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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
Leitura e Análise Linguística: a abordagem de crônicas no Ensino Fundamental
Simone Müller1
Orientadora: Sonia Merith Claras2
Resumo: Este artigo traz reflexões e mostra os resultados obtidos na utilização de diferentes recursos didáticos como pesquisa, slides, vídeos, música, textos para leitura e análise linguística de crônicas, em turma do 9º Ano do Colégio Estadual do Campo de Rio da Prata, de Nova Laranjeiras, Paraná. Durante os
últimos anos, foi possível perceber, nas atividades em sala de aula e através dos índices de avaliações externas, que os estudantes demonstram dificuldade em práticas de leitura que exigem um nível além da decodificação. Diante da concepção de linguagem como uma forma de interação/dialógica, é importante criar oportunidades para o estudante refletir, construir, considerar hipóteses a partir da leitura e análise linguística de diferentes textos que deverão trazer sensibilidade, fascinar e encantar, mas também promover o interesse e o desejo para a reflexão. Assim, objetivou-se abordar a leitura de diferentes crônicas, na busca de uma construção de sentidos que focalize a reflexão acerca da linguagem, ou seja, análise linguística. Palavras-chave: Ensino de Língua Portuguesa; Leitura; Análise Linguística; Crônica.
1 INTRODUÇÃO
Uma das maiores necessidades do mundo globalizado é que indivíduos
aprendam a compreender amplamente o seu meio e, para isso, faz-se
necessário utilizar mecanismos que proporcionem essa compreensão.
A comunicação é o motor da inter-relação entre os homens. Ela é
contínua, permanente e de certa forma obrigatória. A linguagem é o
combustível da comunicação e um instrumento que o indivíduo utiliza desde o
nascimento até os mais elevados níveis de aperfeiçoamento intelectual. Sendo
assim, é fundamental, em todos os âmbitos, o domínio da língua falada e
escrita.
1 Professora de Língua Portuguesa e Língua Estrangeira Moderna- Inglês do Ensino Fundamental da rede
pública do Estado do Paraná, Núcleo Regional de Educação de Laranjeiras do Sul, participante do Programa de Desenvolvimento Educacional- PDE.
2 Professora do Departamento de Letras da UNICENTRO. Doutora em Estudos da Linguagem pela UEL.
Na visão de Silva (1994, p.24),
Em essência, a leitura caracteriza-se como um dos processos que possibilita a participação do homem na vida em sociedade, em termos de possibilidade de transformação sociocultural futura. E, por ser um instrumento de aquisição, transformação e produção de conhecimento, a leitura, se acionada de forma crítica e reflexiva dentro ou fora da escola, levanta-se como um trabalho de combate à alienação, capaz de facilitar às pessoas e aos grupos sociais a realização da liberdade nas diferentes dimensões da vida.
Adquirir habilidades em leitura é sempre um desafio e requer dedicação
do professor ao desenvolver atividades que estimulem o gosto pela leitura e
que visem à superação das defasagens, fazendo os alunos serem melhores
observadores dos fatos e da realidade, despertando interesse pelas leituras.
Ler um texto implica não só em aprender o seu significado, mas também
em trazer para esse texto a experiência e a visão de mundo do leitor. Nesse
processo dinâmico, pode priorizar a formação de um leitor crítico e criativo e a
formação desse leitor não depende exclusivamente da escola, mas cabe a ela
uma parcela da responsabilidade desse trabalho.
Diante da necessidade de transformar a leitura em algo agradável,
significante e que realmente leve os estudantes a construírem novas
significações, refletirem, capacitando-os e transformando-os em leitores
críticos, optou-se então, pela leitura do gênero crônica, por ser um texto
organizado de forma não muito extensa, relacionado a fatos do cotidiano.
O objetivo desse trabalho é incentivar a prática de leitura através de
crônicas e reconhecer a força da linguagem, seus sentidos e significados,
visando reflexão e criticidade por meio da análise linguística. Partindo da
premissa da indissociabilidade das práticas pedagógicas e explorando, com
maior intensidade, as práticas de leitura e análise linguística como
sinalizadoras dos sentidos que podem ser construídos a partir dos discursos
materializados nos textos, coloca-se como questão norteadora deste trabalho:
A leitura e a análise lingüística de crônicas contribuirão para que os estudantes
passem a ter maior interesse pela leitura, tornando-se leitores atentos e
críticos?
