os traços da minha negritude: memórias e reflexões de um negro de pele branca
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Os traços da minha
negritude
Memórias e reflexões de um negro de pele branca
Jonathan Reginnie de Sena Lima
2012
Contatos: [email protected]
“Elevador é quase um temploExemplo pra minar teu sono
Sai desse compromissoNão vai no de serviço
Se o social tem dono, não vai...
Quem cede a vez não quer vitóriaSomos herança da memória
Temos a cor da noiteFilhos de todo açoite
Fato real de nossa história
Se o preto de alma branca pra vocêÉ o exemplo da dignidade
Não nos ajuda, só nos faz sofrerNem resgata nossa identidade
Se o preto de alma branca pra vocêÉ o exemplo da dignidade
Não nos ajuda, só nos faz sofrerNem resgata nossa identidade
Elevador é quase um temploExemplo pra minar teu sono
Sai desse compromissoNão vai no de serviço
Se o social tem dono, não vai...
Quem cede a vez não quer vitóriaSomos herança da memória
Temos a cor da noiteFilhos de todo açoite
Fato real de nossa história
Se o preto de alma branca pra vocêÉ o exemplo da dignidade
Não nos ajuda, só nos faz sofrerNem resgata nossa identidade
Elevador é quase um temploExemplo pra minar teu sono
Sai desse compromissoNão vai no de serviço
Se o social tem dono, não vai...
Quem cede a vez não quer vitóriaSomos herança da memória
Temos a cor da noiteFilhos de todo açoite
Fato real de nossa história”
Contatos: [email protected]
Contatos: [email protected]
SumárioResumo...............................................................................................................................................1
Introdução.........................................................................................................................................1
Palavras-chave.................................................................................................................................2
Considerações iniciais...................................................................................................................2
O paradoxo aparente de um negro envolto em pele branca...........................................3
Preto versus negro.....................................................................................................................6
Dos critérios de analise do pertencimento etnicorracial.................................................7
Autodenominação dos povos ou análise endógena.........................................................8
Heterodenominação ou análise exógena............................................................................8
Algumas considerações sobre os critérios de pertencimento................................8
Alguns desafios à implantação da heterodenominação ou análise exógena.........9
A Constituição Federal 1988 e as normas infraconstitucionais no sentido de promover igualdade e respeito à cultura negra................................................................10
Constituição Federal de 1988..............................................................................................10
Legislação infraconstitucional.............................................................................................11
Lei 10.639/10 – Educação Afro-brasileira....................................................................11
Lei 11.645/10 - Obrigatoriedade da temática de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena............................................................................................................12
Lei 12.288/10 – Estatuto da Igualdade Racial............................................................12
O Código Penal e os crimes de racismo e injúria qualificada..............................13
A identidade negra: construções, abstrações e supressões..........................................14
A filosofia de vida voltada ao controle de malefícios sociais e ao estímulo à solidariedade..................................................................................................................................17
Brasil – África: similitudes e particularidades...................................................................19
O homem e o meio-ambiente: uma relação dialógica de pertencimento, respeito na dialética social e religiosa tradicional.............................................................................21
Os orixás e seus domínios naturais: o sincretismo da religião com os movimentos migratórios e modelos de exploração ambiental.................................23
O número 7..............................................................................................................................25
Contatos: [email protected]
Conclusão.........................................................................................................................................26
Referências......................................................................................................................................26
Textos sugeridos........................................................................................................................26
Vídeos sugeridos.......................................................................................................................28
Anexos...............................................................................................................................................30
Textos...........................................................................................................................................30
Espectros................................................................................................................................30
Resgate afro-brasileiro...................................................................................................31
Assim nasceu o Candomblé.........................................................................................32
Coisa de Pele........................................................................................................................33
Imagens.......................................................................................................................................34
Contatos: [email protected]
Os traços da minha negritude: memórias e reflexões de um negro de pele branca
Jonathan Reginnie de Sena
Lima1
Resumo
Este artigo busca analisar as
relações etnicorraciais, dentro
de um prisma sociológico,
antropológico, político e
jurídico perpassando por
discussões teóricas acerca das
situações de preconceito,
racismo e intolerância que vem
se introduzindo de maneira
cada vez mais forte e sutil,
silenciosa em nossa sociedade,
buscando, ao término desta
releitura iniciar o processo de
resgate e restauração das
1 Acadêmico nas graduações de Licenciatura Plena em Pedagogia pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e Bacharelado em Direito pela Faculdade Metropolitana da Grande Recife (FMGR).
relações com a ancestralidade
negra a partir de uma
perspectiva que busca
observar as similitudes e as
particularidades que
entrelaçam o continente e os
povos africanos e os povos do
Brasil.
Introdução
A questão da identidade
negra é tema recorrente nos
pensamentos diários na
sociedade brasileira por sua
complexidade e necessidade de
estudos aprofundados com o
objetivo de romper alguns
preconceitos e interdições. No
ramo acadêmico este tema
torna-se ainda mais
interessante quando se analisa
indivíduos que, em seu
desenvolvimento pessoal
acabam assumindo uma
postura política no sentido de
desenvolver mecanismos de
ação no combate de
discriminações com ênfase às
discriminações etnicorraciais.
Em especial este artigo versará
sobre aqueles indivíduos que
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não são considerados negros
por grande parte da população
uma vez que não trazem em si
insígnias fenotípicas da
negritude, mas que
compartilham da filosofia e dos
mecanismos de
reconhecimento identitário
negro-africano de tal maneira
que estimula a relação
proximal com a ancestralidade
negra, buscando não só
proferir discursos, mas
também exercitá-lo em sua
práxis.
Analisar as interfaces da
realidade sócio histórica da
conjuntura do negro e
populações afrodescendentes
no Brasil é necessário,
buscando observar como as
noções e imagens
preconceituosas interagem no
que se refere à parcialização
do provimento de uma série de
Direitos e Garantias
Fundamentais, tratados aqui
sob um patamar de condições
mínimas de vida, e por isso
basilares, intensamente
reduzidas no que se pode
conceber em comparação com
as condições de oferta e
manutenção dos mesmos
direitos aos ditos brancos
(eleitos historicamente como
classe socialmente dominante).
Perpassando pelos
princípios da filosofia das
religiões de matrizes africanas
que se fundem à noção de
organização social
tradicionalmente africana, que
irradia para as diversas searas
da vida social, escolhemos a
antropologia como instrumento
hermenêutico, para melhor
compreendermos a conjuntura
do negro e analisar como este
está sendo tratado na
sociedade brasileira, busca-se
analisar com um pouco mais de
profundidade a relação entre
as religiões de matrizes
africanas, e a instauração de
uma identidade social que
persiga a imensa necessidade
de compreender e respeitar a
diversidade sob o prisma do
dialetismo das relações sociais.
Contatos: [email protected]
Palavras-chave
Identidades sociais,
afrodescendência, negritude,
africanidade, processos de
exclusão etnicorracial,
mecanismos de pertencimento
etnicorracial, pluralidade,
igualdade, influências.
Considerações iniciais
Em diversas
oportunidades já fui levado a
questionar o que é ser negro;
quem é negro; quais os
critérios de classificação,
pertencimento e
reconhecimento etnicorracial;
como vem sendo construída
essa identidade; qual a
situação econômica e os papéis
sociais que os negros vêm
desenvolvendo em nosso país.
Essas proposições me fizeram
abrir a mente e iniciar um
resgate ao mesmo tempo em
que instigou-me à pesquisa.
Sendo afim com as
ciências humanas, em especial
à filosofia, buscar o
fundamento e tentar
compreender a completude do
tema em sua complexidade que
congrega diversas áreas do
conhecimento humano
(transitando desde
fundamentos da filosofia até as
teorias mais recentes da
economia política), tornou-se
para mim uma necessidade
tanto acadêmica como pessoal
investigar a linha de
ascendência, a história e a
influência a que viemos sendo
expostos em pouco mais de
cinco séculos de historiografia
nacional oficial.
Despertado há pouco
tempo por duas brilhantes
docentes, a professora Doutora
Denise Maria Botelho, nas
aulas de Educação Afro-
brasileira no curso de
Licenciatura Plena em
Pedagogia pela Universidade
Federal Rural de Pernambuco
(UFRPE) e pelas orientações
normativas profundamente
discutidas nas aulas de Direito
Constitucional Positivo II,
ministradas pela professora
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Mestra Renata Dayanne,
pessoas por quem nutro
profunda admiração, resolvi
assumir, por total afinidade, a
identidade negra (apesar de
todas as discussões e
disposições contrárias, por
fenotipicamente ter
características que mais se
aproximam aparentemente do
padrão estético branco)
trajando o compromisso ético e
moral, afinal, como formador
de opinião, percebo como
necessário debater o tema,
pesquisar, sair da inércia
muitas vezes imposta pelo
senso comum e quebrar
paradigmas, tratei de investir
algum tempo analisando
práticas e lendo alguns livros,
leis e artigos (de cunho
científico e não científico) que
tinham por objetivo analisar
pontos cruciais tratados ora
nesse pequeno texto.
Há muito me questiono
sobre as diretrizes que
norteiam o discurso que
envolve as questões
etnicorraciais, com especial
importância para os
mecanismos de pertencimento
aos mais diversos grupos
étnicos enquadrados pelo
homem como sendo
necessários à interpretação da
essência humana. Muito me
inquietava o pensamento sobre
a metodologia de classificação,
qual a mais correta, qual a
mais precisa: a
autodeterminação dos sujeitos
ou a heterodenominação
advinda de um agente
revestido da legitimidade
estatal?
