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O USO DO CONCEITO DE TEMPO EM SALA DE AULA: ENTRE O
CONTEÚDO SUBSTANTIVO E O DE SEGUNDA ORDEM NAS AULAS DE
HISTÓRIA
Anilton Diogo dos SANTOS1
Marlene Rosa CAINELLI2
Resumo: Neste artigo, buscaremos debater aspectos relativos aos primeiros momentos do trabalho de observação empírica de aulas no âmbito da pesquisa, em andamento no programa de mestrado em educação da Universidade Estadual de Londrina (UEL) temporariamente intitulada: “A construção do conceito de tempo em sala de aula: análise sobre as experiências de professores de história da rede municipal e estadual de ensino de Brasilândia/MS”, sob orientação da professora doutora Marlene Rosa Cainelli. Metodologicamente, escolhemos tratar os dados recolhidos, para essa investigação, a partir do conceito de triangulação de dados que, segundo Duarte (2009), possibilita ao pesquisador aferir a validade dos dados conquistados usando diferentes técnicas ou instrumentos de pesquisa. Aqui restringiremos a análise aos dados obtidos a partir do uso do caderno de campo e da observação direta das aulas desse grupo analisado. Para tanto, partiremos dos pressupostos teóricos do campo de investigação da Educação Histórica, centrando nosso olhar no uso que esse grupo faz do conceito de tempo, e, de que forma se dá a relação entre o tempo conceito de segunda ordem e tempo conteúdo substantivo no aprendizado em história, e qual relação pode ou não ser feita entre o uso da temporalidade em sala de aula e a formação da consciência histórica.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Histórica; Conceitos de segunda ordem e conteúdos substantivos; consciência histórica.
Agencia financiadora: Capes.
INTRODUÇÃO: ENTRE A “HISTORY EDUCATION” INGLESA E A
CONCEPÇÃO DAS IDEIAS HISTÓRICAS EM ALUNOS E PROFESSORES
BRASILEIROS
1 Graduado em História pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, campus de Três Lagoas (UFMS/CPTL); Mestrando em Educação pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) 2 Professora de Metodologia do Ensino de História da Universidade Estadual de Londrina.
Pesquisadora do Mestrado e Doutorado em Educação (CECA-UEL) e coordenadora do grupo de pesquisa História e Ensino de História (UEL)
O presente artigo parte de uma reflexão inicial a partir do uso do caderno
de campo de nossa pesquisa de mestrado em andamento. Nesta investigação
buscaremos refletir sobre como professores de História da rede Municipal e
Estadual de Ensino de Brasilândia no Estado de Mato Grosso do Sul
constroem, organizam e empregam em suas aulas, conceitos ligados a
categoria tempo. Utilizaremos para analise os pressupostos teóricos ligados ao
campo de investigação da educação histórica.
Cainelli (2008), aferiu pensado as concepções de tempo de futuros
professores de História a existência de uma distância entre a História científica
e a escolar, e mais, no processo de observação desses, a questão da
temporalidade, apesar de terem aporte teórico que lhes possibilitavam o
entendimento de que o tempo tem sua historicidade. No trabalho com os
alunos durante as aulas de estágio o tempo era tratado como algo natural, o
que deixava evidente que “não há, nesse sentido, uma problematização do
conhecimento histórico” (CAINELLI, 2008, p.139).
Durante a investigação proposta por nós, tentaremos verificar se o grupo
de professores analisados, naturalizam ou postulam práticas historicizadas
quanto a questão da temporalidade e como essa relação com o tempo é
trabalhada em sala de aula. Com isso ao fazermos uso do caderno de campo
voltaremos nossos olhos às experiências dos docentes.
No Brasil as pesquisas em ensino e aprendizagem em História tem
crescido consideravelmente nos últimos anos, mesmo a despeito das
condições de trabalho e financiamento para pesquisas nesta área, podemos
notar um crescimento gradual de programas de mestrado e doutorado sobre
Ensino de História alocados na área de História ou mesmo em programas em
Educação com ênfase no Ensino de História (Schmidt/Garcia, 2006). Na esteira
deste novo momento sobre as pesquisas ligadas ao Ensino de História novas
possibilidades e novos campos de investigação têm florescido.
