para sempre e mais

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Page 1: Para Sempre e Mais
Page 2: Para Sempre e Mais

Capítulos

01. Um pontinho azul

02. De um verde que nunca se viu

03. A luz mais provável

04. Todos os lados

05. Do outro lado

06. Eu não quero perder nenhum momento

07. Histórias e Bicicletas

08. Museu, blusas e Sushi

09. Entre os vinte

10. Última noite na terra 11. Depois da nuvem

12. Novos céus e nova terra

13. Começando tudo

14. Sempre foi óbvio

15. Família

16. O primeiro ano

17. Talvez não estejamos sozinhos

18. Lembranças

19. O sonho

20. Para sempre e mais

Page 3: Para Sempre e Mais

Um pontinho azul

27 de Julho de 2111 10:37 - Angra

Uma das coisas que Dan mais detestava, era assim que o chamavam, pois seu nome na

verdade era Adan, era quando faltava água. Em seu mundo, água era praticamente um problema,

que fazia parte da grande esfera de problemas, como o calor e alimentação. Todos tinham o

costume de pôr a culpa nas grandes empresas e grandes corporações, pelo que estava

acontecendo, e no meio de todas essas coisas, um pensamento óbvio pairava no ar. Um

pensamento, sobre, o fim de todos os recursos. E se tudo realmente acabasse? Haveria outro

lugar? Outro mundo? Era o que todos, ou quase todos, poderiam se perguntar a esta altura, mas

ninguém tinha uma resposta segura, mesmo em meados do ano de dois mil cento e onze.

Mas mesmo para Dan que estudava física e gostava de filmes de ficção, talvez essa não

fosse sua maior preocupação, no momento. Não sei se o fato dele estar no começo do seu

doutorado em física aos vinte e cinco anos, e estar trabalhando em um projeto particular

chamado por ele de “do outro lado”, eu diria que ele estava pensando sobre o fim das coisas. O

fato era que existiam também outras coisas mais importantes com que se preocupar, e uma delas

era sua amizade com Marah. Às vezes em algum lugar, talvez alguém achasse estranho um cara

com oito anos a mais que uma garota de dezessete anos, constituir algum tipo de amizade que

pudesse ser considerada como uma amizade consistente, mas em alguns lugares isso não

importava. Sua amizade não significava que estavam colados, grudados com fitas dupla face em

suas personalidades, gostos e escolhas, mas que conseguiam compartilhar coisas comuns,

mesmo morando em distritos diferentes, e sendo um pouco diferentes também.

Dan morava em um apartamento com seu pai, sua madrasta e seus dois irmãos mais

novos, um de dezenove e um de dois anos, em um bairro chamado Florencia na área

metropolitana, que era comumente tranquilo, a não ser nas chuvas, que muitas vezes causavam

pequenos problemas, mas também não era toda vez que chovia, inclusive nos últimos meses,

que se tornaram excessivamente quentes, para todas as pessoas. Marah morava na capital do

estado, Angra, em um condomínio com seu pai em sua mãe. Era filha única e estava terminando

o ensino médio, no que ela considerava o melhor ano de sua vida.

Dan e Marah se conheceram numa livraria digital do shopping Passeo quando Dan

estava tentando saber o preço de um livro pelo leitor de HRcode, leitor que analisava as

informações em impressões de traços horizontais que continham dados de algoritmos

criptografados, e não estava conseguindo. Desde que os códigos de barra, QRCodes, BinCodes

foram totalmente banidos, Dan tinha certa dificuldade de saber as coisas, o que parecia ser

estranho para um estudante como ele. Ele estava lá parado, segurando um livro cartão

transparente de física chamado Do outro lado, Quebrando o Tempo e o Espaço, de um escritor

britânico chamado Stephen, tentando descobrir algo sobre a ligação de dois pontos no espaço,

algo sobre buracos de minhoca e bizarrices astronômicas.

-Mas o que é isso? Pensou Dan – Eu nunca consigo fazer estas coisas lerem, quem

colocou esse novo aparelho aqui, ele parece tão antiquado? Murmurou ele baixinho passando o

leitor sobre o diagrama do livro cartão que ele não estava conseguindo usar.

Bem atrás dele vinha uma garota segurando outro livro cartão transparente na mão

chamado “Ao cair da noite”, uma história de grande sucesso nos últimos dias. Embora, o livro

Page 4: Para Sempre e Mais

estivesse se tornando um best-seller, ainda não era muito conhecido no país, e só ela estava ali

para compra-lo, ou não.

-Nossa isso deve estar quebrado – disse ele sentindo que alguém se aproximava.

A garota ainda estava lendo a orelha interativa holográfica de um gráfico virtual do

livro, muito empolgada, cheia de pensamentos curiosos sobre o seu conteúdo, como alguém

normal fazia.

Ela olhou para frente, e continuou lendo. Dan virava e revirava o livro cartão. Estava

começando a ficar tenso e irritado, mesmo sabendo que só havia uma pessoa atrás dele, que

aparentemente, parecia não se importar.

Não havia muitas pessoas na livraria, e as que estavam ali, eram do tipo de pessoas que

leem as abas digitais dos livros e saem, pessoas do tipo, apenas curiosas. Era final de julho e as

outras partes do shopping estavam com muita agitação devido algumas promoções.

Dan estava olhando agora se no livro cartão tinha algum outro lugar com algum outro

HRcode, quando sentiu um toque de leve em seu ombro.

-Com licença moço, você não está conseguindo ver o preço e as referências? Perguntou

Marah simpaticamente com um sorriso.

-Bom parece que sim, eu não entendo, eu sempre não consigo – respondeu Dan com um

tom desajeitado.

-Bom, me deixa ver se consigo te ajudar – disse Marah estendendo a mão para pegar o

leitor – Parece que você não está conseguindo por conta disso aqui.

Marah pegou o leitor, olhou e com um simples toque mudou uma pequena trava, e fez

um teste. Um barulhinho soou dando as informações necessárias sobre o produto.

-Bom, agora deu certo, obrigada – disse Marah satisfeita em saber o preço de seu livro

cartão.

Logo em seguida ela se foi.

Dan pegou o leitor novamente e passou por sobre o código, e depois de um pequeno

barulho, lá estavam todas as informações que ele precisava, e seu próximo passo seria ir ao

caixa fazer o pagamento com seus créditos. Ele também estava empolgado com seu novo livro.

Quando ele chegou, ele se deparou com uma nova situação.

-Desculpe-me moça, mas não tem créditos suficientes na sua conta – disse o atendente

do caixa.

-Sério, dá uma nova olhada senhor, não pode ser. Eu devia ter conferido em casa, mas

estava tão apressada.

O atendente olhou novamente, e seu CP espelho deu um aviso em vermelho, com a

inscrição, saldo insuficiente para compra.

-Desculpe, mas não tem saldo.

Marah fez uma expressão de tristeza e um bico quando Dan olhou para ela.

Page 5: Para Sempre e Mais

-Quanto custa o seu livro senhorita? Perguntou Dan.

-Vinte nove e noventa – respondeu ela meio surpresa com a pergunta.

-Eu posso pagar para você, como gratidão pela a sua ajuda com o leitor de códigos?

-Sem dúvida – disse Marah com um grande sorriso estampado no rosto.

O atendente olhou esperando e Dan lhe deu o cartão com os créditos.

-Pronto senhor – terminou o atendente. Tenham um bom dia.

-Bom dia – responderam os dois e saíram.

...

13 de Abril de 2115 17:24 – Proximidades de Plutão / 6 bilhões de quilômetros de

distância da Terra aproximadamente.

A nave estava se aproximando da orbita de Caronte, dava pAra ver nos gráficos do

espelho onde passava a orbita. Se olhassem pela grande janela de vidro, poderiam ver que o

planeta anão que fica depois de Netuno estava cheio de algumas crateras grandes que

aparentavam terem sido feitas recentemente. Tinham acabado de passar por Plutão, um planeta

anão frio e morto como Caronte seu satélite. Os dois estavam nos limites do sistema. Dan e

Marah também estavam na nave.

Fazia já dois anos e pelo menos oito meses que tudo tinha acontecido desde que

entraram no criotubo e os dois ainda não acreditavam que poderiam ser os únicos seres humanos

vivos desde que a êxtase foi interrompida pela nave.

A coisa mais óbvia que eles pensavam era se iriam sobreviver por muito tempo, naquela

prisão voadora abastecida de hidrogênio e com suprimentos que eles ainda não tinham calculado

quanto tempo duraria.

-Estou com medo e estou exausta Dan – desabafou mais uma vez Marah com lágrimas

nos olhos.

-Eu também Marah. Ainda não sei o que pensar direito. Passamos muito tempo

dormindo, mas as imagens ainda estão em minha mente mesmo tendo saído quase desacordado

de um lugar e entrando em outro em poucos minutos – continuou Dan enquanto a abraçava.

Nesse momento eles estavam na frente da grande nave olhando todas as estrelas a sua

frente. Plutão e Caronte estavam sendo deixados para trás há alguns minutos. Eles estavam indo

a uma velocidade de um quarto da velocidade da luz. Estavam com todas as imagens vividas em

suas mentes do que aconteceu meses atrás.

-Me diga Dan – disse Marah o abraçando firmemente e com voz embargada – Qual o

propósito disso? Porque eu e você? Outras pessoas não deveriam ter tido a oportunidade? Será

que outras naves estão por aí com outros sobreviventes? Hein?

-Depois que acordamos, eu mandei muitas mensagens para todos os lados, mas não veio

nenhuma resposta. Temo que não venha nenhuma, pois durante a nossa saída do planeta a nave

não detectou e não vi pelos vídeos nenhuma outra nave de fuga em quaisquer uns dos lados.

Mas vamos esperar, não podemos perder as esperanças. Devemos aproveitar o tempo que temos

Page 6: Para Sempre e Mais

para saber o que vamos fazer, não creio que estejamos aqui apenas para acabar, se não teríamos

morrido junto com todos quando os meteoros atingiram o planeta. Vou continuar vasculhando e

pesquisando os mundos mais próximos que nos deem alguma chance.

-Se soubéssemos, poderíamos ter feito algo, não sei. Como as autoridades não viram

que aquela grande rocha estava indo para nosso mundo? Estou me sentindo inconformada de um

jeito que não se pode explicar – disse Marah chorando de vez.

-Marah – disse Dan puxando-a e olhando nos seus olhos – temos que ser fortes agora. A

coisa mais sensata que temos que fazer é nos mantermos vivos. Tem que haver alguma coisa

para fazer. Não aceito que não haja nenhuma saída, certo?

-Tá – respondeu ela com voz chorosa.

-Vamos descansar um pouco. Ainda estamos tensos. Vou continuar mandando

mensagens, para ver se encontramos alguém que tenha sobrevivido. E precisamos saber onde

estamos, ficamos dormindo por algum tempo.

...

27 de Julho de 2111 11:01 – Angra

Na praça de alimentação do shopping Passeo.

-Nossa, então quer dizer, que você estudou física na universidade federal, está fazendo

mestrado e tem alguns projetos? Isso é demais Dan – exclamou Marah.

-É, é mesmo. Algumas pessoas não se empolgam muito, mas a física nos trouxe grandes

avanços científicos, tecnológicos e grandes prêmios nesses últimos anos, sabe – disse Dan

satisfeito.

-Não sei muito sobre física sabe, mas eu sei sim que a maioria das músicas cabe em meu

aparelho de música, porque eles descobriram algo sobre isso a muito tempo – sorriu Marah – e

também sou muito boa em química.

-E ganharam um prêmio Nobel por isso. Devemos ficar agradecidos – disse Dan

apontando para o parelho reprodutor de audio do tamanho de um polegar.

-E você Dan, qual plano ou projeto que você tem que mudará ou que salvará o mundo

algum dia? Perguntou Marah sorrindo

-Bom, este livro que acabei de comprar, quebrando o tempo e o espaço, fala sobre

transposição de matéria. Um negócio muito louco. Um tipo de assunto que já falavam há muito

tempo sabe, mas ninguém nunca teve seu êxito com experimentos ou testes.

-E qual é o propósito Dan? Perguntou Marah encostando os cotovelos sobre a mesa

transparente e repousando o queixo sobre as palmas das mãos inclinando-se para ouvir.

-Imagine o espaço, com estrelas, planetas e todas as coisas – disse Dan pegando um

papel – e estes são os pontos A e B, e que eles estão distantes milhares de anos luz um do outro

certo?

-Certo!

-A ideia é criar um buraco que dá a impressão que o espaço é dobrado como esta folha –

disse Dan furando a folha com um palito de petisco – e instantaneamente você sai de um lugar e

entra em outro pelo buraco produzido dessa forma. Acho que é a maneira mais simples de

explicar – disse Dan sorrindo.

-Então é como se fosse um terrível buraco negro?

-Não, não. Buracos negros são os objetos mais estranhos do universo. São

extremamente perigosos, pois não se tem certeza que o que entra pode sair em algum lugar, ou

Page 7: Para Sempre e Mais

até mesmo sair de lá. Eles chamavam antigamente de buracos de minhoca ou túnel de fluxo,

mas buracos negros são estranhos e desconhecidos.

-Nossa, nunca espero encontrar um desses – disse Marah fazendo uma careta.

-Eles estão muito distantes, pelo menos até agora. Então não há perigo de sermos

sugados – riu Dan – E você Marah, está estudando no ensino médio ainda não é?

-Isso mesmo, e olha, tem sido o melhor ano de minha vida na escola. Tenho me saído

muito bem e meus amigos de classe são ótimos.

-Hum.

-Pretendo estudar biologia sabe quando sair da escola, mesmo que este mundo não

esteja lá essas coisas pretendo estudar para encontrar alguma forma de ajudar – disse Marah.

-É mesmo, nunca se estudou tanto física e química quanto nos últimos anos. Estamos

todos precisando de uma saída para muitos problemas.

-E isso é uma coisa que afeta muito mais aqueles que não têm condições não é? Por isso

tem muita gente envolvida nisso. Mas eu temo que estejam usando qualquer tipo de pesquisa

para pôr em prática objetivos escuros e terríveis.

-Sabe, eu vi uma fotografia uma vez que foi tirada depois do cinturão de asteroides, lá

perto do sexto planeta do nosso sistema solar.

-Hum.

-Essa foto – continuou Dan – tem um minúsculo ponto em um tom fraco de azul, um

pixel sabe e é algo aterrador, porque nesse pontinho estão todas as coisas que conhecemos.

-Nossa. É nossa humilde casinha pequena – replicou Marah.

-Isso, e nessa humilde casinha pequena, está toda história, todas as conquistas, todas as

derrotas, todos os valores, todos os reis, todos os trabalhadores, todos os sonhos, todos os

planos, todas as paixões, todas as famílias. E percebemos o quão pequenos nós somos quando

conhecemos a vastidão do universo que está lá fora. Somos como poeira voando no nada em

rumo a algum lugar. Já imaginou. As coisas que muitas vezes consideramos de alguma forma

soberba, não significam nada nesse momento. Quando vemos essa imagem, descobrimos do que

se trata ser um humano mesmo. Somos muito pequenos. Somos como um pequeno pontinho

azul no céu.

-Nossa. É deprimente e não é ao mesmo tempo.

-E esse seu livro. É uma história sobre vampiros. Já ouvi falar um pouco, mas não sei os

detalhes. O que você me diz? Disse Dan com um meio sorriso de curiosidade inocente.

-Bom. É sobre uma história de vampiros rivais, que querem dominar a Europa. Aí tem

um romance proibido entre uma moça de um lado e um rapaz do outro que dá o ápice da história

toda. Só lendo pra ver. Eles estão pensando em fazer um filme, talvez fique bom.

-Um filme. Gosto muito de filmes.

-Eu também Dan. Que tipo de filme você gosta?

-De ficção. Gosto muito.

-Ficção é claro. Um físico está sempre ligado em ficção – disse Marah sorrindo.

-Às vezes, nem todos, sabe, nem todos os físicos acham ficção uma coisa boa, nem uma

boa referência, e nem contem a verdade sobre fatos. Afinal é fantasia. Mas mesmo assim ainda

acho que, imaginação é a fonte para muitas coisas, como disse uma vez um grande cientista, e

sem esquecer que muitas coisas foram inspiradas em filmes.

...

Page 8: Para Sempre e Mais

27 de Julho de 2111 13:22 – ESO / Chile

Nesse momento dois astrônomos estavam observando corpos errantes não ligados a

estrelas em um observatório na América do Sul.

-Lian, qual a possibilidade de um corpo adquirir invisibilidade em sua massa?

Perguntou Ress.

-Bom deixe-me ver. Creio que a principal composição proveniente do corpo deva ser a

causa, talvez afetada pela simples luz solar, mas isso é uma suposição rápida e fantasiosa –

respondeu Ress.

-Sabe, isso é o que me intriga, pois se fosse apenas uma simples refração, eu não

questionaria tanto, mas o fato é que a massa do corpo poderia ser completamente neutralizada

com este fenômeno.

-Existe um grupo de pesquisadores que estão empenhados em descobrir esse problema,

mas vou logo avisando que eles são pessoas que não tem muito crédito na comunidade

científica, pois um corpo ter sua massa neutralizada é praticamente impossível, embora não

excluamos a possibilidade.

-Você não consegue conceber em sua mente, como uma coisa está em um estado de

massa neutra e ainda sim, existir consistentemente – continuou Ress.

-É um problema terrível. Imagine um objeto rochoso com capacidade destrutivas

globais em rota de colisão, mas até poucos momentos antes do impacto, ele permanece invisível

a todos os dispositivos e olhos.

-Não haveria chance.

-Nenhuma.

...

27 de Julho de 2111 13:53 – Angra

-Dan, foi um prazer te conhecer. Sério mesmo. Acho que não foi por acaso que o leitor

estava travado e os meus créditos estavam insuficientes, não é?

-É mesmo. Eu digo a mesma coisa, você foi muito gentil comigo naquela hora. Isso que

dizer que quando eu terminar as minhas pesquisar e apresentar meu projeto, vou citar o teu

nome, dizendo, vejam só a grande ajuda científica que a senhorita Marah deu para que este

momento acontecesse – disse Dan rindo.

-Ficarei ansiosa para este dia, e eu direi, vejam só agora temos aqui algo que pode salvar

nossas vidas – sorriu Marah também.

-Bem lembrado, é assim que se diz, algo que salvará nossas vidas.

-Bom, temos que ir, deixa eu te dar um abraço – disse Marah se aproximando e

passando seus braços em volta de Dan.

-Mais uma vez, obrigado.

-Obrigada também. Tenho que ir, mas depois nos falamos certo?

-Sim, sim, você pegou meu endereço na rede não é?

-Pegue sim, pode deixar Dan. Até mais – disse Marah acenando com a mão na saída

levemente movimentada do shopping.

-Até – disse Dan acenando também com a mão.

Page 9: Para Sempre e Mais

Nesse momento Dan estava satisfeito. Ele tinha conseguido o que queria, e era o livro

que carregava, e que talvez mostrasse o caminho para o que ele imaginava.

...

03 de Agosto de 2111 10:00 – Angra / Biblioteca Faculdade Federal

Dan estava cursando mestrado na Faculdade Federal da capital Angra. Seu tempo agora

tinha uma parcelas grandes em preparar sua tese e nesse momento ele estava empenhado em

conseguir produzi-la junto com um protótipo para apresentação. Talvez você esteja pensando

que deva ser algum tipo de ousadia, alguém construir um protótipo de algo durante o mestrado,

não sei, mas Dan tinha uma visão, era como se fosse um visionário.

Dan era um rapaz típico. Suas músicas favoritas estavam entre todas que faziam parte

das composições das bandas de rock alternativo, umas muito, mas muito antigas e outras nem

tanto. Ele tinha um jeito tranquilo de ver as coisas, até que estas não fossem um impedimento de

algo que ele tanto queria e fosse resolver algum problema ou fosse uma resposta para algo. Seu

comportamento às vezes, racional demais poderia causar certa estranheza ou algum desgosto

típico, mas esse não era completamente ele. Ele tinha um estilo pacato. Não fazia muito barulho,

mas quando defendia algo, você poderia encontra-lo gritando ou agitando cartazes nas

manifestações contra o governo no seu país em dois mil e noventa e quatro no mês de seu

aniversário. Acima de tudo, ele considerava a verdade como algo que não podia ser mudado,

pois o que era verdade era verdade, e relatividade colocava algo que fosse verdade no status de

opinião e gostos. Em alguns casos ele encontrava certa dificuldade, com algumas pessoas, pois

em sua época as pessoas tinha passado de um comportamento líquido para algo menos denso

ainda. Ele considerava muitos como o ar, tão rarefeito e tão disperso.

Sua altura mediana, não impressionava a muitos, embora ele apresentasse um pouco de

robustez, o que claramente tinha herdado de seu pai, se você encontrasse os dois lado a lado,

logo iria perceber a semelhança. Seus cabelos escuros eram quase lisos, não muito e que davam

um leve contraste com a cor parda escura de sua pele. Seus olhos castanhos excessivamente

escuros, pareciam duas luas negras que intimidavam as pessoas, sem nunca ele querer que fosse

isto o que ele estava querendo que elas sentissem. E neste quesito, a pressão que a visão que se

tinha dele fazia, era completada por sua voz levemente rouca e ao mesmo tempo grave. Esse era

ele, e quem não o conhecesse o julgaria diferente por sua aparência, pois a primeira impressão

não deixaria claro que ele também era um rapaz tímido, e que quando lia um livro tinha a mania

estranha de se curvar balançando. Quem o visse tinha a impressão que ele estava querendo

entrar no livro, ao vê-lo com a cabeça quase enfiada em suas páginas indo e voltando. Não era

problema de postura ou um problema em seus olhos, mas um hábito particularmente seu. Era

edifício de ignorá-lo quando ele estava lendo, o que facilitava encontra-lo em algum lugar,

especialmente em uma biblioteca. Marah o encontrou assim na segunda vez que o viu.

-Então senhor físico, é aqui que vem pegar suas ideias para dominar o mundo hein?

Disse ela de forma simpática com um largo sorriso.

-E sim –sorriu Dan – Mas ainda tenho que pegar um monte de informações, pois meu

desejo maior e conquistar o universo e tê-lo só pra mim –disse ele levantando-se e a abraçando.

-Nossa, e não pretende nem levar alguém com você nessa viagem de ter o universo só

para você? Pois minha sugestão seria fazer isso pelo menos com uma pessoa do lado, não?

Perguntou ela terminando o abraço e sentando-se na cadeira na mesa redonda onde estavam só

os dois, na varanda da biblioteca da faculdade.

Page 10: Para Sempre e Mais

-É, não coloquei essa informação na pesquisa, e suponho grandemente que ela deva ser

prioridade.

-É mesmo, seria triste ficar sozinho para sempre – riu Marah – Então, tudo bem não é?

-Tudo sim senhorita. E com você?

-Tudo bem, ou o bem está terminando, pois as aulas do segundo e último semestre do

terceiro ano começam daqui a alguns dias, embora eu goste muito. Isso quer dizer que as férias

acabaram.

-Férias, desconheço essa palavra. Pode me dizer o que significa? riu Dan – Mas então o

que você fez nessas férias Marah, servirá de algum modo para eu conhecê-la melhor, não acho

que você gosta só de vampiros, não é?

-Bom, é mesmo. Deixa eu ver. Nos primeiros dias eu viajei para visitar uns familiares.

Voltei. Depois fui passar uns dias na casa de uma amigas de classe, o que foi muito bom. Estive

em um aniversário. Aproveitei para ver uns filmes que estavam em cartaz e por último adquiri

um bom livro e ajudei um rapaz com o leitor de códigos – terminou ela rindo.

-Nossa, um tempo bem gasto, pois afinal, quase não se há tempo, nesses dias sem

tempo.

-É, mesmo de férias, você parece que não tem todo o tempo que precisa. E, há,

descansei bastante e tomei muito sorvete, o que gosto muito, além de ouvir muita música, todas

as que amo.

-Música, nossa. E quais são suas preferidas?

-Hum, deixa eu ver. Tem Floyyd of Summer, The Travis, On The Door e Ocean Floor.

-Um bom rock, por sinal.

-É sim e você Dan, o que curte?

-É, Kapitals, Moongers, Pluto, Paramanians e Deloreans’s.

-Estilo alternativo. Acho que não brigaremos por músicas. Os estilos são aproximados,

não é? Perguntou Marah.

-É mesmo, é mesmo.

-Talvez a única coisa que eu não entenda quando você estiver falando, seja sobre física

– riu Marah – mas, mesmo assim tem muita coisa interessante.

-Pode acreditar que sim.

-Pelo menos na escola tem muita coisa que eu sei, mas que considero chatinha, mas é

como você disse, tem muita coisa interessante. E então, sobre o mestrado, como está?

-Estou ligado no duzentos e vinte. Acho que concluo antes do fim do ano. E se der certo

vai ser o máximo. Ficarei supercontente.

-Espero sinceramente que aconteça.

-E então Marah, depois que você terminar o terceiro ano, pretende ser bióloga mesmo?

-Sim, sim. Estava pensando em estudar botânica? O que acha?

-Parece ótimo. Sustentabilidade e projetos que envolvam botânica tem crescido bastante

nos último anos. Muitos estão sendo mais cuidadosos com o meio ambiente agora,

especialmente com as plantas, que são logicamente necessárias a nossa sobrevivência nesse

mundo.

-É mesmo. Me lembro de notícias que a destruição de muitas áreas verdes causou os

piores impactos ambientais já registrados. E minha ideia é encontrar uma fórmula para o

crescimento rápido de verde em nosso planeta, além de preservar o que já temos – disse Marah

fazendo beicinho.

-É para isso que estamos estudando, para tentar salvar o mundo.

...

Page 11: Para Sempre e Mais

03 de Agosto de 2111 20:05 – Proximidades de Plutão / 6 bilhões de quilômetros de

distância da Terra aproximadamente.

Um corpo gigantesco com pelo menos cento e quarenta quilômetros de diâmetro estava

nesse momento passando por Plutão e Caronte. Carregando milhares de pedaços menores, esse

asteroide vinha a cento e dez mil quilômetros por hora. Sua massa carregada continha um fator

incomum até então desconhecido pelos cientistas. Sua massa poderia ser neutralizada, cada vez

mais que entrasse em contato com a chuva solar de uma estrela de média grandeza. E

praticamente este corpo ficaria invisível, e perfeitamente indetectável. Outro fator que completa

o nível de perigo desse corpo é que ele quanto maior, mais facilidade de se ficar invisível. O

metal em seu interior, composto por ligas de carbono, era quase inquebrável, misturadas com

outro metal desconhecido e quase indestrutível.

Se alguém estivesse ao redor poderia ver os impactos dos outros pedaços que colidiram

com Caronte. O objeto estava indo para o centro do sistema atraído pelo sol. Esteve vindo de

alguma forma, das proximidades do cinturão de asteroides que está além de Plutão.

...

13 de Abril de 2115 20:57 – Proximidades de Plutão / Mais de 6 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Dan estava agora lendo todas as informações, enquanto Marah tomava um coquetel pós-

sono, que foi ordenado pelo computador do seu criotubo. Então ele começou a falar na sala de

comando onde estava.

-Nave, computador ou seja lá o que for, como você se chama?

Nenhuma resposta

-Computador, você tem sistema de voz? Responda.

Nenhuma outra resposta. Dan pensou se a nave não teria esse dispositivo, porque era

uma coisa simples em todos os veículos mais simples. Uma nave desse porte teria que ter. Ele

fez uma nova tentativa.

-Dan, para computador.

Quando ele disse seu nome, uma resposta veio e gráficos virtuais apareceram em toda a

sala de comando onde ele estava.

-Boa noite Dan. Reconhecendo voz e informações. Todas as operações estão em

funcionamento. Sob ordens. Arca um operante – disse uma voz sintetizada de computador.

Ele olhou e pensou sobre o que iria dizer.

-Arca um, exibir relatórios de acontecimentos, sobre o planeta terra e sobre nossa

posição.

Page 12: Para Sempre e Mais

-Arca um. Iniciando rotina de exibição das informações.

Uma imagem se posicionou nos espelhos escuros frontais. Dan viu a terra. Estava lá

suspensa como sempre esteve. A lua estava lá e podia-se vê-la inteiramente. Parece que a

imagem estava com sua gravação acelerada, pois foi quando Dan viu meteoritos vindo em

direção a lua e a atingiram, mas eram muitos e se direcionavam a terra, mais alguns segundo

depois, um enxame de meteoritos se aproximou da Terra e começou uma verdadeira chuva

deles. Dan se lembrou desse momento. Foi quando ele estava com Marah no observatório no

Chile, mas ninguém sabia que isso ia acontecer.

-Arca um, retroceda a imagem antes do impacto dos meteoritos na lua até minha ordem.

-Arca um retrocedendo imagem.

Um breve momento.

-Pare. Mostre-me o espaço aberto atrás da lua.

-Mostrando espaço aberto atrás da lua.

-Pare. Onde estão os meteoritos Arca um?

-Os meteoritos não se encontram no espaço aberto Dan.

-Mas como eles apareceram?

-Eles podem ser vistos apenas quando já estão perto da lua Dan.

-Mostre-me o vídeo e três terços de exibição, antes dos meteoritos atingirem a lua.

-Arca um, mostrando o vídeo em três terços de exibição.

O vídeo retornou, mas só que mais lento. Dan ficou observando. De repente os

meteoritos aparecem do nada e atingem a lua, Dan reparou que a terra estava fazendo sombra

sobre a lua e os meteoritos apareceram na faixa da sombra, mas que ao saírem da faixa, eles

sumiram quando entraram em contato com a luz do Sol.

-Informar sobre composição e como se dá a refração dos meteoritos Arca um.

-Os meteoritos, são compostos de liga de carbono e um elemento sólido desconhecido

na tabela, o que ocasiona à neutralização de sua massa e refrata a luz que incide sobre eles.

-Os meteoritos, destruíram a Terra, Arca um? Perguntou Dan.

-Negativo.

-O que destruiu a Terra, Arca um?

-Um asteroide.

Dan se calou por um momento

-Quantas pessoas sobreviveram, Arca um?

-Nenhuma. Nenhuma forma de vida poderia ter sobrevivido.

-Algum registro, de alguma outra nave, Arca um?

-Nenhum registro.

-E quais as possibilidades de encontrarmos um novo mundo, Arca um.

-Possibilidades não computadas ou dados imprecisos.

Dan se calou por um momento novamente.

Page 13: Para Sempre e Mais

-Quantas pessoas estão nessa nave, Arca um?

-Duas.

-Quantas pessoas sobreviveram à destruição da Terra, Arca um?

-Duas.

Dan sentou no assento preparado para o capitão da nave. Colocou as mãos nos olhos e

começou a chorar soluçando. Nesse momento uma sensação de terror percorreu o seu interior.

Não era uma simples perca. Não foram uma ou cem pessoas que morreram. Foi um planeta

inteiro que foi destruído. Com todas as formas de vida.

Todos os homens, todos os animais, todas as plantas, todas as cidades, toda a água, todo

o ar, todas as possibilidades se foram. Todas as histórias, todas as invenções, todas as

conquistas, toda obsessão de nacionalismo, todas as pessoas conhecidas, todas as pessoas que

eram amadas, toda mistura de alegrias e sofrimento, cada herói, cada criminoso, cada pai, cada

mãe, cada político corrupto, cada superstar, todas a pessoas estavam nesse único mundo; todas

as conquistas de homens que foram apenas senhores momentâneos de um fração desse pequeno

ponto, na grande escuridão cósmica, toda pretensão que se tinha algum lugar privilegiado, tudo

que foi construído, todos os planos, todas as vidas, não existiam mais.

Dan, sempre sentiu, ou sempre se manteve informado que de alguma forma, talvez

improvável, em sua mente isso acontecesse. Mas eram apenas especulações e estudos

científicos. Ninguém acreditava de fato que o planeta poderia ser destruído. Ninguém acredita

até que aconteça. Mas não havia, nesse momento mais nenhuma pessoa para acreditar que isso

acontecesse também. E ele muito menos acredita que ele e Marah agora são os únicos seres

humanos vivos, que agora estão distantes do que era a sua única casa, seu único mundo.

Page 14: Para Sempre e Mais

De um verde que nunca se viu

14 de Agosto de 2111 9:00 - Angra / Jardim Botânico

Era um lugar que tinha todo tipo de planta. Tinha suporte para abrigar uma variedade

imensa de fauna, de todos os lugares. Se alguém perguntasse a alguns de seus funcionários eles

saberiam dizer prontamente, que aquele era o melhor centro botânico do continente do sul e

onde estavam todos os tipos de plantas. Não havia dúvidas. Quem chegasse lá entendia logo de

cara que ali tinha muitas plantas, e era uma floresta imensa, um grande labirinto, se bem que

tinha um labirinto mesmo.

O jardim botânico de Angra, a capital do estado, era um lugar muito requisitado, por

todo tipo de pessoa, especialmente estudantes. Marah deu pulos de alegria quando Dan a

convidou para ir lá numa manhã, o que foi de grande proveito.

-Bom, eu me lembro que fui lá uma vez, quando estava no segundo semestre. Não tinha

nada a ver com a faculdade, mas eu fui. Estudantes parecem ter algum tipo de motivação para

saber tudo que se pode saber – riu Dan.

-É mesmo. Nesse momento, quero saber tudo o que se pode saber – riu Marah também.

Sabe um lugar fantástico para algumas pessoas. Era esse lugar. Logo na entrada com

seus grandes portões de ferro, moldados em estilo clássico, podia-se ver a grande avenida de

palmeiras imperiais gigantescas, que estavam dos lados da estrada. Os jardins se estendiam,

logo após os campos, e os centros de pesquisa estavam em um lado e a grande estufa de vidro

em outro lado nos fundos do grande terreno. Era como se fosse uma cidade verde cheia de

surpresas, e todo tipo de planta. Um lago tomava conta de um dos lados e era rodeado por

árvores médias. Grandes galerias e pequenos prédios tomavam conta de uma parte do local.

Tinha muita influência barroca nas construções que foram preservadas ao longo do tempo.

Embora sempre houvesse muita gente ali, Dan e Marah estavam à vontade e com tempo de

visitar todos os locais do jardim como desejavam.

-E olha só o que eu trouxe. Uma câmera fotográfica antiga – disse Dan tirando o abjeto

da mochila que carregava.

-Nossa e além de físico você é fotografo também? Perguntou Marah sorrindo.

-Só nas horas vagas Marah.

-Nossa, e quais as outras coisas que você faz, nas horas vagas.

-Hum, algumas muitas coisas – disse Dan simpaticamente – Mas veja – disse ele

apontando a câmera para Marah que sorriu instantaneamente.

-Não! – ela disse num pequeno grito.

-Não ficou tão ruim assim – disse Dan mostrando a câmera.

-Deixa eu me ajeitar – disse Marah mexendo nos cabelos.

-Pronto?

-Pronto.

Marah fez uma pose. Fez outra pose. E foi fazendo poses por toda estrada de palmeiras

imperiais. Dan parecia o seu fotógrafo particular. A luz do sol da manhã parecia dar um toque

incomum a todas as fotos. Dan não percebeu, mas ele de alguma forma começou a se sentir

empolgado em fazer isso. Ele gostava de fotos, gostava de fotografar coisas. Mas ele gostou

Page 15: Para Sempre e Mais

quando viu que Marah estava nas fotos. O que era isso? Como seus olhos verdes, seu nariz

arrebitado, seus lábios pequenos, e seu cabelos ondulados castanhos fizeram aquilo com aquelas

fotografias? E aquele seu vestido floral? Onde ele tinha conseguido ele? Como Dan não havia

notado? Havia muito verde ali que deixava as fotografias belas. Havia outra coisa linda,

determinada pelo tipo e quantidade de pigmentos na íris. Um par de olhos verdes de alguma

beleza incompreensível. De um verde que nunca se viu.

Quando eles terminaram a sessão de fotos de Marah no jardim, ela mesma disse que

tinha trazido uma pequena câmera para gravar alguns vídeos. Agora podia ser um registro cheio

de verde, bem satisfatório. Os dois estavam satisfeitos.

...

15 de Abril de 2115 13:39 – Região do Cinturão de Kuiper / Mais de 6,1 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Um par de olhos verdes olhava junto com um par de olhos escuros a aproximação de

objetos gigantescos a poucos milhares quilômetros de sua nave, Arca um.

-Não tive nenhuma resposta ainda – disse Dan.

-Ainda estou tentando acreditar no que aconteceu – replicou Marah.

-E eu também.

-Mas onde estamos exatamente? Parece que estamos indo tão rápido – continuou

Marah.

-Eu dei uma olhada nos relatório de voo, e descobri que estamos muito longe de casa.

Veja – disse Dan mostrando para a exibição das estrelas bem no espelho visor da nave – Dan,

para Arca um, mostrar sol desta distância.

-Mostrando sol – soou uma voz sintetizada.

-Estamos no lugar mais longe que qualquer ser humano foi. Nós estamos saindo do

sistema solar Marah. Estamos viajando desde que o asteroide destruiu tudo. Enquanto

dormíamos, viajamos muito rápido. Mas mesmo assim, chegamos aqui em pouco mais de dois

anos. Esta nave tem uma potência inacreditável. Um reator, que causa fissão e fusão nuclear que

libera energia suficiente para uso indeterminado de tempo, com um impulso inacreditável.

-Não há como voltar não é? Perguntou Marah.

-Há sim.

-Então porque não voltamos?

-Porque o planeta não pode ser mais habitado. Talvez demore uns mil anos até que a

atmosfera comece a se estabilizar junto com a era glacial que começará, por conta das nuvens

negras que foram produzidas. Não se pode ter mais vida lá.

-Estou com medo. Não existe outro lugar Dan?

-Ainda eu não sei Marah.

-Ai, o que vamos fazer agora?

-Sabe Marah, existe uma possibilidade de encontrarmos outro mundo. Muitas pessoas,

cientistas astrônomos e físicos estavam engajadas nisso nos últimos anos. Creio que exista

alguma informação desse tipo aqui nessa nave.

-Mas e toda aquela história sobre Marte? Não poderia ser habitado. Já tínhamos

mandado sondas e robôs para lá e até fomos lá. Não haveria possibilidade?

Page 16: Para Sempre e Mais

-Haveria, mas precisaríamos de muito tempo e recursos.

-Como assim?

-Tinha um projeto que se chamava terraformação. Algo como fazer a mesma atmosfera

da terra com processadores de ar. Tínhamos planos de enviar terraformadores para Marte, para

iniciar algum projeto, mas demoraria muito tempo e o custo ia ser alto demais. Talvez nem

desse certo devido à distância de Marte do Sol. As temperaturas são diferentes, o solo, e tinha a

questão da água. Tínhamos que nos adequar. Nunca iria ser a mesma coisa. Tinha possibilidade,

mas levaria muito tempo, até nos estabelecermos, até estabelecermos uma condição segura.

-Se tivessem pelo, menos tentado, mas não, nunca quiseram. A humanidade, sempre

caminhou com dificuldade para compreender as coisas. Lidar com seres humanos era uma tarefa

muito difícil. O homem não se suportava. Às vezes era preferível um animal de estimação como

amigo; eram mais dóceis e inteligentes – sorriu Marah depois de um tempo séria.

-Alguém com certeza diria, Compre um cachorrinho, ou um camelo, ou um panda! São

lindos e dóceis e nos fazem esquecer os humanos – riu Dan um pouco também olhando para as

estrelas pelo vidro.

-Mas agora não há nem animais e nem homens, para acertamos nossos sentimentos e

frustrações pessoais.

Dan olhou para Marah. Ela já o estava olhando. Aqueles olhos verdes sempre tiveram

algo que ele não compreendeu. Parecia que tudo que ela falava era certo. Havia algo agora, que

ele não entendia completamente sobre ela. Ele não conseguia tirar os olhos dela.

Era óbvio. Tinha um pensamento óbvio, que lhe passou pela mente, e parecia flutuar

entre os olhos deles. Só estavam eles dois ali, de todas as pessoas do mundo. Eram, o único

homem, e a única mulher viva. Ele virou o rosto rapidamente e continuou.

-Sabe. Lembra-se daquele meu projeto?

-Sim. Lembro sim – os olhos de Marah pareciam mais brilhantes nesse momento.

-Eu o testei, alguns dias antes de partirmos.

-Sério? E como foi.

-Deu certo. Numa pequena distância e com um pequeno objeto.

-No que está pensando?

-Vou pensar mais um pouco. Deixa, era só uma coisa – disse Dan fazendo uma careta.

-Diz Dan. Os nossos pensamentos agora, não devem ser escondidos. Não há motivo,

para esconder, se é algo para nossa sobrevivência. Não será nada de estranho. Não há loucuras

nesse momento. Diz.

-Se encontrarmos um planeta, que é nesse momento aparentemente improvável, isso

pode nos levar para lá – respondeu Dan sentindo a brutalidade cósmica na lógica das palavras de

Marah.

-Isso já me deixou menos triste. Menos desamparada. Com mais esperança.

-Temos que pensar assim. Vamos conseguir.

-Vamos, vamos sim Dan, nós dois.

...

14 de Agosto de 2111 10:00 - Angra / Jardim Botânico

Page 17: Para Sempre e Mais

Dan e Marah ouviam atentamente as explicações do professor enquanto ele mexia nas

plantas dentro dos vasos. Incontrolavelmente Dan já tinha registrados umas quinhentas imagens

e uma hora. Marah estava maravilhada e filmava tudo que podia.

-Bom pessoal, continuando. O processo de fotossíntese, se torna bem mais rápido para

algumas plantas dependendo das condições e da quantidade delas. Esta planta pode estar num

local muito rigoroso para o processo como a base de um vulcão em atividade regular. Ao redor

do local o ar sempre é mais carregado de carbono, mas no círculo em derredor o ar pode ser

incrivelmente limpo e denso, por conta dessa plantinha, Fillosdeomini Camppus. Ela cresce

muito rapidamente em solos diferentes, e quantidade de luz variadas.

-Ela é fácil de ser cultivada, professor. Tipo, pessoas simples, podem ter ela? Precisa de

algum cuidado especial? Perguntou alguém do grupo.

-Sim, sim. Não existem muitos mistérios. O cultivo é simples. Particularmente fácil.

Jogue uma pequena semente de suas pequenas flores no solo e em um dia ou pouco mais que

isso, algo começa a brotar – disse o professor do jardim botânico – só precisa ser regada com

certa regularidade de dois dias durante sua fase de crescimento. E uma coisa boa é que vocês

poderão levar uma pequena muda dela para casa como presente de sua visita ao jardim.

-Obrigado professor.

...

14 de Agosto de 2111 12:44 – Proximidades de Netuno

Um planeta de coloração azul, e algum tipo de verde azulado, estava bem a frente de um

objeto que se movia rápido. O sol tinha o tamanho de um pequeno globo brilhante e iluminava

até ali.

Pedaços gigantescos de rocha vinham, junto do asteroide carregado, rapidamente e sem

impedimento.

Uma faixa de detritos vinha sendo deixada para trás. Uns pedaços foram atraídos por

Netuno que se mostrava imponente naquela vastidão cósmica perto dos confins do sistema solar.

Uma vista denunciaria o tamanho colossal de Netuno e seus finos anéis que circundavam o

planeta. De longe o asteroide parecia um ponto e não causava qualquer impacto diante do

grande planeta gasoso azul. Até mesmo o sol, tão distante não poderia ser temido assim.

Netuno, parecia um mar imenso flutuando na escuridão. Frio e desconhecido. Distante de todos

os outros, mas que perto de si, tinha um objeto destruidor passando rápido. Sua gravidade não o

atraiu, e o asteroide continuou sua viagem, sem ser incomodado pelo grande planeta azul

gasoso.

...

14 de Agosto de 2111 11:46 - Angra / Jardim Botânico

Dan estava junto com Marah agora perto do lago do jardim botânico.

Page 18: Para Sempre e Mais

-Ainda bem que essa muda da planta é pequena – disse Marah.

-É uma planta que tem certa beleza. Vocês se completam – sorriu Dan.

-Obrigada. Vou levá-la para casa e cuidar bem dela para usar quando for necessário.

-Será que ela pode ficar um pouco dentro da mochila. Acho que pode ficar, não?

-Acho que sim. Por quê?

-Estava pensando em irmos no labirinto verde. Você viu no mapa? O que acha?

Perguntou Dan.

-É uma ótima ideia. Coloque a planta na mochila então.

O labirinto tinha em sua maior parte um tipo de planta que era fácil em seu manuseio e

corte. Os muros estendiam-se até uns três metros de altura de maneira uniforme. Sua largura era

de um metro. E tinha meio quilometro quadrado. Havia bancos de concreto dentro do labirinto,

para quem desejasse sentar-se para descansar ou conversar. Um mapa era dado para as pessoas

que desejavam se aventurar, e Marah estava com esse mapa neste momento perto da entrada do

labirinto junto com Dan.

-Agora que estou aqui e que estou vendo esse mapa em suas mãos, sinto que estou com

algum tipo de medo de perder-se – disse Dan olhando para a entrada enquanto algumas pessoas

entravam de grupo ou de dois em dois.

-Bom acho que é uma aventura – disse Marah – creio que não ficaremos perdidos para

sempre – terminou ela rindo.

-Bom, nesse caso, não solte de minha mão menina – riu Dan meio sem jeito, sentindo

um problema.

-Não se preocupe, acho que não chegaremos tarde para almoço – disse Marah

positivamente dando um sorriso leve.

-Bem lembrado. O almoço nos ajudará a encontrar, o caminho, ou melhor, o desejo pelo

almoço.

-Pois vamos.

-Vamos.