Iniciando algumas
reflexões acerca dos principais
paradigmas que dividem a
opinião das massas, devemos
pensar em como esses
mecanismos interagem entre si
e como percebem e são
percebidos dentro da dinâmica
social de determinado lugar,
como vieram sendo
constituídos tais instrumentos
e, portanto, analisando o
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processo histórico e não
apenas seu produto.
O paradoxo aparente de um
negro envolto em pele
branca
É interessante analisar
que paira no imaginário da
coletividade brasileira uma
ideologia que é absolutamente
correlata à perspectiva dos
mecanismos taxonômicos
referentes aos traços
fenotípicos, ou seja, às
características físicas ou
insígnias de
negritude/branquitude para
que se possa efetivamente
emitir um juízo de valor no que
se refere a pertencer ao
“grupo dos negros”, “grupos
mestiços” ou ao “grupo dos
brancos”.
Além desses institutos de
classificação fortemente
higienistas, há também um
fenômeno ligados à perspectiva
freyriana com a instituição de
classificações referentes às
mestiçagens que, até hoje, se
atém, ainda que
inconscientemente, de maneira
mais proximal à matriz branca,
de tal maneira que o indivíduo
tende a negar seus traços e sua
ascendência negra em prol de
uma identidade antropológica
unificada branca. Importante
também é se fazer perceber
que dentro desta perspectiva
(iniciada por Gilberto Freyre),
estamos longe de formarmos
uma democracia racial, sendo,
na verdade, permeados de um
sentimento forte de
silenciamento e, na mesma
proporção, iniciando a
instigação dos nossos
preconceitos e discriminações
com relação não apenas ao
pertencimento etnicorracial
mas a diversas outras
categorias de análise.
A língua, enquanto
instrumento de silenciamento,
é um dos mecanismos sociais
mais efetivos na difusão de
ideologias em que podemos
analisar de maneira bastante
efetiva a influente perpetuação
das expressões de cunho
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discriminatório (tomada aqui,
nos casos a seguir,
discriminação como fator
negativo). Varias são as
situações em que encontramos
expressões como “denegriu”
ou “a coisa ficou preta”, “tem
que ter ordem pra não ficar um
samba de crioulo doido”, uma
das mais ofensivas, por se
pautar numa perspectiva
eminentemente higienista,
“mulato” que possui como
radical o vocábulo mula,
tentando passar a ideia de que
o mulato constituiria uma
espécie híbrida entre seres de
raças diferentes e, por esse
motivo, que fosse estéril,
geneticamente inferior e
impedida de reproduzir-se,
portanto.
Entretanto, cabe observar
que a noção e o sentimento de
pertencimento etnicorracial
passam muito mais pelo crivo
subjetivo do indivíduo do que a
análise dos seus caracteres
fenotípicos, sendo de imensa
necessidade a oitiva do sujeito
para que possamos, de
maneira efetiva, entender sua
natureza, seus referenciais,
seu universo sináptico de
elementos culturais.
Carlos Serrano e
Maurício Waldman (2010) em
sua obra Memória D’África:
A temática Africana em sala
de Aula, assim apresentam a
relevância do tema ora
abordado:
“[...] no tocante à realidade brasileira de hoje, Memória D’África: A temática Africana em sala de Aula posiciona-se como uma contribuição direta aos segmentos da população brasileira de origem africana que, desde os primórdios da colonização, com o concurso da discriminação racial, tiveram as suas práticas ancestrais abafadas, marginalizadas e/ou deturpadas, comprometendo, assim, a sua inserção plena no processo social brasileiro mais amplo.
Tal repressão cultural, quando muito disfarçada pelo mito da “democracia racial”, desdobra-se, aliás, em não reconhecimento de valores e práticas sociais de raiz africana interiorizados pelo conjunto da população brasileira, independentemente da sua
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origem racial. Portanto nesse contexto, verifica-se grande repercussão na identidade nacional, que não pode subsistir nem simplesmente reconhecer-se enquanto tal na hipótese de excluir os seus elementos africanos ou os que procedem da releitura de contribuições dessa origem.”(págs. 12 e 13)
Trabalhar a perspectiva
da africanidade reflete, na
verdade, a necessidade de
investigação realística sob os
novos prismas como a
identidade se constitui. Pensar
o negro e suas relações
históricas e sociais é atentar
para a valorização dos traços
culturais negros no Brasil e
como o Brasil influenciou o
cenário social do continente
africano sob novos moldes, os
moldes da consciência, da
pluralidade e da necessidade
de interpretação das
realidades pelos seus
instrumentos e não pelos
instrumentos padronizadores,
que inibem as singularidades.
Assim, sob esse aspecto,
exprime brilhantemente
Makota Valdina: “Eu não quero
que me tolerem, eu quero é
que me respeitem...”, pois
somente com o respeito será
possível a construção de uma
realidade onde a pluralidade
considerará as diferenças
como possibilidades de
aprendizagem, como
possibilidade de construção
diária de cidadania, de
civilidade, de solidariedade
plena e realística, integrando
povos e culturas.
Para além de traços
unicamente fenotípicos,
reconhecer-se enquanto negro,
no Brasil, perpassa por
questões políticas e ideológicas
mais ligadas à assunção de
certas identidades sociais e
características antropológicas
comuns. A Carta
Constitucional, bem como o
Estatuto da Igualdade Racial
(Lei 12.288/10) prevê que o
indivíduo tenha direito de
igualdade, mas não apenas a
igualdade considerada em seu
sentido formal e absoluto (sob
o instituto do instrumento
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normativo contido art. 5º da
Constituição Federal de 1988
“todos são iguais perante a
lei”), mas considerando
também a possibilidade de
consegui-lo através do
princípio doutrinário que, para
se buscar a efetivação da
igualdade é importante, na
verdade, a promoção de
condições igualitárias que
foram suprimidas durante mais
de cinco séculos de história,
imputando aos negros e
comunidades indígenas e
outros indivíduos das mais
diversas etnias uma condição
de inferioridade
intelectual/cognitiva, física,
ideológica ou de qualquer
ordem que seja, negando-lhes
a possibilidade de inserção em
espaços sociais e relegando-os
a espaços de menor relevância
e prestígio social.
Preto versus negro
O termo preto liga-se com
tonalidade, com a cor. No
universo do discurso das
“raças humanas”, esse termo
refere-se ao conjunto de
caracteres negróides que
expressam-se principalmente
pela pigmentação da pele e
traços do rosto ou biótipos,
sendo que o principal fator de
reconhecimento, o marco
adotado se dá mediante a
presença em maior ou menor
grau de melanina, proteína
responsável pela cor mais
escura na epiderme. Assim,
exclui-se do indivíduo toda a
possibilidade de subsistência
de um ideário que se funde em
mecanismos psicológicos ou de
reconhecimento social. Está,
portanto, desprovido de
história, de consciência, está
despido de experiências e
similitudes, sem valores,
proximidade ou crenças, está
isolado e sem sentido, perdido
no universo da abstração.
O negro, embora utilizado
enquanto sinônimo usualmente
referenciando a tentativa de
eufemismos, uma vez que se
criou a falsa noção de que o
termo preto é preconceituoso,
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envolve, na verdade, uma série
de instrumentos de
pertencimento, de afinidade,
de concordância com
princípios, valores e
referenciais cuja gênese se
aplica à africanidade, ou seja,
com a parte tradicional da
parcela negro-africana cujo
conjunto de crenças e valores
se aproximam das religiões e
culturas tradicionalmente
africanas, sofrendo poucas
interferências ao longo dos
séculos nas seguidas invasões
estrangeiras e diásporas
negras.
O negro não tem
obrigatoriedade de filiar-se ao
critério da pigmentação da
pele ou da presença dos traços
fenotípicos. Pelo contrário,
esta perspectiva é mais flexível
e reflexiva partindo do
referencial psicológico do
sujeito que é emanado aos
demais, e não impondo a ele
classificação pré-determinada
baseada em uma padronização
que anula sua história, seu
contexto e suas percepções.
Dos critérios de analise do
pertencimento etnicorracial
Pensando acerca deste
tópico, embora seja muito
contraditória a vasta literatura
especializada, me permito,
antes, expor acerca das duas
formas aceitáveis e suas
implicações para que, ao final,
possa expor meu ponto de vista
sem querer extinguir o assunto
ou assumir uma postura
monopolizadora, monocrática,
impositiva, acerca das
concepções do leitor, tendo em
vista que estão intimamente
ligadas com as vivências e as
diversas interpretações dos
seres.
Permitam-me iniciar este
tópico com um texto de nossa
Constituição Federal aqui
utilizado como ponto
norteador, como chave
hermenêutica e instrumento de
análise:
“Art. 1º A República Federativa do Brasil,
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formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:I - a soberania;II - a cidadania;III - a dignidade da pessoa humana.”
Sabendo-se desses
princípios, é absolutamente
pertinente que se façam alguns
questionamentos ou
apontamentos de acordo com a
funcionalidade e complexidade
do assunto ora tratado, a
saber:
1. O que é soberania, como se comporta ou se expressa, qual o objetivo deste instituto político?
2. O que é cidadania, como se comporta ou se exprime este instituto, quais as diretrizes sociais deste dispositivo?
3. Qual a amplitude do princípio da dignidade da pessoa humana, tendo em vista que a definição de dignidade varia de acordo com a matriz axiológica de cada indivíduo no tempo e no espaço?
Pensar em relações
humanas é, portanto, fazer
observar espaços e relações de
poder, é investir na busca pela
compreensão e, portanto,
inserir-se num contexto em que
a realidade é muito mais
complexa do que
aparentemente se apresenta.
Desta maneira, buscamos
indicar, de maneira inicial, as
duas concepções referentes
aos critérios de julgamento do
pertencimento etnicorracial de
uma pessoa.
