pesquisa mundial comércio justo 2010 - 1 - internacional
TRANSCRIPT
RELATÓRIO DA PESQUISA MUNDIAL DE COMÉRCIO JUSTORELATÓRIO DA PESQUISA MUNDIAL DE COMÉRCIO JUSTO
PARTE 1
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio JustoAtualização 2010
Pesquisa mundial sobre
“Fair Trade”
Atualização 2010
Relatório
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
4
© 2011. Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SebraeTodos os direitos reservados.A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais (Lei nº 9610).
Informações e contatos:Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SebraeUnidade de Acesso a Mercados e Serviços FinanceirosSGAS 605 – Conjunto A – Asa Sul – 70.200-645 – Brasília / DFTelefone: (61) 3348-7455 - Fax: (61) 3348-7100www.sebrae.com.br
Presidente do conselho DeliberativoRoberto Simões
Diretor PresidenteLuiz Barretto
Diretor técnicoCarlos Alberto dos Santos
Diretor de administração e finançasJosé Cláudio dos Santos
Gerente da Unidade de acesso a mercados e serviços financeirosPaulo Alvim
coordenação técnicaLouise Alves Machado
consultor técnicoJohann Schneider
revisão Gramatical
G3 Comunicação
editoração eletrônica
G3 Comunicação
s359u schneider, Johann.
relatório da pesquisa mundia de comércio justo: parte 1 / Johann schneider. -- Brasília: seBrae, 2012.
109 p. : il.
1. comércio Justo. 2. Pesquisa I. título
cDU 339.16 : 311.21
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
5
Apresentação e Metodologia
A pesquisa sobre o mercado mundial de Comércio Justo se insere
no esforço estratégico de apoiar o sistema Sebrae com inteligência
de mercado de setores de interesse de seu público-alvo.
A pesquisa inicial foi realizada em 2004, principalmente através
de levantamentos secundários na internet e em literatura específica,
ambos predominantemente internacionais, já que documentos
publicamente acessíveis eram muito escassos naquela época. Para
complementar estes dados foram consultadas diretamente por
telefone e email pessoas-chave das principais entidades envolvidas
neste setor, tanto internacionais quanto nacionais, para tirar
dúvidas mais aprofundadas que não puderam ser esclarecidas nos
documentos, bem como para indicar documentos e outras fontes
de informações.
A presente edição, de 2010, é a segunda atualização, tendo
a primeira sido realizada em 2006. A metodologia de um mix
de fontes secundárias e entrevistas pessoais ou por telefone foi
mantida, sendo enriquecida pela experiência direta do autor como
consultor em várias missões técnicas internacionais, eventos e
estudos mais específicos dentro do tema geral do Comércio Justo.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
6
Responsável técnico:
Johann Wolfgang Schneider
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
7
Índice
1. CONCEITUAÇÃO E DEFINIÇÃO .................................................. 12
1.1. “Fair Trade” .......................................................................... 12
1.2. Delimitação de Comércio Justo versus comércio convencional . 12
1.3. Princípios-chave do Comércio Justo ...................................... 13
1.4. Conceitos e definições usados no Brasil ................................ 14
1.5. Expressões e traduções diversas ........................................... 18
1.6. Comércio ético ..................................................................... 18
1.7. “ATO – Alternative Trade Organisations” ................................ 19
1.8. “FTO – Fair Trade Organisations” .......................................... 20
1.9. Nome e convenção de uso .................................................... 20
2. SURGIMENTO E EVOLUÇÃO ............................................... 20
3. OS ATORES DO COMÉRCIO JUSTO ..................................... 25
3.1. Os Produtores ...................................................................... 25
3.2. Os traders ou exportadores .................................................. 26
3.3. Os Importadores .................................................................. 27
3.4. As “world shops” .................................................................. 29
3.5. O varejo convencional ........................................................... 31
3.6. Os licenciados ...................................................................... 32
3.7. As Iniciativas de Certificação ................................................ 32
3.8. As entidades internacionais .................................................. 38
3.8.1. FLO – Fair Trade Labelling Organisations International .. 39
3.8.2. EFTA - European Fair Trade Association....................... 40
3.8.3. WFTO - World Fair Trade Organisation ......................... 44
3.8.4. Fair Trade Federation................................................... 46
3.9. Outras organizações ligadas ao Comércio Justo .................... 47
4. O MERCADO MUNDIAL DE COMÉRCIO JUSTO ................... 48
4.1. O crescimento do Comércio Justo .......................................... 48
4.2. Principais mercados .............................................................. 50
4.3. Gama de produtos ................................................................ 53
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
8
4.4. Um mercado de commodity .................................................. 55
4.5. Produtos não certificados ..................................................... 57
4.6. Artesanato e outros produtos não-alimentícios ..................... 60
4.7. Moda ética ........................................................................... 68
4.8. Comércio Justo no Turismo .................................................. 71
4.9. Parceiros comerciais do Comércio Justo ............................... 74
4.9.1. Supermercados e varejo convencional ........................ 74
4.9.2. Licenciados ............................................................... 75
4.9.3. Traders, importadores e distribuidores ....................... 77
4.10. Continua aumentando o reconhecimento do
“Fair Trade” pelo consumidor ..................................... 79
4.11. Heterogeneidade dos mercados ................................. 79
4.12. O reconhecimento do Comércio Justo como alternativa
importante pelos governantes .................................... 79
5. A SUSTENTAÇÃO DO COMÉRCIO JUSTO - O CONSUMIDOR .. 80
5.1. A evolução do consumidor consciente ................................... 80
5.2. “ethical consumerism” – O consumo ético ............................ 83
5.3. O perfil dos consumidores do Comércio Justo ....................... 84
6. ESTRATÉGIAS DE MARKETING .......................................... 86
6.1. Produto ................................................................................ 86
6.2. Estratégia de preço .............................................................. 88
6.3. Distribuição .......................................................................... 91
6.4. Comunicação ........................................................................ 91
6.5. Posicionamento estratégico ................................................... 92
7. ESTRATÉGIAS DE PROMOÇÃO E EXPANSÃO DO MERCADO .. 93
7.1. Aumentar a base de consumidores, fidelizar e intensificar
a relação .............................................................................. 93
7.2. Aumentar licenciados ........................................................... 95
7.3. Aumentar a base de distribuição ........................................... 95
7.4. “Fair Trade Town” FTT – Cidade de Comércio Justo ............... 96
7.5. Aumentar a base de cliente ................................................... 97
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
9
7.6. Fairtrade at work .................................................................. 98
7.7. Compras públicas ................................................................ 99
7.8. “Advocacy” - Aumentar o reconhecimento institucional .......... 99
7.9. Aumentar a consciência da sociedade - “public awareness”... 100
8. PERSPECTIVAS FUTURAS E DESAFIOS ................................. 103
8.1. Desafios ..............................................................................103
Índice de Ilustrações
Ilustração 1 - Preço do café de Comércio Justo ............................ 15
Ilustração 2 - Logo do Comércio Justo nos EUA e Canadá ............. 23
Ilustração 3 - Marcas harmonizadas de “Fair Trade” ..................... 24
Ilustração 4 - Marca da WFTO para Organizações Fair Trade ........ 24
Ilustração 5 - Fotos de “world shops” da Oxfam e Artisans
du Monde .................................................................................... 29
Ilustração 6 - Foto de bananas no supermercado da Marks &
Spencers na Inglaterra ................................................................. 32
Ilustração 7 - Foto no website da gepa de caixa de suco de laranja .. 32
Ilustração 8 - Foto publicitária de café da marca café direct ......... 32
Ilustração 9 - Marca Max Havelaar nova da Suíça ......................... 32
Ilustração 10 - Países com Iniciativas Nacionais .......................... 33
Ilustração 11 - Selo da FLO ......................................................... 39
Ilustração 12 - Marca da EFTA ..................................................... 40
Ilustração 13 - Marca da WFTO .................................................... 46
Ilustração 14 - Campanha Fair Trade com artistas ........................ 46
Ilustração 15 – Marca da Fair Trade Federation ............................. 46
Ilustração 16 - Consumo per capita ............................................. 52
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
10
Ilustração 17 – Suco de laranja da marca própria da Auchan
na França 58
Ilustração 18 – Selo da Ecocert 60
Ilustração 19 – Marca da Fair Support 64
Ilustração 20 - O Catálogo da Fair Support 65
Ilustração 21 – Detalhes do catálogo de tendências da Fair
Support Fehler! Textmarkenicht definiert.
Ilustração 22 – Imagens da bonequinha da sorte no armazém da
Barbosa do Brasil dentro do Centrum Mundiaal. 66
Ilustração 23 - Loja de Comércio Justo na Holanda 66
Ilustração 24 - Interior da loja 67
Ilustração 25 - Imagem de campanha de moda ética no Reino Unido 68
Ilustração 26 – Logomarca da Ethical Fashion Show 69
Ilustração 27 – Cartaz do evento em 2007 69
Ilustração 28 - Bracelete em madeira (rosewood) sustentável do
Vietnam 69
Ilustração 29 - Capa do catálogo 70
Ilustração 30 – Logomarca da People Tree 70
Ilustração 31 – Capa do catálogo da linha Emma Watson da
People Tree 70
Ilustração 32 - Fair Trade in Tourism - África do Sul 73
Ilustração 33 – Capa do Ethical travel guide 73
Ilustração 34 – Exemplo de marca de operadora de turismo ético 73
Ilustração 35 – Loja da Camden food co. 75
Ilustração 36 - Sede da gepa na Alemanha 77
Ilustração 37 – Embalagem de café premium de origem da
Cafédirect 86
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
11
Ilustração 38 – Embalagens de cosméticos com ingredientes
de Comércio Justo ....................................................................... 87
Ilustração 39 - Manga no supermercado inglês Sainsbury ............ 87
Ilustração 40 - Ala de frutas frescas de Comércio Justo no
supermercado Sainsbury ............................................................. 87
Ilustração 41 - Marca da Starbucks .............................................. 88
Ilustração 42 - Marca de café nos EUA ......................................... 88
Ilustração 43 - Marca de café nos EUA ......................................... 88
Ilustração 44 - Fair Wage Guide ................................................... 90
Ilustração 45 – Bananas no supermercado Waitrose, Reino Unido ..... 91
Ilustração 46 - Propaganda de café da Max Havelaar Holanda ...... 91
Ilustração 47 - Colhedora de chá no Sri Lanka – Max Havelaar Suiça . 91
Ilustração 48 - Colhedora de chá no Sri Lanka .............................. 94
Ilustração 49 - Cartazes do website Fairtrade at work ................... 94
Ilustração 50 - A figura do chocolate M&M como manifestante ..... 95
Ilustração 51 – A placa na entrada da cidade de Garstang ............ 96
Ilustração 52 – Material promocional da campanha Fairtrade at work 98
Ilustração 53 – Logomarca do projeto Fair Procura ....................... 98
Ilustração 54 - Logo da ICLEI ....................................................... 99
Ilustração 55 - Material promocional do mundial do Comércio Justo 100
Ilustração 56 – Material promocional da Fair Trade Fortnight
já para 2011 ............................................................................... 100
Ilustração 57 – Logomarca da Rugmark ....................................... 102
Ilustração 58 – Marca da rede de lojas Chico Mendes da Itália ......... 102
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
12
Índice de Quadros
Quadro 1 - O sistema do Comércio Justo ..................................... 36
Quadro 2 - O sistema financeiro ................................................... 37
Quadro 3 - O sistema de controle ................................................ 38
Índice de Tabelas
Tabela 1 - Iniciativas Nacionais de Comércio Justo ....................... 34
Tabela 2 - Entidades internacionais de Comércio Justo ................. 39
Tabela 3 - Membros da EFTA ....................................................... 41
Tabela 4 – Participação percentual das categorias de produto
no faturamento global ................................................................. 42
Tabela 5 - Produtores por continente e tipo de produto ................ 43
Tabela 6 - Comércio Justo na Europa 2000 - 2007 ....................... 49
Tabela 7 – Mercados em valor de varejo estimado ........................ 50
Tabela 8 - Produtos com critérios de certificação FLO .................. 53
Tabela 9 - Vendas sem selo da FLO na Europa .............................. 57
Tabela 10 - Vendas de Produtos alimentares e não alimentares
no Comércio Justo na França ....................................................... 61
Tabela 11 – Valor dos produtos não alimentares do Comércio
Justo nos distribuidores na França ............................................... 62
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
13
1. CONCEITUAÇÃO E DEFINIÇÃO
A conceituação e a definição corretas do Comércio Justo se
fazem necessárias por vários motivos. Primeiro porque sua própria
maneira de ser evoluiu e precisava ser esclarecida e uniformizada.
Segundo, porque, tanto no cenário internacional quanto no cenário
brasileiro, vários outros conceitos e posturas lhe são próximos e se
confundem ou são confundidos com ele.
1.1. “Fair Trade”
As principais entidades internacionais atuantes no Fair Trade
uniformizaram seus conceitos e a definição durante a Conferência
anual da IFAT (International Federation of Alternative Trade)1, em
2001, e desde então usam a seguinte definição:
“Comércio Justo é uma parceria comercial, baseada em diálogo,
transparência e respeito, que busca maior equidade no comércio
internacional. Ele contribui para o desenvolvimento sustentável
através de melhores condições de troca e a garantia dos direitos para
produtores e trabalhadores marginalizados – principalmente do Sul.”
E acrescentam: “As organizações de Comércio Justo (apoiadas
pelos consumidores) estão engajadas ativamente no apoio aos
produtores, na conscientização e informação (“awareness raising”2)
e em campanhas para promover mudanças nas regras e práticas
do comércio internacional convencional”.
1.2. Delimitação de Comércio Justo versus comércio convencional
Em entrevista concedida à Folha de São Paulo3, Rüdiger Meyer,
então diretor da FLO, delimitou o “Fair Trade” da seguinte forma:
“Não somos contra o comércio. Nossa raiz é desenvolvimento e
não Karl Marx. Não somos um bando de esquerdistas que têm ideias
estranhas sobre a economia. Queremos usar as relações de comércio
existentes e simplesmente oferecer dentro disso uma alternativa.”
1 Hoje substituída pela WFTO - Vide detalhes no capítulo 32 “Awareness raising” é uma expressão típica do jargão de projetos de desenvolvimento e significa “aumentar a consciência/ conhecimento sobre determinado assunto3 publicada no dia 04 de abril de 2004
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
14
O artigo continua: “Críticos do Fair Trade, no entanto, afirmam
que tudo o que o movimento faz é garantir uma maneira de a classe
média aliviar seu sentimento de culpa. O Instituto Adam Smith, uma
organização britânica de estudos sobre livre comércio, divulgou
um estudo em que afirma que o esquema de Comércio Justo está
“fadado ao fracasso”. “No caso específico do café, aqueles que (...)
defendem esquemas inconsistentes para elevar os preços podem
ter a melhor das intenções, mas não estão realmente ajudando. Na
melhor das hipóteses, estão desviando tempo e energia para becos
sem saída. Na pior, poderiam acabar tornando a situação ainda
pior. As pessoas podem se sentir bem, ignorando as realidades do
mercado, mas não produzirão nenhum bem”, conclui o estudo.
Eileen Maybin, porta-voz da Fair Trade Foundation do Reino
Unido, rebate essa análise. “Produtos Fair Trade são apenas parte
da solução, mas são importantes porque significam uma maneira
prática de os consumidores ajudarem os produtores dos países em
desenvolvimento. Comprar produtos Fair Trade também é um voto
pela mudança das regras do comércio”, afirma Maybin.
1.3. Princípios-chave do Comércio Justo
Gerando oportunidades para produtores economicamente em
desvantagem
Comércio Justo é a estratégia para a diminuição da pobreza e o
desenvolvimento sustentável. Seu propósito é de gerar oportunidades
para produtores que foram explorados economicamente ou
marginalizados pelo sistema convencional de comércio.
Transparência e co-responsabilidade (“accountability”4)
Comércio Justo envolve gestão transparente e relações comerciais
que tratam de forma justa e respeitosa os parceiros comerciais.
Treinamento e apoio (“capacity building”5)
1 “accountability” significa a capacidade de prestar contas.2 “capacity building”, outra expressão típica do jargão de projetos de desenvolvimento, significa “construindo a capacidade”, ou seja, a capacitação, mas também a estruturação organizacional.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
15
Comércio Justo é um meio de desenvolver a independência
do produtor. Relacionamentos de Comércio Justo proporcionam
continuidade, durante a qual os produtores e suas organizações de
comercialização podem melhorar suas habilidades de gestão e seu
acesso a novos mercados.
Pagamento de um preço justo
Um preço justo no contexto regional ou local é um que foi acordado
através de diálogo e participação. Ele cobre não somente os custos
de produção mas permite uma produção que é socialmente justa e
ecologicamente segura. Ele proporciona pagamento justo para os
produtores e leva em consideração o princípio do pagamento igual
para trabalho igual para homens e mulheres. Os comerciantes de
Comércio Justo garantem pagamento imediato para seus parceiros
e, sempre que possível, ajudam os produtores com o acesso a
financiamento antes da produção ou antes da colheita.
O seguinte quadro deixa claro, no exemplo clássico do café,
como o Comércio Justo beneficia produtores, principalmente em
momentos de crise dos preços no mercado mundial convencional.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
16
US cents/Ib
300
250
200
150
100
50
97
Preço de Comércio Justo = preço mínimo + prêmio de Comércio Justo
Preço do mercado mundial convencional
Preço mínimo de Comércio Justo
98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08
0
Ilustração 1 - Preço do café de Comércio Justo
Fonte: Transfair USA
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
17
Igualdade de gêneros
Comércio Justo significa que o trabalho de mulheres é valorado
e recompensado corretamente. Mulheres são sempre remuneradas
por suas contribuições no processo produtivo e detêm poderes em
suas organizações.
Condições de trabalho
Comércio Justo significa um ambiente de trabalho seguro e
saudável para os produtores. A participação de crianças não
deve afetar negativamente seu bem-estar, segurança, obrigações
educacionais e necessidade de brincar e deve estar conforme a
convenção das Nações Unidas sobre os direitos da criança, bem
como as leis e normas vigentes no contexto local.
O meio ambiente
O Comércio Justo ativamente estimula melhores práticas
ambientais e a aplicação de métodos responsáveis de produção.
Organizações e produtos de Comércio Justo
Produtos de Comércio Justo são aqueles produtos certificados
sob o sistema de certificação da FLO (Fair Trade Labelling
Organisations International)6 e/ou produzidas por organizações de
Comércio Justo.
1.4. Conceitos e definições usados no Brasil
O conceito de Comércio Justo e Solidário no Brasil é aquele
reconhecido e consolidado pelo Sistema Nacional de Comércio
Justo e Solidário (SNCJS).
Entende-se por comércio justo e solidário “o fluxo comercial
diferenciado, baseado no cumprimento de critérios de justiça e
6 Vide mais detalhes no capítulo 3.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
18
solidariedade nas relações comerciais que resulte no protagonismo
dos Empreendimentos Econômicos e Solidários (EES) por meio da
participação ativa e do reconhecimento da sua autonomia”7.
Características do Comércio Justo e Solidário
• A existência de relações comerciais mais justas, solidárias,
duradouras e transparentes.
• A co-responsabilidade nas relações comerciais entre os diversos
participantes na produção, comercialização e consumo.
• A valorização nas relações comerciais, da diversidade
étnica e cultural e do
Conhecimento das comunidades tradicionais.
• A transparência nas relações comerciais, na composição dos
preços praticados e na elaboração dos produtos, garantindo
acesso a informação acerca dos produtos, processos, e
organizações que participam do Comércio Justo.
Objetivos do Comércio Justo e Solidário
• Promover o desenvolvimento sustentável, a justiça social, a
soberania e a segurança alimentar e nutricional.
• Garantir os direitos dos (as) produtores (as) e consumidores
(as) nas relações comerciais.