A entrada do labirinto do jardim botânico tinha quatro opções de sentido para quem

quisesse continuar com a aventura. Muitos ouviam histórias de pessoas que entraram pela

manhã e só conseguiram sair à noite, e outras lendas de pessoas que se perderam para sempre, o

que de fato era irreal. Dan e Marah seguiram para o corredor que se estendia à direita. Pela

parede verde podiam-se ver placas com algumas inscrições do tempo em que o labirinto foi

construído. Seguindo pela longa parede encontravam-se também, luminárias elétricas que

acendiam a noite, mas mesmo com elas nenhuma pessoa ousava aventurar-se a noite pelas

entranhas daqueles corredores verdes.

Se a imensa parede continuasse sempre sem uma interrupção, poderia ser fácil demais,

mas depois do primeiro desvio para a esquerda, tinha-se mais a frente outro desvio para a

esquerda, que levava aqueles que estivessem ali para mais adentro do labirinto; Dan e Marah

decidiram seguir.

-Então Marah, o que você mais gosta de fazer quando tem algum tempo livre, sei lá,

quando não se há muito a fazer? Perguntou Dan com certo desconforto e insegurança de quem

não sabe onde está em meio a paredes verdes todas iguais.

Page 19: Para Sempre e Mais

-Bom, às vezes gosto de ir à praia. Temos o privilégio de morarmos perto do mar. Mas

quando chego lá gosto mesmo é de caminhar, uma boa caminhada. As vezes gosto de correr um

pouco, e sentir a água salgada nos pés.

-Gosto de praia também. A direita, aqui no mapa diz que esse é um ótimo caminho se

estou certo – disse Dan apontando para o mapa – e sim, gosto de correr. Se tiver uma faixa de

areia longa pela frente, eu corro até cansar. Quase não prefiro muito molhar meus pés na água

salgada. É só isso que faz Marah? Direto agora, apontou Dan para o corredor verde.

-Bom, gosto muito de seriados também. Terror. Já ouviu falar de “De Volta”?

Perguntou Marah.

-Não, do que se trata? À direita agora, acho que falta pouco – eles dobraram em uma

esquina do labirinto.

-Bom, fala de um experimento que foi feito para criar a cura para o câncer, mas que deu

errado. Um vírus poderosíssimo se espalha e infecta as pessoas, causando a morte delas. Um

vírus que destrói a funcionalidade do cérebro da pessoa, e faz com que apenas sua função básica

de se alimentar se torne excessivamente grande, mas de forma descontrolada e sem algum tipo

de racionalidade. Mas nesse estado eles já estão mortos. São como mortos vivos. E desejam

comer tudo vivo que encontram pela frente. É como uma sede cega de devorar. E quem é

mordido, é infectado.

-Mortos vivos sempre deram muito pano para as estórias de terror desde a muito tempo.

Sabe, isso não é real, mas vejo que muitas pessoas vivem como se fosse criaturas desse tipo.

Como zumbis.

-Como assim? Direto, agora por aqui.

-Espere. Algo está errado, eu já vi essa placa antes – Dan sentiu o medo percorrer dentro

de si.

-Não, acho que não estivemos seguindo o mapa, direitinho.

-Sério deixe-me ler.

-O que tem escrito?

-Tem um número, e o que vejo é o 27. Já vi esse, sério.

-Ei olhe, tem um local com um duto onde podemos falar e ver se tem alguém que possa

nos responder.

-Pois vamos tentar.

-Olá, tem alguém aí? Perguntou Marah pelo duto que dava para outros lugares do

labirinto.

Nenhuma resposta.

-Alguém aí, por favor?

Nenhuma resposta.

-Não acredito que estamos só nós aqui. Eu vi pessoas entrando. Não acredito que já

saíram assim tão rápido – disse Dan inconformado.

-Que horas são agora? Perguntou Marah.

-São 12:30 – disse Dan olhando para o relógio em seu pulso.

-Nossa, já tudo isso – disse Marah espantada.

-Olha, vamos continuar. Esse é um pequeno problema, não acredito que não possamos

sair dessa, não é?

-É mesmo. Vamos.

Page 20: Para Sempre e Mais

-Vamos.

Dan e Marah continuaram em frente olhando para os lados atentamente agora e olhando

todos os números. Não olharam muito o mapa dessa vez. Pareciam estar com uma perfeita

intuição que não falhava agora, nenhum momento. Eles não perceberam, mas quando chegaram

à saída estavam de mãos dadas e quase correndo. Quando viram que estavam do outro lado e

que tinham pessoas ali, não puderam evitar um abraço.

-Pronto. Ainda bem quem não me desesperei muito, só um pouco dessa vez - riu Dan

satisfeito.

-Ainda mesmo. Agora vamos almoçar, que estou com muita fome, não aguento mais

verde hoje –sorriu Marah com aqueles olhos verdes marcantes.

-Vamos logo. Estou exausto e com fome também.

...

16 de Abril de 2115 10:13 – Região do Cinturão de Kuiper / Mais de 6,2 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Ontem, eu notei que estes objetos eram poucos Marah, mas agora estão mais próximos.

-O que são? Perguntou Marah.

-É uma imensa faixa de asteroides e corpos pequenos que circundam o sistema solar

desde Netuno. Ainda bem que não esbarramos em nenhum enquanto dormíamos.

-Mas qual o perigo?

-Temos que ter cuidado. Muitos deles são feitos de metal misturado com rocha e gelo.

Podem acabar com a nossa nave. Se um deles por menor que for, nos atingir, pode fazer um

estrago imenso, e eu não me lembro de ser muito bom em reparos no casco de naves espaciais.

-Não há como travar alguma rota que nos impeça de colidir com eles? Quanto tempo

durará até que os atravessemos?

-Bom. Acho que a rota podemos traçar sim, quanto a extensão do cinturão é algo meio

incerto, mas pela velocidade em que estamos acho que terminará logo.

-E o que vem depois disse Dan? Pois eu estava pensando para onde estamos indo? E até

agora não sabemos, não é?

-É mesmo, não sabemos, mas a próxima coisa que vamos ver é a nuvem de Oort, e fica

a um terço de distância da estrela mais próxima, na realidade um sistema binário, de duas

estrelas. Existem mundos lá, mas é pouco provável que possam abrigar vida.

-Fico preocupada é com a quantidade de suprimentos que existem aqui dentro dessa

nave. Agora que estamos conseguindo comer de alguma forma, depois do sono no criotubo,

além de ter pensado também, na quantidade que temos, e até quando teremos, sem falar na

quantidade de oxigênio que dispomos. Comemos a cada algumas horas, mas estamos respirando

todo tempo – disse Marah acentuando o final da frase.

-Isso se tornará preocupante a cada minuto, especialmente o ar.

-É mesmo.

-Mas sabe. Estava me lembrando aqui, daquela plantinha que faz sua fotossíntese muito

rápido. Lembra, quando conseguimos ela antes do labirinto.

-Qual? A Fillosdeomini Camppus?

-Sim. Eu tenho algumas sementes dela. Lembro-me que estava com um pingente, que

continha algumas – disse Dan pegando abaixo do pescoço procurando pelo pingente, que estava

no local, pendurando por uma pequena corrente fina.

Page 21: Para Sempre e Mais

-Nossa. Não sabia que você guardava semente em pingentes.

-Eu não entendo completamente o que me deu na cabeça ao fazer isso, mas estão aqui,

algumas sementes.

-Isso pode nos salvar. Lembra que havíamos dito isso?

-Lembro sim. Lembro que associei com a cor dos teus olhos. A cor de um verde que

nunca se viu. São os únicos olhos verdes da galáxia agora.

-É mesmo – riu Marah.

-Pelo menos, temos a chance de ficar respirando por mais tempo.

-É, e essa plantinha tem que nos ajudar.

-Tem mesmo.

Dan e Marah arrumaram um local especial na nave com muita iluminação e que dava

acesso a muitas passagens de ar, para plantar as sementes de sua nova planta embora eles ainda

não tivessem conhecido a nave completamente. Isso os ajudou bastante pois, a pequena planta

ajuda na troca do ar que era reposto o que tornou definitivamente a nave em um local menos

perigoso por conta dos níveis de oxigênio que constantemente estavam diminuindo embora o

suprimento ainda fosse enorme.

Page 22: Para Sempre e Mais

A luz mais provável

27 de Agosto de 2111 6:30 - Florencia / Estrada Vale 45 que liga Florencia ao litoral.

Naquela manhã Dan estava fazendo caminhada. Era comum ele fazer isso algumas

vezes durante a semana, às vezes sozinho, às vezes acompanhado por algum amigo ou

conhecido que morava perto de sua casa. O sol daquela manhã estava vindo de maneira não tão

intensa entre as nuvens cheias e agrupadas naquele dia. Dan sabia muito bem que o sol era uma

estrela de quinta grandeza. Existiam outras estrelas de grandezas e brilhos diferentes,

verdadeiros monstros galácticos que deixavam o sol como se fosse um pixel no espaço, ou nem

mesmo isso.

Em suas aulas de física astronomia o sul era assunto comum e toda sorte de conteúdo

específico sobre o tema faziam parte de suas aulas, e as aulas que ele lembrava muito bem eram

as que falavam sobre as estrelas, sobre, o que eram, o que poderiam fazer, como nasciam, como

morriam, como poderiam pôr o que estava ao redor em risco, mas como mantinham a vida

também. Até agora o único local conhecido que tinha uma estrela de quinta grandeza, que tinha

um planeta habitável e que tinha uma luz amarela era o sol. A questão às vezes era descobrir se

tinham outras estrelas com o mesmo aspecto e que pudessem ter planetas ao seu redor. Se

tivessem era possível ter um planeta com o mesmo aspecto. Um planeta que pudesse abrigar

vida.

Durante sua caminhada podia-se perder o brilho do sol de vista. Uma pequena encosta,

na pequena colina onde a estrada estava, fazia com que a luz da manhã ficasse perdida atrás das

árvores altas e grandes. Aquele local era como se fosse um pequeno vale. Um olhar mais atento

mostraria um pequeno riacho escondido um pouco depois da estrada que ligava Florencia ao

litoral.

Alguns carros passavam por ali, e outras pessoas que tinha o costume de fazer

caminhadas regulares pela manhã.

Dan era um bom corredor. Na escola, nas aulas de educação física, não nas de física, ele

se dava bem; ele se dava bem em muitas coisas. Tinha o espírito de luta bem generoso, mas em

certas coisas ainda tinha certo temor e às vezes precisava de um incentivo. Às vezes alguém que

lhe desse apenas alguma luz para uma grande ideia ou alguém que apenas o ajudasse em coisas

simples que às vezes ele não conseguia resolver, afinal nem todas as pessoas sabem as resposta

para todas as coisas. Marah surgiu e o auxiliou nessa parte, ela era a ajuda que às vezes ele

precisava. Ela figuradamente falando, era uma luz essencial pra Dan. A luz de uma estrela

quinta grandeza. A luz mais provável, para que ele não desistisse num momento difícil no

futuro.

...

01 de Maio de 2115 15:40 – Borda Externa do Cinturão de Kuiper / Mais de 6,7 bilhões

de quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Graças a Deus que conseguimos passar sem muitos problemas pela parte mais difícil

do cinturão de asteroides – exclamou Dan.

Page 23: Para Sempre e Mais

-Graças a Deus mesmo Dan – disse Marah.

Dan parou e pensou um pouco.

-O que foi Dan? Perguntou Marah.

-Acabamos de agradecer a Deus.

-Foi, foi mesmo.

-Eu pensei nesse momento que não imaginamos, o porquê disso aconteceu, sei lá, de

acordo com alguma forma divina. Mesmo com todo meu conhecimento não consigo negar que

exista algum tipo de poder divino por trás disso – disse Dan.

-Isso me lembra da história em que Deus salvou algumas pessoas e os animais. Salvou

essas pessoas do dilúvio no planeta.

-É mesmo. Havia uma arca, os animais e algumas pessoas. E depois a humanidade

começou dali de novo – disse Dan com um brilho e entusiasmo.

-Sabe, minha tia era uma pessoa que ia a igreja. Era protestante. E ela dizia algumas

coisas para mim. Dizia que Deus tem o controle de todas as coisas e que ele provê recursos para

a manutenção da vida, tanto física quanto espiritual.

-Eu tenho um amigo que estudou comigo e ele era protestante. Ele se reunia em uma

igreja na praia. Um tipo de igreja onde tem alguns surfistas. Sempre me convidou para ir lá, mas

nunca fui e tive a chance de ir, mas sabe, mesmo sendo alguém que estudou física durante

muitos anos, talvez alguém pudesse imaginar que eu negaria a existência de Deus, mas não.

Tudo que busquei sinceramente durante o tempo dos meus estudos, apontam para uma

inteligência. De fato, nunca busquei a Deus como muitas pessoas ou como tua tia, mas sabe,

você tem a certeza, de alguma forma de que existe algo, muito maior, e estranhamente até

mesmo nesse tipo de situação, minha alternativa é ter fé de que precisamos de algo, mas que

nossa inteligência ou nossos instintos, ou nosso desejo de sobreviver para nos mantermos vivos.

-Você crê que Deus existe Dan, pensando dessa forma? Perguntou Marah.

-Creio sim, não estaríamos aqui se Deus não existisse, nem se ele não quisesse –

exclamou Dan.

-Mas é tão estranho, que apenas nós dois estejamos aqui. Como não questionar, sob

esses pensamentos, porque isso aconteceu? Mas não quero fazer isso agora.

-É por isso que temos que acreditar que ficaremos vivos. É um milagre. É um milagre

estarmos aqui e termos a oportunidade de continuar. Significa, mais do que qualquer coisa, e

devemos investir toda nossa alma, toda nossa força, todo nosso intelecto, todo nosso

entendimento, toda nossa vida, para que tudo dê certo.

-Precisamos de uma luz. É inegável que este é o momento mais difícil e crítico que se

tenha imaginado, mas eu agora passo a ter fé de que não acabaremos assim.

-Nem eu acredito que acabaremos assim. Precisamos ficar juntos. Precisamos ter fé.

...

28 de Agosto de 2111 9:30 - Angra / Planetário Municipal

O planetário era um lugar grande. Fantástico também. Um lugar de encher os olhos de

qualquer um, mesmo quem não tivesse interesse pelo assunto, de astronomia. Era um lugar

arredondado, que ficava no litoral da capital Angra. A apresentação inicial era empolgante, pois

as figuras tridimensionais flutuavam no interior da sala. Não era um lugar que mostrava

simplesmente o sistema solar, mas poderia viajar por toda a parte conhecida da galáxia.

Page 24: Para Sempre e Mais

-Bom dia senhoras e senhores. Para nós e um prazer imenso recebê-los aqui nessa

manhã. Espero que se divirtam, estejam atentos e aprendam bastante essa manhã. Quem irá

ministrar a palestra hoje será o doutor Dommer Beor. Então vamos lá.

Logo entrou em cena um homem bem humorado, que usava óculos e uma barba

grisalha, vestido casualmente para a ocasião, e falando bem.

-Olá pessoal. Como todos sabem este aqui é nosso incrível planetário. Fico muito

satisfeito em contar para vocês algumas informações curiosas, belas, perigosas e fantásticas essa

manhã sobre o nosso universo, mais especificamente, sobre nosso sistema solar, e mais ainda o

nosso sol. Vamos lá então?

Dommer tinha nas mãos duas luvas, que tinham pontos luminosos em todas as

extremidades dos dedos e que passaram a controlar todas as informações que se dispunham

dentro da sala. Todos estavam vidrados e de olhos arregalados usando óculos especiais, quando

apareceu uma bola incandescente, iluminada e solitária, que iluminava toda a sala e os rostos de

quem estava ali. Tudo ficou iluminado com um tom meio amarelado, meio laranja claro.

-Esta, como todos já sabem é nossa estrela mais próxima. A que mais precisamos, a que

nos traz luz todos os dias, a que nos acorda e que nunca falhou durante todo esse tempo. Este é o

nosso sol. O Sol do latim sol, solis, é a estrela central do Sistema Solar. Todos os outros corpos

do Sistema Solar, como planetas, planetas anões, asteroides, cometas e poeira, bem como todos

os satélites associados a estes corpos, giram ao seu redor. Responsável por 99,86% da massa do

Sistema Solar, o Sol possui uma massa 332 900 vezes maior que a da Terra, e um volume 1 300

000 vezes maior que o do nosso planeta.

A distância da Terra ao Sol é de cerca de 150 milhões de quilômetros,ou 1 unidade

astronômica (UA). Na verdade, esta distância varia com o ano, de um mínimo de 147,1 milhões

de quilômetros (0,9833 UA) no perélio (ou periélio) a um máximo de 152,1 milhões de

quilômetros (1,017 UA) no afélio, em torno de 4 de julho. A luz solar demora aproximadamente

8 minutos e 18 segundos para chegar à Terra. Energia do Sol na forma de luz solar é

armazenada em glicose por organismos vivos através da fotossíntese, processo do qual, direta

ou indiretamente, dependem todos os seres vivos que habitam nosso planeta. A energia do Sol

também é responsável pelos fenômenos meteorológicos e o clima na Terra.

É composto primariamente de hidrogênio (74% de sua massa, ou 92% de seu volume) e

hélio (24% da massa solar, 7% do volume solar), com traços de outros elementos, incluindo

ferro, níquel, oxigênio, silício, enxofre, magnésio, néon, cálcio e crômio.

Possui a classe espectral de G2V: G2 indica que a estrela possui uma temperatura de

superfície de aproximadamente 5 780 K, o que lhe confere uma cor branca (apesar de ser visto

como amarelo no céu terrestre, o que se deve à dispersão dos raios na atmosfera); O V (5 em

números romanos) na classe espectral indica que o Sol, como a maioria das estrelas, faz parte da

sequência principal. Isto significa que o astro gera sua energia através da fusão de núcleos de

hidrogênio para a formação de hélio. Existem mais de 100 milhões de estrelas da classe G2 na

Via Láctea. Considerado anteriormente uma estrela pequena, acredita-se atualmente que o Sol

seja mais brilhante do que 85% das estrelas da Via Láctea, sendo a maioria dessas anãs

vermelhas. O espectro do Sol contém linhas espectrais de metais ionizados e neutros, bem como

linhas de hidrogênio muito fracas.

Todos ficaram estupefatos. Alguns, acharam chato todas aquelas informações, e

perceberam que aquele não era o seu assunto preferido, mas todos gostavam das luzes e

imagens. Dan e Marah, estavam satisfeitos com tudo. E enquanto ouviam e viam, ficavam

cochichando perto um do outro sobre o que se passava na sala do planetário.

Depois o professor Dommer continuou.

Page 25: Para Sempre e Mais

-Bom pessoal, a luz solar é a principal fonte de energia da Terra. A constante solar é a

quantidade de potência que o Sol deposita por unidade de área diretamente exposta para luz

solar. A constante solar é igual a aproximadamente 1 368 W/m² a 1 UA do Sol, ou seja, na ou

próxima à órbita da Terra, sendo que o planeta recebe por segundo 50 000 000 GW.[nota 4]

Porém, a luz solar na superfície da Terra é atenuada pela atmosfera terrestre, diminuindo a

potência por unidade de área recebida na superfície para aproximadamente 1 000 W/m² no

zênite, em um céu claro. A energia solar pode ser coletada através de uma variedade de

processos sintéticos e naturais.

A luz solar é indispensável para a manutenção de vida na Terra, sendo responsável pela

manutenção de água no estado líquido, condição indispensável para permitir vida como se

conhece, e, através de fotossíntese em certos organismos (utilizando água e dióxido de carbono),

produz o oxigênio (O2) necessário para a manutenção da vida nos organismos dependentes

deste elemento e compostos orgânicos mais complexos (como glucose) que são utilizados por

tais organismos, bem como outros que alimentam-se dos primeiros. A energia solar também

pode ser capturada através de células solares, para a produção de eletricidade ou efetuar outras

tarefas úteis (como aquecimento). Mesmo combustíveis fósseis tais como petróleo foram

produzidos via luz solar — a energia existente nestes combustíveis foi originalmente convertida

de energia solar via fotossíntese, em um passado distante.

O que quero dizer é que o sol te, todas as qualidade possíveis à vida. É difícil para mim

crer que seja um mero acaso. Creio que o sol foi planejado.

Algumas pessoas se contorceram nas cadeira ao ouvir essa afirmação. Dan e Marah

continuavam ouvindo atentamente.

-E se vocês encontrarem outra estrela por aí, e talvez ela tiver a mesma luz do sol, essa é

a luz mais provável de uma estrela que pode suprir a vida.

...

15 de Maio de 2115 7:40 – Depois do cinturão de Kuiper / Mais de 7 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-É estranho, estarmos aqui fazendo uma coisa comum, em uma situação incomum –

disse Marah tomando um pouco de fôlego.

-Não sei se isso poderia ser considerado um privilégio ou um maldição, mas neste local

de gravidade artificial, precisamos disto constantemente, se não ficaremos obesos – disse Dan

rindo.

-Nossa nem me fale, isso me espanta tanto quanto a quantidade de suprimento que

temos e a quantidade de tempo em que eles podem ser conservados. Isso foi muito bem feito –

continuou Marah.

-Fora o fato que acabamos de descobrir, que podemos produzir comida aqui.

-É mesmo. Aparentemente temos muito tempo – disse Marah cruzando uma linha

amarela da raia onde estava correndo com Dan em um dos compartimentos da nave.

-Sabe.

-Hum?

-Lembrei-me de quando corremos uma vez pela manhã. Lembra?

-Lembro sim. Tínhamos um sol, muito verde, e muito ar sendo produzido naturalmente.

Tínhamos o vento passando por nossos rostos, deslizando entre nossos cabelos.

-É mesmo, tínhamos todas aquelas coisas. E agora veja só o que temos – disse Dan

desabafando.

...

28 de Agosto de 2111 11:30 - Angra / Pátio do Planetário Municipal

Page 26: Para Sempre e Mais

-Gostei muito Dan. Fiquei impressionada com hoje. Como nunca tinha vindo em um

planetário, fiquei muito empolgada – disse Marah.

-Realmente foi muito bom. Sempre curto bastante toda vez que venho nesse local.

-Existem pessoas que não estão tão interessadas nessa conversa sobre estrelas e mundos,

mas eu acho algo fantástico. Veja só o quanto nós somos pequenos. Aprendi tudo isso hoje –

continuou Marah empolgada.

-Eu fico sem palavras quando vejo as comparações de tamanhos de estrelas na nossa

galáxia.

-Nossa, é mesmo. Você viu aquela Canis Majoris. O que é aquilo Dan? É uma estrela

monstruosa.

-E achávamos que o sol é grande, ou que a Terra mesmo, é grande.

-Sabe Dan, isso nos mostra o quanto devemos ser humildes. Suponho que o estudo do

universo, contribui grandemente para a formação de caráter de quem o estuda – disse Marah.

-Acho que o pouco que você passa a conhecer, deixa-o deslumbrado, e aí você se

pergunta realmente, de onde veio tudo isto e qual o propósito dessas coisas existirem.

-É como o professor disse. Não pode ser um mero acaso. Tem que ter algum motivo.

-Em filosofia alguém faria a seguinte pergunta: “Qual a razão de algo existir, quando

não há razão para sua existência?”

-Nossa bem profundo – disse Marah arregalando os olhos.

-Existe um grupo, que defende a posição do Design Inteligente sabe, e eles focam os

questionamentos científicos a esse aspecto, de que existe um Designer, que fez todas essas

coisas.

-Não me lembro de ter ouvido algo sobre Design Inteligente. Do que se trata Dan?

-Bom antes de responder, você não está com fome?

-Hum. Nossa! É mesmo, estava sentindo alguma coisa estranha e não sabia o que era.

Estou com fome sim.

-Quando você sentir um imenso vazio qualquer dia desses, não se desespere, é fome –

disse Dan rindo, o que fez Marah rir também.

-Pois estão vamos lá, vamos encher esse vazio, antes que nos tornemos pessoas

deprimentes lambedoras de beiços, que demonstram estar com muita fome.

-Vamos sim.

Dan e Marah seguiram pelo pátio do planetário onde estavam e foram a lanchonete mais

próxima. Haviam alguma ali, muitas delas com opções marinhas, por estarem ao pé da praia.

Dan e Marah foram a um lanchonete bem simples e continuaram a conversa sobre Design

Inteligente.

...

29 de Maio de 2115 10:40 – Depois do cinturão de Kuiper / Mais de 7,1 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Dan estava com um tablet espelho conferindo alguns dados perto da seção de

suprimentos quando Marah chegou perto de Dan.

-Dan –disse Marah bem atrás dele.

Ele se virou e ela deu um abraço nele.

-Desculpe. Estava me sentindo sozinha. Acho que ainda estou com traumas. Desculpe

Dan, eu precisava vir aqui e fazer isso – disse Marah começando a chorar.

-Tudo bem Marah, eu estou aqui, eu estou bem aqui. Não precisa ter medo. Eu sei que é

difícil, mas você sabe que estarei aqui, para o que precisar. É tão difícil para mim também, mas

eu quero que você confie em mim. Vamos sair dessa. Fique tranquila que eu cuidarei de você

Page 27: Para Sempre e Mais

todo o tempo que for necessário – disse Dan fazendo um carinho com uns tapinhas nas costas de

Marah.

-Tá bom – disse ela com voz manhosa.

-Veja, tenho uma boa notícia.

-O que é? Perguntou ela com voz ainda embargada.

-Pelo menos não morreremos de fome pelos próximos dez anos, acredita?

-Ai é – disse Marah soltando um sorriso com o rosto molhado e ainda abraçada com

Dan.

-É sim. E outra coisa melhor, e muito mais empolgante, é que temos muito chocolates.

-Que coisa boa.

-E ninguém poderá vir nos tomar eles. São todos para nós.

-Ah, Dan, obrigada. Eu estava precisando disso. Me desculpe, mas isso em alguns

momentos é desesperador. Parece que em um dia estamos cientes, do que aconteceu, e em

outras horas parece algum tipo de sonho ou fantasia maluca, e que vamos para casa de novo,

mas logo você cai na real e vê o que de fato está acontecendo.

-Eu sei. Estou me sentindo assim também as vezes. É difícil de descrever os tipos de

sentimentos que temos agora.

-Temos que ter cuidado para não ficarmos loucos – disse Marah rindo.

-Para isso temos os chocolates – exclamou Dan.

-Bem lembrado. Nesse caso eu quero um – disse Marah afastando-se.

-É uma ordem então capitã.

-E vá logo – riu Marah.

-Pode deixar – disse Dan com um sorriso se dirigindo ao compartimento ao lado, que

tinha uma variedade de doces conservados a vácuo.

...

28 de Agosto de 2111 12:15 - Angra / Lanchonete na Avenida do Mar em Angra.

-E uma vez ouvi a seguinte história sobre a existência de Deus.

-Então me conta.

-Certa vez um professor ateu desafiou seus alunos fazendo a seguinte pergunta: “Deus

fez tudo que existe?”. Um estudante prontamente respondeu dizendo que sim. O professor,

então, fez a seguinte afirmação: “Se Deus fez tudo, então ele também fez o mal, e se aquilo que

fazemos é reflexo do que nós somos então Deus é mal!”. O estudante então ficou quieto e o

professor começou a se vangloriar de que a fé era apenas um mito.

-Continue – disse Marah terminando seu último gole de suco de laranja.

-Sim. Continuando. Mas outro aluno fez então a seguinte pergunta ao professor ateu: “A

escuridão existe?”. O professor logo respondeu: “Claro que sim.” O estudante então disse o

seguinte: “Não professor, a escuridão não existe! A escuridão é a ausência de luz. Estuda-se a

luz, mas a escuridão não. O prisma, por exemplo, decompõe a luz branca nas suas várias cores.

A escuridão não. Como se faz para determinar quão escuro está um local? Com base na

quantidade de luz presente, não é mesmo? A escuridão é um termo criado para descrever a

ausência de luz. A luz pode ser estudada, mas a escuridão não.”. Finalmente o aluno fez mais

uma pergunta ao professor ateu: “O mal existe?”. O professor respondeu prontamente: “Claro

que existe!”. O estudante então falou novamente: “O mal não existe por si só. O mal é

simplesmente a ausência de Deus. Deus não criou o mal! O mal é o resultado da falta de Deus

no coração das pessoas. É como a escuridão que acontece quando não há luz. Na ausência de

Deus na vida das pessoas aparece o mal”.

-Nossa, bastante curioso esse detalhe. Quem era o aluno?

-Um cientista. Não lembro muito bem dele.

-Depois vou pesquisar.

-É uma ótima história.

-Lembrei de todas a palavras sobre as propriedades da luz no planetário.

-Bem lembrado – disse Dan.

Page 28: Para Sempre e Mais

Todos os lados

4 Junho de 2115 9:40 – Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 7 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Dan estava na sala de controle, observando os dados e a trajetória enquanto ouvia em

volume baixo uma canção chamada Continue Forte de 2007 de um grupo americano tocada

como reprise.

-O que está vendo? Perguntou Marah.

-Estava olhando aqui a direção para onde estamos indo – respondeu Dan.

-E para onde estamos indo?

-Em direção de uma estrela chamada Gliese 581.

-E tem alguma coisa lá?

-Um possível planeta habitável.

-Sério? Perguntou Marah com um brilho nos olhos.

-Sério.

-Então me conta mais sobre isso.

-Está bem.

...

1 de Setembro de 2111 16:45 - Angra / Livraria do Shopping Passeo.

Dan chegou de surpresa na livraria do shopping naquela tarde. Marah estava de costas

lendo um livro de forma concentrada.

-Ei menina o que é isso? – disse Dan com um pequeno grito chamando atenção para si

dentro da livraria.

-Aí que susto menino. Você quase que faz meu coração parar – disse Marah rindo

depois do susto.

-É um poder incomum, fazer o coração das pessoas pararem – riu Dan.

-É mesmo, seu chato – disse Marah entoando a voz fazendo beicinho.

-Então, o que está lendo?

-Um livro – disse Marah secamente de forma maliciosa.

-Um livro eu sei – replicou Dan fazendo um careta balançando a cabeça de um lado para

o outro – mas como se chama?

-Se chama Todos os Lados. Uma crítica aos relacionamentos que não dão certo em uma

história envolvente moderna.

-Nossa, parece bem tenso. O que parte você está lendo agora exatamente? O que diz?

-Hum. Diz assim. “E eu não posso ficar com você, mas escrevo uma história sobre esse

sentimento, e a dou para você ler; você achará tão linda, mas talvez nunca vá saber.”.

-Alguém que está gostando muito de alguém, mas que escreve histórias fictícias que

contam sobre seu sentimento. Depois ele dá essa história para a pessoa da qual se gosta. E essa

pessoa acha linda essa história, mas nem imagina que seja sobre ela mesma. Nossa, interessante.

Quem é o autor?

-Hum. Deixa eu ver. É, Mariano Buller.

-Não conheço.

-Parece ser ótimo esse livro dele.

-Parece ser sim. Mas mudando de assunto, você comprou os ingressos? Perguntou Dan.

-Comprei sim – respondeu Marah.

-Ainda bem. Quase que não consigo concluir esta parte da minha pesquisa.

-Sobre o projeto não é?

-Sim. Acho que está mais perto do que nunca.

Page 29: Para Sempre e Mais

-Isso é ótimo Dan. Sim. Eu não li a sinopse do filme. É ficção eu sei, mas do que se trata

realmente?

-Não acredito que você vai querer perder o susto? Riu Dan.

-O quê? É um filme de Terror-ficção? Não acredito – Disse Marah.

-Não, não é.

-Embora tenha uns filmes desse estilo que realmente sejam bons.

-Então vamos? Faltam vinte minutos e nem temos pipoca ainda.

-E nem os chocolates também.

-E nem a água.

-Os hambúrgueres de picanha?

-Corre – disse Dan puxando o braço de Marah.

...

4 Junho de 2115 9:57 – Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 7 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Bom, como eu ia dizendo. Este planeta está em uma zona habitável sabe.

Marah estava sentada em uma poltrona observando os mapas rodando de um lado para o

outro enquanto Dan explicava as coisas antes de chegar à parte menos promissora da conversa.

-Então ele pode abrigar vida?

-Pode sim.

-Será que existe vida lá?

-Bom, eu não sei. Mas não sei que tipo de vidas esse planeta poderia abrigar.

-Mas, é uma coisa que devemos parar para agradecer, estarmos indo na direção desse

lugar, na situação que estamos, embora eu esteja pressentindo que você logo me dirá

informações não muito felizes sobre quando chegaremos lá.

-É, tenho que admitir que este seja o problema.

-Qual a distância então Dan?

-Duzentos e nove trilhões de quilômetros, basicamente, vinte e dois anos luz.

-Mas, quanto tempo levaria para chegarmos lá?

-A velocidade em que estamos, levaríamos uns oitenta anos, sem parar.

-Sério? Não há como irmos mais rápido? Nem há outra estrela com algum planeta?

-Temos outras estrelas mais próximas, mas sem planetas possivelmente habitáveis.

-Isso é aterrador, só posso chorar até que não tenha mais forças.

-Temos uma possibilidade de, sei lá, perpetuar a nossa raça. Nossos filhos chegariam lá,

mas teríamos que ensinar tudo a eles antes de morrermos. Talvez nem chagássemos a ver o

planeta, mas eles chegariam lá e teriam ainda que descobrir se realmente, o lugar tem água e se

pode sustentar atmosfera. Essa é minha melhor perspectiva com os recursos que temos.

-Todo este lugar é realmente grande, mas parece-me que ele foi feito para que não

chegássemos a canto nenhum.

-Sabe Marah, não podemos nos desesperar, enquanto tivermos o último alimento, o

último gole, o último suspiro, temos que continuar – disse Dan puxando Marah da poltrona e

abraçando-a dando tapinhas nas suas costas.

-É uma pena não podermos ir para qualquer ou todos os lados de uma forma mais

rápida.

-É uma pena mesmo – disse Dan arregalando os olhos com um lampejo de pensamento.

Page 30: Para Sempre e Mais

-Ir para um lugar desses é como continuar um relacionamento, você tem que decidir se

quer continuar ou ficar distante, ou ir para outro lugar. Você não pode ir para todos os lados ao

mesmo tempo.

Dan segurou o rosto de Marah que já estava com os olhos marejados de novo, enquanto

olhava para ela.

-Então só nos resta continuar, não é Dan?

-É isso que estamos fazendo. Não podemos desistir agora. Já chegamos muito longe,

para trocarmos de caminho.

-Já chegamos muito longe mesmo – disse Marah abraçando Dan novamente.

A canção continuou se repetindo dizendo as mesmas palavras nesse mesmo refrão:

“Permaneça firme. Você está no caminho. Olhe sempre para frente. O sol está bem ali

Iluminando tudo o lugar. Continue firme. Estivemos correndo para nosso objetivo. Já estamos

muito longe para se perder.”

...

1 de Setembro de 2111 16:45 - Angra / Sala 5 do Cinema do Shopping Passeo.

Haviam dois pares de olhos atentos, por detrás do óculos especiais fixados no filme. As

cenas se desenrolavam em um lugar de outro planeta, mostrando todas as coisas exóticas que se

podia imaginar. Havia uma guerra entre os homens colonizadores e uma tribo de alienígenas

humanoides que viviam nas florestas, mas que não tinham tecnologia para deter os homens.

Nesse momento as cenas se desenrolavam, na última guerra entre a tribo de alienígenas

e os homens. Estava acontecendo um massacre, o que deixou a plateia aflita nesse momento, o

que faz também com que Marah segurasse o braço esquerdo de Dan apertando-o firmemente

com as duas mãos, quando viu uma explosão perto dos indefesos alienígenas que não

dispunham de nenhuma tecnologia armamentista superior. Estavam todos sendo massacrados

pelos tiros de fuzis, pelas granadas e mísseis.

Mas de repente um grupo passou a ajudar a tribo de alienígenas e depois de muitas luta,

conseguiram vencer e expulsar os homens que os atacavam. O filme terminou. Dan e Marah

voltaram empolgados e cheios de ideias sobre o que tinham acabado de assistir.

-Bom eu acho – disse Marah – que isso mostra o comportamento do homem comum

sabe.

-Que eles querem apenas destruir os pobrezinhos dos aliens? Perguntou Dan rindo.

-Não seu bobo, não exatamente, mas que o homem vai a um lugar, acaba com todos os

seus recursos e vai para outro, como um vírus.

-Então não seria uma ótima ideia o homem ir para outros mundos – disse Dan.

-Porque eles o destruiriam certo?

-É. Eles iriam acabar com tudo. Todo o gado, todo o verde, toda a água, todo o ar, com

todas as coisas – disse Dan mexendo os braços e fazendo uma careta.

-Mas, creio que as pessoas boazinhas fossem habitar outro mundo, eles cuidariam sim

do lugar.

Page 31: Para Sempre e Mais

-Talvez poucas pessoas, não muitas. Muitas pessoas significa, confusão, direito de

propriedade, esquemas econômicos, produção, essas coisas.

-Bom – disse Marah olhando para algum lugar concentrada – mesmo que fossem apenas

duas pessoas para esse lugar, você acha que elas cuidariam dele Dan?

-Sabe – Dan fez um bico – acho que sim. Como você disse, se fossem pessoas

boazinhas, mas o problema é que as pessoas não são boazinhas.

-Ei – protestou Marah – eu sou uma boa moça.

-Oh! Que fofo, temos aqui a boa moça. Você seria a rainha desse mundo. Um mundo só

para você.

-Seu chato, eu cuidaria muito bem sim e de quem estivesse comigo está bem? Marah fez

uma careta.

-Bom, e quem você escolheria para ir com você? Perguntou Dan.

-Sabe, eu não sei. Essa é uma pergunta estranha e ao mesmo tempo não. Pensamos na

nossa família é claro, nos nossos amigos, mas meus sentimentos me levam a concluir que

deveria ter outra pessoa, alguém para compartilhar esse lugar, alguém que não fosse seu amigo

ou seu parente. Eu seria a rainha como você disse, mas toda rainha precisa de um rei.

-Entendo – disse Dan olhando para Marah que olhava para o chão confusa.

-Mas, eu construiria um mundo da melhor maneira que pudesse – disse Marah.

-Eu também – disse Dan.

25 Junho de 2115 8:02 – Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 7,2 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Tua barba cresceu eu você nem notou. Está parecendo um velho – disse Marah sorrindo

olhando para Dan segurando uma bandeja com um lanche.

-Bom, acho que ainda posso tomar o café sem me sujar – riu Dan enquanto saia do

computador de trajetória, onde estava.

-Então, como estamos indo? Perguntou Marah ansiosa.

-Bom, acho que terei algo daqui uns dias e isso nos ajudará bastante.

-Eu confio em você para isto Dan, sei que vai conseguir – disse Marah – mas antes,

vamos tomar café.

-Sim, vamos sim – disse Dan.

Marah ajeitou o lanche que ela mesma fizera em uma mesinha de centro que estava no

meio da sala enquanto Dan mexia novamente no computador finalizando seus cálculos. Podiam-

se ver as estrelas perfeitamente pela tela a frente deles, sem mundos, sem asteroides agora. Um

lugar que nenhum dos dois estivera em toda sua vida há alguns meses, mas que tinha se tornado

sua visão comum em seu novo lar flutuante pelo espaço. Quanto mais o tempo passava, mas o

choque diminuía e os dois pareciam só se concentrar na sua busca, no novo mundo aparente,

para onde estavam indo nesse momento.

-Bom, está tudo aí, tudo o que temos direito – disse Marah.

-Ótimo, vamos nos estufar pelo visto, só no café.

-Não poupei despesas. Somos como senhores do nosso próprio reino e temos tudo para

nós.

-Tudo, até quês estejamos satisfeitos, cansados, com sono e com fome novamente – riu

Dan.

Page 32: Para Sempre e Mais

-E novamente, e novamente – riu Marah.

-Nossa, isso aqui é ótimo. Bacon! Fazia tempo que eu não via um desses.

-E pode apostar, que tem muito de onde esse veio. Estoque para um milhões de anos –

brincou Marah.

-Nossa, poderíamos chegar a Andrômeda apenas com Bacon – riu Dan.

-É por aí – disse Marah rindo.

7 de Setembro de 2111 09:11 - ESO / Chile

-Ei Ress, tenho uma novidade, meu caro – disse Lian.

-E qual é dessa vez? Perguntou Ress desinteressado enquanto olhava os dados no

computador.

-Elaborei uma nova rotina neurocinética. Mais uma diversãozinha para os visitantes –

disse Lian exultante.

-Imagino que deva ser uma besteira imensa – disse Ress com um sorriso sarcástico.

-Não meu amigo, dessa vez não. Essa nova rotina é uma viagem, que os visitantes

poderão fazer. Poderão visitar outros planetas como se fosse algo real sabe.

-Eu pensei que você fosse astrofísico, mas vejam só, estou trabalhando com um

neurocientista e programador de jogos. Está me parecendo aqueles joguinhos para crianças

especiais – disse Ress rindo.

-Não, não, é bem real.

-Espero que você não mande a cabeça de alguém para o espaço com isso – disse Ress

rindo.

-Você não perde por esperar meu amigo, vai ser demais. Inesquecivel, como una bella

canzone che non può essere dimenticato, e da cui si vivrà per sempre e per sempre – disse Lian

cantando em seu italiano grosseiro.

-Sim, e como as pessoas vão usar isto? Perguntou Ress.

-Vamos fazer uma promoção, inserida em uma das visitas promocionais a este lugar.

Será um ótimo brinde. Mas isso vai levar um pouco de tempo, talvez uns nove meses quem

sabe, tenho que apresentar o projeto e ver como irão ficar as instalações dos equipamentos

-Eu quero é ver.

-Não perca por esperar astrofisico amico più critico che abbia mai incontrato in tutta la

mia vita, la mia vita – cantou Lian.

...

8 de Outubro de 2111 08:45 – Universidade Federal – Angra

-Gosto de surpresas, mas desta vez estou muito curiosa – disse Marah rindo andando

pelo corredor ao lado de Dan.

-Bom, eu espero que até mesmo eu goste do que verei acontecer – disse Dan sorrindo.

-E você também não sabe? Perguntou Marah olhando para a aglomeração de algumas

pessoas frente à porta de madeira do teatro circular da universidade.

-Mais ou menos, disseram que era um debate sabe. Entre um teólogo, filósofo cristão e

um biólogo ateu.

-Nossa isso parece ser bem interessante – disse Marah.

-É mesmo, vamos esperar só estas pessoas mostrarem seus crachás.

Page 33: Para Sempre e Mais

Naquela manhã dois debatedores iriam se enfrentar segundo as regras de debates. Eram

debatedores conhecidos por muitos, mas não todos, dos quais Dan e Marah faziam parte. Eduh

Micah era o debatedor cristão e Ricc Dahls e debatedor ateu.

Dan e Marah entregaram suas fichas de inscrição que tinham sido preenchidas por Dan

dias antes e entraram no salão circular. No centro podia-se ver o púlpito circular destinado ao

moderador que já estava no local e conversava em pé com dois homens engravatados. Em um

dos lados em uma mesa de semicírculo estava Eduh e do outro lado em outra mesa do mesmo

formato estava Ricc, os dois olhando e analisando alguns papeis.

O local estava quase cheio e Dan e Marah sentaram-se em um local bem no meio, na

linha de poltronas centrais do semicírculo.

-Então era pra isso que você pediu minhas informações seu esperto – disse Marah

sorrindo.

-Ainda bem que não foi um sequestro – disse Dan.

-Você estaria em sérios problemas, mas isso ainda é um sequestro intelectual. Vamos

ver se realmente é algo bom ou ruim.

-Nunca se sabe – disse Dan apontando para duas poltronas vazias – Olhe, tem duas

poltronas superconfortáveis esperando por nós bem ali senhorita.

-Por mim estão ótimas.

Os dois sentaram-se e ficaram observando enquanto Marah olhava também as

mensagens em seu aparelho e Dan olhava toda a sala. Havia algumas câmeras ali e o local era

bem refrigerado. Um tipo de iluminação que evidenciava mais o centro, mas não havia nada

escuro. Os dois rostos dos dois homens que se preparavam no centro estavam despreocupados

esperando agora, apenas o sinal do início do debate.

...

8 de Novembro de 2115 12:17 – Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 7,9 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

A esta altura os aniversários de Dan e Marah tinham passado. Um em julho e outro em

agosto enquanto estavam na nave.

-O almoço está ótimo Marah – disse Dan com um sorriso.

-Muito obrigada senhor – sorriu Marah – e os testes estão indo bem?

-Sim, estão indo sim. Só tem um probleminha?

-Sério? E qual é? – perguntou Marah sentando-se e colocando um suco de uva em dois

copos.

-Existe uma nuvem sabe. Já havia falado sobre ela. É a nuvem de Oort, e só posso testar

meu experimento depois que a cruzarmos – disse Dan.

-Bom, mas eu não entendo, pois você disse que isso seria como abrir um buraco e não

percorrer uma distância em linha reta. Isso quer dizer que não haveria perigo de bater em nada

certo?

-Basicamente isso, mas eu preciso ter certeza de que estamos totalmente fora do campo

total de nossa estrela. Temos que estar fora do poder gravitacional do sol, não tenho certeza,

Page 34: Para Sempre e Mais

mas acho que isso pode influenciar no processo. Mesmo se não houver problema quero estar

fora do poder do Sol completamente – disse Dan.

-E qual será a próxima sugestão então?

-Bom, é meio crítico, mas eu ia sugerir voltarmos para o criotubo.

-Nossa, mas – Marah fez uma cara de triste – não há outra opção?

-Até agora não. Mas não vamos fazer isso logo. Vamos descansar um pouco. Antes de

tudo sugiro terminarmos o almoço e descansarmos um pouco, e olha separei algo que acho

importante – disse Dan puxando o computador espelho que estava próximo.

-E o que é? Perguntou Marah.

-Talvez você fique surpresa, mas isso significou muito depois que eu li. Veja só.

Marah foi para o lado de Dan enquanto ele clicava e digitava e logo depois ele leu.