Entre os ramos investigativos que organizam sua reflexão sobre o
processo de ensino e aprendizado, temos aqueles que dão especial atenção
aos processos ligados a dinâmica da sala de aula e as ideias históricas de
alunos e professores. Segundo Schmidt e Garcia (SCHMIDT/GARCIA, 2006,
p.14) as “investigações “em escolas” [...] encetam um diálogo mais próximo
com perspectivas teórico-metodológicas empíricas da pesquisa educacional,
com aquelas de cunho antropológico e sociológico”.
Durante a segunda metade do século XX, emergiu na Inglaterra
pesquisas, cujo foco buscava transformar a sala de aula num centro para
estudos sobre as formas e maneiras de como se aprende e ensinam ideias
históricas do passado.
De acordo com Peter Lee (2015) na Inglaterra esse movimento surge
entre as décadas de 60 e 80 do século XX, em oposição a “grande tradição” do
ensino de história que, estava “repleta de exemplos morais e patrióticos” e
objetivava (LEE, 2015, s/p) “garantir que os alunos soubessem um conjunto
mais ou menos acordado de fatos históricos para formar a base da história”.
Essa nova organização do que se ensinar em história estava ligada as
necessidades dos alunos e deveria ser “baseada em evidências”.
Para ele, esse processo não estava e nem era pronto ou acabado, pois,
surgiu, de professores anteriores aqueles que advogavam por um ensino de
história calcado nos preceitos da “grande tradição” historiográfica inglesa, e
mesmo contestando a forma como a história era ensinada anteriormente,
muitas das ideias que gravitavam ao redor dessa “nova história” conflitavam
entre si.
Sobre essa dicotomia na maneira e na expectativa que certos grupos
apresentavam sobre o papel da história no processo escolar Lee aponta que:
Durante as três últimas décadas, a educação histórica no Reino Unido exibiu uma tensão entre duas preocupações diferentes. Entre muitos profissionais (professores, examinadores e pesquisadores) o interesse se concentrou no significado e em como desenvolver a compreensão dos alunos na disciplina de história. Entrementes, alguns professores, muitos historiadores e o público leigo estiveram mais interessados no que os alunos deveriam saber sobre o passado no final dos seus cursos escolares. Claramente não há um conflito necessário entre
essas duas preocupações, mas devemos, todavia, lembrar-nos que lidar com um deles não é necessariamente fazer qualquer avanço sobre o outro. (LEE, 2006, p.133)
Essa mudança de postura nas pesquisas inglesas subsidiou
investigações realizadas por pesquisadores naquele país em diversos campos
da aprendizagem histórica. Barca e Gago (2001) apontam que:
No domínio da cognição histórica, vários estudos sobre ideias dos alunos, partindo de pressupostos inerentes à natureza da História, têm mostrado como crianças e adolescentes fazem inferências históricas a partir de fontes variadas (ex: Dickinson & Lee, 1978, 1984; Shemilt, 1980; Cooper, 1991; Lee, Dickinson & Ashby, 1997; Barton, 1997) e como os adolescentes podem interpretar fontes com pontos de vista diversificados, segundo critérios históricos (Shemilt, 1987; Wineburg, 1991) BARCA, GAGO, 2001, p.240
Germinari (2011) aponta que essas iniciativas, como a do projeto 13-16
coordenado por Denis Shemilt no Reino Unido, foram responsáveis por mudar
a situação de descrédito pela qual o ensino de história passava e criar uma
cultura de pesquisas na área de cognição. Para Lee (2006), nos últimos 40
anos fica clara importância da disciplina História e de sua existência na
educação das crianças e jovens ingleses. Por outro lado, ele assevera que a
educação histórica inglesa “está longe de ser satisfatória”. E isso em certa
medida deu-se pela dicotomia entre o que ensinar e ao significado que os
alunos davam ao que era ensinado e quais conteúdos históricos esse aluno
deveria saber ao fim da escolarização.
