os censores do 25 de abril: o pessoal político da censura...

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ARTIGOS | 77 OS CENSORES DO 25 DE ABRIL: O PESSOAL POLíTICO DA CENSURA à IMPRENSA JOAQUIM CARDOSO GOMES CENTRO DE INVESTIGAçãO MEDIA E JORNALISMO DA FACULDADE DE CIêNCIAS SOCIAIS E HUMANAS DA UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA (CIMJ/ FCSH-UNL) Resumo Neste artigo o autor coloca o problema das fontes para o estudo da censura à imprensa durante o Estado Novo focando, no período do pós-guerra, a persistência do pessoal político exclusivamente militar, com um núcleo duro de oficiais do Exército na direcção da censura. Analisa depois as condições da entrada de civis no aparelho da censura no contexto, da cri- se do regime entre 1958-1962, e do início da Guerra Colonial, identificando o pessoal político, quer a nível da Direcção quer das estruturas intermédias, comissões e delegações. Por fim, no período marcelista, acentua os limites da renovação do pessoal político, com a hegemonia dos coronéis na direcção, e a perda da autonomia funcional da censura na crise final do regime. Palavras-chave: Censura prévia; Salazarismo; Marcelismo; Imprensa; Censores. Abstract In this article the author poses the problem of the sources for the study of press cen- sorship during the “Estado Novo” focusing on the post-war period, the persistence of po- litical personnel exclusively military, with a core group of army officers in the censor- ship board. Then he analyses the conditions of entry of civilians in the apparatus of censorship in the crisis regime of 1958-1962 and the beginning of the Colonial War, identifying the political staff, either at the direction or at the intermediate structures, committees and delegations. Finally, in the period Marcelo Caetano highlights the limits of the renewal of political per- sonnel, the hegemony of the colonels in the direction, and the loss of functional autonomy of censorship in the final crisis of the regime. Keywords: Previous censorship; Salazarism; Marcelism or Marcelo Caetano’s period; Press; Censors. A censura previne, não remedeia Coronel David dos Santos, director-adjunto dos Serviços de Censura (1956) A principal censura é a que se exerce só pelo facto de existir censura Raul Rego (1969) Na madrugada que Sophia crismou como «o dia inicial inteiro e limpo», esboroava-se um dos três pilares em que se alicerçava a vetusta ditadura salazarista-caetanista. O Exército encur- ralado pela impossível vitória militar na frente colonial punha termo ao regime autoritário que tinha na Polícia Política e na Censura os seus dois outros baluartes. No 25 de Abril de 1974 a

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ARTIGOS | 77

Os censOres dO 25 de Abril:O pessOAl pOlíticO dA censurA à imprensA

Joaquim Cardoso Gomes

centrO de investigAçãO mediA e JOrnAlismO dA FAculdAde de ciênciAs sOciAis

e HumAnAs dA universidAde nOvA de lisbOA (cimJ/ FcsH-unl)

resumoNeste artigo o autor coloca o problema das fontes para o estudo da censura à imprensa

durante o Estado Novo focando, no período do pós-guerra, a persistência do pessoal político exclusivamente militar, com um núcleo duro de oficiais do Exército na direcção da censura.

Analisa depois as condições da entrada de civis no aparelho da censura no contexto, da cri-se do regime entre 1958-1962, e do início da Guerra Colonial, identificando o pessoal político, quer a nível da Direcção quer das estruturas intermédias, comissões e delegações. Por fim, no período marcelista, acentua os limites da renovação do pessoal político, com a hegemonia dos coronéis na direcção, e a perda da autonomia funcional da censura na crise final do regime.

Palavras-chave: Censura prévia; Salazarismo; Marcelismo; Imprensa; Censores.

AbstractIn this article the author poses the problem of the sources for the study of press cen-

sorship during the “Estado Novo” focusing on the post-war period, the persistence of po-litical personnel exclusively military, with a core group of army officers in the censor-ship board. Then he analyses the conditions of entry of civilians in the apparatus of censorship in the crisis regime of 1958-1962 and the beginning of the Colonial War, identifying the political staff, either at the direction or at the intermediate structures, committees and delegations.

Finally, in the period Marcelo Caetano highlights the limits of the renewal of political per-sonnel, the hegemony of the colonels in the direction, and the loss of functional autonomy of censorship in the final crisis of the regime.

Keywords: Previous censorship; Salazarism; Marcelism or Marcelo Caetano’s period; Press; Censors.

A censura previne, não remedeiaCoronel David dos Santos, director-adjunto dos Serviços de Censura (1956)

A principal censura é a que se exercesó pelo facto de existir censura

Raul Rego (1969)

Na madrugada que Sophia crismou como «o dia inicial inteiro e limpo», esboroava-se um dos três pilares em que se alicerçava a vetusta ditadura salazarista-caetanista. O Exército encur-ralado pela impossível vitória militar na frente colonial punha termo ao regime autoritário que tinha na Polícia Política e na Censura os seus dois outros baluartes. No 25 de Abril de 1974 a

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PIDE sucumbia, enquanto na rua da Misericórdia, aos censores, já não chegavam os estafetas com os granéis para «exame prévio».

No recorte literário de um grande narrador, José Cardoso Pires descreve esses momentos com os censores «às secretárias, embalados numa rotina de meio século»:

A dada altura levantaram a cabeça, medindo as horas, e todos à uma desataram a telefonar para os jornais. Reclamavam as provas dos textos das edições da tarde. Exi-giam pressa, ameaçavam. Estavam de tal modo viciados da autoridade, tão enraizados nos cadeirais sombrios – vivendo neles, larvando papel, reproduzindo-se – que se julga-vam instituição natural, função pública. Prolongáveis para lá do fascismo que se estava a extinguir. (Pires, 1999: 199)

Mário Bento, o último censor-mor do Estado Novo, na manhã do dia 26, pouco antes do as-salto popular à sede da censura, dera um último conselho sábio a um coronel que ainda pergun-tava o que fazer: esteja «quieto e calado». E assim ficaram, mudos e quedos para sempre, até ele próprio decidir, depois de muito instado, a contar a sua verdade ao Expresso há quatro anos.

De que estrutura estamos a falar quando nos referimos à censura à imprensa? Que compara-ção pode ser feita com os outros pilares de sustentação do regime? De que fontes dispomos para o seu estudo?

Comparada com as Forças Armadas, em particular o Exército, que sempre mostrou transparência na hierarquização dos seus oficiais através da publicação anual de Listas de Antiguidades, a polícia polí-tica mostrou-se mais reservada, nem sempre publicando as listas de antiguidades no Diário do Governo por forma integral, calculando-se que em Portugal a PIDE/DGS teria em 1974 cerca de 1200 elemen-tos. Essa publicação mereceu, aliás, crítica por parte das chefias da polícia política pela informação que transmitia dos seus agentes para o exterior, nomeadamente para o PCP (Pimentel, 2007: 52-54).

Em termos numéricos, a estrutura da censura representava apenas a décima parte da PIDE/DGS, com cerca de 70 a 90 censores e 30 auxiliares no aparelho, mas a sua influência na sus-tentação do regime terá que ser aferida noutro patamar: o permanente condicionamento da informação, eliminando quer a oposição – ou de uma forma mais radical projectando a própria «morte da política» (Baptista, 2012: 428) –, quer qualquer sinal de conflito ou luta social, pro-pugnando o conformismo e as hierarquias, na família, nas relações laborais ou no desporto, padronizando os valores da sociedade pelos do regime, castrando a liberdade de criação, qual-quer que fosse a sua expressão.

Se há uma característica diferenciadora da censura é, sem dúvida, o «hermetismo natural dos Serviços, incompatível com discussões de café pouco conformes à natureza confidencial das suas actividades (…)»1

Raras foram as situações, no Estado Novo, em que os nomes dos censores foram dados a co-nhecer publicamente, com a eventual excepção do director em exercício. Dentro da classe jornalística a comunicação entre a censura e os jornais obedecia a regras estritas: só as chefias de redacção e, mais raramente, o director dialogavam com a censura, quase sempre pelo telefone, como reconhece Francisco Balsemão para quem os censores, «quase todos militares na reforma, eram entidades miste-riosas mas desinteressantes», conhecendo «os nomes de apenas alguns deles» (Castanheira, 2009: 9).

O que explica que a generalidade dos profissionais desconhecesse em absoluto os responsá-veis pelos cortes manifestando, ainda hoje, as mais desencontradas opiniões sobre os censores: enquanto para Roby Amorim a censura salazarista «era constituída por meia dúzia de oficiais do exército que tinham conseguido chegar ao fim da carreira na posição de tenentes e capitães

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e eram totalmente analfabetos», situação alterada por Caetano que «substituiu estes sujeitos todos, totalmente incapazes, e pôs censores que sabiam o que estavam a fazer» (Correia e Bap-tista, 2009: 369), para Germano Silva, «de uma maneira geral, pela forma como conduziam as coisas, via-se que não eram pessoas destituídas. Sabiam o que estavam a fazer e o que estavam a cortar». Mas Adelino Cardoso interroga-se: «Porque é que os censores eram todos coronéis reformados, muito estúpidos, que não compreendiam as próprias instruções que tinham?»2.

Estrutura Pessoal político Pessoal auxiliarDirecção/Comissão de Lisboa 40 18Comissão do Porto 6 4Comissão de Coimbra 4 320 Delegações (Continente e Ilhas) 21 3Delegados substitutos não remunerados 20Subtotal 71 + 20 = 91 28 99

Totais 119

Quadro 1: Funcionários da Comissão de Exame Prévio em 1974Fontes: Relação de vencimentos pagos ao pessoal de escriturários, contínuos e serventes, em serviço na Sede, Comissões e Dele-gações, 31 de Março de 1974, IAN-TT, SNI/DSC, Cx. 443; relação dos vencimentos pagos ao pessoal em serviço na Sede , 31 de Outubro de 1973, Cx. 443; IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 790, ordem de serviço da DSC de 14 de Março de 1974.

Existem diversas condicionantes ao nível das fontes para o estudo da censura à imprensa, quer de natureza interna quer externa ao próprio aparelho censório. No plano interno desta-camos: a sede em Lisboa foi sendo ao longo dos anos sucessivamente transferida e já no mar-celismo a quantidade de material acumulado em arquivo ditou o expurgo da maior parte da documentação anterior a 1955; nas comissões e delegações a situação foi ainda mais precária porque não possuindo, na quase totalidade, instalações próprias o material foi sendo destruído ao longo do tempo.

A nível externo as condicionantes começam nos próprios jornais e revistas que não cuida-ram, em geral, de organizar ou conservar por se terem perdido ou deteriorado os «dossiers» dos cortes e confluem na destruição ou dispersão do arquivo da sede de Lisboa e da comissão do Porto nos dias a seguir a 25 de Abril.

Parte desse material poderá não estar irremediavelmente perdido a julgar pela disponibiliza-ção recente on line de alguns documentos desses arquivos. Como salienta a Comissão do Livro Negro sobre o Regime Fascista, os arquivos dos serviços de Censura foram «em grande parte destruídos, em actos precipitados, intencionais ou inconscientes», havendo razões para crer que essa intencionalidade explicará o desaparecimento quase total dos dossiers respeitantes ao pes-soal político, actualizados no marcelismo.3 Por fim, tratando-se de acontecimentos com apenas quarenta anos, os dados pessoais existentes em arquivos civis ou militares não estão disponíveis pelo que nos está vedada a utilização do método prosopográfico do período anterior a 1945.

censura no pós-guerra: Ferro e caetanoA emergência dos regimes autoritários de Salazar e Franco, com origem na época dos Fascis-

mos, obrigou-os a algum aggiornamento no pós-guerra, marcado pelo triunfo das democracias no Ocidente e o rápido levantar das barreiras da Guerra Fria a Leste. Salazar, sob o escudo protector

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das potências ocidentais, rebaptizou a polícia política PIDE, promoveu as primeiras eleições, «tão livres como na livre Inglaterra», em Novembro de 1945, que servirão de padrão para as sucessivas fraudes eleitorais até ao 25 de Abril e, logo em 1944, depois duma remodelação do Governo e da substituição do tenente-coronel Álvaro Salvação Barreto à frente da censura, trocou o velho Se-cretariado da Propaganda Nacional por um Secretariado Nacional da Informação, menos exultante para quem, como António Ferro, se sentia movido pela «febre de acção»4, mas não menos eficaz no controlo da imprensa, agora directamente subordinado à Presidência do Conselho.

