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ONE ART POR ELIZABETH BISHOP: PROPOSTA DE UMA EDIÇÃO GENÉTICO-DIGITAL CONVERGENTE Sandra Correa Sirlene Ribeiro Góes Sílvia Maria Guerra Anastácio ÍNDICE: 1. Introdução 2. Edição Genética 3. Edição genético-digital: navegando trilhas e novos caminhos 4. Dossiê Genético e considerações 5. Fac-símiles e Transcrições 6. Considerações finais 7. Referências

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ONE ART POR ELIZABETH BISHOP: PROPOSTA DE UMA EDIÇÃO

GENÉTICO-DIGITAL CONVERGENTE

Sandra Correa

Sirlene Ribeiro Góes

Sílvia Maria Guerra Anastácio

ÍNDICE:

1. Introdução

2. Edição Genética

3. Edição genético-digital: navegando trilhas e novos caminhos

4. Dossiê Genético e considerações

5. Fac-símiles e Transcrições

6. Considerações finais

7. Referências

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1. INTRODUÇÃO

O Departamento de Letras Germânicas da UFBA guarda parte do acervo de manuscritos da

poetisa norte-americana Elizabeth Bishop (1911-1979), sendo detentora de fac-símiles de

manuscritos e datiloscritos carimbados e autenticados pela Special Collections de

Poughkeepsie¹1, Nova York, em 1995. O acesso a esses manuscritos tem permitido estudantes

do Grupo de Pesquisa em Crítica Genética do referido Departamento a utilizarem tal material

como instrumento de pesquisa de reconhecida importância, assim contribuindo para a

preservação e divulgação da obra da autora. Considerando o meio digital um ambiente

propício para tal fim, experimenta-se aqui uma proposta de edição genético-digital com base

em um recorte do poema One Art ou “Uma arte” (1976), de Elizabeth Bishop. Sendo assim,

deseja-se, à luz da Crítica Genética, propor uma edição do poema mencionado.

A presente edição aponta, inicialmente, para o percurso genético de One Art, em que imagens

de perdas permeiam os dezessete manuscritos que compõem o seu dossiê de criação, cujos

registros iniciais também datam do ano de publicação. Uma vez que a edição genético-digital

proposta teve como fundamento o conceito de convergência entre as mídias, buscou-se trazer

como suplementos de One Art novos produtos culturais, nos mais variados meios e gêneros

artísticos, gerados a partir do poema. Essa edição pretendeu que leitores e estudiosos de

Bishop pudessem percorrer caminhos de criação da autora, agora suplementados por

paratextos diversos, por outras vozes, outros suportes, outras linguagens artísticas.

1 Os documentos de processo do poema One Art, autenticados, foram cedidos pela Vassar College, Special

Collections, à professora Silvia Maria Guerra Anastácio, em julho de 1995 – juntamente com todo o acervo que se encontra no Departamento de Letras Germânicas da UFBA – para estudo em sua tese de doutorado, posteriormente publicada com o título “O jogo de imagens no universo da criação de Elizabeth Bishop” (1999).

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2. EDIÇÃO GENÉTICA

É importante partir do percurso de vida da autora, não apenas para contextualizar a sua obra,

mas também porque o poema escolhido para uma proposta de edição genético-digital tem

forte cunho autobiográfico. De posse dos manuscritos do poema, foi possível, através de um

contato com os índices do processo de criação da autora, familiarizar-se com a sua forma de

trabalho.

Esses índices que, segundo GRÉSSILLON (2007), constituem o conjunto de traços pertinente

à construção de uma obra de arte, permitem a reconstituição de passos que podem levar o

pesquisador a se aproximar de um determinado processo de criação. A relevância desse

investimento genético, no caso do dossiê de One Art, se apóia na análise de signos verbais e

não verbais da obra em devir, que podem ser vistos como objeto material, cultural e de

preservação da memória de um determinado sistema cultural. O levantamento de tais

informações desses conjuntos de índices, quando devidamente organizados, pode ser reunido

em uma edição genética.

Conforme D’IÓRIO (2010), o objetivo da edição genética é publicar a obra de um autor de

maneira a representar e tornar inteligível a forma dos processos de sua escritura ou de sua

criação artística. GRÉSILLON (2007) sugere então que essas etapas de criação sejam

apresentadas, na ordem cronológica de seu aparecimento; quanto aos manuscritos que

compõem o conjunto de rascunhos a ser estudado, eles devem ser trazidos, um a um, para

posterior análise.