A partir dessas reflexões Lee desenvolveu um modelo de progressão
das ideias históricas de alunos, um dos projetos de maior abrangência foi o
projeto C.H.A.T.A (Concepts of History and Teaching Approaches. - Conceitos
de História e Abordagens de Ensino) e teve como objetivo central segundo
Pacheco (PACHECO. 2013, p.40 e 41) “mapear mudanças nas ideias dos
alunos entre sete e catorze anos de idade, sobre a história” e participaram dele
“Peter Lee, Hilary Cooper, Denis Shelmit e Alaric Dickinson”.
Seguindo este mote de investigação, em que as ações ocorridas em sala
de aula configuram campos de ação e mediação do pensamento histórico as
pesquisas em cognição histórica passaram a ser desenvolvidas além das
fronteiras inglesas. Isabel Barca aponta que:
Os anos 70 do século XX marcaram o início de uma época grande intensidade investigativa em relação a cognição histórica. Países como a Inglaterra, E.U.A ou Canadá começaram a romper a aceitação dos caminhos tradicionais do Ensino de História e procuraram aduzir novos elementos à forma como os alunos assume a compreens-ão em História [...] outros países como Portugal e Espanha seguem actualmente a mesma esteira. BARCA. 2001, p. 13
Para Barca (2001) as pesquisas em cognição histórica em Portugal,
partindo do modelo inglês que inspiram esse campo do conhecimento em
outras partes do mundo, “teoricamente” partem da natureza do conhecimento e
metodologicamente se debruçam sobre as ideias históricas dos sujeitos.
Fixamos esse norte conceitual.
Muito do que é pesquisado sobre ideias históricas no Brasil, e possuem
ligação com o campo do conhecimento da Educação Histórica têm estreitas
relações com a Educação Histórica portuguesa. Tanto que vários encontros,
seminários, teses e dissertações são realizadas buscando aproximar as
pesquisas realizadas nesses dois países. Outro ponto de confluência das
pesquisas realizadas nesse campo, em ambos os países, é embasado pelo
pensamento do teórico alemão Jörn Rüsen.
Para Schmidt e Garcia (2006) a trajetória das pesquisas em Educação
Histórica no Brasil criaram novas possibilidades investigativas e novas
maneiras de refletir sobre como os sujeitos aprendem e ensinam ideias
históricas fazendo dos atores do ato educativo fundamentais para a construção
e significação do que é ensinado em História. Tanto o aluno se tornando
agente de sua formação (p.23) quanto professor vivenciando a produção do
conhecimento histórico (p.21). Desta forma, entender o lugar dos conteúdos
substantivos e dos conceitos de segunda ordem e como esses termos são
vivenciados neste processo é o caminho que buscaremos percorrer adiante.
ENTRE O “SUBSTANTIVO” E “A SEGUNDA ORDEM”: MANEIRAS DE
PENSAR O USO DO CONCEITO TEMPO EM SALA DE AULA.
Durante o processo de ensinar e de aprender História uma série de
elementos são utilizados e podem nortear o percurso no entendimento de como
os sujeitos organizam o conhecimento. Esses elementos, podem, de acordo
com Caimi (2009) ser divididos em três momentos. Para ela o primeiro está
(CAIMI, 2009, 71) na “natureza da história que se escolhe ensinar, com seus
conceitos, dinâmicas, operações, campos explicativos” O segundo nas
“opiniões e decisões sobre aspectos de natureza metodológica, [...] o “como
ensinar” e, por fim, no “desenvolvimento de estratégias cognitivas, de noções e
conceitos próprios dessa área de conhecimento com vistas à construção do
pensamento histórico por crianças, jovens e adultos”.
Partindo desta reflexão sobre as várias dinâmicas utilizadas no fazer
organizacional do momento de aprendizagem no ensino de História, entender e
compreender a importância que o professor dá para o uso do conceito de
tempo em sala de aula torna-se primordial. Desta maneira pretendemos voltar
nosso olhar às experiências dos docentes, levando em conta suas diversas
experiências, fazeres e saberes que os motivam a fazer escolhas de conteúdo
e procedimentos de ensino em torno do conceito de tempo, uma vez que, não
entendemos sua prática como mera transposição didática.