Sabe-se que as atividades pedagógicas, nas aulas de Língua
Portuguesa, devem considerar as práticas de leitura, escrita, oralidade e
análise linguística inter-relacionadas e, também, que a prática da leitura só se
dará efetivamente quando os estudantes construírem significados a partir do
que leem. Portanto, a análise linguística será uma ferramenta indissociável do
ensino e aprendizagem de leitura. Tem-se como pressuposto que pela análise
dos aspectos linguísticos e discursivos e sinalizadores de sentido que podem
ser construídos, os estudantes passem a ver e ter a leitura como algo que
acrescente conhecimentos.
De acordo com as Diretrizes Curriculares para a Educação Básica do
Paraná (DCEs - 2008, p.60),
os alunos trazem para a escola um conhecimento prático dos princípios da linguagem, que assimilam pelas interações cotidianas e usam na observação das regularidades, similaridades e diferenças dos elementos linguísticos empregados em seus discursos. O trabalho de reflexão linguística a ser realizado com esses alunos deve voltar-se para a observação e análise da língua em uso, o que inclui morfologia, sintaxe, semântica e estilística; variedades linguísticas; as relações e diferenças entre língua oral e língua escrita, querem no nível fonológico-ortográfico, quer no nível textual e discursivo, visando à construção de conhecimentos sobre o sistema linguístico.
Diante da concepção de linguagem como uma forma de
interação/dialógica é importante criar oportunidades para o estudante refletir,
construir, considerar hipóteses a partir da leitura e análise linguística de
diferentes textos, para que se possa chegar à compreensão de como a língua
funciona. Assim, o trabalho de análise e reflexão na e sobre língua constitui-se
como uma prática fundamental para que os estudantes tomem consciência da
língua portuguesa refletindo sobre os seus diversos usos. “Busca-se, na
análise linguística, verificar como os elementos verbais (os recursos
disponíveis da língua), e os elementos extraverbais (as condições e situação
de produção) atuam na construção de sentido do texto” (PARANÁ, 2008, p.60).
Segundo Antunes (2003, p.67),
A atividade de leitura completa a atividade da produção escrita. É, por isso, uma atividade de interação entre sujeitos e supõe muito mais que a simples decodificação dos sinais gráficos. O leitor, como um dos sujeitos da interação, atua participativamente, buscando recuperar, buscando interpretar e compreender o conteúdo e as intenções pretendidas pelo autor.
De uma experiência significativa, surge a possibilidade de conhecer algo
novo, uma relação que resulta em conhecimento, transformação e capacidade
de reflexão. Sabe-se que o êxito na leitura, depende em grande parte da
orientação que o estudante recebe do professor. Tendo as crônicas como
instrumento e utilizando-se das várias possibilidades de leitura, o aluno leitor
terá condições de adquirir novos e significativos conhecimentos que lhe
proporcionarão uma visão mais ampla e amadurecida diante do mundo, que
contribuirá para torná-lo capaz de como cidadão crítico, participar do processo
de desenvolvimento da sociedade e posicionar-se diante dos fatos de forma
reflexiva. Consequentemente, tal hábito poderá se estender aos diversos
gêneros literários levando a uma prática constante.
Com base nas Diretrizes Curriculares da Educação Básica Língua
Portuguesa, e em alguns autores importantes para a proposta, este artigo
apresenta uma possibilidade de trabalho que busca oferecer situações que
possam suscitar nos alunos o interesse pela leitura, bem como ampliar as suas
capacidades, a fim de que se tornem leitores autônomos. A leitura e a análise
linguística de crônicas deverão trazer sensibilidade, fascinar e encantar, mas
também promover o interesse e o desejo para a reflexão.
2 REVISÂO DE LITERATURA
2.1 Concepções de Linguagem e o ensino de leitura em Língua
Portuguesa
A linguagem sempre foi utilizada pelo homem em sua comunicação e
passou por várias adaptações e modificações ao longo do tempo. Na
contemporaneidade, a linguagem é o local das relações sociais em que os
falantes atuam como sujeitos e a leitura é vista como co-produtora de sentidos.