Por largas décadas irão ser recorrentes os alvitres ou promessas do regime de aliviar ou anular a censura à imprensa. Analisaremos brevemente apenas dois casos: as reuniões do Con-selho de Imprensa de 1945 e o projecto de Marcelo Caetano em 1957 enquanto ministro da Presidência. A transformação do SPN em SNI previa o funcionamento de um Conselho de Im-prensa, órgão de consulta do Secretário Nacional da Informação, constituído pelos directores dos jornais diários, o director da Censura e o chefe da repartição de Informação, tendo como finalidade «assegurar o contacto entre os jornais e o Estado, elucidando-os acerca do pensamen-to governativo e ouvindo as sugestões que entenderem formular no interesse da sua missão»5.

Na primeira reunião de 8.2.1945, presidida por António Ferro, participaram catorze direc-tores de jornais e o subdirector da Censura, capitão Aníbal Afra Nozes. O director de O Século criticou a dualidade de critérios da censura de Lisboa e Porto que o censor considerou como «pequenas imperfeições de serviço» e António Ferro acentuou a «a autonomia da censura» e o facto dela existir «em todos os países do Mundo, ainda os mais liberais». Nas três reuniões que se seguiram até à última de 27 de Junho, os directores de jornais apelaram repetidamen-te a alterações do regime censura mas só colheram evasivas de António Ferro, escudado num estudo-síntese que estaria a ser feito, para o qual Salazar, que «considerava favoravelmente a possibilidade de revisão da Lei de Imprensa», pedia contributos dos jornais, que foram entre-gues sem qualquer resultado prático.6

Se alguma dúvida houvesse sobre a determinação do regime em manter um apertado mo-delo de censura prévia à imprensa, o relatório enviado pelo director da censura a Salazar após as eleições de Novembro de 1945, em que pela primeira vez as forças da oposição em torno do Movimento de Unidade Democrática denunciaram a política do regime, é bastante esclarecedor. Trata-se, segundo o director Larcher, de «um mapa estatístico, elaborado por distritos, acerca da posição da imprensa portuguesa, tanto antes como depois de terem sido concedidas as possíveis liberdades de crítica aos actos do Governo, da administração geral ou local, da legislação publica-da e a propaganda das várias políticas».7

A percepção de que qualquer exercício de liberdade de imprensa se virava inevitavelmente contra a ditadura, pois em apenas dois meses de «liberdades possíveis» em 1945 a percenta-gem dos jornais que passou para uma posição hostil ao regime passou de 3,4% para 17,9% do total8, levou à adopção de continuadas medidas repressivas como a aplicação de multas e a própria suspensão de jornais, quer pela publicação de uma notícia não submetida a censura prévia, quer por pretextos de ordem burocrática como mudança de tipografia sem autorização, mudança de proprietário ou de director sem cumprimento das formalidades, ou o simples atra-so no envio dos boletins de estatística para as delegações de censura.9

Marcelo Caetano, fiel ao ideário da juventude, do integralismo ao corporativismo fascista, salazarista por convicção e pragmatismo, percorreu ao longo de décadas os degraus do poder, ganhando influência e tecendo o «partido informal» de que fala Franco Nogueira, já na década de 50, quando foi chamado por Salazar para ministro da Presidência, de que se ocupou entre 1955 e 14 de Agosto de 1958, com tutela sobre o SNI e a Censura.

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Caetano atribui ao Presidente do Grémio Nacional da Imprensa Diária, João Pereira da Rosa, director de O Século, a confidência de ser sua intenção «estudar uma lei de imprensa que per-mitisse abolir a censura», estabelecida na Ditadura Militar porque «a imprensa portuguesa não tinha a noção dos limites e a repressão judicial dos delitos era demorada». Incitado por João Pereira da Rosa, elaborou o projecto de lei de imprensa que discutiu com ele e outros directo-res de jornais, não explicando por que não foi posto em prática. «O projecto de lei de imprensa andou para trás e para diante a ser visto e revisto pelos doutos, e lá ficou quando deixei o Go-verno» já em Agosto de 1958. Dez anos depois, ao assumir a Presidência do Conselho, revisitou o projecto antigo mas «envelhecera» e houve que fazer outro (Caetano, 1977: 471).

Este projecto marcelista tornou-se parte da hagiografia «liberalizante» de Marcelo, a par do exercício de Reitor da Universidade de Lisboa. A mais completa biografia de Caetano (Casti-lho, 2012, 356) cita o projecto sem nunca o analisar. Valerá a pena, por isso, determo-nos um pouco no seu articulado. Com quarenta páginas e dividido em cinco capítulos, o artigo 2º fixa, à partida, os requisitos antidemocráticos para se ser director e editor na imprensa periódica e que obrigava a «não revelarem espírito de oposição aos princípios fundamentais da Constitui-ção Política». Mantêm-se os constrangimentos quanto ao número de páginas dos diários, não superior a dez, e a obrigatoriedade de inserção de notas oficiosas. A tipificação dos «abusos do direito de liberdade de imprensa» é minuciosa e a aplicação de multas ou outras penalidades severa, podendo levar à suspensão do periódico e interdição do exercício da profissão para os directores e chefes de redacção, mas o facto mais relevante é o projecto contemplar a censu-ra prévia à imprensa «quando o Governo a considerar necessária para a defesa da segurança interna e externa da Nação», com enumeração de assuntos sobre os quais incide a censura de tal modo abrangentes que neles cabe praticamente tudo, dependendo as comissões de censura «exclusivamente da Presidência do Conselho». Trata-se, pois, de um projecto de lei que aposta numa política repressiva sobre a imprensa, com alguma margem para intervenção judicial, de quem se espera a aplicação de fortes sanções penais, colocando em segundo plano a censura prévia que, no entanto, não é liminarmente excluída (Rosas, 1994: 506).

O projecto de Lei de Imprensa poderá ter sido uma tentativa reformista para alargar a sua área de influência e testar os limites do exercício dos seus poderes, revelando-se incapaz de o pôr em prática num período em que se acumulavam as tensões entre as facções civilista e mili-tarista, monárquica e republicana, dentro do regime. Ironicamente, Salazar utilizaria em 27 de Julho o arbítrio da censura, por ele controlada pessoalmente, para humilhar Caetano ao proibir a reprodução pelos jornais da manhã da entrevista dada pelo ministro da Presidência à United Press, onde defendia não existir em Portugal uma questão de regime, expressão que desagra-dou a Salazar que não queria alienar o sector monárquico.

No livro As minhas memórias de Salazar, Marcelo Caetano caracteriza as funções da Direc-ção dos Serviços de Censura como «de polícia dos delitos de imprensa», recorrendo à imagem do acelerador e do travão, este cabendo à censura, o primeiro ao SNI. Por diversas vezes des-de o tempo da Segunda Guerra Mundial, Caetano pronunciou-se ou foi informado sobre aspec-tos da actuação da censura, chegando em 1950 a denunciar directamente a Salazar a acção do presidente da Comissão de Censura de Lisboa, sobre o qual recaía a suspeita de diminuir intencionalmente a posição de um ministro, o que Salazar prontamente desmente como um mal-entendido ultrapassado com as «instruções convenientes».10

À frente da censura à imprensa encontrava-se, desde 1944, o coronel Armando das Neves Larcher, um militar com um perfil académico atípico, pois para além do curso de Infantaria da Escola de Guerra era licenciado em Filosofia e Farmácia pela Universidade de Coimbra, antigo

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professor do Colégio Militar, publicista e censor-mor.11 Em 1950 esteve na origem do relató-rio, enviado à Presidência do Conselho, sobre as publicações destinadas à infância e juventude que deu origem à primeira Comissão de Literatura Infantil.12 Uma das primeiras medidas desta Comissão foi proibir, em 1952, a importação das revistas do Rato Mickey por «considerar os desenhos de animais de W. Disney prejudiciais à formação intelectual e afectiva da criança», parecer que mereceu a concordância do coronel Larcher.13

Caetano recorda o coronel Larcher por forma ambivalente: considera-o um «homem bas-tante culto e liberal que criara um estilo amistoso de relações com as redações dos jornais», com quem tinha despacho semanal para transmitir «orientações gerais» (Caetano, 1977: 469) e nunca a apresentação de casos concretos, comprometedores para a imagem que cultivava junto da imprensa. «Tudo correu sem problemas graves até ao dia em que, sentindo aproximar-se a data da aposentadoria por limite de idade, o Cor. Larcher começou a ter pretensões… Mas isso é outra história que não vem para aqui.»

neves larcher: “Actualizar a equipagem” De facto, a poucos meses da remodelação governamental que afastou Caetano de minis-

tro da Presidência, em 14 de Agosto de 1958, o coronel Larcher redigiu um memorial sobre a imprensa e a censura intitulado «Alguns apontamentos sobre a imprensa e os serviços de cen-sura» com data de 20 de Março. Neste documento, que irá marcar um ponto de viragem na organização da censura e do seu pessoal político, Larcher começa por questionar «a missão de orientar e educar a opinião pública», o papel dos «interesses materiais da publicidade» e a «to-tal falta da preparação profissional do jornalista» para quem seria fundamental uma escola de jornalismo, controlada pelo Estado. Mas a maior parte do relatório está consagrado à censura.

Esta, se em 1926 «se justificava em acção apenas repressiva e exercida só por oficiais do Exército, para defesa do regime nascente» terá que «ajustar as suas funções às novas neces-sidades» porque «os problemas sociais são outros e outros os inimigos; por isso há que actu-alizar a equipagem.»

São os aspectos de revisão da máquina da censura que merecem a sua atenção começan-do pelo «sistema de recrutamento de censores». O modelo actual está esgotado por razões de formação do pessoal e de natureza funcional. «A preparação literária dos oficiais do Exército, confinada às Matemáticas e à Técnica Militar ou à Administração Militar, tem-se revelado, sal-vas as naturais excepções, bastante deficiente na interpretação, no julgamento e na selecção dos textos. Estes, muitíssimas vezes, ultrapassam os domínios daquela preparação limitada e do auto-didatismo». Exercendo-se a censura sobre um leque alargado de publicações, «literárias, filosóficas, sociológicas e económicas – de livros, revistas, panfletos e jornais», está provada «a impossibilidade dum desempenho satisfatório de tais funções». São por isso relativamente frequentes as diferenças de opinião entre Larcher e alguns dos seus subordinados quanto à proi-bição de vários livros, como é notório lendo os relatórios de livros censurados.