A um grupo de documentos de gênese escolhido pelo filtro singular de um determinado

pesquisador, Jean Bellemin-Noël (1972) denominou de prototexto. Trata-se de um conjunto

de rascunhos, manuscritos, provas, ou seja, documentos diversos de trabalho que precederam,

materialmente, a construção de um texto. Ao montar esse conjunto de documentos, o crítico

genético, responsável pela escolha e ordenação dos mesmos, depara-se com a tarefa de ter que

administrar o que lhe parece, à primeira vista, um verdadeiro caos; o seu desafio se resume

em dar a ver e a ler esses documentos por ele organizados, que foram produzidos pelo artista.

Quando um autor preserva seus documentos de forma organizada e sequencial, o trabalho do

geneticista já está facilitado cronologicamente. Entretanto, muitas vezes, o pesquisador ainda

encontra empecilhos que possam retardar a sua tarefa, como a dificuldade de decifração dos

textos, fato recorrente nos dossiês de Bishop.

Apesar de ter sido organizado pela curadoria da Special Collections em Poughkeepsie, o

acervo manuscrito autógrafo de Elizabeth Bishop chama o pesquisador para o desafio da

transcrição dos textos, considerando que a letra da autora não se presta a ser decifrada

facilmente. Apesar das dificuldades, trabalhar com o percurso genético e com o material

paratextual do poema One Art se transforma em uma meta a ser alcançada pelos

pesquisadores deste grupo, que desejam organizar, em meio digital, os documentos

encontrados.

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Segundo BIASI (2000), a edição eletrônica permite associar a imagem dos fac-símiles dos

manuscritos às transcrições realizadas e apresentá-las na tela do computador. Tal fato implica

na ampliação dos modos de investigação já que desta forma o prototexto torna-se acessível

em meio digital, podendo ser utilizado recursos como o de zoom para tais fins. Busca-se então

divulgar, através de um site construído pelo grupo, o percurso de uma obra de arte em um

ambiente que permita associar os fac-símiles dos manuscritos analisados a suas respectivas

transcrições, possibilitando assim navegar pelo percurso de criação do poema que se deseja

investigar.

3. EDIÇÃO GENÉTICO-DIGITAL: NAVEGANDO TRILHAS E NOVOS CAMINHOS

As especificidades das mídias contemporâneas vêm despertando interesse de se testar

variados tipos de edição ou sua publicação em novos suportes. Uma solução eficaz para

ultrapassar as barreiras impostas pelas edições impressas, que, geralmente, não comportam a

publicação exaustiva dos dossiês, parece estar nas tecnologias digitais. Para Labrave,

“L’édition eletronique, enrichie dês resources presque illimitées de l’hypertexte et du

multimédia, constitue l’horizon naturel dês recherches éditorials sur l’avant-texte” (1994, p.

94)2. Pode-se reconhecer que a edição eletrônica só vem a enriquecer as pesquisas genéticas,

disponibilizando para o usuário o recurso do hiperlink, que o permite fugir de leituras

lineares, assim deixando para trás o paradigma clássico regido pelos princípios da

causalidade.

Segundo D’IORIO (2010), uma edição genética deve repousar sobre cinco elementos

constitutivos: a preexistência de um dossiê genético; a catalogação e apresentação das

versões, em forma fac-similar; a apresentação da transcrição das versões existentes, caso estas

sejam de difícil leitura; a disposição cronológica dos manuscritos; e, por fim, a representação

dos processos genéticos identificados nos documentos que compõem o dossiê genético.

Considerando, então, a disponibilidade dos documentos de processo de One Art, iniciou-se

um projeto de edição genético-digital a qual utiliza como suporte este site na web. Por

acreditar que a internet, através do seu espaço fluido e híbrido, com linguagens líquidas e

maleáveis, é capaz de propiciar aos leitores que navegam nesse ambiente a coleta de

informações, seguindo os caminhos que lhes parecerem mais convenientes, decidiu-se investir

nesse tipo de edição.

