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Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL 554.669 - MG (2003/0125811-6) RELATORA : MINISTRA DENISE ARRUDA RECORRENTE : FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PROCURADOR : CARLOS VICTOR MUZZI FILHO E OUTROS RECORRIDO : ELETRIC - ELETRICIDADE INDUSTRIAL LTDA ADVOGADO : ARIOVALDO VIEIRA DA SILVA RELATÓRIO A EXMA. SRA. MINISTRA DENISE ARRUDA (Relatora): Trata-se de recurso especial, fundado na alínea a do permissivo constitucional, interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, cuja ementa é a seguinte: "Agravo de instrumento. Hasta Pública perfeita e acabada. Preferência manifestada pela Fazenda mais de um ano após a arrematação pelo credor em outra execução. Recurso improvido." (fl. 33) Opostos embargos de declaração, restaram rejeitados (fl. 41). Nas razões recursais, a Fazenda Estadual aponta violação dos arts. 458, II, e 535 do Código de Processo Civil, alegando que o Tribunal de origem omitiu-se ao não apreciar questão relevante ao deslinde da controvérsia. Aponta, ainda, violação do art. 711 do CPC, para requerer o depósito em juízo do valor da arrematação levada a efeito pela parte recorrida, sob a alegação de que foi desrespeitada a preferência do crédito tributário. Em face da inadmissão do recurso, foi interposto o respectivo agravo de instrumento, cujo provimento foi negado (fl. 75). Posteriormente, à vista do pedido de reconsideração apresentado pela Fazenda Pública, o eminente Ministro Humberto Gomes de Barros houve por bem determinar a conversão do Ag 434.258/MG em recurso especial. É o relatório. Documento: 2076397 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 4

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Acórdão

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Page 1: Penhoras simultâneas

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 554.669 - MG (2003/0125811-6) RELATORA : MINISTRA DENISE ARRUDARECORRENTE : FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PROCURADOR : CARLOS VICTOR MUZZI FILHO E OUTROSRECORRIDO : ELETRIC - ELETRICIDADE INDUSTRIAL LTDA ADVOGADO : ARIOVALDO VIEIRA DA SILVA

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA DENISE ARRUDA (Relatora):

Trata-se de recurso especial, fundado na alínea a do permissivo constitucional, interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, cuja ementa é a seguinte:

"Agravo de instrumento. Hasta Pública perfeita e acabada. Preferência manifestada pela Fazenda mais de um ano após a arrematação pelo credor em outra execução. Recurso improvido." (fl. 33)

Opostos embargos de declaração, restaram rejeitados (fl. 41).

Nas razões recursais, a Fazenda Estadual aponta violação dos arts. 458, II, e 535 do Código de Processo Civil, alegando que o Tribunal de origem omitiu-se ao não apreciar questão relevante ao deslinde da controvérsia.

Aponta, ainda, violação do art. 711 do CPC, para requerer o depósito em juízo do valor da arrematação levada a efeito pela parte recorrida, sob a alegação de que foi desrespeitada a preferência do crédito tributário.

Em face da inadmissão do recurso, foi interposto o respectivo agravo de instrumento, cujo provimento foi negado (fl. 75).

Posteriormente, à vista do pedido de reconsideração apresentado pela Fazenda Pública, o eminente Ministro Humberto Gomes de Barros houve por bem determinar a conversão do Ag 434.258/MG em recurso especial.

É o relatório.

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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 554.669 - MG (2003/0125811-6)

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA DENISE ARRUDA (Relatora):

Primeiramente, deve-se consignar que é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que não viola o art. 535 do CPC, nem nega prestação jurisdicional, o acórdão que, mesmo sem ter examinado individualmente cada um dos argumentos trazidos pelo vencido, adota, entretanto, fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia, conforme ocorreu no acórdão em exame, não se podendo cogitar de sua nulidade.

Nesse sentido, os seguintes julgados: AgRg no Ag 571.533/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 21.6.2004; AgRg no Ag 552.513/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJ de 17.5.2004; EDcl no AgRg no REsp 504.348/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 8.3.2004; REsp 469.334/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ de 5.5.2003; AgRg no Ag 420.383/PR, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 29.4.2002.