O segundo argumento contra o sistema de recrutamento é de natureza funcional, um pro-blema que se arrasta desde a Ditadura Militar, quando a censura, confiada a oficiais do activo, se via com frequência tolhida pela incompatibilidade de horários da censura com os das unida-des militares, problema que não foi ultrapassado com «a substituição dos oficiais do activo por oficiais em situação de reserva». Estes oficiais «deixam-se envelhecer neste árduo serviço, por-que sentiriam a falta de gratificação» e o resultado é que muitos «se sentem cansados», sendo que dos 15 oficiais em serviço em Lisboa só dois não são sexagenários.14

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Conclui que por força destas condicionantes «o rendimento na qualidade e na quantidade, tem forçosamente de ser deficitário». Exemplificando: é preciso rever a organização da leitura das publicações, nacionais e estrangeiras, «missão delicada» que implica possuir «além do co-nhecimento de línguas, cultura humanística e capacidade de rápido discernimento para distin-guir o principal do acessório», por forma a evitar «coisas desagradáveis e inconvenientes, com naturais reflexos no prestígio do regime». Soluções: enquanto a questão do recrutamento não for resolvida definitivamente propõe uma solução de transição com a criação de um serviço de Leitura que passaria a ser feito por um director do serviço de Leitura e três adjuntos «todos 4 de nível cultural bastante grande». Propõe para Director de Leitura o Dr. Eduardo Antonino Pestana, licenciado em Letras e Direito, antigo director do Diário da Manhã e, para adjuntos, «indivíduos que à sua formação nacionalista e cristã juntassem cultura sociológica e filosófica», nomeadamente licenciados em Ciências Histórico-Filosóficas».15

neves martinha: o primeiro civilCaetano não terá apreciado que o chefe da censura tenha apresentado formalmente um re-

latório sobre uma área que tutelava, não se coibindo de sugerir nomeações em áreas sensíveis do pessoal político, particularmente num momento em que chamara para o aparelho alguém da sua confiança pessoal para director-adjunto, o Dr. António Neves Martinha, o primeiro civil na di-recção da censura, substituindo um militar influente como o coronel David dos Santos. Entre os raros testemunhos sobre este censor, louvado pela «sua brilhante inteligência, a sua invulgar cul-tura, e a sua ponderação serena e criteriosa»16, regista-se o de José Cardoso Pires que, no con-tacto pessoal que com ele manteve em 1952 por causa da censura ao livro Histórias de Amor, o reputa de «figura curiosa», «paternalista» (Azevedo, 1999: 102-104) e que abandonou a censura em 1 de Julho de 1957 para prosseguir uma auspiciosa carreira que o levaria ao generalato em 1960, tendo sido o autor do inquérito à invasão indiana e rendição de Goa (Meneses, 2010: 532).

Martinha, licenciado em Direito, monárquico na juventude, iniciou a carreira política como presidente da Câmara Municipal de Mafra entre 1936 e 1939, pertencendo activamente à União Nacional e à Legião Portuguesa. No pós-guerra entrou para os quadros da Direcção--Geral da Administração Política e Civil, do ministério do Interior, percorrendo entre 1941 e 1948 as secretarias dos governos civis de Vila Real, Setúbal e Santarém. A etapa seguinte levou-o ao ministério da Economia onde foi nomeado em 1953 inspector-chefe da Comissão de Coordenação Económica, cargo que ocupava quando requisitado em 2 de Maio de 1957 pela Presidência do Conselho, a convite de Marcelo Caetano, para a Direcção dos Serviços de Censura, primeiro como director-adjunto, depois como director. Martinha nunca perten-ceu ao círculo político próximo de Caetano, o grupo da Choupana, pejorativamente desig-nado na Legião como «marcelinos»17, mas manteve uma relação de segunda linha desde os tempos de estudante em Lisboa que proporcionou um reencontro político que iria perdurar para além da chamada de Caetano a Presidente do Conselho. Depois da sua saída da censu-ra em 1965, exerceu funções de fiscal do Governo junto de estações de rádio como o Rádio Clube Português e a Rádio Renascença entrando para a Comissão de Exame e Classificação de Espectáculos entre 1971-1974.

Quesada pastor: “reduzir a bitola”Como resultado da segunda crise do regime na sequência do «terramoto delgadista» (Rosas,

1994: 523), a necessidade de controlar uma imprensa em renovação com quadros mais jovens,

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maior formação académica e de consciência democrática, o aparelho da censura irá conhecer após 1958-59 o maior e mais rápido alargamento do quadro de censores.

Larcher irá adiar a sua saída até 1959 e algumas das suas propostas só então começarão a ser implementadas. O desafio com que o regime salazarista se confrontou na campanha presi-dencial de 1958 e que se prolongou até 1962 com a luta das massas trabalhadoras e estudan-tis, bem como o deflagrar da guerra colonial em Angola em 1961, obrigou o regime a reforçar os mecanismos de controlo da imprensa e dos espectáculos.

Não por acaso, o Dr. José Fernando Quesada Pastor, que dirigiu a censura à imprensa até final de 1959 e inicia funções no início de 1960 como presidente da Comissão de Exame e Clas-sificação de Espectáculos, afirma na primeira reunião que «a bitola tem de ser reduzida», no critério da censura, porque «se tem vindo a acentuar uma largueza na censura que lhe parece inconveniente, porquanto existem certos valores de ordem moral que por serem constantes não podem ser flectidos».18 E esta directiva, que era a de Salazar, vai ter consequências a nível da máquina censória. A relativa abertura operada pelo Secretário Nacional da Informação, Dr. Edu-ardo Brazão, até ao início de 1958 (Cabrera, 2013: 46-50), é posta em causa dentro do regime. O obreiro dessa renovação organizativa vai ser António Neves Martinha, o verdadeiro homem forte do aparelho num período conturbado, que no curto espaço de dois anos viu sucederem à sua frente três civis, o Dr. José Fernando Quesada Pastor (1919-2000)19, o Dr. Eduardo Homem de Gouveia e Sousa (1908-1970)20 e o Dr. Guilherme Lourenço Pinheiro21.

Assim, em Janeiro de 1960, com vista a «uma mais perfeita estrutura de trabalho da cen-sura, em ordem à sua eficácia»22, sistematizou-se um conjunto de procedimentos e normas organizativas que, no essencial, irão manter-se até ao marcelismo como evidencia o facto da mesma ordem de serviço ter sido republicada em 1967, na parte referente à Comissão de Lis-boa, com pequenas alterações de que a mais significativa é a criação do «Gabinete de Leitura das páginas literárias e económicas»23.

Tomando como centro de decisão a Direcção e a Comissão de Censura de Lisboa, que na prática se confundem, a directiva, assinada pelo director-adjunto António Martinha es-tabelece para a Comissão de Lisboa dois grupos de trabalho, diurno e nocturno, com uma estrutura hierárquica rígida de chefes de grupo, subchefes de grupo e leitores, assumindo a Comissão de Lisboa o eixo da Direcção na sua relação com as outras Comissões de Porto e Coimbra e os outros serviços Centrais na sede de Lisboa, a saber, a Secretaria, o Serviço de Controle e o Serviço de Leitura de Livros e Revistas. Particular interesse tem o Serviço de Controle que, para além de executar «a leitura posterior e exame crítico da imprensa», designadamente a diária de Lisboa e Porto, tem a seu cargo a «organização de um ficheiro geral da imprensa do país, de modo a habilitar, rápida e seguramente, à definição das suas tendências sociais e políticas».

O controle sistemático sobre a matéria publicada teve início na década de 50, competên-cia atribuída a um censor experiente, o capitão miliciano de Artilharia, José da Silva Dias, ex--subdirector, «pelo longo conhecimento que tem deste serviço» onde terá entrado em 1938, «dispensado, com é de justiça, de todo e qualquer outro serviço pela exigência da maior con-centração espiritual».24

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ARTIGOS | 85

Gráfico 1 Pessoal Político da Direcção da Censura à imprensa (1931-1974)Fontes: documentação IAN-TT-SNI/ Direcção dos Serviços de Censura

O gráfico 1 ilustra as principais transformações no aparelho da censura a nível dos servi-ços centrais no início dos anos 60: o rápido acréscimo do número global de censores que, em pouco mais de dois anos, passa de 15 para 25 elementos; a entrada de civis que, entre 1960 e 1966, duplicará dando alguma expressão à proposta do coronel Larcher de criação de um cor-po especializado de censores; a entrada e reforço dos coronéis no aparelho, ocupando a quase totalidade das chefias intermédias, decisivas no funcionamento diário da máquina censória, e que está na origem da memória da «coronelização» da censura concretizada na década de 60; finalmente, a persistência de um núcleo residual de capitães e subalternos, quase todos com longo historial na censura que justifica a posição proeminente ocupada por alguns como o te-nente José de Sousa Nazaré, oficial censor desde 1935.

1965: Alvim e a pulsão neofascista António Neves Martinha irá abandonar a direcção da censura em Setembro de 1965, em

circunstâncias peculiares, considerando o persistente trabalho ao longo de oito anos. Deste período conhecemos apenas parte do relatório que enviou, em finais de 1964, à Presidência do Conselho, onde já é patente a preocupação com a falta de remuneração dos delegados substitutos, bem como a necessidade de alargamento do números de censores em Lisboa, Porto e Funchal, no quadro de excesso de serviço a que o aparelho da censura já não res-ponde com eficácia.25

Como elucidou Riccardo Marchi, num estudo notável sobre a direita radical (Marchi, 2009), o sobressalto das eleições presidenciais de 1958, a crise académica de 1962 e, sobretudo, o alas-trar da Guerra Colonial, propiciaram o ressurgimento do nacionalismo revolucionário, com maior ou menor coloração neofascista, em torno do Centro de Estudos Alfredo Pimenta que irá fazer a ponte entre gerações nacionalistas, onde vamos encontrar nomes como o de Carlos Guerra de Oli-veira e Rui Alvim, para além de outros referenciados por Marchi como Jorge Fernandes Moreira, Mário Pinho Leónidas, José Rebordão Esteves Pinto ou Afonso de Jesus Caveiro.

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As várias organizações grupusculares de orientação radical ou neofascista como o Movimen-to Jovem Portugal ou a Frente de Estudantes Nacionalistas não sobrevivem desligadas do apa-relho do Estado, antes são amparadas por várias instituições que as subsidiam como a PIDE, a Legião Portuguesa, a Mocidade Portuguesa, o ministério do Interior e o ministério da Educação Nacional, esforçando-se alguns dos seus dirigentes por acomodar-se no regime e fazer carreira nos ministérios (Marchi, 2009: 47).

Quando em meados de 1965 Rui Alvim é nomeado director da censura à imprensa percorrera já um caminho que o levou à frequência de Direito em Coimbra entre 1947-51, interrompendo o curso para cumprir serviço militar até 1955, altura em que retomou os estudos e se candidatou em 1957-58 (Marchi, 2009: 138, 140-143) à presidência da Associação Académica de Coimbra que venceu, contando com a colaboração da PIDE (Campos, 2009: 65).

Já licenciado em Direito, transfere-se para Lisboa onde o currículo nacionalista ganho em Coim-bra lhe abre as portas para a Legião Portuguesa e a União Nacional, de cuja comissão distrital fará parte em 1961 porque «pelo seu valor e pelas suas ligações em muito poderá auxiliar nos contac-tos a estabelecer com os meios académicos»26 o emprego como chefe de gabinete do ministro da Economia e Agricultura, o part-time como membro da Comissão de Exame e Classificação aos Es-pectáculos (1964-65) e, por fim, o lugar de chefe de Repartição do Fomento do Comissariado do Turismo, cargo que acumulou com o de director dos serviços de censura à imprensa.

O ano de 1965, embora marcado por um refluxo do movimento social, colocou novos de-safios ao regime com a extensão, desde finais de 1964, da luta armada a Moçambique e o assassinato, em fevereiro de 1965, do general Humberto Delgado com ampla repercussão in-ternacional. Em Maio é assaltada por nacionalistas radicais com a cobertura da PIDE, e extinta pelo Governo, a Sociedade Portuguesa de Escritores (Marchi, 2009: 83-84).