A informática inova então os estudos dos manuscritos, colocando em evidência a rede de

comunicação dos meios eletrônicos. A partir daí, parece surgir um ambiente ideal para o tipo

de edição genético-digital que permite a convergência de vídeos, imagens pictóricas,

comentários explicativos, enfim, suportes midiáticos diversos, associando-os a uma rede

2 A edição eletrônica, enriquecida pelos recursos ilimitados da hipertextualidade e da multimidialidade,

constitui um horizonte natural das pesquisas editoriais sobre o prototexto. (Tradução nossa)

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sígnica de movimentos genéticos, que passam a ser expostos de forma dinâmica. Considerar o

processo de criação como uma rede de elementos conectados facilita, assim, a montagem de

uma edição genético-digital, uma vez que o pesquisador já tendo identificado as interseções

entre os manuscritos se utilizará dessas informações para criar caminhos de acesso oferecidos

na edição.

Sendo assim, a edição genético-digital do poema One Art, aqui proposta, não corresponderá a

uma simples transposição dos documentos de criação já existentes na forma escrita para o

ambiente digital. O que se pretende é, além de expor as inter-relações estabelecidas entre os

manuscritos da obra, também suplementá-los com uma teia semiótica que tem sido tecida em

torno do poema com paratextos que possam enriquecer essa edição.

A título de ilustração, ao se buscar, por exemplo, o termo “One Art, Elizabeth Bishop” no site

de busca do Google, em 29/06/2012, encontrou-se em média 2.300.000 resultados. A partir

desses dados, foram encontrados: vídeos feitos a partir do poema; animações; o filme In Her

Shoes (2005), no qual a atriz Cameron Diaz recita One Art; o poema lido por diferentes

pessoas; análises críticas da obra; o poema From Orient Point (Marilyn Hacker,1990) escrito

em resposta a One Art; o livro A Arte de Perder (Michael Sledge, 2011), bem como imagens

pictóricas as mais variadas.

Portanto, de posse do prototexto organizado, pensou-se, primeiramente, em realizar um estudo

genético do processo de criação do poema, para, a partir daí, produzir uma edição que

englobasse não só a riqueza do prototexto escolhido, como também um leque de paratextos

que, continua a ser suplementado a partir da obra fonte. Durante a produção, surgiram,

contudo, vários questionamentos, que geraram os critérios a serem seguidos nessa edição.

2.1 CRITÉRIOS DA EDIÇÃO

O início da montagem dessa edição genético-digital passou, primeiramente, por um período

de reflexão acerca dos critérios que seriam utilizados para embasar sua elaboração. Optou-se,

então, pela utilização dos critérios sugeridos por D’IORIO (2010), os quais estabelecem que

numa edição é imprescindível:

a) A existência de um dossiê genético;

b) A ordenação cronológica dos manuscritos;

c) A realização da transcrição dos fólios escolhidos, quando a caligrafia do autor não for

de fácil leitura;

d) A apresentação fac-similada dos fólios;

e) E, a representação do processo genético.

Além disso, ficou decidida como lista de operadores genéticos que seriam usados nas

transcrições do dossiê genético, a que segue:

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Tabela 1 – Operadores genéticos

Fonte: Grupo de pesquisa em Crítica Genética do Departamento de Letras Germânicas da UFBA

Estabelecidos os critérios, passou-se então à busca de respostas para quatro questões que

incomodavam o grupo, mas que haveriam de servir de suporte para a montagem da edição:

como levar às telas manuscritos criados em suporte papel? Como resolver a questão dos

direitos autorais para publicar, na íntegra, fólios do poema em análise, quando lidamos com o

ambiente digital, cuja premissa seria tornar acessível o maior número possível de informações

ao usuário da internet interessado no assunto? Como apresentar de forma dinâmica ao leitor a

representação dos movimentos genéticos do poema? Como construir uma edição genético-

digital, seguindo a linguagem convergente da internet, que fosse capaz de estabelecer uma

comunicação com o leitor?