• Fortalecer a cooperação entre produtores – comerciantes –
consumidores e suas respectivas organizações para aumentar
a viabilidade, reduzindo riscos e dependências econômicas.
• Promover a autogestão; equidade de gênero, étnica e de
gerações.
• Garantir a remuneração justa do trabalho.
7 Fonte: Faces do Brasil.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
19
• A valorização da preservação do meio ambiente, com ênfase na
produção de produtos de base agroecológica e das atividades
do extrativismo sustentável.
1.5. Expressões e traduções diversas
Na Itália, no website da cooperativa “ctm altromercato”,
encontramos a expressão “commercio equo e solidale”. Eles ainda
usam o slogan “il commercio equo per un’economia solidale”. Nos
sites de outras cooperativas e iniciativas encontra-se a expressão
somente de “commercio equo”.
Na França, o termo usado é: “commerce equitable”.
1.6. Comércio ético
No site da organização internacional de certificação FLO, na lista
de perguntas frequentes, encontra-se a seguinte questão:
Qual é a diferença entre “Fair Trade” e “ethical trade”?
“Ethical trading”, ou comércio ético, significa que empresas
estão engajadas em um processo de tentar assegurar o respeito aos
direitos trabalhistas básicas dos empregados de seus fornecedores
do terceiro mundo. A certificação como Fair Trade visa dar a pequenos
produtores e trabalhadores em desvantagem mais controle sobre
suas vidas. Ela enfrenta a injustiça de uma remuneração insuficiente
para uma vida decente e o acesso insuficiente ao mercado através
da garantia de que produtores recebam condições justas de troca
(“fair terms of trade”) e preços ou salários justos – independente
das condições do mercado convencional. ...”
Aprofundando o conceito
A “Ethical Trade Initiative - ETI8”, da Grã-Bretanha, propõe uma
definição para o comércio ético como código de conduta para
empresas, principalmente em suas relações com fornecedores:
8 www.ethicaltrade.org
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
20
“Comércio ético é entendido como a boa prática das empresas na
implementação de códigos de conduta sobre padrões trabalhistas,
principalmente na cadeia de suprimento, com monitoramento e
verificação independente”
As nove diretrizes tratadas pelo código base da ETI são:
1. Trabalho é livremente escolhido.
2. Liberdade de associação e o direito de negociação coletiva são
respeitados.
3. Condições de trabalho são seguras e higiênicas.
4. Trabalho infantil não deve ser utilizado.
5. Salários dignos são pagos.
6. Horas de trabalho não são excessivas.
7. Nenhuma discriminação é praticada.
8. Trabalho regular é fornecido.
9. Nenhuma punição ou tratamento desumano é permitido.
O movimento pelo comércio ético ganhou força nos últimos
anos com o surgimento de muitos escândalos envolvendo locais de
produção que exploravam mão de obra infantil, ou de outra forma
desfavorecida, em condições insalubres, às vezes como escravos,
entre outros.
1.7. “ATO – Alternative Trade Organisations”
As organizações de comércio alternativo têm por objetivo declarado
contribuir para o desenvolvimento socioeconômico de produtores e
trabalhadores marginalizados pelo sistema convencional, mas não
de ser uma proposta integral de política de desenvolvimento. Elas
se inserem, muitas vezes, na cadeia de fornecimento e logística
do Comércio Justo para viabilizar a “chegada” dos produtos aos
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
21
mercados consumidores. Muitas das organizações ativas no
Comércio Justo começaram como ATO.
1.8. “FTO – Fair Trade Organisations”
São organizações reconhecidas pela WFTO, obedecendo a
critérios específicos e que, por isso, podem usar o selo do mesmo
(vide capítulo específico sobre a WFTO).
1.9. Nome e convenção de uso
Junto com a definição do conceito, o SNCJS definiu o nome a ser
usado no Brasil:
Comércio Justo e Solidário.
Para, na medida do possível, distinguir o cenário brasileiro do
internacional, será usado o termo acima para identificar o primeiro
e o nome Comércio Justo Internacional ou Fair Trade, para identificar
o segundo.
2. SURGIMENTO E EVOLUÇÃO
Apesar de já terem existido pessoas que se preocupassem com
a injustiça nas relações de comércio internacional e o tratamento
abusivo de trabalhadores nas então colônias dos países europeus
no século 19, somente nas décadas de 1940 e 1950 surgiram as
primeiras ações concretas de que se tem registro na busca de
soluções para estes problemas.
Todos os movimentos partiram de iniciativas de pessoas ligadas
a entidades religiosas ativas em missões em países do então
chamado “terceiro mundo”. A partir do final da década de 1940
estes missionários começaram a levar objetos de artesanato da
produção das comunidades que acompanhavam para ajudar-lhes a
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
22
gerar renda própria. Inicialmente a comercialização era totalmente
informal baseando-se na rede de contatos destas pessoas e de suas
organizações religiosas. A partir de bazares e feirinhas organizadas
pelas igrejas, aos poucos foram surgindo pontos de venda e depois
lojas, primeiro nas próprias dependências das mesmas e depois
também fora, mas sempre tocadas por pessoas ligadas a elas.
Para o sucesso das “worldshops” ou lojas do mundo9, o trabalho
voluntário e a solidariedade dos compradores foram fundamentais
neste estágio. Hoje são estimadas em torno de 3000 lojas em todo
o mundo e a grande maioria ainda é ligada a organizações religiosas
e funcionam com voluntários.
Com o aumento deste comércio, surgiram também as Alternative
Trade Organisations (ATO), as organizações de comércio alternativo,
que assumiram o trabalho de importação/exportação e logística.
Eles também ajudaram a criar cada vez mais “world shops” e, em
conjunto, faziam o trabalho de conscientização dos consumidores
na ponta. No entanto, por mais que eles conscientizassem os seus
clientes, eles não conseguiam ir além do público limitado dos
“world shops”.
Desde o início da década de 1970 existiam iniciativas de
comprar também produtos agrícolas diretamente dos produtores.
Na Holanda, a “Fair Trade Organisatie” importou o primeiro café
comercializado justamente (“fairly traded”) de cooperativas de
pequenos agricultores da Guatemala. Na Suíça surgiu a “Gebana”
(de “gerechte Banane” ou “banana justa”) em 1978 e já começou a
abrir espaço nos supermercados para este produto.
Em meados da década de 1980 o movimento recebeu um novo
impulso. Um missionário que trabalhava com pequenos produtores
de café no México e um funcionário de uma ONG com base religiosa
conceberam a ideia de criar um selo para identificar o produto
com origem e princípios de Comércio Justo. Nesta época, o preço
do café, além de outras matérias-primas agrícolas, nos mercados
9 Inicialmente algumas se chamavam “third world shops” ou lojas do terceiro mundo, outras adotaram o conceito e nome “One World” e aos poucos a ideia integracionista de um mundo único, comum a todos, contribuiu para a substituição.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
23
internacionais de commodity estava abaixo de seus custos de
produção, condenando milhões de famílias em toda a América
Central ao êxodo rural se não houvesse uma outra solução. Eles
queriam “TRADE NOT AID”10.
A partir deste pedido foi desenvolvido por uma entidade
holandesa toda uma estratégia de apoio e comercialização que
culminou com a criação de uma marca de produto (Trade Mark):
Max Havelaar, que foi lançada em 1988. O nome “Max Havelaar”
é altamente significativo. Ele é o personagem de um livro que, em
1859, reclamava com as autoridades do governo colonial das então
Índias Holandesas Orientais, hoje Indonésia, sobre as condições
desumanas nas quais trabalhavam os trabalhadores locais. Naquela
época, ele não obteve nenhum sucesso.
Com esta marca era possível ir além do círculo restrito das “world
shops” e entrar no varejo tradicional. A ideia pegou rapidamente e
dentro de um ano o produto com o selo já detinha 3% de participação
de mercado.
Este modelo serviu de referência para iniciativas em outros
países que até hoje são chamadas de “NI - National Initiatives”.
Alguns adotaram o nome Max Havelaar, outros introduziram marcas
próprias, como “TransFair” na Alemanha, “Fairtrade Foundation”
na Grã-Bretanha e “Rättvisemarkt” na Finlândia.
Em 1989, na Holanda, foi criada a “IFAT – International Fair Trade
Association”, uma rede global de organizações de Comércio Justo,
incluindo, desde 1991, também organizações dos produtores.
Na década de 1990 o movimento cresceu consideravelmente e
tornou-se importante harmonizar conceitos e os vários sistemas de
controle e selos nacionais que surgiram, além de integrar atividades
e juntar forças.
Em 1994 a efetivação da União Europeia motivou os lojistas
dos world shops a criarem uma rede de cooperação e troca de
10 “TRADE NOT AID” - Comércio não ajuda. Era o chavão usado à época contra o modelo ineficaz de ajuda humanitária.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
24
informações, a “NEWS! - Network of European World Shops”.
Também em 1994 foi criada a “Fair Trade Federation”, reunindo
importadores, atacadistas e varejistas dos EUA e Canadá, e alguns
de seus fornecedores. Hoje, oferece em seu website a listagem
completa de seus membros para facilitar a identificação de lojas e
fornecedores.
Em 1997, as então 14 entidades nacionais de certificação11
existentes à época criaram a “FLO – Fairtrade Labelling
Organisations International”, uma organização guarda-chuva
internacional responsável pela certificação dos produtos, visando
a harmonização tanto dos critérios e processos para a certificação
quanto o logo, ou seja, a identificação visual, a ser usada. Até então
as entidades nacionais de certificação de cada país trabalhavam com
critérios e marcas próprias. Além de confundir consumidores, isso
resultava em superposição de trabalhos e custos desnecessários,
por exemplo, com inspetores que realizavam visitas aos mesmos
países, ou países vizinhos, e que poderiam ser realizados por um
só profissional num roteiro estendido.
Um selo único também facilitaria o comércio em mais de um
país, tornando o negócio mais viável para o lançamento de novos
produtos. No entanto, o custo de introduzir uma nova marca,
o desafio de encontrar uma marca que funciona em todos os
países, o risco de perder a confiança e reconhecimento com o
desaparecimento das marcas antigas complicaram uma mudança
mais rápida.
Finalmente, em 2003, a nova marca global de Comércio Justo
foi adotada pela maioria das Iniciativas Nacionais, com exceção
dos EUA e Canadá, que mantiveram suas marcas anteriores. Os
EUA ainda usam exclusivamente sua marca, preterindo o logo
universal, enquanto que os Canadenses usam os dois lado a lado
em seu site. Em 2010, o nome e a marca “Fairtrade” já estavam
completamente absorvidos, substituindo os nomes e as marcas
11 Vide capítulo 3.
Ilustração 2 Logo do Comércio Justo nos EUA e Canadá
Ilustração 3 Marcas harmonizadas
de “Fair Trade”
Ilustração 4 Marca da WFTO para
Organizações Fair Trade
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
25
Ilustração 2 Logo do Comércio Justo nos EUA e Canadá
inicialmente usados no país local. Na Áustria, por exemplo, o nome
foi mudado de Transfair Áustria para FAIRTRADE AUSTRIA.
A harmonização do símbolo permite o reconhecimento universal,
enquanto cada Iniciativa Nacional pode ou não usar seu nome junto
ao logo, de acordo com o nível de reconhecimento do nome perante
o público consumidor.
Novos Logotipos do Comércio Justo utilizando as marcas Fair
Trade, Max Havelaar e TransFair12.
Ilustração 3 Marcas harmonizadas
de “Fair Trade”
Reconhecendo que existem muitos aspectos e assuntos de
natureza global no Comércio Justo, as organizações internacionais
se encontram desde 1996 em um grupo de trabalho informal
chamado “FINE”, composto pelas iniciais das quatro principais
entidades: FLO, IFAT, NEWS e EFTA. O FINE foi um bom exemplo
das formas de cooperação típicas do meio do Fair Trade, que são
os grupos de trabalho e redes informais, que procuram agregar
valor de experiências e competências sem necessariamente criar
estruturas administrativas pesadas.
Por fim, em 2004 foi lançada também a marca da IFAT que visa
identificar as organizações que atendem aos critérios de Comércio
Justo. Desta forma, uma loja tipo “world shop” poderá usar a marca,
enquanto um supermercado que apenas mantém alguns itens de
Comércio Justo, mas fora isso não se enquadra nas exigências, não
terá o direito de usá-la.
12 Fonte: FLO, Max Havelaar e Transfair Alemanha.
Ilustração 4 Marca da WFTO para
Organizações Fair Trade
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
26
Em 2009, foi criada a Organização Mundial de Comércio Justo
- WFTO (World Fair Trade Organisation), absorvendo todos os
membros da antiga IFAT, substituindo esta entidade e incorporando
a NEWS, dando continuidade a seus objetivos e princípios num
formato mais global.
A dimensão atual do movimento
De acordo com dados da FLO, 2009 foi mais um ano de crescimento
positivo para o Fair Trade em todos os países membros. Estima-se
que aproximadamente 27.000 produtos Fair Trade estão agora à
venda em cerca de 70 países. De acordo com estudos recentes, a
consciência do consumidor da marca Fair Trade tem excedido 80%
em alguns países.
Apesar da desaceleração econômica global, a Fair Trade alcançou
um aumento de 15% no valor global de varejo, com vendas estimadas
no valor de 3,4 bilhões de euros, tendo este valor triplicado desde
2005.
Na ponta dos produtores, o sistema de Comércio Justo
internacional certificado pela FLO13 em 2009 registrou 827
organizações certificadas de produtores, num aumento de 11% em
relação a 2008, beneficiando mais de 1,2 milhão de produtores e
trabalhadores e distribuindo um total de 52 milhões somente em
prêmios que são aplicados diretamente nas comunidades.
3. OS ATORES DO COMÉRCIO JUSTO
3.1. Os Produtores
Os produtores, evidentemente, constituem o coração de todo o
movimento. Afinal de contas, ele foi criado para gerar benefícios
para eles. Eles devem estar organizados em associações ou
cooperativas, estimulando assim as relações democráticas entre
13 Estes dados não compreendem produtores de artesanato e outros produtos não-alimentícios, que não são certificados pela FLO, além de produtores que não trabalham com a certificação da FLO.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
27
os beneficiários. Eles podem e são até estimulados a participarem
mais do restante da cadeia do negócio. No Gana, por exemplo,
existe uma cooperativa de plantadores de cacau, que é sócia da
empresa de importação, beneficiamento e comercialização do
chocolate, no Reino Unido.
O sistema internacional monitorado pela FLO aceita tanto
pequenos produtos familiares quanto fazendas com trabalhadores
contratados, desde que estas últimas obedeçam a certos critérios
de respeito aos trabalhadores e sigam a legislação trabalhista de
seu país ou, na inexistência de uma legislação, os princípios da
Organização Internacional de Trabalho.
3.2. Os traders ou exportadores
Boa parte dos grupos de produção não tem experiência ou estrutura
para cuidar dos aspectos logísticos e burocráticos da exportação de
seus produtos. Em alguns casos eles mesmos criam uma empresa
para isso, em conjunto com outras entidades de apoio ou não. Apesar
de aumentar a cadeia de distribuição, e parecer um paradoxo em
relação ao conceito de encurtar os caminhos até o cliente final, no
comércio internacional é necessária a intervenção de um agente
profissional para garantir o bom funcionamento dos negócios.
A experiência prática mostrou, inclusive no Brasil, que os
grupos produtores, em sua grande maioria, não têm condições
de gerenciar adequadamente todas as questões operacionais
envolvidas nos processos de exportação, tais como a logística
internacional, desde a contratação do frete, as embalagens para o
transporte internacional, o controle final de qualidade, o despacho
aduaneiro, os pagamentos internacionais, o câmbio, além de todo
o gerenciamento dos contatos com os compradores internacionais.
A função prática dos traders, no entanto, deve ser a de um agente
apoiador e orientador, como um prestador de serviço, em vez de
um “trader” tradicional que compra e revende, visando no processo
apenas a maximização de lucro.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
28
Sua remuneração pode ser absorvida pelo comprador que é o
mais interessado em poder contar com um parceiro no país de
origem para garantir o bom encaminhamento da logística, incluindo
muitas vezes também um controle de qualidade pré-embarque.
Estas empresas devem ser também certificadas pela FLO,
sendo cadastrados como “traders” no país produtor. No caso de
artesanato e outros produtos não-alimentícios, eles normalmente
são registrados nas entidades regionais da Organização Mundial de
Comércio Alternativo – WFTO.
3.3. Os Importadores
Os importadores podem ser diferenciados em duas categorias:
aqueles especializados exclusivamente em Comércio Justo
e aqueles especializados em alguma categoria de produto, por
exemplo café, que trabalham com fornecedores de Comércio Justo
como apenas mais um de seus segmentos.
Os importadores especializados em Comércio Justo muitas
vezes também atuam como atacadistas e distribuidores e, às
vezes, também diretamente no varejo, na maioria por meio de lojas
virtuais. Isso é bastante comum no setor de artesanato.
Os importadores também precisam ser certificados como
“traders” pela FLO, neste caso no país comprador.
Alguns deles apoiam os produtores de várias maneiras:
aconselham e apoiam tecnicamente no
desenvolvimento de produtos;
oferecem treinamentos em várias áreas;
proporcionam apoio adicional em momentos
de dificuldades econômicas e sociais;
antecipam pagamentos, financiando a
produção.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
29
Em seus mercados eles distribuem os produtos através das lojas
especializadas, as “world shops”, e grupos locais ou representantes,
bem como o varejo tradicional, lojas de produtos naturais e
orgânicos, lojas de presentes e decoração, supermercados ou
venda por catálogo e internet. Alguns atuam também no segmento
de catering, atendendo festas, cantinas e cozinhas de empresas.
Os importadores especialistas em determinados produtos, a
exemplo de café, frutas tropicais, mel e castanhas ou especiarias, na
maioria das vezes atendem às indústrias alimentícias que precisam
de matérias-primas Fair Trade para seus produtos que portam o selo
da FLO. Nestes casos, a iniciativa parte das indústrias alimentícias
que querem desenvolver algum produto novo com ingredientes de
Fair Trade e pedem aos importadores especializados para encontrar
estes produtos com as certificações necessárias que eles estimam
importantes para alcançar o mercado consumidor visado.
Estes importadores então acionam a Iniciativa Nacional de seu
país ou diretamente a FLO e pedem a indicação de produtores
habilitados.
O principal motivo para este negócio não ser realizado por
importadores especializados apenas em Comércio Justo é que
aqueles importadores são altamente especializados, prestando
serviços muito importantes e valorizados por seus clientes da
indústria alimentícia na cadeia de fornecimento, que não podem ser
facilmente reproduzidos ou substituídos por novos empreendimentos,
normalmente menores e com foco apenas em Comércio Justo.
Entre estes serviços se destacam: a busca e todo o gerenciamento
da relação com os fornecedores no mundo inteiro, o que envolve muito
tempo e conhecimento, controle de qualidade, armazenamento,
manutenção de estoque controlador, além de toda a logística do
país produtor até o cliente varejista ou industrialno país consumidor,
homogenização, misturas e blending e envase (packing) em
embalagens adequados ao consumidor final ou industrial.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
30
Portanto, estas competências e experiências continuam a ter
seu valor no segmento de Comércio Justo, porque toda a cadeia de
produção e comercialização, ou seja, a indústria alimentícia (vide
capítulo sobre licenciados), os distribuidores e o varejo, continuam a
mesma cadeia tradicional, com exceção das lojas de Comércio Justo.
Como o Comércio Justo se transformou em segmento de interesse
do comércio convencional, graças à demanda dos consumidores
finais, estes especialistas abrem novas linhas de atuação, buscando
fornecedores credenciados para o Comércio Justo internacional e
incorporando seus produtos em suas linhas, para poder atender
às indústrias alimentícias, que procuram desenvolver cada vez
mais produtos nesta linha do Comércio Justo, que é o segmento de
maior crescimento sustentado nos últimos anos.