Nem sempre as metodologias utilizadas no processo de leitura são
conhecidas ou consideradas pelos envolvidos no processo de ensino e
aprendizagem dessa prática pedagógica. É muito importante ter consciência
dos fatores cognitivos que estão envolvidos nesse processo e, além destes,
há, também, os aspectos externos, sociais, históricos, ideológicos e
linguísticos.
De acordo com Geraldi (1991), “toda e qualquer metodologia de ensino
articula uma opção política - que envolve uma teoria da compreensão e
interpretação da realidade – com os mecanismos utilizados em sala de aula”
(p.42), pois, ainda para o autor, o eixo norteador do trabalho do professor, em
sala de aula, diz respeito à sua concepção de linguagem. Assim, é importante
discorrer alguns pontos sobre o objeto da pesquisa, que tem como concepção
de linguagem a perspectiva interativa-dialógica.
A leitura constitui uma das atividades mais importantes na retenção do
saber, de acordo com as DCEs (2008), “ ... compreende-se a leitura como um
ato dialógico, interlocutivo, que envolve demandas sociais, históricas, políticas,
econômicas, pedagógicas e ideológicas de determinado momento”(p.56).
Por fazer parte das práticas discursivas das diferentes esferas sociais, a
leitura é responsável pelas variadas possibilidades de entender o texto, os
sentidos, as intenções e as visões de mundo, assim como a reflexão e uso da
linguagem nas mais diferentes situações. Sendo assim, as possibilidades de
leitura se traduzem nas várias formas de se estabelecer o processo de
interlocução entre leitor e autor através do texto.
As atividades de leitura, para que façam sentido para o aluno, devem
responder a objetivos de realização imediata, resolver um problema prático,
informar-se, divertir-se, etc. Para tal, é necessário trabalhar com a diversidade
de textos e de combinações entre eles, trabalhar com a diversidade de
objetivos e modalidades que caracterizam a leitura, com as diferentes formas
de leitura em função de diferentes objetivos e gêneros, ler buscando as
informações relevantes, com o significado implícito nas entrelinhas, ou dados
para a solução de um problema, entre outros.
2.2 Gêneros do discurso: linguagem e interação
Os gêneros discursivos são os conteúdos básicos nas práticas de leitura
e são selecionados pelo professor de acordo com as esferas sociais de
circulação, abrangendo além dos textos escritos e falados, a integração da
linguagem verbal com outras linguagens.
Pode-se considerar que o discurso se manifesta através de textos e
todos os textos se materializam ou concretizam em diferentes gêneros.
De acordo com Marcuschi (2006, p. 25),
Todas as nossas manifestações verbais mediante a língua se dão como textos e não como elementos lingüísticos isolados. Esses textos são enunciados no plano das ações sociais situadas e históricas. Bakhtinianamente falando, toda a manifestação linguística se dá como discurso, isto é, uma totalidade viva e concreta da língua e não como uma abstração formal que se tornou o objeto preferido e legítimo da linguística.
É possível dominar bem a língua e não participar efetivamente de
determinada esfera de comunicação ou atividade humana, se não conhecer o
gênero que ela requer, ou seja, cada esfera de atividade humana exige um
domínio discursivo.
O estudo de textos, muitas vezes, torna-se complexo, pois pertence a
um determinado gênero, com uma forma própria, porém o conhecimento das
formas discursivas e estilo do gênero é importante para o conhecimento do
aluno conforme enfatiza Bakhtin (2003, p. 285):
Quanto melhor dominamos os gêneros tanto mais livremente
os empregamos, tanto mais plena e nitidamente descobrimos
neles a nossa individualidade (onde isso é possível e
necessário), refletimos de modo mais flexível e sutil a situação
singular da comunicação; em suma, realizamos de modo mais
acabado o nosso livre projeto de discurso.
O professor deve selecionar e oferecer materiais estimulantes e de boa
qualidade, de preferência quando os alunos não encontram motivação para
participar de práticas de leitura essenciais. Possivelmente será uma
oportunidade singular para que os alunos possam interagir de forma
significativa com textos onde a finalidade não seja apenas a resolução de
pequenos problemas do cotidiano.
É preciso, portanto, oferecer-lhes os textos do mundo. Não se formam
bons leitores solicitando aos alunos que leiam apenas durante as atividades na
sala de aula, apenas no livro didático, apenas porque o professor pede. Eis a
primeira e talvez a mais importante estratégia didática para a prática de leitura,
o trabalho com a diversidade textual. Sem ela pode-se até ensinar a ler, mas
certamente não se formarão leitores competentes.