Em resposta a tais questionamentos, chegou-se a algumas conclusões. A fim de disponibilizar

em meio virtual os manuscritos produzidos em papel, optou-se pela digitalização dos mesmos

através de um scanner. Quanto à segunda questão, uma vez que as leis de direitos autorais não

autorizam ao grupo a publicação de imagens, na íntegra, dos manuscritos de Elizabeth

Bishop, decidiu-se apresentar imagens parciais dos fólios; o parâmetro para escolha dos

trechos recaiu sobre aqueles que carregassem traços de movimentos genéticos analisados na

edição. Além disso, visando permitir ao leitor acesso completo ao conteúdo de cada

manuscrito, optou-se por disponibilizar a transcrição completa de cada documento. Em

seguida, para a representação dos movimentos genéticos estudados, criou-se um vídeo em

flash, que buscou simular a transição entre três versões escolhidas, distinguindo esses

movimentos pelo uso de cores distintas. Abaixo, o vídeo:

Crítica Genética - Vídeo

Por fim, para oferecer uma visão resumida dos elementos que compõem a edição proposta,

optou-se pela elaboração de um mapa de navegação, conforme apresentado, na imagem,

abaixo:

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Figura 1 – Mapa de navegação

Fonte: Grupo de pesquisa em Crítica Genética do Departamento de Letras Germânicas da UFBA

Na página inicial do site que apresenta a proposta em pauta, o leitor encontrará no menu

informações que contextualizam a edição apresentada. Na página chamada “Elizabeth

Bishop”, tem-se acesso aos dados biográficos da autora; nesse texto, decidiu-se por sinalizar

palavras em hiperlinks, que remetessem, por sua vez, a mapas, imagens, áudios, vídeos e a

outros textos verbais que expandissem as respectivas informações. Navegando as páginas da

edição, será possível acessar, também, as transcrições integrais dos manuscritos, assistir ao

vídeo que simula os movimentos genéticos escolhidos, acompanhar uma análise genética

elaborada e interagir com os autores da edição por meio de postagem de comentários.

De modo que, a edição proposta buscou entender o digital como um meio de comunicação

com linguagens e características próprias, tendo a convergência midiática, a interatividade e o

dinamismo dos espaços líquidos da internet como fatores primordiais para a sua elaboração.

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4. DOSSIÊ GENÉTICO E CONSIDERAÇÕES

A variedade de textos produzidos por Elizabeth Bishop garante uma abrangente fonte de

dados suficiente para gerar farto material paratextual sobre os trabalhos e a vida da autora.

Millier afirma, a partir da correspondência de Bishop referente ao ano de 1976, quando a

autora produziu One Art, que: “the one piece she did write tells the story of her struggle more

clearly and less evasively than any letter would have” (MILLIER 1993, p.506)3. Essa história,

a qual Millier se refere, começou a ser escrita no outono de 1975, publicada em abril de 1976.

Trata-se de One Art, cujo dossiê de criação é composto por um conjunto de 17 versões, 8

autógrafas e 9 dactiloscritas, sendo um poema apresentado na voz do eu lírico. Contendo

dados biográficos ficcionalizados, é um villanelle: poema originário da França, composto por

seis estrofes de seis versos, sendo a última estrofe formada por três versos. São usadas então,

seis palavras-chave para fechar os versos, uma em cada estrofe; finalmente, na última estrofe,

duas dessas palavras devem constar de cada uma das linhas do poema. Bishop explica o

formato villanelle, 20 anos antes de escrever One Art, em uma carta enviada a sua tia

Florence, em 1956, falando então a respeito do poema Sestina (1956), primeiro villanelle

publicado pela autora (BISHOP, 1956).

A primeira referência aos manuscritos de One Art aparece em uma carta que Bishop escreve a

sua médica Anny Baumann, em Fort Meyers, Florida, 24 de dezembro de 1975:

“I’m now going to take a long walk on the beach. Perhaps I’ll even send you a more

cheerful poem before I leave here. One of the things I didn’t get into the villanelle

[“One Art”] that I feel I’ve also lost, and that I really regret most of all, is that I

don’t think I’ll be able to go back to that beautiful island in Maine any more- this is

too complicated to go into, but it really breaks my heart…”

(Elizabeth Bishop to Anny Baumann, December 24th, 1975. (GIROUX, 1994, p.

602)4

Nessa carta, a linda praia a qual Bishop se refere, situada em Maine, é North Haven. O local

em questão é uma ilha paradisíaca na Baía de Penobscot, nos EUA. A autora dedicou ao seu

amigo, o poeta Robert Lowell, o poema North Haven, publicado em 1978, tendo Lowell

falecido um ano antes. Portanto, embora a ilha de North Haven não conste da lista de perdas

do poema One Art, pelo que se pode inferir, trata-se de um local privilegiado pela autora.