O pretexto será a atribuição do Prémio de Novelística pela SPE ao romance Luuanda, de Luandino Vieira, a cumprir pena de prisão por «traição e terrorismo (George, 2002: 114-118). O semanário Jornal do Fundão, criado em 1946 por António Paulouro, afecto ao regime, mas que progressivamente dele se demarcou, publicou no n.º 984 de 23 de Maio de 1965, em su-plemento literário dirigido por Alexandre Pinheiro Torres, membro do júri da SPE, a notícia da atribuição do prémio e a foto de Luandino Vieira. Tal facto suscitou a intervenção imediata da censura com a apreensão do jornal, suspensão por 180 dias, e a demissão do censor de Castelo Branco, tenente Manuel Dias Catana, acusado de ter actuado com «ligeireza» no processo, não conseguindo «eximir-se ao ambiente local», situação que «já se impunha há muito tempo e só circunstâncias especiais haviam impedido que ainda não tivessem concretizado».27

Cremos que a situação política vivida em 1965 favoreceu o reforço de elementos da direita radical no aparelho da censura ao nível da Direcção e, particularmente, na Comissão de Cen-sura de Lisboa. Depois da entrada, em 1963, do Dr. Carlos Estêvão da Costa Guerra Machado de Oliveira, Rui Alvim pôde contar com o Dr. Jorge Fernandes Moreira (desde 1.1.1966), José Rebordão Esteves Pinto (desde 30.11.1965), Dr. José Maria Alves, Nuno Múrias, Dr. Nuno de Santa Maria Lima de Carvalho e outros como Mário Pinho Leónidas, que entrarão na censura depois da saída de Rui Alvim, que protagonizou a mais curta e desastrada direcção da censura por parte de um civil nos anos 60. Rui Alvim foi exonerado a pretexto duma impossibilidade prática de acumulação de funções de censor com as de chefe da Repartição do Fomento do Co-missariado do Turismo, sendo nomeado para lhe suceder, pelo subsecretário de Estado Paulo Rodrigues, o tenente José de Sousa Nazaré28, mas não deixou de reassumir funções na censu-ra dos espectáculos, onde voltou a exibir a sua «personalidade forte e influente», afrontando outros membros da comissão.29

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ARTIGOS | 87

Mais do que problemas de natureza ideológica, terá sido a clivagem geracional com as chefias intermédias de coronéis (estamos na presença de homens cujas idades oscilam entre os 44 anos de Guerra de Oliveira e os 33 anos de Rebordão e Lima de Carvalho, tendo o director apenas 36 anos), a alteração de rotinas dentro da censura e a rigidez de procedimentos a ditar a saída de Al-vim. Da escassa documentação remanescente desse período de cinco meses percebe-se algum do mal-estar provocado pela sua intolerância que manda suspender «todas as páginas e suplementos literários», «qualquer referência, crítica ou meramente bibliográfica, a todos os escritores nacio-nais» e «retratos ou qualquer outra gravura referente a esses escritores»30, ou quando se insurge contra o censor de Faro, o capitão Mário Lopo do Carmo, um veterano do lápis azul desde 1929, por ter permitido ao Jornal do Algarve publicar uma foto de uma mulher em fato de banho em Londres, exigindo a demissão do censor e provas de página em Lisboa ao jornal.31

Compreende-se que a imprensa tenha visto com satisfação a saída de Alvim e o Jornal do Fundão não deixa de referir a mudança que os «homens conscientes e livres da Imprensa toma-ram como bom augúrio».32 Data desse mesmo mês de Fevereiro de 1966, a seguir à exoneração de Alvim, a conhecida observação de Salazar a Franco Nogueira: «Neste país, apenas o Chefe do Governo está isento de censura. Todos os demais, incluindo os ministros, lhe estão subordi-nados». Alguns dias depois, em 21 de Fevereiro, em conversa com o director da PIDE, Noguei-ra escreve: «Falei-lhe da censura, que me parece exagerada e às vezes estúpida. Concordou, e disse que há um ambiente político desagradável» (Nogueira, 1986: 164).

marcelo caetano, enfim o poder! Após uma década como reserva do poder «em esclerose», de 1958 a 1968 (Valente, 2002:

45), Caetano foi finalmente cooptado pelo círculo restrito da elite do regime com a garantia no discurso de posse de 27 de Setembro de 1968 de que o regime ditatorial permaneceria intocá-vel e a guerra colonial seria levada até ao fim, mesmo à custa de uma derrota militar, como o seu mentor, Salazar, ordenara para a Índia portuguesa.

Interessado pelo poder dos media desde os anos cinquenta, teorizou sobre opinião pública e a liberdade, de que tinha uma visão apenas instrumental, firmada no domínio de um escol sobre a massa ignara e impreparada para aceder às liberdades democráticas. Por via desta ideologia elitista e autoritária nunca aceitou a liberdade de imprensa, em nome da defesa duma «opinião pública» encarada com paternalismo e demagogia, justificação encontrada para manter a censura à imprensa apenas aliviada nos meses a seguir à sua tomada de posse como herdeiro de Salazar.

Tirando partido da natural expectativa criada em amplos sectores da população, Caetano apostou na consolidação do poder acenando com as eleições de 1969 que, esperava, lhe iriam garantir a legitimidade política num regime que nunca a conhecera. Para conseguir esse ob-jectivo confiava no Exército, na polícia política e na mordaça sobre os meios de informação.

Num período marcado, a partir de 1970, por um processo de concentração de empresas jor-nalísticas por grupos económicos, a manutenção do controlo directo do poder político irá traduzir--se num reforço do controlo sobre a imprensa (Cabrera, 2006: 259), propiciando uma instrumen-talização a que Caetano recorre com frequência comportando-se como «o censor-mor, tomando os directores dos jornais como seus subordinados, instruindo directamente a orientação editorial do periódico ou exercendo forte pressão para vencer resistências» (Baptista, 2012: 301). Esta manipulação dos media ganha, no período que antecede as eleições de 1969, a colaboração de uma assessoria de imprensa dirigida por um patrão da publicidade, Jorge Tavares Rodrigues, com resultados decepcionantes para a campanha marcelista (Cavaco, S., 2012: 570-572).33

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Caetano nunca escondeu ser sua intenção manter o regime de censura prévia a que a imprensa estava submetida, e as escolhas políticas que fez no início do seu mandato eram inequívocas. Para seu chefe de gabinete escolheu o antigo director da censura à imprensa e aos espectáculos, Dr. José Fernando Quesada Pastor e, num sinal de continuidade na má-quina da censura, chama o antigo director António Neves Martinha, homem de confiança, à direcção efectiva, mantendo formalmente em funções o tenente Nazaré enquanto escolhia um sucessor à altura das necessidades que as eleições e a estabilidade do regime exigiam. Esse homem forte, capaz de disciplinar o aparelho e adaptá-lo às novas necessidades, vai ser o coronel Armando Páscoa que tomará posse em 21.6.1969, assumindo o tenente Nazaré a posição de subdirector até 1970.

relatório nazaré: “estrutura velha de mais de 30 anos”A estrutura organizativa da censura à imprensa foi definida na reorganização levada a cabo

em 1 de janeiro de 1933, a pedido de Salazar, pelo então major Álvaro Salvação Barreto, arti-culando a Direcção-geral com as estruturas intermédias, as comissões de Lisboa, Porto e Coim-bra, e as delegações que rapidamente se fixaram numa base distrital. A única excepção a esta regra foi a criação da delegação de Guimarães em 1956 e a fugaz existência de delegações em Águeda (1952-1955) e em Elvas (1954-1957), expediente encontrado para dirimir tensões entre elites locais do regime à revelia do esforço de centralização do aparelho encetado desde 1933.

Ainda em 1968 o Secretário de Estado Moreira Baptista, assina um despacho em 2.12.1968 que vai levar o tenente Nazaré a percorrer as 18 delegações distritais no continente e Guima-rães, com vista à elaboração de um relatório fazendo o ponto da situação do aparelho da censu-ra a nível do país.34 Qual é o retrato que nos faz de «uma estrutura velha de mais de 30 anos»?

A primeira preocupação vai para o pessoal político e para a sua desmotivação, «apáticos e desinteressados», pela «insignificância dos vencimentos» que recebiam face ao acréscimo de trabalho estimulado pelas mudanças na imprensa regional. O «problema crucial» passa pela me-lhor remuneração dos censores e pelo pagamento de gratificações aos delegados substitutos que praticamente desapareceram no pós-guerra.

O problema das instalações, no quadro do modelo de censura prévia existente, não se afigura ter solução pois a censura era exercida em organismos públicos como a Legião Por-tuguesa, Quartéis, Intendência dos Abastecimentos, Câmaras Municipais, Delegações Esco-lares, possuindo instalações próprias apenas as comissões do Porto e Coimbra. Confiante na maioria dos jornais de província, os que se interessam «por pequenas obras locais», vê com apreensão o surgimento nos últimos três anos de «vários e difíceis jornais de oposição», cuja acção sobre a opinião publica «é muito nefasta», o brusco aparecimento de bons redactores nos jornais de Lisboa e Porto que tentam influenciar a província, a revolução «nos costumes, na moral e a agitação estudantil» e , por fim, a circulação de boletins paroquiais que pelo «combate à guerra em África estão sendo altamente perigosos e agitando as pequenas al-deias». Face ao aumento do número de publicações, que estima em mais de 2000 revistas e livros lidos anualmente na censura, considera que «a actual estruturação da Censura está obsoleta e não evita constantes deslizes», mas como a «censura foi sempre um organismo de carácter provisório admite sem grandes complicações qualquer modificação». E termina, por forma sibilina, apelando a agir com muita urgência «para não correr o risco de já não ser precisa, por desnecessária…».

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Gráfico 2 Pessoal Político das Delegações da Censura à imprensa (1950-1974)Fontes: documentação IAN-TT-SNI/Direcção dos Serviços de Censura

martinha: “A necessária reestruturação”Uma clara indicação de que a censura à imprensa estava para durar é a afirmação recorrente

na documentação de 1969, assinada pelo Dr. António Martinha, da «necessária reestruturação dos serviços». Enunciemos as principais medidas tomadas com este fim:

- reforço da disciplina interna com vista a melhorar a pontualidade/assiduidade dos cen-sores, e assim, limitar as reclamações pelos atrasos na censura de provas; quebrar o laxismo reinante fixando um horário mínimo de cinco horas diárias; aumento das gratificações para o pessoal da sede e, sobretudo, para os censores da província referenciados no relatório do te-nente Nazaré; contenção de custos.

- racionalização de meios libertando os chefes de serviços da primeira leitura de provas e responsabilizando subchefes e leitores; intensificação da fiscalização dos grupos de trabalho com vista à uniformização de critérios; atribuição de parte da função de controlo às comissões e delegações (1972).

- melhoria da logística do aparelho com a mudança para as instalações da censura na rua da Misericórdia nº 125, em 22 de setembro de 1969; expurgo em 1970 do arquivo do mate-rial anterior a 1955.35

- nomeação em 12.7.1969 de um novo director, o coronel Armando Francisco Páscoa 36 (tenente Nazaré como subdirector), cujo perfil correspondia às necessidades de reestruturação do aparelho, coronel, militar na reserva, escritor e publicista com colaboração em vários jornais diários, entre os quais, o Diário de Lisboa.

No plano funcional a maior alteração decorre de uma directiva da Direcção-Geral da Informa-ção (DGI) de 3.9.1969, de Clemente Rogeiro, transformando o Gabinete de Leitura no Serviço de Leitura Especializada (SLE) para apreciação dos assuntos que «versarem matérias de arte, litera-tura, filosofia, política e economia, a publicar ou já publicados na imprensa diária e não diária».

Os serviços centrais passavam assim a ser constituídos pela Comissão de Lisboa, Serviço de Leitura Geral (SLG), Serviço de Leitura Especializada (SLE), Serviço de Controlo e Serviço de Publicações Estrangeiras.