-Mesmo não florescendo a figueira, não havendo uvas nas videiras; mesmo falhando a

safra de azeitonas, não havendo produção de alimento nas lavouras, nem ovelhas no curral, nem

bois nos estábulos, ainda sim exultarei no Senhor e me alegrarei no Deus da minha salvação.

-A bíblia – disse Marah.

-Pra ser mais exato, Habacuque 3.17 e 18. O que quero dizer é que não devemos nos

desanimar em momento algum. Existe algo que deve ser feito e devemos confiar nisso, pois

devemos antes de tudo ter fé e confiar de Deus.

-Como você conseguiu encontrar isso? Perguntou Marah.

-Estava pesquisando alguma coisa que falasse sobre esperança e confiança, e foi o

primeiro item da pesquisa.

-Não foi por acaso – disse Marah.

-Creio que não. É disso que precisamos.

-Amém então – sorriu Marah.

-Assim seja – sorriu Dan.

...

Page 35: Para Sempre e Mais

Do outro lado

1 de Dezembro de 2111 19:30 - Angra / Bloco De Física aplicada da Faculdade Federal

Às vezes alguns alunos ficavam até tarde, mas neste dia ninguém ficou exceto Dan.

Esse era um dia comum, mas não havia ninguém no bloco de física aplicada. Apenas Dan em

uma das salas e um guarda do lado de fora em frente ao pátio iluminado.

Dan estava na sala sete, em frente a uma mesa grande tendo na sua frente um protótipo

que ele mesmo estava terminando de montar desde o início da tarde.

Uma música tocava de leve e era uma canção antiga, muito antiga, baixa o suficiente

para não atrapalhar ele.

O protótipo tinha duas partes principais que compreendiam dois círculos de alumínio

ligados a vários fios condutores. Na parte central da área dos círculos estavam duas camadas de

cristal líquido bem fina e em uma das superfícies estava a sua cobaia.

Dan ainda estava no seu computador carregando as últimas informações e preenchendo

os dados corretos sobre a sua cobaia, que era uma laranja média.

O guarda nunca tinha observado nada de estranho naqueles últimos meses e talvez a

única coisa que Dan não sabia era que o seu experimento iria precisar de um bom

desprendimento de eletricidade.

Algo estava sendo carregado na tela principal.

Quando o carregamento na tela chegou aos cem por cento um aviso de escolha perguntou se a

operação ia ser continuada. O botão de entrada branco ficou com a cara de grandes botões

vermelhos quando se está preste a fazer uma coisa absurda de bom ou de ruim. Dan colocou a

mão no queixo, olhou para o lado em direção a janela e com um movimento pegou os óculos de

proteção. Ele sabia que iria haver uma iluminação, mas não tinha certeza do impacto. Os dois

geradores e estavam ligados e funcionando bem, e todos os circuitos estava perfeitos. Dan

estendeu a mão e clicou. Ouviu-se um aviso que dizia que a operação estava sendo iniciada. As

luzes começara a piscar e nos dijuntores e o gerador começou a elevar os sinais de status da

máquina. Três carregamentos na tela do computador começaram. O primeiro passou. No

segundo as luzes começaram a piscar, e o guarda do lado de fora percebeu algo estranho, não

em um único lugar, mas em todo quarteirão dos edifícios da faculdade. Terminou o segundo

carregamento. O terceiro começou e no mesmo instante luzes nos fios de condução começaram

a aparecer e nos círculos uma luminosidade incomum começou a se formar lentamente. Com

cinquenta por cento as luzes de toda a faculdade já estavam todas apagadas pela energia que

estava sendo absorvida para a sala de física. O guarda correu para fazer uma ligação em seu

telefone em um canto que ele considerou seguro. Alguma coisa que ele não sabia estava

acontecendo. Dan ficou imóvel e arregalou os olhos quando o carregamento completou cem por

cento na tela, mas ele estava olhando para a laranja, que não foi desintegrada.

Um buraco dimensional de pelo menos vinte centímetros foi aberto na superfície

luminosa onde estava o cristal líquido e a laranja caiu como se estivesse entrando em um túnel.

Instantaneamente ela saiu pelo outro lado circular ligado que estava um pouco mais acima e

caiu em uma superfície de metal. Nesse instante a luzes voltaram.

Dan foi até a laranja e verificou usando as próprias mãos. Nada foi alterado nela. A

laranja viajou de um canto para o outro instantaneamente. Dan sorriu e levou a laranja para

fazer testes mais específicos.

Page 36: Para Sempre e Mais

...

19 de Novembro de 2115 12:17 – Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 8,1 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Dan – disse Marah sorrindo entrando na sala principal da nave.

-O que foi Marah? Que sorriso é esse? Não diga que já chegamos? Perguntou Dan

sorrindo também saindo da coisa a qual estava concentrado.

-Você sabe jogar tênis?

-Nunca joguei – disse Dan fazendo bico.

-Então vamos aprender – disse Marah entusiasmada.

-Nossa, não me diga que na nave tem uma sala de esportes.

-Tem sim, e eu acabei de descobrir. Tem outras coisas também, mas quando vi as

raquetes me empolguei logo. Depois do descanso do almoço que está quase pronto você está

desafiado a competir comigo.

-Está bem jogadora, desafio aceito. Agora procure maneirar, eu não sei pegar numa

raquete, e se você me massacrar vou deixá-la aqui.

-Nunca você faria isso – riu Marah.

-Vamos ver – riu Dan.

-Sim, e você vai fazer algum teste esses dias.

-Estou quase pronto e quero que você veja. Já fiz uma vez na faculdade. É fantástico.

-Espero para ver. Se você me convencer talvez eu o deixe ganhar num próximo jogo.

-Tudo bem. Agora me sinto mais tranquilo. Não quero ser o grande perdedor do espaço

em 2105.

-Tudo bem então – disse Marah sorrindo.

...

1 de Dezembro de 2111 21:10 - Angra / Fim da linha de coletivos rasantes

Angra/Florencia

Um homem observava atentamente a estranheza de Dan que olhava a laranja em sua

mão como se estivesse apaixonado. Dan estava em um ponto de coletivos rasantes. Havia

muitas pessoas ali. Era um lugar onde pessoas de baixa classe média se reuniam para ir para

casa. Alunos da faculdade. Alguns comerciantes da noite. Uma avenida ligeiramente

movimentada. Pessoas voltando para suas casas despreocupadas, embora fosse fim de ano, e a

cada esquina tivesse um cartaz de alguma promoção luminosa de qualquer tipo das lojas do

centro da cidade. A faculdade ficava a quatro quarteirões e já estava fechada, mas havia um

burburinho de vozes sobre um assunto recente, do qual Dan estava despercebido. A queda de

energia que tinha acontecido há meia hora.

-Você viu o que aconteceu? Perguntou um homem de camisa listrada a outro que estava

ao seu lado.

-Vi sim. Estávamos fechando a loja quando aconteceu. Mas não sei bem o que teria

ocasionado. Foi rápido. Demorou apenas alguns segundos – respondeu o outro homem que

estava de azul escuro.

-Ouvi dizer que as luzes da cidade inteira foram apagadas nesse momento, uma coisa

que não acontecia a muito tempo. A distribuição de energia se tornou ótima e nos últimos

cinquenta anos, mesmo com as complicações antes disso – disse o homem de listrado.

Page 37: Para Sempre e Mais

-É mesmo. Lembro-me que eu era bem jovem, quando eles substituíram as grandes

represas por um copo de água, literalmente. A fissão e fusão nuclear nos trouxe energia e tanto

meu amigo – disse o homem de azul escuro com satisfação, enquanto Dan ouvia claramente a

conversa entre os dois.

-O que aconteceu? Perguntou Dan, curioso a um dos homens.

-Um apagão rapaz – respondeu o homem de listrado.

-Um apagão? Perguntou Dan meio espantado.

-Sim, foi a mais ou menos a uma hora e meia atrás – respondeu o homem de azul a Dan,

que logo pensou sobre o que teria acontecido.

-Nossa que estranho - disse Dan deixando sair um pequeno sorriso.

-Estranho mesmo. Faz tempo que isso não acontece – disse um dos homens – mas ainda

bem que tudo voltou ao normal.

-É mesmo.

Dan sabia muito bem o porquê a energia de toda cidade tinha caído.

...

19 de Novembro de 2115 16:29 – Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 8,1 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Dan estava exausto. Marah também. Jogar tênis se revelara mais cansativo que a

caminhada na pista de corrida com cinco raias que ficava em outra parte da nave, que com essas

descobertas começava a ficar grande para os dois, embora esta não fosse a preocupação

principal deles.

-Quando você pratica um esporte pela primeira vez você fica assim, exausto – disse Dan

deitado e caído com os braços abertos.

-Nossa, eu também estou morta – disse Marah ofegante deitada do outro lado da rede

virtual azul.

-Eu estou me lembrando aqui de um fato que aconteceu mesmo antes de eu te conhecer

sabe. Perto de uma rua próxima a faculdade. No fim do dia quando aconteceu eu me senti assim

cansado e tenho essa marca que nunca se foi, que consegui nesse dia – disse Dan mostrando

uma mancha perto do seu ombro direito.

-Não me lembro de ter visto ainda essa mancha – disse Marah curiosa – mas o que

aconteceu Dan? Como conseguiu isso?

-Não sei quantos anos você tinha, mas deve lembrar de algo. O nosso país vivia um tipo

de momento de tensão, o que acontecia de tempos em tempos sabe. O governo sempre se

mostrou sujo de alguma maneira, não importa qual lado assumisse, a esquerda ou à direita ou

até mesmo alguém do povo, eu notei que todos são corruptos e se corrompem com facilidade.

Sempre houve lutas por direitos, redução de impostos, segurança, saúde e educação. O nosso

país sempre foi um local onde houve esse tipo de coisa e para mim foi fácil entender pela

história, que depois do tumulto as coisas aparentemente se resolvem, mas tudo vai voltando ao

estado crítico e o povo resolve se levantar novamente.

-Me lembro de algo sim. Meus pais nunca deixariam sair no meio da rua, para me juntar

as manifestações naqueles dias – disse Marah

-Foi em dois mil e noventa e quatro, no mês de julho, mês do meu aniversário. Eu nem

estava me importando com isso, apenas com as revoltas e com as manifestações e com meu

Page 38: Para Sempre e Mais

cartaz que dizia, “agora chegou a nossa vez, o país não é mais de vocês!” – disse Dan

entusiasmado cheio de imagens em sua cabeça.

-Nossa, mas você sempre deixou transparecer um jeito tão pacato e intelectual – disse

Marah surpresa e curiosa.

-Na maior parte do tempo sim – disse Dan olhando fixamente para um canto – mas

sabe, eu descobri que isso é repetição, e até eu vou repetir o que já disse – riu Dan – Não

importa o quanto lutemos uns com os outros, aquele que assumir o poder, seja de um partido de

esquerda, de direita ou mesmo nenhum dos dois, digamos, vai se corromper. Todos os homens

são corruptos, não há quem busque, não há quem faça o bem, todos estavam perdidos e

extraviados. Talvez tenham recebido o fim que mereciam.

-Então você está dizendo que nós somos merecedores Dan? Perguntou Marah

encarando-o fixamente deitada de lado do outro lado da rede.

-Até mesmo nós dois. É algum tipo de favor imerecido, o fato de estarmos vivos. Temos

que entender o significado disso. No final, não adiantou muito lutar por qualquer questão que

fosse. Só os escolhidos continuariam de alguma forma.

-E estranhamente nós fomos os escolhidos – disse Marah com um pensamento surpreso

passando em sua mente o que fez com que parasse de encarar Dan

-É mesmo – disse Dan distraído olhando para cima.

Marah encarou o teto. Nesse momento uma sensação correu em seu interior. Ele queria

falara alguma coisa mais importante com Dan, mas parecia engasgada. Seu instinto de

sobrevivência parecia ter aflorado, mas algo parecia conter ela nesse momento. O que era aquilo

que ela estava sentindo agora? Dan estava em seu círculo de amizade a tanto tempo, e eles

tinham tantas coisas em comum; pareciam ser cúmplices de tanta coisa mesmo antes da queda

do meteoro e nesse momento estavam só eles dois. Em nenhum momento os dois tinham tocado

no assunto, que provavelmente parecia ser o mais extremo de todos para ela e perfeitamente a

mesma coisa para ele, mas nenhum dos dois tinha tido coragem de iniciar nem falar sobre. Eles

sabiam que teriam que sobreviver de alguma forma até onde pudessem e suas esperanças

estavam voltadas para o experimento de Dan e para o planeta distante que nem sabiam se

poderia abrigar vida. A pergunta era sobre até quando eles permaneceriam contidos sobre o

assunto, e se um deles morresse, aí seria o fim de todos, e esse medo começava a brotar no

coração não só de Marah, mas de Dan também. E para ele inevitavelmente chegaria também ao

ponto onde as coisas passam da mente para o coração. Ela não só o conhecia e tinha uma

intimidade amigável com ele, ela estava chegando a outro nível, que foi cultivado pelas

inúmeras experiências dos dois como amigos, que culminaria em outro nível. Estava se

tornando óbvio em todos os aspectos e o momento era extremo para todos os casos. O caso era a

sobrevivência da raça. O caso era de fato um amor que começava a querer sair.

Depois de mais uns dias Dan apresentou a Marah sua experiência. Com um protótipo

feito com várias peças encontradas na nave e em uma sala de testes ele conseguiu o feito.

Transportar uma laranja de um ponto para o outro. A nave não sofreu nenhuma alteração, mas o

que se dizer sobre transportá-la de um ponto no universo para outro ponto? Daria certo? Os dois

sobreviveriam? Essa pergunta só iria ser respondida depois que Dan terminasse o transmissor e

o disparador para a formação do disco de passagem para eles estarem do outro lado

definitivamente.

...

Page 39: Para Sempre e Mais

Eu não quero perder

Nenhum momento

31 de Dezembro de 2111 20:00 - Angra / Segunda Praia da Capital

Se você olhasse pelas ruas nessa noite de 31 de dezembro você iria ver algo como um

rio branco fluindo para todas as partes desde a capital até nas regiões metropolitanas. Esse era o

costume, pelo menos no país de todas as pessoas receberem o ano novo. Talvez, apenas duas

pessoas não estavam de acordo com a moda da noite, Dan e Marah. Ele estava de jeans e uma

camiseta vinho e ela estava de jeans e azul cobalto.

A noite estava agitada, na praia da capital. Havia gente de todos os tipos para prestigiar

uma apresentação musical e o show de luzes.

-Bom Marah você acha que daqui temos uma ótima visão? Perguntou Dan.

-É, daqui dá pra ver sim, tanto o palco como o mar, de onde sairão as luzes – disse

Marah satisfeita olhando e apontando para o mar.

-Tenho que te confessar que é a primeira vez que venho a este tipo de evento. Sempre

fiquei com minha família sabe – disse Dan.

-Sério? Perguntou Marah surpresa voltando-se para ele.

-É sério, mas eles não se sentiram incomodados – respondeu Dan.

-E sobre se sentir incomodado, meus pais também não viram problema nisso, pois eles

preferiram ir para a casa dos familiares de minha mãe, além do mais tem umas amigas da escola

aqui junto com os pais e eu posso ligar pra eles, o que vou ter que fazer mesmo depois da meia

noite.

-É, estamos bem longe de onde normalmente estaríamos, mas espero que seja legal.

Olha só – apontou Dan para o telão – É o pessoal do Kapitals; ele são ótimos.

-São mesmo. Sim, e lembrando aqui, você trouxe a câmera? Perguntou Marah.

-Trouxe sim. Muitas fotos teremos essa noite jovem padawan – disse Dan entoando a

voz de forma nasal.

-Desenterrou agora Dan. Esses filmes são o clássico das gerações passadas – disse

Marah empolgada.

-É sim, gosto muito. Tenho todos os filmes.

-Nossa. Ei, será que um dia poderemos visitar outras estrelas Dan, como os personagens

dos filmes?

-Bom, creio que sim. Acho que estamos mais perto do que nunca.

-Isso seria o máximo.

-Seria mesmo. Creio que se as grandes civilizações antigas, como os gregos e os

romanos tivessem florescido e continuado, já teríamos chegado as outros mundos.

-É uma pena que tenha acabado. Mas o que aconteceu?

-Bom, temos que admitir que todos os homens são corruptos, por mais que sejam

inteligentes. O povo romano e grego eram o tipo de povo grande e inteligente, mas como eu

disse, a corrupção acabou com todos eles, não apenas a corrupção da nação, mas a corrupção

pessoal. Em todos os casos estavam todos perdidos.

-Será que somos tão inteligentes quanto eles? Perguntou Marah.

-Talvez. Mas conhecemos mais coisas. Embora eu tenha que admitir que todos os

homens são sujos, até a melhor pessoa, pois se você focar apenas na visão humana, verá que

Page 40: Para Sempre e Mais

todos só procuram o prazer próprio e a realização própria, mesmo que se já para fazer o bem a

outra pessoa, infelizmente.

-Imagino que seria preciso um mundo todo novo, para corrigirmos isso – disse Marah

olhando para o mar de novo.

-Creio que sim. Novos céus e nova terra.

-Novos céus e nova terra, isso mesmo. E um novo mar.

-Talvez, embora este esteja bem sujo – disse Dan rindo o que fez Marah rir também.

...

01 de Janeiro de 2116 00:01 - Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 8,3 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Dan e Marah estavam abraçados dizendo feliz ano novo um para o outro, na sala oval de

festas da nave, com uma generosa mesa de centro com um jantar especial, cheio de frutas,

sucos, champanhe e alguns pratos especiais assados. Nesta parte da nave toda a abóbada do

salão era feita de uma tela que exibia imagens e o filme principal era a queima de fogos que

estava acontecendo a um minuto. Dan e Marah não puderam conter as lágrimas. Era o primeiro

ano novo deles fora da terra, e sem dúvida o primeiro ano novo de seres humanos que não

estavam mais em seu mundo natal.

Esse era um momento que continha muitos sentimentos. Não se podia dizer ao certo o

que eles tinham dentro de si, mas eles estavam comemorando, principalmente o fato de estarem

vivos durante muito tempo vagando no espaço rumo a uma estrela próxima.

-Feliz ano novo Marah – disse Dan com um longo sorriso no rosto.

-Feliz ano novo Dan – disse Marah também sorrindo.

-Voando a milhas de casa, pelo menos ainda temos os fogos e a vista do mar – disse

Dan agora olhando para a tela da abóbada.

-O mar ainda não acabou, mesmo neste lugar.

-É mesmo, e nem a comida – disse Marah animada olhando para a mesa de centro que

eles mesmo arrumaram.

-Ei, tenho uma surpresa – disse Dan quase dando um pula de alegria.

-Sério? E o que seria de tão mais fantástico assim? Perguntou Marah levantando as

sobrancelhas.

-Você não vai acreditar Marah, mas a cada dia que passa, pareço descobrir mais coisas

sobre esta nave e coisas que estão nessa nave, e eu descobri que não estamos sozinhos aqui.

-O quê? Não acredito que – Marah fez uma pausa.

-Não é muito, mas é fantástico – disse Dan quase não se contendo em dizer ou mostrar

para Marah sua surpresa.

-Então me mostre logo, e não me mate de curiosidade. É ano novo e precisamos de algo

novo e que seja de grande importância para nós dois.

-Sim, sim, é claro, é muito importante sim. Espere.

Dan foi até uma das portas. Os fogos pareciam estar chegando ao fim. Ele disse para

Marah fechar os olhos enquanto ele se aprontava e preparava sua surpresa. Ela continuou de

Page 41: Para Sempre e Mais

olhos fechados com um sorriso de muita felicidade no rosto até que ela ouviu Dan falando como

se estivesse chamando alguém.

-Red XVIII e Callvino, podem vir – gritou Dan.

No mesmo instante a porta onde Dan estava parado se abriu de lá saíram um cachorro

correndo rapidamente e um androide desajeitado andando em direção a Dan.

Marah não sabia se ria ou se chorava de alegria. Era a primeira vez que ela via duas

coisas vivas, ou pelo menos uma dela. Um cachorro um pouco pequeno e bem animado, chegou

perto de Dan que estava abaixado agora e começou a lambê-lo. E um robô que andava meio

lentamente, que ela descobriu depois tratar-se de um androide, chegou dizendo um feliz ano

novo em uma voz sintetizada. Dan veio até ela segurando o cachorrinho nos braços com o

androide do seu lado.

-Então? O que achou?

O cachorro deu um pequeno latido meio agudo deixando a língua para fora olhando o

androide.

-Dan isso é maravilhoso – disse Marah sorrindo e com lágrimas nos olhos.

-Agora temos mais alguém para dividir nossas atenções não é. Não estamos totalmente

sozinhos aqui nesta nave, e vou te contar uma coisa. Lembra que a nave se chama, Arca Um?

-Sim lembro – disse Marah.

-Lembra da história sobre Noé, e de como ele levou os animais em uma arca e depois

eles povoaram a terra novamente?

-Não de todos os detalhes, mas lembro sim. Não vai me dizer que (pausa)

-É isso mesmo que você está pensando. Tem um lugar repleto de animas nesse lugar ao

lado de uma grande sala de pesquisas. Minhas ocupações sobre uma novo planeta, não me

deixaram perceber que havia muitas coisa nessa nave. Os animais estão todos em hibernação

nos criotubos, mas esse aqui eu acordei, e em outra sala encontrei este amigável robô. Ele não é

muito convincente, mas sabe se comunicar direitinho e tem um conhecimento incrível sobre

muitas coisas.

-Dan, estou sem palavras. Por um momento eu pensei que estávamos em casa, mas

sinceramente, não posso esconder minha alegria.

-Então, vamos festejar? Perguntou Dan.

-Vamos sim. É ano novo afinal e eu não quero perder nada.

-Nem eu. Não quero perder nenhum momento.

...

31 de Dezembro de 2111 23:55 - Angra / Segunda Praia da Capital

Todos agora olhavam uns para os outros e para o mar, de onde iriam ser lançadas as

luzes. Faltavam apenas cinco minutos para a virada do ano e todos demonstravam estar felizes

naquela noite. Parecia ser a última música agitada tocada e ela já estava acabando naquele

momento. Um grande relógio digital em terceira dimensão flutuava no céu acima de todos e

quem olhasse para cima estaria vendo exatamente quantos segundos faltavam.

Page 42: Para Sempre e Mais

Dan e Marah estavam bem na beirada da praia com os pés banhados pelas ondas

espumantes que chegavam sobre a areia e voltavam. O mais fantástico daquela noite era que

algumas algas brilhantes tinham sido levadas de outra praia e trazidas para ali naquela noite, e

quem visse de perspectiva poderia contemplar vários pontos de luzes em meio água e espuma.

Era um fenômeno raro, um tipo de reação química entre a água salgada e as algas.

-Olha só isto aqui Dan. Minutos atrás não havia nada disso aqui - Disse Marah

apontando para os próprios pés.

-É mesmo, isto é fantástico não é. Não é sempre que acontece, mas quando essas algas

vem é fantástico – disse Dan.

-É como se houvesse pontos de luz na água.

-Imagine agora isso olhando bem dali – disse Dan apontando para um ponto acima do

mar.

-Nossa, é mesmo. Pena que não trouxemos nossa câmera.

-Mas, não nos esquentemos. Isso vai ficar bem vívido em nossas mentes – riu Dan.

-Vamos contar com isso – disse Marah.

-Ei olhe pra cima – disse Dan apontando para o céu.

-Faltam dois minutos.

-Antes dos trinta segundos finais o apresentador do show vai nos chamar para contar.

Então prepare-se.

-Mas é claro – riu Marah – Isso me faz lembrar os antigos lançamentos de foguetes e

seus dez últimos segundos empolgantes.

-É quase isso, só que esta noite teremos um show de luzes no céu no lugar desse imenso

marcador de tempo.

-Um imenso marcador de tempo é? Riu Marah – o nome disso é relógio tá?

-Há sim, é claro. Eu e meus termos técnicos. Desculpinhas senhorita – riu Dan.

-Está desculpado senhor – riu Marah.

Depois disso o apresentador convidou a todos bem alto.

-Boa noite pessoas. Não vou ser demorado, porque só temos quarenta segundos, e

faltando vinte segundos começamos a contar. Preparem-se.

Depois que ele terminou, um barulho ensurdecedor rápido que logo se acalmou.

-Eu conto um e você outro. Vamos fazer assim tá? Disse Marah com um sorrisão no

rosto.

-Esta certo – riu Dan – dez segundos. Vamos lá, vamos lá.

-Vamos lá, vamos lá.

-Agora.

-Vinte – gritou Marah.

-Dezenove – gritou Dan.

-Dezoito.

-Dezessete.

-Dezesseis.

-Quinze.

-Quatorze.

-Trezes – gritou Dan

Page 43: Para Sempre e Mais

-Doze – disse Marah fazendo uma careta ao ouvir Dan contando errado.

-Onze.

-Dez.

-Nove.

-Oito

-Sete.

-Seis.

-Cinco.

Quatro.

-Três.

-Dois.

-Um.

Dan e Marah abraçaram-se e disseram a mesma coisa e depois sentaram-se na areia da

praia como todo mundo estava fazendo para ver o show de luzes que poderia ser visto a

distância e do espaço. Era primeiro de janeiro de dois mil cento e doze.

...

01 de Janeiro de 2116 00:30 - Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 8,3 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Dan e Marah agora estavam aproveitando o momento com Calvino e Red XVIII. O

pequeno cachorrinho tinha um pelo incomum e meio avermelhado, e por isso Dan o chamou de

Red, pelo seu pêlo e VXII que era a casinha criogênica onde ele estava quando Dan o

encontrou. Callvino é um androide desajeitado feito de alumínio e poliuretano por fora, e

recebeu esse nome, porque a superfície da sua cabeça é totalmente lisa. Ele é um androide

calvo, embora não tenha nada haver, e essa foi a única coisa boba que Dan lembrou na hora em

que o viu dada a sua antiga mania de apelidar as pessoas de repente.

-Vem cá cachorrinho. Olha só que coisa fofa – disse Marah acariciando os pêlos com

tons de vermelho do pequeno Red XVIII.

-Então Marah, isso é fantástico não é?

-Mas é claro. Ele é tão fofinho – riu Marah.

-É sim.

-E o androide? Ele fala? Perguntou Marah encarando o humanoide de metal e plástico.

-Diga olá para ele – sugeriu Dan.

-Olá Cal, Call o quê mesmo?

-Callvino.

-Olá Callvino – disse Marah confiante e de olhos aregalados.

-Olá senhorita Marah – respondeu o androide com voz sintetizada.

-Está aproveitando o ano novo Callvino?

-Estou senhorita. Meus sensores visuais e auditivos apreciaram o barulho e as luzes dos

fogos nas imagens, embora já tenha acabado nos vídeos.

Page 44: Para Sempre e Mais

-Que ótimo. Pode durar até pela manhã se você preferir. Se bem que não há manhã nem

nascer do sol – disse Marah olhando para o Red novamente.

-Bom, mas ainda temos muita coisa. Vamos para o banquete – disse Dan animado.

-Vamos. Vamos sim.

-E, há! Vamos tirar uma fotografias com Red e Call.

-Está bem. É ano novo, vamos aproveitar.

-Vamos.

...

01 de Janeiro de 2112 00:40 - Angra / Segunda Praia da Capital

A praia ainda estava lotada de pessoas. Dan e Marah ainda estavam sentados

conversando, tendo os pés molhados pelas ondas espumantes que também banhavam as algas

brilhantes da noite.

-Olha só Marah – disse Dan olhando para o alto, não fazendo caso da música que

ecoava no local.

-O que era?

-Que tal irmos passeara agora pela praia.

-Acho ótima ideia.

-E a gente aproveita e compra uma coisa para comer.

-Bem lembrado, estou mesmo com fome.

-Vamos.

Dan e Marah levantaram-se na areia da praia. Havia muitas pessoas ali aproveitando as

apresentações de bandas nacionais, convidadas para a ocasião. Um telão mostrava os

acontecimentos do local e de outros lugares do país que também estavam festejando o ano novo.

Eles se aproximaram de um homem que estava vendendo uns lanches rápidos um pouco

mais distante da praia e depois retornaram, para caminhar molhando os pés.

-Sabe Dan, eu fico imaginando aqui, como será que as pessoas vão comemorar isso

daqui a alguns anos. O que você acha? Perguntou Marah dando uma pequena mordida em seu

lanche.

-Bom, eu não sei o que dizer, mas tenho um palpite que as pessoas vão estar de branco –

sorriu Dan.

-Bem lembrado. Só a gente que não está de branco não é Dan.

-Somos os rebeldes essa noite.

-Rebeldes. Essa foi boa.

-Mas temos uma causa – riu Dan.

-Sabe eu fico pensando – disse Marah – Essa pessoas vem aqui e eu vejo que elas tem

olhares esperançosos. Vejo que elas desejam que o ano seja um ótimo ano, como nós dois

desejamos sabe, mas isso é repetitivo.

-É mesmo. Elas vão estar aqui no ano que vem de novo. Não sei se todas elas, mas

estarão aqui desejando a mesma coisa, aspirando as mesmas esperanças, os mesmo desejos.

-Dá uma sensação terrível, de que eles estão buscando satisfazer um vazio enorme do

qual não sabem o que é – disse Marah fitando os navios cheios de luzes no mar.

Page 45: Para Sempre e Mais

-Esse é o problema do homem. É como se todas essas alegrias terrenas fossem um tipo

de droga, pra ele. E sempre vão querem mais. Não importa o que eles inventem procurando algo

que seja alguma satisfação, sem algo definitivo o mundo vai se tornando sem graça.

-Você acha que conhecemos essa coisa definitiva, eu e você Dan? – perguntou Marah

olhando para ele curiosa.

-Bom, eu creio que não. As pessoas naturalmente sabem das coisas, mas não estão

prontas para aceitar tudo sabe. Eles sabem o que vai acontecer, mas não fazem nada a respeito.

É como se estivéssemos fingindo que sabemos de algo, mas ignoramos algo mais importante,

algo que esteja além de todas as coisas que podemos ver.

-Um dia podemos, sei lá ter alguma coisa que nos ajude a encontrar isso? Perguntou

Marah novamente terminando de comer o último pedaço.

-Creio que sim. Imagine que este seria um dia para os anjos do céu cantarem algo ou se

alegrarem. O dia em que vamos encontrar a resposta. E pode ser um momento eterno.

-Nossa que profundo – disse Marah sorrindo.

-Sim, o que achou do lanche? Perguntou Dan.

-Eu achei ótimo, mas você não pode dizer nada, está tudo aí ainda – disse Marah

sorrindo.

-Não se preocupe tanto moça, ainda tenho um ano pela frente para acabar com isso –

disse Dan entoando a voz de forma engraçada.

-Tudo bem, só não vá ficar com uma dor de barriga.

-Não mesmo - riu Dan dando uma grande mordida no seu lanche.

...

01 de Janeiro de 2116 01:02 - Depois do cinturão de Kuiper/ Mais de 8,3 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Pronto Marah, agora venha um pouco mais para o lado. Isso mesmo. Assim. Eu quero

pegar os fogos ali atrás. Prontinho. Preparem-se – disse Dan com a câmera.

-Estamos prontos – disse Marah sentada segurando Red que estava com a língua para

fora e tendo Call em pé ao seu lado fazendo um sorriso digital em sua face.

-Um, dois três, e digam xis.

-Xiz – disseram Marah e Call com sua voz sintetizada, com um latido de Red também.

-Prontinho – disse Dan.

-Agora, uma só de Call e Red – disse Marah tomando a câmera das mãos de Dan.

-Tudo bem, vá em frente – disse Dan

-Muito bem, muito bem. Agora uma com você e Red – disse Marah olhando para o

visor da câmera – preparem-se. Vamos lá. Ótimo – disse Marah depois do flash rápido.

Eles ficaram ali por alguns instantes, tirando fotos e fazendo poses com Red e Call

enquanto havia uma música que tocava. A mesa ainda estava cheia de alguma coisas e Red

corria para lá para lamber e comer o que podia também, mas era pego por Call que o trazia de

volta, o que provocava risos em Dan e Marah.

Eles tiraram muitas fotos e nesse momento a sessão parecia estar terminando quando

Marah se sentou em uma poltrona moldável redonda que mais parecia um balão que estava

estendida pelo salão junto com outras que faziam parte da decoração.

Page 46: Para Sempre e Mais

-Bom, qual foto está faltando – disse Marah olhando na câmera.

-Deixe eu ver também – disse Dan se aproximando.

-Hum, temos aqui, uma, duas. Nossa são tantas, mas só aparecemos eu e você com Call

e Red. Está faltando – Marah parou.

-É está faltando uma – Dan foi interrompido.

-Uma só nossa. Prepare-se – ordenou ela simpaticamente.

-Preparado – disse Dan dando um salto - gesticulando para Call – Ei Call, venha aqui,

precisamos de sua ajuda.

-Tudo bem – disse o androide com voz sintetizada se dirigindo a Dan e Marah .

-Precisamos que você registre uma foto de nós dois – Dan deu a câmera rapidamente

para Call.

-Nos espere viu? – disse Marah erguendo as sobrancelhas.

Os dois se prepararam e se entreolharam trocando um sorriso e Dan posou o braço do

lado de Marah e os dois sorriram para Call que segurava robótica e precisamente a câmera.

-Prontinho Call – disse Marah.

-Tire várias – ordenou Dan.

Os dois sorriram. Aquelas forma consideradas as melhores fotos por Call. Talvez fosse

suspeito, pois ele mesmo as tirara, mas haviam dois sorrisos satisfeitos. O fato de estarem numa

comemoração de ano novo nada convencional, com um cachorro e um androide vagando no

espaço, não havia tirado a alegria dos dois completamente. De vez em quando Dan ainda

encontrava Marah olhando imagens e chorando na frente da tela principal, lembrando-se de

todas as coisas que se foram. Ele mesmo ainda chorava e se preocupava com o que estava por

vir. Mas ao mesmo tempo as novas descobertas na nave parecia-os impulsionar para o que

poderia ser considerado o seu novo lar numa estrela aparentemente não muito distante. O

sentimento de manter-se vivos e perseverantes ainda estava em seus corações. Talvez essa fosse

ser a única experiência desse tipo para os dois. Foi algo que não foi programado para suas

mentes jovens, que muitos diriam estar cheias de sonhos e planos pela frente. Esses sonhos e

planos mudaram, mas estavam estranhamente acontecendo de outra forma inesperada. Nenhum

dos dois poderia imaginar isso para suas vidas, e ainda sim estavam lidando com todas as

esperanças possíveis. Em todos os casos esse momento se tornava único para os dois e não

deveria ser desperdiçado, simplesmente com tristeza ou pensamentos sobre morte. Poderia sim

estar repleto de sorrisos nas fotos, mesmo que ao lado de um cachorro e um androide que agora

eram uma companhia a mais, mas o fato era que eles não pretendiam perder nenhum momento a

cada segundo, cada lágrima, cada corrida, cada novo teste, cada nova descoberta, cada novo

jantar, cada nova conversa, cada milhão de quilometro voado para mais longe.

...

Page 47: Para Sempre e Mais

Histórias e Bicicletas

02 de Fevereiro de 2112 07:15 - Angra / Jardim da Faculdade Federal

-Sabe Marah, está vendo esse lugar? Perguntou Dan apontando para o verde que tomava

conta do local.

-Sim, estou, desde que chegamos – disse Marah deixado sair um sorriso malicioso.

-Bom, mas o que quero dizer é outra coisa sua engraçadinha. Creio que talvez lugares

como esse não existam no futuro – disse Dan analisando sua bicicleta antes do passeio que

tinham planejado.

-Mas o que você quer dizer? Que não teremos um lugar para caminhar ou andar de

bicicleta? Perguntou Marah soerguendo as sobrancelhas com um meio sorriso sem entender as

perguntas inusitadas de Dan para um passeio pela manhã.

-Os homens têm falado muitas coisas que de alguma forma podem mudar o mundo.

Você sabe tão bem quanto eu que temos muitos problemas – continuou Dan segurando a

bicicleta com as duas mãos.

-Mas eles não têm tentado resolver isso de alguma forma?

-Isso é o que me deixar mais triste ou irritado. O que eu escuto é que eles conseguem

assumir os próprios erros, mas ainda não estão certos – disse Dan com expressão desanimada.

-Bom mais isso é considerável. Pessoas que assumem os próprios erros para os outros

ou para o mundo estão no caminho certo.

-Eu concordo com isso, mas a maioria delas apenas se pseudojustificam por

simplesmente assumir seus erros. O que quero dizer, é que se você assume um erro, não

significa nada se você não se arrepender ou mudar, sabe. Isso é desonesto. É autoengano. Eu

sempre escutei alguém dizendo, “pelo menos eu assumo meus erros”, mas e daí, se você faz

isso, mas não muda o comportamento ou se arrepende, ainda está errado, entende.

-Sim entendo – disse Marah.

-A questão está no arrependimento. Se você não o faz nem muda sua atitude, não

significa nada.

-Mas, então se eu te disser que eu esqueci minha garrafinha de água, você me perdoa se

eu pedir a tua. Prometo que me arrependo e da próxima eu trago a minha – disse Marah

sorrindo.

-Bom nesse caso, você está no caminho certo menina – disse Dan sorrindo e pegado sua

garrafinha na bicicleta – e ainda eu mesmo pegarei água para você ali na cantina da faculdade

antes de nos aventurarmos nas trilhas dos jardins da faculdade.

-E eu ficaria agradecida – disse Marah.

-Não esquenta com isso, me deixe ir lá e já volto. Cabe um litro e meio aqui.

-Ótimo. Eu seguro as bicicletas enquanto você vai lá.

-Está bem. Não vá sem mim – disse Dan saindo.

...

07 de Fevereiro de 2116 08:23 - Depois do cinturão de Kuiper / Mais de 8,5 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Page 48: Para Sempre e Mais

-A cada dia que passa eu fico surpresa Dan. Onde você conseguiu encontrar isso?

Perguntou Marah pedalando em uma das raias.

-Na mesa sala em que você achou as raquetes, só que um pouco mais escondido, e eu ia

me esquecendo – disse Dan tirando um controle de um pequeno pack na bicicleta.

-O que é isso?

-Olhe só – disse Dan apertando um dos botões enquanto pedalava desajeitado.

-Nossa Dan, a ciclovia dos jardins da faculdade - disse Marah olhando para a

polarização nas paredes do local que agora reproduziam imagens – Como você conseguiu Dan?

-Bom, o banco de imagens desse lugar tem o planeta terra completo praticamente. Acho

que ao longo dos anos eles foram reunindo milhares de imagens e vídeos até chegarem a isso –

disse Dan cruzando a raia.

-Mas essa nave deve ter muita história pra contar.

-E em se falando de história, isso me fez lembrar um dia como esse em que estávamos

pedalando na ciclovia dos jardins da faculdade. Você se lembra?

-Lembro sim, aquele foi um dia e tanto. A gente conversou tanta, mas tanta coisa, que

fiquei cansada de tanto conversar – disse Marah sorrindo.

-Eu que a diga. Se houvesse outra pessoa, esta diria que você fala demais. Pelos

cotovelos.

-Ah, não é pra tanto, você é um rapaz conversador também Dan, não se esqueça. Você

contou todas as histórias possíveis naquele dia. Como eu poderia me esquecer – disse Marah

fixando o olhar nas imagens.

...

02 de Fevereiro de 2112 07:30 - Angra / Jardim da Faculdade Federal

O caminho no começo não era tão complicado. O terreno não era tão irregular quanto se

imaginava, embora algumas partes fossem difíceis, devido às chuvas recentes que deixavaram o

local um pouco alagado e úmido.

-Eu adoro isso – disse Marah.

-Eu também. Gosto do cheiro do verde – disse Dan.

-Me faz lembrar quando eu vou visitar o meu avô. Lá onde ele mora, na região

metropolitana, tem uma estrada bem pavimentada sabe. E dos dois lados tem um verde bem

bonito. Alguns campos abertos, mas muitas árvores, especialmente de frutas dentro dos

cercados que seguem pela pista. Eu acho linda a imagem dos tocos cortados e empilhados na

beira da pista durante uma parte do percurso. É uma estrada que vai dar em um pequeno açude

que tomamos banho. É muito bom.

-Que legal. E onde fica Marah?

-Em um distrito chamado Cajueiros?

-Cajueiros, é? riu Dan.

-É. Lá tem muitos pés de cajueiros e por isso o nome do local. Quando o povo começou

a morar lá viu que tinha muito e então o nome pegou, e por falar nisso, já roubei muito caju de

lá. Não se pode entrar nas cercas sem autorização – disse Marah com um sorriso malicioso.

-Nossa, não acredito que estive andando com uma criminosa essa tempo todo. Estou

perdido. Você pegava cajus todas as vezes? Disse Dan rindo.

-Não todas às vezes, só quando estávamos com fome. Eu sempre ia com minhas primas

e meu primos, mas as meninas não entravam, só eu e meus primos, e íamos nos pés de caju que

Page 49: Para Sempre e Mais

ficavam mais perto da cerca e da pista caso precisássemos fugir. Era um aventura. Ficávamos

com as roupas todas manchadas e pegajosas de tanto levar caju para a casa do vovô.

-Tenho que admitir que roubei algumas coisas também – disse Dan.

-Agora eu que fico com medo rapaz – sorriu Marah – mas como foi tua aventura

criminosa Dan?

-Bom, deixa eu lembrar de qual delas.

-Eita, e são muitas é? sorriu Marah passando por cima de uma poça.

-Não, tem umas histórias que são melhores. Histórias de furtos ou roubos não são legais.

Não é um bom incentivo, nem alguma lição – disse Dan.

-Pois conte a melhor.

-Me lembro de uma vez. Quando fomos ao hospital infantil.

-Hospital infantil?

-Isso mesmo. Foi no começo do curso de física na faculdade. Em uma das cadeiras.

Você sabe que em todo curso sempre tem alguma cadeira de relações humanas ou filosofia, e

uma das atividades tinha haver com compartilhar o que sabíamos com as pessoas de várias

faixas etárias. A proposta era, de se fazer conhecer a física ou assuntos que a envolvessem a

pessoas de todos os tipos. Nesse caso, criancinhas no hospital. Foi um dia muito bom – disse

Dan com entusiasmo.

-Nossa, deve ter sido mesmo – disse Marah empolgada – continue.

Sim – eles estavam passando agora na beirada do lago principal do jardim – Eu falei

sobre o sistema solar e os planetas com ilustrações, foi fantástico para eles. A maioria eram

filhos de famílias que não tem muitas condições e aquilo foi muito incentivador para eles sabe.

Talvez algum astrônomo ou físico, sei lá deva sair dali – sorriu Dan – Eu lhes contei sobre a

importância de se cuidar do mundo também, e de como todas as coisas na terra e fora dela

funcionavam de forma bem sincronizada sabe, como se fosse um relógio que alguém construiu,

bem formado e bem ajustado com leis bem elaboradas, que algumas vezes poderiam parecer

estranhas, mas estavam lá sendo governadas de algum modo. E que o método de conhecimento

científico é usado para se conhecer as coisas, e aí eu tive que explicar o que era método, mas foi

bem divertido. Eles riam bastante com minhas gracinhas e piadas.

-Olha, isso é muito legal Dan. Não me lembro de haver coisas assim em curso de

química ou biologia.

-Talvez. É uma forma bem legal de exercitar e repassar nossos conhecimentos. Acho

altamente importante ensinar. As crianças quando crescerem, seguirão algum caminho e sabe,

devemos ensina-las o caminho de algo que tenha valor ou que seja a verdade, para quando eles

estiverem velhos não se desviarem desse caminho. E acredito que a boa ciência sempre estará

do lado da verdade.

07 de Fevereiro de 2116 08:50 - Depois do cinturão de Kuiper / Mais de 8,5 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Nunca perguntei se você fazia exercícios na Terra Marah – disse Dan.

-Às vezes. Não era muito dedicada. Talvez andasse mais de bicicleta, na estrada de

Cajueiro – sorriu Marah.

-Andar de bicicleta sempre foi algo bom. Eram as duas coisas que eu mais fazia no

tempo livre, ou andava de bicicleta ou fazia caminhadas. Algumas vezes fui de bicicleta até a

faculdade quando estudava pela manhã.

Page 50: Para Sempre e Mais

-Nossa, então você era um rapaz saudável e ecologicamente correto – disse Marah com

um meio sorriso.

-É, mais ou menos, sabe. Talvez se o transito de onde morávamos fosse mais caótico eu

usasse mais, mas em alguns lugares se tornou uma ótima alternativa.

-Algumas pessoas preferiam, talvez para passeios dominicais.

-É mesmo, mas lembro bem de ter visto muitas pessoas usarem para outros propósitos,

digo no cotidiano urbano pelo, menos da capital. Uma grande prova é o jardim da faculdade.

-Aquilo era uma floresta. Alguém poderia se perder ali dentro – sorriu Marah.

-Bom, era mesmo. Mas como eu ia dizendo, uma das coisas que poderiam salvar

alguém em alguma situação era o aluguel de bicicletas por créditos, lembra?

-Ah, lembro sim. Eu usei algumas vezes para passear com minhas colegas da escola

depois da aula.

-Era engraçado. As bicicletas ficavam estacionadas em uma avenida, presas em um

ponto, e se você tivesse créditos elas poderiam ser liberadas, e sempre havia o registro de quem

pegou, onde pegou e se devolveu.

-Você poderia pegar em um lugar e devolver em outro não é?

-Mais ou menos. Algumas vezes todas as vagas ficavam preenchidas e você tinha que ir

guardar em outro local – disse Dan.

-Hum, é mesmo.

-E sobre os benefícios. Andar de bicicleta fazia parte das políticas públicas em alguns

países. Essas ações buscavam solucionar problemas de mobilidade, promover a saúde da

população e sanar as doenças das cidades dependentes de carro, como poluição,

congestionamento e estresse.

-Nunca ouvi muito sobre benefícios de andar de bicicleta – disse Marah.