Autodenominação dos povos
ou análise endógena
Essa metodologia de
pesquisa e pertencimento
busca muito mais estabelecer
os traços psicossociais que o
sujeito construiu com as
diversas situações na vida do
que impor um padrão estético
mantido pela sociedade
brasileira. Analisando, a
posteriori, sob os fundamentos
sócio antropológicos e
históricos, percebi que este é o
critério mais apropriado uma
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vez que a identidade social é o
principal instrumento de
análise, cabendo ao indivíduo,
e somente a ele, prolatar seu
grupo de referência ou de
pertencimento etnicorracial. É,
desta forma, fruto dos
processos de síntese que o
indivíduo passou na vida,
fazendo com que sua história
não seja apagada por
categorizações há muito
determinadas e pouco efetivas.
Heterodenominação ou
análise exógena
Analisando com mais
intensidade e profundidade,
esses sistemas políticos (uma
vez que não podemos
desvincular o caráter político
das demais esferas e fazendo-
se perceber que a política aqui
mencionada em nada se
aproxima das concepções
partidárias e sim com as
políticas públicas de um
Estado), ainda que imperfeitos
– e legitimados em sua própria
imperfeição – buscam, através
de agente revestido de uma
pseudolegitimidade derivada
da atribuição das funções do
Estado, investir em uma
taxonomia etnicorracial e, em
seus critérios pessoais, sem
nenhuma motivação ou
fundamentação.
Algumas considerações sobre os critérios de pertencimento
Devemos privilegiar, a
meu ver, a dimensão
psicológica do sujeito,
tornando-o autor e não objeto
de análise, sobressaindo-se,
portanto, o critério da
autodeterminação dos povos,
critério, aliás, adotado pela
nossa Carta Magna, que
assegura no seu art. 4º:
“A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: [...]
III - autodeterminação dos povos;”
Esse dispositivo
vanguardista, privilegia a
perspectiva subjetiva e não a
classificação de terceiros que
em nada conhecem a história
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da pessoa a ser classificada,
suas relações sociais suas
experiências de vida.
Alguns desafios à implantação da heterodenominação ou análise exógena
Pensemos na
possibilidade de instaurar o
critério da heterodenominação,
algumas questões controversas
e, no mínimo, inquietantes se
sobressaem:
Quais critérios nós
utilizaríamos como
diretores da
pesquisa (traços
fenotípicos,
ancestralidade,
traços socioculturais
e/ou religiosos)?
Como nos
certificarmos que o
agente não estará
tendendo ao
processo de
embranquecimento
da população
brasileira,
negligenciando
indícios negro-
africanos e
indígenas sob o
escopo de
sobrepujar a cultura
e a ideologia branca
em nossa
sociedade?
Como promover o
estudo das
características
fenotípicas a fim de
que a análise seja
efetivamente
criteriosa e não
pautada
exclusivamente nas
concepções
subjetivas do
agente,
desconsiderando o
que seria mais
proximal a seu
pensamento e a seu
direito ao exercício
da cidadania plena e
aos direitos mais
fundamentais e, a
meu ver,
irrenunciável
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enquanto ser
humano (direito à
conhecer,
reconhecer e
vivenciar vínculos
com sua
ancestralidade)?
Os critérios objetivos
devem ser construídos
seguindo um entendimento
multidisciplinar que permita no
sujeito constituir (ou pelo
menos saber sobre) elementos
de identificação, diferente, por
exemplo, dos processos que
vieram sendo feito com os
povos indígenas no Brasil e
grupos negros na África,
agrupados genericamente sem
preocupação com suas
particularidades culturais,
econômicas, linguísticas e
religiosas, como índios ou com
os povos africanos que
envolviam maciços grupos
étnicos, alterando
profundamente o mosaico
multiétnico e denominando-os
de africanos ou índios
(nomenclatura equivocada uma
vez que havia o pensamento de
que se havia chegado às
Índias).
A Constituição Federal 1988
e as normas
infraconstitucionais no
sentido de promover
igualdade e respeito à
cultura negra
Conforme LIMA (2012),
ao analisar os Direitos e
Garantias Fundamentais:
“Com a influência dos princípios de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, invocados como temas nucleares assumidos nos aportes teóricos da Revolução Francesa, procurou-se observar a existência de direitos inerentes à essência da natureza humana e, por este fato, tendentes à universalidade, sendo assim inicialmente chamados de Direitos Naturais (posteriormente nomeados como Direitos Humanos) resultados de questionamentos filosóficos já iniciados muitos anos antes quando da Antiguidade Clássica. Esses direitos tiveram interpretações diversas de acordo com a época histórica e as concepções das doutrinas aplicadas ao direito.”
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Percebemos, assim, a
necessidade extrema de
incorporarmos em nosso
sistema jurídico uma
modalidade diferenciada de
promoção de igualdade em que
fosse possível, à baila dos
princípios básicos regentes da
Revolução Francesa, instituir
condições básicas, basilares à
convivência pacífica e
respeitosa dos povos.
Constituição Federal de
1988
A nossa Carta Magna,
promulgada no ano de 1988,
veio a incorporar em seu
arcabouço ideológico uma
série de concepções
humanísticas, tentando, a todo
custo, instaurar determinadas
garantias, por ser pós-
ditadura, tentando resguardar
os direitos dos cidadãos. Sendo
bastante extensa e analítica
(fato este que acabou por fazer
com que nossa atual
Constituição Federativa viesse
a ser conhecida pela alcunha
de Constituição Cidadã), este
compêndio legislativo deveras
avançado, já trazia em seu
interior questões de enorme
relevância social, como por
exemplo o direito a um meio
ambiente saudável (assunto
tratado em outros países
tomados por desenvolvidos
apenas décadas depois devido
ao enorme consumo dos
recursos naturais), a
importância de se poder saber
sobre sua ancestralidade, sua
classificação etnicorracial
entre outros temas complexos
e controversos.
Este instrumento
normativo substantivo é, na
verdade, como um documento
em que se depositam os
anseios, preocupações e as
propostas desenvolvimentistas
para nosso país e, por
conseguinte, para nosso povo.
Desta maneira, sustenta
ainda a C.F./88 que a
pluralidade, questão
amplamente discutida em
nossa atualidade, não seja
negada em prol de uma ou
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outra camada social de tal
forma que os motes da
população não mais vivam em
função da manutenção do
status quo, ou seja, da situação
hierárquica de sobreposição
social que algumas classes vêm
exercendo há séculos.
Analisando nossos traços
históricos, é de imensa
relevância a observação de que
conforme houve o fenômeno da
“descoberta do Brasil”, nossos
padrões, impostos pela força
das espadas e pela ascensão da
cruz, referendadas pela
violência física, religiosa e
ideológica, nos fizeram
“embranquecer” e, junto com o
fenômeno do
embranquecimento, passamos
a, analogamente, dotar de
carga depreciativa todas as
referências não-brancas a que
fomos expostos em nossa
história, relegando a um
segundo plano os movimentos
e ideologias negras e
indígenas.
É nesse sentido que
precisamos de uma norma
substantiva que nos dê base
para, ainda de maneira inicial,
possamos cobrar das
autoridades um
posicionamento que não
permita que terceiros possam
intervir, garantindo-nos o
pleno acesso às liberdades
previstas pela Constituição.
Legislação
infraconstitucional
A lei fundamental é o
instrumento pelo qual o
legislador originário
fundamentou todos os critérios
e assuntos cuja importância é
mais profunda, ou seja, que
possuem maior relevância
jurídica e social dentro da
esfera nacional. Contudo, é
absolutamente incongruente
que se espere que a
Constituição consiga em seus
poucos capítulos abarcar toda
a amplitude dos conteúdos a
ser iniciados nela. Para isso é
necessário que tais assuntos
sejam tratados em legislação
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infraconstitucional (emendas
constitucionais, tratados, leis
ordinárias) para regulamentar
as condutas tidas como
necessárias ou reprováveis, a
depender dos casos.
Lei 10.639/10 – Educação
Afro-brasileira
Esta lei altera o disposto
na Lei 9394/96 (Lei de
Diretrizes e Bases da Educação
Nacional), de tal forma que,
além de garantir formal e
taxativamente o ensino de uma
disciplina cujo teor se ligue
com a construção identitária
nacional onde se possa
observar a historicidade da
cultura afro-brasileira
enquanto elemento
fundamental na compreensão
de nossa realidade, ainda
percebe-se que a herança
ancestral deve ser analisada de
maneira não caricaturada ou
vil, tratada simplesmente como
uma data em que se deva
colocar nossas crianças para
brincar e estudar poucos
traços, marcos, personagens,
processos ou agentes de
imensa importância de nossos
antepassados negros.
Lei 11.645/10 - Obrigatoriedade da temática de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena
Esta lei estabelece
“diretrizes e bases da
educação nacional, para incluir
no currículo oficial da rede de
ensino a obrigatoriedade da
temática “História e Cultura
Afro-Brasileira e Indígena”,
sendo assim, se preocupa não
em garantir efetivamente o
ensino, mas em iniciar a
preocupação no sentido de
buscar-se novos horizontes,
novas frentes de pesquisa e de
ensino nas culturas
supracitadas. É a preocupação
em iniciar metodologicamente,
através de normatização que
se transformará ainda em
orientações, a possibilidade de
implantação das proposições
normativas contidas nesta lei.
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Lei 12.288/10 – Estatuto da
Igualdade Racial
Este dispositivo
normativo trata de iniciar e
instrumentalizar, de maneira
mais diretiva, as garantias no
sentido de promover a
efetivação do mandamento
constitucional de tratamento e
de reconhecimento das
influências positivas da cultura
e dos povos que integraram
nossa imbricada rede de
interações etnicorraciais no
decorrer de nossa história,
entendida aqui desde antes da
chegada dos portugueses às
terras brasileiras.