Estes importadores, no entanto, tendem a se envolver menos
com o desenvolvimento da capacidade produtiva dos grupos, dando
preferência a produtores que já estejam num nível mais adiantados.
3.4. As “world shops”
Ilustração 5
Fotos de “world shops” da Oxfam e Artisans du Monde
As “world shops” ou “lojas do mundo”, como já foi apresentado
anteriormente, são especializadas em produtos de Comércio Justo
e, além dos produtos, oferecem muitas informações e promovem
encontros e eventos educativos sobre o assunto. Algumas também
organizam campanhas locais e regionais de lobby. Elas são
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
31
Ilustração 5
Fotos de “world shops” da Oxfam e Artisans du Monde
organizadas principalmente por associações locais de pessoas
motivadas por algo que se poderia chamar de “cidadania global”.
Apesar de, em geral, serem geridas como negócios, as “world
shops” se orgulham de serem organizações sem fins lucrativos. Na
maioria delas, boa parte do trabalho é realizado por voluntários.
Na maioria dos países, elas criaram entidades nacionais para
facilitar a cooperação e a troca de informações e experiências.
Muitas são apoiadas por grupos locais de solidariedade.
De acordo com o estudo Fair Trade Facts and Figures de 2007, o
total de world shops no mundo se aproximava de 4.000 (3916) e
era distribuído como segue:
0 100
44
19
0
14
836
426
296
117
8
105
300
7
120
9
575
300
50
280
350
60
200 300 400 500 600 700 800 900
Austrália & NZ
Japão
Canadá
França
Itália
Portugal
Espanha
Luxemburgo
Suíça
Áustria
Irlanda
Reino Unido
Bélgica
Holanda
Dinamarca
Alemanha
Noruega
Finlandia
Suécia
EUA
Worid shops por país
Fonte: Fair Trade Facts and Figures de 2007
(onde consta 0 os dados necessários não estavam disponíveis)
Figura 1 – Worid shops por país
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
32
Até 2009 ainda surgiram novas iniciativas em alguns países do
leste europeu, mas não há dados sobre a quantidade de lojas.
3.5. O varejo convencional
O varejo convencional assume um papel cada vez mais
importante na comercialização de produtos do Comércio Justo
certificado. Mais de 120 mil pontos de venda no mundo são
responsáveis pelo enorme volume e crescimento de vendas nos
últimos anos. É interessante observar que o poder das grandes redes
parece não prejudicar as pequenas lojas especializadas apenas em
Comércio Justo. Pelo contrário, o aumento de presença no varejo
em geral aumentou o reconhecimento do selo, beneficiando a todos.
0 5000
30000
0
350
5000
2500
160
0
0
4150
7500
0
40000
3820
1000
10000 15000 20000 25000 30000 35000 40000 45000
Austrália & NZ
Japão
Canadá
França
Itália
Portugal
Espanha
Luxemburgo
Suíça
Áustria
Irlanda
Reino Unido
Bélgica
Holanda
Dinamarca
Alemanha
Noruega
Finlandia
Suécia
EUA
Supermercados que comercializamprodutos de Comércio Justo por país
2500
3000
56000
2700
4000
0
Figura 2 – Supermercados que comercializam produtos
de Comércio Justo por país
Fonte: Fair Trade Facts and Figures de 2007
(onde consta 0 os dados necessários não estavam disponíveis)
Ilustração 6 – Foto de bananas no supermercado da Marks & Spencers na Inglaterra
Ilustração 9 Marca Max Havelaar nova da Suiça
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
33
Ilustração 7 – Foto no website da gepa de caixa de suco de laranja
Ilustração 8 – Foto publicitária de café da marca café direct
Ilustração 6 – Foto de bananas no supermercado da Marks & Spencers na Inglaterra
Ilustração 9 Marca Max Havelaar nova da Suiça
3.7. As Iniciativas de Certificação
As “Labelling Iniciatives” apelidadas de “LIs”, também
chamadas de “National Initiatives” ou Iniciativas Nacionais, são as
organizações de certificação e promoção do Comércio Justo que
surgiram nos diversos países, começando com a Max Havelaar na
Holanda em 1988.
3.6. Os licenciados
Licenciados são as empresas que recebem da Iniciativa
Nacional a licença para o benficamento e/ou comercialização
de um produto de Comércio Justo. Estas empresas podem ser
exclusivamente de Comércio Justo, como a Gepa, da
Alemanha, ou a Café Direct, do Reino Unido, ou são empresas
de produtos convencionais, de marcas tradicionais, como a Marks
& Spencers, também do Reino Unido, que querem lançar um ou
mais produtos de “Fair Trade”. Para poder receber o selo terão
de obedecer a todos os critérios gerais e específicos do produto e
ainda pagar uma taxa anual de licença pelo uso do selo à Iniciativa
Nacional de Certificação. Essa taxa irá financiar a fiscalização da
empresa e de todo processo de produção, o pagamento justo, etc.,
além das campanhas de conscientização e divulgação.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
34
Em 1997 as então 17 LI’s se juntaram para criar a FLO –
Fairtrade Labelling Organisations, a entidade conjunta para
harmonizar critérios de certificação e coordenação e realização de
certificações e monitoramentos dos grupos e licenciados. Hoje são
19 LI’s, sendo 15 na Europa, mais os EUA, o Canadá, o Japão, a
Austrália com a Nova Zelândia. Ainda existem duas organizações
de comercialização de produtos de Comércio Justo na República
Tcheca e na África do Sul (destacados em violeta nas imagens
abaixo). Estas organizações promovem o Fair Trade mas não
realizam a certificação e o monitoramento de licenciados. O México
e a África do Sul ainda têm organizações nacionais de certificação
que constituem membros associados da FLO.
Ilustração 10
Países com Iniciativas Nacionais
Fonte: FLO
O México, como primeiro país produtor a ter uma Iniciativa
Nacional, criou seu próprio sistema de certificação, embasado
e reconhecido pela FLO, mas levando em consideração vários
aspectos característicos da realidade mexicana. Desta forma o país
procura promover seu próprio mercado interno. Por isso, o México
hoje é membro associado da FLO.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
35
Ilustração 10
Países com Iniciativas Nacionais
Os nomes das LI’s, variam em função de suas histórias de
fundação, o que pode ser um pouco confuso para quem entra
neste mercado. Como a Max Havelaar, da Holanda, foi a primeira
de todas, alguns países se valeram de seu apoio na implantação de
suas estruturas e adotaram o nome. Daí surgiram a Max Havelaar
França, Suíça, Bélgica e Noruega. Um movimento similar aconteceu
entre a Transfair da Alemanha e o Luxemburgo, a Itália, os EUA, o
Canadá e o Japão. Outros criaram sistemas e nomes próprios.
Tabela 1 - Iniciativas Nacionais de Comércio Justo14
Alemanha TransFair
Austrália & Nova Zelândia Fair Trade Association
Áustria Fairtrade Austria
Bélgica Max Havelaar
Canadá TransFair
Dinamarca Max Havelaar
Espanha Comercio Justo
EUA TransFair
Finlândia Reilun kaupan edistämisyhdistys
França Max Havelaar
Holanda Max Havelaar
Irlanda Fairtrade Mark
Italia TransFair
Japão TransFair
Luxemburgo TransFair
Noruega Max Havelaar
Reino Unido Fairtrade Foundation
Suécia Föreningen för Rättvisemärkt
Suíça Max Havelaar
Membros associados
México Comercio Justo
África do Sul Fairtrade Label South Africa
Organizações de Marketing
África do Sul Fairtrade Label South Africa
República Tcheca Asociace Pro Fairtrade
Fonte: FLO International
14 Mais informações sobre cada Iniciativa Nacional podem ser encontradas em seus respectivos sites – vide anexo
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
36
As Iniciativas Nacionais são normalmente associações sem fins
lucrativos constituídas em sua maioria por entidades religiosas
ou de desenvolvimento, cooperativas e entidades de proteção ao
consumidor, de educação ou proteção ao meio ambiente e outras
iniciativas de cunho social.
As tarefas das Iniciativas Nacionais são as seguintes:
1. Prospecção, certificação e fiscalização de empresas licenciadas
(“licensees”). São empresas de comércio, empacotamento e/
ou beneficiamento que comercializam produtos com o selo
de Comércio Justo.
2. Apoio e orientação para o Marketing dos licenciados e do
varejo, além de oferecer sua rede de contatos de Comércio
Justo.
3. Ações de informação e educação com entidades e pessoas
que apoiam o movimento.
4. Ações de informação e conscientização ante o consumidor
final e à população em geral.
5. Elas também dão as diretrizes e contribuem para a definição
dos critérios técnicos a serem usados pela FLO para a
certificação de produtos e processos.
Os diagramas apresentados a seguir mostram como funciona o
sistema de Comércio Justo e quais são as funções de uma Iniciativa
Nacional, a exemplo, neste caso, da Alemanha.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
37
Quadro 1 - O sistema do Comércio Justo
FLO Produtores
ImportadorFabricante
Licenciado
Varejo
AssociadosApoio
Consumidor
13. Controle
14. Controle
2. Definição dos Critérios
1. Contribuição ações
3. Educação
4. Conscientização
8. Compra
7. Oferta de produtos
Controle
5. ProspecçãoConcessão deLicença
11. Cumprimento dos critérios
12. Cumprimento dos critérios
9. Marketing
10. P
reço mín
imo
As Iniciativas Nacionais estão no centro de todo sistema e
assumem a principal parte dos trabalhos:
1. elas recebem recursos e apoio de seus associados;
2. ajudam a definir o critérios internacionais de certificação de
produtos e produtores junto com a FLO;
3. realizam ações e campanhas de educação de seus associados;
4. realizam ações de conscientização do público consumidor,
além do lobby junto a órgãos governamentais;
5. prospectam licenciados para a fabricação de produtos,
para os quais são concedidas as licenças de uso do selo de
“Fairtrade” e que receberão o controle regular; e
6. oferecem apoio e orientação para o marketing das lojas.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
38
O lojista oferece uma gama de produtos (7) e o consumidor
compra os produtos (8). O licenciado dá apoio de marketing às
lojas (9), paga o importador, que por sua vez paga o produtor (10).
Em contrapartida, o importador e os produtores se comprometem
a seguir os critérios estabelecidos (11) e (12) em suas relações.
A FLO, depois de ter definidos os critérios, certifica e controla os
produtores e os importadores (13) e (14).
Quadro 2 - O sistema financeiro
FLO Produtores
ImportadorFabricante
Licenciado
Varejo
AssociadosApoio
Consumidor
Certificação
Contribuições
Financiamento e contribuições
Preço Final
Taxa de licença
Valor da mercadoria incl. Preço mínimo
Preço mínimo e financeiro
Valor da mercadoria incl. Preço mínimo + licença
Começando pelo produtor, o sistema financeiro do Comércio
Justo funciona da seguinte forma:
O produtor recebe do importador o preço mínimo definido para
sua mercadoria, além do “Premium” e, se for necessário, um
financiamento para iniciar o plantio ou para antecipar a safra. O
importador pode ainda, em alguns casos bancar a certificação
inicial dos produtores.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
39
O importador vende o produto ao licenciado, quando não for ele
mesmo, acrescentado de suas respectivas margens.
O licenciado, então, vende o produto ao varejista, que recebe
o preço final do consumidor. O licenciado paga a taxa de licença
à Iniciativa Nacional que, por sua vez, recebe as contribuições de
seus associados e paga suas contribuições para o funcionamento
da FLO.
Desde 2003, a FLO e as Iniciativas Nacionais em reuniões
conjuntas com os grupos produtores que já participam do sistema
decidiram começar a cobrar uma taxa de certificação de novos
produtores.
Quadro 3 - O sistema de controle
FLO Produtores
ImportadorFabricante
LicenciadoAssociados
Apoio
Controle
Controle
Controle
Controle
Controle
3.8. As entidades internacionais
O movimento organizado internacionalmente começou na Europa
e, por isso, as entidades internacionais de maior peso e experiência
se encontram lá. A tabela abaixo mostra as seis entidades e seus
principais dados. Em seguida, eles serão apresentados em detalhe.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
40
Tabela 2 - Entidades internacionais de Comércio JustoAs entidades internacionais
FLO WFTO (IFAT) EFTAFair TradeFoundation
Fundadaem
1997 2009 (1989) 1990 1994
Tipo deAssociados
Iniciativasnacionais decertificação,
redes de produtores e organizações de marketing
Produtores eorganizaçõesde comércioalternativos
Importadoras-especializadasem Comércio
Justo
Produtores,importadores,atacadistas,
varejistas
Associadosem países
24 em26 países
32970 países
119 países
300EUA e Canadá
SedeBonn,
GermanyOxford, Reino
UnidoMaastricht,
HolandaWashington,
EUA
Fonte: WFTO
3.8.1. FLO – Fair Trade Labelling Organisations International
A FLO15 (pronuncia-se Flô), como é chamada no meio do Comércio
Justo, foi criada em 1997 pelas então 14 Iniciativas Nacionais de
certificação que promovem e comercializam o selo em seus países.
Responsável pela certificação de produtores, produtos, indústrias
e comerciantes, ela é sediada em Bonn, na Alemanha, e tem hoje
24 membros, sendo:
19 Iniciativas de certificação nacional, entre 15 países europeus,
o Canadá, os EUA, Japão e Austrália e Nova Zelândia;
3 redes de produtores da América Latina, Ásia e África;
2 Organizações de Marketing na África do Sul e na República
Tcheca.
Ela é responsável pela definição dos critérios de certificação e
regularmente inspeciona e certifica organizações de produtores em
mais de 60 países na África, Ásia, e América Latina, envolvendo
aproximadamente 1,2 milhão de agricultores e trabalhadores. Em
2009 foram 827 grupos produtores no sistema, num aumento de
11% em relação a 2008.
15 www.fairtrade.net
Ilustração 11 Selo da FLO
European Fair Trade Association
Ilustração 12 Marca da EFTA
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
41
Ilustração 11 Selo da FLO
Em 2003 ela sofreu uma divisão interna, separando as atividades
do então departamento de definição de critérios e o apoio aos
produtores da atividade específica de auditoria, criando a FLO-
cert16, dando assim maior transparência e independência aos
processos. Esta separação também foi necessária para ganhar a
própria certificação ISO 65 para entidades de certificação.
Portanto, a FLO se divide em duas organizações:17
1. A “FLO International E.V.” é uma associação sem fins lucrativos
de participantes de perfil variado (“multi-stakeholder”)
compreendendo as 24 organizações fundadoras, ou Iniciativas
Nacionais, organizações de produtores, comerciantes
(“traders”) e especialistas externos. Ela desenvolve e revisa
os critérios de certificação, apoia os produtores na obtenção
e manutenção da certificação para que possam capitalizar as
oportunidades de mercado.
2. FLO-CERT GmbH é uma empresa limitada, pertencente
integralmente à FLO E.V., que coordena todas as tarefas e
processa todas as informações relacionadas com a inspeção
e a certificação de produtores e do comércio. Funcionando de
forma independente de qualquer outro interesse ela segue a
norma internacional ISO 65 para entidades de certificação.
3.8.2. EFTA - European Fair Trade Association
A EFTA18 é uma associação de 11 importadoras de Comércio
Justo de nove países europeus (vide Tabela 3 - que importam
produtos de cerca de 400 grupos produtores da África, Ásia e
América Latina.
16 www.flo-cert.net17 Esta apresentação é a tradução do texto da própria FLO.18 www.eftafairtrade.org
European Fair Trade Association
Ilustração 12 Marca da EFTA
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
42
Membros da EFTA
País Importadora Abr.
Alemanha Gepa Gepa
Áustria EZA 3 Welt EZA
BélgicaOxfam Magasins du Monde (MdM)
Oxfam Fairtrade cvbaOMdMOFT
EspanhaIDEAS
Intermón OxfamIDEAS
IO
França Solidar’Monde SoM
Holanda Fair Trade Original FTO
Itália CTM Altromercato CTM
Reino Unido Traidcraft Tc
Suíça Claro Claro
Tabela 3 - Membros da EFTA
Fundada em 1990, com sede em Maastricht, Holanda, após três
anos de cooperação informal, a EFTA é hoje uma das organizações-
chave no movimento de Comércio Justo no esforço de harmonizar
e coordenar as atividades no contexto internacional.
O faturamento global dos membros da EFTA no ano fiscal de
200719 foi de 229 milhões de euros com base no valor de revenda
do varejo (comparado com 218 milhões de euros em 2006 e 169
milhões de euros em 2005).
Os maiores associados da EFTA naquele ano (2006/07) foram a
Gepa na Alemanha, com 56,2 milhões de euros, a CTM altromercato
da Itália, com 43 milhões de euros, e a inglesa Traidcraft, com
EURO 39 milhões de euros. Mais de 50% deste faturamento é
realizado através do canal tradicional dos world shops. Este canal
é particularmente importante para IDEAS e Intermón Oxfam da
Espanha, Solidar’Monde da França e CTM Altromercato da Itália.
19 Compreende o período de julho 2006 até junho 2007 – último relatório publicado
Fonte: EFTA
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
43
Por outro lado, supermercados assumem um papel cada vez mais
importante, como no caso da Traidcraft, no Reino Unido, com 33%,
da Gepa, na Alemanha, com 27%, e a EZA, da Áustria, com 24%.
Os associados de EFTA comercializam produtos alimentícios e
outros. Na tabela abaixo é mostrada a distribuição das vendas por
categoria de produto. Os dados são o percentual que cada categoria
representa dentro do faturamento global da organização.
Distribuição das vendas dos membros por categoria de produto
Café ainda é o produto mais importante para todos os
importadores, seguido por outros alimentos.
Participação percentual das categories de produto no faturamento global
Categoria de produto
Claro CTM EZA FTO Gepa Ideas IO OMdM OFT SoM Tc
Café 6 13,8 33 34 46 7 21 - 21 12,6 10
Outros Alimentos
75,6 56,3 38 39 48 45 22 54,2 79 62,5 66
Frutas frescas
11,6 - - - - - - - - - -
Artesanato 1,5 23,2 29 24 6 36 48 45,8 - 23 14
Literatura 0,2 0,8 - - - 3 2 - - 0,5 -
Outros 5,1 1,5 - 2 - 7 4 - - 0,1 10
Cosméticos - 4,4 - - - 2 1 - - 1,3 -
Tabela 4 – Participação percentual das categorias de produto
no faturamento global
Fonte: EFTA - 2007
Juntos, os associados de EFTA trabalharam em 2007 com quase
370 fornecedores e empregam o equivalente a 730 empregados em
tempo integral20. O quadro abaixo mostra o número de produtores
de alimentos e não-alimentos por continente.
20 Esta medida da equivalência em tempo integral inclui a soma de horas de trabalho de todos os empregados, mesmo os de tempo parcial.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
44
Produtores de alimentos e não-alimentos por continente
Continente Alimento Não-alimento Total
África 39 42 81
Ásia 25 91 116
América Latina 107 46 153
Vários 9 4 13
Total 180 183 363
Tabela 5 - Produtores por continente e tipo de produto
Fonte: EFTA 2007
O objetivo principal da EFTA é tornar os processos de importação
de produtos de Comércio Justo mais eficiente e efetivo.
Para isso, a EFTA facilita a rede de contato de seus membros e a
troca de informações sobre o Comércio Justo em vários países, além
de organizar encontros de vários segmentos especiais para trocar
experiências concretas. A troca de informações inclui assuntos
concretos sobre produtos, lançamentos, produtos que vendem
bem, produtos em dificuldades, etc., tendo desenvolvido várias
ferramentas de gestão para isso, tais como o EFTA information
sheet, o website interno para membros, uma ferramenta de
avaliação e um sistema de monitoramento.
Além dessas atividades de apoio direto ao trabalho de seus
membros, a EFTA é um dos principais atores na organização de
campanhas de conscientização e de discussão de temas nos setores
como arroz, café, cacau etc. e de ações concretas de lobby político.