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No ordenamento jurídico as principais transformações na máquina censória no período marcelista decorrem da criação da Secretaria de Estado da Informação e Turismo (SEIT) pelo Decreto-lei nº 48686 de 15 de Novembro de 1968 que, sem pronunciar uma única vez o termo censura, remete para a dependência da DGI «os serviços destinadas à sua execução».

A revisão constitucional de 1971, se politicamente marcará o começo do fim da ilusão da ala liberal na liberalização do regime, consumada pela reeleição de Américo Tomás em 1972, irá consagrar este desígnio marcelista de ocultação da censura travestida de Exame Prévio, consa-grada no Decreto- Lei nº 150/72 de 5 de Maio, com o fundamento de que persistia «a ocorrên-cia de actos subversivos graves em algumas partes do território nacional», eufemismo para a Guerra Colonial (Castilho, 2012, 678-680). Depois de em 1957, como ministro da Presidência, ter substituído o nome de Comissão de Censura aos Espectáculos por Comissão de Exame e Classificação dos Espectáculos (Decreto-Lei nº 41051 de 1 de Abril de 1957), Caetano reincidia com a censura à imprensa, renomeada Comissão de Exame Prévio, proibindo, pela primeira vez desde 1926, que um jornal censurado disso desse conta aos seus leitores.

mário bento revisitado

Nascido em 1928, na aldeia de Meimoa, Penamacor, Mário Bento Martins Soares (Cruz e Pinto, 2004-2005: 628) frequentou durante quatro anos o seminário do Fundão, concluiu o li-ceu na Guarda e licenciou-se em Direito, na Universidade de Coimbra, onde entrou em 1949, envolvendo-se no movimento associativo, ainda dominado pelas direitas, e em organismos ca-tólicos como o CADC e a JUC. Em 1954 iniciou a carreira profissional na magistratura que in-terrompeu em 1957 para exercer, sem grande sucesso, a advocacia em comarcas da Guarda. Iniciou, entretanto, a actividade política como vogal da Comissão Distrital da União Nacional, colaborando no órgão do partido único, Correio da Beira, e com a Legião Portuguesa.

Em 1960 operou uma viragem na sua vida com a vinda para a Polícia Judiciária em Lisboa, onde conheceu o Dr. Garcia Domingues, foi chefe de gabinete do ministro do Interior, deputado em 1965 e governador-civil da Guarda entre 1967 e 1972. A ascensão de Marcelo Caetano, e o périplo deste ao distrito em campanha eleitoral, proporcionou ao Dr. Mário Bento uma aproxi-mação ao Presidente do Conselho, entusiasmado com o banho de multidão que o governador--civil arregimentara, tendo-lhe pedido então o seu currículo.37

Ainda governador-civil da Guarda em 1971, Mário Bento ambicionou tornar-se Director--Geral do Serviço Tutelar de Menores e, nesse sentido, enviou uma carta a Marcelo Caetano38 «solicitando em momento tão decisivo da minha vida a benevolente compreensão de V. Exa», pois estaria em causa uma oportunidade de promoção «quase única depois que as contingên-cias da vida e as comissões de serviço a que fui chamado me levaram a sair da Magistratura». Termina a sua missiva reafirmando a sua «profunda lealdade e solidariedade política bem como a inteira disponibilidade da minha modesta colaboração em quaisquer circunstâncias e até ao limite em que possa ter utilidade». Acabou por conseguir um lugar como director do Centro de Observação, anexo ao Tribunal Central de Menores, em Lisboa, onde passou a exercer após a sua saída de governador-civil em Novembro de 1972, não sem antes, em Agosto de 1972, nou-tra carta39 enviada ao seu «amigo» Dr. Quesada Pastor, chefe de gabinete de Caetano, recordar que estava em aberto o cargo que tanto almejava.

A disponibilidade manifestada por Mário Bento em servir o regime foi aproveitada por Ca-etano para o nomear Presidente da Comissão Central de Exame Prévio em Abril de 1973 por-que, como confessa ao Expresso «não havia forma de fugir». A constituição duma nova direcção

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ARTIGOS | 91

da censura à imprensa surgiu como resultado da incapacidade do coronel Armando Páscoa em prosseguir no cargo por razões de saúde e constituiu para muitos uma verdadeira surpresa.40 Só em Fevereiro de 1974 é que Caetano anunciou a Mário Bento a possibilidade de nomeação para Director-Geral dos Serviços Tutelares de Menores, inviabilizada pelo 25 de Abril. O sanea-mento a que foi submetido após a Revolução, a fuga para o Brasil e o regresso a Portugal em 1981 com reintegração nos Serviços Tutelares de Menores, não esconde a amargura por ter aceite um cargo que «não teve força para recusar em definitivo», sempre num discurso descul-pabilizante e menorizando a sua acção enquanto censor-mor do regime.

Directores/PresidentesSubdirectores/Directores/

AdjuntosNotas

Tenente-coronel Álvaro Salvação Barreto,

até 31 de Março de 1944

Capitão Aníbal Afra Nozes,primeiro subdirector,

desde 13 de Outubro de 1943

As patentes militares referem-se ao momento do exercício da função

censória

Coronel Armando Jorgedas Neves Larcher,

de 1 de Abril de 1944a 28 de Fevereiro de 1959

Capitão Aníbal Afra Nozes,até final de 1945

Major Dimas Lopes de Aguiar,de 1945 a 1946

Major Mário Baptista Coelho,1946-1947

Capitão miliciano José da Silva Dias1947-1953

Coronel David dos Santos,de 24.4.1953 a 1. 7.1957

Dr. António Neves Martinha,de 1.7.1957 a 26.6.1961

Cap. Nozes(1900-1971)

Major Aguiar(1894-1953)

Major Coelho(1892-1955)

Cap. Dias(1892-1978)

Coronel Santos(1899-1977)

Dr. Martinha(1907-1975)

Dr. José Fernando Quesada Pastor,sucede directamente ao coronel

Larcher e até final de 1959.Dr. António Neves Martinha

Director da censura e chefe de gabinete do ministro da Presidência,

Pedro TeotónioPereira até 22.6.1961; presidente da Comissão de Exame e Classificaçãode

Espectáculos em 26.4.1960Dr. Eduardo Homem de Gouveia e Sousa, desde o início de 1960 e até 31.12.1960

Dr. António Neves Martinha

Dr. Guilherme Lourenço Pinheiro, nomeado para a Presidência do Conselho entre 14.12.1960 e 26.6. 1961 e parece ter

exercido desde 1.1.1961

Dr. António Neves Martinha

Dr. António Neves Martinhade 26.6.1961 a cerca de 15.9.1965

Tenente José de Sousa Nazaré Tenente Nazaré (1895-1980)

nomeado para a Com. de Censura de Lisboa em 1935.

Dr. Rui Edmundo de Araújo Vasconcelos Pereira e Alvim, de aprox. 15.9.1965

a 7 de Fevereiro de 1966Tenente José de Sousa Nazaré

Referido em actada Comissão de Exame e Classificação

de Espectáculos de 15.9.65.

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92 | MEDIA&JORNALISMO

Tenente José Araújo Martins de Sousa Nazaré, de 7 Fevereiro de 1966 até

26.9.1968

Major José Chaves subdirector em exercício

Major Chaves (1893-1977) nomeado para a Com. de Censura de Lisboa

em 1928.Dr. António Neves Martinha

desde final de 1968 até 21.6.1969Marcelo Caetano, Presidente do

Conselho desde 27/9/1968.

Coronel Armando Francisco Páscoa, de 21.6.1969 a 1 de Abril de 1973

Tenente José de Sousa Nazaré, subdirector desde 7/7/1969

e até 21/4/1970 Dr. Bento Garcia Domingues,

subdirector desde 2 de Junho de 1970

Presidente da Comissão Central de Exame Prévio desde 1 de Junho de

1972

Dr. Mário Bento Martins Soares, de 1.4.1973 até 25 de Abril

de 1974

Dr. Joaquim Jorge Mendes de Brito, subdirector de Abril (?) de 1973 a

8.6.1973, substituído pelo Dr. Vitor Manuel Lopes de Sá Pereira que exerceo cargo de subdirector desde 19.6.1973

Direcção da censura à imprensano 25 de Abril de 1974:

Dr. Mário Bento Martins SoaresDr. Bento Garcia Domingues

Dr. Vitor Manuel Lopes de Sá Pereira

Quadro 2: Direcção da Censura à Imprensa no Estado Novo (1944-1974)Fonte: Documentação do IAN-TT/SNI/DSC

O inexistente “gabinete-Fantasma”Tem sido por vezes suscitada a questão da existência no aparelho da censura à imprensa do

que, sugestivamente, José Cardoso Pires designa por «Gabinete Fantasma», «uma nova Cen-sura», «dentro do corpo oficial da Censura», cujo objectivo seria «a manipulação da actividade literária com um novo know-how e com agentes rigorosamente secretos» (Pires, 1999: 190-191). Já Raúl Rego assinalara em 1969 (Rego, 1970: 26) uma censura especializada e, mais recentemente, Riccardo Marchi, a propósito da censura marcelista à revista neofascista Política, admite que a mesma passou a estar sujeita à vigilância do «gabinete especial de censura nas instalações da Secretaria de Estado da Informação e Turismo» (Marchi, 2009: 321). Também António Valdemar, na entrevista de Mário Bento, questiona como foram recrutados os intelec-tuais dos grupos de trabalho especializados ao serviço da censura, grupos que Mário Bento diz desconhecer negando qualquer interferência «nem a título decisório, nem a título meramente consultivo». Sobre este ponto cremos que Mário Bento terá razão.

A subordinação da Comissão Central de Exame Prévio à Direcção-Geral da Informação transferiu para o secretário de Estado Moreira Baptista e para a própria DGI de Pedro Geral-des Cardoso, um papel de controlo que anteriormente o próprio aparelho de censura geria, só ocorrendo uma intervenção externa de Salazar/ Paulo Rodrigues em situações limite. O próprio director-geral da Informação passou a assumir-se como instância de recurso criando, segundo Pedro Feytor Pinto, «um sistema com responsáveis de meios de comunicação através do qual estes, para não perderem tempo, enviavam logo para a Direcção-Geral, ao mesmo tempo que para a Censura» o material julgado mais sensível (Pinto, 2011: 166).

Na presidência da censura do coronel Armando Páscoa e do Dr. Mário Bento, a discordân-cia quanto à ausência de corte desta ou daquela notícia ou comentário é, assim, questionada directamente pelos responsáveis políticos, às vezes de forma agreste: num artigo publicado no Diário de Lisboa de 7.3.1973, onde numa foto apareciam punhos fechados, Moreira Baptis-ta anotou: «Dr. Mário Bento, isto foi visado?». Mário Bento, fazendo um balanço da sua pas-

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sagem pela censura, escreveu: «Foi só um ano e pouco, muito absorvido no atendimento dos reclamantes censurados e na ligação com a última instância – a respectiva Direcção-Geral, ou mesmo o secretário de Estado».41

O papel interveniente da DGI no processo censório levou a uma utilização de membros da DGI na leitura especializada de certas obras com vista à obtenção de um parecer que seria ou não validado pelo director Geraldes Cardoso e remetido à Comissão Central de Exame Prévio.

