo de Passageiros, um projeto de expansão do Porto de
Fortaleza. A análise documental do EIA e do RIMA do referido empreendimento e vistitas
técnicas no local da obra para averiguação de impactos adversos foram procedimentos metodológicos realizados. Os resultados demonstraram que o PBA cumpriu seus objetivos de
monitoramento ambiental, porém não impediu a ocorrência de impactos negativos decorrentes da
instalação do Terminal Marítimo de Passageiros.
Palavras chave: Portos. Gestão Ambiental Portuária. Impactos. EIA/RIMA.
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1. Introdução
A Resolução CONAMA, nº 001, de 23 de janeiro de 1986, art. 1º, define
impacto ambinetal como sendo: "qualquer alteração das propriedades físicas, químicas
e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia
resultante das atividades humanas". Sendo assim, em um ecossistema natural
equilibrado, qualquer mudança capaz de alterar as trocas energéticas é considerada
impacto ambiental (MATTOS & MATTOS, 2004).
Os impactos ambientais provocados pelos portos têm suas origens, por um
lado, na construção, reforma ou ampliação de instalações e, por outro, no
funcionamento e manutenção das instalações portuárias, industriais, nos serviços e nos
sistemas de transporte (DIAS et. al., 2008).
Além disso, a atividade portuária pode impactar diretamente o meio ambiente
em que se insere, aquele que se poderia chamar de patrimônio ambiental destinado à
exploração portuária, do qual fazem parte os estuários, baías, lagoas e outras zonas
litorâneas (PORTO & TEIXEIRA, 2001).
Ademais, a construção de um porto pode acarretar alterações hidrodinâmicas
que originam processos erosivos ou cumulativos de sedimentos, modificando
profundamente a morfologia de praias locais e/ou adjacentes.
Exemplo disso é o Porto de Fortaleza/Ceará, que desde o início de sua
construção tem gerado modificações na configuração do litoral da capital cearense.
Esse mesmo porto passou por uma ampliação mediante a construção do Terminal
Marítimo de Passageiros, um equipamento de uso múltiplo pertencente ao conjunto de
obras dantes previstas para a Copa de 2014.
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O empreendimento foi erguido na área interna do porto, a Praia Mansa (Figura
1), um ambiente dotado de elevado grau de vulnerabilidade ambiental do ponto de vista
ecodinâmico (SOUZA et.al., 2009).
Como instrumento de Gestão Ambiental Portuária para essa obra foi
apresentado o Plano Básico Ambiental (PBA): um documento integrante do processo
de licenciamento e elaborado para operacionalizar os mecanismos de controle
ambiental contido no EIA do empreendimento. Diante disso, este trabalho tem como
objetivo avaliar a eficiência do Plano Básico Ambiental (PBA) do referido Terminal,
mais especificamente os Programas de Análise da Morfologia Praial e de Recuperação
de Áreas Degradadas.
Figura 1 – Localização da Praia Mansa e o Terminal Marítimo de Passageiros.
Fonte: Autores (2014). Consórcio Mucuripe - CTSC (2012).
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2. Materias e Métodos
As atividades executadas nos procedimentos metodológicos e operacionais
foram divididas em três etapas: a de gabinete, de campo, e a de laboratório. Na etapa de
gabinete foram realizados os estudos preliminares dos seguintes documentos: Estudo de
Impacto Ambiental – EIA e do Relatório de Impacto Ambiental – RIMA do Terminal
Marítimo de Passageiros (CARUSO Jr.; DOCAS/CE, 2011) e seu Termo de Referência
do Plano Básico Ambiental - PBA; Dezoito programas fazem parte do PBA, contudo,
avalia-se neste trabalho, apenas a efetividade de dois deles: o Programa de
Monitoramento da Morfologia Praial e o Programa de Recuperação de Áreas
Degradadas.
Na etapa de campo foram realizados os perfis praiais pelo método de
levantamento topográfico proposto por Borges (1977): em cada um de 3 pontos pré-
determinados (Figura 3) foram medidas as cotas com auxílio de uma estação total da
Marca Ruide, modelo RTS-280 e prisma. Instalava-se o equipamento no ponto, entre a
linha água e o RN e realizadas leituras a ré, em seguida as leituras a vante, sempre em
marés de sizígia, em horários de maré baixa. Tais perfis permitiram avaliar a
quantidade de material removido ou depositado ao longo da praia em uma série
cronológica.