Para tanto, foi instalado um escritório em Bruxelas com o mandato
específico de promover a defesa21 e lobby com os decisores políticos
e comerciais. Desde então este escritório se transformou no porta-
voz do Comércio Justo ante a União Europeia.
A EFTA também é responsável pela elaboração dos principais
estudos sobre o comércio justo na Europa.
Uma das iniciativas recentes mais importantes de um grupo de
membros da EFTA é o projeto Fair Trade Procura que tem as compras
21 Em inglês se usa o termo “advocacy” que tem seu conrrespondente português no verbo advogar, no sentido de advogar os interesses de alguém ou de alguma causa. A palavra advocacia, no entanto, poderia levar a uma interpretação errada neste contexto. Por isso, se optou pelo termo “defesa”.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
45
públicas na União Europeia como alvo de estudos aprofundados. O
objetivo do grupo de estudo é analisar a legislação e compartilhar o
aprendizado com os outros membros a fim de facilitar o acesso ao
mercado de compras públicas e, eventualmente, definir estratégias
e ações específicas e/ou conjuntas.
Em 2007 foi lançado o site www.fairtrade-advocacy.org para
apoiar as ações e compartilhar informações de forma mais efetiva
sobre esta linha de ação.
3.8.3. WFTO - World Fair Trade Organisation
A Organização Mundial de Comércio Justo é a herdeira da
antiga IFAT ( Associação Internacional de Comércio Justo), sendo
constituída em 2009. Ela se apresenta como segue: “A WFTO é a
entidade de representação global de mais de
350 organizações comprometidas com 100% Fair Trade. A WFTO
é a voz autêntica do Comércio Justo e a guardiã dos valores do
Comércio Justo.”
A organização está presente em 70 países de cinco regiões onde
atua por meio das respectivas redes regionais, a saber: África, Asia,
Europa, América do Sul, América do Norte e Pacífico, com um total
de 110 milhões de artesãos, agricultores, plantadores, produtores
e apoiadores (30 milhões são micro-produtores com suas famílias
e comunidades), compreendendo toda a cadeia, desde produtores
até os consumidores.
A rede internacional de associações de lojas de Comércio
Justo foi incorporada na WFTO e deixou de existir como entidade
independente.
De acordo com a WFTO, seus membros se diferenciam por se
comprometerem 100% com o Comércio Justo.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
46
Certificação
A WFTO está atualmente desenvolvendo o Sistema de
Gerenciamento de Comércio Justo Sustentável (Sustainable Fair
Trade Management System – SFTMS) para resolver um problema
antigo do Comércio Justo: a limitação da certificação a uma lista
restrita de produtos, principalmente commodities agrícolas,
deixando milhões de artesãos sem a possibilidade de comercializar
um produto reconhecido no mercado mundial. Outro desafio é que
os produtores certificados não podem comercializar seus produtos
em seus próprios países por falta de Iniciativas Nacionais.
O sistema de certificação da FLO não pode ser adaptado para
artesanato que é extremamente complexo para definir critérios, ser
avaliado e fiscalizado.
Os primeiros projetos pilotos estão sendo implementados desde
2007. Em 2009 foi certificada a primeira organização. Para saber
mais a respeito, consulte: www.wfto.com/sftms.
Diferentemente do selo da FLO, a logomarca da WFTO tem
por objetivo identificar as organizações, empresas e entidades,
que obedecem 100% aos princípios de Comércio Justo em suas
atividades.
Os 10 critérios que uma organização deve perseguir no seu dia-
a-dia compreendem:
1. Criar oportunidades para produtores economicamente em
desvantagem.
2. Manter transparência e responsabilidade.
3. Práticas de comércio justo e sustentáveis.
4. Pagar um preço justo.
5. Não permitir trabalho infantil ou forçado.
6. Não discriminar minorias, respeitar a igualdade de gêneros e
liberdade de associação.
Ilustração 14 Marca da Fair Trade
Federation
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
47
7. Manter um ambiente de trabalho são e seguro.
8. Apoiar a capacitação de produtores.
9. Promover o Comércio Justo.
10. Respeitar o meio ambiente22.
Desta forma, por exemplo, uma “world shop” que obedece a todos
os critérios, poderá usar este selo, enquanto um supermercado
que comercializa alguns produtos com o selo da FLO, mas fora
isso não obedece a outros critérios, não poderá ostentar este selo.
O objetivo é óbvio: facilitar a identificação para o consumidor e
exercer pressão em cima das empresas para se aproximarem cada
vez mais das exigências do Comércio Justo.
A WFTO promove em cooperação com todas as Iniciativas
Nacionais e outras entidades, entre outras ações, o dia mundial
de Comércio Justo, sempre no segundo domingo de maio, com
programações de ações de conscientização, envolvendo artistas
conhecidos e muita mídia. Mais informações podem ser encontradas
no site deste evento: www.worldfairtradeday10.org/
22 Detalhamentos no site da WFTO.23 “Pacific rim” significa literalmente “a borda do Pacífico” e se refere aos países mais desenvolvidos do outro lado do oceano, visto a partir dos EUA.
3.8.4. Fair Trade Federation
A Fair Trade Federation (FTF) foi fundada em 1994, com sede
em Washington, EUA, e abrange a região da América do Norte,
i.é. EUA e Canadá e o “pacific rim”23, i.é. o Japão, a Austrália e
a Nova Zelândia. A Fair TradeF não é a Iniciativa Nacional dos
EUA e do Canadá. É uma associação de atacadistas, varejistas e
produtores e reúne em torno de 300 membros. Como todas as
Ilustração 14 Campanha Fair Trade com artistas
Ilustração 14 Marca da Fair Trade
Federation
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
48
outras organizações também se dedica à troca de informações,
apoio, e organização de campanhas de conscientização etc., além
de encomendar estudos sobre o setor.
3.9. Outras organizações ligadas ao Comércio Justo
Além das organizações propriamente de Comércio Justo, há muitas outras com ligações com o setor, podendo ser divididas nas seguintes categorias:
Organizações que visam ajudar os produtores a alcançarem as exigências do mercado consumidor através de desenvolvimento, treinamento e formação técnica, serviços de consultoria etc. Eles podem ser parte de uma organização de Comércio Justo como a “Fair Trade Assistance” para a “Fair Trade Organisatie”, da Holanda, ou a Traidcraft Exchange para a Traidcraft plc no Reino Unido, ou ainda ser uma entidade completamente independente, como a “Fair Trade e.V.” para a Gepa na Alemanha.
Organizações financeiras que apoiam projetos de interesse social ou de meio ambiente, tais como “Shared Interest”24, através dos quais fundos de investidores éticos (“ethical investors”)25 são canalizados para organizações de Comércio Justo no Norte e no Sul a taxas melhores do que de mercado. Em 2007, a “shared interest” distribuiu 26,5 milhões de libras para 462 organizações. Outra financiadora é a Oikocredit26, antigamente EDCS, a “Ecumenical Development Co-operative Society”, que empresta dinheiro das igrejas europeias na forma de créditos para produtores em países do Sul.
ONGs, que direcionam algumas de suas atividades de conscientização para o consumo responsável ou trocas mais justas entre o Norte e o Sul. Muitas destas organizações estão tão próximas do Comércio Justo que resolveram se associar à WFTO.
No setor de produção de tapetes na Ásia, um setor muito propício ao trabalho infantil e condições insalubres, ainda há duas
organizações que cuidam da certificação de produtos feitos com
responsabilidade social: a “Rugmark” e a “Step”.
24 www.shared-interest.com 25 estidores éticos e solidários aplicam dinheiro em fundos que serão investidos em projetos deste setor.26 www.oikocredit.org
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
49
As fontes de informação indicadas no estudo “Fair Trade Facts
and Figures 2007) sobre seus parceiros foram:
o www.label-step.org LabelSTEP
o www.rugmark.org RugMark
o www.traidcraft.co.uk Traidcraft Exchange
o www.worldofgood.org World of Good
Development Org.
o www.aidtoartisans.org Aid to Artisans
o www.cleanclothes.org Clean Clothes Campaign
o www.fairtraderesource.org Fair Trade Resources
Network
o www.triodos.com Triodos Bank
o www.oikocredit.org Oikocredit
o www.shared-interest.com Shared Interest
4. O MERCADO MUNDIAL DE COMÉRCIO JUSTO
4.1. O crescimento do Comércio Justo
O Comércio Justo Internacional certificado27 continua crescendo.
Apesar da crise mundial em 2009 os produtos de Comércio Justo
certificados pela FLO alcançaram um crescimento de 15% em
relação ao ano anterior, medido pelo valor estimado de venda no
varejo, para atingir um total de 3,4 bilhões de euros.
Aproximadamente 27 mil produtos são comercializados com o
selo de Fair Trade em mais de 70 países. De acordo com estudos
recentes o reconhecimento do selo ultrapassa 80% em alguns países.
Em 2009 o número de organizações certificadas de produtores
chegou a 827, comparado com 508 em 2005.
27 O Comércio Justo não-certificado pela FLO compreende todo o artesanato e os produtos comercializados por importadores que não trabalham com o selo da FLO. Como os números referentes a estes setores não são levantados senão de forma parcial, não servem para comparações consistentes.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
50
As categorias que mais cresceram em 2009 foram ervas e
especiarias, com 266%, sucos de frutas, com 62%, e açúcar de cana,
com 57%. 4 categorias recuaram: frutas in natura e frutas secas,
ambas em 24%, bolas de esporte, em 16%, e algodão, em 15%.
O estudo “Fair Trade Facts and Figures 2007”, apesar de não
ser tão atual, oferece uma visão também do desenvolvimento em
outros setores.
Comércio Justo na Europa: 2000 - 2007
2001 2005 2007%
Mudança
Organizações de Importação 97 200 254 27
Pontos de venda
World Shops 2,740 2,854 3,191 12
Varejo 43,100 56,700 67,619 12
Funcionários remunerados (Equivalente a tempo Integral)
Organizações de Importação 746 851 1,301 53
Associações de World Shops 32 107 78 -27
World shops ND ND 588 ND
Organizações de certificação (FLO) 71 113 149 32
TOTAL 849 1,071 2,116 98
Faturamento, em 000€
Organizações de Importação 118,900 243,300 422,225 74
World Shops, valor de varejo líquido 41,600 103,100 132,463 28
Org. de certificação (FLO), valor de varejo líquido
208,900 597,000 1,553,600 160
Educação/RP/Marketing em 000€
Organizações de Importação 5,600 11,400 4,375 -62
Associações de World Shops 1,000 1,700 2,328 37
Organizações de certificação (FLO) 3,500 5,100 3,238 -37
Todas as World Shops, 000€
Todas as World Shops, 000€
Valor de Varejo Líquido, estimativa 92,000 120,000 178,000 48
Todos os Produtos do Comércio Justo, em 000€
Valor de Varejo Líquido, estimativa 260,000 660,000 1,699,000
Tabela 6 - Comércio Justo na Europa 2000 - 2007
Fonte: Fair Trade Facts & Figures 2007
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
51
4.2. Principais mercados
Os principais mercados mundiais, em termos de faturamento estimado de produtos certificados em valores de varejo, de acordo com o relatório anual da FLO de 2009, são o Reino Unido, com 897,3 milhões de euros, os EUA, com 851,4 milhões de euros, a França, com 287,7 milhões de euros, e a Alemanha, com 267,5. As maiores taxas de crescimento foram verificadas no Canadá, com 66%, na Austrália e Nova Zelândia, com 58%, e na Finlândia, com 60%.
Todos os países com Iniciativas nacionais registraram crescimento,
com uma média geral de 15%.
Valor de varejo estimado - EURO
Países 2008 2009 Taxa de Crescimento %
Austrália + Nova Zelândia 18,567,280 28,733,986 + 58
Áustria 65,200,000 72,000,000 + 10
Bélgica 45,780,141 56,431,496 + 23
Canadá 123,797,132 201,978,074 + 66
República Tcheca - 556,540 -
Dinamarca 51,220,106 54,436,609 + 6
Finlândia 54,445,645 86,865,284 + 60
FLO / Resto do Mundo 130,722 18,099,255 -
França 255,570,000 287,742,792 + 13
Alemanha 212,798,451 267,473,584 + 26
Irlanda 94,429,586 118,574,416 + 26
Itália 41,284,198 43,382,860 + 5
Japão 9,567,132 11,283,451 + 2
Letônia - 153,500 -
Lituânia - 315,380 -
Luxemburgo 4,249,301 5,327,122 + 25
Holanda 60,913,968 85,818,400 + 41
Noruega 30,961,160 34,689,522 + 19
África do Sul - 458,075 -
Suécia 72,830,302 82,662,331 + 25
Suíça 168,766,526 180,160,263 + 7
Reino Unido 880,620,304 897,315,061 + 14
Estados Unidos 757,753,382 851,403,590 + 7
TOTAL 2,954,368,443 3,394,187,360 + 15
Tabela 7 – Mercados em valor de varejo estimado
Fonte: FLO 2008-9
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
52
Outro indicador de crescimento é a penetração no mercado.
No Reino Unido, em 2008 70% dos lares compraram pelo menos
um produto de Comércio Justo, num aumento de 75% em relação
ao ano anterior (40%). Nos EUA, de acordo com o estudo da
Transfair/Globescan de 2009, 33% da população se consideram
consumidores éticos, e 19% adquiriram produtos de Fair Trade nos
últimos seis meses.
O próximoquadro apresentaa evolução do consumo per capita nos
países com Iniciativas Nacionais, com base nos dados de 2005/06
e 2007. Fica evidente a liderança da Suíça e do Reino Unido, sendo
que o primeiro mantém um nível altíssimo de consumo há vários
anos e o segundo paísconheceu um crescimento acelerado nos
anos estudados. Nos relatórios de 2010, referentes aos anos de
2009, a Suíça evoluiu pouco, de €21,06 em 2007 para €21,90 em
2009, praticamente estagnando neste patamar alto, enquanto o
Reino Unido continua com o crescimento forte, chegando a €14,40,
comparado com €11,57.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
53
0 5
2,74
10 15 20 25
Austrália & NZ
Total
Japão
Canadá
Europa
França
Itália
Espanha
Luxemburgo
Suíça
Áustria
Irlanda
Reino Unido
Bélgica
Holanda
Dinamarca
Alemanha
Noruega
Finlandia
Suécia
EUA
Consumo per cápita de produtosJusto por país - 2005/06/07
0,44
0,55
2,43
2,42
4,06
3,31
0,66
0,09
6,72
21,06
6,36
5,04
11,07
3,31
2,09
7,27
1,72
3,87
6,56
4,66
2007 200520062007
Fonte: Fairtrade Facts and Figures 2007
Gráfico 4- Consumo per capita
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
54
4.3. Gama de produtos
A gama de produtos que tem seus critérios de certificação
definidos e são certificados pela FLO aumenta continuamente. Hoje
ela compreende 20 categorias de produtos.
Tabela 8 – Produtos com critérios de certificação FLO
Vendas em volume por produto Fair Trade com selo
Produto Unidade Total 2009Taxa de
crescimento %
Flores e plantas 1,000 caules 335893 + 8
Bananas MT 311465 + 4
Açúcar (açúcar de cana) MT 89628 + 57
Café (torrado e instantâneo) MT 73781 + 12
Suco de frutas MT 45582 + 62
Algodão 1,000 itens 23346 - 15
Fruta Fresca MT 20091 - 24
Cacau (em amêndoas) MT 13898 + 35
Vinho 1,000 itens 11908 + 33
Chá MT 11524 + 1
Arroz MT 5052 + 8
Mel MT 2065 0
Nozes e sementes oleaginosas
MT 859 + 13
Ervas e especiarias MT 578 + 266
Quinoa MT 556 + 1
Frutas secas MT 541 - 24
Bolas de esporte 1,000 itens 118 - 16
Fonte: FLO Annual Report 2009-10
Além desses produtos principais, existem vários outros no mercado
que são comercializados sem o selo FLO, principalmente porque ainda
não há uma demanda grande o suficiente para justificar a elaboração
de critérios para a certificação comum a todos os países. Nestes
casos, as Iniciativas Nacionais, que compõem a FLO, desenvolvem
seus próprios critérios para os novos produtos e cuidam dos controles
até que os critérios sejam incorporados pela FLO. Entre estes há vários
alimentos menos comuns, tais como derivados de soja ou especiarias
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
55
da Ásia. Do Brasil, por exemplo, são derivados de soja orgânica, tais
como óleo e leite na Suíça ou guaraná em pó e em xarope para a Itália.
Porém, os principais produtos afetados pela falta de selo
de certificação são os não-alimentícios, tais como artesanato,
instrumentos musicais, brinquedos e confecção. Para estes haverá em
breve o sistema da WFTO, como foi apresentado no capítulo anterior.
A gama de produtos finais, processados, em versões puras, tais como
café ou chá, compostas ou misturadas, tais como chocolates, geleias,
biscoitos, barras ou misturas de cereais, a base de ingredientes de
Comércio Justo também está crescendo a cada dia. Só no Reino
Unido, o mercado com a maior penetração deste tipo de produto,
este número chega a 2.500 linhas de produtos, de acordo com a Fair
Trade Foundation28.
Além do mérito incontestável da FTFna prospecção dos licenciados,
esse número se explica em parte pelo fato de que, seguindo os
critérios definidos pela FLO, um produto alimentício que contém no
mínimo 20% de ingredientes certificados, já pode usar o selo e ser
comercializado com o selo Fair Trade.
Já existe uma discussão polêmica sobre esse percentual de 20%.
Muitos dos defensores querem exigir um percentual significativamente
mais alto, visando manter a pureza dos valores. Por outro lado, não há
como negar que esta medida permitiu a entrada de muitas empresas
com produtos mistos que de outra forma não poderiam viabilizar seus
projetos de trabalhar com ingredientes Fair Trade. Como para muitos
ingredientes ainda não há certificação, a gama ficaria muito limitada.
O resultado para os produtores também está sendo positivo graças
a um aumento significativo na demanda por certas categorias de
produtos, tais como cacão e açúcar mascavo.
Na verdade, com a demanda crescente por produtos socialmente
sustentáveis, a indústria alimentícia está até pressionando para baixar
este percentual. Esta discussão está em pleno andamento.
28 Dados de nov. 2006.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
56
No total, a FLO apresenta o número de 27.000 produtos diferentes
sendo comercializados no mercado global, levando em consideração
os diversos itens de produto de todas as marcas e empresas.
4.4. Um mercado de commodity
Apesar da preocupação com a melhor remuneração dos
produtores, o mercado de Comércio Justo continua a comprar,
com raras exceções, somente a matéria-prima para ser tratada,
processada, misturada ou simplesmente embalada nos países de
destino por empresas especializadas.
Portanto, boa parte do mercado de alimentos de Comércio Justo
continua sendo um mercado de matérias-primas e commodities.
Este aparente paradoxo se explica por vários motivos:
Por um lado, o consumidor, mesmo o consciente, ético e
responsável, não abre mão de suas exigências quanto à qualidade
e apresentação dos produtos;
Por outro lado, a competência industrial e de marketing somente
existe, com raríssimas exceções, nos países de destino, porque...
o ...nem as cooperativas ou outros grupos de produtores têm a
infraestrutura fabril para realizar os trabalhos necessários;
o ...na maioria das vezes, o próprio país de origem não tem a
infraestrutura de produção e de insumos e materiais à altura
da demanda;
o os produtores não conhecem o mercado de destino e
mesmo com apoio profissional teriam muitas dificuldades
para desenvolver os conceitos de marca, embalagem etc., e
acompanhar a evolução do mercado na velocidade necessária.
Os processos de otimização logística também devem ser
aplicados:
o o custo do frete precisa ser otimizado, por exemplo, no caso do
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
57
suco de laranja que usa a mesma tecnologia de concentração
e refrigeração para evitar de transportar água;
o a necessidade de entregar “just-in-time” nos supermercados
exige a estocagem em condições em que a matéria-prima
mantenha a qualidade e possa ser processada somente na
hora certa.