O prototexto do dossiê que se propõe montar a partir dos documentos de trabalho de One Art

foi selecionado dentre as versões que continham movimentos genéticos, os quais enfatizavam

as perdas da vida de Bishop. Nesse rol de perdas estariam incluídos acidentes geográficos e

3 “em um único texto ela teria escrito a história da sua luta pessoal de forma mais clara e menos evasiva do que

em nenhuma de suas cartas”. (Tradução nossa) 4 Agora eu vou dar uma longa caminhada pela praia. Talvez eu até envie um poema mais alegre para você antes

de ir embora daqui. Uma das coisas que eu não incluí no villanelle [One Art] e que eu sinto também ter perdido e que eu realmente lamento, mais do que tudo, é que eu acho que não poderei mais retornar àquela bonita ilha em Maine, – tudo isso é muito complicado, e realmente me deixa de coração partido. (Tradução nossa)

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espaços familiares à autora, que, na edição genético-digital que se pretende montar, remetem

a links mostrando imagens pictóricas ilustrando esses espaços.

Além disso, a análise dos manuscritos de One Art permite aproximações do pesquisador com

o modo de escrever da autora, considerada por Otávio Paz (1992) como a mestra da

reticência. Optou-se, especialmente, por observar nesses manuscritos o dialogismo interno ou

a luta interior da autora com os seus sentimentos e suas próprias emoções ao lidar com tantas

perdas, o que fica expresso nos documentos de gênese, mas que chegam à publicação de

modo reticente.

4.1 Escritura e fases genéticas

Analisando a criação do poema One Art, é possível identificar que Bishop usa, inicialmente,

uma máquina de escrever para sua primeira versão. Da versão 2 a 8, e na 17, tem-se

documentos escritos a mão. As demais são datilografadas, com campanhas posteriores de

revisão feitas à mão.

Tomando como base as fases genéticas de escritura estabelecidas por BIASI (2010),

observou-se que as etapas de trabalho de One Art podem ser assim definidas: a fase pré-

redacional ou inicial é aquela em que a autora busca definir o título na primeira estrofe do

primeiro manuscrito:

Figura 1 – Manuscrito 01 - Fase pré-redacional 5

Fonte: BISHOP, 1976: s.p., Box 60.2

Em seguida, a fase redacional, a mais longa, vai da escrita do manuscrito 1 ao 13, quando

Bishop estrutura, desenvolve, textualiza e aprimora o poema. Nesta fase, surgem versões

5 COMO PERDER COISAS /? / O DOM DE PERDER COISAS? Pode-se começar perdendo seus óculos de leitura ou 2 ou 3 horas por dia – ou sua caneta preferida A ARTE DE PERDER AS COISAS A coisa a fazer é começar extraviando (Tradução nossa)

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sucessivas, com suas re-escrituras; trata-se do bloco de documentos mais denso em

movimentos genéticos.

Figura 2 – Manuscrito 09 - Fase redacional6

Fonte: BISHOP, 1976: s.p., Box 60.2

O manuscrito 14 já aponta para o início da fase pré-editorial, que vai até o manuscrito 17.

Nesta etapa, observa-se que as intervenções da autora deixam de ser freqüentes em todas as

estrofes, passando a ser mais pontuais, em trechos específicos. Analisando as últimas

versões, mais limpas, tem-se a impressão de que a escrita está sendo finalizada, mas ainda

permeada por breves retoques. O manuscrito 17 pode ser considerado o último momento

autógrafo do prototexto. É nele que se visualiza o poema “limpo”, sem mais intervenções

autógrafas; por ser a última versão disponível, constitui o modelo a ser seguido no caso de

haver uma versão impressa:

6 A arte de perder não é difícil de dominar

Um sem número de coisas foram feitas para isso Para se perder, assim a perda não é um desastre <tanta coisas que> Perca alguma coisa todo dia. Ah, você consegue uma lista deve existir A lista usual: chaves de carro chaves, óculos de leitura, encomendas não enviadas A arte de perder não é difícil de dominar Então pratique a perda, perdendo mais e mais rápido, Esquecendo rápido Então pratique a grande perda, esquecendo rápido Lugares e nomes e onde eles deveriam Ir- nenhum deles é soletrado por desastre.