Esses leitores nem sempre eram parte integrante do corpo de censores, e pertenciam a estruturas da própria Direcção-Geral como a Repartição da Imprensa Estrangeira, a Reparti-ção da Imprensa Portuguesa ou o Gabinete de Estudos, como é notório no mais prolixo autor desses pareceres, o Dr. Ernesto Manuel de Moura Coutinho. É certo, no entanto, que quer a nova Direcção-Geral de Informação, quer o antigo SNI, nomeadamente a Direcção-Geral dos Espectáculos, foram viveiro para recrutamento de alguns censores, caso do Dr. João António da Silveira de Lima Pimentel, nomeado para o SLE da censura em 8.5.1973, na SEIT desde 1972, como redactor na Secção de Imprensa Estrangeira e que, depois de ter sido assessor diplomático de António Guterres, terminaria a sua carreira como embaixador de Portugal em Oslo (Pinto, 2011: 211), o Dr. Joaquim Jorge Mendes de Brito, desde 1 de Agosto de 1963 na censura a partir da Direcção–Geral dos Espectáculos, de onde terá vindo também o Dr. Nuno de Santa Maria Lima de Carvalho ou, ainda, o Dr. Manuel Nunes Barata, chefe de Repartição da Informação Audiovisual do SNI, na censura entre 1970 e 3.1.1973, crê-se que demitido na sequência do escândalo suscitado pela publicação de uma carta no vespertino A Capital em Novembro de 1972 e que poderá ter protagonizado o episódio do censor a pedir emprego no jornal que publicou a notícia que arruinou o seu part-time na censura, bem ilustrativo do nível de promiscuidade do director de A Capital com o Governo com quem tinha estabelecido um pacto de autocensura com Moreira Baptista através de um revisor interno «entre a redacção e o Exame Prévio» da confiança de Manuel José Homem de Melo.42

Esta acentuada perda da autonomia funcional da censura à imprensa, como em nenhum outro período do Estado Novo, articula-se com uma última arma da censura no marcelismo: a instrução de processos judiciais para penalizar as infracções cometidas pela imprensa, aspecto incisivamente focado no ensaio de José Cardoso Pires:

Na máquina totalitária, sem independência entre poderes, os braços da repressão trabalham em compromisso contínuo. Polícia e tribunal, decreto e censura fazem parte duma mesma aliança, e não é por acaso que alguns directores da Polícia Cultural (Geral-des Cardoso, Garcia Domingues) tenham transitado da Polícia Judiciária para os tribunais de Supremos Censores».(Pires, 1999: 179-180)

Aos nomes invocados deveremos acrescentar os do próprio Mário Bento, como o do ex-periente Dr. Bento Garcia Domingues, censor da imprensa, onde entrara em Junho de 1970, como subdirector, e da censura dos espectáculos, onde fizera o seu tirocínio censório entre 1954-57, que «já conhecia bem a casa quando eu cheguei em 1973 e era ele que fazia o aten-dimento directo nas dúvidas dos Senhores Coronéis e doutros colaboradores»43 e, desde Junho de 1973, o terceiro elemento da direcção tricéfala, o Dr. Vitor Manuel Lopes de Sá Pereira, juíz de Direito, ajudante do Procurador da República no Tribunal da Relação de Lisboa (juiz Conse-lheiro do Supremo Tribunal de Justiça em 1992), todos eles juristas a quem Marcelo Caetano apostara na colocação à frente da censura no âmbito da criação do chamado Exame Prévio e da nova Lei de Imprensa.

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estatuto do censor militarComo vimos no relatório de 1969, o tenente Nazaré, ao mesmo tempo que caracteriza a

censura como «estrutura velha de 30 anos» e «obsoleta», reconhece que «a censura foi sempre um organismo de carácter provisório», contradição aparente, simultaneamente reveladora da natureza do Estado Novo, aquando da aprovação da Constituição de 1933 em que, no capítulo das liberdades, dá com uma mão o famoso artigo 8º, o que depois anula com o decreto-lei nº 22469 de 11 de Abril de 1933 com a instituição da censura prévia.

Mas a natureza precária da censura não radica apenas no texto fundacional do regime. Salazar, nesse mesmo ano, afirmaria que a origem militar do regime haveria de marcar para sempre o Estado Novo. De facto, tendo origem na Ditadura Militar em 1926, o pessoal político exclusivamente militar irá perdurar até 1957, num tempo longo que não teve paralelo com ou-tras instituições do regime, instrumentos da «violência preventiva» ou da «violência punitiva» (Rosas, 2012: 196-210) em que o processo de desmilitarização foi mais célere. Irene Pimentel afirma que a presença de militares à frente da PIDE, Censura e outros organismos seria «uma forma de apaziguar as chefias militares» face a uma subordinação das Forças Armadas consu-mada por Salazar (Pimentel, 2007: 498).

No caso da censura à imprensa, a essa motivação dever-se-á acrescentar outra de nature-za funcional. Comparada com a censura dos espectáculos que em 1933 era totalmente militar e, no final do regime, estava reduzida a único oficial, a estrutura da censura à imprensa, mais pesada e descentralizada sob o ponto de vista geográfico, manteve-se na mão de oficiais do exército que davam garantias de continuidade de funções e uma disciplina estrita, aspecto que ainda em 1964, face à crescente dificuldade de recrutamento devido à Guerra Colonial, o di-rector Martinha relevava, insistindo na nomeação na província de oficiais destacados na GNR.

É claro que ao longo de três décadas se operaram mudanças significativas na componente militar do pessoal político da censura. Em estudo anterior (Gomes, 2006), mostrámos que, na sua fase inicial, a componente militar era constituída por numerosos oficiais no activo, com capacida-de operacional, herdeiros do «tenentismo» do 28 de Maio. Esta dimensão veio a alterar-se pro-gressivamente, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, período de grande recomposição do pessoal da censura, quando começa a entrar no aparelho, a nível central, um número cada vez maior de oficiais na reserva, o que dará lugar a alguns problemas de natureza jurídica que irão ser resolvidos a contento dos censores.

Quando em 1970 o coronel Abílio Joaquim Patinho, do Serviço de Administração Militar, da Força Aérea, pediu a revisão da pensão de reserva com o fundamento de continuar a pres-tar serviço ao Estado como censor, é-lhe negada a pretensão pela Força Aérea num acto que considerou discriminatório.44 De facto, era prática corrente a entrada na censura de oficiais na reserva, com menos de 40 anos de serviço efectivo, porque ao abrigo do decreto-lei nº 41958 de 14.11.1958, não só podiam com esse tempo de serviço na censura pedir a melhoria da pen-são de reserva, como acumulá-la com a gratificação recebida. O pedido do coronel Patinho só foi deferido em 7.8.1973, e este caso só se tornou exemplar porque pertenceu a um dos ramos das Forças Armadas que poucos elementos colocou na censura, tal como a Marinha.

O coronel Páscoa esclareceu em 197045 que os serviços de censura «não têm quadro or-gânico» e que os oficiais que ali em serviço o fazem «a título eventual, ainda que em regime de «full-time», sendo remunerados por gratificações confidenciais pagas por força de verbas globais não destinadas exclusivamente a pessoal e consequentemente sem qualquer descon-to para a Caixa Geral de Aposentações». A legislação de 1958, na qual se empenhou pesso-almente o coronel Larcher, veio assim dar resposta a uma reivindicação dos oficiais criando

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condições para a contagem do tempo prestado na censura que daria a todos «uma pensão de reforma compensadora».

A definição do regime de prestação de serviço na censura de oficiais do exército na reserva foi ainda objecto do Memorial de 3 de Maio de 1972 que anexa um parecer jurídico, com despacho de Salazar de 18.6.1962, relativo ao exercício de funções na censura, suscitado pelo tenente reformado Mateus Fortunato Soares da comissão de Coimbra e que já então obteve deferimento favorável.46

A situação de excepção dos oficiais na reserva não se alterou até ao fim do regime, reafir-mando Mário Bento, em 1973, «não existir um quadro funcional de Delegados» e que a gra-tificação paga «não está estabelecida em qualquer norma legal e sai de uma verba única e de carácter confidencial que é abonada a esta Comissão pela Secretaria de Estado da Informação e Turismo».47

marcelismo: evolução e continuidadeA transição de poder dentro do Estado Novo operou-se também no aparelho censório sob

o signo da continuidade, de que é expressão o conteúdo das «Normas de censura a observar pelas comissões e delegações destes serviços» em que, a par do reconhecimento da sua actu-ação «casuística», se enfatiza a proibição de matérias jornalísticas «que atinjam, de qualquer modo, o Presidente Salazar, cuja obra, como homem e como político, só pode ser discutida em termos que não diminuam a sua figura» e as «que pretendam, directa ou indirectamente, estabelecer uma antinomia política entre o Presidente Salazar e o Presidente do Conselho».48

São escassos os dados reveladores da dificuldade de adaptação do pessoal político da cen-sura ao novo Presidente do Conselho. Subentende-se, ocasionalmente, alguma incompreensão por parte dos censores face à evolução do regime quando, a propósito de instruções sobre matérias a «visar», e que dizem respeito às famosas «Conversas em Família», se referem as «inconcebíveis dúvidas» que essas instruções suscitaram, sentindo o director Páscoa a necessi-dade de esclarecer ser «evidente (…) que toda a matéria expendida por Sua Excelência é, por natureza, totalmente livre».49 Quando, em 1969, a Direcção pergunta aos delegados de todo o país se querem manter-se em funções há plena unanimidade nessa vontade e, em Lisboa, o não alinhamento com o marcelismo será residual e levará à saída de escassos elementos como José Rebordão Esteves Pinto.

Comissão de Censura do Porto

Nomes Cargos NotasDr. Alberto Alexandre Pestana de Ornelas

Presidente interino, nomeado vice-presidente em 1.10.1960

Sucede ao coronel Arnaldo Fontes. (1901-1967)

Coronel Luciano Roma Torres

Infantaria, reserva,vice-presidente interino

Vogal em 1955, n. 1908; reserva 1961

Coronel António Pedro Saraiva Júnior

Artilharia, reserva, chefe de grupo interino

Nomeado em 23.8.1966 Convidado pelo coronel Páscoa em Agosto de 1969 para presidente da comissão não aceita por

razões de saúde e porque dentro da comissão há pessoas mais qualificadas para o cargo.

Em 18.6.1970 é chefe de grupo interino posição que mantém em 1974.

Coronel Mário Garcia da Silva

Infantaria, reserva, leitorNomeado em 24.4.1970 por proposta do Coronel Simas, um

dos oficiais mais influentes na Comissão de Lisboa. Comandante distrital da Legião Portuguesa. n. 1920; reserva 1969

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Capitão José Eduardo Correia

de Barros

Infantaria, leitor, capitão miliciano na disponibilidade

Desde 1.7.1960.

Tenente Amadeude Almeida Teixeira

Leitor, reserva.Já em 29.12.1939 na censura; n. 1894,

reforma 1964

Comissão de Censura de Coimbra

Nomes Notas

Coronel Artur Afonso Pereira Rodrigues

Presidente interino desde 16/5/1970 em substituição do capitão Caveiro “suspenso”. Despacho de 16/6/1970 do secretário de Estado Moreira Baptista confirma no cargo de Presidente o

tenente –coronel Rodrigues e até 1974. n. 1919. Infantaria.

Alexandrino Marques Ribeiro Professor do ensino primárioDr. Joaquim Marques

de Sá CoutoInspector – adjunto da Polícia Judiciária, entrou em 29.7.1972

Coronel médico Aurélio Afonso dos Reis

Desde 10.8.1973. Comandante do Regimento dos Serviços de Saúde. Ocupou a vaga deixada pela transferência do Dr. João Manuel de Sousa Ramos para a Comissão Central de Exame

Prévio em Lisboa. n.1919

Quadro 3: Comissões de Censura do Porto e Coimbra em 25 de Abril de 1974Fontes: IAN-TT-SNI/ Direcção dos Serviços de Censura.