Nesse instrumento, o
legislador tentou, através do
processo de normatização,
introduzir o caráter reflexivo e
integrador, cujo sentimento de
equidade seja inserido
fortemente e permaneça
pautado nas críticas às
discriminações negativas, tento
em vista que as idiossincrasias
não são e nem poderiam ter
um entendimento
fragmentador e reducionista
enquanto instrumentos de
sobrepujança ou de ostentação
de processos de negação dos
pensamentos, processos de
identidade e das origens
étnicas, em cujas
particularidades residem
possibilidades infinitas para a
construção de uma realidade
que enseje a pluralidade
etnicorracial e o respeito à
diversidade.
Conforme se pode
observar, toda legislação tende
a formalizar relações sociais
que trazem em sua origem
fundamentos sociológicos de
relação de poder. Nesta,
repousa o entendimento de que
é necessário à construção da
paz uma interpretação
normativa que possibilite a
integração dos povos.
O Código Penal e os crimes
de racismo e injúria
qualificada.
É de imensa importância
se observar algumas questões
acerca da legislação penal,
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como por exemplo, o fato de
que esta se constitui enquanto
a ultima esfera de ação do
poder jurisdicional do Estado,
constituindo-se, de maneira
singularíssima, na última
instancia jurisdicional, mais
conhecida como ultima ratio, a
que poderá um particular
investir contra outro acerca de
práticas tipificadas pelo Estado
enquanto reprováveis, ilícitas,
indesejadas.
Estas práticas, na
verdade podem culminar, ao
fim de um devido processo
legal ou através de
representação do Ministério
Público enquanto garantidor
das normas substantivas, na
suspensão de direitos e, de
maneira ainda mais intensa a
depender da potencialidade
lesiva ou da gravidade da ação
(ou omissão), na suspensão da
liberdade individual,
imputando-lhe sanções
intensas com o objetivo de
reduzir-lhes a possibilidade de
reiterar tais práticas ou
exprimir algumas ideologias
altamente lesivas à
estabilidade social. Essa última
seara (a penal) é de imensa
força repressiva na prevenção
de condutas adversas.
Devido à supressão das
liberdades ou direitos dos
seres humanos, ela acaba
sendo responsável pelas
detenções, fato pelo qual o
sistema penitenciário
brasileiro se mantém ainda
hoje superlotado, parecendo
ser “fiel depositário das
ameaças da sociedade” frente
à esfera criminal ainda hoje.
Com a efetiva autorização
da Constituição, que trata no
art. 5º, inciso XLII que “a
prática do racismo constitui
crime inafiançável e
imprescritível, sujeito à pena
de reclusão, nos termos da lei”,
tomada como conduta
reprovável tão intensa que
existem autores que elevando-a
à característica análoga aos
crimes hediondos, tamanha sua
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ameaça à segurança pública e
à manutenção da paz social.
Constitui um grande
avanço no sentido de promover
uma situação mais favorável à
criminalização das condutas
representativas do ideário
pacifista pretendido pelo
Estado, em prol do que se
convencionou chamar de bem
comum, tendo em vista que as
chagas causadas pelo racismo
e/ou injúria na sua forma
qualificada (tipificada pelo
parágrafo 3º do artigo 140 do
Código Penal) acabam por
gerar diversas tensões e
instabilidades sociais. Desta
forma, por fim, a repressão
dessas práticas encontra-se
devidamente expressa da
seguinte maneira:
“Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.[...]
§ 3o Se a injúria
consiste na utilização de
elementos referentes a raça,
cor, etnia, religião, origem ou
a condição de pessoa idosa ou
portadora de
deficiência:”(grifo nosso)
A identidade negra:
construções, abstrações e
supressões
A identidade negra veio
se constituindo no Brasil como
uma identidade de resistência,
de rompimento de paradigmas
estruturais e estruturantes da
segregação social e econômica,
de base para movimentos
contra a hegemonia. Esses
traços revolucionários vieram,
na verdade, servindo como
chaves hermenêuticas para
analisar as mais diversas
expressões sociais, religiosas,
políticas, artísticas e
ideológicas que nós da
sociedade brasileira, em
especial negros, temos
buscado difundir, sob uma
ótica em que a diversidade (e
não a padronização) é o que
nos faz crescer e evoluir como
seres humanos em constate
transformação, perspectiva
inclusive defendida pelas
religiões de matrizes africanas,
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conforme analisaremos
posteriormente, sob o
pensamento que a dialética e
nas relações sociais deve ser
mantida também visando
estabelecer-se enquanto
dialógica, ou seja, os espaços
de vivencia e aprendizado
dialogam, são indissociáveis.
Desde o processo de
“descoberta do Brasil”, se é
assim que podemos chamar, os
negros vieram a ser força
motriz da esfera econômica e
social, mas seu grau de
referência nos feitos e
processos históricos é
inversamente proporcional às
contribuições que deram na
grande parte dos segmentos
sociais para o desenvolvimento
deste país.
Intitulados de seres sem
alma, perpassando pela teoria
camita (em referência a Cam -
filho de Noé descrito na Bíblia
por ter sido amaldiçoado pelo
seu pai ao ter zombado dele)
até pensamento de o povo que
necessitava ser escravizado
para que pudesse receber a
dádiva de receber a devida
noção de civilização, o negro
sofreu flagelos corporais e,
com muito maior intensidade,
flagelos psicológicos, sociais,
familiares.
Dos processos de negação
ao nome, à terra, à
ancestralidade fomos jogados
em porões nos navios
negreiros, fomos sentenciados
às senzalas e às guerras, fomos
rotulados como incapazes, sem
cultura, tratados como
mercadorias, tornados filhos do
desprezo, quando não do
adultério dos senhores de
engenho, embebidos pelo
silêncio da agonizante viagem,
num cenário de sofrimento, das
terras áridas e tropicais que
um dia, fatidicamente, ligaram
o continente africano ao
Brasil...
Há que se fazer notar
que, na verdade, os negros
conjugam, no seu contexto
social e histórico, funções
deveras importantes e, mesmo
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com a tentativa intensa de
silenciar-nos, ainda estamos
com voz ativa, organizando-
nos, requerendo melhorias,
fazendo observar que nossas
origens são nossa força e
orgulho que não deve, sob
nenhuma hipótese, ser negada
ou novamente deturpada.
A condição idiossincrática
dos negros no Brasil, ainda
hoje, se dá como produto do
processo de execração,
acontecido através de séculos
de supressão cultural, em
contraditoriedade com
supremacia social cedida à
cultura europeia com o que se
convencionou chamar, muito
pretensiosamente, de
“intelectualidade europeia”,
com a ideia de civilização
europeia que barbaramente
impõe suas concepções
ostensivamente aos demais
povos, despindo-os de qualquer
sentido, retirando-lhes as
particularidades inerentes aos
fenômenos locais. Outro ponto
deveras importante para a
análise desse sentimento de
superioridade europeia advém
dos instrumentos e marcos
históricos e geográficos
utilizados para medir, segregar
e separar o mundo,
notadamente perceptível, uma
vez que as condições
geográficas (relevo e, em
especial, o fator clima)
serviram para que, em sua
visão dominadora e
silenciadora pudessem
engendrar pensamentos de ser
a África e todos os territórios
intertropicais como lugares
naturalmente impenetráveis
em cujas terras habitavam
horrores, monstros e canibais
regulados pelas temperaturas
baixas que faziam permear na
mentalidade eurocêntrica uma
perspectiva que interpretava,
pautada na da mitologia
judaico-cristã, as temperaturas
mais frias como perspectiva
que equipararia à condição de
Céu, enquanto as temperaturas
mais quentes estariam ligadas
às temperaturas abrasantes do
inferno e de suas criaturas
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horrendas e condições
angustiantes numa visão
dantesca absurdamente
deturpada do continente
africano e regiões centrais,
afinal é a África o mais central
dos continentes tendo em vista
que é nele que se encontram o
Meridiano de Greenwich com o
paralelo do Equador,
encontrando-se, também, com
parte de sua massa territorial
distribuída na zona
intertropical e temperada.
O processo de
escravização, já existente antes
da chegada dos colonizadores
europeus, antes tinha um
caráter totalmente diferente e
passou a ser concebida, pelo
crivo capitalista na primeira
fase (expansão marítima
comercial), como apenas um
objeto de valor ou de prestígio,
não mantendo nenhuma
corresponsabilidade para com
sustento do escravo, como
acontecia com o chefe da tribo
ou a pessoa que se
assenhoreou dele por motivos
específicos como a dívida (e
não de maneira arbitrária
como acontecia habitualmente
com os europeus). Enquanto
mercadoria, na ideologia
mercantilista, o negro perdeu
sua história e tradição,
encaradas aqui como
condições mínimas de
dignidade, de respeito e,
portanto, fundamentais à
manutenção da vida e de seus
elementos constitutivos.
Separados da família,
perde seus costumes ou ter
que exercitá-los às escondidas
modificou, certamente, as
estruturas psicológicas de
muitos dos africanos que,
retirados de sua terra, viram-
se forçados a iniciar uma
odisseia angustiante, para
terras desconhecidas com
pessoas que nunca teria visto,
cujos costumes, religião e
línguas nativas muitas vezes
sequer mantinham contato.