Lopes-Rossi (2006) afirma que o trabalho pedagógico com gêneros
discursivos proporciona ao aluno o desenvolvimento da autonomia no processo
de leitura e, como consequência, tem o domínio do funcionamento da
linguagem nas situações de comunicação. A autora salienta, ainda, que cabe
ao professor criar as condições para o aluno se aproprie das características
discursivas e lingüísticas de diversos gêneros em situações de comunicação
real.
Para o estudante aperfeiçoar sua capacidade lingüística, o professor, na
sala de aula, deve desenvolver um trabalho tendo como base os gêneros
discursivos. E segundo as Diretrizes Curriculares para a Educação Básica do
Paraná (DCEs - 2008, p.53),
O aprimoramento da competência linguística do aluno acontecerá com maior propriedade se lhe for dado conhecer, nas práticas de leitura, escrita e oralidade, o caráter dinâmico dos gêneros discursivos. O trânsito pelas diferentes esferas de comunicação possibilitará ao educando uma inserção social mais produtiva no sentido de poder formular seu próprio discurso e interferir na sociedade em que está inserido. (PARANÁ, 2008, p.53).
No intuito de dialogar com as DCEs, neste projeto se optou pela
abordagem da crônica a qual contribui para o aprimoramento da competência
lingüística. A crônica é um gênero que tem relação com a ideia de tempo e
consiste no registro de fatos do cotidiano em linguagem literária, conotativa e
possibilita uma forma diferente de se narrar os fatos do cotidiano, é um gênero
híbrido, uma intersecção entre o Jornalismo e a Literatura. Embora o jornal ou
a revista sirvam de suporte para a circulação da crônica, e ela apresente,
muitas vezes, o mesmo assunto tratado em uma reportagem ou notícia, os três
gêneros são bem diferentes, pois a ação prática, a finalidade, entre outros
aspectos, garante que em uma há a finalidade de informar e em outra provocar
uma reflexão através de um conteúdo expresso de forma engraçada.
Assim o gênero discursivo crônica pode contribuir para que o estudante
perceba a grande contribuição da esfera da criação literária e para a formação
ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico.
2.3 Análise Linguística: muito além do ensino de gramática
contextualizada
Por muitos anos o ensino da gramática normativa era o principal objetivo
do professor de língua Portuguesa, mas tal função se mostrou ineficaz, pois
classificar e nomear as estruturas linguísticas não proporcionou ao aluno um
bom desempenho em atividades de leitura e escrita de textos.
As Diretrizes Curriculares para a Educação Básica do Paraná (DCEs -
2008, p.78) ressaltam:
Considerando a interlocução como ponto de partida para o trabalho com o texto, os conteúdos gramaticais devem ser estudados a partir de seus aspectos funcionais na constituição da unidade de sentido dos enunciados. Daí a importância de considerar não somente a gramática normativa, mas também as outras, como a descritiva, a internalizada e, em especial, a reflexiva no processo de ensino de Língua Portuguesa.
Sob este aspecto, atualmente as aulas de língua portuguesa têm como
objetivo central refletir sobre os elementos e fenômenos linguísticos,
priorizando o desenvolvimento das habilidades de falar, ouvir, ler e escrever os
textos. Isso não significa eliminar o estudo das nomenclaturas e classificações
das aulas de língua portuguesa, mas estudar juntamente com a gramática
normativa os aspectos discursivos da língua a partir do texto, portanto, uma
prática nomeada análise linguística.
Segundo Mendonça (2006, p. 205),
O termo análise linguística não foge à regra, ou seja, surgiu para denominar uma nova perspectiva de reflexão sobre o sistema linguístico e sobre os usos da língua, com vistas ao tratamento escolar de fenômenos gramaticais, textuais e discursivos.
Compreende-se, deste modo, as atividades de análise linguística como
um trabalho de reflexão sobre a organização do texto, trabalho este voltado
para que o aluno perceba o texto como resultado de opções feitas pelo autor,
tendo em vista o seu interlocutor. Sob tal enfoque, o texto deixa de ser pretexto
para se estudar a nomenclatura gramatical e a sua construção passa a ser o
objeto de ensino.