-Bom. Existiam alguns motivos tipo, aumentar o metabolismo e queimar calorias,

principalmente se aliada a uma boa dieta, sabe. Também, pedalar ajuda a desintoxicar, já que

todo o organismo é trabalhado e a circulação sanguínea aumenta nos rins, órgão que ajuda a

mandar embora todos os excessos, esse tipo de coisa.

-E você está um educador em educação física – disse Marah sorrindo.

-Ah, isso poderia se encontrado facilmente na rede. Os desavisados poderiam saber bem

o que significava andar de bicicleta. Ainda bem que temos pelo menos duas aqui nesse local.

-Ainda bem mesmo. É um grande benefício.

-É mesmo. E já estou exausta.

-Ah, mas você não deu nem mil voltas ainda.

-Eita, assim eu vou desmaiar Dan.

-Estou brincando – disse Dan sorrindo.

02 de Fevereiro de 2112 08:30 - Angra / Jardim da Faculdade Federal

Dan e Marah estavam sentados agora em um banco de madeira na borda do lado do

jardim gigante da faculdade. Rostos transpirando e corpos esticados sobre o banco. Eles se

sentiam como se não tivessem feito aquilo a muito tempo. Andar de bicicleta na trilha do jardim

revelara-se uma tarefa um pouco cansativa, mas para todos os efeitos, válida.

-Ainda tem água Dan? Perguntou Marah olhando para as nuvens.

-Tem sim – respondeu Dan imediatamente.

-Eu trouxe umas frutas aqui no pack da minha bicicleta.

Page 51: Para Sempre e Mais

-Nossa – riu Dan – e eu estava me perguntando porque o pack da tua bicicleta estava um

pouco maior que o meu. Muito esperta você moça.

-É claro. Eu tenho aqui, maças e uvas e umas barras de cereal com aveia e avelã.

-Olha só, acho que não vou almoçar hoje. Temos um piquenique aqui.

-Também não é para tanto – disse Marah fazendo um bico.

-Tome, duas barras de cereal, uma maçã e algumas uvas.

-E brindaremos com o quê? Perguntou Dan com um sorriso.

-Com água – riu Marah.

-Estamos muito saudáveis essa manhã. Tomara que vivamos duzentos anos.

-Viver duzentos anos? só se fossemos congelados.

-Congelados. Isso me deu um calafrio.

-Será que algum dia poderíamos fazer isso?

-Não sei. Não consigo imaginar, talvez até mesmo em uma câmara criogênica. Ficar uns

cinquenta anos dormindo.

-Talvez deva ser uma experiência desagradável.

Pode apostar que sim – disse Dan – Prefiro ficar acordado, passear de bicicleta e comer

frutas brindando com água – riu Dan.

-Eu também – disse Marah sorrindo.

...

07 de Fevereiro de 2116 09:20 - Depois do cinturão de Kuiper / Mais de 8,5 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Mais alguma história, senhor contador de histórias? Perguntou Marah ofegante

descendo da bicicleta e sentando-se no chão.

-Bom, acho que não – disse Dan fazendo o mesmo mudando a polarização de imagens

para águas.

-Isso é para sentirmos forte desejo de beber muita água?

-É – disse Dan sorrindo – Eu amo água.

-Eu também – disse Marah.

-E neste momento temos toda a água praticamente para nós.

-Os homens sempre diziam que a água iria acabar. Acho que tenho uma grande

impressão sobre isso nesse momento – disse Marah preocupada.

-Nem tanto, temos o suficiente para muitos anos lembra? Toda conversa sobre a água

sempre foi história que o homem inventava.

-Ah, entendido senhor historiador, mas essas que você contou são verdadeiras não é?

Afinal você se tornou um péssimo contador de histórias. Que eu lembre você falava mais.

-É mesmo. Talvez estejam faltando umas barras de cereal, uvas, maçãs, essas coisas –

disse Dan maliciosamente.

-Muito espertinho você.

-Que é isso, se pedalarmos mais um pouquinho, e dobrarmos bem ali na esquina

podemos encontrar algo para comer e beber. Dessa vez eu pago a conta e você é minha

convidada.

-E as histórias? Perguntou Marah levantando-se.

-Acho que nesse momento estamos na parte em que escrevemos a própria história.

-Vamos colocar isso nos livros?

-Bom, nós temos todo esse poder agora. Já imaginou algo assim escrito, “Jovens que

sobreviveram depois da destruição da terra da qual nossa civilização que vive nesse planeta se

tem notícia, gostavam de pedalar, comer chocolates, cereais e contar histórias vagando pelo

espaço com um cachorro e um androide.”.

-Seria mais ou menos por aí.

Page 52: Para Sempre e Mais

-Quem sabe daqui a cem anos – disse Dan.

-É, quem sabe.

-Então já temos o primeiro capítulo.

-Vamos continuar escrevendo então – disse Marah.

-É mesmo. E agora é a parte em que comemos os chocolates e cereais – disse Dan

animado.

-Dessa vez não, vamos fazer algo diferente, que realmente encha nossas barrigas.

-Todo bem você quem sabe – disse Dan.

-Chega de histórias e bicicletas por hoje.

...

Page 53: Para Sempre e Mais

Museu, Blusas e Sushi

17 de Março de 2112 18:30 - Angra / Praça de alimentação do Shopping Passeo.

Algumas pessoas diriam que sushi é uma comida exótica. Pelo menos do lado ocidental,

um tipo de comida muito conhecida, uma arte milenar, algumas pessoas poderiam dizer isso.

Outras alegariam e diriam que, não existe comida mais exótica e boa que buchada, um prato

típico do nordeste do país. Dan e Marah resolveram fazer algumas coisas nesses dias, e uma

delas seria experimentar a primeira opção. Os dois nunca haviam experimentado sushi e

manusear os pauzinhos seria uma coisa da qual se poderia rir.

-Olha só Marah, eu vou admitir para você que não sei usar estes Hashis – disse Dan

sorrindo.

-Bom, então você pode ficar tranquilo, pois eu, também não sei usá-los. Aliás, eu nunca

comi sushi – sorriu Marah também.

-Então isso vai ser divertido.

-Ei, nesse menu, tem uma pequena orientação de como você come sushi – disse Marah

mais aliviada com a situação de aprendizado.

-Bom, então leia para nós.

-Hum. Diz aqui que devemos segurar os Hashis assim – Marah segurou os pauzinhos

com uma mão enquanto segurava o menu com a outra e lia – um entre o polegar e o indicador e

outro entre o anular e o indicador em sentido paralelo e não cruzados. Parece fácil – sorriu

Marah.

-Deixe eu tentar – disse Dan desajeitado tentando pegar a massa branca envolta em pele

de peixe cru deixando cair logo em seguida o que fez com que Marah risse.

-Mais uma tentativa senhor físico. Vamos lá você consegue, deve ser como aprender a

terceira lei de Newton – riu Marah.

-Bom, acho que vou precisar de mais umas vinte tentativas para que isso fique ótimo –

disse Dan conseguindo segurando o sushi desajeitado – Agora o que eu faço?

-Come é claro – disse Marah se divertindo com a cena – Nossa eu queria estar gravando

isso.

-Vamos lá – Dan levou os hashis até a boca mas deixou cair o pedaço de sushi o que fez

com que Marah soltasse um estardalhaço de riso.

-Que engraçado você inclinando a cabeça para tentar pegar o sushi. Pareceu um

cachorrinho deixando cair o osso – continuou Marah rindo.

-Acho que precisamos de mais uma orientação sobre isso. É mais difícil do que calcular

a colisão de duas galáxias espirais – disse Dan desanimado.

-Bom, aqui diz que tem o shoyu ele deve ser passado apenas no peixe – disse Marah.

-Mas isso pode ser controverso, pois eu imagino que se deva mergulhar o arroz com

peixe e tudo – riu Dan.

-Bom. Diz aqui que isso é contra as regras e o preparador do sushi, um cara que se

chama itamae faz um sabor que não deve ser trocado pelo shoyu.

-Não seja malvado comigo – disse Marah soltando o menu na mesa e pegando os hashis

desajeitadamente.

Page 54: Para Sempre e Mais

-Pode começar. Os shoyus, não esqueça, mas não tire o gosto – disse Dan com um

sorriso malicioso.

-Bom, vamos lá. Ei, você está gravando – protestou Marah ao ver que Dan segurava seu

aparelho de chamadas no modo de gravação.

-Mas é claro. Foi uma ótima ideia essa sua – riu Dan.

-Vamos ver então, senhor físico, gravador que deixa o sushi cair – disse Marah fazendo

bico e soltando a língua para Dan.

Ela pegou o tempero líquido e derramou sobre uma das peças de sushi. Olhou para Dan

lembrando que estava fazendo algo de errado e depois olhou para o sushi passando a língua

atravessada tocando os dentes superiores e soerguendo as sobrancelhas. Ela segurou

perfeitamente os hashis e começou a amaciar o pedaço de sushi ensopado pelo tempero suave

meio apimentado. Ela fisgou um pedaço e segurou cheia de si olhando para Dan. E

simplesmente ela levou a boca e mastigou enquanto estava sendo gravada.

-Está bem, você me convenceu Marah. Você tem genes orientais. Se saiu muito bem –

riu Dan.

-O segredo é usar os temperos. E amaciar o sushi, assim fica mais fácil, não creio que

tire completamente o gosto real.

-Agora deixe eu tentar então – disse Dan animado.

-Mas eu vou gravá-lo – disse Marah.

-Nada mais justo. A gente ri agora e ri depois.

Os dois ainda tiraram muitas fotos e riram depois.

...

20 de Março de 2116 09:20 - Depois do cinturão de Kuiper / Mais de 8,7 bilhões de

quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Dan começou a rir quando viu Marah vestida a caráter. Ela estava de japonesa e trazia

sushis em uma bandeja. Eles estavam em um jantar na praça central da nave. Call jogava um

disco para Red ali na praça.

-Você está engraçada. Onde conseguiu isso menina? riu Dan.

-Nos armários culturais em um dos setores dessa nave senhor, e trouxe sushi para nossa

refeição desta noite – disse ela entoando a voz.

-Você se sai muito bem interpretando. Nunca tinha pensado em ser artista, ou esse tipo

de coisa.

-Acho que não, só sei que gosto de sushis – disse ela sorrindo.

-E você foi a itamae dessa vez? Perguntou Dan curioso.

-Foi sim, por isso você não deve ser tão exigente. Talvez seja boa em interpretação, mas

não sou uma itamae profissional – sorriu Marah dispondo as porções na mesa – Ah e outras

coisa, selecionei um anime muito antigo para assistirmos enquanto estamos aqui.

-É? E como é a história?

-É de um espadachim, andarilho que tinha um corte em forma de xis no rosto. Era um

assassino, mas depois virou um defensor da justiça, numa época chamada era Meiji.

-Lembro-me dos meus estudos sobre história sobre essa época.

Page 55: Para Sempre e Mais

-É? E como foi? Perguntou Marah curiosa apesar de ter escolhido o anime embora não

soubesse.

-Bom. Cada nova era, era inicia pela chegado do novo imperador ao poder. Uma

sociedade tipicamente imperial, mas que mudou com a chegada dos americanos em seu país.

-E foi mais ou menos quando que isso aconteceu? Perguntou Marah já sentada.

-Bom, em 8 de julho de 1853, quatro navios americanos, comandados pelo comodoro

Mattew Perry, ancoraram na Baía de Edo sem autorização. Edo é a Nova Tóquio, que antes era

só Tóquio antes da nova revolução em 2053 quando foram criados os motores de propulsão

magnética e o início da era de veículos urbanos voadores rasantes como os conhecíamos. Sim,

mas como eu ia dizendo, Perry levava uma carta do presidente americano, Millard Fillmore, ao

xogunato de Tokugawa, exigindo que o Japão abrisse seus portos ao comércio com os Estados

Unidos. Confiante no poderoso arsenal que carregava a bordo, o comodoro deu um ultimato aos

japoneses: avisou que voltaria no ano seguinte para ouvir a resposta dos nipônicos. E assim fez.

Retornou ao Japão em fevereiro de 1854, dessa vez com uma esquadra de 11 navios. Após

alguns dias de tensa negociação, Perry conseguiu o que queria. No dia 31 de março, o Japão

assinou um tratado com os Estados Unidos, abrindo dois de seus portos (Shimoda e Hakodate) a

navios americanos. Concordou também que os americanos comprassem carvão, água e outras

provisões nos portos japoneses. O tratado assinalou o fim de dois séculos de política de

isolamento do Japão do resto do mundo.

Em 1869, o imperador Meiji, então com 17 anos, mudou-se com sua corte de Kyoto

para Tóquio, oficialmente a nova capital do país. O novo governo, controlado por burocratas da

oligarquia que havia derrubado o xogunato, iniciou uma série de reformas para modernizar o

Japão. Em 1871, aboliu o sistema de domínios, substituídos por províncias administradas por

governadores nomeados pelo imperador, em lugar dos senhores feudais que transmitiam o poder

hereditariamente. Os samurais, que haviam sido decisivos para o fim do xogunato de Tokugawa,

acabariam sendo mortalmente atingidos no novo regime. Com a assessoria militar francesa, o

governo Meiji criou, em 1873, um exército de conscritos – todo homem que fizesse 21 anos,

independentemente de sua origem social, teria de se alistar para servir as Forças Armadas. Em

1876, os samurais foram proibidos de portar espadas – somente militares uniformizados do novo

exército poderiam carregar a arma. Na prática, isso representava a extinção da classe dos

samurais. O golpe final veio com a abolição do estipêndio pago aos samurais – que recebiam

um salário fixo, proveniente da taxação do arroz produzido pelos camponeses. Com isso, cerca

de 2 milhões de samurais, 6% da população japonesa da época, viram-se da noite para o dia

obrigados a buscar outra atividade para sustentar-se.

-Nossa, que coisa hein? Sorriu Marah – E onde entram os sushis nessa história toda

também?

-Bom eu não sei, mas tenho uma ideia. Podemos fazer uma coisa – disse Dan

levantando-se e voltando-se para uma das telas de informação transparentes da praça – Polarizar

história do sushi nesta tela computador – ele voltou e sentou.

-Bom, vamos à história e vamos comer – disse Marah.

-Nunca soubemos quando estávamos na terra, e agora vamos comer uma comida não

típica nesta praça típica em uma situação não comum e aprender um pouco.

O computador começou a exibir as imagens com o áudio enquanto Dan e Marah ainda

comiam sushi desajeitadamente. De fato os dois ainda não tinham aprendido nem a história e

nem como se comia sushi, o que deixou a situação engraçada. Call parou para olhar o que fez

Red ficar sozinho cheirando as plantinhas do local. O computador fazia ecoar pelo local todo.

Page 56: Para Sempre e Mais

- A história do sushi remonta à necessidade de conservação de peixe cru, através de

técnicas desenvolvidas no Sudeste Asiático.

A cabeça e as vísceras eram retiradas, os filés do peixe cru eram salgados e acondicionados em

um barril de madeira com camadas de arroz cozido entre eles. Com a fermentação natural do

arroz, ocorria a liberação de ácido láctico, o que azedava o peixe e garantia sua conservação. O

longo processo de armazenamento (de 1 a 3 anos) tornava o arroz impróprio para consumo e

somente o peixe era aproveitado.

Ao ser introduzida no Japão, no século VII, essa técnica sofreu uma pequena

modificação: a utilização de pedras para prensar o peixe cru e o arroz. Estava criado o tipo de

sushi “Nare zushi”, que tinha o odor e sabor fortes como características. Um exemplo atual

desse tipo de sushi é o “Funa zushi”, feito com a carpa.

Em seguida, no século XV, um tipo de sushi chamado “Nama Nare zushi” foi criado.

Basicamente, tratava se do “Nare zushi” com um período de fermentação menor (cerca de 1

mês), o que já permitia o consumo do arroz e do peixe juntos. É considerada a primeira forma

do sushi moderno.

A introdução do vinagre no preparo do arroz para sushi ocorreu no século XVII, em Edo

(atual Tóquio) pelo médico Matsumoto Yoshiichi. Isto possibilitou a redução do tempo de

preparo do sushi para 1 dia. Com a fartura de pescados e frutos do mar na baía de Tóquio, o

peixe passou a ser consumido cru e fresco. Além do ganho em tempo de preparo do sushi, o

vinagre adicionou um sabor especial ao prato. Este tipo de sushi é chamado de “Haya zushi”.

Ainda no final do século XVII, um novo tipo de sushi é criado na região de Osaka: o “Oshi

zushi”. Numa caixa de madeira, o arroz de sushi e o peixe cru são colocados com um peso por

cima para comprimi los. O sushi é cortado em pedaços retangulares. O estilo de sushi de Osaka

ficou conhecido como estilo Kansai.

No século XVIII surge aquele que é considerado o primeiro sushiman da história:

Hanaya Yohei. Ele criou o tipo de sushi mais popular, o “Niguiri zushi”. Um bolinho de arroz

de sushi com uma fatia de peixe cru por cima, para consumo imediato, que podia ser manuseado

com as mãos, dispensando os hashis. Como não havia refrigeradores, os peixes eram marinados

em molho de soja ou vinagre e o tamanho era aproximadamente o dobro dos atuais.

Outros tipos de sushi tornaram-se populares: o “Inari zushi”, o “Maki zushi” (nome

genérico para o sushi enrolado) e o “Chirashi zushi”. A grande inovação destes tipos de sushi

era a utilização apenas da força das mãos para realizar a prensagem.

O “Niguiri zushi” também é conhecido por “Edomae zushi”, em função de sua origem:

eram utilizados pescados, frutos do mar e algas retiradas da baía de Tóquio (antigamente

chamada de Edo). Além disso, a vida “agitada” que tomava forma nas grandes cidades favorecia

o estabelecimento de uma espécie de “fast-food”: as pessoas petiscavam na entrada dos

estabelecimentos, nas ruas ou à beira de estradas. O estilo de sushi de Tóquio ficou conhecido

como estilo Edo. Segundo a história do sushi e suas origens, o quiosque de Yohei, no bairro de

Ryogoku, foi o primeiro a vender o “Niguiri zushi”.

Em 1923, após a cidade de Tóquio ser atingida por um terremoto, muitos donos de

quiosques alimentícios voltaram para suas regiões de origem e disseminaram a receita do sushi

por todo o Japão.

Finalmente, no século XX, com a globalização, o sushi espalhou se por todo o mundo. Além do

sabor, a preocupação do homem moderno com uma alimentação saudável fez do sushi um

sucesso mundial e criou um novo tipo de sushi: o “Kawari zushi”.

Page 57: Para Sempre e Mais

Depois de ouvir toda história, finalmente eles aprenderam e ficaram satisfeitos. Até Red

comeu sushi, mas não gostou. Ficaram assistindo o anime do samurai da era Meiji que tinha um

corte em forma de xis até a hora de irem dormir nas hiperbáricas.

...

15 de Abril de 2112 18:30 - Angra / Praça de alimentação do Shopping Passeo.

-O que você pensa sobre segredos Dan? Perguntou Marah inesperadamente.

Dan a encarou –Eu não gosto de segredos! Respondeu ele.

-Porque?

-Bom. Vou te contar algo. A palavra secreto é repugnante, em uma sociedade livre.

Digo isso porque somos intrinsecamente avessos a segredos ou sociedades secretas, juramentos

secretos, atos secretos. Há um perigo imenso em ocultar excessivamente atos injustificáveis,

muito pior do que os perigos que citam para justifica-los. Isso é uma ameaça que se caracteriza

como arbitrária. Existe nisso uma forma crescente de se usar alguma forma de segurança, para

que depois se tenha o direito de censura ou encobrimento. A oposição a esse tipo de coisa, nos

colocará contra aqueles que usam meios secretos, para converter alguém a sua causa e aumentar

sua esfera de influência, onde há intimidação, infiltração, subversão. Assim as ações não vem a

publico, seus erros são enterrados, e nem aparecem em primeira página. Dissidentes são de

alguma forma silenciados, onde nenhum gasto seria inspecionado, nenhum rumor questionado,

nenhum segredo revelado. Porque a partir da inspeção é que vem apoio ou oposição e ambos

são necessários. Normalmente segredos estão cheios de erros, e um erro não chega a ser um erro

quando você não está disposto a corrigi-lo. Guardar segredo pode significar não estar disposto.

Informações não secretas quando a tona podem nos ajudar, despertar, refletir e indicar nossos

perigo e oportunidades, para indicar nossas crises e nossas escolhas, para dirigir, educar e

moldar. Doutra feita é trágico. É como se não houvesse liberdade. Você está preso pelos

próprios segredos.

-Segredos não nos deixam livres?

-Não! Segredos às vezes são como mentiras. Às vezes é sempre preciso um novo

segredo a favor do segredo anterior. Não que eu saia por aí proclamando toda a minha vida e

responda perguntas indiscretas com satisfação, mas existem pessoas que acham que são mais

fortes por manterem certas coisas no escuro, mas estão apenas presas.

-Às vezes é preciso um melhor amigo para contar certas coisas Dan – objetou Marah.

-Realmente é isso mesmo. Concordo com você que precisamos de alguém de confiança

para contar certas coisas. Muitas vezes eu vi meninas do meu curso que tinham esse jeito.

Pareciam ser pessoas que eram fortes, mas precisavam de alguém. Muitas vezes elas não eram

pessoas mais transparentes porque tinham medo. Muito misteriosas, até mais que o normal para

uma mulher.

-Medo de quê? Perguntou Marah abocanhando o pedaço de pizza logo em seguida.

-Medo, porque se tornam vulneráveis, podem ser dominadas ou alguma informação

poderia ser usada contra elas.

-Entendo – disse Marah – mas em todas isso é charme.

-Isso me faz lembrar uma canção muito antiga – disse Dan olhando para algum lugar

acima de sua cabeça.

Page 58: Para Sempre e Mais

-Você tem algum tipo de dom de lembrar de canções antigas. Apesar de ouvir músicas

atuais, você conhece muitas das antigas. Como é a canção?

-Ela dizia assim, “Eu sou um rapaz que não resiste a estes segredos. Estou preso a

qualquer pergunta sua. Alguém como eu, mesmo inteligente ao observar uma garota, não

resiste aos segredos dela.”

-Realmente. Você tem algum segredo Dan? Perguntou novamente Marah de forma

furtiva.

-Tenho, mas não vou te contar. Talvez no futuro - sorriu Dan – e você tem?

-Tenho, mas não vou te contar. Talvez no futuro – os dois riram juntos nesse momento.

- “Alguém como eu, mesmo inteligente ao observar uma garota, não resiste aos

segredos dela.” – cantou Dan sorrindo.

...

26 de Março de 2116 10:13 - Depois do cinturão de Kuiper / Mais de 8,7 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

-Eu tenho uma surpresa. Vamos – disse Dan puxando Marah pelo braço em direção a

praça da nave.

-Calma Dan, eu vou vomitar o café da manhã todo – reclamou Marah.

-Vai não – disse Dan fazendo uma careta ao pensar sobre manhã e noite dentro da nave.

Eles chegaram à praça e ela estava repleta de imagens históricas em terceira dimensão

distribuídas em alguns cantos. Quando Marah viu deu um grande sorriso de felicidade e um

abraço em Dan. Call e Red que estava com uma coleirinha estavam no local também.

-Pronta para uma passei no museu moça? Perguntou Dan simpaticamente.

-Mas é claro – respondeu Marah exultante.

Os dois ficaram passeando enquanto, a aula de história era exibida em áudio e som.

...

10 de Maio de 2112 09:40 - Angra / Museu municipal de Angra

-Bom, vamos começar pela pré-história – disse Dan.

-Está bem – disse Marah.

-Aqueles ali são os homens das cavernas – sorriu Dan – Eu particularmente não

acredito, e também porque as provas que temos hoje não apontam mais para isso.

-E aqueles? Perguntou Marah, achando as explicações engraçadas e instrutivas embora

ela já soubesse de muitas coisas.

-São alguns animais extintos de alguns períodos diversos, sabe – disse Dan apontando

para um Tigre dentes de sabre, um mamute e um roedor que estavam juntos.

-Olha só, macacos – disse Marah rindo.

-É mesmo, macacos. Alguns ainda acreditam que viemos dos macacos, mas nunca

encontraram um bicho, meio homem, meio macaco.

-O que você quer dizer?

Page 59: Para Sempre e Mais

-Só temos macacos, e só temos homens, nunca um macaco em transição para homens. O

elo perdido, nunca existiu. Invenção do homem. Sim, continuemos.

Mais adiante eles estavam no setor de guerras e artefatos de guerras.

-Olha só, as balas de canhão. Uma coisa daquelas fazia um grande estrago – disse Dan.

-Me lembro dos filmes dos piratas antigos, das guerras e outras coisas.

-Olha aquilo ali, é uma representação da guerra civil americana – disse Dan.

-Aquele era o presidente da época? Perguntou Marah.

-Aquele de cavanhaque, com chapéu grande. O nome dele era Abraham Lincoln. Aboliu

a escravidão no EUA por volta de 1865. Ele foi bem sucedido sabe; liderou bem o país na

Guerra Civil e ainda deu impulso ao Congresso para a aprovação da Décima Terceira Emenda à

Constituição dos Estados Unidos, que como eu disse pôs fim a escravidão.

-Você acha que existe escravidão ainda hoje Dan? Perguntou Marah.

-Existe. Sempre existiu. Eu diria que o homem vive em uma escravidão da qual não

pode vencer. É como uma prisão sem muros onde muitos, vivem assim até a hora de morte, sem

conhecer a verdade.

-Nossa, isso é tenso. Somos esse tipo de pessoa também?

-Creio que sim. Talvez nos libertemos quando conhecermos a verdade. Assim a verdade

nos libertará dessas amarras – disse Dan.

-Hum – disse Marah afastando-se um pouco – olha Dan.

Eles estavam diante de uma cruz na seção religiosa.

-O que é isso, uma cruz em um museu? Perguntou Marah curiosa.

-Deixe eu ver. Ah, está aqui esta cruz foi de uma igreja. Uma pequena igreja

protestante. Batista de uma missão americana que veio ao país. Uma das primeiras. Ela ficava lá

na frente, na parte de dentro da igreja. Embora seu significado aparente, o fato era que a figura

principal do cristianismo, não estava mais na cruz, pois tinha ressuscitado e agora está vivo e vai

voltar.

-Tem mais uma inscrição pequena aqui, olha – disse Marah apontando para uma

pequena placa.

-Bom, deixe-me ver. Diz o seguinte: “E conhecereis a verdade, e a verdade vos

libertará”. (João 8.32)

Dan e Marah entreolharam-se e continuaram seu passeio pelo museu.

...

27 de Julho de 2112 18:47 - Angra / Praça de alimentação do Shopping Passeo.

-Eu encontrei um lugar interessante, Marah e preparei uma surpresa – disse Dan.

-Adoro surpresas rapaz – disse Marah entusiasmada.

-Te chamei aqui hoje para celebrar nossa amizade que já tem um ano hoje – informou

Dan satisfeito.

-Nossa, mas passou tão rápido e eu nem percebi. Esqueci completamente do tempo, mas

estou esperando.

Page 60: Para Sempre e Mais

-Não sei bem se é exatamente o tipo de presente que você gostaria de ganhar, mas olhe

só – Dan tirou uma camisa com uns desenhos – são camisas estampadas.

-Onde você conseguiu isso?

-Em uma lojinha no centro da cidade. As pessoas faziam muito dessas no começo do

século passado, mas virou peça de museu – disse Dan.

-Oh Dan, eu adorei. Olha só somos eu e você desenhados comendo sushi, andando de

bicicleta e no museu. Nossa é linda. Acho que nem vou usar, vou deixar guardada de recordação

para lembrar.

-Mas você tem que tirar uma foto, pelo menos uma, vestida com ela. E não se preocupe

com o tamanho. Essa malha não é exatamente a mesma que eles usavam. Essa tem um

dispositivo de ajuste de tecido que pode automaticamente quando você vestir, ficar no tamanho

ideal. Vista – ordenou Dan.

Marah vestiu a blusa. Dan tinha uma outra blusa estampada para ele. E eles saíram

assim nas fotos, de blusas vestidas e com desenhos. O que ficou engraçado depois das caretas

também que faziam nas fotos.

...

26 de Março de 2116 10:55 - Depois do cinturão de Kuiper / Mais de 8,7 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente.

Dan e Marah não lembravam de quando tinham tido a última aula de história na Terra.

Mas a que tiveram na nave foi fantástico, com todas as imagens vívidas saltando e brilhando

bem na frente deles, que aproveitaram cada segundo com Call e Red que sempre estavam por ali

e também estavam construindo a nova história de fato.

Dan novamente preparou uma surpresa para o final.

-E agora a última história dessa noite.

Era uma gravação do Shopping Passeo. Várias fotos de Dan e Marah, em vários lugares.

No jardim botânico, no planetário, no museu, andando de bicicleta, no ano novo na praia e

depois, uma gravação da praça de alimentação. Foi inevitável, Marah começou a chorar e Dan

também fez o mesmo, mas o choro converteu-se em riso quando eles viram a eles mesmos

fazendo caretas enquanto estavam vestidos com umas blusas estampadas. Call ficou admirado

ao ver a cena e abriu um sorriso digital. As caretas fizeram Dan e Marah gargalhar muito nessa

hora até sentam-se em um dos bancos da praça lembrando todos os bons momentos. Embora

cada momento tivesse algum tema específico, existia algo, mais importante que, sushis, museus,

blusas ou qualquer outra coisa. Havia felicidade em todos os momentos. Talvez alguém

perguntasse algo como “Mas Dan e Marah não tinha momentos tristes também? Não se

desentendiam?”, mas é claro, só que estes não foram devidamente registrados, e nem

precisavam. O que eles precisavam era de todo incentivo e felicidade. O momento pelo qual

atravessavam era o mais triste no momento, e em muito eles se sentiam perdidos, mas ainda sim

podiam contar um com o outro. Podiam contar com a fé e a esperança de que um dia as coisas

iriam melhorar e seriam duradouras.

...

Page 61: Para Sempre e Mais

Entre os vinte

28 de Julho 2112 10:15 - ESO / Chile

Lian estava entrando na sala do telescópio todo animado enquanto Ress fazia umas

observações. Uma promoção de visita ao observatório iria ser lançada nessa semana e Lian

estava com todo o esquema. A visita ao local iria durar uma semana e os ganhadores iriam ficar

hospedados em um hotel na cidade enquanto visitavam o ESO.

- Que cara é essa de animado? Perguntou Ress aparentemente desinteressado.

-Tenho aqui nas minhas mãos todo o esqueminha da promoção – respondeu animado.

-Não sei como o pessoal deixou você fazer isso. Cuidado para não ser confundido, de

astrofísico para promotor de eventos e outras loucuras – sorriu Ress.

-Bom. Vamos veicular no site do observatório. Umas quarenta pessoas virão para cá. Eu

fico empolgado com isso. Faz parte do meu desejo que mais pessoas aprendam um pouco mais

sobre astronomia e astrofísica.

-Isso é uma coisa ótima.

-E quando eles vem?

-Na semana seguinte a promoção. Vou deixar uma semana, mas irão fazer uma ótima

propaganda. Sabe, coisas desse tipo podem nos ajudar nas pesquisas. É propaganda para nossa

instituição. Precisamos de recursos de quisermos descobrir uma maneira de ajudar nosso planeta

com o que fazemos.

-Está bem doutor salvador de mundos. Não se preocupe eu o apoio.

-Fico grato Ress.

-Elabore o seu esqueminha, e me passe o programa de visita depois.

-Está bem.

1 de Agosto de 2112 08:11 – Angra

Dan e Marah estavam em um coletivo de baixo rasante. Eles se encontraram na

Faculdade Federal que fica em um distrito da periferia da capital e estavam indo em direção ao

centro da cidade. Tinham planejado fotografar. Marah estava agora em um curso de fotografia e

aquele era seu exercício. Dan sabia um pouco sobre fotografia estava ajudando-a. Para eles

fotografia estava em um estágio bem avançado desde que o trabalho com lentes foi

desenvolvido no século passado. Fotografar era uma arte, não bastava apenas ter os melhores

recursos da época se você não captava o sentimento apropriado para cada imagem.

Marah sabia muitas coisas de cor, mas como sempre dizem, teoria é uma coisa é prática

é outra, e este era o dia da prática, até porque o professor dela era bem exigente.

-Qual a coisa mais importante em uma foto? Perguntou Dan fazendo graça.

-A luz é claro seu bobinho. Que pergunta hein?

-Só queria saber se você estava esperta – riu Dan.

-Estou, não se preocupe – replicou Marah fazendo uma pose como se a câmera fosse

uma arma.

Page 62: Para Sempre e Mais

Os dois chegaram ao centro de cidade. Era um dia de segunda feira movimentado e

ensolarado. Alguns anúncios brilhavam nas paredes dos edifícios; as avenidas tinham um pouco

de abarrotamento de veículos nos três setores de rasantes civis.

-Olhe Marah – disse Dan apontando para cima.

-O quê? Olhou ela com seus óculos escuros.

-A estratificação social está em tudo.

-Explique – disse Marah levantando as sobrancelhas por trás dos óculos.

-Os rasantes, veja só. Existem três setores. O primeiro que é o baixo rasante, o nosso. O

meio rasante de pessoas mais ricas, e o alto rasante para pessoas altamente ricas. Destes, só a

estratificação civil, diga-se de passagem.

-Sabe, não importa em que nível você esteja, você sempre voltará ao pó. Todas estas

coisas podem acabar em alguns minutos. Os homens são sempre os mesmos, não importa o que

vestem ou o que comem, ou onde dormem ou com quem vivem. Todos são como uma nuvem

que logo se desfaz, e os dias de cada um estão contados. Canseira e enfado virão até que não se

tenha mais vida. É triste, mas essa é a realidade. A não ser que o homem saiba alguma maneira

de viver para sempre.

-Creio que exista, só que até agora não a descobrimos ou ela não nos chamou ainda –

disse Dan.

-Nossa, isso foi um pouco abstrato.

-Um pouco, mas vamos nos deter nas fotos agora, certo?

-Certíssimo rapaz – disse Marah prontamente.

...

30 de Junho de 2116 08:07 - Mais de 9 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente / Heliosfera

O sol agora era um ponto na vastidão cósmica. Nenhum dos planetas do sistema solar

poderia ser visto a olho nu agora. O cinturão de Kuiper ficara para trás e havia um vazio a frente

e ainda faltavam incontáveis milhões de quilômetros para chegar a quase desconhecida nuvem

de Oort, que para todos os efeitos, vagava em um mar escuro e sem vida. O lugar onde estavam

agora poderia conter alguns detritos que circundavam lentamente o sistema solar de alguma

maneira, embora a nave sempre estivesse com os dispositivos anti impacto ligados para caso

alguma coisa se aproximasse.

Mesmo com todas as certeza sobre a destruição da terra evidentes para Dan e Marah era

difícil acreditar que estivessem sozinhos no nada dentro fortaleza que voava para Gliese 581,

pois já fazia mais de um ano que estavam naquele lugar quando acordaram do sono no criotubo.

Inevitavelmente eles teriam que voltar ao criotubo mais uma vez até chegarem perto da nuvem

de Oort.

Dan e Marah mesmo com todo o terror, tristeza e muitas vezes sentimentos de

depressão, tinham algo que os mantinha firmes, contrapondo de uma forma que quase não dá

para descrever a fé dos dois de que encontrariam um novo lugar para viver de uma forma

despreocupada, crescia a cada momento. Talvez em algum momento, os sentimentos aflorassem

e o desejo lhes tomasse conta, mas isso não aconteceu. De alguma forma os dois se mantiveram

sempre ocupados dentro da nave e a única coisa que mais íntima que trocavam era um abraço.

Os dois dormiam em lugares separados e a companhia de Red e Call ajudava os dois nessa

tarefa. Nunca haviam conversado sobre o assunto, e nem ainda haviam se declarado, mas eles

Page 63: Para Sempre e Mais

sabiam que uma nova responsabilidade dentro da nave poderia mudar muita coisa. O desejo não

declarado de ambos era poderem construir algo em um lugar seguro e esse lugar deveria ser o

planeta habitável que estava ao redor da estrela para o qual estavam indo.

De forma lenta, os dois começavam os preparativos para voltarem ao criotubo.

Deveriam passar por um longo sono antes de Dan fazer o transporte da nave de um ponto para o

outro.

Red já estava ficando um pouco grandinho, mas ainda era adorável e Call sempre estava

por ali auxiliando Dan em alguma coisa, com todo o seu compêndio de conhecimento para o

que era necessário.

Dan estava ficando com uma cara de velho, pois sua barba crescia. Marah não se

importava mais com a aparência dele. Falara várias vezes sobre sua barba que estava grande

agora. Os cabelos castanhos dela agora estavam grandes também e davam um pouco de

trabalho. Os dois se deram conta de que uma clínica de beleza era algo importante as vezes, mas

não perdiam a autoestima por isso, e que de vez em quando até faziam piada um com o outro.

Apesar da situação ter tudo para ser algo romântico para os dois, o fato sobrevivência

pesava mais um pouco. Parecia-lhes que um sentimento de respeito mútuo pairava no ar toda

vez que eles se encontravam, quer no café, no almoço ou no jantar. Os julgamentos pareciam-

lhes pesar na consciência de que se fosse para definitivamente declararem alguma coisa, isso

iria ser na hora exata, nem antes, nem depois, mas exatamente quando fosse preciso, num dia

apropriado. Esse dia, como o dia em que chegariam ao novo planeta parecia estar chegando de

forma paralela e essa era uma das coisas que o coração dos dois ansiava de forma secreta.

Dan apesar de todo o conhecimento, não poderia dar certeza que o experimento

funcionaria tão bem como funcionara com na laranja. Haviam alguns problemas que ele se

deteve em superar ou algumas dúvidas que o fizeram esperar passar pela nuvem de Oort. Ele

não sabia até que ponto objetos que estivesse entre dois pontos poderiam afetar o transporte,

embora a ideia fosse de um buraco e não uma viagem de matéria de um ponto a outro. Parecia

loucura, mas Dan queria segurança no processo. Depois da nuvem, não havia nada que

realmente comprometesse a passagem, mas se houvesse algo, tudo estaria perdido. Outra coisa

era que o ponto de entrada seria bem definido, mas e o ponto de saída? Não haveria algo lá no

local para definir a abertura do disco. Da resolveu isso com cálculos precisos, e a resposta era

um composição totalmente virtual. Seria difícil de acreditar. Era como se fosse um puro

teletransporte sem sinal e sem ondas entre dois pontos. O problema seria que eles poderiam

parar em qualquer lugar caso alguma coisa desse errado. Dan sabia perfeitamente disso, mas era

a sua única chance e Marah o apoiava perfeitamente para isso. A responsabilidade era tanta, que

os dois fizeram um tipo de capsula com o DNA dos dois e um sem número de registros e

informações para lançarem pelo espaço antes da passagem.

...

1 de Agosto de 2112 08:30 – Angra

-Eu sinto perfeitamente que adoro tirar fotos Dan.

-Eu também Marah.

-Ainda temos muito espaço, nas câmeras.

-Então vamos aproveitar – disse Dan apontando a câmera para cima onde os veículos

passavam flutuando acima de suas cabeças – olha tive uma ideia.

-E o que é?

-Vamos sair da rua e chegar até a praça principal.

Page 64: Para Sempre e Mais

-Uma ótima ideia Dan. Lá é muito grande e tem uma variedade de coisas. Acho que

vamos acabar o espaço que temos lá.

-Pode acreditar que sim – disse Dan rindo – Vamos.

-Vamos.

Dan e Marah dobraram a rua. Haviam algumas lojas comercias ali. Da mesma forma

que os veículos sobrevoavam a cidade em três setores, quase tudo era dividido em três setores

isso significava a mesma coisa, estratificação social.

Havia um sistema de valores elaborado, para que o homem trabalhasse e fosse

controlado de alguma forma e que estivesse sempre no mesmo lugar. No país onde viviam onde

por muito tempo as tecnologias chegaram anos depois as coisas funcionavam assim. O fato era

que o mundo estava se encaminhando para algo que muitos já falavam a mais de cem anos.

A unificação poderia parecer impossível de acordo com as muitas diferenças, de estudos

científicos sociais, econômicos, dos modelos políticos existentes no mundo, mas estava

acontecendo lentamente, movida por poderes secretos no mundo. Estavam todos falando uma

língua, estavam todos usando uma mesma moeda. Os governos estavam aprovando um plano de

unificação militar depois de intensos debates em mais de uma década e os créditos de compra e

venda seriam definitivamente inseridos sob as peles das pessoas. Isso não aconteceu logo, por

conta de muitas sociedades não aprovarem ou não partilharem de certos pontos do plano. Por

isso levou cem anos para que todas as pessoas estivessem condicionadas a receberem tais coisas

sem questionar. Embora tudo isto haviam ainda alguns lugares que resistiam e por isso muitos

conflitos foram registrados nos últimos cinquenta anos. O fato era que o mundo estava à beira

de um possível colapso e esse era o plano hediondo para justificar um fim terrível que muitos

ainda não tinha percebido. O fim do mundo realmente estava próximo de alguma maneira e uma

nova ordem estava instaurada. Quase ninguém percebeu que diante de tantos problemas os

líderes escuros levantariam um líder, depois de terem dividido o mundo em dez regiões de

comercio.

Embora todas estas coisas estivessem passando aos olhos de muitos. Fundamentalistas

cristãos ainda se mantinham firmes como a cem anos esperando o próximo evento.

Dan e Marah de alguma forma nem percebiam que iriam realmente vivenciar os últimos

momentos da terra de qualquer forma.

Mas enquanto isso ainda não havia chegado e faltavam centavos de tempo. Eles

continuavam fotografando.

Eles chegaram à praça central de Angra. Lá estava o grande e majestoso relógio

marcando o tempo a muito tempo. Imediatamente eles começaram a fotografar apontando para

todos os lados e alturas.

E em um dado momento Dan virou-se para o lado contrário em que Marah estava e

apontando sua câmera viu um anuncio publicitário gigantesco passando.

-Olha só Marah – gritou Dan.

-O que foi?

-Uma promoção – disse Dan apontado para o anuncio que se estendia em um edifício.

-Uma promoção?

-Sim, olhe. O Observatório Europeu do Sul está promovendo uma visita ao próprio

lugar no Chile com tudo pago para vinte pessoas e um acompanhante cada. E a partir de hoje

você pode fazer a inscrição no sitio eletrônico do observatório. Eu fiquei sinceramente

empolgado. Quero ir – exclamou Dan.

-Não seja por isso – disse Marah puxando um CP espelho – Vamos nos inscrever agora.

Page 65: Para Sempre e Mais

Marah acessou prontamente as informações do sitio eletrônico e inscreveu Dan já que

ele foi quem ficou prontamente entusiasmado.

-E agora. Quem vai com você?

Dan sorriu.

-Você vai – respondeu ele – Só não sei os teus pais deixariam, afinal é uma viagem pra

outro país. Não é uma simples saída para o cinema, planetário ou ano novo.

-Eu falo com eles – disse Marah com dúvidas se seus pais deixariam.

-Está bem então. Mas primeiro vamos passar na promoção. Já pensou, nem nos

inscrevemos direito e já falamos como se já tivéssemos ganhado.

-É muita vontade de ir mesmo não é? Sorriu Marah.

-É mesmo, não escondo minha empolgação. Eu quero muito ir.

-Inscrições feitas. Eles vão dar o resultado na sexta e saberemos. Torça pra que dê certo.

Depois fico só de confirmar com os meus pais.

-Isso mesmo. Mas enquanto isso, vamos tirar fotos da nossa sociedade estratificada.

-Sociedade estratificada. Um dia espero que as coisas se arrumem em nosso mundo,

com algum governo que dure muito tempo.

-Um dia existirá um governo, firme como uma rocha, e não se moverá. Ainda que as

ondas venham estourando, jamais se abalará. Um reino que nos reinventará e nos tornará novos

– disse Dan olhando para cima.

-Que assim seja, e que dure indefinidamente.

-Indefinidamente

-Que seja eterno como esta foto, mas que tenha movimento.

-Eterno e que tenha movimento.

-Eterno e que tenha movimento? Perguntou Marah – e o que não seria isto?

-Algo eterno e morto.

-Eternamente morto? Perguntou Marah novamente.

-Sim, porque ou se vive para sempre ou se morre eternamente.

...

5 de Agosto de 2112 09:30 – Angra / Faculdade Federal

Era uma sexta feira de agosto em dois mil cento e doze. Manhã na faculdade Federal da

Angra. Os dedos de Marah eram ligeiros para acessar o sitio eletrônico do ESO pelo CP

espelho. A opção, vencedores da promoção de visita ao observatório estava bem diante de seus

olhos e dos olhos de Dan que resolvera se encontrar com ela para verem juntos se tinham

ganhado ou não. Marah acessou os nomes. Uma lista de quarenta nomes em ordem alfabética.

Vinte à direita e vinte a esquerda.

Dan deu um pulo. Havia ganhado. Era o sétimo ganhador e sua foto estava lá ao lado de

Marah.

-Temos que arrumar as malas, quer dizer, se teus pais deixarem.

-Para nossa alegria, eles deixaram, mas com a condição de que eu mandasse notícias

visuais a cada meia hora. Eu expliquei tudo para eles. Disseram que você deveria cuidar de

Page 66: Para Sempre e Mais

mim. Eu disse que era um rapaz responsável e respeitável, e que era mais bobo do que qualquer

colega de classe que eu tenha tido, mas que você ainda sim vai precisar vir em minha casa.

Dan soltou uma gargalhada, mas agradeceu a Marah. Ele não acreditava que ela tinha

tido coragem para pedir uma coisa dessas. Mandar noticia a cada meia hora foi uma ótima ideia.

Agora eles estavam entre os quarenta, ou entre os vinte ganhadores.