Não obstante, será na Comissão de Coimbra que se detectarão alguns problemas de natureza política no aparelho da censura. O capitão miliciano na disponibilidade Afonso de Jesus Caveiro (em Angola entre 1961-63), presidente da comissão em 1970 (entrara em 28.10.1968), com 38 anos de idade, de tendências integralistas (Vidal, 2002) e ligado a círculos neofascistas de Coimbra, forneceu em 12 de Maio de 1970, ao Diário de Coimbra, no contexto da luta estudan-til, a notícia falsa da morte de um estudante em incidentes com a PSP, o que pôs em cheque o jornal e redundou na demissão do censor. Anteriormente, em Novembro de 1968, sendo presi-dente das comissão o capitão Constantino da Conceição, um artigo a publicar no bissemanário de Coimbra O Despertar, panegírico de César Moreira Baptista, foi suspenso pela comissão, o que levou o visado a perguntar ao director, tenente Nazaré: «Porque é que a censura de Coim-bra é contra mim? Há algo de misterioso em tudo isto, posso saber?».50

Politicamente mais incómodo, mas sem consequências para o censor, foi a publicação no Diário de Coimbra de 26 de Maio de 1971 do discurso do general Reymão Nogueira, coman-dante da 2ª Região Militar, por ocasião da visita ao QG da Região Militar, do Chefe de Estado Maior do Exército. Neste caso, o relatório de averiguações mandado fazer pelo director nada apurou contra a comissão, confirmando-se, no entanto, que as instruções telefónicas enviadas de Lisboa para as comissões de Coimbra e Porto eram gravadas, quer por precaução contra os jornais, quer para controlo da Direcção em Lisboa.51 O jornal República52, pouco depois da Revolução, noticiava: «Preciosas gravações encontradas por jornalistas na censura do Porto», acrescentando que jornalistas e escritores tinham forçado a entrada nas instalações e descober-to gravações de conversações entre censores de Lisboa e Porto, uma das quais faz hoje parte do arquivo da RTP (fonograma AHD 20779, registo 1).

Já em relação à Comissão do Porto os problemas no funcionamento interno remontam à presidência do capitão Dr. Agostinho Seguro Pereira, que foi demitido no ano de 1959 num ambiente de crispação só aliviado pelas directivas de Lisboa para que tudo se solucionasse den-

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tro das «normas cristãs de tolerância e de perdão».53 Por outro lado, o regime sente dificuldade em controlar alguma da imprensa diária, situação evidenciada durante a campanha do general Humberto Delgado.

Em finais de 1960 foi nomeado interinamente para a comissão o Dr. Alberto Alexandre Pestana de Ornelas, como vice-presidente (um madeirense nomeado por um director madei-rense, o Dr. Eduardo Homem de Gouveia e Sousa), mas após a saída do coronel Fontes nunca chegou a ser nomeado um presidente efectivo da comissão pelo que o Dr. Pestana de Ornelas se manterá até 1974 à frente duma comissão em que é o único civil. Lisboa chegará mesmo a enviar para o Porto, em 1967, para funções de controlo, um dos seus mais destacados fun-cionários, o major piloto-aviador Fernando de Carvalho Tártaro, à data com mais de dez anos de serviço na censura.54

O que podemos designar como nomeações de favor para o aparelho da censura em Lisboa, transformadas em verdadeiras sinecuras na mão de oficiais que chegam a alternar uma comis-são de serviço em África com o regresso ao lápis azul, talvez seja um dos aspectos marcantes do marcelismo. É o caso da família Cerqueira Rocha que chega a ter em simultâneo três membros, pai e dois filhos55, como censores na comissão de Lisboa. Essas nomeações tinham, por vezes, origem em pedidos do gabinete do próprio Presidente do Conselho ou da Secretaria de Estado, um sinal, também neste campo, da perda da autonomia funcional do aparelho que ao longo dos anos fizera a selecção do pessoal político em regime de cooptação por parte do director.

Finalmente importa registar que desde 1971, um pouco à revelia da tendência para a ocu-pação de lugares de censores por oficiais superiores na reserva, se dá a entrada de oficiais mais jovens, no activo, normalmente majores. Este movimento não teve continuidade, pois a maior parte dos oficiais acabou por sair para não interromper as suas carreiras militares, alguns dos quais iriam ascender à elite militar após o 25 de Abril, caso do general António Madeira Peste (censor em 1970-1971), do general António Gonçalves Ribeiro, censor desde 1969 até à sua ida para Angola em 1972, vindo a destacar-se como Alto-Comissário para os Desalojados e ministro da Administração Interna (1978-1979) e do general Octávio Gabriel Calderón de Cerqueira Ro-cha (censor entre 1970-1973), nomeado Chefe de Estado-Maior do Exército entre 1992 e 1997.

1968-1974: balanço do marcelismo No plano legislativo o dado mais significativo do marcelismo é a extinção formal da Direcção

dos Serviços de Censura em 1 de Junho de 1972 e a sua integração na Direcção-Geral da Informa-ção, com a designação de Exame Prévio. Este desenvolvimento acarretou uma perda da autono-mia funcional da censura, visível não só na selecção do pessoal político, como na sua própria acti-vidade operacional, onde é patente a interferência do Director-Geral da Informação, do Secretário de Estado e do próprio Presidente do Conselho. Esta situação está igualmente ligada à crescente especialização do trabalho censório, iniciada no início da década de 60 com o Gabinete de Leitura e que se prolongou no marcelismo com a sua transformação em Serviço de Leitura Especializada (SLE), em 3 de Setembro de 1969, acompanhado pela acção complementar do pessoal da DGI, particularmente na censura de livros.

Nomes Notas

Dr. Mário Bento Martins Soares Presidente

Dr. Bento Garcia Domingues Subdirector

Dr. Victor Manuel Lopes de Sá Pereira Subdirector

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Major José Sebastião de Sousa Chaves (1893-1977)

Eduardo Rodrigues Cardoso

Coronel Victorino de Serpa Faria Peres Furtado Galvão n. 1893

Coronel Dúlio Norberto Franco Simas n. 1904

Coronel Francisco Carlos Roma Machado Cardoso Salgado n.1904

Capitão José Augusto Brandão Pereira de Melo (1890-1974)

Capitão António Boleto Ferro Martins

Alferes José Maria de Mendonça de Sousa Cyrne (1896 -1983)

Coronel Júlio de Almeida Fernandes n. 1904

Coronel Orlando Luís de Oliveira n. 1907

Capitão António Isidro Martins n. 1913

Coronel Mário Cerqueira Rocha (1903 -1980)

Coronel José Catela Teixeira Stockler de Albuquerque n. 1913

Tenente –coronel António Augusto de Sampaio e Melo Pereira de Almeida n. 1915

Dr. Mário Rodrigues de Pinho Leónidas n. 1930

Manuel da Silva Lopes

Dr. Carlos Estêvão da Costa Guerra Machado de Oliveira (1921-1984)

Coronel Abílio Joaquim Patinho n. 1921

Tenente-coronel António Emílio Gameiro Cardoso n. 1926

Coronel João António Ribeiro de Albuquerque n. 1916

Dr. Manuel António da Cruz n. 1933

Major João Manuel Martinho Maltês Soares n. 1929

Coronel Luís Mendes n. 1913

Tenente-coronel António Alemão de Mendonça Cisneiros de Faria n. 1924

Coronel Joaquim Duarte de Miranda n. 1917

Coronel Correia e Silva Artur Neves Correia e Silva n. 1913

Dr. João Manuel Sousa Ramos

Tenente-coronel José António Anjos de Carvalho n. 1930

Dr. João Pereira n. 1917

Tenente José Araújo Martins de Sousa Nazaré (1895-1980)

Dr. António Gonçalves Júnior n.1926

Major Mário Jaime Calderon de Cerqueira Rocha (1930-1984)

Major Joaquim Ferreira de Gouveia

Tenente fuzileiro João Frederico de Saldanha de Carvalho e Meneses n. 1948Reserva Naval

Coronel Rui Meira e Cruz (1921-2006)

Dr. Domingos Joaquim Pereira de Melo Mascarenhas e Silva (1910- 1999)

Quadro 4: Pessoal Político da Censura em Lisboa - 25 de Abril de 1974Fontes: IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 443; Ordem de serviço nº1 de 14 de Março de 1974, Cx. 790.

O segundo traço dominante da censura à imprensa é a continuada militarização do aparelho, herdada da Ditadura Militar. A sua lenta desmilitarização, com a entrada de civis, far-se-á ao longo dos anos 60, em boa parte decorrente da constituição do Gabinete de Leitura mas, em simultâneo, assistimos à ocupação das chefias intermédias, de chefes e subchefes, por coronéis do Exército que manterão a hegemonia no aparelho, dando corpo ao estereótipo dos «coronéis da censura», que perdurará até ao 25 de Abril.

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A nível do pessoal político, os militares não só se reforçaram numericamente como consegui-ram em pleno marcelismo colocar um dos seus à frente da censura, o coronel Páscoa, depois de quase dez anos em que a direcção fora predominantemente civil. Ainda no plano militar assinala--se a entrada, nos anos 70, de um pequeno núcleo de oficiais no activo que parece corresponder à tomada de consciência da inviabilidade de liberalizar com a guerra colonial e o reforço, do que Inácia Rezola chama de «‘aliança’ Forças Armadas-regime» por parte do sector ultrasalazarista (Rosas e Oliveira, 2004: 341). Finalmente, nos últimos anos do regime, é no recrutamento do pes-soal civil que se opera a maior alteração com a entrada de censores mais qualificados, quase to-dos licenciados56, em sintonia, de resto, com as necessidades sentidas pela criação do Serviço de Leitura Especializada. No entanto, a constituição duma direcção civilista no último ano do regime com Mário Bento, num contexto de agravamento geral da repressão, não conseguirá aprofundar a desmilitarização desta estrutura do regime.

O pessoal político das delegações foi o que menos transformações sofreu no período marcelista. A entrada de civis no aparelho da censura da província ocorreu igualmente no final da década de 50, mas sem expressão ao nível das delegações até ao início da década de 60 e, sobretudo, após 1965, devido à falta de oficiais mobilizados para a Guerra Colonial. Mantém-se um perfil de clara maioria de oficiais com a patente de capitão ou tenente, poucos no activo, em especial na GNR, e cerca de um terço de civis, pessoal da máquina burocrática corporativa e alguns professores do ensino primário.

Delegação Nome Processo NotasAngra doHeroísmo

Dr. Gervásio Luso de Sousa Martins

Delegado desde 9.12.65.n.1925 (?); licenciado Direito,

Lisboa

AveiroCapitão Armando Luís

Correia, InfantariaDelegado desde 1.7.72,

na GNR.n. 22.5.1916, cap. 10.4.1965, ingresso na GNR em 1.2.1969.

BejaCapitão Mário Pinto Pestana

Fraústo, CavalariaDelegado desde 16.2.72; ingresso na

GNR em 6.9.1953n. 24.10.1926

Braga Joaquim de Magalhães e Vasconcelos Ferreira Chaves

Delegado desde 16.9.1962 I. G. A. E.

BragançaCapitão Álvaro da Silva

Freitas Palmeira, InfantariaDelegado em 8.11.1964.

n. 12.2.1927, cap. 1.12.1965, ingresso na GNR 21.12.1955

Castelo Branco António Marques Flor Nomeado em 31.7.1965.Professor, Delegado do Distrito

Escolar

ÉvoraTenente miliciano Bernardo da Fonseca Fialho, Artilharia

Delegado substituto em 1966, delegado possivelmente desde Outubro de 1967.

Em serviço no QG da 3ª Região Militar.

FaroCapitão miliciano Mário Lopo

do Carmo , InfantariaNomeado antes de 1929. n. 28.12.1898, reforma

5.8.1966

FunchalTenente- Coronel Eleutério

Valeriano MelimDesde 9.6.70, delegado efectivo.

n. 14.4.1921, tenente-coronel 12.8.1967, reserva 6.9.1968

GuardaFrederico Jaubert Cabral de

Quadros Nomeado em 27.7.1968.