Existe uma crítica entre alguns setores do meio do Comércio
Justo quanto à dependência que se cria com isso para os produtores
que continuam sendo meros fornecedores de matéria-prima sem
controle sobre o negócio, reféns das certificadoras e donos das
marcas. Com o crescimento da demanda e a entrada de marcas
convencionais no segmento de Comércio Justo, esta preocupação
aumenta, visto que muitas destas empresas não se preocupam tanto
com o envolvimento com todo o processo, desde que consigam a
matéria-prima certificada na quantidade que lhes permite usar o
selo no produto final.
São principalmente as empresas que exclusivamente trabalham
com Comércio Justo que se preocupam em ampliar o envolvimento
e em deixar o máximo de benefícios com os produtores e no país
de origem, muito além das obrigações “contratuais” necessárias
para conseguir o selo. A “Ethiquable”, da França, chega a envasar
as geleias e no Peru, imprimindo lá também os rótulos e potes.
Outro exemplo famoso é o da Divine Chocolate do Reino Unido, que
tem a cooperativa de plantadores de cacau do Gana formalmente
como sócia na fábrica na Inglaterra.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
58
Tabela 9 - Vendas sem selo da FLO na Europa
Vendas sem selo na Europa - Em milhões de Euros
País OrganizaçãoTotal em
000€
% nãoalimen-
tício
Volume nãoalimentício
em m.€Obs
ÁustriaEine Welt Handel AG AustriaEZA Fairer Handel
3,84911,888
3529
13.4
1)
BélgicaFair Trade OriginalOXFAM Magasins du Monde
2,0375,308
5545.8
1.12.4
Dinamarca Fair Trade Danmark 550 85 0.5
Finlândia Tampereen Kehitysmaakauppa 448 25 0.1 1)
França
ALTER ECOArtisanat SelETHIQUABLESolidar’Monde
16,7002,50017,0008,645
550023
0.81.302
1)1)
Alemanha
CONTIGO Fair Trade Groupdwp eGEL PUENTE GmbHGEPA - The Fair Trade Company
2,5325,5005,80048,904
606
1.55.55.82.9
2)2)
Irlanda OXFAM Ireland (Ireland) 1,262 76 1
Itália
Commercio AlternativoCtm altromercatoEquo Mercato CooperativaLibero Mondo Scs. Arl.
7,83930,4491,2023,932
257033
7.830.40.81.3
1)2)
Holanda Fair Trade Original 18,29 24 4.4
Espanha
Alternativa 3 S. Coop.Equi MercadoIDEASIntermón Oxfam
3,735251
2,7217,504
3513648
1.301
3.6
SuéciaLa Maison Afrique ABThe House of Fair Trade
88648
10060
0.10.4
Suíça
Caritas Fair Tradeclaro fair trade plcFairtrade Villagegebana Ag
2,20614,785
383,700
747.11005
1.610
0.2
Reino Unido
Bishopston Trading CompanyFair Deal Trading PartnershipPachacutiShared EarthTearcraftTraidcraft PlcZaytoun Ltd.
1,265469345
3,9241,63424,642
484
100.0100.0100.099.0100.014.05.0
1.30.50.33.91.63.40.0
TOTAL Vendas sem selo na Europa 94.5
1. O autor estima o mínimo conforme a variedade de produtos da companhia.
2. Os volumes de negócios da dwp e EL PUENTE da Alemanha e Ctm altromercato são 100% não certificado Fonte: Fair Trade 2007: new facts and figures from an ongoing success story
4.5. Produtos não certificados
Ilustração 16Suco de laranja da marca própria da Auchan na França
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
59
Apesar de os números aparentemente não serem tão significativos
diante da grande expansão do Comércio Justo no mundo, o Comércio
Justo sem o selo da FLO não é mais simplesmente um segmento
à margem processo ou uma lista de produtos cujos critérios para
a certificação ainda não foram definidos. Há várias questões em
andamento que merecem uma atenção especial.
Várias organizações tradicionais de Comércio Justo, incluindo
importadores, redes de world shops e marcas, discordam da política
e de algumas práticas da FLO. Primeiro questionam a aceitação
de grandes empresas convencionais para concorrerem com as
pequenas empresas especializadas em Comércio Justo. Também
não concordam com a certificação de grandes produtores rurais.
Além desses pontos questionam o aumento dos custos das
certificações que pequenos produtores que iniciam suas atividades
com o Comércio Justo não conseguem arcar. Este problema
agravou-se com a separação da FLO-Cert, a estrutura que realiza
as auditorias, tornando-se uma empresa que obedece a regras de
sustentabilidade econômico-financeira.
Ao mesmo tempo, a regra que permite que marcas convencionais
usem o selo da FLO com produtos que contém no mínimo 20%
de ingredientes de Fair Trade abriu este segmento para muitas
empresas. Se, por um lado, isto é positivo para alguns fornecedores
já estabelecidos de Comércio Justo, esta nova concorrência, que
por se tratar, em boa parte, de empresas de porte maior que
conseguem preços ao consumidor mais competivos, por outro lado
ameaça a viabilidade econômica de estruturas especializadas em
Comércio Justo, porém muito menores.
De acordo com o diretor da “Ethiquable”, marca francesa
tradicional de “Commerce equitable”, esta concorrência ameaça o
equilíbrio da cadeia do Comércio Justo em vários aspectos: primeiro
o mais óbvio – uma grande rede de supermercado como a “Auchan”
na França pode praticar um preço até 25% mais barato com sua Ilustração 16Suco de laranja da marca própria da Auchan na França
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
60
marca própria em linhas de produtos com grande volume, tais como
sucos de laranja, chocolate ou café, usando o mesmo selo.
Segundo, os importadores convencionais da indústria alimentícia,
com raras exceções, não se engajam no apoio aos produtores com o
mesmo entusiasmo que os importadores especializados em Comércio
Justo. Eles querem grupos produtores prontos para fornecer o produto,
mas não se interessam em desenvolver grupos novos.
Terceiro, com as margens mais apertadas, os importadores/de
marcas de Comércio Justo dispõem de menos recursos para apoiar
novos grupos.
Apesar da FLO ser composta também por duas redes de
produtores, esta não parece se preocupar com esta situação, de
acordo com algumas fontes do setor. Aliás, aparentemente alguns
setores da indústria alimentícia estariam pressionando para baixar
ainda mais o percentual de 20% para 5%.
Ao mesmo tempo surgem outras certificações, normalmente
ligadas ao setor de produtos orgânicos ou florestais, que incorporam
critérios sociais e se apresentam como similares. O consumidor
final menos informado sobre as sutilezas deste segmento não tem
como saber a diferença.
Uma outra acusação comum é que a FLO demora muito para
aprovar novos produtos para serem lançados no varejo e ainda mais
para desenvolver critérios para novas linhas de produtos, tempo
este que, obviamente, faz mais falta aos pequenos negócios.
Diante deste quadro de combinação de fatores, várias das mais
tradicionais organizações de Fair Trade deixaram parcial ou até
completamente de trabalhar com o selo da FLO, confiando de que
seu público é fiel a sua marca e confia na aplicação dos critérios.
Da tabela acima pode-se extrair que a importadora e rede lojas
“El Puente”, da Alemanha, e a importadora CTM altromercato, da
Itália, trabalham 100% sem o selo da FLO.
Ilustração 18Selo da Ecocert
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
61
A Ethiquable está analisando a possibilidade de trocar o selo da
FLO pelo da ECOCERT (ESR – Equitativa, Solidária e Responsável).
A Oxfam é outro exemplo dos que trabalham apenas parcialmente
com a FLO.
Na França estima-se que apenas 50% do Commerce
Equitable tem o selo da FLO.
4.6. Artesanato e outros produtos não-alimentícios
Como não há nenhum órgão que controla ou acompanha este
segmento, não existem dados internacionais específicos sobre a
movimentação do artesanato de Comércio Justo.
De forma indireta pode se chegar a um dado do volume de negócios
dos membros da EFTA na categoria de artesanato. Em seu relatório
de 2007, a média de produtos artesanais comercializada por seus
membros foi de 22,8% em comparação com 20,7% em 2005.
Numa pesquisa realizada pela CBI29 sobre importações de
artesanato de países em desenvolvimentos para a Europa em
2001, o percentual das vendas de artesanato nas “world shops”
tradicionais teria sido de 55%. Este valor ainda é usado amplamente
no meio do Fair Trade na Europa.
O principal desafio do setor nos últimos anos tem sido a estagnação
e, em alguns casos, diminuição das vendas de artesanato. Através
de informações de algumas Iniciativas Nacionais e de especialistas
do setor de artesanato e decoração pôde ser deduzido que este
segmento chegou a um limite de mercado da forma como é
trabalhado atualmente, ou seja, com produção espontânea, sem
desenvolvimento direcionado, e limitado ao público cativo das
“world shops”.
Esta situação está sendo revertida graças ao investimento na
profissionalização e na inovação de design.
Ilustração 18Selo da Ecocert
29 CBI – Centre for imports from developing countries – www.cbi.nl
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
62
“Existem grandes oportunidades,
mas para ter sucesso precisa ser profissional.”
Esta frase de Nicky Robinson, a responsável pelo setor de
produtos não-alimentares da Traidcraft, do Reino Unido, membros
da EFTA e uma das mais antigas e dinâmicas importadoras no
setor, reflete bem a situação atual do setor.
Os dados levantados, tanto dos relatórios das entidades e
organizações de Comércio Justo quanto das entrevistas com
especialistas, apontaram um crescimento de demanda, revertendo
a tendência de alguns anos atrás, quando imperava uma estagnação
neste segmento.
No entanto, vale a ressalva de que cada país tem perfil e
performance própria e que podem variar muito. Tanto o tamanho
do crescimento quanto a origem e a maneira como ele se dá são
o resultado do contexto cultural geral, incluindo aí os hábitos de
consumo da população, mas também da maneira como o movimento
de Comércio Justo evoluiu, como os cidadãos se engajam neste
movimento, etc.
Na França, de acordo com um estudo do Ministério de Assuntos
Estrangeiros e Europeus daquele país, o segmento não-alimentar
cresceu 256% entre os anos 2004 e 2007, superando até o
crescimento do setor de alimentos, que cresceu somente 134% no
mesmo período.
Vendas de produtos alimentares e não-alimentares no Comércio Justo
Categorias2007 2004 Variação
% Euros % Euros %
Produtos alimentares 74 178.651.315 83 76.234.000 134
Produtos não alimentares 26 62.697.988 17 17.617.000 256
Tabela 10 - Vendas de Produtos alimentares e não alimentares
no Comércio Justo na França
Fonte: “Le commerce équitable en France en 2007”
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
63
Na análise de cada linha de produtos da categoria de não-
alimentares na saída dos distribuidores, o sub-segmento de
artesanato surpreende com um crescimento de 1.800% de 2004
para 2007. Este crescimento é puxado pelas mercadorias de couro,
com 7.497% de aumento, seguido por decoração e mobiliário, com
1.643%, e bijuteria, com 726%.
Valor dos produtos não-alimentares do Comércio Justo nos distribuidores em mil €
Linhas de produtos 2007
Têxtil 16.708 1.977 +745
Turismo 12.460 887 +1.305
Bijuteria 975 118 +726
Decoração e mobiliário 3.695 212 +1.643
Mercadorias de couro 2.279 30 +7.497
Sub-total Artesanato 6.949 360 +1.800
Cosméticos 5.311 NC
Outros* 266 7.080 -96
Total 41.694 10.664 +290
* Rosas, brinquedos
Fonte: “Le commerce équitable en France en 2007”
Tabela 11 - Valor dos produtos não-alimentares do Comércio
Justo nos distribuidores na França
No Reino Unido, a Traidcraft, importadora distribuidora de Comércio
Justo, mencionada anteriormente, originalmente especializada em
artesanato, hoje também trabalha com alimentos, registra também
uma tendência positiva constante, com um crescimento de 35% ao
ano nos últimos 5 anos30 no segmento de não-alimentos.
No entanto, o crescimento é bastante diferente dependendo
dos sub-segmentos. O maior crescimento foi registrado no sub-
segmento de não-alimentos, com aumento de 74% entre 2007
e 2008. Por outro lado, roupas, produzidas artesanalmente em
pequena escala registraram uma queda, devido, principalmente
à expansão dos produtos à base de algodão certificado pela FLO
e a dificuldade de competir com os preços destas produções
de larga escala. Joias e bijuterias estiveram em alta bem como
30 Dados até 2008.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
64
um novo lançamento da empresa, o papel feito artesanalmente,
principalmente para cartões de presentes e ocasiões festivas.
Num estudo encomendado pela Associação Holandesa de Lojas
de Comércio Justo, DAWS – Dutch Association of Worldshops, sobre
o Comércio Justo no mundo em 2007, a tendência de crescimento
da categoria de não-alimentos, é estimada em torno de 7,5%.
No entanto, ao mesmo tempo, o estudo reconhece que os dados
somente se referem aos principais importadores dos mercados mais
maduros, mas que o principal potencial de crescimento está nas novas
e pequenas organizações e nos países consumidores mais novos.
A profissionalização do setor
A principal mudança nos últimos anos, com o maior impacto no
segmento de artesanato, foi a profissionalização das organizações
de Comércio Justo no cenário internacional. Sem perder de vista
que os principais beneficiados são os produtores nos países
menos desenvolvidos, eles se deram conta de que, para atuar
com sustentabilidade econômica é imprescindível ter produtos
adequados às tendências gerais dos mercados e estruturas e
cadeias de fornecimento eficientes.
A boa vontade com os produtores não significa ser leniente com
falta de compromisso e desperdícios de tempo e recursos. Ao
mesmo tempo ficou reforçada a posição clara de que o Comércio
Justo também deve educar os beneficiados para a maturidade tanto
individual/pessoal quanto organizacional e empresarial.
Por exemplo, a mesma Traidcraft citada anteriormente também
deixou clara uma posição idêntica a importadores ou compradores
convencionais: “Nós temos recursos limitados, tanto humanos
quanto financeiros, se eu tiver de escolher entre um fornecedor
que, mesmo depois de um certo tempo, continua a me dar muita
dor de cabeça e um outro que me atende sem maiores percalços,
sou obrigado a ficar com o último.”
Ilustração 19Marca da Fair Support
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
65
Por outro lado, as organizações nos países consumidores
também fizeram um mea culpa e verificaram que eles precisavam se
profissionalizar e, se quiserem atingir os mercados convencionais,
direcionar suas atividades com base em pesquisas de mercado e
investimentos em desenvolvimento de produtos, entre outros. Neste
contexto tem que se levar em consideração que, principalmente
as lojas de Comércio Justo, mas também bastante importadores
trabalham com voluntários, cuja bagagem raramente é de negócios
ou administração de empresas.
Orientado para o mercado - apoio para o desenvolvimento de
produtos
Aquelas organizações que registram resultados positivos começaram
já há alguns anos a atuarem como empresas profissionais, similares
ao setor de moda, investindo em pesquisas de tendências, setores de
desenvolvimento de produtos e o direcionamento totalmente orientado
da produção de seus fornecedores em função disso.
O melhor exemplo disso é a Fair Support da Holanda, 2007
pela Associação de Lojas de Mundo e pela Fair Trade Organitië,
a pioneira e mais antiga organização e loja de Comércio Justo da
Holanda, que hoje atua somente como importadora/distribuidora.
O principal objetivo da organização é dar apoio técnico às lojas
associadas à DAWS e aos importadores de artesanato de
Comércio Justo. Os princípios que norteiam a organização são:
Market oriented - orientada ao/pelo mercado Responsabilidade
Social Corporativa
People product – produtos de pessoas para pessoas
Seu trabalho consiste em estudar as tendências de mercado,
o comportamento dos consumidores, aproveitando também a
Ilustração 19Marca da Fair Support
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
66
experiência dos importadores e lojistas para desenvolver estratégias
que incrementem as vendas de toda a cadeia. Isto vai desde linhas
de produtos até o lay-out e a arrumação das lojas.
Uma das principais iniciativas é o programa Fair Trade design
que leva todo o conhecimento do mercado aos produtores para
desenvolver linhas de produtos em conjunto, respeitando o
diferencial cultural local e a capacidade de produção.
Eles desenvolvem um catálogo com todas as tendências para os
setores tão diversos quanto os de decoração, cama, mesa, banho,
utensílios domésticos, bijuteria e acessórios de moda, entre outros,
com as cores, materiais e tipos de estampas, incluindo sugestões
de tipos de produtos. Veja os exemplos a seguir para a temporada
de outono/inverno 2010/11:
Ilustração 20O Catálogo da Fair Support
O catálogo com as tendências de cores da temporada.
A Fair Support pode também ser contratada pelos importadores
para trabalharem diretamente com seus grupos de produtores no
desenvolvimento de uma linha de produtos específica. Neste sentido
é muito importante levar em consideração as épocas de festas, tais
como natal, páscoa, dia dos namorados, e desenvolver produtos
com antecipação. O planejamento para isso deve começar com 10
a 12 meses de antecedência para que o produto esteja na central
de distribuição entre 3 a 5 meses antes da data para que os lojistas
possam se abastecer em tempo.
Ilustração 21Imagens da
bonequinha da sorte no armazém da
Barbosa do Brasil dentro do Centrum
Mundiaal.
Ilustração 22Loja de Comércio Justo
na Holanda
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
67
Ilustração 20O Catálogo da Fair Support
Um dos produtos de maior sucesso são as bonequinhas da sorte
produzidas no Brasil nas mais variadas versões:
Ilustração 21Imagens da
bonequinha da sorte no armazém da
Barbosa do Brasil dentro do Centrum
Mundiaal.
Novo conceito de lojas
A estagnação das vendas nas lojas de Comércio Justo e a
dificuldade de atingir um público mais amplo, além dos socialmente
engajados e simpatizantes, levou também a um questionamento
do conceito de loja como um todo. A experiência de quebra de
paradigma mais radical neste sentido foi da DAWS, a Associação de
Lojas de Comércio Justo, na
Holanda, que encomendou o desenvolvimento de um conceito
de “gift shop”, loja de presentes, com sugestões de layout, cores
diferentes para identificar as diversas categorias de produtos,
chegando a um sistema totalmente estruturado de franquias para
novos empreendedores.Ilustração 22
Loja de Comércio Justo na Holanda
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
68
Os resultados são muito positivos, uma nova loja deste tipo
foi recentemente premiada como a melhor loja de presentes da
Holanda.Ilustração 23
Interior da loja
Profissionalização dos serviços
Os serviços neste segmento são todas as atividades não
diretamente ligadas aos produtos, mas que são fundamentais
para o sucesso do negócio no longo prazo, ou seja, para a sua
sustentabilidade econômica. Isto vai desde a flexibilidade e
capacidade de se adaptar às orientações para a produção, passando
pelo respeito aos prazos e às quantidades e especificações
combinados até à garantia de troca e devolução. Na verdade, o que
acontece é que as importadoras, em relação a estes aspectos de
serviços, nada mais fazem do que repassar as exigências com as
quais são confrontadas no mercado na hora de atender o varejo.
Como são de Comércio Justo, eles podem compensar as limitações
dos grupos produtores até certo ponto. Mas também para eles vale
cada vez mais a regra: quanto menos dor de cabeça se tem com
um fornecedor, melhor para ambos e mais se pode confiar nele,
encaminhando maiores demandas.
E o inverso também é verdadeiro. O melhor exemplo disso é o
que aconteceu a uma das principais importadoras de artesanatos
do Brasil, com dois grupos brasileiros cujos produtos chegaram
com um índice de 50% e 100%! De quebra no destino, por falta
de embalagem adequada para o transporte internacional. Um
ano depois o caso ainda não foi resolvido, ou seja, os produtores
Ilustração 24Imagem de campanha
de moda ética no Reino Unido
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
69
não substituíram a mercadoria e a importadora, que tinha pago
antecipadamente, ficou com o prejuízo.