Ao acolhermos essa postura teórica, em que as experiências docentes
são importantes e aceitarmos existência de várias dinâmicas que imbricam e
perfazem o momento de ensino e aprendizagem em História e pensando sobre
o uso do conceito tempo neste processo surge a necessidade de refletir na
relação entre o tempo como “conteúdo substantivo” e o tempo enquanto um
“conceito de segunda ordem”.
Outro fator é entender o quanto sobre esses termos, trazidos em grande
medida pela nova história inglesa e aprofundados pela educação histórica
deste mesmo país (Germinari 2011) são de domínio do professor de história da
escola pública, e, em que medida ele(a)s compreendem esses termos, ou essa
preocupação limita-se apenas aquela parte da academia que pesquisa sobre a
compreensão e uso da consciência histórica no universo da aprendizagem
histórica na sala de aula?
Tendo essa indagação como norte refletiremos como esses conceitos
surgem no campo da teoria e didática da História e como eles podem auxiliar
no processo diário de ensinar história e, também, como eles se relacionam ao
uso do conceito tempo em sala de aula.
Schmidt, Barca e Garcia reinteram que (2011, p.11) “por ideias de
segunda ordem, em história, podem ser denominados os conceitos em torno da
natureza da história (como explicação, objetividade, evidência narrativa)” e que
só a partir deles, os conceitos substantivos da história (os objetos da história)
podem ser entendidos claramente, uma vez que as ideias de segunda ordem
são “subjacentes à interpretação de conceitos substantivos tais como ditadura,
revolução, democracia, Idade Média ou Renascimento”.
Já Isabel Barca sintetiza que: (BARCA, 2011, p.25) “Os conceitos “de
segunda ordem”, também designados conceitos estruturais ou meta-históricos,
exprimem noções ligadas à natureza do conhecimento histórico” e os conceitos
substantivos “referem-se a noções ligadas aos conteúdos históricos”. Deste
modo, ambos, são importantes e necessários no processo de organização da
progressão do conhecimento sobre o passado nas aulas de História.
Schmidt e Cainelli (2009) ao pensarem sobre a necessidade de uma
disciplina escolar que privilegie esse processo de progressão do conhecimento
histórico apontam para o fato de que (SCHMIDT; CAINELLI, 2009, p.71)
“aprender história é sempre desenvolver a capacidade para se situar no tempo,
por meio de localizações e explicações acerca do passado, e sobre o tempo”, e
continuam por afirmar que isso se dá “porque os elementos históricos estão
sempre presentes no autoconhecimento das pessoas e no significado que elas
dão ao mundo”. Com isso entendemos o uso de conceitos de segunda ordem
como fundamentais ao ensino e aprendizagem histórica.
Partindo de nosso referencial (a Educação Histórica), empregaremos as
seguintes definições sobre os conceitos acima citados, usando como referência
a definição trazida por Peter Lee em que:
Aprender história é uma forma de ver o passado que envolve a compreensão da natureza e do estado do conhecimento histórico. Isso permite que os alunos produzam o sentido de (por exemplo) discordância histórica; e tornam possível o envolvimento com o conhecimento histórico. LEE, 2015, S/P
Tendo assegurado a importância dos conceitos de segunda-ordem no
processo de aprendizagem histórica que prima pelo ensino de conteúdos
substantivos em História, passaremos a análise do caderno de campo e dos
dados trazidos por esse instrumento pensando em como o conceito de tempo
pode ser utilizado como um conceito de segunda-ordem ou/e um conteúdo
substantivo.
O TEMPO NA SALA DE AULA: UMA REFLEXÃO SOBRE OS PRIMEIROS
MOMENTOS DE OBSERVAÇÃO EMPÍRICA E USO DO CADERNO DE
CAMPO
Metodologicamente, escolhemos tratar os dados recolhidos para essa
investigação, a partir do conceito de triangulação que, segundo Duarte (2009),
possibilita ao pesquisador aferir a validade das informações conquistadas
usando diferentes técnicas ou instrumentos de pesquisa. Aqui restringiremos a
análise a partir do uso do caderno de campo e da observação direta das aulas
deste grupo analisado. Optamos pelo uso do caderno de campo e pelo
processo de descrição densa como um instrumento de recolha empírica para
essa investigação por acreditarmos que a observação quando cruzada com
outros dados os torna validos e por consequência torna-se empiricamente
válida no percurso.