A compreensão da importância e da necessidade de que o ensino deixe
de ser descontextualizado e seja fundamentado na reflexão da linguagem, no
aprendizado sistemático do aluno, especialmente, na realidade que ele está
inserido, é fundamental para a realização do trabalho do professor. Pois,
conforme Antunes (2003, p.36),
Já não há mais lugar para o professor simplesmente repetidor, como disse acima, que fica, passivo, à espera de que lhe digam exatamente como fazer, como “passar” ou “aplicar” as noções que lhe ensinaram. Os princípios são o fundamento em que o professor vai apoiar-se para criar suas opções de trabalho. O novo perfil do professor é aquele do pesquisador, que, com seus alunos (e não, “para” eles), produz conhecimento, o descobre e o redescobre. Sempre.
A variedade de recursos expressivos da linguagem é responsável por
ações de reflexividade que permite remeter a si mesma. Geraldi (1997, p.16-
17) explica que,
Com a linguagem não só representamos o real e produzimos sentidos, mas representamos a própria linguagem, o que permite compreender que não se domina uma língua pela incorporação de um conjunto de itens lexicais (o vocabulário); pela aprendizagem de um conjunto de regras de estruturação
de enunciados (gramática); pela apreensão de um conjunto de máximas ou princípios de como participar de uma conversação ou de como construir um texto bem montado sobre determinado tema, identificados seus interlocutores possíveis e estabelecidos os objetivos visados, como partes pertinentes para se obter a compreensão.
A linguagem como forma de interação/dialógica, em suas práticas de
leitura, escrita, oralidade e análise linguística inter-relacionadas, deve ser
trabalhada paralelamente com atividades metalinguísticas e epilinguísticas. A
análise linguística deve se dar de forma reflexiva sobre as normas de uso,
assim como se combinam para produzir efeitos de sentidos de acordo com o
contexto inserido.
Ao distinguir as atividades linguísticas Geraldi (1997) afirma que
atividades linguísticas são as praticadas no processo interacional e referem-se
ao assunto em pauta, as atividades epilinguísticas resultam de uma reflexão
que toma os recursos expressivos como objeto e as atividades metalinguísticas
são as que tomam a linguagem como objeto.
Em outras palavras, na epilinguística a reflexão está voltada para o uso
no interior da atividade linguística. Aqui se faz necessário o planejamento de
situações didáticas que possibilitem a reflexão sobre os recursos utilizados pelo
produtor do texto. Porém, na metalinguística estão voltadas para a análise da
descrição, categorização e sistematização dos elementos linguísticos.
As atividades epilinguísticas agem sobre a própria linguagem, comparam
e transformam as expressões, é uma maneira simples e bastante eficaz de
ensinar língua portuguesa aos alunos, levando-os a uma reflexão sobre a
própria língua e seus recursos, para melhorar o domínio da linguagem nas
mais variadas esferas sociais.
As atividades metalinguísticas são aquelas realizadas conscientemente
pelo sujeito e que exigem habilidades de reflexão e autocontrole, ou seja, trata-
se de uma análise voltada para a descrição, classificação e sistematização dos
elementos linguísticos.
De acordo com as Diretrizes Curriculares para a Educação Básica do
Paraná (DCEs - 2008, p.54),
O estudo dos conhecimentos linguísticos, sob esse enfoque, deve propiciar ao aluno a reflexão sobre as normas de uso das unidades da língua, de como elas são combinadas para produzirem determinados efeitos de sentido, profundamente vinculados a contextos e adequados às finalidades pretendidas no ato da linguagem.
Sendo assim, as práticas cuja tradição determina o ensino da gramática
normativa como foco principal, muitas vezes deixando de lado o
desenvolvimento das habilidades de ler e escrever, imprescindíveis à formação
do aluno, deverão ser abandonadas para que se efetivem práticas de ensino
que focalizem a reflexão sobre a língua da qual os alunos são falantes.
O ensino de gramática contextualizada, não é apenas para mostrar o
que se considera certo ou errado, regras e nomenclaturas gramaticais, mas
para compreensão do que é a língua e do que é gramática e proporcionar a
eficácia discursiva.