O desafio da logística
Uma dos grandes entraves para a exportação, de acordo com os
especialistas locais, é o volume pequeno da produção local, que
não consegue reunir produto suficiente em termos de quantidade
para viabilizar o transporte internacional.
Por este motivo, a Ética, trading especializada em Comércio
Justo, teve que criar uma espécie centro de recepção, controle de
qualidade, consolidação de carga e expedição. Artesãos individuais
ou mesmo grupos sem a infraestrutura de uma associação de maior
porte terão muita dificuldade para alcançar o mercado internacional
com sustentabilidade sem o apoio de uma organização que cuida
desta parte, porque os importadores, por mais que se interessam
em apoiar os produtores, não têm como realizar este trabalho no
território brasileiro.
4.7. Moda ética
A indústria por trás do glamour da moda é um dos setores
que mais prejudicam o meio ambiente e exploram trabalhadores
marginalizados. As plantações de grande porte de algodão são,
comprovadamente, as maiores poluidoras dos campos e lençóis
freáticos do mundo, através da aplicação intensiva de inseticidas e
adubos químicos.
Os abusos de empresas da ethical fashion show produtiva dos
setores de vestuário e calçados já provocaram muitos escândalos
na mídia mundial, sendo identificados, entre outros, pelo termo
“sweat shop”, pequenas fábricas sem as mínimas condições de
trabalho, segurança ou saúde para os trabalhadores, sem falar da
remuneração indigna.
Ilustração 24Imagem de campanha
de moda ética no Reino Unido
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
70
Nos últimos anos, com a evolução dos canais de comercialização
no Comércio Justo internacional, junto com o aumento substancial
de pessoas conscientizadas em todos os setores da sociedade e
economia, o mundo da moda também começa a se engajar na
busca por soluções social e ambientalmente sustentáveis ao longo
de sua cadeia de fornecimento.
A iniciativa de maior visibilidade neste nicho é o ethical fashion
show31 organizado na França desde 2004. O movimento atraiu
tanta atenção que uma das maiores empresas de feiras do mundo,
a Messe Frankfurt, se associou ao grupo e, em 2009, promoveu o
evento, além de Paris, também em Nova York e Milão. Desde 2006
o algodão pode ser certificado pela FLO, o que impulsionou todo
um segmento de moda ética.
Na edição de 2006, a marca brasileira Tudo Bom?, desenvolvida
em parceria com a ONG francesa Alter Eco, ganhou o prêmio na
categoria “Empreendendo a moda com La Redoute”32. Com isso,
a marca ganhou também o direito de ter seus produtos vendidos,
a partir de julho de 2007, aos 13 milhões de clientes desta maior
empresa de venda por catálogo da França.
Para garantir a qualidade socioambiental dos produtos no evento
os organizadores definiram vários critérios a serem seguidos pelos
estilistas. Eles devem se empenhar em criar produtos:
Que podem ser produzidos em condições de respeito ao
homem: respeito à leis internacionais de trabalho; contribuição ao
desenvolvimento das comunidades duráveis; respeito à propriedade
intelectual. que minimizam o impacto ambiental das cadeias
produtivas, desde a criação, passando pela produção, a entrega,
até o fim de vida útil do produto: privilegiar matérias-primas e
substâncias que provocam um impacto mínimo no meio ambiente
que garantem a perpetuação dos conhecimentos locais:
cooperação com os artesãos locais;
criação ética que permite a leitura das origens;
Ilustração 25 Logomarcada ethical fashion show
Ilustração 26Cartaz do evento em 2007
31 www.ethicalfashionshow.com 32 Veja mais no capítulo sobre o mercado brasileiro.
Ilustração 27Bracelete em madeira (rosewood) sustentável do Vietnam
Ilustração 28Capa do catálogo
Ilustração 29Logomarca da
People Tree
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
71
Ilustração 25 Logomarcada ethical fashion show
Ilustração 26Cartaz do evento em 2007
Ilustração 27Bracelete em madeira (rosewood) sustentável do Vietnam
a perpetuação e proteção do “saber fazer” específico através de
investimentos
O Reino Unido é outro país que avança fortemente neste nicho.
Tendo investido por vários anos no processo de desenvolver critérios
para a certificação de algodão de Comércio Justo junto com a FLO,
o Reino Unido tem hoje as primeiras marcas que lançam vestuário
certificado, como a Marks & Spencer. Como também na França, já
se tem inclusive várias lojas especializadas em moda ética e justa.
Junto com o vestuário cresce todo mercado ligado à moda:
calçados, joalheria, bijuteria e acessórios.
No Reino Unido as vendas de algodão certificado como Comércio
Justo subiu de 533 mil unidades em 2006 para impressionantes
19,84 milhões unidades de em 2008.
Ilustração 28Capa do catálogo
Ilustração 29Logomarca da
People TreeUma das organizações pioneiras dedicadas à moda ética na
Inglaterra é a People Tree33, que já mantém várias lojas próprias e
venda pela internet.
Artistas famosos se engajam no tema, como a atriz Emma
Watson, da série Harry Potter.
Ilustração 30Capa do catálogo da linha Emma Watson da People Tree
33 www.peopletree.co.uk
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
72
4.8. Comércio Justo no Turismo
Em 1999, a ONG britânica “Tourism Concern”34 criou a Rede
Internacional do Comércio Justo no Turismo, como um projeto a ser
desenvolvido em 3 anos, com financiamento da Comissão Europeia.
Através da rede, que inclui mais de 150 organizações, tais como
empresas turísticas, ONG´s, universidades, etc. têm sido analisados
os negócios da indústria turística em comunidades dos países em
desenvolvimento.
Pressupostos da rede:
O Comércio Justo no Turismo é um aspecto-chave do turismo
sustentável. Seus objetivos são:
maximizar os lucros provenientes do turismo para os envolvidos
nos locais de destino, através de benefícios mútuos e parcerias
de igualdade entre as organizações nacionais e internacionais nos
destinos turísticos;
apoiar os direitos das comunidades locais, envolvidas ou não
no turismo, no que diz respeito à participação em condições de
igualdade nas parcerias, tornando-as beneficiárias do processo de
desenvolvimento turístico.
Beneficiários:
São priorizados os grupos e partes da comunidade receptiva dos
países de destino que estejam:
ocialmente e/ou economicamente em desvantagem ou são/
foram discriminadas, particularmente no que se refere ao
desenvolvimento já existente ou em fase de planejamento;
envolvidos em iniciativas emergentes de turismo;
aptos a trabalharem com o mercado nacional e internacional,
carecendo de apoio técnico e organizacional;
34 www.tourismconcern.org.uk
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
73
empregados em sectores formais e/ou informais do turismo
que não tenham tido voz nas decisões prévias do processo de
implantação do turismo;
O Comércio Justo no turismo pode ser concebido como:
um processo de desenvolvimento integrado no local de destino,
considerando-se a construção das parcerias dos sectores público,
privado e sociedade civil;
Código corporativo de conduta ética;
Um produto de Comércio Justo, controlado e certificado.
Implementação
O Comércio Justo no turismo deve atuar em cinco áreas onde as
mudanças são necessárias, no sentido da construção da equidade,
a saber:
1. Acordos de comércio Internacional;
2. Indústria Turística (corporações transnacionais e investidores
independentes);
3. Investidores nas comunidades de destino;
4. Comportamento do consumidor;
5. Políticas dos governos dos locais de destino.
Devido a diversidade de circunstâncias e a complexidade do
sistema de turismo dos locais de destino, não deve haver um
modelo único de implantação. Uma linha geral pode ser criada
para, adaptada às exigências do local, servir de orientação aos
diferentes segmentos da indústria turística.
Um dos objetivos, no caso do “Comércio Justo” no turismo,
é também criar uma marca que ainda não existe, assim como
“Férias de Comércio Justo” ou “Operadores de Comércio Justo”
certificados.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
74
Um controle e verificação do processo tem que ser implantados
antes de a marca existir.
Na ausência de uma marca, neste momento, o Comércio Justo
no Turismo deve ser considerado como um processo multifacetado,
em direção a uma mudança global, em favor de uma política de
comércio turístico mais equitativa. Normalmente, as empresas que
participam da rede se identificam pela marca da WFTO.
Uma das regiões que passou na frente e criou sua própria marca
foi a África do Sul. Em 2009, eles iniciaram um projeto piloto, com
apoio de organizações alemãs e suíças, para testar a certificação
de pacotes turísticos com os critérios do Fair Trade.
Enquanto isso, a “tourism concern” oferece a segunda edição
do guia de viagens ético, ou “ethical travel guide”, e uma lista de
operadores que fazem parte de sua rede.
Ilustração 31Fair Trade in Tourism África do Sul
Ilustração 32Capa do Ethical travel guide
Ilustração 33
Exemplo de marca de operadora de turismo ético
De acordo com o relatório de consumo ético de 200535, o turismo
responsável, que considera exatamente este impacto no meio
ambiente e social, teria movimentado £112 milhões em 2004,
um aumento de 22%, enquanto as visitas para atrações turísticas
ambientais se mantiveram praticamente estáveis, em torno de £20
milhões. Em torno de 90% do público do Reino Unido acredita que
operadoras turísticas devem assumir uma responsabilidade para
preservar o meio ambiente local e beneficiar as comunidades locais,
e 80% afirmam que eles estariam mais inclinados a comprar uma
viagem com uma companhia que observa estes princípios.
35 “ethical consumerism report”
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
75
Ilustração 31Fair Trade in Tourism África do Sul
Ilustração 32Capa do Ethical travel guide
4.9. Parceiros comerciais do Comércio Justo
O Comércio Justo internacional já ultrapassou o estágio de um
nicho curioso para ser considerado um segmento consistente que
veio para ficar. Suas taxas de crescimento atraíram e continuam a
atrair a atenção de muitas empresas convencionais, reconhecendo
que existe um segmento de consumidores que não se pode
negligenciar.
4.9.1. Supermercados e varejo convencional
O grande crescimento do Comércio Justo de alimentos
se deu com a abertura das redes de supermercados para os
produtos certificados. Este dado é comprovado pelas estatísticas
que evidenciam que, nos países de maior penetração no varejo
convencional, as taxas de crescimento, o faturamento e/ou a
participação no mercado global, como é o caso do Reino Unido,
da Suíça e, mais recentemente, da França, são maiores do que
naqueles países onde o Comércio Justo repousa principalmente
nas world shops.
É importante anotar que no início a maior receptividade nos
supermercados era das redes com origens em cooperativas,
tais como as Co-op na Suíça e no Reino Unido. O sucesso dos
produtos Comércio Justo nestas redes estimularam a entrada dos
concorrentes convencionais.
Hoje, na maioria dos países europeus as grandes redes de
supermercados oferecem produtos de Comércio Justo. De acordo
com estimativas da DAWS, este segmento conta com mais de
120.000 pontos de venda oferecendo produtos de Comércio Justo.
Marcas próprias
O reconhecimento do potencial do Comércio Justo chegou a levar
algumas das grandes redes de varejo a incorporar vários itens em
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
76
suas linhas de marcas próprias, principalmente os itens de maior
giro, tais como sucos de laranja, café, chá e chocolate. Um bom
exemplo são as redes Marks & Spencer e Sainsbury, na Inglaterra,
e Co-op e Migros, na Suíça, ou a Auchan, na França.
Alguns varejistas abraçam a causa com tanto entusiasmo
que oferecem alguns produtos 100% Fair Trade. As redes de
supermercados Waitrose e Sainsbury do Reino Unido e o grupo
Co-op da Suíça, por exemplo, oferecem as bananas com 100% de
Comércio Justo.
Algumas redes de cafeterias, como a AMT e a Camden food
Co., ambas no Reino Unido também já adotaram 100% café de
Comércio Justo.
4.9.2. Licenciados
O número de licenciados aumentou significativamente em
todos os mercados. O seguinte gráfico, baseado em dados de
2007, mostra a distribuição das empresas que têm produtos com
ingredientes de Comércio Justo no mercado, num total de 1954.
Ilustração 34Loja da Camden food co.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
77
Ilustração 34Loja da Camden food co.
0 100
31
40
33
75
252
47
57
65
21
158
185
615
91
200 300 400 500 600 700
Austrália & NZ
França
Espanha
Suíça
Irlanda
Bélgica
Dinamarca
Noruega
Suécia
EUA
Licenciados por país
26
45
47
44
100
22
Fonte: Fairtrade facts and figures 2007
Gráfico 5 -Licenciados por país
Além das empresas especializadas em produtos de Comércio
Justo, cada vez mais marcas especialistas de categoria incluem
um ou mais itens de Comércio Justo em suas linhas. Inicialmente,
eram as marcas de café e chocolate, além de sucos de frutas,
principalmente laranja. Hoje muitos segmentos já estão presentes
e a abrangência está crescendo a cada dia, entre outros biscoitos,
bebidas, sorvetes. O segmento de especiarias recebeu uma atenção
especial recentemente e está crescendo muito (266% em 2009).
O trabalho de prospecção ativa das Iniciativas Nacionais e
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
78
traders especializados já obteve grandes conquistas em termos
de abertura de mercado junto aos maiores compradores de café
do mundo. Por exemplo, a Starbucks norte-americana, a Nestlé, a
Cadbury chocolates, abrindo mercados consideráveis.
Alguns setores do meio de Comércio Justo consideram essas
aberturas questionáveis e um abandono dos princípios de não-
comungar com multinacionais que, em algum momento ou setor da
empresa, desrespeitam os princípios do comércio ético e, através de
algumas ações isoladas, querem melhorar suas imagens ante o público.
Os defensores desta abertura, no entanto, a defendem argumentando
que mais produtores são beneficiados com o grande volume comprado.
4.9.3. Traders, importadores e distribuidores
A função de integração da cadeia de fornecimento entre
produtores e varejo é crucial para o sucesso do Comércio Justo. Sem o
trabalho dos traders, importadores e distribuidores especializados,
tais como AgroFair, da Holanda, Alter Eco, da França, Café Direct,
Twin Trade e Day Chocolate Company, do Reino Unido, os produtos
não chegariam às prateleiras do grande público.
Em termos de estrutura existem desde organizações muito
pequenas, geridas por apenas duas pessoas, até as maiores
importadoras de Comércio Justo no mundo, como a Gepa da
Alemanha, e a Ctm Altromercato, da Itália.
Ilustração 35Sede da Gepa na Alemanha
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
79
Ilustração 35Sede da Gepa na Alemanha
De acordo com o estudo da DAWS, de 2007, o número de
importadores atuando no Comércio Justo cresceu de 97, em 2001,
para 200, em 2005, e em 2007 era 254..
A quantidade de funcionários remunerados evoluiu no mesmo
período de 743, em 2001, para 1.301, em 2007.
A distribuição do faturamento das organizações de importação
especializadas em Comércio Justo se apresenta da seguinte forma
(em mil EURO):
2.430
300
65.686
249
80.389
26.099
98.211
1.262
15.737
20.729
14.211
50.404
46.067
11.704
50.982
9.431
5.467
20.000 40.000 60.000 80.000 100.000 120.000
Austrália & NZ
Japão
Canadá
França
Itália
Espanha
Suíça
Áustria
Irlanda
Reino Unido
Bélgica
Holanda
Alemanha
Noruega
Finlandia
Suécia
EUA
Faturamento das importadoras por país1.000€
Fonte: Fairtrade facts and figures 2007
Gráfico 6 -Faturamento das importadoras por país
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
80
4.10. Continua aumentando o reconhecimento do “Fair Trade”
pelo consumidor
Várias fontes apontam para a mesma tendência: o reconhecimento
espontâneo da marca continua a crescer.
No Reino Unido, a Fair Trade Foundation divulgou em seu relatório
sobre o ano 2009 o número de 7 em cada 10 consumidores que
reconhecem o selo, liderando o mercado europeu, que é o mais
maduro no mundo. Nos EUA, onde o Comércio Justo tem uma
história mais recente, o “trends report 2009” revela que 71,4% dos
consumidores já ouviram o termo Fair Trade.
4.11. Heterogeneidade dos mercados
Em função de muitas variáveis, os perfis dos mercados são
muito diferentes e não se pode necessariamente tirar conclusões
de um país e aplicá-las a outro. Fatores como o contexto geral da
cultura e da economia, o histórico de iniciativas no Comércio Justo
no país, a própria história do país e eventuais ligações com países
em desenvolvimento, tais como ex-colônias ou territórios ultramar,
a estrutura do comércio, momentos econômicos diferentes,
disponibilidade de apoios financeiros, tradição de cooperativismo,
entre outros, influenciam fortemente a postura das pessoas, tanto
como atores da sociedade civil organizada quanto em seu papel de
consumidores. O tamanho e a velocidade do crescimento também
são muito diferentes em função destes fatores.
4.12. O reconhecimento do Comércio Justo como alternativa
importante pelos governantes
“Fair Trade nos ensina que consumidores não estão condenados
a serem meros caçadores de barganhas... Fair Trade nos lembra
que comércio é sobre pessoas, seu bem-estar, suas famílias, ás
vezes sua sobrevivência.”
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
81
Peter Mandelson
Comissário de Comércio da UE
Em vários países europeus ministérios e repartições públicas
adotaram o café e açúcar de Comércio Justo em suas cantinas e
eventos.
Mas, muito mais importante do que isso, a União Europeia já
reconheceu o Comércio Justo como uma alternativa importante para
o desenvolvimento econômico e social em países pobres e integrou
o assunto em sua pauta de trabalho. Em 2006, foi elaborada uma
resolução neste sentido pelo Parlamento Europeu. No entanto,
as organizações internacionais de Comércio Justo cobram agora
os próximos passos, ou seja, a transformação da declaração de
reconhecimento e apoio em ações concretas.
Várias Iniciativas Nacionais estão recebendo recursos
financeiros de seus governos para sua sustentação e campanhas
de conscientização ou ações promocionais. A Suíça é o melhor
caso de sucesso, tendo recebido amplos recursos para aplicar no
marketing do movimento, o que contribuiu substancialmente para
sua consolidação.
Decisivo para este reconhecimento, de acordo com especialistas
do governo europeu, foi a harmonização internacional do sistema
de certificação com a criação da FLO. Além do ganho significativo de
credibilidade possibilitou o trabalho com apenas um interlocutor.
5. A SUSTENTAÇÃO DO COMÉRCIO JUSTO - O CONSUMIDOR
5.1. A evolução do consumidor consciente
A origem do movimento, nos anos 40 e 50 do século passado,
vem do engajamento de pessoas ligadas a missões humanitárias
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
82
através de entidades religiosas ou de desenvolvimento. A principal
motivação era a solidariedade para com a pobreza. Nos anos 60 e
70, a época dos Beatles, dos hippies, da busca de outros valores (paz
e amor) e a simpatia para com as filosofias e religiões do Oriente
abriram novos contingentes de compradores para objetos exóticos
com valor social. Mas, quando a onda dos “Hippies” foi substituída
pela dos “Yuppies”36 , cujo lema era e seu lema “greed is good”
(ganância é boa), o interesse pela convivência pacífica pareceu ter
sumido do plano da sociedade dos países ricos. No entanto, muitos
adeptos e simpatizantes da postura da época anterior continuaram
a buscar e a construir caminhos alternativos práticos, porém sem
chamar atenção.
O maior impulso para o movimento veio através da mudança de
atitude em relação à maneira de ajudar os países pobres. No final
da década de 70 e da início 80 “TRADE NOT AID”, começou a ser
cobrado por especialistas em desenvolvimento econômico e social
de países do então terceiro mundo, porque já tinham entendido
que além de assistencialismo não resolver as causas do problema,
boa parte dos recursos evaporava pela corrupção.
Ao mesmo tempo, a “cultura alternativa” abraçou o movimento verde
e os produtos orgânicos, que foi também uma manifestação contra o
sistema econômico explorador e destruidor do meio ambiente.