Com efeito, o aresto atacado abordou todas as questões necessárias à integral solução da lide, notadamente quanto ao art. 711 do CPC, como se depreende de excerto do seu voto condutor:

"É claro que, no caso que se examina, a agravante não agiu com a devida diligência que lhe incumbia na defesa de seus direitos.Vê-se que houve duplicidade de penhora sobre o mesmo bem em execuções paralelas.O anúncio da praça foi feito num dos processos e, quando já realizada, é que acordou a agravante em pretende-la naquele em que figura como interessada exeqüente. É claro que, já arrematado o bem, outra venda dele seria impraticável. Isso demonstra que a agravante não estava atenta à defesa dos próprios interesses. Com efeito, dispõe o art. 711 do CPC que: 'concorrendo vários credores, o dinheiro ser-lhes-á distribuído e entregue consoante a ordem das respectivas prelações; não havendo título legal à preferência, receberá em primeiro lugar o credor que promoveu a execução, cabendo aos demais concorrentes direito sobre a importância restante, observada a anterioridade de cada penhora'. De acordo com ensinamento de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR sobre tal dispositivo legal: 'A intercorrência de sucessivas penhoras sobre o mesmo bem, ou a existência de título legal de preferência de outros credores anteriores à penhora, cria um concurso sobre o produto da arrematação, sem a feição de universalidade que é própria da

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insolvência civil (execução por quantia certa contra devedor insolvente). E acrescenta o autor: 'Em razão da intercorrência de penhoras, devem todas as execuções que atinjam o mesmo bem ser apensadas, a fim de que não se multipliquem atos executivos da mesma espécie, como a avaliação e a hasta pública, e, ainda, especialmente para que, naquele processo em que se deu a alienação forçada, também se instaure o concurso particular dos diversos credores que penhoraram o mesmo bem do devedor comum'. E, ainda: 'Os credores interessados devem formular suas pretensões de preferência em petição, nos autos em que ocorreu a alienação forçada, indicando, quando for o caso, as provas que irão produzir em audiência (art. 712)' (Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, vol. IV, 1ª ed., tóp 401)Como se vê, o exame da matéria ao enfoque do art. 711 do Estatuto Processual, reclamado pela embargante, não a favorece, mesmo porque deixou de formular oportunamente a pretensão de preferência.A embargante, atenta ao texto do dispositivo legal invocado, esqueceu-se de que a arrematante também figura como exeqüente e credora do executado comum." (fls. 42/43)

No mais, a pretensão recursal cinge-se à possibilidade de, em face da preferência dos créditos tributários, determinar à parte recorrida que proceda ao depósito em juízo dos valores objeto da arrematação.

Sobre a matéria, determina o art. 711 do CPC:

"Concorrendo vários credores, o dinheiro ser-lhes-á distribuído e entregue consoante a ordem das respectivas prelações; não havendo título legal à preferência, receberá em primeiro lugar o credor que promoveu a execução, cabendo aos demais concorrentes direito sobre a importância restante, observada a anterioridade de cada penhora."

Não há dúvida de que o crédito tributário goza de preferência sobre os demais créditos. No entanto, a existência deste privilégio deve ser apurada no concurso de preferência, momento processual no qual se analisa a ordem em que os credores receberão os seus créditos, conforme se depreende do art. 712 do CPC:

"Art. 712. Os credores formularão as suas pretensões, requerendo as provas que irão produzir em audiência; mas a disputa entre eles versará unicamente sobre o direito de preferência e a anterioridade da penhora."

Nesse sentido, ensina o processualista Alexandre Freitas Câmara:

"O concurso de preferências é um incidente do processo executivo de que participam apenas credores do executado (não tendo este último qualquer participação no incidente). Sendo, como é, incidente processual, o

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provimento que o soluciona é decisão interlocutória (e não sentença, apesar da redação do art. 713 do CPC). Neste incidente do processo executivo deve-se verificar as ordens em que os credores receberão aquilo que fazem jus, pagando-se em primeiro lugar aqueles que têm alguma preferência (créditos fiscais, trabalhistas, garantidos por hipoteca, penhor, etc.), e somente depois os credores quirografários, estes na ordem em que foram realizadas as penhoras (aplicando-se, pois, o princípio prior tempore, potier iure)" ("Lições de Direito Processual Civil", Ed. Lumen Juris, 7ª edição, 2004, pág. 329)

Não tendo a parte recorrente formulado pretensão nesse sentido, ultrapassado o levantamento das quantias obtidas em leilão judicial, dessume-se estar precluso o protesto por preferência, devendo a Fazenda Estadual buscar em outros bens a satisfação de seus créditos.

Assim, afigura-se impertinente qualquer reparo no aresto hostilizado, razão pela qual deve ser negado provimento ao recurso especial.

É o voto.

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