Antunes ( 2007, p.22) esclarece que,
A análise linguística possibilita formar cidadãos capazes de compreender os diferentes textos com os quais se defrontam, pois trata do trabalho com questões de gramática e com questões sobre o propósito do texto. Para isso é preciso organizar ensino e aprendizagem para que experimentem e aprendam isso na escola.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
3.1 ANÁLISE DAS ATIVIDADES REALIZADAS
Este artigo relata os resultados obtidos na utilização de diferentes
recursos didáticos como pesquisa, slides, vídeos, música, textos para leitura e
análise linguística de crônicas, em uma turma do 9º Ano do Colégio Estadual
do Campo de Rio da Prata, de Nova Laranjeiras, Paraná.
Com o objetivo de despertar o interesse e a curiosidade dos alunos
sobre leitura e análise linguística de crônicas, realizou-se discussões,
questionamentos e reflexões sobre a importância desse conhecimento,
discussões essas que permitiram que os alunos reconhecessem ou admitissem
a importância da leitura em suas vidas. O questionário sobre seus
conhecimentos em relação à leitura e crônicas proporcionou situação de
“autocrítica”, pois alguns admitiram que nunca tinham observado a frequência
que costumavam realizar leitura que não fosse a solicitada pelos professores e
que realizavam leitura superficial na maioria das vezes, porém ficou óbvia a
preocupação que os próprios alunos têm em relação a isso.
As atividades realizadas sobre “A última crônica” de Fernando Sabino
principalmente as questões de interpretação e análise linguística possibilitaram
observar as primeiras dificuldades interpretativas. Palavras como “depreciativa,
diminutivo, complexa” foram obstáculos para entender os questionamentos em
relação ao vocabulário e análise linguística. Neste momento podemos destacar
a importância da intervenção do professor no processo de leitura. De acordo
com as Diretrizes Curriculares para a Educação Básica do Paraná (DCEs -
2008, p.78),
O professor poderá instigar, no aluno, a compreensão das semelhanças e diferenças, dependendo do gênero, do contexto de uso e da situação de interação, dos textos orais e escritos; a percepção da multiplicidade de usos e funções da língua; o reconhecimento das diferentes possibilidades de ligações e de construções textuais; a reflexão sobre essas e outras particularidades linguísticas observadas no texto, conduzindo-o às atividades epilinguísticas e metalinguísticas, à construção gradativa de um saber linguístico mais elaborado, a um falar sobre a língua.
Após a apresentação do conceito de crônica em slides foi possível que
os alunos fizessem um paralelo comparando as crônicas e identificando cada
uma das características quanto ao gênero discursivo. As atividades
surpreenderam pela facilidade com que os alunos se apropriaram do conceito e
pelo desempenho em relacioná-lo ao texto propriamente dito. As características
do gênero favoreceram decisivamente nesse sentido. Conforme aponta
KÖCHE ( 2012, p.69),
Uma das marcas desse gênero é abarcar o comentário do fato jornalístico, a ficção, a ironia, o humor diante da sociedade e a defesa de ideias, tendo como sempre um olhar crítico e inesperado. A crônica tem uma estrutura livre, e pode valer-se do diálogo, do monólogo, da entrevista, da resenha e de personagens reais ou fictícios.
As atividades em grupo para analisar e identificar o gênero crônica e
suas características, verificar os vários recursos utilizados por diferentes
autores e caracterizar o narrador também transcorreram naturalmente. Cada
grupo realizou a leitura e análise de uma crônica a partir de um roteiro e após a
análise, cada grupo realizou a leitura para a turma da crônica em estudo e
apresentou suas conclusões a partir do roteiro de questões.
As atividades de análise linguística de crônicas tiveram boa
receptividade pelos alunos, alguns chegaram a afirmar que eram “apenas
questões de interpretação”. Isso se deve ao fato de que a análise linguística
trata de reflexão dos recursos lingüísticos e seus efeitos de sentido como
aponta Mendonça (2006). Dessa forma a análise linguística possibilitou refletir
sobre os fenômenos gramaticais textuais e discursivos de maneira
contextualizada e dinâmica.