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Figura 3 – Imagem do manuscrito 17 e transcrição - Fase pré-editorial7

Fonte: BISHOP, 1976: s.p., Box 60.2

O prototexto analisado do poema One Art não abarca documentos da fase editorial –

momento em que o autor “autoriza o editor a efetuar a transliteração tipográfica do

manuscrito” (BIASI, 2010, p. 63) – pelo fato de não se ter encontrado registro deles. O

poema, publicado em 1976, ano de sua escritura, faz parte do livro intitulado Geography III.

4.2 Escrita como um quebra-cabeça

Bishop inicia a escrita do poema com uma verdadeira tempestade cerebral, uma técnica

recorrente em seu processo criativo. A autora lançava no papel, de maneira livre, as ideias que

lhe passavam pela cabeça sobre o tema em questão para posteriormente sistematizá-las.

Assim, o primeiro manuscrito de One Art se inicia com a escritora brincando com

possibilidades de títulos para o poema, em que Bishop ensaia: How to lose things /?/ The gift

of losing things, (“Como perder coisas?/A arte de perder coisas”).

Seguindo esse fluxo de ideias, Bishop enumera uma relação de coisas do dia-a-dia que se

costuma perder: “chaves, óculos de leitura, canetas”… O tom é de quem deseja dar uma

receita de como perder coisas, uma receita de especialista: “O que se tem a fazer é começar

colocando as coisas fora do lugar”, começa ela. A transcrição, abaixo, mostra como chega ao

papel essa tempestade cerebral:

7 A arte de perder

“A arte de perder não é nenhum mistério; Tantas coisas contêm em si o acidente De perdê-las, que perder não é nada sério. Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero, A chave perdida, a hora gasta bestamente. A arte de perder não é nenhum mistério.” Tradução de Paulo Henriques Britto

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Figura 4 – Imagem e transcrição do manuscrito 01 - Tempestade cerebral8

Fonte: BISHOP, 1976: s.p., Box 60.2

Tomando como exemplo o manuscrito 9, mostrado na transcrição abaixo, fica perceptível a

forma como Bishop vai trabalhando suas ideias dentro de um mesmo documento. As duas

primeiras estrofes (que se tornarão futuramente tercetos) trazem, como numa torrente de

pensamentos, imagens de perdas significativas da persona poética: o relógio da mãe, três

casas, uma ilha, duas cidades, um continente (mother’s watch, three houses, island, two cities,

continent).

Como se pode observar, os movimentos de correção ocorrem tanto dentro do próprio verso,

no curso da escrita, quanto em momentos posteriores, com eliminações e acréscimos na

marginália. Os últimos se configuram, quer por deslocamentos, quer pela adição de palavras e

frases dispostas na entrelinha superior ou imediatamente depois da palavra eliminada:

8 COMO PERDER COISAS /? / O DOM DE PERDER COISAS?

Pode-se começar perdendo seus óculos de leitura ou 2 ou 3 horas por dia – ou sua caneta preferida A ARTE DE PERDER AS COISAS A coisa a fazer é começar extraviando Especialmente, comece “extraviando” Chaves, óculos de leitura, canetas- tinteiro Estes são quase muito fáceis de serem mencionados “Extraviar” significa que eles quase sempre reaparecem No lugar mais óbvio, e mesmo quando a pessoa está facilmente Progredindo, os lugares ficam cada vez mais improváveis. (Tradução nossa)

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Transcrição do manuscrito 99

Num jogo de escolhas, entre tentativas e ensaios, a lista de perdas vai sendo ampliada. Porém,

as coisas banais aparecem apenas como ideias iniciais e, nos manuscritos seguintes, passa-se a

perdas maiores, a perdas pessoais, como aquelas que marcaram a história de vida da autora.

São pistas que levam os estudiosos da vida e da obra de Bishop a correlacioná-las com fatos

vividos. Mas se verifica que a menção a várias perdas experimentadas e já trabalhadas nos

manuscritos iniciais chegam, em sua forma publicada, apenas como vestígios. Enquanto que,

outras perdas, talvez as mais sofridas, passam por re-elaborações, generalizações, e

sobrevivem até a última versão, mas de modo bem reticente, assumindo a voz poética uma

atitude estóica.