Nos mesmos pontos em que se realizaram os perfis, eram coletadas amostras
sedimentológicas na face da praia ou estirâncio e pós-praia, denominado de berma,
totalizando 6 amostras. As atividades de campo também permitiram visualizar, pela
análise sistêmica da paisagem, as principais formas de degradação na área.
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Figura 2 – Localização dos pontos dos perfis
Em laboratório foram analisados os perfis topográficos praiais realizados
em campo, a fim de se constatar possíveis alterações morfológicas na área de estudo.
Imagens de satélite da Praia Mansa, em diferentes períodos, foram utilizadas para
diagnóstico de alterações na linha de costa. Nesta etapa foram gerados relatórios
mensais dos monitoramentos de morfologia praial e recuperação de áreas degradadas –
produtos dos monitoramentos pertinentes ao PBA. Tais relatórios compunham o
Projeto de Monitoramento Ambiental do Terminal Marítimo de Passageiros, do qual
faziam parte o Grupo de Pesquisa e Laboratório de Gestão Integrada da Zona Costeira
(CNPq/UECE) e demais instituições, durante o período de 2012 a 2014.
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3. Resultados e Discussões
Por configurar-se como uma intervenção de grande porte em uma área de alta
vulnerabilidade do ponto de vista ecodinâmico, foi proposto no EIA/RIMA do
empreendimento a execução de monitoramentos ambientais para que tal obra pudesse ser
gerida de forma sustentável. Esses monitoramentos fizeram parte do Plano Básico Ambiental
– PBA.
Os programas ambientais descritos nesse Plano enfocaram no acompanhamento e na
implementação dos procedimentos de controle ambiental e sua execução teve como objetivo
contribuir para normalização e criação de ações de caráter ambiental, desenvolvidas durante
as fases de instalação e operação do Terminal (DOCAS/CE & CARUSO Jr., 2011).
Outrossim, tais planos consistiram na coleta e aquisição dos dados e informações, trabalhos e
inspeções de campo, análises de laboratório, estudos técnicos e científicos e acompanhamento
e monitoramento dos impactos (CONAMA 01/86).
Inicialmente, o Programa de Monitoramento da Morfologia Praial objetivava avaliar
as alterações ocorridas na morfologia da Praia Mansa durante a construção do Terminal.
Dessa forma, a gestão ambiental portuária aplicada a esse Programa sugeria que fossem
realizados monitoramentos dos perfis de praia, devendo ser executados durante toda a
vigência da Licença de Instalação (LI) e até 12 meses da Licença de Operação (LO) do
Terminal. Os monitoramentos foram executados mensalmente desde o início, com a
concessão da Licença Prévia (LP) e de Instalação (LI) do empreendimento.
As ações propostas no Programa de Monitoramento da Morfologia Praial, como a
determinação dos perfis de praia nos pontos de coleta informados no PBA e a caracterização
da morfologia praial foram cumpridas. As etapas de monitoramento e diagnóstico do local
funcionaram, incluindo a elaboração de relatórios técnicos com a realidade da área. Assim, no
que tange ao monitoramento e diagnóstico morfológico, o PBA cumpriu seus objetivos.
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A análise da morfologia praial (Figura 3) diagnosticou mudanças significativas com
perca volume sedimentar nos pontos, a saber:
O Perfil 01 sofreu forte redução de volume total, na ordem de 90 m³ (na secção de 1m
de largura), mesmo valor em área da secção transversal (m²). O perfil mais próximo da
obra do cais portuário do terminal, sujeito aos maiores efeitos erosivos e o que
apresentou maiores alterações;
O perfil 2 apresentou perda de volume total (secção de 1m de largura) na ordem de
60m³, assim como em área da secção transversal (m²);
O perfil 3 apresentou uma diminuição de volume total (na secção de 1m de largura) de
16m³, valor igual para o cálculo de área da secção transversal (m²). É o perfil menos
alterado.
Figura 3 – Perfis 1, 2 e 3 em 2012, 2013 e 2014
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As alterações morfológicas proporcionaram uma remodelação na orla, onde foi
possível constatar, por imagens de satélite, um recuo na linha de costa, entre 2011 e 2014
(Figura 4).
Figura 4 – Carta-imagem mostrando a evolução da linha de costa da Praia Mansa entre 2011 e 2014.
Remetendo-se a análise granulométrica, constatou-se a presença predominante de
grãos de tamanho médio nas amostras de berma dos 3 perfis de praia, classificadas como
"areia litoclástica média"; e de areias finas nas amostras de estirâncio classificadas como
"areias litoclásticas finas" a "muito finas". Embora a presença de grãos grosseiros possa
representar a manifestação de processos erosivos em dado ambiente (SUGUIO, 1973), no
caso da Praia Mansa, os resultados observados não demonstraram essa regra, ainda que essa
praia estivesse sujeita à erosão. Neste estudo, a análise sedimentar não serviu como parâmetro
principal para o diagnóstico da erosão ocorrida.