Promoções como aquela feitas por algumas instituições de pesquisa eram comuns

naqueles dias. Rapidamente as pessoas se inscreviam para as promoções. Em tempos como

aqueles, pesquisar em vários âmbitos científicos eram fundamentais. Fazer as pessoas se

tornarem conhecedores das pesquisas também.

...

7 de Julho de 2116 08:56 - Mais de 9 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente / Heliosfera

-Marah – disse Dan apontando para o computador enquanto Marah chegava com o café

da manhã – Olhe.

-O que foi?

-Estamos em um ponto a mais ou menos uns 9 bilhões de quilômetros de distância da

terra. Estamos no que chamamos de heliosfera desde que partimos é claro.

-O que é essa heliosfera Dan?

-É como se fosse uma bolha de influência do sol. As partículas solares voam até essa

distância e no final colidem com as partículas das nuvens do meio interestelar altamente nocivas

para nós.

-Depois dessa heliosfera vem o quê? A nuvem de Oort?

-Ainda não. Vem o que chamamos de heliopausa. É onde os ventos param. E sabe, a

nuvem de Oort está a dez trilhões de quilômetros da terra, um ano-luz basicamente. O criotubo é

inevitável. Estamos muito longe. Não pretendo correr riscos e não podemos mais voltar. Temos

que terminar de nos preparar. Vai ser uma viagem longa. Durante esse tempo deixarei a nave

captando e acumulando energia da heliosfera e depois das partículas do meio interestelar, vamos

precisar de muita energia para fazer o transporte.

-Não vai ser como nossa viagem para o Chile não é? perguntou Beca desanimada.

-Não, vai ser muito diferente. Tanto agora quanto no transporte. Temos que preparar

tudo. Vamos ter apenas uma chance.

Dan se aproximou de Marah.

-Marah olhe pra mim – Marah o encarou - Vai dar certo, acredite. Estamos tensos

porque está chegando a hora.

-Eu sei – disse ela marejando os olhos – Só quero que tudo fique bem.

-Sei que não escolhemos isso, mas vai dar certo. Quero que nós dois fiquemos bem.

Quero vê-la feliz lá do outro lado, lembre-se disso.

-Tá bom – disse ela abraçando-o.

Os dois foram tomar o café naquela manhã preparando a lista dos afazeres antes de irem

para o criotubo e depois para o transporte. A cada dia que passava mais se aproximava o

momento definitivo que os levaria para mais longe do que jamais foram. Já tinham deixado

Page 67: Para Sempre e Mais

tantos milhões de quilômetros para trás e a hora decisiva estava próxima. Dan sabia que uma

viagem por um buraco desses poderia matá-los, mas ele queria tentar. Não era seu objetivo

morrer no espaço a bordo uma nave gigantesca, deixando tudo vagar para sempre. Os

sentimentos ficavam mais agudos à medida que o tempo passava. Haveria apenas um lance. Ou

seria o fim ou seria para sempre.

...

Page 68: Para Sempre e Mais

Última noite na terra

7 de Agosto de 2112 20:00 – Florencia

Os pais de Dan tinham saído. Isso significava que os volumes das músicas deviam estar

no máximo. Pelo menos na sua casa não estava, pois ele estava ansioso e ele talvez precisasse

de silêncio, embora uma canção estivesse tocando no vizinho, e em volume máximo. A letra

continha as seguintes palavras: “Em tudo o que sou e no ar que respiro, estou dando meu amor

para você. Você poderia até se perguntar sobre isso, mas estou dando meu amor para você. E

você pode ter certeza que ele é todo seu.”

E tocava repetidamente. Ele sabia que o nome da canção era “Última noite na terra” e que era

do álbum de uma banda de punk rock antiga a qual ele não entendia muito bem ainda o que

significava, com as declarações da canção. Como alguém poderia estar ouvindo uma canção tão

antiga? E porque o título parecia estranho à letra? Era isso o que parecia estar sentindo;

estranheza e empolgação ao mesmo tempo. Como se fosse a sua última noite na terra, pois no

dia seguinte ele iria desfrutar do prêmio de uma promoção do ESO no Chile, a Organização

Europeia para a Pesquisa Astronômica no Hemisfério Austral. Ele não iria sozinho. Haviam

outras vinte pessoas que ganharam o prêmio ao redor do mundo, e ele poderia convidar alguém

se quisesse, para conhecer mais sobre astronomia e observação espacial. Marah iria também.

Dan fez uma visita a casa de Marah. O pai dela estava querendo ter certeza quem ele

era. Ele ficou satisfeito em conhecê-lo. Tudo estava praticamente certo para a viagem.

...

20 de Julho de 2116 11.45 - Mais de 9 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente / Heliosfera

Dan e Marah estavam agora na praça principal da nave perto do chafariz. Dan

aproveitava para atirar discos para Red quanto Marah molhava as mãos na água.

-Você já fez algum pedido Call? Perguntou Marah para o androide.

-Não senhorita, eu não acredito em pedidos ou sorte – respondeu Call.

-Mas porquê? Perguntou Marah curiosa sobre como um sintético não acredita ou

acredita em algo.

-Meu sistema é movido por valores exatos. Toda ação foi precedida por um cálculo.

Algo que estava determinado a acontecer, por isso eu excluo a sorte.

-Mas você nunca se deparou em uma situação que não estivesse clara ou que algo como

o acaso acontecesse?

-Não, meu sistema foi iniciado dentro da nave e não tive experiências adquiridas que me

pudessem elaborar novos cálculos de comportamento que exigissem algo como a sorte. Mesmo

que isso possa existir, o que vejo é que não posso agir com intuitos completamente

probabilísticos. Para mim sempre haverá uma causa e um efeito. Tudo começa com uma causa

inicial. Conceber uma coisa não causada é inconcebível e irracional. Até mesmo em termos de

existência, eu perguntaria qual a razão de algo existir, quando não se há razão para que exista.

-Então você teria alguma explicação para o porquê de estarmos aqui, eu e Dan, você e

Red?

Page 69: Para Sempre e Mais

-Tenho.

-Continuar. Cuidar para que um e outro fiquem bem. Mas eu não posso dizer tudo,

afinal a história está sendo construída e não é sem propósito. Isto significa que estamos

desvendando um quebra cabeça. Não podemos entender o que algo pode significar agora, pois

ainda não vimos o quadro inteiro, mas no final vamos entender perfeitamente.

Mas minha vocação eu já sei. Cuidar de você e do rapaz Dan. Servi-los e ajudá-los.

-Oh Call que coisa linda – disse Marah

-Mesmo não conseguindo visualizar o que seja perfeitamente lindo, meus cálculos me

fazer concluir um produto de que o que você acha lindo é algo certo e que tem algum valor.

-É isso mesmo. Existem coisas lindas que você pode ver com os próprios olhos. Outras

não, essas são as que tem mais valor.

-Entendido senhorita.

-Nada de sortes então. Sorte não é algo lindo, lembre-se disso Call.

-Entendido – disse o androide.

-Mas mudando de assunto preciso da tua ajuda Call.

-E o que seria senhorita? Perguntou o sintético.

-Venha. É algo para Dan. Vamos enquanto ele está ali distraído.

-Entendido senhorita.

...

7 de Agosto de 2112 20:20 – Florencia

A música soava repetidamente na casa do vizinho de Dan. As malas já estavam prontas.

Uma ligação.

-Boa noite moça. Preparada? Perguntou Dan.

-Preparada sim – respondeu Marah do outro lado da chamada.

-A nossa nave sairá amanhã as oito da manhã. O observatório enviou um documento

para mim e outro para a estação de embarque, para que não houvesse problemas. Acredita que

andei pesquisando Marah e descobri que somos os únicos de nosso país?

-Nossa, mas isso é um grande privilégio Dan. Eu nunca viajei para outro país. Isso está

me empolgando.

-Estou grandemente empolgado também. Espero que possamos aproveitar o máximo.

Foi uma coisa muito incrível termos nos inscrito na segunda e hoje termos certeza de uma

viagem. Não há nada para descrever minha alegria e minha ansiedade também.

-Vai ser uma semana ótima. Creio que vamos aprender muitas coisas e vamos voltar de

lá satisfeitos e com as respostas, além de descansar e quem sabe, se divertir.

-Isso mesmo, pode apostar que sim – disse Dan.

-Vamos tirar muitas fotos hein? Não podemos nos esquecer.

-Vamos sim, é claro. Isso não vai faltar.

-Sim, que barulho é esse? É aí na tua casa?

-Não, não é. O vizinho está escutando músicas com tudo o que pode. Não me incomodo

tanto, é até boa música.

-Tá bom, depois você me diz qual é. Ei, meu pai me levará a estação de embarque,

certo?

-Por mim tudo bem. Ele precisar saber mesmo com quem sua filha está indo. Sabe eu

ainda não consigo acreditar que ele deixou você ir – disse Dan.

Page 70: Para Sempre e Mais

-Bom, se eu o mantê-lo informado todo o tempo estarei fazendo o certo e além do mais

ele confia bastante em mim, nunca lhe causei problemas sérios – disse Marah satisfeita com os

próprios pensamentos sobre si mesma.

-E não vai ser dessa vez. Prometo que vou cuidar bem de você enquanto estiver lá –

disse Dan.

-Ora se não vai, mas agora vamos descansar e estar bem preparados pela manhã a

viagem deve ser longa.

-Talvez nem tanto, mas vai demorar algumas horas. Quando chegarmos lá, já teremos

um programa inteirinho para a noite no observatório que está no Chile.

-Que ótimo então. E que horas chegaremos lá Dan?

-Perto do meio dia, e iremos logo para o hotel. Almoçaremos por lá e receberemos uma

visita de um instrutor para nos orientar sobre a visita a noite junto com os outros ganhadores.

-Está bem. Encontramo-nos na estação de embarque então.

-Está bem senhorita, na estação de embarque. Um grande beijo e até lá. Boa noite.

-Até lá. Grande beijo e boa noite – disse Marah terminando a ligação.

...

20 de Julho de 2116 12.00 - Mais de 9 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente / Heliosfera

Não se pode dizer que Dan esquecera ou se estava pensando, mas Marah vinha com um

bolo, salgados, doces e sucos cantando parabéns junto com Call. Ele virou-se e apenas ficou

observando e rindo. Red sentia que havia um bom lanche ali.

-Parabéns pra você, nesta data querida, muitas felicidades, muitos anos de vida – cantou

Marah e o sintético.

-Nossa, nem eu me lembrava – riu Dan – como no ano passado eu acho.

-Muitos anos de vida – Marah deixou tudo de suas mãos em cima da mesa na praça e

abraçou Dan – Parabéns Dan. Mais um ano, está ficando velhinho, e ainda mais com essa barba

desajeitada – riu Marah.

-Bom, acho que vou fazê-la para ficar um rapaz novo de novo.

-Parabéns jovem Dan – disse Call estendendo a mão.

-Obrigado Call, que bela surpresa seu malandro, não me disse nada.

-Eu soube agora – disse Call o que fez com que Dan e Marah caíssem na gargalhada.

-Sim, algum pedido? Perguntou Marah.

-Chegar em Gliese – respondeu Dan bem humorado.

-Ótimo pedido – disse Call.

-E você hein seu pequeno, que já está grandinho, não me disse nada com essa sua língua

que fica pra fora o tempo todo – disse Dan acariciando Red.

-Bom, vamos comer. Estou querendo muito - disse Marah.

-Vamos sim. Call, nosso fotografo, fique à vontade.

-Entendido senhor – respondeu o androide.

Dan não imaginara. Um aniversário surpresa. Era o seu segundo aniversário naquele

local. Da última vez não teve uma festa como essa, embora Marah tivesse lembrado. Um

Page 71: Para Sempre e Mais

momento onde as dúvidas sumiam e davam lugar a alegria e sorrisos que ficaram mais uma vez

gravados em fotografias.

...

8 de Agosto de 2112 06:00 – Florencia

Dan despediu-se de seus familiares com um abraço bem apertado. Ele estava indo nesse

momento para a estação internacional de embarque em Angra. Marah já estava chegando lá.

Chile era o destino que os aguardava. Uma visita de uma semana aos complexos do ESO.

Malas prontas, ele seguiu pegando condução em um baixo rasante até a estação.

Alguns minutos de viagem até a capital e ele conseguiu chegar à estação as sete da

manhã. Marah estava lá esperando junto com seu pai.

-Olá Dan – disse o pai de Marah.

-Olá senhor Vital.

-Posso confiar de que vai cuidar da minha filha?

-Pode sim senhor.

-Eu confio muito nela, e acredito que tudo o que ela disse sobre você é verdade. Você

foi nos visitar e espero que não me decepcione.

-Tudo bem senhor Vital, vamos passar apenas uma semana, e ela vai estar de volta

como foi. É um passeio divertido de estudos. O senhor sabe tão bem quanto eu que nossos

registros de passagem vão estar em todos os lugares por onde passarmos. E ela vai estar

mandando notícias.

-Eu vou ficar com saudades papai – disse Marah dando um abraço em seu pai.

-Eu também minha filha, cuide-se e lembre-se de mandar notícias. E você Dan cuide de

vocês dois. É responsabilidade tua certo? Disse o Sr. Vital estendendo a mão.

-Pode deixar, cuidarei bem de nós dois, senhor Vital.

-Lembrem-se também de aprender várias coisas durante a viagem, e de trazer as lições –

disse Vital.

-Sim pai, vamos trazer tudo que pudermos de tudo o que aprendermos.

-Vamos, eu os ajudo com as malas – disse o Sr. Vital.

Eles se dirigiram a plataforma que dava acesso ao embarque onde já haviam algumas

pessoas para pegar a nave com destino ao Chile. Eles iriam descer em Santiago e depois iriam

pegar uma nave menor para um local chamado Residencia. Esse lugar foi concebido como um

refúgio confortável para os profissionais e técnicos que trabalham sob extrema secura e

isolamento, longe de suas famílias, por longos períodos de tempo. Possui 108 quartos

distribuídos por 4 níveis e 10.000 metros quadrados, bem como instalações como um

restaurante, sala de música, biblioteca, piscina e sauna, e era lá o destino de uma semana onde

Dan e Marah iriam passar uma semana junto das outras trinta e oito pessoas de alguns outros

países.

As instalações ficam em uma região desértica, onde há pouca precipitação, mas nessa

época da viagem de Dan e Marah o local estava coberto de neve.

Page 72: Para Sempre e Mais

Dentro da grande nave ainda no país, as oito horas em ponto Dan e Marah estavam

empolgados. O propulsores foram ligados e ela mandou uma mensagem para o seu pai logo que

a nave partiu. A viagem iria demorar algumas horas, e alguns dos outros ganhadores já estavam

viajando a essa hora vindos de outras partes do mundo.

As onze e meia eles pousaram. Marah já havia mandado mensagens com imagens pelo

menos umas oito vezes para sua família. Eles estavam agora no aeroporto internacional

Comodoro Arturo. Para a surpresa dos dois, todos os outros ganhadores da promoção estavam

em um sala reservada esperando a condução para Paranal. Estavam todos empolgados, e ficaram

mais ainda quando um astrofísico chamado Lian e uma pequena equipe chagaram e

cumprimentaram a todos. Durante um pequeno almoço servido no local os visitantes receberam

umas orientações do astrofísico. Lian era alemão, e não fosse os dispositivos de tradução

automática que todos receberam para os ouvidos, ninguém ia entender nada.

Depois de uma meia hora de orientações todos estavam preparados para a última

viagem quando Lian fez uma pergunta.

-Estão todos preparados para seu último dia noite na terra? Perguntou ele entusiasmado.

-Sim, responderam quase todos em suas línguas, inclusive Dan e Marah.

A pequena nave era o suficiente para todos. Estavam bem acomodados e satisfeitos,

embora alguns tivessem feito uma viagem demorada, todos estavam ansiosos para chegar em

Residencia.

Perto de uma hora da tarde eles chegaram. Tinha nevado noite passada e o local estava

com a superfície toda branca, mas o céu estava limpo, e era por isso que o observatório ficava

naquele lugar.

...

30 de Julho de 2116 18.00 - Mais de 9,1 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente / Heliosfera

Todas as coisas estavam no lugar. A nave estava pronta.

-Marah esta nave, pode chegar a uma velocidade de um meio a velocidade da luz. Para

mim foi uma coisa incrível não termos batido em nada na velocidade em que estamos. Aqui

dentro quase não sentimos, mas se estivéssemos lá fora, veríamos a nave passar zunindo por

algo.

-Isso quer dizer que vamos ficar alguns meses no criotubo antes da nuvem?

-Isso mesmo. Call ficará monitorando toda a viagem. Ele não se sentirá só.

Red dormirá também junto com os outros animais que estão nos criotubos. Milhares

deles nem acordaram. E quanto a nós vamos ter nossa última refeição antes de irmos. Call

acionará o aumento de velocidade e quando estivermos próximos ele nos acordará. Eu já

aumentei o alcance das placas captadoras do vento solar que nos ajudará com a velocidade até

certo ponto, mas ainda sim poderemos continuar com rapidez, está bem? – terminou Dan

dizendo todas as palavras de forma serena e segura.

-Está bem – disse Marah quase desconsolada.

Aquelas câmaras feitas para hipersono, nunca os deixaram tão aterrorizados. Era a

segunda vez que isso ia acontecer. Mesmo com todas as coisas planejadas o lampejo de dúvidas

crescia na mente de Dan. E se eles ficassem dormindo para sempre? Se Call nunca mais os

Page 73: Para Sempre e Mais

acordasse? Ou se eles esbarrassem a uma grande velocidade em algo da nuvem de Oort? Não

haveria chances? O medo inevitavelmente começava a tomar de conta de Dan e Marah nessa

hora? Eles simplesmente não tinham certeza do que aconteceria.

...

8 de Agosto de 2112 18:00 – Paranal / Chile

Todos estavam em uma sala de palestras em Residencia escutando algumas explicações

de Lian

-Boa noite pessoal. Como todos já sabem meu nome é Lian. Temos aqui muitas pessoas

que conheciam o observatório só de ver pela rede ou por outros meios. Bom, creio que o

principal motivo que não foi divulgado durante nossa promoção é que neste ano nosso

observatório está completando cento e cinquenta anos, de muito trabalho astronômico,

observação e empenho de todos os colaboradores. Aqui em Residencia, um lugar que

primeiramente servia apenas para alojamento dos pesquisadores recebemos vocês, os

vencedores da nossa promoção de uma semana. Digo a vocês que esse lugar é fantástico. Com o

passar do tempo fomos aumentando os edifícios e esse lugar tem muitos quilômetros,

incrivelmente construídos acima do solo e abaixo dele. Aqui vocês terão tudo que precisam.

Creio que todos já sabem as normas e nossa programação e espero que aprendam bastante e se

divirtam.

E antes de começáramos nosso período de visita faremos um sorteio agora, onde

escolheremos duas pessoas para participarem de uma aula neural no penúltimo dia e que é uma

surpresa.

Bom temos aqui quarenta pessoas certo – disse ele puxando uma lista no CP espelho

que carregava – mas vamos fazer a moda antiga.

Lian pegou um caixa transparente com todos os nomes em pares.

-Aqui estão seus nomes. Isso vai ser rápido.

Lian pós a mão direita dentro da caixa. Ele pegou um par de nomes, enquanto os

visitantes ainda não conseguiam imaginar do que se tratava tal aula. Sem saber os dois

escolhidos pularam quando ouviram seus nomes.

-E aqueles que irão participar se chamam. Leonn Adan Oliver e Marah Evan Sills. Meus

parabéns.

E para os outros, e os sorteados teremos nossa primeira parte da visita. Uma aula de

história.

Dan e Marah sorriam, mas nem sabiam o que tinha ganhado, embora estivessem

empolgados com a ideia. Os outros não fizeram muito caso pois também foram pegos de

surpresa e nem sabiam direito o que era tal aula. Lian depois chegou para parabenizá-los

pessoalmente e disse que os dois formavam um belo casal.

Page 74: Para Sempre e Mais

A visita começou com um dos astrônomos que era o mais conhecedor sobre a história

do local. Todos estavam maravilhados e acompanhavam cada passo cada informação. Nos dias

seguintes o programa de visita foi fantástico. Todos puderam aprender muito com o VLT (Very

Large Telescope), onde passaram a maior parte do tempo. Participaram de filmes, palestras,

atividades, simulações e exercícios educativos. A rotina era completa desde as oito da manhã até

às nove da noite.

Para cada um que estava ali, os dias estavam valendo a pena. As despesas todas pagas

pelo observatório cobriram todas as atividades e visitas perfeitamente. Todos estavam

empolgados em durante todo o tempo. Um aprendizado perfeito.

Somente no último dia como combinado os dois sorteados Dan e Marah foram para uma

atividade extra. Enquanto os outros visitantes desfrutavam de outro percurso, os dois amigos

tinham uma aula especial.

...

3 de Agosto de 2116 13.15 - Mais de 9,1 bilhões de quilômetros de distância da Terra aproximadamente / Heliosfera

-Preparada? Perguntou Dan olhando para Marah ao lado do criotubo.

-Sim – respondeu ela com voz baixa.

-Só precisamos disto e depois ficará tudo bem.

-Está bem. Eu quero um momento para descansar de verdade. Admito que sempre estive

preocupada.

-Espero que tenha uma grama bem verde para onde vamos – disse Dan sorrindo.

-Uma grama verde, um lago bonito, nuvens brancas como algodão, um ar puro, muita

água e tudo que precisamos.

-Encontraremos esse lugar. Precisamos esperar só mais um pouco está certo? Marah

olhe nos meus olhos – disse Dan.

Ela o encarou e ouviu todas aquelas palavras que pareciam significar tudo o que ela

precisava ouvir naquele momento.

-Vai ficar tudo bem. Eu prometi ao teu pai que ia cuidar de você e estou fazendo isso até

agora. Não pretendo decepcioná-lo.

-Tá bom.

Dan deu um beijo na testa dela e os dois se olharam enquanto entravam em suas

respectivas câmaras com um suíte biológico apropriado para o hipersono. Call estava operando

todos os sinais e comandos. As portas se fecharam. Os dois ainda podiam se ver, mas minutos

depois com todas as rotinas concluídas os olhos de ambos começava a se fechar dentro do

criotubo.

...

11 de Agosto de 2112 9:00 – Paranal / Chile

-Vocês dois são muito sortudos em participar disto. Vai ser uma das coisas mais

incríveis na vida de vocês – disse Lian empolgado.

Page 75: Para Sempre e Mais

-Espero que sim. Até agora estou bastante satisfeito – disse Dan sentando e uma

poltrona.

-Eu estou querendo mesmo saber o que é isso – disse Marah.

-Quando vocês colocarem os elmos vocês vão saber do que se trata. Vão aprender tanto

quanto os outros.

-Isso durará quanto tempo? Perguntou Dan.

-Algumas horas – respondeu Lian.

Os dois estavam com alguns eletrodos ligados e sentados prontos para aula neural.

Aquilo já tinha sido feito em outras ocasiões. Era uma experiência e tanto.

Os elmos foram colocados. Lian aplicou um estabilizante orgânico em Dan e Marah que

em poucos minutos fecharam os olhos.

...

11 de Agosto de 2112 9:05 – Orbita da Terra

Um corpo gigantesco com pelo menos cento e quarenta quilômetros de diâmetro estava

nesse momento se aproximando da terra. Não haveria chance. Ninguém detectou o colossal

asteroide invisível.

-Lian! Gritou Ress quando entrou correndo na sala de atividade neural.

-O que foi? Que desespero é esse?

-Temos pouco minutos de vida meu amigo, é o fim – disse Ress com expressão de

terror.

Quando Ress terminou de falar um estrondo gigantesco rugiu os edifícios de Paranal.

-Meu Deus, mas o que é isso?

-Uma chuva de meteoros?

Os dois correram para ver algo e estava tudo sendo destruído pelas rochas que caiam no

local. Não houve nenhum sinal internacional e faltavam apenas poucos minutos para o último

impacto.

Na sala de vigilância os dois ficaram com uma expressão que nunca tinha tido e suas

vidas. Um objeto maior que uma montanha estava a poucos milhares de quilômetros da terra e

em rota de colisão.

Ress pôs as mãos nos olhos e começou a chorar. Os outros pesquisadores não

acreditavam no que viam. De repente várias mensagens começaram a chegar anunciando o

desespero dos líderes de todo o mundo declarando que não estavam preparados. Todos sabiam

que este seria o fim, e ninguém estava preparado. O asteroide iria atingia a América do Sul em

vinte minutos.

Lian correu para a sala de interação neural. Acordou Dan e Marah que ficaram

assustados e sem noção do tempo que tinha passado. A única coisa que eles conseguiram

distinguir foi a ordem de Lian para que o acompanhassem. Os três desceram por um elevador.

Mais um estrondo maior. Lian sentiu que algo foi destruído na parte superior e externa na

instalação. O elevador desceu rapidamente. Fogo consumia agora a linha do elevador que

desceu até uma plataforma. Depois de um corredor os três chegaram a um hangar imenso. Havia

Page 76: Para Sempre e Mais

uma nave ali. Dan e Marah ainda estavam sedados e sem saber exatamente o que estava

acontecendo. Lian os arrastou para dentro da gigante nave que tinha um tom dourado. Faltavam

apenas quinze minutos.

Lian colocou os dois em um criotubo da nave rapidamente e acionou o alarme para um

ponto seguro. De uma torre de controle ele operou a nave que começou a se erguer. Dan e

Marah estavam deitados agora desacordados novamente.

Lian abriu o imenso portal de saída superior. Todo o local agora onde ele estava

começava a racha e desabar. Vários impactos começaram a acontecer, mas nenhum atingiu a

abertura de saída da nave. Ele teria que torcer para que a nave não fosse atingida. Uma rota foi

traçada.

A única coisa que ele conseguiu pensar foi levar Dan e Marah para a nave que estava

escondia. Talvez algum projeto secreto, mas isso não importava agora.

As nove e quarenta e dois da manhã do dia do dia onze de agosto de dois mil cento e

dois, uma quinta feira, os propulsores da nave Arca Um foram ligados e a levaram para os céus.

Inacreditavelmente a nave subiu e a alguns milhares de quilômetros de onde ela estava podia-se

ver o grande asteroide caindo.

Lian subiu por uma escada nos últimos segundos do mundo até o portal por onde a nave

saiu. Viu toda a destruição até onde os olhos podiam ver dos inúmeros meteoros caídos. Ele

engoliu em seco quando viu um grande objeto flamejante rasgando os céus em um estrondo de

proporções globais. Parecia-lhe uma estrela caindo na terra, iluminando todo o céu desfazendo

todas as nuvens. Um impacto.

Foi a última coisa que Lian viu. Um gumo de fogo, fumaça e rochas se elevou até os

céus jogando pedaços de rocha para todos os lados do planeta. Uma onda de choque, queimando

toda a superfície destruindo tudo. Um terremoto de proporções globais varreu a terra

comprimindo tudo que estivesse a um quilometro abaixo da superfície. Os mares ferveram e as

nuvens sumiram. Lian fechou os olhos para sempre. O fim do mundo. O fim da história.

Dan e Marah estavam na nave agora, que ganhava velocidade saindo da orbita da Terra,

ou o que era o planeta Terra.

Às nove horas e vinte e cinco minutos da manhã do dia onze de agosto de dois mil cento

e doze um asteroide de cento e quarenta quilômetros de diâmetro atingiu a terra e causou uma

explosão e uma onda de choque que varreu o globo e destruiu todas as formas de vida,

devastando a superfície, os mares e a atmosfera.

...

Page 77: Para Sempre e Mais

Depois da nuvem

10 de Fevereiro de 2117 13:15 - 9, 4 Trilhões de quilômetros de distância da Terra

aproximadamente / Proximidades da nuvem de Oort A nave estava perdendo velocidade. Call acionara a parada assim como Dan lhe

ordenara há seis meses. A nave acabara de chegar próximo à nuvem de Oort.

Era um lugar tão distante de qualquer brilho que mais parecia um mar de rochas

mergulhado em outro mar de escuridão. Apenas o brilho de todas as estrelas distantes podia dar

algum tipo de forma ou visão naquela região inóspita e fria, carregada de gelo, amônia e

metano.

A nave estava perdendo força a alguns milhares de quilômetros da nuvem. Não era tão

densa e a nave poderia passar por ela sem muita dificuldade, fazendo apenas algumas poucas

manobras de desvio.

Ali era o lar de inúmeros cometas que ainda eram atraídos para o interior do sistema

solar. Muitos deles tão grandes e tão pequenos, mas com a mesma composição que inúmeras

vezes se desfaziam por conta dos ventos solares quando por algum distúrbio iam de encontro ao

sol para rodeá-lo em um dos acontecimentos, mas belos e incríveis do sistema solar, mas aquele

local estava muito distante da heliopausa.

O movimento do local era pouco e para nave passar por ali, os grandes holofotes

deveriam ser ligados.

Call prontamente começou a realizar uma pesquisa de posicionamentos dos objetos, o

que ia ser de grande utilidade já que o único meio de atingir a parte externa da nuvem seria

passar por ela. Embora os objetos distassem uns dos outros o suficiente para uma grande nave

passar, ainda sim haveria perigo e Dan e Marah teriam que passar por isso antes do esperado

hipertransporte da nave para outro ponto do espaço.

Aparentemente nenhum homem ou nenhuma máquina tinha chegado naquele lugar,

senão Dan e Marah que nesse momento abriam os olhos depois de alguns meses de sono no

criotubo.

- O que vamos fazer agora? Perguntou Marah tomando um gole de coquetel pós sono.

-Ainda temos mais um desafio – disse Dan.

-Temos que cruzar esse mar de rochas e gelo.

-Mas eu não estou vendo quase nada – protestou Marah.

-Arca um ligar holofotes.

A nave posicionou grandes feixes de luz a sua frente e revelou uma visão aterradora.

Milhares de objetos flutuavam bem à frente da nave. De tantos tamanhos e formas e tão

perigosos quanto o próprio espaço vazio imerso em partículas carregadas de radiação.

-Estou com medo Dan – disse Marah.

-Eu também estou. Talvez esta seja a parte mais complicada. Vamos ter que usar o

piloto manual e automático. Prepare-se. A primeira parte é a nuvem interna e ela possui mais

objetos do que a nuvem externa. Quando nos aproximarmos vamos perceber que os objetos tem

certa distância, mas todo cuidado é pouco nessa escuridão.

Arca um ligar piloto automático e traçar trajetória. Fazer pesquisa da linha a nossa

frente da posição de cada objeto.

Page 78: Para Sempre e Mais

Em poucos minutos a nave ofereceu um mapa completo de todos os objetos que

estavam à frente da nave, sua posição e tamanho. Dan e Marah prosseguiram. Sentaram-se nas

cadeiras e a nave acelerou.

Passar por aquele lugar a uma grande velocidade estava se revelando mais fácil do que

se pensava. Alguns objetos eram movidos timidamente quando a nave passava a alguns

quilômetros de distância deles. Naquele mar escuro algo poderia acontecer se não estivessem

atentos, mesmo com a nave no piloto automático.

As horas foram se passando, os dias e parecia que era interminável. Vários objetos iam

sendo deixados para trás. Uns maiores e outros menores; do tamanho de uma bola, outros do

tamanho de uma pequena cidade. Estavam todos flutuando de forma pacífica e calma, a não ser,

os que foram perturbados pela passagem da nave.

...

Dan e Marah estavam no almoço as doze horas do dia trinta de março de dois mil cento

e dezessete quando ouviram um rugido imenso soando pela nave. Os dois correram para a

cabine de pilotagem. Quando chegaram ainda ouviram outros barulhos. Os dispositivos

anticolisão não foram o suficiente. Deu a impressão que era uma chuva lá fora. Vários objetos

menores que uma bola colidiram com a nave nesse momento, mas um maior causou um dano

em um dos tubos de ar.

-O que aconteceu Arca Um? Perguntou Dan.

-Colisão no casco de uma das canoas frontais da nave. Um objeto bateu e não

desviamos. Perca regular de oxigênio. Nave necessitando de reparo.

-Minha nossa – Dan levou as mãos à cabeça – eu tenho que sair Marah para consertar

isso.

-É muito perigoso Dan, você pode morrer – disse Marah.

-Mas eu tenho que ir. Não podemos ficar perdendo litros de ar assim

Dan correu para uma das câmaras com suítes espaciais. Ele sabia perfeitamente que

haviam dois perigos naquele local. Os objetos da nuvem e a radiação interestelar. O suíte tinha

que suportar todo o tempo em que Dan estivesse lá fora. Ele se preparou segurando firmemente

uma caixa com os instrumentos reparadores, mesmo sem saber qual o tamanho do dano no

casco. Correu até a câmara de contenção primária. Vários jatos de gás foram lançados em Dan.

Uma luz amarela acendeu-se e abriu-se a porta primária. Marah estava abrindo as portas e

observava tudo pela tela de monitoramento. A aporta primária fechou-se atrás de Dan. Uma luz

vermelha. A porta secundária abriu-se lentamente a gravidade tomou conta de tudo. Dan flutuou

e acionou pequenos propulsores acoplados ao suíte.

Nas luvas haviam dispositivos de fixação. Ele saiu e viu a visão mais fantástica de

objetos flutuando por todas as partes. Aquilo era lindo e tremendamente perigoso. O suíte logo

deu um aviso que a radiação estava a níveis altíssimos e qualquer descuido ou corte poderia ser

fatal para Dan.

Ele subiu pela parte de cima da porta secundária. No instante em que se pôs de pé com

os fixadores nas botas ele percebeu o quanto a nave era imensa e colossal. Para um pouco de

alívio de sua parte o dano estava pelo menos quinhentos metros a sua frente, onde havia várias

marcas e amassados de impactos. Uma pequena nuvem concentrada de objetos atingiu a nave. A

nave estava quase imóvel, e Marah também estava aflita e sem fôlego.

Dan começou a caminhar enquanto falava com Marah pela transmissão.

Page 79: Para Sempre e Mais

-Devo estar a uns quinhentos metros do local Marah – disse ele ofegante e tenso –

Quando chegar lá quero que você continue verificando a quantidade de oxigênio que está

diminuindo, certo?

-Certo, estou de olho na estatística aqui. Cuidado.

-Olhe, se acontecer alguma coisa, não saia da nave, certo?

-Pare de dizer isso – Marah disse em um tom aflito – você vai voltar.

-Olhe, diga para Call ficar a posto caso eu precise.

Dan continuou sua caminhada pelo casco dourado da nave. As luzes estavam todas

acesas o que dava iluminação suficiente ao local. Os gigantescos holofotes denunciavam todos

os objetos à frente da nave.

Com alguns minutos ele conseguiu chegar ao local. Havia um corte um pouco profundo

feito por alguma rocha pontiaguda o que danificou um dos tubos de condução que levava ar para

o setor onde estavam todos os animais. Dava para ver o gás de oxigênio saindo aos poucos.

Rapidamente ele retirou uma placa de metal dobrável e colocou sobre o corte no tubo.

Era apenas de um buraco, o que era ótimo sinal. Lembrando de todos os testes na sala de física

da faculdade, Dan ligou a solda. Fez a inserção em alguns pontos até fixar a placa. Depois

aplicou uma massa rígida para fechar todos os pontos. Em alguns minutos ele conseguiu. Depois

ele aplicou outra placa, só que no casco da nave. Teve que fazer várias emendas até fechar o

local de forma que não deixasse o tubo de conexão exposto. Fechou tudo novamente com a

mesma massa rígida. Visivelmente tinha dado tudo certo.

-Marah, como estão os níveis?

-Estão controlados agora. O ar está passando pelo tubo sem impedimento.

-Ótimo agora só tenho que vol....

-Dan! Gritou Marah.

Dan nem tinha terminado de falar, quando uma pequena rocha do tamanho de um carro

bateu nele empurrando-o para frente. Os seus pés perderam a fixação da lataria da nave e as

coisas a qual trazia se espalharam e foram jogadas. Ele agora estava girando tentando se agarrar

inutilmente a lataria da nave. Lembrou com desgosto que tinha esquecido o gancho de fixação.

Nesse momento Marah já estava na porta primaria vestida com um suíte chorando desesperada,

com um gancho de fixação em uma das mãos. Contrariando os conselhos de Dan ela esperou as

porta se abrirem. Deu ordens a Call que administrasse tudo.

Quando a porta secundária se abriu ela fixou um dos ganchos em um ponto, depois em

seu suíte e saiu controlando os pequenos propulsores. Saindo pela abertura ela subiu ao casco da

nave e viu Dan se afastando a certa velocidade. Um pensamento lhe passou quando ela não

verificou o tamanho da corda do gancho. Ela tinha que ir rápido e foi o que fez.

Ligou os pequenos propulsores no suíte e acelerou enquanto a corda de metal se

estendia. Dan nesse momento esticava as mãos, mas ainda estava muito distante. A corda foi

esticando até que acabou e Marah ficou presa. Era a última chance e Dan já estava chegando na

escuridão onde não havia nenhuma iluminação na nave.

Marah atirou o gancho em direção a Dan. Ela estava em desespero quase total. Os dois

estavam em silêncio e não diziam nada. Dan estava esperando continuar até chegar a parte dos

propulsores da nave.

Ela não acreditava, mas o contador do gancho estava chegando ao fim, e não tinha

certeza se alcançaria Dan.

Page 80: Para Sempre e Mais

Num gesto ele tentou segurar em uma placa que sobressaia quando de alguma forma se

aproximou do casco da nave, mas não conseguiu. Faltavam poucos metros para a corda de metal

acabar. Acabou.

O coração de Marah gelou ao ver Dan se afastando e a corda tinha acabado. Ela ligou

inutilmente seus propulsores em direção e ele, mas não saia do lugar

Para a surpresa dela segundos depois ela começou a se mover, mas se isso estivesse

acontecendo ela também tinha se desprendido. E foi o que aconteceu.

Call saíra para fora da nave e segurava um novo gancho ao mesmo tempo em que

segurava o de Marah

Foi apenas o suficiente para que a extremidade da corda de metal de Marah chagasse em

Dan e ele segurasse com a mão direita firmemente.

-Puxe agora Marah – gritou Dan.

Marah deu um gemido e apertou o botão e Dan estava agora sendo puxado. Ela

permanecia parada enquanto ele vinha. Os dois se esbarraram, mas Marah estava firme no

casco. Ficaram ali abraçados um minuto chorando, mas o pior tinha passado.

Call ainda estava parado com os pés fixados sobre o casco segurando os dois. Depois os

puxou de volta.

-Eu disse que você não deveria sair sua teimosa – disse Dan com lágrimas nos olhos.

-Eu pensei que fosse perder você, por isso saí – respondeu Marah mais aliviada.

-Me desculpe. Obrigado querida. Você nos salvou agora. Me desculpe Marah. Vamos

sair daqui e voltar para a nave.

-Está bem.

-Obrigado Call – disse Dan olhando por sobre os ombros de Marah.

Os dois voltaram até chegarem à porta junto com Call. Mesmo depois ainda estavam

sentindo o terror pulsando junto com os seus corações. Uma coisa ruim ia acontecer, mas

conseguiram se salvar de algo muito pior.

Mais alguns dias voando nesse lugar perigoso e eles conseguiram emergir do meio das

rochas de metano, gelo e amônia. Não era tão grande como se pensava. Demorou menos tempo

para cruzar todo aquele reino de pedras flutuantes até que conseguiram sair da borda externa da

nuvem no dia dez de abril de dois mil cento e dezessete a meia noite.

...

O susto ainda permanecia estampado nos rostos de Dan e Marah. A nave foi avariada

durante a passagem na nuvem de Oort. Mesmo com os dispositivos de automação e anti impacto

a nave foi atingida por vários objetos da nuvem. Uns mais brancos outros mais escuros que mal

podiam ser vistos devido a falta de luz e a distância do sol que agora era como se fosse um

ponto um pouco maior que as estrelas que brilhavam ao redor e preenchiam o céu. Mesmo

assim a nave precisava emitir seus potentes holofotes a frente para desvendar o que havia. Era

um local escuro e frio com radiações a níveis elevados muito maiores do que os registrados

dentro do campo gravitacional do sol.

Se alguém olhasse para trás e direcionasse algum feixe de luz iria encontrar um muro

colossal que se estendia até os horizontes todo preenchido de rochas de todos os tamanhos, de

cores que iam do branco ao metálico escuro misturado com rocha e outras texturas exóticas.

Page 81: Para Sempre e Mais

As estrelas preenchiam o restante, mas tudo permanecia na mais completa escuridão.

Bem a frente da nave algumas estrelas maiores preenchiam o horizonte, umas mais acima da

linha e outras mais abaixo. Bem ao lado a faixa de poeira da galáxia cobria o céu com cores de

escuro e azul escuro opacos. Nenhum homem teria imaginado chegar a um lugar como esse,

inóspito e sem vida. Foi o mais longe que Dan e Marah conseguiram chegar até agora.

Ainda iria demora muito até que eles pudessem ver a abóbada da nuvem de Oort e a

circunferência que ela formava no escuro, mas a frente estava a estrela que eles queriam chegar.

Talvez sua única chance, mesmo com a nave um pouco avariada depois da nuvem.

...

Alguns dias se passaram e Dan e Marah continuaram se distânciando mais da nuvem.

Dan queria ter certeza de que estava longe o suficiente. O próximo passo agora seria fazer o

transporte. Mesmo depois do susto com as rochas pelo qual passaram os dois decidiram sair

novamente e fazer a instalação das três antenas na parte de baixo da nave. Não foi muito

complicado e tudo estava pronto para funcionar como Dan estivera planejando há vários

meses. Era hora de fazer um êxodo universal. Eles iriam sair de um ponto para outro. Como se

estivessem cruzando um mar escuro para buscar refúgio na sua terra prometida, que a cada dia

que passava estava ficando mais próxima segundo as esperanças dos dois.

...

-Dan, Dan! Gritou Marah desesperada e sem fôlego – Venha aqui rápido – gritou

novamente.

-O que foi? Perguntou ele vindo a passos largos pensando que o pior já teria passado.

Ele chegou à cabine do capitão tentando entender o que estava acontecendo e porquê do

desespero de Marah. O que estava acontecendo? O que ela tinha visto?

Logo que Dan olhou para a tela principal ele pode ver o que ela tinha visto. Um objeto

estava aproximando-se da nave. Não era nenhum asteroide, nenhum corpo da nuvem, e mal

podia ser visto naquela escuridão. A neve detectou automaticamente. A diferença estava no fato

de que o objeto tinha traços de algo que fosse mecanizado.

A estrutura se mostrou algo conhecido pelo menos humanamente falando. Uma antena

arredondada comum do século passado na terra, quando alguns satélites eram lançados para

ficar em orbita, mas mais especificamente as sondas espaciais. Tinha também algo semelhante

aos antigos detectores de ondas de rádio planetárias, um espectrômetro de infravermelho,

ultravioleta, gerador de radioisótopos termoelétrico. Mas algo que chamou a atenção.

Havia um disco de aparência dourada. Dan aproximou a câmera e percebeu que tinha

algumas inscrições.

-Eu não sei o que é isto, e nem por que está aqui, mas temos que trazer para dentro da

nave – disse Dan com uma empolgação contida pela expressão de dúvida.

-Mas como vamos fazer isso? Perguntou Marah.

-A nave tem um dispositivo de atração. Ela cria um pequeno campo gravitacional, e

com um controle manual podemos direcionar objetos para nave da forma que quisermos.

-Está bem, então vamos fazer e ver o que é – disse Marah disposta.

Page 82: Para Sempre e Mais

Dan e Marah foram a uma câmara com trajes especiais. Os trajes eram moldáveis e se

ajustavam perfeitamente as silhuetas dos dois. Era escuro e tinha traços cinza escuro. Nas costas

os tubos de ar comprimido não tomavam muito espaço. As informações estavam dispostas no

espelho dourado do elmo robótico. Prontos eles poderiam sair até as duas câmaras de contenção

dessa forma depois que o objeto fosse atraído.

Na contenção primária, Dan se posicionou e acionou os dispositivos de atração artificial

da nave. O objeto que estava indo quase de forma paralela a algum ponto desconhecido

começou a ser atraído para a nave. As informações no espelho reproduziam toda a cena. Era

como se a nave fosse um grande imã que atraia o objeto. Dan foi condicionando a tração para

que não houvesse impacto. O portão da contenção secundária foi aberto, tendo espaço suficiente

para a entrada do objeto sem muitos danos.

O objeto foi passando suavemente pela grande abertura lateral até estar totalmente

dentro da câmara secundária. Da e Marah podiam observar atentamente pelo espelho divisor da

segunda porta. Nesse momento Call apareceu no espelho da primeira porta segurando Red que

latia.

Dan fechou a porta. O objeto ainda continuou flutuando pela gravidade artificial. A

atração artificial foi desativada nesse momento por Dan.

-Bom e agora? Perguntou Marah.

-Só mais um instante. Preciso estabilizar – respondeu Dan.

-Call e Red estão lá fora – disse Marah sorrindo.

-Avise a eles que viemos dar um passeio – disse Dan concentrando, mas deixando

sobressair um sorriso – Prontinho e caindo.

O objeto caiu e fez um pequeno estrondo na superfície metálica da câmara secundária.

Depois rapidamente iniciou-se a rotina de descontaminação. Vários jatos de gás foram lançados

na câmara e uma sonda fez a verificações de níveis de contaminação e radiação do objeto. Não

havia perigo algum detectado agora. Call ainda estava segurando Red que latia e mostrava a

língua.

-Pronto. Abrir porta secundária – ordenou Dan ao computador.

Os dois entraram na câmara e ficaram diante do objeto. Era uma sonda espacial antiga.

Pelo tamanho não tinha tripulante algum. Era apenas um maquinário de verificação que muito

provavelmente foi lançado da terra há muito tempo. Por um instante uma alegria incontida

tomou conta de Dan e Marah. Talvez fosse a mais ótima notícia desde o ano novo. Mas não

havia ninguém lá.