9 Olha! Eu perdi o relógio de minha mãe duas /casas ilhas.?/ minha última, ou Quase última [/uma das/] minhas três casas. Para onde elas foram casas amadas [Acabaram] muito menos um desastre Não é um problema, muito menos um desastre Eu perdi duas casas (sic), encantadoras, Duas cidades desaparecidas, encantadoras, e imensas Perdas um cabo, um continente Você não vai acreditar nas perdas que posso administrar Olha! Eu perdi o relógio de minha mãe, minha última, ou quase última dentre três casas amadas. [Para onde] E elas se foram Olha! Eu perdi o relógio de minha mãe; minha última, ou quase última dentre [três] casas amadas se foram lugar algum distante [algum lugar], [e] mas não foi um desastre (Tradução nossa)

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5. FAC-SÍMILIES E TRANSCRIÇÕES

Fac-Símilies

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Nota: Devido às leis de direitos autorais não temos autorização para publicar a imagem inteira

dos manuscritos de Elizabeth Bishop.

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Transcrições:

Transcrições Draft 1

Transcrições Draft 9

Transcrições Draft 17

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No universo dos estudos genéticos, observou-se então os manuscritos de One Art, que valem

como objeto cultural e de resgate da memória de uma autora que se ocupou de temas tão

universais como as perdas e os lutos que se vai acumulando, ao longo da vida. Dispostos no

espaço líquido da internet, os documentos de trabalho de Bishop parecem ganhar vida ao se

articularem uns com os outros, bem como com paratextos os mais diversos, mostrando que a

Crítica Genética se fortalece na época contemporânea, enriquecida pelas novas mídias e pelos

recursos do ambiente virtual.

Os espaços intermidiáticos, pois, abrem novos horizontes para o trânsito dos manuscritos e,

como se pode observar neste estudo proposto, o poema One Art de Elizabeth Bishop tem

gerado múltiplos desdobramentos que enriquecem a rede de sua criação. Na tentativa de

elaborar uma edição genético-digital, aliou-se os estudos de gênese a informações biográficas

da autora e defendeu-se a importância de disponibilizar paratextos encontrados em meio

digital. Tirar a edição do papel e levá-la às telas ainda é algo em que se necessita investir com

mais cuidado, contudo, mais um passo foi dado pelos membros deste grupo para trilhar os

caminhos virtuais e usá-los a favor da Crítica Genética.

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REFERÊNCIAS

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BIASI, Pierre-Marc de (2010 [2000]). A Genética dos textos. Tradução Marie-Hélène Paret

Passos. Porto Alegre: EDIPUCRS.

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Collection,VassarCollege,Poughkeepsie,New York, 1976, Box 60.2.

BISHOP, Elizabeth. Correspondence. To Aunt Florence. November 21, 1956. Elizabeth

Bishop Collection, Vassar College, Poughkeepsie, N. York, Box 98.2.

D’IORIO, Paolo (2010). Qu’est-ce qu’une édition génétique numérique?. In: Genesis, nº30,

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VASSAR COLLEGE (1995). Elizabeth Bishop Papers Register. Poughkeepsie, New York.

GIROUX, Robert (Org.) (1994). Elizabeth Bishop’s letter. One Art. New York: Giroux, p.

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GRÉSILLON, Almuth (2007 [1994]). Elementos de crítica genética: ler os manuscritos

modernos. Tradução Cristina de Campos Velho Birck et al., superv. Patrícia Chittoni Ramos

Reuillard. Porto Alegre: EDUFRGS.

LABRAVE, Jean-Louis (1994). Hypertext, mémoire, écritures. In: Genesis. nº5, p.9-24.

MILLIER, Brett (1993). Elizabeth Bishop. Life and the memory of it.Berkeley:University

of California.

PAZ, Octávio (1992). Elizabeth Bishop, or the Power of Reticence. In: Elizabeth Bishop and

her art. Estados Unidos: TheUniversity of Michigan Press.