Pelos seus princípios
lógicos e, de maneira mais
efetiva, logísticos, visando
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evitar comunicação e
rebeliões, os colonizadores
europeus acharam por bem
utilizar-se dos nomes dos
portos de exportação da mão
de obra escrava para nomear
esses grupos de escravos,
analisando também as
insígnias fenotípicas como
instrumento fragmentador das
diversas identidades e etnias
ocupantes do espaço africano,
fazendo com que o imaginário
europeu fosse aguçado,
estimulado no sentido de
construir estratégias e
metodologias de inferiorização
que permitiram que o negro
africano fosse mais facilmente
escravizado com o auxílio de
alguns chefes de tribo (faça-se
perceber que houve diversos
processos de resistência que
foram utilizados tanto na
África quanto no Brasil como
instrumento de não aceitação
das realidades desiguais
existentes naqueles
ambientes).
Desta maneira esse
resgate de informações,
suprimidas ao longo de séculos
de silenciamento é necessário
com o objetivo de desconstruir
nossas ideologias e tentar
repensar essa modalidade tão
difundida de um negro fraco,
fragmentado em sua natureza,
irracional e residente em uma
terra instável e, naturalmente,
imposta enquanto zona de
combate e de pobrezas
incomparáveis que, na História
mundial só desempenhou
papeis de coadjuvante
(realidade pouco efetiva que
em nada demonstrava sua
veracidade e, em diversas
ocasiões veio sendo posta à
prova, tamanho o grau de sua
incoerência).
A filosofia de vida voltada ao
controle de malefícios
sociais e ao estímulo à
solidariedade
Inegável é a contribuição
que o continente africano nos
dá no sentido de estimular a
construção de uma sociedade
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que visa ser menos desigual,
que procura reduzir as
disparidades e os desafios
puramente econômicos com o
objetivo de promover justiça e
paz social. Uma sociedade que,
mesmo com as desigualdades,
tenta engendrar-se num
sentimento em que o coletivo e
a solidariedade social são mais
importantes do que a
individualidades, as
particularidades e anseios dos
indivíduos, nos mostrando que
alguns preceitos sociais
importantes reverberam em
estruturas econômicas, sociais,
históricas e culturais.
A ideia de solidariedade,
forte entre os povos africanos,
inclusive entre pessoas de
diferentes etnias, está posta
como elemento fundamental
num continente cujo
diferencial se dá pela realidade
pluriétnica ou, nas palavras de
WALDMAN e SERRANO
(2010), se comportando como
um complexo “mosaico étnico”.
Já nas sociedades ditas
complexas e civilizadas, como
se autoproclamou a sociedade
europeia, o sentimento de
solidariedade advém de uma
organização clânica, de um
pensamento fragmentador
pautado unicamente na
perspectiva da gênese dos
grupos e dos vínculos
decorrentes da estratificação
social. Assim sendo, o campo
das relações sociais
estabelecidas no seio do
continente africano se
consubstanciam enquanto
universo de possibilidades
infinitas, onde o respeito às
diferenças se transforma em
fator de aglutinação e, ao
mesmo tempo, fator de
diferenciação entre os mais
diversos grupos sociais.
WALDMAN e SERRANO
(2010) assim expressam a
relação tradicional entre
política, respeito às diferenças
e solidariedade:
“O poder político tradicional permitiu e foi capaz de criar mecanismos de solidariedade e de convivência entre povos
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muito diversificados, operando com base na construção de consensos, estratégia fundamental em um edifício de poder no qual a autoridade central se estabelecia como mantenedora da pluralidade de interesses e de manifestações culturais e religiosas” (pag. 123) (grifo nosso)
Devido à sua
profundidade em discutir
questões de infinita relevância,
como o preconceito, as
diferenças, culturas, mitos e
outros temas, permito-me,
pois, reproduzir a música de
Chico Cézar intitulada
Respeitem meus cabelos,
brancos que muito tem a ver
com aqueles irmãos negros
que trazem em si as insígnias
fenotípicas em sua pele, e que,
acima de tudo, buscam que
suas características sejam
valorizadas, respeitadas e que
suas idiossincrasias sejam
percebidas não como
instrumento de inferiorização,
mas, simplesmente na direção
da percepção de que pode vir a
existir unidade na diversidade:
“Respeitem meus cabelos, brancosChegou a hora de falar
Vamos ser francosPois quando um preto fala
O branco cala ou deixa a salaCom veludo nos tamancos.
Cabelo veio da ÁfricaJunto com meus santos
Cabelo veio da ÁfricaJunto com meus santos.
Benguelas, zulus, gêgesRebolos, bundos, bantos
Batuques, toques, mandingasDanças, tranças, cantos
Respeitem meus cabelos, brancos.
Se eu quero pixaim, deixaSe eu quero enrolar, deixaSe eu quero colorir, deixa
Se eu quero assanhar, deixaDeixa, deixa a madeixa balançar.
Se eu quero pixaim, deixaSe eu quero enrolar, deixaSe eu quero colorir, deixa
Se eu quero assanhar, deixaDeixa, deixa a madeixa balançar.”
Brasil – África: similitudes e
particularidades
Aos que não conseguem
ver claramente uma ligação,
um elo, um denominador
comum entre essas massas
territoriais devidamente
separadas pelo Atlântico, entre
o lócus geográfico, os marcos
geográficos, referenciais e
feitos históricos que cada uma
delas mantém entre si, se torna
perceptível, na verdade, que
seu imaginário está apenas
permeado por ideologias que
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fazem com que consumamos
silenciosa e acriticamente
determinados pontos de vista
cujo caráter muitas vezes
afropessimista não nos
encoraja a perceber nada de
válido, valioso ou relevante em
nossa formação enquanto povo
e enquanto nação assentada na
pluralidade dos povos e das
concepções e ideologias,
forçando-nos a,
inconscientemente,
reproduzirmos a África em sua
aridez, em seu primitivismo
(que, afinal, nunca existiu
tendo em vista que as mais
expoentes civilizações
nasceram em terras africanas),
em suas “fraquezas”,
fragilidades e barreiras
naturais ou culturais.
No que me cabe à nossa
observação, a África mantém
com o Brasil um intricado
modelo de referenciais que são
conjugados entre esses
espaços geográficos,
envolvendo modelos de
sociedade e esquemas
culturais que são
compartilhados numa
velocidade enorme, embora
encobertos pelo véu do
anonimato e dos diversos
processos de
embranquecimento existentes
na sociedade brasileira.
Muito além dos
empréstimos linguísticos, a
cultura africana repercute em
esferas muito mais práticas
referentes a modos de pensar e
executar determinadas
atividades, mas também com
evidências de natureza social,
histórica, religiosa e
antropológica. Analisar as
similitudes e as divergências
vão muito além de contrapor
espaços geográficos que, pela
sua conjuntura geopolítica
tendem a prolatar sua
proximidade, ou melhor, sua
unidade geográfica.
Assim como nas terras
africanas, o Brasil passou por
um processo histórico de
subjugação, de submissão, de
silenciamento em prol de um
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povo estranho e, nesse sentido,
bárbaro, alienígena, alheio às
realidades sociais, linguísticas
e culturais desses espaços,
modificando de maneira
drástica a dinâmica
populacional, introduzindo
estruturas, instrumentos e
instituições que não se fazia
necessário mas que, por força
da imposição e da ideologia da
época, se fez importante
reforçar e prolatar como
instrumento de dominação. Eis
que por uma demanda
mercadológica baseada em
pensamentos religiosos,
políticos e científicos (se assim
podemos chamar os métodos
da época), construiu-se uma
teoria em que negros deveriam
ser forçados a trabalhar em
prol da libertação de sua alma
pecadora (quer dizer,
inicialmente os negros sequer
possuíam almas, eram tomados
como animais dotados apenas
de força, mas em alma) através
do trabalho, pois sua
penitencia seria naturalmente
se transformar na força motriz
da economia da época
(principalmente quando da
época da Idade Moderna, uma
vez que a alma era o que dava
ao ser humano o caráter mais
divino, cuja existência permitia
a proximidade com Deus (um
deus branco europeu que, na
concepção da Idade Média,
assola seu povo com pragas,
penitências, pestes bem como
curas, interdições e pecados,
com salvações, indulgências e
arrependimentos).
Entretanto, essas
concepções vieram a tomar
força com uma teoria que
categorizava as pessoas
conforme seus caracteres
físicos, de tal maneira que,
determinados traços
fenotípicos seriam o bastante
para classifica-lo dentro de
uma escala de proximidade
com o ideal branco ou com a
escória dos negros, ao
pensamento da época.
Contemporaneamente,
convencionou-se chamar este
tipo de observação, baseada
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em critérios de cientistas
higienistas, de racismo de
marca – espécie bastante
recorrente no nosso País em
contraste com o racismo de
origem em outras partes do
mundo, como nos Estados
Unidos da América, por
exemplo.
WALDMAN e SERRANO
assim exprimem algumas
considerações acerca da
realidade africana que, ao
mesmo tempo se torna tão
idêntica e tão divergente com a
realidade brasileira:
“O mundo africano corresponde a um todo integrado onde se relacionam não só aspectos sociais mas também o espaço e o tempo vivenciados por suas sociedades. Aliás, o entrosamento do tempo com o espaço é, sobretudo, uma premissa africana. No pensamento tradicional africano, o binômio espaço-tempo compartilha tamanha cumplicidade, que tornou-se prescindíveis artifícios regulamentadores externos à realidade vivida, caso dos cronômetros e dos relógios que demarcam um tempo eminentemente
matemático e abstrato.”(pág 136)
O homem e o meio-
ambiente: uma relação
dialógica de pertencimento,
respeito na dialética social e
religiosa tradicional
É inenarrável a
proximidade que o homem
africano tem com o meio
ambiente. Numa relação
altamente sui generis, ele
exprime respeito, cuidado e
necessidade de preservação e
sustentabilidade, valores que
são hoje suscitados pelas
sociedades ditas evoluídas,
modernas e civilizadas que,
após muito degradarem o meio
ambiente (produto dos
processos contínuos de
avanços nas áreas de
amplitude técnico-científica e
social) têm se visto em
situações de extrema
vulnerabilidade ambiental e
imposto, inclusive, a outros
povos conforme seja o produto
de séculos de degradação e
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utilização indiscriminada dos
recursos naturais, uma
situação caótica e
inconveniente frente às
gerações presentes e futuras
de países que pouco mantém
vínculos.