Chefe de Zona da Intendência dos Abastecimentos

(em 1964)

Guimarães

Manuel Alves de Oliveira Nomeado em 28/2/1963.Director do Arquivo Municipal

Alfredo Pimenta n. 1892-1990

HortaCapitão Joaquim Monteiro

de Freitas

Delegado desde 9.12. 1963, ano em que reinicia funções com 67 anos.

Fora delegado em 1934. n. 1896-1983

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LeiriaCapitão José Dias Miguel

Trovão, InfantariaDelegado substituto desde 2.10.1965 .

No final de 1965 já é delegado.n. 1932, cap. 6.5.1969, ingresso

na GNR em 26.9.1961

Ponta Delgada Dr. Ernesto Pacheco Correia de Andrade

Primeiro ofício datado de 22/10/1965.

Subdelegado do INTP ,chefe da secretaria da Federação dos

Municípios deS. Miguel; União Nacional.

n.1900-1976

PortalegreCapitão António de Oliveira

Liberato, Infantaria Delegado desde 14/11/1949.

Comandante distrital da LP.n. 6.9.1899.

SantarémCapitão Manuel António

Cardoso, QSAETerá passado a delegado efectivo em

1.5.1956

n. 1904 –1990Cap. SGE capitão 13.5.1959

reserva 21.4.1964

SetúbalCapitão miliciano José Augusto de Almeida,

Infantaria

Delegado substituto em 8.2.1944. Delegado em 9/5/1957.

n. 1892 – 1978; capitão 1.1.1938; reforma 20.8.1962

Viana do CasteloCoronel Napoleão Pita

Meira de Amorim, Artilharia

Delegado desde 12.4.1971Participou no contingente Viriatos na

Guerra Civil de Espanha

n. 1913 – 1974; reserva 5.11.1968

Vila RealCapitão José Pereira de

Almeida Desde 24.9.1972 . Na GNR.

n. 1908 –1983, capitão 30.3.1963; reserva 23.7.1968

ViseuAntónio Alberto Castelo

Branco Nogueira Delegado efectivo em 22.6.1959 Professor do ensino particular.

Quadro 5: Delegados da Comissão Central de Exame Prévio (1974)Fontes: IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 766, documento não datado referente a finais de 1973-1974; caixas 563, 590, 737, 740 e 742. Lista geral dos oficiais da GNR e pessoal contratado, referida a 1 de Janeiro de 1973, GNR, Comando –Geral, 1ª Repartição.

Nas vésperas do 25 de Abril a maior fragilidade da censura à imprensa residia, afinal, no próprio fracasso do velho modelo de censura prévia em dar resposta às solicitações da imprensa face ao esgotamento do regime político. Em ofício de 24.1.1974 o subchefe de grupo do SLE, tenente-coronel Gameiro Cardoso, face à escassez de pessoal, e quando já se utiliza pessoal da secretaria para censuras menores, sentencia:

o volume de serviço amplia-se cada vez mais, novas revistas vão surgindo, a crítica mais penetrante ou sobre problemas delicados nas já existentes e o surto de matéria de índole subversiva mais ou menos insidiosa, com a consequente necessidade de maior re-flexão e ponderação na sua apreciação, juntamente com as dificuldades apontadas, le-vam a que considere completamente esgotada e ultrapassada a capacidade do SLE, não sendo difícil de prever para muito breve uma situação de rotura (…).57

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ARTIGOS | 101

1 IAN-TT – SNI/DSC, Cx. 799, “Normas de Serviço Interno – Recomendação”, Boletim nº 7/56 de 2 de Fevereiro de 1956. 2 Público, “Coronéis armados de lápis azuis”, 27 de Abril de 2005.3 Comissão do Livro Negro sobre o Regime Fascista, 1980: 6.4 IAN-TT-AOS/CP/112, Carta de António Ferro a Oliveira Salazar de 7.7.1950.5 Artigo 7º do decreto-lei nº 34133 de 24 de Novembro de 1944, Diário do Governo, I Série, nº 260.6 IAN-TT-AOS/CO/PC-12E, fls. 475 a 508 e IAN-TT – SGPCM, NT 112, Proc. 876/66, nº 20.7 IAN-TT-AOS/CO/PC-8D, Pasta 16, fls. 691-692, Ofício nº 1229 de 21.12.1945 do director da Direcção dos

Serviços de Censura Armando Larcher para a Presidência do Conselho. 8 Rui Ramos (Coordenação), História de Portugal, Lisboa , A Esfera dos Livros, 2ª edição, 2010, p. 670 refe-

re que o número de periódicos hostis passou de 1,7% para 9,3 do total por ter contabilizado as publicações neutras cuja natureza não é estritamente política.

9 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 799, Boletins 1/51, 3/51, 4/51 do mês de Janeiro de 1951. 10 IAN-TT-AMC, Cx. 52, nº 459 e nº 461, Correspondência com Salazar.11 Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol 18, p.688 e vol. 40, p.203.12 Direcção dos Serviços de Censura, 1950. 13 IAN-TT –SNI/DSC, Cx. 525, Processo nº 806, “Rato Mickey”.14 PORDATA. Em 1960 a esperança média de vida à nascença para os homens em Portugal era de perto de 60 anos. 15 IAN-TT-AOS/PC/-56, Pasta 34, fls. 215 a 221.16 IAN-TT-SNI/DSC, Boletim nº 37/57 de 1 de Julho de 1957.17 IAN-TT-AOS/PC-57, Pt. 22, sem data, anos 50.18 PT/TT/SNI-DGE-3-18, Acta nº 139 de 29.3.1960.19 Licenciado em Direito, foi magistrado e iniciou a carreira política como chefe de gabinete do ministro da Pre-

sidência Pedro Teotónio Pereira em 1958. Para além de director da censura à Imprensa foi presidente da censura aos Espectáculos e presidente do Conselho de Programas da Emissora Nacional antes de ocupar o cargo de chefe de gabinete do presidente do Conselho, Marcelo Caetano, até 1974. Processo individual no Conselho Superior da Magistratura, Maço 557.

20 Nasceu na Madeira em Câmara de Lobos mas estudou Direito em Lisboa onde se licenciou em 1931. 21 Nasceu em 1907 na freguesia de S. Martinho, Sintra. Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito de

Lisboa em 1937, advogado, magistrado, ficaria conhecido pela sua actuação no Tribunal Plenário Criminal onde pre-sidiu a numerosos julgamentos de presos políticos. Processo individual no Conselho Superior da Magistratura, Maço 586. Cf. Tribunais Políticos. Tribunais Militares especiais e Tribunais Plenários durante a Ditadura e o Estado Novo, Org. Fernando Rosas, Irene Flunser Pimentel, Luís Farinha, Maria Inácia Rezola, Lisboa, Temas e Debates-Círculo de Leitores, 2009. p. 275.

22 IAN-TT- SNI/DSC, Cx. 792, Ordem de serviço nº 1 de 14 de Janeiro de 1960.23 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 792, Ordem de serviço nº 1 da DSC republicada em 5 de Maio de 1967.24 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 799, Boletim nº 29/53 de 19 de Setembro de 1953.25 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 523, Relatório de 16 de Novembro de 1964 à Presidência do Conselho (incompleto). 26 IAN-TT-AOS/CO/PC, Pasta 19, fl. 407.27 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 375, Processo disciplinar do Jornal do Fundão nº 339, Despacho da DSC de 25 de

Junho de 1965.28 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 798, Boletim nº 5/66 de 8.2.1966.29 IAN-TT-SNI/DGE, Acta de 9.11.1966, livro 28. 30 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 798, Boletim nº 14/65 de 23.12.1965.31 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 515, 11.10.1965.32 IAN-TT-SNI/DSC, Cx,. 527, Carta de 5.3.1966 à Direcção.33 A autora parece atribuir uma importância desproporcionada ao relatório apresentado pelo tenente Nazaré, em

Janeiro de 1969, o qual manifestamente não condicionou a opção política de manter a censura.34 Comissão do Livro Negro sobre o Fascismo, 1980: 226-232. Inclui apenas a introdução e conclusões do re-

latório de 31 de janeiro de 1969.35 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 792, Ordem de serviço nº 18 da DSC de 18.12.1970, comissão presidida pelo Dr. Bento

Garcia Domingues para proceder «à inutilização de documentos do arquivo anteriores a 1955 e lavrar o respectivo auto».

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102 | MEDIA&JORNALISMO

36 Armando Francisco Páscoa (1904-1978) nasceu em Beja e fez o curso de Infantaria da Escola Militar. Foi di-rector da revista Infantaria e colaborador em vários jornais diários, escritor de romances, biografias e ensaios so-bre a actividade militar. De 1939 a 1959 foi inspector de Tiro da Mocidade Portuguesa, coronel em 1956, passando à reserva em 1.6.1959. Cf. Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol. 40, p. 280 e vol. 20, p. 512.

37 Expresso, “Confidências de Mário Bento – o último director da Censura”, entrevista de José Pedro Casta-nheira, 8.8.2009.

38 IAN-TT- AMC, Cx. 55, nº 1, Carta de Mário Bento a Marcelo Caetano de 28.7.1971.39 IAN-TT-SGPCM, NT 20, Proc. 553, Carta de Mário Bento a Marcelo Caetano de 21.8.1972.40 IAN-TT – SNI/DSC, Cx. 798. Cartão timbrado de 18.4.1973 do coronel Armando Páscoa para o censor de

Angra do Heroísmo, Dr. Gervásio Luso de Sousa Martins.41 Carta do Dr. Mário Bento ao autor de 28.3.2011.42 Manuel José Homem de Melo, Meio Século de Observação, Lisboa, Círculo de Leitores, 1996, p. 179;

entrevista com Daniel Ricardo, 10 de Outubro de 2013.43 Carta do Dr. Mário Bento ao autor de 28.3.2011.44 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 586.45 IAN-TT-SNI/DSC, Cx.586, Ofício de 2.9.1970 para o director do Serviço de Intendência e Contabilidade da Força Aérea.46 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 414.47 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 563, Carta do presidente da Comissão Central de Exame Prévio ao chefe de Finanças

da Horta de 18.7.1973.48 IAN-TT-SNI/DSC, Cx.416, Boletim nº 6/68, 25 de Outubro de 1968.49 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 577, Boletim nº 6/70 de 21.11.1970.50 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 522, O Despertar, Proc. 169, 14.11.1968. 51 IAN-TT-SNI/DSC, Cx. 795, Relatório de Averiguações de 2 de Junho de 1971.52 República, 4 de Maio de 197453 IAN-TT, SNI/ DSC, Cx. 796, Ofício do presidente interino alferes Alberto Ponce de Castro, de 13.5.1959.54 Processo consultado no Arquivo Histórico da Força Aérea.55 O coronel Mário de Cerqueira Rocha (1903-1980) entrou para a censura em 5.2.1960. O filho, capitão

Mário Jaime Calderón de Cerqueira Rocha (1930-1984), entrou em 15.10.1969 e o filho mais novo, o então major Octávio Gabriel Calderón de Cerqueira Rocha (n. 1932), em 22/9/1970.

56 Entre 1957 e 1974 houve na Direcção dos Serviços de Censura, em Lisboa, 40 civis, dos quais 80% eram licenciados, sobretudo em Direito (mais de 53%) e ainda dois com frequência universitária.

57 IAN-TT, SNI/DSC, Cx.794, Ofício de 24 de Janeiro de 1974 ao Presidente da Comissão Central de Exame Prévio do tenente-coronel António Emílio Gameiro Cardoso, Sub-Chefe de Grupo do SLE.

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