-Mas o que é isso Dan? Perguntou Marah.

-Pelos meus conhecimentos de história e pala análise, deve ser uma sonda espacial do

século passado ou mais antiga que isso. Está tudo desligado talvez a muito tempo, o que quer

dizer que a data do seu lançamento e muito antiga. Não é exatamente uma grande surpresa, mas

é totalmente humana, pois tem uma inscrição, um nome. Deve ser o nome dela.

-Voyager um.

-Voyager um? Perguntou Dan.

-Sim, é o que está escrito aqui desse lado.

-Computador. Mostrar dados de história sobre Voyager um – ordenou Dan.

-Pesquisando – respondeu uma voz sintética.

Page 83: Para Sempre e Mais

O computador reuniu diversos dados, e foi mostrando em forma de nuvem em uma tela

dentro do compartimento.

-Fazer exposição resumida em voz – disse Dan.

-A sonda Voyager um – disse a voz sintetizada – foi lançada em 20 de agosto de 1977,

duas semanas depois da sonda Voyager dois para uma missão planetária no sistema solar.

Depois do seu primeiro trabalho e continuou para além do sistema solar, não chagando a

alcançar os planetas Netuno e Urano. Depois disso prosseguiu para fazer verificações da

heliosfera e heliopausa. Ela contém ainda um disco dourado, uma agulha de cobre para a leitura

e muita informação destinada a alguma civilização que a encontrasse. Suas comunicações foram

perdidas em 2025. Ela seguiu seu percurso e nãos e sabe onde esteja.

-Está aqui bem na nossa frente – disse Marah sorrindo.

-Sabe, eu reconheço que é coisa feita na terra. Essa antena, essas objetos de detecção.

Mas não lembro de ter ouvido falar muito sobre ela. As agências espaciais lançaram muitas

sondas mais velozes nos últimos anos. Talvez tenham se esquecido das antigas empreitadas, e

essa sonda fazia parte de uma delas – disse Dan começando a andar pelos lados.

-Olha aqui desse lado, tem o disco dourado. O que será que tem nele?

Perguntou Marah abaixando-se para ver melhor o disco.

-Bom, vamos saber. Computador, acessar informações básicas do disco dourado da

sonda Voyager um.

O computador deu uma descrição detalhada de todo o conteúdo com sons e imagens que

estavam gravadas no disco. Eram muitas das informações mais marcantes da terra. Dan e Marah

se emocionaram ao ver tantas imagens tão antigas, mas ainda tão claras sobre como era à vida

na terra. A última canção que foi tocada foi um blues animado. Mesmo com os trajes Dan e

Marah abraçaram-se novamente com todas aquelas visões e sons da terra gravados no disco

dourado.

-Esse disco devia ser algo para alguma nova civilização encontrar, ou apenas para servir

como alguma capsula do tempo sei lá.

-Bom, se for algo para alguma nova civilização, talvez já tenha chegado ao seu destino

– disse Marah saindo.

Dan a encarou enquanto ela passava pela porta e pegava Red das mãos sintéticas de Call

e o acariciava. Ele sabia exatamente o que significavam todas aquelas palavras.

...

Tudo estava em seu lugar. Dan preparara com equipamentos da própria nave as três

antenas que reproduziriam o sinal e abririam o portal. O raio do espelho de passagem deveria

ser imenso para reproduzir espaço para que a grande nave Arca Um pudesse passar. O envio de

um sinal de saída para localizar a abertura do reaparecimento não poderia ser feito senão

somente por cálculos. O teste com a laranja se demonstrara perfeito e sem ruído. Esse iria ser

um único lance e Dan e Marah teriam que usar quase toda força do reator.

No dia quatorze de abril de dois mil cento e dezessete do calendário Juliano da Terra a

meia noite e dois minutos Dan e Marah estavam na cabine dos pilotos e o raio das antenas foi

acionado. Era a hora da passagem. A hora do êxodo.

Page 84: Para Sempre e Mais

Três linhas luminosas se concentraram em um ponto abaixo da nave e um buraco que

pareceu dobrar o espaço em si se formou em poucos segundos. A sensação era como se a nave

tivesse perdido o equilíbrio e imóvel ela começou a cair, juntamente com a imagem da luz das

estrelas que se contorciam para dentro do tubo. Dan e Marah ficaram com os olhos arregalados

o tempo inteiro. Parecia que as estrelas estava se dobrando para dentro do buraco. Foi tão rápido

que aos olhos dos dois pareceu-lhes que apenas cruzaram um papel. Nesse momento eles

cruzaram o horizonte de eventos.

Em um ponto distante do espaço perto de uma estrela de brilho um pouco avermelhado

claro, sete planetas orbitavam-na. Era um sistema solar modesto. Uma nave acabara de aparecer

de forma quase instantânea sobre o seu sistema de planetas, em um buraco hiperespacial que

não afetara nada no sistema.

A nave Arca Um estava em um local escuro e cheio de partículas interestelares, perto da

abobada de bilhões de objetos de gelo e rocha, e agora estava sobre um objeto luminoso. Uma

estrela e seus planetas. Um deles seria o destino.

A reentrada não afetou em nada a nave. Talvez apenas um tontura rápida se apoderou

das cabeças de Dan e Marah que vomitaram e sentiram náuseas depois dos poucos segundo de

hiperviagem. A nave agora estava parada e com todas a luzes desligadas. Muita energia da

própria nave tinha sido usada e muita energia que fora acumulada também somente para esse

fim, transportar a nave de um ponto do espaço para o outro. A única certeza que Dan e Marah

tiveram foi a de que estavam vivos ainda e que nada de grave acontecera, pelo menos não era

visível.

Os dois tiraram os cintos de proteção. O chão ao lado estava um pouco sujo de vômito,

mas eles conseguiram sair de ambas as poltronas. Dan falou com a voz embargada.

-Arca um realizar pesquisa tele-espacial e construir mapa do lugar a uma hora luz –

disse Dan com voz embargada.

-Estou tonta Dan – reclamou Marah.

-Vai passar logo – disse Dan se apoiando sobre os joelhos enquanto via a constituição

de imagens e informações na tela principal.

-O que fazemos agora? Perguntou Marah.

-Vamos tomar o coquetel de reabilitação. Precisamos nos recompor. Nossos sentidos

não devem estar bem. Estamos sentindo agora o impacto da passagem.

-Está bem, mas eu não consigo me movimentar direito. Acho que posso cair se eu sair

andando por aí dentro da nave.

-Para não acontecer nenhum acidente vamos chamar Call e pedir o coquetel.

Enquanto Dan e Marah estavam se recompondo a pesquisa estava sendo feita.

Automaticamente a nave fazia comparações em tela dos mapas estelares rastreando o

posicionamento.

Depois de concluído quase uma hora depois, todos os registros tinham uma única

resposta. Eles estavam em Gliese. O que deixou Dan satisfeito. Ele começou a chorar olhando

todas as informações e ainda sentindo os efeitos do mal estar.

Estava dando tudo certo até o momento. Quase nada dera errado. Os dois estavam bem

perto do que tinham imaginado e planejado durante toda a viagem desde que acordaram quando

estavam saindo do sistema solar.

Os dois estavam em uma nave agora que se encontrava a vinte e dois anos luz de

distância da Terra, a incalculáveis duzentos e nove trilhões de quilômetros de distância de sua

antiga casa no espaço. Qualquer homem teria dado a própria vida para realizar esse feito em

Page 85: Para Sempre e Mais

favor da ciência. Muito se fez para pode alcançar as estrelas, mas ninguém havia conseguido.

Dan não tinha certeza se isso poderia ser feito para outro lugar da mesma forma. Aquela era

uma coisa única em toda a história em um momento extremamente crítico, mas o fato era que os

dois ainda estavam vivos e bem apesar dos pesares.

Se nenhuma das grandes sociedades da antiguidade na terra tivesse desaparecido, os

homens já teriam alcançado esse e outros lugares a muito tempo, mas a chance fora dada

unicamente a duas pessoas, e elas não haviam desperdiçado nenhuma coisa, por mais difícil que

parecesse.

...

Page 86: Para Sempre e Mais

Novos céus e nova terra

15 de Abril de 2117 12:00 - Proximidades de Gliese 581g

A pelo menos trezentos milhões de quilômetros Dan acionou os propulsores em direção

a Gliese 581g, o planeta que ansiavam chegar.

Levou algumas horas, mas eles sentiam perfeitamente que tinham alcançado o objetivo

que pelo que tanto esperavam. Quando eles se aproximaram, uma alegria incomum tomou conta

do coração de ambos.

Talvez um poeta profundo descrevesse com um pouco mais de exatidão o que Dan e

Marah estavam vendo agora. O planeta era imenso de uma coloração verde, caqui e azul. Podia-

se ver o que pareciam ser nuvens. Era algo fantástico e sobremodo lindo olhando-se ali de longe

a alguns milhares de quilômetros.

Estavam em um sistema de planetas bem modesto. Sua estrela não era grande como o

nosso sol, mas Gliese 581g era o planeta a qual estavam vendo agora que estava exatamente

onde tinha que estar para abrigar algum tipo de vida, ou se não tinha, deveria ter todas as

capacidades possíveis para ser habitável.

A estrela vermelha brilhava a uma distância de milhares de quilômetros, mas a visão do

sistema podia ser feita sem muita dificuldade. Apenas o último planeta era o mais distante e o

mais difícil de ser ver. Embora se pudesse notar seu tom azulado.

Dan e Marah se acomodavam nas poltronas da cabine de pilotagem juntamente com

Call e Red que ocupavam as poltronas de trás.

-Preparada? Perguntou Dan.

-Sim. Estou ansiosa – respondeu Marah.

-E vocês senhores?

-Preparados, respondeu Call juntamente com um latido de Red.

-Lá vamos nós.

Dan acionou os gigantescos propulsores da nave em direção a Gliese 581g. A nave

chegaria em poucos minutos.

-Vamos dar um nome para o novo planeta, além de Gliese 581g?

-Que tal Nova Terra?

-Por mim tudo bem. Há novos céus também ali. – disse Marah.

-Isso mesmo. Novos céus e nova Terra.

-Que esse seja o lugar e que possamos ter muitas alegrias nesse nele.

-Assim seja.

...

A nave se aproximava do imenso planeta. Dan e Marah não deixaram de notar que havia

dois satélites naturais que orbitavam o planeta. Embora os dois estivessem, um em um lado do

planeta e o outro a milhares de quilômetros do outro lado.

-E como vamos chamar essas duas luas? Perguntou Marah entusiasmada.

Dan pensou rapidamente.

-Bom eu não sei. Acho que estou sem criatividade agora, embora tenhamos todo o

direito agora.

Page 87: Para Sempre e Mais

-Bom, tinha uns nomes que minha tia falava, para mim quando ela me visitava, mas que

também eram siglas de algumas republicas estudantis – disse Marah.

-E quais são?

-Alfa e ômega. O que acha?

-Perfeito. Algo que indica o principia e o fim. O primeiro e o último. Este conjunto

simboliza a eternidade.

-Perfeito então – disse Marah.

-Computador. Realizar varredura e constituição das duas luas. Estabelecer medidas e

constituição química e registrar as luas com os nomes Alfa e ômega – ordenou Dan a nave.

-Entendido – foi à resposta em voz sintética.

As estrelas nunca pareceram brilhar tanto naquela hora. Era o momento mais incrível

que alguém poderia imaginar.

As nuvens brancas podiam ser vistas pelo globo e algo que deixou os dois certos de que

o lugar poderia ser habitável. Havia um mar imenso, que era limitado apenas pelas placas

continentais que se podiam ver por aquele lado do planeta.

O computador já tinha algumas informações e registros de Gliese 581g, mas novas

informações foram adicionadas e corrigidas.

Enquanto a nave avançava os registros foram sendo elaborados definindo todos os

níveis do planeta que agora passara a se chamar Nova Terra.

A nave se posicionou na linha equatorial fazendo um giro de noventa graus para atingir

a posição indicada. À medida que se aproximavam ficavam mais evidentes os traços do planeta.

Havia verde, havia mar, e havia pelo menos um grande continente que preenchia pelo menos

trinta por cento do planeta e aparentemente era a única faixa de terra visível, praticamente

preenchida de verde, senão em algumas áreas onde se podia ver o branco de alguma região

gelada e o amarelo de regiões tipicamente desertas.

Dan e Marah apenas observavam a nave entrando. Em pouco tempo a atmosfera foi

detectada. A leitura da gravidade indicou uma taxa perfeita relacionada ao tamanho e massa do

planeta na retenção da atmosfera como um todo. Eles estavam agora a pelo menos cem mil

metros de distância do solo.

A nave sofreu uma pequena turbulência na reentrada que se revelou repleta de nuvens

massivas. Era uma atmosfera carregada que mostrou conter, grandes quantidades de nitrogênio,

oxigênio e argônio, sendo este último em menor quantidade com pelo menos 1%, basicamente o

que havia na terra. A quantidade de gás carbônico estava no nível relativo à manutenção do

fluxo na baixa atmosfera para a retenção de calor, nivelando o clima. A densidade na atmosfera

revelou a presença de ozônio, produzido pela colisão de oxigênio molecular com atômico.

-Sabe, nunca senti que este lugar está de tal modo tão perfeito que possamos sair sem os

suítes ou trajes.

-Graças a Deus que tudo isto está em sintonia. Os níveis de cada coisa estão exatamente

no ponto de manutenção da vida.

-Isso aqui com certeza não foi feito por acaso.

-Nem estamos aqui por acaso.

-Não mesmo.

As nuvens brancas altamente preenchidas cobriam uma região de cordilheiras altas do

ponto onde Dan e Marah estavam na descida.

-Computador. Faze varredura de área e encontrar lugar com maiores probabilidades, de

habitação segura.

Imediatamente o computador lançou um sinal de mapeamento e posicionamento

climático, revelando a topografia e o clima que envolvia toda a área rastreada. A quantidade de

Page 88: Para Sempre e Mais

oxigênio estava dentro dos níveis seguros no local que o computador sugeriu com maiores

chances de desenvolvimento humano.

Eles continuaram o voo no sentido leste, mas próximos do que parecia ser uma costa. A

nave passou por algumas montanhas onde havia um ambiente visivelmente intocável e

primitivo.

Podia-se ver o solo nesse momento. Um campo aberto em tons de amarelo limitado

pelas montanhas cobertas de neve e limitado por uma floresta que se estendia até o litoral do

que era perfeitamente um mar, meio azul, meio verde turquesa.

Bem no centro do campo, que parecia ser um trigal havia uma árvore gigantesca de pelo

menos quinhentos metros de altura. Com uma casca lisa e trinta metros de circunferência folhas

grandes e pequenas que estavam verdes no momento.

Dan ordenou que a nave fosse pousada ao lado da árvore.

Os dois não se contiveram e correram para a câmara dos suítes, mesmo com todas as

informações sobre a atmosfera.

A porta primária se abriu e logo em seguida a secundária. A pressão dentro da nave

estava em nível. Quando a porta secundária abriu. Dan olhou para Marah e segurou em sua mão

olhando para o campo aberto.

A escada da nave alcançou o solo e os dois começaram a descer. Estavam no último

degrau quando pararam. O sol não estava a pino, mas escondia-se por trás das nuvens. Apesar

de ser vermelho. A atmosfera filtrava e adicionava a entrada da luz, fazendo com que a

iluminação no planeta fosse simplesmente comum ao que Dan e Marah estavam acostumados na

antiga Terra.

-É o nosso primeiro passo nesse lugar. Parece um reino fantástico e desconhecido, mas

que quero desvendar com você. Vamos dar o nosso primeiro passo juntos. E eu gostaria de

chamar esse lugar em que estamos de Capital.

-Capital? Perguntou Marah.

-Sim, será a nossa primeira Capital.

-É onde iniciaremos tudo de novo. Então Capital Inicial seria um ótimo nome – sugeriu

Marah.

-Perfeito. Aqui será a Capital Inicial e aquela grande árvore ali ao lado será o seu

símbolo. Vamos?

-Vamos – respondeu Marah.

Os dois pisaram juntos no solo de terra comum aos seus olhos. Call e Red permaneciam

dentro da nave enquanto os dois faziam seu primeiro passeio na Nova Terra.

Dan deu uma ordem para que a nave criasse um registro inicial e novo, com uma nova

datação, inicio de tempo pela posição do sol e o nome a qual tinham dado ao lugar.

Era dia primeiro, do Anno Solutis, porque estavam a salvo naquele lugar, a primeira era

em Nova Terra na região denominada Capital inicial, as quatro da tarde como indicado pela

nave.

...

Cedo os dois descobriram que o ar era perfeitamente respirável e já não precisavam de

trajes espaciais. Nessa hora Dan tirou o elmo juntamente com Marah e saíram correndo rindo e

gritando de uma felicidade que estava contida há muitos meses. Eles ainda não estavam

acreditando. Parecia que tinham voltado para Terra, só que renovada e sem os problemas.

Cedo também eles se deram conta que ainda estavam sozinhos. Era algo lindo, mas ao

mesmo tempo depressivo. Estar em uma nave sem pessoas era uma coisa, mas estar em um

mundo sem pessoas era tremendamente diferente e aterrador. Os sentimentos dos dois estavam

em um nível de confusão tal que quando se deram conta da situação novamente e de todas as

implicações só puderam voltar para a nave e descansar depois de algumas horas fora.

...

Page 89: Para Sempre e Mais

Dia 2 do Ano Um 04:00 / Anno Salutis /

Capital Inicial / Nova Terra

O relógio estava marcando quatro da manhã quando Dan levantou-se e olhou pela

imensa janela da nave. Ele tinha acordado cedo, mas o sol já estava lá fora. Marah ainda estava

dormindo.

Era um pouco estranho. Dan passara a maior parte do tempo com Marah em um lugar

onde não havia sol nem lua, confinado no espaço, mas agora estavam em um planeta

perfeitamente ajustável a vida.

Um pensamento lhe veio à mente depois que o êxtase e a euforia passaram depois que

acordou. Havia algum tipo de forma de vida naquele lugar? Um ecossistema assim poderia

existir sem formas de vida?

E a flora que estava lá fora, com todo aquele verde que eles viram na reentrada, a grande árvore,

o mar que avistaram? Praticamente um mundo igual ao que conheciam, mas que ainda era

desconhecido e que precisava ser vasculhado. Dan lembrou imediatamente que poderia haver

algum perigo, e que deveria avisar a Marah que não saísse de forma alguma sozinha por aquele

lugar.

Uma coisa que ele achou estranho foi que o sol já estava no céu, mas isso ele

averiguaria depois. Ele lembrou que teria que passar um bom tempo para elaborar a distribuição

de todos os animais que estavam agora nos criotubos dentro da nave.

Depois que eles chegaram Dan percebera o quanto a nave era colossal. Apenas um

campo aberto realmente poderia abrigar a nave sem nenhum problema.

De fato mesmo com todas as estranhezas ele ainda não conseguira esconder a alegria de

estar naquele lugar. Ele ainda assim não acreditava que todas as coisas tivessem dado certo e

que agora estavam a mais de vinte anos luz de distância da antiga Terra. Dan não deixou de

pensar que deveria haver outros mundos daquele jeito, que pudessem ter todas as qualidades

para manutenção da vida como ele a conhecia. Embora isto ele ainda não poderia afirmar com

certeza se haviam outras formas de vida no lugar ou quem sabe em outros mundos. Desde que

chegaram eles não avistaram nenhum traço de civilização, nenhum tipo de edificação, cidade ou

fauna.

-Bom dia – disse Marah entrando no salão de refeição da nave.

-Bom dia Marah. Dormiu bem?

-Sim. Não vejo a hora de vasculhar todo esse lugar – disse ela fixando os olhos no

espelho de vidro olhando o dia ensolarado, mas com algumas nuvens.

-Sim, vamos fazer isso. Estou aqui empolgado com a ideia. Mas temos que ter cuidado

antes.

-É?

-Não sabemos que tipo de perigo há nesse lugar, temos que ter muito cuidado antes de

sair por aí. Esse planeta é dois terços maior do que o antigo planeta Terra.

-Sabe Dan, entendo perfeitamente, embora eu lembre com tristeza da natureza do

homem. Não importava o status social, a quantidade de conhecimento, ou o lugar onde você

morava. O homem era continuamente mal, seja o que fizesse parte das sociedades públicas, dos

grupos manipulados, da grande mídia, das sociedades secretas, de um povo humilde, todos eram

corruptos. De fato sempre foi preciso um tipo de intervenção divina na vida pessoal de alguém.

Não há motivo nem busca que poderia satisfazer a resposta e a sede da procura do homem que

dia após dia se destruía, pelos próprios interesses, as próprias vontades relativistas,

revolucionárias ou baseadas em um senso crítico que se auto anulava, porque nele não havia

moral. Creio que no mundo sempre existiu algum tipo de força maligna ao qual ele estava

enterrado, não fosse a fé ou algum tipo de graça que não merecíamos, o homem já teria se

destruído e nada mais faria sentido. Um grande pensador disse que deveríamos orar para que a

raça humana nunca deixasse a terra, para não levar a sua iniquidade a outros mundos. Todo

ideal de justiça era um ideal caído, era sujo e no fim sempre iria destruir a todos, pois ninguém

era justo e nem queria praticar a justiça. Para quase aqueles que lá estavam, o amor que tanto

falavam era algo estranho, pois o amor não era algo daquele mundo.

-E trouxemos essa iniquidade conosco para esse lugar Marah?

Page 90: Para Sempre e Mais

-Sim. Está dentro de nós, sempre esteve, estará em nossos filhos e nos filhos deles. A

única solução seria uma intervenção divina. Fatalmente a história irá se repetir. O fato é que o

homem precisa de salvação, não importa o lugar do universo em que esteja. Ele sempre estará

nas trevas e na escuridão se a luz não o alcançar. Precisamos de uma luz, uma luz no mundo

para seguir e não andar nas trevas.

-Olha. Vamos aproveitar para descansar mais. Estou pensando em um plano para a

distribuição da fauna, mas antes temos que fazer todas as verificações possíveis. Lembre-se de

não sair sem mim, ou sem me avisar está bem? Vamos minimizar os riscos.

-Está bem.

-Bom, vamos aproveitar o café da manhã, afinal ainda são quatro e meia, mesmo com

esse sol – sorriu Dan.

Dan e Marah passaram a se dedicar a coleta de novas informações sobre o planeta.

Aproveitaram um dia para sair juntos com Call e Red. Dan descobriu que o solo era próprio para

o cultivo, e era constituído de minerais da mesma linha dos da antiga Terra.

Na nave haviam várias espécies de sementes já conhecidas por Dan e Marah. Eles não

quiseram se arriscar logo em cultivar os frutos das árvores que viram ou catalogaram nos cinco

primeiros dias na região onde estavam. Embora tenham feito isso não conseguiram encontrar

água corrente na área até onde foram, mas estavam satisfeitos com todas as descobertas.

Depois Dan ficou extremamente preocupado com a distribuição do animas, ele sabia

muito bem que aquilo o deixaria muito preocupado e ocupado. Foi o que aconteceu. Depois do

decimo quinto dia Marah já estava sentido completamente o fato de Dan estar ausente. Ela

estava se sentindo só naquele imenso planeta.

...

Page 91: Para Sempre e Mais

Começando tudo

Dia 20 do Ano Um 10:00 / Anno Salutis / Capital Inicial / Nova Terra

Marah não avisara que ia sair sozinha, mas seu jeito curioso e o que estava sentindo

falaram mais alto. Dan havia dito que ainda não era uma boa ideia. Eles tinham que se manter

juntos. Por isso ele deu a ela um sinalizador de pulsos. Eles poderiam se encontrar sempre e

saber onde estavam, mas a nova Terra não era como a nave, grande, mas limitada. A nova Terra

era imensa e ainda cheia de verde e azul. Não havia animais o que parecia estranho

cientificamente. A lógica básica era que em situações como esta deveriam existir alguma forma

de vida, mas nenhuma foi detectada. Dan e Marah ainda não tinham libertado todos os animais

de cada espécie que haviam em Arca Um.

Dan estava nesse momento estruturando o plano de distribuição de todos os animais.

Talvez fosse difícil. Não se sabia ao certo como eles se comportariam no novo ecossistema.

Embora todas estas coisas, o local era perfeitamente ajustável. Dan estava fazendo o

mapeamento do clima, ajustando todas as informações com sondas flutuadoras que ele enviou

que transmitiam informações de volta a nave e faziam as verificações de ajuste, o que era

preciso para a distribuição da fauna sobre a superfície da nova Terra.

Ele estava tão concentrado que não percebeu que faziam mais de dez horas que não via

Marah. Ele nem notou o sinalizador de pulsos.

Talvez fossem preciso muitos dias para a distribuição da fauna, mas Dan permanecia

atento e concentrado. Comumente em seus trabalhos e pesquisas ele escolhia uma lista de

canções que tocavam aleatoriamente e quando um sinal vermelho na jaula dos leões na nave ele

teve uma sensação horrível.

Onde estava Marah? O sinal demonstrara que a jaula de um dos leões estava aberta

agora ou tinha acabado de abrir. Dan correu.

...

Marah estava andando junto com Call. Enquanto ela tirava fotos do local ao redor com

um pouco de distância da nave que estava em um campo aberto perto de uma grande árvore, e

Call fazia verificações e coletava algumas amostras para levar de volta a nave.

Se eles olhassem para trás veriam a nave imponente com todo o seu brilho em tons de

dourado que davam um tom diferente ao local denominado por eles de Capital Inicial.

Marah notara que aquele lugar era perfeitamente comum. Como poderia ela e Dan

encontrarem um local que fosse um tipo de fotocópia da Terra? Aquilo parecia ser estranho

demais. Embora ela estivesse muito interessada em sair o fato foi que Dan desde que chegou

ficara muito compenetrado com o que iria fazer e a deixou de lado. Ela estava se sentindo um

pouco só, mesmo com a companhia de Call e Red que estava um pouco crescido, mas estava na

nave. Dan não lhe dirigira nenhuma palavra. Ela pensava, “Os homens sempre seriam assim

insensíveis a qualquer lugar que fosse?”. Ela naturalmente como a única mulher viva, estava

nesse momento precisando de toda atenção. A cada coisa que acontecia ela tinha a necessidade

de que as coisas fossem feitas com Dan, e fazia horas que ele estava “com a cara enfiada

naquele computador” pensava ela.

Uma lágrima escorreu de seu rosto. Call não notara, embora ele soubesse bem algum

tipo de significado dos sentimentos humanos, ele não poderia entender o que ela estava sentindo

naquele momento. Ela precisava da companhia de Dan.

...

O sinal ainda estava soando e as canções tocando no interior da nave. Dan estava

vestindo-se rapidamente com um suíte de proteção. Havia uma arma que disparava feixes em

Page 92: Para Sempre e Mais

um setor militar da nave. Ele voltou rapidamente para pegar o sinalizador de pulsos e saiu

correndo. Claramente ele sabia que havia um leão a solta e Marah estava lá fora. Passando por

um dos corredores da ala de saída humana da nave ele viu uma porta aberta, e ao acionar o

sistema de verificação de movimentos e rastros de seu elmo suas suspeitas foram confirmadas.

Pegadas de leão passaram por ali e ainda estavam quentes. Mas o sinal de Marah já estava um

pouco longe. O que ele faria agora iria a pé ou iria pegar um modulo dirigível?

...

O céu parecia se nublar nesse momento. Não havia chovido desde que chegaram. Dan e

Marah inda teriam que se acostumar com o tempo do local e como ele se desenvolvia. Marah

ainda não estava preocupada com a chuva.

-Então Call, como estão as coletas? Perguntou Marah limpando o rosto.

-Estão indo bem senhorita. Consegui coletar algumas boas mostras que nos servirão

muito bem para estabelecermos algumas coisas de cultivo aqui na Capital Inicial.

-Você acha que vai chover? Perguntou Marah com os pensamentos em Dan.

-Talvez senhorita. Vejo algumas nuvens se formando além da copa das árvores bem ao

norte.

-Talvez tenhamos que voltar logo, Dan deve estar preocupado – disse Marah olhando

para as plantas e com os pensamentos longe.

-O rapaz Dan estava tão preocupado com os animais – disse o androide pegando mais

uma planta.

-É mesmo não é. Então vamos continuar ainda tenho muitas fotografias para levar de

volta que vão ser muito úteis.

-Vamos – disse o androide.

...

O modulo dirigível estava na plataforma de lançamento. Haviam mais dois ali no

mesmo hangar. O modulo parecia um caracol esticado olhado de longe, mas teria que ser nessa

hora, rápido o suficiente. Marah já estava distante alguns quilômetros e talvez nem tivesse

notado, era o que informava o sinalizador de pulsos.

Dan entrou rapidamente no modulo, jogou a arma dentro de acionou os propulsores. O

modulo era de médio rasante, diferente dos coletivos de baixo rasante que Dan estava

acostumado a pegar na terra. Pilota-lo poderia ser agora uma aventura temível, pois ele estava

tão atordoado que não verificara se a pequena nave tinha controle de voz.

A nave começou a flutuar fazendo barulho e espalhando coisas e papeis leves que

estavam no local. Dan segurou firmemente o direcional lembrando de como tinha controlado a

grande nave na nuvem de Oort. Não era a mesma coisa. Embora não houvesse rochas flutuando

o espaço era grandemente menor e todo cuidado era pouco.

Desajeitadamente ele conseguiu levar a pequena nave até a saída principal.

Aparentemente agora era mais fácil. A saída revelara nuvens assustadoras ao norte. O sinal de

Marah estava se movendo naquela direção. A nave calculou a chegada das nuvens carregadas e

demoraria talvez apenas alguns minutos para começar alguma chuva. Não havia chovido pelo

que Dan lembrará e ele nem sabia se Marah estaria acompanhada de Call.

A nave passou zunindo por cima da copa das árvores. A mata era terrivelmente virgem e

quase não se podia ver o chão nem se havia alguém andando por ali. Dan estava com o coração

aos pulos. Ele tinha o pressentimento de que algo iria acontecer e começava a sentir que a culpa

era sua. Como ele deixara Marah ficar tanto tempo sozinha? Ele era praticamente o líder, e não

tinha se comunicado bem com Marah desde que chegaram. Ele não havia avisado a ela sobre os

possíveis perigos, e um leão solto, nem ele mesmo poderia ter imaginado. Ele estava se

castigando por que não cumpriu o seu papel, e agora para todos os efeitos a única mulher que

ele poderia amar estava correndo um sério perigo.

Page 93: Para Sempre e Mais

...

Marah e Call chegaram agora a um lugar onde tinha uma clareira e uma grande rocha

perto do que parecia ser um lago. Água. Era a primeira vez que ela via água naquele lugar de

forma natural, mas tinha um tom muito azulado.

-Call, corre aqui – disse ela quase gritando.

-O que foi senhorita – disse o androide prontamente.

-Água! Disse ela exultante – vá lá e pegue uma amostra para vermos se estamos

totalmente certos sobre isso. Se for será a primeira grande descoberta deste local. Temos que

registra isso. Eu vou gravar.

Marah se preparou. Ela estava a uns dez metro da borda do lago. Não dava ainda para

saber se era profundo ou não, mas Call foi lá se arriscar. Ela estava segurando a câmera e

colocou no modo de gravação.

O androide se aproximou da água e se inclinou nesse momento para coletar um pouco

do líquido. Instantaneamente ele fez uma rápida verificação e levantando-se gritou com sua voz

sintetizada.

-H2O – disse ele, mas mudando sua expressão.

Uma sensação correu pelo interior de Marah. Ela começou a tremer e se virou para olhar

o que Call estava encarando agora.

Uma figura saia das folhagens a poucos metros a frente dela. Ela só lembrara-se de ter

visto algum desse tipo em imagens, mas agora havia um bem na sua frente. Um trovão cortou o

ar enquanto o leão aparecia e uma leve chuva começava a cair.

A cara do grande animal era terrível. Sua juba estava toda espalhada e podia-se sentir

seu cheiro de longe. Ele lambeu os lábios e rugiu não muito alto. Tinha notado que havia uma

presa bem a sua frente.

O solo começava a ficar úmido e o grande animal começava a andar se um lado para

outro quando decidiu atacar.

...

Dan voava baixo nesse momento e conseguia ver a água caindo dos céus bem à frente.

Faltavam poucos metros para o local onde Marah deveria estar. Fazia alguns minutos que o seu

sinal estava imóvel e Dan sentiu algo terrível.

Bem na sua frente apareceu o que parecia ser um lago não muito grande, que também

não dava para saber se era profundo. Era ali que ele deveria pousar enquanto a chuva começava

a se tornar intensa.

...

O leão avançou na direção de Marah que aterrorizada apenas gritou e fechou os olhos.

Um barulho de um impacto de dois corpos bem na sua frente.

Call correra para frente do leão que vinha e o derrubou no chão fazendo-o cair de lado,

rugindo muito. Call caíra a poucos metros dele mais conseguira se levantar.

Marah se afastou o tanto que pode, mas não queria deixar Call ali sozinho, enquanto ao

mesmo tempo uma nave passava sobre o local. Ela ficou surpresa quando o androide deixou

sobressair uma pequena lâmina de reparos em um de seus braços. O leão avançou em direção ao

androide. Marah gritou novamente. A chuva se tornara grandemente intensa agora.

O leão deu um salto sobre o corpo do androide que caiu no chão, mas conseguiu

perfurar o animal na altura da barriga o que fez com que ele caísse de lado, mas conseguindo

segurar o braço da lâmina com suas mandíbulas poderosas. Com uma força tremenda o animal

conseguiu arrancar o braço do androide que ficou caído em uma poça de lama que se formava.

Page 94: Para Sempre e Mais

-Corra senhorita – gritou o Call enquanto Marah abaixava-se para pegar alguma pedra

para atirar no animal.

A expressão do bicho era de um terror tremendo. Estava ali mesmo ferido imponente e

rugindo procurando alguém para devorar. Sua fome era imensa. Ele correu agora na direção de

Marah. Ela gritou enquanto jogou algo que pegou em um dos olhos do leão, mas mesmo assim o

animal conseguiu pular em cima dela com suas patas abertas, arranhando-a nos braços e costelas

fazendo-a cair e bater a cabeça em uma pedra deixando-a desacordada. O leão caiu de lado

coçando o olho que levara uma pedrada. Rugia e olhava para Marah que estava caída nesse

momento.

...

Um barulho alto se fez quando Dan aterrissou. Ele pulou imediatamente na terra

lamacenta do local segurando sua arma e correu. O sinal estava a poucos metros. Ele correu

desesperado.

...

O leão encarou Marah desacordada. Ele lambeu os lábios e os dentes piscando o olho

machucado.

Quando ele avançou com a boca aberta, um rugido semelhante soou no local. Call

emitira um som de leão o que fez com que o grande animal parasse e rugisse em direção dele,

mas ele se voltou novamente.

O leão parou em frente a Marah que tinha o rosto molhado pela chuva e estava numa

poça de lama agora. O animal abriu a boca e mostrou seus grandes dentes ao chegar perto dela.

...

Dan deu um grito, mas o bicho não olhara para trás quando ele estava a poucos

centímetros de Marah que estava claramente caída no chão.

Call ouviu um único barulho com seus ouvidos mecânicos. Um tiro certeiro passou

zunindo no ar e na água que caia e iluminava todo o local acertando o leão que foi jogado a

alguns metros com a força de impacto. O leão não conseguira encostar novamente em Marah,

mas ela estava ainda caída no chão ensopado do local.

Dan correu e tirou imediatamente o elmo. O desespero tomou conta dele. A cabeça de

Marah estava feriada, e seus braços e costelas também. Ele a segurou e conseguiu levanta-la.

Saiu em direção a nave levando-a nos braços olhando para o seu rosto molhado. O androide se

levantou e conseguiu pegar os restos de seu braço que ficou meio despedaçado e acompanhou

Dan que carregava Marah para o módulo.

Lágrimas escorriam de seu rosto enquanto ele falava com ela.

-Me desculpe querida, por tê-la deixado sozinha. Você não devia ter saído assim sem

me avisar. Me desculpe.

Ele entrou no módulo e a colocou em uma das poltronas, assustando-se ao ver o

androide que entrava segurando um dos braços com o outro braço.

-Segure ela Call. Temos que voltar para a nave rapidamente. Ela está desacordada.

Verifique onde ela tem ferimentos e olhe o pulso dela. Ela está muito machucada.

-Sim Dan – respondeu o androide.

A nave conseguiu erguer-se, e Dan acionou os propulsores a velocidade máxima.

A chuva estava parando. Tinha sido intensa, mas passageira. Dan estava aterrorizado se

culpando por tudo o que tinha acontecido enquanto ouvia o diagnóstico de Call que passava um

Page 95: Para Sempre e Mais

eletrossensor luminoso sobre Marah. Seus sinais vitais estavam baixos e ela precisava ser

atendida por uma câmara médica móvel na nave.

A pequena nave caracol estava se aproximando da grande nave dourada que estava em

um grande campo aberto ao lado de uma árvore gigantesca. A floresta ficava perto de um dos

limites do campo de relva amarelada semelhante a trigo. O sol a pino começava a parecer nas

nuvens. Comumente parecia que o clima era sempre ameno e frio, mas não chegava a ser gelado

nessa parte do planeta.

Dan estacionou rapidamente perto da entrada e saiu rápido olhando para Marah que não

mostrava nenhum sinal de vida. A sua cabeça estava girando de desespero. Quando entraram na

nave as músicas ainda estava sendo tocadas. Enquanto ele corria pelos corredores os sinos do

meio dia soavam juntamente com os seguintes versos emitidos por todo o local, “Meu coração

está partido dentro de mim, porque existe uma renúncia agora, para que haja um novo sonho.

Não se pode medir a falta que você faz agora e o silêncio soa tão alto. Minha alma está

cortada, por conta disso, e as lágrimas escorrem.”

Correndo pelos corredores ele conseguiu chegar à sala da unidade médica. Ele acionou a

rotina de verificação por voz enquanto a câmara se abria e ele falava o diagnóstico para a

câmara relacionar com as rotinas de procedimento. Ele colocou Marah lá dentro já com os olhos

encharcados e vermelhos de lágrimas.

A unidade fechou-se. As rotinas de verificação começaram. Call abriu a porta da sala e

Red entrou correndo, mas não latiu e ficou olhando Marah dentro da câmara.

Dan baixou a cabeça e chorou. Até o momento os sinais estavam no vermelho.

Não foi o que ele planejou. Estaria tudo perdido se ela se fosse. Como ele foi esquecer a

única pessoa que poderia amar naquele momento. Ele sempre a viu. E sempre guardou em seu

coração o que sentia até mesmo depois que chegaram a nova Terra. Tudo que ele queria dizer a

ela agora era que ele a amava.

A unidade começou a realizar procedimentos curativos e cirúrgicos nos ferimentos

depois da anestesia. O machucado maior estava em sua cabeça. Nos braços e na costela a

máquina fez uma reconstituição orgânica que logo se diluiria no corpo pela troca de células.

Dan baixou a cabeça e sentou-se no chão de costas para a unidade médica. Call não

sabia o que fazer, era apenas um sintético que não podia fazer mais do que proteger um ser

humano nas diversas situações de perigo codificadas em seu processador.

Dan soluçava e os versos ecoavam pelo local, “Eu não poderia prever isto, nem

imaginar não estar com você. Estou certo de que não encontrarei alguém como você, minha

amada. Porque você sabe exatamente quem sou. Me sinto tão indefeso, e agora sei que com

você me sinto seguro. Eu enfrentei o perigo e agora quero estar com você em qualquer lugar.

Eu estarei com você, eu prometo.”

Os procedimentos cirúrgicos começaram a ser executados na cabeça de Marah. Sangue

escorria e a máquina tentava fechar o ferimento com seus dispositivos e laser cirúrgico.

Dan começou a falar sozinho.

-Eu prometo que estarei aqui meu amor. Por favor, não se vá. Não porque você é a única

de fato, mas porque você é a única pra mim. Se nesse momento eu tivesse milhares de mulheres

sobreviventes eu escolheria você. Eu escolheria você, pois nunca vou encontrar alguém como

você. Eu prometo que sempre estarei com você. Onde quer que esteja eu estarei lá. Eu te amo.

Por favor, Deus. Admito que sempre acreditei até agora. Para mim é difícil de entender

desde o começo, mas cuide dela e faça com que ela fique boa. Sei que não somos melhores que

os outros nem ninguém, mas só te peço isso agora.

O androide com um braço só agora chegou perto da câmara e olhou para Marah deitada,

sendo tocada pelos equipamentos. Ele não entendia perfeitamente o que estava se passando na

mente de Dan, mas começou a falar diante da câmara.

-Volte senhorita, onde quer que esteja. Não sei o que significa, mas o rapaz Dan a ama e

quer você de volta. Ele está sentindo muito isso que vocês humanos chamam de amor.

Page 96: Para Sempre e Mais

A unidade posicionou uma máscara de gás no rosto de Marah e uma pequena agulha

injetada em seu pulso. O androide se virou para Dan que tinha Red agora ao seu lado. As luzes

piscavam no vermelho e Dan soluçava sem parar sentado no chão do local.

Um minuto se passou. Call se aproximou de Dan e pôs a mão que ainda tinha em seu

ombro.

Quando ele se virou para olhar, uma luz verde começou a piscar e Marah se estremeceu

e arfou ar nos pulmões. De um salto Dan se ergueu e correu para perto da câmara. Marah abriu

os olhos e olhou para Dan ainda com a máscara no rosto. O gás dentro da câmara se dispersava.

Ela estava viva. Deu um sorriso para Dan que começou a falar.

-Eu te amo minha querida. Me desculpe. Você vai ficar boa. Vai ficar melhor. Está

bem? – disse Dan limpando os olhos.

Ela apenas mexeu um pouco a cabeça fazendo uma careta.

A máquina disse que ela deveria ficar em repouso ali por algumas horas.

Dan permaneceu a maior parte do tempo ali sentado em uma poltrona olhando para ela

até se cansar. Ele avisou para Call fazer as verificações para ver se mais algum animal tinha

saído que representasse algum perigo. Todas as portas da nave foram fechadas e Dan ficou lá só

observando Marah se recuperar enquanto dormia, até que ele também dormiu ali perto.

...

Nas semanas seguintes Marah se recuperar bem enquanto Dan estava todo atencioso e

esquecera os animais por enquanto. Ela ainda não podia fazer muito esforço e tinha algumas

dores de cabeça, mas estava ficando bem e sem sequelas. Dan estava certo de que aquele era o

mundo da qual não sairiam agora. Devia ser povoado. As implicações na mente dele para um

novo mundo estavam transbordando a cada dia que se passava. Ele lembrara perfeitamente de

como era o seu antigo planeta, como as pessoas se comportavam, pelo que lutavam, o que

significava a moral, o que significava a fé que nesse momento era para eles mais do que

simplesmente ciência ou outra coisa. A responsabilidade de construir um novo mundo era

imensa e ele não esperava que fosse do mesmo jeito que o antigo. Talvez demorasse ainda

muito tempo para alcançar o mesmo estágio em que viviam os humanos, mas Dan estava

querendo descartar todas as outras coisas da corrupção do homem, o que no fim das contas ele

imaginou que seria inevitável.

Depois eles voltaram a floresta e encontraram o leão ainda ferido e manco, mas vivo.

Estava quase indefeso, aplicaram um sedativo no animal e o trouxeram a nave para ser cuidado.

Para Dan no momento em que atirou, não havia pensamentos sobre extinção dos leões, ele só se

deu conta depois, mas em todos os casos o melhor era que Marah estava ficando bem e ele

sentia mais do que nunca que a amava. Talvez só não tivesse admitido esse tempo todo.

Depois que ela ficou completamente curada Marah foi convida para o primeiro jantar

oficial em Capital Inicial fora da nave, assim denominado por Dan.

-Marah – disse Dan olhando para ela que estava distraída olhando para a grande árvore

do campo que tinha folhas que mudavam de cor durante o dia, mas a essa hora já estava perto do

anoitecer já com algumas estrelas e as duas luas gigantes no céu depois de vinte dias de um sol

ameno.

-Oi – disse ela voltando-se para ela com um sorriso.

-Bom, é. Eu queria saber – disse ele parando – se, se, se você – gaguejando - gostaria

de jantar comigo essa noite? Terminou ele corado.

-Oh, que fofinho, um convite para um jantar. Mas é claro que sim, e quer saber de uma

coisa? – disse ela com um sorriso.

-O que? Perguntou ele fazendo beicinho.

-Se houvesse milhares de rapazes sobreviventes eu escolheria você – disse ela

meigamente com aqueles olhos verdes brilhantes.

Page 97: Para Sempre e Mais

-Eu também, quer dizer – riu Dan – se houvesse milhares de moças. Mas minha

pergunta é outra também.

-Eu quero ouvi-la.

...

Page 98: Para Sempre e Mais

Sempre foi óbvio

Dia 5 do Ano Dois 16:20 / Anno Salutis / Capital Inicial / Nova Terra

-Sabe, todas as vez que eu olho para você, meu coração parece cair do firmamento –

disse Dan olhando Marah nos olhos e segurando suas mãos.

-Nossa a primeira poesia mais linda deste lugar, mas acho que você tem mais a dizer –

disse Marah sorrindo.

-Realmente existe algo óbvio aqui. Sempre foi óbvio – disse Dan desajeitadamente – Eu

nunca fiz isso, se quer saber, mas é a primeira vez que tenho satisfação de dizer estas coisas

Marah.

-Oh, que coisas mais linda e fofa. Estou esperando. Continue.

-Bom, eu sempre achei que você tinha uma beleza incomum. Esse par de olhos verdes, é

algo que eu não sei descrever com poucas palavras, mas não somente isso. Não quero

simplesmente considera-la por alguma parte específica física ou da tua personalidade. Tenho

que admitir que você é uma menina completa, e que realmente tem que ser com você. Não há

nada nesse mundo, nem no que ficou para trás que eu queira, mas do que estar com você.