Para o pensamento
africano tradicional, em linhas
gerais, o homem não está
desvinculado da natureza, pelo
contrário, encontra-se
absolutamente ligado ao
contexto socioambiental que o
cerca, devendo, desta forma,
zelar por sua integridade,
respeitando-o uma vez que,
como veremos a seguir, na
própria mitologia ioruba, por
exemplo, os deuses estão
intrinsecamente ligados com
elementos da natureza. A
seguir alguns exemplos da
proximidade que legitima a
sacralização dos espaços
naturais e dos elementos
biológicos, geológicos,
geopolíticos e físicos.
SERRANO e WALDMAN
(2010), assim exprimem a
relação do binômio poder
estatal e religião, antinômicos
nas sociedades de cunho
europeu):
“[...] o sagrado surge como um princípio importante para o exercício do poder legitimando-o. O chefe sintetiza a sociedade como um todo. A sua saúde constituirazão para o bem-estar da sociedade como um todo. É o principal mediador, com as forças vitais ancestrais que trazem fertilidade aos campos e harmonia da sociedade. Portanto, estabelece um elo importante com o povo desde sua entronização até sua morte” (pág. 160)
Entre as diversas
similitudes, Brasil e África
estão ligados pelas estratégias
de resistência entre os
indivíduos de pele escura e a
possibilidade de engendrar
lutas na tentativa de solução
de conflitos e anomias
buscando, sempre que
possível, pacificar as decisões
baseados em conceitos que se
ligam com a ancestralidade
(viva ou desencarnada, em
outro ponto do Cosmos – o
Orun dentro da perspectiva
ioruba). SERRANO e
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WALDMAN (2010), assim
exprimem o que convencionam
chamar de vínculos e
complementaridades:
“Inferências de âmbito antropológico, geográfico, histórico e sociológico que transformam o Brasil e a África em coparticipes nas mais diversas situações e experimentos da vida humana. Tanto na realidade brasileira quanto na africana são dominadas pela tropicalidade, pela pujança do meio natural, pela multiplicidade, cultural e religiosa. Sem qualquer sombra de dúvida, estamos diante de duas realidades nas quais as analogias predominam sobre as diferenças, materializando caminhos comuns passiveis de serem trilhados por africanos e brasileiros.
Podemos igualmente enfatizar a presença da África na realidade social e cultural brasileira alimentada pelo trafico de escravos, o que acabou por transplantar para o Brasil, por mais de três séculos e meio, diversas manifestações daquele continente. Essas influências, mesmo severamente reprimidas, continuaram vivas, atuantes e com inegável presença no cotidiano nacional. Constituem atualmente parte indissociável de valores e posturas que tornam os brasileiros um grupo distinto, portador de signos identitários que
contribuem para torná-lo distinto dos demais povos.” (pág. 13 - grifo nosso)
Em contraposição, as
divergências se dão de maneira
complexa de tal forma que a
unidade brasileira e a
pluralidade de concepções
africanas se esbarram no
enfrentamento real às diversas
formas de pensamento com
relação aos preconceitos e
discriminações negativas
(saibam da existência de
discriminações positivas visto
que discriminar é pôr em
evidência de maneira
axiologicamente valorosa ou
depreciativa).
Pensar que nosso modelo
de colonização, evidentemente
de caráter exploratório, teve o
objetivo de unicamente
destruir os recursos em prol do
enriquecimento desenfreado
pregado pelas potências
mercantilistas do século XVI
faz com que possamos
entender um pouco dos
problemas socioambientais
ainda existentes no Brasil.
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Assim sendo, essa ideologia
(que ainda integra o
pensamento dos cidadãos
brasileiros), torna muito difícil
a transformação de certas
concepções arraigadas no
imaginário social da
população, tendo em vista que
a desconstrução de uma
ideologia é muito mais difícil e
trabalhosa que sua construção
e sedimentação.
Desta maneira, é preciso
iniciar um processo eficaz de
desenraizamento das
ideologias de cunho
predatório, de uma exploração
irresponsável e desenfreada,
pautada unicamente no
suprimento de necessidades
efêmeras e pouco efetivas, cujo
objetivo maior é a ostentação
de um padrão social de vida,
de um status quo conferido em
nossa sociedade onde o
indivíduo é mais notório e
respeitável por aquilo que
possui e não pelas
características morais e éticas
que o constituem enquanto
sujeito que utiliza suas
habilidades e competências no
tempo e no espaço, para
exercer seus atributos e
conceitos, não como produto
de ideologias consumeristas de
cunho consuetudinário
altamente prejudiciais.
Na religiosidade
tradicional africana, existem, a
depender da localidade
geográfica, as divindades
ligadas à natureza e seus
elementos, a saber, os orixás,
os voduns e os inquices. Os
orixás têm sua origem na
tradição cultural ioruba, os
voduns têm ligação com o povo
jêje e os inquices têm como
matriz principal a cultura
banto.
Os sacerdotes destas
religiões têm como função
primordial a ligação entre os
seres humanos e as divindades
superiores. Assim sendo, seu
papel social em traduzir
oralmente as diversas
histórias, míticas ou não, os
conhecimentos sobre os
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elementos naturais, as plantas,
as ervas medicinais ou
ritualísticas, os animais, e os
procedimentos e rituais dentre
outras tradições é de
importância fundamental na
transmissão dos
conhecimentos dentro da
sociedade. A esses sacerdotes
chamamos de babalorixá,
quando o sacerdote é do sexo
masculino e ialorixá quando é
uma sacerdotisa.
Os orixás e seus domínios
naturais: o sincretismo da
religião com os movimentos
migratórios e modelos de
exploração ambiental
Pensar as relações sociais
nesta conjuntura é, na
verdade, dotar de diversas
significações o mundo
mitológico e a própria gênese
da criação. A professora Dra.
Denise Botelho em seu texto
Religiosidade Afro-
brasileira: a experiência do
candomblé analisa essa
relação da seguinte maneira:
“Ao descrever as origens do universo e das criaturas, as relações entre os seres humanos e as divindades e, ainda, como se dá o equilíbrio dinâmico entre eles, o mito de cada divindade dota de sentido o mundo e fornece um sistema de valores e de princípios para os seus seguidores.”
Dentro do panteão
tradicionalmente africano,
incorporado por algumas de
nossas religiões afro-
brasileiras mais eminentes, a
análise de determinadas
características e da
personalidade dos orixás
(inquices ou voduns a
depender da matriz étnica)
refletem a importância dos
seus domínios naturais. Antes,
é preciso entender o que é um
orixá e quais suas atribuições.
Orixá é uma palavra que
deriva de dois radicais iorubas,
a saber, ori (cabeça ou coroa) e
xá (luz). Desta feita, o orixá é o
ser espiritual responsável pela
proteção de determinados
ambientes, elementos ou
forças naturais, que se
integram na complexidade do
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universo, sendo sua relação
determinante para diversos
atos da vida cotidiana. É de
imensa importância se analisar
que a relação com o orixá, que
diferentemente de outras
religiões tem sentimentos e
feitos que misturam
características humanas e
divinas, este tem
discricionariedade, ou seja, seu
ori, seu pensamento, guia ou
fundamento norteador, é que
decidirá se determinado
pedido deverá ou não ser
executado e sob quais moldes
assim deverá ser feito.
É absolutamente
relevante se fazer notar que o
candomblé, a umbanda e
outras religiões de matrizes
africanas são monoteístas,
sendo Olodumaré ou Olorun
(no caso do candomblé de
matriz ioruba – mais difundido
no Brasil) o deus maior dentro
do panteon africano
tradicional, o ser incriado, se
expressando como a energia
que cria todas as coisas no
universo, sendo os demais
orixás, divindades de segunda
geração, como vibrações de
diferentes amplitudes
relacionando-se a diferentes
dimensões, domínios,
características e áreas de
atuação. Assim sendo,
BOTELHO expressa que:
“O candomblé é uma religião monoteísta. Olodumare – o Supremo Criador do Universo – é auxiliado no grande projeto de perpetuação da humanidade pelas divindades do panteon iorubá – os orixás. Tais divindades são acionadas por rituais preparatórios e o momento da absoluta sacralidade se dá quando os orixás expressam suas histórias mitológicas aos sons de atabaques e outros instrumentos, bem como das cantigas que retratam as características e feitos dessas divindades.”
É mister se fazer saber
que nenhum orixá deve ser
adorado isoladamente, tendo
em vista que todos interagem
entre si e mantem, assim como
os seres humanos, relações
interpessoais e sentimentos de
proximidade entre si e com os
seres humanos, buscando o
equilíbrio.
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Apesar de a incorporação
dos orixás ser condição de
integração, de comunicação
entre Orun (ou Orum) e Ayé
(ou Ayê), nem todos os orixás
incorporam (estado de transe)
de tal maneira que, se
estudarmos as religiões de
matrizes africanas
observarmos que nem
Olodumaré, o deus maior, nem
o Iroko, orixá tipificado na
forma de árvore incorporam
uma vez que Olodumaré é a
energia inicial e o Iroko
representa a ligação da
humanidade com sua
ancestralidade, ou seja, com as
almas desencarnadas que se
encontram em um espaço
diferente de nosso corpóreo,
físico.