Inicialmente seriam acompanhadas sete professoras e um professor em
uma escola Estadual e outra Municipal em Brasilândia no Estado de Mato
Grosso do Sul, entretanto, uma das professoras decidiu abandonar a pesquisa
alegando motivos pessoais e outra assumiu a vaga na coordenação escolar,
assim, primando pela identidade dos participantes trataremos os mesmos pelos
termos P1, P2, P3, P4, P5, P6, P7, P8, mesmo que efetivamente só participam
da investigação seis professores.
Durante o processo de observação de aulas percebermos que muitas
vezes, a dinâmica da aprendizagem histórica passou por uso de conceitos de
segunda-ordem como modelos de explicações históricas, o professor(a)
utilizou, por exemplo, o conceito de empatia histórica como uma possiblidade
pedagógica.
Episódios de Aula:
Episódio 1:
Observação de aula do professor(a) P7, no Sexto Ano B do Ensino Fundamental, período Matutino,
Escola Municipal Antônio Henrique Filho (EMAHF) no dia 08/03/2016.
A aula começou com a correção das atividades propostas na aula anterior. A correção foi feita oralmente.
Após isso foi perguntado aos alunos a origem do termo mulata. Os alunos respondem suas impressões e há um
pequeno debate sobre a temática levantada. Feito isso, P7 passa no quadro um texto sobre tema levantado e
pede que os alunos copiem.
O texto é o seguinte: “O termo Mulata é pejorativo pois nas relações escravocratas a mulher era
considerada uma mula, pois carregavam peso”.
Neste episódio ficou evidente o uso de conceitos de alta complexidade
com a finalidade de explicar a origem do termo “mulata”. Percebemos nas
ações de P7 o cuidado com o conhecimento prévio dos alunos, mesmo que
esta preocupação tenha aparecido no processo de forma superficial, já que
após o debate não há aprofundamento desses conceitos por parte de P7,
dando a impressão de que os conhecimentos prévios são importantes como
disparadores, mas não o são no processo final de construção do
conhecimento.
Sobre o uso do conceito de tempo nesse episódio, ele ocorre na forma
de um conceito de segunda ordem, pois, congrega as ideias de processo,
ruptura, permanência, continuidade como algo importante para a construção do
conteúdo substantivo escravidão. Percebemos isso ao observar que o tempo
facilitou o entendimento dos alunos sobre o conteúdo histórico.
Episódio 2:
Episódio ocorreu na mesma aula do episódio anterior.
P7 escreve no quadro a seguinte sentença: “O que é História?” Pede para que os
alunos digam o que acham que seja a História. Neste processo são levantadas cinco
hipóteses, e essas são grafadas no quadro negro. Um dos pontos levantados é a oposição
entre o antigo e o moderno como algo que define a História. Neste ponto P7 procura causar
empatia histórica nos ao mencionar como eram as fotos antigas e se os mesmos já viram
algumas dessas fotos.
P7 também cita a brincadeira de amarelinha como uma atividade realizada no
passado e também atualmente como algo que possibilita perceber o processo de permanência
na História.
Ao tentar trazer o conteúdo para a realidade próxima dos alunos P7
busca, ainda que indiretamente ou de forma não consciente, responder a
finalidade da ciência histórica. Maria Auxiliadora Schmidt (2011) apoiada em
Rüsen afirma ser essa a finalidade da História pois, (SCHMIDT, 2011, p.83)
“parte-se do pressuposto que se aprende História porque a vida cotidiana nos
impõe determinados interesses relacionados a nossa necessidade de
orientação no fluxo temporal”.