É como se você estivesse em orbita perto do meu coração esse tempo todo, esperando só

o momento de colidir comigo. Nossos mundos se colidiram, naquele dia na livraria e estamos

aqui, simplesmente, não apenas para declarar algum tipo de sentimento, mas para dizer o quanto

sentimos um pelo outro. E essa é minha parte.

Quero dizer que eu a amo, e que o que eu mais quero é que você seja minha esposa

daqui para frente. Quero que se case comigo, minha querida. E esta é minha pergunta.

Você aceita se casar comigo Marah?

Marah não se conteve e chorou. Não de tristeza, mas de alegria.

-Esperei por esse momento o tempo todo e minha resposta é definitivamente sim, meu

amor. Eu aceito. Eu te amo.

-Eu também te amo – disse Dan.

Imediatamente os dois se abraçaram e se beijaram sob a sombra da Grande Árvore de

um sol que estava se pondo atrás das montanhas cobertas de neve.

...

Havia uma pequena mesa ali preparada para a ocasião. O tipo de momento

especialmente romântico. Duas luas brilhando no céu de um lado em um céu todo estrelado, um

entardecer demorado, o que parecia ser comum.

Call estava devidamente vestido para a ocasião. Ele seria o garçom que cuidaria de

todas as coisas.

-Tudo bem Call – disse Dan quando o androide se aproximou – o que temos para esse

longo entardecer, que eu esperava que fosse noite? Sorriu Dan.

-Bom senhor, temos o prato especial da casa – respondeu Call.

-Espero que esteja ótimo Call – disse Marah com um largo sorriso.

-Está sim senhorita. Foi feito especialmente por mim.

-Serio? Não acredito. Esse tempo todo e você não me disse que era cozinheiro também

Call – riu Marah.

-Me desculpe senhorita, eu aprendi recentemente.

Page 99: Para Sempre e Mais

-E você Red, já sabia das intenções de Dan? O cachorro que estava ali por perto

comendo ração latiu e continuou o que estava fazendo.

-Call, música por favor – disse Dan.

Dan encarou Marah. Nada poderia ser mais fantástico, lindo, sublime do que aquele

momento. Nada mais repleto de sentimentos poderosos e únicos do que o que estavam sentindo.

Nada mais único do que todas as coisas que se passaram na antiga Terra.

Esse sem dúvida era um dos momentos, mais profundos e significativos para os dois e

quem sabe para a história. Isso não iria se repetir da mesma forma. Eles eram os escolhidos para

viverem esse momento, sob o luar de duas luas gigantes nos céus, algumas poucas nuvens.

Aquilo era incrível, e foi um dos primeiros registros mais lindos do novo planeta.

...

Dois dias depois sob a mesma árvore e sob o mesmo entardecer Red estava segurando

em sua boca de forma bem educada duas alianças de um metal brilhante que foi encontrado pelo

androide na região onde estavam em uma cestinha que Call forjara.

Marah estava linda de branco, juntamente com Dan, um em frente ao outro com largos

sorrisos, sendo observados pelo cachorro que tanto gostavam e pelo androide que tanto

admiravam.

-Isso poderia ter soado estranho em nosso mundo, mas em momento algum é. Pois nós

mesmos estamos celebrando nossa união de todas as formas.

-Eu Adan Oliver declaro neste momento diante de Deus pelo qual é testemunha, que é

desejo do meu coração viver com você Marah Evan, como esposo e ama-la em todos os

momentos até o fim de minha vida neste lugar.

-Eu Marah Evan, declaro sob a mesma forma diante de Deus que quero ser a esposa de

você, Adan Oliver e que vou ama-lo e viver com você em toda circunstância até o fim de meus

dias.

-Em outras palavras, minha resposta à pergunta óbvia nesse momento, é sim.

-Minha resposta também é sim.

-As alianças, por favor Red.

O cachorro atendeu e veio segurando a pequena cesta com as alianças.

Dan pegou uma delas e colocou no anular da mão esquerda de Marah. Logo em seguida

ela fez o mesmo, pegando a outra e colocando no anular da mão esquerda de Dan.

-Alguma coisa a dizer? Perguntou Dan virando-se para Red e Call.

Red deu um latido como de costume.

-Por isso deixa o homem, pai e mãe e se une a sua mulher, tornando-se os dois uma só

carne – disse Call.

-Acho que o noivo já pode beijar a noiva, ou é esposo? Dan fez uma careta quando falou

isso.

-Bom eu não sei, só sei que você deve me beijar agora – disse Marah pondo suas mãos

em volta do pescoço de Dan.

Os dois beijaram-se. Call estava registrando tudo.

...

Page 100: Para Sempre e Mais

Depois de um casamento a maioria dos casais no antigo planeta Terra viajava para

desfrutar o que chamavam de lua de mel. Para Dan e Marah não foi diferente. Agora esposo e

esposa deixaram a nave aos cuidados de Call, enquanto eles fariam um pequeno passeio a um

lugar que Dan prepara dias antes quando estava fazendo uma pesquisa.

Eles subiram a bordo de uma das pequenas naves que haviam em Arca Um e saíram no

dia trinta e sete do ano um em Capital Inicial.

Foram a um lugar onde havia uma cachoeira imensa que dava para uma grande lago, ao

qual deram o nome de cachoeira e lago da Aliança, por conta do seu casamento.

O lugar era praticamente mágico, a água que vinha correndo do rio era repleta de

minerais que ao entrar em contato um com o outro mineral de rochas que haviam no topo da

cachoeira produziam um tipo de luminescência que dava a impressão que estava escorrendo luz

em tons de amarelo e laranja, as vezes vermelho pela cachoeira. O lago era imenso e fundo

também, mas não havia animais na água. Antes dos dois irem a esse local, Dan teve a ideia de

levar uma variedade de peixes para despedir no lago que poderia ser perfeitamente habitado.

Dan construirá uma cabana com madeira de alguma árvores do local e foi ali que

passaram uma semana, antes de voltarem para a nave.

...

Dia 15 do Ano Dois 09:20 / Anno Salutis /

Capital Inicial / Nova Terra

O ano passava rápido em Nova Terra, para Dan e Marah. Durava apenas trinta e sete

dias aproximadamente devido a distância do planeta em relação ao seu sol, ou o segundo sol

simplesmente como eles passaram a chamar, nunca tendo existido um significado de

relativismo, segunda opinião, ou ausência de verdade absoluta, a qual Dan e Marah

abominavam. O segundo sol era simplesmente a segunda estrela.

Dan e Marah, logo depois que voltaram a nave, resolveram continuar o planejamento de

repovoamento de fauna. Durante todo o tempo de distribuição foi que se deram conta da

quantidade animais que haviam na nave. Não eram todas as espécies, mas cada par continha o

código genético de todas as ramificações existentes das mais variadas espécies. Dan lembrara

muito bem, que isso era fatual devido ao material genético existente, e isso era essencial e

divino, para que houvesse variação dos tipos básicos de acordo com clima, flora e ecossistema

local.

De fato o que se tornaria patente seria uma microevolução, ou seja, uma variação de

material genético já existente, uma recombinação, onde poderiam haver duas espécies diferentes

apenas morfologicamente, mas nunca geneticamente. Isso era diferente da macro evolução que

alegava evolução transespecífica, ou seja, além do limite da espécie.

Dessa forma nunca haveria especiação já que esse processo indicaria que o pool gênico

empobreceria, e assim haveria mais riscos de extinção. O que iria acontecer com todos os

animais agora no novo planeta seria a adaptação limitada baseada na carga genética já existente.

Embora a mutação pudesse ser um argumento em favor da macro evolução, muitos casos se

resumem apenas a perca de uma parte do animal e outras vezes não há registros de transições de

um tipo para outro. Porque as mutações, embora alterem o código genético, não codificam

novas estruturas e funções, e nem criam nova informação genética. Elas apenas selecionam,

eliminam, duplicam trocam ou recombinam material genético já existente.

O fato é que não existe nenhuma evolução como sempre se acreditou, mas o uso de todo

o material genético já existente. Assim ficaria uma pergunta: de onde veio todo o material

genético existente? O fato aterrador é que os aminoácidos estão dispostos em forma correta,

para criar as proteínas corretamente. Existia uma sintonia fina, que para todos os efeitos, não

poder-se-ia crer que era um simples mero acaso. Era algo planejado, fruto de uma inteligência

complexa. Concluir-se-ia que quanto maior a complexidade dos materiais orgânicos, minerais

da natureza, maior a inteligência para elabora-los. Caso isso não estivesse perfeitamente

ajustado, nenhum ser vivo se formaria como os conhecemos.

Page 101: Para Sempre e Mais

Dan e Marah passariam dias fazendo aquilo, mas iria dar certo. Eles estavam a bordo de

uma das pequenas naves com alguns espécimes que estavam sendo monitorados por eles através

de alguns dispositivos sensitivos de organismos por área.

-Acha que a maioria deles vai sobreviver em seu novo mundo? Perguntou Marah.

-Creio que sim. Os ambientes que escolhemos atendem perfeitamente as exigências. E

além de tudo eles não são homens, vão cuidar muito bem de tudo, antes que este planeta se

encha novamente.

-É mesmo – riu Marah – ainda vai levar muito tempo para povoarmos esse lugar.

-Então vamos ter muitos filhos – disse Dan rindo também.

-E esse é um momento histórico, por isso temos que nos cuidar e ver como está nossa

saúde, afinal somos só nós dois – disse Marah.

-Mas vai dar certo. Nem sei como será minha reação ao ser pai. Espero que sejam os

tempos mais abençoados desse lugar.

-Serão. Estão sendo tempos abençoados desde que eu te conheci meu amor. Não

trocaria isso por nada nesse mundo, nem no que se foi, e nem em outro planeta – disse Marah

encarando Dan enquanto ele pousava a nave em um local.

-Vou me lembrar disso para sempre, minha querida – Dan apertou um botão e uma jaula

foi aberta e dois pares de cavalos saíram correndo rumo a um campo de prados aberto onde

tinham pousado a nave.

Aquela visão era intensa. Ver os animais correndo por aquele local, estavam livres para

desvendar os mistérios desse novo lugar e aumentar a sua espécie. Dan e Marah ficaram fazendo

aquilo por meses. Muitos animais foram soltos em locais distantes, mas sempre monitorados

pelos dispositivos que implantaram. Eles foram a lugares gelados, muitas vezes áridos, com

muito verde, regiões pantanosas. Nenhuma outra forma de vida foi avistada. As vezes Dan se

perguntava como um local daquele poderia existir, sem uma influência participativa de fauna e

flora como os ecossistemas na antiga Terra. Ele não se deteve em questões como essa, e tanto

ele como Marah ficaram felizes com os resultados que vieram de como os animais estavam se

comportando em suas respectivas regiões. Muitos animais estavam na região onde eles estavam,

especialmente os que poderiam ser mais facilmente domesticados.

Depois de algum tempo o local onde estavam começou a ter as primeiras características

de uma pequena vila. Dan e Marah construíram fora da nave alguns lugares específicos, como

currais para alguns animais, algumas pequenas estradas, algumas pequenas edificações onde

realizavam alguns trabalhos. Os dois elaboraram um plano de condução de água de um local

distante, onde a água vinha de alguma cachoeiras. Toda água era usada muito bem no local.

Com os tempo as plantações começaram a florescer nas regiões que havia escolhido

para plantio. Nesse momento eles passaram a ter uma variedade de frutos que já conheciam e

outros que passaram a conhecer. Red já era um cachorro grandalhão e Call estava com a mesma

cara de sempre, pois ele nunca ia envelhecer.

Mas mesmo com um androide simpático e comunicativo, um cachorro grandemente

amigável e muitas tarefas e coisas para cuidar, os dois começaram a se sentir um pouco

sozinhos.

Nada era igual a ter outro ser humano além deles. Eles já havia se relacionado com

tantas pessoas, tinham uma família, escola e mais, mas sentiam a falta disso tudo. O momento

estava chegando, onde eles iriam começar a constituir a coisa, mais linda, mais básica, mais

sólida, das relações humanas uma família entre um homem e uma mulher, pois afinal isso

sempre foi óbvio. Um filho estava por vir.

Page 102: Para Sempre e Mais

Família

Dia 16 do Ano Cinco 10:20 / Anno Salutis / Capital Inicial / Nova Terra

No mundo que se foi e que ficou para trás Dan e Marah agora, esposo e esposa

conheciam os fatos sobre a família. Na situação em que eles estavam eles poderiam se perguntar

qual a definição de família agora, que estavam em um novo mundo. Para todos os efeitos, eles

entendiam perfeitamente que onde estivesse sabiam o que era uma família.

Haveria uma nova forma de se agrupar? Haveria uma nova forma de se relacionar? Não.

Este era o pensamento dos dois. Eles sabiam que família se constitui com um homem e uma

mulher e logo depois, a constituição continua com a sua prole.

Dan quase caia para trás, quando Marah disse que estava grávida.

-Dan – disse Marah sorridente.

-O que foi meu amor? Que belo sorriso é esse essa manhã? – disse Dan sorrindo.

-Estou grávida – disse Marah simplesmente e sorrindo.

-O quê? Disse Dan repleto de sentimentos poderosos deixando escorrer lagrimas nos

momentos seguintes.

Os testes na nave revelaram a surpresa agradável para os dois. Era fato que só um

homem e uma mulher poderiam continuar a raça humana nessa hora decisiva da história do

homem. Mais do que um homem e uma mulher que tem todas as capacidades para se reproduzir,

eles sabiam qual o seu papel definitivo agora. Eles sabiam qual era o papel verdadeiro de um

homem e uma mulher. Nesse momento, não havia sequer uma fagulha do conflito existencial da

antiga terra, onde um homem não sabia que era mais homem, nem uma mulher não sabia que

era mais uma mulher. Onde homens não reconheciam o seu semelhante e se destruíam por

motivos banais. Onde homens estavam desesperados para compreender o que eles mesmos eram

no mundo. Enfim seu mundo acabou, mas algo permaneceu, a família, homem, mulher e filhos.

Dan e Marah iriam ter um agora. E esta era a notícia mais comovente e feliz da nova história.

Como um grande apologista disse, esse era o fato nesse momento “Este triângulo de

truísmos de pai, mãe e filho, não pode ser destruído. Só pode ser destruído aquelas civilizações

que o ignorem.”. O mundo tinha recebido algum castigo, porque começou a ignorar a família?

Se sim ou se não, este mundo não mais existia, e o que agora existia era uma linda família em

um novo mundo, não segundo as mentes do mundo onde as perversões se tornaram convenções,

mas segundo a ideia de que um homem deixa seu pai e sua mãe e seu une a sua mulher, e ainda

mais, fundamentado no fato de que o homem ama a mulher verdadeiramente e ela lhe tem

respeito e assim cada um cumprindo o seu papel se completam e completam o ideal perfeito

para a construção de um mundo.

Infelizmente, no mundo que passou, o conceito de família era meramente cultural, e

assim família podia ser qualquer coisa. Muito distante do que era pra ser, casamento era algo

solúvel em qualquer comportamento. O fato era que qualquer coisa que fosse considerada

tradicional não era exatamente a coisa certa, mas todos que criam nisso estavam errados, pois só

queriam fazer as próprias vontades. O homem se tornou o que se admitia por homem quebrado,

pois ele não sabia mais se definir e nem definir as convenções verdadeiras e indissolúveis como

o casamento entre homem e mulher.

Page 103: Para Sempre e Mais

Dan e Marah viveram em uma época onde o que era pregado era a banalização do

matrimonio. A grande mídia destruía continuamente a visão de um casamento correto e

duradouro. Novelas e séries televisivas exaltavam personagens que não tinham compromisso

nenhum com o seu casamento ou conjugue, tendo até motivação para se fazer festas quando

uma pessoa se separava de outra. No entanto quando se tratava de adultério, dava-se a visão de

que era algo lindo e que não havia erro se as duas pessoas estivessem dispostas. E essa

disposição sempre foi a infidelidade. Com todos os ataques feitos pelo próprio homem ele foi

deixando de acreditar que o casamento era uma instituição sólida.

Desacreditar no matrimônio, revelou-se como um produto da falta de relacionamento

com Deus. Você não se relacionava com Deus e isso trazia consequências sociais terríveis, pois

as pessoas não estavam sabendo como se relacionar, e assim entravam em casamentos furados

que acabavam em divórcios altamente comuns.

Para felicidade dos dois que estavam um diante do outro, Dan e Marah, não havia nada

que pudesse afastá-los um do outro, e nem motivação para que não considerassem o casamento

como uma relação suprema de amor entre homem e mulher. O que não era isso, amor entre

homem e mulher, era sintoma de uma sociedade perdida, fragmentada, levada pelos desejos de

homens corruptos e alheios a moral, que tanto relativizaram os últimos dias.

-Essa é uma das notícias mais felizes da minha vida. Fará parte da história – disse Dan

feliz.

-Temos que arrumar um nome. A unidade médica informou que seria um menino. Estou

apenas com oito semanas. E acho que já estou enjoada.

-Nossa, mas que coisa linda. Temos que arrumar um nome para ele – disse Dan

entusiasmado.

-É mesmo. Dois nomes. Um que eu escolher e outro que você escolher – sugeriu Marah.

-Está ótimo – disse Dan abaixando-se e beijando a barriga de Marah.

...

Os meses foram se passando e aparência de Marah estava mudando. Sua barriga estava

ganhando a saliência da gravidez. Dan a via como a posse mais preciosa do universo. Não havia

nada que fosse mais belo e poético que seu amor por ela e como ele a via.

Ele se tornou tão cuidadoso em todos os aspectos durante os meses de gravidez dela.

Embora comumente fosse natural que a mulher mudasse seu comportamento durante esse

período, Dan era suficientemente compreensível para manter o mesmo amor em todas as

ocasiões. Isso era imprescindível para ela.

Durante todo o tempo Dan registrou de forma criativa o período em que ela estava

gestante. Milhares de fotos estavam no servidor da nave, juntamente com vídeos e mais vídeos.

E ao dia 20 do ano dez em Capital Inicial Marah começou a sentir as contrações. Era

perto do meio dia. Apressadamente Dan levou ela para a unidade médica que a salvara uma vez,

e agora seria o momento de dar as boas-vindas para uma nova vida. O filho deles dois.

Perto de uma hora da tarde Lel Set, assim foi como foi chamado, deu seu primeiro choro

de vida enquanto seus pais sorriam. Novamente não haviam palavras para expressar a imensa

alegria de ter um pequeno ser humano ali diante deles, com pequenos olhos verdes escuros.

Mesmo um momento tenso para os dois, tudo correu bem, até mesmo para Dan que sentia

náuseas com acontecimentos médicos extremos.

-Nossa, ele é lindo – disse Dan.

Page 104: Para Sempre e Mais

-Eu sei. Nosso bebê tem os olhos meus e os teus, de um verde escuro perfeito.

-Mas é tão fofinho e pequeno. Que coisa mais linda – Dan olhou para Marah – Meu

amor, não há nenhum momento que seja feliz, quanto um novo nascimento. E eu queria dizer

que te amo e amo nosso filho.

-Eu também te amo meu amor. Esse é o momento mais lindo para nós dois.

No mundo onde eles viviam na antiga Terra. Um novo ser humano era motivo de

discussão entre muitos. Em alguns países existiam severos controles de natalidade, o que

ocasionava comportamentos brutais contra recém-nascidos ou fetos. Campanhas a favor do

aborto eram vinculadas por muitos em vários lugares. Isso era fruto do falso humanismo que

dava ocasião apenas a quem pudesse se proteger com essa ideologia que destruía o homem sem

que ele percebesse.

A luta contra o aborto era somente oposição à morte. Era luta contra o infanticídio.

Mesmo embora nunca ficando claro que essa ideologia era motivação básica de um pequeno

grupo que controlava o mundo, a quem poderia ser rotulado de genocidas riquinhos. O propósito

principal era conter o homem, não o homem em si, mas o crescimento populacional. Dessa

forma de maneira indireta por etapas de controle de massas, eles implantavam a legalização de

várias leis que neutralizavam o nascimento de pessoas, alegando motivos de saúde, relativização

de gênero sexual, relativização da família o que aumentava o conflito existencial e crise

humana, para inserir totalmente na sociedade o que se rotulou como uma ordem nova de

valores, comportamentos, ideologias, conceitos, que iriam destruir o homem.

Para infelicidade destes um asteroide caiu na antiga Terra e acabou somente com tudo.

Todos os propósitos, todas as leis, todos os poderosos e oprimidos, enganadores e controladores,

céticos e místicos e ninguém pode se salvar com suas instalações de segurança, suas cidades

subterrâneas e fortalezas.

Nesse momento da história do homem, só havia uma coisa que existia. A família de Dan

e Marah, juntamente com o pequenino Lel Set, a qual iria ser o primeiro a receber uma

educação verdadeira de conceitos sólidos, que nunca se perderam no mundo antigo, pois não

foram elaborados pelo homem, embora o homem estivesse perdido e em crise.

...

O pequeno Set, depois que saiu da unidade médica estava bem. Era um menino robusto

com olhos verde-escuro pequenos e cabelos castanhos. Dan e Marah fizeram um quarto especial

para ele. Muitas das coisas que haviam no seu quarto foram feitas artesanalmente por seus pais

que agora estavam com a aparência de um pouco mais velhos desde a primeira vez que se

viram.

-Nossa Dan, devem fazer um seis anos que nos conhecemos – disse Marah segurando e

olhando para Set.

-Faz mesmo. Sinto como se tudo isso tivesse passado rápido – disse Dan estendendo a

mão e acariciando Set.

-Como será para ele crescer aqui neste lugar? Perguntou Marah.

-Vais ser tão diferente. Ele nunca vai sentir o gosto de se viver em uma civilização

como a nossa, mas eu creio que ele vai ser inteligente, e será bem educado por nos dois.

-Vamos ensiná-lo o caminho correto, para que quando ele estiver velho ele não se

desvie dele – disse Marah.

-Se o ensinarmos ele não se desviará.

Page 105: Para Sempre e Mais

-Ele vai aprender praticamente um idioma – disse Marah – será que a humanidade que

florescer nesse lugar falará uma só língua.

-Talvez. O homem sempre foi tão complexo e confuso. Tenho a tremenda sensação de

que onde o homem estiver ele sempre expressará a mesma natureza, não importa.

-Não importe quantas línguas ele fale, nem quantas leis criem, ele de alguma forma

espalhará a iniquidade a outros lugares.

-Infelizmente.

...

Família tinha uma definição. Foi criada e designada juntamente com o casamento como

a mais fundamental das relações humanas. No mundo onde Marah e Dan viviam, tínhamos

famílias atormentadas pelo conflito e arrasadas pela negligência e o abuso. O divórcio tornara-se

uma palavra comum, significando miséria e dureza para os múltiplos milhões de suas vítimas.

Muitos homens jamais aprenderam a serem esposos e pais devotados. Muitas mulheres fugiram

de seus papéis. Pais que não tinham nenhuma ideia de como preparar seus filhos estão assim

perturbados pelo conflito com seus rebentos rebeldes. Outros simplesmente abandonaram seu

dever, deixando filhos sem qualquer preparação ou provisão.

Dan tinha um pensamento em mente. Abominar todas as coisas que eram erradas no que

se dizia respeito à família. Isso iria ser a base fundamental para o mundo a qual eles estavam

construindo agora, e ele estava ciente de que havia um dever dele mesmo como líder, pai e

esposo. Mesmo que não houvessem milhões de pessoas naquele lugar, ele sabia que existiam

responsabilidades que definiriam tudo dali pra frente.

A destruição, inversão de valores, deturpação, descaracterização e a desmoralização da

família, implicam diretamente num profundo caos, produzindo os mais terríveis danos à

humanidade, quer sejam de ordem moral, espiritual, econômica, fraternal e social.

...

Perto da grande arvore em Capital Inicial, Dan e Marah foram passear juntamente com

Set. Call ainda estava com a mesma forma de sempre. Red agora estava acompanhado por uma

cadela que recebeu o nome de Belablul e seus dois pequenos filhotes, Lirogreen e Lirocloud.

Fazia mais de um ano terrestre que eles haviam chegado ao planeta e quinze anos já haviam se

passado na nova Terra. O lugar estava se transformando aos poucos e como de costume, pelo

menos na antiga terra Dan e Marah começaram a escrever a árvore genealógica, literalmente. Os

dois escreveram seus nomes na superfície lisa da grande árvore no dia em que chegaram como

marco do início de tudo.

-Isso é tão romântico – disse Marah sorrindo – só via nomes gravado em árvores em

filmes.

-Esta é literalmente nossa árvore genealógica – disse Dan enquanto escrevia.

-Será que ela vai ter muitos nomes daqui a alguns anos? Perguntou Marah.

-Terá. Mas se não tiver fico feliz em saber que os nossos já estão aí. Afinal é a coisa

mais romântica que alguém poderia fazer – sorriu Dan – E estou satisfeito que as duas pessoas

que amo estão gravados aí e aqui – apontou Dan para o próprio peito.

Tão belo era aquele momento. Os nomes dos três estavam gravados ali na árvore, mas

também em seus corações.

Page 106: Para Sempre e Mais

O primeiro ano

Dia 12 do Ano Quinze 09:20 / Anno Salutis / Capital Inicial / Nova Terra

Era pouco mais que um primeiro ano com trezentos e sessenta e cinco dias. Dan e

Marah contavam o tempo de forma diferente agora, mas ainda tinham em mãos o antigo

calendário terrestre.

Pouco mais de um ano se passara em Capital Inicial. Set ainda era um bebê, mas tudo ia

bem, e os animais estavam dando grandes indícios de procriação nos lugares onde Dan e Marah

os deixaram. Um mundo novo estava sendo construído.

Embora, as rotinas da antiga terra não existissem mais, Dan e Marah ainda sim tinham

que aprender muita coisa em seu novo planeta.

No local onde estavam, um campo coberto comumente por uma relva amarelada com

uma imensa árvore no meio já havia alguma edificações. Dan construíra um tipo de armazém

para mantimentos desde que passou a cultivar naquele mesmo canto. Haviam outros cultivos em

outras áreas, determinadas pelo clima e tipo de cultivo. A dieta dos dois era basicamente

vegetariana e a base de frutas, já que não haviam animais suficientes para que eles mantivessem

uma dieta de carnes e outras coisas, que eram produzidas industrialmente.

Embora aquele lugar estivesse parecendo uma pequena vila, onde a nave parecia ser o

castelo e fortaleza. Dan e Marah ainda viviam dentro da nave. Era inegável que lá encontravam

o que precisavam de forma rápida. Eles rapidamente perceberam que mesmo tendo passado

muito tempo voando naquele objeto dourado, precisavam dele para muitas coisas, não havia

como simplesmente viver sem o que já tinham.

-Marah – disse Dan chamando a atenção dela que sorria e brincava com o pequeno Set

em um pequeno quiosque perto da nave.

-O que foi meu amor?

-Já faz um tempinho que estamos nesse lugar ainda não vimos à praia duas vezes, o que

acha de irmos visitar o local outra vez. Os grandes tanques de água salgada da nave já estão com

muitos peixes, acho que não precisamos mais ficar cuidando da população deles mais aqui.

-Acho uma ótima ideia, mas fico meia receosa, porque a região onde fomos, é a mesma

região onde está o leão e a leoa. Embora o macho tenha ficado muito debilitado, sabemos que

hoje eles já produziram filhotes e talvez tenha mais leões por lá.

-Bom eu andei verificando, e não há sinal de que eles estejam por lá. Vou verificar, mas

creio que não há mais perigo.

-Bom, dessa forma creio que podemos ir sim.

-Vou preparar a pequena nave com Call. Arrume Set, vamos amanhã.

-Está bem – disse Marah.

...

Dia 17 do Ano Quinze 08:20 / Anno Salutis / Capital Inicial / Nova Terra

Page 107: Para Sempre e Mais

O dia parecia o mesmo, já que a rotação de Nova Terra era lenta. Era como se fosse

manhã por vários dias, o que era bom, pois a distribuição de luz do sol ajudava a atmosfera e o

solo. Dan e Marah estavam com algumas malas sob a sombra projetada pela pequena nave de

transporte, mas que tinha o tamanho de um pequeno prédio de dois andares, pois haviam

tanques de peixes de água salgada, pois Dan descobrira que água dos oceanos era levemente

salgada. Cria ele que os peixes iriam se adaptar facilmente.

-Bom dia meu querido – disse Dan acariciando Set enquanto o bebê dava um sorriso

mesmo com a carinha de sono.

-Bom dia papai – disse Marah entoando a voz.

-Tudo pronto minha querida? Perguntou Dan.

-Tudo sim.

-Vai ser um ótimo dia. Quem sabe encontramos um canto para construir nossa casa de

praia – sorriu Dan.

-Isso é uma ótima ideia. Fixar alguns pontos conhecidos em vários locais. Servirá para

nossos descendentes, embora tenhamos que descobrir onde há perigo ou não.

-Pelo menos na última pesquisa sobre o local estava tudo limpo – disse Dan pegando as

malas.

-Então está ótimo, não é meu amor – disse Marah encostando carinhosamente as pontas

dos dedos nas bochechas de Set.

Call também estava por ali, um pouco diferente, pois um de seus braços, o que tinha

sido arrancado pelo leão era um outro braço mais forte e com algumas funções extras. Um dos

filhotes de Red, Lirocloud, chamado apenas de Cloud por Marah foi junto com eles enquanto o

cachorro ficou em Capital Inicial com Belablul e Lirogreen.

A neve se ergueu pela força dos propulsores a alguns metros do chão para poder seguir

o destino traçado por Dan.

...

A leitura de reconhecimento topográfico que Dan e Marah fizeram desde a última vez

que foram a praia revelou que havia chuvas regulares naquela região também, pois alguns

lugares estavam encharcados e cheios de sulcos.

Na região de Capital Inicial a nave passou pela floresta. Era um lugar cheio de árvores

verdes e densas que se mantinham sobre algumas pequenas planícies. Um vale se estendia com

um rio abaixo que serpenteava o vale até o fim da relva que revelava os morros brancos a por

fim, a praia.

Não demorou muito indo a pelo menos sessenta quilômetros por hora, e a nave

conseguiu alcançar os morros brancos com um céu que estava nublado, mas não mostrava sinais

de chuva. Arvores típicas de litoral preenchiam o local, com uma vegetação rasteira em várias

partes perto da borda da praia. Uma faixa de areia branca se estendia até chegar a um imenso

rochedo que ser erguia ao lado de outras rochas menores. A água do mar era levemente salgada,

e altamente límpida. As ondas quebravam de forma generosa na praia e deixavam o rastro de

molhado nas idas e vindas espumadas.

Dan pousou a nave em um local aberto no meio de altas árvores que mais pareciam

pinheiros inclinados cheios de micro galhos que visualmente pareciam pequenos cabelos que

saiam da folhagem verde. O sol estava leve e ventava de forma regular no local. Era uma praia

Page 108: Para Sempre e Mais

deserta, que logicamente estava recebendo uma de suas primeiras visitas. Aquele local recebeu

um nome a qual Dan e Marah dedicaram ao seu filho. Chamou-se, Praia de Set.

-Este lugar só não mais lindo que Set – disse Marah fitando o horizonte do mar, onde

podia-se ver algumas ilhas cheias de verde que ser erguiam ao longe.

-Vamos chamá-la de Praia de Set – disse Dan – o que acha hein garotão? Uma praia

toda para você – Dan pegou o menino e o segurou encarando-o o que o fez sorrir.

-É um lugar lindo. Poderíamos ter nossa casa de praia aqui – disse Marah.

-Bem lembrado. Nesse momento somos as pessoas mais ricas do mundo, temos um sol

acima de nossas cabeças, uma terra limpinha, um mar azulado perfeito e um verde tão belo

quanto os teus olhos minha querida. O que eu queria a mais nesse momento? Nada, eu só quero

isto.

-Eu também meu amor – disse Marah – agora me dê Set para cá. Vou colocar uma

roupinha nele para ele ter seu primeiro contato com a água da praia.

-Está bem. Enquanto isso, vou preparar os tanques. Hoje temos diversão e trabalho.

Depois fazemos um pequeno almoço.

-Está certo – disse Marah saindo levando Set para trocar de roupa.

Dan começou a preparar os tanques. Eram objetos não compactos que flutuavam e

estavam cheios de uma variedade de peixes médios. Enquanto Marah estava na nave ele levou

os tanques a cinco quilômetros mar adentro em um dirigível auxiliar. O continente visto de

longe pareceu uma faixa de terra com uma enorme pedra que ser erguia. Dan sentiu uma

ansiedade enquanto soltava os peixes, não por estar se desfazendo dos animais, mas porque

Marah estava sozinha lá com Set dentro da nave, mesmo com o androide Call ali por perto.

Em pouco mais de dez minutos ele terminou com facilidade de despejar os peixes e

voltou pra a praia.

...

Marah armou uma tenda, para se proteger um pouco do leve sol da manhã. Estirou um

tapete sobre a areia e pôs Set sentadinho em baixo da tenda sobre o tapete. Call como de

costume fora levar os cachorros para passear. Marah se afastou um pouco da tenda para chamar

Call.

Quando ela se virou novamente Set deu uma risada. Um filhote pequenino de leão se

aproximara dele. O coração de Marah gelou e rapidamente ela pegou Set e o pôs nos braços

quando gritou.

-Call – disse ela gritando.

-O que foi? Perguntou Call enquanto voltava correndo.

-Eu disse para Dan ter cuidado – disse Ela meio apavorada olhando para os lados e indo

em direção ao mar com Set nos braços.

-O registro não viu nada – disse Call.

Marah olhava a barraca onde o pequeno animal estava, tão lindo, mas um cria de outro

animal tão perigoso e que muito provavelmente estava por perto. De uma coisa Marah não tinha

dúvidas, e era de que os animais estavam procriando muito bem.

Page 109: Para Sempre e Mais

A água do mar agora banhava os seus pés enquanto Call acionava uma arma no seu

novo braço, o suficiente para se fazer um estrago. Ele entendia perfeitamente que havia perigo

ali.

De repente uma leoa saiu de um dos arbustos. Olhando atentamente para o seu filhote.

Provavelmente ela deixou escapar um deles já que estava acompanhada de mais alguns.

Marah ficou aflita. Call foi para perto dela com a arma apontada para a leoa enquanto

ela se aproximava da barraca rugindo suavemente em direção ao filhote.

Marah não tinha certeza se os animais estavam famintos, pois Dan deixou altas doses de

ração própria para os animais já que o sistema de relação de caça entre outros animais não

poderia ter o mesmo a princípio.

Ela não percebeu um barulho de motores. Dan havia chegado. E saindo rapidamente do

flutuador ele pulou na água empunhando uma arma. No mesmo instante Marah correu para

perto dele e um leão apareceu dos arbustos.

-Ainda bem que você chegou Dan - disse Marah aflita.

-O que aconteceu?

-Um filhote de leão apareceu e depois aquela leoa ali.

O leão rugiu e chegou perto da leoa e seus filhotes. Dava pra ver visivelmente que uma

de suas patas estava marcada, pelo tiro de energia concentrada disparado por Dan a pouco mais

de um ano atrás na floresta perto do lago. Dan, Marah e Sete estavam a menos de quinze metros

dos animais. O leão encarou os três. Dan ergueu a arma juntamente com Call fazendo um

barulho de acionamento.

A única coisa que o leão fez foi rugir em direção à leoa. A leoa pegou o filhote com a

boca e os três se foram desaparecendo por entre os arbustos

-Está tudo bem – disse Dan abraçando Marah – E você Call lance rastreadores, quero

que esse animal fique apenas em derredor dos lugares onde estamos.

-Tudo bem senhor – respondeu o androide saindo e verificando que não havia mais

perigo.

-Ainda quer ficar aqui? Perguntou Dan

-Não, vamos embora. Você já conseguiu despachar os peixes?

-Sim – respondeu Dan.

...

O tempo foi passando e Dan e Marah conseguiram completar a distribuição de fauna.

Não era a mesma, mas Dan acreditava que tudo iria se ajustar com o tempo.

Set estava ficando crescido e já estava querendo balbuciar algumas palavras como papai

e mamãe. Marah chorou de felicidade quando Dan instituiu o dia das mães embora Marah fosse

a única e nesse dia Set a chamou de mamãe pela primeira vez.

A cada momento, cada acontecimento, cada descoberta, sempre havia uma nova

instituição de datas e nomes de lugares. Isso servia em muito para o registro histórico do início

do novo planeta onde estavam.

Em um dado momento ou outro Dan as vezes tinha um deslumbre sobre como aquele

mundo iria se transformar. Ele e Marah sabiam perfeitamente que todo o compendio de

conhecimento estava com eles e em todos os arquivos da nave e que serviriam para as gerações

futuras, que nunca saberiam como foi o antigo mundo. Não haveria lembranças, pois todas as

Page 110: Para Sempre e Mais

coisas já passaram e todas as outras eram novas. Nunca as gerações futuras iriam saber do que

aconteceu no passado da outra terra. Uma nova história estava sendo escrita agora que se

iniciara por Dan e Marah.

Embora os dois sempre pensassem que tudo poderia ser bom, quando a população

aumentasse eles tinham certeza de que tudo poderia ser como antes de novo com todas as

características, pois o conhecimento do bem e do mal estava no homem. Eles sabiam

perfeitamente que mesmo que instituíssem valores morais e éticos, tudo poderia ser desfeito,

pois sabia muito bem que a natureza do homem sempre seria a mesma a não ser que algo

sobrenatural mudasse isso.

Dan e Marah mesmo estando em um novo planeta junto com seu filho sentiam que

havia algum propósito divino por trás de todas as coisas que estavam acontecendo e de modo

nenhum excluiriam isso na educação de seu filho. Não se tratava de um tipo de deus criado por

mentes humanas, mas o Deus que criara todas as coisas.

...

Page 111: Para Sempre e Mais

Talvez não estejamos sozinhos

Dia 29 do Ano Trinta e Oito 20:20 / Anno Salutis / Capital Inicial / Nova Terra

Um dos grandes mistérios, as marcas nos campos de cultivo que diziam serem sinais de

comunicação entre alienígenas, não existiam no novo planeta de Dan e Marah. Eles já estava há

dois anos e meio em Capital Inicial e nada havia que lhes parecesse de outro mundo, se bem que

a expressão de outro mundo poderia ser aplicada a eles. Mas Marah começou a notar algo todas

as noites que lhe pareceu diferente. Não sabia ela se alguém que também tivesse sobrevivido a

terra, porém a esta altura as chances eram quase impossíveis. O pequeno Set que ainda era

pequeno mesmo, tinha toda a atenção do mundo, até porque no mundo haviam apenas três

pessoas, talvez até a distração de Marah ser interrompida pela pequena luz que cruzava o céu

algumas noites. A princípio não foi estranho, pois o planeta era imenso e nem em uma vida

toda, Marah, Dan e o pequeno Set iriam conhecê-lo. Mas a repetição do fenômeno gerou

expectativa e ansiedade ao coração de Marah.

-Vamos passear meu bebê lindo – disse Marah arrumando Set com uma pequena roupa

– Mamãe vai mostrar o céu estrelado essa noite.

Dan estava na entrada da nave fazendo uns reparos junto com Call. Mesmo com os

animais em alguns lugares distantes e sendo rastreados, muitos poderiam chegar onde Dan,

Marah e Set estavam. Eles já haviam construído algumas edificações de proteção e contenção

em alguns lugares com dispositivos de alarme que foram elaborados por Call. Qualquer animal

classificado por eles como perigoso não chegaria perto deles em um raio de cinquenta

quilômetros.

Marah chegou à entrada da nave com Set carregando uma pequena bolsa de suprimentos

e percebeu Dan com um elmo e uma solda ligada sob as luzes de grandes refletores fora da

nave. Quando ele viu sua esposa e seu filho parou o que estava fazendo.

-Meus amores, vão para algum passeio sem mim? Não pode uma coisa dessas – disse

Dan sorrindo.

-Pode sim papai, já estou bem grandinho – disse Marah mexendo as pequenas mãos de

Set.

-Está bem, mas tenham cuidado – disse Dan colocando o elmo novamente.

A grande árvore estava verde, mas de um verde escuro com tons de verde pálido em

suas folhas grandes. Marah estava levando Set para uma das coisas que sempre quis ter quando

era criança, uma casa da árvore.

Não era uma simples e pequena casinha, mas uma grande casa, pois a árvore era imensa

também.

Dan construíra um elevador e uma escada para que pudessem chegara até o topo onde

estava a Casa da Árvore. Marah ficou meio apreensiva quando subiu, mas não tanto quanto da

primeira e vez. Eram nada mais nada menos que quinhentos metros de subida, o equivalente a

um prédio de cento e quarenta e sete andares. O elevador era confortável e tinha um espelho que

dava para o grande campo. Abaixo podia-se ver a iluminação da nave, mas também em alguns

lugares longínquos do campo pelos grandes refletores instalados por Dan e Call nos últimos

Page 112: Para Sempre e Mais

meses. Mais fantástico ainda, era que os campos estavam sendo cultivados por eles, tendo flores

de algumas cores bonitas por alguns hectares em faixas coloridas que se limitavam já perto das

montanhas escuras.

Demorou alguns poucos minutos até que o elevador chegasse ao topo da árvore.

Não estava ventando muito e o céu estava limpo todo estrelado. Havia uma varanda na

casa e uma vista que Marah nunca tivera na antiga Terra. Havia também uma pista de pouso

para naves em um dos lados. Do alto da árvore podia-se ver até onde as estrelas encontravam o

mar no horizonte. Era um céu tão limpo, sem a grande poluição, sem as fumaças das grandes

cidades, sem as nuvens escuras, sem naves voando para todo lado, sem edifícios, sem satélites,

apenas duas grandes luas que agora estavam minguantes e não muito grandes.

-Olha só meu querido, as estrelinhas piscando lá em cima. Não é lindo meu amor? Coisa

fofa da mamãe.

Marah continuou conversando e explicando coisas para Set em forma de ninar.

No local um espaço grande onde deveriam caber umas cem pessoas haviam umas

pequenas acomodações parecidas com sofás, bolsões moldáveis onde podia se deitar e um

cercadinho para Set.

Marah o pôs nos cercadinho enquanto preparava em uma mesa um pequeno lanche para

Set tomar.

-Agora você vai comer um pouquinho certo seu fofo – disse Marah sorrindo.

O pequeno Set ficou sentadinho brincando com um pequeno carrinho enquanto sua mãe

preparava algo.

O olhar do pequeno garoto que estava voltado para fora foi desviado para uma luz que

passava no céu.

Ele deu uma risada, o que faz com que sua mãe olhasse para ele.

-O que você está vendo hein seu engraçadinho? Marah o pegou nos braços. Nesse

momento ela viu a luz cortando o céu.

No mesmo instante ela correu para dentro da casa e gritou por Dan pelo aparelho de

chamadas.

-Dan socorro – griou ela – tem uma coisa aqui no céu.

-O que foi disse Dan? Pelo aparelho segundos depois.

-Tem alguma coisa aqui no céu e eu não sei o que é.

No mesmo instante Dan correu juntamente com Call para a pequena nave e ela passou

rapidamente por cima de Arca Um e subiu até alcançar os quinhentos metros de altura. Dan

correu em direção a Marah que estava com Set na sala de estar da casa da árvore.

-O que aconteceu? Disse ele entrando apressadamente no local.

-Eu não sei Dan havia uma luza cruzando o céu o tempo inteiro eu não entendi o que

era. Fiquei com medo e gritei, depois corri aqui para dentro.

Page 113: Para Sempre e Mais

-Vou ver o que há lá fora – disse Dan empunhando uma arma de feixes e dois

rastreadores flutuantes – Cal fique aqui.

Dan chegou a varanda. O céu estava limpo como se via lá de baixo. Todas as luzes

instaladas sobre os campos estavam normais. Não havia nada de estranho. Por um breve

momento Dan sentiu uma náusea pela altura. Lembrou ele, que Call construíra aquilo inteiro

quase sozinho. Mas não havia nada lá fora em nenhum lugar. Ele lançou os rastreadores, que

voltaram poucos minutos depois, mas a área estava limpa. O que será que Marah tinha visto?

Era apenas um medo comum de mulheres que normalmente se espantavam com facilidade? Dan

não conhecia esse lado de Marah. Parecia estranho, mas não aconteceu nada e os dois, ela e Set

estavam bem.

Dan lembrou novamente que sempre que Marah estava sozinha algo de ruim tinha

acontecido, mas dessa vez não fora pior que as outras vezes. Talvez ela estivesse se sentindo

estranha por estar em um mundo onde havia apenas três pessoas pensou ela. Será que eles

poderiam ficar malucos com toda aquela situação? Será que definitivamente a civilização iria

acabar com eles ali e não ia florescer novamente?

Dan percebera que eles estavam vivendo tão tranquilamente. Mesmo com alguns sustos

que passaram eles estavam como se estivessem despreocupados. Que sentimento era aquele?

Eles não deveriam estar procriando, tendo mais filhos, para que a raça pudesse continuar? Dan

suspirou e lembrou que passara o dia trabalhando. Estava sentindo a fadiga de muito trabalho.

Não era a mesma coisa que os trabalhos de seu antigo planeta, onde os meios de produção

estavam na mão de uma única pessoa e ela contratava outras para realizar diversos serviços para

produção de bens de consumo. Ele se deu conta que era o dono dos recursos e o contratado e

que não poderia fugir desta situação, mesmo em um novo planeta. Ele poderia fazer seu horário,

mas de alguma forma tinha que trabalhar para suprir as necessidades de sua família. Lembrou

ele que Marah tinha que gastar muito tempo com Set, em cuidados, alimentação e ensino. Se

não fosse Call que tem a força de cem homens, Dan não teria construído tudo que estava diante

de seus olhos.