Foi nesta época que estourou a pior crise das commodities agrícolas
e o grito dos pobres ecoou na mídia internacional. Não veio uma radical
mudança do sistema de comércio e da política de desenvolvimento
esperada, mas surgiu uma proposta prática e aplicável de fazer
comércio de forma diferente, alternativa e mais justa. Neste momento
cristalizou-se o movimento do Comércio Justo e os “militantes” e
simpatizantes da “cultura alternativa” aderiram imediatamente
porque podiam contribuir de forma concreta para uma alternativa
viável. Não importava se essa adesão era motivada pela possibilidade
de ser contra o sistema injusto ou para ajudar a quem precisava.
36 “Yuppies”, plural de “Yuppy”, derivado de Y.U.P. – “young urban professional” – jovem profissional urbano.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
83
O impacto da globalização
Na década de 1990, a globalização e algumas mudanças estruturais
nas sociedades dos países ricos deixaram marcas profundas nas pessoas.
A deterioração das relações familiares e de vizinhança.
A destruição dos espaços econômicos nas pequenas cidades,
provocada pelas redes de varejo transnacionais e a concentração
urbana nos grandes centros37.
O desemprego provocado pela tecnologia e a reestruturação das
empresas na busca de mais lucro.
O aperto econômico por que passam os pequenos fazendeiros
ante o sistema de exploração do comércio.
A sensação de impotência diante do poder das empresas
transnacionais e da inércia ou conivência de seus governos.
A destruição do meio ambiente.
O enfraquecimento, ver destruição, da relação entre produtor e
consumidor (não se sabe mais onde e como são feitos muitos produtos).
Por outro lado, o nível educacional cada vez mais elevado
contribui para sua capacidade de discernimento e crítica ao
sistema. Alguns mais motivados se engajam em iniciativas, outros
apoiam financeiramente, outros ainda ajudam na divulgação etc.
Os escândalos sobre as descobertas da exploração de trabalho
infantil e condições insalubres em “sweat shops”38 ou de trabalho
escravo em plantações, levaram milhões de consumidores no
mundo inteiro a boicotarem produtos das empresas envolvidas.
Esses fatos provocaram a criação de entidades como a “ethical
trade initiative” cujo o objetivo é cobrar respeito aos direitos dos
trabalhadores dos fornecedores das empresas britânicas, e o
“institute of social and ethical accountability”39 de responsabilidade
social para as empresas.
37 vide estudos “Corporate Breakdown Retail” e “Ghost Town Britain”, no anexo.38 “sweat shop” do inlgês “sweat” – suor > fábricas que exploram a mão-de-obra em condições indignas.39 vide link no anexo.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
84
A busca por produtos de valor social agregado
A crítica ao atual sistema sócioeconômico está saindo
da roda dos acadêmicos e começa a fazer parte do dia-a-dia
do cidadão mais esclarecido e politizado. Nem todos se envolvem
diretamente com iniciativas concretas, mas quando ele encontra
oportunidades de contribuir ele está cada vez mais inclinado a
fazê-lo.
O consumidor busca produtos de maior valor social agregado.
Ele quer poder se identificar com o produtor, poder contribuir para
uma causa em que acredita.
A pesquisa da Leatherhead Foods International revela que “hoje
consumidores mais sofisticados estão interessados em saber de
onde vem a sua comida e como ela é produzida. Isso tem ocasionado
um aumento da importância das questões éticas, o que abrange não
apenas o Comércio Justo, mas também as fazendas de orgânicos,
saúde animal, recursos sustentáveis, trabalhos de caridade dos
manufaturadores, e interesses humanitários e de mercado.”
5.2. “Ethical consumerism” – O consumo ético
Em 1999, o “Co-operative Bank” e a “NEF (New Economics
Foundation)”, do Reino Unido, criaram uma “cesta de compras
éticas” (“Ethical Purchasing Index”) para poder levantar e mensurar
o valor das decisões de compra influenciadas por motivações éticas.
A cesta é composta, entre outros, por alimentos, incluindo de
Comércio Justo e orgânico, eletrodomésticos energeticamente
econômicos, cosméticos que não fazem testes em animais, turismo
responsável, doações, boicotes, investimento ético.
Conforme os resultados do levantamento realizado em 2009,
disponível no “ethical consumerism report”40, o valor total do
consumo ético foi valorado em £36 bi, comparado com £31 bi no
ano anterior.
40 http://www.co-operativebank.co.uk/images/pdf/coopEthicalConsumerismReport2005.pdf
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
85
Alimentos, que incluem produtos orgânicos, Comércio Justo, ovos
de galinhas criadas livremente (não em baterias - “free range eggs”),
vegetarianos, etc. aumentou de £1,9 bi em 1999 para £6,1 bi.
Interessante é a valoração do comportamento de consumo ético
que gera um impacto “invisível”, tais como usar transporte público
por motivos ambientais, fazer compras em lojas locais, evitar
marcas “anti-éticas” ou comprar para reuso.
Comportamentos de consumo ligados a transportes, turismo
ecológico e boicotes de viagens subiu de £175 mi em 1999 para £1,6 bi.
Produtos pessoais éticos, incluindo cosméticos, moda e compra de
roupa usada (reuso), entre outros, subiram de £653 mi para £1,7 bi.
O sistema de financiamento de negócios éticos aumentou de
£5,2 bi em 1999 para £14,4 bi em 2009.
5.3. O perfil dos consumidores do Comércio Justo
O perfil dos consumidores de produtos de Comércio Justo mudou
bastante nos últimos anos. Na verdade não se trata exatamente
de uma mudança, e sim de uma abrangência maior. No início os
consumidores eram cidadãos muito esclarecidos e, eventualmente,
ativos política e socialmente. o aumento da disponibilidade dos
produtos nos supermercados alargou significativamente a base de
clientes, abrangendo um público cada vez mais amplo.
Em geral pode-se afirmar que são pessoas muito esclarecidas
e que se preocupam em contribuir para uma mudança no sistema
atual de economia e comércio. Uma pesquisa de 2008, na França,
por exemplo, revelou que 100% dos consumidores possuíamcurso
superior e 94% tinham uma alta renda.
Ora, há muito, principalmente nos mercados mais maduros,
produtos de Comércio Justo deixaram de ser um nicho de militantes
e ativistas. Cada vez mais pessoas “comuns” se preocupam em
contribuir de alguma forma para “um mundo melhor” sem, no entanto,
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
86
querer chegar a se engajar em algum movimento. Para estes, comprar
um produto socialmente justo é uma alternativa prática e conveniente.
No segmento do artesanato, entrevistas sobre a representatividade
do setor no Reino Unido revelaram que a maioria das empresas vê
seu alvo como o público feminino das classes A e B, com idade
acima de 35 anos, ou mulher com um tipo de consciência mais novo,
ainda que a pesquisa tenha revelado que homens também estão
interessados neste assunto, portanto as das compras de algumas
mulheres podem ter sido resultado da pressão dos seus parceiros.
Este perfil é válido também para a maior parte dos outros países.
De acordo com a WFTO, existem clientes para todos os padrões
de produto, desde o barato ao mais caro. Muitas empresas
identificaram consumidores que estão dispostos a gastar bastante
quando pensam que o produto tem um valor especial. O fato
de o produto ser de Comércio Justo lhes é simpático, mas não
necessariamente os fazem gastar muito dinheiro regularmente.
Este tipo de cliente espera uma qualidade alta ou um produto único
em troca de um preço mais elevado.
Outros têm uma base de clientes que estão comprometidos com
o conceito de Comércio Justo, mas têm uma postura de vida não-
materialista. Muitas vezes eles escolheram profissões de maior
retorno intelectual do que financeiro. Eles não gastam seu dinheiro
com produtos de luxo, mas também não são atraídos pelos produtos
mais baratos.
Visão holística e proximidade com o consumidor de produtos
orgânicos e outras iniciativas
No relatório da Leatherhead Foods International, de 2003,
consta: “Os laços do Comércio Justo e dos orgânicos são fortes,
pois muitos produtos de Comércio Justo são certificados também
como orgânicos. Isso é importante visto que a mensagem trazida
pelo Comércio Justo atinge aos consumidores tanto quanto a
mensagem dos orgânicos.”
Ilustração 36Embalagem de café prêmium de origem
da cafédirect
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
87
De 2003 para cá, a proximidade entre esses públicos cresceu, o
que se explica por uma postura holística crescente em determinados
segmentos de consumidores, que se preocupam não somente com
o meio ambiente físico, mas também com o social e cultural.
A redescoberta da economia local
Nesta mesma visão holística, uma outra iniciativa próxima do
Comércio Justo é a renovada valorização de empresas locais,
pequenas indústrias, produtores agrícolas, comércio e prestadores
de serviço, em detrimento das redes de supermercados
multinacionais sem pátria. Muitas vezes o mesmo consumidor
que se engaja para ajudar pequenos produtores no Sul, também
o faz por pequenos agricultores de sua própria região no Norte.
Afinal, ambos sofrem a pressão de uma concorrência que abusa do
poder econômico. O que dá força a este movimento é que muitos
consumidores ainda mantêm relações familiares e de amizade com
essas pequenas empresas.
Isto pode levar a uma situação de concorrência e resistência nesses
consumidores. Por exemplo, maçãs de Fair Trade vindas da África do Sul
não foram aprovadas por consumidores do Reino Unido, conscientes das
dificuldades que seus pequenos agricultores locais já enfrentam com a
concorrência de organizações multinacionais que trazem produtos da
Europa Oriental e do Sul. A postura geral das organizações de Comércio
Justo em relação a estes casos é não trazer produtos diretamente
concorrentes e sim apoiar produtos complementares.
6. ESTRATÉGIAS DE MARKETING
6.1. Produto
Após um início com pouca preocupação com a qualidade e mais com
o fundo político do Comércio Justo, as estratégias de produto evoluíram
consideravelmente. Na Inglaterra, por exemplo, a principal marca de
Ilustração 36Embalagem de café prêmium de origem
da cafédirect
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
88
café de Comércio Justo, a Cafédirect, ciente da imagem inicialmente
comprometida, investiu muito em qualidade e usou durante muitos
anos a degustação e os testes cegos para convencer consumidores da
qualidade de seus produtos. Hoje, ela é considerada uma marca
premium, associada à alta qualidade. Regularmente lança novos
produtos com origens exclusivas, nos moldes de vinhos nobres,
tais como um café do monte Kilimanjaro, no Quênia, ou outro de
Machu Pichu, no Peru. Portanto, boa parte dos produtos são hoje
posicionados pelos licenciados como de alta qualidade, na categoria
premium, já que muitas vezes eles também são orgânicos.
Hoje em dia, as grandes marcas especializadas em Comércio Justo,
tais como a Cafédirect, a Ethiquable ou a Gepa, gerenciam e renovam
sua linha de produtos como qualquer concorrente convencional,
buscando a diversificação e a ocupação de market share.
A entrada de muitos licenciados convencionais contribuiu
significativamente para o aumento das linhas de produtos e dos
segmentos.
A qualidade das embalagens acompanha as estratégias e, com
algumas exceções, estão no mesmo nível das principais marcas e
chamam atenção pela elegância e pelo direcionamento estratégico
ao perfil dos consumidores. Dependendo do contexto cultural do
país e do comportamento de consumo da população, as embalagens
podem associar os produtos mais às suas origens étnicas, ou a um
posicionamento moderno junto ao público jovem.
Ilustração 37 Embalagens de cosméticos com ingredientes de Comércio Justo
Ilustração 38 Manga no supermercado inglês Sainsbury
Ilustração 39 Ala de frutas frescas de Comércio Justo no supermercado Sainsbury
Ilustração 41 Marca de café nos EUA
Ilustração 42 Marca de café nos EUA
Ilustração 40 Marca da Starbucks
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
89
Neste posicionamento mercadológico moderno, até as frutas
frescas, tais como a banana e a manga, recebem tratamento de
produto de marca.
Nos EUA a linha de produtos alimentícios ainda é mais restrita
do que na Europa, concentrando-se principalmente nos produtos
pioneiros de café e chocolate. As apresentações dos produtos
as organizações especializadas em Fair Trade são coloridas e com
desenhos alegres, lembrando as culturas indígenas e sua origem
no campo, além de explorar temas ativistas.
A expansão agressiva, principalmente do café, trouxe também
as grandes marcas convencionais, lideradas pela Starbucks, que
oferece várias opções de café Fair Trade.
Mudança estratégica de rumo no artesanato
Como visto anteriormente, o segmento de artesanato precisa
se renovar para retomar as vendas e ultrapassar os limites das
“world shops”. A iniciativa tomada pela Associação Holandesa de
Lojas de Mundo de reposicionar os estabelecimentos como gift
shops vide capítulo anterior, é muito bem sucedida. A principal
inovação na estratégia de produto é o apoio dos importadores no
desenvolvimento de produtos, embasada em estudos e profissionais
do design. Além da Holanda, as grandes organizações, membros
da EFTA, a exemplo da Traidcraft e da Oxfam, já incorporaram esta
filosofia. No entanto, este desenvolvimento não é homogêneo em
todas organizações e países.
6.2. Estratégia de preço
O estudo da Leatherhead revelou que o nível de preço é muito
diferente nos países pesquisados, mesmo levando em consideração
diferenças no poder aquisitivo e custo de vida.
Prêmios pagos por alimentos de Comércio Justo variam
consideravelmente por setor e país.
Ilustração 41 Marca de café nos EUA
Ilustração 42 Marca de café nos EUA
Ilustração 40 Marca da Starbucks
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
90
Há dificuldade de comparar preços devido ao diferente
posicionamento dos produtos em países diferentes.
A postura do consumidor em relação a certos setores e hábitos
gerais de alimentação também pode influenciar na definição do preço,
por exemplo, chá é um produto diário no Reino Unido, por isso o preço
é bem diferente do da França, onde o chá é um produto Premium.
Produtos de Comércio Justo são, geralmente, mais baratos que
os orgânicos, embora alguns deles também serem orgânicos e,
consequentemente, mais caros.
Em muitos setores e mercados, as linhas de Comércio Justo
também são posicionadas como produtos Premium ou de melhor
qualidade do que produtos concorrentes e, desta maneira, têm
maior preço.
Comércio Justo é posicionado como uma escolha de estilo de vida,
como uma oposição a alguns termos dados a doações para caridade
feitas por produtores que se ligaram a alguns tipos de caridades.
Em geral, as diferenças de preço identificadas podem variar
em até 70%. No entanto, pelos motivos apresentados acima não
se pode garantir uma consistência na comparação de valores de
mercados diferentes.
Também é importante lembrar, como mencionado anteriormente,
que o enorme crescimento recente do Comércio Justo proporciona
economias de escala significativas e que há casos em que produtos
de Comércio Justo conseguem preços mais baratos do que
concorrentes convencionais. Um desses casos foi o das bananas
na Suíça em que a concorrente de marca “chiquita”, durante
determinado período, estava mais cara do que as de Comércio
Justo. O mesmo se dá na rede Sainsbury da Inglaterra.
Não foram encontrados estudos sobre preços do artesanato em
comparação com objetos de decoração ou de utilidade no varejo
convencional.
Ilustração 43 Fair Wage Guide
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
91
É importante mencionar que há esforços no sistema internacional
de Comércio Justo para ajudar a definir o que é um preço justo para
um produto artesanal. Isso representa um ponto de preocupação
da WFTO, porém ainda sem definições e que provoca discussões
devido à dificuldade de atribuir um preço justo a aspectos cujos
valores são difíceis deserem definidos, tais como a identidade étnica
e cultural, o trabalho do artesão que, muitas vezes, se confunde
com o do artista, entre outros.
Um esforço interessante neste sentido está sendo desenvolvido por
uma organização chamada “World of Good”. Com o objetivo de definir
um pagamento mínimo para o artesão, foi criada uma ferramenta
on-line que qualquer pessoa pode usar através da internet.
Através desse projeto, a organização visa dar uma melhor
condição de vida para artesãos e seus familiares que vivem com
menos de US$ 4 ao dia. Vale salientar que apenas é calculado uma
remuneração mínima para cada produtor, e não o preço de venda
dos produtos, a partir da análise do tempo necessário para a criação
de cada peça, o preço do material gasto e o custo de vida referente
ao local onde o indivíduo vive. A partir deste piso, que visa garantir
um padrão de vida mínimo, cada produtor ou grupo produtor pode
negociar os valores agregados que consideram “justos” para seus
produtos e contextos culturais.
O teste está disponível no site: www.fairtradecalculator.net.
Esse projeto está sendo testado com aproximadamente 2000
produtos de diversas nacionalidades. Alguns testes ocorreram
com artesãos que vivem em países mais pobres, como é o caso
do Vietnã, Guatemala, Quênia, Tailândia, e Camboja. A intenção
da organização é transferir esse projeto, que ajuda a definir uma
espécie de piso de remuneração aos artesãos, à instituições como
IFAT, FTF, FLO, que, por serem maiores, podem torná-lo conhecido
em âmbito mundial.
Ilustração 43 Fair Wage Guide
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
92
6.3. Distribuição
As organizações de Comércio Justo usam todos os canais para
chegar ao consumidor. Desde os canais mais tradicionais do
segmento, como os bazares e feirinhas e o canal mais visível das
world shops, os produtos podem hoje ser encontrados cada vez
mais no varejo convencional, em lojas virtuais e eventos especiais
promovidos pelas organizações, bem como em feiras locais.
6.4. Comunicação
As estratégias de comunicação com o mercado acontecem em
vários níveis. A comunicação do setor de Comércio Justo para
aumentar a consciência pública e conquistar mais clientes será
descrita no capítulo 8.
Ilustração 44 Bananas no supermercado Waitrose, Reino Unido
Ilustração 45 Propaganda de café da Max Havelaar, da Holanda
Ilustração 46 Colhedora de chá no Sri Lanka – Max Havelaar, Suíça
A propaganda dos produtos, realizada pelos licenciados como
parte de suas estratégias de marketing, segue suas estratégias
de posicionamento, direcionada (a propaganda) ou direcionadas
(as estratégias) para o público jovem, consciente, mas “fashion
descolado” ao mesmo tempo.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
93
Ilustração 46 Colhedora de chá no Sri Lanka – Max Havelaar, Suíça
Leva-se cada vez mais em consideração o desejo dos consumidores
de conhecer os produtores e a origem dos produtos. Para atender a
este anseio são apresentadas cada vez mais imagens dos produtores,
os beneficiados, diretamente nos produtos como também nos
websites das organizações de apoio e dos licenciados especializados.
Neste sentido pôde se sentir inclusive uma mudança na forma
de prestação de contas das Iniciativas Nacionais e das principais
organizações, tais como a EFTA, direcionando seus relatórios cada vez
mais para evidenciar o impacto do FT nas comunidades dos produtores.
De acordo com a pesquisa da Leatherhead Foods International,
a presença de um produto “Fair Trade” na prateleira foi para
muitos o primeiro encontro com o tema. Isto é confirmado pelo
fato de que nos países de maior distribuição em supermercados
o reconhecimento também é mais alto. Portanto, a presença na
prateleira dos supermercados, onde a maioria da população faz
suas compras, é uma ferramenta de comunicação muito importante
não somente para a venda em si, mas também para a disseminação
do conceito como um todo junto ao público de massa.
6.5. Posicionamento estratégico
A Leatherhead Foods International revelou que em termos de
posicionamento de produto, outro ponto levantado por vários
especialistas do setor foi o da qualidade, especialmente nos mercados
de café da Europa Continental. No mercado de café europeu, se tem a
impressão de que a maioria das linhas de Comércio Justo tem o objetivo
de serem percebidos como produtos especiais, situando-se no topo
do mercado, onde os seus preços mais altos são mais justificáveis.
Muitos fornecedores acreditam que os preços de Comércio Justo e
as linhas convencionais não deveriam ser comparados, uma vez que
a qualidade dos produtos é muito diferente.
Em muitos mercados, há também uma sobreposição entre
produtos de Comércio Justo e orgânicos, com muitos dos produtos
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
94
de Comércio Justo da Europa sendo também certificados como
orgânicos, e desta maneira elevando-os ainda mais para cima.