Segundo WALDAN e
SERRANO (2010), ao analisar
o capítulo sobre religiosidade
africana:
“Para o africano, de um ponto de vista ontológico, a vida social insere-se, na sua totalidade, numa constante busca de equilíbrio. Seu pressuposto é um sistema
de forças – incluindo deuses, ancestrais e mortos das linhagens – que se expressa desde os tempos primordiais até a sociedade presente, segmentada em espaços como o étnico, clânico, das linhagens e aldeão. Esse sistema estabelece uma hierarquia de estruturas baseadas em critérios de ancianidade, uma qualidade social referendada por esta mesma visão ontológica”(pág. 137)
É de grande interesse que
se perceba algumas questões
análogas ou decorrentes,
talvez, do processo de
sincretismo, que ocorreu entre
as religiões de matrizes
africanas e as demais religiões
com suas respectivas
divindades.
O número 7
Sete são os orixás
derivados de Oxalá, sete são as
cores do arco-íris, sete são os
pontos de energia (conforme
poderá ser percebido no índice
de imagens constantes no
anexo deste texto), sete são as
notas musicais e os dias da
semana.
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Importante se fazer notar
que as religiões de matrizes
africanas sofreram, entre si, o
processo de sincretismo, para
que não se pense que esse
processo se deu unicamente de
maneira a considerar como
padrões mínimos o candomblé
ou a umbanda e a matriz
judaico-cristã.
Na perspectiva da
louvação aos deuses, é
importante que haja
confluência, ou seja, que todos
se empenhem na obtenção da
evolução e que nós, os
humanos demos cumprimento
a todas as obrigações,
respeitemos as interdições e
limitações a que estamos
naturalmente vinculados
percebendo, entretanto,
possibilidades de crescimento
efetivo, factível e não apenas
iniciarmos divagações e
conjecturas. Não se deve pedir
a apenas um dos orixás mas
pedir que todos deem anuência
à possibilidade de obtenção de
determinado pedido em
conjunto, permitindo que o
desejo, a aspiração seja
percebida como possível e que
seja mostrada enquanto viável
entre eles.
Conclusão
Longe de ser apenas uma
espécie de categorização, o
sujeito negro no Brasil passa
por uma série de processos
muitas vezes concomitantes ou
alternantes de negação e
aceitação, da noção de
pertencimento e exclusão, das
dúvidas constantes, de
processos impostos de
silenciamento, processos de
embranquecimento que
cominam numa identidade que,
a cada dia, vem se formatando
paradoxalmente enquanto
instrumento de resistência, de
força, denúncia, de lutas
contra as desigualdades num
país de dimensões continentais
e abismos sociais cuja
amplitude é proporcional
àquele.
Implantar, de maneira
séria, as diretrizes regentes da
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identidade negra é resgatar o
respeito retirado de nossos
antepassados, é devolvê-los ao
seio da sociedade brasileira
exaltando suas potencialidades
exercidas e seu legado deixado
a nós negros, em especial aos
negros de pele branca, que não
permite que sejamos
novamente silenciados ou que
recebamos silenciosamente
algumas críticas e
desclassificações por nossas
características sócio históricas
ou genéticas deveras
particulares.
Aceitar-se como negro é
assumir uma postura
ideológica que se aproxima da
valorização do ser humano e
da multiplicidade das
características sociais,
econômicas e culturais
(religiosa, linguística, política,
estrutural) fazendo-se
perceber que as diferenças não
excluem a possibilidade de
crescimento, quer seja
espiritual, quer seja
materialmente.
Referências
Textos sugeridos
1. BRASIL. Constituição da
República Federativa do
Brasil. 1988. Vade
Mecum. 2011. Editora
Saraiva.
2. SERRANO, Carlos e
WALDMAN, Maurício.
MEMÓRIA D’ÁFRICA –
A temática Africana em
sala de Aula. 2010. 3ª
Edição. São Paulo.
Editora Cortez.
3. A lenda da Criação.
Disponível em:
http://odeigbo.webs.com/
olorumouolodumar.htm
4. Candomblé - Um pouco
de história. Disponível
em:
http ://odeigbo.webs.com /
5. 7 Orixás da Umbanda.
Disponível em:
http :// www.paimaneco.or
g.br/orixas/orixas-da-
umbanda
Contatos: [email protected]
6. As Sete Linhas. Disponível em: http ://casaiemanjaiassoba .com.br/setelinhas.html
7. 7 Orixás da Umbanda. Disponível em: http ://www.paimaneco.or g.br/orixas/orixas-da-umbanda. Acessado em: 23/08/2012.
8. Os Orixás. Disponível em: http ://www.caboclopery.c om.br/os_orixas.htm. Acessado em: 23/08/2012.
9. Exús. Disponível em: http ://xango.sites.uol.com .br/exus.html. Acessado em: 23/08/2012.
10. Nações Ketu Jeje e Angola: O CANDOMBLÉ COMO SISTEMA DE TRANSMISSÃO DE IDENTIDADE In: Orixás, Umbanda e Candomblé. Disponível em: http ://wwworixas.blogspo t.com/2010/05/nacoes-ketu-jeje-e-angola.html. Acessado em: 23/08/2012.
11. FERNANDES, Fernando. Marte, Jorge da Capadóciae Ogum do Brasil. O
sete e a varinha mágica de Ogum. Disponível em: http ://www.constelar.com .br/revista/edicao37/jorge5.htm
12. OLIVEIRA, Aurea. IBEJI - ERÊ - CÓSME E DAMIÃO In UMBANDA ON LINE. Disponível em: http ://wwwumbandaonlin e.blogspot.com/2008/05/ibeji-er-csme-e-damio.html
13. Fonte Estudo Religioso. Disponível em: http ://estudoreligioso.wor dpress.com/2008/07/24/nacoes-da-umbanda/
14. MESTRE FREITAS. Disponível em: http ://axeforteor.dominiot emporario.com/mestre_freitas_91.html. Acessado em: 26/08/2012
15. Juremeiro Mestre NetoGoiânia – Goiás.Disponível em: http ://juremeironeto.blog spot.com/
16. BOTELHO, Denise. RELIGIOSIDADE AFRO-BRASILEIRA: a experiência do candomblé. In: Educação Africanidades - Brasil, MEC.
Contatos: [email protected]
17. BRASIL. Lei 7.716/89. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7716.htm. Acessado em: 26/08/2012.
18. BRASIL. Lei 10.639/10. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm. Acessada em 26/08/2010.
19. BRASIL. Lei 11.645/10. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm. Acessado em: 26/08/2012.
20. BRASIL. Lei 12.288/10. Disponível em: http://www.leidireto.com.br/lei-12288.html. Acessado em: 26/08/2012.
21. LIMA, Jonathan Reginnie de Sena. Direitos e Garantias Fundamentais: Uma análise sócio-antropológica do surgimento e implantação dos Direitos Humanos. 2012. Disponível em: http://www.jurisway.org.b
r/v2/dhall.asp?id_dh=7621. Acessado em 06/09/2012.
Vídeos sugeridos
1. Preconceito e racismo na escola - Parte 1. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=SP1ZX47muUE. Acessado em: 15/08/2012.
2. Sagrado no Mais Você [Rede Globo] - Cultos Afro (Candomblé Umbanda) - Parte 01. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=RsWOKL6Fesk. Acessado em: 23/08/2012.
3. Sagrado no Mais Você [Rede Globo] - Cultos Afro (Candomblé Umbanda) - Parte 02. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=h6AIXpNuU0U. Acessado em: 23/08/2012.
4. Makota Valdina - Um Jeito Negro de Ser e
Viver – Completo. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=9X-
Contatos: [email protected]
tqRFwEKk&feature=related. Acesso em: 23/08/2012.
5. A IGUALDADADE RACIAL e a INTOLERÂNCIA RELIGIOSA - Ricardo
Barreira. Disponível em:
http://www.youtube.com/watch?v=Trch___RvG0. Acessado em 23/08/2012.
6. Bença, entrevista com
Makota Valdina. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=P0ziJx0KWRE&feature=related. Acessado em 23/08/2012.
7. Pleno - STF julga constitucional política de cotas na UnB (1/4). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=ZbOcW5oF2fQ&feature=relmfu. Acessado em 25/08/2012.
8. Pleno - STF julga constitucional política de cotas na UnB (2/4). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=vjPZmCRRcTc&feature
=relmfu. Acessado em: 25/08/2012.
9. Pleno - STF julga constitucional política de cotas na UnB (3/4). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=5rP1zG5m6UU&feature=relmfu. Acessado em: 25/08/2012.
10. Pleno - STF julga constitucional política de cotas na UnB (4/4). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=HVNM9Fu5qms&feature=relmfu. Acessado em: 25/08/2012.
11. Minha Fé - Zeca Pagodinho Ao Vivo - DVD MTV - 2010 - HDTV.Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=fl4sSBjHQJ0. Acessado em 25/08/2012.
12. Margareth Menezes - Cordeiro de Nanã/Deixa a Gira Girar/Atabaque Chora. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=OyIsfdwhQRE. Acessado em 26/08/2012.
Contatos: [email protected]
Anexos
Textos
Espectros
Jonathan Reginnie
E no silêncio dos inocentes
Pela força dos grilhões
Renegando nossos nomes
Nossa cor e tradição,
Nossos deuses tão presentes
Nossa voz se faz ausente
Sangram nossos corações
Que os Orixás perdoem
Nossas falhas e inconstâncias,
Zumbi, que do alto ecoa
Como herói que não se cansa
Ganga Zumba e sua lança
Sua força e importância
Emergem dos corações
É na força do guerreiro
Na cor de nossas lembranças
Que Xangô demonstra os feitos
Com as falas, com as danças
Mostrando riqueza e graça
A sublime e iluminada
Cor do povo de Aruanda
Oxalá, meu pai amado
Me ilumina sempre atento
Olodumaré nos dá
Força, fé e provimento
Iansã, grande rainha
Olha pela vida minha
Do alto do firmamento
Ogum, Oxóssi, Ibeji, Nanã
Iaôs dançam com os atabaques
O babalorixá reinou
No terreiro iluminado
Quanto axé dos agogôs
Nos guiam em nosso caminho
E protegem nossos passos
Que o Yroko sagrado
Nos conecte aos ancestrais
Que a cultura nos permita
Viver com amor e paz
Que a importância de outrora
Nos permita ainda agora
Falar com os ancestrais
Respeite minha cultura
Minha cor, minha mensagem
Não desvirtue a realidade
Cor não mede capacidade
Não fragmente a identidade
Nunca tente silenciar
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Minha ancestralidade.