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HOW TO LOSE THINGS /? / THE GIFT OF LOSING THINGS? [look] [†] One might begin by losing one’s reading glasses [Draft 1]* oh 2 or 3 times a day - or one’s favorite pen. THE ART OF LOSING THINGS The thing to do is to begin by “mislaying”. Mostly, one begins by “mislaying”: keys, reading-glasses, fountain pens [†] - these are almost too easy to be mentioned, and “mislaying” means that they usually turn up in the most obvious place, although when one easily is making progress, the places grow more unlikely - This is by way of introduction. I really want to introduce myself - I am such a [†] fantastic lly /fantastically?/ good at losing things I think everyone shd. profit from my experiences. initially You may find it hard to believe, but I have actually lost intelligent I mean lost, and forever, two whole houses , never one a very big one. A third house, also big, is at present, I think, “mislaid” - but maybe it’s lost, too. I won’t know for sure for some time. I have lost one [long] peninsula and one island. I have lost - it can never be has never been found - a small - sized town on that same island. I’ve lost smaller bits of geography, like and many smaller bits of geography or so: a splendid beach, and a good-sized bay. Two whole citiees (sic). two of the world’s biggest citiies (sic) (two of the most beautiful although that’s beside the point) A piece of one continent - and one entire continent All gone, gone forever and never. One might think this would have prepared me for losing one average-sized not [especially] ------- <exceptionally> beautiful or dazzlingly intelligent person (except for blue eyes) (only the eyes were exceptionally beautiful and the hands looked intelligent) But it doesn’t seem to have, at all … the fine hands a good piece of one continent and another continent - the whole damned thing! He who loseth his life, etc. - but he who loses his love - neever (sic), no never never never again - [geography] ever A a [scenery] never x † [bay] for ever B a [never again] † excellent (intelligent) never † intelligent continent † ( † ) ( get ) ( set ) *símbolo utilizado pela autora

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[Draft 9]* The art of losing isn't hard to master: innumerable thing seem really to be meant so many things that to be lost, so their loss is no disaster. Lose something every day. Oh you can muster a list might muster the usual list: car-keys, keys, reading- galases (sic), /packages?/ unsent - The art of losing isn't hard to master. Then practice losing bigger, losing faster, forgetting faster † Then practice losing big, forgetting faster losing faster places, and names, and where it was you meant to go - None of them spells disasterdisaster (sic). Lose [someth] something every day. Oh you can muster the usual list: Lose something every day. Lose every day. Oh /anyone?/ can muster the the packages un sent (sic) Look! I have lost my [list] mother’s watch two /houses island?/ my last, or next-to-last [/one of?/] my three houses. Where they went, beloved houses. [Has ceased] much less a disaster. isn’t a problem, much less a disaster. I’ve lost two citiies (sic), lovely ones, Two cities vanished, lovely ones, and vaster losses a cape, a continent. You won’t believe the losses I can master. Look! I have lost my mother’s watch, my last, or next-to last of three beloved houses. [Where] AND they went Look! I have lost my mother’s watch; my last, or next-to-last of [three] loved houses went nowhere away [somewhere], [and] but they weren’t a disaster. Two cities, lovely ones And on to vaster [and vaster loss, a cape, a con /continente?/] an entire continent. The art of losing isn't hard to master. geographical loss – a continent. The artof (sic) losing isn't too hard to master. The art of losing isn’t hard to m /master?/ All that I write is false, it’s evident gesture ? The art of losing isn't hard to master. oh no. anything at all anything but one’s love. (Say it: disaster.) * Símbolo utilizado pela autora

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One Art [Draft 17]* The art of losing isn't hard to master. So many things seem filled with the intent to be lost that their loss is no disaster. Lose something every day. † Accept the fluster of lost door-keys, the hour badly spent - The art of losing isn't hard to master. Then practice losing farther, losing faster: places, and names, & where it was you meant to travel. None of these will /mean?/ disaster. I lost my mother's. watch. And, look, my last, or next-to-last, of three lost houses went,

? The art of losing isn't hard to master. _____________________________

I lost two cities, lovely ones, and, roots, some realms I owned, two rivers, a continent. - I miss them, but it wasn't a disaster. Even losing you, the joking voice, a gesture I love, I shan't have lied. It's evident the art of losing isn’t hard to master though it may look like (write it!) like disaster.

(Wrote this out of published #. read - Rotterdam )

* Símbolo utilizado pela autora