Ele se lembrou de sempre estar grato. Vendo todas as coisas pelo lado bom, ele viu que

tinha uma família, tinha um lugar para morar, tinha um trabalho a fazer, tinha uma vida para

viver, até quando, ele não poderia dizer, mas tinha que deixar tudo pronto e seguindo o curso

correto quando não estivesse mais ali.

Ele voltou para a sala de estar e Marah estava curiosa e ao mesmo tempo espantada com

o que vira.

-Não vi nada meu amor. Nem os rastreadores conseguiram captar algo. Tem certeza do

que viu querida?

-Tenho Dan – disse ela como se estivesse clamando – era uma luz que percorria o céu

de um lado para o outro.

-Olha. Vamos descer. Creio que você dever estar muito cansada com isto. E eu também

estou aqui exausto. Call amanhã continuaremos nosso serviço.

-Está bem senhor.

-Vamos descer. E você garotão não viu nada hein? Sorriu Dan para Set pegando e

segurando – vamos voltar para casa. Depois passeamos de novo seu grandão.

...

Nos dias seguintes Dan e Call continuaram o trabalho, mas só que atentos ao céu.

Page 114: Para Sempre e Mais

-Call quais são as informações que você tem sobre vida em outros planetas? Disse Dan

retirando o seu elmo.

-Bom senhor. Posso dizer que nunca fizemos contato. Em quase dois séculos de

pesquisa, nunca encontramos sequer um pequeno organismo animal ou humano vivo em outro

lugar.

-Eu acho meio estranho encontrarmos vegetação em um lugar que não há homens ou

animais como este planeta sabe.

-A vegetação daqui é primitiva e não é extremamente complexa, mesmo com as

florestas e grandes árvores. A área mais desenvolvida que temos é o lugar onde moramos depois

que começamos a cultivar. Fora isto a coisa que parece ser mais antiga nesse lugar é a grande

árvore aqui em Capital Inicial.

-E todas aquelas imagens, acontecimentos e gravações que mostravam xenomorfos

humanoides capturados?

-Tudo falso. Nada foi precisamente provado. Os governos apenas encobriam o que eles

mesmos faziam. Se um dia eles precisassem atacar a própria humanidade por motivos

genocidas, eles poderiam alegar que foi algo vindo de fora, por isso sempre introduziram a

ilusão que existia algo fora do planeta – disse Call com sua voz sintetizada – e era tudo bem

feito. Bem feito para enganar.

-Estou pasmo Call – disse Dan fazendo uma careta – definitivamente somos as únicas

criaturas vivas neste lugar.

-Creio que sim. Não podemos dizer com certeza que é um desperdício de espaço. O

homem foi feito para preencher todo o espaço possível, pois ele teria chance de chegar a lugares

mais distantes. Só não chegou a outros lugares por conta da sua própria maldade para com seus

semelhantes, e mesmo assim ele espalharia a sua iniquidade a outros lugares.

-Nenhuma informação real computada meu amigo androide? Perguntou Dan curioso.

-Nenhuma informação senhor Dan. Nenhuma, em todos os meus bits de informação.

-Isso seria uma preocupação desnecessária não é Call?

-Creio que sim senhor. Existem coisas mais importantes para nos dedicarmos neste

lugar.

-Está bem. Embora eu ainda esteja naturalmente curioso sobre o que Marah tenha visto

lá na casa da árvore.

-Creio que logo esse mistério será solucionado.

-Espero que sim.

...

Os dias foram se passando e Marah nunca mais vira as luzes desde aquele dia. Ela não

se deteve em descobrir o que seria, nem mesmo instou Dan a averiguar nos dias seguintes. Com

o passar do tempo ela começou a se dedicar a outras coisas com seu esposo no lugar onde

moravam. Set já estava crescendo e já entendia muita coisa simples para uma criança de sua

idade. Seu desenvolvimento foi rápido o que deixava seus pais surpresos.

A única preocupação que eles tinham era todos os animais que distribuíram sobre a

maior parte da face do novo planeta, mas estes permaneciam em seus devidos lugares já que

Dan dominava sobre todos eles.

Durante todo o tempo em que estavam em Capital Inicial eles aprenderam muitas

coisas. Havia muitas informação da própria antiga Terra e muito mais da nova Terra.

Dan não tinha certeza, mas mesmo com o início de um florescimento humano em um

lugar, ele imaginava até onde eles poderiam chegar, se muito provavelmente alcançariam outros

Page 115: Para Sempre e Mais

planetas. Ele as vezes ficava imaginando sobre como tinham conseguido chegar aquele lugar

com Marah. As vezes um sentimento de remorso vinha em sua mente, pois ele bem sabia que o

processo de passagem que criara já estava pronto antes do fim da antiga Terra. A única coisa

que ele pensou que não poderia evitar, foi a queda do asteroide. Mas e se ele tivesse publicado o

seu projeto? As grandes corporações usariam para propósitos maus? O homem sempre se deteve

neste comportamento, já que quase tudo aquilo que era produzido, servia tanto para o bem

quanto para a destruição do próprio homem. Talvez o fato de os homens nunca terem descoberto

tal coisa, foi a coisa mais útil para o próprio homem.

...

Page 116: Para Sempre e Mais

Lembranças

Dia 17 do Ano Quarenta e Cinco 20:20 / Anno Salutis / Capital Inicial / Nova

Terra

-Estão vendo aquela estrela ali? Perguntou Dan.

-Estamos – responderam Marah e Set.

-É a nossa antiga estrela – respondeu Dan com um brilho nos olhos.

-E como era lá papai? Perguntou Set.

-Bom Set, era um lugar imenso também. Tinha alguns planetas ao redor e em um desses

planetas ficava nossa antiga casa, o primeiro planeta Terra.

-Igual onde moramos?

-Igualzinho – disse Marah.

-E como eram as pessoas de lá papai?

-Bom meu filho, as pessoas eram bem diferentes. Tinham pessoas mais altas, pessoas

mais baixas, pessoas de olhos puxados, pessoas de cabelos enrolados, pessoas de pele escura,

pessoas de pele clara, pessoas de cabelos vermelhos, de olhos castanhos, olhos verdes, como os

seus Set, olhos azuis, olhos escuros e profundos como os meus. Haviam pessoas de todos os

tipos, e haviam bilhões de pessoas.

-Nossa, não sei o que é bilhões papai – disse Set curioso.

-Bilhões é um montão de pessoas assim meu amor – disse Marah estendendo os braços

-E as pessoas eram amigas papai, como você e a mamãe? Perguntou Set.

Dan e Marah entreolharam-se.

-Muitas delas eram, meu filho, outras não, outras não eram amigas umas das outras.

Muitos faziam coisas más para os outros.

-Eles não se gostavam muito como você e a mamãe?

-Não. Às vezes eles brigavam, faziam guerras uns com os outros, o que deixava todo

mundo triste, até eles mesmos.

-Se guerra é ruim papai, eu não quero essa coisa aqui perto da nossa casa.

-Mas é claro meu filho, não quero também, eu farei de tudo para não deixar.

-Os homens eram maus porque papai? Perguntou Set repentinamente.

Dan pensou um pouco e olhou para Marah. Ele percebeu que seu filho seria um

questionador. Não o tipo de pessoa decididamente cética a respeito das coisas, mas alguém

queria buscar a verdade. Mesmo com seus quase quatro anos de idade, cabelos castanhos lisos e

olhos escuros negros profundos, e um rosto angelical. Parecia loucura mas era como se ele não

tivesse herdado nenhuma qualidade, nem de Marah nem de Dan. E Dan sentia como ele seu

filho tivesse sido feito por alguém, como se fosse a invenção mais linda daquele lugar. Dizer

que pessoas nascem com personalidades diferentes poderia ser altamente simplista. O pequeno

garoto era diferente e Dan não parecia entender. Era como se ele fosse de algum tempo no

futuro, e Dan não conseguia conceber se sua personalidade era fruto de um mundo onde só

haviam três pessoas, pois parecia evidente que ele vivia em um mundo onde várias pessoas

existiram.

Por um momento de questionamentos desse tipo, Dan pensou que tudo aquilo não

passava de um sonho longo da qual acordaria, não sabia ele se em algum ponto do passado. Ele

chegou a pensar se realmente conhecia Marah, quando ele fixou o olhar nela naquele momento.

Se fosse um sonho, estava sendo o sonho mais profundo e perfeito. Não fazia sentido aquilo não

ser real. E todas as emoções e sensações, e a nave e o seu casamento? E o próprio Set bem ali na

sua frente? Quem poderia passar tanto tempo assim? Estaria ele em coma profundo criando

Page 117: Para Sempre e Mais

todas essas visões e não sabia. Como ele poderia ter certeza? Diante disso ele só conseguiu dizer

uma coisa boba.

-Me belisque meu filho – disse ele voltando-se pra o seu filho que o encarava curioso.

-Assim - disse Marah – beliscando Dan.

-Ai – murmurou Dan – é isso, mas não precisava arrancar o meu braço Marah.

-Desculpa amor – disse Marah.

-Eles eram maus meu filho – continuou Dan – parecia que era continuamente mal todo o

desígnio do homem. Mesmo que ele buscasse de alguma forma algum tipo de bem, lá no fundo

todos eram maus e queriam apenas fazer os próprios desejos. Os homens gostavam de sacrificar

outros homens e animais por prazer, apenas para celebrar a desgraça alheia. Você pode conceber

que é um traço essencial da natureza humana e da própria experiência dos mesmos vivenciar o

gosto pela maldade, até mesmo para pessoas que poderiam ser consideradas decentes. Mas você

me perguntaria, “Mas até mesmo pessoas decentes?”. Sim! Não se engane, muitos deles se

mantinham como apaixonados espectadores de programas onde a presa esperava apenas ser

engolida, onde os lutadores caiam com o rosto inchado e cheio de sangue, onde o noticiário

registrava a estatística da violência urbana, onde o reality show evidenciava todas as discórdias

dos participantes, onde carniceiros não davam a mínima para qualquer coisa.

A história da conduta humana através dos tempos se dá por meios de guerras,

destruições e dominações de uns homens sobre outros.

-Mas não havia nada que pudesse ser feito papai? Perguntou Set esperançoso.

-Bom meu filho, o homem era mal por conta de uma maldição que o tornava mal por

natureza. Embora ele entendesse o que era o bem e o mal ele sempre queria fazer o mal. Era

preciso alguém que estivesse acima das expectativas humanas para mostrar o caminho, alguém

que soubesse o que era o que chamamos de amor.

-O amor é o que você vê na mamãe?

-E sim Set.

-Mas o que é o amor papai?

-O amor é uma coisa grande. Nós não podemos simplesmente vê-lo, nem tocá-lo, nem

cheirá-lo. Ele pode estar dentro de nós, e ele pode ser expresso por nós. O amor é o que nos faz

cuidar, um com o outro, nos faz nos importamos um com o outro, é o que nos faz nos

sacrificarmos para o outro. E fazemos essas e outras coisas lindas sem condições. Nós não

sentimos o amor como uma coisa que vem e depois desaparece meu filho, o amor está dentro de

uma condição de escolha, isso significa que eu escolho amar alguém, o que deixa bem evidente,

que o amor não pode ser considerado como algo cego, mas inteligente e lúcido. É a forma mais

elevada de se expressar um com o outro, não há nada que seja maior do que isto. Nunca foi e

nunca será apenas um processo químico como muitos diziam. No final as pessoas nunca

perceberam também que o amor não era uma coisa do mundo onde viviam, era algo de outro

mundo, por isso o homem quase nunca entendeu o que era o amor. Era como se fosse uma

cultura estranha a qual não entendiam, nem podiam vivenciar profunda e perfeitamente. Os

homens não amavam de verdade.

De fato aquilo era estranho para Dan. Seu filho parecia entender muito bem sobre

assuntos de gente adulta. Mais estranho ainda era ele ficar explicando sem problemas. Era como

se Set tivesse uma personalidade construída.

-Mas mesmo assim ainda existiam coisas boas meu filho – disse Dan.

-E quais eram papai essas coisas? Perguntou Set muito curioso.

-Bom, uma delas era eu e sua mãe. Nós costumávamos fazer muitas coisas juntos.

Coisas simples. Não precisávamos fazer muito para rir juntos. Eram coisas bobas. Eram coisas

da graça comum que estava sobre nós.

-Nós passeávamos de bicicleta nos jardins meu filho – disse Marah.

-Nós íamos ao planetário olhar as estrelas – disse Dan apontando para o céu noturno.

Page 118: Para Sempre e Mais

-Comemorávamos quando um ano inteiro se passava. Soltávamos fogos e assistíamos ao

show de luzes no mar.

-Nós nos perdíamos em labirintos, não é amor? Perguntou Marah.

-É mesmo, mas nós encontrávamos a saída, não ficávamos perdidos para sempre – disse

Dan.

-Assistíamos filmes em um local chamado cinema e nos divertíamos muito – disse

Marah.

-Vocês tinham um cachorro papai? Perguntou Set.

-Não, não tínhamos meu filho, mas havia muitos deles onde morávamos. E havia muitos

outros animais também, uns grandes e outros pequenos, uns engraçados e outros estranhos.

-Era um planeta grande, mas não tão grande quanto esse nosso.

-E Deus existia lá papai? Perguntou Set inesperadamente.

-Mas – Dan olhou para Set sem entender de onde ele tinha tirado aquela pergunta

embora pudesse respondê-la – porque você pergunta isso meu filho?

-Porque Call o robô, me disse que as pessoas lá acreditavam em Deus, mas não eram

todas e todas as coisas ruins aconteciam porque os homens não acreditavam em Deus e quando

acreditavam era da forma errada e por isso brigavam uns com os outros.

-Bom, não me lembro quando Call disse isso pra você mas, era assim mesmo. Algumas

pessoas não suportavam a ideia de existir alguém que tinha criado todas as coisas meu querido.

Porque se existisse alguém assim que tinha inteligência e vontades, esse mesmo alguém poderia

dizer como os homens deveriam se comportar, e os homens não gostavam disso, porque sempre

queriam fazer o que vinha nos pensamentos deles.

-Mas o que Deus disse que os homens não gostavam?

-Deus disse meu filho – disse Marah olhando nos olhos de Set – que deveríamos amar a

ele e as pessoas. Esta era sua grande ordem. Se os homens fizessem isso, muitas coisas ruins não

teriam acontecido. Mas nem todos queriam saber de Deus meu filho.

-Mas amar não é bom?

-É meu querido, mas os homens não queriam saber de amar como seu papai já disse –

disse Marah passando as mãos nos cabelos de Set.

-Então eu quero amar – disse Set.

-Que é o certo meu amor – disse Marah.

-Esta é a coisa mais linda que você pode fazer.

-Mas eu quero amar a Deus primeiro. Como e que se faz isso papai?

-Set – Dan olho nos olhos de seu filho – Existe um livro que nos ensina isso, e lá

podemos descobrir.

-Pois eu quero – disse Set.

-Está bem, vamos aprender juntos.

...

A vida na nova Terra ainda não tinha se tornado uma rotina. Se acostumar com o clima

que muitas vezes parecia não mudar era uma das coisas. Mesmo assim Dan e Marah estavam

localizados justamente onde a diferença climática era menos brusca. O planeta poderia ser muito

parecido com a antiga Terra em muitos aspectos, porém continha umas condições que

permaneciam sempre as mesmas durante muito.

As estações chuvosas eram regulares em certo período, mas em outros não caia

nenhuma gota. Mesmo com toda água existente ela ainda precisava ser tratada para consumo.

Depois das primeiras colheitas Dan e Call puderam começar uma produção de ração para os

animais. Era um trabalho árduo em que ele, Marah Call e Set visitavam vários lugares para

deixar a comida dos animais, o que era aliviado apenas pelos pequenos robores de distribuição

que Call projetara. Mas como não tinham horários sociais a cumprir eles sentiam que tinham

todo o tempo do mundo. Depois de uma tempo, a pesca se tornou uma opção, junto com a dieta

de vegetais visto que os peixes procriaram rapidamente no mar e nas fazendas aquáticas

próximas a Capital Inicial.

Page 119: Para Sempre e Mais

...

Inevitavelmente Dan não deixou de ter um pensamento sobre outros mundos. Ele sabia

muito bem que existia um planeta chamado Kepler 22b a quase seiscentos anos-luz de onde

estavam. Apesar de a nova Terra ter a capacidade de abrigar vida este outro planeta possuía uma

estrela que era praticamente a mesma coisa que o antigo sol, e este planeta, Kepler 22b estava

dentro da zona habitável.

Parecia loucura, mas Dan se deu conta de que poderia ir a outros lugares. Ele se

lembrou do episódio das luzes que Marah vira, mas não tinha certeza de nada.

Kepler 22b era um planeta grande e poderia ser habitado como este em que eles

estavam. Será que Dan seria um tipo de mito para as pessoas das próximas gerações? Como o

homem que conquistou vários mundos e fundou milhares de cidades? Como o homem que foi o

primeiro de muitos de um tempo que ele mesmo iniciara?

Ele se deu conta da verdade mais lógica que poderia existir. Não importava onde fossem

o homem sempre carregaria consigo a maldição de conhecer o bem e o mal, e que no fim das

contas só se inclinaria para o mal. Ele lembrava perfeitamente, que antes da antiga Terra findar

com o impacto do meteoro, o próprio planeta estava praticamente acabado fisicamente e

moralmente. Não havia como se livrar do terrível destino. O homem em qualquer lugar do

universo se revelaria um ser destruidor, sempre movido pelas mesmas tentações, pela mesma

soberba, pelos mesmos vícios, pela mesma ganância, pelos mesmos ódios e ele não poderia se

salvar dele mesmo. Toda humanidade seria corrompida se não houvesse uma redenção de

alguém muito maior do que o próprio homem.

Dan parecia neste momento entender perfeitamente que nem todo o universo poderia

satisfazer a ânsia, a procura, o vazio existente em sua alma. Tinha que ser algo muito maior. Ele

lembrou de todas as coisas que seu filho perguntara, e definitivamente aquilo parecia-o

convencer de que era o que precisava. Devia haver um sentido, que tivesse haver com algo

eterno e imutável. Parecia estranho, mas será que era ali que ele encontraria a resposta

fundamental para a vida? Será que era nos confins do cosmos que encontraria a resposta? Não

faria sentido tudo aquilo acontecer e não ter um propósito para a vida dele e de Marah. Não era

um simples acontecimento, era a coisa mais intensa e profunda de suas vidas. Tinha que haver

um motivo maior por detrás de tudo. Deveria haver alguma razão. Se não houvesse razão ou

escolha maior que todas as coisas, eles nunca teriam chegado até ali e nem haveria motivo para

continuar. E o próximo passo seria descobrir isso, pois sua alma ansiava por isso.

...

-Dan vem aqui – disse Marah surpresa.

-O que foi meu amor – disse ele vindo ao seu encontro de onde estava na porta de

entrada da nave.

-O que é isso? Perguntou ela apontando para a árvore grande.

-É uma cruz – disse Dan.

-Você quem fez?

-Sim.

-E o que significa?

-Significa que somos pessoas feitas de dois tipos de relações. Uma horizontal, entre nós

e uma vertical, entre nós e aquele que criou todas as coisas. E tudo depende do vertical.

-Quando vejo uma cruz, me lembro de um personagem fundamental na história.

-Este personagem eu creio, sempre foi o ponto fundamental de todas as coisas. É isso

que quero dizer, e é isso que talvez Ele quisesse nos dizer desde o começo.

...

Page 120: Para Sempre e Mais

O sonho

Dia 7 do Ano Setenta 07:07 / Anno Salutis / Capital Inicial / Nova Terra

Dan e Marah tinham transformado o campo de folhagens amarelas de Capital Inicial em

um lugar colorido com flores verde turquesa, azul-cobalto, vermelho, lilás claro e branco.

O cenário ficou maravilhoso. Dan fixou um limite até onde as flores cresciam. Aquele

era o Grande Jardim de Marah, e foi como Dan o chamou. Os dois passavam uma boa parte do

tempo cultivando as flores e estudando elas. Set observava tudo o que seus pais descobriam e

ensinavam para ele. Call era o melhor cultivador, sabia perfeitamente as técnicas e os períodos

das flores. Um pouco distante Dan construiu também um lugar especial próprio para apicultura,

o que ajudou em muito já que as abelhas ajudavam na polinização da das flores e produziam

uma ótima quantidade de mel.

Dan, Marah, Set e Call estavam no caminho dos campos caminhando, comendo mel e

colhendo flores ao entardecer. O brilho do sol dava tons incomuns aos campos de flores do

local. Algumas borboletas já podiam ser vistas o que era muito bom, pois muitas ainda estavam

em cativeiro dentro da nave. Dan e Marah lembraram de soltá-las no tempo certo. Muitas

conseguiram se reproduzir bem e eram os últimos seres presos dentro da nave que foram

libertos no novo planeta na região de Capital Inicial.

-Olha mamãe as borboletas – disse Set exultante.

-É mesmo meu querido, elas são muito lindas e ajudam bastante a cuidarmos dessas

florezinhas coloridas – disse Marah.

-Eu posso pegar uma delas mamãe?

-Por enquanto não meu filho, ainda são poucas que existem. É preciso que elas se

tornem milhares – disse Dan.

-Ah, acho que vou ter que esperar – disse Set desconsolado.

-Mas olhe só – disse Dan pegando algo um favo de mel em uma cesta – você pode

aproveitar esse mel enquanto não tem suas borboletas rapaz.

-Nossa, então está bem – disse Set.

-Esse é o melhor mel silvestre que já comi – disse Marah lambendo a colher

-Eu gosto muito com um pedaço de pão – disse Dan.

-Pão é bom papai – disse Set.

-Mas é claro meu filho. Só temos que trabalhar um pouquinho para conseguir nosso pão.

-Quando eu tiver grande eu quero ser como o senhor papai, e fazer muitas coisas.

-Bom, você pode fazer muitas coisas, mas sempre vai ter uma coisa mais especial que

gosta de fazer Set.

-Eu não sei uma coisa especial que eu goste mamãe – disse Set fazendo beiço e

erguendo as sobrancelhas.

-Mas você pode descobrir meu amor – disse Marah.

-Por exemplo. Eu gosto de uma coisa que chamamos de física. É uma coisa muito boa.

Com ela nós podemos aprender muitas coisas sobre a natureza, e como as coisas acontecem no

lugar onde vivemos. Aprendemos a entender como as coisinhas mais minúsculas funcionam e

até mesmo as maiores por muitas leis e regras que existem na natureza.

-E quem criou todas essas coisas da natureza papai? Foi a física?

Dan olhou para Marah e sorriu.

-Não Set. A física apenas compreende essas coisas. E quem criou todas as leis e tudo

que conhecemos foi um ser grandessíssimo.

-E onde ele está papai?

Page 121: Para Sempre e Mais

-Não podemos vê-lo Set, mas Ele está em todo lugar. É Ele quem sustenta as coisas,

todas elas. Sem Ele nada existiria nem subsistiria.

-Nossa, mas Ele deve saber de muita coisa não é?

-Sabe sim, e Ele sempre tem alguma coisa para nos ensinar.

-Ele é bom papai?

-É sim meu filho, infinitamente bom.

-Foi ele quem fez estas florezinhas?

-Foi sim e deu cores a todas elas meu querido – disse Marah.

-As flores tem um cheiro bom igual o seu mamãe – disse Set dando uma flor para

Marah.

-Obrigado meu querido, que coisa mais fofa. Você também é lindo e tem um perfume

como estas flores. Você é como um sonho meu filho.

-O que é um sonho?

-Sonho é uma coisa boa meu querido, mas só acontece quando estamos dormindo.

-Eu posso ter sonhos?

-Pode sim meu filho – disse Marah.

-E o sonho acaba quando eu acordar mamãe?

-Acaba, mas muitas vezes nos lembramos de muitas coisas dos sonhos. Coisas boas,

outras não tão boas, mas muito provavelmente aprendemos alguma coisa.

-Esta noite eu quero sonhar como vocês – disse Set encarando Dan e Marah.

-E esta noite sonharemos como você meu amor - disse Marah abaixando-se e dando um

beijo na testa de Set.

-Vamos sonhar como você meu filho – disse Dan dando um sorriso.

Nesse instante os três ouviram um estrondo no céu. Marah se levantou e colocou Set nos

braços. Os três viram vários meteoritos caindo e vindo em direção onde eles estavam.

-Corram para o carro – gritou Dan.

-Meu Deus o que é isso? Perguntou Marah desesperada.

-Uma chuva de meteoros – disse Call.

-Vamos. Temos que chegar até a nave – disse Dan.

Os três correram até um pequeno carro de baixo rasante. Muitos meteoritos estavam

cruzando o céu. Era uma chuva de meteoros. Começaram colidindo os topos das montanhas

despedaçando tudo. Call ligou o carro e o três seguiram a toda velocidade em direção a nave que

estava a um quilometro de distância. Atrás deles vários objetos flamejantes colidiam com o solo

agora queimando e devastando todas as flores.

O local começou a ficar semelhante a uma zona de guerra onde vários mísseis atingem o

local. Um explosão maior perto das montanhas jogou milhares de rochas em direção ao céu.

Nesse momento Call já não respeitava a trilha por onde tinham vindo e saiu cortando

caminho pulverizando as flores com o jato do carro flutuador rasante. Mais e mais meteoros

caiam e colidiam no campo atrás deles e incrivelmente a sua frente estava a nave e a grande

árvore que mostravam uma visão limpa.

Dan abraçava Marah que abraçava Set e cobria seus olhos sem entender o que estava

acontecendo. O carro deu um solavanco mas conseguiu chegar deixando um rastro atrás de si.

Dan, Marah, Set e Call desceram rapidamente do carro. A porta da nave abriu-se

automaticamente ao comando de Dan que gritou para que Marah e Set entrassem.

-Mas e você Dan? Perguntou Marah.

Quando eles olharam para cima, viram um meteorito atingir a grande árvore bem no

topo destruindo a casa da árvore.

-Corram! Gritou Dan.

Page 122: Para Sempre e Mais

Antes que os destroços atingissem o chão eles estavam em baixo da entrada da nave.

Correram para dentro de Dan só conseguia imaginar uma coisa. Seus temores foram

confirmados quando ele solicitou exibição nas telas dos corredores.

-Exibir relatório Arca Um.

A nave com sua voz sintetizada começou a exibir todas a informações e trajetórias dos

meteoritos.

Ele ficou aterrorizado quando a nave disse que um asteroide gigantesco estava pronto

para colidir com a nova Terra em poucos minutos. Os pequenos meteoritos eram apenas uma

preparação para algo maior.

-Eu não acredito que vamos ver isso acontecendo de novo – disse Marah chorando.

-Mamãe estou com medo - disse Set.

-Vai ficar tudo bem. Vamos sair daqui, se não vamos todos morrer – disse Dan

perplexo.

Um estrondo lá fora, balançou a nave e fez um rugido imenso que ecoou pelo casco. Os

impactos pareciam estar chegando mais perto e os quatro correram para a sala da cabine do

piloto.

-Temos que ir para a sala dos criotubos. Eu pilotarei a nave senhor – disse Call.

Dan estava tão atordoado que apenas agarrou Marah e Set e juntos correram para a sala

dos criotubos.

Rapidamente eles colocaram seu filho e o beijaram chorando dentro do criotubo.

-Vai ficar tudo bem meu filho – disse Marah chorando – você vai ter um ótimo sonho

agora está bem?

-Está bem mamãe – disse ele meigamente. Depois fechou os seus olhinhos quando o gás

de sonolência tomou conta do recipiente.

Dan terminou a rotina e fechou a câmara. Pegou Marah pelos braços e correu até o outro

modulo criogênico.

-Não vamos conseguir, não vamos – disse Marah.

-Não se desespere meu amor. Já saímos desse uma vez e vamos sair de novo. O porque

está acontecendo eu não sei – disse Dan.

Call acionou os reatores da nave e se comunicou com ele.

-Senhor, um minuto para a partida. E menos de dois minutos para o impacto. Temos que

ir logo.

-Está bem – gritou Dan – estamos indo. Rápido meu amor, entre.

Marah deitou-se rapidamente na câmara e deu um beijo em Dan.

-Eu te amo. Sempre te amei, desde o começo e continuarei te amando – disse ela.

-Eu também meu amor – disse Dan.

A porta do criotubo fechou na frente dele. Marah ficou olhando para ele quando as

rotinas de êxtase finalizavam. Ela o encarou até fechar seus olhos quando o gás de sonolência

foi ejetado dentro do local.

Page 123: Para Sempre e Mais

Dan correu rapidamente para o seu criotubo. Os motores nucleares rangeram alto ao

mesmo tempo em que outro impacto lá fora acontecia. Ele se deitou e viu que faltava menos de

um minuto para o impacto final. A porta não conseguiu travar e ele entrou em desespero. Mas o

pior foi quando Call disse que os motores não se acionavam para levantar voo. Mas o que tinha

acontecido? Os motores não tinham ligado a alguns segundos?

Dan empurrou a porta do criotubo com o braço e correu para a sala de pilotagem.

Faltavam apenas vinte segundos quando ele entrou e viu Call teclando freneticamente na tela de

vidro tentando acionar os motores. A única coisa que ele fez foi se aproximar da tela da frente

da nave. Um gumo de fogo subiu no céu depois de um barulho terrível e hediondo.

Nesse momento os motores funcionaram, mas ainda levaria alguns minutos para a nave

conseguir alcançar o céu. Dan sentou-se na cadeira do piloto e acionou os propulsores a todo

poder.

A nave se ergueu e voou. Infelizmente uma onda de choque que queimava os céus vinha

em direção a nave. Nesse momento Dan se virou para Call que olhou para ele e disse uma única

coisa.

-Acabou. Hora de acordar.

Dan fez uma careta e virou para frente. Um brilho intenso atravessou os seus olhos. Ele

não sabia se era assim que as pessoas se sentiam quando morriam, mas tudo ficou escuro depois.

...

Page 124: Para Sempre e Mais

Para sempre e mais

Luzes. Parecia haver luzes para todos os lados. Aquilo não podia ser um paraíso, pois

seus olhos pareciam doer. Ele piscou várias vezes antes de se dar conta de que havia alguém

bem ao seu lado deitada em uma poltrona com o que parecia ser eletrodos ligados. A visão

estava embaçada, mas era uma pessoa que estava ali. Uma mulher.

Ele piscou os olhos novamente contra aquelas luzes fortes e esticou a mão para passar

nos olhos. O que era aquilo? Eletrodos em seus braços e cabeça? Ele se deu conta que sentia seu

corpo muito bem. O que aconteceu?

Alguém se colocou ao seu lado e disse algo.

-Acorde Adan. Essa sensação vai passar logo – disse Lian.

Dan respirou fundo, e só depois de algum momento percebeu que estava deitado em

uma poltrona e que quem estava do seu lado era Marah. Seus pensamentos estavam confusos e a

única coisa que conseguiu balbuciar em estado de choque foi uma pergunta.

-O que aconteceu?

Logo em seguida ele apagou.

Lian levou os dois ainda inconscientes para uma sala de recuperação enquanto Ress

vinha ao seu encontro.

-Eles estão bem Lian? Perguntou Ress.

-Eles vão ficar bem sim. Só precisam relaxar um pouco antes de acordar

definitivamente. Eles ficaram apenas um dia em atividade neural intensa, mas sonharam alguns

anos.

-E isso não pode ser um choque para eles? Quando acordarem vão descobrir que nada

aconteceu, pois que eu bem sei o roteiro dessa aula continha o fim do mundo e um filho –

indagou Ress.

-Vamos administrar um coquetel pós atividade ele eles vão se sentir bem. Só vou

realmente ter que explicar tudo o que aconteceu.

-Faça isso. Não quero pessoas saindo malucas aqui deste local. A promoção era para

promover o observatório e não criar problemas.

-Tudo bem Ress, manterei tudo sob controle e todos voltarão bem para suas casas –

disse Lian firmemente.

-Tudo bem. Notifique-me. Até mais – disse Ress saindo.

...

Dan e Marah estava deitados em um dos quartos médicos de Residencia em Paranal.

Ainda estava branco lá fora com neve cobrindo o solo. Todos os outros participantes da

promoção estavam descansando agora e talvez nem lembrassem que Dan e Marah estivessem

ainda na aula de interação neural. O sol passava por entre as cortinas e iluminavam o quarto

onde havia uma enfermeira fazendo as verificações de rotina nos dois.

Marah abriu os olhos pela primeira vez sentindo a luz do sol e percebeu que estava em

um quarto. Ela olhou para o lado e viu Dan deitado dormindo, e estranhamente havia uma moça

ali em pé de costas, o que fez com que ela se levantasse rapidamente e ficasse sentada na cama

em que estava. Ele viu que tinha uma sonda intravenosa injetada em seu braço foi quando ela

ouviu a voz de uma pessoa que não conhecia.

-Bom dia querida. O médico Emanuell Josueh virá aqui para conversar com vocês –

disse a enfermeira.

Page 125: Para Sempre e Mais

-O que é isso? Onde é que eu estou? Perguntou Marah confusa.

-Você está em Residencia no observatório de Paranal no Chile.

-Onde está Dan, Call e Set?

-Olha – disse a enfermeira se aproximando – tente relaxar um pouco está bem, essa

sensação vai passar logo. Você está um pouco desorientada, porque esteve em interação neural

inserida durante algumas horas.

-O quê? Nós estávamos em Capital Inicial quando os meteoros caíram novamente e Dan

nos colocou na nave e – Marah foi interrompida.

-Olha, deite-se de novo. Você estava dormindo e sonhou todas as coisas que

provavelmente lembra agora.

-Mas o que é isso? Não era real? – uma lágrima escorreu pelo rosto de Marah – não

aconteceu nada?

-Vai ficar tudo bem senhorita Marah. Fique calma por favor.

Marah sentiu uma leve sonolência novamente e se deitou encarando os raios de sol que

passavam pela janela que estava fechada, pois estava uns sete graus lá fora.

...

O médico Emanuell Josueh entrou na sala junto com Lian e Ress observando os dois.

Marah percebeu que eles estavam lá, mas não fez caso. Dan abriu os olhos novamente e se pôs

sentado.

-Bom dia garotos, sei que devem estar meio confusos, mas não se preocupem - disse o

médico com uma CP espelho na mão – vocês vão ficar desorientados um pouco porque a mente

de vocês viveu alguns anos, mas o corpo só viveu algumas horas. Não sei se vocês se lembram,

mas ganharam a promoção de uma aula neural promovida por pessoas profissionais aqui de

Paranal. Na realidade isso servia basicamente como um experimento para os astrônomos e

astrofísicos aqui do lugar, e Lian achou que isso seria uma boa ideia para a visita.

-O que o doutor quer dizer – disse Lian se aproximando com o micro tradutor na altura

da boca – é que vocês estiveram dormindo por algumas horas, mas a mente de vocês viveu

alguns anos fazendo uma viagem que eu mesmo elaborei com todos os detalhes.

-Não acredito nisso – disse Dan.

-Bom. Isto que está acontecendo agora é real – disse o médico.

Marah ainda estava deitada olhando fixamente para um lugar.

-Quer dizer então que nada aconteceu? Vocês sabem quanto tempo ficamos lá? Nós

ficamos vários anos. Isso é loucura – disse Dan insatisfeito.

-Você vai se sentir normal em alguns dias, sua mente ainda não se acostumou com a

volta a realidade.

-Que realidade? Disse Marah – Vocês fizeram isso e parecia tudo tão real. Nós sofremos

tantas coisas, quase, sei lá, morremos várias vezes, e eu ainda tive um filho, apenas em um

sonho neuro induzido por vocês. Eu não acredito nisso – disse ela encarando Lian e Emanuell –

vocês são loucos.

-Se soubéssemos, nunca teríamos participado – disse Dan.

-Olha, acalmem-se isso acontece, porque é a primeira vez que vocês passam por essa

experiência – Lian foi interrompido.

-Experiência? Então somos cobaias de testes para essas coisas quem nem sabemos o que

é? Definitivamente não gostei do que fizeram e eu quero ir embora daqui o mais rápido possível

– disse Marah virando-se novamente para o outro lado.

-Por favor, nos levem para casa. Estamos cansados. Acabou nossa diversão – disse Dan.

-Bom, vocês irão para casa sim. Só sigam as instruções de repouso para o próprio bem

de vocês, e assim podem partir. Obrigado – disse o médico saindo.

Page 126: Para Sempre e Mais

-Vou pedir para alguém preparar tudo – disse Lian – Nos desculpem, nunca foi minha

intenção afetá-los desse jeito, apenas tentar ensinar algo. Espero que tenham aprendido alguma

coisa válida pelo menos. Perdoem-nos, por favor – Lian olhou para um canto sentindo o próprio

erro.

-Está bem. Só queremos ir só isso – disse Dan.

...

Dan e Marah estavam péssimos. Seus rostos demonstravam claramente que estavam

mentalmente cansados e abatidos. Impor para a mente coisas inexistentes pode ser perigoso,

embora muitos elementos fossem reais e existentes no mundo real.

Dan se lembrou das últimas palavras de Lian na sala médica sobre ter aprendido

algumas coisa era inegável que tinham aprendido muitas coisas e todas as lembranças estavam

tão vívidas quanto o que seus olhos viam agora. Um mundo ainda estava ali inteirinho, com

todas as pessoas. Embora se pudesse especular que isso acontecesse, o fim iria ser de outras

formas. A única coisa que pareciam não ter completado no sonho foi o fim da busca pela reposta

final. Dan sabia exatamente do que se tratava e ficou pensando sobre isso o tempo inteiro. Ele

encontrou Marah em um dos corredores de Residencia antes de irem embora. Ela estava

cabisbaixa, mas consciente das coisas. Ele parou em frente a ela, e a encarou com serenidade ao

passo que ela também fez a mesma coisa. Os dois não resistiram e choraram. Ninguém os

incomodou. Era um momento só deles.

-Ainda estamos vivos pelo menos – disse Dan baixinho nos ouvidos de Marah.

-Não sei o que estou sentindo – disse Marah.

-Eu sempre estive dizendo isso enquanto estávamos no nosso sonho e digo mais uma

vez para você, que eu estou aqui para cuidar da gente.

-Tá bom.

-A gente vai voltar para casa agora, mas nunca mais seremos os mesmos – disse Dan.

-Acho que muita coisa vai mudar não é? perguntou Marah com voz chorosa.

-Muitas coisas sim. Nem eu nem você estávamos preparados para isso, mas estive

pensando que nem tudo pode ser considerado tão ruim, acho que podemos pensar sobre o que

aprendemos.

-Não vamos esquecer isso facilmente. Ainda lembro perfeitamente do rostinho dele.

-Sabe, não acho que isso não possa acontecer Marah. Quero que saiba que eu te amo de

verdade agora e te quero bem de uma forma que não posso descrever agora.

-Eu também, não posso esconder que o que sinto é real agora e não posso e nem quero

mudar isso. Será que vamos ficar juntos mesmo?

-Vamos, ainda temos um mundo inteiro pela frente. Agora tenho certeza mais do que

nunca que há uma história para nós dois – disse Dan.

-Vamos?

-Vamos.

Dan se aproximou de Lian, que esperava junto com Ress.

-Não considero completamente bom o que houve, mas também não considero

completamente ruim – disse Dan.

-Sabe Adan, creio que você e Marah descobrirão alguma coisa realmente útil. Não

considero que as coisas aconteçam por acaso, nem o que viveram coisas das quais não possam

tirar lições. Vocês foram escolhidos e sempre levarão isso consigo.

-Espero grandemente que consigamos nos repor bem de tudo isso, e concordo com o

que diz. Enquanto estávamos lá descobrimos muitas coisas e nos últimos momentos começamos

a refletir sobre o verdadeiro motivo de todas as coisas. Algo que está além do que os olhos

podem ver. Não se trata de algo místico, mas algo real, o sentido para todas as coisas existirem.

-Sabe creio que o mundo um dia passará, mas existem coisas eternas que nunca

passarão, e propositadamente eu inseri isso na indução.

Page 127: Para Sempre e Mais

-Então você acredita em Deus Lian?

-Eu creio nele – respondeu Lian.

-Admito para você que não foi inútil, e o que você pretendia de alguma forma foi feito e

sei que encontraremos nossa resposta quando chegarmos em nossas casas. O mundo já não crê,

mas este foi nosso passo para que pudéssemos fazer isso.

-Vocês foram escolhidos para a promoção, e espero que tenham sido escolhidos antes da

fundação do mundo.

-Espero que sim. E essa seria uma maneira de se viver para sempre? Perguntou Dan.

-É a única maneira de se viver para sempre. Para sempre e mais. Pode crer que sim.

-Está bem. Temos que ir. Obrigado – disse Dan estendendo a mão.

-Eu que agradeço

-Até mais

-Até – disse Lian com um sorriso.

...

Dan e Marah arrumaram as malas. Dessa vez, não viajaram junto com o pessoal da

promoção que saíram do local apenas no dia seguinte, satisfeitos com toda a semana.

Marah foi a maior parte do tempo calada na viagem de volta. Dan não quis fazer

perguntas, pois ela precisava de descanso pelo que aconteceu. Casar e ter um filho na

imaginação como se fosse real e descobrir que não aconteceu foi um choque.

Ele foi a maior parte do tempo pensando em todas as coisas. E se realmente tivesse

acontecido? Eles estariam mortos agora e nenhum humano jamais teria existido novamente. Não

faria sentido tudo acabar dessa maneira, da mesma forma que não haveria sentido tudo existir

sem um propósito. Dan estava chegando no limiar de admitir o que era, mas naturalmente

parecia relutar.

Se eles estavam vivos e se a morte não era o fim deveria haver uma segunda vida mais

elevada, doutro modo que deveria haver uma segunda e profunda morte. Pois se depois dessa

vida não houvesse mais morte, depois da morte não poderia haver mais vida. E eles tinham que

encontrar a vida ou o que criara a vida, pois vida apenas cria vida.

Ele estava longe de concluir que era tudo o que tinha aprendido com o mundo ou com

as pessoas, pois mundo estava perdido. Todo tipo de ideologia e penas exaltava o homem e seus

desejos pérfidos, homicidas, impuros, levianos, corruptos, irracionais, perversos e podres.

Eles estavam de volta a um mundo onde a moral não significava mais nada, embora isto

não tenha sido relatado aqui em detalhes.

Eles desceram a rampa de acesso ao saguão de chegada do aeroporto. Os pais de Marah

estavam lá. Ela se saiu muito bem em não demonstrar.

-Então aproveitaram? Perguntou o Sr. Vital.

-Sim, foi um experiência que nos trouxe grandes emoções – disse Marah com um

sorriso.

-Minha filha, eu já estava com saudades – disse a mãe de Marah dando um abraço nela.

-E você Dan, aproveitou também, é claro.

-Sim Sr. Vital, aprendemos muitas coisas e trouxemos algumas recordações conosco.

-E qual foi a lição principal?

-Há uma vida para se viver, digo não essa vida, mas outra nova vida – disse Dan.

-Muito abstrato pra mim isso – disse o Sr. Vital sorrindo – mas creio que foi

significativo para os dois. Então, estão cansados não é? Vamos para casa, depois olhamos tudo o

que trouxeram.

-Vamos lá – disse a mãe de Marah.

-Vamos mãe, não vejo a hora de chegar em casa também.

...

Page 128: Para Sempre e Mais

Dan chegou bem em casa. Sua família o recebeu bem e o deixou descansar até o dia

seguinte. Quando ele acordou se deu conta que estava mesmo em casa. Parecia estranho, mas

era inegável que ele queria estar lá, mas nada melhor do que ter sua família toda ali na sua frente

e saber que tudo não tinha se perdido simplesmente.

Dois dias depois ele e Marah foram para um passeio na primeira praia da capital em

Angra para conversar. Ela estava bem melhor e ficou feliz em vê-lo. Não estava muito

movimentado na avenida a beira mar, que tinha prédios grandiosos. Era fim de tarde e o céu

estava laranja.

-Só quero ter certeza sobre nós dois – disse Marah com um sorriso enquanto caminhava

ao lado de Dan, descalços e segurando um CP espelho.

-Estamos juntos desde o começo. Meu sentimento por você não muda Marah – disse

Dan pegando na mão dela.

-Nem o meu – disse Marah.

-Sabe, já disse que acho lindo te ver assim descalça na areia da praia?

-Não – disse Marah sorrindo.

-Nem quando fomos casados nos sonhos? Riu Dan.

-Nem mesmo – disse Marah.

-Nossa, como eu fui desatencioso.

-Mas por mim está ótimo agora – disse Marah.

-Eu preciso falar com o teu pai.

-Ele te acha um ótimo rapaz – Disse Marah.

-Ainda bem, pensei que fosse o contrário.

Dan olhou para o lado e encarou o sol do fim de tarde.

-O que foi? Perguntou Marah.

-Está vendo aquele local ali – disse ele se virando para um dos prédios.

-Estou. Parece uma igreja protestante, só que de surfistas. Estou certa?

-Quer ir comigo lá no domingo?

-Quero, e o que tem lá? Não é aquela igreja do seu amigo surfista lá da faculdade?

-É e lá tem uma coisa que nunca acaba.

-Nossa e o que é essa coisa que nunca acaba? Perguntou Marah curiosa.

-O amor. Não qualquer amor, mas o amor de Deus

-Nossa – sorriu Marah.

-E sabe por que podemos nos amar?

-Por quê?

-Porque ele nos amou primeiro, e isso é incrível. Vem comigo nessa? Prometo que vai

ser ótimo.

-Vou sim, e quanto dura esse ótimo?

-Para sempre.

-Então vamos – sorriu Marah.

-Não só para sempre, mas pode ter certeza que tem muito mais coisa, aí será para

sempre e mais.

Dan e Marah se foram ao pôr do sol, com uma esperança, não uma esperança em algo

que sonharam, mas uma esperança em algo que sempre existiu, e que era muito mais lindo do

que qualquer coisa, que tinham vivido ou sonhado em suas vidas.