De qualquer maneira, embora a relação existente entre os
produtos orgânicos e os de Comércio Justo permanece forte e pode
ser benéfica para ambos os setores, a associação direta talvez
seja um pouco perigosa para os fornecedores de Comércio Justo,
pois pode ofuscar a mensagem do Comércio Justo e atrapalhar o
desenvolvimento da consciência do consumidor.
Da mesma maneira, algumas organizações de Comércio Justo
expressaram preocupação sobre o fato de estarem sendo ligadas a
um mercado de caridade. Alguns fornecedores de alimentos e bebidas
têm se aliado a eventos de caridade nos quais alguns dos ganhos
com as suas vendas são doados para boas causas. Organizações de
Comércio Justo insistem que os seus pedidos ocorrem mais por uma
decisão de estilo de vida do que por doações de caridade e, por essa
razão, tendem a distanciar-se deste tipo de mercado.
Para o segmento de artesanato é importante sair dos limites das
“world shops” e se posicionar no mercado convencional por força
de diferenciais como design, caráter étnico e qualidade.
7. ESTRATÉGIAS DE PROMOÇÃO E EXPANSÃO DO MERCADO
Para analisar as estratégias de marketing usadas para promover e
expandir o setor como um todo é necessário diferenciar os diversos
níveis e segmentos de público-alvo em que são aplicadas e seus
respectivos objetivos.
7.1. Aumentar a base de consumidores, fidelizar e intensificar
a relação
O curioso que já ouviu falar ou talvez já tenha comprado de
forma irregular é o alvo para a intensificação do consumo. Para
isso, informação é tudo em um setor que quer crescer muito ainda.
Ilustração 47 Colhedora de chá
no Sri Lanka
Ilustração 48 Cartazes do website
Fairtrade at work
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
95
Websites
Os websites das Iniciativas Nacionais e dos licenciados têm um
papel fundamental na busca de informações de todos os tipos.
Desde a história do movimento, dos produtores, localização das
“world shops”, dicas sobre como montar lojas e orientações sobre
como organizar campanhas e eventos podem ser encontradas,
além de informações sobre setores ligados direta e indiretamente
ao Comércio Justo como problemas com alimentos, pesticidas
etc., resultados de pesquisas sobre saúde, consumo ético, saúde
animal, proteção de animais, etc.
A qualidade visual é muito boa e as imagens e histórias dos
produtores são bem exploradas.
Ilustração 47 Colhedora de chá
no Sri Lanka
Ilustração 48 Cartazes do website
Fairtrade at work
Os websites também são importantes ferramentas de
comunicação e apoio às iniciativas locais e outros interessados nos
quais pode ser baixado material de apoio para campanhas e ações.
A imagem acima mostra cartazes da campanha Fairtrade at work
que podem ser baixadas do site.
Newsletters regulares
Quando bem feitas e consistentes, as newsleatter são excelentes
instrumentos para manter e intensificar o relacionamento com os
clientes mais interessados. A Gepa da Alemanha, por exemplo,
distribui uma newsletter mensal de 5 a 8 páginas.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
96
7.2. Aumentar licenciados
As duas linhas principais de atuação são:
A prospecção direcionada de empresas para lançarem produtos
de Comércio Justo. É trabalhoso, já que na fase inicial de
convencimento, muito trabalho de explicação e de desmistificação
precisa ser feito, mas fora isso pouco custoso e de alto impacto.
Nos mercados mais maduros já há uma certa demanda espontânea
por parte das empresas que compreendem as oportunidades deste
segmento de público-alvo.
A pressão sobre produtos de grandes marcas, usando desde
argumentos que ameaçam a imagem da marca ou demonstrando
que seu público está interessado neste tipo de alternativa.
Um caso interessante foi a campanha nos EUA direcionada para
a M&M, para adotar o cacau justo na fabricação de seus chocolates.
Foi criada até uma figura com um cartaz: “Eu quero ser de Comércio
Justo”, que foi distribuído em escolas e “world shops”. No website
da Iniciativa Nacional tinha também um email pré-redigido para ser
enviado para o presidente da empresa.
As recentes conquistas deste trabalho incluem grandes marcas
como a Nestlé, a Cadbury e a Dole.
Além disso, é feito um trabalho importante de “advocacy” e nas
assembleias de acionistas de grandes empresas selecionadas, tais
como a Procter & Gamble, que nos EUA é líder de mercado no
segmento de café.
A Starbucks nos EUA é outro caso de sucesso destas estratégias.
A maior rede de pontos de venda de café do mundo está hoje
comercializando alguns itens de fornecedores de Comércio Justo.
7.3. Aumentar a base de distribuição
As Iniciativas Nacionais e os principais importadores oferecem
muitas informações e apoio para a abertura de novas lojas. Na
Ilustração 49 A figura do chocolate M&M como manifestante
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
97
Ilustração 49 A figura do chocolate M&M como manifestante
Alemanha já existe até um sistema de franquia de “weltladen”. No entanto, o número de lojas evoluiu muito pouco nos últimos porque, aparentemente chegou-se a um limite neste segmento. A principal contribuição para o crescimento vem dos novos países, como na Europa Oriental.
A prospecção de supermercados e outras categorias de lojas é um trabalho direcionado como para a prospecção de licenciados. Posicionamentos, tais como proximidade do movimento orgânico, produtos naturais, e cooperativismo, facilitam o acesso e são
critérios para a escolha dos alvos.
7.4. “Fair Trade Town” FTT – Cidade de Comércio Justo
Esta é uma das campanhas de maior sucesso no cenário
internacional de Fair Trade.
Uma localidade é reconhecida como apoiadora de Comércio Justo, podendo ostentar o status e placas indicadoras. O mecanismo do FTT é uma ferramenta muito poderosa para envolver a população local em torno de um objetivo comum.
Ao estabelecer cinco objetivos claros, ambiciosos ao mesmo tempo que alcançáveis, esta ferramenta consegue mobilizar as forças de várias iniciativas locais e direcioná-las para os alvos maiores que são a disseminação do conceito e a abertura de canais de mercado para os produtos.
Os cinco objetivos são os seguintes:
A câmara de vereadores passa uma resolução apoiando o
Comércio Justo e concorda em servir café e chá de Comércio Justo
em suas reuniões e em seus escritórios e cantinas.
Uma gama de produtos de Comércio Justo deve ser facilmente
encontrada no varejo local quando a população faz sua feira rotineira.
Produtos de Comércio Justo são usados por um número de
empresas e órgãos das comunidades .
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
98
Atrai cobertura da mídia e apoio popular para a campanha.
O grupo local de Comércio Justo que está liderando o processo
é associado à Iniciativa Nacional para garantir continuidade do
processo.
Em maio do ano 2000, a pequena cidade de Garstang, na Inglaterra,
foi a primeira a receber da Fair Trade Foundation a Iniciativa Nacional
do Reino Unido, o status oficial de “Fair Trade Town”.
A metodologia hoje pode ser aplicada a vários tipos de
localidades, aldeias, pequenas e grandes cidades, ilhas, bairros e
outras unidades administrativas. Já existem também versões para
universidades, escolas, igrejas e paróquias, entre outros.
Os resultados são impressionantes. Até o final de 2009 a
campanha chegou a 435 locais somente no Reino Unido, e tem
iniciativas em 18 países. O movimento de envolvimento das
comunidades naquele país inclui mas de 5.000 igrejas registradas
como entidades de Comércio Justo, 67 grupos religiosos, 39
sinagogas e uma mesquita.
O sucesso desta abordagem para promover o Comércio Justo,
de acordo com seu realizador, pode ser atribuído à capacidade de
mobilizar as entidades e os militantes locais em torno de objetivos
e metas claras e motivadoras.41
7.5. Aumentar a base de cliente
A disponibilidade de cada vez mais produtos nas prateleiras de
mais lojas do varejo convencional é fundamental para aumentar a
base de clientes e sair do público restrito das “world shops”.
Pegar carona com os produtos orgânicos é outro caminho, mas
deve ser trabalhado com cautela.
41 Mais informações podem ser obtidas no site - http://www.fairtrade.org.uk/get_involved_fairtrade_towns.htm
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
99
Vendas institucionais
Este segmento tem sido um canal interessante para o aumento
significativo de vendas de muitas importadoras e lojas. É muito
eficaz, já que com uma negociação se alcança dezenas até centenas
de pessoas. Além de aumentar a base de cliente, em muitos
casos funciona como divulgação. A captação de muitos órgãos
governamentais até bastante significativos, tais como o parlamento
em vários países e a própria União Europeia, tem contribuído
também para aumentar a “public awareness”.
7.6. Fairtrade at work
Buscando aumentar sua base de consumo, a FTF, do Reino Unido,
lançou mais uma campanha inovadora. A campanha, que conta até
com um gerente temático, visa promover a introdução de produtos
de Comércio Justo nas cantinas, copas e refeições nos locais de
trabalho. Para atender às demandas específicas destes canais, a
Cafedirect desenvolveu uma máquina de autoatendimento e está
desenvolvendo pacotes de 5 kilos para seus cafés.
Ilustração 51 Material promocional da campanha Fairtrade at work
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
100
7.7. Compras públicas
As compras públicas recebem uma atenção especial por
parte das organizações de Comércio Justo, já que a administração
pública tem uma importância que vai além da mera compra dos
produtos. O interesse por este segmento também é grande porque
muitos ativistas de Comércio Justo também estão engajados na
política e querem ver os produtos serem oferecidos em seus locais
de trabalho. Para isso são criados grupos de trabalhos específicos
para analisar como trabalhar com este setor.
A campanha de FTT trabalha bastante com este segmento, tendo
preparado inclusive alguns materiais para a orientação de quem
começa com este projeto em sua localidade.
A iniciativa mais importante neste segmento é o Fair Procura,
da EFTA, cujo objetivo é estudar a legislação da União Europeia e
propor estratégias de atuação para o setor42.
A entidade ICLEI é uma associação internacional de governos
locais que se preocupa com o desenvolvimento sustentável e
contribuiu ativamente para as atividades do Fair Procura43.
7.8. “Advocacy” - aumentar o reconhecimento institucional
No Brasil seria chamado de lobby, no bom sentido. É a pressão
junto a órgãos governamentais em todos os níveis e junto com
políticos simpáticos à causa (ex.: os Verdes na Alemanha que já
atuaram fortemente a favor dos orgânicos), visando desde a abertura
de canais de compras públicas e institucionais até o reconhecimento
do Comércio Justo como merecedor de apoios e condições especiais
de comércio. Os papéis de executores são assumidos por atores
diferentes de acordo com os níveis da administração alvejados. No
município e na região são grupos informais, normalmente ligados
a outras organizações que se organizam em torno do tema. Neste
nível, a ferramenta do FTT é muito bem sucedida (vide capítulo
específico). Em nível nacional são as Iniciativas Nacionais que
42 http://www.european-fair-trade-association.org/observatory/index.php/fair-procura-2010 43 http://www.iclei.org
Ilustração 53 Logo da ICLEI
Ilustração 54 Material promocional
do dia mundial do Comércio Justo
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
101
Ilustração 53 Logo da ICLEI
exercem este papel. No âmbito da União Europeia é a EFTA, que
inclusive mantém um escritório em Bruxelas especificamente para
este fim. E em nível mundial é o papel exercido pela WFTO, que
elabora documentos e participa de eventos importantes, mantendo
sempre em mente que o objetivo final do movimento do Comércio
Justo é tornar todo comércio justo.
Ilustração 54 Material promocional
do dia mundial do Comércio Justo
7.9. Aumentar a consciência da sociedade - “public awareness”
Eventos e ações
As diversas entidades e empresas do setor se articulam em nível
local, regional, nacional e internacional para realizar eventos e
campanhas que alcancem a massa da população.
O melhor exemplo é o Dia mundial do Comércio Justo. Promovido
pela WFTO, mas realizado mesmo pelas iniciativas locais, ele é
ocasião para ações nas world shops e comunidades engajadas,
como as cidades de Comércio Justo.
Ilustração 55 Material promocional da Fair Trade Fortnight já para 2011
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
102
Outro exemplo importante é a Fairtrade Fortnight, no Reino
Unido. São 15 dias de eventos e ações no país inteiro, envolvendo
muitos atores a parceiros além das tradicionais world shops.
As iniciativas locais, diretamente ligadas às world shops, são
fundamentais para a organização de encontros e feirinhas. O
marketing boca-a-boca é fundamental neste momento.
Marketing boca a boca
As Iniciativas Nacionais e outras entidades dão um apoio muito
grande e colocam à disposição muito material informativo e
orientações práticas sobre que tipo de evento promover e como
organizá-lo, como fazer a divulgação, fornecem inclusive emails pré-
formulados para serem distribuídos etc. (vide anexo – material da
Fair Trade Resource network dos EUA). No entanto, o marketing boca
a boca e as ações pequenas, mas impactantes nas comunidades,
tais como escolas, lanchonetes bem frequentadas etc. ainda têm
um peso importante na hora de captar novos adeptos.
“Grass roots campaigns”
Estas campanhas de mobilização dos cidadãos atuam na base da
sociedade, ou seja, nas comunidades (tradução literal: campanhas
nas raízes da grama). São muito usadas para pressionar os
governos ou grandes empresas para mudar alguma lei ou postura e
são bastante comuns nos EUA e já têm sua própria sistemática. É a
recuperação do poder dos pequenos contra os grandes.
Campanhas de mídia
Em vários países as Iniciativas Nacionais conseguiram o apoio
para campanhas de mídia com esportistas e pessoas de renome.
A Finlândia colocou à disposição um barco que faz um roteiro
em toda a Europa e onde atraca chama atenção e realiza recepções
H E L P C H A N G E A S M A L L O F T H E W O R D .
Ilustração 56 Logomarca da Rugmark
cooperativa
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
103
de conscientização e a Iniciativa Nacional local aproveita para
organizar outros eventos.
Aproveitar escândalos
Para captar o interesse da população são aproveitados temas da
atualidade, ligados à exploração ou marginalização de algum grupo,
que já têm muita visibilidade e já provocaram uma pré-disposição para
ajudar. O melhor exemplo é o escândalo do trabalho infantil na fabricação
de bolas de futebol terceirizada pela NIKE. O resultado foi que elas são o
primeiro produto não-alimentício a ser certificado pela FLO.
Outro exemplo é a “RugMark”, a marca do tapete, um projeto
internacional de apoio à recuperação de crianças exploradas na
fabricação de tapetes na Índia, Nepal e Tibet.
Há um projeto similar da Max Havelaar, na Suíça, chamado
“Step”, o passo, que segue os critérios da RSC internacional
(Responsabilidade Spocial Corporativa).
As notícias sobre o trabalho escravo nas plantações de cacau
do Gana certamente contribuíram para a abertura do mercado do
chocolate no Reino Unido e o sucesso da cooperativa “Kuapa Kokoo”.
Uma das redes de “botteghe del mondo”, em Milão na Itália, por
exemplo, se chama “Chico Mendes”, em homenagem ao personagem
que simboliza a luta contra o desmatamento na Amazônia e cuja
história teve grande impacto naquele país.
Assessoria de imprensa
O tema desperta bastante interesse na mídia e a geração de
novos fatos e dados é muito bem explorada. Algumas Iniciativas
Nacionais acompanham os resultados de mídia espontânea gerada.
H E L P C H A N G E A S M A L L O F T H E W O R D .
Ilustração 56 Logomarca da Rugmark
cooperativa
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
104
8. PERSPECTIVAS FUTURAS E DESAFIOS
Nos mercados considerados maduros, o Comércio Justo já saiu
da fase de nicho e já é considerado um segmento de mercado
estabelecido.
As taxas de crescimento continuam muito acima da média de
qualquer outro segmento de mercado. A linha de produtos também
continua crescendo, tanto do lado da matéria-prima quanto do lado
dos produtos de consumo.
Cada vez mais empresas se interessam pelo segmento,
reconhecendo que o consumidor está cada vez mais fazendo
escolhas conscientes e dando preferência a marcas que agregam
um valor social a seus produtos e/ou sua administração.
Aliás, a tendência do consumidor de se preocupar com o valor
social agregado mostrou que não é uma moda passageira e se
consolidou após passar pela prova de fogo da crise mundial em
2009, quando o Fair Trade foi um dos raros segmentos que não
caíram e até cresceram na média geral.
A expectativa em relação ao crescimento futuro permanece forte,
apesar de ser difícil prever como se darão os desenvolvimentos
futuros com segurança fora dos segmentos já estabelecidos, como
café, chá, chocolates e bananas.
O movimento internacional de Comércio Justo mantém sua visão
de longo prazo de tornar todo comércio justo.
8.1. Desafios
O sucesso do Fair Trade e seu rápido crescimento também
trazem novos desafios. A principal conclusão da pesquisa “Fair
Trade facts and figures 2007” revela que o Comércio Justo está
entrando cada dia mais rápido em novos terrenos e que a única
coisa que se pode afirmar com segurança é que os desafios ficam
cada dia mais complexos.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
105
Os principais desafios enumerados na pesquisa são concorrência,
credibilidade, crescimento e legislação.
Concorrência
As “world shops” perderam sua posição exclusiva entre os
produtores e consumidores. Elas precisam se renovar se quiserem
continuar a ser pontos de referência do Comércio Justo.
As importadoras/distribuidoras especializadas em Comércio
Justo sentem a entrada das concorrentes convencionais que têm
muita experiência com os produtos, acesso à indústria, além de
uma economia de escala maior.
Para os licenciados a situação é similar à das importadoras.
Investimentos em “branding” (posicionamento da marca no mercado)
e desenvolvimento de produto serão chave para o sucesso no futuro.
Até as Iniciativas Nacionais de Certificação começam a ter
concorrência de outros selos que oferecem certificações que
incluem aspectos sociais.
Credibilidade
As “world shops”, que trabalham com muitos produtos sem
selo, precisam de um sistema prático, equilibrado e acessível que
garante os princípios do Comércio Justo ao longo de toda a cadeia,
mesmo que não possa ostentar um selo.
Importadores podem contar com o sistema da FLO para os
produtos que esta certifica. Para os outros, eles precisam da
própria credibilidade para convencer o consumidor.
Questões como o percentual de ingredientes e a entrada de
grandes multinacionais, tais como a Nestlé e a Dole, que adotam o
selo comente para parcelas negligenciáveis de seus negócios e são
visto com desconfiança por muitos, devem ser abordadas o futuro
próximo, sob pena de por em risco a credibilidade do sistema.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
106
Crescimento
Para as “world shops” o crescimento passa inevitavelmente pela
profissionalização. Para as associações das lojas de Comércio Justo,
o desafio é lidar justamente com perfis e níveis de profissionalização
cada vez mais díspares.
Os importadores especializados em Comércio Justo precisam
buscar o crescimento através do constante desenvolvimento de
novos produtos e no segmento de produtos de dupla certificação
– orgânico e Comércio Justo. Alguns destes importadores estão
buscando uma intensificação de relação comercial com as “world
shops”, apoiando-se no fato de que estas dificilmente trabalharão
com outras marcas não especializadas em Comércio Justo.
Para as organizações de certificação nacional, o crescimento
passa simplesmente pelo lançamento de novos produtos. No
entanto, eles precisam superar suas próprias limitações de recursos
humanos e financeiros para atender ao crescimento de demanda
com a presteza necessária.
Legislação
O amadurecimento do setor levanta em vários países a
preocupação com uma legislação para regulamentar o setor, o que
é o grande desafio que exige atenção redobrada.
Um outro aspecto que exige atenção é o fato de que os militantes
da primeira hora estão envelhecendo e que o movimento precisa se
renovar para não perder o dinamismo e enfrentar os desafios que
estão por vir.
Relatório da Pesquisa Mundial de Comércio Justo Atualização 2010 - Parte 1
www.sebrae.com.br | 0800 570 0800