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No que tange ao Programa de Recuperação de Áreas Degradadas, as etapas
realizadas foram: o reconhecimento da área e a inspeção ambiental do local produzida
mensalmente e as coclusões entregues aos órgãos ambientais competentes; o registro
fotográfico dos itens de passivo ambiental e os processos causadores; identificação dos
processos de degradação e dos impactos ambientais existentes. A degradação ambiental
instalada na Praia Mansa esteve associada, principalmente, ao estado da vegetação e
problemas ligados ao solo. Com a supressão da vegetação local, tanto pela ação marinha
quanto antrópica, a barreira natural ficou sem o amortecimento garantido pelo complexo
vegetacional, estando facilmente exposta aos processos erosivos das marés, às quais
provocaram o arrasamento parcial da faixa de praia e diminuição da mesma (Figura 5).
Para a inserção de aterros hidráulicos pertinentes à obra, foi preciso o revolvimento
do terreno bem como a terraplanagem do mesmo. Tal fato favoreceu a compactação do solo.
E, não apenas as etapas para o recebimento do aterro, mas as próprias atividades do cotidiano
das obras, como o tráfego de veículos pesados, o transporte de máquinas e as movimentações
de terra originárias das operações de pavimentação ajudaram na desestabilização do solo da
Praia Mansa (Figura 6).
Figura 5 – À esquerda, ação hidrodinâmica retira as árvores do solo; à direita arrasamento
das barreiras naturais e erosão com carreamento sedimentar. Fonte: Autores (2012 e 2013).
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Figura 6 – Dragagem para aterro hidráulico. Detalhe da extrusão do material do
aterro hidráulico (Fotos acima) Desestabilização do solo (Fotos abaixo).
Fonte: Autores (2013 e 2014).
As problemáticas observadas atestam estudos feitos em outros momentos, como o
Projeto Orla de Fortaleza (2006), que fez prognósticos de um aumento na degradação
ambiental da área, caso fosse instaurada alguma tipologia de uso, defendendo a necessidade
de criação de uma Unidade de Conservação (UC) da Praia Mansa (FORTALEZA, 2006, p.
85). Os impactos constatados evidenciam a assertiva do Projeto Orla Fortaleza.
4. Considerações finais
Obras portuárias exigem, dentro dos parâmetros legais, a execução de Estudos de
Impacto Ambiental – EIA para sua total efetivação. No caso do Terminal Marítimo de
Passageiros foi elaborado um Plano Básico Ambiental (PBA) com 18 tipos de Programas para
operacionalizar os instrumentos contidos no EIA do empreendimento. Os Programas
analisados neste trabalho foram os de Morfologia Praial e de Recuperação de Áreas
Degradadas.
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A execução dos mesmos permitiu analisar as modificações na morfologia sedimentar
da Praia Mansa durante as obras do Terminal: o perfil 01 apresentou maior processo erosivo,
seguido do perfil 02 que também teve seu volume diminuído. Esses dois perfis eram os mais
próximos da área de construção do Terminal de Passageiros. O perfil 03 não sofreu processos
erosivos relevantes devido a sua maior distância da área das obras, cerca de 200m. As
reduções no aporte sedimentar da Praia Mansa provocaram um recuo na linha de costa entre
2011 a 2014, observado através de imagens de satélite. No que tange à análise sedimentar,
esta não apresentou grandes alterações para diagnóstico de erosão.
Ao proceder-se uma avaliação da degradação ambiental, foi verificado que o cotidiano
das obras gerou uma considerável degradação no ambiente, apresentada pela supressão da
vegetação, arrasamento de barreiras naturais e compactação do solo local. Os problemas
erosivos e os demais prejuízos ambientais atestaram os prognósticos realizados por
documentos importantes como o Projeto Orla de Fortaleza (FORTALEZA, 2006).
A execução dos programas de monitoramento do Plano Básico Ambiental – PBA
demonstraram uma tentativa de implantação de um sistema de gestão ambiental portuária,
entretanto não evitou a manifestação de grandes impactos negativos incidentes sobre o
ambiente praial.
Agradecimentos
Agradecemos ao Instituto de Estudos, Pesquisas e Projetos da UECE – IEPRO e à
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES pelo financiamento
da pesquisa.
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