Contatos: [email protected]
Resgate afro-brasileiro
Claudiane Caroline A. Wanderley
Conta a história que nas terras africanas numa cidade chamada IféNasceu a religião afro-brasileira denominada CandombléTrazida para o Brasil pela nação iorubaViajando pelos mares sob a proteção de Yemanjá
Em seu culto à natureza, com suas divindades geniosasCandomblé é a religião afro-brasileira mais influente do paísOnde as mães e pais de santo são canais dos orixásEnsinando a humanidade o que fazer pra ser feliz
Olodumaré é o grande criador, de todo o Orum ele é senhor Ogum é orixá guerreiro, vai à frente do caminho, pioneiroOxossi é caçador, dos animais o grandioso protetorOssain detém o poder do axé, filho caçula de YemanjáNanã controla a lama e os pântanos e as águas paradas está sempre a governar
Oxumaré é o arco-íris, entre terra e céu transporta a águaOrixá da beleza é Logunedé, seis meses vive como homem e os outros seis como mulherOmolú ou Obaluaiê representa as doenças contagiosas, mas também a sua curaYroko é dono do tempo e do espaço, decide o início da vida e o quanto ela dura
Obá, orixá corajosa, mulher de Xangô, não era bonita e nem fazia questão de ser formosaEnquanto a majestosa Oxum representa beleza, maternidade, fertilidade e riquezaXangô é orixá do trovão e da justiça, orgulhoso, autoritário e ao mesmo tempo generoso
Yansã é senhora dos ventos e da tempestade e junto com Xangô manda no elemento fogo
Ewá é uma bela virgem que protege tudo que nunca foi tocado, aquilo que é inexploradoYemanjá é senhora do mar e dos oceanos e a mãe de todos os orixásQuem gosta de cachaça é Exu, quem veste branco é OxaláDo Candomblé nasceu o culto à natureza através dos Orixás!
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Assim nasceu o Candomblé
“No começo não havia separação entre o Orum, o Céu dos orixás, e o Aiê, a Terra dos humanos. Homens e divindades iam e vinham, coabitando e dividindo vidas e aventuras. Conta-se que, quando o Orum fazia limite com o Aiê, um ser humano tocou o Orum com as mãos sujas. O céu imaculado do Orixá fora conspurcado. O branco imaculado de Obatalá se perdera. Oxalá foi reclamar a Olorum. Olorum, Senhor do Céu, Deus Supremo, irado com a sujeira, o desperdício e a displicência dos mortais, soprou enfurecido seu sopro divino e separou para sempre o Céu da Terra. Assim, o Orum separou-se do mundo dos homens e nenhum homem poderia ir ao Orum e retornar de lá com vida. E os orixás também não podiam vir à Terra com seus corpos. Agora havia o mundo dos homens e o dos orixás, separados. Isoladas dos humanos habitantes do Aiê, as divindades entristeceram. Os orixás tinham saudades de suas peripécias entre os humanos e andavam tristes e amuados. Foram queixar-se com Olodumare, que acabou consentindo que os orixás pudessem vez por outra retornar à Terra. Para isso, entretanto, teriam que tomar o corpo material de seus devotos. Foi a condição imposta por Olodumare. Oxum, que antes gostava de vir à Terra brincar com as mulheres, dividindo com elas sua formosura e vaidade, ensinando-lhes feitiços de adorável sedução e irresistível encanto, recebeu de Olorum um novo encargo: preparar os mortais para receberem em seus corpos os orixás.
Oxum fez oferendas a Exu para propiciar sua delicada missão. De seu sucesso dependia a alegria dos seus irmãos e amigos orixás. Veio ao Aiê e juntou as mulheres à sua volta, banhou seus corpos com ervas preciosas, cortou seus cabelos, raspou suas cabeças, pintou seus corpos. Pintou suas cabeças com pintinhas brancas, como as pintas das penas da conquém, como as penas da galinha-d’angola. Vestiu-as com belíssimos panos e fartos laços, enfeitou-as com jóias e coroas. O ori, a cabeça, ela adornou ainda com a pena ecodidé, pluma vermelha, rara e misteriosa do papagaio-da-costa. Nas mãos as fez levar abebés, espadas, cetros, e nos pulsos, dúzias de dourados indés. O colo cobriu com voltas e voltas de coloridas contas e múltiplas fieiras de búzios, cerâmicas e corais. Na cabeça pôs um cone feito de manteiga de ori, finas ervas e obi mascado, com todo condimento de que gostam os orixás. Esse oxo atrairia o orixá ao ori da iniciada e o orixá não tinha como se enganar em seu retorno ao Aiê. Finalmente as pequenas esposas estavam feitas, estavam prontas, e estavam odara. As iaôs eram as noivas mais bonitas que a vaidade de Oxum conseguia imaginar. Estavam prontas para os deuses. Os orixás agora tinham seus cavalos, podiam retornar com segurança ao Aiê, podiam cavalgar o corpo das devotas. Os humanos faziam oferendas aos orixás, convidando-os à Terra, aos corpos das iaôs. Então os orixás vinham e tomavam seus cavalos. E, enquanto os homens tocavam seus tambores, vibrando os batás e agogôs, soando os xequerês e adjás, enquanto os homens cantavam e davam vivas e aplaudiam, convidando todos os humanos
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iniciados para a roda do xirê, os orixás dançavam e dançavam e dançavam. Os orixás podiam de novo conviver com os mortais. Os orixás estavam felizes. Na roda das feitas, no corpo das iaôs, eles dançavam e dançavam e dançavam. Estava inventado o candomblé.”
Disponível em: http://www.alaketu.com.br/ritos/festas.htm. Acessado em 26/08/2012.
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Coisa de Pele
Jorge Aragão
Podemos sorrir, nada mais nos impedeNão dá pra fugir dessa coisa de peleSentida por nós, desatando os nósSabemos agora, nem tudo que é bom vem de fora
É a nossa canção pelas ruas e bares queNos traz a razão relembrando PalmaresFoi bom insistir, compor e ouvirResiste quem pode à força dos nossos pagodes
E o samba se faz, prisioneiro pacato dos nossos tantãsE um banjo liberta da garganta do povo as suas emoçõesAlimentando muito mais a cabeça de um compositorEterno reduto de paz, nascente das várias feições do amor
Arte popular do nosso chão... é o povo quem produz o show e assina a direçãoArte popular do nosso chão... é o povo quem produz o show e assina a direção
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Imagens
Figura 1. Orixás dançando ao redor do Iroko que figura o centro da imagem. Os deuses do panteon africano são interdependentes e harmônicos.
Figura 2. Ibejis, espíritos de crianças que são existentes nas religiões de matrizes africanas. Assim como existem anciãos, as crianças são importantes na compreensão da dinâmica social e na lógica das populações africanas, em especial àquelas que se aproximam da africanidade (que alguns autores preferem chamar África Negra ou África Subsaariana).
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Figura 3. Esta divindade é responsável pelo ensino de uma integridade inabalável à humanidade, assim sendo, grande parte do referencial ético-moral decorre de seus ensinamentos.
Figura 4. Exú, o deus de comunicação e do movimento entre o ser humano e os orixás. É responsável por organizar os orixás nos processos ritualísticos de incorporação pelo iniciado (transe).
Figura 5. É a deusa considerada como a mãe ancestral sendo responsável pelo conhecimento.
Figura 6. É uma deusa guerreira que representa a energia e a força.
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Figura 7. É o grande responsável por abrir os caminhos, sendo coparticipe, junto com os seres humanos, na evolução espiritual e na construção de um Universo melhor.
Figura 8. É o deus responsável pelas curas e pelas doenças. Sua aparência desfigurada por uma varíola fez com que houvesse a necessidade de cobrir seu rosto a fim de que pudesse ser incorporado mais facilmente ao cotidiano dos demais orixás.
Figura 9. Versão jovial de Oxalá, o primeiro deus que foi criado como vibração de Olodumaré. É viril e galanteador.
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Figura 10. Versão anciã de Oxalá, adorado pela sua enorme responsabilidade, sabedoria e por ser o mais velho orixá de segunda geração.
Figura 11. É o provedor das necessidades dos seres humanos e, nessa condição, é admirado por ser responsável pela fartura nas mesas dos homens.
Figura 12. É responsável pela distribuição das riquezas e pela concessão da prosperidade aos seres humanos, desempenhando papel importantíssimo na dinâmica social.
Figura 13. É o orixá que se apresenta na forma de uma serpente que representa o arco-íris.
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Figura 14. Oya-Iansã é a deusa cuja atribuição se liga com os ventos e as tempestades. É responsável também por auxiliar os espíritos desencarnados no caminho do Ayé (a terra dos humanos) ao Orun (o céu dos orixás).
Figura 15. É a rainha dos domínios das águas salgadas, a grande mãe que com seus seios alimenta seus filhos.
Figura 16. Yroko – É um orixá que nunca incorpora, pois é responsável pela instituição do vínculo simbólico dos seres humanos encarnados com a ancestralidade.
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