Abud (2005) afirma que os alunos tendem a organizar e elaborar
conceitos históricos a partir de sua experiência e que o conceito de empatia
(2005, p. 27) “facilita a compreensão histórica, ao aproximar as pessoas do
passado às do presente”. Lee (2001) aponta que o processo de organização do
conhecimento e das maneiras de progressão deste, passam, pela familiaridade
que os alunos possam ter com fontes e evidencias históricas. Schmidt (2011)
nesta mesma linha afirma que a ida ao passado é sempre a partir do presente.
Cooper (2012) ao pensar a progressão e ensino de ideias históricas de
crianças advoga a necessidade do uso de processos de empatia e imaginação
históricas.
Episódio 3:
Observação de aula do professor(a) P2, no Nono Ano do Ensino Fundamental B,
período Matutino, Escola Municipal Antônio Henrique Filho (EMAHF) no dia 28/03/2016.
P2 inicia a aula passando aos alunos no quadro o roteiro da aula (do grupo assistido
ele(a) é o (a) único(a) que instrumentaliza o uso do roteiro de aula).
A aula tem como foco o trabalho com música. Como estratégia P2 apresenta aos
alunos uma música contemporânea e uma da década de 1980. Fato relatado aos alunos
durante a orientação da atividade.
A temática da aula é a desigualdade no Brasil e, nas palavras de P2 ao apresentar as
músicas, essas “fazem uma crítica social”.
O processo de construção temporal fica evidente quando da escolha das
fontes (letras de músicas) de períodos diferentes focando a mesma temática,
evocando uma ideia de continuidade. P2 ao apresentar músicas de
temporalidade diferentes sobre a mesma temática, partindo da mais antiga
para a contemporânea sempre direcionando o olhar dos alunos para seu lugar
próximo, busca3, a partir do conceito de empatia criar meios para que os alunos
a partir das músicas reflitam sobre as mudanças entre os períodos no que se
refere ao tema central da aula a desigualdade no Brasil.
Outro ponto importante neste evento é que P2 demarca um espaço
temporal usando a própria ação humana no tempo (compor e apresentar
músicas) como fonte histórica ou como reitera Lee (2011) como evidência.
Nestas primeiras impressões do uso do caderno de campo e dos dados
trazidos por este instrumento percebemos como alguns conceitos históricos
ficam na superfície do processo de ensino de história nas aulas deste grupo
analisado. Outro ponto que caberá maior reflexão é o fato de que em muitos
casos conceitos históricos e o passado de uma forma geral não são tratados
3 Muitas de nossas impressões, apresentadas como relevo nesta pequena reflexão, poderão ser comprovadas no estágio das entrevistas e analises dos planos de ensino, pois, acreditamos que ao cruzar os dados do caderno de campo com esses outros, saberemos ou poderemos inferir, por exemplo, se neste evento em especifico P2 usou o conceito de empatia de forma deliberada na execução de sua aula.
como um componente histórico, denotando a ideia de um passado prático
(OAKESHOTT 2003).
BREVES CONSIDERAÇÕES
Quando Peter Lee (2011) afirma que a história é a única ciência que
provem meios racionais para investigar o passado está apontando para a
ocorrência de uma reflexão em que somente por meio da aprendizagem
histórica é possível produzir sentido e ver o passado como parte do sofrer e do
agir humanos no tempo (Rüsen 2001), transpomos o debate em torno dos
conceitos meta-históricos para o centro da discussão sobre a formação da
consciência histórica e qual a sua finalidade na aprendizagem em História.
Para nós, o ensino da história de História fornece uma variedade de
conceitos meta-históricos como o de evidência ou mesmo o de empatia
histórica permitindo o aprofundamento racional de uma investigação sobre o
passado. Nesse aspecto o tempo como elemento de discussão sobre o
processo de ensino e aprendizagem em história no âmbito escolar perpassa
pela compreensão do que é temporalidade para o ensino e como esse conceito
pode auxiliar no entendimento de questões primordiais ao ensino da disciplina
com os chamados conteúdos substantivos. Assim, a grande questão, ao nosso
ver, é como um conceito como o de tempo, que pode ser entendido como
estruturante para a vida humana ou mesmo ligado ao cerne do conhecimento
histórico se acomoda na tessitura dos conteúdos históricos.
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