A análise paralela da notícia de jornal e da crônica produzida a partir da
notícia proporcionou reflexão e comentários sobre o potencial criativo de
cronista e sobre a relação que ainda é possível fazer entre os elementos
composicionais dos dois gêneros textuais
Para a leitura dramatizada de crônicas dividiu-se a turma em grupos e
cada grupo fez uma análise mais aprofundada da crônica. Para a apresentação
de cada grupo foi possível certa “adaptação” da crônica. O desempenho dos
alunos na leitura dramatizada de crônicas foi uma grande surpresa. Tornou-se
concreta a teoria o conceito apresentado por Geraldi (1997), ao escrever sobre
a prática de leitura na escola, explica que a leitura constitui uma forma de
interlocução que se estabelece entre o leitor e o autor, mediada pelo texto. Ele
afirma que, na leitura, o leitor reconstrói o sentido intencionado pelo autor,
dando sua própria significação ao texto lido. Ficou evidente o comprometimento
e o prazer em desenvolver essa atividade.
Para a conclusão da implementação realizou-se a produção de murais e
exposição para a comunidade escolar onde cada grupo faz uma breve
explanação da temática de seu mural. As visitas aos murais foram organizadas
pela equipe pedagógica, que optou por levar uma turma cada vez. Em grupos
menores houve explanação e questionamentos sobre as temáticas. Para
concluir a atividade cada aluno visitante recebeu um “marca página”
relacionado ao tema. Atividade como esta é pouco comuns e talvez por isso foi
bem recebida pelos alunos que aceitaram as lembrancinhas como verdadeiros
presentes.
3.2 SOBRE O GTR
O grupo de Trabalho em Rede, GTR, proporcionou análise, reflexão e
discussão sobre o processo de Ensino e Aprendizagem de leitura. Foi uma
oportunidade interessante de troca de experiência, atividades e pesquisas
sobre a temática e a fundamentação desta pesquisa.
Foi possível perceber que a angústia em relação a leitura superficial
realizada pelos alunos atinge a grande maioria dos cursistas, grupo que
compõe-se não apenas por professores de Língua Portuguesa, mas também
por Pedagogos, professores da Educação Especial e Diretores de escolas. Nos
relatos muda-se o posicionamento, mas os depoimentos compõem-se
igualmente preocupados e empenhados em buscar superar as dificuldades.
De maneira quase unânime, os cursistas concordam quanto à relevância
da pesquisa e da mesma maneira concordam que as práticas cuja tradição
determina o ensino da gramática normativa como foco principal, devem ser
abandonadas para que se efetivem práticas de ensino que focalizem a reflexão
sobre a língua da qual os alunos são falantes.
Foi uma experiência significativa e gratificante que contribui com a
pesquisa além do esperado.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo é resultado das atividades desenvolvidas no Programa de
Desenvolvimento Educacional – PDE no período de 2014 – 2015. A pesquisa
demonstrou a importância e a eficácia da análise linguística de crônicas no
processo de ensino e aprendizagem de leitura.
Alguns obstáculos surgiram durante as atividades que exigiam
conhecimento de vocabulário diferenciado para entender os questionamentos
sendo necessária a intervenção da professora. Neste sentido as atividades de
análise linguística proporcionaram compreensão e reflexão quanto aos
recursos lingüísticos e seus efeitos de sentido, pois trata do trabalho com
questões de gramática e com questões sobre o propósito do texto.
Observou-se que o gênero crônica estimulou os alunos que encontraram
motivação para participar das práticas de leitura e análise linguística. Foi uma
oportunidade singular para que os alunos pudessem interagir de forma
significativa com textos.
Conclui-se com essa pesquisa que a leitura e a análise linguística de
crônicas trazem sensibilidade, fascinam e encantam, promovem o interesse e o
desejo para a reflexão além de contribuir para que os estudantes passem a ter
maior interesse pela leitura, tornando-se leitores atentos e críticos.
As possibilidades de pesquisa não se esgotam aqui, ainda há muitas
possibilidades de abordagens a serem estudadas para desenvolver habilidades
em leitura que é uma prática muito importante, pois possibilita a participação do
homem na vida em sociedade.
5 REFERÊNCIAS ANTUNES, Irandé. Aula de português: Encontro &interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003. ______. Muito além da gramática: por um ensino de línguas sem pedras no caminho. São Paulo: Parábola Editorial, 2007. BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. GERALDI, João Wanderley. Concepções de linguagem e ensino de português. In:GERALDI, J.W. (org.). O texto na sala de aula. 7. ed. São Paulo: Ática, 1991. p.41 – 47.
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